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Prefácio
"O mundo é cada vez mais dominado pela Matemática".
A. F. Rimbaud
Este texto foi elaborado aos poucos através das publicações mensais no
blog Fatos Matemáticos, em que buscou evitar o máximo possível as técnicas
e o formalismo matemático, priorizando as ideias, os relatos e as curiosidades
destes grandes homens.
Lavras, julho de 2012
Paulo Sérgio Costa Lino
Sumário
1 O Cálculo de Diferenças Finitas 7
1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
1.2 De�nição e Propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
1.3 O Polinômio Fatorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.4 O Operador Antidiferença . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.5 O Teorema Fundamental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
2 Equações de Recorrências 25
3 A Transformada Discreta de Laplace 26
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
3.2 Conceitos e Propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
3.3 O Produto Convolutivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
3.4 A TDDL de Algumas Sequências Elementares . . . . . . . . . . 37
3.5 Relação Entre a Transformada de Laplace e a TDDL . . . . . . 38
3.6 Somatórios Através da Transf. Discreta de Laplace . . . . . . . 40
3.7 A Transformada Discreta Inversa de Laplace (TDIL) . . . . . . 42
3.8 A Sequência Delta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
3.9 Equações e Sistemas de Diferenças Finitas Lineares Através da
TDL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
3.9.1 Equações de Diferenças Finitas Lineares
Não-Homogêneas de Primeira Ordem de
Coe�cientes Constantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
4
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
3.9.2 Equações de Diferenças Finitas Lineares
de Segunda Ordem de Coe�cientes Constantes . . . . . . 59
3.9.3 Equações de Diferenças Finitas Lineares
de Segunda Ordem Não-Homogênea . . . . . . . . . . . . 64
3.9.4 Equações de Diferença do Tipo Volterra . . . . . . . . . 65
3.9.5 Sistemas de Equações de Diferenças Finitas
Lineares de Primeira Ordem . . . . . . . . . . . . . . . . 65
3.10 Exercícios Propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
4 Funções Geradoras 68
4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
4.2 Conceitos e Propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
4.3 A Notação Operacional G . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
4.4 Os Números de Stirling do Segundo Tipo . . . . . . . . . . . . . 76
4.5 A Notação Operacional G−1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
4.6 Exercícios Propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
5 Técnicas Para o Cálculo Somatórios 78
5.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
5.2 Conceitos e Propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
5.3 Somatórios Através do Teorema das Colunas . . . . . . . . . . . 80
5.4 A Técnica de Soma Por Partes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
5.5 A Notação de Iverson Para Somatórios . . . . . . . . . . . . . . 85
5.6 Usando Derivadas Para Calcular Somatórios . . . . . . . . . . . 88
5.7 Usando Integrais Para Calcular Somatórios . . . . . . . . . . . . 91
5.7.1 Uma Identidade Entre Séries e Integrais . . . . . . . . . 92
5.8 Somatórios Através das Funções Beta e Gama . . . . . . . . . . 94
5.9 Somatórios Através da Transformada de Laplace . . . . . . . . . 99
5.10 Somatórios Através das Funções Geradoras . . . . . . . . . . . . 103
5.11 Exercícios Propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104
6 Apêndices 107
6.1 A Hipótese de Riemann: Um Problema de um Milhão de Dólares107
5
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
6.1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107
6.1.2 A Função Zeta de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
6.1.3 O Teorema dos Números Primos . . . . . . . . . . . . . . 116
6.1.4 A Função Zeta de Riemann . . . . . . . . . . . . . . . . 118
6.1.5 A Conjectura ou Hipótese de Riemann . . . . . . . . . . 120
6.1.6 Problemas Relacionados . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122
6.2 Explorando a Torre de Hanói . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
6
Capítulo 1
O Cálculo de Diferenças Finitas
1.1 Introdução
O Cálculo de Diferenças Finitas ou Cálculo Natural é o análogo discreto ao
familiar Cálculo Diferencial e Integral. Historicamente, Brook Taylor (1685−1731) foi pioneiro nesta área extraindo muitas analogias entre seu cálculo �nito
e o cálculo ordinário, publicando seus resultados na obra Methodus Incremen-
torum Directa e Inversa.
1.2 De�nição e Propriedades
De�nição 1.1 Dada a função real f , o operador diferença de f em x ∈ Rcom passo h é de�nido por:
∆0hf(x) = If(x) = f(x)
∆1hf(x) = ∆hf(x) = f(x+ h)− f(x)
∆nhxn = ∆(∆n−1f(x+ h)), n > 1
Nestas notas, adotaremos h = 1 e quando necessário, restringiremos o domínio
de f ao conjunto dos naturais, denotando f(n) por x(n) ou xn.
7
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
De�nição 1.2 Dada a sequência f(x), o operador translação E é de�nido
por:
Ef(x) = f(x+ 1)
Proposição 1.1 Se p ∈ N∗, então
Epf(x) = f(x+ p) (1.1)
Demonstração: Para p = 1, o resultado segue da Def.(1.2). Suponhamos
que (1.1) seja válida e provaremos sua validade para p+ 1. De fato,
Ep+1f(x) = E(Epf(x)) = Ef(x+ p) = f(x+ p+ 1)
�
Proposição 1.2 Os operadores ∆ e E são lineares, ou seja,
i) ∆[af(x) + bg(x)] = a∆f(x) + b∆g(x), ∀a, b ∈ R;
ii) E[af(x) + bg(x)] = aEf(x) + bEg(x), ∀a, b ∈ R.
Demonstração:
i)
∆[af(x) + bg(x)] = [af(x+ 1) + bg(x+ 1)− (af(x) + bg(x))]
= a[f(x+ 1)− f(x)] + b[g(x+ 1)− g(x)]
= a∆f(x) + b∆g(x)
ii) Análogo ao item anterior.
�
Exemplo 1.1 Calcule a derivada �nita das sequências abaixo:
a) an = k;
b) bn = (−1)n;
8
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
c) cn = n!;
d) xn = sin2
(nπ
2
).
Resolução:
a) ∆an = an+1 − an = k − k = 0;
b) ∆bn = (−1)n+1 − (−1)n = −(−1)n − (−1)n = −2(−1)n;
c) ∆cn = cn+1 − cn = (n+ 1)!− n! = (n+ 1)n!− n! = nn!;
d) Da de�nição de derivada �nita, temos:
∆xn = xn+1 − xn = sin2
[(n+ 1)
π
2
]− sin2
(nπ
2
)= sin2
(nπ
2+
π
2
)− sin2
(nπ
2
)=
1− cos(nπ + π)
2− 1− cos(nπ)
2= cos(nπ) = (−1)n
Proposição 1.3 Sejam xn e yn duas sequências reais. Então:
i) ∆(xnyn) = ∆xnEyn + xn∆yn;
ii) ∆
(xn
yn
)=
∆xnyn − xn∆ynynEyn
.
Demonstração:
i) De fato,
∆(xn · yn) = xn+1yn+1 − xnyn = xn+1yn+1 − xnyn+1 + xnyn+1 − xnyn
= (xn+1 − xn)yn+1 + xn(yn+1 − yn) = yn+1∆xn + xn∆yn
= Eyn∆xn + xn∆yn
ii) De fato,
∆
(xn
yn
)=
xn+1
yn+1
− xn
yn=
xn+1yn − xnyn + xnyn − xnyn+1
yn+1yn
=(xn+1 − xn)yn − xn(yn+1 − yn)
ynyn+1
=yn∆xn − xn∆yn
ynEyn
9
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
�
Exemplo 1.2 Use a Prop. (1.3) e a propriedade de linearidade do operador
∆ e calcule:
a) ∆(n · 2n)
b) ∆(1 + n+ n2)
c) ∆
[4n(n+ 1)
2n
]Resolução:
a)
∆(n · 2n) = ∆n · 2n+1 + n ·∆2n = 2n+1 + n(2n+1 − 2n)
= 2 · 2n + n(2 · 2n − 2n) = 2 · 2n + n · 2n = (n+ 2)2n
b)
∆(1 + n+ n2) = ∆1 +∆n+∆n2 = 1 + (n+ 1)2 − n2 = 2n+ 2
c) Seja xn = 4n(n+ 1). Assim,
∆xn = 4∆[n(n+ 1)] = 4∆(n2 + n)
= 4[(n+ 1)2 + (n+ 1)− n2 − n] = 8n+ 4
Se yn = 2n, então ∆yn = 2n. Assim,
∆
(ynxn
)=
(8n+ 4)2n − 4n(n+ 1)2n
2n · 2n+1=
−n2 + n+ 1
2n+1
Proposição 1.4 Se ∆ é o operador diferença, então
∆
( n−1∑k=n0
xk
)= xn
10
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: De fato,
∆
( n−1∑k=n0
xk
)=
n∑k=n0
xk −n−1∑k=n0
xk = xn +n−1∑k=n0
xk −n−1∑k=n0
xk = xn
�
De�nição 1.3 Sejam α ∈ R e p ∈ N. O coe�ciente binomial(αp
)é de�nido
por (α
p
)=
1, se p = 0α(α− 1) . . . (α− k + 1)
p!, se p > 0
No caso em que α = n ∈ N, temos:
(n
p
)=
0, se p > nn!
p!(n− p)!se 0 ≤ p ≤ n
Proposição 1.5 Se(np
)é o coe�ciente binomial.
i) Então
∆
(n
p
)=
(n
p− 1
)ii) Vale a relação de Stifel:(
n
p− 1
)+
(n
p
)=
(n+ 1
p
)Demonstração:
i) De fato,
∆
(n
p
)= ∆
(n(p)
p!
