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RAQUEL SALCEDO GOMES A APLICAÇÃO DA PEDAGOGIA DE PROJETOS NO ESTÁGIO SUPERVISIONADO DE ENSINO DE LÍNGUA INGLESA DO CURSO DE LETRAS DA UNISINOS

A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

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Trabalho de Conclusão do Curso de Letras, habilitação Português/Inglês pela Universidade do Vale dos Sinos, 2008.

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Page 1: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

RAQUEL SALCEDO GOMES

A APLICAÇÃO DA PEDAGOGIA DE PROJETOS NO ESTÁGIO SUPERVISIONADO

DE ENSINO DE LÍNGUA INGLESA DO CURSO DE LETRAS DA UNISINOS

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS

CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

CURSO DE LETRAS PORTUGUÊS-INGLÊS

RAQUEL SALCEDO GOMES

A APLICAÇÃO DA PEDAGOGIA DE PROJETOS NO ESTÁGIO SUPERVISIONADO

DE ENSINO DE LÍNGUA INGLESA DO CURSO DE LETRAS DA UNISINOS

Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciado em Letras – Português-Inglês pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.

Orientadora: Prof. M.S. Melissa Santos Fortes

São Leopoldo

2008

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho, primeiramente, a meus pais e a seus novos companheiros,

que sempre me incentivaram a prosseguir nos estudos, vendo a educação e o saber como

única maneira de ascensão financeira e realização pessoal.

Dedico-o também a meu companheiro, Marcelo, pelo amor devotado a mim e pela

eterna cobrança para que eu concluísse meus estudos.

Dedico-o a todos os meus professores, mas, em especial, a Melissa Santos Fortes,

Marlene Teixeira, Juracy Saraiva, Maria Helena Veppo, Vera Haas e Élvio Funck, que me

serviram de exemplo e muito me influenciaram nas escolhas profissionais que tenho feito.

Dedico-o aos meus amigos, Patrícia Facchini Lampert, Carlos Roberto Ludwig,

Cláudia e Cláudio Kremer, que colorem minha vida com pinceladas de estímulo e muitas

risadas.

Por fim, dedico-o a todos que quiserem lê-lo e a todos aqueles que defendem a

educação e o conhecimento como um modo de libertação das pessoas contra todo o tipo de

opressão.

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EPÍGRAFE

“Achei que ia ser suspenso mas era só pra conversar

E me disseram que a escola era meu segundo lar

E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente

Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre!

Então eu vou passar de ano

Não tenho outra saída

Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida

Discutindo e ensinando os problemas atuais

E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais

Com matérias das quais eles não lembram mais nada

E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada...”

Trecho da canção Estudo Errado, de Gabriel O Pensador, 1996

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RESUMO

Este trabalho propõe-se a investigar o tipo de ensino e aprendizagem que se tem

buscado nos estágios supervisionados de língua inglesa do Curso de Letras da UNISINOS, a

partir da opção pela Pedagogia de Projetos.

Mediante entrevistas realizadas com três estagiárias e a análise de seus relatórios

da Prática de Ensino, busca-se refletir sobre a Pedagogia de Projetos e sua aplicação no ensino

de língua inglesa em escolas regulares, durante os estágios. Para fundamentar esta reflexão, a

Pedagogia de Projetos é apresentada, assim como uma discussão sobre a influência das

principais teorias de aprendizagem nessa abordagem de ensino.

PALAVRAS-CHAVE: Pedagogia de Projetos, Ensino, Aprendizagem, Língua

Inglesa, Estágio Supervisionado

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1 PEDAGOGIA DE PROJETOS

1.1 TRAJETÓRIA

1.2 PRETENSÕES DA PP

1.3 PRINCÍPIOS EM QUE A PP SE FUNDAMENTA

1.4 ESTRUTURA DE UM PROJETO

2 CONCEPÇÃO DE LÍNGUA, TEORIAS DE APRENDIZAGEM E SUAS

IMPLICAÇÕES PARA A PP

2.1 CONCEPÇÃO DE LÍNGUA

2.2 TEORIAS DE APRENDIZAGEM

3 METODOLOGIA

3.1 CONTEXTO DA PESQUISA

3.2 ANÁLISE

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANEXOS

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INTRODUÇÃO

Este trabalho de conclusão objetiva analisar três projetos escolares desenvolvidos

por estagiárias da disciplina de Prática de Ensino de Língua Inglesa no Ensino Fundamental e

Médio do Curso de Letras da UNISINOS, com o intuito de investigar que tipo de ensino de

língua inglesa tem sido desenvolvido nos estágios, a partir da opção pela Pedagogia de

Projetos. Pretende-se discutir de que modo a Pedagogia de Projetos se concretiza no ensino e

aprendizagem de língua inglesa nos estágios e a influência que a aplicação dos projetos teve

na vida profissional das estagiárias, após a graduação na universidade.

A escolha de investigar o uso da PP nos estágios de LI se deu por que:

Durante a disciplina de Prática, a supervisora estimulou os estagiários a trabalhar

com projetos de trabalho, mediante discussões sobre modos alternativos de ensinar inglês de

forma significativa para os alunos.

Os PCNs (Brasil, 1998) indicam os projetos de trabalho como uma maneira

concreta de trabalhar os conteúdos, de modo a não focar somente os conteúdos em si mesmos,

mas os problemas e questões do dia-a-dia dos estudantes.

De acordo com os PCNs (1998), a aprendizagem de uma LE deve acontecer de

modo significativo, contextualizado e com enfoque social porque, mediante o uso da língua,

ocorre socialização, as pessoas expõem seu posicionamento no mundo e reivindicam direitos

e deveres. Mediante os projetos, os alunos interagem entre si, com o professor e com o

mundo, podendo utilizar a LE em um contexto, em uma situação em que ela seja necessária

de alguma forma.

O trabalho com projetos no ensino de LE é uma novidade para muitos formandos

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ainda não familiarizados com essa abordagem. É um desafio trabalhar os conteúdos dentro de

um contexto, escolher um assunto sobre o qual aprender e utilizar a língua, de modo a criar

condições para que os alunos reflitam sobre o mundo, especialmente porque a maioria dos

professores não vivenciou a aprendizagem de línguas no contexto escolar dessa forma.

O ensino de língua inglesa nas escolas tem seguido moldes antigos, como a ênfase

na forma, na gramática ou na simples leitura instrumental. Porém, em uma escola regular, o

professor também tem o compromisso de ensinar cidadania, ética e pensamento crítico. Os

projetos emergem como uma proposta para que isso seja feito.

Esse trabalho pode ajudar os leitores docentes no sentido de fazê-los pensar sobre

a PP e estreitar seus laços com essa abordagem, estimulando-os a voltar a usá-la ou a

continuar a usá-la, e pode ainda ajudar acadêmicos que tenham interesse em trabalho com

projetos em LE em seus estágios, em seus TCC e também em sua vida profissional futura.

Pode ajudar o leitor a perceber a trajetória das teorias de aprendizagem e de que modo as

ideias sobre educação tiveram influência sobre a PP. Pode ainda fornecer dados práticos e

sugestões de projetos de trabalho e maneiras de aplicá-los e de refletir sobre eles.

A pesquisa divide-se em três capítulos: no capítulo 1, a PP é apresentada, sob a

ótica de quatro diferentes dimensões dessa abordagem: relata-se a trajetória cronológica da

PP, ou seja, sua história, quando surgiu e como foi adaptada e modificada ao longo do tempo;

discute-se suas pretensões, enquanto uma maneira de concretizar a aprendizagem que

ambiciona inovar e contrapor-se a ideias sobre aprendizagem mecanicistas e fragmentadoras;

são apresentados os princípios que caracterizam o trabalho com projetos, bem como a

estrutura de um projeto, com as etapas que o compõem.

No capítulo 2, reflete-se sobre a concepção de língua relacionada ao ensino por

projetos e são apresentadas as principais teorias de aprendizagem e sua relação com a PP é

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discutida, no sentido de analisar se a PP foi influenciada por tais teorias ou se busca

contrapor-se a elas. O terceiro e último capítulo contém a metodologia de pesquisa utilizada

neste trabalho e a análise dos dados obtidos, cotejados com as reflexões apresentadas nos

capítulos 1 e 2.

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1 PEDAGOGIA DE PROJETOS

Neste capítulo, pretende-se apresentar a Pedagogia de Projetos, doravante PP,

explicitando quatro dimensões dessa abordagem pedagógica: 1) sua trajetória, desde seu

surgimento até a atualidade; suas pretensões, isto é, o papel que ela anseia cumprir na

educação ou a lacuna que visa à preencher; 3) Seus princípios e suas características: de que

modo ela se configura no que concerne ao ensino, à aprendizagem e aos papéis dos

participantes desse processo; 4) as etapas que compõem a estrutura de um projeto em sua

aplicação na sala de aula.

Optamos por explicitar essas quatro dimensões para fins didáticos. Ao analisar cada

dimensão separadamente, podemos aprofundar o conhecimento sobre os aspectos relevantes,

o que deve colaborar com a análise dos projetos investigados.

Se conhecermos a trajetória desse fazer pedagógico, poderemos compreender melhor o

porquê a PP se estrutura da maneira como presentemente o faz; se explicitarmos suas

pretensões, ficará claro a que tipo de ensino a PP busca se contrapor e de que modo suas

pretensões são concretizáveis no ensino de língua inglesa; se conhecermos seus princípios e

características, poderemos analisar em que medida ela se apresenta como uma alternativa

promissora para um ensino de língua inglesa significativo, isto é, que não ensine a língua

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apenas como um sistema de regras, mas como um modo de fazer coisas e de se posicionar no

mundo; ao conhecermos a estrutura de um projeto, com suas principais etapas, poderemos

investigar modos coerentes de aplicá-los nas aulas de inglês.

1. Trajetória

O trabalho com projetos não é uma forma de ensino nova. De acordo com o pedagogo

espanhol Fernando Hernández (1998), a abordagem educacional por projetos existe há

bastante tempo; surgiu no começo do XX, com teóricos como John Dewey e William

Kilpatrick.

Segundo Hernández (1998), John Dewey, no decorrer de sua vida acadêmica como

filósofo da educação, mostrou-se insatisfeito com o ensino oferecido pela escola, que ia se

compartimentando a cada dia devido ao grande número de disciplinas, sobrecarregadas de

fragmentos desconexos e dados fora de contexto, estes últimos, transmitidos pelos professores

com base na repetição e na autoridade.

Dewey sugeriu, ao longo de sua e obra e, mais pontualmente, no livro “How we think”,

cuja primeira publicação data de 1910, que o desenvolvimento do pensamento se origina de

uma situação problemática, a qual se deve tentar resolver a partir de uma série de atos ou

etapas, articuladas com o objetivo de encontrar uma solução (Van Acker, In: Dewey, 1979).

Conforme Hernández (1998), William Kilpatrick, um discípulo de Dewey, decidiu

levar essa linha de pensamento sobre a aprendizagem para a sala de aula, com a publicação do

artigo “The project method”. A partir de então, o trabalho por projetos passou a ter

reconhecimento nos meios educacionais em diversos períodos daquele século, sendo

readaptado por outros estudiosos da educação.

Tanto que, já em 1934, afirma Hernández (1998), Martí, educador americano,

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registrou pelo menos dezessete diferentes interpretações do método de projetos. Portanto, o

trabalho por projetos segmentou-se em múltiplas denominações, abrigando divergências em

muitos níveis, algumas sutis, outras mais acentuadas.

Algumas dessas denominações são: centros de interesse (Decroly, 1943), estratégia de

projetos (Araújo, 2003), trabalho por temas, projetos de trabalho (Hernández, 1998), project

work1 (Fried-Booth, 1986) e projeto de pesquisa (Martins, 2001).

As principais diferenças entre essas variadas denominações estão no número de etapas

de desenvolvimento dos projetos e nos argumentos que cada autor utiliza para justificar o uso

de projetos em sala de aula.

Por exemplo, para Decroly (1943), a aprendizagem deveria ocorrer levando em conta a

intuição do estudante. O autor sustentava a ideia de que o conteúdo a ser estudado deveria

partir exclusivamente do aluno e de seus interesses. Argumentava que a intuição do aluno

seria o melhor guia na seleção e ordem dos conteúdos. Fried-Booth (1986) argumenta que o

assunto deve ser selecionado com base em uma análise do que os alunos necessitam para

cumprir com determinadas tarefas e solucionar certos problemas, não seguindo a intuição,

mas a necessidade.

Hernández (1998) relata que, também na década de trinta, o professor espanhol

Fernando Sáinz defendeu a ideia de fazer com que a escola se aproximasse da vida cotidiana

dos alunos, para que o aluno “não sinta a diferença entre a vida exterior e a vida escolar” (p.

81). De acordo com Sáinz (Sáinz, 1931 apud Hernández, 1998), a escola deve estar próxima

da vida real, os problemas da realidade devem ser trazidos para a escola e enfrentados na sala

de aula.

Assim, podemos listar as principais ideias que caracterizavam o ensino por projetos

1.... Trabalho com projeto

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quando este surgiu:

iniciar a aprendizagem por uma situação problemática;

aproximar a escola da vida real;

combater a excessiva fragmentação das disciplinas

estimular o aluno a pensar, orientando-o a descobrir respostas por si mesmo;

A primeira dessas ideias, iniciar a aprendizagem por uma situação problemática,

pretende estimular o engajamento dos alunos no assunto a ser estudado. Para que isso possa

ocorrer, é importante explicitar aos alunos por que e para quem a situação é problemática, ou

seja, é necessário problematizá-la. Tal situação poderá partir do professor, de um aluno, de um

grupo de alunos ou, até mesmo, de toda a turma, sendo conveniente analisar com toda a turma

até que ponto ou para quem ela se configura como um problema e por que se configura como

um problema para os estudantes.

Não basta que o professor afirme que a situação é problemática. Se os alunos

realmente a encararem dessa forma, tenderão a um maior comprometimento na busca por uma

solução. Por exemplo, o professor de inglês pode propor que os estudantes escrevam uma

carta de apresentação no idioma a um amigo estrangeiro em potencial, com informações

pessoais básicas, como sua idade, dados sobre sua família e preferências, como a comida e o

esporte favorito.

Nesse processo, os estudantes precisam se dar conta de que ter a habilidade de

escrever sobre si na língua estrangeira poderá lhes trazer benefícios para seu presente e seu

futuro e não ter essa habilidade poderá lhes fazer falta como cidadãos de um mundo que tem

fronteiras menos demarcadas a cada dia, se configurando, a falta de tal habilidade, como um

problema, o qual professor e alunos buscarão solucionar.

Portanto, a aprendizagem deve se iniciar por uma situação problemática e

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problematizada, na qual todos vejam um porquê de a estarem estudando. A aproximação da

escola com a vida real é uma característica que sempre deve estar presente no ensino, por dois

motivos interligados: para que o aluno veja um propósito no conteúdo que está estudando e,

assim, saiba utilizá-lo e reutilizá-lo com propriedade, transferindo-o para outras situações fora

da escola. Sempre ouvimos de muitas pessoas, ainda estudantes ou não mais, que alguns

conteúdos aprendidos são logo esquecidos, especialmente fórmulas e regras, porque, quando

ensinadas, não são contextualizadas, ou seja, aprende-se a fórmula e a regra, mas não

situações concretas em que poderiam ser utilizadas. Por isso, muitas vezes ouvimos que a

escola é uma perda de tempo, pois o conhecimento lá ensinado não perdura. Se o estudante

consegue perceber os diversos usos dos conhecimentos, ele poderá enxergar um propósito em

sua aprendizagem e saberá utilizar esses conhecimentos em sua vida na escola e além dela.

A questão do combate à fragmentação das disciplinas também se relaciona com as

noções de aplicação na vida real e de contextualização. Por exemplo, se um aluno brasileiro

terminou a escola, fez um curso técnico, se tornou mestre de obras e precisa construir uma

casa, ele terá de lidar com questões que envolvem várias disciplinas para a construção da

referida casa: precisará de conhecimentos de língua para ler e entender a planta do projeto, de

conhecimentos de matemática para calcular as medidas da casa e a quantidade de materiais

necessária à sua construção, terá de ter noções de física para lidar com questões de peso e

volume dos materiais, noções de química para encontrar o ponto certo do cimento, entre

outras coisas. Ou seja, os desafios com que as pessoas se deparam ao longo de suas vidas não

estão fragmentados e é para lidar com esse tipo de desafio que a escola deve preparar o

cidadão.

E é devido a essa preocupação com a vida dos cidadãos, que convém estimular os

estudantes a pensarem por si mesmos, a desenvolverem suas próprias estratégias para lidar

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com os problemas e a buscarem suas próprias soluções.

A aula de inglês se configura como um ambiente no qual as ideias acima discutidas

podem ser concretizadas, pois, pelo fato de a língua ser, ao mesmo tempo, objeto de estudo e

meio de se estudar outros assuntos, ela proporciona um espaço aberto, uma ponte para se

chegar a vários lugares. Por isso, o estudo da língua mediante o trabalho com projetos é viável

e pode ser muito produtivo.

Hernández (1998) menciona que o trabalho por projetos passou por períodos de maior

e menor evidência desde seu surgimento com Dewey. Durante o período da Segunda Guerra

Mundial, por exemplo, o autor afirma que essa abordagem2 foi deixada de lado, pois a guerra

fortaleceu o conceito de racionalidade tecnológica, em que há uma resposta exata para tudo, o

que desencorajou o uso de estratégias educativas que objetivavam estimular o aluno a pensar

e descobrir respostas por si mesmo.

Mas o autor lembra que, com o fim da guerra e a estabilização econômica, o

racionalismo tecnológico perdeu parte de sua força e diversos conflitos sociais surgidos nesse

período favoreceram a aceitação de ideias, muitas vezes divergentes, embora construtivistas,

de Piaget e Vygotsky3 sobre o desenvolvimento da inteligência, a aprendizagem de conceitos

e a cognição.

Assim, após a guerra, a discussão sobre quais seriam os conceitos mais adequados a

serem ensinados e como deveriam ser selecionados voltou a abranger o trabalho por temas.

2.... Richards e Rodgers (1986) distinguem três nomenclaturas diferentes para modos de ensino: abordagens, que abrigam inclinações teóricas sobre o processo educacional; metodologia, que abrange um conjunto de procedimentos variados mas teoricamente compatíveis sobre o ensinar e o aprender e método ou técnica, referente a um procedimento prático para a consolidação do processo educativo. Nos referimos à PP enquanto uma abordagem, porque ela abriga uma visão teórica específica sobre o ensino, a aprendizagem e a língua, que estabelece etapas mais ou menos fixas, mas não procedimentos de como estas devem ocorrer.

3.... De acordo com Moreira (1999), tanto Piaget, quanto Vygotsky sustentavam a ideia de que o conhecimento é construído pelo ser humano mediante a interação, por isso, são chamados construtivistas. Piaget, por um lado, afirma que a construção do conhecimento ocorre na interação do ser humano com o meio em que vive, ao passo que Vygotsky vê tal construção nas interações sociais com outras pessoas. As ideias destes teóricos e suas implicações para a PP serão discutidas mais enfaticamente no capítulo 2.

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Hernández (1998) ressalta que, na década de 1960, o teórico americano Bruner desempenhou

importante papel na discussão em torno do trabalho por temas e tal abordagem temática

levantou a bandeira da interdisciplinaridade. As ideias brunianas, entretanto, despertaram

inúmeros questionamentos por parte dos educadores daquela década. Hernández (1998)

lembra que Bruner foi questionado porque suas ideias não davam conta de explicar, por

exemplo, por que, às vezes, os alunos não aprendem ou não conseguem transferir conteúdos

estudados para outras situações.

O educador espanhol ressalta que, nos anos oitenta, o avanço da tecnologia e a

consolidação do construtivismo fizeram com que o trabalho com projetos voltasse a ser

destaque no campo da educação em todo o mundo.

De acordo com o brasileiro Nilbo Nogueira (2003), a tecnologia permite o amplo

acesso à informação e o aluno necessita aprender a selecionar, distribuir e armazenar toda a

quantidade de conteúdos a que tem acesso de modo a aperfeiçoar e validar sua aprendizagem.

Não basta que os dados cheguem ao estudante, ele precisa saber manejá-los a seu favor. O

autor brasileiro inclui, ainda, as mudanças na noção de inteligência desenvolvidas por

Gardner (1995) como aspectos influentes na visão sobre aprendizagem, exigindo o uso de

estratégias metacognitivas como forma de pensar e reelaborar as decisões e atitudes

consideradas importantes nesse processo.

