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Lngua
Portuguesa VI: Concordncia e Regncia
Elvira Lopes Nascimento
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2009 IESDE Brasil S.A. proibida a reproduo, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorizaopor escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.
N244 Nascimento, Elvira Lopes. / Lngua Portuguesa VI: Con-cordncia e Regncia. / Elvira Lopes Nascimento.
Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2009.
260 p.
ISBN: 978-85-387-0231-3
1. Lngua Portuguesa Concordncia. 2. Lngua Portuguesa
Sintaxe. 3. Lngua Portuguesa Gramtica. 4. Lngua Portugue-
sa Verbos. I. Ttulo.
CDD 469.5
Capa: IESDE Brasil S.A.
Imagem da capa: Jupiter Images e DPI Images
IESDE Brasil S.A.Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200Batel Curitiba PR0800 708 88 88 www.iesde.com.br
Todos os direitos reservados.
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Elvira Lopes Nascimento
Doutora em Filologia e Lngua Portuguesa pela Universidade de SoPaulo (USP). Mestre em Filologia e Lngua Portuguesa pela USP. Especialistaem Lngua Portuguesa e Literatura pela Universidade Estadual de Londrina(UEL). Licenciada em Letras Portugus/Ingls pela UEL.
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Sumrio
O objeto dos estudos lingusticos ...................................... 13
Sob o ponto de vista das manifestaes lingusticas no texto situado ................. 13
O texto como unidade de ensino/aprendizagem da lngua ..................................... 16Sob o ponto de vista da lngua como estrutura .................................... ........................ 21
Morfossintaxe ............................................................................31
Os estudos gramaticais ....................... .......................... ......................... .......................... ....... 31
As unidades lingusticas e os nveis de anlise ...................... .......................... ............... 34
Por que morfossintaxe ........................ .......................... ......................... .......................... ....... 38
Os critrios formal e sinttico para a classificao morfolgica ........................ ....... 40
O estudo da Sintaxe ................................................................ 51
As leis sintticas ........................ .......................... ......................... .......................... .................... 51
O campo de atuao da Sintaxe ....................... .......................... .......................... ............... 53
Frase e orao ........................ ......................... .......................... .......................... ........................ 56
A frase uma estrutura ....................... .......................... ......................... .......................... ....... 59
A estrutura sintagmtica do portugus ........................... 69
Constituintes imediatos ...................... .......................... ......................... .......................... ....... 69
Constituintes oracionais: os sintagmas ....................... .......................... ......................... ... 71
Os tipos de sintagmas ......................... .......................... ......................... .......................... ....... 73
A estrutura do sintagma nominal ......................... ......................... .......................... ........... 77
Sntese da estrutura do sintagma nominal ........................ ......................... .................... 78
Sintagma verbal ........................ .......................... ......................... .......................... .................... 79
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A significao na construo dos enunciados ............... 85Componentes do significado ......................... .......................... ......................... .................... 85
Ordem das palavras .......................... .......................... ......................... .......................... ........... 88
Ambiguidade ......................... .......................... ......................... .......................... ........................ 90
Redundncia semntica ......................... ......................... .......................... .......................... .. 94
Parfrase sinttica ......................... .......................... ......................... .......................... ............... 94
Sintaxe e Semntica ..............................................................101
A ordem ......................................................................................................................................102
A ordem nas oraes ..............................................................................................................103
A ordem nos sintagmas constituintes .........................................................................108
Funo semntica: os papis temticos .........................................................................110
Sintaxe de concordncia nominal ....................................119
Relaes de concordncia: termo regente e termo regido ......................... .............119
Relaes de concordncia nominal: gnero e nmero ...................... ...................... 123Concordncia nominal ..........................................................................................................124
Sintaxe de concordncia verbal ........................................137
Concordncia verbal ..............................................................................................................138
A abordagem tradicional da concordncia verbal ....................... .......................... .....139
As regras variveis da concordncia verbal: uma questo de estilo? ................... 144
Estilo e concordncia verbal ideolgica..........................................................................146
Sintaxe de regncia ...............................................................159
Os fatos sintticos que geram os dados de anlise ....................................................159
Manifestao da relao de regncia...............................................................................162
Regncia de alguns verbos ..................................................................................................165
Regncia nominal ...................................................................................................................169
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Crase: questo de sintaxe de regncia ...........................179Manifestao da relao de regncia...............................................................................180
Crase: combinao e contrao .........................................................................................183
Preliminares: o uso do artigo definido ............................................................................185
Preliminares: o emprego da preposio a ......................... ......................... .................. 188
Identificao do uso da crase..............................................................................................189
Sintaxe de colocao ............................................................197
As funes sintticas dos pronomes pessoais ..............................................................198Posies do pronome tono junto ao verbo .......................... .......................... .............200
Colocao pronominal em norma culta:pronomes tonos atrelados forma simples do verbo ....................... ...................... 202
Colocao pronominal em norma culta:pronomes tonos presos s formas compostas do verbo ....................... ................. 204
Colocao pronominal no uso coloquial da linguagem .......................... ................. 205
Colocao pronominal: fatores ligados sonoridade do enunciado ................... 207
Pontuao .................................................................................221A funo bsica dos sinais de pontuao .......................................................................221
Quando pontuar ......................................................................................................................223
Ambiguidades de sentido e pontuao..........................................................................225
O uso da vrgula no perodo simples ...............................................................................227
O uso da vrgula no perodo composto ..........................................................................230
O uso do ponto-e-vrgula .....................................................................................................232
O uso dos dois-pontos...........................................................................................................233
O uso das reticncias..............................................................................................................234
O uso do travesso ..................................................................................................................235O uso dos parnteses .............................................................................................................235
O uso das aspas ........................................................................................................................236
Gabarito .....................................................................................243
Referncias ................................................................................251
Anotaes .................................................................................259
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Apresentao
Ao atribuirmos ao texto uma funo central para o intercmbio comunica-tivo realizado pelos usurios da lngua, consideramos que as regras especficas detextualidade e textualizao se apoiam nas unidades que compem o texto asfrases. Estas, para comporem o texto, aceitam uma combinao mltipla de cons-tituintes do sistema lingustico, cuja finalidade e relevncia consistem em preen-cher tambm uma condio de textualidade. A frase deve ser capaz de associarsignificados e sequncias de sons, mas isso vai depender da escolha e do arranjode seus constituintes hierarquicamente constitudos. Para isso, a frase submete--se fora das leis que regem essa organizao sinttica, uma vez que a lngua emuso pressupe combinao, adaptaes ao contexto de uso, observao de con-venes sociais por parte dos seus usurios, pois os sentidos das frases s tomamforma nos arranjos sintagmticos.
Em consequncia, no estudo da linguagem, no se pode sufocar o fun-cionamento discursivo da lngua, o sujeito, a histria, a cognio, ignorando as-pectos que esto interligados nos estudos lingusticos, como os sentidos e a in-terao verbal, que do margem a diferentes estilos e variedades de registro nosmltiplos contextos de uso da lngua. Isso significaria um reducionismo do objeto a linguagem. O enfoque para o estudo e a descrio da linguagem vai alm deum enfoque nas estruturas formais da lngua e deve caminhar em direo lin-guagem e seu funcionamento, articulando e harmonizando os aspectos formais funo, ao, ao social e ao histrico.
Inseridos nesse quadro da lingustica moderna, organizamos os tpicosque constituem a disciplina Lngua Portuguesa VI: Concordncia e Regncia. Vocvai perceber que os fenmenos sintticos analisados e descritos so consideradoscomo desencadeadores da textualidade na superfcie dos enunciados e, portanto,o conhecimento das estruturas e leis morfolgicas e sintticas da lngua, consti-tui um importante instrumento para o aperfeioamento de nossa capacidade deproduzir textos.
Na aula 1, discute-se o objeto dos estudos lingusticos, em que se analisadois pontos de vista para a abordagem, a partir do texto-discurso e da lngua
como estrutura. Na aula 2, trata-se da abrangncia dos estudos atravs do vnculoMorfologia e Sintaxe, a partir de uma abordagem da Morfossintaxe e na aula 3estuda-se a estrutura sintagmtica do portugus.
Na aula 4, percorre-se os caminhos da Semntica, discutindo-se a questoda significao na construo dos enunciados e aspectos a ela relacionados. Naaula 5, enfatiza-se aspectos do sentido, correlacionando Sintaxe e Semntica paraenfocar a ordem nos sintagmas. Na aula 6, enfoca-se a problemtica que envolvequestes de Sintaxe e Semntica, uma vez que a compreenso da relao entre
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forma, ordem e significado princpio bsico para a estruturao da lngua. Naaula 7, o enfoque recai sobre os princpios de relacionamento e concordnciaentre as palavras na construo da frase. Na aula 8, trata-se especificamente darelao entre o sujeito e o verbo.
Na aula 9, o enfoque recai sobre a integridade da construo frasal e darelao entre termo regido e termoregente, e, na aula 10, aborda-se os aspectosligados crase como marca formal da sintaxe de regncia. Na aula 11, o objetivodo enfoque o de tratar da colocao dos pronomes tonos na frase em portu-gus. E, finalmente, na aula 12, o enfoque recai sobre as leis sintticas, que do aousurio da lngua diferentes possibilidades para a construo do ritmo do enun-
ciado atravs da pontuao.
Voc ainda pode contar com dicas de estudo para cada um desses assun-tos, sugestes de leituras complementares, uma farta referncia que dar suportea cada tema tratado e estudos lingusticos com os quais voc ir praticar e testaros conhecimentos adquiridos.