)=
p
p!· n(p−1) =
n(p−1)
(p− 1)!=
(n
p− 1
)ii) Segue imediatamente do item anterior.
�
11
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 1.6 Para a função f(x) e n ∈ N, temos:
f(x+ n) =n∑
k=0
(n
k
)∆kf(x) (1.2)
Em particular, se ∆(m)f(n) é uma constante não-nula para todo n ∈ N, então
f(n) =m∑k=0
(n
k
)∆kf(0)
Demonstração: Seja I o operador identidade, isto é, Ix = x, de modo que
∆ = E − I e E = ∆+ I. Da Prop. (1.1), segue que
f(x+ n) = Enf(x) = (∆ + I)nf(x) =n∑
k=0
(n
k
)∆kf(x)
Para a segunda parte, fazemos x = 0 em (1.2). Em seguida usamos o fato que
∆m+1f(n) = 0, isto é,
f(n) =n∑
k=0
(n
k
)∆kf(0) =
m∑k=0
(n
k
)∆kf(0) +
m∑k=m+1
(n
k
)∆kf(0)
=m∑k=0
(n
k
)∆kf(0)
�Através da proposição anterior, podemos achar o termo geral de uma se-
quência que possui crescimento polinomial. Para isso, fazemos o esquema de
diferenças abaixo:
x 0 1 2 3 . . .
f(x) f(0) f(1) f(2) f(3) . . .
∆f(x) f(1)− f(0) f(2)− f(1) f(3)− f(2) . . .
∆2f(x) f(2)− 2f(1) + f(0) f(3)− 2f(2) + f(1) . . .
o qual pode ser reescrito como
12
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
x 0 1 2 3 . . .
f(x) f(0) f(1) f(2) f(3) . . .
∆f(x) ∆f(0) ∆f(1) ∆f(2) . . .
∆2f(x) ∆2f(0) ∆2f(1) . . .
Os elementos da segunda coluna são os coe�cientes necessários para achar f(n).
Exemplo 1.3 Ache o enésimo termo da sequência 4, 14, 30, 52, 80, 114, . . . as-
sumindo que ela possui crescimento polinomial.
Resolução: Elaboramos o esquema de diferenças:
x 0 1 2 3 4 . . .
f(x) 4 14 30 52 80 . . .
∆f(x) 10 16 22 28 . . .
∆2f(x) 6 6 6 . . .
Logo,
f(n) =2∑
k=0
(n
k
)∆kf(0) = 4
(n
0
)+ 10
(n
1
)+ 6
(n
2
)= 3n2 + 7n+ 4
Exemplo 1.4 Escreva n2 em função dos coe�cientes binomiais(nk
).
Resolução: Fazemos o esquema de diferenças:
n 0 1 2 3 4 . . .
n2 0 1 4 9 16 . . .
∆n2 1 3 5 7 . . .
∆2n2 2 2 2 . . .
Logo,
n2 =
(n
1
)+ 2
(n
2
)Proposição 1.7 Se ∆ é o operador diferença e E é o operador translação,
então
∆pf(x) = (E − I)pf(x) (1.3)
13
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Consequentemente,
∆pf(x) =
p∑j=0
(p
j
)(−1)jf(x+ p− j)
Demonstração: Para p = 0, temos ∆0f(x) = If(x) = (E − I)0f(x).
Suponhamos que a expressão (1.3) seja válida e provaremos que
∆p+1f(x) = (E − I)p+1f(x)
De fato,
∆p+1f(x) = ∆(∆pf(x)) = ∆[(E − I)pf(x)]
= (E − I)pf(x+ 1)− (E − I)pf(x)
= (E − I)pEf(x)− (E − I)pIf(x)
= (E − I)p(E − I)f(x) = (E − I)p+1f(x)
Pelo binômio de Newton, temos:
∆pf(x) = (E−I)pf(x) =
p∑j=0
(p
j
)(−1)jEp−jf(x) =
p∑j=0
(p
j
)(−1)jf(x+p−j)
�
Proposição 1.8 Se
P (E) =k∑
j=0
ajEk−j
é o operador polinomial, sendo E0 = I e k ∈ N, então para b ∈ R+,
P (E)bn = P (b)bn
Demonstração: De fato,
P (E)bn =k∑
j=0
ajEk−jbn =
k∑j=0
ajbn+k−j = bn
k∑j=0
ajbk−j = P (b)bn
�
14
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 1.9 Se P (x) = anxn+an−1x
n−1+ . . .+a1x+a0 é um polinômio,
então
∆nP (x) = ann! e ∆n+kP (x) = 0 para k ≥ 1
sendo constantes reais ak, para k = 0, . . . , n.
Demonstração: Inicialmente, analisaremos a ação do operador ∆ sobre o
termo maior de maior grau anxn. Se n = 0, então
∆0ann0 = I · an = an = an0!
Suponhamos que ∆nanxn = ann!. Provaremos que esta expressão é válida para
n+ 1. De fato,
∆n+1[an+1xn+1] = an+1∆
n∆xn+1 = an+1∆n[(x+ 1)n+1 − xn+1]
= an+1∆n
[n+1∑k=0
(n+ 1
k
)xn+1−k − xn+1
]
= an+1∆n
[n+1∑k=1
(n+ 1
k
)xn+1−k
]
= an+1
n+1∑k=1
(n+ 1
k
)∆(n)xn+1−k
= an+1
[(n+ 1
1
)∆nxn +
n+1∑k=2
(n+ 1
k
)∆nxn+1−k
]= an+1(n+ 1)n! = an+1(n+ 1)!
pois ∆nxk = 0 para 0 ≤ k ≤ n− 1. Logo,
∆nP (x) = ∆n[anxn + an−1x
n−1 + . . .+ a1x+ a0]
= ∆nanxn +∆(n)[an−1x
n−1 + . . .+ a1x+ a0] = ann!
�
Corolário 1.1 Se n ∈ N, então
n! =n∑
k=0
(−1)n−k
(n
k
)(x+ k)n
15
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: Seja P (x) = xn. Pela proposição anterior, ∆nP (x) =
∆nxn = n!. Logo,
n! = ∆nxn = (E − I)nxn =n∑
k=0
(−1)n−k
(n
k
)Ekxn =
n∑k=0
(−1)n−k
(n
k
)(x+ k)n
�
1.3 O Polinômio Fatorial
De�nição 1.4 Seja x ∈ R. O k−ésimo polinômio fatorial x(k) é de�nido por:
x(k) = x(x− 1) . . . (x− k + 1), k ∈ Z+
Note que se x = n ∈ Z+ e n ≥ k, então
n(k) =n!
(n− k)!e n(n) = n!
De fato,
n(k) = n(n− 1) . . . (n− k + 1)(n− k)!
(n− k)!=
n!
(n− k)!⇒
n(n) =n!
(n− n)!= n!
Proposição 1.10 Sejam k ∈ Z+ e x ∈ R. Então:
i) ∆x(k) = kx(k−1)
ii) ∆nx(k) = k(k − 1) . . . (k − n+ 1)x(k−n)
iii) ∆kx(k) = k!
Demonstração:
16
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
i) De fato,
∆x(k) = (x+ 1)(k) − x(k)
= (x+ 1)x(x− 1) . . . (x+ 1− k + 1)− x(x− 1) . . .
(x− k + 2)(x− k + 1)
= [x+ 1− (x− k + 1)](x− 1) . . . (x− k + 2)
= kx(x− 1) . . . [x− (k + 1) + 1] = kx(k−1)
ii) Pelo item anterior, para k = 1, temos
∆1x(k) = ∆x(k) = kx(k−1)
Suponhamos que a expressão ii) seja válida e provaremos sua validade
para n+ 1. De fato,
iii) Consequência do item anterior.
�
Observação 1.1 Do item ii), segue que:
∆nx(k) = k(k − 1) . . . (k − n+ 1)x(k−n)
= k(k − 1) . . . [k − (n− 1)](k − n)!
(k − n)!x(k−n)
=k!
(k − n)!x(k−n)
Exemplo 1.5 Calcule as expressões abaixo:
a) ∆(n(3) + n(2))
b) ∆
(n(3)
2n(2) + 1
)Resolução:
a) De fato,
∆(n(3)+n(2)) = ∆n(3)+∆n(2) = 3n(2)+2n(1) = 3n(n−1)+2n = 3n2−n
17
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
b) De fato,
∆
(n(3)
2n(2) + 1
)=
3n(2) · (2n(2) + 1)− 4n · n(3)
(2n(2) + 1) · [2(n+ 1)(2) + 1]=
2n4 + n2 − 3n
4n4 + 1
De�nição 1.5 Para k ∈ Z+, de�nimos
x(−k) =1
x(x+ 1) . . . (x+ k − 1)
com x(0) = 1.
