Trilogia Insana
Livro I
2 Ivanna Potter
Trilogia Insana
Livro I
Primeira Edição
Editora do Livre Pensador
Recife, Pernambuco
2012
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Titulo Original
Trilogia Insana
Livro I
Primeira Edição
Copyright @ 2012 by Ivanna Potter
Copyright da edição @ 2012
Editora do Livre Pensador
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Candeias
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Capa: Instituto do Livre Pensador
Ilustração de capa: Clodoaldo Turcato
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Dedicatória 06
Prefácio 07
Capítulo I 17
Capítulo II 32
Capítulo III 45
Capítulo IV 50
Capítulo V 59
Capítulo VI 70
Capítulo VII 81
Capítulo VIII 91
Capítulo IX 101
Capítulo X 110
Capítulo XI 123
Capítulo XII 136
Capítulo XIII 141
Capítulo XIV 146
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Capítulo XV 160
Capítulo XVI 167
Capítulo XVII 178
Capítulo XVIII 189
Capítulo XIX 207
Capítulo XX 216
Capítulo XXI 226
Capítulo XXII 232
Capítulo XXIII 240
Final 243
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Dedico este trabalho, e todos os
demais destra Trilogia, ao único
homem que acreditou em mim
quando eu estava no fundo do
poço vivendo entre prostitutas em
Boa Viagem.
Clodoaldo, amarei-te por todas as
vidas e desencontros que tivermos.
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Prefácio
Escrever uma história verdadeira sempre abre
brechas terríveis em qualquer pessoa. Relembrar o passado
com todas as suas mágoas não é para qualquer um.
Quando nascemos o mundo está pronto, com seus
comandos e basta se ajustar a ele sem perguntas. Já tem
sua religião, seus padrões, suas lendas, seus exemplos, sua
moral... tudo. Parece muito fácil, mas não é.
Existem duas maneiras de se viver: aceitar tudo
como está ou tentar diferente - eu quis ser diferente. Ser
diferente vai contra conceitos milenares, tendências que
sempre levam a pessoa a não raciocinar. Ser virgem, por
exemplo, é o certo. Eu me pergunto, por quê? Uma boa
mulher precisa ter filhos, um bom marido e uma religião.
Eu torno a perguntar, por quê? Uma mulher ou homem
devem ter relações somente com pessoas do mesmo
gênero. Inquiro mais uma vez por quê?
Iniciei estes questionamentos muito cedo, creio que
aos nove anos. Eu era uma dessas meninas pautadas por
toda sorte de conceitos morais tradicionais de uma família
católica. Pensava igual a todos, com o mesmo padrão.
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Certo dia, por puro acaso, minha avó (que morava
conosco) pediu-me que buscasse um casaco, estava
ventando muito naquele dia. Tentei no guarda-roupa dela,
porém a porta estava trancada me obrigando a procurar no
maleiro do quarto de mamãe, e neste vasculhar eis que
caiu diante de meus olhos uma caixa cheia de revistas de
papai. Eram cerca de trinta ou quarenta revistas de
variadas publicações. O barulho foi enorme a ponto de
despertar minha avó que aguardava na sacada.
_ Machucou-se, Ivanna – gritou de sua cadeira de
balanço.
_ Não, vó – respondi tremendo com o susto.
Iniciei a arrumação das revistas, afinal mamãe não
iria gostar de ver a caixa jogada no chão e mesmo que não
conseguisse erguê-la de volta, pelo menos a colocaria
sobre a cama.
E nisso dei com uma revista erótica. Sempre tinha
sido orientada que tudo em matéria de sexo era feio. O
Diabo era responsável pelas sacanagens todas e nada do
Diabo prestava. Ao ver qualquer coisa, tipo um pinto
(naquele tempo chamava de pinto ou tico) eu deveria me
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postar e rezar três Ave-Marias e um Pai-Nosso, sempre
após o sinal da cruz. Se um pensamento feio surgisse eu
tinha que repetir a penitência.
A revista tinha na capa duas meninas se beijando.
Uma loira que não deveria ter mais de 15 anos e outra um
pouco mais morena com a mesma idade. Tomei um susto
tão grande que caí sentada e automaticamente fiz o sinal
da cruz e fechei os olhos, orei para que aquela coisa feia
saísse da minha frente.
_ Ivanna, o casaco que estou com frio – tornou
minha vó da sua cadeira.
Abri os olhos e a revista continuava no mesmo
lugar. Tapei o rosto umas duas vezes sem sucesso.
Levantei com o coração batendo forte e peguei o
primeiro casaco que estava à mão e corri para a sacada.
Vovó percebeu meu desassossego e perguntou se eu estava
assustada e se tinha me machucado. Respondi que estava
bem, apenas o susto da caixa.
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Não tive coragem de voltar ao quarto, mas fiquei
imaginando de quem seria aquela revista tão feia, e como
era possível e nojento duas mulheres fazendo aquilo.
Dias depois fui chamar papai para o almoço, mas
não estava no quarto. De repente vi sobre a cama outra
revista aberta. Dei dois passos pra trás e fechei meus
olhos. No entanto não fiz sinal da cruz nem orei. Alguns
segundos depois abri os olhos, devagarinho, primeiro o
olho da direita, depois da esquerda e dei com os
quadrinhos. A revista era colorida somente na capa, os
desenhos internos eram em preto e branco. O título era A
Raspadinha e o Trava, de Carlos Zéfiro, um mestre do
erotismo do Brasil. Não sei por que comecei a folear, e
aquilo foi tomando conta de mim. Um misto de medo e
desejo, incompreensível naquela hora, me levou a ler.
