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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS GEOGRÁFICAS
LICENCIATURA EM GEOGRAFIA
JOSÉ RAFAEL DE LIMA
ENTRE OS RISCOS NATURAIS E OS DESASTRES SOCIOAMBIENTAIS: EXERCÍCIO SOBRE AS
CONDIÇÕES DE VULNERABILIDADE NA CIDADE DO RECIFE
RECIFE
2015
JOSÉ RAFAEL DE LIMA
ENTRE OS RISCOS NATURAIS E OS DESASTRES SOCIOAMBIENTAIS: EXERCÍCIO SOBRE AS
CONDIÇÕES DE VULNERABILIDADE NA CIDADE DO RECIFE
Trabalho apresentado à Coordenação do Curso de Geografia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do título de Licenciado em Geografia
Orientador: Profª Dra.Edvânia Torres Aguiar Gomes
RECIFE 2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS GEOGRÁFICAS
LICENCIATURA EM GEOGRAFIA
FOLHA DE APROVAÇÃO
JOSÉ RAFAEL DE LIMA
ENTRE OS RISCOS NATURAIS E OS DESASTRES SOCIOAMBIENTAIS: EXERCÍCIO SOBRE AS CONDIÇÕES DE VULNERABILIDADE NA CIDADE
DO RECIFE
Trabalho apresentado à Coordenação do Curso de Geografia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito obrigatório para obtenção do título de Licenciado em Geografia. Recife, 23 de Fevereiro de 2015
____________________________________________________ Orientadora: Profª Dra. Edvânia Torres Aguiar Gomes - UFPE
____________________________________________________ Profª Mariana Zerbone Alves de Albuquerque – UFRPE
____________________________________________________ Profº Gevson Andrade – UPE
Dedico este trabalho a minha mãe, Sra. Josefa Maria de Lima, que em toda a sua vida fez todos os esforços, mesmo com a distância, para que eu e minha irmã pudéssemos atingir nossos objetivos.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter atingido mais um objetivo e conseguir concluir minha segunda graduação.
Agradeço aos meus pais, Sr. José Sebastião e Sra. Josefa Maria, por todo o apoio que sempre me deram na conquista dos meus objetivos, sempre com seus incentivos.
Agradeço minha irmã Ana Rafaela, sempre prestativa e companheira, principalmente nos momentos mais difíceis.
A ProfªEdvânia Torres pelo apoio e orientação neste trabalho e na área de Geografia Urbana.
A Universidade Federal de Pernambuco por ter me dado mais uma oportunidade de conseguir alcançar meus objetivos e sempre melhorar meus conhecimentos.
A Fábio Lelis pela ajuda e apoio dado nos momentos de maior sufoco principalmente na realização deste trabalho e na conclusão do curso.
Aos colegas e professores do curso de Licenciatura em Geografia pela construção coletiva do conhecimento.
Aos meus gerentes da Regional Sul da Secretaria Executiva de Defesa Civil da Prefeitura da Cidade do Recife, Selma Borges e ErmesonSuame, pelo apoio dado nos momentos difíceis e durante o curso.
Aos meus amigos e colegas de Secretaria Executiva de Defesa Civil da Prefeitura da Cidade do Recife, em especial a Taciara Dutra e Cynthia Tenório da regional Sul e a Keila Ferreira, gerente geral de atenção social, pelo apoio, ajuda e orientações durante mais esta trajetória.
Visto que o processo de produção do conhecimento é coletivo, a constituição da
Geografia Urbana deve ser colocada nessa perspectiva.
Ana Fani
RESUMO
LIMA, José Rafael de. Entre os Riscos Naturais e os Desastres Socioambientais: exercício sobre condições de vulnerabilidade na cidade do Recife. Trabalho de conclusão do curso de Licenciatura em Geografia – Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2015.
O processo acelerado de urbanização ocorrido no Brasil durante a segunda metade do século XX não veio acompanhado de investimentos em infraestrutura nas cidades brasileiras, acarretando grandes problemas urbanos. O objetivo deste trabalho é apresentar a realidade das ocupações nas áreas de morro do Recife assim como as ações que vem sendo realizada para se minimizar os problemas relativos a essa ocupando como forma de diminuição dos riscos ambientais. A ocupação de áreas ambientalmente frágeis, como margens de rios e nos morros com declives acentuados, realizada pela população de baixa renda gera o surgimento de assentamentos subnormais, constituída por habitações precárias e com a ausência de infraestrutura urbana como saneamento ambiental, coleta de resíduos sólidos, além da precarização dos serviços sociais como saúde e educação. Os investimentos nos programas habitacionais durante o governo militar e no atual momento ainda não conseguiram suprir o alto déficit habitacional, assim como melhorar significativamente as infraestruturas das localidades já consolidadas. Alguns marcos jurídicos foram implementados durante as últimas décadas, tendo o Estatuto da Cidade a principal lei federal que trata da Política Urbana e os Planos Diretores Municipais a principal lei municipal ao qual as cidades podem implementar o processo de planejamento e gestão do solo urbano. Diante dos grandes problemas enfrentados pela população de baixa renda residentes nas áreas ambientalmente frágeis localizadas em morros, decorrentes da forma inadequada de ocupação, ocasionando principalmente os deslizamentos de barreiras, ainda pode-se levantar alguns mecanismos que possibilitam um monitoramento e mesmo minimização de acidentes. O Recife possui um grande histórico de deslizamentos, mas que vem sendo revertido com a implementação de ações estruturais e não-estruturais que tem evitado a ocorrência de grandes desastres. A diminuição dos fatores de risco tem sido um dos objetivos a serem alcançados no intuito de se evitar a ocorrência de vítimas nesses desastres.
Palavras-Chave: Geografia Urbana. Área de Risco. Vulnerabilidade. Recife.
ABSTRACT
LIMA,JoséRafael. The Environmental Risks and Social Vulnerability: Case study by Occupancy of Recife hill areas. Geography Course Final Paper-FederalUniversity of Pernambuco.Recife,2015.
The accelerated process of urbanization that happened in Brazil during the second half of the twentieth century did not come accompanied by investments in infrastructure in Brazilian cities, leading to major urban problems. The objective of this paper is to present the reality of occupations in the hill areas of Recife as well as the actions that have been performed to minimize the problems related to this occupation as a way to reduce environmental risks. The occupation of environmentally fragile areas such as riverbanks and in the hills with steep slopes, held by the low-income population generates the emergence of substandard settlements, consisting of substandard housing and with the lack of urban infrastructure such as: environmental sanitation, solid waste collection in addition to the precariousness of social services like health and education. Investments in housing programs during the military government and currently have not meet the high housing deficit yet, as well as significantly improve the infrastructure of the locations already consolidated. Somelegal frameworkshave been implementedduringthepast decades havingCity Statutethemainfederal law thatdeals with theUrban Policyand the MunicipalMaster Plansthe mainmunicipal lawto whichcities canimplementthe process ofplanning andurban landmanagement. Given the major problems faced by low-income residents in environmentally fragile areas located on hills, resulting from inadequate occupation, mainly causing landslides barriers, still can raise some mechanisms which enable monitoring and even minimizing accidents. Recife has a long history of landslides, but that has been reversed with the implementation of structural and non-structural actions that have avoided the occurrence of major disasters. The reduction of risk factors has been one of the objectives to be achieved in order to avoid the occurrence of victims in these disasters.
Keywords: UrbanGeography. Risk Area. Vulnerability.Recife.
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 – Ciclo de Gestão da Defesa Civil......................................... 48 Figura 02 – Ação Estrutural - Obras de Contenção de Encosta........... 49 Figura 03 – Ação Não-Estrutural – Ação Informativa nas Escolas........... 50 Figura 04 – Área atingida pela enchente em Palmares........................ 51 Figura 05 – Mapa de Risco do Recife................................................... 53 Figura 06 – Setorização dos Pontos de Risco Zona Norte e Zona Sul do Recife............................................................................................................. 54 Figura 07 – Vulnerabilidade e suas interações...................................... 55 Figura 08 – Área vulnerável a desastre – Realização de Monitoramento... 56 Figura 09 – Diagrama de Desastre Natural............................................ 58 Figura 10 – Mapa de Localização da Cidade do Recife............................ 61 Figura 11 – Mapa de relevo........................................................................ 62 Figura 12 – Climograma do Recife........................................................ 64 Figura 13 – Mapa hidrográfico....................................................................... 66 Figura 14 – Mapa do Recife no século XVI................................................... 67 Figura 15 – Vista de Olinda para o Porto do Recife no século XVII....... 68 Figura 16 – Cidade Maurícia em 1644....................................................... 69 Figura 17 – Mapa geral da cidade do Recife, com as vilas construídas pela Liga Social Contra o Mocambo de 1939 e 1942.................................... 73 Figura 18 – Mocambos do Recife 70..................................................... 73 Figura 19 – Mapa das Zonas Especiais de Interesse Social do Recife..... 86 Figura 20 – Ocupação desordenada em área ambientalmente frágil no Bairro da Guabiraba, Zona Norte do Recife................................................ 88 Figura 21 – Mapa Geológico do Recife....................................................... 90 Figura 22 – Residência em situação de Risco Muito Alto............................. 91 Figura 23 – Presença de Lixo despejado diretamente no talude............ 92 Figura 24 – Cano de Águas servidas diretamente sobre a barreira............. 92 Figura 25 – Deslizamento de Barreira na Lagoa Encantada em 2010....... 94 Figura 26 – Abordagem nos Morros - Ciclo de Intervenção.......................... 95 Figura 27 – Ações Estruturais de Retaludamento no Bairro do Jordão...... 96 Figura 28 – Obra de Contenção e Drenagem no Bairro do Jordão.......... 97 Figura 29 – Colocação de Lona Plástica em área de risco...................... 98 Figura 30 – Aplicação de Gel Impermeabilizante em área de risco......... 98 Figura 31 – Ação Porta-a-porta na localidade de Costa Porto, Bairro do Jordão....................................................................................................... 99 Figura 32 – Ação Informativa na Escola...................................................... 100 Figura 33 – Oficina de Capacitação do Nudec-Jovem............................. 101
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 – População Brasileira.............................................................. 27 Tabela 02 – Índice de Urbanização.............................................................. 27 Tabela 03 – Sistema Financeiro da Habitação (1964-1986) Produção de Unidades Habitacionais por períodos.................................. 30 Tabela 04 – Necessidades Habitacionais conforme o Plano Nacional de Habitação.................................................................................................. 36 Tabela 05 – Distribuição dos municípios conforme a quantidade de seus moradores (2014)........................................................................................ 39 Tabela 06 – Liga Social Contra os Mocambos – Casas Projetadas, construídas e a construir....................................................................... 74 Tabela 07 – População do Recife................................................................. 77 Tabela 08 – Características dos Domicílios Particulares Ocupados - Situação de aglomerados subnormais........................................................ 79 Tabela 09 – Condição de ocupação do domicílio........................................ 79 Tabela 10 – Forma de abastecimento de água.......................................... 80 Tabela 11 – Tipo de Esgotamento Sanitário.............................................. 81 Tabela 12 – Destino do Lixo.................................................................. 82 Tabela 13 – Existência de Energia Elétrica................................................. 82 Tabela 14 – Características e localização predominantes do sítio urbano... 87
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 – População Brasileira........................................................... 26 Gráfico 02 – Evolução da Taxa de Urbanização................................... 27 Gráfico 03 – Déficit Habitacional no Brasil............................................. 38 Gráfico 04 – Evolução da População do Recife.................................... 77 Gráfico 05 – Mortes por Deslizamento........................................................ 93
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 – Classificação dos Riscos.................................................. 45 Quadro 02 – Principais ações do ciclo de gestão de risco e gerenciamento de desastres............................................................................................. 48 Quadro 03 – Definição dos Níveis de Risco.......................................... 52 Quadro 04 – Classificação dos desastres quanto a sua intensidade, evolução e origem....................................................................................... 59
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.................................................................................... 12
2. A URBANIZAÇÃO ACELERADA NO BRASIL............................... 18
2.1 Problemas Ambientais Urbanos...................................... 39
3. ENFOCANDO CONCEITOS.............................................................. 43
3.1 Risco Socioambiental................................................... 43
3.2 Susceptibilidade e Vulnerabilidade................................... 54
3.3 Desastres Socioambiental................................................. 57
4. O PROCESSO DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO NO RECIFE................................................................................................... 61
4.1. Caracterização Geral........................................................ 61
4.2 Caracterização Física do Recife........................................ 62
4.3 Síntese da Ocupação do Recife.......................................... 66
4.4 Caracterização Habitacional e Populacional do Recife.... 77
5. A ocupação irregular do solo nas áreas ambientalmente frágeis: Ocupando vazios..................................................................... 84
5.1 Caracterização da ocupação das áreas de Morro do Recife................................................................................................... 84
5.2 Problemas Urbanísticos da Ocupação dos Morros do Recife.................................................................................................... 87
5.3 Ações para enfrentar os problemas de Ocupação dos Morros............................................................................................ 94
5.3.1. Ações Estruturais............................................................ 96
5.3.2. Ações Não-estruturais................................................... 97
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................... 102
REFERÊNCIAS................................................................................... 104
APÊNDICE 01 – PLANO DE AULA
APÊNDICE 02 – EXERCÍCIO DIDÁTICO
12
1. INTRODUÇÃO O processo de ocupação das cidades brasileiras ensejou em modos de
ocupação do espaço urbano com características bem marcantes e bastante
particularizadas em relação à realidade local. Partindo do litoral, ainda durante
o período colonial, a ocupação do território brasileiro foi marcada pela
constituição de pontos estratégicos ao que concerne a questão político-
administrativa. Nas primeiras décadas, o modo de apropriação da nova terra
por parte dos portugueses se desenvolveu através de feitorias ao longo de
determinado trecho do litoral brasileiro, no intuito de explorar uma riqueza
natural então encontrada – pau-brasil. Algumas dessas feitorias deram no
momento seguinte à origem das primeiras aglomerações populacionais, se
tornando pontos estratégicos do ponto de vista econômico. O fator econômico
tendeu a influenciar ao longo dos séculos o modo de ocupação do espaço
brasileiro, principalmente ao que se refere às áreas urbanas, partindo da
escolha privilegiada de determinadas porções de terra, até a extensão da
ocupação territorial por parte de restritos grupos familiares, principalmente
durante o período colonial com as plantações de cana para a produção de
açúcar nos engenhos.
Dentro do processo de ocupação das cidades brasileiras, o ponto de
destaque se dá na rápida inversão da taxa de urbanização verificada na
segunda metade do século XX, em especial durante os censos de 1960 e
1970. A acelerada urbanização brasileira no século XX se baseia em alguns
fatores principais, dentre os quais a crescente industrialização de algumas
cidades se destaca, como no caso de São Paulo, que deixa de ser um simples
vilarejo no fim do século XIX para se tornar a principal cidade do país,
concentrando 5% de toda a população nacional no começo do século XXI, o
que vem a representar aproximadamente 10 milhões de habitantes de acordo
com dados do IBGE1 apenas na capital paulista, e um montante de 18 milhões
em sua Região Metropolitana. A rápida industrialização de São Paulo resultou
em diversos processos urbanos, dentre os quais, o êxodo rural e a forte
1 De acordo com o Censo Demográfico do IBGE realizado em 2010, o município de São Paulo possuía uma população de 11.253.503 habitantes. O Estado de São Paulo detinha uma população de acordo com o mesmo censo de 41.262.199 habitantes.
13
migração interna, com grandes contingentes populacionais advindos de outras
regiões do país, como do Nordeste; a expansão periférica da cidade, atrelado
ao crescimento desordenado, com falta de infraestrutura básica (serviços
urbanos como as redes de água, esgoto, energia, assim como de serviços
sociais de educação e saúde, entre outros).
Ao longo do século XX, o mesmo fenômeno verificado na cidade de São
Paulo pode ser presenciado em diversas outras cidades brasileiras, com maior
intensidade nas principais capitais como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto
Alegre, Salvador, Recife, Fortaleza e Brasília (esta última teve sua construção
efetivada a partir de 1956 com grande contingente populacional advindo dos
diversos Estados do país, principalmente de nordestinos).
A cidade do Recife verificou na segunda metade do século, assim como
as demais cidades citadas anteriormente, o rápido crescimento urbano, com
uma população migrante das cidades menores do Estado de Pernambuco, com
o objetivo de alcançarem novas oportunidades de serviços e empregos. Desde
o período colonial, em decorrência do cultivo da cana para a produção de
açúcar nos engenhos espalhados pela atual Zona da Mata, o Estado sempre
teve destaque no cenário nacional, vindo sua capital a perder importância no
século XIX, com a entrada de novos produtos na cadeia produtiva, como o café
na Região Sudeste, fator que impulsionou o desenvolvimento do Estado de
São Paulo.
“O dinamismo da cidade, que era grande em princípios do século XIX,
começa a cair com a perda do dinamismo da economia açucareira e com o
surgimento da cultura do café, no Centro-Sul do País, transferindo-se o centro
dinâmico da economia para essa região.” (ALVES, 2009, pg.50)
Ao longo da segunda metade do século XX, diversas indústrias foram se
instalando em Recife e na sua Região Metropolitana, com a formação de
distritos industriais instalados ao longo dos grandes eixos de desenvolvimento,
como na BR-101 e na BR-232.
“O processo de industrialização do setor açucareiro, iniciado no final
do século XIX, as secas que afetaram o setor rural, sendo decisivas
as de 1915 e 1919, e o processo de industrialização experimentado
na cidade motivam uma grande migração de população “expulsa” do
campo ou em busca de emprego nas fábricas que se pretendiam
14
instalar, o que supõe absorver um grande contingente.” (ALVES,
2009, pg.53).
Do ponto de vista urbano, a primeira metade do século XX marcou
diversas transformações na configuração da cidade do Recife, com especial
destaque para a Reforma Urbana implementada no Bairro do Recife a partir de
1909. O processo então aplicado tinha como objetivo principal a modernização
do bairro com foco no embelezamento e higienização da cidade. A
preocupação habitacional e o direcionamento às populações de baixa renda
foram negligenciados durante esse período. Apenas na década de 1930, o
então governador Agamenon Magalhães cria um programa no intuito de
erradicar determinados tipos habitacionais, com baixa qualidade construtiva e
localizados em áreas com potencial imobiliário alto por se localizarem próximos
às áreas centrais, os denominados Mocambos (BONDUKI, 2014). Atrelado à
expansão industrial esta a necessidade de promover uma expansão da cidade
com a construção habitacional, vindo com a instalação de diversos conjuntos
habitacionais durante o período militar, através dos chamados Conjuntos
Habitacionais (COHABs) por meio da construção de diversas Unidades
Residenciais (UR’s) (BONDUKI, 2014; LIMA, 2012). A valorização das terras
nas áreas mais centrais da cidade e a ausência de terrenos em condições
ambientais favoráveis faz com que a população de baixa renda comece a
ocupar áreas cada vez mais distantes do centro e consequentemente,
ambientalmente frágeis.
O processo de urbanização do Brasil atrelado à baixa capacidade de
Planejamento Urbano dos entes governamentais resulta na soma constante de
problemas nas cidades brasileiras, tais como a baixa qualidade dos serviços
públicos como transportes, habitação, saneamento, saúde, educação, assim
como ausência de marcos regulatórios como legislação urbanística que
discipline o uso e ocupação do solo atrelado a uma fiscalização eficiente. Os
problemas nas cidades brasileiras decorrentes da falta de um planejamento
urbano efetivo resulta na ocupação de áreas com grandes vulnerabilidades
sociais e ambientais, vindo a ocasionar possíveis desastres com perdas
econômicas, sociais e principalmente de vidas humanas.
