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Regularização fundiaria urbana

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RegularizaçãoFundiária

UrbanaAnálise da Legislação Urbanística

Luis Portela Pereira | 2013

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Prefácio

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Sumário

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Um dos maiores problemas nacionais, nas grandes e pequenas cidades, é a informalidade que acontece pela falta de infraestrutura urbana. Esta informalidade tem gerado núcleos desumanos de habitação, nos quais tudo se parece com um

verdadeiro apartheid. A infraestrutura urbana é um clamor nacional. Encontramos alguns pontos de cidades brasileiras repletas de infraestrutura, inclusive infraestrutura abundante; na periferia, porém, tudo é pautado pelo descaso. Diversos fatores contribuem para esta demanda reprimida e histórica. Os principais são o formalismo e a burocracia, que sempre dominaram a atuação pública em nosso país.

Podemos enumerar diversas causas dentro desta estrutura urbana que geram a informalidade.

01. A explosão demográfica. É um elemento que contribuiu definitivamente para que as grandes cidades acolham a população que migrou do campo, sem qualquer qualificação, em busca de oportunidades de trabalho e buscou nos grandes centros uma oportunidade de melhorar de vida. Como não há oferta de lotes, casas e infraestrutura, os migrantes terminaram ocupando áreas consideradas de risco, pois, além de seu baixo valor econômico, têm a certeza de não serem incomodados com ações de depejo ou reintregração de posse. Os percentuais de migração indicam que 83% da população brasileira é urbana; percentual que dobrou nos últimos quarenta anos.

Introdução

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02. A lei do parcelamento do solo. No momento em que a lei 6.766/79 tipificou a prática do parcelamento como crime, imputando-o não só ao loteador como a todos os que participam deste processo, a rigidez do processo de parcelamento se asseverou principalmente nos entes municipais e nos registros imobiliários, tornando a regularização urbanística e jurídica de uma área numa verdadeira maratona.

03. A falta de compreensão do texto legal e sua regulamentação inadequada. Os legisladores municipais, a quem a lei federal sobre o parcelamento do solo é endereçada, tiveram muita dificuldade de compreensão sobre tal lei. Fizeram exigências em nome desta lei sem que ela as contemplasse. Ou seja, colocavam ao empreendedor empecilhos diversos, alegando que tal exigência era da lei, quando na verdade a lei não falava nada disso. Para se ter uma ideia: a pavimentação de vias é uma exigência local; a lei federal nunca tratou disso, assim como nunca tratou também do esgotamento sanitário através de rede cloacal. Diversas vezes, se viu municipalidades fazendo exigência de ETE (Estação de Tratamento de Esgoto) quando o município não tinha uma rede de esgotamento em seus domínios.

04. Zoneamento urbano. Os municípios entendiam que a fiscalização do controle do solo se extinguia na divisa territorial determinada pelo plano diretor, ou seja, o limite do plano diretor. Assim, fora da zona de expansão urbana, não havia qualquer fiscalização municipal quanto ao parcelamento do solo, projetando-se e difundindo-se empreendimentos sob os mais variados títulos, condomínios de lazer, clubes, sociedades em conta de participação, Sociedade de Propósito Específico, etc... A partir da vigência do Estatuto da Cidade, Lei 10.257/01, é que os municípios com mais de vinte mil habitantes se obrigaram a ter planos diretores. O estatuto determina que o plano diretor abranja todo o território do município, englobando também a área rural.

05. Criatividade empreendedorística. A criatividade foi gerada a partir da dificuldade legislativa. Não há, por parte do empreendedor, a retração do empreendimento impossível de se realizar. Normalmente, criam-se figuras jurídicas inexistentes, como as que mencionamos anteriormente.

06. A legislação registral. A legislação referente a registros públicos sempre foi rígida. Costumo dizer que o prazer do registrador é impugnar a pretensão do apresentante e não registrar o título. Afora isso, como a prática

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de registro indevido foi tipificada pela lei do loteamento, os registradores impunham à pretensão de registro as mais absurdas exigências. Algumas beiravam a total falta de bom senso, o que terminava levando muitos empreeendimentos à irregularidade jurídica.

Os loteamentos são executados, mas não regularizados juridicamente pelos empecilhos que os registros impunham. Os leigos, na grande maioria, não conhecem o processo de dúvida (art.198 da Lei 6015/73), o qual consiste no julgamento do juiz da vara dos registros públicos ou do juiz corregedor do registro imobiliário se a exigência do registrador é procedente ou improcedente. Assim, a falta de conhecimento arremeteu muitos loteadores à irregularidade, pois tinham por terminativa a negativa do registro. Seus empreendimentos, porém, não deixaram de acontecer, mesmo na irregularidade.

08. As áreas públicas. A lei 6.766/79 estipulou que todo o parcela-mento do solo deveria observar a reserva de 35% para áreas públicas destinadas ao verde, prédios institucionais e arruamento até a vigência da lei 9.875/99. O que aconteceu com tais áreas? Porque não eram implantados os equipamentos previstos, elas terminavam sendo ocupadas com a aquiescência do poder público. Ou seja, não serviam ao fim que se destinavam e sequer regularizadas poderiam ser, pois tratavam-se de áreas públicas a partir do registro do loteamento conforme determina a lei do parcelamento do solo. Esta situação veio a ser sanada apenas em 2001, com a vigência do Estatuto da Cidade, lei federal 10.257/01, e com o advento da medida provisória 2220/01, que trouxe para o nosso ordenamento jurídico a Concessão de Uso Especial. A partir da lei 9.785/99 este percentual foi extirpado da lei do parcelamento do solo. O legislador optou pela proporcionalidade e pela necessidade de equipamentos equânimes com a densidade populacional do local e a infraestrutura oferecida.

09. As questões ambientais. São totalmente conflitantes com o uso e parcelamento do solo, mais por um entendimento ainda difícil da legislação ambiental, principalmente no entendimento de conceitos e sua aplicação, do que a própria reserva do patrimônio ambiental. O exemplo clássico nos parcelamentos do solo são as chamadas APPs. As áreas de preservação permanente têm por objetivo a preservação da fauna e flora locais. A maioria dos aplicadores da legislação, porém, estende conceitos que engessam sobremaneira os empreendimentos, muitas vezes os inviabilizando. Somos do entendimento de que para as questões urbanas o tratamento deveria

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ser diferenciado, não podendo ser observado um código florestal único nacional, tanto para a floresta como para a malha urbana.

10. A lei 11.977/09. Esta lei trouxe a solução legal para conceitos e procedimentos que já vinham sendo adotados nos processos de regularização. Aliás, a introdução dessas alterações, que levaram a um avanço na regularização fundiária, está representada a partir da lei 9.785/99 que conceituou as Zonas de Interesse Social, a infraestrutura básica e trouxe outros conceitos que possibilitam, efetivamente, a regularização de qualquer área que esteja sofrendo o verdadeiro apartheid urbano. Neste trabalho, estaremos desenvolvendo de forma prática e teórica conceitos, entendimentos e procedimentos que podem levar o leitor desta obra a proceder efetivamente a REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA.

Para qualquer entendimento, é necessário compreender os conceitos. Somente com o domínio da conceituação, é que podemos entender o que o legislador quis dizer. A nossa legislação sempre foi carente em conceitos, deixando que a doutrina ou a aplicação da lei

(jurisprudência) efetuassem a conceituação. Atualmente, por ser de ordem pública, os conceitos começam a ser gerados como forma de uniformizar o entendimento dos principais fundamentos da legislação. Mesmo antes da lei 11.977/09, a lei 9.785/99 e a lei 6.766/79, diversos conceitos urbanísticos foram introduzidos na legislação do parcelamento do solo.

1.1. Conceito de Loteamento: o artigo 2º da lei 6.766/79, conceituou loteamento da seguinte forma: ‘‘§ 1º - Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes”.

Assim, podemos afirmar que a subddivisão de uma gleba de terras que se destina a edificação com alteração do sistema viário – tal alteração, que ocorre pela criação de novas vias ou pelo prolongamento das existentes, caracteriza o loteamento. Entendemos que o conceito é insuficiente, pois, para viabilizar o aproveitamento de uma pequena gleba, é necessário o prolongamento ou a abertura de uma pequena via. Sabe-se que diversas cidades no Brasil foram concebidas na forma de sítios de lazer ou de pequenas propriedades com uma extensão de área superior ao molde padrão de lote urbano. Eram chácaras que serviam ao veraneio para as

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novas classes sociais que passaram a habitar o meio urbano. Integradas ao contexto urbano, tais chácaras, com uma pequena alteração do sistema viário existente, resultariam na produção de diversos lotes para ocupação imediata, procedimento impossível em razão da necessidade de reserva de áreas públicas, o que inviabiliza sobremaneira o parcelamento. Daí surge a crítica à lei do parcelamento do solo, que não enfrentou a questão, simplesmente generalizou, como se vê no próprio conceito.

1.2. Conceito de desmembramento: conforme o artigo 2º da lei 6.766/79, ‘‘§ 2º - considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes’’.

É normal os empreendedores submeterem-se às regras próprias do município, estipulando a quantia de lotes que não carecem de contrapartida para a aprovação de desmembramento. O texto legal é definitivo quando trata da alteração do sistema viário ou dos espaços públicos. Sempre que houver um acréscimo ou uma modificação, é loteamento. Caso contrário, é um desmembramento. Como a lei do parcelamento indica que a ele se aplicam as regras do loteamento (art. 111), quando não existirem disposições urbanísticas próprias, é possível a contrapartida em troca da aprovação ou produção de um número determinado de lotes conforme previsão da legislação municipal. Tecnicamente, tudo deve estar vinculado à oferta de infraestrutura. Somente a abundância ou a falta de infraestrutura

1. Lei 6.766/79. Art. 11. Aplicam-se ao desmembramento, no que couber, as disposições urbanísticas vigentes para as regiões em que se situem ou, na ausência destas, as disposições urbanísticas para os loteamentos. (Redação dada pela lei nº 9.785, de 1999).

02 regularIzação

FundIárIa urbana em ConCeItos

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é que poderá mover o poder público municipal a exigir contrapartidas, sequer o mérito do ato administrativo poderá movimentar o procedimento administrativo em outra direção.

2.3. Conceito de lote: afirma o artigo 2º da lei 6.766/79 que ‘‘§ 4º -Considera-se lote o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe’’ (Incluído pela lei nº 9.785, de 1999).

Na prática registral, fazia-se a diferença de terreno (não loteado) de lote (produto do loteamento) para diferenciar a produção de espaço urbano, que ocorria antes da vigência do decreto-lei 58/37 e da própria lei 6.766/79. O legislador, em 1999, quando resolveu aplicar a legislação do parcelamento do solo, conceituou lote como sendo a porção de área, ou terreno, servida de infraestrutura básica e que atenda por suas dimensões aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou pela lei municipal do zoneamento. O legislador faz essa distinção de legislação, pois, de acordo com o § 1º do art. 182 da Constituição Federal para as cidades com menos de vinte mil habitantes, o direito urbanístico indica a necessidade de existência de lei de zoneamento como forma de possibilitar a organização e o planejamento da cidade que com certeza crescerá, sendo dispensável a existência do plano diretor.

2.4. Conceito de infraestrutura básica: conforme o artigo 2º da lei 6.766/79, ‘‘§ 5º - Consideram-se infraestrutura básica os equipamentos urbanos de escoamento das águas pluviais, iluminação pública, redes de esgoto sanitário e abastecimento de água potável, e de energia elétrica pública e domiciliar e as vias de circulação pavimentadas ou não’’ (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999).

Insistimos que a legislação federal estipula critérios mínimos. Jamais o máximo. Por isso, quando trata de infraestrutura básica, está se estipulando o mínimo necessário para o parcelamento. Esse conceito não existia antes de 1999. A lei 9.785/99 fez uma distinção entre a infraestrutura, que chamamos de regular ou normal para empreendimentos comuns, e a infraestrutura básica para assentamentos urbanos localizados em zona de interesse

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social. O conceito não determina a pavimentação obrigatória das vias, tanto que deixa ao administrador local a exigência ou não dessa pavimentação. Muito se ouviu de administrações municipais sobre a imputação a lei do parcelamento do solo federal e sobre a exigência na pavimentação das vias. Preferencialmente, pelos administradores municipais em aslfalto, o que é caro e de dificil manutenção. Afora isso, sabemos que ambientalmente o asfalto não é recomendado em razão da falta de permeabilidade do solo após o asfaltamento, sem considerar o desconforto ambiental que o asfalto causa aos usuários, em razão do calor que emite. Com relação às redes de esgotamento sanitário, parece que a dúvida deixou de existir. Agora, pela legislação municipal, deve o esgotamento sanitário ser tratado de maneira diferente do escoamento pluvial. Antes, o resultado poderia ser todo ele despejado no pluvial, o que terminava por poluir os córregos e riachos que circulam nossas cidades.

O restante da recomendação do legislador federal é o suficiente para um assentamento humano digno. As exigências sobressalientes são de responsabilidade das leis municipais e das autoridades municipais, que podem inviabilizar um processo de regularização em razão do exagero.

1.5. Conceito de infraestrutura básica para a regularização fundiária: o artigo 2º da lei 6.766/79: “§ 6 º - A infraestrutura básica dos parcelamentos situados nas zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse social (ZHIS) consistirá, no mínimo, de: (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999).

I - vias de circulação; (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

II - escoamento das águas pluviais; (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

III - rede para o abastecimento de água potável; e (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

IV - soluções para o esgotamento sanitário e para a energia elétrica domiciliar. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999).

Em 1999, em razão da prática em diversas cidades do país, a lei federal apresentou a ZHIS na forma conceitual. O conceito consolidou-se com a Lei 11.977/79, mas era um conceito já trabalhado em todas as cidades que buscavam de alguma forma viabilizar a regularização fundiária urbana. A legislação tinha que deixar claro o entendimento de urbanização

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específica. Esta diferenciação com o empreendimento normal, o parcelamento ordinário e a urbanização específica querida pela ZEIS sempre foi de dificil assimilação, porque o entendimento da administração municipal continuava sendo o da urbanização completa exigida para a cidade formal.

O termo “urbanização específica”, utilizado para as ZHIS nunca foi bem entendido. Assim, as cidades procuravam adequar o tratamento das ocupações e distorções urbanísticas da mesma forma como tratavam um loteamento regular que se tornou irregular, principalmente urbanisticamente. Esse conceito de infraestrutura básica foi incorporado automaticamente no processo de regularização para evitar que o administrador público saísse dando títulos sem tratar a área urbanisticamente Este é também o conceito que pode ser dado ao projeto urbanístico. Ou seja, prover a área que está sendo objeto de um processo de regularização fundiária de infraestrutura básica. A lei do parcelamento faz, de forma completa, a distinção entre um empreendimento e uma regularização ao tratar de duas infraestruturas básicas. Uma que chamamos de normal, e a outra para as Zonas de Habitação de Interesse Social ( ZHIS). Assim fica claro, mas a própria lei 11.977/99 também flexibiliza as obras de infraestrutura necessárias para que o administrador público já conceda títulos exigindo apenas dois elementos de infraestrutura básica para que o processo de regularização, através da concessão de títulos, possa ocorrer.

2.6. Conceito de equipamentos comunitários: conforme o artigo 4º da lei 6.766/79, ‘‘§ 2º - Consideram-se comunitários os equipamentos públicos de educação, cultura, saúde, lazer e similares”.

Estes equipamentos são os convencionais. Durante muito tempo, eram exigidos no percentual de equipamentos comunitários do loteador (35% do total da gleba). A previsão legal estava prevista no art. 4º, inciso I da lei 6.766/79. Porém, com o advento da lei 9.785/99, o legislador escreveu de outra forma a requisição destes equipamentos como sendo: artigo 4º inciso ‘‘I: as áres destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamento urbano e comunitário, bem como os espaços livres de uso público, serão proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou

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aprovada por lei municipal para a zona em que se situem”. As áreas ficavam à disposição da municipalidade para implantação desses equipamentos, mas a implantação não ocorria. Em consequência, as áreas eram loteadas e ocupadas por populações de baixa renda, rendendo assentamentos sem qualquer infraestrutura, desordenados e que juridicamente eram impossíveis de regularização por tratarem-se de áreas públicas.

Cientes deste tipo de acontecimento, diversas legislações municipais já começaram a prever como contrapartida estes equipamentos prontos para o uso da municipalidade. Escolas, prédios públicos, áreas livres de recreação, etc.. tudo pronto para o uso. Mas, dentro do princípio da proporcionalidade, as exigências relativas à infraestrutura somente poderiam ser exigidas quando fosse necessário. Numa primeira leitura do texto legal, muitos podem pensar que a exigência dos 35% será a menor a partir da lei 9.785/99, quando na verdade poderá não existir assim como ser a maior. Um dos equipamentos urbanos não elencado na legislação federal é o de segurança. A partir do descontrole da segurança urbana, os parcelamentos urbanos têm visualizado os equipamentos de segurança como um item essencial de infraestrutura. Isso acontece nos chamados condomínios fechados. O grande apelo comercial dos condomínios é a segurança. Além de a pessoa ter a sensação de viver em uma casa ou residência unifamiliar, mesmo que o condomínio implique desfrutar e usufruir áreas comuns a todos os condôminos, não importando apenas a exclusividade de residência; a segurança que lhe introjeta o psicológico termina tornando este tipo de empreendimento seguro e bastante procurado nos dias de hoje.

1.7. Conceito de equipamentos urbanos públicos: conforme o artigo 4º da lei 6.766/79, ‘‘Parágrafo único - Consideram-se urbanos os equipamentos públicos de abastecimento de água, serviços de esgostos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, rede telefônica e gás canalizado”.

Aqui reside a infraestrutura propriamente dita. A infraestrutura urbana é considerada um equipamento urbano público, pois é de uso de todos. Outros equipamentos urbanos, como TV a cabo, internet, gás canalizado são também equipamentos urbanos, mas não são considerados públicos, apesar de tratarem-se de uma concessão de serviço. Nenhuma operadora poderá atuar no país sem a autorização pública. Automaticamente, todos

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os serviços que chegam à nossa porta são de infraestrutura.

Agora, passaremos a analisar os conceitos que a Lei 11.977/99 trouxe para o direito urbanístico. Acreditamos que a sua contribuição terminou por oficializar conceitos já usados no processo de regularização. Deixa então de ser invenção dos profissionais que atuam na área de regularização urbanística e passam a ser conceitos legais.

1.8. Conceito para fins de assentamentos urbanos: “Art. 47. Para efeitos da regularização fundiária de assentamentos urbanos, consideram-se...”.

O legislador restringiu a conceituação aos assentamentos urbanos. Entendemos que não era necessária essa ressalva, uma vez que a própria lei trata de tais assentamentos. A lei 11.977/99 não observou a boa técnica legislativa e tratou de diversos assuntos na mesma lei, sendo que os títulos é que determinam o assunto tratado. Os assentamentos urbanos dizem respeito exatamente à irregularidade urbana chamada de “invasão” ou o politicamente correto “ocupação”.

1.9. Conceito de área urbana: diz o artigo 47 da lei 11.977/99 que ‘‘ I ‘‘ área urbana: parcela do território, contínua ou não, incluída no perímetro urbano pelo Plano Diretor ou por lei municipal específica.”

Neste conceito, o legislador tratou de definir o perímetro urbano como sendo o lugar onde a área urbana poderá localizar-se. Nota-se que no perimetro rural, assim definido pelo plano diretor, ou então simplesmente excluído da legislação do zoneamento urbano, não há qualquer tratamento para aqueles pequenos povoados que por sua formação têm vocação urbana. É possível encontrar-se informalidades neste meio. Claro que sim. É comum até as pessoas não terem como regularizar as propriedades em razão de sua localização. Entendemos ser mais correto o conceito da destinação dos imóveis. Assim como posso ter no meio urbano uma área rural definida por sua destinação, posso também no meio rural ter uma área urbana com essa destinação. A limitação do plano diretor até contraria o disposto no Estatuto da Cidade, Lei 10.257/01, que determina que o plano diretor envolva toda a área do município (Art. 40,§ 2º2) fazendo um alongamento da competência municipal sobre todo o território.

2. Lei 110.257/01 Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.

....§ 2º O plano diretor deverá englobar o território do município como um todo.

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2.10. Conceito de área urbana consolidada: Lei 11.977/99, art. 47; ‘‘II ‘‘ área urbana consolidada: parcela da área urbana com densidade demográfica superior a 50 (cinquenta) habitantes por hectare e malha viária implantada e que tenha, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados:

a) drenagem de águas pluviais urbanas;

b) esgotamento sanitário;

c) abastecimento de água potável;

d) distribuição de energia elétrica; ou

e) limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos”.

O legislador do Minha Casa Minha Vida trouxe como elementos definidores da consolidação de uma área a densidade demográfica, a malha viária implantada e ainda dois elementos da infraestrutura básica. Este conceito abre a porta para que a regularização jurídica com a distribuição de títulos seja feita imediatamente, independentemente da regularização urbanística. Dois elementos da infraestrutura básica são pouco para que se proceda na regularização jurídica. O adminstrador político perderá o interesse no restante da regularização, já que o elemento propulsor do voto é o título. Outros conceitos existem sobre a consolidação de áreas urbanas. No Rio Grande do Sul, a Corregedoria Geral da Justiça edita a Consolidação Normativa Extrajudicial que enfrenta o tema desde 1988. O conceito foi posto no parágrafo primeiro do art. 512:

‘‘Art. 512 ‘‘ Nas comarcas do Estado do Rio Grande do Sul, em situações consolidadas, poderá a autoridade judiciária competente autorizar ou determinar o registro acompanhado dos seguintes documentos:..

§ 1º ‘‘ Considera-se situação consolidada aquela em que o prazo de ocupação da área, a natureza das edificações existentes, a localização das vias de circulação ou comunicação, os equipamentos públicos disponíveis, urbanos ou comunitários, dentre outras situações peculiares, indique a irreversibilidade da posse titulada que induza ao domínio.’’

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O conceito é jurídico. Trata da prescrição aquisitiva através do prazo de ocupação. A natureza definitiva das edificações existentes, as vias de circulação e comunicação devidamente organizadas, os equipamentos públicos urbanos e comunitários vêm como a irreversibilidade da posse titulada, que induz ao domínio. Como se nota, a natureza definitiva das edificações existentes é percebível ao contato. Se bem que a tendência, após a regularização, é que tais benfeitorias sofram ainda mais acessões, tornando-se definitivas.

Da mesma forma, a prescrição aquisitiva. Não há resistência contra o prazo. Assim que flui o prazo da prescrição, nada mais tem a fazer o proprietário dominial, que, em tempo hábil, não se voltou contra a posse. Então este conceito, mais jurídico do que urbanístico, tem o condão de dar um tratamento diferenciado às questões que envolvam ocupação em áreas consolidadas.

2.11. Conceito de demarcação urbanística: Lei 11.977/99, art. 47: ‘‘II’’ demarcação urbanística: procedimento administrativo pelo qual o poder público, no âmbito da regularização fundiária de interesse social, demarca imóvel de domínio público ou privado, definindo seus limites, área, localização e confrontantes, com a finalidade de identificar seus ocupantes e qualificar a natureza e o tempo das respectivas posses”.

A demarcação urbanística é uma grande novidade no sistema registral brasileiro. Na verdade, trata-se do aperfeiçoamento da matrícula para que a área que vai sofrer a intervenção por parte do poder público esteja perfeitamente delimitada sem o processo de retificação de registro público. Para tornar o auto de demarcação compreensível, é necessário que se faça o levantamento poligonal da área, incluindo suas medidas perimétricas e confrontações.

Tem também por finalidade localizar a parte ocupada com suas divisas e confrontações, bem como relatar o tempo de posse. Este tempo de posse é determinante para a incidência da prescrição aquisitiva. Se o tempo passou, em áreas particulares o título dominial perdeu sua essência se o proprietário não se voltou contra a ocupação. Este procedimento, anteriormente à lei 11977/99, era feito através do processo de retificação judicial da área.

Um processo lento, demorado e que levava a informalidade dos empreendimentos. O auto de demarcação indica um aceleramento no

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processo de regularização urbanística.

2.12. Conceito de legitimação da posse: Lei 11.977/99, art. 47; ‘‘IV’’ legitimação de posse: ato do poder público destinado a conferir título de reconhecimento de posse de imóvel objeto de demarcação urbanística, com a identificação do ocupante e do tempo e natureza da posse”.

Outra grande novidade trazida pela lei 11.977/99 e que abre portas para a usucapião extrajudicial foi a legitimação da posse. A legitimação de posse é um ato administrativo em que a administração pública reconhece a posse do imóvel ocupado, que foi objeto da demarcação urbanística. É um título que somente poderá ser utilizado quando a administração lançar mão do auto de demarcação.

A dúvida que fica é quanto ao auto de demarcação de imóveis públicos. Neste caso, entendemos que o título que é gerado não pode ser a legitimação da posse, pois no prazo prescricional de cinco anos esta posse vira propriedade. Sobre os imóveis públicos, não incide a prescrição aquisitiva. O requisito formal da legitimação de posse e o prazo para a transformação da posse em propriedade é o da prescrição aquisitiva.

2.13. Conceito de ZEIS. Lei 11.977/99 art. 47: ‘‘V’’ Zona Especial de Interesse Social - ZEIS: parcela de área urbana instituída pelo Plano Diretor ou definida por outra lei municipal, destinada predominantemente à moradia de população de baixa renda e sujeita a regras específicas de parcelamento, uso e ocupação do solo”.

O conceito de ZEIS é necessário para que haja o entendimento do que são as regras específicas de parcelamento, uso e ocupação do solo. Quando o legislador trata de ZEIS, está retirando a incidência das diretrizes normais do plano diretor, ou da lei de zoneamento as exigências ordinárias de parcelamento, admitindo uma regra específica de parcelamento, uso e ocupação do solo. Significa, por exemplo, que o limitador de testada, 5,00m, e área superficial de lotes, 125m2, previstos na Lei 6.766/79, podem ser menores. (art. 4ª da lei 6.766/79, inciso II3). Entre outras coisas, como por exemplo no gabarito de ruas, é possível numa ZEIS o arruamento obedecer a parâmetros diferenciados na região para a sua urbanização,

3. Lei 6.766/79. Art. 4º. Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos: II - os lotes terão área mínima de 125m² (cento e vinte e cinco metros quadrados) e frente mínima de 5 (cinco) metros, salvo quando o loteamento se destinar a urbanização específica ou edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes.

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não obedecendo às diretrizes do plano diretor. O necessário é que a área esteja declarada como ZEIS através de lei ou de decreto regulamentador autorizado por lei. Algumas legislações municipais já observam a forma de tratar as ZEIS, assim como fazem uma classificação diferenciada para diversas ZEIS. Vejamos o plano diretor de São Paulo − lei 13.430, de 13 de setembro de 2002.

“Art. 171 – As Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS – são porções do território destinadas, prioritariamente, à recuperação urbanística, à regularização fundiária e à produção de Habitações de Interesse Social – HIS ou do Mercado Popular - HMP definidos nos incisos XIII e XIV do artigo 146 desta lei, incluindo a recuperação de imóveis degradados, a provisão de equipamentos sociais e culturais, espaços públicos, serviço e comércio de caráter local, compreendendo:

I - ZEIS 1 - áreas ocupadas por população de baixa renda, abrangendo favelas, loteamentos precários e empreendimentos habitacionais de interesse social ou do mercado popular, em que haja interesse público expresso por meio desta lei, ou dos planos regionais ou de lei especifica, em promover a recuperação urbanística, a regularização fundiária, a produção e manutenção de Habitações de Interesse Social (HIS), incluindo equipamentos sociais e culturais, espaços públicos, serviço e comércio de caráter local;

II - ZEIS 2 ‘‘áreas com predominância de glebas ou terrenos não edificados ou subutilizados, conforme estabelecido nesta lei, adequados à urbanização, onde haja interesse público, expresso por meio desta lei, dos planos regionais ou de lei especifica, na promoção de Habitação de Interesse Social – HIS – ou do Mercado Popular – HMP –, incluindo equipamentos sociais e culturais, espaços públicos, serviços e comércio de caráter local;

III - ZEIS 3 ‘‘áreas com predominância de terrenos ou edificações subutilizados situados em áreas dotadas de infraestrutura, serviços urbanos e oferta de empregos, ou que estejam recebendo investimentos desta natureza, onde haja interesse público, expresso por meio desta lei, dos planos regionais ou de lei específica em promover ou ampliar o uso por Habitação de Interesse Social ‘‘ HIS – ou do Mercado Popular – HMP –, e melhorar as condições

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habitacionais da população moradora;

IV - ZEIS 4 ‘‘glebas ou terrenos não edificados e adequados à urbanização, localizados em áreas de proteção aos mananciais, ou de proteção ambiental, localizados na Macroárea de Conservação e Recuperação, definidos no artigo 153 desta lei, destinados a projetos de Habitação de Interesse Social promovidos pelo Poder Público, com controle ambiental, para o atendimento habitacional de famílias removidas de áreas de risco e de preservação permanente, ou ao desadensamento de assentamentos populares definidos como ZEIS 1 por meio desta lei, ou dos planos regionais ou de lei, e situados na mesma sub-bacia hidrográfica objeto de Lei de Proteção e Recuperação dos Mananciais.

Como se nota na legislação paulistana, a definição de ZEIS tem por finalidade uma identificação de acordo com os seguintes fatores: prioritariamente, com a recuperação urbanística, a regularização fundiária e a produção de Habitações de Interesse Social – HIS – ou do Mercado Popular – HMP. Dentro deste critério, foram desmembradas as Zonas de Interesse Social de acordo com a sua identificação e finalidade. Por isso houve a subclassificação de ZEIS dentro da realidade territorial do município. Cada município pode estipular seus critérios de formação de tais zonas.

2.14. Conceito de assentamentos irregulares: Lei 11.977/99 art. 47. ‘‘VI’’ assentamentos irregulares: ocupações inseridas em parcelamentos informais ou irregulares, localizadas em áreas urbanas públicas ou privadas, utilizadas predominantemente para fins de moradia”.

Os assentamentos irregulares, trazidos a conceito pela lei, são os chamados loteamento ou parcelamento do solo irregulares. Esta irregularidade pode se dar de diversas formas: pela falta de atendimento às exigências urbanísticas, pela falta de regularização jurídica ou apenas por não haver nenhum tipo de submissão aos orgãos públicos e a gleba ser simplesmente parcelada. O art. 40 e seus incisos da lei 6.766/79 tratam desse assunto e da forma como deve agir a municipalidade para proceder a regularização quando o loteador não o faz. A comunicação entre a municipalidade e o loteador se dá através da NOTIFICAÇÃO URBANÍSTICA, que é a constituição em mora do loteador.

2.15. Conceito de regularização fundiária de interesse

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social: lei 11.977/99, art. 47: ‘‘VII1‘‘ regularização fundiária de interesse social: regularização fundiária de assentamentos irregulares ocupados, predominantemente, por população de baixa renda, nos casos:

a) em que tenham sido preenchidos os requisitos para usucapião ou concessão de uso especial para fins de moradia;

b) em que a área esteja ocupada, de forma mansa e pacífica, há, pelo menos, 5 (cinco) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)

c) de imóveis situados em ZEIS; ou

d) de áreas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social”.

Deste conceito, muitas dúvidas são originadas a respeito da baixa renda. Somente é admitida a regularização fundiária de interesse social em ocupações ou assentamentos irregulares de população de baixa renda?

A resposta é que a lei deixa que isso ocorra com o predominio desta classe social. Não se pode negar a regularização por interesse social quando há uma mescla de classe social. Pode ser feito também em outras hióteses, e os casos são numerados nos incisos do caput do artigo. O inciso I trata da prescrição aquisitiva e do direito à concessão de uso especial prevista na MP 2220/01 e no parágrafo 1º do art. 1834 da CF.

Os requisitos da usucapião constitucional estão previstos no art. 183 e parágrafos da CF de 1988. Nestas hipóteses, se o imóvel for de particulares, a usucapião é o caminho; se o imóvel for público, o caminho é o da Concessão de Uso Especial, que é um direito que o ocupante tem. O inciso II trata do prazo prescricional de cinco (5) anos.

Este prazo é para baixa renda, imóvel público, único imóvel, estar residindo de forma mansa e pacífica, ou seja, não existe no judiciário nenhuma ação de reintegração de posse. Preenchido estes requisitos nasce o direito à usucapião e à consessão de uso, conforme o caso, se imóvel particular ou imóvel público. É requisito da regularização de interesse social

4. Art. 183 da CF de 1988. Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

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que o imóvel esteja localizado em ZEIS. Então tratamos a declaração de ZEIS como primeiro requisito para o processo de regularização.

E, por fim, aos imóveis públicos pertencentes aos entes federados e que tenham sido declarados em cada esfera como de interesse social para fins de regularização. É muito comum os estados, ao tentarem regularizar, enfrentarem a má vontade do município, principalmente se as administrações forem de partidos adversários.

Basta a legislação estadual declarar de interesse para fins de regularização que esta declaração interferirá na legislação urbanística municipal, criando a situação equivalente a ZEIS. Esta declaração de interesse social tem como fundamento a estipulação de situação análoga a ZEIS.

2.16. Conceito de regularizaçao fundiária de interesse específico. Lei 11.977/09, art. 47. ‘‘VIII’’ regularização fundiária de interesse específico: regularização fundiária quando não caracterizado o interesse social nos termos do inciso VII”.

Como exemplo, podemos invocar as ZEIS 3 e 4 do plano diretor de São Paulo. É uma gleba em que será produzida habitação de interesse social de forma ordenada. Ou seja, o empreendimento não resulta de uma ocupação ou invasão. Disponibiliza-se a gleba para a produção de novas habitações com a finalidade de atender demandas, desadensar áreas, criar espaços verdes e públicos de recreação, etc.

2.17. Conceito de etapas da regularização fundiária: Lei 11.977/09, art. 47. “IX - etapas da regularização fundiária: medidas jurídicas, urbanísticas e ambientais mencionadas no art. 46 desta Lei, que envolvam a integralidade ou trechos do assentamento irregular objeto de regularização. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)’’.

As etapas de regularização fundiária sempre envolvem estes três eixos. Nota-se que faltaram no conceito as medidas sociais. O processo de regularização sempre inicia pelo levantamento socioeconômico e pela leitura exata da situação da comunidade que será afetada com a

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regularização. O segundo momento envolve a regularização urbanística e ambiental; e a terceira e definitiva etapa envolve a regularização jurídica. O envolvimento será, como afirmamos, multidisciplinar.

2.18. Área de risco. Não existe uma conceitução legal ou jurídica da área de risco. Área de risco é definida por analogia com as disposições contidas na lei do parcelamento do solo (lei 6.766/79). Vamos analisar tais disposições conforme preceitua o art. 3º.

“Art. 3º Somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal. (NR) (Redação dada pela Lei nº 9.785, 29.1.99)”

Pelo caput do artigo, houve a inclusão da urbanização específica entre os limites em que poderá ser admitido o parcelamento do solo. O caput limita o parcelamento do solo em zonas urbanas ou de expansão urbana. Estes limites são dados pelo plano diretor ou pela própria lei de zoneamento para cidades com menos de vinte mil habitantes. A exceção ou classificação da área de risco começa a ser clareada a partir do parágrafo único do mesmo artigo. O artigo autoriza o parcelamento e limita a sua localização, e o parágrafo proíbe o parcelamento.

“Parágrafo único. Não será permitido o parcelamento do solo:

I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas.”

Entendemos que a parte final do inciso devesse ser estirpada da lei. Os terrenos alagadiços não são própios para o parcelamento e a ocupação. Além disso, causam aos seus ocupantes desconforto ambiental. Sabe-se que a proximidade do lençol freático causa tal desconforto em razão do abafamento ou das infiltrações, que podem ocorrer no piso ou mesmo em paredes. Os terrenos sujeitos a inundações são comuns em cidades em que haja rios, arroios e lagos. As cidades antigas iniciaram sua urbanização na beira dos rios, que eram elementos de acessibilidade. Esta é a primeira área considerada de risco pela legislação.

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“II - em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados.”

Este cuidado, antes da lei 6.766/79, não havia. Os aterros sanitários eram feitos sem nenhum controle ambiental. Por isso, encontramos assentamentos humanos produzidos em cima de aterros não recomendáveis. Normalmente, os aterros são feitos em áreas alagadiças. Veja que se juntam dois elementos não recomendáveis na mesma hipótese de risco, a área alagadiça e o aterro sanitário. Quanto à parte final do inciso, entendemos também que deveria ser estirpada do texto legal.

Este saneamento que a lei prevê é de uma avaliação subjetiva que pode ou não ter resolvido a questão. Entendemos que estas áreas devem ser tratadas de maneira apartada do restante da superfície do município. Deveriam ser ZEIS ambientais ou transformadas em APPs.

“III - em terreno com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas exigências específicas das autoridades competentes”

Dependendo do terreno, esta declividade pode resultar em risco. Em algumas cidades em que a topografia é acidentada, é possível ultrapassar esta cota com soluções de contenção ou taludes. Porém, não recomendável. O caso do Rio de Janeiro, que em todos os verões sofre com deslizamentos, é um exemplo desta topografia acidentada e ocupação acima na declividade recomendada como risco. A presidente Dilma Rousseff, no programa Conversas com a Presidenta, em abril de 2011, afirmou que iria fazer uma proposta de modificação do Estatuto da Cidade, propondo que ao prefeito seja imputada improbidade administrativa se ele deixar ocupar encostas e terrenos com declividade de risco. Até agora, nada se viu, talvez tenha sido na emoção da catástrofe, como sempre aconteceu na histório deste país.

“IV - em terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação”

Esse risco pode estar no subsolo como na superfície. Existem os chamados terrenos “podres”, onde a remoção de lama e barro é muito mais cara que o próprio terreno. Automaticamente, não é um lugar adequado para edificação. Em todos os projetos de parcelamento do solo, a presença do geólogo é obrigatória. Através de ensaios feitos na área, ele tem

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condições técnicas de atestar a sua condição para edificação. Estes ensaios são feitos em diversos pontos da área, sendo fundamentais para a execução do parcelamento.

“V - em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção.”

As áreas de preservação ecológicas são consideradas impróprias para o parcelamento do solo em razão da condição de manutenção da flora e fauna do local, condição essencial do conceito de área de preservação. No art. 3, da lei Nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Novo Código Florestal), inciso II, está o conceito de área de preservação permanente: “II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. O conceito do novo código florestal, por si só, explica qual a função da APP e sua classificação. Como veremos na análise da lei 11.977/09 o legislador deu uma anistia ambiental aos empreendimentos que já estavam instalados art. 545 § 1º da lei 11.977/09. O novo código florestal tem todos os limitantes ecológicos para a ocupação do solo e seu parcelamento, sendo necessário que se faça o estudo do parcelamento sempre vinculado ao código florestal.

Com relação às áreas poluídas, normalmente situam-se à margem de rodovias ou sofrem influência direta de dejetos e fuligem industrial. O zoneamento urbano, como lei específica ou o próprio plano diretor, pode resolver esta questão de maneira singela: criando após os distritos industriais um cinturão que amorteça esta condição para só então permitir a ocupação para fins residenciais. Nas cidades em que tais atividades já se confundiram, é necessário que se faça alguma coisa no sentido de mitigar o problema. Nas margens de rodovias o ideal é a implantação de áreas verdes que amorteçam os efeitos da poluição.

Em resumo, pois alguns tópicos mais serão trabalhados, as áreas de risco são estas enumeradas pela legislação do parcelamento do solo.

5. Art. 54.  O projeto de regularização fundiária de interesse social deverá considerar as características da ocupação e da área ocupada para definir parâmetros urbanísticos e ambientais específicos, além de identificar os lotes, as vias de circulação e as áreas destinadas a uso público. 

§ 1º  O Município poderá, por decisão motivada, admitir a regularização fundiária de interesse social em Áreas de Preservação Permanente, ocupadas até 31 de dezembro de 2007 e inseridas em área urbana consolidada, desde que estudo técnico comprove que esta intervenção implica a melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação irregular anterior. 

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2.19. Conceito de órgão ambiental capacitado. É o órgão, em nível municipal, que possui, em seus quadros ou à sua disposição, profissionais com atribuições para análise de projeto e decisão sobre o licenciamento ambiental. Tal conceito está contido no art. 53, § 2º da lei 11.977/09.   Muitas vezes, há o preenchimento destas vagas através dos Cargos em Comissão, sem a qualificação necessária para proceder a análise e o licenciamento ambiental. É necessário que os municípios qualifiquem e promovam seus quadros ambientais com profissionais cujas atribuições sejam inerentes ao processo de licenciamento e análise de projetos. Não basta investir na função, tem que ter condições técnicas para exercê-la.

2.20. Conceito de baixa renda: É remuneração mínima para a sustenção alimentícia de uma pessoa ou de uma família.

Cada município deve estipular, dentro de sua circunscrição, qual é o valor considerado de baixa renda. Existe uma variável grande de município para município e de estado para estado. Não é possível haver uma fixação nacional deste valor. As realidades locais são variáveis. Para se ter uma ideia: em Porto Alegre, a baixa renda é de cinco salários mínimos; em Rio Grande, no interior do Rio Grande do Sul, que vive hoje uma expansão desenvolvimentista, a baixa renda é de três salários mínimos, mas, há pouco tempo, já foi de um salário.

2.21. Agora vamos ver os conceitos do novo Código Florestal. A lei Nº 12.651, de 25 de maio de 2012, trouxe conceitos que servem diretamente a conceituação utilizada na regularização fundiária, além do conceito de APP (já trabalhado quando tratamos da área ecológica).

2.21.1. Conceito de área verde urbana; lei 12.651/12, art, 3º. “XX - área verde urbana: espaços, públicos ou privados, com predomínio de vegetação, preferencialmente nativa, natural ou recuperada, previstos no Plano Diretor, nas Leis de Zoneamento Urbano e Uso do Solo do Município, indisponíveis para construção de moradias, destinados aos propósitos de recreação, lazer, melhoria da qualidade ambiental urbana, proteção dos recursos hídricos, manutenção ou melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais”.

Este conceito de área verde urbana é completo. Como se nota, é uma área pública de uso comum do povo e que serve para o propósito de

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recreação, lazer, melhoria da qualidade ambiental urbana, proteção de recursos hidrícos, manutenção ou melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais. A gama de utilidades e propósitos da área verde urbana é a visão moderna que passamos a ter de parque. Nesse sentido; a população das grandes cidades está consumindo esses espaços, que valorizam o ambiente urbano e servem para a recreação como uma opção de lazer nos grandes aglomerados urbanos.

2.22. Conceito de bens públicos: Código Civil Brasileiro, art. 98, 99 e 100.

‘‘Art. 98. São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.’’

O caput do artigo diz que apenas os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público são públicos, os demais são particulares. Mas, para que entendamos isso, é necessário que se conheça o que são as pessoas jurídicas de direito público interno, cuja previsão está contida no mesmo código civil no art. 41 e incisos6. Se não forem os entes federados e suas extensões com as previsões ‘‘números clausus’’ da lei, nenhuma outra pessoa jurídica de direito interno poderá ser considerada como tal. Logo, a definição de bens públicos engloba somente os pertencentes à númeração do art. 41 e incisos do Código material. Agora podemos avançar:

‘‘Art. 99. São bens públicos:

I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças.”

Estes exemplos, tais como os que o inciso enumera, não são considerados números fechados. Aqui podem aparecer as nossas praias, nossas ilhas, etc... São espaços destinados a todos, indistintamente. O PODER público pode dispor ou ceder o uso desses bens mediante autorização legislativa e termo de permissão de uso ou outro tipo de concessão. Falamos em autorização legislativa, até porque tais bens devem ser desafetados em

6. ‘‘Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno:I - a União;II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;III - os Municípios;IV - as autarquias;IV - as autarquias, inclusive as associações públicas; (Redação dada pela Lei nº 11.107, de 2005)V - as demais entidades de caráter público criadas por lei.Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito

privado, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas deste Código.

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razão do seu uso. Esta desafetação implicaria a mudança de sua destinação ou finalidade. Após isso, o poder público poderá dispor dos referidos bens e titulá-los. Muitos desses espaços comuns do povo foram ocupados de forma desorganizada. O poder público não deu a destinação que devia a esses espaços, os quais terminaram sendo ocupados por habitações de população de baixa renda. Não se imaginava qualquer regularização dessas áreas por serem imóveis públicos. A partir da MP 2220/01, começou a ser possível esta regularização. A constituição de 1988, no seu artigo 183, já fez menção à concessão de uso especial para imóveis públicos. Neste tipo de bens, se faz regularização fundiária como veremos adiante.

“II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias.”

Nesses bens é que funciona a administração pública. O inciso relaciona todos os prédios em que as pessoas jurídicas de direito público interno funcionam; também podemos incluir os imóveis com destinação institucional, tais como escola pública, posto de saúde, etc...

III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.

Os bens dominicais são bens disponíveis do patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, não estando os mesmos afetados com uma destinação específica. Por isso, são bens disponíveis para proceder-se, por exemplo, num parcelamento do solo para fins de interesse social. Nos bens dominicais, é que a produção de empreendimentos será feita.

‘‘Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.’’

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Já falamos em desafetação. O artigo 100 prescreve a necessidade de desafetar. A qualificação desses bens é a sua qualificação ou destinação. Mesmo no processo de regularização fundiária, é necessário que se faça a desafetação das áreas para proceder-se na sua alienação, seja a que título for. As áreas de uso especial e de uso comum do povo estão vinculadas ao uso geral, e não podem ser regularizadas sem o devido processo legal.

‘‘Art. 101. Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.’’

Como dissemos, estes bens não necessitam de desafetação, que vem a ser a sua mudança de destinação.

‘‘Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião.’’

Esta previsão do direito material já está contida na Constituição Federal, no § 3º do art. 183, que diz: ‘‘Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.’’

‘‘Art. 103. O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem.’’

Na disposição do art. 103, encontramos a forma como o poder público pode ceder o uso dos bens públicos: de forma gratuita ou onerosa. Assim é feito com o Termo de Permissão de Uso, Concessão do Direito Real de Uso, Concessão de Uso Especial, etc... enfim uma gama de títulos utilizados no processo de regularização fundiária.

Além dos bens particulares, que podem ser objeto da regularização fundiária, os bens públicos também podem sofrer esta intervenção de beneficiamento de área e concessão de habitabilidade aos seus ocupantes.

Em nível conceitual, é o que temos para fixar para o bom entendimento da regularização fundiária.

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As irregularidades no parcelamento do solo podem surgir de diversas formas. A simples alteração física de um imóvel urbano, gleba ou não, é o suficiente para gerar a irregularidade, que pode se manifestar de diversas maneiras, pois a criativade para burlar

a legalidade não tem limites. Falamos na criatividade porque, ao ler a lei, a pessoa já começa a buscar uma forma de não se enquadrar nela. Já vimos diversas formas de parcelamento do solo não previstas em lei. Uma delas é o condomínio civil. Há ainda a venda da fração ideal de parcelamento de imóvel rural para diversas pessoas, constituindo o condomínio civil; outras modalidades: a sociedade em conta de participação, o título patrimonial de clube, o condomínio em diversas formas, algumas adequadas parcialmente ao art. 8º da lei 4.591/64 e outras dentro das diretrizes legais, mas feitas de forma clandestina.

3.1. Loteamento clandestino: Este tipo de loteamento é efêmero. No momento em que ele é descoberto, passa a ser um loteamento irregular. Para fins de conceito e entendimento, chama-se de clandestino; aquele em que a gleba simplesmente foi parcelada sem qualquer procura do proprietário pelos órgãos públicos para submeter o parcelamento ao crivo administrativo. Porém, no instante em que tal loteamento é descoberto, temos esta figura como loteamento irregular. Uma das características deste tipo de empreendimento é que ele se desenvolve tanto na área privada como na área pública. Mesmo o município tendo poder de polícia, muitas

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vezes ele mesmo pratica a clandestinidade. Nesta hipótese, a atuação do MINISTÉRIO PÚBLICO é determinante para sanar a irregularidade. Nos imóveis particulares, é comum que isso aconteça. A resistência dos empreendedores, a intransigência dos aplicadores da lei, via de regra, os remete à irregularidade e clandestinidade. As dificuldades são tantas impostas ao empreendedor, que ele simplesmente desiste. Este é um dos grandes motivos das irregularidades. Neste primeiro momento, tratamos do parcelamento do solo sem que haja qualquer envolvimento dos órgãos municipais, ou seja, simplesmente, a gleba é parcelada em pequenos lotes pelo proprietário privado. As previsões legais estão contidas na Lei 6.766/79, que trata do assunto.

Diz o art. 43. “Ocorrendo a execução de loteamento não aprovado, a destinação de áreas públicas exigidas no inciso I do art. 4º desta Lei não se poderá alterar sem prejuízo da aplicação das sanções administrativas, civis e criminais previstas.1’’

‘‘Parágrafo único. Neste caso, o loteador ressarcirá a Prefeitura Municipal ou o Distrito Federal quando for o caso, em pecúnia ou em área equivalente, no dobro da diferença entre o total das áreas públicas exigidas e as efetivamente destinadas. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)’’

A penalidade prevista no artigo lido diz respeito ao pagamento

03. loteamento,

Forma de IrregularIdades

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em pecúnia. Se não for possível a cobrança em dinheiro, o pagamento acontecerá com o dobro da diferença das áreas que seriam exigidas no processo de aprovação do loteamento. O artigo excetua as disposições penais, civis e administrativas as quais estão prevista noutro momento da lei, no art. 50 :

‘‘Constitui crime contra a Administração Pública.’’