Essa invasão da tecnologia na vida cotidiana e, por conseqüência, na vida escolar dos

cidadãos é benéfica ao trabalho por projetos. O uso de meios diversos, como o computador, a

internet, a televisão, gravações de voz, vídeos, jornais, revistas e outros, amplia o número de

ferramentas que estudantes e professores têm à disposição para a solução das questões

abordadas nos projetos. Um uso eficaz dessas ferramentas, no entanto, também requer

reflexão e investigação. É preciso aprender a dominá-las no que diz respeito a seu uso técnico,

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selecionar qual a mais adequada para cada atividade e aprender a usá-las da forma que melhor

se encaixe no propósito do projeto trabalhado.

Martins (2001) é outro brasileiro estudioso da PP e fala a respeito dos avanços das

ideias sobre educação no Brasil. Segundo ele, após séculos de predomínio do método

tradicional, em que o professor transmitia o conteúdo ao aluno, que deveria repeti-lo durante

as avaliações para provar que realmente o aprendeu, surgiu, na década de 1930, o movimento

“Ensino para todos”, contribuindo com experiências de movimentos como o da “Nova

Escola” e da “Escola Crítica”.

Conforme Medeiros (2006), o movimento da Nova Escola, cujo ícone foi o educador

Anísio Teixeira, defendia a universalização da escola pública como único elemento eficaz

para a construção de uma sociedade democrática, respeitando a individualidade dos sujeitos.

O autor afirma que a Escola Crítica, que se popularizou entre os educadores por meio dos

trabalhos de Paulo Freire, abraçava a ideia de que professores e alunos devem ser vistos como

intelectuais, pensantes e críticos e que a escola tem o papel de transformar a sociedade4.

Martins (2001) também destaca o impacto das ideias brunianas em nosso país. Em

1960, sob a influência das ideias de Bruner, fortaleceu-se, no campo da educação, a noção de

“ensino por descoberta”, segundo a qual os alunos deveriam aprender sozinhos, priorizando-

se a observação, a experimentação, a formulação de hipóteses e de generalizações em

detrimento dos conteúdos. Mas o autor brasileiro relembra que esse método foi refutado

porque os estudantes sentiam a necessidade de um acompanhamento mais substancial do

professor e de modelos mais coerentes e consistentes para elaborar seus trabalhos e

desenvolver seu conhecimento. Portanto, buscaram-se novas ideias, dentre as quais, a partir

de década de 1980, encontra-se o trabalho com projetos, que difere dos demais porque busca

4.... MEDEIROS, Joaquim. A história da educação: introdução. 2. ed. São Paulo: Ática, 2006. 300 p. (Primeiros passos, vol. 21)

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resolver a questão da presença e participação do professor nas tarefas e apresenta um modelo

de elaboração dos trabalhos que, embora flexível, tem estágios e procedimentos fixos, o que

ajuda os estudantes a concretizarem cada etapa da aprendizagem.

O autor explica como se deu a popularização do trabalho com projetos no país. Ele

afirma que, primeiramente, as inovações de Piaget e Vygotsky começaram a ser divulgadas no

Brasil, introduzindo conceitos de que a PP faz uso, como a ideia de conhecimento prévio e de

interação com o ambiente como forma de modificar a ele e a si mesmo. Educadores

brasileiros como Paulo Freire, com sua Pedagogia Crítica e Pedro Demo, com sua luta

constante pelo aperfeiçoamento da formação de professores, também contribuíram com ideias

inovadoras sobre a escola como espaço democrático para descobertas e reflexões.

Na última década, estudiosos como Fernando Hernández (1998) e Josette Jolibert

(Barbosa, 2004), na Europa, e Maria Carmen Barbosa (2004) e Nilbo Nogueira (2003), no

Brasil, têm enfatizado a aplicação do trabalho com projetos como alternativa ao melhor

desenvolvimento da aprendizagem escolar porque afirmam que a aplicação de projetos tem a

capacidade de transformar a escola em um espaço de democracia e liberdade, colaborando

para a formação do pensamento crítico e reflexivo dos estudantes, uma vez que divide a

responsabilidade sobre a aprendizagem entre professor e alunos.

Até aqui, apresentamos um pouco da trajetória da PP no Brasil e no mundo, suas

denominações e os nomes dos autores que argumentaram e argumentam em favor do uso

dessa abordagem. Discutimos as primeiras ideias sobre educação apresentadas pela PP e seu

potencial em aulas de língua inglesa. Nas próximas seções desse capítulo, as pretensões e

características da PP serão detalhadas, discutiremos mais a fundo sua aplicação no ensino de

inglês em escolas regulares e apresentaremos a estrutura de um projeto, com suas principais

etapas de desenvolvimento.

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1.2 Pretensões da PP

Hernández (1998) afirma que a abordagem educacional por projetos pretende ser

transgressora e mudar antigos paradigmas sobre o modo de aprender, armazenar e lidar com o

conhecimento. Desse modo, a PP tem a pretensão de se apresentar como uma alternativa aos

procedimentos tradicionais de aprender e ensinar e também à maneira de ver a educação e o

conhecimento.

Quando se refere a antigos paradigmas, o autor cita seis, dos quais discorda: 1)

educação como instrução, isto é, apenas como uma forma de armazenar conteúdos, que são

vistos como estáveis e universalmente aceitos; 2) o construtivismo aparente, sob a capa do

qual algumas escolas se escondem, acreditando que, só por usarem essa denominação, estão

justificadas e definidas, não precisando mais refletir sobre a educação; 3) a visão do currículo

focado em disciplinas; 4) a educação encarada somente como uma preparação para a vida

adulta, o depois, o que reduz os estudantes a seres humanos em potencial, não cidadãos já

atuantes em suas famílias, bairros, escolas e comunidades; 5) a substituição do conhecimento

e experiência dos docentes por discursos cientificistas que pouco sabem sobre o cotidiano da

sala de aula e; 6) a incapacidade da escola de se repensar de forma contínua e de levar em

conta as mudanças e acontecimentos da sociedade.

Garcez (2006), em artigo publicado para a revista científica Calidoscópio, fala da

estrutura seqüencial básica usada em sala de aula pelo professor para avaliar o conhecimento

do aluno, a, também mencionada pelos PCNs, IRA (Iniciação, Resposta e Avaliação), em que

o professor pergunta algo que já sabe, esperando do aluno uma resposta que já predeterminou

e avalia essa resposta como negativa ou positiva conforme a concordância com suas

expectativas. Para Garcez (2006) a estrutura IRA é muito eficaz para a reprodução do

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conhecimento, mas não para o estímulo à reflexão e ao pensamento crítico.

Com base na leitura de Hernández (1998), pode-se perceber que a aprendizagem

tradicional discutida por Garcez (2006) como a transmissão do conhecimento do professor

para o aluno, que a reproduz, não é aceita pela PP. Mais do que preparar o aluno para um

futuro no mundo do trabalho ou no mundo adulto como um todo, a PP pretende auxiliar o

estudante a visualizar-se como um sujeito pertencente a uma cultura, sociedade e ambiente

“hoje”, no período em que está na escola, estimulando-o a pensar sobre os fenômenos e os

fatos que o rodeia.

Tanto Hernández (1998), quanto Nogueira (2003), Martins (2001) e Barbosa

(2004) citam em seus trabalhos que a PP leva em consideração a pluralidade e multiplicidade

de etnias, culturas, pontos de vista e verdades que operam na atualidade. A PP busca iniciar a

aprendizagem por uma situação problemática concreta, aproximando a escola e a vida real do

aluno, conjugando, para isso, as diversas disciplinas e estimulando os estudantes a pensarem

por si próprios.

Todas essas considerações se encaixam nas prerrogativas para a educação

expostas nos PCNs (1998), que indicam, por exemplo, que o aluno deve ser capaz de

posicionar-se de maneira crítica nas diferentes situações sociais, de perceber-se como ser

integrante e transformador do ambiente e de desenvolver confiança em suas próprias

habilidades para exercer a cidadania.

Rampton (2006) afirma que, naquilo que ele chama de modernidade tardia ou

contemporaneidade, o mundo modificou-se em dois níveis: no mundo real, com o fenômeno

da globalização, que alterou, de modo direto, a economia e as comunicações e, indiretamente,

todas as demais áreas da vida humana e; no mundo das ciências humanas e sociais, com o

movimento filosófico chamado pós-estruturalismo, cuja concepção é a de que não existe uma

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verdade absoluta, mas que essa deve ser investigada e justificada.

Assim, o sujeito de hoje tem de aprender a conviver, tanto na vida real quanto

escolar e acadêmica, com múltiplas visões paralelas à sua, com uma postura de tolerância e

aceitação que permita a coexistência banindo o radicalismo, sem repelir o diálogo e a

divergência. Barbosa (2004) afirma que “para compreender o mundo é preciso, cada vez mais,

fazer a interconexão dos diversos elementos refutando as simplificações, pois a verdade é

provisória” (P. 08).

As novas ferramentas tecnológicas e de comunicação permitem que os seres

humanos de um determinado lugar tenham acesso a grupos diferentes do seu, com divergentes

noções sobre o que é correto, o que é aceitável, o que é verdadeiro.

Com o volume de informações disponibilizado pela internet e a televisão, por

exemplo, já não é mais possível uniformizar o currículo, definindo conteúdos que devem ser

aprendidos por todos, no mesmo ritmo e seqüência. Gardner (1995) enfatiza que é impossível

pensarmos em uma escola enciclopédica com todo o conhecimento acumulado na atualidade.

O local influencia o global e vice-versa, fazendo com que os conteúdos mais adequados e

pertinentes aos vários grupos sejam divergentes. O que se pode fazer para tornar a

aprendizagem significativa é selecionar, dentre as várias possibilidades expostas, qual tema

deve ser aprofundado, com base em sua relevância para a vida dos participantes do processo

educativo.

Hernández (1998) argumenta que, na verdade, o processo de aprendizagem

tornou-se mais complexo, visto que alunos e docentes têm de lidar com cada vez mais

numerosos fatores durante a aprendizagem. Devido a essa complexidade que paira sobre o

mundo contemporâneo, ao professor não cabe mais o papel de detector do saber, pois, por

mais que queira, não consegue acompanhar com a rapidez adequada a evolução e o

Page 22: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

desenvolvimento de todo o conhecimento de sua área de atuação.

Muito menos conseguiria o professor transmitir todo esse volume de

conhecimento a seus alunos, que, por sua vez, também não o assimilariam de forma completa,

uniforme e idêntica, pois, são sujeitos diferentes, dotados de um conhecimento prévio diverso,

construído a partir de experiências anteriores únicas.

Portanto, na PP, cabe ao professor o triplo papel de coordenador, facilitador e

aprendiz, uma vez que ele não impera mais sobre todo o processo, embora o oriente, e não

detém mais todo o saber, o que lhe permite aprender junto a seus alunos. O papel do estudante

também sofre profundas modificações, ele ganha autonomia, o que implica maior

responsabilidade sobre seu próprio aprendizado5. Martins (2001) afirma:

“Por reconhecerem que eles mesmos devem descobrir e buscar as respostas para o problema ou para os fatos a estudar, os alunos sentem-se completamente satisfeitos com o que fazem – e o fazem de maneira surpreendente.” (p. 84)

O trabalho com projetos oferece uma alternativa para adequar a escola e a

educação aos fenômenos que, nos últimos anos, tornaram a vida dos sujeitos multifacetada.

Isso não significa dizer que o trabalho com projetos terminaria com todos os problemas da

escola, e todos os autores lidos deixam esse fato bem claro, porque, seguindo a própria linha

de pensamento da PP, o conhecimento se expande, a realidade muda e novos caminhos

precisam ser trilhados.

Essa abordagem pretende levantar questionamentos e levar os envolvidos no

processo educativo a refletir sobre outros modos de ensinar e aprender, transformando o

questionamento e a reflexão em constantes, que devem se fazer presentes nas escolas hoje e

sempre, para que a escola possa ser um prolongamento da vida e acompanhar as ininterruptas

5.... A discussão sobre os papéis do professor e do estudante na PP será aprofundada mais adiante.

Page 23: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

transformações que ocorrem no mundo.

Segundo Hernández (1998), a PP pode ser entendida como uma etapa em um

processo contínuo de mudança na educação, que nunca deve se esgotar ou ser “solucionado”,

visto que outras mudanças ocorrerão, outras necessidades devem se instalar e a escola deve

ser o lugar para enfrentá-las.

Anunciamos até aqui o que a PP pretende e o que não pretende, com destaque para

o combate a paradigmas tradicionais de transmissão e reprodução de conhecimentos e a

disposição dessa abordagem para ajudar os sujeitos a viverem com qualidade em um mundo

plural e constantemente modificado. A seguir, apresentaremos e discutiremos as

características dessa abordagem, os princípios em que se baseia e as etapas que compõem um

projeto.

1.3 Princípios em que a PP se fundamenta

Na seção anterior, dialogamos com as pretensões da PP. Nessa seção,

apresentaremos os princípios que caracterizam o trabalho com projetos a fim de que as

pretensões previamente discutidas possam se concretizar, com uma análise também de sua

aplicação nas aulas de língua inglesa.

A partir do cotejo das ideias dos estudiosos da PP, a saber, Barbosa (2004),

Hernández (1998), Martins (2001), Nogueira (2003), Dewey (1979), Kilpatrick (1978), pode-

se estabelecer uma lista dos princípios que permeiam o trabalho com projetos:

curiosidade e motivação;

aproximação da escola com a vida cotidiana;

tratamento de temas-problemas;

desenvolvimento de novos conhecimentos a partir de conhecimentos prévios;

Page 24: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

interdisciplinaridade;

convergência entre teoria e prática;

interação aluno-aluno e aluno-professor;

flexibilidade de tempo;

planejamento;

questionamento das representações únicas da realidade.

Esses princípios remetem a uma concepção de ensino-aprendizagem centrada na

interação entre os participantes da ação educativa, não somente alunos e professores, mas toda

a comunidade escolar e a sociedade, na flexibilidade e na construção do conhecimento como

um processo social, a partir de temas presentes na vida cotidiana desses agentes.

Tal concepção é importante para o presente trabalho, porque se sobrepõe à visão

sobre a língua e seu uso, que também encaramos como um processo social e de interação

entre agentes6. Mais ainda, sobrepõe-se à aprendizagem de língua inglesa que, como língua

estrangeira, oferece àquele que a aprende a oportunidade de conhecer hábitos e costumes

diferentes, construindo uma ponte entre si mesmo e o outro e criando um campo para

comparações e confrontamentos de pontos de vista.

A seguir, cada um desses princípios e suas implicações para a aprendizagem serão

discutidos.

1.3.1 Curiosidade e motivação

De acordo com Martins (2001), Vasconcellos (2000) e Barbosa (2004), o assunto

abordado em um projeto deve ser do interesse dos alunos. Esse interesse pode partir

naturalmente deles ou ser estimulado pelo professor, ao demonstrar-se, ele próprio,

6.... Discutiremos a concepção de língua e seu uso no Capítulo 2.

Page 25: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

interessado pelo tema ou ao trazer para a turma um objeto, uma pergunta, uma dúvida que

desperte nos alunos a vontade de descobrir mais. Não importa de quem seja a proposição do

tema, uma vez que o estudante se sinta curioso em relação ao assunto estudado, o docente

estará criando condições para que o aluno se motive na busca por mais informações, para

descobrir mais detalhes que enriquecerão seu aprendizado e que poderão levar a outras

indagações e pesquisas futuras.

Isso não significa afirmar que o trabalho por projetos só poderá ser aplicado em

escolas cujo currículo se organiza por temas, mas essa questão levanta muitas outras, como,

por exemplo, a diferença entre interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, que serão

aprofundadas no item 1.3.5, deste capítulo. A curiosidade levará a um aprendizado autônomo

e significativo. Sobre isso, Vasconcellos (2000) afirma: “o grande ganho aqui, em termos de

aprendizagem, está justamente no fato do projeto nascer da participação ativa dos alunos, o

que implicará em alto grau de mobilização, aumentando em muito a probabilidade de uma

aprendizagem significativa”.

A língua inglesa está presente na vida cotidiana do aluno nos mais variados lugares.

Em casa, palavras no idioma estão em programas de TV, na internet, em filmes e revistas. No

supermercado, nas marcas de diversos produtos e até mesmo na rua, quando vai ao

“shopping” ou vê “motoboys”, anúncios de comidas “delivery” e postos de gasolina “self-

service”. Não há para onde fugir, o inglês faz parte do cotidiano e pode ajudar o aluno a

pensar sobre vários outros assuntos, como o mundo do entretenimento e do consumo.

Estando curiosos e interessados, os alunos tenderão a se comprometer mais com o

tema estudado na aula, participando das atividades com maior intimidade. Problemas podem

surgir, como o desinteresse e o conseqüente não-engajamento, apesar de todas as tentativas de

aproximar os estudantes do assunto. Por isso, o assunto abordado deve ser amplamente

Page 26: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

discutido pelos estudantes e o professor e este deve criar oportunidades para que seus alunos

expressem suas opiniões e colaborem na problematização do tema, trazendo, até mesmo,

opiniões contrárias ao estudo do tema e argumentos que se opõem a seu tratamento, para que

a sala de aula seja realmente um espaço democrático, em que os alunos tenham liberdade para

se expor e aprender. O professor deve estar preparado para não conquistar sempre a aceitação

e o engajamento esperado, pois a cada tema diferente tratado, os alunos tendem a reagir

também de maneira diversa

1.3.2 Aproximação da escola com a vida cotidiana

O trabalho com projetos procura aproximar a escola e a vida real do aluno, uma vez

que os temas estudados nos projetos de pesquisa devem, de algum modo, fazer parte do

universo do aluno fora da escola. Segundo Martins (2001), “sempre é bom iniciar com temas

ou problemas da natureza, da família, da comunidade, por serem mais fáceis ou porque os

alunos convivem mais diretamente com eles.” (p. 94)

Essa ponte com a vida cotidiana é importante, não só para a curiosidade e motivação

anteriormente mencionadas, mas também para estimular os alunos a questionarem sua própria

realidade e os fatos com que se deparam no dia-a-dia. Já que a PP se insere em uma

concepção de aprendizagem que tem na interação seu marco principal, os estudantes estarão

interagindo uns com os outros, colocando essa interação no centro da aprendizagem para

pensar o que é bom, o que querem mudar e de que modo em suas vidas e na realidade ao seu

redor. Assuntos como a higiene, a administração dos recursos financeiros da família e o

gerenciamento do tempo, são exemplos de temas de projetos que se ligam ao cotidiano do

aluno. O estudante deve perceber que a escola pode ajudá-lo a lidar com as dificuldades que

enfrenta em seu dia-a-dia, conforme propõem os PCNs (Brasil, 1998) com os Temas

Page 27: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Transversais que são, a saber, Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Pluralidade

Cultural, Trabalho e Consumo.

Ao mesmo tempo, tal aproximação permite que o aluno compreenda melhor o que

estuda e veja mais sentido nos assuntos abordados e o professor estará fazendo sua parte na

criação das condições necessárias para que o aluno transfira o que aprendeu para outros

momentos e situações. Não se pode garantir, no entanto, que o aluno realmente saberá aplicar

conhecimentos estudados em sala de aula para outros momentos, pois, uma vez que a

aprendizagem acontece na interação entre as ações do professor e do aluno, parte do trabalho

cabe a este último e o professor não pode fazê-la por ele.

1.3.3 Tratamento de temas-problemas

Conforme Van Acker (In: Dewey, 1979), Dewey já falava que o ser humano evolui

quando tem situações adversas à sua frente que precisa resolver. Tratar de problemas implica

delimitá-los, refletir sobre eles para buscar soluções, analisá-las e implementar a mais

adequada. O processo de resolução de um problema é complexo, formado por várias fases que

exigem habilidades e ações específicas e que refletem na etapa seguinte e no resultado final.