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Os estudos lingusticos na rea aplicada ao ensino-aprendizagem cadavez mais tm entendido o texto como unidade fundamental da comuni-
cao verbal. O objetivo maior das aulas de Lngua Portuguesa deveria ser
sempre ensinar e aprender o que pode ser usado, com a finalidade principal
de melhorar a capacidade de expresso e de comunicao. Nessa perspec-
tiva, o texto assume a posio central dentro da interao verbal e a frase
ganha importncia como unidade responsvel pela boa forma lingustica
desses textos: a frase, criao indefinida, variedade sem limite, a prpria
vida da linguagem em ao (BENVENISTE apudSAUTCHUK, 2004).
Sob o ponto de vista dasmanifestaes lingusticas no texto situado
Com a finalidade de situar brevemente as posies adotadas pelos es-
tudiosos da linguagem no mbito da pragmtica interacionale no mbito
do enfoque estruturalista gramatical iniciaremos esta reflexo com a
abordagem que toma a linguagem como atividade interativa e no como
forma ou sistema.
A lngua como trabalho social, histrico e cognitivoPartindo do ponto de vista que toma a lngua como um conjunto de
prticas enunciativas e no como forma abstrata,pensamos a linguagem
em seu funcionamento no fenmeno textual, pois consideramos impos-svel qualquer manifestao de linguagem fora do texto produzido em
uma enunciao.
Nos estudos da linguagem na atualidade, essa concepo est situa-
da na chamada lingustica enunciativa. Concepo esta em consonncia
O objeto dos estudos lingusticos
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comos estudos de Mikhail Bakhtin e Valentin Volochinov, autores fundamentais
para esse quadro epistemolgico. Para os autores, mesmo a mais elementar das
enunciaes humanas se organiza fora do indivduo pelas condies extraor-
gnicas da vida social (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1929/1982, p. 107). Em nossas
palavras, a enunciao humana sempre um ato social, produto da interao
social. Vejamos essa tese dos autores:
A verdadeira substncia da lngua no constituda pelo sistema abstrato de formas lingus-ticas nem pela enunciao monolgica e isolada, nem pelo ato psicofisiolgico de sua pro-duo, mas pelo fenmeno social da interao verbal, realizada atravs da enunciao ou dasenunciaes. (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1929/1982, p. 109)
Refletindo sobre a posio dos autores quando, na mesma obra, afirmam que
A lngua vive e evolui historicamente na comunicao verbal concreta, no no
sistema lingustico abstrato das formas da lngua nem no psiquismo individual
dos falantes (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1929/1982, p. 121) (grifo nosso).
A comunicao verbal concreta configura textos formas empricas do uso
da linguagem verbal, oral ou escrita, no interior de prticas sociais contextuali-
zadas histrica e socialmente. Esta perspectiva de lngua/linguagem leva o ana-
lista a tomar como ponto de partida o texto na interao, associando-o, a partir
das pistas materiais que se encontram em sua superfcie, s prticas sociocul-
turais no interior das quais surgiu e que chamamos de contexto. E ao se referir
comunicao verbal concreta que evolui historicamente, os autores esto
se referindo relativa estabilidade no modo de configurao dos enunciados,
que permite o seu reconhecimento (por exemplo, conseguimos reconhecer umafbula, uma bula de remdio, em meio a outros textos).
A interao verbal: a lngua na prtica socialA importncia do que acabamos de discutir se deve a uma dicotomia muito
comum entre professores de lngua portuguesa quando se deparam com a di-
viso: aspectos gramaticais e/ou aspectos textuais da fala e da escrita, o que os
leva a pensar que o que textual no gramatical e que o que gramatical no textual (TRAVAGLIA, 2003), posio com a qual no podemos concordar.
Se partirmos da concepo de que a interao verbal a realidade da lngua,
o enunciado concreto (que tem um autor e um interlocutor) a unidade mnima
da comunicao verbal. A partir desse momento, estaremos assumindo uma po-
sio da lingustica enunciativa, ponto de vista do qual se estudam os fatos de
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fala, ou seja, a produo concreta de enunciados por locutores na situao real
de comunicao.
A interao entre um locutor (ou mais de um) e seu(s) interlocutor(es) produz
um efeito de sentido que configura uma unidade semntica, ou seja, uma uni-
dade de uso da linguagem (um texto) e no uma unidade gramatical. Um texto
deve produzir sentido, ou ento ser apenas um amontoado aleatrio de ele-mentos da lngua o que significa que o texto deve apresentar textualidade. Para
Adam (apudBONINI, 2005) e Bronckart (2003) essa textualidade teria um nvel
microestrutural(o das unidades semnticas de base, isto , das frases), um nvel
macroestrutural(o dos segmentos maiores constitudos pelos tipos de discurso
que constituem o texto) e um nvel superestrutural(que organiza a produo e a
interpretao dos discursos em gneros de texto).
O que a interao verbal configura no uma estrutura morfolgica ou sin-
ttica, um texto estruturado em vrios planos, tais como: fonolgico, sinttico,semntico e cognitivo, interdependentes e organizados no processo de enun-
ciao pelo qual se d a interao verbal. Assim que A situao social mais
imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e, por assim
dizer, a partir do seu prprio interior, a estrutura da enunciao (BAKHTIN; VO-
LOCHINOV, 1929/1982, p. 113) (grifos do autor).
Percebeu por que no podemos tratar a lngua como um cdigo ou um sis-
tema de sinais autnomos, sem histria e fora da realidade social dos falantes?
A lngua muito mais que um mero sistema de formas fonolgicas, sintticas elexicais. Como afirma Franchi (1992), a lngua uma atividade constitutiva com
a qual podemos construir sentidos. No pode ser confundida com gramtica,
ortografia ou lxico, pois ela se manifesta nos processos discursivos, concreti-
zando-se em variados gneros de texto e recorrendo a diferentes linguagens
(verbal e no-verbal).
Marcuschi (2001) considera a lngua como uma forma cognitiva porque com
ela expressamos sentimentos, ideias, desejos; como uma forma de ao social,
pois com ela podemos agir realizando coisas; e, tambm, como um sistema sim-blico, uma vez que constituda por um conjunto de signos que pode significar
muitas coisas, mas cujos significados no podem ficar prisioneiros no interior
das estruturas morfolgicas ou sintticas, ou seja, apreendidos de forma descon-
textualizada. Para esse linguista, a atividade comum entre produtor e receptor
engajados na interao oral ou escrita no pode ser reduzida a um simples pro-
cesso de codificao (na produo) e de decodificao (na recepo).
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A linguagem vista por esse linguista (que apresenta seu postulado a partir
de uma abordagem sociointeracionista), sobretudo, como forma de aoe, nesta
perspectiva, deve ser analisada como atividade e no como estrutura. Entretanto,
o autor nos adverte para um problema que demanda muita reflexo: como cons-
truir uma teoria que equacione estrutura e atividade, que case adequadamente,
por exemplo, sentena e enunciado ou sentena/enunciado/enunciao?
Essa questo nos remete para a problemtica da interao social enfoque
que vai alm dos fenmenos estruturais da lngua. O estudo da interao verbal,
mediada pela linguagem, essencial para que possamos entender no apenas o
funcionamento da linguagem, mas tambm o sujeito que se constri na intera-
o. Nesse quadro que estudiosos como Bakhtin retiram a estrutura da lngua
do foco de suas reflexes para situar a linguagem na esfera de uso, em seu con-
texto sociointerativo. Esse o ponto em que ocorre a virada pragmtica, no
enfoque dos estudos da linguagem, ou seja, analisam-se muito mais os usos e
funcionamentos da lngua em situaes concretas do que os elementos das es-
truturas do sistema da lngua.
Atualmente, muitos linguistas tm discordado da tese de que o objeto da
sua cincia seja o sistema, o cdigo abstrato imune s circunstncias de uso em
cada situao de interao. Cada vez mais tentam descrever, no quadro dos es-
tudos lingusticos, a lngua (e a gramtica que a constitui) no mais como um
objeto esttico composto por estruturas do sistema, mas como manifestao
intencional de sentido, deslocando-se o fenmeno lingustico do ponto de vista
do sistema para o da atividade comunicativa.
Nesse quadro, no podemos concordar com a posio estruturalista na qual
a lngua considerada um sistema estvel de formas normativamente idnticas.
Isso seria uma abstrao cientfica que pode servir a certos fins tericos e prti-
cos particulares, mas no para o estudo da lngua e da linguagem em funciona-
mento na prtica social.
O texto como unidadede ensino/aprendizagem da lngua
No podemos ignorar uma srie de aspectos que hoje so considerados
fundamentais nos estudos lingusticos aplicados ao ensino/aprendizagem da
lngua. Os aspectos que esto ligados linguagem na interao social lembram
ao professor a necessidade de reflexo sobre:
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O que que se ensina ou se estuda quando se ensina ou se estuda lngua?
A questo faz emergir tomadas de decises quanto ao ponto de vista a ser
adotado na elaborao de materiais didticos, na organizao de currculos,
ementas e programas, nos procedimentos de avaliao (vestibulares, por exem-
plo), e nos cursos de formao de professores. Enfocar a lngua sob o ponto de
vista da gramtica descritiva? Da gramtica normativa? Nos eixos do uso (produ-
o e leitura/compreenso)? No eixo da reflexo lingustica (anlise lingustica)?
No uso oral? No domnio de uma variedade lingustica prestigiada socialmente?
A partir disso surgem outros questionamentos: O ensino ser do tipo pres-
critivo? Ser um ensino descritivo? Ou ser um ensino produtivo em torno de
capacidades de uso?
Dependendo das respostas dessas questes, outras surgiro sobre os objetosde ensino, os objetivos, a perspectiva da abordagem. Contudo, todas as respos-
tas podem ser enquadradas em uma nica denominao: ensina-se ou estuda-
-se a lngua portuguesa.