15
A estruturação de órgãos específicos como as Defesas Civis nas três
esferas de governo tem possibilitado nos últimos anos uma melhor organização
administrativa no enfrentamento dos problemas urbanos na tentativa de se
minimizar a ocorrência de desastres. Um marco importante decorre de diversos
desastres ambientais que resultou na perda de vidas humanos já neste século
como as enchentes ocorridas em 2008 em Santa Catarina, em 2010 em
Alagoas e Pernambuco, e os deslizamentos de terra ocorridos no Rio de
Janeiro entre os anos de 2010 e 2011. (Guia do Estudante – Atualidades, 2011,
pg.114)
A percepção do risco por parte da população também faz com que a
mesma comece a cobrar dos governos locais uma maior preocupação ao que
concerne a implementação de políticas públicas referentes à proteção e defesa
civil. De acordo com as diretrizes e princípios definidos na 2ª Conferência
Nacional de Proteção e Defesa Civil realizada em Brasília em Novembro de
2014:
A Proteção e Defesa Civil deve fazer parte do currículo escolar em
todos os níveis de ensino, sendo: a) incorporada na matriz curricular
como tema transversal e/ou capacitação, utilizando os agentes de
proteção e defesa civil como multiplicadores do conhecimento; b)
implementada à LDB e na matriz curricular dos municípios e dos
estados e demais políticas, nas três esferas de governo, respeitando
as peculiaridades municipais, estaduais e regionais; c) articulada
junto à universidade (pública e privada) e entidades de pessoas com
deficiência, a partir do fomento à formação continuada, pesquisa e
extensão, com ênfase na sustentabilidade planetária. (Princípio 82,
2ªCNPDC)
O processo de ocupação irregular do solo enseja alguns conceitos que
irão embasar o desenvolvimento do referido trabalho. Os principais conceitos
que consubstanciarão os processos antrópicos do solo, aos quais irão
influenciar a forma de tratamento e percepção dos condicionantes
socioambientais dizem respeito ao risco, vulnerabilidade e desastre, que irão
reverberar na forma como a população irá participar da gestão do risco
juntamente com os agentes governamentais, na tentativa de construção de
modelos de cidades resilientes.
16
A conceituação de risco de acordo com o Ministério da Integração
Nacional, do Governo Federal, se baseia nos conceitos básicos proposto pela
ONU (Organização das Nações Unidas), servindo de base no gerenciamento
de Risco.
Segundo a Secretaria Executiva de Defesa Civil do Governo Federal,
risco vem sendo conceituado como a “possibilidade de danos causados por
eventos físicos ou fenômenos da natureza ou atividade humana, que podem
resultar em perdas de vidas ou ferimentos, danos à propriedade, rupturas
sociais e econômicas ou degradação ambiental.” (Ministério das Cidades,
2008, pg.14)
A conceituação de risco está envolta em algumas definições
particularizadas de acordo com os fenômenos aos quais estarão relacionados.
Partindo da definição de riscos naturais como sendo os processos ou
fenômenos naturais que ocorrem na biosfera e podem resultar em danos,
podem ser classificados de acordo com sua origem em: geológicos,
hidrometeorológicos ou biológicos.
O presente trabalho tem como objetivo geral apresentar a realidade das
ocupações nas áreas de morro do Recife assim como as ações que vem sendo
realizadas para se minimizar os problemas relativos a essa ocupando como
forma de diminuição dos riscos ambientais.
Serão enfocados os seguintes objetivos específicos:
Conceituais
Apresentar os conceitos de risco, vulnerabilidade e desastre ambiental,
como forma de associar à realidade social da população que habita os
ambientes vulneráveis e com iminência da ocorrência de desastres.
Abordar teórica e empiricamente o entendimento do modo de ocupação
do espaço urbano na cidade do Recife.
Procedimentais
Discutir o processo de urbanização acelerada ocorrido no Brasil, assim
como as suas consequências para o espaço urbano;
Apresentar os principais problemas urbanos decorrentes da ocupação
de áreas ambientalmente frágeis;
17
Associar as práticas dos moradores das áreas de risco com a ocorrência
de desastres na cidade do Recife.
Atitudinais
Despertar nos alunos o senso crítico sobre o processo de ocupação do
espaço urbano;
Associar as formas de minimização de desastres com o seu ambiente
cotidiano;
Apresentar técnicas de como melhorar o meio urbano onde os alunos
residem com a inserção de novas práticas de preservação, objetivando a
diminuição de acidentes.
O trabalho está estruturado no capítulo 02 na conceituação de
urbanização, descrição do processo de urbanização ocorrido no Brasil e as
consequências dessa aceleração com apresentação dos principais problemas
urbanos, principalmente aqueles relacionados ao modo de ocupação do
espaço. O capítulo 03 irá enfocar nos conceitos de risco, vulnerabilidade e
desastres como forma de embasamento teórico para fundamentar os
problemas existentes no processo de ocupação das áreas ambientalmente
frágeis. O capítulo 04 irá abordar de forma descritiva a caracterização geral
com enfoque nas questões físicas, históricas, populacional e habitacional do
Recife. O capítulo 05 irá abordar a questão do risco existentes nas áreas de
encosta da cidade do Recife, assim como as ações estruturais e não-
estruturais que vem sendo realizadas pela prefeitura no intuito de se minimizar
a ocorrência de acidentes com vítimas na cidade. Por fim, as considerações
finais irão abordar de modo crítico os problemas decorrentes da falta de um
planejamento efetivo que possibilitou a existência de habitações em
assentamentos subnormais e a existência de riscos socioambientais
decorrentes das ocupações nas áreas ambientalmente frágeis.
18
2. A URBANIZAÇÃO ACELERADA NO BRASIL
O presente capítulo tem como objetivo apresentar a conceituação de
urbanização, descrição do processo de urbanização ocorrido no Brasil e as
consequências dessa aceleração com apresentação dos principais problemas
urbanos, principalmente aqueles relacionados ao modo de ocupação do
espaço. O capítulo irá enfocar de forma sucinta o processo de urbanização no
Brasil que veio resultar em alguns problemas ambientais urbanos, com
destaque para a ocupação de áreas ambientalmente frágeis como a encosta de
morros, resultando em graves desastres ao longo das últimas décadas.
A definição do processo de urbanização no Brasil parte da conceituação
inicial de urbanização como forma de delimitação temática. “Urbanização
refere-se ao aumento da porcentagem de população urbana em relação à
porcentagem da população rural” (TERRA, 2011, pg. 361). A mesma autora
ainda define como sendo “o processo de crescimento da população urbana em
ritmo mais acelerado que o crescimento da população rural. Esse processo
sinaliza a transição de um padrão de vida econômico apoiado na produção
agrícola para outro, baseado na indústria, no comércio e nos serviços”
(TERRA, 2011, pg. 358). “Em geografia, urbanização é um conceito
populacional que indica o crescimento da parcela da população que vive nas
cidades, em comparação com a das zonas rurais (GUIA DO ESTUDANTE –
ATUALIDADES, 2010, pg.55). Em outras áreas do conhecimento, a definição
de urbanização ganha novos conceitos, complementando a conceituação
definida em geografia. “Em arquitetura e urbanismo, refere-se aos recursos que
a cidade oferece, como água encanada, asfaltamento, aterro sanitário e
transportes públicos.Nesse sentido, urbanizar é dotar uma área de
infraestrutura urbana”(GUIA DO ESTUDANTE – ATUALIDADES, 2010, pg.38).
Para o IBGE, é considerada uma área como sendo urbana a sede dos
municípios (denominada cidade) e a sede dos distritos (denominada de vila),
independente do tamanho ou infraestrutura oferecida.
No Brasil é considerada zona urbana toda sede de município ou
distrito, não importando a concentração de pessoas que vivem no
local [...]. Assim, se um grupo pequeno de pessoas vive na sede de
19
um distrito, elas são consideradas população urbana,
independentemente da densidade populacional (total de pessoas por
área) e dos recursos que o local oferece (GUIA DO ESTUDANTE –
ATUALIDADES, 2010, pg. 38).
De ocupação inicial partindo do litoral, com a instalação de vilas ao longo
da costa brasileira, a população residente nesses núcleos urbanos ainda era
bastante incipiente face às condições de vida ali presentes. Até o século XIX
viver nas áreas rurais era o principal habitat da população brasileira. Apenas
com a virada do século e a melhoria das condições de infraestrutura das
cidades, as mesmas passam a ganhar destaque e servir de atração para a
população brasileira.
Alguns fatores contribuíram para o processo de urbanização no Brasil,
que decorre principalmente do chamado êxodo rural, ou seja, da migração
rural-urbana ocorrida com maior aceleração na segunda metade do século XX.
O êxodo rural decorre de alguns fatores como:
Industrialização das cidades;
Melhoria da infraestrutura urbana;
Trabalhador livre (decorrente do fim da escravidão e a
implantação de leis trabalhistas ainda na primeira metade do século XX);
Mecanização do campo;
Como explicado por Maricato (2002, pg.17),
[...] Considerando o universo das Américas, o Brasil já apresentava
cidades de grande porte desde o período colonial, mas é somente a
partir da virada do século XIX e das primeiras décadas do século XX
que o processo de urbanização da sociedade começa realmente a se
consolidar, impulsionado pela emergência do trabalhador livre, a
proclamação da República e uma indústria ainda incipiente que se
desenrola na esteira das atividades ligadas à cafeicultura e às
necessidades básicas do mercado interno.
A primeira metade do século XX ainda e marcada pela forte influência do
campo nas relações sociais, econômicas e políticas, a exemplo das relações
de poder na definição dos presidentes centrada na política do Café-com-Leite
(São Paulo – Minas Gerais). Com o início do processo de industrialização
20
verificado na década de 1930, o país começa a presenciar novos fenômenos,
principalmente ao que concerne o modo de vida da população. Os fatores
apresentados acima começam a se acelerar nesse período, em decorrência
dos problemas enfrentados pelo país diante da grave crise econômica
internacional, explodida em 1929 nos Estados Unidos, do pós Primeira Guerra
Mundial e eminência de uma Segunda Grande Guerra, que veio expor o
problema da dependência do país a produtos industrializados advindos do
exterior e impôs ao Brasil a necessidade de produção local aos produtos então
importados. A economia manteve seu epicentro no setor agrário exportador até
1930, quando ocorre o que Florestan Fernandes denomina de a
revolução burguesa no Brasil. O Estado passa então a investir
decididamente em infraestrutura para o desenvolvimento industrial
visando à substituição de importações. A burguesia industrial assume
a hegemonia política na sociedade sem que se verificasse uma
ruptura com os interesses hegemônicos estabelecidos. (MARICATO,
2002, pg. 17)
A população antes residente nas áreas rurais começa definitivamente a
migrar para os núcleos urbanos, principalmente para as regiões de maior
desenvolvimento do país, como o eixo centro-sul e as capitais dos Estados,
como Recife e Salvador, que já dispunham de certo desenvolvimento regional
desde o período colonial.
As indústrias da Região Sudeste, especialmente na cidade de São
Paulo, exerceram enorme poder para atrair a força de trabalho para
os centros urbanos. Mas regiões como o Centro-Oeste,
especialmente com a fundação de Brasília (1960), e o Sul também
possuem muitos habitantes nas cidades. Os menores níveis de
urbanização encontram-se na Amazônia e no Nordeste. (GUIA DO
ESTUDANTE – GEOGRAFIA, 2011, pg. 93)
As cidades começam a ganhar novos contornos com o aumento da sua
população e as novas atividades que passam a exercer. O advento de novos
meios de transporte com a chegada das ferrovias, e novos meios de
comunicação como o telégrafo e o telefone, possibilitaram novos horizontes
21
para os que residiam nas áreas urbanas, o que impulsionou o processo de
migração campo-cidade.
O processo de urbanização no mundo decorre da Revolução Industrial
desde o século XVIII e verificada principalmente no século XIX na Europa e nos
Estados Unidos, fazendo com que a população diante de novos desafios
começasse a migrar para as cidades atrás de novas perspectivas de vida. A
urbanização iniciada ainda nos fins do século XVIII possibilitou uma gradativa
modificação na estrutura urbana das cidades, que foram se adaptando ao
elevado contingente população que começavam a receber.
Na Europa, o desenvolvimento da indústria durou muito tempo e
levou a uma urbanização lenta, que permitiu maior planejamento no
crescimento das cidades, seja no projeto de áreas residenciais, seja
na construção de redes de água e esgoto, de eletricidade, de ruas e
avenidas, de linhas de trem e metrô, além de serviços públicos como
escolas, hospitais etc. (GUIA DO ESTUDANTE – ATUALIDADES,
2010, pg. 37)
Diferente do processo ocorrido nos países desenvolvidos, os países da
América Latina apresentam um processo de urbanização concentrado na
segunda metade do século XX, ocasionando sérios problemas urbanos, com o
inchaço das cidades que não apresentavam infraestrutura urbana e social
adequadas e não tiveram tempo suficiente para se adaptarem as novas
exigências advindas da população. “Nos atuais países em desenvolvimento, a
industrialização ocorreu de forma mais acelerada apenas após a II Guerra
Mundial, como é o caso do Brasil e provocou maior urbanização nos últimos 60
anos”. (GUIA DO ESTUDANTE – ATUALIDADES, 2010, pg. 37).
A intensificação do processo de urbanização no Brasil inicialmente
ocorre em algumas poucas cidades. Conforme descrito por SANTOS (2009)
apenas três cidades possuíam população superior a cem mil habitantes nos
anos de 1890: Rio de Janeiro com 522.651, Salvador com 174.412 e Recife
com 111.556 e São Paulo possuía apenas 64.934 habitantes. Mas ao passo de
10 anos, o crescimento populacional nessas cidades se avolumou, com São
Paulo chegando a crescer a cifras de aproximadamente 26% ao ano, chegando
a um contingente de 239.820 habitantes na virada do século XX e se tornando
22
a segunda maior cidade do país, apenas atrás da então capital da República, a
cidade do Rio de Janeiro.
Pode-se grosseiramente admitir que a base econômica da maioria
das capitais de estado brasileiras era, até o fim da Segunda Guerra
Mundial, fundada na agricultura que se realizava em sua zona de
influência e nas funções administrativas públicas e privadas, mas,
sobretudo públicas. É o que explica as oscilações indicadas ou uma
relativa estagnação do crescimento populacional, mediante
influências diretas do que se passava nas áreas não-urbanas. [...] Até
a Segunda Guerra Mundial, o peso das capitais no processo urbano e
na população urbana sobreleva, tanto do ponto de vista quantitativo
como qualitativo. (SANTOS, 2009, pgs. 27-28)
Santos ainda complementa enfocando a grande fragmentação
apresentada no país de dimensões continentais, com problemas de interligação
terrestre entre os principais pontos. A principal ligação realizada entre as
capitais dos Estados se realizava através do transporte marítimo, pois havia
uma grande ausência de estradas e as ferrovias começavam a ser construídas,
mas que não possibilitaram uma efetiva interligação nacional.
O Brasil foi, durante muitos séculos, um grande arquipélago, formado
por subespaços que evoluíam segundo lógicas próprias, ditadas em
grande parte por suas relações com o mundo exterior. Havia, sem
dúvida, para cada um desses subespaços, polos dinâmicos internos.
Estes, porém, tinham entre si escassa relação, não sendo
interdependentes. (SANTOS, 2009, pg. 29)
Aos poucos o país começa a apresentar certa integração nacional,
partindo primeiramente pelo eixo formado pelos Estados do Rio de Janeiro
(então capital federal), São Paulo e Minas Gerais (maiores produtores e
exportadores de café do país, em ascensão no final do século XIX), conforme
observado por Santos (2009, pg. 29). Este momento perdura quase inalterado
até os anos de 1930, quando começa a se verificar uma maior pulverização do
processo industrial para outros pontos do país.
23
[...] Não há como não reconhecer que a industrialização que se afirma
a partir de 1930 e vai até o fim da Segunda Guerra Mundial constituiu
um caminho de avanço relativo de iniciativas endógenas e de
fortalecimento do mercado interno, com grande desenvolvimento das
forças produtivas, diversificação, assalariamento crescente e
modernização da sociedade, como nota Caio Prado. (MARICATO,
2002, pg. 18)
A nação brasileira ainda se encontrava em construção e os
acontecimentos históricos externos como a crise de 1929 ocorrida nos Estados
Unidos e as duas Grandes Guerras Mundiais proporcionaram ao país grandes
avanços internos.
Em 1950, o processo de industrialização entra em nova etapa. O país
passa a produzir bens duráveis e até mesmo bens de produção. No
entanto, segundo Celso Furtado, com essa ‘nova dependência’ o
centro das decisões é cada vez mais externo ao país e seu epicentro
se distancia cada vez mais das necessidades internas. A
dependência se aprofunda em relação à fase anterior, e se amplia a
inserção subalterna do país na divisão internacional do trabalho.
(MARICATO, 2002, pg. 19)
Segundo a afirmação de Celso Furtado, exposta por Maricato, mesmo
com a industrialização do país, as ações externas tendem a influenciar de
forma mais direta os acontecimentos ocorridos no país, principalmente do
ponto de vista político. A dependência do país ás ações exteriores,
principalmente aos Estados Unidos e aos países europeus se aprofunda, e o
processo de industrialização se intensifica, acarretando na aceleração da
urbanização do país, verificado principalmente nas décadas de 1960 em diante.
De acordo com SANTOS (2009, pg,25), o processo de urbanização
começa a acelerar entre os anos de 1920 e 1940,
Se a urbanização pouco se alterou entre o fim do período colonial até
o final do século XIX e cresceu menos de quatro pontos nos trinta
anos entre 1890 e 1920 (passando de 6,8% a 10,7%), foram
necessários apenas vinte anos, entre 1920 e 1940, para que essa
taxa triplicasse, passando a 31,24%. A população concentrada em
24
cidades passa de 4,552 milhões de pessoas em 1920 para 6,209
milhões em 1940.
Os acontecimentos internacionais relatados acima no período entre
guerras acarretaram na aceleração demográfica apresentada no país e em
outros pontos do mundo. As novas relações trabalhistas advindas com a
formulação de diversas leis no Brasil, durante a década de 1930 possibilitou
uma nova dinâmica urbana, que veio resultar numa aceleração ainda maior nas
décadas seguintes, tanto dos pontos de vista político e econômico, quanto
demográfico e social.
SANTOS (2009, pg. 26) citando Rossini relatam o processo de
urbanização ocorrido em São Paulo e a chegada de novos serviços de
infraestrutura que passaram a atender a população,
No Estado de São Paulo, a expansão da urbanização nesse período
é marcante, com um crescimento de população urbana da ordem e
43%. Segundo Rossini (1988, pg.74), no final da década de 1920 [...]
a urbanização no interior, evoluindo de forma acelerada e atomizada,
foi reforçada pelo movimento de capitais mercantis locais propiciando
investimentos de origem privada de companhias de energia, de
telefone, de meios de transporte, bancos, instituições de ensino etc.
As décadas seguintes presenciam um novo momento na urbanização
brasileira com o fenômeno da aceleração econômica, marcada pelo avanço no
processo de industrialização que ganhou novas vertentes, passando a abarcar
áreas que antes não trabalhavam dentro do processo fabril. Avanços em obras
de infraestrutura também marcaram o desenvolvimento econômico do país,
com a construção de grandes rodovias interligando diferentes pontos do Brasil,
assim como obras urbanas nas grandes cidades brasileiras, associada a
amplos projetos habitacionais, principalmente no período militar.
De 1940 a 1980, o PIB brasileiro cresceu a índices superiores a 7%
ao ano, um dos maiores do mundo no período. A riqueza gerada
nesse processo permaneceu concentrada, embora mesmo com a
concentração da renda, o alto grau do crescimento econômico tenha
influído na melhoria da qualidade de vida de toda a população,
25
especialmente aquela que abandonou o campo buscando melhores
oportunidades nas cidades. (MARICATO, 2002, pg. 20)
O rápido crescimento econômico possibilitou uma maior migração da
população para certas áreas como visto anteriormente, no caso da migração
campo-cidade, migração para as capitais e principalmente para as cidades de
São Paulo e Rio de Janeiro. No período de 40 anos, o Brasil presenciou um
acelerado processo de urbanização que resultou no inchaço das cidades e o
agravamento dos problemas urbanos, principalmente os relacionados com a
ausência de infraestrutura e as questões de habitação.
Até a Segunda Guerra Mundial, o peso das capitais o processo
urbano e na população urbana sobreleva, tanto do ponto de vista
quantitativo como qualitativo. [...] O Brasil foi, durante muitos séculos,
um grande arquipélago, formado por subespaços que evoluíam
segundo lógicas próprias, ditadas em grande parte por suas relações
com o mundo exterior. Havia sem dúvida, para cada um desses
subespaços, pólos dinâmicos internos. Estes, porém, tinham entre si
escassa relação, não sendo interdependentes. (SANTOS, 2009,
pg.28-29)
Dentro da formação econômica brasileira, o processo de industrialização
apresentado pelo país, sobretudo a partir da segunda metade do século XX,
proporcionou uma nova dinâmica para as cidades, vindo a significar não
apenas a instalação de indústrias em pontos estratégicos do território, mas
uma verdadeira mudança no sentido de país. Os subespaços citado por Santos
no parágrafo acima começa a se inter-relacionarem a partir do momento em
que a infraestrutura do país passa a ser instalada.
