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Turma e Ano: Flex A (2014)
Matéria / Aula: Direito Tributário / Aula 09
Professor: Mauro Luís Rocha Lopes
Monitora: Mariana Simas de Oliveira
AULA 09 CONTEÚDO DA AULA: Princípio da Irretroatividade. Princípio da Anterioridade (Introdução).
LIMITAÇÕES DO PODER DE TRIBUTAR
Princípios constitucionais (que limitam o poder de tributar)
Princípio da irretroatividade
Os atos são regidos pela lei vigente ao tempo da sua prática. A Constituição
reconhece a irretroatividade da lei como uma garantia geral do cidadão de que os atos que
pratica serão afetados única e exclusivamente pelas leis que estiverem em vigor ao seu
tempo. A irretroatividade tutela, ainda, a segurança jurídica (ninguém pode ser surpreendido
por um novo gravame que retroaja a atos praticados antes da sua existência).
O art.5º, XXXLVI, da CRFB\88 traz uma cláusula geral que tem por objetivo a
tutela da segurança jurídica, sendo ela suficiente para que se concebesse a irretroatividade
da lei tributária.
O princípio da segurança jurídica também é chamado de princípio da não surpresa
(antítese de segurança).
O legislador constituinte especializou a irretroatividade com a previsão do art.150,
III, “a”, da CRFB\88:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os
houver instituído ou aumentado; (...)
Assim, em regra, a lei tributária tem eficácia prospectiva. Se for uma lei instituidora
ou majoradora de tributo não há qualquer exceção, devendo alcançar fatos ocorridos após a
sua vigência.
Ex. de princípio da irretroatividade: o governo Collor abriu mercado para
importação de veículos. Começaram a entrar veículos importados no Brasil. As montadoras
nacionais começaram a ratear e o governo começou a ser pressionado, tendo que elevar a
alíquota do IPI de um dia para o outro. Muitos importadores já estavam com veículos
embarcados chegando no Brasil. O caso chegou ao Poder Judiciário que, encampando a
posição do Fisco, afirmou que o IPI tem como fato gerador a entrada da mercadoria no
território nacional. Essa entrada, por uma ficção, é considera pelo legislador como ocorrida na
data da declaração para o desembaraço aduaneiro. Entendeu-se, também, que quem faz
uma operação e assume ônus antes da ocorrência do fato gerador assume também o risco de
a tributação ser majorada. Conclui-se pela inexistência de violação à irretroatividade. RE
225.602:
Controvérsia doutrinária com relação ao art.105 do CTN
O referido dispositivo, ao tratar da legislação tributária, dispõe o seguinte:
Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos
pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja
completa nos termos do artigo 116.
Do ponto de vista temporal, os fatos geradores podem ser considerados como
instantâneos (se consuma da mesma fração do tempo) ou complexivos (se inicia, se protrai
no tempo e se consuma em momento posterior, fazendo com que entre o início e a sua
consumação decorre um lapso de tempo considerável – diz que o fato gerador está pendente
do fato gerador).
Exemplo de fato gerador instantâneo: no caso do ICMS, cada operação realizada é
um fato gerador autônomo. Se uma sapataria vende 20 pares de sapatos, existem 20
obrigações distintas.
Exemplo de fato gerador complexivo: uma contribuição que incida sobre a receita
mensal da empresa no meio do mês o fato gerador está pendente. O mesmo vale para renda,
lucro, pois são sempre elementos considerados dentro de um espaço de tempo.
Pois bem. O art.105 do CTN, na sua parte final, determina a aplicação da lei
tributária aos fatos geradores pendentes (se iniciaram, mas não se consumaram).
Vários autores entendem que essa disposição final teria sido derrogada pela
CRFB\88, em razão do princípio da irretroatividade tributária.
O Fisco, se valendo a literalidade do art.150, III, “a”, que prevê que a lei tributária
não pode se aplicar a fatos geradores ocorridos, afirma que como o fato gerador está
pendente a lei se aplica.
A doutrina, em defesa ao argumento do Fisco, diz que se a interpretação for literal
do art.150, III, “a”, haveria afastamento da finalidade da norma que é a tutela da segurança
jurídica.
(Conselho do professor: em provas de concurso, quando o aluno não tiver certeza
da matéria, não se lembrar, etc., é aconselhável adotar a posição que defenda o Fisco).
No entanto, para efeito de provas de concursos, deve ser considerada a tese
do Fisco. Afirma a jurisprudência que não há macula na disposição do CTN com relação à
Constituição, pois aplicar a nova legislação tributária ao fato gerador pendente não é aplicá-la
ao fato gerador ocorrido e, portanto, não há ofensa ao art.150, III, “a”, da CRFB\88.
A jurisprudência do STF sempre se posicionou adotando essa teoria, como se
observa da súmula 584, que, apesar de antiga, já foi mencionada em julgados depois da
Constituição:
Ao imposto de renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no
exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração.