No entanto, h hoje um consenso entre linguistas tericos e aplicados: o
ensino de lngua deve se dar por meio de textos e essa a orientao central
dos Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Lngua Portuguesa.
Diante das mudanas na seleo e na abordagem do objeto de estudo/apren-
dizagem da lngua, temos nos deparado com o problema:
Como se pode conduzir o trabalho com a lngua por meio do texto?
O texto tomado como unidade emprica dos estudos de linguagem aplicados
ao ensino apresenta muitas possibilidades, como salienta Marcuschi (2001), ao
preconizar um trabalho com base em textos. Veja algumas dessas possibilidades:
a lngua em seu funcionamento autntico e no-dissimulado;
as variantes lingusticas;
as relaes entre fala e escrita no uso real da lngua;
a organizao fonolgica da lngua;
os problemas morfolgicos em seus vrios nveis;
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o funcionamento e a definio de categorias gramaticais;
os padres e a organizao de estruturas sintticas;
o funcionamento dos processos semnticos da lngua;
a organizao das intenes e os processos interacionais;
a progresso temtica e a organizao tpica;
o treinamento do raciocnio e da argumentao;
o estudo da pontuao e da ortografia;
os problemas residuais da alfabetizao;
o estudo dos gneros de texto.
O autor deixa em aberto outros possveis enfoques pois, como ele afirma, essarelao no exaustiva e nem obedece a uma ordem lgica de problematizao.
Contudo, devemos fazer uma ressalva: ainda que pensemos a linguagem
como um conjunto de prticas sociais, cognitivas e interacionais, isso no sig-
nifica que estamos ignorando o sistema, a gramtica da lngua. Como afirma
Antunes (2005, p. 85), todas as pessoas falam conforme as regras particulares da
gramtica de sua prpria lngua. Isso porque toda lngua tem sua gramtica, seu
conjunto de regras. [...]. Quer dizer, no existe lngua sem gramtica.
O argumento da autora pertinente e relevante. O problema que vemos
fazer da metalinguagem e da anlise formal o centro do trabalho com a lngua
ou, em outra abordagem, reduzir a lngua s regras gramaticais, dentro de um
objetivo pedaggico prescritivo e normativo. Uma educao lingustica deve
estar centrada em capacidades a serem desenvolvidas nos aprendizes: o pro-
fessor deve decidir se objetiva desenvolver capacidades de linguagem para as
prticas sociais ou desenvolver a competncia para o reconhecimento da lngua
como sistemadelimitado em diferentes nveis estruturais.
A abordagem textual-discursiva da lnguaComo voc percebeu, estamos nos referindo a abordagens da lngua que
esto relacionadas a diferentes concepes de lngua(gem).
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A conscientizao do professor de lngua importante, uma vez que o en-
foque didtico vai depender da natureza do objeto de ensino-aprendizagem,
qualquer que seja ele:
a lngua considerada em seu contexto de uso, nesse caso, os textos e os
seus nveis de organizao so objeto de estudo; ou
a lngua funcionando como um sistema de regras com sua fonologia, morfo-
logia, sintaxe, lxico e semntica sem indagao sobre os seus usos sociais.
Bronckart (2003), dentro de uma perspectiva textual para o ensino de lngua,
lembra que os textos so um objeto legtimo de estudo e que a anlise de seus
nveis de organizao permite trabalhar a maioria dos problemas relativos
lngua em todos os seus aspectos. O autor apresenta trs nveis superpostos que
definem o que ele, metaforicamente, denomina de folhado textual.
A proposta do autor representa uma boa contribuio por se prestar adequa-damente nossa necessidade metodolgica de desvendar a trama pela qual se
d a organizao dos textos. Por ela, temos uma viso geral daquilo que pode
constituir o objeto que desejamos enfocar no estudo da linguagem, ou seja, em
qual camada do folhado textual se encontra a questo que desejamos abordar.
Qualquer que seja o objeto de estudo (no nvel da microssintaxeou da macros-
sintaxe), ele estar sempre l, na relao de interdependncia que todos os ele-
mentos mantm entre si e entre as representaes do produtor sobre o contexto
de produo.
No que se refere ao folhadoque constitui a arquitetura interna dos textos,
Bronckart (2003), considera trs nveis:
A infraestrutura geral do texto que compreende os tipos de discurso
(narrar/expor) e os tipos de sequncias (narrativa, descritiva, argumentati-
va, explicativa, injuntiva e dialogal).
Os mecanismos de textualizao compreendendo a conexo, a coe-
so verbal e a coeso nominal.Os mecanismos enunciativos nesta camada do folhado se localizam as
questes pertinentes s vozes e s modalizaes.
Por ora, fiquemos apenas na camada dos mecanismos de textualizao:
aqui as marcas de textualizao so observveis tanto no nvel da microssinta-
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xequanto no nvel da macrossintaxe, ou seja, o texto coeso, tecido, articulado,
amarrado pelos mecanismos de textualizao que lhe do coeso.
Assim, para Bronckart, (2003), os trs nveis da arquitetura textual resultam
das operaes de linguagem acionadas pelo produtor de um texto oral ou
escrito em determinadas condies externas de produo de linguagem, que
envolvem, por um lado, a situao de ao (as representaes sobre o contextofsico, social e subjetivo de seu agir, sobre suas prprias capacidades e sobre
o contedo temtico mobilizado). Do outro lado, essas condies externas
envolvem a preexistncia de espcies de texto que ele deve selecionar para a sua
ao de linguagem gneros textuais que implicam operaes de linguagem
especficas para a sua textualizao.
Essa articulao da abordagem das condies externas de produo e da ar-
quitetura interna dos textos permite mostrar que as operaes de linguagem
so determinadas pelas representaes sociais relativas s atividades de lin-guagem em uma esfera de comunicao humana, mas deixam aos produtores
certa margem de deciso e liberdade para a escolha adequada dos mecanismos
de textualizao que atendam s especificidades intencionais e interacionais
(BARROS; NASCIMENTO, 2007).
Isso significa que as pessoas, para exercer a linguagem, para usar a lngua
e para produzir sentidos devem manter o cuidado com a adequao social do
produto lingustico em conformidade com as suas representaes da situao
de produo.
Como afirma Neves (2000, p. 53), s haver exerccio pleno da linguagem se
as escolhas e arranjos estiverem adaptados s condies de produo, incluin-
do os participantes do ato lingustico. Para a autora, quanto mais a interpreta-
o estiver prxima da inteno, mais bem sucedida ter sido a comunicao,
incluindo-se at a possibilidade de que a inteno tenha sido uma interpretao
ambgua. Dentro dessa moldura pragmtica que governa a interao, afirma
a autora que o que se faz produzir sentido, tanto quem produz o enunciado
quanto quem o recebe.
Dessa forma, o que fazemos em relao gramtica da lngua :
ficarmos submissos a um ncleo duroque governa a parte estrutural dos
arranjos;
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manejarmos um conjunto de decises entre os possveis, com as quais
ajustamos nossas produes para compor sentido, para obtermos sucesso
na interao, e conseguirmos, realmente, manter a comunicao.
Sintetizando: ensinar e aprender a lngua implica a adoo de um ponto de
vistaterico e metodolgico que vai dirigir o enfoque em duas direes: ou para
uma anlise dos fenmenos lingusticos relacionados organizao interna dalngua em seus vrios nveis de abordagem (fonolgica, morfolgica, semntica
e sinttica), independentes do contexto de uso; ou para uma anlise que reco-
nhece na superfcie dos textos as pistas ou marcas deixadas pelos processos in-
teracionais de produo de sentidos.
Sob o ponto de vista da lngua como estruturaNo tpico anterior, voc percebeu que o foco era a lngua relacionada ao con-
texto social de uso, aos textos e/ou discursos e aos interesses diversos dos inter-
locutores na produo textual-discursiva.
Nesta seo vamos discutir a tese assumida por Saussure (1975) ao definir
o objeto da lingustica como sendo a lngua (e no a linguagem) definida
como um sistema, cujas unidades so, para o autor, de natureza relacional no
encadeamento linear, ligadas por relaes sintagmticas.
Nos meados do sculo XX, predominou a viso formal da lngua, culminan-do com o estruturalismo formalintroduzido por Ferdinand de Saussure, linguista
que considerado o pai da lingustica moderna. Essa abordagem da lngua se
fundamenta em princpios tericos, entre os quais podemos citar:
a lngua uma totalidade organizada;
a lngua um sistema autnomo de significao;
a lngua pode ser estudada em si e por si mesma.
Esses postulados instituram um novo modo de fazer lingustica e fizeram
eclodir diferentes vertentes dos estudos da linguagem que, mesmo sem negar
que as lnguas tenham seu lado social e histrico, no consideram esses aspec-
tos como seu objeto de estudo especfico.
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O estruturalismo saussuriano volta-se para a descrio das regularidades
internas ao sistema, ao cdigo da lngua (a langue,e no a parole). Para os es-
tudiosos da lngua nesse modelo terico, a fala/paroleno controlvel pelo
analista, portanto no pode constituir objeto de estudo cientfico. Hoje, a viso
de lngua/linguagem evita a viso estruturalista e a descrio puramente formal,
e caminha em direo a uma perspectiva do funcionamento do sistema em seus
aspectos funcionais, situacionais e contextuais do uso.