‘‘I - dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municipíos;

II - dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença;

III - fazer ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade de loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo.

Pena: Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinquenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País.’’

Esta crimininalização dos empreendimentos termina, até certo ponto, gerando a impunidade, porque existe a regularização fundiária. Muitos proprietários de gleba apostam na regularização como forma de ‘‘arredondar’’ seus empreendimentos ou torná-los legais, já que não existe esta criminalização com cumprimento de pena, porque o sistema penitenciário nacional não funciona. Diante de um risco calculado, os empreendedores fazem do seu jeito esses empreendimentos.

3.2. Loteamento irregular urbanisticamente e juridicamente: O processo de loteamento envolve obrigatoriamente a fase de implantação de infraestrutura. Para garantia do município que estas obras serão implantadas, a lei prevê que o loteador firme com o poder público municipal o termo de compromisso de obras. Esta previsão está contida no art. 18, inciso V7. A legislação federal exige dos municípios que incluam na sua

7. Art. 18, inciso V da lei 6.766/79. - cópia do ato de aprovação do loteamento e comprovante do termo de verificação pela

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legislação o termo de verificação de obras, o qual ainda deverá ter ainda a garantia da execução, principalmente das vias de circulação. Não de uma forma direta, mas o legislador fez esta previsão nos documentos exigidos para o registro do parcelamento no registro de imóveis. É evidente que a exigência está diretamente vinculada à solidariedade que existe entre o município e o loteador. A garantia das obras diz respeito à administração e à garantia econômica da implantação das obras. O que falta, na prática, é a verficação das obras, cujo cronograma deve ser fiscalizado. Nesse sentido, podemos afirmar que a regularização urbanística está totalmente desvinculada da regularização jurídica, que é o registro do loteamento no registro de imóveis. Pode, muitas vezes, o loteamente estar registrado, e as obras não serem executadas como deveriam. A partir dessa constatação, podemos invocar dentro da lei do parcelamento do solo o art. 39 em diante. Mas a irregularidade jurídica é refletida pela falta de registro do loteamento no registro imobiliário. Muitas dificuldades são postas ao loteador para o registro. Algumas de cunho fiscal e outras de natureza obrigacionais, etc... Porém, a lei do parcelamento do solo veda o loteamento para aqueles que já foram condenados por crime contra a administração pública, ou então suas dívidas põem em dúvida a garantia de entrega dos imóveis que estão sendo produzidos. Seria a chamada fraude a credores que o legislador tenta evitar, pois os terceiros inevitavelmente teriam prejuízo. O rol de documentos necessários para o registro está previsto no art. 18 da Lei 6.766/79’’.

3.3. Análise dos procedimentos legais de regularização de um loteamento irregular: Vamos analisar um a um esses dispositivos legais para um melhor entendimento do que seja a regularização urbanística e jurídica.

A disposição do art. 38, diz respeito à regularização jurídica (registro do loteamento ou desmembramento), ou à regularização da execução (urbanística). Nesse instante, o legislador aponta as duas formas de irregularidade dos parcelamentos. Falamos parcelamento porque tanto faz ser loteamento ou desmembramento, a regra inclui as duas formas de parcelar: irregularidade urbanística (falta de execução das obras), ou irregularidade jurídica (falta do registro), ou as duas, ou seja, o loteamento não chegou a ser aprovado.

O caput dá essa legitimidade ao adquirente de lote. Num segundo momento, dá a legitimidade ao município ou Distrito Federal. O § 2º Prefeitura Municipal ou pelo Distrito Federal, da execução das obras exigidas por legislação municipal, que incluirão, no mínimo, a execução das vias de circulação do loteamento, demarcação dos lotes, quadras e logradouros e das obras de escoamento das águas pluviais ou da aprovação de um cronograma, com a duração máxima de quatro anos, acompanhado de competente instrumento de garantia para a execução das obras. (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)

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(analisado a seguir) estende também ao Ministério Público a possibilidade dessa notificação. O entendimento de leitura deste texto legal sem dúvidas seria o seguinte: “Verificado pelo adquirente de lote que o loteamento ou desmembramento não se acha registrado ou regularmente executado, deverá suspender os pagamentos e notificar o loteador para suprir a falta. Parágrafo Único: Da mesma forma, deverá promover o município no acompanhamento do cronograma de obras, notificando o loteador para suprir as faltas.”

A forma de comunicação entre o município e o loteador é a notificação, chamada de NOTIFICAÇÃO URBANÍSTICA. O município deve notificar o loteador para suprir a irregularidade. Ao mesmo tempo, os adquirentes dos lotes devem suspender os pagamentos com a finalidade de realizar uma poupança prévia para ressarcir os cofres públicos dos investimentos que farão para regularizar o empreendimento.

A comunicação aos adquirentes de lotes deve ser feita por edital, pessoalmente de uma forma pública inequívoca, assim que o município notificar o loteador. Errado é parar de pagar. É necessário que os pagamentos não cessem com a finalidade de ressarcir os investimentos públicos que serão feitos. A própria lei protege os adquirentes de lotes em loteamentos irregulares ao vetar ao loteador ações contra estes sem que haja a regularização do empreendimento art. 46 da lei 6.766/798.

“Art. 38. Verificado que o loteamento ou desmembramento não se acha registrado ou regularmente executado ou notificado pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, deverá o adquirente do lote suspender o pagamento das prestações restantes e notificar o loteador para suprir a falta.”

Na sequência, o legislador faz a previsão relativa à suspensão dos pagamentos. Deverá o adquirente procurar o registro de imóveis onde o loteamento encontra-se registrado e requerer ao registrador o depósito das prestações devidas, as quais serão disponibilizadas em estabelecimento bancário com incidência de juros e correção monetária. A movimentação desta conta extrajudicial somente será possível com autorização judicial.

‘‘§ 1º Ocorrendo a suspensão do pagamento das prestações restantes, na forma do caput deste artigo, o adquirente efetuará o depósito das prestações devidas junto ao Registro

8. Lei 6.766/79. Art. 46. O loteador não poderá fundamentar qualquer ação ou defesa na presente Lei sem apresentação dos registros e contratos a que ela se refere.

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de Imóveis competente, que as depositará em estabelecimento de crédito, segundo a ordem prevista no inciso I do art. 666 do Código de Processo Civil, em conta com incidência de juros e correção monetária, cuja movimentação dependerá de prévia autorização judicial.’’

A previsão do parágrafo segundo, como afirmamos anteriormente, estende a legitimidade de notificação do loteador faltoso ao órgão do Ministério Público. Até porque o MP atua na defesa do consumidor e dos interesses difusos. Assim, estamos diante das possibilidades do MP processar a representação feita. O que normalmente acontece é o MP voltar-se subsidiariamente contra o município e o loteador.

‘‘§ 2º A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, ou o Ministério Público, poderá promover a notificação ao loteador prevista no caput deste artigo.”

Feita esta notificação urbanística, restam ao loteador duas opções. Ou regulariza a falta ou então torna-se inadimplente. Se regularizar a falta, deverá comprovar em juízo esta regularização, tendo como pessoas integrantes da lide a Prefeitura ou Distrito Federal, para que a comprovação seja feita judicialmente com audiência do Ministério Público. Após esta regularização, poderá lançar mão dos depósitos feitos pelos adquirentes. Neste caso, convalida a falta, não restando interesse em prosseguir a ação penal caso assim entenda o MP.

‘‘§ 3º Regularizado o loteamento pelo loteador, este promoverá judicialmente a autorização para levantar as prestações depositadas, com os acréscimos de correção monetária e juros, sendo necessária a citação da Prefeitura, ou do Distrito Federal quando for o caso, para integrar o processo judicial aqui previsto, bem como audiência do Ministério Público.’’

Num segundo momento, o loteador deverá notificar, via registro de imóveis, os adquirentes para darem prosseguimento ao pagamento das prestações restantes, o que poderá fazer de forma direta. A liberação para

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este contato, e consequentemente a restauração da obrigação contraída com a promessa de compra e venda, dependerá da respectiva autorização judicial feita no processo, em que o loteador demonstrar a regularidade da falta. Deve haver a comprovação de que foi sanada a irregularidade.

‘‘§ 4º Após o reconhecimento judicial de regularidade do loteamento, o loteador notificará os adquirentes dos lotes, por intermédio do Registro de Imóveis competente, para que passem a pagar diretamente as prestações restantes, a contar da data da notificação.’’

Porém, a segunda vertende diz respeito à inadimplência do loteador. Neste caso, abre-se a hipótese de regularização pela Prefeitura ou pelo Distrito Federal. As prestações depositadas não serão entregues ao loteador, mas servirão de ressarcimento dos cofres públicos pelas obras efetivadas no local, assim como os lotes caucionados ou a garantia aportada pelo loteador quando da aprovação do projeto de loteamento ou desmembramento.

‘‘§ 5º No caso de o loteador deixar de atender à notificação até o vencimento do prazo contratual, ou quando o loteamento ou desmembramento for regularizado pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, nos termos do art. 40 desta Lei, o loteador não poderá, a qualquer título, exigir o recebimento das prestações depositadas.’’

Ainda como proteção do adquirente, o art. 39 prevê a nulidade de cláusula de rescisão por inadimplemento do adquirente sempre que o loteamento não estiver regularmente inscrito. Ou seja, em loteamentos irregulares juridicamente é impossível o loteador pleitear a rescisão do contrato por inadimplemento. Entendemos que a cláusula prevista no art. 39 fica solta na legislação. Para que o adquirente não seja inadimplente, deve notificar o loteador e depositar em juízo as parcelas conforme preceitua o art. 38. O simples fato de ficar inadimplente não leva a lugar nenhum a solução do problema, e o investimento feito até então poderá ser perdido ou depreciado.

‘‘Art.39. Será nula de pleno direito a cláusula de rescisão de contrato por inadimplemento do adquirente, quando o loteamento não estiver regularmente inscrito.’’

O artigo 40 começa a colocar subsidiariamente o município e o loteador para efetivar a regularização do empreendimento. A lei fala em “poderá” em

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vez de “deverá”. Com isso, deixa ao encargo da administração atuar ou não na regularização de loteamentos irregulares, normalmente feitos aos olhos do município, que deveria dar sua partida através da fiscalização.

As justificativas que o texto legal traz dizem respeito à lesão aos seus padrões de desenvolvimento urbano e também à defesa de adquirentes de lotes.

Estes dois motivos deveriam obrigar o município a atuar, pois, por si só, são suficientes para atuação pública. Estes loteamentos irregulares, muitas vezes, não estão com o sistema viário adequado e tampouco com a destinação de áreas públicas suficientes para atender a população local.

Neste sentido, os padrões de desenvolvimento urbano sofrem com feridas que mais tarde se transformarão em ZEIS e receberão a regularização fundiária criando um gueto urbano visível, o que no nosso sentido é discriminador e preconceituoso.

‘‘Art. 40. A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, se desatendida pelo loteador a notificação, poderá regularizar loteamento ou desmembramento não autorizado ou executado sem observância das determinações do ato administrativo de licença, para evitar lesão aos seus padrões de desenvolvimento urbano e na defesa dos direitos dos adquirentes de lotes.’’

Aquele depósito de prestações dos adquirentes de lotes, necessário para o ressarcimento do município, bem como a garantia das obras de infraestrutura, num primeiro momento evitam o prejuízo público. O município seria apenas o executor ou substituiria o loteador na execução do parcelamento. Assim como o loteador que regularizar pode solicitar o levantamento das quantias depositadas, o município também pode proceder da mesma forma para o seu ressarcimento. Normalmente, este ressarcimento não é total, é parcial, aí entra a execução da garantia das obras, que poderão ir a mercado para ser vendidos - o resultado desta venda reverterá para os cofres públicos.

O legislador pensou, quando vinculou subsidiariamente os municípios ao loteador, em não causar prejuízo aos cofres públicos, mesmo que seja um prejuízo causado pela omissão pública. A lei trata inclusive da necessidade de haver expropriações para dotar a área da infraestrutura

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prevista para a região com equipamentos públicos comunitários, podendo o município utilizar estes recursos para tal. Essa regularização envolve também a regularização jurídica, que deverá ser feita no registro de imóveis competente. Neste caso, a propriedade permanece em nome do titular dominial, mas o registro do loteamento é feito a requerimento do município ou do DF.

Em nada altera a propriedade dominial, que poderá, pelas vias próprias, se voltar contra o registro quando for intimado de tal registro, condição esta necessária para ser levado o mesmo a termo pelo registrador. Sendo o município interessado, pela via administrativa dificilmente algum oficial entende que possa registrar o loteamento sem a participação e o requerimento do proprietário dominial. O procedimento deverá ser judicial.

Agora vamos analisar um case do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O provimento 32/06 traz ao registrador os seguintes comandos:

‘‘Art. 514’’ Nos casos de regularização pelo Poder Público, conforme autorizado pelo art. 40 da Lei 6.766, de 19-12-79, poderá o Juiz de Direito autorizar ou determinar o registro nas mesmas condições, sem prejuízo de adoção de outras medidas, cíveis, criminais ou administrativas contra o loteador faltoso.

§ 1º Através de requerimento fundamentado e com parecer favorável do Ministério Público, poderá ainda o Juiz conceder alvará de autorização para o Município firmar contratos de alienação de imóveis pendentes e promover a venda dos lotes remanescentes, revertendo a quantia apurada em benefício da Municipalidade para ressarcimento das despesas decorrentes da regularização;

§ 2º O requerimento de que trata o parágrafo anterior deverá ser instruído com documentos, públicos ou privados, e apresentação do respectivo laudo de avaliação dos lotes, firmado por profissional habilitado, sendo facultada, ainda, a comprovação das despesas através de prova testemunhal;

§ 3ºHavendo dúvida sobre os valores gastos pela Municipalidade na regularização e avaliação dos lotes, o Juiz poderá, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, determinar a realização das diligências ou perícias que entender cabíveis.

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Art. 515 Nas hipóteses de regularização previstas no presente título, a autoridade judiciária poderá permitir o registro, embora não atendidos os requisitos urbanísticos previstos na Lei nº 6.766, de 19-12-79 ou em outros diplomas legais.”

Como se nota do texto administrativo e legal, somente o juiz de direito poderá autorizar ou determinar o registro. O mesmo juiz poderá, por alvará, autorizar o município a firmar contratos dos lotes remanescentes. É a chamada anticrese urbanística.

A venda destes lotes, porém, precede de laudo de avaliação, que servirá de parâmetro de mercado, bem como a comprovação de despesas feitas pelo município. Com a venda dos lotes, o município busca o seu ressarcimento, a hipótese de perícia para apurar o valor de despesas e receitas é uma faculdade do juiz, que poderá ser assessorado de profissionais habilitados para fazerem este trabalho. Por fim, cabe ao juiz também determinar o registro dos contratos firmados, os quais, comprovado o pagamento mesmo para a municipalidade, dão direito ao adquirente a adjudicação. Estes procedimentos de caráter administrativo encaminham a questão para uma solução no vácuo legislativo.

Parece que o legislador foi tímido ao tratar do assunto, não o deixando claro ao entendimento do leitor. Carece o texto legal de complementos que são adotados na maioria das vezes por legislações administrativas, como são os provimentos oriundos das corregedorias gerais de justiça de nossos tribunais.

§ 1º A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, que promover a regularização, na forma deste artigo, obterá judicialmente o levantamento das prestações depositadas, com os respectivos acréscimos de correção monetária e juros, nos termos do § 1º do art. 38 desta Lei, a título de ressarcimento das importâncias despendidas com equipamentos urbanos ou expropriações necessárias para regularizar o loteamento ou desmembramento.

Neste parágrafo primeiro, o legislador tratou do ressarcimento através das prestações depositadas no registro imobiliário. Porém, aventa a hipótese das importâncias serem inferiores às despendidas pela municipalidade e

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aponta para a despersonalização da pessoa jurídica para o ressarcimento integral como uma das formas de ressarcimento.

Esta previsão está disposta no art. 479 do mesmo diploma. Os valores superiores serão lançados em dívida ativa e executados com esta permissão do art. 47, despersonalizaçao da pessoa jurídica do loteador.

§ 2º As importâncias despendidas pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, para regularizar o loteamento ou desmembramento, caso não sejam integralmente ressarcidas conforme o disposto no parágrafo anterior, serão exigidas na parte faltante do loteador, aplicando-se o disposto no art. 47 desta Lei.

Ainda com relação ao ressarcimento, a lei autoriza o Municipio ou DF a receber prestações dos adquirentes até o valor devido. Seria a anticrese urbanística. 10

§ 3º No caso de o loteador não cumprir o estabelecido no parágrafo anterior, a Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, poderá receber as prestações dos adquirentes, até o valor devido.

No parágrafo quarto, existe a possibilidade de o município lançar mão dos procedimentos cautelares para garantir a regularização do parcelamento. Estes procedimentos envolvem as cautelares de arresto com

9. Art. 47. Se o loteador integrar grupo econômico ou financeiro, qualquer pessoa física ou jurídica desse grupo, beneficiária de qualquer forma do loteamento ou desmembramento irregular, será solidariamente responsável pelos prejuízos por ele causados aos compradores de lotes e ao Poder Público.

10. Código Civil. Da AnticreseCódigo Civil . Art. 1.506. Pode o devedor ou outrem por ele, com a entrega do imóvel ao credor, ceder-lhe o direito de perceber,

em compensação da dívida, os frutos e rendimentos.§ 1o É permitido estipular que os frutos e rendimentos do imóvel sejam percebidos pelo credor à conta de juros, mas se o seu

valor ultrapassar a taxa máxima permitida em lei para as operações financeiras, o remanescente será imputado ao capital.§ 2o Quando a anticrese recair sobre bem imóvel, este poderá ser hipotecado pelo devedor ao credor anticrético, ou a terceiros,

assim como o imóvel hipotecado poderá ser dado em anticrese.Art. 1.507. O credor anticrético pode administrar os bens dados em anticrese e fruir seus frutos e utilidades, mas deverá apresentar

anualmente balanço, exato e fiel, de sua administração.§ 1o Se o devedor anticrético não concordar com o que se contém no balanço, por ser inexato, ou ruinosa a administração,

poderá impugná-lo, e, se o quiser, requerer a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel, o qual poderá ser corrigido anualmente.

§ 2o O credor anticrético pode, salvo pacto em sentido contrário, arrendar os bens dados em anticrese a terceiro, mantendo, até ser pago, direito de retenção do imóvel, embora o aluguel desse arrendamento não seja vinculativo para o devedor.

Art. 1.508. O credor anticrético responde pelas deteriorações que, por culpa sua, o imóvel vier a sofrer, e pelos frutos e rendimentos que, por sua negligência, deixar de perceber.

Art. 1.509. O credor anticrético pode vindicar os seus direitos contra o adquirente dos bens, os credores quirografários e os hipotecários posteriores ao registro da anticrese.

§ 1o Se executar os bens por falta de pagamento da dívida, ou permitir que outro credor o execute, sem opor o seu direito de retenção ao exequente, não terá preferência sobre o preço.

§ 2o O credor anticrético não terá preferência sobre a indenização do seguro quando o prédio seja destruído, nem, se forem desapropriados os bens, com relação à desapropriação.

Código Civil. Art. 1.510. O adquirente dos bens dados em anticrese poderá remi-los, antes do vencimento da dívida, pagando a sua totalidade à data do pedido de remição e imitir-se-á, se for o caso, na sua posse.

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a finalidade de ressarcir-se no final dos investimentos feitos.

§ 4º A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, para assegurar a regularização do loteamento ou desmembramento, bem como o ressarcimento integral de importâncias despendidas, ou a despender, poderá promover judicialmente os procedimentos cautelares necessários aos fins colimados.

O parágrafo quinto não concede ao município nenhuma anistia relacionada com os requisitos mínimos urbanísticos bem como a situação relativa às áreas de risco. Estes requisitos mínimos estipulados no artigo 4º dizem respeito à necessidade de áreas públicas, arruamento, tamanho mínimo de lote com testada de 5m e área não inferior a 125m2, área non aedificandi, reserva legal ambiental distância de leito d’água e também a sincronia do arruamento do parcelamento com o arruamento existente. Estes são requisitos mínimos exigíveis que não podem ser anistiados na regularização de um loteamento fora de ZEIS. As questões relativas às áreas de risco mesmo em ZEIS devem ser cumpridas.

§ 5o A regularização de um parcelamento pela Prefeitura Municipal, ou Distrito Federal, quando for o caso, não poderá contrariar o disposto nos arts. 3o e 4o desta Lei, ressalvado o disposto no § 1o deste último. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

O artigo 41 da lei trata da adjudicação compulsória e seus elementos para tal. O legislador, da forma como tratou o assunto, dá a impressão que basta o adquirente comparecer no registro e sua promessa de compra e venda se transformará em propriedade apenas com o depósito de todas as prestações avençadas. Isso sempre na hipótese da regularização jurídica ser efetuada pela Prefeitura ou no caso pelo DF. Os elementos necessários de direito material estão comprovados com o depósito das parcelas e o registro do contrato, permissão esta, aliás, concedida judicialmente, quando da autorização do registro do loteamento encaminhado pelo órgão público e não pelo proprietário da área. O legislador se antecipou à negativa do proprietário dominial em proceder na regularização jurídica do empreendimento antevendo que este se negará a cumprir os pactos acordados nas alienações, já que as parcelas não foram diretamente pagas a ele. Mais salutar do que a previsão legal seria a adjudicação administrativa

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ou extrajudicial. Nesta hipótese, o registrador seria revestido da figura determinante da troca de domínio, sem a intervenção judicial. Raros são os casos em que o município encaminha o registro do loteamento irregular. Esperamos que, com a difusão desta possibilidade, tal prática seja cotidiana sem a necessidade de incluírem-se na regularição fundiária de interesse social todos os casos de loteamentos irregulares. Até porque isso pode ser um convite a irregularidade, já que o processo de regularização é menos doloroso do que o processo normal de registro de loteamento.

Art. 41. Regularizado o loteamento ou desmembramento pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, o adquirente do lote, comprovando o depósito de todas as prestações do preço avençado, poderá obter o registro de propriedade do lote adquirido, valendo para tanto o compromisso de venda e compra devidamente firmado.

O artigo 42 abre a hipótese de o município desapropriar a área restante de loteamento não registrado, criando a possibilidade menos onerosa de pagamento do proprietário ou loteador. O pagamento seria por gleba, e não por lotes. Diversos casos acontecem país afora.

Ao loteador irregular, seria muito cômodo deixar a irregularidade se consolidar e depois receber a desapropriação em lotes. Nesse sentido, a lei é justa. O pagamento pela expropriação deve ser em valor de gleba, que é bem diferente do valor de lote.

Art. 42. Nas desapropriações não serão considerados como loteados ou loteáveis, para fins de indenização, os terrenos ainda não vendidos ou compromissados, objeto de loteamento ou desmembramento não registrado.

A execução de loteamento não aprovado traz para o loteador diversas sanções. Algumas de cunho administrativo, outras de cunho civil e outras, ainda, criminais. Uma das sanções importantes que a lei traz está prevista no parágrafo único do art. 43, que determina ao loteador o pagamento em dobro das áreas públicas.

Como normalmente esta quantia sempre é reduzida, no loteamento irregular a possibilidade de indenização em dinheiro onera o faltante, criando-lhe uma sanção administrativa, civil e pecuniária volumosa ou vultosa. Se aplicada adequadamente, ou então difundida esta previsão legal, antes de proceder no parcelamento irregular o loteador pensará

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duas vezes. Os ônus que são advindos da irregularidade são extensos e não compensam.

Art. 43. Ocorrendo a execução de loteamento não aprovado, a destinação de áreas públicas exigidas no inciso I do art. 4º desta Lei não se poderá alterar sem prejuízo da aplicação das sanções administrativas, civis e criminais previstas.

Parágrafo único. Neste caso, o loteador ressarcirá a Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, em pecúnia ou em área equivalente, no dobro da diferença entre o total das áreas públicas exigidas e as efetivamente destinadas. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

O artigo 44, na nossa leitura e compreensão, cria a possibilidade de expropriação com direito de preempção. Assim, o município e os entes ali enumerados podem expropriar áreas para proceder a uma adequação do loteamento, chamada pela lei de reloteamento, para proceder à demolição, reconstrução e incorporação de áreas com a finalidade de adequá-las urbanisticamente. Quase sempre, as irregularidades causam transtornos ao modelo espacial urbano. Fazendo-se uso desses instrumentos, a administração poderá regularizar sem que modifique a chamada cidade formal ou legal. Não haverá, dessa forma, vestígios da regularização. Entendemos que a ideia do legislador ao incluir este artigo na lei foi essa, porque a administração poderá em qualquer hipótese de interesse público promover a expropriação. Porém, como a intervenção é numa determinada área, a preempção ficou assegurada ao expropriado, quando da nova formatação ou de parcelamento ou de edificação.

É um artigo que requer um estudo mais aprofundado em razão dos variados instrumentos que correlaciona, como reparcelamento, demolitória, reconstrução e incorporação. Não se imagina o órgão público procedendo a uma incorporação, permissão esta dada pela lei do parcelamento do solo, nas hipóteses que enumera. Ao mesmo tempo, visualizamos o ente público como incorporador, pois os imóveis produzidos pelos órgãos públicos não são, obrigatoriamente, entregues a seus destinatários de maneira gratuita, podendo se dar esta aquisição de forma onerosa.

Art. 44. O Município, o Distrito Federal e o Estado poderão expropriar áreas urbanas ou de expansão urbana para reloteamento, demolição, reconstrução e incorporação,

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ressalvada a preferência dos expropriados para a aquisição de novas unidades.

A previsão do artigo 45 trata da irregularidade de edificações. O artigo legitima o loteador bem como os vizinhos do imóvel em que está ocorrendo a edificação em desacordo com as restrições legais ou contratuais e embargar a obra. A ação de embargo é a nunciação de obra nova. Estas restrições legais que o artigo menciona dizem respeito ao direito de vizinhança e à possibilidade que tem o loteador de incluir no seu plano de loteamento restrições que avançam as mínimas previstas na legislação municipal. Pode o loteador impor um tipo de edificação, ou uma forma de fachada, por exemplo, conforme o art. 9 da Lei 6766/79 e seus incisos.11

Art. 45. O loteador, ainda que já tenha vendido todos os lotes, ou os vizinhos, são partes legítimas para promover ação destinada a impedir construção em desacordo com restrições legais ou contratuais.

Por último, nesta ánalise da regularização fundiária feita em loteamentos irregulares, o legislador determina que as notificações devem ser feitas pessoalmente ao intimado ou notificado, devendo este assinar o comprovante de recebimento.

Todavia, a outra forma de notificar é através do Cartório de Títulos e Documentos, pois havendo negativa em receber a intimação ou notificação o funcionário certificará e no momento seguinte será feita a intimação ou notificação por edital. No âmbito geral, serve inclusive para a NOTIFICAÇÃO URBANÍSTICA este procedimento.

Art. 49. As intimações e notificações previstas nesta Lei deverão ser feitas pessoalmente ao intimado ou notificado, que assinará o comprovante do recebimento, e poderão igualmente ser promovidas por meio dos Cartórios de Registro de Títulos e Documentos da Comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-las.

§ 1º Se o destinatário se recusar a dar recibo ou se furtar ao recebimento, ou se for desconhecido o seu paradeiro,

11 Art. 9º... § 2º - O memorial descritivo deverá conter, obrigatoriamente, pelo menos:I - a descrição sucinta do loteamento, com as suas características e a fixação da zona ou zonas de uso predominante;II - as condições urbanísticas do loteamento e as limitações que incidem sobre os lotes e suas construções, além daquelas

constantes das diretrizes fixadas

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o funcionário incumbido da diligência informará esta circunstância ao Oficial competente que a certificará, sob sua responsabilidade.

§ 2º Certificada a ocorrência dos fatos mencionados no parágrafo anterior, a intimação ou notificação será feita por edital na forma desta Lei, começando o prazo a correr 10 (dez) dias após a última publicação.

A questão das irregularidades dos loteamentos se esgota nesta análise da lei do parcelamento do solo. Não estamos falando em processo de regularização de interesse social. Este será analisado em capítulo próprio. O tipo de parcelamento do solo que a lei 6.766/79 envolve diz respeito a qualquer classe social, ou a qualquer loteamento pertencente à particular ou não que apresente uma irregularidade urbanística ou jurídica.

Como afirmamos no início deste capítulo, o registro não é o suficiente para atestar a legalidade do parcelamento do solo. É necessário também que a regularidade urbanística esteja satisfeita. Caso contrário, todo o processo de irregularidade poderá ser acionado como analisamos neste capítulo.

3.4. Parte prática:

3.4.1. Gleba de terras sendo parcelada (loteamento ou desmembramento) sem a aprovação do município.

a) Embargo da obra;

b) Notificação do loteador para aprovar o parcelamento;

c) Denúncia ao MP para os procedimentos criminais;

d) Notificação dos compradores para depositar no registro de imóveis as parcelas;

e) Aplicação da multiplicação de exigência de áreas públicas como penalidade, ou o pagamento do equivalente em dinheiro;

f ) Transferência ao MP do ajuizamento da ação civil pública para resolver a situação dos adquirentes e interesses difusos, terceiros adquirentes;

g) Não deixar a ocupação, pelos adquirentes de lotes, se consolidar;

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g.1) Se consolidar: elaborar projeto urbanístico; fazer as obras restantes de infraestrutura e debitar ao loteador; requerer ao juiz o registro do empreendimento; pedir autorização judicial para a venda dos lotes que remanescerem;

h) Se o município resolver desapropiar o remanescente, efetuar a desapropriação por gleba.

Ou seja, assumir definitivamente o empreendimento.

3.4.2. Gleba de terras parcelada, porém o loteador não executou as obras de infraestrutura conforme termo de compromisso e cronograma de obras:

a) Notificar urbanisticamente o loteador para suprir a falta:

b) Se o loteador atender, continua o processo de fiscalização;

c) Se o loteador não atender: Encaminhar denúncia ao Ministério Público, notificar os adquirentes para suspenderem os pagamentos depositando no registro de imóveis; retomar as obras; lançar o valor das obras em dívida do loteador; lançar mão da caução de lotes dada pelo loteador no ato de aprovação; concluir as obras, solicitar ao juiz o levantamento das quantias depositadas, executar a caução, se sobrar remanescente, cobrar judicialmente estes valores ou ainda efetuar desapropriação do remanescente.

3.4.3. Gleba de terras parcelada, porém o loteador não registrou o loteamento no registro de imóveis:

a) Notificar o loteador para proceder no registro;

b) Se não atender, encaminhar ao juiz de direito a solicitação de registro juntando o projeto urbanístico devidamente aprovado;

A finalidade deste procedimento é garantir a ordem urbanística e

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proteger os adquirentes de lotes.

3.4.4. Gleba de terras parcelada, porém o loteador não registrou o loteamento no registro de imóveis, e as obras não estão regularmente realizadas:

a) Notificar urbanisticamente o loteador;

b) tomar as providências do 3.4.2 e 3.4.3 simultaneamente.

3.5. Qual o freio da irregularidade de terras particulares? FISCALIZAÇÃO E CONTROLE.

02. aspeCtos legaIs

e ConstItuCIonaIs da regularIzação FundIárIa urbana

Introdução:Qualquer análise sobre regularização fundiária nos obriga a buscar a

origem legislativa, para que tal procedimento seja nornalizado através de comandos constitucionais e leis esparsas. Não existe um direcionamento na legislação específica de forma a uniformizar procedimentos. Neste diapasão, encontramos espalhados por diversas legislações elementos que juntados compõem a autorização legislativa para proceder-se à regularização fundiária de interesse social sem as observâncias da legislação específica,

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que vem a ser o plano diretor municipal e suas vertentes. Ou então, para cidades com menos de 20 mil habitantes, para as quais o plano não é obrigatório, a chamada lei do zoneamento.

Podemos afirmar que a legislação foi um grande entrave da regularização fundiária por envolver órgãos da administração pública e também as chamadas serventias extrajudiciais, mais especificamente o registro imobiliário.

O passeio por esta legislação começa com o decreto-lei 58/37, que tratava do loteamento urbano e chega à lei 11.977/09, que trata da Minha Casa Minha Vida, mas que aproveitou o “ensejo’’ para normalizar a regularização fundiária urbana.

Muitos discutem qual foi o pontapé inicial da regularização fundiária urbana. Tivemos diversos eventos que levaram ao estágio em que nos encontramos agora. O primeiro evento fundamental para a regularização foi a proliferação das invasões, termo politicamente incorreto, que teve o grande surto em meados dos anos 1980.

Nesta fase, o BNH (Banco Nacional da Habitação), criado atraves da lei 4.380/64, estava agonizando. A lei 4.380 foi um grande passo na política habitacional brasileira, sua concepção foi perfeita e sua execução, uma tragédia a partir de certo momento. Sua ementa assim dispunha: “Institui a correção monetária nos contratos imobiliários de interesse social, o sistema financeiro para aquisição da casa própria, cria o Banco Nacional da Habitação (BNH), e Sociedades de Crédito Imobiliário, as Letras Imobiliárias, o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo e dá outras providências’’.

Faremos uma análise a respeito desta legislação em razão de sua importância. Mas, como afirmamos, tudo passou pelo decreto-lei 58/37, que tinha na sua emenda: “Dispõe sobre o loteamento e a venda de terrenos para pagamento em prestações”.

Como se nota pela ementa, não havia qualquer preocupação de cunho urbanista. Apenas preocupação com a relação contratual. O decreto-lei 58/37 tinha como fundamento da proteção contratual.

O decreto-lei 271/67 foi altamente inovador, sendo que alguns de

seus preceitos foram incluídos em legislações posteriores, como a Lei do

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Parcelamento do Solo 6766/79 e o Estatuto da Cidade. Estamos falando da forma de indenizar o loteamento irregular no caso de expropriação, da concessão de uso e também do direito de superfície do espaço áereo.

Em 1976, a Lei dos Regitros Públicos entrou em vigor. Lei 6.015/73, trazendo modificações efetivas na sistemática de registro de imóveis, principalmente criando o cadastro do imóvel, que é a matrícula.

Nesta linha, trouxe também o chamado engessamento dos registradores ao fiel cumprimento da legislação específica, levando-os a ir além o que se agravou com a nova lei do parcelamento, que surgiu em 1979 e que termina por tipificar condutas dos registradores na não observância da lei específica.

Entendemos que a tipificação de condutas dos registradores os tornou inflexíveis e, por segurança, terminaram indo além dos ditames legais, o que gerou também uma série de condutas que terminaram por dificultar o parcelamento do solo, gerando loteamento irregulares juridicamente.

A partir de então, em 1979, surgiu a nova lei do parcelamento do solo, a lei 6.766/79, que trouxe em seu corpo, além da proteção contratual que havia no decreto-lei 58/37, requisitos urbanísticos, área de risco, enfim tratava do planejamento urbano de uma forma concisa para evitar as distorções que de 1937 a 1979 foram praticadas no desenvolvimento das cidades. Um dos principais elementos da nova lei, além das questões urbanísticas, é a tipificação de crimes aos loteadores, corretores, enfim a todos que participam do parcelamento irregular, e, como afirmamos, aos registradores.

Neste retrospecto, algumas normas foram alterando, não de maneira substancial, a lei do parcelamento, mas de forma gradual modificou a legislação vigente, buscando a sua atualização e especialização.

As principais leis que modificaram a lei do parcelamento do solo somente ocorreriam depois de 1999. A lei 9.785/99 foi a grande modificação urbanística e de regularização fundiária introduzida na legislação do parcelamento do solo. Além dela, outras, com pequenas alterações e relevância, se seguiram, como as leis 10.932/04, 11.445/07, 12.424/12 e 12.424/11.

Após a legislação do parcelamento do solo, a Constituição Federal de 1988 deu sinais de que a irregularidade poderia tomar o seu caminho em direção à regularização com a estipulação no art. 182 da exigência de planos diretores e, no art. 183, da regularização jurídica de área irregulares

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através da usucapião especial ou através da concessão de uso. Além disso, a Emenda Constitucional 64/10 altera o artigo 6º da

Constituição Federal trazendo como um dos direitos sociais a moradia.

Da mesma forma, os direitos fundamentais previstos na CF 88, no seu artigo 5º, inciso XXII, garantem o direito de propriedade. O inciso XXIII trata da necessidade da propriedade atender a sua função social. E por aí andou o texto constitucional, dando sinais claros da necessidade da regularização.

Em 2001, entrou em vigor a lei 10.257/01, o autodenominado Estatuto da Cidade. Após onze anos nas gavetas do Congresso, enfim foi promulgada a lei que tem por fundamento a regulamentação das disposições do art. 182 e 183 da Constituição Federal, que trata da Política Urbana. O Estatuto inovou com relação ao planejamento urbano. Mas, com relação a Regularização Fundiária, como veremos, pareceu tímido.

A partir de então, o Governo Federal sempre deu mostras de querer normalizar a legislação que trata da regularização. Com relação aos imóveis da União, a lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, trouxe a seguinte ementa: “Dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos Decretos-Leis nos 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 2.398, de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2o do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências”.

Nesta lei e suas alterações, o governo federal tratou de seus “próprios” bem como deu um norte ao final da enfiteuse, direito real que vigia desde o código de 1.916 e que fora estirpado de nossa legislação em 2002 com a vigência do novo código.

O auge da regularização fundiária ocorreu com o advento da lei 11.977/09, MINHA CASA MINHA VIDA. Nesta legislação, que é um programa de governo e não uma política habitacional, a regularização fundiária foi tratada como merecia há muito tempo.

A própria lei 11.977/09 tem sofrido alterações desde a sua vigência, buscando adequações, como foi o caso da MP 514, que se converteu na lei 12.424, de 16 de junho de 2011. Além disso, para operacionalizar o programa de regularização fundiária foi necessário mexer consideralvelmente na lei dos registros públicos em que ocorre a regularização jurídica de qualquer

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empreendimento. Neste sentido, as alterações ocorridas na lei dos registros foram fundamentais e definitivas para que novos instrumentos de regularização pudessem ser implementados.

Ainda com relação à lei 11.977/09, o auto de demarcação e a legitimação da posse são instrumento de muita valia ao processo de regularização, suprimindo degraus de intransigência no processo de demarcação de áreas e titulação.

A sistemática que propomos a partir de agora é a análise individual destas legislações e da própria constituição federal de forma a entendermos o indicativo legal dado à regularização fundiária. Abordaremos aspectos fundamentais de apresentação de cada legislação, pois a Minha Casa Minha Vida terá um capítulo especial somente para ela.

4.1. Decreto-lei 58/37. “Dispõe sobre o loteamento e a venda de terrenos para pagamento em prestações.”

Se analisarmos as considerações que justificaram o decreto-lei 58/37, já poderemos ter uma ideia do que estava acontecendo em 1937.

“Considerando o crescente desenvolvimento da loteação de terrenos para venda mediante o pagamento do preço em prestações”

Tornou-se prática, com o desenvolvimento urbano, a venda de terrenos a prazo sem qualquer tipo de norma que viesse a disciplinar a forma como se relacionava o proprietário da terra e o adquirente de terreno. Este movimento foi crescente a ponto de gerar o decreto-lei 58/1937.

“Considerando que as transações assim realizadas não transferem o domínio ao comprador, uma vez que o art. 1.088 do Código Civil permite a qualquer das partes arrepender-se antes de assinada a escritura da compra e venda”

Em razão da vigência do art. 1088 do antigo código civil, que dava às partes o direito de arrependimento, o comprador de terrenos ficava à mercê de seu vendedor, que poderia se arrepender antes de assinar a escritura de compra e venda, a qual efetivamente cerrava o negócio feito. Isso gerava insegurança aos adquirentes de lotes, já que o preço era pago

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em prestações alongadas e no decorrer do tempo eram possíveis ofertas melhores pela venda dos lotes. Esta justificativa vem nos considerandos seguintes do decreto.

“Considerando que esse dispositivo deixa praticamente sem amparo numerosos compradores de lotes, que têm assim por exclusiva garantia a seriedade, a boa-fé e a solvabilidade das empresas vendedoras”

Em nome da segurança jurídica destas transações, principalmente da cautela com relação aos compromissários (adquirentes) e contra futuras alienações que eram feitas pelos proprietários de glebas, que terminavam vendendo para diversos o mesmo imóvel:

“Considerando que, para segurança das transações realizadas mediante contrato de compromisso de compra e venda de lotes, cumpre acautelar o compromissário contra futuras alienações ou onerações dos lotes comprometidos”

E, por fim, sem o registro do loteamento, que não era obrigatório, os compradores não tinham como se certificar do domínio de quem estava vendendo. Resolveu a União decretar a lei com o fim de resguardar esta modalidade de negócio imobiliário que se difundia sem qualquer segurança principalmente ao comprador de lotes.

“Considerando ainda que a loteação e venda de terrenos urbanos e rurais se opera frequentemente sem que aos compradores seja possível a verificação dos títulos de propriedade dos vendedores”

Nestas considerações, a compreensão dos motivos são exclusivamente o contrato e a exigência de registro do parcelamento a partir de então. Muitos depositavam a planta do parcelamento no registro de imóveis, o qual fazia o parcelamento conforme os contratos de promessa de compra e venda apareciam para registro.

Assim a lei dispôs, no seu artigo 1º12, a necessidade do loteador em, 12. Art. 1º Os proprietários ou coproprietários de terras rurais ou terrenos urbanos, que pretendam vendê-los, divididos em lotes

e por oferta pública, mediante pagamento do preço a prazo em prestações sucessivas e periódicas, são obrigados, antes de anunciar a venda, a depositar no cartório do registo de imóveis da circunscrição respectiva:

I, um memorial por eles assinado ou por procuradores com poderes especiais, contendo :a) denominação, área, limites, situação e outros característicos do imóvel; b) relação cronológica dos títulos de domínio, desde 30 anos, com indicação da natureza e data de cada um, e do número e data

das transcrições, ou cópia autêntica dos títulos e prova de que se acham devidamente transcritos ; c) plano de loteamento, de que conste o programa de desenvolvimento urbano, ou de aproveitamento industrial ou agrícola;

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antes de anunciar a venda, depositá-la no cartório de registro de imóveis a documentação que elenca:

Os requisitos urbanísticos ficaram a cargo do município, responsável por fazer esta exigência na aprovação do projeto de loteamento, que passou a ser necessária a partir de então. Esta previsão está contida no mesmo art. 1º, inciso I, c) e inciso II. Nada mais continha de exigência urbanística o projeto de loteamento. Com relação ao inciso II, este começou a gerar irregularidade com as áreas públicas, que eram exigidas pelos municípios com a finalidade de edificar áreas verdes, de lazer ou a própria preservação florestal que terminava sendo ocupada de alguma forma sempre com a aquiescência do poder público.

Assim, o legislador urbanístico era o município. A ele, cabia estruturar todas as exigências possíveis para a implantação de um parcelamento do solo. Os municípios, via de regra, copiavam a legislação de outro e assim as cópias se difundiam.

Com relação ao decreto-lei 58/37 e a regularização fundiária, podemos dizer que foi o ínicio da regulamentação ou da difusão das irregularidades que se seguiram. Ficou a legislação inerte por 42 anos, quando o Brasil dava um salto urbano incalculável, fazendo com que o meio urbano recebesse uma densidade muito maior do que o Brasil rural tinha. Da mesma forma, o meio urbano não estava preparado para receber tal demanda.

Chegamos à conclusão que o decreto-lei vigiu por muito mais tempo do que suportava. Trouxe uma segurança jurídica relativa aos contratos, mesmo pífia, mas com relação ao espaço urbano praticamente nada, sequer uma diretriz.

4.2. Lei 4.380/64. “Institui a correção monetária nos contratos imobiliários de interesse social, o sistema financeiro para aquisição da casa própria, cria o Banco Nacional da Habitação (BNH), e Sociedades de Crédito Imobiliário, as Letras Imobiliárias, o Serviço Federal de Habitação e nesta última hipótese, informações sobre a qualidade das terras, águas, servidões ativas e passivas, estradas e caminhos, distância de sede do município e das estações de transporte de acesso mais fácil;

II, planta do imóvel, assinada também pelo engenheiro que haja efetuado a mediação e o loteamento e com todos os requisitos técnicos e legais; indicadas a situação, as dimensões e a numeração dos lotes, as dimensões e a nomenclatura das vias de comunicação e espaços livres, as construções e benfeitorias, e as vias públicas de comunicação;

III, exemplar de caderneta ou do contrato-tipo de compromisso de venda dos lotes; IV, certidão negativa de impostos e de ônus reais; V, certidão dos documentos referidos na letra b do nº I. § 1º Tratando-se de propriedade urbana, o plano e a planta de loteamento devem ser previamente aprovados pela Prefeitura

Municipal, ouvidas, quanto ao que lhes disser respeito, as autoridades sanitárias, militares e, desde que se trate de área total ou parcialmente florestada, as autoridades florestais. (Redação dada pela Lei nº 4.778, de 1965).

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Urbanismo e dá outras providências.”

O que se nota na ementa da lei é que foi criado o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo. Os demais elementos compõem-se do financiamento para aquisição da casa própria. Tal política de Estado tinha diretriz, sabia onde queria chegar. Vamos destacar alguns elementos que entendemos fundamentais para uma boa política de governo.

O art. 1º13 prevê a formulação de uma política nacional de habitação e também de planejamento territorial. Via o governo a necessidade de iniciar o projeto de planejamento, cuja implantação só foi possível a partir do Estatuto da Cidade de forma efetiva. No mesmo sentido, o governo incentiva a iniciativa privada através de financiamento para estimular a construção de habitações de interesse social com a finalidade de produção e aquisição da casa própria para camadas ou população de baixa renda. A lei 11.977/09, com relação à produção de habitação de interesse social para camadas de baixa renda, repete a lei 4.380.

Como se nota, o objetivo é o mesmo, a produção de habitação de interesse social destinado a população de baixa renda. Mas a lei 4.380 não para por aí.

Para a implantação desta política, no art. 2º a lei determina os órgãos, capitaneados pelo Banco Nacional de Habitação, que irão financiar e participar ativamente de tal política, imputando a eles a responsabilidade do desenvolvimento do compromisso do estado.

A política era tão bem estruturada que as responsabilidades ficaram ajustadas no art. 3º14, cabendo a cada ente da federação uma missão, sendo que em todos eles a União concederia recursos técnico e financeiros para implementação de planos diretores e politicas visando à construção de moradia de interesse social. O compromisso da iniciativa privada era fazer os empreendimentos com a tutela e financiamento do governo federal. Mas, na lei 4.380, já se fala em Planejamento e Urbanismo. Então não ficou este vazio tão grande entre o decreto-lei 58/37 e a lei 6.766/79: no meio

13. ‘Art. 1° O Governo Federal, através do Ministro de Planejamento, formulará a política nacional de habitação e de planejamento territorial, coordenando a ação dos órgãos públicos e orientando a iniciativa privada no sentido de estimular a construção de habitações de interesse social e o financiamento da aquisição da casa própria, especialmente pelas classes da população de menor renda.

14. Art. 3º Os órgãos federais enumerados no artigo anterior exercerão de preferência atividades de coordenação, orientação e assistência técnica e financeira, ficando reservados:I - aos Estados e Municípios, com a assistência dos órgãos federais, a elaboração e execução de planos diretores, projetos e orçamentos para a solução dos seus problemas habitacionais;II - à iniciativa privada, a promoção e execução de projetos de construção de habitações segundo as diretrizes urbanísticas locais.

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do caminho, havia uma legislação federal que começou a implementar o planejamento urbano como forma de resolver os problemas de habitação já existentes.

As prioridades eleitas pela lei estão previstas no seu art. 4º. Notam-se indícios de regularização fundiária de forma muito efetiva. O inciso I fala em construção de conjuntos habitacionais para eliminação de favelas, mocambos e outras aglomerações em condições sub-humanas de habitação. O que vem a ser isso? Exatamente a realidade que temos hoje, ou seja, nossas Zonas de Habitação de Interesse Social, guetos e redutos urbanos sem qualquer condição humana de ocupação. As áreas de risco são ocupadas em razão do seu baixo valor comercial. Se tivessem efetivamente algum valor comercial, seriam reinvidicadas. As demais formas de prioridade dizem respeito a projetos de ordem municipal para produção de casas, as cooperativas, aí podemos falar das COHABs, que estavam perfeitamente enquadradas na política prevista na lei 4.380 − a iniciativa privada tinha fomento para contribuir com o desenvolvimento da política habitacional.