Imagine-se dois exercícios financeiros:
(a lei pode ser editada em qualquer momento de 2014)
2014 2015
Os rendimentos recebidos no ano de 2014 serão apurados na declaração de 2015.
O ano do fato gerador para o IR é o ano base e o da declaração é o seguinte. Quando o STF
diz que aos rendimentos do ano base será aplicada a lei vigente no ano em que tiver que ser
apresentada a declaração, ele diz que ela pode ser editada até às 23h59min do dia 31 de
dezembro de 2015.
Exceções ao princípio da irretroatividade (art.106, CTN)
Esse tema sempre é alvo de provas objetivas, justamente por se tratar de
exceção.
Note-se que a exceção não é com relação à irretroatividade da forma como
mencionada no art.150, III, “a”, do CTN, porque não há exceção quanto à lei que institui ou
aumenta tributo.
A exceção ora tratada diz respeito à regra geral do tempus regit actum.
Dispõe o art.106 do CTN:
Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de
penalidade à infração dos dispositivos interpretados; (lei interpretativa).
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado:
a) quando deixe de defini-lo como infração;
b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde
que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo;
c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua
prática.
O inciso I trata da lei interpretativa, que se presta a para aclarar o sentido de uma lei
anterior. Esse tipo de lei é muito criticado pela doutrina, afirmando não caber ao legislador
fazer interpretação. Ademais, a nova norma interpretativa será objetivo de interpretação.
Exemplo: uma determinada lei cria uma obrigação acessória, como um dever de
conduta. Ocorrido o fato X deverá ser emitido um documento fiscal. O contribuinte fica em
dúvida de qualquer documento deve emitir, o A ou o B. Sem saber qual emitir, o contribuinte
expede o A. Posteriormente, verificando que a lei é imprecisa com relação a essa questão, o
legislador edita uma lei dizendo que deve ser o documento B. Essa lei se aplica
retroativamente porque não está criando um novo dever. Aqueles que não emitiram o
documento devem observar B. Mas não é razoável punir aqueles que antes da lei
interpretativa optaram por emitir o documento A. Por isso o inciso I do art.106 exclui aplicação
de penalidade às infrações dos dispositivos interpretados. Aquele que não emitiu documento
algum pode ser punido.
Obs.: Ninguém pode ser punido por não realizar consulta administrativa.
Caso concreto sobre o tema: No art.168 o CTN prevê que para a repetição de
indébito o contribuinte tem prazo de cinco anos. No tributo sujeito por homologação, o STJ
estabeleceu que o prazo para repetir o indébito seria de cinco mais cinco anos. O governo
editou uma lei complementar (n.118) dizendo que para efeito de interpretação do art.168,
mesmo no caso de tributo sujeito por homologação, o prazo para a repetição do indébito é de
cinco anos a contar do pagamento. Note-se que o Executivo poderia ter alterado o art.168 do
CTN, mas, agindo de má-fé, editou uma lei interpretação. A matéria foi ao STJ, declarando-se
inconstitucional o art.4º da Lei Complementar n.118, que dizia ter aplicação retroativa a parte
da lei que “interpretou” o art.168 do CTN. O STJ fundamentou sua decisão de que a norma
não era interpretativa, até porque o STJ – última instância interpretativa em matéria de lei
federal – já tinha entendimento consolidado sobre o tema e qualquer mudança de
entendimento é inovadora, rompendo com a jurisprudência dominante. O STF confirmou a
posição do STJ. Conclusão: a lei não é interpretativa quando há jurisprudência dominante e
sedimentada.
O segundo caso de aplicação retroatividade de lei está no II do art.106 do CTN.
As alíneas “a” e “b” se confundem.
O inciso II pode ser resumido da seguinte maneira: lei que trata de infração à
legislação tributária e beneficia o infrator, seja destipificando a infração, seja reduzindo a
gravidade da sanção, aplica-se retroativamente. O paralelo no Direito Penal seria a abolitio
criminis e redução da pena.
O que se trata, aqui, não diz respeito a leis que definam hipótese de incidência,
aumentem ou diminuem tributo, mas sim de leis sobre infrações tributárias que beneficiam
o infrator.
Exemplo: A legislação do Estado do Rio de Janeiro estabelece um prazo para abrir
o inventário e para, depois da homologação do cálculo, se recolher o imposto. Determinada
pessoa abriu o inventário fora do prazo e não recolher o imposto no prazo. No momento do
óbito, a alíquota do imposto de transmissão era de 4% do valor dos bens transmitidos e o
percentual da multa era de 10% sobre o valor do imposto. Quando do momento do
pagamento essa lei foi alterada e a alíquota do imposto de transmissão caiu para 3% e a
multa para 5% sobre o valor do imposto. Para efeito tributário, a alíquota é a da data do óbito,
pois não se aplica retroativamente lei que altera alíquota (4%). A multa era de 10%, mas
quando foi pagar tinha reduzido para 5%, aplica-se a multa mais favorável por ter beneficiado
o infrator.