So imensas as contribuies da abordagem estruturalista, que polarizou
o enfoque da linguagem em dicotomias que ainda so utilizadas nos estudos
lingusticos, especialmente os de cunho formal ou estrutural. Veja algumas dico-
tomias saussurianas:
lngua X fala
sincronia X diacronia
significante X significado
sintagmtico X paradigmtico
social X individual
As dicotomias saussureanas representam um valioso repertrio de possibili-
dades para os estudos lingusticos e constituem fundamentos que precisam ser
bem compreendidos por quem se prope a estudar o sistema da lngua.
Texto complementar
Ensino de lngua materna gramtica e texto:
alguma diferena? (TRAVAGLIA, 2003)[...]
Antes de tudo preciso acreditar que o homem se comunica por meio
de textos. Assim, comunicar-se significa de alguma forma (lingustica ou
no) produzir um efeito de sentido entre o(s) produtor(es) de um texto e o(s)
receptor(es) desse mesmo texto. Se nos restringirmos aos textos lingusti-
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cos, podemos dizer que uma sequncia lingustica s se transforma em texto
quando produz um efeito de sentido entre seu produtor e seu receptor, ou
seja, quando faz/tem sentido para algum. Caso contrrio, o que temos
s um amontoado de elementos da lngua, mas no um texto. Essa a lio
que aprendemos com a Lingustica Textual ao tratar da coerncia. Sabe-se
tambm que o sentido que uma sequncia lingustica faz (e que a transfor-ma em texto) depende de uma srie de recursos, mecanismos, fatores e prin-
cpios internos e externos lngua. Todos esses elementos esto, de alguma
forma, inscritos e regularizados na lngua, constituindo sua gramtica. Por
isto que se pode afirmar que a gramtica de uma lngua o conjunto de
condies lingusticas para a significao. Portanto, o conjunto desses recur-
sos, mecanismos, fatores e princpios que usamos para produzir efeitos de
sentido a gramtica de uma lngua.
Todos os recursos da lngua em todos os seus planos (fonolgico, mor-folgico, sinttico, semntico, pragmtico) e nveis (lexical, frasal, textual-dis-
cursivo) em termos de unidades e estruturas (sejam elas fonolgicas, morfo-
lgicas, sintticas, textuais), funcionam como pistas e instrues de sentidos
que so coadjuvados nesta funo por mecanismos, fatores e princpios.
Dessa ao conjunta surgem os efeitos de sentido possveis para uma dada
sequncia lingustica usada como texto numa dada situao de interao.
A seguir daremos, utilizando os recursos da lngua que muitos chamam
de artigo, um exemplo que pode evidenciar que no h uma separao sus-tentvel entre gramtica e texto.
[...]
No final de um estudo sobre o chamado artigo nosso aluno pode saber:
dizer o que um artigo;1.
dizer qual a classificao dos artigos;2.
listar os artigos;3.
classificar os artigos;4.
identificar artigos em sequncias lingusticas;5.
discutir se o artigo uma classe de palavras parte ou um tipo de6.
pronome, inclusive apresentando argumentos como, por exemplo, o
fato de que, na sequncia lingustica, no se pode usar essa unidade
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da lngua junto com alguns tipos de pronomes (como os demonstra-
tivos e os indefinidos, naturalmente por razes diferentes) (exemplos
1a, b), mas pode-se us-la como outros tipos de pronomes como os
possessivos (exemplos 1a, b), mas pode-se us-la com outros tipos de
pronomes como os possessivos (exemplo 1c). Pode-se discutir ainda
se ele nem uma classe de palavras, mas apenas um morfema.
(1)
a. * Os estes/alguns meninos esto alegres.
b. * Uns estes/alguns meninos esto alegres.
c. * Os meus meninos esto alegres.
saber usar na construo e compreenso de textos os recursos da ln-7.
gua chamados de artigos, com base no conhecimento das instrues
de sentido com as quais estes recursos so capazes de contribuir para
a produo de sentido em um texto, permitindo a comunicao numa
situao de interao comunicativa. Neste caso, podemos trabalhar
com os alunos as seguintes questes:
a. as instrues de sentido bsicas desses recursos da lngua nor-
malmente especificados na teoria lingustica, inclusive nas cha-
madas gramticas tradicionais, seriam os artigos definidos pois
apresentam entidades como definidas, conhecidas dos interlo-
cutores e os indefinidos as apresentam como indefinidas, des-conhecidas. Assim, s se pode usar o artigo definido para algo
que apareceu no texto ou que est disponvel de alguma forma
em nossa cultura;
b. alguns efeitos de sentido mais frequentes derivados desses va-
lores bsicos.
[...]
A seguir so comentados, mesmo que sumariamente, esses efeitosde sentido.
(2)
a. O preo da entrada X.
b. O preo de uma entrada X.
c. O preo de entrada X.
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O texto em (2a) poderia ser usado em qualquer situao em que se pre-
tende dizer quanto custa a entrada, o ingresso para algum, por exemplo,
para um show, inclusive poderia responder pergunta: Qual o preo da
entrada?. J (2b) s poderia ser usado, por exemplo, em uma situao em
que se discute o valor da entrada para se comprar uma s ou muitas. Em (2c)
no se refere ao ingresso, mas a outro tipo de entrada: o comeo de parti-cipao em algo, como ser scio de um clube, por exemplo: Quanto paga
para ser scio de seu clube?/ O preo de entrada R$1.000,00 depois voc
paga uma mensalidade de R$30,00.
(3)
a. Joo levou seu sobrinho ao parque. O menino pulou no lago
para nadar.
b. Joo levou seu sobrinho ao parque. Um menino pulou no lago
para nadar.
Nos textos de (3) a diferena entreae b de referncia e causada pelo
uso de recursos diferentes (artigo definido ou indefinido) na segunda frase
do texto: emasobrinho e menino so a mesma pessoa, mas em bsobri-
nho e menino so duas pessoas diferentes. Inclusive, o sobrinho de Joo
pode no ser um menino, pode ser um rapaz.
(4)
a. O grupo do Rio, composto pelos pases latino-americanos, deci-diu que...
b. O grupo do Rio, composto por pases latino-americanos, decidiu
que...
Em (4) a diferena entre ae b consequncia do uso ou no do artigo
definido contrado com a preposio (pelos xpor). O texto de asignifica que
o grupo do Rio formado por todos os pases latino-americanos, enquan-
to o de bsignifica que o grupo do Rio formado apenas por alguns pases
latino-americanos. Dessa forma, se confrontarmos com a realidade, apenasum texto verdadeiro: o texto b.
(5)
a. A menina de ontem trouxe este recado para voc.
b. (?) Uma menina de ontem trouxe este recado para voc.
c. Uma menina trouxe este recado para voc.
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Em (5) observamos que (5a) s pode ser usado com o artigo definido por
causa do identificador (de ontem) que se coloca para menina, o que marca
que uma menina conhecida dos interlocutores. por isso que (5b) soa estra-
nho, se tivermos uma situao em que ontem s se conheceu uma menina.
Para que (5b) seja visto como um texto bem construdo, adequado, preciso
que ontem os interlocutores tenham tido contato ou conhecido vrias me-ninas. Neste caso (5b) adequado e indica que uma das meninas de ontem
trouxe o recado, mas se especifica com preciso qual delas. O texto (5c) s
poder ser usado em uma situao em que o falante teve contato anterior
com a menina, o ouvinte no. Neste caso a menina conhecida do falante,
mas no foi referida anteriormente para o ouvinte; assim, usa-se o artigo in-
definido para apresent-la no texto, como desconhecida ou de forma impre-
cisa (se considerarmos que os dois tiveram contato com vrias meninas no
dia anterior, mas no h como especificar qual delas).
(6)
a. Joo danou com uma menina.
b. J-o-dan-ou-com-U-MA-me-ni-na.
c. Is-so-vai-dar-UM-bo-de.
d. O- J-o-tem-UM-na-riz.
Nos textos de (6) temos uma oposio entre um texto que tanto pode
ser escrito quanto oral (6a), com entonao normal de uma sequncia de-
clarativa e textos que s podem ocorrer na lngua oral (6b, c, d), em que
se tem uma pronncia/entonao silabada com nfase entonacional no
artigo (tom de voz mais alto), geralmente com um certo alongamento da
vogal u. Assim, (6a) significa que Joo danou com uma menina X, que
o locutor no sabe quem . J em (6b), pela entonao silabada e nfase,
tem-se mais o sentido de que a menina muito especial em algum aspecto
(beleza etc.). uma espcie de superlativo que aparece tambm em (6c)
(o problema que vai ocorrer muito grande) e (6d) (o nariz de Joo um
nariz muito grande, notvel, muito feio). Para Nunes J. (2001), em casossemelhantes a (6c), em que se tem uma expresso idiomtica, a entonao
silabada obrigatria. A entonao comum s aconteceria sem o artigo
(Isso vai dar bode). O texto de (6d) tambm no pode ocorrer sem esta
entonao a no ser que se v qualificar explicitamente o nariz: (*Joo tem
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um nariz) parece no ocorrer no portugus, mas Joo tem um nariz feio/
bonito/chato/aquilino ocorre normalmente.
(7)
a. O meu lar o botequim.
b. O meu lar um botequim.