Proposição 1.11 Sejam k ∈ Z+ e x ∈ R. Então:
i) ∆x(−k) = −kx−(k+1)
ii) ∆nx(−k) = −k(−k − 1) . . . (−k − n+ 1)x(−k−n)
Demonstração:
i) De fato,
∆x(−k) =1
(x+ 1) . . . (x+ k − 1)(x+ k)− 1
x(x+ 1) . . . (x+ k − 1)
=1
(x+ 1) . . . (x+ k − 1)
(1
x+ k− 1
x
)= − k
x(x+ 1) . . . (x+ k − 1)(x+ k)= −kx−(k+1)
ii) Segue por indução �nita.
�
Observação 1.2 Procedendo de forma análoga, é possível mostrar que ∆(ax+
b)(k) = ka(ax+ b)(k−1) para k ∈ Z.
Exemplo 1.6 Calcule as expressões abaixo:
a) ∆
(1
n
)18
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
b) ∆[2n(−3)
]Resolução:
a) Usando a proposição anterior, temos:
∆
(1
n
)=
1
n+ 1− 1
n= − 1
n(n+ 1)= −n(−2)
b) De fato,
∆[2n(−3)
]= 2∆n(−3) =
2 · (−3)
n−(3+1)= − 6
n(n+ 1)(n+ 2)(n+ 3)
1.4 O Operador Antidiferença
Assim como a derivada �nita é semelhante a derivada de funções reais, apre-
sentaremos nesta seção a antiderivada �nita o qual é semelhante a integral e
muito útil no cálculo de alguns somatórios.
De�nição 1.6 Se ∆Xn = xn, então a antiderivada �nita ou antidiferença de
xn é Xn + C e representa-se por
∆−1xn = Xn + C, C ∈ R
Note que
∆∆−1xn = ∆(Xn + c) = ∆Xn −∆C = xn
e
∆−1∆Xn = ∆−1xn = Xn + C
de modo que ∆∆−1 = I, mas em geral, ∆−1∆ ̸= I. Portanto os operadores ∆
e ∆−1 não comutam. Da Prop. (1.4), segue que
∆−1xn =n−1∑k=n0
xk + C
Esta expressão é útil para provar a próxima proposição.
19
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 1.12 O operador ∆−1 é linear.
Demonstração: Precisamos mostrar que para a, b ∈ R,
∆−1[axn + byn] = a∆−1xn + b∆−1yn
De fato,
∆−1[axn + byn] =n−1∑k=n0
[axk + byk] + C =n−1∑k=n0
axk +n−1∑k=n0
byk
= a
n−1∑k=n0
xk + b
n−1∑k=n0
yk = a∆−1xn + b∆−1yn
�Vejamos agora a antidiferença de algumas sequências básicas.
Proposição 1.13 Segue da de�nição de antiderivada �nita e das proposições
anteriores que
i) ∆−1an =an
a− 1+ C, para a ̸= 1
ii) ∆−1(np
)=
(n
p+1
)+ C
iii) ∆−1x(k) =x(k+1)
k + 1+ C, para k ̸= −1
iv) ∆−1 cos(an+ b) =sin(an− a
2+ b)
2 sin(a2)
+ C
v) ∆−1 sin(an+ b) = −cos(an− a
2+ b)
2 sin(a2)
+ C
vi) ∆−n0 = c1xn−1 + c2x
n−2 + . . .+ cn
Demonstração:
i) De fato,
∆
[an
a− 1+ C
]=
an+1
a− 1− an
a− 1=
a · an − an
a− 1= an
20
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
ii) Segue da Prop. (1.5).
iii) Segue das Props. (1.10) e (1.11).
iv) Pela fórmula de Euler, temos
cos(an+ b) + i sin(an+ b) = ei(an+b) = eianeib
Aplicando o operador ∆, obtemos
∆cos(an+ b) + i∆sin(an+ b) = eib∆eian = eib[eia(n+1) − eian]
= eibeian(eia − 1) = eibeian(eia − 1) = 2ieia/2 − e−ia/2
2ieia/2ei(an+b)
= 2i sin
(a
2
)ei(an+a/2+b)
= 2i sin
(a
2
)[cos
(an+
a
2+ b
)+ i sin
(an+
a
2+ b
)]Comparando as partes reais e imaginárias da última igualdade e apli-
cando o operador ∆−1 segue o resultado.
vi) Segue da Prop. (1.9).
�
Exemplo 1.7 Calcule:
a) ∆−1[3n+ 4(n3
)]
b) ∆−1(−1)n
c) ∆−1(2n+ 1)(2)
Resolução:
a) De fato,
∆−1
[3n+ 4
(n
3
)]= 3∆−1n+ 4∆−1
(n
3
)= 3
(n
2
)+ 4
(n
4
)+ C
21
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
b) Fazendo a = −1 no item i) da Prop. anterior, temos
∆−1(−1)n =(−1)n+1
2+ C
c) Da Obs. (1.2),
∆−1(ax+ b)k =(ax+ b)(k+1)
a(k + 1)+ C
de modo que
∆−1(2n+ 1)(2) =(2n+ 1)(3)
6+ C
1.5 O Teorema Fundamental
Nesta seção, veremos como aplicar a antidiferença �nita no cálculo de so-
matórios.
Teorema 1.1 (Teorema Fundamental) Se ∆Xn = xn em < n comm,n ∈N, então
n−1∑k=m
xk = ∆−1
∣∣∣∣nm
= Xn −Xm
Demonstração: De fato,
n−1∑k=m
xk =n−1∑k=m
∆Xk =n−1∑k=m
(Xk+1 −Xk) =n−1∑k=m
Xk+1 −n−1∑k=m
Xk
=n−2∑k=m
Xk+1 +Xn −n−1∑
k=m+1
Xk −Xm
=n−1∑
j=m+1
Xj −n−1∑
k=m+1
Xk +Xn −Xm = Xn −Xm
= ∆−1xn −∆−1xm = ∆−1xi
∣∣∣∣nm
�
22
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Exemplo 1.8 Calcule os somatórios abaixo:
a)n∑
k=1
(−1)k
b)n∑
k=1
(2k − 1)
c)n∑
k=1
(−1)kk
Resolução:
a) Usando a letra b) do Exemplo 1.7, temos:
n∑k=1
(−1)k = ∆−1(−1)k∣∣∣∣n+1
1
=(−1)k+1
2
∣∣∣∣n+1
1
=(−1)n+2 − (−1)2
2=
(−1)n − 1
2
b) De fato,
n∑k=2
(2k − 1) = ∆−1(2k − 1)
∣∣∣∣n+1
2
=
[2∆−1
(k
1
)−∆−11
]n+1
2
=
[2
(k
2
)− k
]n+1
2
= 2
(n+ 1
2
)− (n+ 1)−
[2
(2
2
)− 2
]= (n+ 1)n− n− 1 = n2 − 1
c) Note que
∆(−1)kk = (−1)k+1(k + 1)− (−1)kk = −(−1)kk − (−1)k − (−1)kk
= −2(−1)kk − (−1)k
de modo que
(−1)kk =∆(−1)kk + (−1)k
−2
23
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Logo,
n∑k=1
(−1)kk = −1
2
n∑k=1
∆(−1)kk − 1
2
n∑k=1
(−1)k
= −1
2[(−1)n+1(n+ 1)− 1]− 1
4[(−1)n − 1]
=2(−1)n(n+ 1− (−1)n − 1)
4
=(−1)n(2n+ 1)− 1
4
24
Capítulo 3
A Transformada Discreta de
Laplace
3.1 Introdução
As transformadas de Laplace é uma ferramenta muito conhecida e usada para
resolver de forma prática e operacional problemas de valores iniciais (PVI),
integrais impróprias, sistemas de equações diferenciais ordinárias e algumas
equações diferenciais parciais. De forma análoga, podemos de�nir a trans-
formada discreta de Laplace para sequências numéricas. Neste capítulo, ap-
resentaremos a transformada discreta direta de Laplace (TDDL) explorando
suas propriedades e algumas técnicas para encontrá-las. Em seguida, vere-
mos a transformada discreta inversa de Laplace (TDIL). Encerraremos o capí-
tulo, aplicando a transformada discreta de Laplace para achar as soluções das
equações e sistemas de diferenças �nitas de primeira e segunda ordem. A
aplicação da transformada discreta de Laplace no cálculo de somatórios será
apresentada no capítulo 4.
26
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
3.2 Conceitos e Propriedades
Nesta seção, veremos alguns conceitos e teoremas relativos a transformada
discreta direta de Laplace (TDDL).