A partir dos anos 1940-1950, é essa lógica da industrialização que
prevalece: o termo industrialização não pode ser tomado, aqui, em
seu sentido estrito, isto é, como criação de atividades industriais nos
lugares, mas e sua mais ampla significação, como processo social
complexo, que tanto inclui a formação de um mercado nacional,
quanto os esforços de equipamento do território para torná-lo
integrado, como a expansão do consumo em formas diversas, o que
impulsiona a vida de relações (leia-se terceirização) e ativa o próprio
processo de urbanização. Essa nova base econômica ultrapassa o
26
nível regional, para situar-se na escala do país; por isso, a partir daí,
uma urbanização cada vez mais envolvente e mais presente no
território dá-se com o crescimento demográfico sustentado das
cidades médias e maiores, incluídas, naturalmente, as capitais de
Estados. (SANTOS, 2009, pg. 30)
A partir desse momento citado por SANTOS (2009), as políticas
implementadas durante os governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek,
proporcionaram a mudança de rumo na situação do país, que passou de
agrícola e rural para um país industrial e urbana, fato ratificado durante o
Regime Militar com a expansão das políticas voltadas as grandes obras de
infraestrutura. Entre 1940 e 1980, dá-se verdadeira inversão quanto ao lugar de
residência da população brasileira. Há meio século atrás (1940), a
taxa de urbanização era de 26,35%, em 1980 alcança 68,86%.
Nesses quarenta anos, triplica a população total do Brasil, ao passo
que a população urbana se multiplica por sete vezes e meia.
(SANTOS, 2009, pg.31)
Fonte: Dados Censitários - IBGE
020406080
100120140160180
1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010
28,3 33,2 38,9 41,6 39,1 36,0 31,8 29,812,9 18,8
32,0
52,9
82,0
110,8
137,8
160,9
Popu
laçã
o (m
ilhõe
s/ha
b)
Anos do Censo do IBGE
Gráfico 01 - População Brasileira
Rural
Urbana
27
Tabela 01 – População Brasileira
População Total População Urbana Índice de Urbanização 1940 41.326.000 10.891.000 26,35 1950 51.944.397 18.782.891 36,16 1960 70.992.343 32.004.817 45,08 1970 94.508.583 52.904.744 55,98 1980 121.150.573 82.013.375 67,70 1991 146.917.459 110.875.826 75,47 2000 169.590.693 137.755.550 81,23 2010 190.755.799 160.925.792 84,36
Fonte: Dados Censitários - IBGE
Fonte: Dados Censitários - IBGE
Tabela 02 – Índice de Urbanização
Ano Pop. Urbano Pop. Rural 1940 26,35 73,65 1950 36,16 63,84 1960 45,08 54,92 1970 55,98 44,02 1980 67,70 32,30 1991 75,47 24,53 2000 81,23 18,77 2010 84,36 15,64
Fonte: Dados Censitários – IBGE
26,35
36,16
45,08
55,98
67,7075,47
81,23 84,36
73,65
63,84
54,92
44,02
32,3024,53
18,77 15,64
0,00
10,00
20,00
30,00
40,00
50,00
60,00
70,00
80,00
90,00
1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010
Perc
entu
al
Anos do Censo do IBGE
Gráfico 02 - Evolução da Taxa de Urbanização
Pop. Urbano
Pop. Rural
28
Como visto no gráfico acima, o país começa apresentar um aumento na
sua taxa de urbanização com maior intensidade a partir da década de 1960,
onde verifica-se uma inversão da população que residia nas áreas rurais
passando de 54,92% em 1960 para 44,02% em 1970, enquanto as taxas
referentes a população urbana apresentam um aumento passando de 45,08%
em 1960 para 55,98% na década seguinte.
Esse crescimento global foi acompanhado de uma reversão da
proporcionalidade entre população rural e população urbana (na
definição dada pelo IBGE), com seu ponto de inflexão nos anos de
1960. A curva da população urbana, que tinha começado seu
crescimento mais rápido na década precedente, em função do
crescimento vegetativo dos citadinos e do êxodo rural, interceptou a
curva da população rural, que iniciava uma lenta descida. (THÉRY,
2009, pg.92)
Entre os anos de 1940 e 1991, de acordo com os dados censitários do
IBGE representado na Tabela 02, a taxa de urbanização cresce numa média
de 10% no período intra-censitário. A segunda metade do século XX até os
dias atuais pode-se verificar inúmeras mudanças dentro das cidades
brasileiras, principalmente com a implantação de programas e projetos voltados
para o desenvolvimento dessas cidades. Mesmo diante das iniciativas tomadas
durante o período, ainda verifica grandes problemas urbanas em decorrência
de equívocos no modelo de planejamento então adotado, vindo a ocasionar
ainda grandes déficits no setor habitacional e nas infraestruturas então
instaladas.
Primeiramente, uma nova politica econômica marca o país com a
instalação do Regime Militar em 1964, vindo a modificar a estrutura social e
urbana do país, que já vinha ganhando novos contornos desde a era Vargas
com o processo de industrialização do país. Do ponto de vista urbano, e como
caminho para desmistificar a frieza dada pelo sistema político então instalado,
e com isso ganhar apoio da população, é estruturado dentro do governo federal
políticas de investimento em infraestrutura associada a criação de programas
habitacionais no intuito de se diminuir o alto déficit habitacional instalado no
29
país, principalmente face a aceleração da urbanização presenciada no período
de 1940 em diante.
O golpe de Estado de 1964 todavia aparece como um marco, pois foi
o movimento militar que criou as condições de uma rápida integração
do País a um movimento de internacionalização que aparecia como
irresistível, em escala mundial. A economia se desenvolve, seja para
atender a um mercado consumidor em célere expansão, seja para
responder a uma demanda exterior. (SANTOS, 2009, pg. 39)
Complementando a citação feita por Santos, Bonduki retrata a questão
habitacional no tocante de tentativa de aproximação do regime então instalado
com a opinião pública.
O novo quadro político imposto pelos militares em 1964, com o apoio
das elites conservadoras do país e do governo norte-americano,
particularmente interessado em bloquear os governos progressistas
na América Latina, representou um ponto de inflexão muito
importante na ação do Estado brasileiro na questão habitacional.
(BONDUKI, 2014, pg. 63)
Como forma de suprir o grande déficit habitacional no país, em
decorrência da aceleração do processo de urbanização verificado acima
através das taxas do IBGE, o governo militar, ainda em 1964 implanta o
Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU) e cria em agosto
daquele ano o Banco Nacional de Habitação – BNH, como agente financiador
do Sistema Financeiro de Habitação – SFH, formulado desde o segundo
governo Vargas (BONDUKI, 20140).
As iniciativas do novo regime procuravam, por um lado, angariar
apoio entre as massas populares urbanas, segmento que era uma
das principais bases de sustentação do populismo afastado do poder,
e, por outro, criar uma política permanente de financiamento, capaz
de estruturar em moldes capitalistas o setor da construção civil
habitacional, objetivo que acabou por prevalecer. (BONDUKI, 2014,
pg. 63)
30
O país presenciou durante o período de funcionamento do Sistema
Financeiro de Habitação – SFH (1964-1986) o maior programa habitacional
implementado até então. Mesmo diante das críticas ao que concerne o modelo
de planejamento então adotado, aos quais os projetos executados não
contemplavam diversos investimentos em infraestrutura e geralmente
localizados em áreas bastante afastadas dos grandes centros urbanos, com a
constituição de bairros distantes que dificultavam os deslocamentos da
população. Durante o período de vigência do Sistema Financeiro da Habitação
foram construídas mais de 2,3 milhões de habitações em todo o Brasil,
concentradas principalmente nas grandes cidades das Regiões Metropolitanas,
mas também pulverizadas em loteamentos realizados em cidades de pequeno
e médio porte.
Tabela 03 – Sistema Financeiro da Habitação (1964-1986) Produção de Unidades Habitacionais por períodos
Período Presidente Habitação Popular
Cohab Outros Cooperativas Total de
Habitação Popular
1964-1969 Castelo Branco 178.895 64.727 61.223 304.845 1970-1974 Garrastazu Médici 77.902 55.833 100.227 233.962 1975-1979 Ernesto Geisel 593.777 31.134 178.008 802.919 1980-1984 João Figueiredo 655.888 112.842 156.493 925.223 1985-1986 José Sarney 71.402 19.984 14.656 106.042 Total 1.577.864 284.520 10.607 2.372.991
Fonte: Bonduki, 2014
A partir do final da década de 1970 e durante toda a década de 1980 o
país presencia um grande recessão econômica, atrelada a alta inflação e
endividamento externo, impossibilitando o andamento de diversas políticas de
cunho desenvolvimentista implementadas no país desde os anos de 1950 e em
especial as desenvolvidas durante o Regime Militar, como o caso da política
habitacional, que viu o Sistema Financeiro da Habitação entrar em falência e
obrigado a ser extinto durante o governo Sarney em 1986.
A crise do modelo econômico implementado pelo regime militar, a
partir do início dos anos 1980, gerou recessão, aumento de
31
desemprego e queda dos níveis salariais. Esse processo teve enorme
repercussão no Sistema Financeiro da Habitação, provocando forte
redução da sua capacidade de investimento e grande inadimplência.
Em um clima de mobilização popular pela redemocratização, as
críticas ao Banco Nacional de Habitação se acirraram, articulando-se
com a luta contra o regime autoritário ao qual a instituição estava
muito associada. (BONDUKI, 2014, pg. 82)
As cidades começam a mudar seu padrão de ocupação ganhando novos
arranjos urbanísticos. A estrutura das grandes cidades passa por formulações,
com aumento nos investimentos em obras públicas, principalmente as
relacionadas com o sistema viário de cunho rodoviário, face ao aumento no
número de veículos automotores por parte da população, e em decorrência das
grandes distâncias as quais essa população começava a passar diante do
trajeto casa-trabalho (o primeiro localizado nos novos loteamentos distantes
dos centros urbanos, e o segundo localizado principalmente nas áreas
centrais). Além das distâncias, verifica-se também a introdução de novos
padrões de ocupação do espaço, com a disseminação de edifícios verticais,
tanto dentro do modelo de construção das habitações no Sistema Financeiro
da Habitação, quanto em relação as moradias para a população de classe
média alta, em localizações mais privilegiadas e de maior custo.
Maricato (2002, pg. 20) afirma que,
“[...] as cidades brasileiras passaram a ocupar o centro de uma
política destinada a mudar seu padrão de produção. A drenagem de
recursos financeiros para o mercado habitacional, em escala nunca
visa no país, ocasionou a mudança no perfil das grandes cidades,
com verticalização promovida pelos edifícios de apartamentos. [...]
Além da imagem das cidades, mudaram também o mercado fundiário
e vários aspectos da cadeia produtiva (que apesar disso não
abandonou suas características de atraso em relação ao processo de
trabalho).”
Mesmo com o grande impulso dado durante o regime militar em relação
a implantação de uma política habitacional, o problema nas grandes cidades
persistem até os dias atuais, principalmente em decorrência da grande
32
recessão pelo qual o país passou durante as décadas de 1980 e 1990, onde
pode-se verificar uma diminuição nos investimentos em políticas urbanas. Os
principais problemas urbanos tendem a aumentar com a aceleração do
processo de urbanização do país verificado após os anos de 1960, quando se
verifica a reversão da população rural para maioria urbana. Uma parcela da
população é beneficiada pelos programas habitacionais implementados, mas
uma grande maioria se vê obrigada a utilizar de outros métodos para
adquirirem suas habitações, sendo obrigadas a residirem em áreas
consideradas do ponto de vista ambiental, bastante vulneráveis, localizadas
nas margens dos cursos d’água ou nas encostas dos morros, sofrendo riscos
de alagamentos ou desmoronamentos de terra respectivamente.
A despeito das críticas que devem ser feitas ao BNH e ao sistema
financeiro por ele preconizado, que gerou uma intervenção urbana
equivocada, com consequências que afetaram as cidades brasileiras
de modo quase irreversível, sua importância e seu caráter estratégico
na estruturação de uma política habitacional para o país são
indiscutíveis. Esse período foi único – pelo menos até o início do
século XXI – em que o país teve, de fato, uma Política Nacional de
Habitação. (BONDUKI, 2014, pg.63).
Entre os anos de 1986 e 2002 o país presencia uma espécie de
“apagão” ao que concerne a elaboração de políticas públicas urbanas por parte
do governo federal, onde o único grande fato importante no período condiz com
a aprovação da Lei Federal 10.257 em 2001, denominada de Estatuto da
Cidade, e que veio regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal
que tratavam da política urbana e defendida por diversos movimentos sociais.
Apenas fontes de financiamento como o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço) que subsidiava alguns programas, é que foram seguidos durante a
década de 1990.
Na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002)
não se conseguiu implementar uma política habitacional consistente,
mas os documentos elaborados pelo governo já apontavam para uma
nova abordagem da questão urbana e habitacional, com
pressupostos fundamentalmente diversos daqueles que vigoraram
33
desde o período do BNH. Aos poucos, com a estabilidade econômica
alcançada com o real e a substancial redução dos investimentos do
SFH que ocorreu durante os anos 1980 e 1990, houve uma
recuperação do FGTS, o que permitiu uma lenta e gradual retomada
dos financiamentos de habitação e saneamento, depois de vários
anos de paralização. No entanto, a política macroeconômica,
marcada pela restrição ao crédito e ao gasto público, impediu uma
atuação governamental mais contundente e massiva para enfrentar
os problemas habitacionais, que se agravaram significativamente no
período. (BONDUKI, 2014, pg. 102)
Em contrapartida as ações em âmbito federal, as políticas
implementadas a nível estadual e principalmente municipal ganha força, com
destaque para a introdução de iniciativas que visavam à participação direta da
população na elaboração e definição de políticas públicas como descrito por
Bonduki (2014, pg. 81),
[...] ao longo dos anos 1990, experiências concretas de
administrações municipais introduziram novos programas e formas
participativas de gestão, que inspiraram os movimentos de moradia a
propor um projeto de lei de iniciativa popular visando à criação de um
fundo nacional de moradia para subsidiar a produção de habitação de
interesse popular.
Diversos programas que possibilitavam a participação da população na
definição de projetos ou na execução dos mesmos foram implementados,
principalmente dentro de gestões municipais de cunho progressista, como no
caso da gestão da Prefeita Luiza Erundina do PT na cidade de São Paulo
durante os anos de 1989-1992 (BONDUKI, 2000; BONDUKI, 2014). Durante
este período, dois grandes programas exitosos foram implementados durante a
gestão Erundina. O primeiro programa diz respeito a produção de habitação
por mutirão e autogestão com ampla parceria de diversos movimentos sociais
gerando a construção de 109 empreendimentos. O outro programa era a
urbanização de favelas, que visava à regularização urbanística e ao acesso à
infraestrutura básica (BONDUKI, 2014).
O autor ainda complementa abordando as raízes que deram subsídio
para a criação das políticas urbanas durante o governo seguinte.
34
O Projeto Moradia (2000), proposto pelo Instituto Cidadania (atual
Instituto Lula), que formatou uma proposta para equacionar o déficit
habitacional no país, base da nova Política Nacional de Habitação,
incorporou essa trajetória, que culminou na criação do Ministério das
Cidades (2003), encarregado de coordenar em nível nacional uma
nova política urbana, articulando as políticas de habitação,
saneamento habitacional e mobilidade. (BONDUKI, 2014, pg. 81)
Maricato (2002) associa os principais problemas ocorridos durante as
décadas de 1980 e 1990 ao fato da crise econômica presenciada no país e a
um aumento da pobreza concentrada agora nas cidades. O aumento da
pobreza nas áreas urbanas acarreta o surgimento de novos problemas, como
algumas questões já tratadas anteriormente, como as distâncias decorrentes
da criação de inúmeros loteamentos em áreas longínquas aos centros urbanos
ou áreas ambientalmente frágeis como os cursos d’água ou encostas de
morros.
Nessas décadas, conhecidas como “décadas perdidas”, a
concentração da pobreza é urbana. Pela primeira vez em sua história,
o Brasil tem multidões, que assumem números inéditos, concentradas
em vastas regiões – morros, alagados, várzeas ou mesmo planícies –
marcadas pela pobreza homogênea. Segundo estudo o IPEA
(Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicada), 33% dos pobres
brasileiros se concentram no Sudeste, predominantemente nas
metrópoles. (MARICATO, 2002, pg. 22)
Maricato ainda discorre sobre os principais problemas urbanos e o
aumento da pobreza a questões relativas ao trabalhador livre, pois sem ter
condições de prover sua própria habitação de forma condizente com uma boa
qualidade de vida, a população tende a procurar as áreas remanescentes do
processo de urbanização oficial e passa a residir nos chamados vazios
urbanos. Áreas consideradas vulneráveis do ponto de vista ambiental por
apresentarem sérios riscos às moradias e, por conseguinte, a própria vida dos
moradores.
As décadas perdidas não são as únicas a registrarem as origens do
que podemos chamar de tragédia urbana brasileira – enchentes,
35
desmoronamentos poluição dos recursos hídricos, poluição do ar,
impermeabilização do solo, desmatamento, congestionamento
habitacional, reincidência de epidemias, violência, etc. O crescimento
urbano sempre se deu com exclusão social, desde a emergência do
trabalhador livre na sociedade brasileira, que é quando as cidades
tendem a ganhar nova dimensão e tem início o problema da
habitação. (2002, pg. 22)
Apenas em 2003, com a posse do Presidente Lula e a criação do
Ministério das Cidades, a agenda da Reforma Urbana e a ampliação nos
investimentos públicos relativo às políticas para as cidades voltam a entrar na
agenda do governo federal e dos demais entes federativos. A criação do
Ministério das Cidades em 2003 proporcionou a aplicação direta de
investimentos em diversos setores das políticas urbanas como saneamento
ambiental, mobilidade, intervenções em sítios históricos, ampliação do
planejamento urbano com a elaboração dos Planos Diretores Participativos, e a
partir de 2009 com a criação do Programa Minha Casa Minha Vida, que
possibilitava a retomada dos investimentos em habitação e um planejamento a
longo prazo através do PlanHab - Plano Nacional de Habitação (Site do
Ministério das Cidades). “Uma das principais tarefas do MCidades foi estimular
a implementação do Estatuto da Cidade, entendido como fundamental para
garantir o acesso à terra e viabilizar a produção de habitação social”
(BONDUKI, 2014, pg. 110).
Várias articulações foram realizadas durante o governo Lula para
implementar e consolidar as políticas urbanas no país, mesmo com grandes
desafios a serem enfrentados em decorrência dos anos de recessão
presenciados durante as duas décadas anteriores e que ainda resultavam em
entraves ao avanço de programas e projetos, como os relacionados com a área
habitacional. Em paralelo com as ações que o Ministério das Cidades tentavam
articular, os problemas urbanas tendiam a aumentar e a causar mais
transtornos a população em geral, com especial destaque para os moradores
das áreas mais afastadas, localizadas em áreas ambientalmente frágeis.
De acordo com relatório do Ministério das Cidades sobre a questão
habitacional com demonstrativo do déficit habitacional e da demanda futura por
habitação no país.
36
Foram quantificadas, pela primeira vez, de modo consistente, as
necessidades habitacionais do país considerando a dinâmica
demográfica. Assim, no horizonte temporal viável para se enfrentar o
problema, levantaram-se não apenas os déficits quantitativos e
qualitativos, como também as necessidades futuras, resultantes do
crescimento da população e de sua demanda habitacional, e das
migrações. (BONDUKI, 2014, pg. 116)
A demanda habitacional se dá em várias vertentes, partindo desde a
ausência habitacional por parte das famílias, passando pela utilização de
residência cedida ou alugada, até a demanda em relação à precariedade
habitacional. Ainda se mede a necessidade por demanda de novas habitações
em decorrência do aumento populacional.
Tabela 04 – Necessidades Habitacionais conforme o Plano Nacional de Habitação
Déficit acumulado (2006) e Demanda Futura (2007-2023)
Modalidade de Necessidade Habitacional Número de Unidades (em milhões)
Déficit acumulado de unidades novas (2006) 7,9 Necessidade de novas unidades geradas pela urbanização de assentamentos precários 0,9
Demanda Futura de novas unidades habitacionais (2007-2023) 27,0
Necessidades Habitacionais Totais (2007-2023) 35,8 Necessidades de Urbanização de Assentamentos Precários 3,2
Necessidade de complementação de infraestrutura 10,8
Fonte: BONDUKI, 2014
Chegou-se à conclusão de que até 2023 seria necessário produzir
cerca de 34,9 milhões de unidades habitacionais, sendo 7,9 milhões
para eliminar o déficit existente e 27 milhões para atender as
necessidades futuras, além da urbanização de assentamentos
precários onde vivem 3,3 milhões de famílias e da complementação
de infraestrutura em assentamentos que reúnem 9,8 milhões.