Em (7a) o texto significa que o falante mora em dado botequim especfico
que ele e o ouvinte conhecem (7b), pode-se ter o sentido de que o falante
mora em um botequim qualquer que o ouvinte no conhece, mas pode-se
tambm ter o sentido de que o lar do falante, em sua casa, por alguma razo,
parece com um botequim em alguma caracterstica ( desarrumado? vive
cheio de gente? o falante tem muita bebida em casa e vive bebendo s com
amigos? seu lar popular? etc.). Nesse segundo caso, temos uma compara-
o e uma metfora.Os aspectos apresentados nos itens 1 a 6, no incio deste artigo, constitui-
riam uma parte da teoria lingustica ou gramtica que se preocupa basica-
mente com a identificao dos tipos de unidades e recursos de que a lngua
dispe, sua classificao, identificao, estruturao. J o que foi apresenta-
do em 7 e nos comentrios dos exemplos constituiria uma parte da teoria
lingustica ou gramatical que se preocupa basicamente com o funcionamen-
to dessas unidades e recursos na constituio de textos para produo de
determinados efeitos de sentido, pode-se dizer num plano mais semntico
e pragmtico e no nvel textual-discursivo. Pode-se afirmar que a primeira
parte apenas um requisito para a segunda, ou melhor ainda, faz parte da
segunda, e no precisa necessariamente ser conhecida pelos usurios de
uma lngua para que sejam usurios competentes dessa lngua.
Desta forma, acreditamos que se deixarmos de dividir essas duas partes
em gramatical e textual como se fossem coisas distintas e estivermos con-
vencidos de que texto apenas um resultado da aplicao da gramtica
da lngua em funcionamento, para comunicar por meio da produo de
efeitos de sentidos, deixaremos de ter no ensino de lngua materna a ati-tude, pode-se dizer, perniciosa, de achar que gramtica e texto so coisas
distintas e que tm de ser tratadas separadamente por terem pouca rela-
o entre si. Tal atitude tem criado a sndrome da incompetncia que leva
tantos falantes de portugus a dizerem no sei portugus.
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Dicas de estudoA Prtica de Linguagem em Sala de Aula: praticando os PCNs , organizado por
Roxane Rojo (So Paulo, EDUC/Campinas (SP), Mercado de Letras, 2000).
Este livro especialmente dedicado aos professores em pr-servio e em ser-vio, identificados com as propostas presentes nos Parmetros Curriculares Na-
cionais (PCN), que preconizam os gneros de textos como objetos de ensino.
Dicionrio de Lingustica e Gramtica , de Joaquim Mattoso Cmara Jr. (So
Paulo, Editora Vozes, 2001).
Neste dicionrio, Mattoso Cmara Jnior, considerado o mais ilustre represen-
tante do estruturalismo lingustico no Brasil, oferece noes gramaticais como
base para a compreenso estrutural, funcional e histrica da lngua portuguesa,
alm de informar sobre fatos da lngua, verbetes gramaticais, termos tcnicos,entre outros temas.
Ferdinand de Saussure: escritos de lingustica geral , de Simon Bouquet e Ru-
dolfo Emgler (So Paulo, Cultrix, 2004).
Este livro trata das novas descobertas de textos inditos de Saussure que
esto provocando a (re)discusso sobre aquilo que se considerava a viso saus-
suriana de lngua, na forma como foi interpretada pelos discpulos que publica-
ram o Curso de Lingustica Geral. Os novos manuscritos de Saussure demonstramque ele no fechou as portas para o sentido, o uso, o texto ou a enunciao.
Ao contrrio, ele tinha uma viso ligada anlise da lngua em uso que ia alm
daquela que seus discpulos deixaram entrever no curso. Nestes novos textos,
Saussure lembra que a linguagem discurso, ainda que para ele a unidade de
anlise v at o item lexical ou o sintagma.
Estudos lingusticos1. Explique com suas palavras por que a lngua enquanto prtica social tem oenunciado concreto como realidade fundamental.
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2. A partir do que foi tratado, complete a tabela com alguns traos diferencia-dores das concepes de lngua que foram discutidas nesta aula e que con-
duzem a diferentes abordagens.
Concepo da lnguacomo estrutura formal
Concepo da lnguacomo interao
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Considerando que no se pode separar o conhecimento morfolgicodo sinttico, pode-se abordar os termos da orao num mtodo prtico
de anlise que culmine com um quadro morfossinttico desses termos. A
natureza morfolgica de um sintagma (constituinte imediato das oraes)
determina sua funo sinttica. Se aprendermos a reconhecer e a decom-
por os sintagmas, a tarefa de observar as funes sintticas na orao fica
mais fcil. A proposta de abordagem da morfossintaxe a de analisar e
descrever a estrutura da lngua da maneira mais lgica e prtica possvel.
Os estudos gramaticaisPara o linguista ingls John Lyons (1981, p. 54) a lingustica descritiva,
no prescritiva. Dizendo isso ele afirma que ela uma cincia descritiva,
ou seja, no-normativa, por tentar descobrir e registrar as regras segundo
as quais se comportam os membros de uma comunidade lingustica.
Os linguistas atuais procuram distinguir regras descritivas e prescriti-
vas, enquanto que a gramtica tradicional tinha um carter predominan-
temente normativo. O gramtico acreditava que sua tarefa era formular
os padres de correo e impor aos falantes da lngua as normas para
o falar correto de uma variante lingustica, a do padro culto da lngua
portuguesa.
Perini (2006, p. 21) tambm se refere ao fato de que a lingustica se
ocupa de muitos aspectos da linguagem e de seu uso, mas um aspecto do
uso do qual ela no se ocupa a distino entre o certo e o errado na
lngua, pois no h a menor base lingustica para tal distino: o linguistase interessa pela lngua como ela , e no como deveria ser.
Nesse quadro, estamos nos referindo oposio entre dois tipos de
gramtica: a gramtica descritivae a gramtica prescritiva (ou normativa). A
primeira procura descrevercomo que as pessoas realmente falam e escre-
vem, e a segunda tenta estabelecer normas para os modos como as pessoas
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devem falar ou escrever. A oposio certo e errado avalia o uso da lngua de
acordo com as regras de um padro de uso que a gramtica normativa considera
correto geralmente, o uso de maior prestgio social.
Tomando por base os estudos de vrios autores, podemos sintetizar a oposi-
o entre a gramtica descritiva e prescritiva, apresentando algumas caracters-
ticas que as distinguem:
Gramtica descritiva Gramtica prescritiva
Descrio da estrutura da lngua emuso.
Atende s regras de funcionamentoda lngua enquanto sistema.
Enumera e classifica a estrutura doselementos constitutivos dos diferen-
tes nveis da lngua: fonolgico, mor-folgico, sinttico e semntico.
A partir de dados, registra como sefala/escreve realmente.
Levanta hipteses baseadas em fa-tos lingusticos que constituem da-dos de anlise.
As hipteses fundamentadas nos fa-tos precisam ser justificadas nas ocor-rncias das formas lingusticas.
Retrata e sistematiza os fatos da lngua
em uso. encontrada nos manuais didticos.
Critrio do bom uso consagrado porbons escritores.
Procura prescrever as normas, discri-minando padres lingusticos.
Ignora as caractersticas prprias dalngua oral.
Avalia e deprecia outras variedadesda lngua com base em fatores no--lingusticos.
Seus parmetros so os do purismoe da vernaculidade, classe social deprestgio etc.
Apoia-se na tradio lingustica.
encontrada nos manuais didticos.
Como voc pode observar, a abordagem descritiva apresenta caractersticas
bem claras em oposio abordagem normativa.
Uma distino essencial que se deve fazer ao estudar a gramtica de uma
lngua a que se estabelece entre diacroniae sincronia. Na sincronia lingustica
v-se a lngua em um recorte temporal, sincronizada em um contexto socio-his-
trico especfico. Na diacronia, a lngua vista atravs do tempo, ou seja, na suahistoricidade. Tanto a gramtica normativa como a descritiva podem utilizar-se
de estudos diacrnicos como sincrnicos. Dessa forma, podemos ter uma anli-
se lingustica de cunho normativo-sincrnico, normativo-diacrnico, descritivo-
sincrnico ou descritivo-diacrnico.
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Estudos descritivosPara Travaglia (1996, p. 27), a gramtica descritiva faz uma descrio da estru-
tura e funcionamento da lngua, de suaforma e funo. Neste caso, saber gram-
tica, segundo o autor, significa ser capaz de distinguir, nas expresses de uma
lngua, as categorias, as funes e as relaes que entram em sua construo,
descrevendo com elas sua estrutura interna e avaliando sua gramaticalidade.
Um linguista no deve fazer julgamentos de valor a respeito de seu objeto
de estudo. Para Travaglia (1996, p. 27), qualquer variedade da lngua deve ser
objeto de estudo, desde que seja usada (ou tenha sido) por uma comunidade
lingustica.
A elaborao de descries de uma lngua relevante em funo de dois
fatores:
a necessidade de subsidiar o desenvolvimento da teoria lingustica com
dados confiveis e sistematizados;
a necessidade de fornecer gramticas descritivas para usos pedaggicos.
Como afirma Perini (1989), o primeiro fator se refere ao desenvolvimento de
uma teoria lingustica que pressupe a existncia de gramticas descritivamen-
te adequadas, capazes de dar uma viso de conjunto de estrutura da lngua. O
segundo fator de relevncia do trabalho de descrio a necessidade de ela-
borar gramticas pedaggicas, que propiciem informao sobre a estrutura dalngua em funcionamento.
So duas abordagens da lngua que evidenciam dois tipos de gramtica, pois
em uma sala de aula do Ensino Fundamental ou Mdio, por exemplo, diferentes
graus de detalhamento e diferentes formas de abordagem se fazem necessrios
(os Parmetros Curriculares Nacionais de Lngua Portuguesa PCN recomen-
dam os gneros de texto como objeto de ensino, consequentemente, a aborda-
gem dos mecanismos lingusticos e discursivos se faz de uma forma contextua-
lizada, ou seja, relacionada ao uso). Segundo Perini (1998), o grande perigo emreduzir a gramtica a um ensino puramente normativo transform-la em uma
doutrina absolutista, dirigida exclusivamente correo de erros lingusticos.