Por fim, a lei cria o Serviço Nacional de Habitação e Urbanismo, previsto no art. 5515. Eu diria que uma simples leitura das atribuções é o suficiente para entendermos que, se tivesse sido implantado e funcionado, a realidade urbana brasileira seria outra. Mas parece que o tal serviço não passou de uma estrutura bem feita, mas inóqua. Assim veremos na análise do Estatuto da Cidade, Lei 10.257/01, em que muitas referências de competência do

15. Art. 55. O Serviço Federal de Habitação e Urbanismo terá as seguintes atribuições:

a) promover pesquisas e estudos relativos ao deficit habitacional, aspectos do planejamento físico, técnico e socioeconômico da habitação;b) promover, coordenar e prestar assistência técnica a programas regionais e municipais de habitação de interesse social, os quais deverão necessariamente ser acompanhados de programas educativos e de desenvolvimento e organização de comunidade;c) fomentar o desenvolvimento da indústria de construção, através de pesquisas e assistência técnica, estimulando a iniciativa regional e local;d) incentivar o aproveitamento de mão de obra e dos materiais característicos de cada região;e) estimular a organização de fundações, cooperativas, mútuas e outras formas associativas em programas habitacionais, propiciando-lhes assistência técnica;f ) incentivar a investigação tecnológica, a formação de técnicos, em qualquer nível, relacionadas com habitação e urbanismo;g) prestar assistência técnica aos Estados e Municípios na elaboração dos planos diretores, bem como no planejamento da desapropriação por interesse social, de áreas urbanas adequadas à construção de conjuntos habitacionais;h) promover, em colaboração com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a realização de estatísticas sobre a habitação no país;i) (Vetado);j) prestar assistência técnica aos Estados, aos Municípios e às empresas do país para constituição, organização e implantação de entidades de caráter público, de economia mista ou privadas, que terão por objetivo promover a execução de planos habitacionais ou financiá-los, inclusive assisti-los para se candidatarem aos empréstimos do Banco Nacional da Habitação ou das sociedades de crédito imobiliário;l) prestar assistência técnica na elaboração de planos de emergência, intervindo na normalização de situações provocadas por calamidades públicas;m) estabelecer normas técnicas para a elaboração de Planos Diretores, de acordo com as peculiaridades das diversas regiões do país;n) assistir aos municípios na elaboração ou adaptação de seus Planos Diretores às normas técnicas a que se refere o item anterior.§ 1° Os municípios que não tiverem códigos de obras adaptados às normas técnicas do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo ou que aprovarem projetos e planos habitacionais em desacordo com as mesmas normas, não poderão receber recursos provenientes de entidades governamentais, destinados a programas de habitação e urbanismo.

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Serviço Federal de Habitação e Urbanismo se repetem. Estamos com a esperança que, desta vez, é pra valer.

4.3. Decreto-lei 271/64. Ementa: “Dispõe sobre loteamento urbano, responsabilidade do Ioteador concessão de uso e espaço aéreo e dá outras providências.”

Este decreto-lei equiparou o incorporador ao loteador e os dois empreendimentos, loteamento e incorporações, às mesmas regras, pendentes de regulamentação do BNH. Como isso não ocorreu, o preceito foi contido no art. 3º.

Com relação aos loteamentos irregulares, o decreto-lei dipõe sobre a forma como o município deverá indenizar caso queira expropriar o loteador irregular, previsão contida no art. 5º. Nota-se que muitas disposições contidas no decreto-lei 271 foram parar na lei 6.766/79.

Para a época, este decreto foi inovador. Criou a Concessão de uso tanto para imóveis públicos como para imóveis privados, remuneradas ou não (art. 7º), bem como direito de superfície do espaço aéreo, que somente com o Estatuto da Cidade voltou a vigir em nosso ordenamento jurídico. Aliás, o conceito de espaço áereo do decreto-lei é doutrinário, veja a disposição do art. 8º16.

Como se nota, em 1967 falava-se em coisas que a partir da vigência do Estatuto da Cidade pareceram modernas.

4.4. Lei dos Registros Públicos. Lei 6.015/73. A lei dos registros públicos inibia a regularização juridica dos imóveis. Era inflexível, pois tratava apenas da propriedade normal. Não tinha previsões para propriedades especiais. Se o nosso sistema não suporta a posse, que dirá alguma irregularidade oriunda do parcelamento do solo. A lei do parcelamento do solo prevê a tipificação de crime ao registrador que registrar um loteamento, desmembramento, contrato, etc. sem atender aos preceitos da lei 6.766/79. (Art. 5217). A partir de então, a rigidez ficou maior. Muitos registradores não têm conhecimento suficiente para a função. Sequer se aperfeiçoam, porque pensam que seu

16 Art 8º É permitida a concessão de uso do espaço aéreo sobre a superfície de terrenos públicos ou particulares, tomada em projeção vertical, nos termos e para os fins do artigo anterior e na forma que for regulamentada.

17 Art. 52. Registrar loteamento ou desmembramento não aprovado pelos órgãos competentes, registrar o compromisso de compra e venda, a cessão ou promessa de cessão de direitos, ou efetuar registro de contrato de venda de loteamento ou desmembramento não registrado.Pena: Detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinquenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis.

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cargo é vitalício. Por ser altamente lucrativa, nem mortos deixam a cadeira! Muitos que estão profissionalizados tomaram para si, em cidades menores, o dever de proceder na regularização fundiária mesmo sabendo que não têm direito a emolumentos, como veremos na análise da lei 11.977/09. O que efetivamente mudou na legislação dos registros foi o Capítulo XII, introduzido pela lei 11.977/09, que inseriu no texto os artigos 288-A a 288-G, que se adequam à lei 11.977/09.

Algumas corregedorias gerais de justiça do país já tratavam a irregularidade urbana bem antes.

4.4.1. Rio Grande do Sul - Com a Consolidação Normativa Extrajudicial, os provimentos relativos ao MORE LEGAL chegaram aos cartórios antes da lei federal. Tudo se originou na constituição de condomínios civis em áreas rurais. O “empresário” que tinha uma extensão de área em zona rural efetuava a venda de frações ideais de terreno para diversas pessoas e constituía um condomínio, normalmente administrado por ele, para implantação de infraestrutura urbana e cobrança de taxas condominiais. Este procedimento no aspecto do direito material não era ilegal, porém se constituía num parcelamento irregular do solo. As prefeituras se omitiam, pois entendiam que o que acontecesse no perímetro rural não era de sua responsabilidade. Os tabeliães lavravam escrituras, e os registros registravam, até que um provimento da Corregedoria os proibiu de fazer isso. Passados alguns anos, veio a solução através do More Legal, em que a lei do parcelamento em ocupações consolidadas era flexionada. Só não se permitia a regularização em área de risco. E o município deveria aprovar o projeto urbanístico onde as áreas públicas, até então exigidas, poderiam ser dispensadas. Foi a maneira de regularizar diversos empreendimentos feitos desta forma.

Você pode acessar a íntegra deste provimento no seguinte link:

http://www.tjrs.jus.br/site/poder_judiciario/tribunal_de_justica/corregedoria_geral_da_justica/codigo_de_normas/

4.4.2. Tribunal de Justiça de São Paulo. Art. 152 a 155 da sua consolidação normativa.

O link de acesso é:

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http://www.tjsp.jus.br/Institucional/Corregedoria/ NormasExtrajudicial.aspx?f=7

4.4.3. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Art. 205.

http://cgj.tjrj.jus.br/consultas/legislacao/ consolidacao-normativa-parte-extrajudicial

Enfim, todos os tribunais, de alguma forma, tratam das irregularidades.

4.5. A Lei do Parcelamento do Solo. 6.766/79. “Dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano e dá outras Providências” e sua principal alteração, lei 9.785/99. Ao contrário do decreto-lei 58/37, a lei 6.766/79 inovou com relação à antiga regulamentação do parcelamento do solo, indo além da proteção contratual. Esta proteção foi contemplada na nova lei, mas as questões de natureza urbanística foram também abordadas no parcelamento do solo. Regras mínimas de parcelamento foram fixadas, e conceitos urbanísticos foram introduzidos a nossa legislação. Assim, podemos verificar já no art. 3º18 o legislador enumerando as áreas chamadas de risco. Muito se fala nestas áreas, porém a enumeração das principais áreas de riso decorre da própria lei.

No caput do artigo, o legislador não exonerou as áreas de urbanização específica das áreas de riso. Isso indica que, no caso de uma ocupação consolidada, em ZEIS, a obrigação do poder público com relação a este assentamento é sua e implica na remoção. Não pode ser assentado em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações.

O inciso I trata deste dispositivo. A crítica que se faz com relação ao dispositivo legal é que a lei autoriza o uso destas zonas alagadiças e sujeitas a inundação desde que sejam tomadas providências para assegurar o escoamento das águas.

Dificilmente, estas providências serão seguras. Assim, quis o legislador mitigar a ocupação de uma área de risco impondo, para a sua utilização, as

18. Art. 3o Somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal. (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)Parágrafo único - Não será permitido o parcelamento do solo:I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas;Il - em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados;III - em terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas exigências específicas das autoridades competentes;IV - em terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação;V - em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção.

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providências a serem adotadas, como a drenagem das águas pluviais. Nas áreas alagadiças muito menos; a não ser que cursos de rios e arroios sejam modificados, o que torna o processo oneroso e destituído de segurança. Afora isso, regiões com lençol freático baixo causam desconforto ambiental aos ocupantes a tal ponto de verterem água das paredes e dos pisos das construções. Seguindo a análise das áreas de risco, os aterros, principalmente os sanitários, não são recomendáveis ao parcelamento conforme preceitua o inciso II.

Da mesma forma que o inciso anterior, a lei exige que sejam previamente saneados. Mas este seria outro fator de risco para acolher o parcelamento do solo. O terceiro elemento considerado de risco é em terrenos com declividade igual ou superior a 30%. Em muitas cidades brasileiras, a topografica é acidentada. Vejam a região serrana do Rio de Janeiro, onde há desmoronamento de encostas, vias de regra em todos os verões, quando há desmoronamento de morros, que causam grandes tragédias coletivas. O mesmo problema ocorre nas encostas de morros em Santa Catarina. A questão de ocupação de encostas está diretamente vinculada à sua contenção e aos trabalhos para amortizar a queda de água e o deslocamento do solo superficial.

Temos o exemplo de Belo Horizonte, que tratou de suas encostas com legislação e atitudes efetivas de contenção, permitindo a aplicação da segunda parte do dispositivo legal, que prevê a exigência do aval de autoridades competentes para efetivar a ocupação. Aqui cabe mais um comentário a respeito desta proibição legal. Algumas prefeituras entendem que somente quando se trata de parcelamento do solo na modalidade prevista na lei 6.766/79 é que há incidência da lei do parcelamento e suas exigências. É uma interpretação equivocada, já que a área de risco sempre será uma área de risco. Independentemente de ser regido o parcelamento pela lei específica ou não, deve o legislador municipal aproveitar os conceitos que a lei federal traz e impor a todo o parcelamento do solo estas condicionantes.

A quarta previsão do risco está contida no inciso IV, que trata dos terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação. Para tanto, o laudo geológico faz parte da própria licença ambiental para implantação de um parcelamento do solo. Deve haver condições geológicas para a implementação do parcelamento do solo. Logo que a lei passou

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a vigir, muitos loteadores ficavam indignados com mais este custo para implantação do parcelamento sem se ater à importância que esta condição daria ao seu empreendimento. A quinta área de risco, em que é impossível parcelar, diz respeito à área de preservação ecológica e às áreas poluídas que impedem as condições sanitárias suportáveis. Aqui há a incidência do Código Florestal e suas áreas não edificantes, conforme prevê a própria lei do parcelamento, como veremos na análise do art. 4º, inciso III.

Podemos, então, em resumo, dizer que as áreas de risc constituem-se nas seguintes:

a) Terrenos alagadiços e sujeitos a inundações;

b) Terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública;

c) Terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento);

d) Terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação;

e) Áreas de preservação ecológica ou aquelas onde a poluição impede condições sanitárias suportáveis.

A partir de então, podemos começar a analisar os requisitos mínimos urbanísticos que a lei impõe às legislações municipais e estaduais. Estes requisitos são necessários para o parcelamento do solo e muitas vezes geram irregularidade neste parcelamento, já que não são atendidos pelo legislador. A previsão está contida no art. 4º e seus incisos e art. 5º.

4.5.1. Equipamentos urbanos e comunitários: O primeiro elemento restritivo trata das áreas destinadas a sistemas de circulação e da implantação de equipamento urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público. Antes a lei fixava um percentual para estas áreas em 35% do total da gleba. Assim, nenhuma legislação municipal poderia aprovar um empreendimento em que a soma das áreas de circulação, implantação de equipamentos urbanos e comunitários, bem como os espaços livres de uso público, poderiam ser inferiores a este percentual. Podemos afirmar com convicção que este foi um elemento gerador de irregularidade. As áreas institucionais, normalmente estipuladas em 5% da área de gleba, não recebiam o prédio a que se destinavam. Veja que estas

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áreas consideradas áreas afetadas ou bens de uso especial na maioria das vezes não receberam a destinação correta. Assim, terminaram ocupadas por famílias de baixa renda, sem qualquer possibilidade de regularização, uma vez que a prescrição aquisitiva não se opera em imóvel público.

Da mesma forma, as praças e os espaços livres também não recebiam equipamentos. Tornavam-se áreas abandonadas, servindo para a ocupação, na maioria das vezes consentida pelo próprio poder público. Estas anomalias no trato do bem público e do bem-estar geral terminaram gerando uma série de irregularidade sem qualquer solução até o ano de 2001.

Mesmo que o decreto-lei 271/67 autorizasse o uso da Concessão do Direito de Uso para imóveis públicos, muitos não usavam tal área por ser uma área afetada e sua desafetação importava em substituir esta área por outra. As comunidades que se instalavam nas áreas públicas ficavam com uma posse precária, totalmente desprotegida, o que refletia também na infraestrutura que o local recebia. O prejuízo era generalizado. Por isso, a lei 9.785/99 veio como solução para o término do percentual fixado, que provou com o tempo não se tratar de planejamento urbano a relação entre a densidade populacional para a área e a infraestrutura urbana oferecida.

Distorções foram geradas com a utilização do percentual. Loteamentos limítrofes foram obrigados a deixar as mesmas áreas com iguais destinações para cumprir o percentual, quando na verdade nenhum daqueles equipamentos seria necessário para o novo parcelamento do solo. Tornou-se a utilização do percentual mais um empecilho para o planejamento urbano e a efetiva utilização destes espaços pelas comunidades. Muitas legislações municipais passaram a exigir do loteador o prédio institucional construído, a área verde equipada e também o espaço de recreação, enfim foi uma maneira de resolver o problema de desvio de utilização. Outras legislações municipais reeditaram planos diretores e a lei do parcelamento do solo revigorando o percentual em vez de utilizar a fórmula oferecida pela lei 9.785/99.

Numa primeira leitura a respeito deste dispositivo legal, pensamos que a área sempre será menor do que os 35%. Nem sempre; ela pode ser maior inclusive. O pensamento que o legislador quis introduzir nas administrações públicas é o de efetivo planejamento urbano dentro da necessidade,

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evitando-se estes vazios que terminam servindo eleitoralmente ao mau uso de tais espaços que são de uso especial e uso comum do povo, conforme a classificação dos bens públicos. A relação com a densidade populacional e infraestrutura urbana oferecida tem tudo a ver com a utilização do espaço urbano, inclusive com o adensamento. Sempre que sobrar infraestrutura, a recomendação é adensar.

4.5.2. Testada mínima e área de lotes: O segundo elemento que se constitui numa diretriz urbanística e que também gera irregularidade urbana se não observado é a testada e área mínima de lotes.

A lei recomenda, no inciso II do art. 4º, que os lotes terão área mínima de 125m2 e testada mínima de 5m. Numa leitura rápida, o aplicador do direito urbanístico poderá entender que este é um limitador definitivo para qualquer irregularidade. Seguindo em frente na leitura do inciso, chegamos à seguinte conclusão, que vem a ser a exceção: “salvo quando o loteamento se destinar a urbanização específica ou edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes”. Aqui vem a ressalva da urbanização específica. Ela ocorre em duas situações: a primeira diz respeito às áreas declaradas como Zonas Especiais de Interesse Social, ou ZEIS, e a segunda às operações urbanas consorciadas quando a legislação permite a urbanização específica.

Esta urbanização não fica refém do parcelamento do solo, será utilizado um elemento próprio para tanto, ou seja, gabarito de ruas, testada e tamanho de lotes, índices de aproveitamento, direito de vizinhança, todos estes elementos podem ser suprimidos no processo de regularização. Com relação a edificações e conjuntos habitacionais de interesse social, da mesma forma não sofrem a incidência dos limitadores urbanísticos da lei. É evidente que o mínimo do conjunto urbano deva ser preservado em nome da ordem urbanística.

Muitas vezes, para otimizar um empreendimento e fazer o maior número possível de residências, as administrações produzem empreendimentos que fogem deste limitador urbanístico legal. Assim, sempre que nos depararmos com tal situação devemos afastar este requisito urbanístico.

O § 1º do mesmo artigo prevê a atribuição da legislação municipal

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para fixar áreas mínimas e máximas de lotes, bem como coeficiente de aproveitamento e índices urbanísticos para cada região.

4.5.3. As áreas non aedificandi. O terceiro limitador urbanístico está previsto no inciso III do mesmo artigo. Num primeiro momento, trata das áreas chamadas non aedificandi, ou não sujeitas à edificação. Os primeiros elementos que requerem este tipo de reserva urbanística são as faixas de curso d’água corrente ou dormentes. Aqui teremos a incidência do Ccódigo Florestal, LEI Nº 12.651, de 25 de maio de 2012 e suas respectivas reservas de áreas previstas no art. 4º19 da mencionada lei, já que a parte final do inciso faz a ressalva: “as maiores exigências da legislação específica”. Isso afasta os 15m de área não edificável prevista inicialmente na lei ao longo das faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente. Com relação às faixas de domínio público das rodovias, ferrovias e dutos será obrigatória a reserva de uma faixa non aedificandi de 15 (quinze) metros de cada lado. São áreas de escape que independem da faixa de domínio da rodovia. Nestas distâncias, é impossível edificar. Porém, o § 3º o legislador previu a possibilidade de reserva de faixa não edificável vinculada a dutovias. Se necessária, a reserva de faixa não edificável será vinculada a dutovias, podendo ser exigida no lincenciamento ambiental. Muito se pergunta da

19 Art. 4o  Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:- as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do

leito regular, em largura mínima de:      (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012). a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;      (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012). IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros;      (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012). V - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive;VI - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;VII - os manguezais, em toda a sua extensão;VIII - as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;IX - no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação;X - as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação;XI - em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.      (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012). § 1o  Não será exigida Área de Preservação Permanente no entorno de reservatórios artificiais de água que não decorram de barramento ou represamento de cursos d’água naturais.      (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012). § 2o  (Revogado).      (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

......§ 4o  Nas acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a 1 (um) hectare, fica dispensada a reserva da faixa

de proteção prevista nos incisos II e III do caput, vedada nova supressão de áreas de vegetação nativa, salvo autorização do órgão ambiental competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente - Sisnama.      (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

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aplicabilidade das áreas não edificáveis em outros imóveis que não sejam produto de parcelamento do solo. Voltamos a afirmar que a legislação se constitui de um sistema, se a lei do parcelamento recomenda estas faixas não edificáveis não é para onerar o loteador, mas objetivando um melhor aproveitamento do espaço urbano e a segurança dos futuros adquirentes de terrenos.

4.5.4. Articulação das vias novas e as existentes. A quarta restrição urbanística que gera impacto no meio urbano é a articulação das vias existentes e projetadas. Os cortes de vias devem obedecer à ordem hierárquica do sistema viário, bem como à sua perfeita articulação com o sistema existente e projetado. Na solicitação de diretrizes, o art. 6º20, todos os requisitos urbanísticos mencionados serão analisados, tomando-se por base os elementos fornecidos pelo loteador no ínicio do processo de parcelamento. Existe a preocupação do legislador para que haja a harmonia das novas vias com a topografia local. Esta sincronização de arruamento acontece também em aglomerados urbanos e regiões metropolitanas, quando loteamentos são limítrofes entre municípios. Neste instante, entra em cena o órgão estadual que trata da região e interfere para que haja harmonia.

4.6. A Constituição da República.

Toda a nossa ordem jurídica emana da Constituição Federal. Até 1988, não tinhamos incluído na Constituição da República qualquer indicação a política urbana. Através de uma proposta popular, a constituição de 1988 trouxe em seu texto um capítulo de apenas de dois artigos que trata da Política Urbana. As previsões estão contidas no art. 182 e 18321. Analisaremos

20. Art. 6º. Antes da elaboração do projeto de loteamento, o interessado deverá solicitar à Prefeitura Municipal, ou ao Distrito Federal quando for o caso, que defina as diretrizes para o uso do solo, traçado dos lotes, do sistema viário, dos espaços livres e das áreas reservadas para equipamento urbano e comunitário, apresentando, para este fim, requerimento e planta do imóvel contendo, pelo menos:I - as divisas da gleba a ser loteada;

II - as curvas de nível à distância adequada, quando exigidas por lei estadual ou municipal;III - a localização dos cursos d’água, bosques e construções existentes;IV - a indicação dos arruamentos contíguos a todo o perímetro, a localização das vias de comunicação, das áreas livres, dos equipamentos urbanos e comunitários existentes no local ou em suas adjacências, com as respectivas distâncias da área a ser loteada;V - o tipo de uso predominante a que o loteamento se destina;VI - as características, dimensões e localização das zonas de uso contíguas.

21. Capítulo II da Política Urbana

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende as exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

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ambos os artigos de forma a elucidar o norte traçado pelo legislador que terminou por ser regulamentado pelo Estatuto da Cidade, Lei 10.257/01

O Artigo 182 trata na sua introdução da política de desenvolvimento urbano. Já vimos na lei 4.380/64 que esta mesma matéria já tinha sido tratada buscando o planejamento e o desenvolvimento urbanos. Na leitura da lei de 1964, o indicativo eram os planos diretores e na CF de 1988 o norte é o mesmo. Então faltaram os planos diretores para que as irregularidades e informalidades urbanas não fossem significativas como são nestes dias. O objetivo inicial e principal é o planejamento, porém a CF 88 foi além, tratando do desenvolvimento das funções sociais da cidade e da garantia do bem-estar de seus habitantes. Além de a cidade ser socialmente justa, igualando seus investimentos em todo o território espacial, não negando infraestrutura pública a todos, ou seja, universalizando a urbanização, ela visa também ao bem-estar dos habitantes, a quem são endereçadas as políticas públicas.

O legislador constitucional elegeu o instrumento que serviria de indução ao desenvolvimento e expansão urbanos, o plano diretor para cidades com mais de 20mil habitantes, tornando-o obrigatório. O plano diretor é materializado através de lei aprovada pela Câmara Municipal de Vereadores. Dependerá das leis orgânicas municipais a necessidade de ter um plano diretor como lei complementar ou lei ordinária. Alguns municípios adotam a aprovação do plano diretor por lei complementar. Mas, para tanto, deveria haver uma previsão na lei orgânica municipal exigindo lei complementar para o plano diretor, que nada mais é do que uma modalidade específica do processo de votação pelo legislativo municipal. A obrigatoriedade do plano diretor somente foi cumprida a partir do momento em que a União trancou recursos para os municípios e o Ministério Público entrou em ação ameaçando os prefeitos com ações próprias. Foram alguns

§ 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

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planos implantados de forma desorganizada e rápida. A conclusão é que os planos não funcionam, falta legislação específica; enfim, o conceito e a concepção dos planos diretores foram mal administrados e planejados pelas administrações municipais. Foi um apreendizado que a partir de agora poderá se enquadrar na modalidade como o legislador federal trouxe para a política urbana.

O § 2º traz a definição constitucional da função social da propriedade urbana. Ele dita que a propriedade deve estar em consonância com as exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, ou seja, deve estar de acordo com a legislação municipal que trata de diretrizes e ordena o espaço urbano. Como se nota, o plano diretor é o fundamento da função social da propriedade prevista no art. 5º, inciso XXIII da mesma CF/88. Outros fatores de qualquer natureza não influenciam nesta definição, que é constitucional.

O § 3º reafirma a justeza nas desapropriações e determina que elas sejam feitas em dinheiro. Pode ser contraditório, visto que a indenização, quando a propriedade não cumpre sua função social, é feita com títulos da dívida pública. Estes títulos, porém, assim como os títulos da dívida agrária, refletem uma quantia em dinheiro a ser recebida pelo expropriado.

No § 4º, o legislador constitucional começa a grande inovação que terminou no Estatuto da Cidade. É explicitado o que o § 2º determinou como função social da propriedade. O primeiro elemento é a faculdade que o poder público municipal tem de utilizar ou não ferramentas que terminam com a expropiação de um imóvel. Mas, para que se usem todas as ferramentas disponibilizadas pela CF e o Estatuto da Cidade, é necessária uma legislação específica para definir uma área atingida. Antes de individualizar a área, todavia, é necessário que seja gravada a zona em que poderão ser utilizados os intrumentos e as ferramentas disponibilizadas pela CF e pelo Estatuto da Cidade. Esta inclusão nas legislações atuais se dá através do zoneamento, no qual é indicada a utilização de tais instrumentos. Para isso, o endereço da não utilização da propriedade de acordo com o plano diretor são as seguintes: a) imóvel sem edificação; gleba de terras de grande extensão no meio urbano e que esteja sendo utilizada na forma especulativa, interrompendo o desenvolvimento da cidade, ou então simplesmente terreno baldio sem qualquer edificação no meio urbano com infraestrutura necessária para a utilização; b) imóvel subutilizado, podendo

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ser uma gleba, um terreno, enfim, aquele que não esteja sendo utilizado adequadamente de acordo com os índices urbanísticos e o aproveitamento técnico previstos no plano diretor. Estas hipóteses dão margem a que se formem irregularidades urbanas, já que a própria constituição federal enumera os instrumentos de que a administração pode lançar mão: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

Como se nota, é possível numa receita extrafiscal a imposição do IPTU progressivo no tempo ao proprietário que se negar a dar a função social da propriedade conforme as diretrizes de ocupação previstas no plano diretor. Quando analisarmos o Estatuto da Cidade, colocaremos à disposição dos leitores estas ferramentas. Normalmente, estas extensões de terras são utilizadas para os fins definidos para a regularização fundiária como forma de manter uma política de regularização com elementos capazes de produzir espaços para a produção de novas moradias e assentamento das moradias irregulares.

Por sua vez, o art. 183 da CF/88, traz no seu texto a regularização fundiária de forma efetiva relacionada com a regularização jurídica da Constituição. Os requisitos para a usucapião constitucional especial estão todos previstos no artigo mencionado. Limita o texto constitucional a existência da posse por cinco anos ininterrupta e sem oposição; limita a área do imóvel em 250m2; exige a utilização do imóvel como moradia sua e da família e, por fim, não pode o beneficiário ser proprietário de outro imóvel. Serve a usucapião constitucional para fins de regularização individual de imóveis feitos por seus ocupantes quandos os imóveis forem terras de particulares. Este título de domínio será reconhecido apenas uma vez, sendo necessária a declaração do beneficiário de que não possui outro imóvel. De forma sutil, o legislador incluiu no § 1º, junto com a usucapião, a concessão de uso. Esta concessão, veremos no desenvolvimento deste trabalho, resultou na MP 2220/01, pois, matéria tratada no Estatuto da Cidade, foi vetada pelo Presidente da República, editando na sequência a MP 2220/01 ainda em vigor. Ainda reconhece o legislador constitucional que tanto a usucapião como a concessão de uso podem ser reconhecidas tanto para o homem

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como para a mulher, sendo que a preferência, como veremos na análise da legislação restante, é da mulher. A concessão de uso foi incluída na nossa legislação federal para resolver o problema dos imóveis urbanos públicos ocupados, como é o caso da área de uso especial e das áreas de uso comum do povo originárias normalmente de loteamento irregulares, ou mesmo regulares que não tiveram a sua destinação confirmada.

Esta seria uma análise suscinta dos dispositivos constitucionais que tratam, de alguma forma, do desenvolvimento urbano e da regularização fundiária de forma efetiva como balizadores do norte da ocupação do solo de maneira efetiva.

Já no artigo 1º da CF/88�, o legislador constituinte traça fundamentos que devem ser observados na vigência da constituição através da Federação. Entre os enumerados estão a cidadania e a dignidade da pessoa humana. O exercício da cidadania envolve obrigatoriamente o direito à moradia, assim como a dignidade da pessoa. Nada mais indigno do que morar em um lugar que a qualquer momento possa sofrer um dano de ordem natural, como um deslizamento, um alagamento, e que o Poder Público não forneça qualquer das infraestruturas necessárias para a sobrevência − como água, luz e esgotamento sanitário.

Não se admite mais este tipo de situação para qualquer brasileiro. O país chegou num patamar que isso também deve ser irradicado. A questão da infraestrutura urbana, que não era feita − pois canos enterrados não aparecem e, consequentemente não evertem em votos −, ficou para o passado. Agora é necessário que se faça um mutirão buscando resgatar esta dívida que muito refletiu na saúde pública.

Na sequência, podemos analisar o art. 6º, que trata do direito social à

moradia, incluido na CF/88 pela EMENDA 64. Este direito à moradia veio reforçar sobremaneira todo o processo de inclusão urbana. Necessário que um direito social forte pudesse servir de base ao processo de regularizar, de forma a tornar iguais os desiguais.

Este foi o objetivo do legislador infraconstitucional ao propor a emenda 64: dar suporte ao processo de regularização. Assim, o invasor ou ocupante passarão a ter um direito reconhecido pela legislação maior do país, no sentido de ver reconhecido o seu direito de morar, o que vem a ser

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dignidade humana e cidadania. O direito à propriedade não pode ser restrito a determinadas classes sociais. O acesso à moradia deve ser universalizado.

Seguindo a análise da CF/88 e a regularização fundiária, chegamos ao momento em que as leis são produzidas, sendo possível a distribuição desta competência legislativa para cada ente federado. Num primeiro momento, o art. 21 determina a quem compete legislar sobre direito urbano. O art. 2122 determina esta competência para a União, e seus incisos IX e XX indicam a ordenação do território e a instituição de diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transporte.

Assim nasceu a lei de diretrizes básicas de saneamento, estatuto da cidade, etc., todos de iniciativa da União. Mas, com relação a registros públicos, um dos elementos que encrencavam a regularização fundiária, o permisso constitucional, é privativo da União conforme art. 2223. Somente a União poderá legislar sobre registros públicos. Ficou o processo de regularização à mercê da iniciativa da União para modificar a lei dos registros públicos, o que foi possível apenas com a Lei 11.977/09.

Porém, com relação a construção de moradias, melhoria das condições habitacionais e saneamento básico, esta competência é comum ou concorrente, cabendo também a iniciativa aos estados, municípios e o DF.O que se vê é sempre o município buscar recursos nos estados, raros, ou então direto na União, que é quem concentra a maior renda através da cobrança exagerada de impostos. Esta competência está disciplinada no art. 2324, inciso IX da CF/88.

O constituinte ainda estipulou uma regra que é princípio básico do direito. Poderá o município suplementar a legislação federal e estadual no que couber, art. 30 e inciso II25. Se a União é omissa ou a legislação não atende determinada situação local, pode o Município legislar. Como exemplo atual, podemos falar do chamado condomínio de lotes. A legislação federal não trata do assunto, os estados também não. Isso serve de fenda para que os

22 Art. 21. Compete à União:IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos;23 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:XXV - registros públicos;24 Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;25 Art. 30. Compete aos Municípios:II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento

e da ocupação do solo urbano;

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empresários penetrem na irregularidade, promovendo condomínio de lotes utilizando o disposto no art. 826 da Lei 4.591/64, que trata das incorporações. Muitas irregularidades urbanas foram geradas a partir da utilização deste dispositivo de lei específica utilizado para produção de condomínio de lotes. Pode o legislar local elaborar legislação específica para este tipo de empreendimento sem jogá-lo na irregularidade. Há previsão legal e constitucional para que isso ocorra. Não é necessário criar-se uma série de irregularidades para depois corrigir tudo o que se tornou irregular por omissão tripla.

Já o inciso VIII do art. 3027 da CF/88 trata da competência dos municípios para gerir e gestionar o adequado ordenamento territorial feito através do planejamento, do controle, do uso e da ocupaçao do solo. Por isso é que afirmamos que o município é quem tinha que legislar sobre o parcelamento do solo. Nosso entendimento a respeito é de que a União somente poderia expedir diretrizes, cabendo ao município os casos locais.

A interferência do Estado e da União nas questões locais, tão diversificadas num país continental como é o Brasil, além de não corresponder à realidade local, é fato gerador de irregularidades.

Com relação aos imóveis da União, a matéria está disciplinada nos atos das disposições finais e transitórias da CF/88 em legislação própria, lei Nº 9.636, de 15 de maio de 1998, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos decretos-leis nos 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 2.398, de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2o do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e dá outras providências.

Estas seriam as considerações a serem feitas quanto aos aspectos 26 Lei 4.591/64.Art. 8º Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário deste ou o

promitente cessionário sobre ele desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte:a) em relação às unidades autônomas, que se constituírem em casas térreas ou assobradadas, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação e também aquela eventualmente reservada como de utilização exclusiva dessas casas, como jardim e quintal, bem assim a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá às unidades;b) em relação às unidades autônomas que constituírem edifícios de dois ou mais pavimentos, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação, aquela que eventualmente for reservada como de utilização exclusiva, correspondente às unidades do edifício, e ainda a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá a cada uma das unidades;c) serão discriminadas as partes do total do terreno que poderão ser utilizadas em comum pelos titulares de direito sobre os vários tipos de unidades autônomas;d) serão discriminadas as áreas que se constituírem em passagem comum para as vias públicas ou para as unidades entre si.

27 Art. 30. Compete aos Municípios:....VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento

e da ocupação do solo urbano;

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constitucionais relacionados com a regularizaçao fundiária e seus princípios.

4.7. O Estatuto da Cidade. Lei Federal 10.257/01. Ementa: “Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências”.

Como se nota na ementa, a existência do Estatuto da Cidade tem ligação direta com a Política Urbana determinada na Constituiçao Federal de 1988 nos artigos 182 e 183. O Estatuto da Cidade se autodenominou assim. É uma lei federal que estabelece normas de ordem pública e interesse social. “As normas de ordem pública são normas de aplicação imperativa que visam direta e essencialmente tutelar os interesses primordiais da colectividade.”28 Nesse sentido, muitas diretrizes e comandos do Estatuto da Cidade são obrigatórios na execução da política urbana relacionada com o planejamento e a ordenação do uso territorial dos referidos espaços.

Com relação à regularização fundiária urbana, entendemos que o Estatuto foi tímido, trazendo em seu bojo apenas poucas referências e diretrizes, mas o suficiente para servir de espeque à construção de uma legislação e a uma política capaz de realizar a reforma urbana em consonância com o planejamento e a formalidade das cidades no tocante à distribuição de infraestrutura de forma igualitária. Passaremos a analisar estes comandos do estatuto para um melhor entendimento de sua real influência no processo de regularização fundiária.

O parágrafo único do art. 1º coloca a coletividade acima do bem particular, vinculando o uso da propriedade neste sentido. Da mesma forma, o legislador refere-se à segurança e ao bem-estar dos cidadãos e ao equilíbrio ambiental. Neste sentido, o legislador já dá uma ideia ampla de sua abrangência, incluindo na introdução do texto legal a necessidade de atender as premissas determinadas pelo texto legal na execução da política urbana. Seria este parágrafo uma autorização para o legislador concorrente e aplicador da política ousar. Com a finalidade de ordenar a função social da cidade, foram fixadas diretrizes para atingir este objetivo, estipulado no art. 2º. As diretrizes são objetivos a ser alcançados para se atingir o comando do caput do artigo, que é a função social da cidade – esta não deve ser confundida com a função social da propriedade.

A cidade envolve o todo, e está relacionada com a política de 28 COSTA, MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA, Direito das Obrigações, 3.ª Edição, Editora Almedina, Coimbra, 2000, p. 473.

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desenvolvimento igualitário. Já a primeira diretriz prevista no inciso I deste art 2º propõe a garantia a cidades sustentáveis e, como tal, sugere o legislador o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer para as presentes e futuras gerações. A leitura desta diretriz nos faz concluir que deve ser estendida a todos a condição de cidade formal.

Quando se trata de regularização fundiária, nunca podemos abandonar o conceito de regularização urbanística (que vêm a ser todos os elementos que compõem equipamentos públicos comunitarios e urbanos) bem como a regularização jurídica, que é a garantia à segurança do direito sobre a terra urbana. Assim, o Estatuto da Cidade inicia seu rol de diretrizes em busca da função social da cidade indicando a necessidade de procedermos de forma igual em todo o território ocupado espacialmente pelos cidadãos, não fazendo discriminação sobre localização ou tipo de ocupação29.

As parcerias relativas ao processo de urbanização estão previstas no inciso III30. Sempre que houver o interesse social, a lei recomenda esta cooperação entre os entes federados e a iniciativa privada, comprometendo todos os setores da sociedade e determinando a busca incessante de tal regularidade urbanística. Neste sentido, podemos afirmar ser esta diretriz um comando para a regularização urbanística. A distorção do planejamento urbano causa reflexo na questão ambiental, uma vez que as áreas ocupadas quase sempre têm valor ambiental, e não urbanístico, pois aquele não é reinvidicado. Esta previsão exigindo o planejamento está contida no inciso IV31 do diploma analisado. Por enquanto, ou na leitura e análise destas diretrizes de forma indireta, elas apontam as distorções urbanas havidas, que por sua vez geram as irregularidades urbanas que pretendemos resolver. São autorizações legislativas para que o processo de regularização sofra o seu START.

Ainda com relação à regularização urbanística, a diretriz V32, trata das necessidades das populações e a obrigação do poder público em disponibilizar equipamentos, sempre de acordo com as características locais.

29. I garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

30. III cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social.

31. IV planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

32. V oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;

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Mais uma vez, o legislador do Estatuto da Cidade reforça a necessidade de o meio urbano ter regulariação urbanística. Não se concebem mais assentamentos subumanos sem água, luz, esgotamento pluvial e sanitário, recreação, lazer, saúde, educação, etc... Acredito que, felizmente, a época de total apartaheid está com os dias contados.

A diretriz VI33 ainda se refere à desordem urbana que ocorreu no Brasil. O legislador aponta que somente com ordenação e controle do uso do solo podemos evitar situações que geram a irregularidade urbana. Basta ler as letras incluídas no inciso que se chega facilmente à conclusão de que a ordenação e o controle do uso do solo, se não feitos, geram irregularidades. Enumerando as situações que a diretriz quer evitar e que se referem à regularização fundiária, terremos: a utilização inadequada dos imóveis urbanos – sempre geram irregularidade de alguma forma, ou jurídica ou urbanística; o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivo ou inadequado em relação à infraestrutura urbana; a falta de infraestrutura e o adensamento exagerado geram inclusive crimes contra a ordem urbanística; a deterioração das áreas urbanizadas – o que seria um desperdício e terminaria gerando de igual sorte irregularidade; a poluição e a degradação ambiental – como já afirmamos, estas áreas são desprezadas pelo mercado imobiliário, por isso são ocupadas; a exposição da população a riscos de desastres. Todas estas são hipóteses geradoras de irregularidades.

A IX34 diretriz também faz menção à regularização fundiária no momento em que exige a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização. Seria a formalização de toda a cidade ou a universalidade da infraestrutura.

Por fim, nesta primeira análise do Estatuto da Cidade pela primeira vez aparece a regularização fundiária. Está prevista na diretriz XIV35. Trata-se de uma definição do processo de regularização fundiária, abrangendo todos

33. VI ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana;d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente;e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;f ) a deterioração das áreas urbanizadas;g) a poluição e a degradação ambiental;h) a exposição da população a riscos de desastres. (Incluído dada pela Lei nº 12.608, de 2012)

34. IX justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;35. XIV regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de

normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;

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os tópicos a ela relacionados. Porém, para a realização desta diretriz, todas as outras que analisamos a compõem de alguma forma.

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda, mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais.

O artigo 4º da lei é o que disponibiliza instrumento para a implantação da política urbana. Daremos destaque aos institutos jurídicos e políticos que foram disponibilizados ao administrador municipal, pois têm a ver com a regularização fundiária de forma direta. O primeiro instituto previsto na letra a do inciso V trata da desapropriação, forma mais comum de intervenção na propriedade privada desde que haja interesse público e interesse social. A letra f trata da instituição das Zonas Especiais de Interesse Social, ZEIS, onde pode ser realizada a urbanização específica e onde a lei do parcelamento do solo não incide com seus condicionantes. Seria o primeito ato de intervenção do poder público a classificação da área a ser beneficiada como ZEIS. As letras g, h e u tratam de títulos a ser concedidos no processo de regularização, os quais serão temas de análise a ser feita oportunamente. A letra q trata da própria regularização fundiária; a letra r trata da assistência técnica e jurídica gratuita a ser disponibilizada para as comunidades e os grupos sociais menos favorecidos, principalmente quando litigam com proprietários privados nos processos de usucapião; a letra t trata da demarcação urbanística, uma novidade cadastral imobiliária trazida pela Lei 11.977/09. Por último, ainda quanto a títulos, o § 2º possibilita ao Poder Público contratar a concessão de direito real de uso de imóveis públicos na forma coletiva. Por fim, a necessidade de ouvir a comunidade envolvida no processo de forma democrática está prevista no § 3º. Sempre que houver dispêndio de recursos por parte do Poder Público municipal, a comunidade deve ser ouvida. Assim, prescinde o processo de regularização da audiência pública necessária para tal. Seria ela consultiva, deliberativa ou meramente publicista?Entendemos que é publicista, visto que o processo de regularização é um dever do Poder Público, que apenas vai comunicar aos interessados suas ações de forma a torná-las transparente. Numa cidade da Grande Porto Alegre, em audiência pública a respeito de uma área pública ocupada, a população que já tinha direito à Concessão de Uso Especial prevista na MP 2220/01, disse que não queria concessão, mas desejava outro título. Aí foi sugerida a doação com encargos pelo período

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de dez anos, sendo esta a forma eleita pela população, mas concedida por liberalidade do administrador público municipal como forma de proceder na regularização jurídica da área. Até porque, conforme disposições do art. 13 da Lei 11.481/0736, a concessão de uso especial para fins de moradia bem como a concessão de direito real de uso e o direito de superfície, pode ser objeto de garantia real junto aos agentes do Sistema Financeiro de Habitação, não devendo nada ao título que aquela comunidade elegeu.

As disposições relativas à lei 11.977/09, Minha Casa Minha Vida, e suas alterações terão capítulo especial, assim como a MP 2220/01, que trata da concessão de uso especial para fins de moradia e comércio. Os principais aspectos legislativos e constitucionais que envolvem o processo de regularização fundiária, no nosso entendimento, foram abordados neste capítulo.

05. a leI 11.977/09

mInha Casa mInha VIda

Agora passaremos a analisar, de forma específica, a lei 11.977/09 e suas alterações, sendo a principal a lei 12.424/11. Os conceitos que a lei 11.977/09 introduziu no direito urbanístico já foram objeto de análise Neste ponto, trabalharemos a regularização de forma

concreta quanto aos procedimentos relativos às fases da regularização fundiária.

Se fizermos uma análise de técnica legislativa da lei 11.977/09, encontraremos uma verdadeira bagunça, pois ela trata de diversos assuntos, inclusive da digitalização dos registros, fixando prazo e acesso do poder

36. LEI 11.481/07.Art. 13. A concessão de uso especial para fins de moradia, a concessão de direito real de uso e o direito de superfície podem ser

objeto de garantia real, assegurada sua aceitação pelos agentes financeiros no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação - SFH.

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executivo em qualquer arquivo digital registral. Financiamento, títulos, formas de financiamento, regularização fundiária de interesse social, auto de demarcação, mexe com a lei dos registros públicos enfim, um verdadeiro sarau. Por isso, ao analisarmos esta lei, vamos nos fixar em pontos que se repetirão no decorrer deste trabalho de forma localizada.

5.1. Princípios da Regularização Fundiária. Além dos princípios já comentados do Estatuto da Cidade inerentes à regularização fundiária, e na análise das diretrizes de desenvolvimento urbano prevista no Estatuto, se nota que a maioria das diretrizes tem endereço certo: a irregularidade urbana; a lei 11.977/09 também dispôs de princípios a serem observados na implementação da regularização fundiária. Esta previsão está contida no Art. 48 e incisos37.

O maior princípio já aparece no inciso I do art. 48, que, aliás, tem consonância com mais dois princípios do Estatuto da Cidade, art. 2º, incisos I e XV38. O inciso I do art. 48 trata como princípio a ampliação do acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda. A diretriz I do art. 2º do Estatuto da Cidade, quando garante o direito a terra urbana, moradia, sanemaento ambiental, infraestrutura urbana, transporte e serviços públicos, trabalho e lazer, também está indicando o princípio da distribuição da terra de forma equânime e justa. Esta distribuição justa da infraestrutura está também contida na diretriz V39.

O princípio ou a diretriz XV do art. 2º do Estatuto da Cidade trata da simplificação da legislação com o objetivo de produção de novas habitações para a população de baixa renda. O primeiro princípio trata da oferta de imóveis para a população de baixa renda como um primeiro momento, já que no segundo momento sugere que o processo de regularização ocorra sem a remoção dos envolvidos, fazendo com que permaneçam no próprio local ocupado. A remoção é muito onerosa ao Poder Público. Já tivemos

37 Art. 48. Respeitadas as diretrizes gerais da política urbana estabelecidas na Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001, a regularização fundiária observará os seguintes princípios: I ampliação do acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda, com prioridade para sua permanência na área ocupada, assegurados o nível adequado de habitabilidade e a melhoria das condições de sustentabilidade urbanística, social e ambiental; II articulação com as políticas setoriais de habitação, de meio ambiente, de saneamento básico e de mobilidade urbana, nos diferentes níveis de governo e com as iniciativas públicas e privadas, voltadas à integração social e à geração de emprego e renda; III participação dos interessados em todas as etapas do processo de regularização; IV estímulo à resolução extrajudicial de conflitos; e V concessão do título preferencialmente para a mulher.

38. Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana mediante as seguintes diretrizes gerais:I garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;...XV simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais;

39. V oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;

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casos de remoção de área de risco em que o ocupante se negou a ir para a casa nova oferecida, pois era muito menor do que a dele na situação de risco. Sempre que houver remoção, o processo de regularização fica difícil; por isso, o legislador sugere que prioritariamente não se façam remoções, mas em contrapartida quer um avanço da área que esteja sendo objeto de intervenção para que haja uma melhoria na habitabilidade, na situação social e econômica da população ali residente. Ou seja, é necessária uma evolução daquela comunidade.

Temos o exemplo emblemático dos catadores de papel. Eles demarcam territórios nos centros urbanos, onde recolhem o material para a reciclagem. Este território demarcado normalmente é próximo de uma irregularidade. Se houver a necessidade de reassentamento, dificilmente isso ocorrerá sem confronto, pois eles perderiam a oportunidade de trabalho. Fica mais complicada a inserção social e econômica desta população, que muitas vezes para evoluir terá que tirar do corpo vícios impregnados que não permitem a eles sequer raciocinar. Em muitos assentamentos, o problema é de saúde pública antes de ser social, econômico e urbano.

A sustentabilidade que o princípio enumera tem por fundamento uma sequência de equipamentos urbanos necessários para esta sustentabilidade. Não estamos falando apenas de conservação de pavimentos e esgotamento pluvial, mas também de equipamentos comunitários tão necessários para a inserção. Na maioria dos casos, basta uma creche, que já resolve grande parte do problema. Mas sabemos que não é o suficiente, deve haver consciência, informações, trabalho de conscientização que somente se fixa por repetição, enfim um trabalho efetivo para recuperar qualquer número de pessoas de uma comunidade. O segundo princípio previsto no inciso II do mesmo artigo tem sincronia com as diretrizes gerais do estatuto da cidade, diz respeito ao que chamamos de SISTEMA URBANO. Este sistema consiste realmente nas articulações que devem ser feitas com relação a edificação de habitações, meio ambiente, saneamento básico e mobilidade urbana para que possa se asseguar efetivamente a sustentabilidade urbanística e possibilitar a integração social dos envolvidos, mais a geração de emprego e renda, com o que haverá a fixação do envolvido no local do assentamento. Muito se comemora quando não há rotatividade nestas regularizações.

O ideal é que as pessoas permançam no local até que evoluam economicamente e socialmente para então sair. O terceiro princípio previsto no inciso III trata da gestão democrática da cidade, a participação

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popular ou ainda democrática e participativa. Repete o princípio a diretriz II, do art. 2º40 do Estatuto da Cidade. Sempre entendemos que o processo de regularização fundiária passa por uma audiência pública com a participação dos envolvidos no processo de regularização, seja social, urbanístico e jurídico. Para tanto, o social seria o primeiro tipo de contato com a comunidade que vai ser regularizada. Depois entram as demais etapas do processo de regularização em campo. Mas a participação é fundamental para o sucesso do empreendimento.