Cuidado: o inciso II diz “tratando-se de ato não definitivamente julgado”. O
contribuinte, discutindo administrativamente a cobrança de uma multa não tem a sua tese
acolhida e a decisão transita em julgado. Se posteriormente uma lei reduz o valor da multa ele
não é apanhado. A jurisprudência é tolerante. O STJ tem julgados no seguinte sentido: o
contribuinte não discutiu a multa, mas não pagou e está sendo executado sem oferecer
qualquer meio de defesa. Para o STJ se a lei posterior reduzir a multa ele tem direito de pagar
(note-se que a execução não está extinta). Para o contribuinte que pagou e não discutiu a lei
também não retroage porque ele já cumpriu a pena.
Comentário de aula: juros sobre multa significa bis in idem por se estar punindo mês
a mês sobre a sanção que já foi aplicada ao cidadão (o que não ocorre com a correção
monetária).
Princípio da anterioridade da lei tributária
A limitação estudada decorre das peculiaridades da tributação, dispondo o art.150,
III, “b”, da CRFB\88:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)
III - cobrar tributos: (...)
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou
aumentou;
A anterioridade se vincula ao mesmo ideal da irretroatividade: segurança jurídica e
não surpresa, não sendo sem razão que tanto a irretroatividade e anterioridade se encontram
no mesmo dispositivo constitucional.
Reconheceu-se que ao contribuinte não bastava garantir que a lei criadora de um
gravame tributário não incidisse para fatos ocorridos anteriormente a sua vigência. A
anterioridade é imposição constitucional para que o contribuinte tenha tempo prévio para se
organizar financeiramente.
No Direito brasileiro, a anterioridade veio do princípio anterior da anualidade
inaugurado com a Constituição de 1946, reproduzido na Constituição de 1967 e vigorou até a
EC n.01 de 1969, quando veio a ideia da anterioridade. A anualidade impunha que para que o
tributo fosse cobrado em cada exercício havia necessidade de previsão orçamentária
correspondente na lei orçamentária aprovada no ano anterior.
A anterioridade surgiu por conta da inobservância da anualidade chancelada pelo
STF: o governo cobrou tributos em determinado ano sem tê-los previstos na lei orçamentária
correspondente. O Supremo, apreciando a questão, entendeu que não houve surpresa, pois a
lei tributária instituidora foi publicada no ano anterior à cobrança.
Assim, a lei que institua ou majore tributo deve ser publicada no exercício anterior
da sua cobrança.
O Congresso Nacional, pretendendo evitar a burla que ocorria com leis publicadas
no dia 31 de dezembro, criou um adicional à anterioridade de 90 dias. Assim, a lei deve ser
publicada no ano anterior, devendo se observar o período mínimo de 90 dias (pode a norma
ser publicada no dia 31 de dezembro, mas o tributo não poderá ser cobrado em 01º de
janeiro).
Existem várias exceções, tanto parciais como totais.
O princípio da anterioridade ataca a eficácia ou vigência da lei?
R.: O conceito de vigência e de eficácia não é uniforme na doutrina. Considerando-
se que a vigência é a existência da norma se observará que a anterioridade não afeta a
vigência, mas a eficácia da lei. A eficácia, para alguns e segundo o professor parece o mais
correto, é a aptidão que a norma tem para produzir efeitos jurídicos. O importante é saber que
uma vez publicada a lei existe, mas enquanto ela aguarda o período de anterioridade
constitucionalmente exigido ela está com a sua eficácia paralisada. A maior parte da doutrina
considera que a anterioridade afeta a eficácia da norma (Roque Carrazza, Geraldo Ataliba,
por exemplo).
Exemplo de norma que tem vigência, mas não tem eficácia: lei tributária que institui
um tributo aguarda o período da anterioridade para incidir.
Ao contrário, é possível que uma lei tenha eficácia, mas não tenha vigência?
Exemplo: alguém reúna todos os requisitos para se aposentar. No entanto, opte por continuar
trabalhando. O legislador edita uma nova lei agravando os requisitos para a aposentadoria. O
direito adquirido é exemplo típico em que se aplica lei sem vigência, mas tem eficácia.
O STF controlou a constitucionalidade de uma lei que tinha vigência, mas ainda não
produzia efeito (quando aguardava o período da anterioridade). A lei aumentou a contribuição
dos servidores públicos de 11% para 25% progressivamente. O STF trabalhou com o
princípio da proibição de confisco. Se ela não tivesse vigência não poderia ter sido objeto de
ação direta de inconstitucionalidade.
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