De�nição 3.1 Dada a sequência (xn)n∈N, a transformada discreta de Laplace
(TDDL), denotada por ℓd é de�nida para s > 0 por
ℓd{xn} =∞∑n=0
e−snxn := X(s) (3.1)
Nem todas as sequências admitem a transformada discreta de Laplace,
podemos citar, por exemplo xn = n!. Deste modo, devemos impor condições
sobre a sequência (xn) de modo que a série (3.1) seja convergente. As sequên-
cias (xn) para os quais a transformada discreta de Laplace existe são chamadas
de sequências admissíveis.
Teorema 3.1 (Existência da TDDL) Seja xn : N → R uma sequência tal
que |xn| ≤ αes0n para n ≥ N0, sendo α > 0 e s0 > 0. Então
∞∑n=0
e−snxn
é absolutamente convergente e portanto, convergente de modo que a transfor-
mada discreta de Laplace ℓd{xn} existe para s > s0.
Demonstração: De fato,∣∣∣∣ ∞∑n=0
e−snxn
∣∣∣∣ = ∣∣∣∣n0−1∑n=0
e−snxn +∞∑
n=n0
e−snxn
∣∣∣∣ ≤ n0−1∑n=0
|e−snxn|+∞∑
n=n0
|e−snxn|
≤ M +∞∑
n=n0
|αe−snes0n| = M +∞∑
n=n0
αe(s0−s)n
≤ M +∞∑n=0
αe−n(s−s0) = M +α
1− e−(s−s0)< +∞
�
27
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 3.1 (Linearidade da Transformada Discreta de Laplace)
Se ℓd{xn} = X(s) e ℓd{yn} = Y (s), então
i) ℓd{xn + yn} = ℓd{xn}+ ℓd{yn};
ii) ℓd{kxn} = kℓd{xn}, ∀k ∈ R
Demonstração:
i) De fato,
ℓd{xn + yn} =∞∑n=0
e−sn(xn + yn) =∞∑n=0
(e−snxn + e−snyn)
=∞∑n=0
e−snxn +∞∑n=0
e−snyn = X(s) + Y (s)
ii) De fato,
ℓd{kxn} =∞∑n=0
e−sn(kxn) = k∞∑n=0
e−snxn = kX(s)
�
Proposição 3.2 (Teorema do Valor Inicial e Final) Se ℓd{xn} = X(s)
para s > 0, então lims→+∞
X(s) = x0.
Demonstração: Note que
ℓd{xn} =∞∑n=0
e−snxn = x0 +∞∑n=1
xn
esn
de modo que
lims→+∞
X(s) = lims→+∞
x0 +∞∑n=1
lims→∞
xn
esn= x0
�
28
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 3.3 A série geométrica
∞∑n=0
xn
converge se |x| < 1; neste caso, sua soma é 1/(1 − x). A série geométrica
diverge para |x| ≥ 1.
Demonstração: Ver [x]
Proposição 3.4 (Translação na TDDL) Seja (xn)n∈N. Se p ∈ N, então
ℓd{xn+p} = esp∞∑n=p
e−snxn
Demonstração: Usando a de�nição de transformada discreta de Laplace
dada em (3.1), temos:
ℓd{xn+p} =∞∑n=0
e−snxn+p
Fazendo m = n+ p, temos n = m− p, de modo que
ℓd{xn+p} =∞∑
m=p
e−s(m−p)xm = esp∞∑n=p
e−snxn
�
Corolário 3.1 Se ℓd{xn} = X(s), então:
i) ℓd{xn+1} = esX(s)− esx0
ii) ℓd{xn+2} = e2sX(s)− e2sx0 − esx1
29
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração:
i) De fato,
ℓd{xn+1} = es∞∑n=1
e−snxn = es( ∞∑
n=0
e−sn − x0
)= esX(s)− esx0
ii) De fato,
ℓd{xn+2} = e2s∞∑n=2
e−snxn = e2s( ∞∑
n=0
e−sn − x0 − e−sx1
)= e2sX(s)− e2sx0 − esx1
�
Corolário 3.2 Se ∆xn é a derivada discreta da sequência (xn)n∈N, então
ℓd{∆xn} = (es − 1)X(s)− esx0
Demonstração: Segue diretamente da Def. (3.1) e do Cor. (3.1) acima.
�
Proposição 3.5 (Multiplicação por r−an) Sejam a ∈ R e r > 0. Se ℓd{xn} =
X(s), então
ℓd{r−anxn} = ℓd{xn}es→raes = X(ras)
para s > 0, onde a expressão es → raes signi�ca substituir es por raes na
função X(s).
Demonstração: Pela de�nição de transformada discreta de Laplace, temos:
ℓd{r−anxn} =∞∑n=0
e−sn(r−anxn) =∞∑n=0
(esra)−nxn
= ℓd{xn}es→raes = X(ras)
para s > 0.
�
30
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Observação 3.1 Para a = −1 e r = −1, segue que ℓd{(−1)nxn} = ℓd{xn}es→−es.
Observação 3.2 No caso em que r = e, temos ℓd{e−anxn} = X(s+ a).
Proposição 3.6 (Multiplicação por n) Se ℓd{xn} = X(s), então
ℓd{nxn} = −X ′(s)
Demonstração: Por de�nição, temos:
X(s) =∞∑n=0
e−snxn
Derivando ambos os lados desta expressão, segue que
X ′(s) =∂
∂s
( ∞∑n=0
e−snxn
)=
∞∑n=0
xn∂
∂s(e−sn) =
∞∑n=0
xne−sn(−n) ⇒
ℓd{nxn} =∞∑n=0
e−sn(nxn) = −X ′(s)
�
Corolário 3.3 Para k ∈ N,
ℓd{nkxn} = (−1)kdk
dskℓd{xn} = (−1)kX(k)(s)
Demonstração: O resultado segue por indução �nita.
�
Observação 3.3 Tomando xn ≡ 1, temos a relação
ℓd{nk} = (−1)kdk
dskℓd{1} = (−1)k
dk
dsk
(es
es − 1
)Teorema 3.2 Se xn =
(np
)para n, p ∈ N, então:
ℓd
{(n
p
)}=
es
(es − 1)p+1
31
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: Seja f(x) = 1/(1 − x) de�nida para x ∈ (−1, 1). Então
para todo p ∈ N,f (p)(x) =
p!
(1− x)p+1(3.2)
Para p = 0 é claro que f (0)(x) = 1/(1−x). Suponhamos que a expressão (3.2)
seja válida e provaremos que ela também é válida para p+ 1. De fato,
f (p+1)(x) = [f (p)(x)]′ = p![(1−x)−p−1]′ = −(p+1)p!(1−x)−p−2(−1) =(p+ 1)!
(1− x)p+2
Por outro lado, mostraremos que
f (p)(x) =∞∑n=p
p!
(n
p
)xn−p (3.3)
Usaremos indução �nita sobre p para provar este resultado. Para p = 0, temos:
f (0)(x) =∞∑n=0
0!
(n
0
)xn−0 =
∞∑n=0
xn = f(x)
Suponhamos que a expressão (3.3) seja válida e provaremos sua validade para
p+ 1. De fato,
f (p+1)(x) = [f (p)(x)]′ =
[ ∞∑n=p
p!
(n
p
)xn−p
]′=
∞∑n=p+1
p!(n− p)
(n
p
)xn−1−p
=∞∑
n=p+1
(p+ 1)!
(n
p+ 1
)xn−(p+1)
Na última linha, usamos o fato que
p!(n− p)
(n
p
)=
p!(n− p)n!
p!(n− p)!=
n!
(n− 1− p)!= (p+ 1)!
(n
p+ 1
)Das expressões (3.2) e (3.3), segue que
∞∑n=p
(n
p
)xn =
xp
(1− x)p+1
32
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
para |x| < 1. Fazendo x = e−s nesta expressão, temos∞∑n=p
e−sn
(n
p
)=
(e−s)p
(1− e−s)p+1=
es
(es − 1)p+1(3.4)
Por outro lado,
ℓd
{(n
p
)}=
∞∑n=0
e−sn
(n
p
)=
∞∑n=p
e−sn
(n
p
)(3.5)
De (3.4) e (3.5) segue o resultado.
�
Exemplo 3.1 Calcule ℓd{n2}.
Resolução: Note que
n2 = n(n− 1) + n = 2
(n
2
)+
(n
1
)Assim, pelo Teor. (3.2), temos
ℓd{n2} = ℓd
{(n
1
)}+ 2 · ℓd
{(n
2
)}=
es
(es − 1)2+
2es
(es − 1)3
=es(es − 1) + 2 · es
(es − 1)3=
es(es + 1)
(es − 1)3
Corolário 3.4 (Relação de Stifel) Se(np
)é o coe�ciente binomial de n por
p, então (n
p− 1
)+
(n
p
)=
(n+ 1
p
)Demonstração: Pelo Cor. (3.2) e o Teor. (3.2),
ℓd
{∆
(n
p
)}= (es − 1) · es
(es − 1)p+1=
es
(es − 1)p= ℓd
{(n
p− 1
)}⇒
ℓd
{∆
(n
p
)−
(n
p− 1
)}= 0 ⇒
(n+ 1
p
)−
(n
p
)=
(n
p− 1
)donde segue o resultado.