Barbosa (2004) afirma que “os projetos têm como base saber partir, na prática escolar,

de uma situação problema e global dos fenômenos, da realidade do grupo e não da

interpretação teórica já sistematizada através de disciplinas” (p. 10). Mediante a busca pela

solução de um assunto-problema, os estudantes têm de pôr em prática certas ações de

pesquisa que os ajudam a desenvolver habilidades técnicas para encontrar respostas e

soluções. Por exemplo, nas aulas de inglês de uma quinta série, professor e alunos poderiam

trabalhar com um projeto sobre reciclagem de lixo na escola, culminando com a adesivagem

das lixeiras das salas de aula em inglês, separadas por lixo orgânico e lixo seco. Alunos e

Page 28: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

professor teriam de pesquisar sobre o tema, fazer orçamentos, descobrir as palavras em inglês,

contar o número de lixeiras na escola, conseguir autorização e apoio da direção, enfim,

executar uma série de ações até chegar ao resultado final, as lixeiras com seus adesivos.

O processo de solução de um problema é organizado, tem início, meio e fim. Uma vez

que o aluno chega a um resultado final, ele fica mais satisfeito, pois consegue olhar para trás,

ver o caminho que seguiu e medir até onde conseguiu ir. É uma forma de aprendizado

consciente, em que se sabe que resultado foi alcançado e de que modo foi obtido.

1.3.4 Desenvolvimento de novos conhecimentos a partir de conhecimentos prévios

Aquilo que o aluno já sabe deverá ser levado em conta no trabalho com projetos. Ao

professor, é recomendado fazer uso dos conhecimentos prévios tanto na hora de iniciar um

projeto e selecionar o assunto com a ajuda dos alunos, quanto durante as etapas de

desenvolvimento da pesquisa. Martins (2001) define o diagnóstico do que os alunos já sabem

sobre o assunto como uma condição indispensável para o desenvolvimento de um projeto

dentro dos moldes do método científico, pois, ao saber o que eles sabem, o professor pode

traçar o rascunho do caminho que será seguido na busca por mais informações. De acordo

com o autor, o conhecimento humano começa a ser adquirido desde o nascimento e vai se

acumulando ao longo da vida. Novos conhecimentos não excluem os antigos, mas

sobrepõem-se a eles, aproveitando-os.

Por isso, o professor examinará aquilo que o aluno sabe para que esse possa

efetivamente evoluir e perceber sua evolução, ao comparar conhecimentos antigos e novos e

se sentir valorizado, enquanto ser que está no mundo e que conhece a seu respeito. Sobre o

cotejo dos conhecimentos prévios com aqueles adquiridos ao final de um projeto, Martins

(2001) defende que servirá para sensibilizar os alunos sobre a necessidade de estar em

Page 29: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

constante aprendizagem, pois, por mais que se saiba, sempre haverá mais para aprender. No

ensino de língua estrangeira, o professor pode fazer essa análise em dois níveis: 1) aquilo que

o aluno sabe sobre a língua e 2) aquilo que sabe sobre o tema do projeto. Procedendo desse

modo, o professor pode equilibrar os dois aspectos na hora de trabalhar com um projeto e

mesclá-los a fim de chegar a um resultado final significativo aos alunos, no qual eles possam

ver seu desenvolvimento.

1.3.5 Interdisciplinaridade

Lembramos que, na primeira seção deste capítulo, o combate à fragmentação dos

conteúdos em disciplinas apareceu como uma das primeiras ideias componentes da PP.

Hernández (1998) aponta porque a fragmentação do currículo é prejudicial ao

desenvolvimento do estudante:

“a organização da Escola Média baseia seu currículo mais nas disciplinas acadêmicas e na transmissão de conteúdos do que na formação da subjetividade dos estudantes, em facilitar-lhes estratégias para procurar, dialogar e interpretar informações que lhes permita construir pontes entre diversos fenômenos e problemas, de maneira que desenvolvam uma atitude de pesquisa que lhes leve a aprender ao longo de suas vidas” (p. 43).

Nessa passagem, Hernández afirma que o problema é que a escola se preocupa demais

com a transmissão dos conteúdos de cada disciplina, enquanto os estudantes, deveriam, estes

sim, ser a preocupação central da escola. O autor não refuta a existência das disciplinas ou a

partição dos conteúdos. Ao contrário, defende que essa fragmentação é parte da história e

mostra como se estruturou o pensamento humano durante longo tempo, como se acreditava

que o conhecimento era aprendido e como as concepções sobre aprendizagem foram

oscilando no decorrer da história. Porém, muitas vezes, não se consegue resolver um

problema utilizando-se uma única disciplina. Existem disciplinas demais e muito

conhecimento foi acumulado pela humanidade ao longo dos séculos.

Page 30: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

É, cada vez mais, impossível, para qualquer ser humano, dominar todo o

conhecimento que a humanidade armazenou. A era da informática ainda ampliou,

agressivamente, o acesso a todos os tipos de informações, o que remete novamente a Rampton

(2006) e ao pós-estruturalismo com sua busca pela verdade comprovada. Desse modo,

Hernández (1998) aponta que o conceito de saber teve de mudar. O mais sábio não é mais

aquele que detém todo o conhecimento, uma vez que isso não é possível, e sim aquele que

sabe selecionar o conhecimento que lhe é importante e aplicá-lo para a solução de seus

problemas.

Por esse motivo, a interdisciplinaridade, que conforme afirma Nogueira (2003) “é o

trabalho de integração das diferentes áreas do conhecimento, um real trabalho de cooperação

e troca, aberto ao diálogo e ao planejamento” (p.115), surge como uma alternativa para

utilizar os conhecimentos adquiridos de maneira eficaz, isto é, congregar conhecimentos de

várias disciplinas para resolver uma questão problemática e, assim, ampliar o conhecimento

do aluno de modo contextualizado. Hernández (1998) defende que os alunos precisam

“aprender a aprender” para saber selecionar o que é relevante e como aplicá-lo, não somente

na escola, mas por toda a vida.

Porém, a discussão sobre a junção ou fragmentação das disciplinas não pára por aí.

Para Hernández (1998), a transdisciplinaridade, definida por Nogueira (2003) como a

proposição de “um sistema sem fronteiras, em que a integração chegou a um nível tão alto

que é impossível distinguir onde começa e onde termina uma disciplina” (p. 118), seria a

melhor opção para a integração do currículo, porque removeria as fronteiras entre as

disciplinas. Nogueira (2003), por sua vez, baseia-se no trabalho de Fazenda (1995) para

afirmar que a transdisciplinaridade é uma utopia, pois o fim das fronteiras entre as disciplinas

também culminaria no fim do diálogo entre elas, pré-requisito básico para o uso convergente

Page 31: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

de suas diferentes características com vistas à solução de um ou mais problemas.

Nogueira (2003) e Martins (2001) não são tão radicais quanto Hernández (1998) na

proposição de um novo currículo. Contanto que o trabalho interdisciplinar seja aberto,

coerente e realmente ativo, isto é, que os docentes das diversas disciplinas verdadeiramente

interajam e troquem conhecimentos, não apenas no discurso, mas na ação, ele pode funcionar

perfeitamente para a globalização dos conhecimentos dentro do currículo atual. Mas, todos os

autores defendem o trabalho por projetos, isto é, por temas. O trabalho por temas é

interdisciplinar por natureza, pois convoca as várias disciplinas como a única forma de

resolver um problema ou aprofundar-se no tema. As aulas de língua estrangeira, por sua vez,

também compartilham dessa interdisciplinaridade natural, pois, como já foi mencionado

anteriormente, a língua é utilizada para “fazer coisas”, que são outras além da própria língua.

Por exemplo, ao escrever um manual de instruções sobre a instalação de um aparelho

eletrônico, o autor do manual deve conjugar conhecimentos de eletrônica e língua na

produção de seu texto.

1.3.6 Convergência entre teoria e prática

Em sua dissertação de mestrado, Pazello (2005) menciona a articulação entre teoria e

prática como uma das características que foram se agregando ao termo projeto para compor

seu significado na área educacional, apresentando os pontos de vista de Richards (1904), Rosa

(1997) e Fazenda (1995). Para Pazello (2005), os três autores defendem que, em um projeto, o

saber, articula-se com o saber fazer, em uma analogia com o presente (saber) em direção ao

futuro (saber fazer). O aluno precisa teorizar tendo em vista uma prática, um uso concreto,

que o auxiliará em situações e problemas futuros. Mas, por onde o aluno deve começar, pela

teoria ou pela prática? Na verdade, na PP, não há uma ordem pré-estabelecida.

Page 32: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Pode-se iniciar um projeto a partir de uma prática corriqueira na vida dos estudantes e

então teorizá-la para sobre ela refletir, ou se pode fazer o oposto, iniciar um projeto por algo

que os alunos só conheçam na teoria, como a fusão nuclear, por exemplo, e levá-los, por meio

de pesquisa e experimentos, a dominar esse tema.

A escola deve estimular que prática e teoria andem juntas, para que o aluno possa

pensar sobre suas ações, a fim de ser capaz de reformulá-las quando necessário e encontrar

alternativas para aperfeiçoá-las, além de aprender novas práticas, a partir de conceitos

teóricos. Na aula de inglês, por exemplo, a turma pode construir uma pipa, a partir de uma

lista de instruções no idioma estrangeiro, conjugando conhecimentos lingüísticos teóricos

para a execução de um projeto prático.

1.3.7 Interação aluno-aluno e aluno-professor

Segundo Barbosa (2004) “as pesquisas biológicas contemporâneas afirmam que a

inteligência é um tipo particular de interação entre organismos em contextos particulares” (p.

24). De acordo com essa perspectiva interacional, estudantes aprendem mais quando atuam

uns com os outros e com o ambiente que os cerca, construindo socialmente o conhecimento.

Nogueira (2003) afirma que “coletivo” e “cooperativo” são termos que não podem

estar desvinculados da prática da PP. Quando trabalham com projetos, os estudantes tendem a

colaborar uns com os outros na busca por novas informações e na troca de dados que possam

trazer benefícios para todos. Uma vez que o objetivo do projeto é aprofundar o conhecimento

e descobrir novidades sobre o tema em questão para tentar resolver uma situação problemática

ao invés de, simplesmente, obter aprovação em um teste com boas notas no boletim, os alunos

não têm motivos para competir e sim para compartilhar resultados. O fato de trabalharem em

projetos nos quais surgirão diferentes versões para um mesmo tema auxiliará os alunos a

Page 33: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

perceberem que, em certos momentos, ninguém está mais certo do que o outro, apenas

pensando de modo diferente, baseando-se em sua própria cultura e experiência, embora exista

um parâmetro de adequação que deve ser construído pelos participantes do projeto com base

em dados concretos e na cultura que compartilham.

Os próprios alunos deverão construir sua opinião, seu posicionamento sobre o tema

estudado e esta opinião deve estar amparada em argumentos sólidos, que podem sustentar que

o posicionamento escolhido se mostra o mais adequado sobre o fato ou problema em questão.

Conforme citado anteriormente, a relação com o professor sofre profundas transformações no

trabalho com projetos de acordo Hernández (1998), Martins (2001) e Nogueira (2003). O

professor passa a ser um colaborador, um guia a conduzir a investigação e a aprendizagem de

seus alunos. Isso provoca uma mudança em sua postura, pois, com a pedagogia de projetos, o

professor não precisa ter todas as respostas, mas deve, inclusive, fazer perguntas.

O professor deve saber orientar a pesquisa e conduzir o aluno durante o processo

investigativo. Deve conhecer recursos, fontes de pesquisa e seus modos de funcionamento, a

fim de guiar o estudante em seu próprio processo de descoberta. Certamente, o professor deve

também avaliar a qualidade do que já foi investigado e orientar as medidas a serem tomadas

para melhorar a pesquisa e a forma de divulgação dos resultados, o que se relaciona com a

pretensão da PP de fazer com que os participantes do processo educativo estejam em

constante questionamento e análise, sempre prontos a realizar mudanças pertinentes.

Martins (2001) discerne cinco ações que o professor deve conduzir na aplicação de um

projeto de pesquisa, criando oportunidades para um aprendizado significativo e contínuo: 1)

estimular a criatividade, explicando procedimentos para descobrir mais sobre os fatos; 2)

induzir à descoberta, mediante leituras e reflexões; 3) fornecer meios para que os estudantes

encontrem as informações de que precisam; 4) adequar os assuntos à faixa de idade dos

Page 34: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

alunos; 5) promover a exposição dos resultados encontrados pelos estudantes, a fim de

estimular novas pesquisas. Portanto, o papel do professor se amplia enquanto criador de

oportunidades e se extingue enquanto centro do processo educativo.

O centro do processo passa a ser a interação em si. É nela que se constrói

conhecimento, é através dela que as pessoas trocam informações e acrescentam umas às

outras, construindo um espaço em que aquilo que cada um sabe é somado e investigado,

chegando-se a um produto final mais rico do que o inicial. Na aula de língua inglesa, essa

interação facilita a aprendizagem do idioma e é importante que o professor use a língua

estrangeira em determinadas ações como cumprimentos, despedidas e para chamar a atenção

dos alunos, aumentando esse uso rotineiro progressivamente.

O professor é visto como um interagente mais capacitado, que compartilha seu

conhecimento com os alunos, interagentes menos capacitados, mas com grande potencial, que

se capacitam na interação com o agente mais capacitado, professor. Entre os colegas, o

mesmo processo ocorre: um estudante com habilidade para pronunciar bem as palavras na

língua estrangeira auxiliará seu colega que não tem a mesma facilidade nesse aspecto,

melhorando a habilidade deste e ele o auxiliará naquilo em que for mais bem habilitado do

que ele.

Mas os papéis de interagente mais habilitado e menos habilitado não são fixos.

Dependem do assunto tratado e da maneira como esse assunto é abordado. O professor pode

ser visto como o participante mais habilitado no que diz respeito à disciplina estudada em

suas aulas, mas, dependendo do tema tratado, os alunos podem ser mais habilitados do que o

professor. Não há alunos melhores ou piores, mais ou menos inteligentes, apenas com

habilidades e talentos diferentes que devem ser aproveitados da melhor forma possível por

todo o grupo, para que se chegue ao final de um projeto com um bom resultado. Mas, se a

Page 35: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

interação é o aspecto central na aprendizagem por projetos, qual é o papel do aluno? Como o

professor, ele é um colaborador, mas objetiva facilitar a própria aprendizagem. Para que o

trabalho com projetos seja desenvolvido com sucesso e os alunos realmente alcancem uma

aprendizagem significativa, é importante que os alunos saibam da relevância de seu papel

para sua própria aprendizagem. É essencial que a escola mostre ao aluno a responsabilidade

que este tem nesse processo. Alunos e professor são co-responsáveis pelo desenvolvimento

dos primeiros e cabe ao professor deixar claro essas responsabilidades quando se trabalha

com projetos.

1.3.8 Flexibilidade de tempo e planejamento

Os projetos escolares podem ter as mais variadas durações e períodos. Podem ser

feitos de maneira concomitante com outros projetos e atividades ou em caráter de

exclusividade. Barbosa (2004) defende a ideia de que “há sempre um momento de decisão

inicial e de avaliação final, mas a forma como os momentos são articulados, subdivididos e

organizados fica a critério do grupo de alunos e educadores.” (p. 12).

É muito importante que um projeto seja cuidadosamente planejado, mas o mais

importante é que se cumpra os objetivos propostos, o que significa que a duração pode ser

alterada em detrimento da qualidade. Não se deve gastar energias tentando a qualquer custo,

cumprir prazos. A atenção deve estar voltada para a solução do problema tratado. Nisso é que

reside a importância do planejamento. Deve ocorrer muita pesquisa sobre o tema a ser tratado

no projeto, buscando-se materiais, fontes e recursos que auxiliem para um bom produto final.

As etapas devem levar ao produto final e a reflexão sobre o tema.

1.3.9 Questionamento das representações únicas da realidade

Page 36: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Uma vez que o trabalho com projetos visa à solução de situações-problema mediante a

investigação, à aproximação com a vida cotidiana, à convergência entre teoria e prática, ao

desenvolvimento de novos conhecimentos a partir de saberes prévios e à interação entre os

personagens envolvidos na atividade, uma das prerrogativas do trabalho com projetos é a

aceitação de que existe mais de uma versão para os assuntos que serão tratados. Hernández

(1998) defende enfaticamente tal assertiva e afirma que, com ela

“a cultura escolar adquire a função de refazer e de renomear o mundo e de ensinar os alunos a interpretar os significados mutáveis com que os indivíduos das diferentes culturas e tempos históricos dotam a realidade de sentido”. (p. 65)

A escola deve ajudar o aluno a aprender como lidar com toda a multiplicidade de pontos

de vista que existe no mundo e com a qual o aluno se depara diariamente através dos meios de

comunicação, de modo que saiba formular e expor sua opinião, sem se deixar influenciar e

sem criar conflitos desnecessários com opiniões contrárias.

Obviamente, a escola precisa estimular o diálogo, desestimulando a hostilidade e a

agressividade. A escola deve ajudar os diversos pontos de vista a coexistirem, e ajudar o

estudante a adotar, como uma escolha, o ponto de vista que lhe parece mais coerente. A

escola deve ser um lugar de vanguarda, em que as ideias não permaneçam sempre as mesmas,

mas mudem, à medida que o ser humano transforma o mundo e cria novas necessidades.

Nesse sentido, o trabalho com projetos se apresenta como uma alternativa para concretizar

essa aprendizagem de constantes transformações, devido à sua flexibilidade e intuito de fazer

com que o aluno investigue os temas tratados.

A aula de língua estrangeira, por ter como objeto um idioma que não é o mesmo falado

pelos estudantes, oferece a oportunidade de entrar em contato com uma cultura diferente,

cujas “verdades” também divergem daquelas presentes no cotidiano dos alunos. A aula de

Page 37: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

língua estrangeira fornece a chance de se comparar os idiomas e as representações da

realidade sob o ponto de vista das diferentes culturas.

1.4 Estrutura de um projeto

Nogueira (2003), Barbosa (2004), Hernández (1998), Martins (2001) e Vasconcellos

(2000) apontam nos projetos de pesquisa escolares, com sutis variações, as seguintes etapas:

escolha do tema; planejamento; coleta de informações; apresentação dos dados coletados;

avaliação.

1.4.1 Escolha do tema

Independentemente de quem a escolha do tema partir, o assunto deve ser delimitado e

hipóteses sobre o tema devem ser levantadas, para que posteriormente sejam confirmadas ou

refutadas. Além das hipóteses, é importante que, durante essa fase do projeto, professor e

estudantes reflitam sobre a relevância do tema e o porquê de investigar esse assunto mais a

fundo.

O debate sobre aquilo que se quer descobrir e o porquê estimula a curiosidade e a

motivação, enquanto, concomitantemente, ajuda os estudantes a valorizar seu trabalho, uma

vez que percebem que estão estudando um tema significativo para seu desenvolvimento

intelectual.

A liberdade na escolha do tema remete à pretensão da PP de fazer os alunos pensarem

por si próprios e, já nessa etapa, eles terão o direito de expor suas opiniões e colaborar no

desenvolvimento do projeto. Na aula de inglês, deve-se observar se o tema escolhido é

passível de ser estudado com o uso do idioma e se o desenvolvimento do projeto auxiliará os

Page 38: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

alunos a desenvolverem atividades na língua, utilizando-a para um propósito comunicativo

definido.

1.4.2 Planejamento

O segundo passo é o planejamento das atividades que serão executadas no decorrer do

projeto, definindo-se quem fará o quê, onde o assunto deverá ser pesquisado, de que forma as

informações encontradas serão registradas, quando a pesquisa se realizará e com que prazo e

de que maneira as informações registradas serão analisadas e expostas.

Hernández (1998) afirma que o planejamento funcionará como uma bússola,

orientando os passos de todos os envolvidos no projeto, fornecendo, desse modo, segurança

nas ações empreendidas. Obviamente, essa programação pode ser alterada, à medida que

forem surgindo novas necessidades.

Com o planejamento, estudantes e professor poderão ter uma visão global do projeto,

percebendo-o como um processo de aprendizagem, com início, meio, fim e objetivos

definidos.

Nessa etapa, segundo Fried-Booth (1986), professor e alunos definem também qual

será o conteúdo lingüístico que os alunos devem aprender para a aplicação do projeto na aula

de inglês. Alunos e professor podem definir quais tópicos lingüísticos precisarão para o

desenvolvimento de cada etapa do projeto. Ao verem o objetivo da aprendizagem de

determinadas estruturas, a motivação dos alunos para seu estudo tende a aumentar ou, pelo

menos, o professor estará criando condições para que isso ocorra.

1.4.3 Coleta de informações

Após a etapa de planejamento, inicia-se a coleta de informações e a pesquisa sobre o

Page 39: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

tema. Nessa fase, além de aprofundar-se no assunto pesquisado, o aluno aperfeiçoa e

desenvolve estratégias de pesquisa, como fazer anotações, marcar em livros as páginas em

que o assunto é mencionado para depois retornar a elas e registrar as fontes utilizadas.