A cada passo, o aluno que procura escrever encontra essa arma apontada contra sua cabea:no assim que se escreve (ou se fala), Isso no portugus e assim por diante. Da spode surgir aquele complexo de inferioridade lingustica to comum entre ns: ningumsabe portugus exceto, talvez, alguns poucos privilegiados, como os que se especializam empublicar livros com listas de centenas ou milhares de erros de portugus. (PERINI, 1989, p. 33)
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Refletir sobre esse fato importante para ns, professores em servio ou em
formao, uma vez que os PCN de Lngua Portuguesa do Ensino Fundamental,
tanto os de primeiro e segundo ciclos como os de terceiro e quarto (BRASIL,
1997, 1998), salientam que, sendo o objetivo principal do trabalho de anlise
e reflexo sobre a lngua o de imprimir maior qualidade ao uso da linguagem,
as situaes didticas devem centrar-se nas atividades epilingusticas (GERAL-
DI, 2003) que se referem reflexo sobre a lnguaem situaes de produo
e interpretao, ou seja, a lngua em funcionamento. A partir da que se d
a descrio lingustica, para depois introduzir progressivamente os elementos
para uma anlise de carter metalingustico, ou seja, por meio da categorizao
e sistematizao dos elementos lingusticos.
Podemos, assim, definir trs passos para o estudo da gramtica da lngua:
a reflexo sobre os fatos lingusticos;
a descrio desses fatos;
a anlise metalingustica, que inclui regras e definies.
Ou seja, mesmo na perspectiva de uma gramtica descritiva, a normatizao,
isto , o uso de normas, acaba acontecendo, porm em um processo posterior
reflexo e descrio da realidade da lngua que se est abordando.
As unidades lingusticas e os nveis de anliseEstudar uma lngua significa descrever fatos dessa lngua em todos os nveis
do sistema: o nvel fonolgico, morfolgico, sinttico e semntico. Nesta aula,
vamos nos ater aos nveis morfolgico e sinttico, pois o nosso objetivo o de
integrar esses dois nveis com a finalidade de enfocar a Morfossintaxe.
As unidades lingusticas so organizadas segundo graus de posio que
seguem princpios constitutivos de uma lngua. Assim, convencionou-se
chamar de hierarquia gramatical esses diferentes nveis de construo do sis-tema da lngua.
Para Flvia Carone (1986), o conjunto de relaes que se estabelecem entre as
partes de um todo constitui a sua estrutura. O todo, ou seja, o objeto (lingustico
ou no) s se configura graas a essa estrutura. Os elementos que constituem
uma estrutura so a substncia dessa estrutura, mas apenas se eles se inter-
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relacionarem adequadamente, de acordo com o padro estrutural previsto para
aquela espcie de conjunto.
Assim, e ainda de acordo com a autora, aquilo que d ao conjunto (o objeto)
um esqueleto, uma estrutura formada por um feixe de relaes, constitui a sua
forma. Uma construo no apenas substncia formal, ou seja, dotada de forma,
ela se torna uma estrutura da lngua.
Uma construo apresenta, portanto, uma estrutura formal constituda pelo
feixe de relaes entre seus elementos. Numa frase como:
O filme foi interessante.
A sequncia filme foi no uma construo, pois no h relao entre as
duas palavras, h apenas uma vizinhana contingente. Mas o filme constitui
uma construo, pois as duas palavras contraram entre si uma funo.
Sobre esse assunto, Perini (1998, p. 44) fala em constituintes: certos grupos
de unidades que fazem parte de sequncias maiores, mas que mostram certo
grau de coeso entre eles.
Por exemplo, na frase:
A bola de Joo preta e branca.
Sabemos, como falantes da lngua portuguesa, que a bola de Joo forma
uma unidade estrutural da lngua, o que no acontece, por exemplo, com a
sequncia Joo preta. Assim, podemos dizer que, nesse contexto, a bola
de Joo um constituinte e Joo preta, no. Um constituinte pode tambm
fazer parte de outro. No nosso exemplo, o constituinte preta e branca est contido
em preta e branca, que por sua vez faz parte de a bola de Joo preta e branca.
Essa noo de estruturao por constituintes de suma importncia, pois,
na perspectiva sinttica da lngua, os constituintes geralmente recebemuma funo. Na frase analisada, para exemplificar, o constituinte a bola
de Joo exerce a funo de sujeito enquanto preta e branca funciona
como predicado.
Vejamos, agora, como a hierarquia gramaticalopera na constituio do fe-
nmeno lingustico, comeando pela menor unidade significativa da lngua:
o morfema:
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os morfemas se combinam entre si para formar a unidade imediatamente
superior: o vocbulo (ou palavra);
os vocbulos combinam-se para formar o sintagma;
os sintagmas constituem as unidades superiores a frase (ou orao).
a(s) frase(s) constitui(em) o texto, unidade significativa e comunicativa da
lngua, por meio do qual o falante age pela linguagem verbal.
A sequncia a seguir pode demonstrar esses diferentes nveis de construo.
Morfema Vocabulrio Sintagma Frase Texto
(-o) (menino) (O menino) (O menino
chorou.)
(O menino
chorou!)
Na perspectiva de Silva e Koch (1986), os morfemas podem ser lexicais ou
gramaticais. Os morfemas lexicais constituem um inventrio aberto, pois cons-
tantemente novas palavras surgem com a funo de nomear a realidade per-
tencente ao mundo extralingustico, nomeando os objetos (representados pelos
substantivos), as qualidades (representadas pelos adjetivos) e as aes (repre-
sentadas pelos verbos).
Os morfemas gramaticais (tambm denominados gramemas) constituem
um inventrio fechado, porque remetem ao domnio da gramtica. Quando osgramemas compem a estrutura de um vocbulo, so chamados de gramemas
dependentes, pois no tm autonomia vocabular. Quando os morfemas grama-
ticais (gramemas) tm autonomia vocabular e sozinhos constituem uma palavra,
recebem o nome de gramemas independentes, o caso dos artigos, pronomes,
numerais, preposies, conjunes e dos advrbios pronominais.
Aqui se encontram asformas dependentesque, segundo Macambira (1982),
so formas que no podem aparecer sozinhas no discurso, especialmente numa
pergunta ou resposta. Veja, como exemplo, a impossibilidade de se recorrer preposio de como resposta a uma pergunta:
Voc foi ao cinema de carro?
De, respondeu Joo apressadamente.
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Mas, segundo Macambira (1982), os morfemas gramaticais tambm apare-
cem na lngua sob a forma de formas presas, ou seja, como afixos (prefixos e
sufixos), vogais temticas e desinncias (nominais: de gnero e nmero; verbais:
de modo, tempo, nmero e pessoa). No campo da Morfologia, so formas presas
os morfemas flexionais e derivacionais como, por exemplo:
Garotinhas: garot- (morfema lexical), -inh (morfema gramatical derivacio-nal); -a(morfema gramatical flexional, pois indica o gnero), -s(morfema grama-
tical flexional, pois indica o nmero).
Assim, na frase abaixo:
As cartas estavam rasuradas.
Temos trs formas livres (cartas, estavam, rasuradas) constitudas por mor-
femas lexicais nomeando substantivo, verbo e adjetivo, respectivamente:
cart- ; est-; rasur-;
Temos um gramema que uma forma dependente (morfema gramatical:
artigo as);
Temos oito gramemas que so formas presas (morfemas gramaticais
flexionais):
Em relao ao vocbulo cartas: - s(as); -s (cartas);
Em relao forma verbal: -a(vogal temtica do verbo estar); -va(desi-
nncia modo-temporal do verbo ); -m(desinncia nmero-pessoal do
verbo);
Em relao ao vocbulo rasuradas: - ad(morfema gramatical deriva-
cional; -a(morfema gramatical flexional de gnero); -s(morfema gra-
matical flexional de nmero).
Essa classificao dos morfemas (lexicais e gramaticais) contribui para aclassificao das palavras da lngua por meio de duas categoriais iniciais: le-
xemasegramemas. uma classificao mais eficiente que aquela tradicional
(palavras variveis so os substantivos, adjetivos, verbos, artigos, pronomes
e numerais) e palavras invariveis (advrbios, preposies, conjunes e
interjeies).
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Voc quer ver por qu? Separe as palavras da frase, a seguir, em duas categorias:
As alunas colocaram os livros preferidos sobre a mesa.
Grupo 1: palavras carregadas semanticamente em relao ao mundo ex-
tralingustico.
Grupo 2: categorias autnomas, ou seja, palavras de funcionalidade gra-
matical (gramemas independentes).
Grupo 1: lexemas alunas; colocaram; livros; preferidos; mesa
Grupo 2: gramemas as; os; sobre; a
Essas noes so importantes para que possamos compreender a noo de
morfossintaxe que implica o reconhecimento das categorias de palavras emportugus que pertencem aoarquivo aberto(substantivos, adjetivos e verbos), e
as demais que constituem um conjunto fechado, que no se altera ou cresce.
Por que morfossintaxeDependendo dos objetivos e dos mtodos de abordagem dos fatos da lngua,
as classes gramaticais e as funes sintticas podem ser estudadas separadamen-
te pela Morfologia e pela Sintaxe, respectivamente. Entretanto, uma abordagemmorfossintticados elementos da lngua tem sido frequentemente adotada pela
maioria dos professores, sobretudo, tendo em vista uma descrio e anlise dos
fatos da lngua para fins didticos.Assim, podemos definir a morfossintaxe como
o estudo integrado das regras que regem a estrutura interna das palavras e as
regras combinatrias das palavras e sintagmas nas oraes.