(Ministério das Cidades, apud BONDUKI, 2014, pg. 116)
37
Conforme dados do Ministério das Cidades em relação ao principal
programa habitacional implementado durante o governo Lula (2003-2010) o
Programa Minha Casa Minha Vida entre os anos de 2009 e 2012 nas suas
duas etapas, a meta inicial seria a construção de 3,4 milhões de habitações,
tendo sido contratado um total de 2,2 milhões, o correspondente a 64% da
meta para o período. O volume de contratações para o período de 2009-2012
se apresenta equivalente ao total de habitações populares construídas durante
todo o período do Sistema Financeiro da Habitação (1964-1986) equivalente a
2,37 milhões, ou seja, o Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV se
propunha realizar em 04 anos um volume de construção equivalente ao que foi
realizado pelo antigo SFH em 22 anos. Associado ao PMCMV estava o
aumento do crédito para financiamento da casa própria e de programas de
incentivo por meio dos bancos estatais como a Caixa Econômica Federal e o
Banco do Brasil, com crédito para a aquisição de materiais de construção e
para a aquisição de mobiliário.
Mesmo diante dos grandes avanços presenciados no país na última
década e meia, ainda verifica-se grandes problemas urbanos na aquisição de
habitação por parte da população de baixa renda, principalmente em
decorrência da ausência de terras em áreas mais centrais, resultado da forte
especulação imobiliária implantada por grandes construtoras, que reservam
parte dessas terras para a construção de empreendimentos voltados
exclusivamente para as classes média e alta aumentando a segregação sócio
espacial já bastante marcante no país (MARICATO, 2002; SANTOS, 2009).
As cidades, e sobretudo as grandes, ocupam, de modo geral, vastas
superfícies entremeadas de vazio. Nessas cidades espraiadas,
características de uma urbanização corporativa, há interdependência
do que podemos chamar de categorias espaciais relevantes desta
época: tamanho urbano, modelo rodoviário, carência de
infraestruturas, especulação fundiária e imobiliária, problemas de
transporte, extroversão e periferização da população, gerando,
graças às dimensões da pobreza e seu componente geográfico, um
modelo específico de centro-periferia. (SANTOS, 2009, pg. 106)
38
Santos faz a associação entre os diferentes problemas resultantes do
processo de urbanização presenciado no país nas últimas décadas e ressalta o
problema da especulação fundiária e imobiliária como determinando para os
demais problemas de espraiamento urbano e, por conseguinte, das relações
sociais e espaciais que marcam fortemente a segregação da população.
Fonte: IBGE e Fundação João Pinheiro
De acordo com a classificação dada pela Fundação João Pinheiro (GUIA
DO ESTUDANTE – ATUALIDADES, 2014, pg. 145) em parceria com o IBGE o
déficit habitacional no Brasil está concentrado principalmente no nicho dos
moradores que residem de aluguel, correspondendo a 46,01%, seguido do
nicho de famílias que dividem residência com outras pessoas e gostariam de
viverem em domicílios separados (geralmente membros das mesmas famílias,
como filhos que constituíram famílias próprias, mas ainda residem na casa dos
pais) representam um montante de 32,15%.
O processo de urbanização no Brasil apresentou uma diminuição no
ritmo de crescimento urbano, em face de já elevada taxa de urbanização, mas
que não chegou a apresentar estagnação ao que concerne o aumento no
número de habitantes. O país apresentava de acordo com o censo demográfico
do IBGE em 2010 uma taxa de urbanização de 84,37%, equivalente a 160,9
milhões de habitantes residindo nas cidades brasileiras.
A distribuição da população nas cidades brasileiras se concentra em 04
grandes blocos de cidades, conforme Tabela 05.
382.926
2.669.348883.777
1.865.457
Gráfico 03 - Déficit Habitacional no Brasil
Adensamento excessivo
Aluguel muito caro
Habitação Precária
Famílias em coabitação
39
Tabela 05 – Distribuição dos municípios conforme a quantidade de seus moradores (2014) Número de Habitantes Número de Municípios Até 5.000 hab. 1.247 De 5.001 a 10.000 hab. 1.227 De 10.001 a 20.000 hab. 1.378 De 20.001 a 50.000 hab. 1.080 De 50.001 a 100.000 hab. 339 De 100.001 a 500.000 hab. 260 Mais de 500.000 hab. 39 Total 5.570
Fonte: IBGE
Conforme verificado acima, mesmo diante dos avanços presenciados, a
questão habitacional ainda se torna o principal problema urbano brasileiro.
Outros problemas podem ser constituídos como agregados à questão
habitacional, principalmente em decorrência da falta de efetivação do
planejamento urbano, realizado por vezes devido a pressões de órgãos
superiores como forma de liberação de verbas, mas que não se efetiva como
prática constante dentro das prefeituras das pequenas e médias cidades, e as
vezes, nas grandes cidades e metrópoles do país, vindo a ocasionar uma
espécie de caos urbano.
2.1 Problemas Ambientais Urbanos
As exigências por infraestrutura advinda da pressão demográfica fez
com que as cidades começassem a apresentar sérios problemas.
Primeiramente com a falta de habitação que pudesse suprir a necessidade do
contingente populacional somado ao ambiente urbano. A questão habitacional
torna-se o primeiro grande problema urbano, pois ainda em decorrência do
grande déficit habitacional e com o ritmo de provisão de habitação que não
acompanha o crescimento da população faz com que estes novos habitantes
passassem a procurar áreas não-ocupadas para poderem residir.
O primeiro impacto nas áreas urbanas diz respeito á forma como o solo
é ocupado, sofrendo grandes modificações na sua geomorfologia, vindo a
ocasionar sérios problemas que não serão resolvidos de imediato e com a
construção das moradias tende a aumentar.
40
À medida que as cidades se expandem e novas áreas são ocupadas,
ocorrem mudanças ao seu redor, como a ocupação de terras
agricultáveis, perda de áreas de vegetação e o consequente aumento
da erosão dos solos, obstrução do leito de rios, contaminação de
fontes de água, etc.
A principal consequência da expansão do espaço urbano é a
impermeabilização do solo, principalmente devido à cobertura
asfáltica das vias públicas e ao adensamento construtivo provocado
pela verticalização das edificações. (TERRA, 2011, pg. 370)
Com a ausência de um efetivo planejamento urbano que pudesse suprir
as necessidades da população, começa a ser construída uma cidade informal,
ou seja, uma cidade construída em paralelo com as ações governamentais,
sem um planejamento prévio do Estado, com total ausência de infraestrutura e
em áreas ambientalmente frágeis. A cidade informal não conta com serviços
e equipamentos urbanos e ocupa áreas desvalorizadas [...] traduz uma
segregação ao mesmo tempo social e espacial (TERRA, 2011, pg.368). As
habitações urbanas informais podem ser consideradas aquelas “habitações
improvisadas ou inacabadas, construídas com restos de materiais, como
tábuas, papelão ou alvenaria. Frequentemente, essas habitações situam-se em
zonas degradadas (ou como dito anteriormente em áreas ambientalmente
frágeis), como vertentes de morro sujeitas a deslizamentos de terra, mangues
ou áreas susceptíveis a enchentes, e não contam com serviços como
saneamento básico ou iluminação pública”. (TERRA, 2011, pg.368).
Como dito por TERRA (2011) na citação acima, partindo-se
primeiramente da questão habitacional, verifica-se a precarização da moradia,
por vezes, construídas com materiais inadequados do ponto de vista técnico, o
que resulta em problemas de habitabilidade, pois a mesma não apresenta
condições técnicas adequadas para a sua utilização. Outro fator condiz com os
locais de assentamento destas habitações, implantadas geralmente em áreas
vulneráveis do ponto de vista ambiental, localizadas em terrenos com solos não
propícios ao assentamento humano em decorrência de sua geologia e
geomorfologia.
41
Associado ao problema do terreno, a ocupação desordenada do solo
das cidades brasileiras tende a aumentar outros problemas já presentes como
a baixa capacidade das infraestruturas como o saneamento ambiental e a
coleta de resíduos. A população sem ter onde despejar o seu esgoto ou lixo,
acaba jogando em terrenos baldios, nas encostas dos morros e principalmente
nos cursos d’água, acarretando sérios problemas à saúde dessa população.
As respostas para essa realidade típica do crescimento das grandes
cidades são refletidas na interação entre sociedade e natureza onde
o ambiente é sujeito a alterações realizadas pelos seres humanos,
principalmente, na forma desigual de apropriação dos solos urbanos
e pelos fenômenos naturais, gerando mudanças na paisagem, no
lugar e no espaço. (Ministério das Cidades, 2008, pg. 33)
A ocupação de áreas ambientalmente frágeis tem gerado nas últimas
décadas o aumento no número de acidentes devido o deslizamento de
barreiras vindo a ocasionar perdas materiais e de vidas humanas em todo o
país.
Outros problemas do ponto de vista ambiental interferem na qualidade
de vida da população, principalmente as diversas formas de poluição (ar, água,
solo, sonora), mas que de certa forma se inter-relacionam e se agravam nas
áreas onde os investimentos públicos em infraestrutura não acompanharam o
crescimento da população de baixa renda, por conseguinte, a mais afetada
social e economicamente.
A periferização do processo de urbanização resultou no aumento das
distâncias entre as áreas habitacionais ocupadas pela população de baixa
renda e os centros de trabalho, fazendo com que a população tenha que
percorrer grandes distâncias através de meios de transportes coletivos de
baixa qualidade, principalmente por não conseguirem atender adequadamente
a demanda crescente. Com a baixa qualidade do transporte público está o
aumento na oferta no mercado de meios de transportes individuais como
carros, através de subsídios governamentais, fazendo com que a população
consiga adquirir automóvel com preços acessíveis, resultando no aumento de
veículos nas vias, ocasionando em engarrafamentos e aumento no tempo de
percurso casa-trabalho.
42
Ainda como resultado da periferização, coloca-se a baixa cobertura dos
serviços urbanos relativos a infraestrutura básica, face a grande demanda por
abastecimento d’água, esgotamento sanitário, coleta de lixo e da rede de
drenagem.
A desigualdade social acaba sendo a marca principal nas áreas
habitadas pela população de baixa renda, face os problemas ambientais
urbanos se tornarem mais presentes na dicotomia alta demanda x baixa
capilaridade dos serviços ofertados, o que resulta no não atendimento de todos
os serviços a toda população residente nas áreas mais periféricas das cidades.
A desigualdade social é uma marca da urbanização brasileira. Quanto
mais baixa a renda mensal por morador de uma casa, menor é o
percentual dos domicílios com saneamento básico: apenas 40% dos
lares com renda per capita baixa de meio salário mínimo possuem os
serviços básicos de saneamento, mas essa participação sobe para
81,9% nas casas em que a renda per capita é maior que cinco
salários mínimos. (GUIA DO ESTUDANTE – ATUALIDADES, 2010)
43
3. ENFOCANDO CONCEITOS
A ocupação do solo em áreas ambientalmente frágeis possibilita o
aumento na probabilidade de efetivação de alguns acontecimentos que podem
acarretar em perdas sociais, econômicas e ambientais do ponto de vista
material, ou mesmo, em perdas de vidas humanas. O gerenciamento das áreas
vulneráveis por parte dos entes governamentais, assim como por parte da
sociedade civil enseja um ciclo de ações que possibilita à diminuição dos riscos
eminentes apresentados nos cenários de maior vulnerabilidade.
Primeiramente, antes de se enfocar nos processos aos quais às áreas
ambientalmente frágeis, com destaque para a cidade do Recife, se encontram
expostas, serão apresentados os principais conceitos envoltos no
gerenciamento dessas áreas. A multidisciplinaridade das ações dentro do
processo de gestão de risco faz com que haja uma intercambiação entre os
conceitos apresentados, onde cada área de conhecimento pode enfocar
determinado ponto, fazendo com que haja enfoques diferenciados. Dentro do
ciclo de gerenciamento de risco, vários conceitos são trabalhados para que se
haja o melhor entendimento das ações a serem expostas. Para tal, como forma
de sintetização serão apresentados de forma mais detalhada os principais
conceitos a serem desenvolvidos dentro do presente trabalho2. Parte-se da
conceituação de risco socioambiental e suas vertentes, vindo a destacar o
conceito de vulnerabilidade e o conceito de desastre ambiental.
Como forma de melhor embasamento teórico-conceitual, serão
apresentados os conceitos utilizados pelos órgãos governamentais como o
Ministério da Integração Nacional, através da Secretaria Nacional de Proteção
e Defesa Civil e na bibliografia especializada de diversos órgãos de pesquisa
nacional e internacional.
3.1. Risco Socioambiental
Partindo da conceituação desenvolvida pela Estratégia Internacional
para Redução de Desastres-EIRD da Organização das Nações Unidas (2009)
2 Os conceitos de risco, vulnerabilidade e desastre são apresentados no presente capítulo, os demais conceitos estarão expostos no Apêndice 01 deste trabalho.
44
utilizada pelo Ministério da Integração Nacional através da Secretaria Nacional
de Proteção e Defesa Civil, entende-se Risco como sendo:
A probabilidade de consequências prejudiciais ou perdas esperadas
(mortes, lesões, propriedades, meios de subsistência, interrupção de
atividade econômica ou ambiente ameaças naturais ou
antropogênicas e condições de vulnerabilidade). Convencionalmente,
o risco é expresso por Risco = Ameaças x Vulnerabilidade. (EIRD,
2009, pg.17)
Ainda partindo da definição de risco da EIRD-ONU (2009),
Algumas disciplinas também incluem o conceito de exposição para
referir-se principalmente aos aspectos físicos da vulnerabilidade. Mas
além de expressar uma possibilidade de dano físico, é crucial
reconhecer que os riscos podem ser inerentes, aparecem ou existem
dentro de sistemas sociais. Igualmente é importante considerar os
contextos sociais nos quais os riscos ocorrem, pois a população não
necessariamente compartilha as mesmas percepções sobre o risco e
suas causas subjacentes.
O Ministério da Integração Nacional através da Secretaria Nacional de
Proteção e Defesa Civil adota o mesmo conceito complementando a
caracterização de risco a partir do momento em que o mesmo existirá “em
menor ou maior grau, quando elementos vulneráveis estiverem localizados em
uma área que apresente ameaça a um tipo de fenômeno.” (Ministério da
Integração, 2014, Cap. 02, pg16).
Ainda segundo o Ministério da Integração “o risco representa uma
estimativa do dano potencial a que pessoas, bens e atividades econômicas
estão sujeitos, levando em consideração a probabilidade de ocorrência de um
evento adverso nesse período (um ano, por exemplo) e a vulnerabilidade dos
elementos expostos” (Ministério da Integração, apud FELL et al. 2008).
Segundo texto da Professora Margareth Alheiros para a Capacitação em
Gestão e Mapeamento de Riscos Socioambientais do Ministério das Cidades
realizado em 2008 “A possibilidade de danos causados por eventos físicos,
fenômenos da natureza ou atividade humana, que podem resultar em perdas
45
de vidas ou ferimentos, danos à propriedade, rupturas sociais e econômicas ou
degradação ambiental.” (Ministério das Cidades, 2008, pg. 14).
Alheiros (1998, pg. 13) em sua Tese de Doutorado faz o paralelo entre
Perigo e Risco como termos intimamente relacionados. “Enquanto o primeiro
refere-se à probabilidade de ocorrência de um desastre, o segundo expressa
às consequências em termos de danos e perdas de vidas, propriedades e
serviços, caso esse desastre venha a ocorrer.”
De acordo com a classificação internacional os riscos podem ser
classificados como naturais ou tecnológicos, tendo os riscos naturais
subdivididos em hidrometeorológicos, geológicos ou biológicos conforme
especificado na Tabela 06 a seguir:
Quadro 01 – Classificação dos Riscos Riscos Naturais: Processos ou fenômenos naturais que ocorrem na biosfera e podem resultar em danos, podem ser classificados de acordo com sua origem em: geológicos, hidrometeorológicos ou biológicos. Origem Fenômenos Riscos Hidrometeorológicos Processos naturais ou fenômenos de ordem atmosférica, hidrológica ou oceânica.
Inundações, fluxos de detritos ou de lama, erosão hídrica e costeira, ciclones tropicais, tempestades, ventos, chuvas e outros eventos climáticos severos, raios relâmpagos, secas, desertificação, incêndios florestais, temperaturas extremas, tempestade de areia e poeira, solos congelados (permafrost), avalanches de neve.
Riscos Geológicos Fenômenos terrestres naturais associados a processos endógenos tectônicos ou exógenos, como os movimentos de massa.
Terremotos, maremotos (tsunamis), atividade e emissões vulcânicas, movimentos de massa: deslizamentos, queda de rochas, corridas de lama, deslizamentos submarinos, colapsos e atividades de falhas geológicas.
Riscos Biológicos Processos de origem orgânica decorrentes de vetores biológicos, incluindo exposição a microrganismos patogênicos, toxinas e substâncias bioativas.
Surtos de doenças epidêmicas, contágio por planta ou animal e infecções extensivas (pragas de gafanhotos).
Riscos Tecnológicos: Perigo associado a acidentes tecnológicos ou industriais, falhas estruturais ou humanas que possam causar perdas de vidas, ferimentos, danos à propriedade, ruptura social ou econômica, ou danos ambientais, quase sempre associados a riscos antropogênicos. Exemplos: poluição industrial, emissão nuclear e radioatividade, lixos tóxicos, ruptura de barragens, acidentes de transportes ou acidentes tecnológicos (explosões, incêndios, derramamentos).
Fonte: ALHEIROS, apud Ministério das Cidades, 2009
46
Como verificado, o conceito de risco está relacionado com a
probabilidade de algum acidente, seja natural ou provocado por ações
humanas acontecer e consequentemente ocasionar danos sociais, econômicos
e ambientais.
Todo e qualquer sistema está direta ou indiretamente submetido por
algum risco em potencial, podendo variar a sua intensidade de acordo com
fatores intrínsecos aos fenômenos incidentes sobre esse sistema,
principalmente ao que concernem os riscos naturais classificados como
hidrometeorológicos e geológicos. Esses dois tipos de risco estão intimamente
relacionados, pois em grandes proporções, os dois tipos acabam ocorrendo
simultaneamente, a exemplo de fenômenos climáticos que afetam áreas
vulneráveis do solo e vem ocasionar movimentações de massa (deslizamentos,
desmoronamentos, escorregamentos, etc.). Os dois tipos de fenômenos podem
ocorrer independentemente da ação antrópica, mas devido ao processo de
ocupação do solo, principalmente nas áreas urbanas, afetadas pelo
desmatamento e por modificações no seu relevo, os fenômenos climáticos
tendem a atingir com maior intensidade e consequentemente a afetar áreas
maiores com aumento nos danos sociais e econômicos.
Quando um determinado fenômeno tende a atingir determinada área
sem causar danos, o mesmo é classificado apenas como evento. De acordo
com o Glossário apresentado pelo Ministério da Integração Nacional3
conceitua-se evento como sendo ”em análise de risco, ocorrência externa ou
interna ao sistema, envolvendo fenômeno da natureza, ato humano ou
desempenho do equipamento, que causa distúrbio ao sistema”. (Ministério das
Cidades, 2009, pg. 77).
Para Alheiros (1998, pg.16) “a gestão de risco compreende um sistema
que inclui a percepção do perigo, a análise de risco, a divulgação da
informação e o suporte gerencial, como instrumento operativo que implementa
todas as decisões do sistema”. Ainda segundo a mesma autora (ALHEIROS,
1998, pg. 16) “o grau de insegurança da população (percepção) é o elemento
que desencadeia o processo e que demandará a realização de estudos dos
fenômenos e das suas consequências, com vistas ao zoneamento (análise de 3 Disponível em: http://www.integracao.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=71458606-5f48-462e-8f03-4f61de3cd55f&groupId=10157. Acessado em: 06 de Janeiro de 2015.
47
risco). Esses resultados subsidiarão o diálogo social (informação sobre o risco)
para a orientação do gerenciamento entre intervir e não intervir”. Baseando-se
no exposto, todo o processo que envolve a gestão de risco está relacionado
com a realização prévia de um Planejamento, com a elaboração de Planos de
Ação cuja finalidade condiz com a prevenção de risco e no intuito de se
minimizar possíveis desastres.
De acordo com a Estratégia Internacional de Redução de Desastres
(EIRD/ONU, 2009) o ciclo de gestão de risco de desastres se divide em duas
grandes etapas: a Gestão de Risco de Desastres e o Gerenciamento de Desastres. Partindo primeiramente para a definição de Gestão de Risco
(Ministério da Integração, 2014, Cap. 01, pg.02)
Caracteriza-se pelo conjunto de decisões administrativas, de organização e de
conhecimentos operacionais desenvolvidos por sociedades e comunidades
para estabelecer políticas, estratégias e fortalecer suas capacidades e
resiliência a fim de reduzir os impactos de ameaças e, consequentemente, a
ocorrência de possíveis desastres. Em outras palavras, a gestão de riscos
consiste na adoção de medidas para reduzir os prejuízos e danos ocasionados
por desastres, antes que estes ocorram.