Martins (2001) defende que é durante essa etapa que o estudante passa a sistematizar

as informações coletadas, para apresentá-las no futuro. Tal sistematização pode ser feita

através de um esquema com figuras, anotações, a produção de um texto, vídeo, cartazes,

fichas e muitas outras linguagens. Afinal, investigar implica utilizar uma série de recursos, em

cada uma das etapas da investigação, a fim de se coletar e examinar os dados necessários.

Para poder se apropriar desses recursos e utilizá-los de forma mais e mais competente, os

estudantes devem estar sempre investigando, em contato com diversas ferramentas.

O grupo irá investigar o assunto, coletar, organizar, armazenar e pensar informações

para que chegue ao resultado final com a capacidade de desenvolver argumentos para embasar

a conclusão a que chegou. Nogueira (2003) sustenta que a investigação nos projetos de

pesquisa é essencial antes, durante e após a conclusão do projeto, visto que é na sua

investigação que o aluno poderá basear seus resultados.

Na aula de língua estrangeira, o aluno poderá utilizar, durante essa etapa, estruturas

definidas na etapa anterior para a coleta de dados, como a aprendizagem de certas estruturas

interrogativas para realizar entrevistas ou certas palavras que os alunos deverão conhecer para

pesquisar sobre o tema em livros ou na internet, no idioma estrangeiro. A etapa de coleta de

dados é relevante para que o aluno aprenda algo que a PP estabelece como uma de suas

principais pretensões: estimular o aluno a pensar e resolver problemas por si mesmos, ao

aprender estratégias de pesquisa, seleção e registro de informações.

1.4.4 Apresentação dos dados coletados

Page 40: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Uma vez que a coleta de dados é concluída, o resultado da pesquisa deve ser

apresentado. Barbosa (2004) afirma que a apresentação também é flexível e pode ser feita à

turma toda, somente ao professor, a outras turmas, aos pais ou à toda comunidade escolar.

Martins (2001) relembra que, como todas as etapas do projeto, a apresentação deve ser

previamente planejada e, em alguns casos, até mesmo ensaiada, a fim de que os alunos

possam notar o quão produtivos foram durante o projeto e o quão longe chegaram na

investigação do assunto.

Durante a apresentação os estudantes mostram quão longe chegaram e exercitam a

habilidade de se expor e argumentar em favor de suas conclusões. Na aula de língua

estrangeira, poderão utilizar a língua para fazê-lo. Estarão expondo ideias, argumentando e

estabelecendo reflexões no outro idioma. A apresentação dos dados na aula de língua

estrangeira possibilitará ao aluno desenvolver sua capacidade de auto-afirmação em uma outra

língua, transformando-o em um ser mais habilitado a exercer e buscar seus direitos.

1.4.5 Avaliação

Ao contrário do que acontece na escola tradicional, a avaliação não é feita somente

pelo professor. Nessa etapa, a participação dos alunos equipara-se à do docente em grau de

importância.

A avaliação é vista, pela escola tradicional, como tarefa do professor. Na PP,

entretanto, a avaliação não é unilateral, mas multilateral, com todos os participantes avaliando

o processo.

Segundo Martins (2001), a primeira pergunta a ser respondida durante a avaliação do

projeto é: atingimos os objetivos estabelecidos no início? Alunos e professor avaliam o quão

longe conseguiram ir e definem quais hipóteses são cabíveis e quais são refutáveis em relação

Page 41: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

ao tema.

Avalia-se também a qualidade da pesquisa realizada e a maneira como o projeto foi

conduzido. Nogueira (2003) defende que cada etapa pode ser retomada e analisada a fim de

medir a eficiência de cada ação.

O desempenho de cada um dos participantes é avaliado, o professor pode avaliar os

alunos, os alunos podem avaliar o professor e cada um pode avaliar a si mesmo, procurando

descobrir o que foi feito de bom e o que pode ser melhorado.

A avaliação pode ser feita através de relatórios elaborados pelos alunos, questionários,

elaborados pelo professor ou pelos alunos, mediante uma lista de critérios elaborada pelo

professor para a avaliação da produção final, dos relatórios, da apresentação dos resultados,

entre outros.

O estabelecimento de critérios é importante para que professor e alunos cheguem a um

acordo sobre a avaliação já na etapa de planejamento do projeto. Todos os participantes

devem entender que a avaliação não existe apenas para classificar os alunos como aptos ou

não aptos para passar para o próximo nível de aprendizagem, mas sim para medir a qualidade

dessa aprendizagem e, por isso, tem de se avaliar, não só o desempenho dos alunos, mas o do

professor, do andamento do projeto, das escolhas feitas e da interação que ocorreu entre os

agentes.

Na aula de língua, por exemplo, não se avaliará somente a quantidade de conteúdos

que foi aprendida ou se foi aprendida com exatidão gramatical, isto é, sem erros ortográficos

ou equívocos no uso de tempos verbais ou estruturas. Deve-se avaliar se a aprendizagem

serviu ao objetivo a que foi proposta, se a língua foi utilizada eficazmente para realizar a ação

objetivada e se o aluno percebeu que a utilizou para algo significativo.

Mesmo na aula de língua, não se avaliará somente a língua. O trabalho como um todo

Page 42: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

deve ser avaliado, sendo a língua um dos aspectos observados entre outros, como propósito,

engajamento, progressão de ideias e construção de conceitos.

Martins (2001) ressalta que os resultados da avaliação podem desencadear a

elaboração de mais um projeto. A percepção de uma lacuna em algum aspecto do tema, a

conexão do tema a outro podem gerar questões-problemas para o desenvolvimento de uma

nova pesquisa.

A avaliação na PP estende-se além do objetivo de avaliar desempenhos, ela pretende

avaliar o processo de aprendizagem, visando a modificar o que for necessário.

No capítulo seguinte, discutiremos a PP sob a luz das teorias de aprendizagem que a

influenciaram, falaremos da concepção de linguagem implícita na PP e nas implicações dessa

visão sobre a língua para o ensino de língua inglesa.

Page 43: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

2 CONCEPÇÃO DE LÍNGUA, TEORIAS DE APRENDIZAGEM

E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PP

Nesse capítulo, pretende-se apresentar e discutir a concepção de língua adotada neste

trabalho sobre a aprendizagem de língua inglesa mediante a aprendizagem por projetos. Em

seguida, pretende-se apresentar as principais teorias de aprendizagem presentes na literatura

sobre este assunto e discutir de que modo tais teorias influenciam a PP.

2.1 – Concepção de Língua

No capítulo anterior, a PP foi apresentada no que diz respeito à sua trajetória

cronológica, suas pretensões, seus princípios e a estrutura de um projeto. Concluiu-se que a

PP pretende auxiliar para a formação de um ser humano integral, reflexivo, questionador e

investigador.

Verificou-se que aluno e professor dividem responsabilidades no trabalho com

projetos, o professor como um orientador, facilitador e guia e o aluno como um orientado em

um processo de aprendizagem que visa a torná-lo independente, capaz de pensar e resolver

problemas por si mesmo.

E quando se estuda uma língua, como ocorre esse processo? Como o aluno aprenderá

a descobrir, investigar, enfim, aprender sobre a língua por si mesmo? E como poderá usar o

conhecimento sobre a língua para agir no mundo em seu favor, como um cidadão que tem

direitos e deveres? Para que isso ocorra, o professor deve ter em mente uma concepção sobre

a língua: um construto do que ela é, para que ela serve e como é usada.

Os PCNs (BRASIL, 1998) apresentam algumas afirmações sobre concepção de língua

Page 44: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

que vão de encontro ao trabalho com projetos. Os PCNs (BRASIL, 1998) afirmam que

“aprender línguas significa aprender conhecimento e seu uso” (p. 27), ou seja, quando as

pessoas aprendem língua precisam aprender também como usar esse conhecimento, quais os

efeitos que o modo como usam a língua terá quando as pessoas agirem na sociedade. Segundo

os PCNs (BRASIL, 1998), o conhecimento que se tem sobre o mundo é atingido através do

uso da linguagem.

Em 1996, o psicolingüista norte-americano Herbert Clark escreveu um livro chamado

Using Language. Nesse livro, Clark propõe que a língua está sempre vinculada a seu uso, uma

vez que “o uso da língua é uma forma de ação conjunta”. “Uma ação conjunta acontece por

um grupo de pessoas agindo de maneira coordenada uma com a outra” (p. 03).

Para Clark (1996), a língua está sempre vinculada a seu uso. Ao interagirem, as

pessoas interagem pelo uso da linguagem. Quando as pessoas usam a língua, estão

interagindo umas com as outras, agindo de maneira conjunta.

A tese de Clark (1996) alinha-se com a tese dos PCNs (BRASIL, 1998) sobre a

natureza sociointeracional da linguagem que afirma que, quando as pessoas falam ou

escrevem, fazem isso para “agirem no mundo social” e o fazem de um espaço e momento

determinado, interagindo com quem se dirigiu a elas ou a quem elas se dirigiram

primeiramente.

Portanto, língua não pode ser separada de uso e o uso sempre remete a um lugar de

onde se fala, a um tempo em que se fala e a um ou mais interlocutores com quem se interage.

Interação e uso ocorrem sempre, o tempo todo. As ideias primeiras da Lingüística, de se

estudar a língua como um sistema de signos com regras pré-estabelecidas, não são suficientes

para a formação do cidadão que pensa por si só como a PP deseja, pois o simples fato de saber

regras não assegura que o ser humano saiba usá-las para diferentes propósitos em seu dia-a-

Page 45: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

dia, na interação com outros seres humanos.

Na PP, o estudo da língua deve vincular-se a seu uso e alunos e professor devem se dar

conta de que já estão interagindo em “uma forma de ação conjunta” como propõe Clark

(1996), desde a sala de aula e o tempo todo. O uso da língua é uma ação conjunta mesmo

quando os participantes da interação estão em conflito. Brigas, discussões, debates, até as

formas mais desarmônicas de comunicação ocorrem com a ação conjunta dos participantes.

Cabe ao professor de língua apresentar aos alunos essa característica do uso da

linguagem. O professor deve indicar a seus alunos que a língua é mais do que um sistema de

signos repleto de regras. Ele deve mostrar que a língua é uso, é interação. Não basta que o

professor diga isso a seus alunos, ele precisa apresentar situações em que essa ação conjunta

possa ser inferida, a fim de que os estudantes percebam os papéis dos participantes da

interação e os efeitos que o modo com que os participantes usam a língua têm nessa interação.

A PP permite que essa característica da língua se sobressaia porque tudo, na PP, deve

ocorrer pela interação. As várias etapas de um projeto devem ser discutidas e negociadas e o

aluno participa como um ser ativo, que influencia na tomada de decisões sobre o processo

educativo.

Além disso, nas aulas de língua inglesa, o professor deve procurar trabalhar com

material autêntico e deve expor o aluno a situações autênticas de uso do idioma, o que

permitirá que o professor questione os estudantes sobre os papéis de cada participante nas

situações de comunicação, levando o aluno a se dar conta dessa ação conjunta.

Uma vez que o professor tenha a visão da língua como uso, fica muito mais fácil

torná-la consciente aos alunos, pois ao longo do trabalho com projetos, sejam esses projetos

referentes ao estudo da língua em si ou não, o professor pode focar, cada vez mais, aspectos

como interlocutor, propósito e efeito, fazendo com que o aluno se dê conta da natureza

Page 46: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

sociointeracional da linguagem.

2.2 Teorias de Aprendizagem

A partir da compreensão da língua como ação conjunta, passaremos a explicitar e

refletir sobre as teorias de aprendizagem e sua relação com a PP.

Esta discussão está baseada em Bigge (1977), Moreira (1999) e Behrens (2005). Esses

três autores publicaram obras, no Brasil, sobre as principais teorias de aprendizagem.

A escolha desses autores se justifica porque suas obras, além de didáticas e

explicativas, refletem o pensamento pedagógico de cada época em que foram escritas,

evidenciando a evolução cronológica do pensamento sobre aprendizagem e indicando os

caminhos percorridos na ciência da educação. Apresentarei cada livro e cada teoria e, a seguir,

refletirei sobre sua relação com a PP.

Bigge (1977) escreve sobre as teorias de aprendizagem que mais influenciaram o

ensino até o final da década de 1960. No quadro demonstrativo das teorias de aprendizagem,

presente nas páginas 10 e 11 de seu livro, ele se posiciona como um dos expoentes

contemporâneos das teorias cognitivas, que serão discutidas na seção 2.2.3 deste capítulo.

O autor inicia seu livro explicando porque a aprendizagem é um problema e porque

foram desenvolvidas diferentes teorias sobre a aprendizagem. Para Bigge (1977), a

aprendizagem passou a ser uma questão problemática quando foi formalizada na escola, na

sala de aula, com um professor e alunos diferentes tendo que aprender juntos um conteúdo em

comum.

De acordo com Bigge (1977), foi a partir da institucionalização da aprendizagem que

ela passou a ser um problema no meio acadêmico e as teorias de aprendizagem surgiram

como uma maneira de pensar a ação educativa a fim de torná-la mais eficaz. O autor afirma

Page 47: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

que toda a ação subjaz à uma teoria e, em uma tentativa de aperfeiçoar a ação na escola,

desenvolveram-se teorias de aprendizagem.

O autor norte-americano também aponta o que ele considera o ideal de aprendizagem:

“As escolas deveriam se preocupar em ensinar de tal forma que os estudantes não só acumulassem muitas aprendizagens significativas aplicáveis à situações de vida, mas também desenvolvessem uma técnica para adquirir, independentemente, novos insights ou novas maneiras de compreender independentemente seu universo.” (p. 18-19)

Interessante notar que o ideal de aprendizagem de Bigge (1977) tem muito em comum

com a proposta da PP, já visando à formação de um estudante investigador, que busca

soluções para os diversos problemas de sua realidade.

Bigge (1977) apresenta dez teorias de aprendizagem, divididas em três famílias de

teorias. Na primeira família, o autor apresenta as teorias de aprendizagem anteriores ao século

XX que tiveram influência sobre as teorias daquele século. Nessa família, ele inclui a Teoria

da Disciplina Mental, a Teoria do Crescimento Natural e a Teoria da Apercepção ou

Herbartianismo. Essas teorias serão aprofundadas na seção 2.2.1.

A segunda e terceira famílias referem-se às teorias de aprendizagem do século XX, a

saber, teorias behavioristas e teorias cognitivistas. Dentro das teorias de cunho behaviorista,

Bigge (1977) inclui a Teoria das Conexões, do Condicionamento e do Condicionamento por

Reforço. Já as teorias da família cognitiva que o autor apresenta são: Teoria de Insights da

Gestalt, Teoria de Insights de Objetivos e Teoria do Campo Cognitivo. As teorias

behavioristas serão discutidas na seção 2.2.2 e as teorias cognitivistas, na seção 2.2.3.

Moreira (1999) também apresenta três famílias de teorias, mas divididas em teorias

behavioristas, cognitivistas e humanistas. Ele apresenta as teorias behavioristas de Watson,

Guthrie, Thorndike e Hull; as teorias cognitivas de Hebb, Tolman, da Gestalt e de Lewin, as

teorias behavioristas mais recentes de Skinner e Thorndike; a teoria de Gagné, que o autor

Page 48: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

classifica como intermediária entre o behaviorismo e o cognitivismo; as teorias cognitivistas

de Piaget, Vygotsky, Bruner, Ausubel, Kelly e Johnson-Laird; as teorias de Novak e Gowin,

classificadas como intermediárias entre o cognitivismo e o humanismo; por fim, introduz a

teoria humanista de Rogers. As teorias humanistas serão discutidas na seção 2.2.4.

Behrens (2005), por outro lado, não fala em teorias, mas em abordagens. Ela aponta

como pertencentes ao paradigma conservador da educação as abordagens Tradicional,

Escolanovista e Tecnicista, que, de acordo com ela, visam à reprodução do conhecimento.

Após detalhar esse paradigma e suas abordagens, a autora propõe o que chama de paradigma

inovador, visando à produção do conhecimento e, para isso, defende a aplicação conjunta das

abordagens Sistêmica, Progressista e do Ensino com Pesquisa, que serão apresentadas e

discutidas na seção 2.2.5.

Behrens (2005) faz essa proposição inovadora para o ensino na universidade,

afirmando que mesmo que os educadores tenham passado as últimas décadas procurando

metodologias que atendam às expectativas dos alunos, “a realidade parece intransponível

quando o professor fecha sua porta e começa a dar aulas” (p. 54). Ou seja, para a autora, nem

na universidade, muitas vezes, os antigos paradigmas foram quebrados.

Tendo apresentado um breve resumo da exposição de cada autor, vamos sintetizar as

teorias e abordagens apresentadas por eles. Para isso, as teorias e abordagens apresentadas

podem ser divididas em cinco seções, a saber: teorias anteriores ao século XX, abordagem

behaviorista, abordagem cognitiva, abordagem humanista, abordagens do paradigma

emergente, dentro do qual a PP poderia ser incluída.

A seguir, discutiremos cada abordagem e sua relação com a PP.

2.2.1 Teorias anteriores ao século XX

Page 49: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Bigge (1977) fala em três teorias anteriores ao século XX: Disciplina Mental,

Crescimento Natural e Apercepção ou Herbatianismo. A primeira, Disciplina Mental, surgiu

enquanto teoria durante o movimento da Renascença Humanista no século XVIII, quando os

filósofos humanistas se voltaram à Roma e à Grécia antigas para explicar a aprendizagem.

Fazendo uso do dualismo entre mente e corpo proposto pelos filósofos da Antigüidade, os

adeptos dessa teoria acreditam que o homem tem uma substância mental, totalmente desligada

do corpo físico, responsável por seu intelecto. Eles crêem que essa substância deve ser

treinada como um músculo a fim de se desenvolver, para que o homem se desprenda de sua

natureza má, que tende a destruí-lo.

Bigge (1977) afirma que, na Disciplina Mental, o conhecimento é um fim em si

mesmo e se estuda para adquirir sabedoria e disciplina. Essa ideia de adquirir conhecimento

apenas para aumentá-lo, como a um músculo, não para desenvolver habilidades para

solucionar problemas e questões não se alinha com as proposições da PP.

No estudo de idiomas, a Disciplina Mental influenciou a ampla aprendizagem do

Latim quando já não era mais falado, por ser considerado um idioma clássico cujo estudo

aperfeiçoaria a substância mental dos aprendizes.

A PP contrapõe-se a essa teoria porque não visa ao estudo pelo estudo e não concebe

o estudante como um ser despreparado, que necessita de treinamento. Ao contrário, a PP visa

ao estudo como uma forma de aperfeiçoar os conhecimentos do aluno, que são levados em

consideração no processo de aprendizagem. O aluno não é visto como um ser despreparado,

mas como uma pessoa que já adquiriu certos conhecimentos e que deve ampliá-los e

desenvolvê-los. Bigge (1977) afirma ainda que a disciplina mental exerceu grande influência

nos modos de ensinar até a primeira metade do século XX e teve seu auge no século XIX.

A outra teoria pré-século XX apresentada por Bigge (1977) é a Teoria do Crescimento

Page 50: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Natural. Essa teoria se contrapõe à Disciplina Mental, afirmando que o homem é um ser bom

por natureza, que passa a ser mau quando vítima de influências negativas. Segundo Bigge

(1977), o principal responsável por tal ideia foi Rousseau com a noção do bom selvagem, que

levou os educadores Pestalozzi e Froebel a idealizarem a aprendizagem pelo crescimento

natural.

Na verdade, eles defendem uma educação negativa, ou seja, o professor não dará

instrução nenhuma aos alunos e nem lhes indicará qual conteúdo deve ser estudado. Os

próprios alunos irão decidir o que estudar, quando e como, com base em suas necessidades.

O radicalismo dessa teoria a afasta da PP, pois exclui totalmente o papel do professor,

lhe deixando apenas um não-papel, isto é, o professor não interfere de forma alguma no

processo de aprendizagem do aluno. Isso impede que haja interação entre o participante mais

habilitado e o participante menos habilitado do processo de aprendizagem, o que atrapalha o

desenvolvimento do participante menos habilitado, no caso, o aluno7.

Além da falta de interação com o professor, não há também, na Teoria do Crescimento

Natural, a intenção de que o estudante interaja com outros estudantes (Bigge, 1977), não há

procedimentos, nem parâmetros, o que inviabiliza discussões e reflexões.