“Depois de ter penetrado parei de fazer movimentos e
ficamos longo tempo abraçados, gozando aqueles
momentos divinos. Não tínhamos pressa.” O homem
agarrado na mulher nua e com o pau enorme penetrando
na buceta dizia “Neide, és maravilhosa! Como és
gotosa...” A mulher de rosto virado respondia “Gostoso, és
tu Luis, como sabes foder! Que pica infernal!” E logo a
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frente aparecia uma mulher de cabelos curtos com um pau
enorme e dizia “Isso é sacanagem, só gozei seis vezes.
Quero mais!” Era um triângulo amoroso, com um
homem, uma mulher e... Não consegui entender o que era
a terceira pessoa do quadrinho se homem ou mulher.
De repente meu pai gritou do banheiro:
_ Tem alguém no quarto?
Saí rapidinho, correndo pro meio da sala e avisei
que estava na hora do almoço. Ele ainda perguntou se eu
teria entrado no quarto, por certo se lembrou da revista.
_ Não pai – respondi e fiz o sinal da cruz pela
mentira.
Bom, depois daquele dia comecei a ter
questionamentos terríveis. Como poderia meu pai,
exemplo de moral, estar lendo aquilo. Se for feio, meu pai
passava a ser um homem feio. Cheguei a pensar que ele
estava possuído ou coisa assim. Decidi falar com mamãe.
“Era o melhor a fazer”, conclui.
E levei dois dias pra me decidir. Uma tardinha,
acho que era sábado, papai estava em casa e sempre que
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chegava almoçava se recolhia com mamãe no quarto.
Vovó me mandava ler o livro de catecismo ou me dava a
figurinha de algum santo.
_ Deixa seu pai descansar, viu! – me orientava.
Eu jamais violava o quarto de meus pais, eles
precisavam descansar. Só que naquele sábado eu estava
tão agoniada que nem lembrei da ordem expressa e entrei.
A porta não estava trancada e não rangia, logo abri sem ser
notada e dei com mamãe chupando o pau de papai,
enquanto ele sorria e acarinhava sua cabeça, numa alegria
consciente. Mamãe sorria e falava coisas como “aí que
gotoso; com está duro; que delicia”. A cena me assustou e
gritei, fazendo os dois voltarem-se para mim. Fiquei
alguns instantes presa, meu corpo não respondia, o mundo
todo tinha sumido de repente.
_ Ivanna, eu não disse pra não entrar – berrou
mamãe.
Os dois se cobriram e eu saí correndo chorando.
Mamãe foi atrás de mim zangada. Disse que iria
me bater por ter invadido o quarto, eu deveria saber que
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não podia. Vovó ouviu os gritos e me socorreu em tempo
de eu não levar uma surra. Mamãe seguiu gritando, até que
Vovó mandou que se calasse e me levou pra parte debaixo
da casa, desesperada.
_ Calma, Ivanna. Sua mãe logo fica bem – me
consolou.
Solucei por alguns minutos, então Vovó me pediu
o que eu tinha visto. Disse-lhe. Ela balançou a cabeça e
blasfemou qualquer coisa em italiano e acariciou minha
cabeça.
_ Ivanna, não se assuste. Tem coisas que os adultos
fazem que você ainda não entende – prosseguiu – um dia,
quando for grandinha vai entender.
_ Quando? – perguntei.
_ Quando ficar grandinha. Agora vamos pedir a
Nossa Senhora que limpe sua cabecinha – e começamos a
rezar.
Mas aquilo nunca mais saiu de minha cabeça. Era
coisa demais uma menina tão certinha. Eu tinha tantas
perguntas pra fazer e sem ninguém que me explicasse
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claramente o que estava acontecendo. Claro que não
consegui coragem pra pedir pra mamãe ou Vovó, então
iniciei minha pesquisa com outras pessoas. O mundo tão
enquadrado que me ensinaram começou a ruir e eu queria
as respostas. Se tudo era feio e ruim, por que mamãe
parecia estar tão feliz? Se fosse o Diabo, por que Deus
permitia que se fizesse aqueles quadrinhos? E mais, por
que papai tinha tantas revistas daquelas? E Vovó sabia de
tudo, tanto que me dissera que no futuro eu ia saber das
coisas de adultos.
_ Vovó, os mandamentos de Deus são somente pra
crianças? – perguntei pra Vovó certo dia.
_ Não, querida, é pra todos – me respondeu sem
muita atenção – Porque, meu amor?
_ Nada, Vovó, nada. Perguntei por perguntar.
Nunca mais a questionei nem a qualquer um de
minha família.
A partir de então tomei novos rumos E isso me
custou muito. Sempre tem alguém na família, na
vizinhança, na igreja, na puta que o pariu pra enquadrar a
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gente. E à medida que fui crescendo ficou pior, mais me
cercaram, tentaram me prender e voltar ao padrão
estabelecido. Nunca conseguiram. Eu lutei demais por
minha liberdade e algumas vezes de uma maneira odiosa.
Este livro vai tentar relatar esta experiência,
passagens muito legais e muito doloridas também; uma
forma de viver que adotei, com a dor e a delícia de ser o
que quis.
Eu não queria expor assim, afinal de contas eu era
perfeitamente responsável por tudo. No ano passado voltei
ao Brasil depois de dois anos na Espanha e reencontrei
meu primeiro amor. Ele estava reformulando sua editora,
me disse que acabara um livro, Histórias verdadeiras de
uma menina pequena, um relato sobre uma adolescente
que narrava sua existência dos doze aos vinte anos. Gostei
tanto do livro que me entusiasmei em escrever a minha
historinha. Ele achou muito legal e se propôs a lançar.
_ E eu sei algumas coisas de sua vida – disse-me
sorrateiro.
_ Sim, sem dúvida – respondi.