Costumamos publicar CARTILHAS de regularização fundiária numa linguagem bem comunitária, buscando efetivamente o entendimento dos participantes no trabalho que está sendo feito. Inviável praticar-se outra linguagem que não seja a comunitária. Seria impossível o entendimento das ações e, nesta etapa, o Poder Público tem que conversar com a comunidade sem intermediários. O quarto princípio refere-se ao estímulo à resolução extrajudicial de conflitos, ou seja, em evitar recorrer ao Poder Judiciário. Por quê? O Poder Judiciário não está dimensionado para o tamanho do Brasil. É insignificante perto disso. Não suporta mais suas próprias pernas e não passa por qualquer reforma. Mantém uma estrutura antiga, arcaica, ainda introjetada na toga. A decisão que depender do nosso Judiciário não demora menos de dez anos. Por isso, a lei recomenda a conciliação, a arbitragem em vez do conflito judicial. Por último, o princípio V do art. 48 trata da concessão do título. Quando falamos em conceder títulos, estamos falando da regularização jurídica. O legislador recomenda que os títulos sejam concedidos preferencialmente à mulher. A nossa sociedade está se tornando novamente matriarcal. As mulheres ficam com os filhos, e os homens começam vida nova, como se fossem solteiros. Esta é uma realidade social que influencia diretamente o bem-estar dos cidadãos, pois a divisão do quase nada importaria retomar o processo em busca de moradia novamente. Ter um lugar regularizado para morar é também uma das principais funções da regularização fundiária, e torná-la produto de mercado fugiria de tal função.

Portanto, fala-se na fixação da população no mesmo local. Antes, durante e após o processo de regularização fundiária, o mercado de chaves funciona. A compra e venda é normal neste meio, ou seja, existe um mercado em torno da regularização fundiária. A mulher que fica com

40. Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

...II gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da

comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;

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os filhos normalmente é a parte mais frágil, pois não tem mobilidade para locomover-se em razão dos filhos. A lei tem a pretensão de protegê-la nesse sentido.

A MP 2220-01 tratou da seguinte forma a questão: “§ 1º A concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma gratuita ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil”. A inclusão da mulher juntamente com o homem indica que não há mais o cabeça de casal para efeitos de tais concessões. Agora, com a Lei 11.977/09, o legislador efetivamente criou coragem e endereçou preferencialmente o título para as mulheres, o que entendemos justo.

5.2. A autoaplicabilidade da Lei 11.977/09.

A necessidade do município sobre a regularização fundiária, ou a autoaplicabilidade da Lei 11.977, foi enfrentada no art. 4941. O legislador deixou claro ao administrador municipal que é possível implementar a regularização sem a necessidade de uma legislação municipal própria. Assim, basta utilizar as ferramentas e diretrizes constantes da lei para que o processo de regularização aconteça.  

5.3. Partes legitimadas para proceder à regularização fundiária. Art. 5042. A princípio, temos diversas partes legitimadas para a iniciativa da regularização fundiária.

1. A federação: A União, os estados, o Distrito Federal e o município são os primeiros autorizados a proceder à regularização fundiária conforme o caput do art. 50. O que ocorre é que muitas vezes persiste uma briga política entre os entes, com o que o processo não se viabiliza, pois o município deve ser a ponta do processo e aprovar o projeto urbanístico para que ocorra a regularização.

A pergunta que fica é a seguinte: pode a União ou o Estado, por exemplo, levar a cabo um processo de regularização em áreas próprias, sem que o município dele participe? Não. Eles sempre dependerão da aprovação

41. Art. 49. Observado o disposto nesta Lei e na Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, o Município poderá dispor sobre o procedimento de regularização fundiária em seu território. Parágrafo único. A ausência da regulamentação prevista no caput não obsta a implementação da regularização fundiária.

42. Art. 50. A regularização fundiária poderá ser promovida pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios e também por: I seus beneficiários, individual ou coletivamente; e II cooperativas habitacionais, associações de moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público ou outras associações civis que tenham por finalidade atividades nas áreas de desenvolvimento urbano ou regularização fundiária.

Parágrafo único. Os legitimados previstos no caput poderão promover todos os atos necessários à regularização fundiária, inclusive os atos de registro. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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do projeto urbanístico pelo município, que é a quem cabe estabelecer requisitos e exigências complementares à lei federal para aprovação do projeto relacionadas com o que se refere “aos desenhos, ao memorial descritivo e ao cronograma físico de obras e serviços a serem realizados”, § 2º do art. 51. Se nota que a liberdade do município com relação às exigências possíveis do projeto urbanístico são restritas à descrita no § 2º do art. 51, não podendo o município inovar ou exigir a maior do que previsto, uma vez que, se assim o fizer, não acontecerá a regularização fundiária. Pode o Estado ou a União declarar ZEIS, intervindo no planejamento urbano de um município para proceder na regularização fundiária? Não é possível, deve encaminhar o pedido ao município caso não esteja contemplada a área de intervenção no plano diretor já como Zona de Habitação Especial de Interesse Social.

Mas a União e o Estado, por lei, podem declarar uma área de sua propriedade de interesse social e promover a urbanização específica sem que seja ZEIS. Esta previsão está contida no art. 47, VII, c43. No nosso entendimento, este procedimento legislativo estirpa a necessidade de incluir este próprio da União ou do Estado do zoneamento municipal. Não pode o pacto federativo ser rompido em razão de suas competências. O que não pode é o municipio se omitir e não analisar os pedidos feitos pela União, pelo Estado, por particulares ou por qualquer um dos legitimados para proceder à regularização fundiária. Nesta hipótese, aplicam-se os prazos contidos nas leis 6.766/79, 9785/99 e 10.257/01, que estipulam o prazo para apreciação e as consequências caso não seja apreciado.

O próprio Estatuto da Cidade no art. 4944 também tratou desta matéria. Na lei 6.766/79, com a alteração da lei 9.785/99, ficou assim disposta a questão da apreciação ou omissão no projeto de parcelamento: art. 1645 estipula o prazo que a lei municipal determinará se o Poder Público não se manifestar: (§1º) o projeto será considerado rejeitado ou as obras recusadas. Consequência: na parte final do parágrafo, lê-se “assegurada a

43. c) de áreas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social;

44. Art. 49. Os Estados e Municípios terão o prazo de noventa dias, a partir da entrada em vigor desta Lei, para fixar prazos, por lei, para a expedição de diretrizes de empreendimentos urbanísticos, aprovação de projetos de parcelamento e de edificação, realização de vistorias e expedição de termo de verificação e conclusão de obras.

Parágrafo único. Não sendo cumprida a determinação do caput, fica estabelecido o prazo de sessenta dias para a realização de cada um dos referidos atos administrativos, que valerá até que os Estados e Municípios disponham em lei de forma diversa.

45. Art. 16. A lei municipal definirá os prazos para que um projeto de parcelamento apresentado seja aprovado ou rejeitado e para que as obras executadas sejam aceitas ou recusadas. (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)§ 1o Transcorridos os prazos sem a manifestação do Poder Público, o projeto será considerado rejeitado ou as obras recusadas, assegurada a indenização por eventuais danos derivados da omissão. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)§ 2o Nos Municípios cuja legislação for omissa, os prazos serão de noventa dias para a aprovação ou rejeição e de sessenta dias para a aceitação ou recusa fundamentada das obras de urbanização. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

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indenização por eventuais danos derivados da omissão�. Já o parágrafo 2º, prevê àqueles municípios em que a legislação for omissa o prazo de noventa dias. Voltando ao Estatuto da Cidade, no seu art. 49, o legislador fixou prazo aos estados e municípios: noventa dias do vigor da Lei 10.257/09 para fixar prazo, por lei, para os seguintes atos urbanísticos: (a) expedição de diretrizes de empreendimentos urbanístico; (b) aprovação de projetos de parcelamento e edificação; (c) realização de vistorias e expedição do termo de verificação e conclusão de obras. Não expedindo lei, o Estado e municípios passaram a ter o prazo de sessenta dias para esta expedição.

Assim, entendemos, por uma questão simétrica, que os dispositivos do Estatuto da Cidade estão em vigor com relação à matéria a que se refere. Não pode então o município omitir-se na apreciação de um projeto urbanístico que visa à regularização fundiária. Da mesma forma, entendemos que cada autoridade promotora da regularização fundiária terá os frutos políticos de sua ação. Já nos deparamos acordos políticos feitos a respeito em que o governador e o prefeito fariam a entrega dos títulos 50% para cada um. Bem, o título, que é a regularização jurídica do empreendimento, é o que mais interessa depois da regularização urbanística.

Se chegar ao título, significa que a área já foi beneficiada com infraestrutura ou, ao menos, já está prevista nas leis orçamentárias a reserva de verba para a sua implantação, sendo então este processo irreversível.

2. De forma individual, o ocupante que estiver morando no local. Na forma individual, o ocupante poderá requerer a usucapião especial, desde que tenha preenchido os requisitos para tal quando se tratar de imóvel particular ou, então, requerer a concessão de uso especial para fins de residência ou comércio quando o imóvel for público. Entendemos que as outras formas de titular as áreas dependem obrigatoriamente da iniciativa do poder público. Apenas estas duas modalidades de regularização jurídica é que não necessitam da intervenção pública para tal. De tal sorte que, os títulos enumerados para a iniciativa privada ou na forma coletiva foram dados no art. 51 § 1º, que estipula que, para a legalização pela usucapião ou concessão de uso especial, não haverá necessidade de projeto urbanístico.

3. De forma coletiva: Para proceder à regularização de forma coletiva, é necessário que a ocupação seja desordenada, não podendo identificar-se a parte que cada um ocupa. Este é o requisito essencial para a usucapião coletiva e também para a concessão de uso especial para fins de moradia

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na forma coletiva. A previsão está contida no art. 10 da lei 10.257/09 ao referir-se à usucapião especial de imóvel urbano. A mesma regra com relação à concessão de uso especial pra fins de moradia está contida no art. 2º da MP 2220/01. Quanto à legitimidade, o art. 12 do Estatuto da Cidade nomina como sendo partes legítimas os possuidores, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente.

Os possuidores, em estado de composse; como substituto processual, a associação de moradores de comunidade, regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados. Por sua vez, a lei 11.977/09 estende este rol que pode, coletivamente, requerer o direito a regularização. Inclui também as cooperativas habitacionais, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público e outras associações civis que tenham por finalidade atividades nas áreas de desenvolvimento urbano ou regularização fundiária.

Neste sentido, o leque de autorizados é muito grande. Qualquer associação civil que tenha por objetivo o desenvolvimento urbano ou a regularizaçao fundiária ou ambos poderá ser parte legítima para proceder ao processo de regularização, inclusive atos de registro. (Parágrafo único do art. 50). Podemos utilizar os seguintes exemplos: Cooperativa Habitacional Sargento Garcia. Tem legitimidade para promover os atos de regularização fundiária tanto no âmbito administrativo (município) quanto no registro de imóveis, solicitar registro, etc... Se a cooperativa for atuar em nível judicial, ou seja, promover uma usucapião coletiva, terá por consequência legitimidade para representar os requerentes desde que autorizada por assembleia geral válida e com representatividade. Assim, um grupo de pessoas que vivem num aglomerado irregular, normalmente proveniente de ocupação em área particular, pode se organizar, em vez de associação de moradores, em uma associação civil para proceder ao processo de regularização fundiária, desde que seus objetivos sejam estes. Em 2003, formamos uma associação de moradores para levar a cabo uma regularização fundiária de área localizada na grande Porto Alegre.

A iniciativa cumpriu seu objetivo, restando à associação, após a regularização, proceder à titulação da área. Isso foi antes de 2009, quando entrou em vigor a lei 11.977. Naqueles tempos, havia a rigidez dos registros e a possibilidade de se atingir os objetivos seria por usucapião ou então por alienação. Como a área passou a pertencer à associação, foi possível

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resolver a questão por alienação. Os processos de usucapião, via de regra, são excessivamente onerosos, demorados e cansativos.

Por fim, a autorização de representação de todos os interessados prevista no parágrafo único do art. 50 aponta que são parte legítima perante o registro imobiliário para requerer o parcelamento oriundo da regularização fundiária, sem qualquer outro tipo de representação. Amiúde, parece que a lei tentou facilitar demais. Não se justifica qualquer alteração da situação dominial, que não é o caso do parcelamento, mas de qualquer titulação sem a participação do proprietário dominial ou de seu representante constituído. O que podemos discutir a esta altura é a possibilidade de lançamento na matrícula do imóvel do parcelamento do solo, ou do projeto urbanístico. Absolutamente viável, como já vimos nas previsões do art. 40 e seguintes da lei 6.766/79 já citada.

A mesma modalidade de intervenção veremos no auto de demarcação e a legitimação da posse de áreas particulares46. Neste auto, a propriedade permanece com o proprietário dominial, o cadastro do imóvel é modificado e os títulos de posse são registrados no registro imobiliário. A sua conversão em propriedade somente após a transcrição aquisitiva47.

5.4. Onde pode ser feita a regularização fundiária: Sempre que houver uma irregularidade urbana, pode ser feita a regularização fundiária. As previsões estão contidas no art. 4748. O indicativo principal da legislação é que a regularização fundiária deve ser feita predominantemente em assentamentos irregulares, ocupados por população de baixa renda. Claro que, para isso, é necessário que cada município faça a sua lei municipal definindo nos parâmetros locais o que seja baixa renda.

Porém, não significa que outras irregularidades não podem ser objeto de regularização por não estar contemplados os de baixa renda. Da mesma forma, chama-se regularização fundiária de interesse social aquela voltada à produção de habitações de baixa renda. O que a Lei 11.977/09, Minha

46. Art. 47. § 1o A demarcação urbanística e a legitimação de posse de que tratam os incisos III e IV deste artigo não implicam a alteração de domínio dos bens imóveis sobre os quais incidirem, o que somente se processará com a conversão da legitimação de posse em propriedade, nos termos do art. 60 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

47. Transcrição aquisitiva: Prazo necessário para a posse se consolidar sem oposição e transformar-se em propriedade. Chamamos também de tempo de usucapião ou prazo para o usucapião, quando então a propriedade tem novo dono o possuidor que a adquiriu pelo tempo.

48. Art. 47... VII regularização fundiária de interesse social: regularização fundiária de assentamentos irregulares ocupados, predominantemente, por população de baixa renda, nos casos: a) em que a área esteja ocupada, de forma mansa e pacífica, há, pelo menos, 5 (cinco) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)b) de imóveis situados em ZEIS; ou c) de áreas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social;

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Casa Minha Vida, fala de famílias de zero a três salários mínimos de renda. Então, para atender tais regularizações, são necessários alguns requisitos que autorizam efetivamente a regularização. As previsões estão nas letras a b e c do inciso. A letra a trata da prescrição aquisitiva. Os imóveis ocupados há mais de cinco anos, de forma mansa e pacífica, poderão ser objeto da regularização fundiária. Isso seria no caso de ocupação de áreas particulares em que a ocupação se consolidou e o proprietário dominial não reagiu.

De forma individual, também pode ser objeto de regularização qualquer área, mesmo não estando colocada no zoneamento como ZEIS. Então, fora de ZEIS é possível regularizar: a letra b trata das ZEIS. As ZEIS são tratadas de acordo com a legislação municipal de diversas formas. Pode inclusive fazer indicação genérica, como a feita no plano diretor de Porto Alegre49, quando

49. Das Áreas Especiais de Interesse Social � AEIS. Lei Complemetar 434 e sua alterações. Art. 76. As Áreas Especiais de Interesse Social são aquelas destinadas à produção e à manutenção de Habitação de Interesse Social, com destinação específica, normas próprias de uso e ocupação do solo, compreendendo as seguintes situações: I - AEIS I - assentamentos autoproduzidos por população de baixa renda em áreas públicas ou privadas, aplicando-se as Leis Complementares nºs 242, de 10 de janeiro de 1991, e 251, de 26 de julho de 1991, que dispõem sobre a Concessão de Direito Real de Uso - CRDU -, nos termos da Lei Orgânica do Município, art. 1º do Ato das Disposições Orgânicas, Gerais e Transitórias, quando se tratar de bens públicos municipais; II - AEIS II - loteamentos públicos ou privados irregulares ou clandestinos que atendam às condições de habitabilidade nos termos do § 5° deste artigo; III - AEIS III - imóveis não edificados, subutilizados, localizados na Área de Ocupação Intensiva, que venham a ser destinados à implantação de Habitação de Interesse Social com interveniência do Poder Público. IV - AEIS IV - áreas ocupadas com fins de uso habitacional por populações de baixa renda com incidência significativa de edificações precárias, não plenamente concluídas, degradadas ou destinadas originalmente a outras atividades, na maioria das vezes com carência de equipamentos públicos e comunitários.§ 1º As áreas instituídas como AEIS I e II integrarão os programas de regularização fundiária e urbanística, com o objetivo da manutenção de Habitação de Interesse Social, sem a remoção dos moradores, exceção feita às moradias em situação de risco e em casos de excedentes populacionais. § 2º A delimitação e localização de áreas destinadas à produção de Habitação de Interesse Social dar-se-á pela instituição de AEIS III pelo Poder Executivo, considerado o déficit anual da demanda habitacional prioritária e os imóveis subutilizados das AUOPs, permitida a promoção de parcerias, incentivos ou outras formas de atuação para a consecução dos objetivos.

§ 3º Na produção e implantação de parcelamento do solo ou edificações destinados a suprir a demanda habitacional prioritária, ou ainda na regularização de parcelamentos do solo enquadrados como tal, será admitido o Urbanizador Social, que será o responsável pelo empreendimento, nos mesmos termos do loteador, com as responsabilidades previamente definidas em projeto específico.

§ 4º Urbanizador Social é o empreendedor imobiliário cadastrado no Município com vistas a realizar empreendimentos de interesse social em áreas identificadas pelo Município.

§ 5º Consideram-se condições de habitabilidade o atendimento a padrões de qualidade de vida e o equacionamento dos equipamentos urbanos e comunitários, circulação e transporte, limpeza urbana e segurança, conforme regulamentação específica.

§ 6º A instituição das AEIS, bem como a regularização urbanística e recuperação urbana levadas a efeito pelos programas municipais, não exime o loteador das responsabilidades civis e criminais e da destinação de áreas públicas, sob a forma de imóveis, obras ou valor correspondente em moeda corrente a ser destinado ao Fundo Municipal de Desenvolvimento - FMD.

§ 7º A regularização fundiária de núcleos habitacionais em áreas de propriedade municipal, de suas autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista dar-se-á pela instituição de AEIS I, mediante concessão de Direito Real de Uso, atendidas as condições e requisitos da Lei Complementar nº 242, de 10 de janeiro de 1991, e alterações posteriores.

Art. 77. As áreas caracterizadas como bens de uso comum do povo atingidas por AEIS I e II somente serão objeto de processo de desafetação se:

I - o índice de área verde por habitante, na respectiva Região de Gestão do Planejamento, for e mantiver-se, após a desafetação, igual ou acima dos parâmetros desejados, conforme laudo técnico elaborado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e pela Secretaria do Planejamento Municipal;

II - a população da respectiva região for consultada e aprovar a medida.§ 1º Se as condições locais não permitirem o cumprimento do disposto no inciso I, a desafetação somente poderá ocorrer após

a desapropriação, ou imissão na posse, de gleba de igual área, situada na mesma região, com a mesma finalidade e destinação.§ 2º Excluem-se do disposto neste artigo as áreas que nesta data integram o Programa de Regularização Fundiária.Art. 78. As AEIS serão definidas através de um processo gradativo e permanente de instituição, observando-se os seguintes

procedimentos: I - as AEIS I e II serão instituídas por decreto do Poder Executivo e as AEIS III mediante lei ordinária; II - a definição de regime urbanístico será por decreto quando a sua alteração restringir-se ao uso e outros indicadores - não

modificando índices de aproveitamento e densificação em relação ao entorno - e por lei ordinária quando as alterações modificarem índices de aproveitamento e densificação;

§ 1º A regularização de loteamento, bem como a instituição de AEIS II para a sua regularização, poderá ser requerida pelos adquirentes dos lotes ou pelo loteador.

§ 2º O proprietário de imóvel que pretenda construir Habitação de Interesse Social poderá solicitar ao Poder Executivo a

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revisto e também na forma de classificação como foi feito no plano diretor de São Paulo. Porém não é só em ZEIS que pode ocorrer à regularização fundiária ou em ocupações mansa e pacífica. Também pode ocorrer em áreas dos entes federados, desde que as áreas sejam declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social. Neste sentido, entendemos que a declaração de ZEIS somente pode ocorrer quando há a intervenção do município, mas de qualquer forma sempre o projeto urbanístico deverá passar pelo crivo de aprovação do Poder Público Municipal. Então, para iniciar o processo de regularização somente nestas áreas previstas é que é possível proceeder-se à regularização fundiária. Estes seriam pré-requisitos para proceder à urbanização específica e à regularização propriamente dita.

5.5. O projeto urbanístico. Como já vimos, o projeto de regularização fundiária será precedido de um projeto urbanístico. Porém, antes, de um projeto socioeconômico para que se possa avaliar socialmente e economicamente a população que ali reside. Somente em duas hipóteses o projeto urbanístico pode ser dispensado: no caso da usucapião especial

instituição mediante Estudo de Viabilidade Urbanística, o qual deverá conter: I - padrões específicos do parcelamento do solo e/ou edificações; II - formas de participação da iniciativa privada, proprietários de terrenos, empreendedores imobiliários ou associações e

cooperativas de moradores. § 3º Será garantida, na forma a ser definida em lei, a participação dos moradores diretamente, através de suas entidades

representativas e através das Regiões de Gestão do Planejamento, no processo de identificação, delimitação e detalhamento das AEIS.

§ 4° As AEIS I e II terão como padrões aqueles estabelecidos nos respectivos cadastros.§ 5º Incluem-se no cadastro referido no parágrafo anterior as edificações existentes destinadas a práticas religiosas, equiparando-

se à habitação para efeito de regularização ou remoção. LEI COMENTADA Artigos 76/77 e 78 - As AEIS permitem que as vilas e os loteamentos irregulares, que hoje são considerados clandestinos ou

irregulares, sejam melhor integrados à cidade. Ao marcar uma área no mapa da cidade (gravar) como AEIS, o Plano Diretor admite que as mesmas poderão ser regularizadas no próprio local com regras diferenciadas (outro tipo de medida de terrenos ou de ruas, por exemplo), para que possam ser urbanizadas (receber obras) considerando, sempre que possível, a forma como o núcleo está organizado.

As AEIS de nível I e II se referem a áreas já ocupadas e cuja regularização é possível de ser feita no próprio local. As AEIS de nível III tratam de terrenos ainda não ocupados, identificados para a implantação de projetos habitacionais de interesse social.

As AEIS de nível IV têm o objetivo de permitir a regularização de conjuntos habitacionais. As famílias somente sairão de onde estão, indo para locais próximos, quando a vila ou loteamento estiver em área de risco (como

pedreira, encosta de morro, beira de arroio ou de estrada) ou nos casos em que for necessário ter mais espaço para a execução de obras para a prestação de serviços à população.

No caso de um núcleo estar ocupando um terreno da Prefeitura destinado para uma praça, as famílias somente poderão ficar no local se este tiver sido ocupado antes de 1989. Uma lei (Concessão do Direito Real de Uso) garante que estes moradores podem permanecer ali. Se, neste caso, não existirem praças suficientes naquela Região de Planejamento ou se a vizinhança exigir a praça, outro local próximo deverá ser escolhido pela Prefeitura para fazê-la.

Também para que mais famílias possam morar melhor, o Poder Público pode escolher uma nova área, que esteja vazia, e permitir que se faça um novo loteamento popular com regras próprias para o tamanho dos lotes, largura das ruas e a construção das casas. Tudo isso para baratear o preço da moradia. Estes loteamentos poderão ser feitos pelo DEMHAB ou pelo proprietário da área que for identificada e liberada pela Prefeitura.

O dono do terreno que quiser fazer um loteamento popular pode pedir à Prefeitura esclarecimentos sobre os passos que deve seguir e como proceder para associar-se com outros proprietários, empresários, associações ou cooperativas. Trata-se do urbanizador social, que será o responsável pelo empreendimento e assumirá as responsabilidades previamente definidas em um projeto específico.

Na regularização de vilas ou loteamentos todos assumirão suas parcelas de responsabilidade: a Prefeitura, os moradores e os loteadores clandestinos.

A indicação de terrenos vazios para loteamentos de caráter social precisa ser aprovada, através de lei, pelos vereadores.

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e quando se tratar de área pública, o título a ser concedido é a concessão de uso especial para fins de moradia. MP 2220/01, conforme preceitua o disposto no Art.52 § 1º50.

5.5.1. As sentenças de usucapião e declaratórias: Quando o processo de usucapião é distribuído para o poder judiciário processá-lo, ele é instruído com planta feita do imóvel e o memorial descritivo assinado pelo profissional responsável pela medição. Da mesma forma, informações sobre a propriedade dominial e se o imóvel que está sendo usucapido tem registro no registro imobiliário fazem parte da documentação inicial que ingressará em juízo. As demandas de usucapião, na sua maioria, são demandas movidas na forma individual. Por isso, o que se discute no processo de usucapião não diz respeito à infraestrutura, podendo a demanda de usucapião ser proposta em qualquer parte do município sem os requisitos do art. 47, pois apenas se discute o prazo em que a posse foi exercida sem oposição. Transcorrido o prazo, que chamamos prescrição aquisitiva, o possuidor tem o direito à propriedade, não interessando em nome de quem está o imóvel lançado no álbum imobiliário. Esta é a primeira hipótese no processo de regularização em que o projeto urbanístico é dispensado.

5.5.2. Depósito da planta de imóvel para o registro da concessão de uso especial para fins de moradia. Sempre que a adminstração pública for outorgar administrativamente a concessão de uso especial para fins de moradia, prevista e regulada pela MP 2220/01, deverá depositar a planta administrativa no registro de imóveis para fins de orientação, como se fosse uma planta do parcelamento, sem a necessidade do projeto urbanístico. Assim, os órgãos públicos, ou entes federados que têm seus imóveis ocupados devem depositar a planta do parcelamento da área no registro de imóveis para outorga administrativa da concessão de uso especial para fins de moradia. Imagina-se que basta o requerimento do poder público e a descrição da área que poderá ser feita também através do auto de demarcação, ou retificação simples da matrícula para identificar sua poligonal ou suas divisas perimétricas. Esta modalidade de depósito de planta no registro de imóveis era muito comum antes da vigência do decreto-lei 58/37.

Porém, o que podemos informar é que qualquer área pública que esteja ocupada e que preencha as condições para a concessão administrativa

50. Art. 51. § 1o O projeto de que trata o caput não será exigido para o registro da sentença de usucapião, da sentença declaratória ou da planta, elaborada para outorga administrativa, de concessão de uso especial para fins de moradia.

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da concessão de uso especial para fins de moradia está pronta para ser regularizada juridicamente. É claro que a falta do projeto urbanístico não deixará a área sem o mínimo de infraestrutura. Se bem que o mínimo fixado pela lei 11.977/09 foram apenas dois itens da infraestrutura básica51 querida para a ZEIS conforme a lei 6.766/79 para considerar a área urbana consolidada. O inciso II do art. 47, além destes dois elementos mínimos de infraestrutura básica, ainda exige a malha viária implantada e densidade demográfica superior a cinquenta habitantes por hectare. Para se ter uma vaga idéia, esta densidade é facilmente alcançada em aglomerados irregulares urbanos, uma vez que, em cada hectare, considerando-se lotes de 150 m2, teriamos 62 famílias, o que corresponde, no mínimo a três vezes o número individual de ocupantes, OU SEJA, 186 pessoas.

Então, para que se possa efetuar a regularização fundiária de áreas públicas ocupadas há mais de cinco anos, a MP 2220 fixou em cinco anos na data de 30 DE JUNHO DE 2001. Cada município pode estipular esta data de ocupação de área não superior a 250m2. Preenchendo os seguintes requisitos, tem o possuidor o direito à concessão: estar morando com sua família, ser seu único imóvel urbano ou rural, não ser proprietário nem concessionário de outro bem. Para estas áreas, que normalmente são oriundas de loteamentos particulares em que os espaços públicos não foram implantados, abre-se a matrícula do todo, e inclui-se no registro a planta do parcelamento. A partir de então, pode a administração conceder o título de concessão de uso especial para fins de moradia aos seus ocupantes.

5.5.3. Requisitos mínimos do projeto de regularização fundiária:

A lei Federal fixou no art. 5152 os requisitos mínimos dos elementos 51. Art. 47. Para efeitos da regularização fundiária de assentamentos urbanos, consideram-se: ......

II. área urbana consolidada: parcela da área urbana com densidade demográfica superior a 50 (cinquenta) habitantes por hectare e malha viária implantada e que tenha, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: a) drenagem de águas pluviais urbanas; b) esgotamento sanitário; c) abastecimento de água potável; d) distribuição de energia elétrica; ou e) limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos;

52. Art. 51. O projeto de regularização fundiária deverá definir, no mínimo, os seguintes elementos: I as áreas ou lotes a serem regularizados e, se houver necessidade, as edificações que serão relocadas; II as vias de circulação existentes ou projetadas e, se possível, as outras áreas destinadas a uso público; III as medidas necessárias para a promoção da sustentabilidade urbanística, social e ambiental da área ocupada, incluindo as compensações urbanísticas e ambientais previstas em lei; IV - as condições para promover a segurança da população em situações de risco, considerado o disposto no parágrafo único do art. 3º da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979; e (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)V as medidas previstas para adequação da infraestrutura básica. § 1o O projeto de que trata o caput não será exigido para o registro da sentença de usucapião, da sentença declaratória ou da planta, elaborada para outorga administrativa, de concessão de uso especial para fins de moradia. § 2o O Município definirá os requisitos para elaboração do projeto de que trata o caput, no que se refere aos desenhos, ao memorial descritivo e ao cronograma físico de obras e serviços a serem realizados. § 3o A regularização fundiária pode ser implementada por etapas.

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que compõem o projeto urbanístico. Sempre que há uma lei federal autoexecutável, como é a lei 11.977/09, ou seja, não necessita de outra legislação em nível estadual ou municipal para ser implementada, nem sequer decretos, a indicação do mínimo importa em indicar o suficiente para o processo de regularização. Aliás, o suficiente deve ser exigido em qualquer circunstância, porém, no caso de regularização fundiária, para não inviabiliar o processo, a lei federal não deixou para os municípios muita coisa a alterar.

Veja a disposição contida no § 2º do art. 51. Ao município caberá apenas: definirá os requisitos para elaboração do projeto de que trata o caput (1) aos desenhos, (2) ao memorial descritivo e (3) ao cronograma físico de obras e serviços a serem realizados. Razão assiste ao legislador federal. Já estive em contato com a montagem de algumas legislações municipais que terminavam sendo excessivamente rígidas com o processo de regularização jogando-o novamente na irregularidade. Ou seja, seria a irregularidade ao quadrado. É necessário, para elaboração deste projeto e para trabalhar-se efetivamente a regularização fundiária, conceber, entender, digerir o que á a urbanização específica de que a lei trata. Em que consiste esta urbanização específica, pois, sendo específica, é diferente do restante da cidade, ou não, se as condições locais antenderem. Assim, quando se fala em condições locais, é necessário ater-se às condiçõe urbanísticas da área bem como à condição cultural da população que ali habita. Interessante é que, em uma cidade praiana gaúcha, os donos de imóveis não querem pavimentação das vias. Preferem o piso em areia, pois pavimentação eles têm na cidade onde moram regularmente; na praia, desejam apenas a terra para poder saborear um suposto contato com a natureza em suas férias. Ultrapassada esta fase com relação à competência municipal, vamos analisar os incisos que determinam os elementos mínimos do projeto. O primeiro elemento, indica o inciso, que a regularização não necessita ser apenas de lotes, pode também ser de área. Isso acontecerá muito em relação à regularização coletiva. Muitas dúvidas ficam com relação às acessões e benfeitorias. Aí podemos tomar duas vertentes:

5.5.3.1. Acessão de propriedade do ocupante: Quando o objeto da regularização é terreno ocupado que os ocupantes edificaram, podemos tomar novamente dois vieses: o poder público regulariza o terreno, e o ocupante, mediante certidão municipal de lançamento da acessão no cadastro imobiliário do município, regulariza a benfeitoria. A outra forma

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de regularizar tal situação seria o direito de superfície. Neste caso, podemos usar dois direitos de superfície, ou melhor, um dos dois, o do Estatuto da Cidade53 ou o do Código Civil54. Ambos os direitos de superfície somente serão admitidos se constituídos atravavés de escritura pública. Mas tanto um quanto o outro separa a propriedade em duas. O proprietário da superfície e o proprietário da acessão.

O inciso I do art. 51, trata também das benfeitorias que serão relocadas. Isso importa no reassentamento. As questões que envolvem o reassentamento estão diretamente vinculadas às áreas de risco. Porém, mesmo que a legislação tenha por objetivo manter a população no local em que se encontra, a legislação que trata da concessão de uso especial, MP 2220 art. 4º�, traz a previsão de remoção em caso de risco à saúde, flexibilizando esta necessidade além do risco de vida ou da saúde pública. O direito do concessionário adere à pessoa dele. Entendemos que outra hipótese pode ser avençada para a remoção.

Áreas urbanas com excelente valor de mercado. É possível, pela via da negociação, que as famílias sejam reassentadas em outros lugares que não o da ocupação, desde que o interesse público está configurado. Um exemplo ocorreu em Porto Alegre. Uma área supervalorizada, destinada a uma escola, que nunca aconteceu, tinha apenas quatro moradores. Com o valor de mercado desta área, seria possível levantar mais de cem moradias. Nosso parecer foi no sentido de negociar com os ocupantes e produzir habitações suficientes para um número maior de necessitados.

5.5.3.2. As vias de circulação existentes ou projetadas e, se possível, as outras áreas destinadas a uso público. O inciso II do art. 51 indica que

53. Estatuto da Cidade, Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis.

§ 1º O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, atendida a legislação urbanística.

54. Código Civil Brasileiro. Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.Parágrafo único. O direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao objeto da concessão.Art. 1.370. A concessão da superfície será gratuita ou onerosa; se onerosa, estipularão as partes se o pagamento será feito de uma só vez, ou parceladamente.Art. 1.371. O superficiário responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre o imóvel.Art. 1.372. O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do superficiário, aos seus herdeiros.Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a nenhum título, qualquer pagamento pela transferência.Art. 1.373. Em caso de alienação do imóvel ou do direito de superfície, o superficiário ou o proprietário tem direito de preferência, em igualdade de condições.Art. 1.374. Antes do termo final, resolver-se-á a concessão se o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida.Art. 1.375. Extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário.Art. 1.376. No caso de extinção do direito de superfície em consequência de desapropriação, a indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um.Art. 1.377. O direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de direito público interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente disciplinado em lei especial.

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no projeto urbanístico é necessário que sejam definidas e delimitadas as vias públicas existentes, da forma como estão, tendo-se apenas que dar uma melhorada que não resulte em remoção de muitas casas.

O que se defende é que a acessibilidade a estas áreas seja suficiente para um carro de bombeiros ou uma ambulância. Assim, por ser de urbanização específica, se afasta a necessidade de moldarem-se estas ruas ao desenho de diretrizes existentes para a cidade “normal”. Esta é uma das funções da ZEIS, permitir que se aplique no local uma urbanização diferenciada. Da mesma forma, por ser urbanização específica a questão relativa às áreas destinadas ao público, se não for possível, não será atendida. Recomenda-se a compensação das áreas próximas à ocupação. Mas, na realidade, a intenção do legislador é que a ocupação seja regularizada da forma como se encontra, sempre respeitando as características locais e a ocupação. Sabe-se que a existência de áreas livres possibilita aos ocupantes um melhor conforto ambiental, necessário para o dia a dia, mas o primeiro sentido, o objetivo maior, é garantir a moradia.

5.5.3.3. As medidas necessárias para a promoção da sustentabilidade urbanística, social e ambiental da área ocupada, incluindo as compensações urbanísticas e ambientais previstas em lei.  Atendida a questão da moradia segundo o inciso III do art. 51, o projeto urbanístico deve contemplar ainda, num primeiro momento, medidas especiais, necessárias para a sustentabilidade urbanística. Vamos nos fixar no que seja sustentabilidade urbanística. Na verdade, o termo sustentabilidade está na moda. Mas entendemos que o conceito passe por algo definitivo, que não agrida o meio urbano e tampouco o meio ambiente, por isso o texto legal refere a compensação. Então, a sustentabilidade urbana passa obrigatoriamente pela infraestrutura concatenada com o restante da cidade, pela acessibilidade e pela sustentação dos equipamentos públicos urbanos e comunitários. Já com relação à sustentabilidade social, ela está voltada para a inclusão de forma direta e para a produção de renda. A comunidade somente vai se fixar se houver a possibilidade de produzir renda. Certa vez, trabalhamos na remoção de uma ocupação; o meio urbano em que se encontrava possibilitava, de alguma forma, a sustentabilidade social. Porém, a área urbana era totalmente inviável em razão das situações geológicas. No instante em que se apresenta risco à saúde ou à vida, deve-se proceder na remoção dos ocupantes e criar no novo empreendimento condições eficientes de sustentabilidade. As compensações a que o texto

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se refere dizem respeito à liberalidade que é dada no inciso anterior com relação às áreas livres. Se não tiver possibilidade, isso não interromperá o processo de regularização, mas a compensação deve ser proposta no projeto urbanístico, mesmo que resulte na remoção de algumas casas. Tudo implica estudos e viabilidades.

5.5.3.4. As condições para promover a segurança da população em situações de risco, considerado o disposto no parágrafo único do art. 3º da lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979 (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011). O quarto inciso do art. 51 trata novamente da situação de risco. O art. 3º da lei 6.766/79 enumera os casos de risco. No nosso comentário ao referido artigo, fizemos menção ao fato de que, na parte final, sempre havia a possibilidade de “antes de tomadas providências”. Criticamos essa possibilidade. Hoje, na análise ambiental de uma área aterrada em Porto Alegre, a condição dada para reaproveitar a área para construção de moradiras é dessaterrá-la e tomar as providências necessárias para viabilizar a edificação. Há algumas áreas de risco em que é impossível tomar qualquer providência para reaproveitá-las. O bom senso deve nortar a atividade pública com relação a esta exigência legal. Porém, se a área que está sofrendo a intervenção não apresenta esta situação de risco, torna-se desnecessária a inclusão deste item no projeto urbanístico. Basta a declaração da autoridade pública para que ele seja suprimido das exigências.

5.5.3.5. As medidas previstas para adequação da infraestrutura básica. Aqui, existe a necessidade de projetos para a implantação da infraestrutura básica. Entendemos que, a partir da movimentação feita com a comunidade, audiência pública publicista, os projetos relacionados com a infraestrutura devem ser apresentados. Com os respectivos orçamentos devem reservar verbas no Plano Plurianual, na Lei das Diretrizes Orçamentárias e na própria lei do orçamento, sendo uma necessidade estas reservas. Muitos municípios se socorrem do governo federal para implementação desta infraestrutura, muito mais relacionada com o saneamento básico. A Presidência da República reservou 66 bilhões e 800 milhões para estes projetos em 2013. Outros municípios socorrem-se dos governos estaduais que também investem em infraestrutura, nada tendo de compromisso com o orçamento direto, que muitas vezes está totalmente comprometido.

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5.6. Implantação da regularização fundiária: Com relação ao projeto urbanístico e o próprio processo de regularização, a lei determina que no mínimo dois dos equipamentos urbanos estejam presentes para que o processo se inicie com a regularização jurídica. Assim, dos cinco elementos que temos de infraestrutura básica, havendo dois é o suficiente para iniciar-se o processo. Entretanto, o §3º ajuda ainda mais este processo, já que permite que a regularização fundiária seja implantada por etapas. Apenas exige que haja um complemento disso, ou uma previsão da conclusão de todas as etapas, não estipulando prazo nem requisitos maiores para a sua implementação. Neste sentido, podem o Estado e o Município se organizar, de forma a apresentar aos envolvidos no processo soluções orçamentárias que suportem a sustentabilidade urbanística de qualquer área.

5.7. Assentamentos consolidados anteriores à lei 11.977/09. Neste ponto, o legislador operou em devaneio. Se a área é de urbanização específica, se o art. 51, flexibiliza a necessidade de áreas livres, se o projeto de regularização está inserido em área declarada como ZEIS,(Zona de Habitação de Interesse Social).

5.8. Regularização Fundiária de Interesse Social. A regularização fundiária de Interesse Social está diretamente vinculada à preexistência de uma irregularidade urbana. Os casos de regularização fundiária de interesse social estão elencados no art. 47, inciso VII, a, b e c. O inciso, já analisado, trata de assentamentos irregulares, ocupados predominantemente por população de baixa renda, nos casos de ocupação pacífica há mais de cinco anos; imóveis situados em ZEIS; e área da federação declarada de interesse para implantação de projeto de regularização fundiária de interesse social. Estas são as hipóteses em que podemos chamar a regularização de interesse social, que, veremos, é diferente da regularização fundiária de interesse específico, que é quando os empreendimentos serão produzidos para atender demandas de falta de moradia O art. 5355 trata da necessidade e aprovação pelo município do projeto urbanístico mencionado no art. 51. É fundamental, ou condição necessária, a elaboração e aprovação pelo município do projeto urbanístico. Como afirmamos, e não custa relembar, somente na hipótese das sentenças de usucapião e na concessão de uso especial não é necessário o projeto urbanístico. Resulta a aprovação do projeto de regularização fundiária em duas consequências § 1º56 do art.

55. Art. 53. A regularização fundiária de interesse social depende da análise e da aprovação pelo Município do projeto de que trata o art. 51.

56. Art. 51. § 1º A aprovação municipal prevista no caput corresponde ao licenciamento urbanístico do projeto de regularização

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51: a primeira refere-se ao licenciamento urbanístico. A aprovação implica o licenciamento urbanístico. A segunda consequência, condicionada, é o licenciamento ambiental, para o qual daremos um destaque a seguir.

5.8.1. Licenciamento ambiental: Coforme determina o art. 51, o projeto de regularização fundiária, implica o licenciamento ambiental, com as seguintes condicionantes. A aprovação do projeto de regularização fundiária somente será considerada licenciamento ambiental se o Município tiver o conselho de meio ambiente e órgão ambiental. A lei não vincula este licenciamento a nenhum tamanho de área, subtendendo-se que, com relação a isso, deverá ser ouvido o órgão estadual, caso o licenciamento esteja vinculado a um determinado tamanho de área para o licenciamento municipal − esta previsão está contida no § 1º57 do art. 51. Porém temos que entender o conceito de órgão ambiental capacitado como sendo o órgão que tem à sua disposição profissionais com atribuição de análise de projeto e decisão sobre licenciamento, ou seja, um órgão capacitado e habilitado, com pessoal treinado para o licenciamento ambiental municipal, coisa que ainda é novidade nas gestões municipais, por estarem, os estados, delegando aos municípios a atribuição de licenciar ambientalmente. Caso o município não tenha quadros formados para o licenciamento, deverá terceirizar esta demanda. O profissional que assinar o licenciamento, porém, deverá estar habilitado. Esta disposição está contida no § 2º58 do mesmo artigo analisado. Caso não haja o conselho do meio ambiente e não exista o órgão ambiental atuante, retorna ao Estado a prerrogativa de licenciar, sendo que o licenciamento urbanístico e o ambiental se cingem, dividem-se em razão das referidas competências. Esta disposição está contida no § 3º do art. 54.

5.8.2. Unidades de Conservação de Uso Sustentável. Existem sete classes de unidades de conservação de uso sustentável. As unidades de conservação de uso sustentável admitem a presença de moradores. Elas têm como objetivo compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável dos recursos naturais. Vamos ver sua definição e classificação:

Uso sustentável:fundiária de interesse social, bem como ao licenciamento ambiental, se o Município tiver conselho de meio ambiente e órgão ambiental capacitado. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

57. Art. 53 da Lei 11.97709. § 1º A aprovação municipal prevista no caput corresponde ao licenciamento urbanístico do projeto de regularização fundiária de interesse social, bem como ao licenciamento ambiental, se o Município tiver conselho de meio ambiente e órgão ambiental capacitado. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

58. Art. 53. Da Lei 11.977/09. § 2º Para efeito do disposto no § 1º, considera-se órgão ambiental capacitado o órgão municipal que possua em seus quadros ou à sua disposição profissionais com atribuição para análise do projeto e decisão sobre o licenciamento ambiental. (Incluído único pela Lei nº 12.424, de 2011)

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Área de Proteção Ambiental - área em geral extensa, com certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.

Área de Relevante Interesse Ecológico - área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional, e tem como objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da natureza.

Floresta Nacional - área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas e tem como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para exploração sustentável de florestas nativas.

Reserva Extrativista - área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.

Reserva de Fauna - área natural com populações animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para estudos técnicocientíficos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos.

Reserva de Desenvolvimento Sustentável - área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica.

Reserva Particular do Patrimônio Natural - área privada, gravada

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com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica; é exceção das categorias do SNUC, pois é a única categoria de UC que continua sendo de propriedade privada após sua criação.

Estas reservas têm o seu órgão gestor constituído no ato de sua instituição. Quando a regularização fundiária abranger algum destes tipos de unidades de conservação, a anuência do órgão gestor da unidade é fundamental para obter-se o licenciamento ambiental, devendo acompanhar o projeto de regularização fundiária. Esta disposição está contida no § 3º do art. 53 da lei comentada.

5.8.3. Anistia ambiental: Chamamos assim porque não deixou de ser uma anistia. Teoricamente, qualquer assentamento urbano que estivesse numa área de preservação permanente não poderia ser objeto da regularização fundiária. Porém, a lei 11.977/09 com o objetivo determinado de proceder à regularização fundiária, foi além, prevendo, no art. 5459, a justificativa para a anistia concedida no § 1º60. A justificativa a que nos referimos diz respeito à análise que deverá ser feita, relativa a parâmetros urbanísticos e ambientais específicos. Quando a lei fala em parâmetros ambientais específicos, está apontando para algo que não seguirá, com certeza, a lei ambiental na sua plenitude, uma vez que a característica da ocupação e a área ocupada, é que determinarão as exigências ambientais possíveis. Já o § 1º afirma que, por decisão motivada, e o § 2º exige esta motivação, o município poderá, por mérito do ato administrativo, admitir a regularização em áreas de preservação permanente ocupadas até 31 de dezembro de 2007 e inseridas em áreas consolidadas. A única exigência feita pelo § para não ferir de morte a questão ambiental é que haja um estudo técnico de que a intervenção resulte numa melhoria das condições ambientais, em relação à situação de ocupação irregular anterior. Este estudo deve conter os elementos constantes do § 2º61 e incisos do mesmo

59. Art. 54. O projeto de regularização fundiária de interesse social deverá considerar as características da ocupação e da área ocupada para definir parâmetros urbanísticos e ambientais específicos, além de identificar os lotes, as vias de circulação e as áreas destinadas a uso público.

60 Art. 54. Da Lei 11.977/09. § 1º O Município poderá, por decisão motivada, admitir a regularização fundiária de interesse social em.Áreas de Preservação Permanente, ocupadas até 31 de dezembro de 2007 e inseridas em área urbana consolidada, desde que estudo técnico comprove que esta intervenção implica a melhoria das condições ambientais em relação à situação de ocupação irregular anterior.

61. Art. 54. § 2º O estudo técnico referido no § 1º deverá ser elaborado por profissional legalmente habilitado, compatibilizar-se com o projeto de regularização fundiária e conter, no mínimo, os seguintes elementos: I caracterização da situação ambiental da área a ser regularizada; II especificação dos sistemas de saneamento básico; III proposição de intervenções para o controle de riscos geotécnicos e de inundações; IV recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização; V comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental, considerados o uso adequado dos recursos hídricos e a proteção das unidades de conservação, quando for o caso; VI comprovação da melhoria da habitabilidade dos moradores propiciada pela regularização proposta; e VII garantia de acesso público às praias e aos corpos d´água, quando for o caso.

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art. 53.

5.9. Implantação do sistema viário e infraestrutura básica na regularização fundiária. Desde a abertura das concessões de água, luz e esgotos, entendemos que esta atribuição é das concessionárias. Porém, nada se ouvia a respeito, parecendo que o empreendedor e o próprio município tinham a obrigação de entregar às concessionárias toda a infraestrutura pronta para que explorassem e tivessem seus lucros. A partir da lei 11.977/09, há uma sinalização no sentido de as concessionárias participarem do processo de regularização fundiária, uma vez que serão clientes novos que terão que aderir às suas carteiras. A disposição contida no art. 5562 indica para este caminho quando atribui estas obras ao poder público ou às concessionárias e permissionárias de serviço público. No mesmo sentido, o parágrafo único autoriza a implantaçao de obra pública, mesmo antes da regularização jurídica da área perante o registro de imóveis. O que se nota é que a lei quer dar velocidade ao processo de regularização, fazendo com que tudo ande de maneira automática, sem entraves que normalmente impediriam a sequência do processo. O legislador facilitou de todas as formas a realização do processo de regularização. Antes os municípios não investiam em regularização fundiária em área particular por faltar-lhe a propriedade. Agora, com o permissivo do parágrafo único do art. 55, tudo fica mais facilitado.