A segunda etapa do ciclo é entendida como o gerenciamento de
desastres que
Contempla a organização e gestão de recursos e responsabilidades para o
manejo de emergências quando o desastre se concretiza. Essa etapa,
também denominada como gestão de emergências ou gestão de desastres,
inclui planos, estruturas e acordos que permitem coordenar os esforços do
governo, de entidades voluntárias e privadas para responder as necessidades
associadas às emergências.
No Brasil, segundo o Artigo 3º da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (Lei nº 12.608, de 10 de Abril de 2012), a gestão de risco e o gerenciamento de desastres estão baseados nas seguintes ações:
48
Prevenção; Mitigação; Preparação; Resposta; e Recuperação.
Figura 01 – Ciclo de Gestão da Defesa Civil
Fonte: Ministério da Integração Nacional, 2014
Quadro 02 - Principais ações do ciclo de gestão de risco e gerenciamento de desastres.
Gestão de Risco Gerenciamento de Desastre Prevenção Mitigação Preparação Resposta Recuperação
Ações destinadas a
reduzir a ocorrência e a intensidade de desastres, por
meio da identificação,
mapeamento e monitoramento
de riscos, ameaças e
vulnerabilidades, bem como a
capacitação da sociedade
Medidas estruturais e
não estruturais para limitar os
danos e prejuízos visto
que não é possível
prevenir todos os impactos adversos das
ameaças
Medidas tomadas antecipadamente
para assegurar uma resposta
eficaz aos desastres, como
planos de contingência,
simulados, monitoramento,
emissão de alertas e a evacuação da população
Ações de socorro, ações de
assistência às vítimas e ações
de restabelecimento
de serviços essenciais
Envolve principalmente
as ações de reconstrução, que são ações
de caráter definitivo
destinadas a restabelecer o
cenário destruído pelo
desastre
Fonte: Brasil (2010); EIRD/ONU (2009)
49
As três primeiras etapas do ciclo ocorrem relacionadas à prevenção do
risco, com a realização de ações no intuito de minimizar a probabilidade de
ocorrência de algum desastre. A gestão de risco é realizada através do
conhecimento dos fenômenos envolvidos na área de ação, tornando possível a
estruturação de um planejamento com a definição de prioridades e estratégias
que permitam reduzir o risco. As ações focam principalmente no levantamento
da área de atuação do órgão responsável com a realização do mapeamento de risco. O mapeamento prevê a realização de mapas de suscetibilidade,
perigo, vulnerabilidade e risco. Num segundo momento, ainda dentro das
etapas citadas e após a realização de um mapeamento e planejamento prévio
das ações, são realizadas as chamadas ações estruturais (realização de obras
de infraestrutura como obras de contenção de barreiras e redes de drenagem
de águas fluviais) (Figura 02) e ações não-estruturais (ações de planejamento
e voltadas a informação à população com a realização de capacitações e
implantação de sistemas de alerta) (Figura 03).
Figura 02 – Ação Estrutural - Obras de Contenção de Encosta
Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em: http://www.recife.pe.gov.br/2010/07/27/prefeito_entrega_obra_de_contencao_no_alto_do_mandu_172910.php. Acessado em 10 de Fevereiro de 2015.
50
Figura 03 – Ação Não-Estrutural – Ação Informativa nas Escolas
Fonte: Arquivo Regional Sul / SEDEC – Recife, 2014
As duas últimas etapas do ciclo ocorrem no momento de ocorrência de
algum desastre e nos momentos seguintes no intuito atender
emergencialmente a população atingida por determinado desastre e
reestabelecer as condições de normalidade da área atingida. Conforme
visualizado na Figura 04, onde após as enchentes que atingiram o Estado de
Pernambuco em 2010, foram realizados levantamentos para verificar a real
situação das edificações e a possibilidade de retorno dos moradores onde
havia possibilidade.
51
Figura 04 – Área atingida pela enchente em Palmares
Fonte: José Rafael, 2010
Ainda na definição de Mapeamento de Risco, os mapas de risco tem
como finalidade setorizar determinada área de acordo com a avaliação prévia
do grau de risco.
Segundo a definição do Ministério da Integração Nacional (2008, pg.15)
“o Grau de Risco dimensiona a probabilidade de ocorrência de acidentes,
segundo uma escala de intensidade. Usualmente vêm sendo adotados 4
intervalos (1 – Risco Baixo; 2 – Risco Médio; 3 – Risco Alto; e 4 – Risco Muito
Alto)”.
A seguir verifica-se a definição dos quatro níveis de risco, segundo
quadro presente no Plano Municipal de Redução de Risco da Prefeitura do
Recife:
52
Quadro 03 – Definição dos Níveis de Risco
NÍVEL DE RISCO
DEFINIÇÃO
Risco Muito Alto
(R4)
Os condicionantes geológico-geotécnicos predisponentes e a falta
de intervenção no Setor são de muito alta potencialidade para o
desenvolvimento de processos de deslizamentos e erosão. As
evidências de instabilidade são expressivas e estão presentes em
grande número ou magnitude. Processo de instabilização em
avançado estágio de desenvolvimento. É a condição mais crítica.
Mantidas as condições existentes, é muito provável a ocorrência de
eventos destrutivos durante episódios de chuvas intensas e
prolongadas, no período de 1 ano.
Risco Alto (R3)
Os condicionantes geológicos-geotécnicos predisponentes e a fala
de intervenção no Setor são de alta potencialidade para o
desenvolvimento de processos de deslizamentos e erosão.
Observa-se a presença de significativas evidências de
instabilidades. Processo de instabilização em pleno
desenvolvimento. Mantidas as condições existentes, é possível a
ocorrência de eventos destrutivos durante episódios de chuvas
intensas e prolongadas no período de 1 ano.
Risco Médio
(R2)
Os condicionantes geológicos-geotécnicos predisponentes e a fala
de intervenção no Setor são de média potencialidade para o
desenvolvimento de processos de deslizamentos e erosão.
Observa-se a presença de algumas evidências de instabilidade.
Processo de instabilização em estágio inicial de desenvolvimento.
Mantidas as condições existentes, é reduzida a possibilidade de
ocorrência de eventos destrutivos durante episódios de chuvas
intensas e prolongadas no período de 1 ano.
Risco Baixo
(R1)
Os condicionantes geológicos-geotécnicos predisponentes e a fala
de intervenção no Setor são de baixa potencialidade para o
desenvolvimento de processos de escorregamentos e erosão. Não
se observa(m) evidência (s) de instabilidade ou processo de
instabilização de encostas. É a condição menos crítica. Mantidas
as condições existentes, não se espera a ocorrência de eventos
destrutivos no período de 1 ano. Fonte: Plano Municipal de Redução de Risco – PMRR – Recife
53
Ainda seguindo a mesma definição Setor de Risco é entendido como
“uma porção do território, analisado em escala de detalhe (>1:5.000) que
apresenta características similares quanto ao processo gerador de desastres e
quanto à sua probabilidade de ocorrência. São mapeados polígonos fechados,
aos quais são atribuídos os graus de risco” (Ministério da Integração, 2008, pg.
15).
Figura 05 - Mapa de Risco do Recife
Fonte: Base Cartográfica da Prefeitura do Recife, Secretaria Executiva de Defesa Civil. Adaptado por José Rafael, 2015
54
Figura 06 – Setorização dos Pontos de Risco Zona Norte e Zona Sul do Recife
Fonte: Base Cartográfica da Prefeitura do Recife, Secretaria Executiva de Defesa Civil. Adaptado por José Rafael, 2015
3.2. Susceptibilidade eVulnerabilidade
Partindo-se inicialmente do conceito de susceptibilidade, entende-se
como sendo a “característica inerente ao meio, que expressa à probabilidade
de ocorrência de eventos ou acidentes” (Ministério das Cidades, 2008, pg 15).
O conceito de vulnerabilidade está relacionado com a “predisposição de
um sujeito, sistema ou elemento, ser afetado por ocasião de um acidente.”
(Ministério das Cidades, 2008, pg. 15)
De acordo com o Glossário do EIRD-ONU (2009), vulnerabilidade ganha
as seguintes conceituações:
55
1. Condição intrínseca ao corpo ou sistema receptor que, em interação
com a magnitude do evento ou acidente, caracteriza os efeitos adversos,
medidos em termos de intensidade dos danos prováveis.
2. Relação existente entre a magnitude da ameaça, caso ela se
concretize, e a intensidade do dano consequente.
3. Probabilidade de uma determinada comunidade ou área geográfica
ser afetada por uma ameaça ou risco potencial de desastre, estabelecida a
partir de estudos técnicos.
4. Corresponde ao nível de insegurança intrínseca de um cenário de
desastre a um evento adverso determinado. Vulnerabilidade é o inverso da
segurança.
Ainda segundo a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil,
O termo vulnerabilidade está associado à condição dos elementos sob ameaçaou em perigo (indivíduos, comunidades ou cenários
expostos) e pode ser avaliado através do grau esperado de danos e prejuízos no caso do evento acontecer (Figura 7). Sendo assim, a
vulnerabilidade indica como as condições preexistentes fazem com
que os elementos expostos sejam mais ou menos propensos a ser
afetados por um processo perigoso.
Figura 07 – Vulnerabilidade e suas interações
Fonte: Alheiros, 1998; adaptado por José Rafael, 2015
56
Enquanto o termo susceptibilidade está relacionado com as
características das áreas a serem afetadas, o termo vulnerabilidade está
relacionado com os sistemas a serem expostos.
Baseando-se nos conceitos expostos, afirma-se que a vulnerabilidade
está relacionada com a predisposição de determinado cenário em ser
acometido por algum acidente de acordo com a exposição a determinadas
condições ou fenômenos externos, a exemplo de um determinado ambiente
urbano com alta densidade construtiva que devido a modificações acentuadas
no seu relevo, em períodos de maior precipitação pluviométrica, ocasiona a
ocorrência de deslizamentos de massas, podendo ocasionar acidentes e, por
conseguinte, em perdas materiais e humanas.
De um modo geral, a análise de qualquer modalidade de risco, deve
contemplar a suscetibilidade da área e a vulnerabilidade dos sistemas (sociais,
econômicos, ecológicos) presentes na área ameaçada. (ALHEIROS, 1998,
pg.25)
Figura 08 – Área vulnerável a desastre – Realização de Monitoramento
Fonte: Arquivo Regional Sul / SEDEC – Recife, 2013
57
As características da área de exposição podem interferir diretamente na
vulnerabilidade, a exemplo de uma construção de tijolos localizada numa área
estável, sem a incidência de determinados fenômenos climáticos (como
vendavais, furacões, grandes precipitações), assim como as condições
geomorfológicas como o tipo de relevo (inclinação dos taludes), tipo de solo, ou
mesmo a cobertura vegetal. A mesma construção localizada próxima às
margens de cursos d’água, ou numa encosta com grandes modificações do
seu relevo, ou mesmo numa área com incidência de variações climáticas ou
ocorrência de determinados fenômenos podem aumentar a vulnerabilidade
para ocorrência de desastres e, por conseguinte, a ocorrência de perdas
sociais, econômicas e ambientais que afetem diretamente determinado sistema
urbano.
3.3. Desastres Socioambiental
O conceito de desastre socioambiental está relacionado com o resultado
de processos adversos naturais ou provocados pelo homem, sobre um sistema
vulnerável causando danos humanos, ambientais e / ou materiais e
consequentes prejuízos econômicos e sociais (EIRD-ONU, 2009, pg.08).
Segundo a conceituação do EIRD-ONU apresentada acima ainda define-
se ainda desastre como sendo:
[...] uma séria interrupção no funcionamento de uma comunidade ou sociedade que ocasiona uma grande quantidade de mortes e igual perda e impactos materiais, econômicos e ambientais que excedem a capacidade de uma comunidade ou sociedade afetada para fazer frente à situação mediante o uso de seus próprios recursos (EIRD-ONU, 2009, p13-14.)
Continuando a definição do EIRD-ONU:
“os desastres são quantificados, em função dos danos e prejuízos, em termos de intensidade, enquanto que os eventos adversos são quantificados em termos de magnitude. A intensidade de um desastre depende da interação entre a magnitude do evento adverso e o grau de vulnerabilidade do sistema receptor afetado. Normalmente o fator preponderante para a intensificação de um desastre é o grau de vulnerabilidade do sistema receptor. Os desastres classificam-se quanto à Intensidade, Evolução e Origem.”
58
A definição apresentada pela EIRD-ONU “enfatiza a capacidade da
comunidade ou da sociedade afetada de enfrentar a situação mediante seus
próprios recursos, apontando a condição de vulnerabilidade como aspecto
primordial na compreensão dos desastres, sejam eles decorrentes de ameaças
tecnológicas, ambientais, meteorológicas, geológicas ou outra” (MINISTÉRIO
DA INTEGRAÇÃO, 2013, pg.53).
A conceituação de desastre pode ser representada pela Figura 09, onde:
Figura 09 – Diagrama de Desastre Natural
Fonte: Alheiros, 1998; adaptado por José Rafael, 2015
Entendem-se como eventos extremos aqueles que destoam da
normalidade ocasionando danos e prejuízos à população ou ao ambiente.
Quando uma sociedade não se encontra em condições favoráveis do ponto de
vista ambiental, com baixa capacidade de suas infraestruturas básicas (redes
de abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta de resíduos sólidos,
além de estarem assentadas em áreas ambientalmente frágeis com ocorrência
de grandes modificações geomorfológicas – existência de desmatamentos
associados a cortes incorretos nos taludes) a vulnerabilidade instalada na
localidade apresenta-se mais favorável à ocorrência de eventos adversos,
sendo intensificadas com a ocorrência de eventos extremos (com intensidades
superiores as médias e de frequência mais esporádica). A associação dos
chamados eventos extremos numa sociedade vulnerável implica no aumento
da probabilidade de ocorrência de um desastre natural com sérias implicações
à população e ao ambiente (esse já modificado pelas intervenções humanas).
De acordo com a classificação determinada pela Defesa Civil Nacional,
os desastres são classificados segundo a sua intensidade, evolução e origem.
A intensidade de um desastre depende da interação entre a magnitude do
evento adverso e o grau de vulnerabilidade, sendo que, na maioria das
Eventos Extremos
Desastre Natural
Sociedade Vulnerável
59
vezes, o fator preponderante para a intensificação de um desastre é o grau de
vulnerabilidade dos elementos expostos (CASTRO, 2003).
Quadro 04 – Classificação dos desastres quanto a sua intensidade, evolução e origem
Inte
nsid
ade
Nível I – média intensidade: os danos e prejuízos são suportáveis e
superáveis pelos governos locais e a situação de normalidade pode ser
restabelecida com os recursos mobilizados em nível local ou
complementados com recursos estaduais e federais.
Nível II – grande intensidade: os danos e prejuízos não são superáveis
e suportáveis pelos governos locais, e o restabelecimento da situação
de normalidade depende da mobilização e da ação coordenada das três
esferas de atuação do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil
(SINPDEC) e, em alguns casos, de ajuda internacional.
Evol
ução
Súbitos ou de evolução aguda: se caracterizam pela velocidade com
que o processo evolui e pela violência dos eventos adversos, podendo
ocorrer de forma inesperada e surpreendente ou ter características
cíclicas e sazonais.
Graduais ou de evolução crônica: se caracterizam por evoluírem em
etapas de agravamento progressivo.
Orig
em
Naturais: causados por processos ou fenômenos naturais.
Tecnológicos: originados de condições tecnológicas ou industriais,
incluindo acidentes, procedimentos perigosos, falhas na infraestrutura
ou atividades humanas específicas.
Fonte: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, 2012
Segundo ALHEIROS (1998, pg.14) Os acidentes ou desastres naturais são eventos catastróficos,
envolvendo perdas materiais ou de vidas. São fatos consumados,
cujo estudo permite entender o comportamento do meio frente aos
processos que nele atuaram, avaliar as perdas materiais e humanas
resultantes e conhecer a maior ou menor fragilidade dos sistemas ali
implantados.
60
Em análise, os conceitos apresentados se inter-relacionam a partir do
enfoque dado ao grau de intensidade do evento e o consequente prejuízo
social e material dado à determinada localidade.
61
4. O PROCESSO DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO NO RECIFE
4.1. Caracterização Geral Como foco do presente trabalho, tem-se como recorte espacial a cidade
do Recife. Este capítulo irá apresentar a caracterização da cidade do Recife
com a síntese descritiva dos dados gerais, físicos e do processo de ocupação
da cidade.
A cidade do Recife desde o início de sua ocupação apresenta grande
importância regional e nacional devido a sua localização e a influência política,
social e econômica, correspondendo a capital do Estado de Pernambuco. O
Recife possui uma área de 217,01km² de extensão, estando localizado na
porção central da extremidade leste, às margens do Oceano Atlântico. De
acordo com dados do censo do IBGE, a cidade se constitui como sendo uma
das 10 mais populosas do país, com uma população de 1.537.704 habitantes.
A localização da cidade na porção leste da Região Nordeste do Brasil, em
posição estratégica constituiu um dos fatores importantes para a sua
instalação, o que veio fazer com que ganhasse rápido destaque desde o início
da sua colonização, principalmente com a existência de um porto que
possibilitava a comunicação do lugar com o restante do mundo, em especial
com o Portugal, então sede da colônia. Figura 10 – Mapa de Localização da Cidade do Recife
Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em: http://www2.recife.pe.gov.br/o-recife/caracterizacao-do-territorio/. Acessado em: 10 de Janeiro de 2015.
62
4.2. Caracterização Física do Recife O relevo do Recife é compreendido basicamente por duas unidades
distintas, sendo a primeira unidade formada pela Planície Flúvio-Marinha,
compreendendo de terrenos sedimentares do período geológico do
Quartenário. A segunda unidade de relevo é compreendida pelas colinas
dissecadas, conhecidas como morros e que ocupa grande porção territorial da
cidade. Os morros circundam a cidade com concentração nas porções norte,
oeste e noroeste numa formação semelhante a um anfiteatro, de formação
sedimentar, com terrenos anteriores as áreas de planície. Os depósitos
sedimentares fazem parte do grupo Barreiras, de idade plio-pleistocênica, com
solos areno-argilosos (ANDRADE, 2009, pg. 176).
Figura 11 – Mapa de relevo
Fonte: Base Cartográfica da Prefeitura da Cidade do Recife, adaptado por José Rafael, 2015
63
De acordo com Andrade (2009, pg. 177) em texto adaptado da Prefeitura
do Recife, pode-se dizer que a cidade estava compartimentada em 05 grandes
unidades ambientes naturais, sendo:
Ambiente Litorâneo: Situado entre o canal de Setúbal, os manguezais do Pina e o oceano, o ambiente litorâneo do Recife se estende sobre 6km². O solo de areias é intensamente ocupado nos bairros de Boa Viagem, Brasília Teimosa e do Pina.
Ambiente da Planície: A planície, situada entre os morros e o baixo estuário, estende-se sobre 50km². Por ser a área de solo massapé, até o século XIX, era quase exclusivamente ocupada por canaviais e os aglomerados que nela existiam eram ligados à agricultura.
Ambientes Aquáticos: Os ambientes aquáticos compreendem as águas superficiais, formadas pelas águas salgadas do oceano Atlântico e pelas águas doces dos rios, canais, lagoas e açudes. Quase todos os bairros são atravessados por rios, entre os quais se destacam o Capibaribe, o Beberibe, o Tejipió e o Jordão; por canais, riachos ou córregos, açudes, como o de Apipucos, e lagoas, como a do Araça.
Ambientes do Baixo Estuário: Situado entre os ambientes da planície e o litorâneo, o ambiente de baixo estuário se estende por uma área de 30km² de extensão. Nesse ambiente há uma intensa troca entre a água doce dos rios e a água salgada do mar. A maior parte do solo resulta de aterros que, ao longo do tempo, interligaram ilhas, ilhotas e coroas.