Pelo fato de os alunos não precisarem seguir nenhum direcionamento, é difícil que

avaliem seu próprio desempenho e façam modificações quando necessário. É, portanto, uma

abordagem solta, sem consistência, que não poderia funcionar em uma escola devido a essa

falta de consistência.

A última teoria anterior ao século XX sobre a qual Bigge (1977) trata é a teoria da

Apercepção ou Herbartianismo. Essa teoria defende que o ser humano aprende por

7.... A partir da ideia da Zona de Desenvolvimento Proximal de Vygotsky, o aluno é visto como o interagente menos habilitado que tem potencial para desenvolver-se caso esteja em contato com outros participantes mais habilitados que o auxiliem. De qualquer modo, nem sempre o aluno será o interagente menos habilitado e o professor o mais habilitado; o grau de habilitação dependerá do assunto a ser tratado.

Page 51: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

associação, ligando conhecimentos novos a antigos. De acordo com Bigge (1977), o

Herbartianismo está ligado às ideias de John Locke e seu empirismo social, que afirma que a

mente humana é como uma tábula rasa que deve ser preenchida.

Segundo Bigge (1977), Herbart, educador alemão que viveu entre 1776 e 1841, foi o

primeiro a sistematizar um método de ensino e a enfatizar uma abordagem psicológica à

aprendizagem, ao desenvolver uma teoria de moldes científicos sobre como o ser humano

aprende.

A metodologia de Herbart abriga cinco passos: 1) preparação, na qual o professor

procura trazer à consciência dos alunos ideias que já tenham sobre o assunto estudado; 2)

apresentação, na qual o professor apresenta novos conteúdos; 3) comparação e abstração, na

qual os estudantes irão associar as ideias novas às velhas, se o professor tiver agido

corretamente nas duas etapas anteriores; 4) generalização, na qual os alunos deveriam chegar

aos princípios que caracterizam os fenômenos ou tópicos estudados e 5) aplicação, na qual os

princípios aprendidos seriam usados para explicar fatos ou problemas adicionais.

As ideias de Herbart têm convergências e divergências com a PP. Ambas apresentam

passos e procedimentos fixos, embora uma das características da PP seja a flexibilidade, que,

segundo Bigge (1977), não é encorajada na metodologia herbartiana. Porém, a PP não vê o

estudante como uma folha em branco que deve ser preenchida, mas como um ser que interage

com o mundo e tem ideias e conhecimentos próprios a respeito dele.

Sendo assim, a PP leva em consideração o que o aluno já sabe para dar continuidade à

sua aprendizagem, como na primeira etapa proposta por Herbart, mas não simplesmente para

assimilar conhecimentos novos aos velhos e sim para ajudar o aluno a perceber o que ele sabe

e a descobrir o que mais seria interessante saber e como.

Na PP, esse conhecimento prévio do aluno contribui com outros colegas, com o

Page 52: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

professor e com o projeto como um todo. O conhecimento prévio não é ativado simplesmente

para listar ideias sobre o assunto estudado, mas para ser repensado e analisado, a fim de que o

aluno chegue a novas conclusões a partir de sua própria investigação, com a ajuda do

professor e de outros colegas.

Essas três teorias influenciaram aquelas que vieram depois. Isso fica claro na corrente

behaviorista, fortemente influenciada pelas ideias de Herbart de transmissão do

conhecimento. Elas são a base para as teorias de aprendizagem do século XX. Assim, a PP foi

também influenciada por elas, mas penso que mais no sentido de contrapô-las, pois a PP não

concebe o homem da maneira como essas primeiras teorias o faziam, como um ser

completamente passivo ou totalmente ativo, mas sim como um ser interagente, que influencia

e é influenciado, que age no mundo o tempo todo.

Na PP, o ser humano é um ser que interage com seu mundo e que não pode ser

rotulado como ativo ou passivo, bom ou mau. A PP concebe o ser humano como um ser

múltiplo, que influencia e sofre influências, que não é bom nem mau, pois essa rotulação é

relativa, depende do ponto de vista de quem faz essas afirmações, o que remete ao que foi dito

no capítulo anterior sobre o pós-estruturalismo e o fato de a verdade ser provisória (Rampton,

2006). O homem é concebido como um ser pertencente a uma cultura, que tem valores

próprios e cujos valores se distinguem dos valores de outras culturas.

Dando seguimento à apresentação das teorias e sua relação com a PP, discutiremos a

abordagem behaviorista ou comportamentalista.

2.2.2 Abordagem behaviorista

Dentre os três autores anteriormente citados, apenas Bigge (1977) e Moreira (1999)

Page 53: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

detalham as teorias behavioristas. Behrens (2005), por sua vez, chama essa abordagem de

tecnicista e discute suas características genericamente, citando como autor Skinner e

criticando as ideias behavioristas pelo reducionismo que fazem do homem, concebendo-o

como a uma máquina e compreendendo a aprendizagem como um processo reprodutivo

similar à produção em série de uma fábrica. Bigge (1977) e Moreira (1999) também criticam

o Behaviorismo.

De acordo com Moreira (1999) e Bigge (1977), as primeiras teorias behavioristas

surgiram no início do século XX, com os experimentos de Thorndike e Watson. No decorrer

do século XX, outros estudiosos desenvolveram teorias behavioristas, como Skinner, Spencer

e Guthrie. Esses são chamados por Bigge (1977) de Neobehavioristas.

Moreira (1999) afirma que o Behaviorismo surgiu quando os estudiosos do processo

de aprendizagem tentaram tornar a ciência psicológica tão exata quanto às ciências naturais.

Segundo Bigge (1977), os behavioristas queriam que os fenômenos da ciência psicológica

fossem tão testáveis e observáveis quanto os fenômenos das ciências físicas. Para isso,

eliminaram das ações observadas toda a subjetividade, intenção ou objetivo.

Bigge (1977) afirma que os behavioristas concebiam a aprendizagem como um

processo no qual o aluno aprende pela repetição de estímulos que levam a uma resposta

condicionada, isto é, pré-estabelecida e esperada. Entre as teorias behavioristas existem

algumas variações, por exemplo, as teorias de Guthrie e Watson assumem que o ser humano

aprende através de condicionamento, ou seja, mediante estímulos que induzam a uma resposta

esperada. Skinner também, mas, por sua vez, enfatiza a importância de reforçar as respostas

esperadas para que elas sejam repetidas e assimiladas pelo estudante.

Apesar das variações, todas as teorias behavioristas concebem o ser humano como um

ser neutro e passivo, que precisa ser estimulado e conduzido a assimilar respostas corretas

Page 54: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

mediante a repetição. As teorias behavioristas não consideram aspectos como vontade e

sentimento no processo de aprendizagem, por isso, são criticadas por Moreira (1999), Bigge

(1977) e Behrens (2005).

A seqüência IRA (Garcez, 2006), mencionada no capítulo anterior é um exemplo de

organização interacional tradicional do evento aula. Como já foi dito, essa seqüência é muito

comum, ainda usada em salas de aula até hoje, o que testemunha o impacto que as teorias

behavioristas tiveram e têm nos processos de ensino até o momento.

De acordo com Moreira (1999), na abordagem behaviorista, o sucesso da educação

não depende nem do professor e nem do aluno, mas da adequação do estímulo e do

condicionamento aplicado ao aluno em sala de aula. Se o estímulo for adequado, resultará na

resposta correta esperada..

A PP não se alinha a essa concepção de educação porque a maioria de seus princípios

vão exatamente na direção oposta. Na PP, os personagens do processo educativo

compartilham responsabilidades sobre o processo. Os alunos são responsáveis pelo que

aprendem e pelo modo com que aprendem. O professor é responsável pela aprendizagem dos

alunos e por sua própria adaptação e mudança, na busca por formas mais eficazes de estimular

a aprendizagem.

A maneira com que os procedimentos são realizados durante um projeto também

influência no sucesso da educação, como no Behaviorismo, mas o sucesso não está centrado

somente nos procedimentos. A PP possibilita que o processo de educação tenha mais de uma

base de apoio. O que importa não são apenas os passos ou a técnica, mas o modo com que se

chega até eles, com que são negociados ou adaptados.

O espírito de investigação conjunta impera na PP. Alunos e professor atuam em

conjunto, buscando alternativas para situações diversas. Essa busca por alternativas se dá com

Page 55: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

base na lógica, na busca por hipóteses e sua comprovação, na tomada de decisões baseada em

raciocínio e experimentos, científicos ou não.

Além do mais, a PP concebe o ser humano como um ser dotado de sentimentos,

intenções e objetivos e considera que eles desempenham papéis importantes no processo de

aprendizagem. Por isso, na PP, a motivação é um dos fatores mais relevantes para o

desenvolvimento de um projeto. Os alunos precisam se sentir motivados e interessados para

que sua aprendizagem seja significativa.

A PP considera que o conhecimento que o aluno aprende interfere na maneira como

ele se sente e vice-versa. Sendo assim, o aluno não deve aprender a repetir conhecimentos,

mas sim a refletir sobre eles para posicionar-se no mundo com uma opinião própria,

estabelecida de dentro para fora e não imposta de fora para dentro.

Mas e o estudo de línguas? Muitas atividades da aula de língua compreendem

exercícios de repetição e de preencher lacunas com respostas “certas”, a partir de regras

gramaticais explicadas pelo professor. Com a opção pela PP, esse tipo de atividade deve

desaparecer?

Não acredito nisso. Essas atividades são importantes para que os alunos internalizem

regras gramaticais e memorizem a pronúncia de palavras, por exemplo. O que não pode

acontecer é a repetição pela repetição. Com o trabalho por projetos, o professor e os alunos

devem aprender as estruturas da língua visando a algum propósito comunicativo e social

autêntico.

Por exemplo, o professor pode pedir a seus alunos que repitam as palavras

“nature” (natureza) e “global warming” (aquecimento global), para que posteriormente

escrevam um roteiro de rádio a ser veiculado em inglês nos alto-falantes da escola na hora do

intervalo, discutindo a questão da defesa do meio ambiente.

Page 56: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

A repetição de estruturas pode continuar nas aulas de língua estrangeira, desde que

tenha um propósito além de si mesmo; desde que, o objetivo central dessas atividades seja a

utilização dessas estruturas para que se aja criticamente no mundo social.

É essa pretensão de fazer o aluno pensar por si mesmo que distancia a PP da

abordagem behaviorista, pois a PP enfatiza a especificidade de cada pessoa, o direito de ter

sua própria opinião, o direito de aprender do seu jeito, enquanto as teorias behavioristas,

como afirma Behrens (2005), aproximam os seres humanos de máquinas, sujeitando-os a uma

aprendizagem de massa, em série.

2.2.3 Abordagem cognitivista

Historicamente, o cognitivismo surgiu quase em concomitância com o behaviorismo.

De acordo com Moreira (1999), ambas as abordagens surgiram como uma reação ao

Mentalismo do começo do século XX, em que somente se analisava o que as pessoas sentiam

e pensavam. O nascimento das abordagens behaviorista e cognitivista surgiu como uma

tentativa de dar cientificidade aos estudos sobre aprendizagem. O behaviorismo defendia o

estudo do comportamento, das ações das pessoas, buscando, em termos de teoria de

aprendizagem, criar maneiras de condicionar suas atitudes para obter o comportamento

desejado. Os behavioristas acreditavam que tudo era uma questão de condicionamento.

Já os cognitivistas, segundo Moreira (1999), se ocuparam da mente, da cognição, ou

seja, daquilo que o ser humano conhece. Moreira (1999) ressalta que os primeiros

cognitivistas, como Hebb e Tolman, ainda utilizavam termos behavioristas como “estímulo” e

“reforço” em suas teorias. Moreira (1999) explica que a diferença entre esses teóricos e os

behavioristas é que eles lidavam com os aspectos chamados intervenientes do processo de

Page 57: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

estímulo e resposta: a percepção, a intenção, a motivação e a seleção.

Bigge (1977) afirma que o canadense Donald Hebb, em 1949, propôs que uma série de

processos mentais ocorrem no cérebro do indivíduo após o estímulo e antes da resposta. A

resposta da pessoa não é automática, há uma atitude em relação à resposta e uma seleção da

resposta que será dada. Por exemplo, quando nadadores ouvem o disparo do tiro de partida

em uma competição e começam a nadar, há neles uma atitude de espera daquele sinal e uma

escolha de prestar atenção a ele e selecioná-lo entre tantos outros sons e estímulos que podem

estar recebendo no momento da partida.

Moreira (1999) afirma que, na mesma época, Edward Tolman, por sua vez, enfatizava

a intenção guiada por cognições como a principal característica do processo de aprendizagem.

Para ele, todo o comportamento está repleto de intenções que o dirigem, em lugar do reforço,

defendido por autores behavioristas.

A abordagem cognitivista é bastante ampla, com inúmeros autores e teorias. Para fins

didáticos, Moreira (1999) a divide em duas fases: a fase inicial cognitivista e a fase

construtivista, que surgiu posteriormente. Algumas vezes, o construtivismo é classificado

como uma abordagem à parte, mas, neste trabalho, optamos pela classificação utilizada por

Moreira (1999), que inclui as teorias de cunho construtivista junto às cognitivas, defendendo

que as teorias construtivistas são teorias cognitivistas interpretacionistas, uma vez que tratam

da cognição e do modo pelo qual o sujeito interpreta o conhecimento.

As outras teorias cognitivas da chamada primeira fase são a Teoria da Gestalt e a

Teoria do Campo Cognitivo. Segundo Bigge (1977), a Teoria da Gestalt foi desenvolvida por

psicólogos alemães que foram morar posteriormente nos Estados Unidos e popularizaram

suas ideias por lá. Gestalt, em alemão, significa algo como configuração, forma, padrão.

Moreira (1999) afirma que o gestaltistas vêem o ser humano e a aprendizagem como um todo,

Page 58: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

que não pode ser desmembrado em partes menores. Por isso, eles estabeleceram algumas leis

que conduzem o funcionamento dos processos cognitivos e da percepção.

Moreira (1999) apresenta a lei da pregnância, desenvolvida pelos gestaltistas, que diz

que tudo que é percebido pela mente tende a assumir a melhor forma possível, ou seja, a

forma mais simples, eficaz e funcional possível. Segundo Moreira (1999), subordinados à lei

da pregnância estão os princípios da similaridade, proximidade, fechamento e continuidade,

que buscam estabelecer relações com tudo o que é percebido.

Nesse sentido, se tem uma primeira intenção holística, com Hebb e Tolman, nas visões

sobre aprendizagem, que continua com a Teoria do Campo, que, segundo Bigge (1977), foi

emprestada da Física. Moreira (1999) afirma que a Teoria do Campo da Física argumenta em

favor da inter-relação entre todas as partes, que influenciam umas às outras e que, na

psicologia, os teóricos da Teoria do Campo procuraram fazer o mesmo, inter-relacionando

todos os aspectos do ser humano.

Kurt Lewin criou o termo “espaço vital” para designar tudo aquilo que é relevante para

o comportamento do indivíduo, suas crenças, o ambiente que o circunda, sentimentos, metas

alternativas, etc. Bigge (1977) afirma que, para Lewin, tudo o que é consciente em uma

pessoa está em seu espaço vital e tudo o que é conscientemente experienciado pode modificar

esse espaço vital.

As teorias da Gestalt e do Campo popularizaram o termo insight. O insight é o

momento em que o ser humano se dá conta de alguma coisa, com um aprendizado consciente.

O insight pode ser ilustrado com aquele balão com uma lâmpada que se acende em cima da

cabeça dos personagens em desenhos animados. Segundo Bigge (1977), é “o momento da

mudança na percepção, com uma sensação de clareamento e compreensão das ideias” (p.

214).

Page 59: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Bigge (1977) é defensor das teorias cognitivas, especialmente da Teoria de Campo.

Ele argumenta que a aprendizagem deve ser um processo democrático, que o professor deve

ser um arquiteto cultural, no sentido de construir a cultura junto com seus alunos, não

somente conservá-la, e que o ensino e a aprendizagem devem ocorrer no nível da

compreensão, isto é, o professor deve propor uma série de atividades que levem o aluno a

refletir, a perceber relações entre os fatos e fenômenos, de modo que possa utilizar os

conhecimentos adquiridos em outras situações e aprender modos de perceber relações

sozinho, isto é, de aprender por si mesmo.

Porém, Bigge (1977) não fala das teorias construtivistas, como faz Moreira (1999) e

Behrens (2005). Esses dois autores criticam o Construtivismo, não pela maneira como trata da

aprendizagem, mas pela maneira como foi mal interpretado e implementado nas escolas. Do

mesmo modo que Hernández (1998), Behrens (2005) e Moreira (1999) afirmam que as

escolas passaram a dizer que adotavam a filosofia construtivista apenas para dar uma

atmosfera de renovação ao ensino que, na prática, continuou tão tradicional quanto sempre

foi.

Outra interpretação que esses autores consideram negativa sobre o Construtivismo é a

de que o aluno deve trabalhar sozinho na construção de seu conhecimento, sem a interferência

e o direcionamento do professor, como que em uma volta ao Crescimento Natural de

Rousseau.

Esse argumento não procede para todos os autores construtivistas. Vygotsky, por

exemplo, enfatizou muito, em seu trabalho, a interação, o que mostra que nem todos os

construtivistas defendem o trabalho individual do aluno.

Um considerável número de autores são classificados como construtivistas. Dentre

eles, Vygotsky, Ausubel, Dewey, Kilpatrick, Bruner e Piaget. Piaget, segundo Moreira (1999),

Page 60: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

é considerado o principal autor dessa abordagem, tanto que seu nome se confunde com a

abordagem em si. Piaget tem uma obra muito vasta e suas ideias foram amplamente

divulgadas desde a década de 1920. Moreira (1999) afirma que Piaget dividiu o

desenvolvimento humano em estágios e elaborou uma teoria para o desenvolvimento

cognitivo. Para Piaget, o ser humano constrói seu conhecimento quando interage com o meio

em que vive. Nessa interação, ocorre o desequilíbrio dos processos mentais do ser humano e a

pessoa busca se re-equilibrar quando acomoda o conhecimento em sua mente, assimilando-o.

De acordo com Moreira (1999), esses são os principais termos da teoria piagetiana: equilíbrio,

desequilíbrio, assimilação e acomodação.

Vygotsky, cuja teoria se diferencia da piagetiana porque vê na interação social um fator

essencial para o desenvolvimento cognitivo, é outro reconhecido autor construtivista.

Segundo Moreira (1999), Vygotsky criou o termo zona de desenvolvimento proximal, que se

refere ao potencial do sujeito para aprender. Na interação com alguém que saiba mais, a zona

de desenvolvimento proximal é ativada, possibilitando a construção de novos conhecimentos.

Moreira (1999) afirma que Vygotsky mencionava a importância dos signos e seus

significados para a aprendizagem e considerava a linguagem o sistema de signos mais

importante para o desenvolvimento cognitivo.

Os outros autores construtivistas citados também contribuíram com diferentes ideias

para a educação com base nos processos cognitivos. Moreira (1999) afirma que Bruner

cunhou o termo aprendizagem por descoberta; Kilpatrick e Dewey defendiam a educação

como um processo democrático, visando à solução de problemas e à aproximação da escola

com a vida cotidiana, conforme mencionamos no início do Capítulo 1; segundo Moreira

(1999), Ausubel criou e popularizou o termo “aprendizagem significativa” e muitos outros

educadores são chamados construtivistas e até hoje desenvolvem ideias nessa abordagem.

Page 61: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

A PP tem influências da abordagem cognitivista e de autores construtivistas. Na PP, o

aluno também é visto como um ser que constrói seu próprio conhecimento a partir da

interação com as outras pessoas e com o mundo. Porém, a PP vai além da cognição, do

conhecimento. De acordo com os princípios da PP, não basta um aluno saber sobre algo, ele

precisa saber usar esse conhecimento a seu favor para ajudá-lo a resolver os possíveis

conflitos com que tenha de lidar durante a vida. Na PP, a aprendizagem não representa apenas

o acúmulo de conhecimentos factuais na mente, mas a aplicação de conhecimentos para o

aprimoramento da vida dos seres humanos.

Mas penso que, sem dúvida, a PP foi influenciada pelos autores construtivistas na

medida em que estes já buscavam uma aprendizagem significativa para os estudantes, uma

aprendizagem que promovesse a reflexão e a construção interna de conceitos próprios,

diferentemente das teorias behavioristas que visam à reprodução dos conhecimentos.