5.10. O auto de demarcação: O art. 5663 instituiu o auto de demarcação. Este documento de natureza administrativa é baseado no levantamento da situação da área a ser regularizada e na caracterizaçao da ocupação. Então, consiste o auto de demarcação no documento que o poder público determina a identificação da área através da poligonal de tal área com as medidas perimétricas confrontantes e a forma como está dividida, buscadas no levantamento da área conforme preceitua o § 1º, inciso I64 do mesmo artigo. Consiste no próprio projeto de regularização fundiária relativo à parte urbanística de divisão da área. As novidades trazidas por

62. Art. 55. Na regularização fundiária de interesse social, caberá ao poder público, diretamente ou por meio de seus concessionários ou permissionários de serviços públicos, a implantação do sistema viário e da infraestrutura básica, previstos no § 6º do art. 2º da Lei no 6.766, de 19 de dezembro de 1979, ainda que promovida pelos legitimados previstos nos incisos I e II do art. 50. Parágrafo único. A realização de obras de implantação de infraestrutura básica e de equipamentos comunitários pelo poder público, bem como sua manutenção, pode ser realizada mesmo antes de concluída a regularização jurídica das situações dominiais dos imóveis.

63. Art. 56. O poder público responsável pela regularização fundiária de interesse social poderá lavrar auto de demarcação urbanística, com base no levantamento da situação da área a ser regularizada e na caracterização da ocupação.

64. Art. 56. § 1º O auto de demarcação urbanística deve ser instruído com: I - planta e memorial descritivo da área a ser regularizada, nos quais constem suas medidas perimetrais, área total, confrontantes, coordenadas preferencialmente georreferenciadas dos vértices definidores de seus limites, número das matrículas ou transcrições atingidas, indicação dos proprietários identificados e ocorrência de situações mencionadas no inciso I do § 5º. (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)

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este instrumento estão diretamente relacionadas ao registro imobiliário e à especialidade da matrícula. A matrícula constitui-se no cadastro do imóvel. É necessário, para que se faça qualquer desmembramento, que ela esteja definida. Normalmente, estas ocupações em áreas maiores terminam impossibilitando a retificação de área pela forma normal adotada pelos registros, mesmo na forma administrativa. Os requisitos constantes no inciso I dizem respeito diretamente à identificação da área. Por sua vez, o inciso II65 do mesmo parágrafo e artigo trata da sobreposição de áreas, a demarcada com a anotada no registro. Isso para identificar remanescentes, se houver, ou então para que o registro consiga fazer a localização exata em seus arquivos da área que está sendo objeto de modificações. O auto de demarcação não transfere propriedade. O auto de demarcação atua diretamente no cadastro do imóvel. Muitas vezes, ocorrerá a falta de identificação do proprietário dominial da área que está sendo objeto da demarcação. Nesta hipótese, deverá o registrador proceder a estas buscas, conforme preceitua o art. 5766. Por fim, o último instrumento que instrui o auto de demarcação é a certidão do registro da área demarcada, ou, na sua inexistência, por falta de localização, a busca deverá ser feita nos registros anteriores ou circunscrições imobiliárias anteriores ao cartório em que foi buscada.

5.11. Notificação dos entes federados do auto de demarcação: Uma providência necessária de acordo com o § 2º� e incisos. É o mesmo procedimento da usucapião. Para que haja, no prazo de 30 dias a manifestação do ente da Federação, União, Estado e Município, se este não for o autor do auto de demarcação nas hipóteses previstas nos incisos: (a) a primeira seria a anuência ou concordância com o procedimento, não tendo nada a opor à demarcação: a segunda seria opor-se ao auto de demarcação se o mesmo atingir imóvel público: b) com relação aos limites da demarcação, ou então na hipótese de a área confrontar com imóvel público. Sempre que houver esta divisa com imóvel público, deve o ente federado concordar ou discordar do procedimento; (c) por fim, a eventual titularidade pública da área ou então da inexistência ou impossibilidade de identificação dos proprietários. Estas seriam as razões para que se proceda à notificação dos demais entes federados. Na hipótese de o Estado ser o autor do auto de demarcação, devem ser cientificados o Município e a União.

65. II - planta de sobreposição do imóvel demarcado com a situação da área constante do registro de imóveis e, quando possível, com a identificação das situações mencionadas no inciso I do § 5º; e (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)

66. Art. 56. Encaminhado o auto de demarcação urbanística ao registro de imóveis, o oficial deverá proceder às buscas para identificação do proprietário da área a ser regularizada e de matrículas ou transcrições que a tenham por objeto.

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5.11.1. Omissão dos entes federados: O silêncio no prazo para manifestação importa na continuidade da demarcação, conforme previsão do § 3º.

5.11.2. Áreas de propriedade dos entes federados: Na hipótese de áreas da União, aplica-se a demarcação e a regularização com as disposições da lei 11.481/07 e, quanto aos demais entes, estados, Distrito Federal e municípios, a legislação patrimonial destes entes. Este dispostivo está contido no art. 56, § 4º. A princípio, a previsão do texto legal não coaduna com o próprio processo de regularização fundiária previsto na lei 11.977/09. Se os imóveis objetos da intervenção forem públicos e atenderem os requisitos da MP 2220/01, não se discute o direito do concessionário. Se, porém, as características forem outras, aí sim admite-se a aplicação das legislações próprias.

5.11.3. Demarcação parcial e áreas que são objetos da demarcação: É possível o auto de demarcação abranger parte da área titulada. Também pode envolver mais de um imóvel em sistema de fusão de áreas. O auto de demarcação não fica restrito à matrícula do imóvel encontrado. Ele pode se referir também apenas a um remanescente de área. Sempre que o domínio for privado, com proprietários não identificados em razão das imprecisões registrais, servirá o auto de demarcação para fixar o novo cadastro de uma área; da mesma forma, imóveis de domínio privado objeto de registro de imóveis, mas com proprietários distintos ou então imóveis domínio público, estas hipóteses autorizam a utilização do auto de demarcação. Estas previsões estão contidas no art. 56, § 5º e incisos I, II e III67. Conclui-se que o auto de demarcação poderá ser utilizado em qualquer área ocupada, seja ela pública ou privada. O título que se origina da demarcação urbanística é a legitimação de posse. Entendemos que não é possível utilizar este título em razão da imprescritibilidade do bem público. Assim, a legitimação da posse se aproxima demais da usucapião extrajudicial, possibilitando a sua conversão em propriedade, o que afronta o § 3º do, art. 18368 da CF.

67. Art. 57. § 5 º O auto de demarcação urbanística poderá abranger parte ou a totalidade de um ou mais imóveis inseridos em uma ou mais das seguintes situações: (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

I - domínio privado com proprietários não identificados, em razão de descrições imprecisas dos registros anteriores; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

II - domínio privado objeto do devido registro no registro de imóveis competente, ainda que de proprietários distintos; ou (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

III - domínio público. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)68. CF/88 Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos,

ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

...§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

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Completados estes procedimentos, o poder público poderá encaminhar o auto de demarcação ao registro de imóveis. Nesse momento, começa a fase relativa aos procedimentos registrais que ocuparão um capítulo próprio neste trabalho.

5.12. A Regularização Fundiária de Interesse Específico. A interpretação desta regularização fundiária é a de áreas ou glebas vazias para implementação e edificação de conjuntos habitacionais, direcionadas para políticas públicas. De igual forma, poderemos entender como Regularização Fundiária de Interesse Específico a regularização realizada nas operações urbanas consorciadas nas quais existe a participação da população local na efetivação da operação. As operações urbanas consorciadas estão previstas nos art. 32 a 34 do Estatuto da Cidade. Por último, entendemos necessária esta regularização em virtude de uma série de loteamentos irregulares, nos quais o próprio loteador vai promover a regularização urbanística e jurídica. Abre-se uma porta para regularizar os irregulares, o que, convenhamos, pode ser perigoso. Por que o loteador se submeteria aos rigores da legislação do parcelamento do solo, sendo que, gerando a irregularidade, há uma porta aberta − e bem aberta − para regularizar? Este é o questionamento que devemos fazer. Enquadra-se como forma de reduzir custos e flexibilizar a legislação existente, indo ao encontro do disposto na diretriz XV, do art. 2º69, que determina a simplificação da legislação com o objetivo de produzir novas habitações. Algumas cidades já têm o seu urbanizador social, por exemplo, e há parcerias com a iniciativa privada para produzir loteamentos com esta finalidade. Aplica-se o projeto de regularização fundiária conforme o previsto no art. 51, porém as áreas de preservação voltam a observar a legislação ambiental. Tanto a licença urbanística como a ambiental podem ser precedidas de contrapartida exigida pela autoridade licenciadora. Ou seja, com alguma flexibilidade, todas as atividades da regularização fundiária de interesse específico observam a legislação sobre o parcelamento do solo na sua integralidade.

Estas são as considerações sobre a lei 11.977/09, com exceção da parte que envolve as alterações da lei 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), que serão tratadas no próximo capítulo.

69. Art. 2º da Lei 10.257/01. Estatuto da Cidade. XV - simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais;

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06. o regIstro de ImóVeIs

e a regularIzação FundIárIa

Historicamente, o registro de imóveis, em razão de sua natureza, foi o óbice da regularização fundiária. O sistema registral brasileiro comete alguns equivocos de natureza cultural. Os registradores, em razão do princípio da territorialidade, na sua maioria, se sentem, num

primeiro momento, maiores do que a própria lei e, num segundo momento, inseguros ou temerosos dos atos que praticam. Evidente que não são todos, mas infelizmente são a maioria. Esta delegação pública tem que ser revista o quanto antes. Em pouco mais de vinte e poucos anos, avançamos um pouco com o fim da herança dos cartórios. Mas a qualificação apenas agora está sendo possível com os novos delegados, que, para serem aprovados em concursos públicos, têm que estudar exaustivamente, atualizando-se.

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O óbice cartorário, num primeiro momento, foi a própria lei. Aliás, dela não podemos esperar tanta coisa, pois ela acontece bem depois dos fatos e atos jurídicos. Algumas corregedorias gerais de justiça, a quem cabe controlar a delegação, vão além da lei e orientam seus delegados de forma a fazer andar as coisas mesmo com as lacunas legais.

6.1. Introdução: A propriedade, pelo nosso sistema jurídico, adquire-se pela transcrição do título no registro de imóveis mesmo que a aquisição se tenha dado por prescrição, que é o caso da usucapião. Esta previsão está contida no Código Civil de 2.002, no art. 1.245 e parágrafos.70 Assim é e assim foi. A propriedade somente será considerada de alguém se o título estiver registrado no registro imobilliário. Antes de 1.976, quando vigia o antigo sistema de registro, a aquisição de dava pela transcrição. A transcrição era o registro. Não se primava pela exatidão registral, e os registros sempre apresentaram diversas imperfeições, sendo de caráter de identificação do proprietário como de descrição do imóvel. As descrições, na sua maioria, eram genéricas, sem a inclusão de medidas perimetrais e às vezes em situação condominial que transformava o título num mero documento, sem qualquer tipo de certeza e identificação. O exercício da posse sempre foi, a nosso juízo, o definidor da propriedade. A propriedade sem posse não é propriedade, é um imóvel abandonado. Para tanto, devemos também ter em mentre os poderes inerentes à propriedade. O Art. 1.22871 define estes poderes como sendo: usar, gozar e dispor da coisa e, ainda, o direito de reavê-la através da defesa da posse. Assim, o registro de imóveis sempre foi de uma importância definitiva em nosso direito quando se trata de propriedade.

A tal ponto que a proteção deste direito decorre da própria Constituição Federal e é um direito fundamental previsto no art. 5º, inciso XXI do texto maior. Movimentos sociais agitaram o país principalmente quando se falava em reforma agrária de maneira efetiva. Porém, a constituição de 1988, além de garantir o direito de propriedade, a vinculou à sua função social como sendo condição essencial deste exercicio. Com esta simples garantia constitucional do que seja função social da propriedade, o legislador constitucional não se omitiu em definir constitucionalmente esta garantia fundamental, ou seja, cláusula pétrea constitucional, e previu no § 2º do art. 182 quando a propriedade cumpre a sua função social. O sentido

70. Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.71. Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que

injustamente a possua ou detenha.

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constitucional da função social está no atendimento das diretrizes ditadas pelo plano diretor, ou seja, a utilização da propriedade deve atender à legislação urbanística existente.

O Código Civil no art. 1.228, § 1º, ao falar do uso da propriedade, avançou um pouco mais neste conceito constitucional ao determinar que a utilização da propriedade deve atender tanto à sua finalidade econômica como ao respeito ao meio ambiente em geral. Registralmente, porém, o sistema anterior vigiu até 1.976, quando então passou a vigir a lei 6.015/73, a qual inovou, de maneira efetiva, a sistemática registral. Criou a matrícula, o registro e a averbação.

A matrícula do imóvel consiste no cadastro do imóvel. Para tanto, a Lei dos Registros Públicos trouxe no seu contexto diversos tratamentos a esta descrição, inovando com relação ao sistema registral anterior. Os requisitos da matrícula referentes à descrição dos imóveis, ou seja, o seu cadastro, estão contidos no art. 176, I, II,3), a) e b) da Lei. A lei não para aí. Em nome do princípio da especialidade, que vem a ser a melhor descrição do imóvel possível, o art. 22572 ditou com relação aos imóveis urbanos os requisitos mínimos que devem conter em todo o título que seja endereçado ao registro imobiliário. Entre outras coisas, características, confrontações, quarteirão, distância da esquina, etc... A lei se preocupou em especializar a identificação do imóvel em razão da disputa do espaço urbano.

E, para que os imóveis sejam integralmente caracterizados, pois 1m2 tem em algumas regiões valor inestimável, a precisão é a regra. A disputa chega a centimetros. No mesmo diapasão, mexia-se nesta matrícula somente por ordem judicial, ou seja, não havia a possibilidade de, administrativamente, corrigir-se algum erro, ou então modificar ou inserir algum elemento na matrícula. A maioria dos registros de imóveis, por imperfeição do sistema registral anterior, não tinha a caracterização completa dos imóveis lançados em seus arquivos. Mas, como afirmamos, qualquer modificação a ser feita naqueles registros só poderia ocorrer com ordem judicial a partir do devido processo legal. Neste instante, entram em cena ações como demarcatória, divisão, retificação de registro, etc...

Diversos monstros travavam o processo de regularização e mesmo de empreendedorismo imobiliário, levando o loteador à informalidade

72 Lei 6.015/73. Art. 225 - Os tabeliães, escrivães e juízes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário. (Renumerado do art. 228 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

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ou à irregularidade, pois não lograva o registro do loteamento mesmo avançando administrativamente. Com certeza, podemos afirmar que este comportamento da lei dos registros, somado ao comportamento dos registradores, que impõem ao processo de registro diversas dificuldades, como já afirmamos a partir da capitulação do art. 51 da Lei 6.766/79, que impõe responsabilidades civis e criminais ao registrador que proceder no parcelamento do solo sem observância da lei específica, a coisa ficou muito difícil.

A incompetência aliada ao medo transformou alguns registradores em verdadeiros travados e entravantes. Com relação aos juízes, a matéria atinente a registros públicos sempre foi muito maltratada tanto nos bancos acadêmicos como nos concursos públicos. Normalmente, o juiz não entende nada de registro. Aí mora o perigo. Ele se socorre de uma das partes para decidir. Procura os registradores.

Tudo começou a mudar a partir da lei 10931/04, que modificou substancialmente o processo de retificação das matrículas, tornando-o, na grande maioria, administrativo em vez de apenas judicial. Claro que cabe ao interessado promover este processo de retificação dos elementos constantes da matrícula na forma administrativa ou continuar na forma judicial, sendo este último excessivamente penoso, como é penoso o nosso judiciário.

Então, a partir da possibilidade de se retificar administrativamente a matrícula do imóvel, o processo ficou mais célere. Os empreendimentos não travaram mais na imperfeição da descrição da matrícula e o processo de regularização fundiária, que exige a regularização jurídica, ficou também mais ágil. Parecia que isso seria o máximo. Então a lei 11.977/09 trouxe modificações profundas na lei dos registros públicos e na forma de proceder dos registradores, participando efetivamente com uma contrapartida que, entendemos, é devida à sociedade em geral quando se fala em regularização fundiária.

Estas novidades envolvem o auto de demarcação, uma forma de identificação do imóvel de forma sumária, bem como o trabalho do registrador comprometido com o processo na busca de eventuais proprietários não identificados, notificações, etc., além da isenção no pagamento de custas dos atos de institutição da regularização fundiária e

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também nos atos do primeiro registro dos imóveis oriundos do processo de regularização fundiária. Vamos desenvolver por partes estas análises a partir de agora com o intuito de fazer entender, de maneira clara, o que significa este envolvimento registral com a regularização fundiária.

6.1. Imóvel desapropriado. Procedimentos registrais: os procedimentos relativos às desapropriações sempre causaram celeuma no âmbito registral, pois não havia previsão específica do procedimento de cadastro destes imóveis; o registrador os tratava de forma ordinária ou normal, como tratava todos os imóveis. Na realidade, havia no registro de imóveis a verdadeira ISONOMIA. Lembro-me de quando operava em registro de imóveis, e o cartório recebeu diversas desapropriações para instalação de uma rodovia, não se sabia como realizar aqueles registros pela imperfeição do arquivo do registro e também dos títulos apresentados: nada coincidia. A precariedade gerada pela antiga sistemática registral foi a causa deste caos. Em 2011, com as modificações ocorridas na lei 11.977/09 pela lei 12.424, o legislador doou ao art. 17373, o parágrafo 8º, que dispõe que, a partir da imissão da posse concedida em processo judicial, o ente público pode requerer a abertura da matrícula de parte de imóvel localizado no zoneamento urbano, ou de extensão urbana, previamente matriculado ou não, tendo como bases a planta e o memorial descritivo. Se o imóvel consistir em parte, o remanescente ou sua apuração poderá ser feita posteriormente. Sempre no processo expropriatório restam reamanescentes de áreas e antes isso não podia ser apurado após, mas a flexibilidade data pelo § 8º tem como fundamento a celeridade do processo. Da mesma forma, se o ente público proprietário quiser desmembrar parte de um imóvel para proceder à abertura de matrícula com a finalidade de regularização de interesse social ou específico, poderá fazê-lo da mesma forma como existe a previsão para a imissão provisória na posse. Estes elementos devem ser usados rotineiramente em processos de desapropriação.

6.1.1. Desapropriação para fins de regularização de interesse social ou específico: Se a administração pública utilizar a desapropriação para a produção de novas glebas, ou então para fins de regularização fundiária de interesse social, poderá, a partir da imissão na posse, encaminhar o registro, o parcelamento ou a regularização. Tratando-se de produção de novas unidades através do parcelamento do solo, o despacho do juiz da

73.

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desapropriação que concedeu a imissão provisória na posse, a qual deve ser pedida, serve como título para que o registrador registre o parcelamento do solo. Previsão contida no art. 18, §§ 4 e 5º74. Dispensa-se o título de propriedade. Em substituição ao título de propriedade, basta juntar os documentos citados nos parágrafos, que incluem a decisão do juiz que concedeu a imissão provisória, que este aspecto formal do registro estará suprimido. Como se nota, a ideia do legislador é tornar céleres os processos de produção de novas habitações e de regularização, intervindo no registro de forma a torná-los também ágeis. Outra hipótese que devemos tratar é a desapropriação efetuada quando existe a irregularidade no parcelamento e o município termina a obra, restando desapropriar o remanescente art. 4275 da lei 6.766/79. O legislador quer que o reamanescente seja tratado como gleba, e não lotes prontos ou loteáveis, o que implica uma redução significativa do valor da expropriação. Esta hipótese às vezes acontece. Não acontece mais porque já vimos negociações entre o proprietário dominial do loteamento não executado querer indenização em lotes não produzidos por ele. O disposto no art. 42, a nosso juízo, é bem claro e não deixa brechas para outras interpretações.

Afora estas hipóteses de desapropriação, não vislumbramos outras que possam influir diretamente na regularização fundiária e na posição registral ditada pela lei dos registros públicos.

6.1.2. Áreas públicas em loteamentos não registrados: Parece que a pior parte de implantação de um loteamento é a parte que se refere ao meio ambiente. Isso quanto à etapa administrativa, que poderíamos chamar de urbanística e ambiental. Quando chegamos à regularização jurídica, quando parecia que o pior tinha passado (fase administrativa), o pior está por acontecer. Entendemos que a maioria das complicações registrais dizem respeito ao desconhecimento geral da lei do parcelamento do solo e dos princípios registrais pelos empreendedores e muitas vezes pelos próprios registradores. Quanto ao registrador ele exala: prepotência,

74. § 4o O título de propriedade será dispensado quando se tratar de parcelamento popular, destinado às classes de menor renda, em imóvel declarado de utilidade pública, com processo de desapropriação judicial em curso e imissão provisória na posse, desde que promovido pela União, Estados, Distrito Federal, Municípios ou suas entidades delegadas, autorizadas por lei a implantar projetos de habitação de interesse social. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999) § 5o No caso de que trata o § 4o, o pedido de registro do parcelamento, além dos documentos mencionados nos incisos V e VI deste artigo, será instruído com cópias autênticas da decisão que tenha concedido a imissão provisória na posse, do decreto de desapropriação, do comprovante de sua publicação na imprensa oficial e, quando formulado por entidades delegadas, da lei de criação e de seus atos constitutivos. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

75 Lei 6.766/79.Art. 42. Nas desapropriações não serão considerados como loteados ou loteáveis, para fins de indenização, os terrenos ainda não

vendidos ou compromissados, objeto de loteamento ou desmembramento não registrado.

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insegurança, ignorância, falta de conhecimento, etc.

Às vezes, o município se depara com a figura de um loteamento implantado com planta aprovada pelo município com as áreas destinadas a equipamentos urbanos comunitários ocupadas ou então livres. Os municípios ficavam engessados com relação a essas áreas, e não conseguiam fazer nada. Alguns, mais radicais, sequer água disponibilizavam aos ocupantes deste tipo de área; luz, nem pensar, até porque a destinação de recursos públicos sempre exigem a ‘‘matrícula’’ da área. É necessário que as áreas estejam com a matrícula própria. A lei 12.424/11, incluiu no art. 195-A76, na lei dos registros públicos, a seguinte determinação: o município, querendo, poderá solicitar ao registro de imóveis a abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis públicos oriundos do loteamento, mesmo não registrados. Não basta, pura e simplesmente, o requerimento. Ele deverá ser instruído com planta e memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado, com as exigências de especialização contidas no restante do inciso I do mesmo artigo; além da planta e do memorial, o município deve intimar os confrontantes para que se conformem ou não com as divisas oferecidas pela planta e pelo memorial descritivo. Esta intimação é necessária sempre, em qualquer retificação de área ou proceso de usucapião que implique alteração das medidas perimetricas, previsão do inciso II. O prazo de resposta é de quinze dias. Se houver resposta do confrontante, esta resposta deverá fazer parte do expediente que será entregue ao registro de imóveis, previsão do inciso III. A planta geral do loteamento, assinada pelo loteador, ou simplesmente aprovada pela prefeitura, deve ser acompanhada da declaração de que o parcelamento se

76. Art. 195-A. O Município poderá solicitar ao registro de imóveis competente a abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis públicos oriundos de parcelamento do solo urbano, ainda que não inscrito ou registrado, por meio de requerimento acompanhado dos seguintes documentos: (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)I - planta e memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado, dos quais constem a sua descrição, com medidas perimetrais, área total, localização, confrontantes e coordenadas preferencialmente georreferenciadas dos vértices definidores de seus limites; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)II - comprovação de intimação dos confrontantes para que informem, no prazo de 15 (quinze) dias, se os limites definidos na planta e no memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado se sobrepõem às suas respectivas áreas, se for o caso; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)III - as respostas à intimação prevista no inciso II, quando houver; e (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)IV - planta de parcelamento assinada pelo loteador ou aprovada pela prefeitura, acompanhada de declaração de que o parcelamento se encontra implantado, na hipótese deste não ter sido inscrito ou registrado. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)§ 1o Apresentados pelo Município os documentos relacionados no caput, o registro de imóveis deverá proceder ao registro dos imóveis públicos decorrentes do parcelamento do solo urbano na matrícula ou transcrição da gleba objeto de parcelamento. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 2o Na abertura de matrícula de imóvel público oriundo de parcelamento do solo urbano, havendo divergência nas medidas perimetrais de que resulte, ou não, alteração de área, a situação de fato implantada do bem deverá prevalecer sobre a situação constante do registro ou da planta de parcelamento, respeitados os limites dos particulares lindeiros. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 3o Não será exigida, para transferência de domínio, formalização da doação de áreas públicas pelo loteador nos casos de parcelamentos urbanos realizados na vigência do Decreto-Lei no 58, de 10 de dezembro de 1937. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 4o Recebido o requerimento e verificado o atendimento aos requisitos previstos neste artigo, o oficial do registro de imóveis abrirá a matrícula em nome do Município. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 5o A abertura de matrícula de que trata o caput independe do regime jurídico do bem público. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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encontra implantado. A previsão está contida no inciso IV. O texto legal fala em loteamento inscrito ou registrado. A inscrição se dava anteriormente à lei dos registros públicos que criou a matrícula Lei 6.015/73. Anteriormente a 01.01.1976, os loteamentos eram inscritos no livro 8 do sistema antigo, que era regido especialmente pelo decreto 4.857/39.

Por tratar-se de registro de imóveis, a lei é administrativa e, por isso, trata dos procedimentos em suas particularidades. Por exemplo, o § 1º dispõe que: apresentada a documentação dos incisos, o registrador deve proceder ao registro dos imóveis públicos decorrentes do parcelamento. Entendemos que o registro a que o § se refere seria uma averbação, e não um registro, já que a transmissão das áreas públicas decorre de lei apenas para preservar o princípio da continuidade, já que a matrícula da área pública será aberta em nome do município. Mas o oficial deverá abrir matrícula do bem público: essa regra está contida no § 4º, em nome do município, restando na matrícula da gleba o remanescente para acolher o registro do parcelamento posteriormente. Das situações previstas neste art. 195-A, outra que chama atenção é com relação à discrepância entre o registro e a situação de fato. Definitivamente, o legislador entendeu que o cadastro imobiliário constante nos registros é inconfiável. Tanto que, na hipótese de divergência entre o registro e a documentação apresentada, prevalecerá a documentação apresentada, ou seja, a situação de fato. Esta previsão está contida no § 2º do mesmo artigo. Com relação aos parcelamentos anteriores à lei 6.766/79, não há necessidade de formalização de doação de áreas, apenas levantamento, memorial e documentos constantes nos incisos do art. 195-A.

Como se vê, num exame mais detalhado desta disposição incluída na lei dos registros públicos, a possibilidade de realizar-se com velocidade a regularização fundiária é cada vez maior. As ferramentas necessárias estão disponibilizadas.

6.1.3. Áreas da União, estados e Distrito Federal. Previsão constante no art. 195-B e §§’s77. Diversas áreas pertencentes a estes entes federados por autorização legislativa ainda não estão lançadas no registro de imóveis.

77. Art. 195-B. A União, os Estados e o Distrito Federal poderão solicitar ao registro de imóveis competente a abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis urbanos sem registro anterior, cujo domínio lhe tenha sido assegurado pela legislação, por meio de requerimento acompanhado dos documentos previstos nos incisos I, II e III do art. 195-A. (Incluído pela Lei nº 12.693, de 2012)

§ 1o Recebido o requerimento na forma prevista no caput, o oficial de registro de imóveis abrirá a matrícula em nome do requerente, observado o disposto no § 5o do art. 195-A. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 2o O Município poderá realizar, em acordo com o Estado, o procedimento de qe trata este artigo e requerer, em nome deste, no registro de imóveis competente a abertura de matrícula de imóveis urbanos situados nos limites do respectivo território municipal. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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Encontramos esta situação nos estados de Tocantins, Mato Grosso do Sul, Acre, Amapá, enfim os últimos estados criados. Muitas áreas ainda não foram tituladas ou lançadas no álbum imobiliário, mas pertencem especialmente à União e a estes estados novos, principalmente os criados com a Constituição Federal de 1988. Assim, a lei 12.693/12 incluiu na lei dos registros públicos uma forma rápida de titular estas áreas. Os entes nominados, União, estados e o Distrito Federal, poderão aplicando o disposto no art. 195-A, requerer a abertura de matrícula destas áreas junto ao registro de imóveis, apresentando a documentação prevista nos incisos I, II e III do art. 195-A, o mesmo que para municípios. É uma forma rápida, prática e eficiente de titular estas áreas. Da mesma forma, o § 2º do art. 195-B trata dos convênios entre Estado e município, quando então o município poderá requerer em nome próprio as áreas, mesmo autorizadas legislativamente ao Estado. Normalmente, trata-se de área já ocupada e pendente de regularização. Isso evitaria um trâmite a mais, autorização legislativa para o Estado, e o município poderia agir de forma direta e imediata.

6.1.4. Os atos de impugnação e o processo de dúvida – art. 198 até o 20478. Quando um título é apresentado para registro ele passa pelas seguintes situações:

6.1.4.1. Apresentação: Na apresentação do título, ela acontece, por tradição, com a entrega. Não necessita requerimento expresso. Apenas em pedidos de averbações, ou seja, alterações das matrículas, é necessário

78. Art. 198 - Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimí-la, obedecendo-se ao seguinte: (Renumerado do art 198 a 201 “caput” com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).I - no Protocolo, anotará o oficial, à margem da prenotação, a ocorrência da dúvida; Il - após certificar, no título, a prenotação e a suscitação da dúvida, rubricará o oficial todas as suas folhas; III - em seguida, o oficial dará ciência dos termos da dúvida ao apresentante, fornecendo-lhe cópia da suscitação e notificando-o para impugná-la, perante o juízo competente, no prazo de 15 (quinze) dias; IV - certificado o cumprimento do disposto no item anterior, remeterse-ão ao juízo competente, mediante carga, as razões da dúvida, acompanhadas do título. Art. 199 - Se o interessado não impugnar a dúvida no prazo referido no item III do artigo anterior, será ela, ainda assim, julgada por sentença. (Renumerado do art. 201 § 1º com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).Art. 202. Impugnada a dúvida, o Juiz proferirá a sentença no prazo de cinco (5) dias, com os elementos constantes dos autos.Parágrafo único. Da sentença poderão interpor recurso de apelação, com ambos os efeitos o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado.Art. 200 - Impugnada a dúvida com os documentos que o interessado apresentar, será ouvido o Ministério Público, no prazo de dez dias. (Renumerado do art. 202 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).Art. 201 - Se não forem requeridas diligências, o juiz proferirá decisão no prazo de quinze dias, com base nos elementos constantes dos autos. (Renumerado do art. 202 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).Art. 202 - Da sentença, poderão interpor apelação, com os efeitos devolutivo e suspensivo, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado. (Renumerado do parágrafo único do art. 202 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).Art. 203 - Transitada em julgado a decisão da dúvida, proceder-se-á do seguinte modo: (Renumerado dos arts. 203 e 204 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).I - se for julgada procedente, os documentos serão restituídos à parte, independentemente de translado, dando-se ciência da decisão ao oficial, para que a consigne no Protocolo e cancele a prenotação; II - se for julgada improcedente, o interessado apresentará, de novo, os seus documentos, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivados, para que, desde logo, se proceda ao registro, declarando o oficial o fato na coluna de anotações do Protocolo. Art. 204 - A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente. (Renumerado do art. 205 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

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que se proceda no requerimento próprio. Exemplos: averbação de uma edificação, alteração de nome de rua, alteração do estado civil, alteração de confrontantes, alteração de divisas, averbações e retificações, etc., sempre requerente com a respectiva comprovação. Assim, quando da entrega do título ou requerimento escrito no balcão do cartório, ele tomará um número que será o da prenotação, ou protocolo, e com o permissivo do art. 1479 da Lei dos Registros Públicos, 6.015/73, são cobradas as custas − depósito de valor correspondente ao custo para que o título ou requerimento tramite e seja ou não registrado ou averbado como veremos.

6.4.1.2. Preferência. Num segundo momento, o título é lançado no livro 1, que é o livro protocolo, que dá a ele prioridade e preferência de registro, dois princípios registrais de suma importância. À luz de nosso direito pátrio, uma das formas de quaisição da propriedade é com o registro do título no registro imobiliário − art. 1.24580. Como se nota na leitura do § 1º, enquanto não se registrar o título, o antigo proprietário continua a ser havido como dono. A previsão legal, na nossa ótica, parece coisa de doido. Será que um alienante faria a venda da mesma coisa para duas pessoas? Por incrível que possa parecer, sim, quando a coisa ainda não existe, não é cóporea. Nas incorporações imobiliárias, a prática é comum, pois a coisa está em construção. Porém, quando o imóvel existe, não é mais possível em razão do apossamento, ou aprisionamento, que o adquirente faz da coisa. Ou seja, demonstra a sua propriedade com a vontade do dono.

6.4.1.3. Qualificação registral: Na sequência, o registro faz a chamada qualificação do título. Nesta qualificação, outros princípios registrais são apreciados, como o da continuidade, que significa que é requisito para o registro que haja um título já registrado, o chamado registro anterior, e que o alientante seja proprietário no registro anterior e a descrição do imóvel não tenha se alterado a ponto de colocar em dúvida tratar-se do mesmo imóvel; já o princípio da especialidade é a forma que o registrador tem de aprimorar o cadastro imobiliário, representado pela matrícula do imóvel de forma a tornar mais específica possível a propriedade. Bem, na aplicação destes dois princípios, alguns títulos serão recusados, assim como no exame

79. Art. 14. Pelos atos que praticarem, em decorrência desta Lei, os Oficiais do Registro terão direito, a título de remuneração, aos emolumentos fixados nos Regimentos de Custas do Distrito Federal, dos Estados e dos Territórios, os quais serão pagos, pelo interessado que os requerer, no ato de requerimento ou no da apresentação do título. (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1974)

Parágrafo único. O valor correspondente às custas de escrituras, certidões, buscas, averbações, registros de qualquer natureza, emolumentos e despesas legais constará, obrigatoriamente, do próprio documento, independentemente da expedição do recibo, quando solicitado. (Incluído pela Lei nº 6.724, de 1979).

80. Código Civil. Da Aquisição pelo Registro do Título. Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

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da legalidade, em que leis esparsas impõem exigências diversas, muitas vezes não atendidas na elaboração do título. A forma como o registrador se comunica com o apresentante é através da impugnação. E é sobre a impugnação ou exigência que trata o art. 198 e seguintes.

6.4.1.4. Processo de dúvida: A dúvida tem natureza administrativa. Ou seja, é um processo sumário regulado pela própria lei dos registros públicos. Então, sempre que houver exigência a ser satisfeita, o oficial do registro deverá fazê-la por escrito. É a chamada nota de impugnação. Aí a lei indica dois caminhos: (1) O apresentante se conforma e atende as exigências do registrador, sendo o título levado a registro ou (2) o apresentante não se conforma ou não pode satisfazer a dúvida, então ele requer ao registrador que declare dúvida. Quando falamos em conformismo, estamos nos referindo à questão relativa a entender cabível a exigência, assim como o não conformismo é contrário, a exigência feita. Outras questões estão relacionadas com a possibilidade de atendimento ou não da exigência. Muitas vezes, não é possível atender a exigência do registrador, ou pelo decorrer do tempo, ou então pela impossibilidade. Nesta hipótese, o juiz vai mensurar a importância para o ato registral da exigência feita. Em ambas as hipóteses, compete ao juiz corregedor, diretor do foro, etc. − são diversas denominações de acordo com a estrutura judiciária dos estados − decidir se a exigência é procedente ou improcedente.

O registrador então declara a dúvida, e remete ao foro os documentos todos, ou seja, o título, a impugnação e a declaração de dúvida, bem como a intimação do apresentante para impugnar a dúvida no prazo de 15 (quize) dias, já diante da autoridade judicial. Impugnada a dúvida e ouvido o representante do Ministério Público, pois o MP é o curador dos registros públicos, e não havendo mais nenhuma diligência, o juiz deve decidir. Se a dúvida for julgada improcedente, o registro será feito afastando-se aquela exigência do registrador; se a dúvida for julgada procedente, o apresentante deverá providenciar a supressão da exigência do registrador para que seja efetivado o registro. As consequências do processo de dúvida estão relacionadas mais com o tempo que demora o registro do que com qualquer outra coisa.

Muito registrador gosta de se esconder atrás do processo de dúvida como se estivesse se eximindo de qualquer responsabilidade por um registro feito de forma errada ou equivocada, transferindo a responsabilidade ao

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judiciário. Este comportamento indica falta de competência para a delegação que exerce. Entendemos que o processo de dúvida gera responsabilidade civil. Se a dúvida for julgada improcedente e o registrador tenha infringido alguns dos componentes da culpa, negligência, imprudência ou imperícia, deve indenizar o apresentante pelos prejuízos ocasionados. Uma simples recomendação do Conselho Nacional de Justiça já faz alguns registradores despreparados exigirem certidões trabalhistas e mais uma série de coisas para o registro de uma simples alienação.

O excesso de cautela, na maioria das vezes, é insegurança. Então, toda a matéria submetida ao registro e protocolizada pode ser objeto de dúvida. Falamos, no início deste tópico, que a dúvida tem caráter administrativo, mas não impede que o apresentante resolva utilizar o contencioso judicial para dirimir a questão. Claro é que o contencioso judicial é ainda mais demorado. Mas, se for alguma exigência que poderá demandar de provas a serem produzidas, a via correta é o contencioso judicial. Na esfera administrativa, não existe a dilação probatória. Assim, por diversas vezes deverá haver a opção pelo contencioso judicial em vez do procedimento administrativo. Com relação à regularização fundiária, a maioria dos processos de registro termina com a autorização judicial para o seu registro. O registrador ainda não tem condições técnicas, segundo o legislador, para o exame e a qualificação destas documentações relativas à regularização fundiária e ao parcelamento do solo.

6.4.1.5. Consequências da declaração de dúvida: O prazo de validade do protocolo no registro de imóveis é de trinta dias − art.188 81. No caso da dúvida, o número de protocolo fica como se numa reserva, aguardando o julgamento da dúvida, ou seja, o prazo do protocolo previsto no art. 188 se dilata além dos trinta dias que a lei prevê para que se proceda no registro. Esta é uma consequência efetiva da declaração de dúvida. Se o apresentante do título optar pela jurisdição contenciosa, este efeito não se aplicará ao protocolo, que será cancelado e, quando terminada a contenda, será protocolizado novamente. Como já falamos, esta preferência nos dias de hoje se opera muito em razão dos empreendimentos em produção, ou a serem produzidos, não com relação a imóveis usados ou prontos.

6.5. Retificação do registro/matrícula/averbação: As imprecisões registrais (omissão, imprecisão ou não expressão da verdade) decorrem da

81. Art. 188 - Protocolizado o título, proceder-se-á ao registro, dentro do prazo de 30 (trinta) dias, salvo nos casos previstos nos artigos seguintes

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forma como os registros eram feitos até 1976. Durante o tempo de instalação dos registros, 1875 em média, até a data de janeiro de 1976, o processo de registro foi acolhido nos chamados livrões medievais. Eram feitos com caneta de pena, ou seja, um excesso de tradição. A partir da mecanização dos registros, houve um salto de qualidade na qualificação registral, até porque as propriedades se multiplicaram, como se multiplicou a população do país e os sistemas de medições também se aprimoraram dando a plantas e mapas uma maior precisão. Mas, quando se fala de registro de imóveis, o registro é imutável.Tem que ser assim em razão da segurança jurídica que a própria lei lhe confere. Neste sentido, para alterar qualquer elemento constante do registro é necessário um procedimento próprio, de natureza administrativa, com regras claras e definitivas quanto ao procedimento do registrador, frente ao erro ou à omissão do registro. A possibilidade de alteração do registro está prescrita no art. 21282 da lei dos registros públicos. É bom ressaltar que nem sempre a área será modificada fisicamente, a adequação consiste num ajuste descritivo em busca do princípio da especialidade comum aos registros. O legislador sempre se preocupou com a vinculação dos confrontantes nestes processos de alteração do registro, tornando-o justo e similar à usucapião. Os procedimentos todos de retificação estão previstos no art. 213 seus inúmeros incisos e 16 §s83. Nas retificações feitas

82. Art. 212. Se o registro ou a averbação for omissa, imprecisa ou não exprimir a verdade, a retificação será feita pelo Oficial do Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, por meio do procedimento administrativo previsto no art. 213, facultado ao interessado requerer a retificação por meio de procedimento judicial. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)

Parágrafo único. A opção pelo procedimento administrativo previsto no art. 213 não exclui a prestação jurisdicional, a requerimento da parte prejudicada. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)

83. Art. 213. O oficial retificará o registro ou a averbação: (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004) I - de ofício ou a requerimento do interessado nos casos de: (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)a) omissão ou erro cometido na transposição de qualquer elemento do título; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)b) indicação ou atualização de confrontação; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)c) alteração de denominação de logradouro público, comprovada por documento oficial; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)d) retificação que vise à indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georreferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)e) alteração ou inserção que resulte de mero cálculo matemático feito a partir das medidas perimetrais constantes do registro; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)f ) reprodução de descrição de linha divisória de imóvel confrontante que já tenha sido objeto de retificação; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)g) inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas; (Incluída pela Lei nº 10.931, de 2004)II - a requerimento do interessado, no caso de inserção ou alteração de medida perimetral de que resulte, ou não, alteração de área, instruído com planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no competente Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA, bem assim pelos confrontantes. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 1o Uma vez atendidos os requisitos de que trata o caput do art. 225, o oficial averbará a retificação. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 2o Se a planta não contiver a assinatura de algum confrontante, este será notificado pelo Oficial de Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, para se manifestar em quinze dias, promovendo-se a notificação pessoalmente ou pelo correio, com aviso de recebimento, ou, ainda, por solicitação do Oficial de Registro de Imóveis, pelo Oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 3o A notificação será dirigida ao endereço do confrontante constante do Registro de Imóveis, podendo ser dirigida ao próprio imóvel contíguo ou àquele fornecido pelo requerente; não sendo encontrado o confrontante ou estando em lugar incerto e não sabido, tal fato será certificado pelo oficial encarregado da diligência, promovendo-se a notificação do confrontante mediante edital, com o mesmo prazo fixado no § 2º, publicado por duas vezes em jornal local de grande circulação. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 5o Findo o prazo sem impugnação, o oficial averbará a retificação requerida; se houver impugnação fundamentada por parte de algum confrontante, o oficial intimará o requerente e o profissional que houver assinado a planta e o memorial a fim de que, no prazo de cinco dias, se manifestem sobre a impugnação. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 6o Havendo impugnação e se as partes não tiverem formalizado transação amigável para solucioná-la, o oficial remeterá o

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conforme inciso II do caput deste artigo, serão considerados confrontantes somente os confinantes de divisas que forem alcançados pela inserção ou alteração de medidas perimetrais. Essa previsão está contida no § 16 do mesmo artigo.

6.5.1. Hipóteses de retificação de ofício: Quando a lei refere-se a “de ofício” significa que não é necessária a provocação da parte ao registrador. Ele, constatando erro, omissão, imprecisão poderá corrigir por sua conta, sem que seja provacado através de requerimentos, etc.. Assim a lei dá uma maior mobilidade ao registrador para manter em dia e atual o seu arquivo de registro. As hipóteses numeros clausus estão previstas no inciso I e letras do art. 213. O inciso deixou a critério do registrador fazer de ofício a retificação ou então a requerimento do interessado. Sabemos que, de ofício, poucos delegados destas serventias públicas fazem alguma coisa. Até porque se o fizerem não terão direito a custas, sendo que o requerimento sempre gera custas a serem recebidas, já que o carácter da delegação é através de remuneração privada.

6.5.1.1. a) A omissão ou o erro cometido na transposição de qualquer elemento do título: A matrícula, o registro e a própria averbação contêm alguns poucos elementos do título. Podemos dizer que os processo ao juiz competente, que decidirá de plano ou após instrução sumária, salvo se a controvérsia versar sobre o direito de propriedade de alguma das partes, hipótese em que remeterá o interessado para as vias ordinárias. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 7o Pelo mesmo procedimento previsto neste artigo poderão ser apurados os remanescentes de áreas parcialmente alienadas, caso em que serão considerados como confrontantes tão somente os confinantes das áreas remanescentes. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 8º. As áreas públicas poderão ser demarcadas ou ter seus registros retificados pelo mesmo procedimento previsto neste artigo, desde que constem do registro ou sejam logradouros devidamente averbados. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 9o Independentemente de retificação, dois ou mais confrontantes poderão, por meio de escritura pública, alterar ou estabelecer as divisas entre si e, se houver transferência de área, com o recolhimento do devido imposto de transmissão e desde que preservadas, se rural o imóvel, a fração mínima de parcelamento e, quando urbano, a legislação urbanística. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 10. Entendem-se como confrontantes não só os proprietários dos imóveis contíguos, mas, também, seus eventuais ocupantes; o condomínio geral, de que tratam os arts. 1.314 e seguintes do Código Civil, será representado por qualquer dos condôminos e o condomínio edilício, de que tratam os arts. 1.331 e seguintes do Código Civil, será representado, conforme o caso, pelo síndico ou pela Comissão de Representantes. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 11. Independe de retificação: (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)I - a regularização fundiária de interesse social realizada em Zonas Especiais de Interesse Social, promovida por Município ou pelo Distrito Federal, quando os lotes já estiverem cadastrados individualmente ou com lançamento fiscal há mais de 10 (dez) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)II - a adequação da descrição de imóvel rural às exigências dos arts. 176, §§ 3o e 4o, e 225, § 3o, desta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)III - a adequação da descrição de imóvel urbano decorrente de transformação de coordenadas geodésicas entre os sistemas de georreferenciamento oficiais; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)IV - a averbação do auto de demarcação urbanística e o registro do parcelamento decorrente de projeto de regularização fundiária de interesse social de que trata a Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009; e (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)V - o registro do parcelamento de glebas para fins urbanos anterior a 19 de dezembro de 1979, que esteja implantado e integrado à cidade, nos termos do art. 71 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)§ 12. Poderá o oficial realizar diligências no imóvel para a constatação de sua situação em face dos confrontantes e localização na quadra. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 13. Não havendo dúvida quanto à identificação do imóvel, o título anterior à retificação poderá ser levado a registro desde que requerido pelo adquirente, promovendo-se o registro em conformidade com a nova descrição.(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)§ 14. Verificado a qualquer tempo não serem verdadeiros os fatos constantes do memorial descritivo, responderão os requerentes e o profissional que o elaborou pelos prejuízos causados, independentemente das sanções disciplinares e penais. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)

§ 15. Não são devidos custas ou emolumentos notariais ou de registro decorrentes de regularização fundiária de interesse social a cargo da administração pública. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)

§ 16. Na retificação de que trata o inciso II do caput, serão considerados confrontantes somente os confinantes de divisas que forem alcançadas pela inserção ou alteração de medidas perimetrais. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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elementos contidos dizem respeito ao extrato do título. Assim, quando o registro retira do título estes elementos para produzir a matrícula, o registro ou a averbação é possível que haja erro ou omissão. Nestes casos, o próprio título é o elemento que vai gerar a retificação da matrícula ou o registro. Antes de 2004, da vigência da lei 10.931, todos os participantes do ato deveriam assinar uma escritura pública de rerratificação do título para poder alterar o registro.

6.5.1.2. b) A indicação ou atualização de confrontação: O próprio registrador, ao levar a registro um título, poderá encontrar as matrículas e os registros dos lindeiros e alterar as confrontações de ofício, atualizado o registro de todos. É uma permissão que a lei dá, mas, como afirmamos, não é feita pela maioria. Assim, sempre que o imóvel lindeiro ao seu for vendido, você poderá fazer um requerimento ao registrador, juntando a cópia da matrícula do imóvel alienado e solicitar que se proceda à atualização da confrontação. Assim, o cadastro imobiliário que se constitui na matrícula estará constantemente atualizado.

6.5.1.3. c) A alteração de denominação de logradouro público, comprovada por documento oficial: O comando do legislador é no sentido das leis serem publicadas por jornal oficial da cidade. Ao tomar conhecimento, o registrador de ofício passaria a proceder à alteração de todos os imóveis que tenham aquele logradouro público com denominação alterada. O que acontece, na prática, é que o interessado sempre que necessitar praticar algum ato registral deverá solicitar ao município uma certidão de que o nome da rua ou logradouro foi alterado e requerer ao registrador que averbe esta condição. Na prática, estamos diante de possibilidades de ofício, mas que dificilmente ocorrem sem a iniciativa do interessado.

6.5.1.4. d) A retificação que vise à indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georreferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais: A lei, para estas retificações mais simples, sempre deixa claro que não pode haver alteração das medidas perimetrais. A simples inserção de rumos, ângulos ou coordenadas não implica a alteração da área na sua substância, ou seja, divisas. Seria apenas a especialização sendo feita no registro com indicações técnicas recomendáveis à identificação efetiva da área. Este procedimento, como afirmamos, especializa o registro, não alterando sua substância. Para tal, basta a apresentação do documento técnico, o levantamento e o

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requerimento ao registrador, apontando os pontos em que haja omissão, contradição ou imprecisão.

6.5.1.5. e) A alteração ou inserção que resulte de mero cálculo matemático feito a partir das medidas perimetrais constantes do registro: Novamente, o embasamento em um documento técnico, a planta, seria o suficiente para proceder-se a esta retificação. Na maioria das vezes, esta retificação, prevista na letra e, do inciso I, do art. 213, faz menção clara a erros relacionados com a declaração da área superficial do imóvel desenhado. Normalmente, são erros evidentes relacionados com a declaração da superficíe, sempre preservando-se as medidas perimetrais, que são a sustentação do registro. Entende o legislador, e com razão, que o perímetro é que interessa, pois aí é que se colocam as divisas da propriedade − e qualquer alteração em tais divisas implicariam a alteração da própria.