Ambiente dos Morros: Os ambientes dos morros se estendem a norte, a Oeste e a Sudoeste da cidade, sobre mais da metade da área do município. A partir do Bairro de Cajueiro, passado pelos morros de Casa Amarela, Macaxeira, Dois Irmãos, Curado, Tejipió, Ibura, Cohab, até o Jordão, as colinas, com variação aproximada de cinquenta a oitenta metros de altura, elevam-se sobre a planície e se prolongam nas chãs/ tabuleiros dos bairros da Guabiraba e Pau Ferro, a Noroeste do município, uma área que apresenta ainda grandes espaços semirrurais. As vertentes e os fundos de vale mantêm a sua cobertura vegetal, necessária à preservação da qualidade das aguas dos numerosos riachos, que lá têm suas nascentes. Os desmatamentos e a ocupação das colinas mais próximas da cidade, originalmente periferias das grandes propriedades dos plantadores de cana-de-açúcar, ocorrem neste século, a partir dos anos quarenta, nos morros da Zona Norte e a partir dos anos sessenta, nos morros da Zona Sul.
Do ponto de vista climático, Recife está inserido no domínio climático
Tropical Chuvoso, de classificação As’ com clima quente e úmido com chuvas
de outono-inverno, segundo a classificação de Köppen.
64
De acordo com dados colhidos da Estação Meteorológica do Recife,
localizada no Curado e pertencente ao INMET – Instituto Nacional de
Meteorologia, a temperatura média anual no Recife é de 25,5ºC, com máxima
média anual de 29, 1ºC e mínima média anual de 21,9ºC (CPRM, 2003). O
período com maiores temperaturas abrange os meses de dezembro a março
(verão no hemisfério sul), enquanto os meses de junho a setembro (inverno no
hemisfério sul) compreendem os meses com as menores temperaturas.
A precipitação média no Recife compreende 2.200mm. Conforme o
climograma da Cidade do Recife, representado na Figura 12, o período
compreendido entre os meses de março a julho apresenta médias
pluviométricas acima da média, com grande concentração de chuvas. O
trimestre entre maio e julho concentra 47% do total anual, enquanto o trimestre
entre outubro e dezembro concentra apenas 7,5% da precipitação. Os demais
meses do ano, os índices pluviométricos se apresentam abaixo da média,
apresentando para o mês de novembro índice médio inferior a 50mm de chuva.
(ALHEIROS, 2003; ANDRADE, 2009; CPRM, 2003)
Figura 12 – Climograma do Recife
Fonte: http://slideplayer.com.br/slide/53349/# - Slide 38.
Na associação da intensidade de chuva em determinados meses do
ano, com o relevo acidentado, de solo areno-argiloso, e com os processos
65
erosivos intensificados em decorrência da forte ocupação do solo urbano por
habitações com baixa técnica construtiva, observa-se uma maior intensidade
de deslizamentos de encostas nos períodos de maior intensidade
pluviométrica. “Essas características favorecem o intemperismo químico das
rochas graníticas e dos sedimentos feldspáticos, aumentando o conteúdo de
argilas nos solos, o que leva a uma maior probabilidade de ocorrência de
escorregamentos.“ (ALHEIROS, 2003, pg. 34).
Do ponto de vista hidrográfico, a cidade do Recife é banhada pela Bacia
do Capibaribe e por rios que formam algumas bacias litorâneas como o Rio
Beberibe ao norte e o Rio Tejipió ao sul. Associado a esses três rios principais,
a cidade ainda é cortada por diversos canais e riachos, que desaguam nos rios
principais e, por conseguinte no estuário principal que forma as Ilhas do Recife
e Martim Vaz na região central da capital pernambucana (PFALTZGRAFF,
2007, pg, 59).
Os rios que cortam a cidade se caracterizam como perenes, tendo as
suas vazões aumentadas nos períodos de maior precipitação. Em decorrência
do relevo e do processo de ocupação urbana, as margens dos principais
cursos d’agua se encontram ocupadas, o que possibilita a ocorrência de
transbordamentos e consequentemente, enchentes em diversos pontos da
cidade.
Devido às características citadas acima, a Prefeitura da Cidade do
Recife, através da atual Secretaria Executiva de Defesa Civil tem intensificado
na última década diversas ações de prevenção com o intuito de se reduzir
drasticamente a ocorrência desses acidentes, objetivando a diminuição ou
mesmo zerar o número de vítimas fatais.
66
Figura 13 – Mapa hidrográfico
Fonte: Base Cartográfica da Prefeitura da Cidade do Recife, elaborado por José Rafael, 2015
4.3. Síntese da Ocupação do Recife A ocupação do Recife parte da instalação de um porto. Partindo das
áreas planas ao longo dos cursos d’água como a foz dos Rios Capibaribe e
Beberibe, o processo de ocupação do solo da cidade do Recife se processou
por eixos radiais que partem da área central em direção ao interior, decorrentes
da instalação de antigos engenhos de cana-de-açúcar durante o período
colonial até o século XIX.
A síntese da ocupação do Recife remonta as primeiras décadas de
colonização do Brasil ainda em 1537, através do Foral de Olinda, quando se
tem o primeiro registro da existência de um núcleo inicial com a constituição de
um porto natural, que servia de atracadouro de barcos na extensão de Olinda.
O porto iria servir de ancoradouro dos barcos que iriam fazer o transporte de
cana-de-açúcar produzida nos engenhos localizados na então Capitania de
67
Pernambuco. Inicialmente a ocupação nas imediações do porto era formada
apenas por trabalhadores e alguns pescadores, vindo a localidade começar a
ganhar destaque com a chegada dos holandeses no século XVII (ALVES,
2009, pg. 30).
Figura 14 – Mapa do Recife no século XVI
Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/cidade/projetos/bairrodorecife. Acessado em 10 de Janeiro de 2015.
A ocupação inicial se dava no istmo que ligava o porto a vila de Olinda,
sendo uma estreita faixa de terra onde foram construídas poucas casas para
abrigar os trabalhadores do porto e alguns comerciantes e pescadores. Com o
passar dos anos, o então istmo começa a sofrer vários aterros, principalmente
no século XVII com a chegada dos holandeses, vindo a se expandir,
possibilitando a construção de novas edificações e abertura de novas vias.
68
Figura 15 – Vista de Olinda para o Porto do Recife no século XVII.
Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccr/historia/. Acessado em 10 de Janeiro de 2015.
Em 1931 a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais se lança na
conquista e exploração das terras pertencentes à colônia portuguesa,
aportando no povoado do Recife, onde ali se instalam e durante 24 anos
estabelecem um domínio holandês no novo território. Com aproximadamente
70 casas e algumas poucas vielas que davam sustentação ao porto ali
instalado, Recife ainda não apresentava estrutura urbana com porte para a
fixação de um comando como os holandeses queriam instalar, mas diante das
boas condições do terreno, o solo era propício para o crescimento de um
povoado e da sua posterior expansão, fato que veio acontecer, fazendo com
que o lugar se desenvolvesse nos anos posteriores. (ALVES, 2009)
Durante os anos de ocupação holandesa, o território do Recife se
expande com a realização de sucessivos aterros e a constituição de uma nova
organização urbana com a ocupação da Ilha de Martin Vaz localizada no outro
lado do Rio Capibaribe (atual bairros de Santo Antônio e São José), onde o
governo holandês instala e ali constrói a “Cidade Maurícia” durante o período
governado pelo Conde Maurício de Nassau. Com a chegada dos holandeses,
Recife começa a ganhar nova configuração espacial, e o traçado espontâneo
presente no Istmo do Recife (atual bairro do Recife), começa a conviver com
69
um traçado planejado, retilíneo e monumental, proposto para os atuais bairros
de Santo Antônio e São José. (Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccr/historia/cap3/cap3-box4.html.
Acessado em: 10 de Janeiro de 2015).
Figura 16 – Cidade Maurícia em 1644.
Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/cidade/projetos/bairrodorecife/mapas_xvii.htm. Acessado em: 10 de Janeiro de 2015.
Com a expulsão dos holandeses em 1654 a configuração urbana do
Recife se apresenta completamente diferente do período em que os mesmos
aportaram naquela povoação em 1631, tendo apresentado uma grande
expansão urbana e a implantação de um novo modelo de cidade, com a
configuração de um traçado regular, retificação dos seus canais, e a realização
de sucessivos aterros, que continuaram ao longo dos séculos seguintes.
Recife se constituiu como cidade em 1823 e veio tornar capital do
Estado de Pernambuco em 1827 (Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível
em:http://www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccr/historia/ Acessado em: 15 de
janeiro de 2015), quando devido o seu desenvolvimento comercial e a
importância do seu porto para as exportações de cana-de-açúcar advinda dos
inúmeros engenhos da então província de Pernambuco e das províncias
vizinhas, já se destaca como uma das vilas mais importantes do país, junto
com Salvador (primeira capital da colônia) e Rio de Janeiro (então capital do
império português no Brasil, após a vinda da família real em 1808).
70
No início do século XX, com inspiração europeia, Recife passa por
novas transformações urbanísticas, e começa o processo de remodelação da
cidade com a redefinição do seu desenho urbano, com especial destaque para
as regiões centrais que sofreram inúmeras transformações, com o intuito
higienista, que tinha a função de abrir novas ruas e demolir as antigas
construções que não apresentavam condições adequadas de higiene e
salubridade (Prefeitura da Cidade do Recife. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccr/historia/cap7/cap7-box3.html.
Acessado em 15 de Janeiro de 2015). Inúmeras outras modificações ocorreram
na cidade ao longo do século XX com o mesmo objetivo higienista inspiradores
nas proposições de Saturnino de Brito. “O projeto e a instalação do sistema de
saneamento idealizado pelo engenheiro Saturnino de Brito colocava o Recife
na posição de um centro urbano moderno.” (Prefeitura da Cidade do Recife.
Disponível em: http://www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccr/historia/cap7/cap7-
box3.html. Acessado em 15 de Janeiro de 2015). A expansão da cidade
começa a abarcar novas áreas como a faixa sul do litoral da cidade, com os
bairros do Pina e Boa Viagem, assim como pelos antigos corredores de ligação
dos engenhos, como o eixo no sentido da Várzea e nas imediações de Casa
Amarela e Torre, onde ali foram edificados antigas fábricas têxteis.
Ainda no século XIX, começa o processo de industrialização da cidade
com a implantação de algumas fábricas, dando novas configurações aos
antigos engenhos.
Algumas fábricas começam a ser implantadas na cidade e marcam
uma conformação diversa da existente, ocupando áreas dos antigos
engenhos. Assim, instala-se a indústria têxtil no Recife, em 1874,
constrói-se, em terras do antigo engenho da Madalena, a Fábrica de
Fiação e Tecidos Madalena, e em terras do antigo engenho da Torre,
a Fábrica da Torre 1 (1884) e a Fábrica da Torre 2 (1889). Em 1895,
instalam-se as fábricas da Várzea e de Apipucos. Outras se instalam
nos municípios próximos, que hoje forma parte da Região
Metropolitana do Recife, em Paulista (1891), em Camaragibe (1891)
e em Jaboatão (1910). (Alves, 2009, pg. 51)
A configuração então existente até o século XIX de casa-grande,
senzala e engenho, passa a dar lugar a fábrica e as chamadas vilas fabris,
71
onde os operários residiam. As vilas fabris constituem nos primeiros conjuntos
habitacionais construídos no intuito de prover habitação para os operários das
fábricas com a possibilidade de estarem localizados próximos das mesmas.
(ALVES, 2009, pg. 51).
No princípio do século XX, a ocupação da cidade ainda permanecia
bastante concentrada nos bairros centrais. [...] é por intermédio dos
tentáculos que a cidade se expande incorporando as partes nodosas
ou povoações periféricas aos trechos iniciais, preenchendo os vazios,
concentrando e consolidando povoações de maior porte. (LIMA,
2012, pg. 48)
Durante o século XX vários processos de remodelação e expansão da
cidade passam a ser verificados, com a formação de núcleos urbanos ao longo
da malha urbana existente, principalmente com a construção de diversas linhas
férreas que remodelaram a estrutura viária da cidade e deram a configuração
dos principais eixos existentes atualmente.
A expectativa da população no final do século XIX e início do século XX
com o processo de industrialização verificado com a instalação de diversas
fábricas, atrelado a crises no meio rural em decorrência de fortes estiagens,
abolição do trabalho escravo e modernização dos engenhos que começaram a
se constituir como usinas, impulsionaram fortes migrações da população para a
capital do Estado.
A modernização do parque açucareiro e as frequentes secas no
sertão, além do processo mais geral de urbanização por que passou
o país a partir da revolução d 30, colaboraram para o crescimento da
população do Recife, que, como as demais cidades brasileiras que se
expandiram no período, não possuía infraestrutura capaz de atender
tal explosão demográfica. (BONDUKI, 2014, pg. 288)
As populações mais abastadas conseguiram ao longo do tempo se
instalarem adequadamente, principalmente nos novos eixos como os bairros de
Casa Forte, Graças, e imediações. Diferentemente dessa população, os
habitantes de menor poder aquisitivo, que não possuíam condições para
adquirirem uma habitação, foram habitar nos cortiços existentes nas áreas
72
centrais, ou começaram a ocupar as áreas menos valorizadas como os
mangues e as encostas dos morros. (ALVES, 2009; LIMA, 2012; BONDUKI,
2014)
A expansão da cidade esta bastante associada, desde o início da sua
ocupação com a realização de sucessivos aterros, como observado no início
deste capítulo, e que começa a ganhar novas proporções ao longo do século
XX, principalmente ao longo dos cursos d’água, nas áreas consideradas
alagadas, com o assentamento de uma população pobre advinda de diferentes
áreas do Estado. Essa população começou a construir os chamados
mocambos, que se caracterizavam como sendo habitações feitas com restos
de materiais, como madeiras e palha, e estavam localizados em áreas
precárias do ponto de vista de assentamento e infraestrutura.
Desprovidos de infraestrutura, com condições precárias de
habitabilidade e higiene, distantes do padrão recomendado de
moradia saudável, os mocambos proliferaram como a principal
alternativa de moradia para a população de baixa renda pela
facilidade de execução e disponibilidade de mão-de-obra. (BONDUKI,
2014, pg. 288)
Como forma de promover uma “renovação urbana” de cunho higienista
que visava principalmente a retirada daqueles habitantes das áreas próximas
ao centro e que poderiam sofrer certa valorização imobiliária com a realização
posterior de novas edificações, foi criado em 1938 pelo então governador
Agamenon Magalhães a Liga Social Contra os Mocambos – LSCM, que visava
a erradicação desse tipo de moradia. De acordo com levantamento feito,
existiam na cidade 45.581 mocambos com população de aproximadamente
165 mil habitantes, o que representava um terço da população total do Recife
segundo o censo demográfico de 1940.
Do total de mocambos, 77% eram cobertos com palha ou capim, 83%
tinham piso de terra, 72% tinham três cômodos ou menos e 91% não
contavam com sistema de coleta de esgoto. Uma informação, no
entanto, surpreendente: apenas 9% dos mocambos eram próprios,
enquanto 34% eram alugados e nada menosque 48% tinham
construção própria sobre uma terra alugada, mostrando a força do
73
patrimonialismo nas cidades brasileiras e a expressão do mercado
em áreas de assentamento informal já nos anos de 1940. (BONDUKI,
1914, pg. 288)
Figura 17 - Mapa geral da cidade do Recife, com as vilas construídas pela Liga Social
Contra o Mocambo de 1939 e 1942
Fonte: Relatórios da Liga Social Contra o Mocambo, julho/1941 a julho/1942. Recife:
Imprensa Oficial, 1942, apud BONDUKI, 2014.
Figura 18 – Mocambos do Recife
Fonte: BONDUKI, 2014
Diante de tal realidade, em 1939 foi criada a primeira instituição pública
durante o regime varguista com a finalidade específica de construir casas
populares, e que contou com grande participação da iniciativa privada. A
principal função da Liga Social Contra os Mocambos foi promover uma
reorganização espacial, com a construção de habitações populares e a retirada
das antigas habitações com a liberação dos terrenos para posterior
74
intervenção. Mesmo com toda a propaganda, tanto do governo quanto da
iniciativa privada, pouco se foi feito ao que concerne a construção de novas
habitações, enquanto por outro lado, houve uma grande limpeza social dos
moradores dos mocambos, que foram obrigados a se mudarem para áreas
mais distantes onde os riscos sociais persistiam.
Tabela 06 – Liga Social Contra os Mocambos - Casas projetadas, construídas e a
construir
Casas Projetadas
Casas Construídas
Casas a construir
Recife - total de casas populares 6.483 3.212 3.362 Recife - casas de classe média 899 899 - Interior 6.222 6.222 - Total 13.604 10.242 3.362
Fonte: BONDUKI, 2014
Mesmo com a construção de casas, o efetivo construído e a real
necessidade da população se mostravam bastante distinto, pois o número total
de habitações construídas (admitindo que todas as edificações localizadas no
interior fossem destinadas a população de baixa renda), menos 20% das
famílias teriam sido beneficiadas com habitações adequadas.
Em 1945, depois de mudanças no modelo de construção e com a falta
de recursos para prosseguimento do programa, a LSCM foi transformada em
autarquia governamental, mas que não teve os mesmos objetivos anteriores.
A intervenção realizada pela LSCM, como nenhuma outra ação
habitacional do período, esteve profundamente articulada com as
propostas de renovação e expansão urbana da cidade do Recife.
Infelizmente, não foi implementada na perspectiva de garantir o
direito à cidade, mas, ao contrário, como instrumento para aprofundar
a segregação socioterritorial. (BONDUKI, 2014, pg. 293)
A política habitacional no Estado após o período varguista tem uma
paralização, voltando a ser retomada com a implantação das políticas
habitacionais durante o Regime Militar através do Banco Nacional de Habitação
– BNH. Durante os anos de 1965 a 1978 foram erguidos no Estado 63.665
habitações, através da constituição de vários conjuntos habitacionais no Recife,
75
Região Metropolitana e alguns municípios do interior. O primeiro conjunto
habitacional foi construído na extremidade sul da capital pernambucana, no
atual bairro da Cohab, a chamada UR-01 (Unidade Residencial 01) com um
total de 1.051 unidades entregues em outubro de 1966 (Jornal do Comércio.
1999. Entre os anos de 1979 e 1986 foram entregues mais 33.835 habitações e
13.618 intervenções em áreas pobres.Disponível
em:http://www2.uol.com.br/JC/_1999/1107/ec1107o.htm. Acessado em 15 de
Fevereiro de 2015).
Durante a década de 1980, mesmo com a continuidade na construção
de habitacionais (em grande maioria nos demais municípios da Região
Metropolitana do Recife, principalmente em Paulista e Abreu e Lima), novas
formas de intervenção começam a ser implementadas na capital do Estado. A
década de 1980 é marcada pela constituição de um marco jurídico e pelo
reconhecimento por parte do poder público municipal das áreas pobres da
cidade. Nesta década o poder público do Recife adquire e regulariza o
equivalente a 36% da área dos assentamentos pobres existentes. Em parte, o
reconhecimento desses assentamentos se desenvolve em decorrência da forte
pressão dos movimentos sociais de luta por moradia, juntamente com diversos
organismos institucionais, como a Igreja Católica e o meio acadêmico (LIMA,
2012; NETO, 2013).
Em levantamento feito pela Fundação de Desenvolvimento
Metropolitano - FIDEM em 1978 foram registrados 27 assentamentos de baixa
renda, que veio posteriormente a ser constituídos como Áreas Especiais de
Interesse Social – AEIS, e institucionalizados como Zonas Especiais de
Interesse Social – ZEIS pela Lei de Uso e Ocupação do Solo 14.511 de 1983.
Este foi o primeiro passo para o reconhecimento legal desses assentamentos
pobres e uma forma de consolidação dessas áreas. Em 1987 é criado, através
de pressão dos movimentos sociais organizados o Plano de Regularização das
Zonas Especiais de Interesse Social – PREZEIS. A constituição dessas áreas
como ZEIS tem como principal objetivo a regularização fundiária e
posteriormente a consolidação dessas áreas com a implantação de
infraestrutura urbana e a inibição da especulação imobiliária devido o
estabelecimento de lotes mínimos e proibição de remembramentos. Mesmo
com todo o marco jurídico implementado e a expansão das ZEIS para outros
76
níveis de governo, a exemplo o reconhecimento por parte do governo federal
com a incorporação de artigos na Lei Federal nº10.257/2001 – Estatuto da
Cidade, ainda verifica-se grande pressão do setor imobiliário por diversas
áreas, a exemplo de bairros como Brasília Teimosa e partes do Pina na cidade
do Recife, objetivando a aquisição dessas áreas e a posterior “expulsão” de
seus moradores para áreas mais distantes, aumentando a segregação
socioespacial já presente na cidade (LIMA, 2012; NETO, 2013).