Hernández (1998) afirma que Vygotsky influenciou muito a PP com a noção de

aprendizagem mediante a interação, que é uma das características norteadoras da PP,

assumindo que a aprendizagem se dá na interação entre os participantes do processo

educativo.

Segundo Hernández (1998) e Martins (2001), Dewey e Kilpatrick já defendiam, no

começo do século XX, a aprendizagem baseada na solução de problemas, na investigação de

hipóteses e a aproximação da escola com o cotidiano do aluno, correlacionando teoria e

prática.

A visão deles ultrapassou as ideias do cognitivismo tradicional, que via a

aprendizagem como o acúmulo de estruturas mentais, anunciando uma visão mais global da

aprendizagem, como um processo no qual o aluno se desenvolve e se habilita para resolver e

lidar com questões inerentes à sua realidade.

Page 62: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Falaremos agora da abordagem humanista e suas implicações para a PP.

2.2.4 Abordagem humanista

De acordo com Moreira (1999), a abordagem humanista surgiu na década de 1930 e

tem no psicólogo Carl Rogers seu principal representante. Moreira (1999) afirma que essa

abordagem sustenta a aprendizagem como um processo que envolve o ser humano como um

todo, incluindo os sentimentos, a mente e o corpo. Essa visão do homem por inteiro se opõe

às duas abordagens previamente citadas, pois, na abordagem behaviorista, o que importa é o

comportamento do homem, um comportamento responsivo e esperado. Na abordagem

cognitivista, especialmente naquela anterior ao Construtivismo, o que importa são as

estruturas mentais, o conhecimento que o aluno armazena na mente.

Moreira (1999) afirma que, na abordagem humanista, não se separa a mente do corpo

e não se ignora aquilo que o estudante sente. A abordagem humanista defende a aprendizagem

como um processo que vem enriquecer e preencher a vida do ser humano e por isso não pode

ser um processo maçante, inibidor ou imposto.

Em alguns momentos, quando se lê os textos de Rogers (1987), pode-se pensar que ele

visa a um não-ensino, retornando à Teoria do Crescimento Natural, anterior ao século XX,

pois ele refuta todas as imposições da escola sobre o estudante. Porém, à medida que se

aprofunda na leitura, o leitor se dá conta de que Rogers (1987) não é contra o ensino, mas

contra as amarras que o limitam.

Por exemplo, para Rogers (1987), as formaturas deveriam ser abolidas, pois não se

pára de aprender no momento em que se conclui a escola. As avaliações feitas a partir de

Page 63: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

critérios previamente estabelecidos pelo professor também deveriam ser excluídas do

processo educativo, porque, para Rogers (1987), somente o próprio aluno pode avaliar sua

aprendizagem e a vida será responsável por impor-lhe testes que servirão para medir suas

capacidades.

Moreira (1999) declara-se adepto da abordagem humanista e ressalta que, de acordo

com essa concepção, os seres humanos têm um potencial natural para aprender e a

aprendizagem significante (Rogers, 1987) acontece quando o conteúdo estudado é percebido

pelo aluno como importante para que atinja seus próprios objetivos.

Por outro lado, Rogers (1987) reconhece no ser humano uma resistência à mudança

que muitas vezes é provocada quando ocorre a aprendizagem significante. A aprendizagem

profunda tende a suscitar mudanças às quais os alunos costumam resistir, porque não é fácil

mudar. Moreira (1999) afirma que essas aprendizagens tendem a ser menos ameaçadoras se o

aluno encontra-se em um ambiente estimulante.

A fim de que o ambiente seja estimulante para a aprendizagem, Rogers (1987)

estabelece cinco condições: 1) o aluno precisa ter um problema a ser resolvido; 2) o professor

deve ser uma pessoa congruente, isto é, capaz de ser aquilo que realmente é, sem omitir ou

mascarar opiniões e sentimentos; 3) o professor precisa ter uma verdadeira preocupação pela

aprendizagem e bem-estar do aluno, que Rogers (1987) chama de “consideração positiva

incondicional”; 4) o professor deve ter o que Rogers (1987) nomeia de “compreensão

empática” do mundo do aluno, o que significa ser capaz de colocar-se no lugar do aluno a fim

de compreender como e porque o aluno vê o mundo do modo que o vê; 5) a quinta condição

mencionada por Rogers (1987) para que o ambiente estimule a aprendizagem é que o aluno

perceba no professor pelo menos três das condições anteriormente citadas.

Rogers (1987) salienta que o aluno deve perceber no professor, pelo menos um pouco

Page 64: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

da congruência, preocupação e compreensão deste para com aquele, a fim de que se

estabeleça um ambiente de confiança.

A abordagem humanista pode parecer ingênua em um primeiro momento, quando

assume que o ser humano é bom por natureza, ou quando estabelece que o professor deva ser

sempre verdadeiramente congruente, preocupado e inclinado a entender o aluno. No dia-a-dia

de uma sala de aula se pode perceber que nem sempre o professor sente essas inclinações, que

muitas vezes tem de lidar com seus próprios problemas e parece afastar-se dos interesses de

seus alunos.

Além disso, existem todos os outros problemas da escola que estão além do alcance do

professor, como os problemas pessoais dos alunos, da rotina da escola, do sistema e de toda a

sociedade.

Porém, penso que as proposições humanistas são válidas, pois Rogers (1987) não pede

um professor perfeito, mas sim um professor verdadeiro, que possa ser ele mesmo,

independente de seus problemas ou dos problemas de seus alunos. A abordagem humanista vê

tanto o aluno como o professor como seres que podem concordar ou discordar, argumentar e

discutir, mas que precisam ser verdadeiros durante o processo de aprendizagem.

A abordagem humanista notoriamente influenciou a PP. Embora os conceitos

humanistas não sejam claramente mencionados pela PP, há uma grande semelhança entre a

proposta de ensino humanista e o trabalho com projetos. Assim como na PP, a abordagem

humanista também propõe começar a aprendizagem por um problema e, assim como na PP, a

avaliação estabelecida a partir de critérios externos não é vista como válida. Tanto a

abordagem humanista quanto a PP defendem a aplicação de auto-avaliações para que o aluno

analise sua própria aprendizagem.

A PP, porém, também concebe outros modos de avaliação como válidos, desde que os

Page 65: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

alunos participem do processo de avaliação desde o começo, isto é, desde que os critérios de

avaliação sejam discutidos e estabelecidos de modo democrático.

Tanto a abordagem humanista como a PP visam à uma aprendizagem para a vida, que

leve à realização pessoal, ao desenvolvimento da habilidade de aprender a aprender e ao

estabelecimento de parâmetros que ajudem os estudantes a lidarem com situações

problemáticas ao longo de suas vidas.

Teoricamente, creio que temos os pressupostos perfeitos para uma educação

transformadora, realizadora, completa. A PP aborda o processo de ensino e aprendizagem em

todos os níveis: no nível subjetivo, considerando fatores como motivação e interesse; no nível

de procedimentos, ao estabelecer etapas a serem realizadas em um projeto; no nível de

avaliação, ao conceber uma avaliação democrática que visa ao aperfeiçoamento dos

procedimentos e das técnicas, mais do que ao estatuto do desempenho dos alunos. O que

precisa ser pensado são alternativas para concretizar essa educação dentro da sala de aula em

um sistema de ensino segmentado em disciplinas com um programa curricular a ser cumprido.

É necessário uma adaptação dos princípios da PP à escola atual, para que se possam

trabalhar os aspectos integrais do ser humano dentro de um programa curricular organizado

por disciplinas e conteúdos.

2.2.5 O paradigma emergente

Falaremos agora sobre o paradigma emergente proposto por Behrens (2005). A autora

propõe a aplicação conjunta de três abordagens para a educação contemporânea na

universidade, a saber: abordagem progressista, abordagem holística e abordagem do ensino

com pesquisa. As ideias de Behrens (2005) são pertinentes para este trabalho porque, além de

Page 66: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

propor o ensino mediante a pesquisa, a autora o propõe para a universidade e, neste trabalho

de conclusão, analisamos o trabalho de estagiárias elaborado como um componente do curso

universitário.

Ela propõe esse paradigma inovador para quebrar o antigo paradigma newtoniano-

cartesiano, que fragmenta a ciência em partes esmiuçadas e desenvolvidas pontualmente e

concebe o ser humano como um ser fragmentado em mente e corpo, ignorando características

como emoções, intuição e sentimento.

O paradigma newtoniano-cartesiano fundamentou a ciência nos séculos XIX e XX.

Surgiu com o método científico proposto por Descartes, cuja ideia principal consistia em não

aceitar como científico nada que não pudesse ser comprovado.

Behrens (2005) afirma que esse paradigma possibilitou à sociedade chegar ao atual

nível de avanço tecnológico, mas, por outro lado, foi responsável pela maioria dos problemas

que assombram a humanidade, como a extrema violência, o egoísmo, a valorização do ter em

detrimento do ser e a utilização desgovernada dos recursos naturais do planeta.

Creio que a visão de Behrens é um pouco ingênua no sentido de culpar a tecnologia e

o cientificismo pela maioria dos problemas da humanidade. O avanço tecnológico e científico

pode ter trazido alguns problemas como a acentuação da individualidade, da fragmentação das

ideias e da busca pelo ter em detrimento do ser, mas essas características já estavam presentes

entre os seres humanos anteriormente e, possivelmente, foram apenas agravadas pelas

novidades tecnológicas e científicas.

Dentro do paradigma newtoniano-cartesiano surgiram para o ensino as abordagens

tradicional, escolanovista e tecnicista, que, de acordo com Behrens (2005) visam à reprodução

do conhecimento. Nesse aspecto, discordo de que o objetivo da abordagem escolanovista seja

este. Com base na leitura feita sobre as ideias dos educadores escolanovistas citados por

Page 67: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Behrens (2005), como Dewey (1976) e Rogers (1987), verifiquei que objetivavam ao

desenvolvimento de um ser humano criativo, capaz de produzir conhecimento ao invés de

repetí-lo. Ambos autores argumentam em favor disso ao longo de suas obras.

Behrens (2005) ressalta que a abordagem escolanovista foi mal interpretada ou

implementada superficialmente por algumas instituições de ensino, as quais adotaram de

renovador apenas o discurso, mantendo, na sala de aula, uma visão de transmissão do

conhecimento a alunos passivos.

A autora defende que esse antigo paradigma já não é suficiente para atender às

demandas da atualidade. A humanidade chegou a um nível tecnológico e de conexão global

que requerem que as pessoas sejam capazes de se desenvolverem de modo autônomo,

valorizando sua própria produção.

Para Behrens (2005), a ciência não pode mais ignorar a presença da subjetividade nas

ações humanas. Ela defende que a ciência deve continuar requerendo conhecimento técnico e

factual, mas que esse conhecimento deve estar aliado aos propósitos e objetivos do ser

humano para a produção de novos conhecimentos que o auxiliem na solução de questões e

problemas que venham a surgir e na criação de seus próprios conceitos, desenvolvidos a partir

de reflexão e análise dos fatos e fenômenos.

As três abordagens propostas por Behrens (2005) para compor o paradigma inovador

pretendem preencher essa lacuna no fazer acadêmico. A Abordagem Holística, também

chamada em Behrens (2005) de Abordagem Ecológica ou Sistêmica, vê o ser humano como

um todo, um ser complexo e coletivo, único e valioso. Essa abordagem concebe como papel

das instituições educacionais aprofundarem as relações com o planeta, com a comunidade

global e com o cosmo. A abordagem holística pretende que o homem supere a fragmentação e

recupere a visão do todo.

Page 68: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Segundo Behrens (2005), a Abordagem Progressista, por sua vez, estabelece que a

escola deve ser responsável pela transformação social. Para isso, aluno e professor são

concebidos como sujeitos criativos, produtores de conhecimento e de propostas e trabalham

em uma relação horizontal, de parceria, na busca por essa transformação. A aprendizagem é

vista como um processo infinito, que dura a vida toda.

Na abordagem do Ensino com Pesquisa, Behrens (2005) afirma que o aluno é visto

como um sujeito que produz conhecimento, fazendo uso de tecnologias e recursos diversos e

o professor é o agente que facilita o aprendizado e cria condições para que o aluno aprenda e

aprenda a aprender, todas características em consonância com as ideias dos autores que

defendem a PP, mencionados no capítulo 1.

Por tudo o que foi exposto até aqui, pode-se perceber, neste início do século XXI, uma

inclinação muito grande à inovação na educação, uma vontade de ousar e tentar implementar

modos de ensino e aprendizagem que visem à formação de um ser integral, ético, consciente

de si mesmo e do planeta.

Pode-se perceber um retorno às ideias dos autores escolanovistas e construtivistas, mas

um retorno mais forte, que não aceitará uma transformação apenas nominal porque isso já

aconteceu com o Construtivismo e não trouxe inovações significativas para o processo de

aprendizagem.

Mas como se mudam paradigmas? Como se altera aquilo que se fez e testemunhou por

um longo tempo como sendo a única alternativa? Seria ingênuo pensar que temos a resposta,

mas temos, no trabalho com projetos, no ensino com pesquisa, uma tentativa de ir um pouco

além.

Toda essa trajetória das teorias de aprendizagens, as várias correntes que se destacaram

em diferentes épocas, revelam o quão longa é a caminhada na busca pela educação de

Page 69: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

qualidade.

A PP é um dos pontos a que se chegou com essa caminhada. Ela tem aspectos das

diferentes teorias e tem também características próprias, como o questionamento das

representações únicas da realidade e a postura de que a verdade é relativa e construída

mediante investigação. A PP propõe uma estrutura procedimental a ser seguida na sala de aula

para o ensino e a aprendizagem. As ideias que compõem seus princípios e a estrutura flexível

do trabalho com projetos delineiam a aplicação da PP em sala de aula.

Uma das vantagens da PP é que ela é tão flexível que pode ser aplicada no currículo

atual complementando o ensino em uma tentativa de torná-lo mais significativo e procurando

equilibrar a extensiva fragmentação das disciplinas e a realidade complexa e múltipla com que

o estudante se depara na vida.

No capitulo a seguir, apresentaremos a metodologia seguida para o desenvolvimento

da pesquisa realizada neste trabalho, falaremos sobre os projetos analisados, sobre as escolas

e as condições de aplicação desses projetos, procurando refletir sobre a sua aplicação e as

ideias sobre aprendizagem até aqui expostas.

Page 70: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

3 METODOLOGIA

3.1 Contexto da Pesquisa

Para o desenvolvimento desta pesquisa, realizou-se entrevistas com três

estagiárias da disciplina de Prática de Ensino de Língua Inglesa no Ensino Fundamental e

Médio do Curso de Letras, habilitações Inglês e Português/Inglês da UNISINOS, que

trabalharam com projetos durante seu estágio, e procedeu-se à leitura de seus relatórios da

Prática de Ensino.

Esses três projetos foram selecionados porque foram considerados coerentes e

bem-sucedidos pela Supervisora da Prática, atingindo os objetivos propostos nos projetos e

seguindo as etapas previstas para uma aplicação de projeto efetiva. Outra razão para a escolha

destes três projetos se deu porque as estagiárias que os aplicaram foram colegas da autora

deste TC na disciplina de Prática, o que facilitou meu acesso a elas.

Duas das entrevistas foram respondidas por escrito, enquanto uma delas foi feita

oralmente, gravada e transcrita. As entrevistas ocorreram no segundo semestre de 2008, nos

meses de agosto e setembro. Os projetos haviam sido elaborados e aplicados no primeiro

semestre de 2006.

Os instrumentos utilizados para a pesquisa foram as entrevistas e os relatórios da

Prática de Ensino. Optou-se pela escolha desses instrumentos porque: 1) o relatório é o

documento mais completo de que se tem registro sobre o projeto, uma vez que não temos

mais acesso às atividades, produções e instrumentos de avaliação utilizados, exceto aos

anexados nos relatórios; 2) a entrevista é a forma mais eficaz de obter informações sobre o

trabalho das estagiárias, porque, na entrevista temos acesso à professora que elaborou e

aplicou o projeto e podemos saber a visão que ela tem sobre o trabalho com projetos.

Page 71: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Visto que os projetos foram aplicados em 2006, não teríamos mais acesso aos

alunos e não poderíamos fazer observação de aulas. Os relatórios e entrevistas foram os

instrumentos encontrados para obter informações sobre os projetos aplicados.

3.2 Análise

A presente pesquisa tem como objetivo analisar três projetos escolares

desenvolvidos por estagiárias da disciplina de Prática de Ensino de Língua Inglesa do Curso

de Letras da UNISINOS, a fim de investigar que tipo de ensino de língua inglesa tem sido

desenvolvido nos estágios da Prática de Ensino, de que modo a PP é aplicada no ensino e

aprendizagem de língua inglesa nos estágios e a influência que a aplicação dos projetos teve

na vida profissional das estagiárias, após a graduação na universidade.

A escolha de investigar o uso da PP nos estágios de LI se deu por que:

Durante a disciplina de Prática, a supervisora estimulou os estagiários a trabalhar

em projetos de trabalho, mas, durante sua vida escolar, as estagiárias entrevistadas não

trabalharam com projetos, o que significa dizer que não tiveram a vivência de projetos

enquanto alunas (exceto por alguns projetos já elaborados na faculdade).

Os PCNs (1998) afirmam que a aprendizagem de uma LE deve acontecer de

modo significativo, contextualizado e com enfoque social, porque a língua é um modo de

socialização. Mediante os projetos, os alunos interagem entre si, com o professor e com o

mundo, podendo utilizar a língua em uma situação em que ela seja, de algum modo,

necessária.

Pretende-se discutir se, nas três situações práticas analisadas, as estagiárias

conseguiram propiciar a seus alunos momentos de reflexão crítica sobre o mundo, de

interação entre os participantes do processo de aprendizagem e de uso da língua com

Page 72: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

propósitos delimitados e claros.

Pretende-se discutir se as estagiárias conseguiram fazer com que os alunos

utilizassem a língua com um propósito real e pensassem criticamente sobre um tema, se

houve uma diferença entre o projeto aplicado e a aula de inglês de “todos os dias”. Deseja-se

saber, também, se as estagiárias viram nos projetos uma alternativa ao ensino de inglês, se

acharam que contribuíram, com os projetos, para que os alunos tivessem uma aprendizagem

significativa e se pretendem usar ou usam projetos em sua vida profissional atual.

Esse trabalho pretende contribuir para minha formação enquanto uma

oportunidade de revisar a bibliografia sobre projetos de trabalho, sobre teorias de

aprendizagem e sobre concepções de língua e aprendizagem, complementando com

orientações dos PCNs para o ensino de LE. Tudo isso fornece uma base teórica para analisar

os relatórios e as entrevistas e tentar chegar a um panorama sobre o ensino e a aprendizagem

objetivados nos estágios.

A pesquisa se fundamenta em quatro perguntas norteadoras:

1 Que tipo de ensino de língua inglesa tem sido desenvolvido nos estágios de língua

inglesa no Curso de Letras, a partir da opção pela Pedagogia de Projetos?

2 Com qual concepção de língua as professoras-estagiárias trabalharam durante a

aplicação de seus projetos no estágio?

3 Que tipo de aprendizagem os professores-estagiários relatam ter promovido, na

medida em que o projeto era aplicado e ao seu término?

4 Como o trabalho com a Pedagogia de Projetos no estágio influenciou a vida

profissional das professoras-estagiárias, após a universidade?

Como já mencionado anteriormente, as entrevistas ocorreram nos meses de agosto

e setembro de 2008, a leitura e análise dos relatórios foi feita nos meses de setembro e

Page 73: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

outubro do mesmo ano e os projetos tinham sido aplicados no primeiro semestre de 2006.

Essa distância cronológica entre a aplicação dos projetos e as entrevistas e análise

dos relatórios pode ter deixado de lado aspectos relevantes da aplicação dos projetos, como a

opinião dos alunos e a atmosfera de trabalho em sala de aula, mas pode também contribuir

para que sejam analisados apenas os dados que ficaram impressos na memória das

entrevistadas, porque são os mais relevantes na visão destas.

Temos consciência de que estamos analisando apenas dados relatados pelas

professoras-estagiárias nas entrevistas e nos relatórios e que, para obtermos dados sobre a

aprendizagem sob o ponto de vista dos alunos, deveríamos ter observado aulas e colhidos

opiniões dos estudantes na época em que os projetos estavam sendo desenvolvidos.