6.5.1.7. f) A reprodução de descrição de linha divisória de imóvel confrontante que já tenha sido objeto de retificação: A letra f repete em outra situação a letra b do mesmo inciso. A letra b refere-se à indicação ou atualização de confrontante. A letra f faz menção à descrição de linha divisória de imóvel confrontante que foi objeto de retificação. Bem neste sentido, podemos alterar além do confrontante a descrição desta linha divisória, pois o procedimento de cautela já foi feito pelo vizinho. Este procedimento de cautela é relativo à intimação dos confrontantes sempre que houver alteração desta linha divisória. Seria desnecessária, na coincidência de divisas, repetir-se o mesmo procedimento para chegar ao lugar comum. Neste sentido, a lei é justa e producente, já que evita um novo procedimento para o mesmo fim.

6.5.1.8. g) A inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas: A qualificação das partes está contemplada no art. 176. Esta qualificação envolve a nacionalidade, o estado civil, a profissão, o número da Carteira de Identidade Civil, o número do Cadastro de Pessoa Física (CPF), o endereço, se casado, o regime de bens e a data de casamento, o nome e qualificação completa da esposa, a residência e domicílio da pessoa. Sempre que qualquer destes elementos que compõem a qualificação de um dos indivíduos da matrícula ou do registro for modificado, a retificação deverá ser requerida para o fim de atualizar o registro. Como se nota, neste elemento a lei permite a sua alteração de ofício, sem querimento, ou através

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de requerimento do interessado, porém as alterações não são de forma substancial a alterar a propriedade. Tem apenas a função de modificar os dados e elementos que compõem a identificação das partes.

6.5.2. A retificação a requerimento do interessado: O inciso II prevê as hipóteses de retificação a requerimento do interessado. Neste momento, vamos ver o auto de demarcação e outras infiltrações que a lei 11.977/09 fez na lei dos registros públicos. Como veremos aqui, as medidas perimetrais da área poderão ser alteradas, sendo uma retificação plena, sem as condicionantes de não alteração vistas anteriormente no comentário destes dispositivos legais.

6.5.2.1. Alteração ou não de área com modificação das medidas perimétricas: Sempre que houver inserção ou alteração de medida perimetral, resultando ou não em alteração de área, a retificação será feita a requerimento do interessado, instruído com MEMORIAL DESCRITIVO, PLANTA E ART, sendo indispensável a assinatura dos confrontantes. Assim sendo, sempre que houver modificação nas medidas perimétricas, os vizinhos devem ser ouvidos. Este consentimento dos vizinhos deve ser posto na própria planta com firma reconhecida, ou então por temo com a firma reconhecida, preferencialmente, POR AUTENTICIDADE.

Assim, relembrando as hipóteses do inciso II são: (1) inserção com alteração ou não de área: (2) alteração de medida perimetral, com alteração ou não de área. A lei não limita o quanto pode ser alterado de área. Normalmente, se utiliza por simetria a regra do art. 500 § 1º84 do CCB viculando a possibilidade alteração da área para maior em um vigéssimo do total, ou 5% da área alienada. Este limite nos parece ter sido esquecido pela lei, liberando o quanto poderá acrescer esta retificação.Serve, então, a previsão do inciso para qualquer retificação de área que resulte na alteração da poligonal de tal área. Sabemos que, para qualquer empreendimento imobiliário, mesmo garantia de financiamento, é necessário que a área esteja devidamente matriculada, com divisas, confrontações e medidas perimétricas definidas. Impossível qualquer projeto de parcelamento do solo e mesmo de oneração sem que esteja definida a garantia de forma cabal.

84. Código Civil Brasileiro. Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço.

§ 1o Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio.

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6.5.2.1.1. Concordância dos confrontantes: Às vezes, os confrontantes não concordam espontaneamente em colocar sua aquiescência no pedido de retificação. Mesmo assim, posso encaminhar ao registro o pedido de retificação e requerer ao registrador que ele proceda à intimação do confrontante para se manifestar sobre a minha solicitação. A forma como o registrador se comunica com o confrontante está prevista no §2º, quais sejam: (1) pessoalmente; (2) pelo correio com aviso de recebimento; (3) pelo oficial do Registro de Títulos e Documentos com a solicitação do oficial do registro de Imóveis, este último do domicílio do confrontante, não nescessitando ser do lugar de localização do bem. A comunicação deverá ser encaminha ao confrontante nos seguintes endereços: (1) ao próprio imóvel contíguo; (2) ao endereço fornecido pelo requerente ou apresentante. Se a comunicação for frustrada, o oficial certifica e promove a notifição edilícia, publicado duas vezes em jornal local de grande circulação, para que o confrontante se manifeste no prazo de quinze (15) dias. Esta previsão está contida no § 3º do artigo em análise. A lei no § 10º dá o seu entendimento do que seja confrontante efetivamente: não são considerados confrontantes somente os proprietários dominiais lançados no registro de imóveis. São também considerados confrontantes eventuais ocupantes. Ou seja, sempre que houver a ocupação da área vizinha por alguém, a lei a considera ocupante. Conforme as hipóteses do condomínio geral, previstas no art. 1.314 e seguintes do Código Civil, qualquer condômino pode representar este condomínio, não sendo necessária a anuência de todos; o mesmo acontece com relação ao condomínio edilício, quando a representação poderá se dar através do síndico ou então pela comissão representante nos casos especiais criados pela lei 4.591/64.

6.5.2.1.2. Término do prazo de quinze dias: Segundo previsões do § 5º, findo o prazo, o oficial procederá à retificação requerida. Caso contrário, se o confrontante apresentar uma impugnação à pretensão requerida fundamentada, ou seja, com embasamento, deverá intimar o requerente e o profissional que houver assinado a planta e o memorial, para, no prazo de cinco dias, se manifestarem sobre a impugnação. Se não houver transação amigável entre os confrontantes, que poderá ser feita no próprio registro de imóveis, o oficial tem que remeter o processo ao juiz da vara de registros públicos − ou corregedor, ou diretor do foro responsável e corregedor dos registros −, o qual decidirá após instrução sumária do processo. Se a fundamentação da impugnação versar sobre direito de propriedade, as partes serão remetidas às vias ordinárias, ou seja, para o contencioso judicial

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a fim de ver quem está com a razão.

6.5.2.1.3. Apuração de remanescentes de áreas: Antes da vigência do decreto-lei 58/37, os parcelamentos eram feitos com o depósito de plantas no registro imobiliário. Esta prática durou muitas décadas. Logo, não havia o registro do parcelamento do solo, como foi feito a partir de 1.937 e, principalmente, a partir de 1.979. É comum encontrarmos remanescentes de áreas que foram parceladas, apresentando o que costuma se chamar de “sobras de matrículas”. Essas sobras de áreas podem ser consideráveis e ter um excelente valor de mercado. O que normalmente ocorre é que os lotes vendidos, quando os compradores se apercebem da sobra, tomam posse dela, anexando-a ao lote comprado. Para apuração destas sobras, antes da vigência da Lei 10.931/04 não tínhamos nenhuma hipótese, já que a sobra restaria em condomínio. Os confrontantes a serem intimados seriam os da área toda. Com a alteração dada pela lei 10.931/04, os confinantes serão considerados somente os das áreas remanescentes, não envolvendo o do todo maior. A partir de então, é possível a identificação da sobra, a assinatura dos confrontantes; o procedimento é o mesmo do inciso anterior, ou seja, poderemos matrícular uma área remanescente que poderá realizar a regularização fundiária em áreas privadas.

6.5.2.1.4. Demarcação e retificação de áreas públicas: Segundo previsão do § 8º, as áreas públicas poderão ser objeto de demarcação ou retificação, utilizando-se para tal o mesmo procedimento: planta, memorial descritivo, assinatura dos confinantes. Não podemos confundir a hipótese prevista no art. 195-A e B. As hipóteses do §8º dizem respeito às áreas públicas já registradas. As previsões do art. 195-A e B dizem respeito a áreas ainda não registradas. Porém, havendo a planta do parcelamento em cartório, é possível a demarcação e a retificação das áreas públicas com o mesmo procedimento previsto para os casos anteriormente mencionados.

6.5.2.1.5. Alteração de divisa entre vizinhos: Quando os vizinhos pretendem alterar divisas, normalmente o fazem através da compra e venda. Porém, o § 9º, trouxe outra modalidade. Através de escritura pública, eles podem alterar ou estabelecer as divisas entre si, podendo inclusive fazer transferência de áreas entre si. Neste caso, a incidência dos impostos de transmissão ocorre sobre a área transmitida. O simples estabelecimento de divisas é uma escritura declaratória. Mas, sempre que houver transferência de área, deverá ser constituída regularmente a alienação. Os limites que a

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lei impõe são dois: um para o imóvel rural, a observância do remanescente de acordo com o módulo ou fração mínima de parcelamento; a outra seria a urbana, observando a legislação urbanística da cidade, os imóveis devem obedecer à testada mínima disposta no plano diretor e na lei do parcelamento do solo local.

6.6. Independe de retificação: As hipóteses que trataremos a seguir não exigem retificação de área no registro de imóveis, sendo uma forma original de corrigir as distorções, equívocos, erros e omissões de qualquer matrícula ou registro, como afirmamos, independentemente do processo administrativo ou judicial de retificação. Este comando legal está previsto no § 11º e seus incisos.

6.6.1. A regularização fundiária de interesse social: A Regularização fundiária de interesse social pode ser feita nas hipóteses prevista no art. 47, inciso VII, a, b, e c da lei 11.977/09. Como vimos, estas hipóteses são: a) se a área estiver ocupada, de forma mansa e pacífica, há, pelo menos, 5 (cinco) anos; b) imóveis situados em ZEIS; ou c) áreas da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social, realizada em Zonas Especiais de Interesse Social, promovida por município ou pelo Distrito Federal, quando os lotes já estiverem cadastrados individualmente ou com lançamento fiscal há mais de 10 (dez) anos. Destas três hipóteses, apenas a segunda, área situada em ZEIS, não necessita do processo de retificação, basta o projeto urbanístico aliado às seguintes informações: quando os lotes já estiverem cadastrados individualmente ou com lançamento fiscal há mais de 10 (dez) anos. Assim, não basta estar em ZEIS, tem que ser promovida pelo Estado ou DF e os lotes devem estar cadastrados individualmente, ou com lançamento há mais de dez anos. Note-se: sempre devemos estar atentos. Quanto temos o “e como conjunção aditiva, devemos fazer o que segue o “e”; sempre que tivermos o “ou”, conjunção alternativa, se não pudermos cumprir a primeira parte do comando, cumpriremos a segunda, mas as duas não se somam.

6.6.2. Imóveis rurais e o georreferenciamento. Para adequação dos imóveis rurais ao sistema de georreferenciamento, o levantamento é suficiente para proceder-se à retificação da área sem as cautelas normais deste procedimento, como a ouvida dos confrontantes.

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    6.6.3. Imóveis urbanos. Georreferrenciamento oficial. Entende-se como futuro próximo o georreferenciamento urbano para consolidar o chamado cadastro multifacetário para o município em seus dois cadastros existentes: o técnico e o fazendário e também para o registro de imóveis com a geração de matrículas. A lei adotou como digno de confiança o sistema de georreferenciamento, atribuindo a este precisão que até então não existia nos sistemas de medição. Este sistema veio suprir, tanto no meio rural como no urbano, as possibilidades de verdade real entre a situação efetiva da propriedade e o seu cadastro, tanto imobiliário como fazendário e técnico.

6.6.4. Auto de demarcação e registro de parcelamento: O auto de demarcação foi uma novidade na reforma urbana na regularização fundiária e no sistema registral. Quando analisamos a lei 11.977/09, estudamos o auto de demarcação. Neste momento, estamos apenas analisando as alterações cadastrais sem a necessidade do processo administrativo de retificação. Pois a lei, conforme inciso IV, diz que o auto de demarcação, bem como o registro do parcelamento, constituim-se em elementos suficientes para a especialização da matrícula, assim como o é o sistema georreferenciado.

6.6.5. Registro de loteamentos implantados anteriormente à lei do parcelamento do solo, de 19.12.1979. Trata-se de uma anistia. Se o empreendimento não foi regularizado ainda, mas já está implantado, sendo anterior à vigência da lei 6.766/79, este registro é o suficiente para aperfeiçoar a matrícula, não sendo necessária a retificação. Esta previsão também está contida no art. 7185 da lei 11.977/09. A lei dispensa o envolvimento do total da gleba lançada no registro, podendo este registro ser parcial, conforme previsão do § 1º. Assim, é outra possibilidade de regularização jurídica dos empreendimentos anteriores à vigência da lei do parcelamento do solo que estejam implantados e integrados à cidade. Claro que não se justificaria sua irregularidade, até porque já fazem parte do meio urbano, depois de mais de trinta anos.

6.6.6. Diligências do oficial. Se a documentação apresentada gerar alguma dúvida ao oficial do registro, este poderá promover diligências para dirimir as dúvidas surgidas, essencialmente com relação a confrontantes e localização no espaço urbano ou na quadra. De todas as questões que

85. Lei 11.977/09. Art. 71.  As glebas parceladas para fins urbanos anteriormente a 19 de dezembro de 1979 que não possuírem registro poderão ter sua situação jurídica regularizada, com o registro do parcelamento, desde que o parcelamento esteja implantado e integrado à cidade. 

§ 1o  A regularização prevista no caput pode envolver a totalidade ou parcelas da gleba. § 2o  O interessado deverá apresentar certificação de que a gleba preenche as condições previstas no caput, bem como desenhos

e documentos com as informações necessárias para a efetivação do registro do parcelamento. 

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envolvem situação física de imóvel a melhor é a verificação através da inspeção ou diligência. As questões se resolvem mais rápidamente e com eficiência. Assim, poderá o oficial diligente fazer a verificação pessoalmente. Esta faculdade está prevista no § 12º. Estando tudo análisado e não havendo nenhuma dúvida quanto à identificação do imóvel, o registrador poderá promover o registro requerido com a nova descrição, encerrando desta forma a retificação.

6.6.7. Responsabilidade civil e penal solidária: Sendo os fatos apresentados para a retificação não verdadeiros, o requerente e o responsável técnico respondem civil e penalmente pelo ato e pelos prejuízos causados. Esta previsão está contida no § 14º.

6.7.8. Isenção de custas: Sempre que o promotor da regularização fundiária de interesse social for o agente público, este estará isento de custas no registro e nos atos notariais necessários.

6.8. Dos títulos admitidos para registro: O artigo 221 da lei dos registros públios enumera os títulos que são admitidos para registro. De todos normalmente admitidos, cabe resaltar a previsão feita no inciso  V86 quanto aos contratos ou termos administrativos. Todo o processo de regularização fundiária que pode ser promovido por qualquer ente da federação gera como documento final ao beneficiário o termo administrativo de concessão ou então o contrato, seja a que título for. Estes documentos são revestidos de fé pública, sendo por isso dispensado o reconhecimento de firma. Os demais títulos admitidos para registro são as escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados, escritos particulares contratos autorizados por lei e também os contratos do SFH e SFI, atos autênticos de países estrangeiros, devidamente legalizados no país e os documentos oriundos do poder judiciário.

6.9. Termos e contratos oriundos da reforma urbana firmados por analfabeto: Dispensado o documento público para a verificação da vontade emanda pelo analfabeto. Pode o poder público apanhar a impressão dactiloscópica − o dedão, no popular − desde que o documento público seja firmado por duas testemunhas. Esta previsão está contida no § 1º87 do mesmo artigo 221.

86. Art. 221. Da Lei 6.015/73. V - contratos ou termos administrativos, assinados com a União, Estados, Municípios ou o Distrito Federal, no âmbito de programas de regularização fundiária e de programas habitacionais de interesse social, dispensado o reconhecimento de firma. (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)

87. Art. 221 da Lei 6.015/73. § 1o Serão registrados os contratos e termos mencionados no inciso V do caput assinados a rogo com a impressão dactiloscópica do beneficiário, quando este for analfabeto ou não puder assinar, acompanhados da assinatura de 2 (duas) testemunhas. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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6.10. Qualificação dos beneficiários: Nos contratos e termos administrativos, a qualificação dos beneficiários poderão constar apenas o nome e o número do documento oficial. Este requisito para fins de registro é insuficiente frente ao disposto no art. 176, incisos II e III88 da Lei 6.015/73. Para tanto, o § 2º do artigo (221) comentado autoriza na hora do registro, mediante requerimento do interessado, fazer a inclusão dos elementos necessários para a qualificação da parte frente ao registro público, sem a necessidade de modificar o título, contrato ou termo.

6.11. O registro da regularização fundiária urbana: As alterações feitas na lei dos registros públicos pela lei 12.424/11 foram de tal forma substanciais que modificaram sobremaneira a lei dos registros públicos, incluindo nela o Capítulo XII, intitulado de Registro da Regularização Fundiária Urbana. O óbice do processo de regularização fundiária foi sempre jurídico, mais voltado para a regularização jurídica. Na questão envolvendo a regularização urbanística, alguns conceitos tiveram que ser digeridos, mas nada que não seja resolvido em curto espaço de tempo, principalmente o conceito que envolve as ZEIS.

Lembro que, em 2003, falava a engenheiros e arquitetos sobre o que a ZEIS poderia fazer dentro do planejamento urbano e o que era a urbanização específica. Alguns deles levaram mais de seis meses para entender o conceito, levando sempre em conta que as disposições urbanísticas constantes do plano diretor eram rígidas e inflexíveis, mesmo diante de uma situação anormal, que é o processo de regularização. É sem dúvida a melhor solução, já que, guetos urbanos são formados e podem refletir discriminações com a população ocupante deste espaço. Mas, dentro da regularização jurídica, o registro imobiliário sempre exerceu papel fundamental para executar a reforma urbana.

A rigidez da legislação inibia o registrador. E, como o registro do

88. Lei 6.015/73. Art. 176 - O Livro nº 2 - Registro Geral - será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3. (Renumerado do art. 173 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975). Parágrafo único - A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas: I -... II - são requisitos da matrícula: ...4) o nome, domicílio e nacionalidade do proprietário, bem como: a) tratando-se de pessoa física, o estado civil, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda ou do Registro Geral da cédula de identidade, ou à falta deste, sua filiação; b) tratando-se de pessoa jurídica, a sede social e o número de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda; III - são requisitos do registro no Livro nº 2: ...2) nome, domicílio e nacionalidade do transmitente, ou do devedor, e do adquirente, ou credor, bem como: a) tratando-se de pessoa física, o estado civil, a profissão e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda ou do Registro Geral da cédula de identidade, ou, à falta deste, sua filiação; b) tratando-se de pessoa jurídica, a sede social e o número de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda;

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parcelamento do solo foi tipificado pela Lei 6.766/79, aí o registrador termina indo além do que é razoável com receio de punição. Mas as alterações que passaremos a analisar são bem-vindas e terminam por destravar o processo de regularização de forma definitiva.

6.11.1. O Registro da regularização fundiária urbana: O legislador não se ocupou de delongas e, no art. 288-A89, já disse que o registro da regularização fundiária deve ser requerido diretamente ao oficial e independe de manifestação judicial. No Rio Grande do Sul, temos o provimento More Legal, que é o registro da regularização fundiária urbana, que depende sempre da manifestação judicial. Desta forma, o legislador, no artigo mencionado, autoriza o registrador a proceder ao registro independentemente de manifestação judicial que ocorreria somente no caso de dúvida suscitada. Todos os atos de registro previsto no art. 288-A, até o § 3º, dizem respeito a atos de registro em que o projeto de regularização fundiária previsto no art. 51 da lei 11.977/09 é obrigatório. Veremos, a partir da análise do § 4º, as hipóteses em que a regularização fundiária de interesse social não exige o projeto urbanístico, o que, convenhamos, é um passo efetivo na velocidade da regularização jurídica urbana.

6.11.1.1. Atos registrais praticados com o registro: A área total objeto da regularização deve ter a sua matrícula aberta, se não houver. A área total matriculada ou cadastrada é necessária para obter-se o alcançe efetivo do parcelamento. Diríamos que é um caso de especialização da matrícula.

A previsão de abertura de matrícula está prevista no inciso I90 do art. 288-A. Porém, esta matrícula pode ser aberta precedida do auto de demarcação, como veremos adiante, ou então, conforme previsão do art. 213, § 11º, I, nos casos de regularidação fundiária de interesse social realizadas em ZEIS, quando os lotes estiverem cadastrados individualmente ou com lançamento fiscal há mais de dez anos, em processo de regularização promovido pelo município ou pelo Distrito Federal.

Afora isso, o registro da regularização fundiária de interesse social deve ser precedido da matrícula, feita através de retificação de área ou do auto de demarcação. Aberta a matrícula, o próximo ato registral é o registro do parcelamento decorrente do projeto de regularização, com a descrição do

89. Art. 288-A. O registro da regularização fundiária urbana de que trata a Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, deverá ser requerido diretamente ao oficial do registro de imóveis e será efetivado independentemente de manifestação judicial, importando: (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

90. I - na abertura de matrícula para a área objeto de regularização, se não houver; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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plano urbanístico constante do memorial do projeto.

Imagine o plano de loteamento que é feito para o registro de um loteamento, os mesmos requisitos deverão constar no projeto de regularização fundiária. Nome do empreendimento, áreas públicas, quadras, áreas dos lotes todos com a sua respectiva descrição; esta previsão está contida no inciso II91 do mesmo artigo. Já o inciso III92 dá o comando ao registrador, que deve abrir matríccula individual para cada unidade gerada pelo projeto de regularização fundiária em razão do parcelamento do solo.

6.11.1.2. Quem pode requerer o registro? Segundo o § 1º93 do art. 288-A, todos os legitimados pelo art. 5094 da lei 11.977/09, independentemente de serem ou não proprietários da gleba. Esta hipótese da propriedade da gleba diz respeito à utilização do auto de demarcação para delimitação da área objeto da regularização. Porém, entre os autorizados não está o proprietário dominial da gleba. Assim, não serve o projeto de regularização fundiária para beneficiar um infrator, digamos, loteador irregular. Este deve obedecer literalmente às disposições da lei 6.766/79, pois não se pode parcelar com a finalidade das relativas benesses da regularização. Provomer a irregularidade para depois regularizar é um procedimento que não diz respeito à ética e ao bom senso. Digamos que esta é a única crítica que pode ser feita ao provimento e programa da Corregedoria Geral da Justiça do Rio Grande do Sul, intitulado MORE LEGAL. Neste, o infrator poderia requerer a regularização da irregularidade. Muitas vezes porque existe um link do proprietário dominial com o restante do parcelamento. Aliás, as modalidades criadas pela lei 11.977/09, auto de demarcação e legitimação da posse, não retiram a propriedade do proprietário dominial. Assim como a regularização de loteamento irregular, prevista no art. 40 da lei 6.766/79, não retira do proprietário dominial a sua propriedade. Apenas regulariza urbanisticamente a área, possibilitando aos ocupantes que façam a sua regularização de forma organizada e ordenada. É um bem para o registro e para o desenvolvimento urbano em si próprio.

91. II - no registro do parcelamento decorrente do projeto de regularização fundiária; e (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)92. III - na abertura de matrícula para cada uma das parcelas resultantes do parcelamento decorrente do projeto de regularização

fundiária. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)93. § 1o O registro da regularização fundiária poderá ser requerido pelos legitimados previstos no art. 50 da Lei no 11.977, de

7 de julho de 2009, independentemente de serem proprietários ou detentores de direitos reais da gleba objeto de regularização. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011).

94. Lei 11.977/09. Art. 50. A regularização fundiária poderá ser promovida pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios e também por:

I seus beneficiários, individual ou coletivamente; e II cooperativas habitacionais, associações de moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil

de interesse público ou outras associações civis que tenham por finalidade atividades nas áreas de desenvolvimento urbano ou regularização fundiária.

Parágrafo único. Os legitimados previstos no caput poderão promover todos os atos necessários à regularização fundiária, inclusive os atos de registro

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6.11.1.3. Abertura de matrículas de áreas públicas: Diversamente do que acontece no registro de um parcelamento comum, a lei autoriza desde logo a abertura de matrículas das áreas públicas. Esta previsão está contida no § 2º� do art. 288-A. Com relação a estas áreas públicas, às vezes me pergunto: Como pode um órgão estatal exigir dos municípios e dos registros a abertura de matrícula de ruas? Ruas são interseccionadas, não é possível fazer-se uma descrição completa de uma rua a não ser que, lá pelas tantas, na descrição da matrícula, quando há a intersecção, se faça o comentário desta intersecção continuando a descrição posteriormente, juntando-se os pedaços para exprimir, por exemplo, a área total. Esses imóveis públicos, segundo ensinava Helly Lopes Meirelles, não tem que ter registro nem matrícula. A sua destinação é o bastante para dar o carácter de público. Além disso, de todos os imóveis públicos que podem ter matrícula, sempre deve haver a anotação de sua destinação, que vem a ser a afetação. Os imóveis públicos, como já vimos, por sua própria característica devem estar destinados a uma utilização. Para alterar esta destinação, é necessária lei municipal aprovada pela Câmara de Vereadores, bem como a compensação, sendo área de uso comum do povo, ou a justificativa efetiva da sua desnecessidade.

6.11.1.4. Cancelamento total ou parcial do registro de regularização fundiária: O registro da regularização fundiária poderá ser feito de forma total ou parcial, observando as hipóteses previstas no art. 250 e seus incisos95 da lei dos registros públicos. A previsão do cancelamento total ou parcial está prevista no § 3º96 do artigo (288-A) analisado, bem como no art. 24997 da Lei dos Registros.

6.12. Hipóteses em que o projeto de regularização fundiária é dispensado: Veremos que diversos atos de regularização fundiária podem ser praticados sem a necessidade de apresentação ao registro de imóveis do projeto de regularização fundiária aprovado pelo município.

6.12.1. Usucapião especial, individual e coletiva: As sentenças de 95. Lei 6.015/73. Art. 250 - Far-se-á o cancelamento: (incluído pela Lei nº 6.216, de 1975)

I - em cumprimento de decisão judicial transitada em julgado; II - a requerimento unânime das partes que tenham participado do ato registrado, se capazes, com as firmas reconhecidas por tabelião; III - A requerimento do interessado, instruído com documento hábil.IV - a requerimento da Fazenda Pública, instruído com certidão de conclusão de processo administrativo que declarou, na forma da lei, a rescisão do título de domínio ou de concessão de direito real de uso de imóvel rural, expedido para fins de regularização fundiária, e a reversão do imóvel ao patrimônio público. (Incluído pela Lei nº 11.952, de 2009)

96. § 3º. O registro do parcelamento decorrente de projeto de regularização fundiária poderá ser cancelado, parcialmente ou em sua totalidade, observado o disposto no art. 250. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

97. Art. 249 - O cancelamento poderá ser total ou parcial e referir-se a qualquer dos atos do registro. (Renumerado do art. 250 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975)

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usucapião, bem como as declaratórias de domínio, não exigem a aprovação do projeto urbanístico. Normalmente, estes processos de usucapião ou declaratórias de domínio são ações individuais, promovidas pelo interessado, em que há a delimitação da área, a intimação dos confrontantes, bem como dos entes públicos até a prova do tempo necessário para a aquisição de domínio. As exigências para a usucapião especial estão contidas na Constituição Federal no art. 18398. Este artigo constitucional foi regulamentado pelo Estatuto da Cidade, nos seus artigos 99. A usucapião coletiva, por sua vez, é uma novidade que está prevista na Lei 10.257/01, o Estatuto da Cidade. Porém, esta modalidade de usucapião para fins de reforma urbana tem os seus requisitos dispostos no art. 9º até o art.14. A usucapião coletiva está prevista no art. 10.

O requesito essencial para este tipo de ação é que não haja a possibilidade de identificar-se a área ocupada pelos beneficiários, sendo atribuídas a eles frações ideais iguais e não superiores a 250 m2. Pela diversidade de autores, muitas vezes, colegas advogados propõem a usucapião coletiva sem saber que o requisito básico é a impossibilidade de identificação que cada

98. Constituição Federal. Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

99. Lei 10257/01- Estatuto da Cidade. Art. 9o Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.§ 1o O título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.§ 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.§ 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão.

Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

§ 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis.

§ 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas.

§ 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio.

§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os demais, discordantes ou ausentes.

Art. 11. Na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarão sobrestadas quaisquer outras ações, petitórias ou possessórias, que venham a ser propostas relativamente ao imóvel usucapiendo.

Art. 12. São partes legítimas para a propositura da ação de usucapião especial urbana:I � o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;II – os possuidores, em estado de composse;III � como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, regularmente constituída, com personalidade

jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados.§ 1o Na ação de usucapião especial urbana é obrigatória a intervenção do Ministério Público.§ 2o O autor terá os benefícios da justiça e da assistência judiciária gratuita, inclusive perante o cartório de registro de imóveis.Art. 13. A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada como matéria de defesa, valendo a sentença que a

reconhecer como título para registro no cartório de registro de imóveis.Art. 14. Na ação judicial de usucapião especial de imóvel urbano, o rito processual a ser observado é o sumário.

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possuidor tem do imóvel.

6.12.2. Planta elaborada para outorga administrativa da concessão de uso especial para fins de moradia: Antes do decreto-lei 58/37, era comum os cartórios arquivarem plantas de parcelamentos. Sem qualquer necessidade de aprovação de projeto, ouvida de autoridades adminsitrativas municipais, a plantas serviam ao registro como orientação, já que havia uma dificuldade grande relativa à descrição dos imóveis, o que terminou gerando uma imprecisão muito grande no registro imobiliário.

Agora, com o advento da lei 12.424/11, novamente está retornando a prática do arquivamento da planta, independentemente do projeto urbanístico. Sabemos que para proceder à regularização jurídica é necessário que a área tenha dois dos equipamentos urbanos constantes da infraestrutura básica. Basta ter ruas abertas e luz, já é o suficiente para proceder à regularização jurídica. As áreas públicas ocupadas são a quem se destina a previsão do § 4º, inciso I100. Sempre que a administração pública de qualquer ente da federação for utilizar a outorga administrativa da concessão de uso especial para fins de moradia previsto na MP 2220/01, depositará a planta no registro de imóveis e procederá à emissão dos respectivos títulos. Isso sobremaneira desemperra definitivamente a reforma urbana, restando apenas observar os requisitos para a concessão do referido título.

6.12.3. Parcelamentos anteriores a 19 de dezembro de 1979. O inciso II do mesmo artigo 288-A101 prevê a anistia ou regularização de parcelamentos anteriores à lei 6766/79. O requisito é que esteja integrado à cidade, conforme prevê o art. 71102 da lei 11.977/09. Os requisitos legais são mínimos: que o parcelamento esteja integrado à cidade. As condições de registro também são mínimas, o suficiente para que possa se aperfeiçoar o registro identificando as áreas oriundas do parcelamento. Estas previsões

100 Art. 288-A. Lei 56.015/73. § 4º Independe da aprovação de projeto de regularização fundiária o registro: (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

I - da sentença de usucapião, da sentença declaratória ou da planta, elaborada para outorga administrativa, de concessão de uso especial para fins de moradia; e (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

101 Art. 288-A. II - do parcelamento de glebas para fins urbanos anterior a 19 de dezembro de 1979 que não possuir registro, desde que o

parcelamento esteja implantado e integrado à cidade, nos termos do art. 71 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

102 Lei 11.977/09. Art. 71. As glebas parceladas para fins urbanos anteriormente a 19 de dezembro de 1979 que não possuírem registro poderão ter sua situação jurídica regularizada, com o registro do parcelamento, desde que o parcelamento esteja implantado e integrado à cidade.

§ 1o A regularização prevista no caput pode envolver a totalidade ou parcelas da gleba. § 2o O interessado deverá apresentar certificação de que a gleba preenche as condições previstas no caput, bem como desenhos

e documentos com as informações necessárias para a efetivação do registro do parcelamento.

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estão contidas no inciso II103 do art. 288-A.

6.12.4. Regularização fundiária implantada por etapas: A implementação por etapas corresponderá aos seguintes procedimentos: o levantamento da área será total, ou seja, a gleba toda; o projeto deverá indicar a área de intervenção e as demais áreas remanescentes. Esta previsão etá contida no art. 288-B104.

6.12.5. Responsabilidade técnica. Sempre que o subscritor do projeto for um profissional liberal vinculado à administração pública, será dispensada a ART. Mas, se o profissional não for funcionário público, deverá instruir o processo a ART expedida pelo CREA. Esta previsão está contida no art. 288-C105 da lei 6.015/71.

6.13. Demarcação urbanística procedimentos registrais: Os procedimentos registrais estão previstos no art. 288-D106. Os registros de imóveis, normalmente, não participam de absolutamente nada. Ou seja, não movem uma palha sequer para participar da qualificação do título. Sempre que falamos em registro de imóveis, não

103 Art. 288-A. II - do parcelamento de glebas para fins urbanos anterior a 19 de dezembro de 1979 que não possuir registro, desde que o parcelamento esteja implantado e integrado à cidade, nos termos do art. 71 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

104 Lei 6.015/73. Art. 288-B. Na hipótese da regularização fundiária implementada por etapas, o registro será feito com base em planta e memorial descritivo referentes à totalidade da área objeto de regularização, que especifiquem as porções ainda não regularizadas. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

105 Lei 6.015/73. Art. 288-C. A planta e o memorial descritivo exigidos para o registro da regularização fundiária a cargo da administração pública deverão ser assinados por profissional legalmente habilitado, dispensada a apresentação de anotação de responsabilidade técnica no competente Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA, quando o responsável técnico for servidor ou empregado público. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

106 Lei 6.015/73. Art. 288-D. A averbação da demarcação urbanística para fins de regularização fundiária de interesse social observará o disposto nos arts. 56 e 57 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, e será feita mediante requerimento do poder público dirigido ao registro de imóveis responsável pela circunscrição imobiliária na qual o imóvel estiver situado. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 1 º Na hipótese de a demarcação urbanística abranger imóveis situados em mais de uma circunscrição imobiliária, o procedimento previsto no art. 57 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, será feito no registro de imóveis que contiver a maior porção da área demarcada. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 2º O requerimento de que trata o caput deverá ser acompanhado do auto de demarcação urbanística, instruído com os documentos relacionados nos incisos I a III do § 1o do art. 56 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 3 º Recepcionado o auto de demarcação urbanística, o oficial deverá proceder às buscas para identificação do proprietário da área a ser regularizada e de matrículas ou transcrições que a tenham por objeto. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 4 º Realizadas as buscas, o oficial do registro de imóveis deverá notificar o proprietário e os confrontantes da área demarcada para apresentar impugnação à averbação da demarcação urbanística, no prazo de 15 (quinze) dias, podendo a notificação ser feita: (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

I - pessoalmente; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)II - por correio, com aviso de recebimento; ou (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)III - por solicitação ao oficial de registro de títulos e documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva

recebê-la. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)§ 5o No caso de o proprietário ou de os confrontantes não serem localizados nos endereços constantes do registro de imóveis

ou naqueles fornecidos pelo poder público, para notificação na forma estabelecida no § 4º, disso o oficial deverá comunicar o poder público responsável pelo procedimento para notificação nos termos dos §§ 2 º e 3 º do art. 57 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 6o Havendo impugnação, o oficial do registro de imóveis deverá notificar o poder público para que se manifeste no prazo de 60 (sessenta) dias. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 7o O oficial de registro de imóveis deverá promover tentativa de acordo entre o impugnante e o poder público. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 8o Havendo impugnação apenas em relação à parcela da área objeto do auto de demarcação urbanística, o procedimento seguirá em relação à parcela não impugnada. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 9o Não havendo acordo, a demarcação urbanística será encerrada em relação à área impugnada. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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estamos generalizando. A generalização não reflete a maioria, mas na verdade a grande maioria. Pois a lei 11.977/09 resolveu incumbir os registradores a uma série de atividades quando se trata do auto de demarcação urbanística. Procede-se, em nível de registro, a duas atividades relativas ao auto de demarcação urbanística. Resulta numa simples averbação ou resulta em abertura de matrícula. O auto de demarcação, como já afirmamos, constitui-se no levantamento da poligonal da área. O que pode acontecer ao definir a poligonal da área com a inclusão de medidas perimétricas, etc.?

Não haver coincidência com o registro lançado no álbum imobiliário, sequer poder identificar a própria área e seus proprietários dominiais. Neste instante, entram em campo as responsabilidades do delegado relativas ao aperfeiçoamento do título auto de demarcação urbanística no intuito de aperfeiçoá-lo. Deverá o delegado da serventia registral lançar mão de seu arquivo através de buscas para identificar o proprietário dominial da área demarcada. Então o poder público oferece ao registro os documentos previstos no art. 56 e 57 da lei 11.977/09, e requer a conclusão e o aperfeiçoamento do registro o registrador. Assim que todos os proprietários foram identificados, ou por indicação do município ou DF ou Estado ou União, o registrador deverá notificá-los, bem como os confrontantes da área para se manifestarem no prazo de quinze dias. A manifestação é diversa com relação ao sujeito a quem é endereçada a notificação. Se ao proprietário dominial, a oposição à posse seria o elemento fudamental de manifestação. A obrigação de promover a transação é do registrador. Se não resultar positivamente esta transação, inclusive com a redução da área objeto do auto de demarcação, os autos deverão ser remetidos a juízo para decisão.

6.13.1. Forma de notificação dos envolvidos: Todas as formas previstas no CPC deverão ser cumpridas: pessoalmente, através do correio com aviso de recebimento ou então através do cartório de títulos e documentos. Cumpridas essas etapas, se não resultar positivamente na identificação dos endereçados, deverá ser procedida a notificação edilícia, com publicação do referido edital em jornais de grande circulação do local, além de ser fixado no cartório, pelo período de quinze dias a partir da publicação.

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6.13.2. Havendo impugnação: Havendo impugnação dos notificados, deverá o oficial do registro promover a conciliação. Não sendo possível, mesmo reduzindo a área objeto da regularização, deverá encerrar o processo de regularização e encaminhar as partes as vias ordinárias, que consistem no contencioso. Para isso, existem prazos fatais para os notificados. O prazo faltal de manifestação é de quinze dias. Passado este prazo, a lei interpreta como concordância a demarcação. A demarcação não subtrai a propriedade, apenas regulariza uma área em que haverá intervação urbanística e jurídica de um legitimado para regularizar um assentamento.

6.13.3. Não havendo impugnação: Se não houver impugnação, ou superada a oposição ao procedimento, a demarcação é registrada nas matrículas alcançadas pelo auto. Pode acontecer de haver matrículas localizadas em mais de uma circunscrição imobiliária. Neste caso, o auto de demarcação será averbado ou resultará em abertura de nova matrícula na circunscrição em que houver maior área da demarcada. (Art. 288-D, § 1º)

6.13.4. Averbação do auto de demarcação: O auto de demarcação deverá ser averbado na matrícula fazendo menção às hipóteses do art. 288-E, incisos I à III107. Esta averbação poderá ser feita após o prazo de impugnação, ou então a partir do momento em que as impugnações forem superadas ou resolvidas administrativamente.

A averbação deverá conter: (a) a área total e o perímetro correspondente ao auto de demarcação: (b) as matrículas alcançadas pelo auto, bem como a área abrangida em cada uma delas: (c) a existência de áreas cuja origem não tenha sido identificada, em razão das imprecisões dos registros anteriores. Nota-se que as exigências das averbações são mínimas, porém suficientes para identificar que houve uma alteração no cadastro do imóvel, que é a matrícula. Entendemos um pouco diferente do que a lei. Entendemos que deveria ser aberta matrícula da área objeto do auto de demarcação com suas origens todas mencionadas. Parece que a lei não diz nada diferente disso, porém o diz de forma confusa. Manda averbar na matrícula a

107. Art. 288-E. Nas hipóteses de curso do prazo sem impugnação ou de superação da oposição ao procedimento, a demarcação urbanística será averbada nas matrículas alcançadas pelo auto, devendo ser informadas: (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

I - a área total e o perímetro correspondente ao auto de demarcação urbanística; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)II - as matrículas alcançadas pelo auto de demarcação urbanística e, quando possível, a área abrangida em cada uma delas; e

(Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)III - a existência de áreas cuja origem não tenha sido identificada em razão de imprecisões dos registros anteriores. (Incluído pela

Lei nº 12.424, de 2011).

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descrição da área, ou seja, parece que está tratando de uma simples retificação ou então de um remanescente.

6.13.5. Abertura de matrícula prévia: Sempre que a demarcação urbanística incidir sobre áreas que não haja a matrícula aberta, o registrador deverá fazer isso antes de averbar o auto de demarcação. Esta abertura poderá ser feita com base em certidões, quando, por exemplo, o imóvel pertencer à outra circunscrição imobiliária. Da mesma forma, os cancelamentos de matrículas e a comunicação ex officio entre os cartórios são determinados também pelo § 3º do mesmo artigo. Estas previsões estão contidas no Art. 288-E, §’s 1 a 3108.

6.13.6. Diferença a menor entre a área matriculada e a área do auto de demarcação. Procedimentos. O § 4º do artigo 288-E determina que, mesmo sendo maior a área do auto de demarcação, assim mesmo o registrador deverá proceder a sua averbação, não se aplicando o caso do § 2º do art. 225109. O princípio da continuidade é preservado pela hipótese prevista no parágrafo segundo do artigo 225, já que, não havendo coincidência entre as descrições, o título é considerado irregular. A alteração ora comentada, imposta à lei dos registros públicos pela lei 12.424/11, que modificou a lei 11.977/09, anistiou nestas hipóteses de auto de demarcação até princípios registrais. Ou seja, seria muito fácil o registrador colocar um único artigo. Artigo único: nada é empecilho para a regularização fundiária urbana. O próximo comentário confirma o que afirmamos aqui.

6.13.7. Retificação de matrícula e remanescente: A averbação do auto de demarcação é feita com vistas ao memorial descritivo e ao levantamento topográfico apresentado. Se no registro anterior houver imperfeições, não pode o registrador requerer a sua retificação,

108. Art. 288-E. § 1º Na hipótese de o auto de demarcação urbanística incidir sobre imóveis ainda não matriculados, previamente à averbação, será aberta matrícula nos termos do art. 228, devendo esta refletir a situação registrada do imóvel, dispensadas a retificação do memorial descritivo e a apuração de área remanescente. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 2o Nos casos de registro anterior efetuado em outra circunscrição, para abertura da matrícula de que trata o § 1º, o oficial requererá, de ofício, certidões atualizadas daquele registro. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 3o Na hipótese de que trata o § 1º do art. 288-D, o oficial do registro de imóveis responsável pelo procedimento comunicará as demais circunscrições imobiliárias envolvidas para averbação da demarcação urbanística nas respectivas matrículas. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

109. Art. 225 - Os tabeliães, escrivães e juízes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário. (Renumerado do art. 228 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

§ 1º As mesmas minúcias, com relação à caracterização do imóvel, devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para registro.

§ 2º Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a caracterização do imóvel não coincida com a que consta do registro anterior.

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deve averbar o auto de demarcação. Da mesma forma, caso haja área remanescente, competirá ao proprietário dominial providenciar a abertura da matrícula de tal área, já que o proprietário do imóvel atingido terá o interesse para efetivar o aproveitamento da chamada “sobra de área”. Esta previsão está contida no § 5º110 do mesmo art. 288-E.

As disposições legais encerram aqui as previsões referentes ao auto de demarcação, uma inovasão no sistema registral nacional que retirou de maneira definitiva a burrocracia do sistema registral quando o assunto for REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA. Se o legislador não tomasse estas providências, o nosso processo de regularização ainda estaria andando a passos curtos.

6.14. O registro do projeto de regularização fundiária de interesse social. O art. 288-F111 e seus parágrafos indicam a forma como deve ser lançado o registro do projeto de regularização fundiária de interesse social. Para que haja o registro, é necessário que a área esteja matriculada. Porém, quando tratar-se de auto de demarcação o registro será feito em todas as matrículas em que houver a averbação do auto de demarcação, previsão do art. 288-G112.

A lei sugere que, em cada matrícula, se diga o quanto ela foi atingida pelo projeto. Outra inovação deste registro é que o registrador deverá destinar matrículas individuais de cada lote gerado pelo projeto de regularização fundiária. Os documentos exigidos são apenas os previstos no art. 65, incisos I à IV da lei 11.977/09.

6.14.1. Dispensa das exigências da Lei 6.766/79 quanto ao parcelamento do solo. A lei 6.766/79 sempre foi muito exigente. Por isso, a lei 11.977/09 determinou que as exigências da lei 6.766/79 fossem afastadas para o registro do projeto de regularização fundiária.

110. Art.. 288-E. § 5 º Não se exigirá, para a averbação da demarcação urbanística, a retificação do memorial descritivo da área não abrangida pelo auto, ficando a apuração de remanescente sob a responsabilidade do proprietário do imóvel atingido. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

111. Art. 288-F. O parcelamento decorrente de projeto de regularização fundiária de interesse social deverá ser registrado na matrícula correspondente. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 1o O registro do parcelamento implicará a imediata abertura de matrícula para cada parcela, inclusive daquelas referentes a áreas destinadas ao uso público, nos termos do § 2º do art. 288-A. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 2o Os documentos exigíveis para o registro do parcelamento, conforme o caso, são aqueles relacionados nos incisos I a IV do art. 65 da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 3o O registro do parcelamento independe do atendimento aos requisitos constantes da Lei n º 6.766, de 19 de dezembro de 1979. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011).

112. Art. 288-G. Na hipótese de procedimento de demarcação urbanística, o registro do parcelamento decorrente de projeto de regularização fundiária de interesse social será feito em todas as matrículas nas quais o auto de demarcação urbanística estiver averbado, devendo ser informadas, quando possível, as parcelas correspondentes a cada matrícula. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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O que, sem isso, tornaria impossível fazer-se o registro do projeto.

6.14.2. Área do auto de demarcação maior do que a titulada: Quando a administração pública utilizar a demarcação urbanística, o registro do projeto de regularização fundiária será registrado mesmo a área dominial sendo menor do que a área do auto de demarcação. Será considerado sempre o auto de demarcação, independentemente de retificação de matrícula.

Igual procedimento quanto à averbação do auto de demarcação deverá ser adotado, servindo os documentos gerados no processo de regularização fundiária como fundamento de averbação ou registro do projeto urbanístico. Previsão legal contida no Art. 288-G, § 1º�.

6.14.3. Proprietário dominial não identificado: É possível não ter a identificação do proprietário dominial ou então as matrículas ou os registros anteriores ao auto de demarcação. Nesta hipótese, o registrador deverá declarar “proprietário não identificado”. Esta previsão está no art. 288-G, § 2º, inciso II113.

6.14.4. Falta de identificação do registro anterior: Nesta hipótese, o registrador deverá lançar como registro anterior todas as matrículas mencionadas no auto de demarcação. Isso se não for possível identificar exatamente a matrícula de origem. Muitas vezes, haverá sobreposição de registros, mas é necessário não frustar a regularização fundiária em nenhum nível. Esta previsão está contida no Art. 288-G, § 2º, inciso I e II114.

6.14.5. Abertura de matrículas de áreas públicas: O § 3º do art. 288-G prevê que na abertura de áreas destinadas a uso público o procedimento é o mesmo previsto no § 2 do mesmo art. 288-G.

113. Art. 288-G. ...§ 2o Nas matrículas abertas para cada parcela deverão constar, nos campos referentes ao registro anterior e ao proprietário:

(Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)....II - quando não for possível identificar a exata origem da parcela matriculada, todas as matrículas anteriores atingidas pelo auto e

a expressão �proprietário não identificado�, dispensando-se neste caso os requisitos dos itens 4 e 5 do inciso II do art. 167. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011).

114. Art. 288-G. ...§ 2º... I - quando for possível identificar a exata origem da parcela matriculada, por meio de planta de sobreposição do parcelamento

com os registros existentes, a matrícula anterior e o nome de seu proprietário; (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011).II - quando não for possível identificar a exata origem da parcela matriculada, todas as matrículas anteriores atingidas pelo auto e

a expressão �proprietário não identificado�, dispensando-se neste caso os requisitos dos itens 4 e 5 do inciso II do art. 167. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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6.14.6. Registro da legitimação de posse e conversão em propriedade: Será feito na matrícula da parcela correspondente oriunda dos procedimentos relativos à falta de identificação do proprietário e na exata localização dos registros anteriores conforme as previsões do § 2º do mesmo artigo.

A lei tratou de orientar de forma cabal os registradores quanto aos procedimentos a serem adotados nesta excepcionalidade, que é o auto de demarcação e o registro do projeto de regularização fundiária. Temos que ter presente que nem sempre o auto de demarcação será utilizado. A sua utilização está vinculada à real necessidade de identificação das medidas perimetrais da área que sofrerá a intervenção. Se as áreas de intervenção já estiverem identificadas não há por que utilizar o auto de demarcação. O que o legislador quis foi tratar de identificar plenamente a intervenção, não deixando dúvida de sua demarcação.