�
33
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 3.7 (Mudança de Escala) Seja p ∈ R∗. Se ℓd{xn} = X(s),
então
ℓd{x(pn)} = X
(s
p
)Demonstração: De fato, note que
ℓd{x(pn)} =∞∑n=0
e−nsx(pn)
Fazendo m = pn, então n = m/p, de modo que
ℓd{x(pn)} =∞∑
m=0
e−mpsxm =
∞∑n=0
e−(s/p)nxn = X
(s
p
)�
3.3 O Produto Convolutivo
O produto convolutivo ou convolução de�nida por duas funções reais, também
é de�nido para sequências, ou seja:
De�nição 3.2 Dadas as sequências (xn)n∈N e (yn)n∈N, o produto convolutivo
é de�nido por:
xn ∗ yn =n∑
k=0
xn−kyk
Proposição 3.8 Segue desta de�nição que
i) O produto convolutivo é comutativo, isto é, xn ∗ yn = yn ∗ xn
ii)
xn ∗ 1 = 1 ∗ xn =n∑
k=0
xk
Demonstração:
34
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
i) De fato, pela de�nição de produto convolutivo, temos:
yn ∗ xn =n∑
k=0
yn−kxk
Fazendo n− k = j, segue que:
yn ∗ xn =0∑
j=n
yjxn−j =n∑
j=0
xn−jyj = xn ∗ yn
ii) Seja yn = 1. Assim, yn−k = 1. Logo, pela de�nição de produto convolu-
tivo, temos:
xn ∗ 1 = xn ∗ yn =n∑
k=0
xk
�
Proposição 3.9 Se ℓd{xn} = X(s) e ℓd{yn} = Y (s), então
ℓd{xn ∗ yn} = X(s)Y (s)
Demonstração: O produto de séries é de�nido por:
∞∑k=0
akxk ·
∞∑k=0
bkxk =
∞∑k=0
( k∑j=0
ajbk−j
)xk
Desta identidade, resulta que
ℓd{xn ∗ yn} =∞∑n=0
∞∑n=0
e−sn(xn ∗ yn) =∞∑n=0
e−sn
( ∞∑k=0
xn−kyk
)=
∞∑n=0
e−snxn ·∞∑n=0
e−snyn = X(s)Y (s)
�
Corolário 3.5 Se X(s) = ℓd{xn}, então
ℓd
{ n∑k=0
xk
}=
esX(s)
es − 1
35
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: Pelo item ii) da Prop. (3.8), temos xn∗1 =n∑
k=0
xk, de modo
que
ℓd
{ n∑k=0
xk
}= ℓd{xn ∗ 1} = X(s) · ℓd{1} =
esX(s)
es − 1
�
Proposição 3.10 Sejam as sequências xn = cos(an) e yn = sin(an). Então:
i)
ℓd{xn} =e2s − es cos a
e2s − 2es cos a+ 1
ii)
ℓd{yn} =es sin a
e2s − 2es cos a+ 1
Demonstração: Seja zn = eian. Pela fórmula de Euler,
eian = cos(an) + i sin(an)
de modo que
ℓd{eian} = ℓd{cos(an)}+ iℓd{sin(an)} (3.6)
Assim,
Z(s) =∞∑n=0
e−sneian =∞∑n=0
e−(s+ia)n = ℓd{1}s+ia
=es+ia
es+ia − 1=
eseia
eseia − 1=
es
es − e−ia
=es
(es − cos a)− i sin a=
es(es − cos a+ i sin a)
(es − cos a)2 + sin2 a⇒
Z(s) =e2s − es cos a+ ies sin a
e2s − 2 · es cos a+ 1(3.7)
Comparando as partes reais e imaginárias de (3.6) e (3.7), segue o resultado.
�
36
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
3.4 A TDDL de Algumas Sequências Elementares
Nesta seção apresentaremos a transformada discreta de Laplace de algumas
sequências que surgem frequentemente.
Proposição 3.11 Considere as sequências abaixos de�nidas em N.
i) Se xn = n, n ∈ N, então ℓd{n} =es
(es − 1)2para s > 0
ii) Se xn = rn, n ∈ N, então ℓd{rn} =es
es − rpara s > 0.
iii) Se xn = 1, n ∈ N, então ℓd{1} =es
es − 1para s > 0
iv) Se xn = (−1)n, n ∈ N, então ℓd{(−1)n} =es
es + 1para s > 0
v) Se xn = cos(nπ2), n ∈ N, então ℓd{cos(nπ2 )} =
e2s
e2s + 1para s > 0
vi) Se xn = sin(nπ2), n ∈ N, então ℓd{sin(nπ2 )} =
es
e2s + 1para s > 0
Demonstração:
i) De fato,
ℓd{n} = ℓd
{(n
1
)}=
es
(es − 1)2
para s > 0 pelo Teor. (3.2).
ii) De fato,
ℓd{rn} =∞∑n=0
e−snrn =∞∑n=0
(e−sr)n =∞∑n=0
(r
es
)n
=1
1− res
=es
es − r
para es > r, ou seja, s > ln r.
ii) Segue imediatamente do item anterior.
iv) Segue imediatamente do item ii).
37
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
v) Basta fazer a = π/2 no item i) da Prop. (3.10).
vi) Basta fazer a = π/2 no item ii) da Prop. (3.10).
�
3.5 Relação Entre a Transformada de Laplace e
a TDDL
Em alguns casos, é possível usar a transformada de Laplace para calcular a
TDDL de algumas sequências.
Teorema 3.3 Considere a sequência {xn} e suponhamos que L−1{xn} = F (t).
Então
X(s) = es∫ ∞
0
F (t)
es − e−tdt (3.8)
Demonstração: Por hipótese, L{F (t)} = xn, de modo que
X(s) = ℓd{xn} =∞∑n=0
e−snL{F (t)} =∞∑n=0
e−sn
∫ ∞
0
e−ntF (t)dt
=
∫ ∞
0
F (t)∞∑n=0
e−(s+t)ndt =
∫ ∞
0
F (t)
1− e−se−tdt = es
∫ ∞
0
F (t)
es − e−tdt
�
Corolário 3.6 Sejam a > 0 e b ≥ 0. Se xn = 1/(an+ b), então
ℓd{xn} =es
a
∫ 1
0
ub/a−1
es − udu
Demonstração: Note que
F (t) = L−1{xn} = L−1
{1
an+ b
}=
1
aL−1
{1
n+ b/a
}=
1
ae−bt/a (3.9)
Substituindo (3.9) em (3.8), temos
ℓd{xn} =es
a
∫ ∞
0
e−bt/a
es − e−tdt
38
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
para s > 0. Fazendo u = e−t, temos du = −e−tdt = −udt. Além disso, se
t = 0, temos u = 1 e se t → +∞, u → 0. Assim,
ℓd{xn} =es
a
∫ 0
1
ub/a(−du/u)
es − u=
es
a
∫ 1
0
ub/a−1
es − udu
�
Exemplo 3.2 Calcule a transformada discreta de Laplace de xn = 1/(n+ 1).
Resolução: Pelo teorema anterior, temos
ℓd{xn} = es∫ 1
0
1
es − udu
Fazendo v = es − u, então dv = −du. Para u = 0, temos v = es e se u = 1,
temos v = es − 1. Assim,
ℓd{xn} = es∫ es−1
es
(−dv)
v= es
∫ es
es−1
dv
v
= es[ln(es)− ln(es − 1)] = es[s− ln(es − 1)]
Corolário 3.7 Sejam b > c > 0. Se
xn =1
(n+ b)(n+ c)
então
ℓd{xn} =es
b− c
∫ 1
0
uc−1 − ub−1
es − udu
Demonstração: Usando frações parciais,
1
(n+ b)(n+ c)=
1
b− c
(1
n+ c− 1
n+ b
)Assim,
ℓd{xn} =1
b− cℓd
{1
n+ c
}− 1
b− cℓd
{1
n+ b
}=
es
b− c
∫ 1
0
uc−1
es − udu− es
b− c
∫ 1
0
ub−1
es − udu
=es
b− c
[∫ 1
0
uc−1
es − udu−
∫ 1
0
ub−1
es − udu
]=
es
b− c
∫ 1
0
(uc−1 − ub−1)
es − udu
�
39
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Exemplo 3.3 Determine ℓd{xn}, sendo
xn =1
(n+ 1)(n+ 2)
Resolução: Fazendo b = 1 e c = 2 na proposição anterior, temos:
ℓd{xn} = −es∫ 1
0
u− 1
es − udu
Fazendo v = es − u, temos dv = −du. Além disso, para u = 0, temos v = es e
se u = 1 ⇒ v = es − 1. Assim,
ℓd{xn} = es∫ es−1
es
v − es
vdv = es
∫ es−1
es
(1− es
v
)dv = e2s[s− ln(es − 1)]− es
3.6 Somatórios Através da Transf. Discreta de
Laplace
Podemos usar a TDL para calcular o valor da soma de algumas séries conver-
gentes, conforme a proposição seguinte:
Proposição 3.12 Se ℓd{xn} = X(s), então
∞∑n=1
xn = X(0)
Demonstração: Basta substituir s = 0 na de�nição de TDDL.