Isso não foi feito porque a escolha de analisar a PP a partir desses projetos ocorreu

após a conclusão da disciplina e seria inviável conseguir acesso a esses alunos e impossível

conseguir registros diretos das aulas, pois essas não foram registradas em vídeo ou com

gravadores de voz.

Mas acreditamos que o caminho percorrido tem sua relevância, e,

independentemente das considerações finais, a investigação é válida porque foi feita nos

moldes propostos por Behrens (2005) de valorização da pesquisa, da investigação realizada

pelo aluno e do conhecimento por ele produzido.

Dois dos projetos foram aplicados em escolas particulares, uma situada na cidade

de São Leopoldo e a outra situada no município de Lajeado. O outro projeto foi aplicado em

uma escola pública estadual, também situada na cidade de São Leopoldo.

O primeiro projeto analisado foi aplicado em uma escola particular de São

Leopoldo, em uma sexta série do Ensino Fundamental, uma turma com aproximadamente

trinta alunos e alguns casos especiais. De acordo com a estagiária, havia na turma um

Page 74: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

estudante em situação de inclusão, uma estudante com dislexia e alguns alunos com déficit de

atenção, o que, segundo a professora-estagiária, tornava a turma bastante agitada e seu

trabalho mais desafiador.

Esta estagiária, porém, era a professora titular dos alunos. Portanto, os conhecia

bem, já os tendo acompanhado desde o começo do ano letivo. O nome do projeto aplicado foi

Healthy Eating (alimentação saudável) e foi aplicado entre os meses de maio a junho de 2006.

O grupo utilizava livro didático nas aulas de inglês. O nome do livro era Our Way

e a professora seguia a ordem do livro na programação dos conteúdos. Durante o

planejamento de seu projeto de Prática de Ensino, a professora-estagiária trabalharia,

seguindo o livro didático, o caso imperativo na língua inglesa, com o estudo do caso

imperativo em receitas de alimentos.

Junto à sua professora orientadora da Prática de Ensino, a estagiária verificou que

trabalhar o imperativo apenas em receitas culinárias não seria o suficiente para que os alunos

compreendessem o uso desse modo verbal. Ela percebeu que seria necessário ir além do livro,

trabalhando com os alunos exemplos de outros usos do caso imperativo.

A estagiária decidiu que buscaria, além das receitas e exercícios propostos no

livro, receitas culinárias em língua inglesa extraídas da internet para trabalhar com seus

alunos material autêntico no idioma e procurar incentivá-los a adotar uma alimentação

saudável.

A produção final do projeto seria a elaboração de uma receita de salada de fruta

em inglês, que os alunos deveriam entregar à professora-estagiária como parte de sua

avaliação trimestral. Após a entrega da receita escrita, a estagiária e os alunos fariam uma

receita de salada de frutas na sala de aula e produziriam um videoclipe da elaboração da

receita, utilizando uma canção em inglês, cuja letra é uma receita de salada de fruta.

Page 75: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Conforme comenta em sua entrevista, a estagiária iniciou o projeto apresentando-

o aos estudantes e detalhando qual seria a produção final8 e os principais objetivos do projeto,

a saber: a discussão sobre uma alimentação saudável; o trabalho com os imperativos e a

elaboração de uma receita culinária.

O primeiro procedimento da professora foi distribuir entre os alunos uma

pirâmide alimentar em branco, para que, em conjunto, a completassem. A professora

apresentou as categorias em que a pirâmide se divide (dairy, vegetables, fruit, fat,

carbohydrates e proteins) e pediu aos alunos que dissessem nomes de alimentos em inglês

que se encaixassem em cada categoria.

Os alunos disseram os nomes dos alimentos que conheciam em inglês e, depois

que já tinham dito todos os alimentos que conheciam na língua inglesa, a professora pediu a

eles que dissessem outros em português enquanto ela os ia traduzindo e os inserindo na

pirâmide.

Quando a pirâmide estava completa, contendo os alimentos principais, como

proteínas, vegetais, frutas, carboidratos e laticínios, a professora pediu que os alunos

elaborassem uma dieta saudável em seus cadernos, usando o imperativo: eat ... , don’t eat ... ,

eat only .... A dieta não deveria ter como objetivo nem ganho, nem perda de peso. Os alunos

deveriam fazer de conta que eram nutricionistas elaborando uma dieta saudável a um

paciente.

Deveriam também especificar a quantidade de porções diárias (servings) de cada

categoria de alimentos. Essa atividade foi elaborada no caderno, com a supervisão da

professora. O objetivo era revisar e introduzir vocabulário referente a alimentos em inglês e

8.... Durante as discussões realizadas na disciplina de Prática antes dos estágios, a supervisora da Prática explicitou que os estagiários deveriam estabelecer uma produção final que seria o objetivo principal do projeto, o que se alinha com a estrutura de um projeto, apresentada na seção 1.4 do capítulo 1 deste trabalho.

Page 76: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

iniciar o estudo do caso imperativo.

A professora procurou também, com essa atividade, ativar conhecimentos prévios

dos alunos sobre o vocabulário referente a alimentos em inglês. A segunda atividade tinha

como objetivo familiarizar os estudantes com o gênero textual receita culinária em inglês. A

professora utilizou duas receitas presentes no livro didático e trouxe outras duas receitas

extraídas da internet. Nessa atividade, os alunos deveriam ler as receitas e enumerar as partes

do modo de preparo na ordem apropriada para a elaboração do prato9.

Durante essa etapa, a professora-estagiária foi chamando a atenção dos alunos

para as partes de uma receita culinária, a estrutura do texto e a linguagem utilizada. Também

visando a ativar conhecimentos prévios, a professora perguntou aos alunos quais as partes que

compõem uma receita, o que todas as receitas têm em comum e a quem se dirigem. A

professora pretendia que os alunos estivessem conscientes de como se elabora uma receita

culinária e do vocabulário envolvido, em inglês.

Na entrevista, a professora-estagiária enfatizou que não há como exigir que os

alunos produzam um tipo de texto se eles não conhecem sua estrutura e não têm modelos e

exemplos de como fazê-lo.

Depois de ter trabalhado com a leitura de receitas e exercícios relacionados, o

grupo partiu para a elaboração da produção final, a receita da salada de frutas. A professora

estabeleceu que a receita deveria ser escrita em dois períodos. No primeiro, os alunos

escreveriam um rascunho e o mostrariam à professora a fim de esclarecer dúvidas. No

segundo período, o rascunho seria passado a limpo e a escrita da receita seria finalizada.

Os alunos fizeram suas produções, alguns com maior, outros com menor

dificuldade. A professora-estagiária relata que uma das alunas estava muito insegura e trouxe

9.... ANEXO 1.

Page 77: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

sua receita pronta de casa. A estagiária conta que conversou com ela e procurou estimulá-la a

fazer sua própria receita, afirmando que acreditava em sua capacidade e potencial.

Após um pouco de insistência, a professora-estagiária afirma ter conseguido fazer

com que a aluna desenvolvesse sua receita e que o resultado ficou muito bom. A aluna inseriu

frutas diferentes, de que gostava, e o resultado final foi muito positivo, seguindo

eficientemente a estrutura de receita culinária estudada nas aulas anteriores.

A estagiária relata, em sua entrevista, a estranheza dos alunos com relação ao uso

do dicionário. De acordo com ela, eles ainda precisariam de muito auxílio no sentido de se

familiarizarem com essa ferramenta, pois ainda encontravam dificuldades quando precisavam

buscar um verbo ou uma palavra em sentido figurado.

Na aula seguinte à elaboração da produção final, que seria a última do estágio, os

alunos fizeram a salada de fruta na sala de aula. Trouxeram os ingredientes e utensílios

necessários, produziram a salada de fruta, comeram-na, tiraram fotos e limparam a sala

depois. A estagiária relata ter aproveitado a oportunidade para trabalhar a questão do

imperativo nas instruções para a elaboração da salada de frutas e para a organização e limpeza

da sala, após o preparo do alimento.

Ela conta ter trabalhado frases como don’t point the knife at the classmates (não

aponte a faca para os colegas) e clean the room after the mess (limpe a sala depois da

bagunça), durante a aula de preparo da salada de fruta. A estagiária relata, na entrevista, que,

depois do projeto, o uso do imperativo passou a fazer parte da rotina de sala de aula daqueles

alunos. Praticamente em todas as aulas de inglês, tanto a professora-estagiária quanto eles

começaram a usar mais o imperativo no inglês, com expressões como sit down (sente-se),

come here, please (venha cá, por favor) etc.

A estagiária apontou o projeto como bem sucedido, mostrando-se satisfeita com o

Page 78: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

desempenho dos estudantes e o seu. Segundo ela, o diferencial do projeto foi o engajamento

dos estudantes. Eles participaram e se comprometeram com as aulas mais do que costumavam

fazer nas aulas de inglês guiadas somente pelo livro didático. A professora atribui esse

engajamento dos alunos à exposição clara dos objetivos e do que seria esperado dos alunos ao

longo da aplicação do projeto.

Ela afirmou, durante a entrevista, que esse é o grande diferencial do trabalho com

projetos: os alunos sabem o que irão fazer e porquê. A professora diz ter conseguido trabalhar

de maneira muito mais eficiente a questão do gênero textual estudado, no caso, receita

culinária, porque os alunos, além de escreverem uma receita, teriam que fazê-la depois e, por

isso, a receita deveria ser clara e cumprir esse propósito.

Embora fosse a professora regular da turma, a professora-estagiária não trabalhou

interdisciplinarmente com outro professor na aplicação desse projeto. Quando questionada

sobre isso, ela afirmou que poderia ter trabalhado em conjunto com a professora de Ciências,

mas optou por não fazê-lo porque a professora de Ciências já havia trabalhado a questão da

alimentação em suas aulas, no início do ano letivo. Portanto, não havia porque trabalhá-la de

novo.

Porém, segundo a professora-estagiária, o fato de os alunos já terem trabalhado

com esse assunto ajudou no desenvolvimento do projeto nas aulas de inglês. Os alunos já

estavam familiarizados com a pirâmide e com a questão da alimentação saudável, o que

colaborou quando esse assunto foi abordado no idioma estrangeiro.

Desse modo, pode-se pensar neste trabalho como uma forma de

interdisciplinaridade. A estagiária sabia que o assunto já havia sido trabalhado em outra

disciplina e o retomou, enfocando, em seu projeto, além da alimentação saudável, a estrutura

de uma receita e o vocabulário em inglês relativo à alimentos e receitas culinárias.

Page 79: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Um aspecto do projeto que deixou os alunos bastante motivados, além da clareza

na exposição do trabalho que seria realizado, foi a leitura de receitas autênticas, cuja fonte

estava presente na folha lida, e que realmente poderiam ser acessadas na internet em outros

momentos. A professora-estagiária afirma que os alunos ficaram encantados por ler textos que

estavam realmente na rede.

Quando perguntada sobre os temas transversais, a estagiária relatou que trabalhou

a questão da saúde alimentar, mas que não poderia medir o impacto que esse projeto teve nos

alunos no sentido de chamar sua atenção para a importância de uma alimentação saudável,

porque ela acredita ser muito difícil perceber os impactos na vida dos alunos como um todo

quando se passa com eles cem minutos por semana.

Ela afirma ter percebido algumas mudanças em outros aspectos, por ter sido sua

professora ao longo do ano, mas não relacionadas a esse projeto exatamente. Ela afirma ter

auxiliado seus alunos a conhecer melhor o gênero receita e os ter estimulado a experimentar

receitas diferentes em casa, indo para a cozinha.

A professora-estagiária avaliou o desempenho dos alunos da seguinte forma:

avaliou o texto da produção final, utilizando como critérios a apropriação do gênero, a divisão

e organização das partes de uma receita, a ortografia e a gramática empregada, especialmente

o uso do imperativo. Avaliou também a colaboração na aula em que fizeram a salada de fruta,

se os alunos trouxeram as frutas e materiais solicitados e se auxiliaram na elaboração e na

limpeza.

De acordo com a professora-estagiária, os alunos avaliaram positivamente o

projeto, solicitando esse tipo de trabalho com maior freqüência. A professora-estagiária afirma

que os alunos colaboraram uns com os outros e interagiram ao longo do projeto, embora

afirme que o fizeram como sempre o fazem: “daquele jeito tumultuado deles”.

Page 80: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Por se tratar de seu estágio, a professora afirma ter aplicado o projeto de uma

maneira assimétrica, ou seja, não deixando muito espaço para que os alunos escolhessem os

modos de trabalho. Ela afirma ter feito isso porque ainda não estava familiarizada com o

trabalho com projetos e temia que seus alunos, também desconhecedores desse modo de

trabalho em sala de aula, criassem uma situação que acabasse tomando outro rumo.

A professora afirma ter incorporado o trabalho com projetos em seus afazeres

profissionais. Ela aplica cerca de três projetos com cada turma por ano, nessa mesma escola

onde desenvolveu sua Prática de Ensino. O projeto aplicado no estágio foi revisado, sofreu

algumas adaptações e aperfeiçoamentos, como por exemplo, a seleção de outras receitas

culinárias, agora com maior poder de escolha dos alunos, e continua sendo aplicado por ela

em algumas sextas séries.

Ela afirma que, no começo de sua carreira como professora, o trabalho com

projetos era muito difícil, pois exigia muita pesquisa e preparação. Com o passar do tempo,

porém, trabalhar com projetos ficou mais prático, porque ela se adaptou a essa abordagem e

passou a reciclar alguns projetos já utilizados, intercalando projetos antigos e novos.

A segunda estagiária entrevistada aplicou seu projeto em uma oitava série de uma

escola particular, no município de Lajeado. Ela afirma ter escolhido essa escola porque havia

recebido um convite da professora titular da turma no ano anterior, quando foi à escola a fim

de observar aulas para outra disciplina do Curso de Letras.

A turma em que seu projeto foi aplicado era pequena, com cerca de vinte alunos.

Uma das alunas era portadora da Síndrome de Down, enquanto outra sofria de déficit de

atenção. A estagiária afirma que, durante as observações, notou que a turma tinha

pouquíssimo conhecimento do idioma, o que a motivou a trabalhar com os alunos vocabulário

básico referente a si mesmos.

Page 81: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

O projeto aplicado chamava-se “The world around me: my classmates and my

family” (O mundo ao meu redor: meus colegas e minha família). Os objetivos eram trabalhar

com vocabulário relacionado à vida e à família dos adolescentes, a fim de que pudessem se

expressar sobre isso no idioma estrangeiro, fazer entrevistas utilizando perguntas e respostas

no idioma, preencher uma tabela com o vocabulário estudado e escrever a produção final, que

seria uma carta apresentando-se a um amigo em potencial e perguntando-o sobre sua vida e

sua família. As cartas seriam lidas e respondidas por estudantes de um primeiro ano de uma

outra escola na mesma cidade.

Segundo dados de seu relatório, a estagiária iniciou o projeto explicando aos

alunos o que seria feito no período em que atuaria como professora deles, a produção final (a

carta), os objetivos e as atividades.

Em seguida, a professora-estagiária começou a apresentação de conteúdos com

um jogo de introdução. Ela colou no quadro-negro um mini-poster contendo as seguintes

frases: my name is ..., I am .... years old e I live in .... Ela começou o jogo modelando-o,

dizendo essas informações sobre si mesma e, em seguida, pediu a um aluno que fizesse o

mesmo, segurando a ponta de um novelo de lã e jogando para o colega solicitado. Todos os

alunos deveriam jogar o novelo a um colega, segurando uma ponta do fio e cada colega que

recebesse o novelo deveria se apresentar utilizando as estruturas introduzidas pela professora-

estagiária.

A segunda parte era composta por outro jogo, no qual cada aluno deveria escolher

uma pessoa famosa, dizer seu nome e a cidade onde mora em inglês e em seguida reunir-se

em pares para que cada par apresentasse a “celebridade” a seu lado. Nesse momento, a

professora colou mais um mini-poster no quadro-negro, desta vez contendo as estruturas: He/

She is ..., He/She is ... years old, He/She lives in ....

Page 82: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

A terceira atividade da primeira aula foi a leitura de um texto: “Maurizio’s life”10.

A professora solicitou aos alunos que o lessem silenciosamente. Em seguida, os alunos

ouviram o texto no CD player e, por último, a professora foi trabalhando o significado do

texto com os alunos, perguntando a eles que informações estavam em cada frase e como se

perguntaria por aquela informação em inglês, como: What's your name?, Where are you

from?, What do you study?, por exemplo.

A estagiária e os alunos trabalharam essas perguntas e respostas e, no final da

aula, ela solicitou que os alunos entrevistassem um parente, como tema de casa, utilizando as

novas perguntas estudadas.

Na segunda aula, a professora-estagiária pediu a alguns alunos que lessem suas

entrevistas e foi colocando algumas perguntas e respostas no quadro-negro, a fim de revisar o

conteúdo trabalhado. Em seguida, a classe continuou com a leitura do texto sobre Maurizio,

lido na aula anterior, e a estagiária aproveitou algumas frases para apresentar o tempo verbal

Present Progressive (Presente Progressivo).

Quando terminou a leitura do texto, a estagiária solicitou aos alunos que

entrevistassem seus colegas, utilizando as estruturas vistas na aula anterior. Depois que os

alunos as praticaram por alguns minutos, a professora organizou o que ela chamou de

Chocolate Game (Jogo do Chocolate). Nesse jogo, os alunos responderam a mais algumas das

perguntas trabalhadas na aula anterior, enquanto tentavam abrir uma barra de chocolate com

uma faca e um garfo. Ao fim do jogo, a professora pediu aos alunos que fizessem, como tema

de casa, alguns exercícios, nos quais responderiam perguntas sobre si mesmos em inglês.

Na terceira aula, os alunos tiveram um teste que já estava marcado e que fora

elaborado pela professora titular da turma. O teste era sobre o modo imperativo, o uso de Let's

10 Anexo 2.

Page 83: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

e os plurais irregulares. A professora-estagiária colaborou com duas questões no teste,

referentes a informações pessoais, tema que estava trabalhando no projeto.

Após o teste, a estagiária recolheu os exercícios que havia solicitado como tema

de casa e distribuiu entre os alunos um outro texto, extraído da internet, sobre outro rapaz, de

nome Billy. O objetivo desse texto seria estimular os alunos a aprenderem mais quatro

perguntas em inglês: How old are you? What do you like to do? What grade are you in?

Where do you study?

Os alunos deveriam preencher uma tabela com essas informações e a professora

os auxiliaria a desenvolver as perguntas para, logo em seguida, entrevistar os colegas,

utilizando-as. Como tema, a professora solicitou aos alunos que terminassem de preencher a

tabela.

Na quarta aula, a estagiária ajudou os alunos perceberem as diferenças entre dar

informações sobre si mesmo e falar sobre outras pessoas. Ela enfatizou o uso dos pronomes

nas frases: My name is ... / Her name is ... e pediu aos alunos que elaborassem nove perguntas

buscando informações sobre um amigo.

Em seguida, a professora-estagiária questionou os alunos sobre o formato de uma

carta, perguntando a eles o que uma carta deve conter, como se inicia e se termina uma carta e

quais marcas mostram a quem a carta se dirige. A professora-estagiária pediu aos alunos que

produzissem sua carta com as estruturas até então estudadas e recolheu as cartas produzidas

no final da aula. Como tema, a professora solicitou aos alunos que entrevistassem um parente

ou amigo, utilizando todas as nove perguntas estudadas no início da aula.

Na última aula, a estagiária fez a correção do tema com os alunos e devolveu-lhes

as cartas, escritas na aula anterior, a fim de proceder à reescrita11. Após a reescrita das cartas,

11.. Alguns exemplos da produção final encontram-se no ANEXO 3.

Page 84: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

os alunos fizeram uma auto-avaliação e avaliaram o trabalho da estagiária. A aula e o projeto

foram encerrados com um jogo de perguntas e respostas, no qual meninos e meninas

competiram uns contra os outros.

Tanto na entrevista quanto no relatório, a professora-estagiária considerou que seu

estágio foi bem-sucedido, porque conseguiu fazer com que os alunos produzissem na língua

estrangeira, partindo de um conhecimento quase nulo do idioma, o que havia verificado

durante o período de observação. A estagiária considera que os objetivos foram atingidos

porque os alunos estavam fazendo algo que seria realmente útil para suas vidas: novas

amizades através de cartas e também porque eles trabalharam os conteúdos a partir de textos e

situações contextualizadas, não a partir de regras gramaticais isoladas.