07. regularIzação FundIárIa

de ImóVeIs da unIão

7.1. Introdução: Os imóveis públicos, conforme previsão constitucional do § 3º da Constituição Federal de 1988, são imprescritíveis, ou seja, não estão sujeitos à prescrição aquisitiva que determina a usucapião, uma das formas de adquirir-se a propriedade. Por isso, os imóveis pertencentes à União receberão tratamento especial com a lei 9.636, de 15 de maio de 1998, seus decretos e demais leis que alteraram de alguma forma a relação da União com a regularização fundiária. A União é uma grande imobiliária. Sabemos da intransigência da União com relação a seus imóveis e as formas como os adminstra, ou através do Serviço de Patrimônio da União, ou de forma direta. Vamos analisar os pontos fundamentais desta legislação

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para termos uma ideia de como a União preparou sua reforma urbana.

7.2. Autorização de convênios e licitações: A União não fará a regularização fundiária de forma direta nem pelo Serviço de Patrimônio da União. A reforma urbana de imóveis pertencentes à União será objeto de convênios com os estados e municípios com a finalidade de proceder à regularização destas áreas. A lei autoriza também a participação da iniciativa privada nestes procedimentos, porém através do certame de licitações115. A solicitação do convênio é feita através do Ministério da Fazenda116, ao qual cabe assumir a execução do projeto de regularização. As contrapartidas estão também discriminadas na lei117 e se constituem em duas: I - arrecadação anual das taxas de ocupação e foros, propiciadas pelos trabalhos que tenham executado; e II - venda do domínio útil ou pleno dos lotes resultantes dos projetos urbanísticos por eles executados.

Com relação à iniciativa privada a lei prevê a sua participação nas receitas da seguinte forma: Se no processo licitatório for incluída a cobrança de taxas, poderá haver a compensação das receitas com os

115. Art. 1º É o Poder Executivo autorizado, por intermédio da Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a executar ações de identificação, demarcação, cadastramento, registro e fiscalização dos bens imóveis da União, bem como a regularização das ocupações nesses imóveis, inclusive de assentamentos informais de baixa renda, podendo, para tanto, firmar convênios com os Estados, Distrito Federal e Municípios em cujos territórios se localizem e, observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, celebrar contratos com a iniciativa privada. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007).

116. Art. 4º Os Estados, Municípios e a iniciativa privada, a juízo e a critério do Ministério da Fazenda, observadas as instruções que expedir sobre a matéria, poderão ser habilitados, mediante convênios ou contratos a serem celebrados com a SPU, para executar a identificação, demarcação, cadastramento e fiscalização de áreas do patrimônio da União, assim como o planejamento e a execução do parcelamento e da urbanização de áreas vagas, com base em projetos elaborados na forma da legislação pertinente.

117. Art. 4º § 2º Como retribuição pelas obrigações assumidas, os Estados, Municípios e a iniciativa privada farão jus a parte das receitas provenientes da: Decreto nº 3.725, de 10.1.2001

I - arrecadação anual das taxas de ocupação e foros, propiciadas pelos trabalhos que tenham executado;II - venda do domínio útil ou pleno dos lotes resultantes dos projetos urbanísticos por eles executados.§ 3º A participação nas receitas de que trata o parágrafo anterior será ajustada nos respectivos convênios ou contratos,

observados os limites previstos em regulamento e as instruções a serem baixadas pelo Ministro de Estado da Fazenda, que considerarão a complexidade, o volume e o custo dos trabalhos de identificação, demarcação, cadastramento, recadastramento e fiscalização das áreas vagas existentes, bem como de elaboração e execução dos projetos de parcelamento e urbanização e, ainda, o valor de mercado dos imóveis na região e, quando for o caso, a densidade de ocupação local.

§ 4º A participação dos Estados e Municípios nas receitas de que tratam os incisos I e II poderá ser realizada mediante repasse de recursos financeiros.

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serviços executados de identificação, demarcação e fiscalização das áreas118. Todo o resultado auferido com a identificação, demarcação ou mesmo com o parcelamento do solo destas áreas feitos pelos conveniados deverão ser homologados pelo SPU para ter eficácia jurídica119.

7.3. Objetivo inicial da lei: Pela extensão nacional, o SPU seria o maior cartório existente no país e, automaticamente, o mais difícil de ser controlado, porque diversos imóveis de propriedade da União não estão catalogados entre os imóveis do cadastro do SPU.

Assim, de uma forma original, a lei 9.636/98 recomenda que sejam feitas as seguintes ações: identificação, demarcação, cadastramento, registro e fiscalização dos bens imóveis da União, bem como a regularização das ocupações nesses imóveis, inclusive de assentamentos informais de baixa renda. Como se nota, somente através de convênios é que seria possível executarem-se estas tarefas, que se resumem num inventário do estoque, ou das coisas que pensa que tem e não tem certeza alguma de sua existência.

Com excessão de Brasilia, onde proliferam os chamados condomínios da União, em que há um controle, ao menos com relação a impedir sua regularização, nos demais estados e municipios da Federação este controle não existe. Raros os imóveis são catalogados, a não ser por declaração. Ou seja, o serviço atua por declaração quando o domínio útil é vendido.

7.4. Identificação de áreas da União e áreas comuns do povo, praias, etc.: Compete ao SPU, em livro próprio, lavrar o termo competente de identificação e demarcação das áreas da União. Este termo tem força de escritura pública120. O termo administrativo de demarcação e identificação da área será levado ao registro de imóveis competente para a abertura de matrícula, acompanhado de planta e memorial descritivo121.

118. Art. 4º. ... § 5º Na contratação, por intermédio da iniciativa privada, da elaboração e execução dos projetos urbanísticos de que trata este artigo, observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, quando os serviços contratados envolverem, também, a cobrança e o recebimento das receitas deles decorrentes, poderá ser admitida a dedução prévia, pela contratada, da participação acordada.

119. Art. 5º A demarcação de terras, o cadastramento e os loteamentos, realizados com base no disposto no art. 4º, somente terão validade depois de homologados pela SPU.

120. Art. 2º Concluído, na forma da legislação vigente, o processo de identificação e demarcação das terras de domínio da União, a SPU lavrará, em livro próprio, com força de escritura pública, o termo competente, incorporando a área ao patrimônio da União.

121. Art. 2º Parágrafo único. O termo a que se refere este artigo, mediante certidão de inteiro teor, acompanhado de plantas e outros

documentos técnicos que permitam a correta caracterização do imóvel, será registrado no Cartório de Registro de Imóveis competente.

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Necessário também grifar que há, de parte da legislação, uma preocupação em garantir as intervenções de imóveis da União através de convênio preservação das seguintes áreas122: livre acesso às praias marítimas, fluviais e lacustres e a outras áreas de uso comum do povo. Pode, porém, a União ou ao SPU e demais entes legitimados neste processo, conceder o termo de permissão de uso destes imóveis, mas jamais bloquear o acesso à praia, seja do tipo que for, desde marítima até a lacustre.

Os novos ricos, ou simplesmente os ricos, têm o hábito de “comprar” ilhas marítimas ou mesmo pluviais. Esta compra é uma concessão de direito de uso ou então um termo de permissão de uso concedido pelo ente público detentor do patrimônio, uma vez que as enfiteuses, ou aforamentos, desde 2002 deixaram de existir no nosso ordenamento civil. Assim, a forma de titulação na esfera administrativa é através destes dois títulos.

7.5. Órgãos que representam a União junto ao registro de imóveis: A lei enumera os órgãos da administração pública direta que têm legitimidade para requerer junto ao registro imobiliário. Inicia com o Serviço de Patrimônio da União, mais a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e ainda inclui a Caixa Econômica Federal, em razão de sua universalidade nacional123, como legitimada para participar deste processo de identificação de áreas.

7.6. Requisitos legais de identificação das áreas da União: A legislação trouxe também os requisitos mínimos deste registro, desta identificação e demarcação das áreas da União. Os requisitos mínimos são: a localização e a área; a respectiva matrícula no registro de imóveis da circunscrição imobiliária à qual os imóveis pertencerem; o tipo de uso, ou seja, a finalidade que está tendo, a indicação da pessoa física ou jurídica à qual, por qualquer instrumento, o imóvel tenha sido destinado, e o valor atualizado, sempre que disponível. Estas informações todas devem estar disponibilizadas na internet124,

122. Art. 4º § 1o Na elaboração e execução dos projetos de que trata este artigo, serão sempre respeitados a preservação e o livre acesso às

praias marítimas, fluviais e lacustres e a outras áreas de uso comum do povo.123. Art. 3º A regularização dos imóveis de que trata esta Lei, junto aos órgãos municipais e aos Cartórios de Registro de Imóveis,

será promovida pela SPU e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN, com o concurso, sempre que necessário, da Caixa Econômica Federal - CEF.

124. Art. 3º -A Caberá ao Poder Executivo organizar e manter sistema unificado de informações sobre os bens de que trata esta Lei, que conterá, além de outras informações relativas a cada imóvel: (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)I - a localização e a área; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

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tornando transparentes e públicas as informações sobre os imóveis da União.

7.7. Cadastramento das terras da União, individual ou coletivo: Será possível proceder-se no cadastramento de imóveis da União na forma individual ou coletiva. Na forma coletiva, ocorrerá o cadastramento sempre que os imóveis estiverem sendo possuídos por população carente ou de baixa renda para moradia e não for possível individualizar a posse, quando então se fará o cadastramento da ocupação, e os ocupantes receberão em proporcionalidade suas parte ideais125. É o mesmo procedimento da usucapião coletiva do Estatuto da Cidade, que veremos na titulação, próximo capítulo.Também na hipótese e ocupação aqui mencionadas, nos casos de baixa renda ou população carente, a União poderá isentar os beneficiários de qualquer taxa de ocupação, conforme preceitua a própria lei quando tratar dos títulos concedidos126.

7.8. Inscrição das áreas de União: Para a inscrição das áreas de União, que é feita no SPU, o legislador deixou claro que o imóvel deve ter um efetivo aproveitamento. Sem o efetivo aproveitamento não é possível fazer a inscrição127. Quando as ocupações estiverem em zona especial de interesse social, de acordo com o seu plano diretor ou lei do zoneamento, será dispensada para inscrição da comprovação do efetivo aproveitamento.

Entendemos que esta comprovação deve ser feita através de fotos e audiência pública com a comunidade envolvida128. Excepcionam-se as áreas pertencentes à União que estejam em faixa de fronteira, ou II - a respectiva matrícula no registro de imóveis competente; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)III - o tipo de uso; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)IV - a indicação da pessoa física ou jurídica à qual, por qualquer instrumento, o imóvel tenha sido destinado; e (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) V - o valor atualizado, se disponível. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)Parágrafo único. As informações do sistema de que trata o caput deste artigo deverão ser disponibilizadas na internet, sem prejuízo de outras formas de divulgação. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

125. Art. 6º Para fins do disposto no art. 1º desta Lei, as terras da União deverão ser cadastradas, nos termos do regulamento. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)§ 1º Nas áreas urbanas, em imóveis possuídos por população carente ou de baixa renda para sua moradia, onde não for possível individualizar as posses, poderá ser feita a demarcação da área a ser regularizada, cadastrando-se o assentamento, para posterior outorga de título de forma individual ou coletiva. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

126 Art. 6º -A No caso de cadastramento de ocupações para fins de moradia cujo ocupante seja considerado carente ou de baixa renda, na forma do § 2º do art. 1º do Decreto-Lei no 1.876, de 15 de julho de 1981, a União poderá proceder à regularização fundiária da área, utilizando, entre outros, os instrumentos previstos no art. 18, no inciso VI do art. 19 e nos arts. 22-A e 31 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

127 § 1º É vedada a inscrição de ocupação sem a comprovação do efetivo aproveitamento de que trata o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

128 § 2º A comprovação do efetivo aproveitamento será dispensada nos casos de assentamentos informais definidos pelo Município como área ou zona especial de interesse social, nos termos do seu plano diretor ou outro instrumento legal que garanta a função social da área, exceto na faixa de fronteira ou quando se tratar de imóveis que estejam sob a administração do Ministério da Defesa e dos Comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

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seja, a 150 km da divisa de qualquer país da América do Sul, ou que estejam sob a adminsitraçao do Ministério da Defesa e dos comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. A partir de então, é que a inscrição será concedida, na forma precária e de acordo com o mérito do ato administrativo. Também em razão da sua natureza jurídica, é resolúvel o título.

A consequência da inscrição, que é o fato gerador, é a obrigação do pagamento anual da taxa de ocupação129. A resposabilidade do pagamento das taxas será do ocupante do imóvel inscrito.

7.9. Pagamento de laudênios de imóveis ocupados anteriormente a 27 de abril de 2.006: Para efeitos da regularização fundiária, os imóveis ocupados antes de 27 de abril de 2006 terão reconhecida sua cadeia sucessória, ou cadeia dominial, e serão anotados no cadastro de bens imóveis da União para fins de regularização para os fins previstos de cobrança do laudêmio130.

7.10. Limites da inscrição e cadastramento de usuários: Tanto no cadastramento de forma regular e ordinária quanto no recadastramento, a lei prevê hipóteses em que é vedada a inscrição da área. A primeira é a data da ocupação, que não pode ser superior a 17 de abril de 2006.

A segunda seria relativa a consideradas áreas de risco para fins de inscrição ou cadastramento, áreas de preservação ambiental, faixa de fronteira, áreas de uso comum do povo, acesso a praias marítimas, pluviais e lacustres, áreas administradas pelos ministérios da Defesa, Marinha, Aeronáutica ou Exército. Nestes casos, a União será imitida sumariamente na posse dos referidos imóveis e serão canceladas as inscrições. O que é interessante nesta legislação é que a União fixa o percentual de 10% do valor da área para fins de cobrança do ocupante, até que este a desocupe131.

129 Art. 7º A inscrição de ocupação, a cargo da Secretaria do Patrimônio da União, é ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, que pressupõe o efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante, nos termos do regulamento, outorgada pela administração depois de analisada a conveniência e oportunidade, e gera obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

130 § 7º Para efeito de regularização das ocupações ocorridas até 27 de abril de 2006 nos registros cadastrais da Secretaria do Patrimônio da União, as transferências de posse na cadeia sucessória do imóvel serão anotadas no cadastro dos bens dominiais da União para o fim de cobrança de receitas patrimoniais dos respectivos responsáveis, não dependendo do prévio recolhimento do laudêmio. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

131 Art. 8º Na realização do cadastramento ou recadastramento de ocupantes, serão observados os procedimentos previstos no art. 128 do Decreto-Lei no 9.760, de 5 de setembro de 1946, com as alterações desta Lei.

Art. 9º É vedada a inscrição de ocupações que:

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7.11. Aforamento e enfiteuse: A enfiteuse, direito real, foi extinta no código civil de 2002. A lei que estamos comentando é anterior ao Código Civil, pois se trata da lei 9.636/98 e suas alterações. Porém, a forma como a União levaria seus imóveis ao mercado seria através da licitação, o que vem ao encontro dos princípios constitucionais da administração pública, art. 37 da CF.

A extirpação da enfiteuse do direito material não impede de forma alguma a continuidade das existentes, porém parece que o legislador, já prevendo, tentou fazer uma distinção entre aforamento e laudênio. Previu a contratação de aforamento para imóveis posteriores ao evento do novo código civil, o que, convenhamos é um jeitinho na lei, já que aforamento e enfiteuse são sinônimos. As previsões relativas ao aforamento e suas nuanças foram incluídas na lei nos art. 12 a 16. Por se tratar de uma norma de natureza administrativa, ou seja, cobrança, imposições de domínio útil, transferências, etc., não comentaremos este elemento da lei, pois já seria um elemento posterior à regularização, pois se trata da regularização jurídica da área.

7.12. Os direitos dos ocupantes regularmente inscritos até 05 de outubro de 1988. Os inscritos até a promulgação da Constituição Federal de 1988 estão assegurados, mediante a celebração do contrato de cessão de uso oneroso. Ou seja, conforme afirmamos, a cessão de todo o patrimônio da União é feita de forma onerosa, com exceção dos imóveis atingidos pela MP 2220/01, em que a concessão será gratuita.

Este título fornecido pela União é totalmente precário, sendo possível sua resolução unilateral a qualquer momento, dependendo apenas do mérito do ato administrativo. Então, a forma como a posse é normalizada nos imóveis da União não é a que ela indica para os imóveis públicos dos estados e municípios. Até parece que o tratamento deveria ser igual, porém, no exame da lei, o que se nota é

I - ocorreram após 27 de abril de 2006; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007) II - estejam concorrendo ou tenham concorrido para comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de

segurança nacional, de preservação ambiental ou necessárias à preservação dos ecossistemas naturais e de implantação de programas ou ações de regularização fundiária de interesse social ou habitacionais das reservas indígenas, das áreas ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos, das vias federais de comunicação e das áreas reservadas para construção de hidrelétricas ou congêneres, ressalvados os casos especiais autorizados na forma da lei. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

Art. 10. Constatada a existência de posses ou ocupações em desacordo com o disposto nesta Lei, a União deverá imitir-se sumariamente na posse do imóvel, cancelando-se as inscrições eventualmente realizadas.

Parágrafo único. Até a efetiva desocupação, será devida à União indenização pela posse ou ocupação ilícita, correspondente a 10% (dez por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da posse ou ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.

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que todos os procedimentos são absolutamente diferentes, para um caso e para outro132.

7.13. Cessão e direitos dos inscritos beneficiários de imóveis da União: É possível esta cessão de forma gratuita ou em condições especiais com a anuência do Serviço de Patrimônio da União para os seguintes entes ou nas seguintes hipóteses: I - estados, Distrito Federal, municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela lei nº 11.481, de 2007); II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela lei nº 11.481, de 2007). O que é interessante no texto legal é que fala em concessão do direito real de uso resolúvel. Enfim, todos os imóveis da União, como já afirmamos, estão vinculados ao estado de precariedade, forma adotada pela União para conceder o direito de posse de seus imóveis.

Com certeza, isso gera a insegurança jurídica, por isso também os convênios se repetem. Mas a União, como já afirmamos, é uma grande imobiliária, que onera legalmente os imóveis próprios, inclusive até a sua desocupação, no processo sumário de imissão de posse. Para que haja a cessão de espaços físicos de águas públicas, assim como espaço aéreo, depende de autorização presidencial, e se formalizará mediante termo ou contrato. Por isso é possível que sejam cedidas áreas públicas para fins particulares. A cessão é um ato precário, da mesma forma que os demais títulos que envolvam diversas áreas consideradas da União. Sempre que a cessão envolver área para empreendimento lucrativo, ela deverá ser onerosa.

7.14. Casos de dispensa de licitação: A forma de concessão de cadastro e inscrições públicas é a licitação, conforme a lei 8666. Porém, a lei excepciona as possibilidades de dispensa de licitação. O primeiro

132 Art. 17. Os ocupantes regularmente inscritos até 5 de outubro de 1988, que não exercerem a preferência de que trata o art. 13, terão os seus direitos e obrigações assegurados mediante a celebração de contratos de cessão de uso onerosa, por prazo indeterminado. Decreto nº 3.725, de 10.1.2001.

§ 1o A opção pela celebração do contrato de cessão de que trata este artigo deverá ser manifestada e formalizada, sob pena de decadência, observando-se os mesmos prazos previstos no art. 13 para exercício da preferência ao aforamento.

§ 2o Havendo interesse do serviço público, a União poderá, a qualquer tempo, revogar o contrato de cessão e reintegrar-se na posse do imóvel, após o decurso do prazo de noventa dias da notificação administrativa que para esse fim expedir, em cada caso, não sendo reconhecidos ao cessionário quaisquer direitos sobre o terreno ou a indenização por benfeitorias realizadas.

§ 3o A qualquer tempo, durante a vigência do contrato de cessão, poderá o cessionário pleitear novamente a preferência à aquisição, exceto na hipótese de haver sido declarado o interesse do serviço público, na forma do art. 5º do Decreto-Lei no 2.398, de 17.

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elemento diz respeito aos bens imóveis residenciais destinados e utilizados no âmbito de programas de provisão habitacional ou de regularização fundiária de interesse social, desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública. Desnecessário isso, já que as regularizações fundiárias sempre envolvem áreas ocupadas de forma indiscriminada, e os ocupantes detêm o direito de assentamento se resolvida a questão social e econômica. Afora esses empreendimentos, os bens imóveis de uso comercial de âmbito local, com área até 250m2, também são objeto de programas de regularização fundiária com ocupação consolidada até 27 de abril de 2.006133.

7.15. Ato autorizativo da cessão: Esta autorização de cessão, ou seja, a transferência da posse ou do direito, poderá envolver diversas situações enumeradas no art. 19 e incisos134, inclusive o de oneração. Por ser um título precário e resolúvel, esta autorização deverá afastar por um certo tempo a resolutividade e precariedade do título, senão não serviria de garantia para alienação. Até frutos civis necessitam de autorização do poder concedente. A cessão sob o regime de arrendamento poderá ter prazo superior a vinte anos, desde que o tempo seja o necessário para a viabilização econômico-financeira do empreendimento135. Não visualizamos o motivo por que o legislador

133 § 6º Fica dispensada de licitação a cessão prevista no caput deste artigo relativa a: (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

I - bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas de provisão habitacional ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

II - bens imóveis de uso comercial de âmbito local com área de até 250 m² (duzentos e cinquenta metros quadrados), inseridos no âmbito de programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública e cuja ocupação se tenha consolidado até 27 de abril de 2006. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

134 I - permitir a alienação do domínio útil ou de direitos reais de uso de frações do terreno cedido mediante regime competente, com a finalidade de obter recursos para execução dos objetivos da cessão, inclusive para construção de edificações que pertencerão, no todo ou em parte, ao cessionário;

II - permitir a hipoteca do domínio útil ou de direitos reais de uso de frações do terreno cedido, mediante regime competente, e de benfeitorias eventualmente aderidas, com as finalidades referidas no inciso anterior;

III - permitir a locação ou o arrendamento de partes do imóvel cedido e benfeitorias eventualmente aderidas, desnecessárias ao uso imediato do cessionário;

IV - isentar o cessionário do pagamento de foro, enquanto o domínio útil do terreno fizer parte do seu patrimônio, e de laudêmios, nas transferências de domínio útil de que trata este artigo;

V - conceder prazo de carência para início de pagamento das retribuições devidas, quando: a) for necessária a viabilização econômico-financeira do empreendimento; b) houver interesse em incentivar atividade pouco ou ainda não desenvolvida no País ou em alguma de suas regiões; ouc) for necessário ao desenvolvimento de microempresas, cooperativas e associações de pequenos produtores e de outros

segmentos da economia brasileira que precisem ser incrementados. VI - permitir a cessão gratuita de direitos enfitêuticos relativos a frações de terrenos cedidos quando se tratar de regularização

fundiária ou provisão habitacional para famílias carentes ou de baixa renda. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)Art. 20. Não será considerada utilização em fim diferente do previsto no termo de entrega, a que se refere o § 2º do art. 79 do

Decreto-Lei no 9.760, de 1946, a cessão de uso a terceiros, a título gratuito ou oneroso, de áreas para exercício de atividade de apoio, definidas em regulamento, necessárias ao desempenho da atividade do órgão a que o imóvel foi entregue.

Parágrafo único. A cessão de que trata este artigo será formalizada pelo chefe da repartição, estabelecimento ou serviço público federal a que tenha sido entregue o imóvel, desde que aprovada sua realização pelo Secretário-Geral da Presidência da República, respectivos Ministros de Estado ou autoridades com competência equivalente nos Poderes Legislativo ou Judiciário, conforme for o caso, e tenham sido observadas as condições previstas no regulamento e os procedimentos licitatórios previstos em lei.

135 Art. 21. Quando o projeto envolver investimentos cujo retorno, justificadamente, não possa ocorrer dentro do prazo máximo de 20 (vinte) anos, a cessão sob o regime de arrendamento poderá ser realizada por prazo superior, observando-se, nesse caso, como prazo de vigência, o tempo seguramente necessário à viabilização econômico-financeira do empreendimento, não ultrapassando o período da possível renovação. (Redação dada pela Lei nº 11.314 de 2006)

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tratou de forma tão rígida os imóveis da União, como se fossem todos lucrativos e especiais. Não se quer um tratamento diferenciado aos imóveis dos municípios, por exemplo, mas não com a rigidez com que a União tratou do assunto.

7.16. Títulos utilizados na regularização de imóveis da União: Os títulos, num processo de regularização fundiária, implicam a regularização jurídica da área em favor de um beneficiário. O que se nota é que a União não fala em momento algum em regularização urbanística. Parece que seria obrigação dos conveniados a entrega dos títulos correspondentes à regularização jurídica; por delegação, esta seria a contrapartida dos envolvidos conveniados. Afora isso, não há, na regularização de imóveis da União, qualquer benefício aos conveniados senão o benefício político, que é a regularização jurídica. O que é interessante no exame que vamos fazer é que a União utiliza todo o tipo de título possível para regularizar juridicamente, cabendo a ela a eleição do que utilziará.

7.16.1. Permissão de Uso: Os imóveis da União poderão ser cedidos com a permissão de uso nas seguintes hipóteses: realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional136. Esta permissão de uso poderá ser repassada aos estados e municípios nos limites de seus convênios. Como se nota, a utilização independe da área. Está vinculada a eventos de curta duração, shows, circos intinerantes, atividades culturais, esportivas, religiosas e também de natureza educacional.

7.16.2. Concessão de uso especial para fins de moradia: Este título foi incluído em nosso sistema urbanístico através da medida provisória 2220/01. As exigências de concessão são as mesmas para imóveis do Estado e dos municípios137. A exclusão que a lei fez foi dos imóveis funcionais, ocupados principalmente por deputados e

136 Art. 22. A utilização, a título precário, de áreas de domínio da União para a realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional, poderá ser autorizada, na forma do regulamento, sob o regime de permissão de uso, em ato do Secretário do Patrimônio da União, publicado no Diário Oficial da União.

§ 1o A competência para autorizar a permissão de uso de que trata este artigo poderá ser delegada aos titulares das Delegacias do Patrimônio da União nos Estados.

137 Art. 22-A. A concessão de uso especial para fins de moradia aplica-se às áreas de propriedade da União, inclusive aos terrenos de marinha e acrescidos, e será conferida aos possuidores ou ocupantes que preencham os requisitos legais estabelecidos na Medida Provisória no 2.220, de 4 de setembro de 2001. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

§ 1º. O direito de que trata o caput deste artigo não se aplica a imóveis funcionais. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)§ 2º. Os imóveis sob administração do Ministério da Defesa ou dos Comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica são

considerados de interesse da defesa nacional para efeito do disposto no inciso III do caput do art. 5º da Medida Provisória no 2.220, de 4 de setembro de 2001, sem prejuízo do estabelecido no § 1o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

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senadores no exercício do mandato e que, muitas vezes, vão além. Para evitar este contratempo, foi necessário deixar claro e excepcionar a incidência do título a este tipo de imóvel. Evidente que os imóveis que interessam à segurança nacional não recebem abrigo neste tipo de regularização, da mesma forma os imóveis de risco. Quando analisarmos no capítulo próprio este título, aprofundaremos o exame dos requisitos legais, formais e especiais para a concessão deste título.

7.16.3. Por alienação. A alienação sempre precede de parecer da SPU e ato do Presidente da República. Necessário para que haja a alienação, a fundamentação do parecer da SPU deve alicerçar-se na oportunidade e conviniência, que são os componentes do mérito do ato administrativo. Seria destinado àqueles imóveis que não têm função essencial para a União, aliás, a grande maioria, sempre resguardando o interesse público, econômico, social, ambiental e defesa nacional138. O interessante é a vinculação do Ministro da Fazenda neste episódio. A SPU é vinculada ao Planejamento, mas as alienações podem ser delegadas pela presidência ao Ministro da Fazenda. Na lei, são tratadas com muita seriedade e de forma vinculada estas alienações ao interesse nacional.

7.16.4. Por venda: A venda de imóveis da União segue a lei. Somente poderá ser feita por concorrência ou leilão público. Além desta modalidade de venda, todos os requisitos da lei 8666/93 deverão ser observados. Os licitantes apresentarão propostas ou lances distintos para cada imóvel. Deverá o participante oferecer caução de participação correspondente a 10%do valor da avaliação do bem. Em caso de leilão público, o arrematante pagará, no ato do pregão, sinal correspondente a 10% do valor da arrematação, complementando o restante no prazo estipulado no edital. Caso não faça a complementação perderá o sinal dado em favor da União. O leilão deverá ser feito por leiloeiro oficial ou então por funcionário público designado para tal, sendo a comissão do leilão o equivalente a 5% do valor da arrematação, pagos no ato do sinal de participação. As demais condições estão vinculadas no edital do certame139. É realmente uma venda de imóvel público com todas as

138 DA ALIENAÇÃOArt. 23. A alienação de bens imóveis da União dependerá de autorização, mediante ato do Presidente da República, e será sempre

precedida de parecer da SPU quanto à sua oportunidade e conveniência.§ 1º A alienação ocorrerá quando não houver interesse público, econômico ou social em manter o imóvel no domínio da União,

nem inconveniência quanto à preservação ambiental e à defesa nacional, no desaparecimento do vínculo de propriedade.§ 2º A competência para autorizar a alienação poderá ser delegada ao Ministro de Estado da Fazenda, permitida a subdelegação.139 Da VendaArt. 24. A venda de bens imóveis da União será feita mediante concorrência ou leilão público, observadas as seguintes condições:

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cautelas e procedimentos legais.

7.16.4.1. Avaliação dos bens para fins de venda em leilão ou concorrência pública. É possivel que se faça a avaliação dos bens através da avaliação expedita. Esta avaliação é procedida com base em informações do avaliador, sem se constituir num documento técnico elaborado de acordo com as normas técnicas de avalição ditadas pela ABNT, mais precisamete NBR 14653 e seus cadernos. Sempre ficará a cargo do SPU a fixação deste valor de venda, porém a SPU poderá se assessorar de serviços especializados140. A chamada avaliação de precisão é elaborada de acordo com a norma técnica e envolve vistoria e avaliação, preenchidos todos os requisitos de elaboração destes documentos técnicos constante nas atividades básicas da NBR.

7.16.4.2. Direito de preferência na arrematação: Concorrem em igualdade de condições com o arrematante: o cessionário de direito real ou pessoal, o locatário ou arrendatário. A condição que a lei impõe para esta preferência é estar em dias com as suas obrigações junto à SPU141. A preferência de compra poderá ser estendida também ao locatário mesmo sem contrato escrito, previsão contida no parágrafo único do art. 24.

7.16.4.3. Condições de pagamento da venda parcelada de imóveis fora do projeto de regularização fundiária: O texto legal abre a possibilidade do pagamento da venda ser parcelado da seguinte forma: sinal de 10% do valor da arrematação e o restante em até 48 prestações mensais e consecutivas.

I - na venda por leilão público, a publicação do edital observará as mesmas disposições legais aplicáveis à concorrência pública; II - os licitantes apresentarão propostas ou lances distintos para cada imóvel;III - a caução de participação, quando realizada licitação na modalidade de concorrência, corresponderá a 10% (dez por cento)

do valor de avaliação; IV - no caso de leilão público, o arrematante pagará, no ato do pregão, sinal correspondente a, no mínimo, 10% (dez por cento)

do valor da arrematação, complementando o preço no prazo e nas condições previstas no edital, sob pena de perder, em favor da União, o valor correspondente ao sinal e, em favor do leiloeiro, se for o caso, a respectiva comissão;

V - o leilão público será realizado por leiloeiro oficial ou por servidor especialmente designado; VI - quando o leilão público for realizado por leiloeiro oficial, a respectiva comissão será, na forma do regulamento, de até 5%

(cinco por cento) do valor da arrematação e será paga pelo arrematante, juntamente com o sinal; VII - o preço mínimo de venda será fixado com base no valor de mercado do imóvel, estabelecido em avaliação de precisão

feita pela SPU, cuja validade será de seis meses; VIII - demais condições previstas no regulamento e no edital de licitação.140 Avaliação. Art. 24. § 1o Na impossibilidade, devidamente justificada, de realização de avaliação de precisão, será admitida avaliação expedita. § 2o Para realização das avaliações de que trata o inciso VII, poderão ser contratados serviços especializados de terceiros,

devendo os respectivos laudos, para os fins previstos nesta Lei, ser homologados pela SPU, quanto à observância das normas técnicas pertinentes.

141 Preferência: Art. 24. § 3o Poderá adquirir o imóvel, em condições de igualdade com o vencedor da licitação, o cessionário de direito real ou pessoal, o

locatário ou arrendatário que esteja em dia com suas obrigações junto à SPU, bem como o expropriado.

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O valor de cada parcela não poderá ser inferior ao valor do salário mínimo. O adquirente não poderá ter mais de oitenta anos, e também as parcelas que aderir não podem ultrapassar a esta idade. Imagina a União que aos oitenta anos o adquirente estará morto, e seus sucessores não terão condições de arcar com os ônus da parcela. Os encargos financeiros do contrato são TABELA PRICE, juros de 10% aa, atualização mensal do saldo devedor e da parcela de amortização pelos índices de variação da poupança.

Prêmio de seguro por morte e danos físicos. Se houver mora, multa de 2%, mais juros de 0,033 ao dia. O atraso de três prestações importa no vencimento antecipado da dívida. Tudo isso garantido pela HIPOTECA do bem ou direito142. A União mostra um modelo austero e inflexível no trato da coisa pública, mostrando zelo, cautela e lucratividade. Sabemos o mal que a aplicação da tabela Price causa nos financiamentos. Você compra um imóvel e paga três.

7.16.4.4. Projetos de caráter social ou natureza social: Quando a venda observar critérios sociais relacionados com a renda familiar, fixada no regulamento da lei, o valor do sinal será de 5%,

142 Art. 24. § 4º A venda, em qualquer das modalidades previstas neste artigo, poderá ser parcelada, mediante pagamento de sinal

correspondente a, no mínimo, 10% (dez por cento) do valor de aquisição e o restante em até quarenta e oito prestações mensais e consecutivas, observadas as condições previstas nos arts. 27 e 28.

§ 5º Em se tratando de remição devidamente autorizada na forma do art. 123 do Decreto-Lei no 9.760, de 5 de setembro de 1946, o respectivo montante poderá ser parcelado, mediante pagamento de sinal correspondente a, no mínimo, dez por cento do valor de aquisição, e o restante em até cento e vinte prestações mensais e consecutivas, observadas as condições previstas nos arts. 27 e 28. (Incluído pela Lei nº 9.821, de 1999)

Art. 25. A preferência de que trata o art. 13, exceto com relação aos imóveis sujeitos aos regimes dos arts. 80 a 85 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, e da Lei no 8.025, de 12 de abril de 1990, poderá, a critério da Administração, ser estendida, na aquisição do domínio útil ou pleno de imóveis residenciais de propriedade da União, que venham a ser colocados à venda, àqueles que, em 15 de fevereiro de 1997, já os ocupavam, na qualidade de locatários, independentemente do tempo de locação, observadas, no que couber, as demais condições estabelecidas para os ocupantes. Decreto nº 3.725, de 10.1.2001

Parágrafo único. A preferência de que trata este artigo poderá, ainda, ser estendida àquele que, atendendo as demais condições previstas neste artigo, esteja regularmente cadastrado como locatário, independentemente da existência de contrato locativo.

Art. 27. As vendas a prazo serão formalizadas mediante contrato de compra e venda ou promessa de compra e venda em que estarão previstas, dentre outras, as seguintes condições:

I - garantia, mediante hipoteca do domínio pleno ou útil, em primeiro grau e sem concorrência, quando for o caso; II - valor da prestação de amortização e juros calculados pela Tabela Price, com taxa nominal de juros de 10% (dez por cento)

ao ano, exceto para as alienações de que trata o artigo anterior, cuja taxa de juros será de 7% (sete por cento) ao ano;

III - atualização mensal do saldo devedor e das prestações de amortização e juros e dos prêmios de seguros, no dia do mês correspondente ao da assinatura do contrato, com base no coeficiente de atualização aplicável ao depósito em caderneta de poupança com aniversário na mesma data;

IV - pagamento de prêmio mensal de seguro contra morte e invalidez permanente e, quando for o caso, contra danos físicos ao imóvel;

V - na amortização ou quitação antecipada da dívida, o saldo devedor será atualizado, pro rata die, com base no último índice de atualização mensal aplicado ao contrato, no período compreendido entre a data do último reajuste do saldo devedor e o dia do evento;

VI - ocorrendo impontualidade na satisfação de qualquer obrigação de pagamento, a quantia devida corresponderá ao valor da obrigação, em moeda corrente nacional, atualizado pelo índice de remuneração básica dos depósitos de poupança com aniversário no primeiro dia de cada mês, desde a data do vencimento até a do efetivo pagamento, acrescido de multa de mora de 2% (dois por cento) bem como de juros de 0,033% (trinta e três milésimos por cento) por dia de atraso ou fração;

VII - a falta de pagamento de três prestações importará o vencimento antecipado da dívida e a imediata execução do contrato; VIII - obrigação de serem pagos, pelo adquirente, taxas, emolumentos e despesas referentes à venda. Parágrafo único. Os contratos de compra e venda de que trata este artigo deverão prever, ainda, a possibilidade, a critério da

Administração, da atualização da prestação ser realizada em periodicidade superior à prevista no inciso III, mediante recálculo do seu valor com base no saldo devedor à época existente.

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podendo ser dividido em duas parcelas, e o saldo financiado em até 300 meses, sendo o mínimo de pagamento 30% do valor do salário mínimo vigente143. Difere esta modalidade da outra relativa à venda de imóveis da União, no tocante a alguma flexibilidade dada pela lei, já que a aquisição aqui tratada é de famílias de baixa renda e o caráter da venda é para fins de reforma urbana. De todas as condições mencionadas no item anterior, há uma redução do encargo de juro anual de 10% para 7% na aplicação da tabela Price. O tratamento dado, mesmo com o caráter social, é comercial, conforme afirmamos. Não há qualquer incentivo ou beneficio. Os imóveis são vendidos com uma boa perspectiva de rentabilidade.

7.16.5. Permuta: Entre unidades da Federação, é possível que haja esta permuta de imóveis da União por outros, edificados ou não, ou por edificações a construir, sempre que houver a manifestação do SPU e a autorização da presidência da República, que conforme afirmamos pode delegar esta competência ao Ministro da Fazenda. Se houver condições de competitividade, o processo de permuta deverá ocorrer por procedimento licitatório144.

7.16.6. Da doação: Existe a hipótese de a União doar imóveis para pessoas físicas em áreas de intervenção por ser de regularização fundiária de interesse social. Esta doação é condicionada. Por exemplo: renda familiar não ser superior a cinco salários mínimos. Neste instante, a União elege como baixa renda a quantia equivalente ao valor de cinco salários mínimos.

O beneficiário ou donatário não pode alienar o imóvel antes de passados cinco anos. Não pode ser proprietário de outro imóvel ou concessionário. Com relação às pessoas jurídicas em que é possível a doação, elas ficam restritas também às condições legais impostas a estas doações. Mas uma condição chama atenção quando refere que, se houver venda, é necessário que o valor apurado com a venda do

143 Art. 26. Em se tratando de projeto de caráter social para fins de moradia, a venda do domínio pleno ou útil observará os critérios de habilitação e renda familiar fixados em regulamento, podendo o pagamento ser efetivado mediante um sinal de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor da avaliação, permitido o seu parcelamento em até 2 (duas) vezes e do saldo em até 300 (trezentas) prestações mensais e consecutivas, observando-se, como mínimo, a quantia correspondente a 30% (trinta por cento) do valor do salário mínimo vigente. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

144 Da Permuta Art. 30. Poderá ser autorizada, na forma do art. 23, a permuta de imóveis de qualquer natureza, de propriedade da União, por

imóveis edificados ou não, ou por edificações a construir. § 1º Os imóveis permutados com base neste artigo não poderão ser utilizados para fins residenciais funcionais, exceto nos

casos de residências de caráter obrigatório, de que tratam os arts. 80 a 85 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946. § 2º Na permuta, sempre que houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios

previstos em lei.

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bem doado seja investido em infraestrutura no local145.

Esta é uma breve análise dos procedimentos adotados pela União no trato de seus própios. Ao tomarmos conhecimento da legislação e seus regulamentos, chegamos à conclusão que os imóveis da União são tratados como os de uma empresa privada, produtora de imóveis e que está no mercado não para fazer de conta, mas para lucrar efetivamente. A aplicação da tabela Price com juros de 10 e 7% aa são um indicativo desta lucratividade. Da mesma forma, se este ativo da UNIÃO for efetivamente administrado, com profissionalismo, todo este acervo imobiliário é de altíssimo rendimento. Seriam carteiras de imóveis que vão além da expectativa do bom. Entendemos que a função da União não é ser uma imobiliária. Também a União tem os imóveis que quiser a hora em que quiser, ou para a defesa do território nacional ou por interesse público. Assim, não é necessário este acúmulo de bens e regras tão rígidas e rentáveis para administração de seus imóveis.

145 Da Doação Art. 31. Mediante ato do Poder Executivo e a seu critério, poderá ser autorizada a doação de bens imóveis de domínio da

União, observado o disposto no art. 23 desta Lei, a: (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007) I - Estados, Distrito Federal, Municípios, fundações públicas e autarquias públicas federais, estaduais e municipais; (Incluído

pela Lei nº 11.481, de 2007) II - empresas públicas federais, estaduais e municipais; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) III - fundos públicos nas transferências destinadas a realização de programas de provisão habitacional ou de regularização

fundiária de interesse social; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) IV - sociedades de economia mista voltadas à execução de programas de provisão habitacional ou de regularização fundiária

de interesse social; ou (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) V - beneficiários, pessoas físicas ou jurídicas, de programas de provisão habitacional ou de regularização fundiária de interesse

social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública, para cuja execução seja efetivada a doação. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

§ 1º No ato autorizativo e no respectivo termo constarão a finalidade da doação e o prazo para seu cumprimento. § 2º O encargo de que trata o parágrafo anterior será permanente e resolutivo, revertendo automaticamente o imóvel à

propriedade da União, independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas, se: I - não for cumprida, dentro do prazo, a finalidade da doação; II - cessarem as razões que justificaram a doação; ou III - ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista. § 3º Nas hipóteses de que tratam os incisos I a IV do caput deste artigo, é vedada ao beneficiário a possibilidade de alienar

o imóvel recebido em doação, exceto quando a finalidade for a execução, por parte do donatário, de projeto de assentamento de famílias carentes ou de baixa renda, na forma do art. 26 desta Lei, e desde que, no caso de alienação onerosa, o produto da venda seja destinado à instalação de infra-estrutura, equipamentos básicos ou de outras melhorias necessárias ao desenvolvimento do projeto. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

§ 4º Na hipótese de que trata o inciso V do caput deste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) I - não se aplica o disposto no § 2º deste artigo para o beneficiário pessoa física, devendo o contrato dispor sobre eventuais

encargos e conter cláusula de inalienabilidade por um período de 5 (cinco) anos; e (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) II - a pessoa jurídica que receber o imóvel em doação só poderá utilizá-lo no âmbito do respectivo programa habitacional ou

de regularização fundiária e deverá observar, nos contratos com os beneficiários finais, o requisito de inalienabilidade previsto no inciso I deste parágrafo. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

§ 5o Nas hipóteses de que tratam os incisos III a V do caput deste artigo, o beneficiário final pessoa física deve atender aos seguintes requisitos: (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

I - possuir renda familiar mensal não superior a 5 (cinco) salários mínimos; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) II - não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

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08. a regularIzação JurídICa

títulos possíVeIs na regularIzação

FundIárIa

Vamos ver, a partir de agora, títulos, condições, espécie, requisitos para titular os beneficiários do processo de regularização fundiária de interesse social. Seria o gran finale do processo de regularização, mas, como a lei 11.977/09 autoriza a concessão de títulos a partir

da existência de dois equipamentos urbanos de infraestrutura básica, automaticamente os títulos podem ser concedidos a partir do primeiro momento de atuação do poder público. Entendemos até que este momento

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é no cadastramento das famílias que se encontram na irregularidade urbana.

8.1. Concessão do direito real de uso - CDRU. Arriscamos dizer que foi o título mais utilizado em processos de regularização fundiária até agora. Surgiu com o decreto-lei 271/67.

8.1.1 Legislação comentada:

Art. 7º . É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

Da leitura do artigo, se descolam as seguintes características: (1) A concessão de uso é um título administrativo resolúvel. Ou seja, a administração que concede pode revogar no instante que julgar interessante. (2) Pode ser remunerado ou gratuito. É opção do concedente optar pela gratuitade ou não. (3) Por prazo certo ou indetermnado, e os fins específicos são enumerados no caput e envolvem num primeiro momento a regularização fundiária de interesse social além de outros destinos que a legislação aponta.

§ 1º A concessão de uso poderá ser contratada, por instrumento público ou particular, ou por simples termo administrativo, e será inscrita e cancelada em livro especial.

Com relação à forma, o §1º deixa a opção com o poder público. Ele pode optar por contratar por termo ou através do serviço notarial. Este indicativo

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não contraria as disposições do artigo 108 do Código Civil de 2002, que prevê a necessidade de forma de escritura pública em direitos reais para contratos de valor superior a trinta salários mínimos.146

§ 2º Desde a inscrição da concessão de uso, o concessionário fruirá plenamente do terreno para os fins estabelecidos no contrato e responderá por todos os encargos civis, administrativos e tributários que venham a incidir sobre o imóvel e suas rendas.

A concessão, na forma como foi prevista em 1967, dá ao concessionário os direitos de fruição plena, podendo inclusive servir de renda ao mesmo através dos frutos civis, tudo, porém, vinculado aos encargos tributários e fiscais que incidam sobre o bem. O que vem acontecendo na reforma urbana é que a utilização da concessão é mediante condições, entre as quais a impossibilidade de transferência do direito de concessão a terceiro. Isso para evitar aquela especulação natural que se cria em volta de imóveis. Também para evitar que o imóvel se transforme em renda, e o concessionário retorne para a fila esperando por outro imóvel.

No atual nível de emprego que o país se encontra, achamos que os objetivos da regularização fundiária serão atingidos com a fixação do concessionário no lugar, sem a rotatividade que a especulação proporciona. Somente assim será possível a redução da demanda. Não se imagina a moradia que não seja para a necessidade de moradia. Não pode servir a moradia para a especulação.

§ 3º Resolve-se a concessão antes de seu termo, desde que o concessionário dê ao imóvel destinação diversa da estabelecida no contrato ou termo, ou descumpra cláusula resolutória do ajuste, perdendo, neste caso, as benfeitorias de qualquer natureza.

Não tem o concessionário direito de retenção de benfeitorias, e sequer indenização, caso não cumpra a destinação estabelecida no contrato ou termo. A cláusula é resolutória. Então, é possível ao concedente, antes do prazo estabelecido no contrato ou termo, reaver o imóvel e resolver de forma unilateral a concessão. Por isso a sua precariedade. O mesmo entendimento não serve para a CONCESSÃO DO DIREITO REAL DE USO prevista no Código Civil Brasileiro, por tratar-se de um direito real. Esta

146 Código Civil. Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

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inscrita no registro imobiliário somente será resolutiva se houver qualquer infração à sua instituição e terá eficácia erga omnes no momento de seu registro no ofício imobiliário.

§ 4º A concessão de uso, salvo disposição contratual em contrário, transfere-se por ato inter vivos, ou por sucessão legítima ou testamentária, como os demais direitos reais sobre coisas alheias, registrando-se a transferência.

É possível a cessão da concessão. Porém, as disposições contratuais que o §4º excepciona, normalmente não permitem a cessão pelos motivos expostos no comentário ao § 2º. Tem validade jurídica esta condição de não transferência imposta ao contrato ou termo administrativo que concede a CDRU? Sem dúvida alguma, tem e a consequência é a resolução do título. Porém, essa cessão somente poderá ser feita com anuência prévia do órgão concedente, nos casos numerados no § 5º e incisos I e II. Como se nota, esta alteração foi feita em 2007, com a Lei 11.481 o que atesta o vigor do decreto-lei 271/67147. Mais especificamente, os casos tratados como de segurança nacional.

8.1.2. Vantagens de utilização do CDRU na regularização fundiária. A primeira grande vantagem que a utilização do CDRU tem é com relação à área dos imóveis beneficiados. Veremos que na concessão de uso especial, a usucapião especial e a legitimação na posse temos a restrição da área superficial. Nestes três títulos, o limite é de 250m2. Então, a primeira grande vantagem de utilização do CDRU e a não limitação de área para a sua concessão. Da mesma forma, a concessão poderá incidir sobre qualquer imóvel público, afetado ou não. É um título precário, como todos os outros originários do poder público, e pode ser contratado de duas formas: por tempo determinado ou indeterminado e, ainda, de forma onerosa ou gratuita.

8.1.3. CDRU onerosa. Vamos analisar um exemplo de utilização de CDRU e que foi um dos pioneiros no país na sua utilização. O DEMHAB de Porto Alegre utiliza a CDRU já há muito tempo. Tanto que poucos são os contratos de alienação ou promessa de compra e venda feitos de próprios municipais produzidos pelo departamento.

147 Art. 7º do Decreto-Lei 271/67. § 5o Para efeito de aplicação do disposto no caput deste artigo, deverá ser observada a anuência prévia: (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

I - do Ministério da Defesa e dos Comandos da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, quando se tratar de imóveis que estejam sob sua administração; e (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

II - do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência de República, observados os termos do inciso III do § 1º do art. 91 da Constituição Federal. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007).