�
Observação 3.4 Se ℓd{xn} = X(s) e r > 0, então da Prop. (3.5), segue que
∞∑n=0
r−anxn =∞∑n=0
(ra)−nxn = ℓd{xn}es→ra
No caso em que r = e, temos
∞∑n=0
e−anxn = X(a)
40
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Exemplo 3.4 Use a Prop. (3.12) ou a Obs. (3.4) e calcule os somatórios
abaixo:
a)∞∑n=1
n
4n
b)∞∑n=1
n2
3n
c)∞∑n=2
n(n− 1)
2n
d)∞∑n=0
1
2n(2n+ 1)
e)∞∑n=0
(n
3
)1
4n
f)∞∑n=0
cos2(nπ/2)
3n
Resolução:
a) De fato,
∞∑n=1
n
4n=
∞∑n=0
2−2nn = ℓd{n}es→4 =
[es
(es − 1)2
]es→4
=4
9
b)
∞∑n=1
n2
3n=
∞∑n=1
3−nn2 = ℓd{n2}es→3 =
[es(es + 1)
(es − 1)3
]es→3
=3(3 + 1)
(3− 1)3=
3
2
c)
∞∑n=2
n(n− 1)
2n= 2 ·
∞∑n=0
e−n
(n
2
)= 2 · ℓd
{(n
2
)}es→2
= 2
[es
(es − 1)3
]es→2
= 4
41
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
d)
∞∑n=0
1
2n(2n+ 1)= ℓd
{1
2n+ 1
}es→1
=∞∑n=0
2−n
2n+ 1=
1√2ln
(√2 + 1√2− 1
)
e)∞∑n=0
(n
3
)1
4n= ℓd
{2−2n ·
(n
3
)}es→4
=
[es
(es − 1)4
]es→4
=4
81
f)
∞∑n=0
cos2(nπ/2)
3n=
∞∑n=0
3−n
2[1 + cos(nπ)] =
1
2ℓd{1}es→3 +
1
2ℓd{(−1)n}es→3
=1
2
[es
es − 1
]es→3
+1
2
[es
es + 1
]es→3
=6
8+
3
8=
9
8
3.7 A Transformada Discreta Inversa de Laplace
(TDIL)
Para obter a solução de equações e de sistemas de equações de diferença �nita
é necessário aplicar a transformada discreta inversa de Laplace (TDIL) que
apresentaremos a seguir.
De�nição 3.3 Se X(s) é a transformada discreta de Laplace da sequência xn,
de�ne-se a transformada discreta inversa de Laplace através da expressão
ℓ−1d {X(s)} = x(n) = xn
Se Nn ≡ 0 é a sequência nula, então ℓd{xn + Nn} = ℓd{xn} = X(s), de
modo que a transformada discreta inversa de Laplace não é única. Excluindo
as sequências nulas, obtemos a unicidade. Assim, dispensaremos as sequências
nulas, fazendo uso delas apenas na resolução das equações de diferenças �nitas
que serão estudadas futuramente.
Proposição 3.13 (Prop. da transf. discreta inversa de Laplace) Se ℓ−1d {X(s)} =
xn e ℓ−1d {Y (s)} = yn, então
42
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
i) ℓ−1d {X(s) + Y (s)} = ℓ−1
d {X(s)}+ ℓ−1d {Y (s)};
ii) ℓ−1d {kX(s)} = kℓ−1
d {X(s)} ∀k ∈ R;
iii) ℓ−1d {X(s) · Y (s)} = xn ∗ yn;
iv) ℓ−1d {X ′(s)} = −nxn;
v) ℓ−1d { es
es−r} = rn;
vi) ℓ−1d { es
e2s+1} = sin(nπ
2);
vii) ℓ−1d { e2s
e2s+1} = cos(nπ
2);
viii) ℓ−1d { es
(es−1)p+1} =(np
);
ix) ℓ−1d { es
es−1} = 1;
x) ℓ−1d {X(ras)} = r−anxn.
Demonstração:
i) De fato,
X(s) + Y (s) = ℓd{xn}+ ℓd{yn} = ℓd{xn + yn} ⇒
ℓ−1d {X(s) + Y (s)} = xn + yn = ℓ−1
d {X(s)}+ ℓ−1d {Y (s)}
ii) Segue de modo análogo ao item anterior.
iii) Segue da Prop. (3.9) e da de�nição de transformada discreta inversa de
Laplace.
iv) Da Prop. (3.6), temos que ℓd{nxn} = −X ′(s). Tomando a transformada
discreta inversa de Laplace em ambos os lados segue o resultado.
v) Segue da Prop. (3.5).
vi) Segue da Prop. (3.11).
vii) Segue também da Prop. (3.11).
43
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
viii) Segue da de�nição da TDIL e do Teor. (3.2).
ix) Segue do item anterior;
x) Segue da Prop. (3.5).
�
Exemplo 3.5 Calcule:
a) ℓ−1d
{e2s
(es − 1)3
};
b) ℓ−1d
{es
es + 1
};
c) ℓ−1d
{2es
4e2s + 1
};
d) ℓ−1d
{e2s
e2s + 4
};
e) ℓ−1d
{1
e2s + 4
}.
Resolução:
a) Note que
e2s
(es − 1)3= es · es
(es − 1)3= es · e
s − 1 + 1
(es − 1)3= es
[1
(es − 1)2+
1
(es − 1)3
]Assim,
ℓ−1d
{e2s
(es − 1)3
}= ℓ−1
d
{es
(es − 1)2
}+ ℓ−1
d
{es
(es − 1)3
}=
(n
1
)+
(n
2
)b) Tomando r = −1 no item v) da proposição anterior, obtemos
ℓ−1d
{es
es + 1
}= (−1)n
44
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
c) Pelo item x) da proposição anterior, temos
ℓ−1d
{2es
4e2s + 1
}= ℓ−1
d
{(2es)
(2es)2 + 1
}= ℓ−1
d {X(21s)}
= 2−nℓ−1d {X(s)} = 2−n sin
(nπ
2
)d)
ℓ−1d
{e2s
e2s + 4
}= ℓ−1
d
{(es/2)2
(es/2)2 + 1
}= 2n cos
(nπ
2
)e) Note que
ℓ−1d
{e2s
e2s + 4
}= ℓ−1
d
{e2s + 4− 4
e2s + 4
}= ℓ−1
d
{1− 4
e2s + 4
}= ℓ−1
d {1} − 4ℓ−1d
{1
e2s+ 4
}de modo que
ℓ−1d
{1
e2s + 4
}=
δ0(n)
4− 2n
4cos
(nπ
2
)
3.8 A Sequência Delta
Uma sequência muito útil na teoria das transformadas discretas de Laplace é
a sequência delta que apresentamos a seguir:
De�nição 3.4 Seja p ∈ N. A sequência delta denotada por δp(n) é de�nida
por
δp(n) =
0, n ̸= p
1, n = p
Segue diretamente desta de�nição que δp(n) · xn = xp e
δp(n) ∗ 1 =n∑
k=0
δp(k) · 1 = 1
Um resultado muito útil sobre a sequência delta é a proposição seguinte.
45
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 3.14 A transformada discreta de Laplace da sequência delta é
dada por:
ℓd{δp(n)} = e−sp
consequentemente, ℓ−1d {e−sp} = δp(n).
Demonstração: De fato,
ℓd{δp(n)} =∞∑n=0
e−snδp(n) = e−sp · 1 = e−sp
�Desta proposição, observamos que ℓd{δ0(n)} = 1 e ℓd{δ1(n)} = e−s. Além
disso, a imagem da sequência δp(n) é um pulso unitário em n = p. Assim, é
natural esperar que quando variamos p ∈ N, a soma de todos esses pulsos é
igual a sequência unitária xn ≡ 1. Este resultado é apresentado na proposição
seguinte.
Proposição 3.15 Se δp(n) é a sequência delta e xn ≡ 1 é a sequência unitária,
então∞∑p=0
δp(n) = xn
Demonstração: De fato,
ℓd
{ ∞∑p=0
δp(n)
}=
∞∑n=0
e−sn
( ∞∑p=0
δp(n)
)=
∞∑p=0
∞∑n=0
e−snδp(n)
=∞∑p=0
ℓd{δp(n)} =∞∑p=0
e−sp =1
1− e−s=
es
es − 1⇒
∞∑p=0
δp(n) = ℓ−1d
{es
es − 1
}= xn ≡ 1
�
Proposição 3.16 Se δ0(n) é a sequência delta no ponto p = 0 e r ∈ R, então
ℓd{rn − δ0(n)} =r
es − r
46
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: De fato,
ℓd{rn − δ0(n)} = ℓd{rn} − ℓd{δ0(n)} =es
es − r−
∞∑n=0
e−snδ0(n)
=es
es − r− 1 =
es − (es − r)
es − r=
r
es − r
�
Observação 3.5 Desta proposição segue que para r ̸= 0,
ℓ−1d
{1
es − r
}=
1
r[rn − δ0(n)] = rn−1 − δ0(n)
r(3.10)
Podemos usar as sequências delta para calcular a transformada discreta
de Laplace de algumas sequências. Ilustraremos esta técnica através de dois
exemplos:
Exemplo 3.6 Use a sequência delta e mostre que
a)
ℓ−1d
{es
es − r
}= rn
b)
ℓ−1d {ee−s} =
1
n!