De acordo com o Plano Diretor do Recife (Lei Municipal nº17.511/2008),
a cidade apresenta 61 áreas consideradas como Zonas Especiais de Interesse
Social – ZEIS. A configuração dessas áreas como ZEIS possibilita para os seus
habitantes uma maior segurança jurídica sobre a posse da terra, ao passo que
também contribui para a fixação dos mesmos nas áreas em que habitam,
impedindo o processo de especulação imobiliária, principalmente nas ZEIS
localizadas em áreas mais valorizadas, como os bairros de Boa Viagem, Casa
Forte, Pina, entre outras áreas. A configuração de áreas como ZEIS também
tem a pretensão de proporcionar a regularização fundiária e urbanística das
áreas dotando-as de infraestrutura urbana e social, o que deveria ser
consolidado através do Fórum do PREZEIS (Programa de Regularização das
ZEIS).
De acordo com dados do censo demográfico do IBGE em 2010, a cidade
do Recife apresentava um déficit habitacional de 12,5%, equivalente a 47.327
habitações e um total de 167.613 habitações (44,4%) com condições
inadequadas por infraestrutura. Dentro do contexto sociopolítico, os programas
implementados se constituíram como insuficientes para acabar com o déficit
habitacional, ou ao menos, estimar uma diminuição gradativa dos problemas
habitacionais existentes na cidade do Recife.
Atualmente, Recife se constitui como sendo uma das cidades mais
importantes do país, e destaque dentro da Região Nordeste junto com Salvador
e Fortaleza, por atrair grandes instituições governamentais de nível nacional,
assim como polo de grandes empresas de diversos ramos da economia. Com
uma área total de 218,50km², segundo dados da Prefeitura do Recife, a cidade
está compartimentada segundo o seu relevo, tendo sua formação territorial
compreendida por 67,43% de morros; 23,26% de planícies; 9,31% de
aquáticas; e 5,58% de Zonas Especiais de Preservação Ambiental – ZEPA.
77
4.4. Caracterização Habitacional e Populacional do Recife A cidade do Recife possuía de acordo com o censo demográfico do
IBGE realizado em 2010 uma população total de 1.537.704 habitantes,
compreendendo uma densidade demográfica de 7.039,64hab/km².
Tabela 07 – População do Recife
Ano População 1872 116.671 1890 111.556 1900 113.106 1920 238.843 1940 348.424 1950 524.682 1960 797.234 1970 1.084.459 1980 1.240.937 1991 1.296.995 2000 1.421.993 2010 1.537.704
Fonte: Censos Demográficos do IBGE – Sistema de Recuperação de Dados / SIDRA
Fonte: Censos Demográficos do IBGE – Sistema de Recuperação de Dados / SIDRA
Recife, que em 1900 tinha 113.106 habitantes, em 1950 já contava
com 524.682 habitantes, apresentando um crescimento nesses
cinquenta anos de quase 464%. Sua maior taxa de crescimento se
deu entre as décadas de 1900 e 1920, quando apresentou uma taxa
de 211%. Entre os anos de 1920 e 1940, teve uma taxa de 146% e,
entre 1940 e 1950, de 150%. (ALVES, 2009, pg. 45)
116.671111.556113.106238.843348.424
524.682797.234
1.084.4591.240.9371.296.995
1.421.9931.537.704
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
187218901900192019401950196019701980199120002010
Popu
laçã
o
Anos do Censo
Gráfico 04 - Evolução da População do Recife
78
Conforme o gráfico apresentado acima observa-se uma aceleração na
evolução da população do Recife, principalmente na primeira metade do século
XX, com continuidade entre as décadas de 1950 e 1970, onde a população
dobra de tamanho, acompanhando uma aumento nas taxas de natalidade e em
decorrência da forte migração advinda do interior do Estado e de Estados
vizinhos devido às fortes secas presenciadas no período.
De acordo com o censo demográfico do IBGE realizado em 2010 a
população da cidade do Recife era de 1.537.704 habitantes, o que fazia da
capital pernambucana uma das 10 cidades mais povoadas do país. Entre os
censos de 2000 e 2010, houve um acréscimo de 115.711 habitantes, o
equivalente a 7,52%, taxa bastante inferior a apresentada em grande parte do
século XX.
Em 2000, Recife apresentava um contingente de 377.068 domicílios
ocupados, compreendendo uma média de 3,78 moradores por domicílio . Do
ponto de vista habitacional, de acordo com o censo demográfico do IBGE de
2010, Recife possuía um total de 471.210 domicílios particulares ocupados,
compreendendo uma média de 3,25 moradores por domicílio. Observa-se um
grande aumento no número de domicílios no período de 10 anos, ao passo que
há uma diminuição no número de habitantes por domicílio, o que vem
representar uma diminuição nas taxas de crescimento médio da população,
associada a uma maior independência dos moradores.
Do total de habitantes da cidade, o equivalente a 22,85% residiam em
aglomerados subnormais, totalizando 349.920 habitantes. Foram
contabilizados um total de 102.392 domicílios localizados em aglomerações
subnormais, com percentual corresponde a 21,73% do total de domicílios
existentes no Recife, localizados de acordo com o IBGE em 109 Aglomerações
Subnormais especializadas em todo o território municipal. A média de
moradores por domicílio nessas localidades se apresentava superior à média
geral do município, totalizando 3,42 moradores por domicílio. Constata-se
ainda o grande contingente habitacional residindo em habitações sem
condições de habitabilidade, com grande deficiência nas condições das
habitações e na infraestrutura urbana instalada, como abastecimento de água
79
deficitário, rede de esgotamento sanitário e coleta de resíduos sólidos
inadequados. Tabela 08 – Características dos Domicílios Particulares Ocupados - Situação de aglomerados subnormais Domicílios particulares ocupados (Unidades) 471.210 Domicílios particulares ocupados em aglomerados subnormais (Unidades) 102.392 População residente em domicílios particulares ocupados (Pessoas) 1.531.394 População residente em domicílios particulares ocupados em aglomerados subnormais (Pessoas) 349.920 Número de aglomerados subnormais (Unidades) 109
Fonte: Censo Demográfico do IBGE - 2010
A presença dos assentamentos pobres, como elemento constante na
construção da cidade, em busca pelo direito de morar, encontra
desde os primórdios o contraponto de indução à propriedade de uma
casa, o que dá uma dimensão reducionista do problema social e,
ainda assim, é combatido de modo relativamente ineficaz. (NETO,
2013, pg. 20)
Em relação à condição dos domicílios, segundo dados do censo
demográfico do IBGE de 2010, verifica-se na Tabela 09 que a maioria dos
domicílios era própria e se configuravam como casa. Mas ainda verifica-se um
grande contingente de domicílios considerados alugados ou cedidos,
equivalendo a 26,19% do total (123.267 domicílios). Tabela 09 - Condição de ocupação do domicílio
Tipo de domicílio
Total Casa Casa de vila
ou em condomínio
Apartamento
Habitação em casa de
cômodos ou cortiço
Total 470.754 335.534 6.844 124.355 4.021 Próprio 344.154 253.346 4.240 84.558 2.010 Próprio já quitado 328.206 251.310 3.685 71.216 1.995 Próprio em aquisição 15.948 2.036 555 13.342 15 Alugado 104.659 65.811 2.297 35.158 1.393 Cedido 18.608 13.918 271 4.194 225 Cedido por empregador 1.845 1.086 11 733 15
Cedido de outra forma 16.763 12.832 260 3.461 210
Outra condição 3.333 2.459 36 445 393
Fonte: Censo Demográfico do IBGE - 2010
80
Do ponto de vista das infraestruturas básicas, como abastecimento
d’água, esgotamento sanitário, coleta de lixo e energia elétrica observa-se
também um menor quantitativo de domicílios sendo atendidos nas áreas
consideradas aglomerações subnormais em relação à média da cidade.
Conforme verificado na Tabela 10, do total de domicílios existentes na
cidade, um percentual de 86,74% tem como forma de abastecimento de água
proveniente da rede geral de distribuição. Em relação aos domicílios
localizados em aglomerados subnormais, a abrangência de domicílios chega a
90,85%, sendo o serviço com melhor cobertura em relação ao total de
domicílios da área em estudo.
Tabela 10 – Forma de abastecimento de água Domicílios particulares
permanentes Aglomerados Subnormais
Unidades Percentual Unidades Percentual
Total 470.754 100 102.271 100
Rede geral de distribuição 408.329 86,74 92.916 90,85
Poço ou nascente na propriedade 50.635 10,76 4.131 4,04
Poço ou nascente fora da propriedade 5.423 1,15 2.215 2,17
Carro-pipa ou água da chuva 807 0,17 183 0,20
Rio, açude, lago ou igarapé 248 0,05 199 0,19
Outra 5.312 1,13 2.627 2,57
Fonte: IBGE - Censo Demográfico – 2010
Em relação ao tipo de esgotamento sanitário, assim como nas demais
áreas da cidade, a abrangência de domicílios atendidos por rede geral de
esgoto ou que despejam na rede fluvial é considerada baixa, com um
percentual de 54,99% para a cidade do Recife, e o correspondente a 40,01%
em relação aos domicílios localizados em assentamentos subnormais. Verifica-
se segundo os dados da Tabela 10 que 27,50% dos domicílios despejam seus
esgotos em fossas rudimentares, sem nenhum tratamento, e que cerca de 10%
81
dos domicílios despejam diretamente nos cursos d’agua da cidade.” Cabe
registrar os bairros Cohab, Ibura e Jordão, onde ocorreu crescimento
populacional elevado na última década, que apresentam maiores índices de
domicílios com essa forma precária de escoamento sanitário” (Prefeitura da
Cidade do Recife. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/pr/secplanejamento/planodiretor/diagnostico_ii.html.
Acessado em: 20 de Janeiro de 2015).
Em relação à destinação dos resíduos sólidos, mais de 95% dos
domicílios possuem seus lixos coletados pelo serviço de limpeza. Cerca de
3,6% tem seus resíduos coletados através de caçamba, sendo a grande
maioria localizados em áreas de difícil acesso para os caminhões, estando em
áreas de assentamentos subnormais, como encostas, em palafitas ou áreas
cujas as vias não possuem dimensões adequadas para a entrada de
caminhões de coleta. Destaca-se o percentual de domicílios que despejam
seus resíduos em terrenos baldios ou logradouros, cerca de 3,5% com 3.561,
correspondendo a quase metade dos domicílio da cidade que se utiliza deste
tipo de destinação para seus resíduos.
Tabela 11 – Tipo de Esgotamento Sanitário Domicílios particulares
permanentes Aglomerados Subnormais
Unidades Percentual Unidades Percentual
Total
470.754
100,00 102.271 100 Rede geral de esgoto ou pluvial
258.867
54,99 40.917 40,01
Fossa séptica 73.395 15,59 15.933 15,58
Fossa rudimentar 101.747 21,61 28.125 27,50
Vala 11.823 2,51 4.763 4,66
Rio, lago ou mar 19.242 4,09 10.266 10,04
Outro tipo 3.229 0,69 1.102 1,08 Não tinham banheiro ou sanitário 2.451 0,52 1.165 1,14
Fonte: Censo Demográfico do IBGE - 2010
82
Tabela 12 – Destino do Lixo Domicílios particulares
permanentes Aglomerados Subnormais
Unidades Percentual Unidades Percentual
Total 470.754 100,00 102.271 100,00
Coletado 460.679 97,86 97.184 95,03 Coletado diretamente por serviço de limpeza 445.779 94,69 93.517 91,44 Coletado em caçamba de serviço de limpeza 14.900 3,17 3.667 3,59
Queimado 687 0,15 255 0,25
Enterrado 54 0,01 12 0,01 Jogado em terreno baldio ou logradouro 7.358 1,56 3.561 3,48 Jogado em rio, lago ou mar
1.310 0,28 924 0,90
Outro destino 666 0,14 335 0,33 Fonte: Censo Demográfico do IBGE – 2010
Tabela 13 – Existência de Energia Elétrica
Domicílios particulares
permanentes Aglomerados Subnormais
Unidades Percentual Unidades Percentual
Total 470.754 100,00 102.271 100
Tinham 470.100 99,86 101.985 99,72 Tinham - de companhia distribuidora
466.464 99,09 100.017 97,8
Tinham - de outra fonte 3.636 0,77 1.968 1,92
Não tinham 654 0,14 286 0,28 Fonte: IBGE - Censo Demográfico
Do ponto de vista da rede de energia elétrica, os percentuais de
domicílios abastecidos com energia da companhia de distribuição são
superiores a 99,7%. A problemática da habitação, com forte rebatimento sobre os
segmentos de mais baixa renda na formação social urbana do
Recife, gera um campo de luta, embate e resistência como
alternativa de instalação dos pobres e garantia de sua
83
permanência na cidade. Afigura-se essa problemática de modo
expressivo no processo de ocupação de terras no espaço
citadino que, no transcurso da história, assume diferentes
feições e manifesta-se também na moradia habitada pelos
segmentos populares. (LIMA, 2013, pg. 84)
O déficit habitacional do Recife ainda se apresenta bastante alto,
principalmente em decorrência do processo histórico de ocupação da cidade,
onde os terrenos localizados nas áreas mais estáveis são destinados à
construção de empreendimentos de grande porte cujo foco das construtoras
existentes no Estado, tem como principal público alvo a população de renda
média e alta, ficando a população de renda baixa excluída. A deficiência nas
infraestruturas também acompanha o déficit habitacional, principalmente nas
áreas periféricas, nos aglomerados subnormais. (ALVES, 2009; LIMA, 2013)
84
5. O DESAFIO DA OCUPAÇÃO DO SOLO NAS ÁREAS AMBIENTALMENTE FRÁGEIS: OCUPANDO VAZIOS 5.1 Caracterização da ocupação das áreas de morro do Recife
A ocupação do solo no Recife e nas grandes cidades brasileiras enseja
um movimento de expansão urbana cada vez mais predatória do ponto de vista
social e ambiental. A expansão das grandes cidades brasileiras tem se
verificado na ocupação de áreas periféricas e com grandes fragilidades
ambientais. De um lado encontram-se áreas susceptíveis a deslizamentos de
massas devido a sua formação geológica e aos tipos de solo presentes,
atrelado à baixa qualidade técnica das edificações, construídas sem
acompanhamento técnico de profissional habilitado (arquiteto, engenheiro ou
geólogo). Do outro lado, não menos impactante, está à ocupação ao longo dos
cursos d’água, susceptíveis a alagamentos constantes, atrelado a construções
realizadas com materiais de baixa resistência, como madeira ou resíduos
advindos de lixo.
O processo de ocupação irregular e informal do solo por parte da
população de baixa renda na cidade do Recife remonta desde o século XIX, se
intensificando no século XX como descrito no capítulo 4 do presente trabalho.
Algumas ações foram tomadas pelo poder público municipal e estadual no
intuito de se minimizar a situação de irregularidade e informalidade destas
ocupações, mas que mesmo se passado décadas, as ações não surtiram o
efeito desejado, principalmente do ponto de vista jurídico, onde ainda se
presencia a expansão da cidade informal com ocupações da população de
baixa renda em áreas ambientalmente frágeis, como as encostas dos morros e
as margens dos cursos d’água. A situação descrita acima é reconhecida pela
Prefeitura da Cidade do Recife no momento de revisão do seu Plano Diretor
em meados dos anos 2000, quando reafirma as condições de habitabilidade
das edificações e a baixa qualidade da infraestrutura instalada em
determinadas áreas da cidade, principalmente onde se encontram localizadas
essa população.
85
A omissão do Estado em relação a uma necessária regulação das
propriedades urbanas e sua ação direta, por meio de políticas de
desenvolvimento urbano e habitacional, se rebateram numa
distribuição seletiva dos investimentos públicos, incentivando a
retenção especulativa da terra e restringindo o acesso ao solo urbano
e à moradia para a população de baixa renda. Esta população só vem
tendo, historicamente, acesso à terra urbana e a alternativas
habitacionais mediante ações informais e irregulares de ocupação da
terra e padrões de baixíssima qualidade na construção da habitação,
em áreas pouco infraestruturadas e ambientalmente frágeis, com as
piores condições de habitabilidade (margens de córregos, áreas de
risco geotécnico, entre outras).(Prefeitura da Cidade do Recife.
Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/pr/secplanejamento/planodiretor/diagnosti
co_ii.html. Acessado em: 20 de Janeiro de 2015.
Em decorrência do modo de ocupação do espaço na cidade e o modelo
segregador dessa ocupação que ensejou a população de baixa renda a residir
em áreas cada vez mais distantes das áreas centrais da cidade, onde os
melhores terrenos (localizados em áreas planas e secas, sem a iminência de
alagamentos) foram destinados de forma indireta para a realização de
empreendimentos para as classes média e alta com a construção de grandes
edifícios. Com isso, as áreas restantes localizadas na área periférica foram
sendo destinadas a construção de loteamentos para a população de baixa
renda, como as realizadas nas décadas de 1960 a 1980 pela antiga
Companhia de Habitação – COHAB através das Unidades Residenciais – UR.
As áreas remanescentes da construção dos loteamentos da COHAB
foram ao longo dos anos, sendo ocupados por meio de invasões pela
população de baixa renda. Geralmente essas áreas remanescentes estavam
localizadas nas encostas, o que possibilitava a ocorrência de modificações
acentuadas no declive dos terrenos e a iminência de possíveis deslizamentos,
devido à associação dessas modificações com o modelo de apropriação
inadequada do solo.
Como forma de assegurar juridicamente a população dos
assentamentos subnormais, a Prefeitura do Recife, através da Lei nº14.511 de
1983 as Zonas Especiais de Interesse Social, reafirmadas no Plano Diretor
86
aprovado através da Lei nº17.511 de 2008, delimitando 61 áreas ZEIS,
abrangendo uma população total em 2000, de acordo com o censo
demográfico do IBGE, de 583.724 habitantes (o equivalente a 41% da
população total do Recife, que era de 1.422.905 habitantes). Figura 19 – Mapa das Zonas Especiais de Interesse Social do Recife
Fonte: http://eps.revues.org/docannexe/image/5824/img-3-small480.jpg
As áreas consideradas ZEIS estão localizadas em todas as regiões da
cidade, encontrando-se pulverizadas conforme verificado na Imagem 11. Do
total de ZEIS, aproximadamente 20 (algumas ZEIS estão delimitadas
abrangendo áreas de encosta e plana) delas se encontram localizadas em
87
áreas de relevo acidentado, nas extremidades da cidade, como os bairros do
Jordão, Cohab, Ibura, Barro, Curado, Coqueiral, Casa Amarela, Linha do Tiro,
Dois Unidos, Várzea, Vasco da Gama, Novas Descoberta, Guabiraba, além
dos diversos morros localizados na Zona Norte da cidade.
A grande parcela dos domicílios localizados em aglomerações
subnormais estão localizados na parte plana da cidade, o equivalente a
102.271 domicílios, sendo 49,07%. Os domicílios localizados em áreas de
colina ou encosta corresponde a 33.509 domicílios, equivalente a 32,76%,
conforme dados do Censo Demográfico do IBGE de 2010, representado na
Tabela 14.
Tabela 14 – Características e localização predominantes do sítio urbano
Localização Total de Domicílios Percentual
Total 102.271 100,00 Margem de córregos, rios ou lagos/lagoas 11.863 11,60 Sobre rios, córregos, lagos ou mar (palafitas) 209 0,20 Manguezal 491 0,48 Faixa de domínio de rodovias 1.864 15,71 Faixa de domínio de linhas de transmissão de alta tensão 547 0,53 Encosta 24.109 23,57 Colina Suave 9.400 9,19 Plano 50.180 49,07 Outras 3.608 3,53 Fonte: IBGE - Censo Demográfico
5.2. Problemas Urbanísticos da Ocupação dos Morros do Recife O processo de ocupação nas áreas de morro da cidade do Recife
associado à baixa qualidade da infraestrutura urbana, principalmente em
relação aos serviços de esgotamento sanitário e coleta de lixo acarreta na
aceleração de processos erosivos em períodos chuvosos, e
consequentemente, na ocorrência de deslizamentos de barreiras.
Como visto na caracterização do Recife presente no capítulo 4, a
ocupação nas áreas de morro foram realizadas pela população de baixa renda,
em decorrência da ausência de terrenos adequados para a ocorrência desses
88
assentamentos, principalmente devido a forte especulação imobiliária presente
na cidade.
Entre as décadas de 1940 e 1970, já havia uma notável expansão da
favelização, com grande expressão nas colinas, consentida pelos proprietários
de terra, que fizeram contratos com os moradores, embora fossem à margem
do quadro jurídico instituído (NETO, 2013, pg. 30 apud SOUZA, 2009).
Durante a década de 1970 se acelera o ocorrência de invasões nas
áreas de morro da cidade, ocupando as áreas remanescentes dos diversos
loteamentos implantados através do BNH, na Zona Sul da cidade e devido a
forte migração do interior do Estado. Com isso, a ocupação nas áreas de morro
se faz sem a presença de técnicas apropriadas de construção.