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A simpatia e utilização da concessão do direito de uso disseminaram-se pelos imóveis produzidos. O legislador municipal, na lei complementar 242/91148, estipulou uma chamada contribuição social, em que a renda da família é comprometida dentro de percentuais de 5% até 7,5% da renda familiar, sendo considerada a dedução de 2,5%do salário mínimo para cada membro da família. O valor mínimo de contribuição é de 5% do valor do salário mínimo em qualquer situação. O valor máximo de contribuição é de 7,5% da renda familiar, sendo que a inadimplência por mais de 180 dias, resolve a CDRU. A baixa renda no município de Porto Alegre, assim como indicações do governo federal na sua lei de regularização fundiária de seus próprios, é de cinco salários mínimos. Coincidentemente ou não, esta estipulação tem servido de base para fixação da população envolvida no projeto de reforma urbana. Alguns municípios menores não têm condições de estipular nesses patamares sua baixa renda. Então, fica a cargo de cada município, dentro da sua política urbana, definir o que seja baixa renda.

8.1.4. Outros exemplos de CDRU onerosa. O Estado do Tocantins, através da lei 2.283/10, deixou para o regulamento definir a contribuição onerosa de cada CDRU concedido. Muitos imóveis do Estado não poderiam receber outro título em razão da área que os imóveis ocupados pela população de baixa renda tinham. Para tanto, houve uma adequação da política urbana no sentido de utilizar a CDRU, já que a baixa renda no estado de Tocantins ficou fixada em cinco salários mínimos de renda familiar. Houve discussão a respeito do quantum deveriam pagar pela CDRU onerosa. A maioria entendia que tinha que ser gratuita a concessão, outros que deveria haver uma contrapartida. Então, a lei definiu que o valor da contrapartida seria capitalizado e, ao término de cinco anos, o concessionário poderia adquirir por opção de compra o imóvel, revertendo a contribuição social para o abatimento do valor da venda. Ou seja, a contribuição social seria capitalizada.

8.1.5. Crítica a CDRU. Por ser um título precário, a maior crítica que a CDRU tem recebido é de tratar-se de um aluguel perpétuo. OU seja, sempre haverá o encargo e jamais o concessionário terá a oportunidade de adquirir o bem. A grande saída de qualquer programa social é a possibilidade de

148 Lei Complementar 242/91- Porto Alegre. Art. 11- A concessão do Direito Real de Uso terá a contrapartida, pelos beneficiários, de uma contribuição social mensal obrigatória calculada em 7,5% (sete e meio por cento) da renda familiar, sendo considerada uma dedução de 2,5% (dois e meio por cento) do salário mínimo para cada membro familiar e um valor mínimo de contribuição de 5% (cinco por cento) do salário mínimo em qualquer situação.

§ 1º - O inadimplemento injustificado, por mais de 180 dias, desta contribuição, bemcomo a prestação deliberada de informações incorretas quanto à renda familiar, darão direitoao Município de extinguir a concessão.§ 2º -0 valor arrecadado da contribuição social de ocupação será recolhido ao FundoMunicipal de Desenvolvimento Urbano .

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a pessoa deixar este programa. Entendemos que a CDRU deve ser tratada de maneira transitória, ou seja, sua vigência e validade deve ser por tempo limitado, possibilitando após ao concessionário a aquisição do bem. A sanção que restaria ao concessionário que saísse do programa é que não retornaria mais aos programas sociais implantados pelo município. A outra crítica que pode ser feita à concessão é a possibilidade de cessão e transferência. Aqui deve entrar o controle público sobe o cadastro dos beneficiários. O cessionário deve ficar alijado da demanda, e esta informação deve ser difundida de forma efetiva. Assim, todo aquele que ceder seu direito não pode retornar para a fila dos não atendidos, pois se isso acontecer o programa jamais termina. Tornar-se-ia vicioso, sem a possibilidade de atendimento integral da demanda habitacional. Esta possibilidade de cessão serve para que poucos acumulem muitos imóveis oriundos de cessão, instrumentos esses de gaveta e geradores de renda, principalmente quando estes contratos são cedidos para pagamento de dívidas do concessionário. Não pode a administração permitir que tal procedimento seja rotina. O setor social dos municípios deve acompanhar estas famílias, de forma a não serem surpreendidos num projeto de regularização com a concentração de muitas propriedades na mão de poucos. Normalmente, isso acontece nos armazéns que vendem a prazo. Não conseguindo pagar a conta, o concessionário entrega ao comerciante o imóvel e paga-lhe aluguel a partir de então. O comerciante que assim procede não poderá regularizar esta benfeitoria. Na verdade, os títulos serão resolvidos por terem alterada a sua finalidade, que é a moradia.

Mesmo com estas críticas, entendemos que o CDRU é a porta de entrada de todo o programa social de inclusão pela regularização fundiária. Porém, não pode ser um título definitivo. Ele tem por função fixar o indivíduo no projeto, sendo necessário o acompanhamento dos concessionários pelo tempo de vigência do CDRU.

8.2. Direito real de uso. Código Civil. O direito real de uso é um dos direitos reais sobre coisa alheia que tem uma função social efetivamente clara, buscando sempre a utilização da coisa e a percepção de frutos. Esta opção é do concessionário, e a ela estão vinculadas as necessidades de sua família. Estas necessidades estão sempre vinculadas à condição social e ao lugar onde as pessoas necessitadas vivem ou são beneficiárias do direito149.

149 Código Civil. Art. 1.412. O usuário usará da coisa e perceberá os seus frutos, quanto o exigirem as necessidades suas e de sua família.

§ 1o Avaliar-se-ão as necessidades pessoais do usuário conforme a sua condição social e o lugar onde viver.§ 2o As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço

doméstico.

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Este direito de uso obedece à regra do artigo 108 do Código Civil com relação à forma. É também registrado no registro de imóveis e acompanha o imóvel durante sua vida e transmutações de propriedades. Recomenda-se a utilização deste direito sempre que for, por exemplo, fechar-se um loteamento. O Direito do Código Civil não apresenta a precariedade do termo ou contrato estipulado pelo decreto-lei 271/67. Aliás, o decreto determinada que a CDRU pode ser concedida tanto em imóveis públicos quanto em imóveis particulares. Não querendo fazer a distinção de um e outro, mas se a concessão de direito de uso do decreto-lei 271/67 fosse igual à do Código Civil, estaria revogada por este. Assim, estamos diante de dois tipos de concessão, como são as relativas ao direito de superfície do Código Civil art. 1.369 a 1.377 e o direito de superfície do Estatuto da Cidade art. 21 a 24 da lei 10.257/01. Restou à administração pública, a utilização da concessão prevista no decreto-lei 271/69, e não as previsões do Código Civil, já que a concessão de direito de uso existe desde 1.917 em nosso ordenamento material pátrio.

8.3. Concessão de uso especial para fins de Moradia. Medida provisória no 2.220, DE 04 de setembro de 2001. Emenda: “Dispõe sobre a concessão de uso especial de que trata o § 1º do art. 183 da Constituição, cria o Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano - CNDU e dá outras providências.

Existia uma lacuna imensa com relação à ocupação de áreas consideradas públicas especialmente as áreas dos loteamentos destinadas a praças, prédios públicos e áreas verdes. Na verdade, por imposição legal, um percentual da gleba deveria ser destinado à implementação destes equipamentos urbanos comunitários, percentual de 35%, incluindo o arruamento e vias de circulação. Ocorre que, na maioria dos casos, os equipamentos não eram implantados, e a área se tornava um loteamento para políticos, essencialmente, concederem um pedaço de terra para construir a sua ‘‘casinha’’. A constituição federal de 1988 repetiu a regra de que as áreas públicas são imprescritíveis. Assim, a posse que as pessoas têm destas áreas não seriam passíveis de domínio. Para resolver o problema, entendemos que o mais correto seria levar a posse para o nosso sistema registral, admitindo, para registro, o contrato de posse e as limitações oriundas desta. Mas o legislador resolveu criar uma concessão especial para regularizar as posses e dar a ela um caráter excepcional, que admite inclusive financiamento do sistema financeiro habitacional. Ou seja, é uma

Art. 1.413. São aplicáveis ao uso, no que não for contrário à sua natureza, as disposições relativas ao usufruto.

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propriedade que ficou limitada em razão de a Constituição Federal proibir usucapião de imóveis públicos, mas que na verdade é a usucapião de imóvel público com outro nome. Mas a irregularidade não podia continuar, e a concessão especial estava inserida no Estatuto da Cidade como um capítulo, que, porém, foi vetado pelo Presidente e, em substituição a ele, editou a MP 2220/01 ainda em vigor, mas não transformada em lei. Esta MP 2220/01 veio terminar de regulamentar o art. 183 da Constituição Federal, que fala em usucapião e concessão. A concessão é exatamente o que é tratado pela MP 2220/01. Vamos fazer uma análise deste título, da facilidade de sua concessão, dos direitos do concessionário e de sua semelhança com a usucapião constitucional, inclusive com relação aos requisitos, que são os mesmos.

8.3.1. Requisitos da Concessão150:

1. Tempo: A MP trouxe fixado o tempo de posse; cinco anos, bem como a data em que este tempo, somado ou não, deveria estar completado: 30 de junho de 2.001. Ocorre que cada município ou Estado pode fixar um tempo diverso deste da MP 2220/01. Se não houver uma fixação, o tempo é o da MP. Esta data é fixada com a intenção de estancar este tipo de ocupação. Entendemos inútil a fixação de um termo. A sequência somente será interrompida no momento em que houver fiscalização ou a demanda estiver satisfeita, o que, convenhamos, é uma utopia.

2. Posse sem oposição: É outro requisito para a concessão do título. A posse somada ao tempo é o suficiente para consolidar o título.

3. Limite de área quadrada; todos os requisitos são iguais aos da usucapião especial constitucional, que também limitou a área em 250m2 e ao perímetro, que tem que ser urbano.

4. Utilização do bem: deve estar configurada, moradia do beneficiário ou de sua família. É possível que o beneficiário não esteja residindo no imóvel, mas sua família sim. Encontramos diversas migrações em razão de trabalho, os trabalhadores se transferem com suas empresas para obras

150 Art. 1o Aquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o A concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma gratuita ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo concessionário mais de uma vez.§ 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, na posse de seu antecessor, desde que já resida

no imóvel por ocasião da abertura da sucessão

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em outros estados ou mesmo países. Isso não afasta o direito a concessão, apesar de sua ausência. Soma-se à posse da família para adquirir o direito.

5. Condição da concessão: a primeira condição dada pela lei é que o beneficiário não pode ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Esta propriedade não está restrita ao local do imóvel, mas ao território nacional, ou simplesmente propriedade mesmo, que é a referência do texto legal. Além da propriedade, a concessão também é um título que concede ao beneficiário direitos relativos à propriedade. Não pode o beneficiário ser concessionário a qualquer título de outro imóvel. Estas restrições indicam a função meramente social do título e sua forma de regulamentação, não servindo o mesmo para acréscimo patrimonial ou então para especulação. O que falta ainda na execução desta política é o controle efetivo desta rotação, que acontece com as concessões e demais títulos utilizados na regularização fundiária. Deve haver por parte do concedente um controle rígido. Sempre falamos em UNIDADE familiar para caracterizar este controle, em que todos estariam vinculado a um só, que seria a mulher ou o homem da família, somente sendo admitida sua saída deste núcleo familiar em hipótese de constituição de uma nova família ou novo núcleo, para evitar, por exemplo, que diversos imóveis parem na mão de uma família só.

8.3.2. Concessão gratuita ou onerosa? A concessão de uso especial será sempre gratuita, não podendo ser cobrada nenhuma taxa ou contribuição pela sua concessão, conforme preceitua o § 1º do art. 1º do texto legal.

8.3.3. Isonomia na concessão: A MP 2220/01 determina a isonomia entre homem e mulher para concessão. Esta concessão poderá ser requerida por um ou ambos. A lei 11.977/09 já é mais explícita, indicando que a concessão deverá ser outorgada preferencialmente à mulher. Ocorre que as famílias estão alicerçadas no trabalho da mulher. Diria até que a nossa sociedade tem uma tendência efetiva ao matriarcado. O homem simplesmente some, ficando o passivo de filhos com a mulher, que assume a criação. Por isso, não é nada injusto que se dê a ela a preferência de aquisição pela concessão.

8.3.4. Quantas vezes pode ser reconhecido esse direito: Assim como na usucapião constitucional, o direito será reconhecido apenas uma vez ao mesmo concessionário. Isso ocorre justamente para evitar que sejam os imóveis regularizados, vendidos e solicitado novamente o mesmo benefício.

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• 8.3.5. Direito à sucessão: O requisito que a lei impôs à sucessão é que o herdeiro legítimo esteja residindo no imóvel por ocasião da abertura da sucessão. Caso contrário, este direito deverá ser estendido a outros que residam efetivamente no imóvel. Entendemos que a aplicação efetiva deste dispositivo carece de regulamentação. Por exemplo: os herdeiros maiores e o inventário extrajudicial. Como fica a situação do concedente, deve ou não comparecer no ato? Entendemos que sim. Mas, para isso, em razão da falta de regulamentação devem as corregedorias agir. E, com relação ao concedente, depois da entrega do título, parece que cessou toda e qualquer atividade relativa àquele imóvel e aos beneficiários, o que não corresponde efetivamente à realidade. Se assim agirem, fica exposta a liberdade de transferência, mediante contratos de gaveta, etc. Deve haver a responsabilidade efetiva e duradoura, mesmo na concessão, somente se admite a soltura, digamos assim, do processo quando é transmitida a propriedade em si.

8.3.6. Concessão especial coletiva: O art. 2º fixa a condição para a concessão. Esta concessão coletiva somente ocorrerá quando não for possível identificar os terrenos ocupados por possuidor. Muito se têm confundido, assim como na usucapião coletiva, com a aplicação desta novel modalidade de aquisição ou concessão. Ocorre que a diversidade de autores ou beneficiários não autoriza a concessão ou a aquisição coletiva. O que autoriza a legitimidade coletiva é não haver possibilidade de identificação do terreno que cada possuidor tem.

Os demais requisitos são efetivos a concessão individual, tempo, posse, utilização e não ser proprietário ou concessionário de outro imóvel. Assim como na usucapião coletiva regulamentada pelo Estatuto da Cidade, é atribuída a cada beneficiário uma fração ideal de terreno em igualdade de condições. É a constituição de um condomínio especial em que as regras também são especiais. A hipótese de não ser igual esta fração ideal de terreno é a prevista em convenção assinada entre as partes, em que é possível atribuir-se frações diferenciadas a cada beneficiário. Com relação ao tamanho desta fração ideal, ela não poderá ser superior a 250 m2, este é o limite tanto para a concessão individual como para a coletiva.

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8.3.7. Cessão de posse: O § 1º do art. 2º autoriza a cessão de posse. No momento em que o legislador autoriza a contagem de prazo a partir da posse do antecessor, está automaticamente reconhecendo as posses anteriores para somar o tempo necessário para o direito. A única ressalva que o legislador faz é que as posses sejam contínuas, não admitindo espaços entre uma e outra, até porque neste espaço normalmente alguém se interpõe.

Assim como é na usucapião, na qual a soma das posses é admitida, assim o é na concessão de uso especial. Porém, a cessão de posse mencionada no texto examinado diz respeito apenas à concessão de uso coletiva, e não à individual. Assim, as posses somente se somam para efeitos da concessão coletiva de uso especial.

8.3.8. Direito de ocupantes regularmente inscritos: Pode haver ocupantes regularmente inscritos que não sejam titulares do direito ao benefício. Seriam na verdade substitutos imediatos dos beneficiários. Esta previsão de extensão do benefício aos ocupantes está prevista no art. 3º� da MP. O que se discute em toda a medida provisória é sua constitucionalidade relativa à destinação de imóveis dos estados, Distrito Federal e municípios além de seus próprios. Mas os ocupantes mencionados poderiam ter um endereço certo, que seriam os imóveis funcionais. Porém, a lei 9.636/98 no seu art. 22-A, § 1º, já exclui da concessão especial de uso os imóveis funcionais.

8.3.9. Exercício da concessão em outro local: As previsões estão contidas nos artigos 4º e 5º da MP 2220/01. A transferência do beneficiário para outra área sempre foi motivo de discussão. Não se nega o direito que tem o beneficiário, mas o seu exercício é que é discutido. Por quê? Muitas vezes, a área ocupada tem um excelente valor comercial e termina beneficiando poucos. Porém, no entorno destas áreas, as comunidades ocupantes, que serão os futuros beneficiários, terminam operando economicamente numa determinada região.

Ou seja, fazem com que a renda que os sustenta seja oriunda de uma região ou área onde se insere o assentamento. Mas a MP deixa claro onde e como podem ser compelidos a exercer em outro local o direito. A primeira hipótese diz respeito às áreas de risco, prevista no art. 4º Sempre que as condições do local acarretarem risco à vida ou à saúde dos ocupantes, deverá o poder público garantir ao possuidor o exercício em outro local.

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Ou seja, o direito adere ao ocupante ou beneficiário. Esta hipótese não dá ao Poder Público a possibilidade de transferir ou não, é necessária a transferência para outro local, levando consigo o beneficiário o direito.

O art. 5º excepciona as hipóteses em que a remoção é uma liberalidade do poder público que está executando a intervenção de regularização, colocando a remoção como uma faculdade.

1. A primeira hipótese é nas áreas de uso comuns do povo: Sempre que houver uma ocupação nestas áreas, fica o poder público, dentro da conveniência e oportunidade, autorizado a regularizar onde se encontra o assentamento ou optar pela remoção.

É o caso dos equipamentos urbanos comunitários, ou imóveis com destinação especial, como escola, posto de saúde, praça, ruas, etc. Neste ponto, cabe apenas relembrar o exemplo de uma área supervalorizada em razão do seu entorno que abrigaria um número pequeno de famílias, que o mercado pagaria o suficiente para aumentar consideravelmente o empreendimento de assentamento em outro local;

2. áreas destinadas a projeto de urbanização: Sempre que houver áreas destinadas à urbanização, recomenda-se a remoção dentro da análise do mérito do ato administrativo. Sabemos que a remoção é por demais onerosa. Muitas vezes, a casa oferecida ao ocupante é de tamanho e qualidade inferiores à que ele tem, em qualquer das áreas passíveis de remoção, então ele reluta na transferência, criando empecilhos e constrangimentos.

3. Área de interesse da defesa nacional, da preservação ambiental e da proteção de ecossistemas naturais: apesar de constar no rol das possibilidades vinculadas ao mérito do ato administrativo, as hipóteses trazida no inciso III são de remoção e não liberalidade ao poder público de exercer em outro local. A questão relativa ao meio ambiente, apesar da anistia que a lei 11.977/09 trouxe, deve ser preservada por não tratar-se de área própria para o assentamento humano.

4. Reservada à construção de represas e obras congêneres; sem dúvida, nesta hipótese, o mérito do ato administrativo é que determinará ou não a remoção. A tendência é de remoção, pois um projeto da magnitude de uma represa ou outra obra gigantesca não admite outro comportamento senão o de remoção.

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Por isso, entendemos que os incisos III e IV não seriam casos de faculdade ao poder público de remover, mas sim o de remoção, sempre lembrando que em qualquer das hipóteses o direito adere ao beneficiário, indo com ele para onde for o imóvel que receberá em sub-rogação.

5. Situado em via de comunicação: Imagina-se a via de circulação sem circulação apenas com a sua projeção ou sem trânsito, pois seria impossível instalar-se no meio da via. Existem muitos casos relacionados com o planejamento urbano, que projeta vias que nunca existirão. Estas vias, via de regra, são ocupadas, pois são terrenos livres sem destinação. Ou modifica-se o planejamento viário ou então se removem as pessoas do local onde se encontram.

Na realidade, os artigos 4º e 5º da lei tratam dos casos específicos de remoção de assentamentos irregulares feitos em áreas públicas. Com relação às áreas privadas, as remoções ocorrerão sempre que houver risco à vida ou à saúde dos ocupantes, ou por determinação judicial.

8.3.10. Forma do título de concessão de uso especial151: O título é por termo administrativo, documento originário do poder público municipal ou estadual que tem a força de escritura pública em razão de estar revestido de fé pública. Sempre que configurar o direito, o ocupante ou beneficiário poderá requerer junto à administração respectiva a emissão do título. O que ocorre muitas vezes é a inércia do poder público em emitir o título. Para tanto, a MP estipulou o prazo de até doze (12) meses para a concessão contados do requerimento. Quando se tratar de imóveis da União ou dos estados, o requerimento deverá ser instruído com certidão municipal que ateste a localização do imóvel em área urbana e a sua destinação para moradia do ocupante e sua família. O título é registrado no registro de imóveis, já fazendo parte do elenco de direitos suscetíveis de registro.

8.3.11. No caso de recusa ou omissão do município, do Estado ou da União na concessão administrativa: Havendo esta recusa e passado o prazo de doze meses desde o requerimento, o beneficiário deverá ir a juízo reivindicar o seu direito. A sentença da lavra do judiciário é declaratória

151 Art. 6º O título de concessão de uso especial para fins de moradia será obtido pela via administrativa perante o órgão competente da Administração Pública ou, em caso de recusa ou omissão deste, pela via judicial.

§ 1º A Administração Pública terá o prazo máximo de doze meses para decidir o pedido, contado da data de seu protocolo.§ 2º Na hipótese de bem imóvel da União ou dos Estados, o interessado deverá instruir o requerimento de concessão de uso

especial para fins de moradia com certidão expedida pelo Poder Público municipal, que ateste a localização do imóvel em área urbana e a sua destinação para moradia do ocupante ou de sua família.

§ 3o Em caso de ação judicial, a concessão de uso especial para fins de moradia será declarada pelo juiz, mediante sentença.§ 4º O título conferido por via administrativa ou por sentença judicial servirá para efeito de registro no cartório de registro de

imóveis.

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do direito e serve para registrar o mesmo no registro imobiliário. Deverá a mesma ser instruída com o protocolo do pedido e, em se tratando de bens da União ou dos estados, deverá conter também a certidão do município referida no item anterior. O Código Civil de 2002 já trouxe com relação à concessão dispositivos como os previstos no art. 1.240, § 1º.

8.3.12. Transferência do direito de concessão de uso especial: É possível esta transferência, gratuita ou onerosa, tanto por atos inter vivos como causa mortis. A exigência que a legislação faz é com relação ao herdeiro que esteja morando no local; caso este requisito não seja preenchido, os ocupantes regularmente inscritos terão direito ao novo título. Com relação à transferência inter vivos, ela se opera da mesma forma como foi a concessão, ou seja, por termo administrativo. Os municípios, o Estado e a União devem regulamentar a forma como ocorrerá esta transferência, não sendo possível onerá-la, mas o novo adquirente do benefício deverá preencher os mesmos requisitos do concedido, ou seja, baixa renda e não possuir outro imóvel ou concessão.

8.3.13. Hipóteses de extinção da concessão de uso especial para fins de moradia e cancelamento do registro152: A lei criou duas hipóteses apenas para o cancelamento do registro e do benefício. A primeira hipótese tem relação com a destinação.

A destinação será apenas de moradia para si e sua família. Implica infração a este dispositivo legal, por exemplo, alugar o imóvel ou ceder seu uso a qualquer título; a outra hipótese diz respeito ao fato de o concessionário adquirir outra propriedade ou outra concessão sobre imóvel urbano ou rural. Na verdade, não pode haver propriedade. Em ambos os casos, mediante declaração feita pelo poder público concedente, o registro de imóveis deverá promover o cancelamento do registro. Então basta uma simples declaração do poder público para que o direito registrado seja cancelado.

8.3.14. Concessão de uso especial para fins comerciais: É possível e facultado ao poder público conceder o uso especial para fins comerciais. A hipótese está prevista no art. 9º da MP 2220/01. As condições para a concessão são as mesmas previstas para a concessão para fins de residência.

152 Art. 8º O direito à concessão de uso especial para fins de moradia extingue-se no caso de:I - o concessionário dar ao imóvel destinação diversa da moradia para si ou para sua família; ouII - o concessionário adquirir a propriedade ou a concessão de uso de outro imóvel urbano ou rural.Parágrafo único. A extinção de que trata este artigo será averbada no cartório de registro de imóveis, por meio de declaração

do Poder Público concedente.

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Somam-se as posses para a concessão.

Reconhece o legislador que muitas famílias utilizam imóveis comerciais nos assentamentos irregulares para abastecer do mínimo aquela comunidade. Seria injusto não conceder o título ao pequeno comércio, o que foi feito pelo legislador.

Não deixa claro se o concessionário pode ter uma concessão de residência e outra comercial. Na nossa ótica, sim. Não pode ter duas residências e duas comerciais, já que a concessão comercial é para o poder público uma faculdade e não consiste num direito como é a residencial. Assim, fica a critério da administração pública conceder ou não este título.

8.3.15. Resumo do título:

Local para concessão: Qualquer imóvel público.

Requisitos: área não superior a 250 m2, posse de cinco anos ininterrupta.. Baixa renda. Utilização como residência sua ou da família. Não possuir outro imóvel como propriedade ou concessão.

Concessão: Preenchidos os requisitos, é um direito.

Exercício do direito em outro lugar: A lei nos oferece duas vertentes: em área que cause risco à saúde ou à vida do ocupante, a remoção é obrigatória. Porém, a remoção é facultativa nas áreas públicas destinadas a equipamentos urbanos comunitários e áreas de uso comum do povo, além de áreas destinadas à urbanização, assim como nas APPs e áreas de segurança nacional.

Característica do direito: Gratuidade, possibilidade de sua cessão. Para fins de concessão coletiva, somam-se as posses dos antecessores. Este direito somente poderá ser utilizado quando não for possível identificar a parte de cada ocupante. Os ocupantes receberão frações ideais iguais, a não ser que a convenção firmada por eles estipule uma fração diferenciada para cada um. É facultado ao poder público conceder o título para fins de comércio.

Extinção do direito: São duas previsões: alterar a destinação ou adquirir outro imóvel urbano ou rural ou outra concessão.

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8.4. USUCAPIÃO constitutucional. Assim chamada em razão da sua previsão, que foi feita no art. 183153 da Constituição Federal. A autoaplicabilidade da regra constitucional ocorreu incontinente à promulgação da Carta Magna. Não foi necessário aguardar a regulamentação que viria a partir do Estatuto da Cidade, previsões de regulamentação constitucional constantes nos artigos 9º154 a 14º. Trouxe o Estatuto da Cidade diversas inovações com relação à usucapião especial. Uma delas diz respeito à aplicação da disposição constitucional do art. 6º, que trata do direito à moradia, que termina robustecendo os pedidos de usucapião especial.

8.4.1. Requisitos para adquirir por usucapião: Tanto o caput do artigo 183, quando o art. 9º do Estatuto da Cidade trazem a mesma disposição legal. O Estatuto da Cidade reproduziu as disposições constitucionais, e não poderia ser diferente. Avançou na regulamentação e no trato de outras questões referentes aos requisitos. São eles: (1) posse: O fundamental requisito para aquisição pela prescrição é a posse. Deve esta posse ser ininterrupta e sem oposição pelo prazo de prescrição de cinco (5) anos. (2) Área urbana: A usucapião de cinco anos com área de até 250m2 contempla imóveis localizados na zona urbana das cidades. O tratamento referente às áreas rurais onde a prescrição também é de cinco anos é para área de até 50 Ha, e a previsão está contida no Código Civil Brasileiro, art. 1.239155. (3) Utilização ou destinação: a destinação ou utilização do bem deve ser para residência do requerente ou de sua família; (4) único bem: Completa-se o requisito pelo fato de ser o único bem do requerente. Não pode haver outro em qualquer lugar, não obrigatoriamente no mesmo município, pois o caráter deste tipo de usucapião é puramente social.

8.4.2. Quais as áreas que posso usucapir e qual sua aplicação na regularização fundiária? Somente as áreas particulares são passíveis da prescrição aquisitiva. O parágrafo único do art. 183 da Constituição Federal

153 Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

154 Da usucapião especial de imóvel urbano

Art. 9º Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.§ 2º O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.§ 3º Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no

imóvel por ocasião da abertura da sucessão.

155 Código Civil. Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

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de 1988 proíbe a usucapião em áreas públicas. Logo, somente em ocupações em áreas particulares onde não houver a resistência do proprietário é que posso utilizar o instituto da usucapião. Com o advento da legitimação na posse, entendemos que a usucapião estará em desuso, como veremos ao tratar do novel instituto criado que se chama legitimação na posse.

8.4.3. Quem pode requerer a usucapião? O artigo 12156 do Estatuto da Cidade enumera a legitimidade ativa para requerer a usucapião. Claro que de uma forma ou outra estende esta competência pensando noutra modalidade de usucapião que existe, que é a coletiva, também criada com o advento da reforma urbana. (1) A primeira pessoa que pode requerer é o possuidor individual, mesmo que esteja ocupando outros lugares no processo como litisconsórcio originário ou superveniente. Em qualquer parte destas nominadas, estando o possuidor ocupando o espaço, pode requerer a usucapião em razão de sua posse. (2) Os condôminos são também legitimados para requerer a usucapião. A ação não tem que ser individual, pode ter em composse mais de um requerente em frações ideais definidas no processo de usucapião. (3) Como substituto processual, a associação de moradores da comunidade,além de estar regularmente constituída, deve ter autorização explícita dos representados para usucapir em seus nomes. Evidente que esta possibilidade que a lei trouxe diz respeito à usucapião coletiva, que tem as mesmas regras da concessão de uso especial para fins de residência coletiva.

8.4.4. Isonomia: A declaração de domínio será conferida ou deferida tanto ao homem quanto à mulher e, de preferência, a ambos, não importando o estado civil. Como nestes assentamentos temos muitas sociedades de fato, a questão do estado civil e do regime de bens deve ser revista o quanto antes. Muitos companheiros ou companheiras são casados, mas não regularizaram suas situações com a dissolução do vínculo do casamento. Apesar de o vínculo estar dissolvido com a constituição de uma nova família, o receio de aquisição em nome do ‘‘separado de fato’’ existe. Até porque na hipótese de alienação deverá haver obrigatoriamente a dispensa da outorga concedida judicialmente. Porém, a lei se inclina de maneira definitiva a eliminar esta isonomia, não possível na prescrição aquisitiva, mas possível na concessão de uso.

156 Art. 12. São partes legítimas para a propositura da ação de usucapião especial urbana:I � o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;II – os possuidores, em estado de composse;III � como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, regularmente constituída, com personalidade

jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados.

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8.4.5 Direito reconhecido apenas uma vez: A tendência da regularização jurídica de todos os títulos utilizados na regularização fundiária é o reconhecimento apenas uma vez. Porque a função da regularização fundiária é de cunho social, e não especulativo ou gerador de renda. Não serve os imóveis adquiridos ou concedidos como renda familiar. Eles têm que servir para residência, fator primordial na regularização.

8.4.6. Direito da sucessão na posse: Desde que o herdeiro legítimo resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão, terá direito a posse do ascendente.

8.4.7. Usucapião coletiva157: Como já afirmamos, se repete a regra da concessão de uso especial coletiva. Aplicável a usucapião coletiva as áreas superiores a 250 m2, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor. Neste caso, será atribuída a cada um uma fração ideal igual da área toda. Outro requisito é que nenhum dos condôminos sejam proprietários urbanos ou rurais.

8.4.7.1. Cessão de direitos de posse: Mais uma vez, a legislação repete o título anterior da concessão de uso especial. É possível a contagem de prazo com o antecessor, desde que a posse seja ininterrupta. Isso porque neste tipo de assentamento é comum a rotatividade. Entendemos que o legislador quis fechar o grupo ao prever a possibilidade de soma das posses. Nas outras modalidades de usucapião, o ordinário e extraordinário, é possível a soma de posse na usucapião individual. Já nesta modalidade de usucapião constitucional, somente na usucapião coletiva é possível a soma das posses.

8.4.7.2. Instituição do condomínio especial: Quando da sentença declaratória, o juiz deverá fixar a fração ideal igualitária para cada um dos copossuidores. A exceção é se houver pacto firmado entre os autores,

157 Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para

sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

§ 2º A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis.

§ 3º Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas.

§ 4º O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio.

§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os demais, discordantes ou ausentes.

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fixando frações ideais diferentes para cada um dos copossuidores. O limite desta fração ideal é a área de 250m2.

8.4.7.3. Extinção e administração do condomínio: O condomínio, chamado pela lei de especial, é indivisível. Porém, existe a possibilidade de deliberação por dois terços dos condôminos, este foi o quorum eleito pelo legislador para acabar com o condomínio especial. Também entendemos que este condomínio somente poderá ser constituído em parcelamento do solo, e jamais em hipóteses que caracterizam o condomínio edilício ou de casas. A administração do condomínio é feita por síndico, eleito com as regras previstas no Código Civil e lei 4.591/64, porém as deliberações da assembleia são por maioria simples dos presentes, obrando a todos os condôminos. Também inócua esta disposição com relação ao parcelamento do solo que seja resolvido pela usucapião coletiva, já que não há áreas comuns para administrar. Possível esta administração em condomínio edilício, porém neste, é possível a identificação das partes ideais. Logo, é uma letra morta escrita pelo legislador.

8.4.8. Litispendência e dependência�: Todas as ações possessórias e petitórias serão sobrestadas à ação de usucapião. Significa que, na tramitação da usucapião, a sua procedência, preenchidos os requisitos da prescrição, acaba com qualquer pedido oposto à aquisição prescritiva. As ações de usucapião devem ter a intervenção do Ministério Público, e a lei elege o rito como sumário, sendo que o rito sumário, no atual momento do poder judiciário, não é observado por falta de condições físicas de implementação. Afora isso, quando a usucapião for alegada como matéria de defesa, a sentença que reconhece a prescrição serve de título para registro no álbum imobiliário.

8.4.9. Isenção de custas e emolumentos registrais: De acordo com o art. 12, § 2º do Estatuto da Cidade, o autor da ação de usucapião constitucional goza do benefício da assistência judiciária gratuita, bem como a isenção de custas e emolumentos para o registro do mandado no registro imobiliário.

8.4.10. Resumo do título:

Aplicação: Áreas particulares.

Limite de área: 250 m2.

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Pode ser requerido na forma individual ou coletiva.

Admite a Associação de Moradores como substituto processual na forma coletiva.

Forma de aquisição: Judicial.

Cessão de Posse: Somente na forma coletiva, na forma individual não admite cessão.

Isenção de custas judiciais e de registro.

8.5. Termo de Concessão de Uso: É um título precário cuja concessão depende do mérito do ato administrativo. As limitações de concessão são postas pela lei 8.666/93. A precariedade do título inspira insegurança jurídica. Normalmente, por termo ou prazo o título é respeitado, mas por prazo indeterminado depende da vontade administrativa para sua manutenção ou resolução.

8.5.1. Limite de área: A lei limita a área apenas comercial para a permissão de uso em 250m2; no que tange a imóveis residenciais objetos de programas de regularização fundiária, este limite não existe, sendo possível utilizar o termo de permissão de uso para qualquer área158.

8.5.2. Dispensa de licitação: É dispensada a licitação. Na verdade, este título é utilizado para formalizar posse, sendo que a sua concessão pode ser gratuita ou onerosa. O tempo também é definido pela administração pública concedente. Têm-se notícias de utilização deste título para concessão de exploração de comércio, quiosques localizados em áreas públicas de uso comum do povo.

8.6. A Legitimação da posse�: Ousamos chamar de usucapião extrajudicial. A legitimação da posse sempre é derivada do auto de demarcação. Não pode o poder público servir-se deste título se não utilizar o auto de demarcação. Também com relação a imóveis públicos, entendemos que não é possível emitir a legitimação da posse. Isso porque os imóveis

158 Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

I -...... f ) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis

residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

h) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis de uso comercial de âmbito local com área de até 250 m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) e inseridos no âmbito de programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

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públicos são imprescritíveis, conforme determina o art. 183, § 3º. O auto de demarcação é possível de ser utilizado inclusive em áreas públicas. Porém, a administração deverá escolher outro título para substituir a legitimação de posse.

Esse nosso entendimento é claro com relação ao preceito constitucional. Até porque a legitimação de posse, assim como a imissão provisória na posse concedida em processos de desapropriação, são as duas modalidades de posse admitidas no registro de imóveis. O nosso sistema registral não contempla a recepção dos títulos com direito de posse para registro, em vez, por exemplo, do sistema registral português, em que a posse é recepcionada e no álbum imobiliário ela aguarda a prescrição aquisitiva, ou seja, o prazo para a usucapião.

Se o registro tem a finalidade de dar publicidade dos atos registrais e a partir da matrícula todos os direitos referentes ao imóvel são registrados, nada mais racional do que lançar o título de posse na matrícula do imóvel. O proprietário dominial que reivindique judicialmente a sua posse, caso a tenha perdido.

8.6.1. Isonomia entre homem e mulher: Pelos motivos já comentados anteriormente, a legitimação de posse será conferida preferencialmente à mulher, conforme preceitua o Art. 58, § 2º da Lei 11.977/09.

8.6.2. Obrigatoriedade do registro: No mesmo § citado anteriormente, o legislador determina o registro do título no registro de imóveis. Aliás, condição para a soma do tempo de cinco anos para que haja a possibilidade de conversão da legitimação de posse em propriedade. Diferentemente de outros títulos, a lei determina o registro deste.

8.6.3. As relocações: Mesmo originárias de um auto de demarcação, as relocações que houverem asseguram ao possuidor o direito à moradia, não ao título de legitimidade de posse, como ocorre com a concessão de uso especial para fins de moradia, em que o direito acompanha o concessionário, mesmo no caso de relocação. Esta previsão legal está disposta no § 3º do art. 58 da mesma lei.

8.6.4. Efeitos do título registrado: A legitimação de posse registrada no registro imobiliário constitui em favor do detentor a posse direta para fins de moradia159. Esta é a segurança jurídica que o título

159 Art. 59. A legitimação de posse devidamente registrada constitui direito em favor do detentor da posse direta para fins de moradia

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oferece. Os efeitos e princípios registrais geram diretamente o ato do registro. Ou seja, publicidade, eficácia, conservação, erga omnes, enfim fica a posse sobre o manto e princípios registrais, atribuindo oponibilidade erga omnes.

8.6.5. Condições para a concessão da legitimidade de posse: Qualquer intervenção deve partir de um princípio. No caso da regularização fundiária, este princípio é o conhecimento dos possuidores e da região. Com relação aos possuidores, este conhecimento se dá através do cadastramento160. Este cadastramento é necessário para abastecer o banco de dados do poder público que está intervindo na área. Então, em cima deste cadastramento é que serão gerados os títulos de legitimação de posse. O cadastramento qualifica o possuidor, sua posse e o imóvel ocupado. As hipóteses de não concessão do título são as seguintes: (a) o beneficiário não pode já ser concessionário, foreiro ou proprietário de outro imóvel, seja ele urbano ou rural; (b) O beneficiário não pode já ter recebido o título de legitimação de posse em outro local ou no próprio.

Os requisitos se aproximam da usucapião constitucional. Porém, este controle que o poder público deve fazer é que tem que ser severo. Sabemos da compra e venda de chaves e de pessoas que utilizam os programas habitacionais como fonte de renda. Para isso, imagina-se a criação de um controle de emissão de títulos e cadastramento por família.

Também a lei fala do coproprietário, que poderá receber a legitimação de posse, desde que exerça seu direito de propriedade em um lote individualizado e identificado no parcelamento registrado. Aqui seria efetivamente a usucapião extrajudicial, que termina por evitar a adjudicação compulsória, ou a própria usucapião para regularização161.

8.6.6. Conversão da legitimidade de posse em propriedade: Se 160 § 1o A legitimação de posse será concedida aos moradores cadastrados pelo poder público, desde que: (Renumerado

do parágrafo único pela Lei nº 12.424, de 2011)I - não sejam concessionários, foreiros ou proprietários de outro imóvel urbano ou rural; (Redação dada pela Lei nº 12.424, de

2011)II - não sejam beneficiários de legitimação de posse concedida anteriormente. (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)III - (revogado). § 2º A legitimação de posse também será concedida ao coproprietário da gleba, titular de cotas ou frações ideais, devidamente

cadastrado pelo poder público, desde que exerça seu direito de propriedade em um lote individualizado e identificado no parcelamento registrado. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

161 § 2º A legitimação de posse também será concedida ao coproprietário da gleba, titular de cotas ou frações ideais, devidamente cadastrado pelo poder público, desde que exerça seu direito de propriedade em um lote individualizado e identificado no parcelamento registrado. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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o imóvel possuir até 250 m2, o prazo é de cinco anos. Se o imóvel tiver mais de 250m2, o prazo é o mesmo da legislação da usucapião, ou seja, dez anos justo título e entre presentes, e quinze anos entre ausentes a qualquer título, sem oposição. Os requisitos para a conversão são os estipulados no art. 60, § 1º incisos I à IV, sendo que as certidões serão relativas à totalidade da área e serão fornecidas pelo poder público.

Estas certidões compreendem as do distribuidor judicial em que seja certificada a inexistência de ações em andamento que versem sobre a posse ou a propriedade do imóvel; declaração de que não possui outro imóvel urbano ou rural; declaração de que o imóvel é utilizado para sua moradia ou de sua família, e declaração de que não teve reconhecido anteriormente o direito à usucapião de imóveis em áreas urbanas162.

Como se nota, a maioria da documentação oriunda de declarações feitas sob as penas da lei, sendo a principal destas penas a perda do título.

8.6.7. A extinção da legitimidade de posse: As hipóteses de extinção, que é um ato unilateral do poder público, se dá conforme o caput do art. 60-A163, quando constatado que o beneficiário não se encontra na posse do imóvel. O cancelamento se dá no próprio registro de imóveis através da declaração do município.

É claro que o movimento seguinte seria cadastrar quem está ocupando o imóvel e identificar se se enquadra para a concessão de

162 Art. 60. Sem prejuízo dos direitos decorrentes da posse exercida anteriormente, o detentor do título de legitimação de posse, após 5 (cinco) anos de seu registro, poderá requerer ao oficial de registro de imóveis a conversão desse título em registro de propriedade, tendo em vista sua aquisição por usucapião, nos termos do art. 183 da Constituição Federal.

§ 1º Para requerer a conversão prevista no caput, o adquirente deverá apresentar: I � certidões do cartório distribuidor demonstrando a inexistência de ações em andamento que versem sobre a posse ou a

propriedade do imóvel; II � declaração de que não possui outro imóvel urbano ou rural; III � declaração de que o imóvel é utilizado para sua moradia ou de sua família; e IV � declaração de que não teve reconhecido anteriormente o direito à usucapião de imóveis em áreas urbanas. § 2º As certidões previstas no inciso I do § 1º serão relativas à totalidade da área e serão fornecidas pelo poder público. § 3o No caso de área urbana de mais de 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados), o prazo para requerimento da

conversão do título de legitimação de posse em propriedade será o estabelecido na legislação pertinente sobre usucapião. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

163 Art. 60-A. O título de legitimação de posse poderá ser extinto pelo poder público emitente quando constatado que o beneficiário não está na posse do imóvel e não houve registro de cessão de direitos. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

Parágrafo único. Após o procedimento para extinção do título, o poder público solicitará ao oficial de registro de imóveis a averbação do seu cancelamento, nos termos do inciso III do art. 250 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

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novo título. Porém, o desafio da regularização fundiária urbana é a fixação dos beneficiários no local, através da sua inserção social e econômica, deixando, então, após esta maioridade, que saiam do local para dar sequência a suas vidas e não ficar eternamente dependentes do poder público.

8.6.8. Resumo do título:

Principal característica: é um título precário que depende da prescrição aquisitiva para se consolidar.

É um título derivado? Sim, da intervenção do poder público numa área privada através do auto de demarcação.

É gratuito ou oneroso? A legitimação de posse é sempre gratuita.

Qual o tamanho da área que posso conceder o título? Qualquer área, a lei limita tempos diferentes para converter a legitimação em propriedade.

Qual o tempo de prescrição aquisitiva? Para imóveis até 250m2, o tempo é de cinco anos, para imóveis maiores de 250m2, o tempo é o mesmo da usucapião, dez e quinze anos.

Como se dá a extinção do título? Se o beneficiário deixar a posse do imóvel.

8.7. Doação com encargos: A doação com encargos depende de lei municipal autorizando o prefeito a conceder o título. Este título é feito por escritura pública, não sendo possível o termo administrativo. Pode ser concedido a qualquer tamanho de área, mas como afirmamos tem que ter a autorização legislativa.

8.7.1. Encargos: Com relação a encargos, a criação é da municipalidade. Por exemplo:

8.7.1.1. Encargos por termo: Pode a administração fixar o prazo de dez anos para que a pessoa fique residindo no local, não podendo locar nem transferir o imóvel, apenas em causa mortis.

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8.7.1.2. Encargos de participação: O poder público pode incluir nos encargos a participação do beneficiário em cursos de inclusão social, ou então em algum trabalho comunitário dentro da própria vila.

8.7.1.3. Revogação da doação: Sempre que houver termo ou encargos e algum deles não for cumprido, deverá o poder público revogar a doação, retornando o bem ao patrimônio público.

8.8. Promessa de compra e venda: Promessa de compra e venda é o contrato mais utilizado na compra e venda de imóveis. O poder público que faz um empreendimento imobiliário cujo título seja oneroso pode utilizar o contrato de promessa de compra e venda. As disposições sobre este contrato estão contidas nos artigos. 25 e 26 da Lei 6.766/79164.

Para falar sobre o contrato de promessa de compra e venda, que depende de autorização legislativa, precisaríamos do mesmo espaço até aqui utilizado. Nasceu a promessa de compra e venda com o parcelamento do solo, pois era a forma como vendiam lotes, em prestações, carnes, cadernetas, etc. É um pré-contrato, pois ele depende do aperfeiçoamento. Costumamos fazer o seguinte exemplo: a cada prestação que o promitente comprador paga, o promitente vendedor perde um pedaço da propriedade, até que não tenha mais nada, quando então deverá escriturar definitivamente o imóvel ao promitente comprador que cumpriu sua obrigação. A negativa de escrituração dá direito à adjudicação compulsória, ou seja, o juiz determina a transferência da propriedade ao promitente comprador.

8.9. Cessão de posse: É outro contrato possível de ser utilizado. A previsão legal diz respeito ao empreendimento que o poder público faz em que há a imissão provisória na posse, deferida pelo juiz no início do processo de expropriação. Somente depois de concluído o processo de desapropriação é que a propriedade será do município ou do Estado.Neste ínterim, o poder público pode emitir estes títulos de

164. Dos ContratosArt. 25. São irretratáveis os compromissos de compra e venda, cessões e promessas de cessão, os que atribuam direito a

adjudicação compulsória e, estando registrados, confiram direito real oponível a terceiros.Art. 26. Os compromissos de compra e venda, as cessões ou promessas de cessão poderão ser feitos por escritura pública ou por

instrumento particular, de acordo com o modelo depositado na forma do inciso VI do art. 18 e conterão, pelo menos, as seguintes indicações:

I - nome, registro civil, cadastro fiscal no Ministério da Fazenda, nacionalidade, estado civil e residência dos contratantes;II - denominação e situação do loteamento, número e data da inscrição;III - descrição do lote ou dos lotes que forem objeto de compromissos, confrontações, área e outras características;IV - preço, prazo, forma e local de pagamento bem como a importância do sinal;V - taxa de juros incidentes sobre o débito em aberto e sobre as prestações vencidas e não pagas, bem como a cláusula penal,

nunca excedente a 10% (dez por cento) do débito e só exigível nos casos de intervenção judicial ou de mora superior a 3 (três) meses;VI - indicação sobre a quem incumbe o pagamento dos impostos e taxas incidentes sobre o lote compromissado;VII - declaração das restrições urbanísticas convencionais do loteamento, supletivas da legislação pertinente.

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REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA

posse aos possuidores do imóvel. Finda a expropriação, a posse se transforma em propriedade. Num primeiro momento, é uma atitude de ofício do registrador, ou seja, não necessita a provocação judicial, já que a sentença de desapropriação serve de transferência da propriedade. Estas previsões legais estão contidas no art. 26,§§§ 4, 5 e 6165.

165. Art. 26...§ 3º Admite-se, nos parcelamentos populares, a cessão da posse em que estiverem provisoriamente imitidas a União, Estados, Distrito Federal, Municípios e suas entidades delegadas, o que poderá ocorrer por instrumento particular, ao qual se atribui, para todos os fins de direito, caráter de escritura pública, não se aplicando a disposição do inciso II do art. 134 do Código Civil. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

§ 4º A cessão da posse referida no § 3º, cumpridas as obrigações do cessionário, constitui crédito contra o expropriante, de aceitação obrigatória em garantia de contratos de financiamentos habitacionais. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

§ 5º Com o registro da sentença que, em processo de desapropriação, fixar o valor da indenização, a posse referida no § 3º converter-se-á em propriedade e a sua cessão, em compromisso de compra e venda ou venda e compra, conforme haja obrigações a cumprir ou estejam elas cumpridas, circunstância que, demonstradas ao Registro de Imóveis, serão averbadas na matrícula relativa ao lote. (Incluído pela Lei nº 9.785, de 1999)

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