Nesta aula, vamos considerar a morfossintaxe como o estudo simultneo da
Sintaxe e da Morfologia sempre sem perder de vista seu contexto, ou seja, a
situao de produo do texto em que se encontram; considerando-se, portan-to, tambm aspectos semnticos e pragmticos. Para isso, vamos levar em conta
no s as funes sintticas exercidas por expresses nessas frases, mas tambm
as classes gramaticais e as oraes que exercem essas funes. Vamos conside-
rar, tambm, que um vocbulo pertence a uma ou outra classe, dependendo das
relaes estabelecidas dentro da frase em que est sendo enunciado.
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Como vimos anteriormente, quando vistas de maneira independente, a Mor-
fologia estuda o lxico e suas formas e a Sintaxe estuda as combinaes formais
ou funes sintticas.Segundo Bechara (2004), se fssemos nos guiar por esses
parmetros, a gramtica como um todo seria resumida Sintaxe, uma vez que
tudo na lngua se refere combinaes de formas (mesmo que forma zero),
mesmo dentro do mbito da Morfologia.
Por exemplo, para formar a palavra gatas preciso combinar/articular
formas: morfema lexical -gat + morfema gramatical flexional de gnero -a +
morfema gramatical flexional de numero -s.
Ou seja, no h Morfologia sem combinaes formais, assim como no h
uma Sintaxe independente das formas lingusticas.
Cereja e Magalhes (1999) tratam da articulao entre Morfologia e Sintaxe a
partir da ideia de seleoe combinao. Tradicionalmente, a Morfologia estudaas classes de palavras o campo da seleo e a Sintaxe, o campo da combina-
o. Entretanto, para esses autores, selecionare combinar so procedimentos
que ocorrem simultaneamente nas prticas de linguagem. Ao selecionar as uni-
dades lingusticas, ns, falantes da lngua, levamos em conta:
a forma dessas unidades (fonemas e morfemas que se articulam e for-
mam palavras);
a formadessas palavras: (artigo, substantivo, verbo etc.);
a funo: a articulao combinatria que as formas assumem na frase/
texto (sujeito, objeto direto, adjunto adnominal etc.)
o sentidodessas unidades lingusticas.
Note que nesse processo de produo verbal a seleo e a combinao
so aspectos indispensveis e, Morfologia, Sintaxe e Semntica (nveis de an-
lise lingustica, normalmente, tomados separadamente) se solidarizam. Veja o
exemplo:
Para completar estes versos famosos de Vinicius de Moraes,
Tristeza no tem fim, _______ sim...
Voc seleciona qual palavra: ( ) feliz ( ) felicidade ( ) felizmente
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Provavelmente voc selecionou felicidade, no porque voc conhece os
versos do poeta, mas porque voc, simultaneamente, utilizou-se do processo
verbal de seleo/combinao.
Veja que mesmo tendo o mesmo radical, essas palavras so de classes gra-
maticais diferentes, assim, foi preciso voc combinar o sentido de cada forma
ao contexto dos versos para selecionar a palavra mais adequada, aquela que, naarticulao com os outros componentes lingusticos, produzisse sentido dentro
da nossa realidade lingustica. As palavras constituem grupos morfolgicos, mas
ao se combinarem em frases/textos para produzirem sentidos, adquirem uma
funo sinttica.
De acordo com Cereja e Magalhes (1999), no se pode desvincular a Mor-
fologia e a Sintaxe, poisforma efunocoexistem e seus papis s se definem
na superfcie lingustica (tambm chamado cotexto), produzindo um todo de
sentido dentro de uma interao.
Os critrios formal e sintticopara a classificao morfolgica
Neste tpico veremos como os estudos morfossintticos influenciam na clas-
sificao morfolgica das palavras, a partir de um princpio bsico:
As palavras existentes da lngua distribuem-se em vrias classes confor-
me as formasque assumem, as funesque desempenham e o sentidoque
expressam.(MACAMBIRA, 1982). (grifos nossos).
Para isso, vamos refletir, primeiramente, sobre os conceitos: forma, funo
e sentido. As formas so percebidas pelos nossos rgos sensoriais pelo
ouvido, quando falamos, e pela viso, quando escrevemos. Por exemplo, a
palavra pato manifestada pela forma sonora /patu/ ou pela forma escrita
pato (PERINI, 2006), e classificada morfologicamente, na tradio gramatical,como substantivo. Por sua vez, funo o papel desempenhado por uma de-
terminada forma dentro de algum nvel da estrutura da lngua. Na frase pato
come milho, a forma pato, em uma perspectiva sinttica, assume a funo
de sujeito da orao.
J os sentidos nos so revelados pela relao que estabelecemos com o
mundo extralingustico. Sabemos, pelo nosso conhecimento de mundo, que o
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sentido de pato refere-se ao conceito de certo animal existente na nossa reali-
dade extralingustica, o qual associamos forma pato. Vejamos um exemplo:
Numa interao de um filho, no dia do seu aniversrio, com seu pai que acaba
de chegar, o filho diz:
Voc trouxe meu presente?
Podemos dizer que o garoto, em sua ao de linguagem, acionou forma,
funo e sentido para selecionaras palavras que iria usar em seu texto, combin-
lasde maneira gramaticalmente aceitvel, levando em considerao a funciona-
lidade delas dentro da frase e do contexto, a fim de produzir o sentidopretendi-
do com seu discurso.
Observe o esquema abaixo:
Voc trouxe meu presente?
Nvel morfolgico
(formas)
Nvel sinttico
(funes)
Pronomepessoal
Verbotransitivo direto
Pronomepossessivo
Substantivoconcreto
Sujeito Predicado verbal
Objeto direto
Veja que em uma perspectiva morfossinttica, as palavras so analisadas pela
classe gramatical a que pertencem e, ao mesmo tempo, pela funo que de-
sempenham na orao. Podemos dizer que forma, funo sinttica (combina-
o entre formas), funo semntica (combinao entre forma e significado) e
funo externa (combinao entre o sistema de formas e seu contexto) se unem
para construo dos sentidos do texto (NEVES, 2004).
Os conceitos de forma, funo e sentido fornecem elementos valiosos dentrode uma perspectiva morfossinttica, determinando critrios distintos para a
classificao das palavras.
Vejamos, por exemplo, os critrios utilizados para essas trs definies de
verbos. Observe que o critrio mrfico est relacionado ao conceito de forma,
o critrio sinttico, funo sinttica, e o critrio semntico, ao sentido.
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Verbo:
uma palavra que indica um processo situado no tempo, seja ao,
estado ou fenmeno. (critrio semntico)
uma palavra pela qual se realizam atribuies feitas ao sujeito da frase.
um constituinte indispensvel de qualquer ato de produo. (critrio
sinttico)
Palavras que apresentam desinncias tpicas para marcar pessoa, nmero,
tempo e modo. (critrio mrfico)
Os trs critrios so uma ferramenta para dissipar dvidas relacionadas s
diferentes classes de palavras que constituem o lxico de uma lngua.
Texto complementar
O objeto da Sintaxe(AZEREDO, 2001, p. 9-13)
As pessoas falam geralmente sua lngua nativa, nas situaes cotidianas,com a mesma naturalidade com que respiram, veem, andam; e assim como
no esto interessadas em saber como seu corpo funciona naquelas tarefas,
tambm no costumam se deter no exame dos movimentos que executam
para produzir os sons das palavras, nem tampouco na observao do que
acontece com as palavras quando elas se combinam nos enunciados. A lin-
guagem, porm, muito mais do que articular sons e combinar palavras;
alm de ter uma estrutura extraordinariamente complexa que envolve sons,
palavras e frases, seu uso nas mltiplas situaes reflete condicionamentos
psicolgicos, sociais e culturais. Por outro lado, o ato de dizer/escrever se d
em um contexto que inclui ouvinte/leitor, assunto, tempo, espao. Quem
diz/escreve normalmente o faz buscando a comunicao e s excepcional
ou maldosamente evitando-a. O ouvinte/leitor , por conseguinte, to de-
cisivo para o carter do discurso quanto quem o produz. Nem tudo o que
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o enunciado deixa ou faz entender se acha explcito nele; parte de seu sen-
tido j est no conhecimento do interlocutor (informao implcita/impli-
cada) ou constitui um dado prvio qualquer no conhecimento do locutor
(informao pressuposta).
[...]A cada instante pode-se estar pronunciando uma frase nova. Afinal, nin-
gum pode garantir que a frase que inicia este pargrafo e a que estou escre-
vendo agora no so inditas. Eu no as tinha memorizadas, muito menos o
leitor, e, apesar disso, no houve qualquer dificuldade para produzi-las e en-
tend-las. Ns no apreendemos o significado de cada uma das frases poss-
veis como se nada tivessem em comum uma com as outras. Todas elas, acei-
tas como estruturas da lngua pelos usurios, se criam graas a um sistema
de unidades sons, palavras, afixos, acentos e regras que as combinam.
A dupla articulao da linguagem
Quem pretendesse separar as unidades constitutivas de ns chegva-
mos tarde, na realidade oral da lngua, teria vrias escolhas: palavras (ns
chegvamos tarde), morfemas (ns-cheg-a-va-mos-tarde), slabas ou fone-
mas. Dentre as unidades agora conhecidas evidentemente sem maio rigor
as slabas e os fonemas so vazios de significao, e as demais providas de
significao.
Distinguir unidades significativas e unidades no-significativas implica
reconhecer dois planos de estruturao lingustica, que coexistem natu-
ralmente em todo enunciado. O linguista francs Andr Martinet chamou
dupla articulao a esta propriedade da linguagem humana (MAERTNET,
1964). Esses dois planos, o do contedo e o da expresso, so solidrios e
interdependentes no que diz respeito sua finalidade no discurso, embora
cada qual tenha uma organizao interna prpria.