De acordo com a professora-estagiária, a turma foi bastante colaborativa. Os

alunos cooperaram uns com os outros na elaboração das cartas e procuraram auxiliar os

colegas com mais dificuldades. Durante o estágio, ela afirma não ter trabalhado

interdisciplinarmente porque já estaria interferindo o suficiente na rotina da escola por estar

atuando na sala de aula de outra pessoa.

Porém, na entrevista, a estagiária defendeu a interdisciplinaridade no trabalho com

projetos, afirmando que é interessante para o desenvolvimento do aluno no sentido de

estabelecer relações com as outras disciplinas.

A terceira professora-estagiária entrevistada aplicou seu projeto em uma sétima

série do Ensino Fundamental, em uma escola estadual, localizada na cidade de São Leopoldo.

O nome do projeto era Do we want a healthy diet? (Nós queremos uma dieta

saudável?) Os alunos iriam trabalhar vocabulário referente à alimentação para elaborar sua

produção final, que foram posteres com sugestões de cardápio para a cantina do colégio.

A professora-estagiária teve de fazer alterações em seu projeto inicial porque a

Page 85: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

professora titular da turma solicitou que ela trabalhasse o artigo indefinido e os substantivos

contáveis e incontáveis. Seu plano inicial era produzir um scrapbook (álbum de recortes) com

informações pessoais sobre os estudantes, como sua família, seus amigos, informações

pessoais e habilidades.

Uma vez que a estagiária teve de fazer alterações no conteúdo trabalhado, ela

modificou o projeto. Ela iniciou o projeto mostrando duas figuras aos alunos, uma contendo

comida saudável e a outra contendo alimentos considerados prejudiciais à saúde. Com essas

figuras, começou-se uma discussão sobre hábitos saudáveis e preferências alimentares.

Em seguida, a estagiária explorou uma pirâmide alimentar que havia no livro

didático que os alunos utilizavam12 , explicitando para que servia essa pirâmide e o

vocabulário presente. Após a observação da pirâmide, a professora-estagiária desenhou uma

tabela no quadro-negro, com o título: things we can eat or drink (coisas que podemos comer

ou beber). A estagiária dividiu a tabela em quatro partes: for breakfast, for lunch, for dinner,

for snack (no café da manhã, no almoço, no jantar, no lanche). Os alunos deveriam completá-

la como tema de casa.

Na segunda aula, a professora-estagiária examinou a tabela com os alunos e pediu

que eles produzissem sua própria pirâmide alimentar em inglês, para entregar. O objetivo

dessa atividade era fixar o vocabulário estudado até ali.

Na terceira e quarta aulas, os alunos leram uma receita de salada de fruta, a partir

da qual a professora-estagiária trabalhou o artigo indefinido. Ao explorar a receita, a estagiária

questionou os alunos sobre o uso de a / an, perguntando a eles o que sabiam sobre o tópico e

explicando as regras de uso desses artigos.

A professora escreveu essas regras no quadro-negro, em português, explicando

12.. O nome do livro didático não consta no relatório de estágio e a estagiária não lembrou seu nome na entrevista.

Page 86: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

quando se usa a e quando se usa an e solicitou aos alunos que completassem um exercício de

preencher lacunas com esses artigos.

Na quinta aula, os alunos fizeram um teste sobre o artigo indefinido e, após o

teste, a estagiária promoveu atividades lúdicas, como bingo e jogo da velha, revisando o

vocabulário sobre comida e os artigos indefinidos.

Na sexta aula, a professora-estagiária revisou o conteúdo do teste, o que era

obrigatório, segundo as normas da escola, e iniciou o trabalho com substantivos contáveis e

incontáveis.

Para isso, a estagiária trouxe porções de alimentos, como açúcar, e alguns objetos,

como colheres e potes, que auxiliariam os alunos a compreender a diferença entre

substantivos contáveis e incontáveis. Depois de trabalhar exemplos com os alunos,

escrevendo-os no quadro-negro, as regras foram também explicadas, escritas no quadro-negro

e copiadas pelos alunos em seus cadernos. Em seguida, os alunos fizeram dois exercícios: no

primeiro, deveriam corrigir frases com erros sobre o uso dos números dos substantivos e, no

segundo, deveriam reescrever frases transformando os substantivos incontáveis em contáveis.

Na oitava aula, a professora-estagiária perguntou aos alunos sobre os alimentos

disponíveis na cantina da escola e distribuiu entre a turma um trecho de um artigo do “The

New York Times” sobre as bebidas permitidas e proibidas, por lei, nas cantinas escolares

daquele país13. O texto foi lido, seu vocabulário foi trabalhado e o grupo discutiu a respeito do

artigo.

A estagiária pediu aos alunos que, em grupos de quatro componentes, elaborassem

um poster com itens que eles gostariam que fossem disponibilizados na cantina da escola,

justificando a razão pela qual cada item foi selecionado.

13 ANEXO 4.

Page 87: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

Na nona aula, os alunos continuaram a produzir seus posteres e os alunos foram

liberados da aula para assistir ao jogo de futebol do Brasil, pois era época de Copa do Mundo

e a escola havia alugado uma tela para os estudantes assistirem ao jogo.

Na décima e última aula, os alunos concluíram e apresentaram seus posteres,

discutindo-os com os colegas. O projeto foi encerrado com uma reflexão sobre as escolhas da

turma em seus posteres, em comparação com o artigo publicado no “The New York Times”. A

turma concluiu que nem sempre prefere uma alimentação saudável e que eles têm o direito de

decidir o que vão comer na escola.

As três estagiárias entrevistadas relatam que conseguiram atingir os objetivos

propostos em cada projeto. Elas atribuem esse sucesso ao comprometimento dos alunos.

Conforme relatam nas entrevistas, pelo fato de os objetivos terem sido explicados e

estabelecidos nas primeiras aulas dos estágios, com os projetos, as estagiárias conseguiram

obter um engajamento satisfatório, o que permitiu aos alunos produzir, na língua estrangeira,

material de qualidade.

As três estagiárias aplicaram seus projetos tendo em vista uma produção final, que

englobou a escrita em um gênero textual específico: 1) receita culinária; 2) carta; e 3) poster.

Todas trabalharam também conteúdos gramaticais previamente planejados no plano de ensino

das escolas: 1) imperativo; 2) presente simples; e 3) artigo indefinido e substantivos contáveis

e incontáveis.

Para trabalhar os tópicos gramaticais, todas elas partiram de textos, que foram

usados como modelo e preparação para a produção final. A apresentação dos conteúdos

gramaticais foi feita de maneira contextualizada. Os alunos trabalharam em dois níveis

interligados: o nível do gênero e o nível da gramática, somando a isso o nível do input

(apresentação) de vocabulário.

Page 88: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

As três professoras procuraram levar em conta o conhecimento prévio de seus

alunos. Todas elas iniciaram tarefas e discussões perguntando aos alunos o que conheciam e

pensavam sobre os temas trabalhados.

Isso nos leva a crer que o ensino objetivado nos estágios, a partir da opção pela

PP é um ensino que se centra na aprendizagem do aluno, buscando valorizar seus

conhecimentos e auxiliá-lo a se desenvolver com motivação e interesse.

A concepção de língua enquanto modo de ação no mundo esteve presente nos três

projetos. No entanto, nota-se também, a presença, no plano de ensino das escolas, da

concepção tradicional da língua enquanto sistema de regras e do ensino a partir de conteúdos,

pois as três estagiárias tiveram de selecionar tópicos gramaticais segundo o currículo das

escolas e trabalharam seus projetos a partir deles.

O ponto de partida para o planejamento foi a gramática, por exigência do

currículo que as escolas seguiam. A partir da gramática, as estagiárias procuraram gêneros

textuais que contivessem o tópico gramatical planejado para apresentar a gramática a partir de

textos e trabalhar assuntos que fossem interessantes para os alunos.

Se, por um lado, as estagiárias partiram da gramática para planejar seus projetos,

no que concerne à visão sobre aprendizagem, as três estagiárias buscaram alternativas mais

inovadoras para concretizar suas aulas. As três procuraram trabalhar com jogos e atividades

lúdicas para praticar e revisar os assuntos estudados e buscaram fazer os alunos se sentirem

confortáveis e engajados nas atividades, promovendo atividades que atraíram seu interesse.

Procuraram, também, trabalhar com materiais autênticos e aprofundar-se nas

estruturas dos gêneros textuais que compunham a produção final, a fim de propiciar segurança

aos alunos no momento em que tivessem de elaborar suas próprias produções.

O planejamento dos projetos foi feito antes dos estágios, o que implica afirmar

Page 89: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

que os alunos, nos três projetos, não tiveram muitas oportunidades de opinar e decidir nas

tomadas de ações durante os projetos. Pelo fato de não conhecerem as turmas muito

profundamente, a segunda e terceira estagiárias entrevistadas relatam que preferiram

direcionar a maneira de trabalho, a fim de sentirem-se mais seguras. Outro fator que

contribuiu para essa verticalidade na aplicação dos projetos foi a inexperiência da segunda e

terceira entrevistadas em salas de aula de ensino regular e a inexperiência das três estagiárias

no trabalho com projetos.

Por não saberem como esse tipo de trabalho funcionaria, as três preferiram não

dar tanta liberdade aos alunos durante as escolhas das ações dos projetos. O que todas elas

relatam ter feito é ter aberto espaço para os alunos exporem suas opiniões e argumentarem em

favor delas, configurando-se assim, a concepção da escola como um lugar no qual o aluno

aprende a se posicionar no mundo e a argumentar em favor de sua opinião, de forma

democrática e aberta.

Nenhuma das estagiárias trabalhou com outros professores da escola de forma

interdisciplinar durante seus projetos. A primeira e a segunda estagiárias entrevistadas

mencionaram a interdisciplinaridade como uma forma importante de trabalho na escola.

Como anteriormente mencionado, a primeira professora, a única titular da turma em que

aplicou seu projeto, relata não ter trabalhado com outro professor porque o tema tratado em

seu projeto já havia sido trabalhado na aula de Ciências, disciplina que poderia trabalhar em

conjunto a respeito do tópico. Mesmo assim, pode-se notar, em seu projeto, uma característica

interdisciplinar por ter trabalhado um tópico de outra disciplina: Ciências.

A segunda estagiária relatou, na entrevista, que não trabalhou com outras

disciplinas por se tratar de um estágio. Ela relata ter se sentido invasiva à rotina da escola e

trabalhar com outra disciplina seria ainda mais invasivo, segundo ela. A terceira estagiária

Page 90: A aplicação da pedagogia de projetos no estágio supervisionado de ensino de língua inglesa

relata não ter trabalhado com outras disciplinas por se tratar de seu estágio e, como não

possuía muita experiência nem com o trabalho com projetos não se sentiria segura para

trabalhar com projetos articulada com outra professora. De qualquer modo, ela tratou, em seu

projeto, da questão da alimentação saudável, caracterizando uma certa interdisciplinaridade,

também com a disciplina de Ciências.

Todas elas, no entanto, afirmam ter apreciado o trabalho com projetos em função

do engajamento dos estudantes. Elas argumentam que, uma vez que os objetivos são expostos

cedo, os alunos sabem o que se espera deles e com que critérios serão avaliados. As

entrevistadas relatam que os alunos se sentem mais confiantes com o trabalho e interessados,

porque produzirão textos reais, que serão lidos por outras pessoas e serão produzidos nos

moldes de textos que eles já conhecem e encontram na realidade fora da sala de aula.

As três estagiárias relatam que, após a formatura, continuaram utilizando projetos

de trabalho em suas aulas, duas delas em escolas regulares e outra em um curso livre de

língua inglesa, porque consideram que os projetos desempenham um importante papel na

motivação dos estudantes em relação ao tema a ser estudado.

Mas, afinal, que tipo de ensino de língua inglesa tem sido desenvolvido nos estágios

de língua inglesa no Curso de Letras, a partir da opção pela Pedagogia de Projetos? Com base

nos dados acima apresentados, pode-se afirmar que se tem tentado desenvolver um ensino que

abra espaço para a manifestação do estudante e que valorize seu conhecimento e suas

habilidades.

As escolas regulares apresentam uma estrutura curricular dividida em disciplinas que

se subdividem em conteúdos. É obrigatório para os professores seguir essa grade e estudar

esses conteúdos com seus alunos. O que tem se tentado demonstrar, nos estágios da Prática de

Ensino, é que é possível seguir esses conteúdos e ir além deles, trabalhando temas relevantes

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para a vida do aluno e, nas aulas de língua, tipos de texto com os quais os estudantes se

depararão fora da sala de aula, em seu cotidiano.

É possível, seguindo a programação curricular, aplicar os princípios propostos pela PP

e apresentados na seção 1.3 do capítulo 1 deste trabalho. É possível também, concretizar o

ensino e a aprendizagem mediante projetos de trabalho que seguem a estrutura apresentada na

seção 1.4 do capítulo 1 deste TCC, com apresentação do projeto, planejamento,

desenvolvimento, apresentação de resultados e avaliação do trabalho desenvolvido.

O ritmo em que se segue o cronograma curricular pode ser flexível e ainda mais

flexibilizado pela aplicação de projetos de trabalho. É preciso criatividade e organização para

conciliar o trabalho com projetos e o currículo.

As estagiárias entrevistadas procuraram aplicar seus projetos seguindo estes

parâmetros. Elas seguiram a programação dos conteúdos, mas procuraram desenvolver o

estudo de gêneros textuais e temas relevantes para a vida dos estudantes. Elas procuraram

fazer com que os alunos escrevessem para leitores concretos, tentaram fazer com que seus

alunos pensassem nos efeitos que suas escolhas textuais teriam para quem lesse suas

produções.

Elas trabalharam com uma concepção de língua vinculada ao uso, embora afirmem

que não aprenderam inglês dessa forma na escola e que tiveram de se policiar para não aplicar

exercícios meramente estruturais que visassem somente ao funcionamento das regras do

idioma.

Pelo relato das estagiárias, pode-se notar que elas buscaram promover uma

aprendizagem democrática, porque aceitaram as diferentes opiniões expostas pelos alunos,

que não seriam as respostas desejáveis esperadas por professores tradicionais. P o r o u t r o

lado, as estagiárias não abriram muito espaço para que os alunos tomassem decisões no que

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diz respeito à aplicação dos projetos e ao processo de aprendizagem, o que vai contra as

prerrogativas da PP.

Embora essa falta de liberdade tenha sido justificada pela inexperiência em sala de

aula, pela inexperiência com o trabalho com projetos e principalmente, pela tradição escolar

de não abrir espaço para que o aluno decida sobre como ocorrerá o ensino, o ideal seria que os

alunos tivessem mais liberdade para decidir e atuar nas escolhas sobre sua própria

aprendizagem. A introdução dessa liberdade deve ocorrer de forma gradual, a fim de que tanto

professor quanto alunos se acostumem e aprendam a lidar com tal liberdade.

De todo o modo, as estagiárias afirmam que a PP conquistou sua simpatia pela

motivação e engajamento dos alunos e pela flexibilidade propiciada para o ensino e a

aprendizagem. Elas puderam comprovar, em seus estágios, os benefícios do trabalho com

projetos e concluíram que eles são maiores do que o árduo trabalho de preparação que o

trabalho com projetos exige, configurando-se como uma alternativa à aprendizagem

significativa e engajada.

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CONCLUSÃO

Este trabalho teve como objetivo investigar e discutir que tipo de ensino de língua

inglesa tem sido desenvolvido nos estágios da Prática de Ensino do Curso de Letras da

UNISINOS, a partir da opção pela Pedagogia de Projetos, discutir de que modo a Pedagogia

de Projetos se concretiza no ensino e aprendizagem de língua inglesa nos estágios e a

influência que a aplicação dos projetos teve na vida profissional das estagiárias, após a

graduação na universidade. Para fundamentar essas discussões, apresentamos, no capítulo 1,

a Pedagogia de Projetos, com sua história, suas pretensões para a educação, os princípios

que orientam o trabalho com projetos e a estrutura que compõe um projeto, com suas várias

etapas.

No capítulo 2, apresentamos e discutimos a concepção de língua mais apropriada

para o trabalho com projetos, as principais teorias de aprendizagem e em quais teorias a PP

se fundamenta. Averiguamos que a PP se opõe a abordagens mecanicistas de aprendizagem,

como a Abordagem Behaviorista. Averiguamos, também, que os autores que defendem a PP,

na atualidade, procuram combater discursos sobre educação que se afirmam inovadores, mas

cuja inovação fica restrita à proposta, sem chegar à sala de aula.

Percebemos que a PP se apresenta como uma maneira de concretizar o currículo

escolar, abrindo espaço para a valorização das produções e do conhecimento do aluno.

No terceiro capítulo, apresentamos a metodologia da pesquisa e a análise dos dados

coletados. Percebemos que o trabalho com projetos pode ajudar para que os alunos se

comprometam mais com sua aprendizagem e tenham uma postura mais curiosa e

participativa com relação a ela, mas que seria ingênuo demais afirmar que a PP é ou tem a

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solução para todas as questões que envolvem a educação no ensino regular.

Mesmo aspectos como motivação e curiosidade por parte dos alunos, que se

demonstraram bastante altos nos projetos analisados, dependem de vários fatores além do

projeto, como pré-disposição pessoal dos alunos, relacionamentos na turma, relação com o

professor e com a escola. Além do mais, a PP defende que a aprendizagem ocorra a partir de

temas e se inicie com o intuito de solucionar uma questão problemática. Isso não ocorreu

exatamente dessa forma nos projetos analisados porque a escola não abre mão da

organização do currículo por conteúdos e, devido aos projetos terem sido aplicados em

estágios, não se pôde estabelecer com o alunos, problemas que eles deveriam tentar

solucionar.

Os projetos analisados foram planejados com base em três pilares: tópico gramatical,

tipo de texto e tema, o que difere um pouco das prerrogativas da PP apontadas no capítulo 1.

Além do mais, os alunos não tiveram liberdade para tomar decisões durante os projetos, o

que reflete a antiga tradição da verticalização do processo de ensino-aprendizagem.

Por se tratarem de projetos aplicados no ano de 2006, não pudemos observar aulas e

nem tivemos acesso à opinião direta dos alunos sobre os projetos, exceto por algumas

avaliações que constavam nos relatórios e pelos relatos das estagiárias. Essa ausência de

feedback por parte dos alunos pode ter nos impedido de avaliar sua opinião, mas não nos

impediu de avaliar as impressões das estagiárias e a forma como procederam no

planejamento, elaboração e desenvolvimento dos projetos que aplicaram.

Seria interessante, no futuro, realizar uma pesquisa que enfoque a opinião de

estudantes sobre o trabalho com projetos, bem como seria interessante observar a aplicação de

um projeto a fim de analisar o grau de participação que os alunos possam ter nas decisões

tomadas sobre os temas estudados e os procedimentos executados em sala de aula. Poderia-se

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também, investigar de que modo se concretiza a avaliação com o trabalho por projetos, de

acordo com os PCNs.

Este trabalho pode ajudar os leitores no sentido de fazê-los repensar sobre a PP e

estreitar seus laços com essa abordagem, estimulando-os a voltar a usá-la, ou a continuar a

usá-la, e pode ainda ajudar outros acadêmicos que tenham interesse no trabalho com

projetos em LE, tanto em seus estágios, quanto em seus TCCs, como também em sua vida

profissional. Pode ajudar o leitor a perceber a trajetória das teorias de aprendizagem e de que

modo as ideias sobre educação tiveram influência sobre a PP. Pode ainda fornecer dados

práticos e sugestões de projetos de trabalho e maneiras de aplicá-los e de refletir sobre eles.

Com esta pesquisa, aprendi que, para se obter uma aprendizagem significativa, que é

o que gostaria para meus alunos quando eu for professora no ensino regular, é preciso

prosseguir questionando a educação, os procedimentos em sala de aula, a relação entre

professor e aluno e seus papéis no processo de ensino-aprendizagem.

Aprendi também, que o professor não deve ser o centro da sala de aula, nem os

alunos, nem os procedimentos, nem os conteúdos. O processo educativo deve ser

globalizado, ou seja, fundamentado em vários pilares de maneira equilibrada, a fim de que a

responsabilidade não se concentre em apenas um aspecto, mas em vários, o que pode

propiciar maneiras diversificadas de aprender e ensinar e, dessa forma, criar mais

oportunidades para que alunos e professores diferentes se desenvolvam em conjunto.

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