Resolução:
a) De fato,
ℓ−1d
{es
es − r
}= ℓ−1
d
{1
1− re−s
}= ℓ−1
d
{ ∞∑k=0
(re−s)k}
=∞∑k=0
rkℓ−1d {e−sk} =
∞∑k=0
rkδk(n) = rn
47
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
b) Usando o fato que
ex =∞∑n=0
xn
n!para todox ∈ R
temos,
ℓ−1d {ee−s} = ℓ−1
d
{ ∞∑k=0
(e−s)k
k!
}=
∞∑k=0
ℓ−1d {e−sk} =
∞∑k=0
δk(n)
k!=
1
n!
Exemplo 3.7 Ache a transformada discreta de Laplace de xn =(−1)n
(2n)!.
Resolução: De fato,
ℓd
{(−1)n
(2n)!
}= ℓd
{ ∞∑k=0
(−1)kδk(n)
(2k)!
}=
∞∑k=0
(−1)k
(2k)!ℓd{δk(n)}
=∞∑k=0
(−1)ke−sk
(2k)!=
∞∑k=0
(−1)k(e−s/2)2k
(2k)!= cos(e−s/2)
Proposição 3.17 Seja a ∈ R∗. Então:
ℓ−1d
{1
(es − a)2
}= (n− 1)an−2 +
δ0(n)
a2
Demonstração: De fato,
ℓ−1d
{1
(es − a)2
}= −1
aℓ−1d
{es − a− es
(es − a)2
}= −1
a
{1
es − a− es
(es − a)2
}= −1
aℓ−1d
{1
es − a
}+
1
aℓ−1d
{es
es − a· 1
es − a
}= −1
a
[an−1 − δ0(n)
a
]+ an−1 ∗
[an−1 − δ0(n)
a
]= −an−2 +
δ0(n)
a2+
1
a2an ∗ an − an−2 ∗ δ0(n)
= −an−2 +δ0(n)
a2+
1
a2
n∑k=0
akan−k − an−2
= −2an−2 +δ0(n)
a2+
1
a2· an(n+ 1)
= (n− 1)an−2 +δ0(n)
a2
�
48
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 3.18 Se p, r ∈ R, então
ℓ−1d
{es + p
(es + p)2 − r2
}=
1
2(−r − p)n−1 +
1
2(r − p)n−1 +
rδ0(n)
r2 − p2
Demonstração: Note que
es + p
(es + p)2 − r2=
es + p
(es + p+ r)(es + p− r)=
A
es + p+ r+
B
es + p− r
de modo que
es + p = A(es + p− r) +B(es + p+ r) ⇒ A = B =1
2
Assim,
ℓ−1d
{es + p
(es + p)2 − r2
}=
1
2ℓ−1d
{1
es + p+ r
}+
1
2ℓ−1d
{1
es + p− r
}=
1
2
[(−r − p)n−1 − δ0(n)
(−r − p)
]+
1
2
[(r − p)n−1 − δ0(n)
r − p
]=
1
2(−r − p)n−1 +
1
2(r − p)n−1 +
rδ0(n)
r2 − p2
�
Exemplo 3.8 Calcule:
ℓ−1d
{1
(es − 1)2+
es + 2
(es + 2)2 − 1
}Resolução: Usando as duas proposições anteriores, temos:
ℓ−1d
{1
(es − 1)2+
es + 2
(es + 2)2 − 1
}= ℓ−1
d
{1
(es − 1)2
}+ ℓ−1
d
{es + 2
(es + 2)2 − 1
}= (n− 1)1n−2 +
δ0(n)
12+
1
2(−2− 1)n−1 +
1
2(2− 1)n−1 +
2δ0(n)
22 − 12
= n− 1 + δ0(n) +1
2(−3)n−1 +
1
2+
2
3δ0(n)
= n− 1
2+
5
3δ0(n)−
1
2(−3)n−1
49
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 3.19 Sejam as sequências xn = sin(nπ/2) e yn = cos(nπ/2).
Então:
i)
sin
(nπ
2
)=
∞∑k=0
(−1)kδ2k+1(n)
ii)
cos
(nπ
2
)=
∞∑k=0
(−1)kδ2k(n)
Demonstração:
i) De fato,
sin
(nπ
2
)= ℓ−1
d
{es
e2s + 1
}= ℓ−1
d
{e−s
1 + e−2s
}= e−sℓ−1
d
{ ∞∑k=0
(−1)k(e−2s)k}
= ℓ−1d
{ ∞∑k=0
(−1)ke−(2k+1)s
}=
∞∑k=0
(−1)kℓ−1d {e−(2k+1)s}
=∞∑k=0
(−1)kδ2k+1(n)
ii) Segue de forma análoga ao item anterior.
�
Proposição 3.20 Seja p ∈ N. Então:
i)
ℓ−1d
{1
e2ps(e2s + 1)
}=
p∑k=0
(−1)kδ2k(n)− cos
(nπ
2
)
50
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
ii)
ℓ−1d
{1
e(2p+1)s(e2s + 1)
}=
p∑k=0
(−1)kδ2k+1(n)− sin
(nπ
2
)Demonstração:
i) Note que
1
e2ps(e2s + 1)=
e−2ps
e2s + 1=
(e−s)2pe−2s
1 + e−2s=
(e−2s)p+1
1 + (e−2s)(3.11)
onde x = e−2s. Mas,
xp+1
1 + x=
1 + xp+1
1 + x− 1
1 + x=
p∑k=0
(−x)k − 1
1 + x(3.12)
De (3.11) e (3.12) segue que
1
e2ps(e2s + 1)=
p∑k=0
(−1)ke−2sk − 1
1 + e−2s=
p∑k=0
(−1)ke−2sk − e2s
e2s + 1
Logo,
ℓ−1d
{1
e2ps(e2s + 1)
}= ℓ−1
d
{ p∑k=0
(−1)ke−2sk
}− ℓ−1
d
{e2s
e2s + 1
}
=
p∑k=0
(−1)kℓ−1d {e−2sk} − cos
(nπ
2
)
=
p∑k=0
(−1)kδ2k(n)− cos
(nπ
2
)
ii) Note que
1
e(2p+1)s(e2s + 1)=
e−(2p+1)s − e2s
1 + e−2s=
e−(2p+3)s
1 + e−2s
=(e−2s)p+1e−s
1 + e−2s=
[1 + (e−2s)p+1]e−s
1 + e−2s− e−s
1 + e−2s
=
p∑k=0
(−1)ke−(2k+1)s − es
e2s + 1
51
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Assim,
ℓ−1d
{1
e(2p+1)s(e2s + 1)
}=
p∑k=0
(−1)kℓ−1d {e−(2k+1)s} − ℓ−1
d
{es
e2s + 1
}
=
p∑k=0
(−1)kδ2k+1(n)− sin
(nπ
2
)�
Exemplo 3.9 Calcule
ℓ−1d
{1
e4s(e2s + 1)
}Resolução: Usando a proposição acima, temos
ℓ−1d
{1
e4s(e2s + 1)
}=
2∑k=0
(−1)kδ2k(n)− cos
(nπ
2
)= δ0(n)− δ2(n) + δ4(n)− cos
(nπ
2
)A próxima proposição que apresentaremos a seguir é uma generalização da
Prop. (3.16).
Proposição 3.21 Se p ∈ N∗ e r ∈ R, então
ℓ−1d
{1
eps(es − r)
}=
1
rp+1
[rn −
p∑k=0
rkδk(n)
]Demonstração: De fato, note que
rp+1
eps(es − r)=
rp+1e−pse−s
1− re−s=
rp+1e−(p+1)s
1− re−s= −(re−s)p+1
re−s − 1
= − [(re−s)p+1 − 1]
(re−s)− 1− 1
re−s − 1= −
p∑k=0
(re−s)k +es
es − r
Assim,
ℓ−1d
{rp+1
eps(es − r)
}= −ℓ−1
d
{ p∑k=0
rke−sk
}+ ℓ−1
d
{es
es − r
}
= −p∑
k=0
rkℓ−1d {e−sk}+ rn =
1
rp+1
[rn −
p∑k=0
rkδk(n)
]�
52
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Observação 3.6 Note que
ℓ−1d
{1
eps(es − r)
}= ℓ−1
d
{1
ep−1s· es
es − r
}= ℓ−1
d
{e−(p−1)s· es
es − r
}= δp−1(n)∗rn
Exemplo 3.10 Use a observação anterior e calcule ℓ−1d {δ1(n) ∗ 2n}.