[...]
Martinet chamou de primeira articulao ao plano do contedo (lxico-
-gramatical), que inclui proposies, palavras, razes, afixos, e de segunda ar-
ticulao ao plano da expresso, cujas unidades acentos, slabas, fonemas
so desprovidas de sentido.
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As unidades do plano do contedo: gramtica e lxico
A oposio tradicional entre gramtica e lxico fundamenta-se na exis-
tncia de duas espcies de unidades na primeira articulao ou plano do
contedo que passamos a examinar.
A frase abaixo talvez cause estranheza a um usurio do portugus:
1 Encarceravam-se os prisioneiros em bolachas.
A frase 2, no entanto, lhe parecer normal:
2 Encarceravam-se os prisioneiros em cavernas.
A sequncia 3 abaixo, indiscutivelmente inaceitvel, deve, porm, esta
propriedade a fatores distintos dos que causam a estranheza de 1.
3 Os encarceravam prisioneiros se cavernas em.
Parece, entretanto, no haver dvida de que, tendo de decidir entre 1 e 3,
qual das duas mais aceitvel, qualquer falante de portugus apontaria 1.
Agora vejamos 4:
4 Englaufavam-se os vancioneiros em chilgartas.
Esta frase evidentemente esquisita. Mas ser a razo de sua esquisitice a
mesma de 1 ou de 3? Certamente que no. Em 1 o problema a improprie-
dade lgica de bolachas; em 3, a ordem das unidades. Em 4, o que ser?Seja qual for a razo, pode-se garantir que 4 tem algo que a identifica com 1
e 2, mas falta a 3. Se, considerando 3 e 4, tivssemos que apontar a sequncia
dotada de um arranjo interno aceitvel, no hesitaramos em eleger 4.
Como em 2, podemos desmembrar 4 em sujeito (os vancioneiros), ncleo
do predicado (englaufavam) e Adjunto Adverbial (em chilgartas). Englaufa-
vam seguramente um verbo (englaufar), possivelmente derivado de um
nome (glaufo, glaufa ou glaufe) pelo processo de parassntese. Vancionei-
ros, que se acha no plural, possivelmente deriva de um substantivo (vano),cujo radical se modifica de um modo regular em portugus (cano/cancio-
neiro, nao/nacional, exibio/exibicionista). Podemos, ainda, admitir uma
variante, como em 5:
5 Os vancioneiros eram englaufados em chigartas.
Exatamente como em 6:
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6 os prisioneiros eram encarcerados em cavernas.
Se, de outro modo, as formas novas fossem as que 2 e 4 tm em comum
(em-avam-se-os-eiros-em-s), vejamos qual poderia ser o resultado:
7 Ascaceritar-ne chus prisionaumel ra cavernaf.
O resultado foi catico. No h um arranjo, uma estrutura reconhecvel
que permita relacionar os elementos da sequncia entre si ou com outras
unidades capazes de ocupar as mesmas posies.
Todos esses fatos mostram que uma lngua como o portugus rene duas
espcies de unidades mnimas no plano do contedo: unidades renovveis,
inventveis a qualquer momento, cuja substituio no interfere no arranjo
interno da frase; e unidades que garantem a existncia daquele arranjo. As
primeiras unidades, ditas semantemas ou morfemas lexicais, pertencem a um
conjunto aberto (lxico) e constituem a base dos substantivos, verbos e adjeti-
vos; as ltimas, ditas morfemas gramaticais, pertencem a um sistema fechado
(gramtica) e exprimem certas relaes entre as unidades lexicais no interior
da frase (como o em 6), acionam a criao de unidades lexicais a partir de
outras (como o eiro de prisioneiro em face de priso) expressam distines
obrigatrias que caracterizam os membros de certas classes (como o m de
encarceravam, ope graficamente esta forma ao singular encarcerava) etc.
Os papis desempenhados pelos morfemas gramaticais variam de lnguapara lngua. A diferena entre eles e os lexicais no depende a rigor do contedo
que exprimem, mas das condies estruturais em que se encontram. A noo
humano, salvo em oposies pronominais do tipo que/quem, algo/algum,
faz parte do contedo lexical dos nomes em portugus, uma vez que, em
vocbulos como homem, mulher, menino, prncipe, alfaiate, nenhum ndice
formal regular os enquadra na categoria humano, ao contrrio da categoria
singular, reconhecida pela ausncia regular de s, indicador formal da noo
plural (homem/homens, menino/meninos, alfaiate/alfaiates).
Lxico e gramtica: uma reviso
Este modo de opor lxico e gramtica tem, contudo, o inconveniente de
no reconhecer o carter lexical dos artigos, preposies, pronomes, con-
junes, que, segundo a tradio, so desprovidos de morfema lexical. Essas
unidades, porm, pertencem ao lxico tanto como os verbos, substantivos
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e adjetivos. Todas vm listadas no dicionrio, todas tm um significado que
compete ao dicionrio informar, cada uma precisa ser aprendida como uma
unidade lexical independente. No h regra para a aprendizagem do signifi-
cado de esse, assim, o, quando, desde, at, como no h regra para a apren-
dizagem do que significam fosfeno, adrede, hialino, prelibar. No entanto,
sabido que desde uma preposio, pode-se prever sua posio na frase;sabido que o um artigo, pode-se prever sua variao para concordar em
gnero e nmero com o substantivo; sabido que prelibar verbo, pode-se
garantir que, dado o contexto apropriado, teremos prelibamos, prelibem,
prelibasse etc.
Por outro lado, embora a mesma distino gramatical oponha chego a
cheguei e vou a fui, o conhecimento de chego conduz regularmente na
primeira e na segunda articulao forma cheguei, mas o conhecimento
de vou no conduz regulamente ao de fui, motivo por que estas duas formasfonolgicas tm de ser apreendidas independentemente uma da outra.
Temos neste ltimo fato uma questo terica delicada. Chego e cheguei
so realizaes concretas de uma diferena gramatical; lexicalmente, estamos
diante de uma mesma unidade, o verbo chegar. No caso das formas vou/fui
temos, por outro lado, uma profunda diferena fonolgica que, primeira
vista, desautoriza associ-las a uma mesma unidade lexical; porm evidente
que os falantes do portugus esto aptos a elaborar a proporo segundo a
qual vou est para fui, assim como chego est para cheguei, isto , valho-mede fui para atribuir a um sujeito eu o ato de ir situado no passado, exatamente
como me valho de cheguei para atribuir a um sujeito eu o ato de chegar situa-
do no passado. Fui e vou diferem, portanto, fonolgica e gramaticalmente,
mas no quanto ao lxico, onde representam o mesmo lexema /ir/.
Dicas de estudoPERINI, Mrio. Princpios de Lingustica Descritiva.Introduo ao pensa-mento gramatical.So Paulo: Parbola, 2006.
O livro se concentra nos aspectos sinttico-semnticos da linguagem, fazen-
do um recorte dos fundamentos necessrios para que o leitor possa fazer uma
ideia do que seja fazer lingustica.
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TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramtica e Interao: uma proposta para o en-
sino de gramtica no 1.oe 2.ograus. So Paulo: Cortez, 1996.
O livro trata da gramtica para fins didticos considerando a concepo de
linguagem como interao nas prticas sociais. Apresenta uma proposta de
ensino de gramtica a partir de diferentes gramticas: gramtica de uso, gra-
mtica reflexiva, gramtica terica e gramtica normativa.
Estudos lingusticos1. Analise as proposies a seguir como abordagens pertencentes gramtica
normativa ou descritiva, e descreva o motivo da sua anlise.
a) A frase: Me d dois suco e trs pastel contraria uma regra morfossint-
tica do portugus. O correto, sob o ponto de vista normativo, seria dizer:D-me dois sucos e trs pastis. Como tal construo no contradiz a
lei do sistema, dizemos que uma construo gramatical.
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b) * As talemas do panto mevem em fistos. Nessa construo h evidn-
cias de leis morfolgicas e sintticas do portugus que nos permitem,
no s localizar flexes tpicas de gnero (*As talem-a-s) e nmero (*A-s
talem-a-s), como tambm flexes verbais (*meve-m). Essa construo
contradiz as regras semnticas do sistema. Os elementos que a consti-
tuem no so lexemas do portugus, no se encontram dicionarizados.
Assim, uma construo agramatical (*).
2. Explique o que voc entendeu sobre a relao entre:
Morfologia + Sintaxe = Morfossintaxe
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O estudo da gramtica de uma lngua, pedagogicamente, costuma serfeito pela abrangncia de quatro aspectos, conforme as unidades lingus-
ticas que estiverem em estudo: fonemas; morfemas e palavras; sintagmas
e frases; unidades semnticas em geral. A cada um desses tipos de unida-
des lingusticas corresponde uma determinada rea de estudo: Fonologia,
Morfologia, Sintaxe e Semntica. Nesta aula, vamos refletir sobre a Sintaxe
da nossa lngua.
As leis sintticasA lngua, tomada como um cdigo composto de unidades, realiza-se
pela interao perfeita e harmoniosa entre todos esses aspectos. Todos os
falantes concretizam seus atos de fala, exercem sua competncia comuni-
cativa baseados nessas unidades. Contudo, nem todas as construes so
possveis na lngua, nem todas podem ser consideradas bem formadas.
So consideradas bem formadas as construes que no desobede-
cem gramtica da lngua, isto , que no desobedecem s suas leis que
sejam constitutivas dessa gramtica.
Veja o exemplo a seguir, encontrado em textos produzidos por alunos
do Ensino Fundamental:
(1) No mundo de hoje a violncia parece at que virou parte da rotina
que a cada dia h uma.
Nessa passagem
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