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Lírica Galego-Portuguesa Ao longos dos anos, os estudiosos da Literatura Portuguesa têm afirmado que a lírica galego-portuguesa teve uma origem múltipla: para uns não seriam mais do que a apropriação de formas e temas populares por parte dos trovadores; para outros tem origem na poesia latina produzida pelos clérigos nos mosteiros; outros ainda defendem uma origem moçárabe. Existe também uma linha de pensamento que defende uma origem Provençal. Podemos afirmar que a lírica galego- portuguesa nasce do conjunto de todas estas influências, por isso é tão original face às outras produções da mesma época existentes na Europa. Por lírica galego-portuguesa entendemos um grupo de cerca de 1680 textos de assunto profano e 420 textos de tema religioso, todos eles escritos numa língua com características bastante uniformes, o galego-português, num período que abrange todo o séc. XIII e a primeira metade do séc. XIV. Como limite ad quem fixou-se a data do testamento do Conde de Barcelos (1350), supondo que o Livro das Cantigas legado pelo filho bastardo de D. Dinis a Afonso XI de Castela seria provavelmente a compilação geral da lírica galego-portuguesa. O Conde D. Pedro seria assim o último dos poetas representados nos cancioneiros galego-portugueses. Entre os textos mais antigos costuma indicar-se o serventês 1 «Ora faz ost’o senhor de Navarra», datável de 1196, de Senhor de Paiva. Os textos da lírica galego-portuguesa chegaram até nós, fundamentalmente, através de três cancioneiros manuscritos: Cancioneiro da Ajuda, Cancioneiro da Biblioteca Nacional e Cancioneiro da Vaticana. Da tradição manuscrita fazem ainda parte um rolo, o chamado Pergaminho de Vindel, com as setes cantigas de amigo de Martim Codax. Uma lista com nomes dos poetas do Cancioneiros, conhecida pela designação Tavola Colocciana, completa o conjunto de testemunhos da lírica profana. As Cantigas de Santa Maria, de caráter religioso, têm uma formação manuscrita autónoma formada por quatro códices afonsinos. A chamada Arte de Trovar (arte poética onde se definem os princípios da lírica galego-portuguesa) define os três géneros 1 Género de poesia satírica.

Contextualização da lírica galego-portuguesa

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Lírica Galego-Portuguesa

Ao longos dos anos, os estudiosos da Literatura Portuguesa têm afirmado que a lírica galego-portuguesa teve uma origem múltipla: para uns não seriam mais do que a apropriação de formas e temas populares por parte dos trovadores; para outros tem origem na poesia latina produzida pelos clérigos nos mosteiros; outros ainda defendem uma origem moçárabe. Existe também uma linha de pensamento que defende uma origem Provençal. Podemos afirmar que a lírica galego-portuguesa nasce do conjunto de todas estas influências, por isso é tão original face às outras produções da mesma época existentes na Europa.

Por lírica galego-portuguesa entendemos um grupo de cerca de 1680 textos de assunto profano e 420 textos de tema religioso, todos eles escritos numa língua com características bastante uniformes, o galego-português, num período que abrange todo o séc. XIII e a primeira metade do séc. XIV.

Como limite ad quem fixou-se a data do testamento do Conde de Barcelos (1350), supondo que o Livro das Cantigas legado pelo filho bastardo de D. Dinis a Afonso XI de Castela seria provavelmente a compilação geral da lírica galego-portuguesa. O Conde D. Pedro seria assim o último dos poetas representados nos cancioneiros galego-portugueses. Entre os textos mais antigos costuma indicar-se o serventês1 «Ora faz ost’o senhor de Navarra», datável de 1196, de Senhor de Paiva.

Os textos da lírica galego-portuguesa chegaram até nós, fundamentalmente, através de três cancioneiros manuscritos: Cancioneiro da Ajuda, Cancioneiro da Biblioteca Nacional e Cancioneiro da Vaticana. Da tradição manuscrita fazem ainda parte um rolo, o chamado Pergaminho de Vindel, com as setes cantigas de amigo de Martim Codax. Uma lista com nomes dos poetas do Cancioneiros, conhecida pela designação Tavola Colocciana, completa o conjunto de testemunhos da lírica profana. As Cantigas de Santa Maria, de caráter religioso, têm uma formação manuscrita autónoma formada por quatro códices afonsinos.

A chamada Arte de Trovar (arte poética onde se definem os princípios da lírica galego-portuguesa) define os três géneros fundamentais desta poesia: cantiga de amor, de amigo, de escárnio e de mal dizer. O denominativo comum aos três géneros é cantiga, isto é, poesia para ser cantada, poesia feita de palavras e som, destinada a um público de ouvintes.

A distinção entre cantiga de amor e cantiga de amigo a partir do sujeito que fala (feminino, na cantiga de amigo e masculino, na cantiga de amor) é sugerida na Arte de Trovar: “E por alguas cantigas i há em que fala eles e elas outrossi, por ém é bem de entenderdes se som d’amor, se d’amigo; por que sabede que, se eles falam na prima cobra e elas na outra, [é d’]amor […]; e, se elas falam na primeira cobra, é outrossi d’amigo…”2.

Quanto à distinção entre cantiga de escárnio e cantiga de mal dizer, a Poética diz que na primeira desconhecemos o objeto da sátira, enquanto na segunda o alvo é mencionado no próprio texto.

Ramos, Maria Ana & Gonçalves, Elsa (1985). A lírica galego-portuguesa. Lisboa: Editorial Comunicação (Adaptado).

1 Género de poesia satírica. 2 Ramos, Maria Ana & Gonçalves, Elsa (1985). A lírica galego-portuguesa. Lisboa: Editorial Comunicação.