A partir da década de 1990, os conflitos que culminaram no surgimento
de novos assentamentos pobres, seja nos alagados/alagáveis ou nos “morros”,
foram arrefecidos, contudo as ocupações, processadas à margem do quadro
jurídico instituído, continuaram ocorrendo por meio de estratégias políticas.
(NETO, 2013, pg. 36)
Figura 20 – Ocupação desordenada em área ambientalmente frágil no Bairro da
Guabiraba, Zona Norte do Recife
Fonte: Jose Rafael, 2013
89
A forma como se processou a ocupação das áreas de encosta na cidade
do Recife vem acarretar inúmeros problemas urbanos, associados com o
modelo de assentamento das edificações, geralmente localizadas em áreas
com grande instabilidade geológica. O risco de deslizamentos se torna evidente
devido às condições que se processaram a ocupação nas áreas de encosta. As Ocupações Espontâneas, resultantes da busca individual ou
coletiva pela moradia, tem os próprios ocupantes como agentes
modificadores do espaço. A decisão de onde e como habitar, é
estabelecida à medida que o assentamento se estrutura. As
necessidades vão criando o lugar, consolidando um tipo de ocupação
desordenada, considerada como o principal responsável pelo
desequilíbrio das encostas, prevalecendo os efeitos da ação
antrópica, sobre os demais fatores de risco. (Agência CONDEPE-
FIDEM, 2001)
O risco de deslizamentos na cidade do Recife pode ser de diferentes
origens, tendo como principais fatores decorrentes da forma inadequada de
ocupação das áreas de encostas os condicionantes naturais (litologia,
declividade, forma da encosta, etc) e condicionantes antrópicos (retirada da
cobertura vegetal, cortes inadequados nos taludes, acúmulo de lixo e materiais
provenientes das modificações do relevo, e inexistência de rede de drenagem
planejada que atenda as condições de ocupação do solo) (PFALTZGRAFF,
2007, pg.65). Outros fatores podem ocasionar deslizamentos, como abalos
sísmicos, mas não há presença de registros no Brasil em relação a este tipo de
ocorrência, em decorrência da localização geotécnica do país sobre a Placa
Sulamericana.
O tipo de solo presente no Recife, com influência da sua granulometria,
associada à alta pluviosidade em determinados períodos do ano se torna um
dos principais fatores para a ocorrência desses deslizamentos
(PFALTZGRAFF, 2007).
90
Figura 21 – Mapa Geológico do Recife
Fonte: Base Cartográfica da Prefeitura da Cidade do Recife, adaptado por José Rafael, 2015
Primeiramente, como forma de preparação do solo para a realização de
construção, a população retira de forma inadequada toda a cobertura vegetal,
deixando o solo sem proteção e acelerando o processo de assoreamento do
solo. Sem cobertura vegetal que possibilita a redução da velocidade da chuva e
aumento da sua absorção no solo, a água cai diretamente no solo com maior
velocidade, infiltrando no solo deixando saturado. A chuva provoca erosão no solo pelo impacto das suas gotas sobre a
superfície e através da infiltração e do escoamento da água. As
águas de infiltração dão lugar a movimentos de remoção de materiais
quando a umidade excessiva provoca a perda de coesão do solo. [...]
Chuvas concentradas, associadas aos fortes declives, aos espessos
mantos de intemperismo e ao desmatamento podem criar áreas
potenciais de erosão. (Ministério das Cidades, 2008, pg.82)
91
A presença de água no solo, associado com as condições do terreno
(condições relativas ao relevo e geológica como fatores endógenos, e
condições relativas às modificações antrópicas), faz com que aumente a
probabilidade de ocorrência de movimentos de massa (Ministério das Cidades,
2008, pg. 67).
Figura 22 – Residência em situação de Risco Muito Alto
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2013
A ação antrópica sobre o terreno acarreta na aceleração dos processos
erosivos em decorrência da forma como essas ações são realizadas. A retirada
da cobertura vegetal e o plantio de vegetação inadequada como árvores de
grande porte que sobrecarregam o solo, assim como de bananeiras que
absorvem muita água deixando o solo saturado; cortes inadequados no talude
e a presença de aterros sem compactação; despejo inadequado de resíduos
sólidos (Figura 23), assim como de águas servidas diretamente sobre o talude
(Figura 24), sem tratamento; obras inadequadas de infraestrutura, como redes
de drenagem subdimensionadas e impermeabilização excessiva do solo, sem a
possibilidade de absorção das águas da chuva.
92
Figura 23 – Presença de Lixo despejado diretamente no talude
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2013
Figura 24 – Cano de Águas servidas diretamente sobre a barreira
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2013
93
A efetivação na ausência de um planejamento que possibilita uma
remodelação na forma de uso e ocupação do solo nas áreas ambientalmente
frágeis como as encostas da cidade tende a provocar diversos deslizamentos
nos períodos de maior pluviosidade, como os meses de abril a agosto, vindo a
ocasionar perdas sociais, econômicas, ambientais, principalmente com a
presença de vítimas, conforme verificado segundo dados da SEDEC-Recife no
Gráfico 05.
Fonte: SEDEC – Recife, 2015
Conforme os registros da Prefeitura da Cidade do Recife, devido à
ausência de ações efetivas e a estruturação de órgão responsável pelo
monitoramento das áreas de risco nas décadas de 1980 e 1990, o número de
mortes se apresentava elevado. Até a constituição do Programa Guarda Chuva
pela prefeitura do Recife, a atuação da Defesa Civil estava restrita a ações de
socorro nos momentos de maior intensidade de chuvas. Em 1996, ano de
maior incidência de mortes, em apenas um dia, foram registradas 23 mortes no
Córrego do Boleiro em decorrência de deslizamentos, que totalizaram 41
vítimas no Estado (Folha de São Paulo. Disponível
em:http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/4/30/cotidiano/39.html. Acessado em
25 de Janeiro de 2015). No ano de 2010, a elevação no número de vitimas foi
decorrente a um acidente ocorrido na localidade da Lagoa Encantada no bairro
da Cohab (Figura 25), na parte sudoeste da cidade, onde um cano da
Compesa havia estourado causando o deslizamento que vitimou 05 pessoas e
destruiu 03 casas. (Jornal Extra. Disponível em:
http://extra.globo.com/noticias/brasil/deslizamento-de-barreira-causa-cinco-
mortes-em-recife-224083.html. Acessado em: 2 de Janeiro de 2015)
01020304050
1984
1989
1990
1991
1994
1995
1996
1997
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
12 83 1
91
43
111
0 0 1 1 2 2 0 2 6 92 0 2 0
Num
ero
de M
orte
s
Ano
Gráfico 05 - Mortes por Deslizamento
94
Figura 25 – Deslizamento de Barreira na Lagoa Encantada em 2010
Fonte: Hans Von Manteuffel. Disponível em:
http://oglobo2.globo.com/pais/fotogaleria/2009/7734/. Acessado em: 25 de Janeiro de 2015.
De acordo com dados da Secretaria Executiva de Defesa Civil de 2012,
existiam na cidade do Recife 7.397 pontos de risco, sendo 1.656 pontos
considerados de Muito Alto Risco – R4, e 5.741 pontos considerados de Alto
Risco – R3.(CODECIR, 2012)
5.3. Ações para enfrentar os problemas de ocupação dos morros
A primeira ação conjunta que objetivava um melhor monitoramento das
áreas de risco foi a criação em 1999 de parceria entre o Governo do Estado de
Pernambuco através da Agência Condepe-Fidem e os diversos municípios da
Região Metropolitana do Recife, com a criação do Programa Viva o Morro, com
amplo levantamento das áreas de risco, assim como da proposição de ações
para o monitoramento com vistas na prevenção de acidentes. (ALHEIROS,
2003).
Como dito anteriormente, até o ano de 2001 a ação da Defesa Civil
estava voltava para o atendimento de emergências, não havendo a realização
de ações de prevenção do ponto de vista não-estrutural, apenas obras de
contenção de encostas e colocação de lonas eram realizadas. Em março de
95
2001, a prefeitura do Recife cria o programa Guarda-Chuva que objetivava,
através de ação conjunta com diversas secretarias o monitoramento constante
das áreas de risco da cidade (Figura 26).
Figura 26 – Abordagem nos Morros - Ciclo de Intervenção
Fonte:Programa Guarda-Chuva. Disponível em:
http://www.recife.pe.gov.br/especiais/guardachuva/. Acessado em: 15 de Fevereiro de 2015
Através do Programa foram realizados mapeamento das áreas de risco
com a elaboração, junto com o Ministério das Cidades em 2006 do Programa
Municipal de Redução de Risco – PMRR. Como forma de se minimizar a
ocorrência de acidentes nas áreas de encosta, a Prefeitura da Cidade do
Recife, através da atual Secretaria Executiva de Defesa Civil, em sintonia com
as resoluções emanadas pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil
do Ministério da Integração Nacional, a realização de ações estruturais e ações
não-estruturais em todas as etapas de atuação da gestão e gerenciamento de
risco (CODECIR, 2012). Através da reestruturação e direcionamento das
ações da Defesa Civil foi possível uma maior intervenção nas áreas de morro e
consequentemente a realização de um monitoramento mais efetivo que tivesse
como intuito a redução de vítimas.
As ações foram divididas em duas áreas de atuação, sendo as ação
estruturais, voltadas para obras de contenção, e as ações não-estruturais,
destinada a intervenções pontuais e a disseminação de informação aos
moradores residentes nessas áreas.
96
5.3.1. Ações Estruturais
As ações estruturais realizadas pela Prefeitura do Recife dizem respeito
a obras de engenharia que visam reduzir o grau de risco de uma área. As
obras tem como enfoque realizar a contenção das barreiras, retaludamento,
execução de obras de drenagem e obras de urbanização.
Figura 27 – Ações Estruturais de Retaludamento no Bairro do Jordão
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2013
Na maioria dos casos de estabilização dos processos de movimentos
de massa, executam-se diversos tipos de obras combinadas (Figura
28). As obras de drenagem e de proteção superficial não devem ser
encaradas apenas como obras auxiliares ou complementares no
projeto de estabilização. Uma correta execução destas obras pode
ser o principal instrumento na contenção de diversos problemas de
instabilização. (Ministério das Cidades, 2008, pg. 131)
97
Figura 28 – Obra de Contenção e Drenagem no Bairro do Jordão
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2013
5.3.2. Ações Não-Estruturais
As ações não-estruturais visam a minimização dos desastres através de
atuação preventiva. As ações realizadas pela Defesa Civil do Recife enfoca em
duas vertentes, sendo a execução de ações diretas nas encostas como a
colocação de lonas plásticas (Figura 29), a aplicação de gel impermeabilizante
(Figura 30)e a aplicação de gel-manta, que evita a penetração da ação no solo.
Outras ações como o corte de árvores em situação de risco e a capinação de
encostas, também são ações realizadas com o objetivo de se evitar a
sobrecarga do solo.
98
Figura 29 – Colocação deLona Plástica em área de risco
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2014
Figura 30 – Aplicação de Gel Impermeabilizante em área de risco
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2014
99
Associado às ações realizadas diretamente nas encostas, também são
realizadas ações no intuito de prover informação à população diretamente
afetada. São realizadas ações porta-a-porta (Figura 31), onde as equipes da
Defesa Civil, delimitam as principais áreas de risco e com a informação direta
aos moradores, através da distribuição de material informativo, sobre ações de
como os moradores devem agir em situação de risco, na tentativa de
prevenção de acidentes. No ano de 2014 foram realizadas ações em todas as
áreas da cidade, totalizando 8.309 casas visitadas (SEDEC-Recife, 2014).
Figura 31 – Ação Porta-a-porta na localidade de Costa Porto, Bairro do Jordão
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2013
Também são realizadas ações informativas nas escolas municipais e
estaduais (Figura 32), com o intuito de disseminação do conhecimento para os
alunos, objetivando o repasse de informação entre os familiares e vizinhos que
também residem em áreas de risco. Em 2014 foram realizadas 330 ações
informativas nas escolas, de acordo com dados da Secretaria Executiva de
Defesa Civil.
100
Outras ações também são realizadas com o objetivo de se prevenir
possíveis acidentes, como a realização de simulados e mutirões de
monitoramento e informação.
Figura 32 – Ação Informativa na Escola
Fonte: Arquivo Regional Sul – SEDEC Recife, 2015
No ano de 2014 foram implantados junto às comunidades de 04
localidades (o projeto piloto foi realizado no Bairro da Guabiraba em 2013) o
Projeto do Núcleo Jovem de Defesa Civil (Figura 33) que visava à formação de
agentes jovens de defesa civil com o objetivo de atuarem junto com os técnicos
da defesa civil na prevenção de acidentes.
Em casos de reconhecimento técnico de situação de alto risco, a
população residente nas áreas são orientadas a saírem de suas residências, e
encaminhadas para o Programa de Auxílio Moradia, que provêm um auxílio
para a família alugar outra residência em área segura enquanto a prefeitura
provêm outra residência para a mesma. Existiam 4.508 moradores recebendo
auxílio moradia segundo a SEDEC_Recife em 2012. Os dados atuais estão
sendo atualizados com a realização de recadastramento dos beneficiários.
101
Figura 33 – Oficina de Capacitação do Nudec-Jovem
Fonte: Arquivo SEDEC Recife, 2014
Atualmente as ações da Defesa Civil tem o caráter permanente,
promovendo ações não apenas no momento de ocorrência de acidentes, mas
na prevenção de desastres, com atuação direta junto às comunidades
localizadas em áreas de risco.
102
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo histórico de ocupação das cidades brasileiras, em
decorrência da acelerada urbanização resultou no rápido crescimento dessas
cidades, principalmente com a ocupação das áreas periféricas, realizada pela
população de baixa renda, que sem ter onde habitar constroem suas
residências em áreas ambientalmente frágeis com a probabilidade de
ocorrência de desastres devido o alto grau de risco.
Primeiramente encontra-se o alto déficit habitacional, que atrelado aos
programas habitacionais dos governos federal, estadual e municipal, não
conseguem suprir as reais necessidades e atender a demanda, sempre
crescente, fazendo com que, devido as necessidades de habitação, a
população procure, dentro das suas condições financeiras, alguma área para
poder residir.
As melhores áreas das cidades são geralmente destinadas ao mercado
imobiliário, de características especulativas, impede a entrada da população
mais pobre no modelo habitacional então imposto pelas grandes construtoras.
Resta a esta população de baixa renda, se distanciar dos centros urbanos na
busca por habitação. As áreas mais vulneráveis, localizadas às margens dos
cursos d’água ou nas encostas dos morros periféricos acabam sendo refúgio
para a população de baixa renda.
Associado a necessidade habitacional e a fixação da população nas
áreas periféricas, encontra-se diversos problemas urbanos decorrentes do
modo de ocupação do espaço, e aos baixos investimentos governamentais em
infraestrutura ambiental, como saneamento básico, coleta de lixo, redes de
drenagem e abastecimento de água. Sem condições adequadas de
habitabilidade, a população acaba improvisando ao que concerne a
infraestrutura com a instalação de fossas para o esgotamento e despejando o
lixo em terrenos vazios no topo dos taludes, aumento o grau de risco.
As modificações nos terrenos como o corte nos taludes de forma
inapropriada e a ausência de obras de urbanização, também agravam o
problema para a população residente nas áreas de risco.
Pode-se dizer que existem duas cidades dentro de uma única cidade. A
cidade formal, reconhecida pelos entes públicos, residência da população de
103
renda média e alta, com infraestrutura urbana e social. A outra cidade não
recebe o tratamento adequado por parte dos governos municipal, estadual e
federal, principalmente na provisão dos serviços de infraestrutura.
Atualmente, em decorrência de grandes desastres naturais ocorridos na
última década nas diferentes regiões do país, a atuação da Defesa Civil na
proteção e atendimento a população residente nas áreas de risco tem se
tornado mais efetivo, com a realização de obras de contenção de barreiras,
instalação de redes de drenagem e esgotamento sanitário, assim como na
urbanização de áreas pobres.
Mesmo com todos os investimentos realizados nos últimos anos, em
decorrência do acelerado processo de urbanização, as deficiências em
infraestrutura ainda se tornam bastante evidentes, principalmente devido a
realização de um planejamento urbano efetivo, que tente englobar toda a
população e tenha como foco a inversão de prioridades. Há uma emergente
necessidade para a efetivação de um planejamento urbano estruturante, que
englobe todas as áreas da cidade de forma integrada, assim com a elaboração
de metas de curto, médio e longo prazo, haja vista, atualmente as ações
privilegiarem o imediato, que engloba apenas o período de uma gestão.
A situação no Recife não se mostra diferente das demais regiões do
país, onde as ações da Defesa Civil ainda estão voltadas para ações que
tratem apenas das áreas de risco, sem que haja uma integração das políticas
públicas, com a realização de projetos de urbanização macro-estruturantes.
Atualmente, as obras são focadas em trechos pequenos, abrangendo poucas
edificações, e que resultarão em benefícios pontuais, assim como ações de
curto prazo, sem a visualização de um projeto futuro de cidade.
A população sentirá os efeitos das obras apenas na sua área de
atuação, mas não há perspectiva de realização de projetos que englobem as
áreas de infraestrutura, social, econômica e ambiental, focando na criação de
um novo modelo de cidade, que tenha como prioridade o planejamento
participativo e estruturante, não apenas das áreas de risco, mas da cidade
como um todo.
104
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107
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Fevereiro de 2015.
PLANO DE AULA Professor: José Rafael de Lima Série: 3º Ano (Ensino Médio) Tema: Urbanização no Brasil. Subtema: Problemas Urbanos Título: Entre o Natural e o Modificado: A ocupação desordenada dos vazios Data: 23/02/2015 Tempo de aula: 50 min. Objetivo Geral: O objetivo desta aula é apresentar a realidade das ocupações nas áreas de morro do Recife assim como as ações que vem sendo realizadas para minimizar os problemas relativos a essa ocupação como forma de diminuição dos riscos ambientais. Metodologia: Aula expositiva com a utilização de quadro branco para observações textuais, utilização de slides através de Datashow para apresentação do conteúdo programático da aula, por meio de textos e imagens. Haverá a distribuição de atividade com exercícios e de material informativo distribuído pela Secretaria Executiva de Defesa Civil da Prefeitura do Recife.
CONTEÚDOS OBJETIVOS RECURSOS
DIDÁTICOS CRITÉRIOS DE
AVALIAÇÃO CONCEITUAIS PROCEDIMENTAIS ATITUDINAIS
1. O processo de Urbanização no Brasil; 2. Caracterização da situação da Cidade do Recife; 3. A ocupação irregular do solo nas áreas ambientalmente frágeis; 4. Ações para enfrentar os problemas da ocupação dos morros do Recife
1. Apresentar os conceitos de risco, vulnerabilidade e desastre ambiental, como forma de associar à realidade social da população que habita os ambientes vulneráveis e com iminência da ocorrência de desastres. 2. Abordar teórica e empiricamente o entendimento do modo de ocupação do espaço urbano na cidade do Recife.
1. Discutir o processo de urbanização acelerada ocorrido no Brasil, assim como as suas consequências para o espaço urbano; 2. Apresentar os principais problemas urbanos decorrentes da ocupação de áreas ambientalmente frágeis; 3. Associar as práticas dos moradores das áreas de risco com a ocorrência de desastres na cidade do Recife.
1. Despertar nos alunos o senso crítico sobre o processo de ocupação do espaço urbano; 2. Associar as formas de minimização de desastres com o seu ambiente cotidiano; 3. Apresentar técnicas de como melhorar o meio urbano onde os alunos residem com a inserção de novas práticas de preservação, objetivando a diminuição de acidentes.
1. Quadro Branco; 2. Data show; 3. Folha de Atividades; 4. Material Informativo da Prefeitura do Recife.
1. Participação na
aula; 2. Comportamento; 3. Resolução dos
exercícios.
Exercício Didático Disciplina: Geografia Professor: José Rafael de Lima Aula: Entre os Riscos Naturais e os Desastres Socioambientais: exercício sobre condições de vulnerabilidade na cidade do Recife. Data: 23/02/2015 EXERCÍCIO 1. Baseando-se na aula apresentada, disserte sobre o processo de urbanização no
Brasil e no Recife, associando com os problemas ambientais urbanos encontrados na nossa cidade. De forma crítica, discorra sobre a ocupação das áreas de risco, enfocando nas causas e consequências dessas ocupações.
2. Descreva sobre os problemas ambientais urbanos apresentados nas imagens a seguir.