Resolução: De fato,
δ1(n) ∗ 2n = ℓ−1d
{1
e2s(es − 2)
}=
1
23
[2n −
2∑k=0
2k · δk(n)]
=1
8
[2n − 20δ0(n)− 2δ1(n)− 22δ2(n)
]= 2n−3 − δ0(n)
8− δ1(n)
4− δ2(n)
2
3.9 Equações e Sistemas de Diferenças Finitas
Lineares Através da TDL
Equações de diferenças �nitas ou lineares são equações de recorrência envol-
vendo sequências numéricas. Nesta seção, usaremos as de transformadas dis-
cretas de Laplace para achar a solução de PVI (problema de valor inicial)
formados por estas equações. Este método possui a vantagem de achar dire-
tamente a solução do problema, ao contrário do método tradicional em que a
solução do PVI é obtida da solução geral e das condições iniciais.
3.9.1 Equações de Diferenças Finitas Lineares
Não-Homogêneas de Primeira Ordem de
Coe�cientes Constantes
Para a ∈ R e f : N → R, considere o PVI:xn+1 = axn + f(n), n ∈ N
x(0) = x0
53
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
O primeiro passo para obter a solução deste PVI, aplicamos a transformada
discreta direta de Laplace em ambos os lados da equação dada. Em seguida,
usamos a condição inicial e isolamos X(s).
ℓd{xn+1} = aℓd{xn}+ ℓd{f(n)} ⇒
esX(s)− esx0 = aX(s) + F (s) ⇒
X(s) =x0e
s
es − a+
F (s)
es − a(3.13)
Para obter a solução xn, aplicamos a transformada discreta inversa de Laplace
em (3.13), isto é,
ℓ−1d {X(s)} = ℓ−1
d
{x0e
s
es − a
}+ ℓ−1
d
{F (s)
es − a
}Pelo item v) da Prop. (3.13) e da Obs. (3.5), segue que
xn = x0an + f(n) ∗
[an−1 − δ0(n)
a
](3.14)
Temos dois casos a considerar: a = 1 e a ̸= 1. Se a = 1, segue da expressão
(3.14) que
xn = x0 + f(n) ∗ [1− δ0(n)] = x0 + f(n) ∗ 1− f(n) ∗ δ0(n)
= x0 +n∑
k=0
f(k)−n∑
k=0
f(n− k)δ0(k) ⇒
xn = x0 +n−1∑k=0
f(k) (3.15)
Observação 3.7 Se f(n) = b, então
xn = x0 +n−1∑k=0
b = x0 + bn (3.16)
54
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Para o caso em que a ̸= 1, temos
xn = x0an + f(n) ∗ an−1 − 1
af(n) ∗ δ0(n)
xn = x0an +
1
a
n∑k=0
f(n− k)ak − 1
a
n∑k=0
f(n− k)δ0(k)
= x0an +
1
a
n∑k=1
f(n− k)ak ⇒
xn = x0an +
n∑k=1
f(n− k)ak−1 (3.17)
Observação 3.8 Da expressão (3.17), se f(n) = b ∈ R, então
xn = x0an +
b(an − 1)
a− 1
e se f(n) = n, temos
xn = x0an +
n∑k=1
(n− k)ak−1 = x0an +
(an − 1)n
a− 1− nan
a− 1− an
a− 1+
an+1 − 1
(a− 1)2
=
(x0 −
1
a− 1
)an +
an+1 − 1
(a− 1)2− an
a− 1
Nos cálculos acima usamos o fato que
n∑k=1
kxk−1 =(n− 1)xn
x− 1− xn+1 − 1
(x− 1)2
que explicado no capítulo 4.
Exemplo 3.11 Se um capital C0 é aplicado a uma taxa i ao mês, determine
o montante após n meses, se o regime for:
a) de juros simples;
b) de juros compostos.
55
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Resolução: Seja xn o montante no mês n. Assim, o montante inicial será
x0 = C0. No regime de juros simples, o montante no n + 1 mês é igual ao
montante do período anterior adicionado ao juro de um mês, incidido sobre o
capital inicial. Deste modo que temos o PVI:xn+1 = xn + iC0
x0 = C0
Resolução:
a) Neste caso, a = 1 e f(n) = C0i. Da expressão (3.16), segue que
xn+1 = C0 + C0in = C0(1 + in)
b) Para juros compostos, temos xn+1 = xn + ixn = (1 + i)xn, de modo a
obter o PVI: xn+1 = (1 + i)xn
x0 = C0
Neste caso, a = 1 + i e f(n) = 0. Da expressão (3.17), temos xn =
C0(1 + i)n.
Para praticar o método das transformadas discretas de Laplace, é preferível
em alguns casos resolver passo a passo cada PVI ao invés de usar as fórmulas
deduzidas acima.
Exemplo 3.12 Determine a solução do PVI:∆xn = n
x1 = 1
Resolução: Aplicando a transformada discreta direta de Laplace, temos
ℓd{∆xn} = ℓd{n} ⇒ (es − 1)X(s) = esx0 +e2s
(es − 1)2
Isolando X(s), segue que
X(s) = x0 ·es
es − 1+
es
es − 1· es
(es − 1)2
56
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Tomando a transformada discreta inversa de Laplace e usando a Prop. (3.13),
obtemos
xn = x0 · 1 + 1 ∗ n = x0 +n∑
k=0
k = x0 +n(n+ 1)
2
Sendo x1 = 1, então 1 = x1 = x0 + 1, de modo que x0 = 0 e
xn =n(n+ 1)
2
Exemplo 3.13 Resolva o PVI:∆xn =1
n+ 1
x0 = 1
Resolução: Neste caso, temos:
ℓd{xn+1}−ℓd{xn} = ℓd
{1
n+ 1
}⇒ esX(s)−esx0−X(s) = es[s−ln(es−1)]
Isolando X(s), segue que
X(s) =es
es − 1+
es
es − 1[s− ln(es − 1)] ⇒
xn = ℓ−1d
{es
es − 1
}+ ℓ−1
d
{1
es − 1· es[s− ln(es − 1)]
}= 1 + [1− δ0(n)] ∗
1
n+ 1
devido ao Exem. (3.2) e a Obs. (3.5). Assim,
xn = 1 +n∑
k=0
1− δ0(k)
n− k + 1= 1 +
n∑k=0
1
n− k + 1−
n∑k=0
δ0(k)
n− k + 1
= 1 +0∑
j=0
1
j + 1− 1
n+ 1= 1 +
n−1∑j=0
1
j + 1
Exemplo 3.14 Ache a solução da equação soma abaixo:
n∑k=0
xk = 2xn − 1
57
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Resolução: Aplicando a transformada discreta de Laplace em ambos os lados
da equação dada, temos:
ℓd
{ n∑k=0
xk
}= 2ℓd{xn} − ℓd{1} ⇒ ℓd{xn ∗ 1} = 2X(s)− es
es − 1⇒
esX(s)
es − 1− 2X(s) = − es
es − 1⇒ X(s) =
es
es − 2⇒ xn = 2n
Exemplo 3.15 Um medicamento administrado uma vez a cada 4 horas. Seja
C(n) a quantidade de medicamento presente na corrente sanguínea no enésimo
intervalo. O corpo elimina uma fração p do medicamento a cada intervalo
de tempo. Se a quantidade administrada inicialmente é C0, ache C(n) e
limn→+∞
C(n).
Resolução: Uma vez que a quantidade de medicamentos no organismo no
tempo tn+1 é igual a diferença entre esta quantidade no tempo tn e a fração p
eliminada pelo corpo, adicionada a nova dosagem C0, temos o seguinte PVI:Cn+1 = (1− p)Cn + C0
C(0) = C0
Seja c(s) = ℓd{C(n)}. Assim,
ℓd{Cn+1} = (1−p)ℓd{Cn}+ℓd{C0} ⇒ esc(s)−esC0 = (1−p)c(s)+C0e
s
es − 1⇒
c(s) =C0e
2s
(es − 1 + p)(es − 1)=
es
es − 1· C0e
s
es − (1− p)⇒
ℓ−1d {c(s)} = C(n) = 1 ∗ [C0(1− p)n] = C0
n∑k=0
(1− p)k
= C0[(1− p)n+1 − 1]
1− p− 1=
C0
p[1− (1− p)n+1]
Além disso,
limn→+∞
C(n) = limn→+∞
C0
p[1− (1− p)n+1] =
C0
p
58
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3.9.2 Equações de Diferenças Finitas Lineares
de Segunda Ordem de Coe�cientes Constantes
A forma geral de uma equação de diferença �nita de segunda ordem é dada
por
xn+2 = f(n)xn+1 + g(n)xn + h(n) (3.18)
Se f(n) e g(n) são funções constantes, a equação é dita de coe�cientes con-
stantes. Quando h(n) ≡ 0 a equação é chamada de homogênea. Em nosso
estudo, estamos interessados em achar a solução dos PVI's de segunda ordem
cuja equação é um caso particular da expressão (3.18). Inicialmente, tratare-
mos do seguinte PVI: axn+2 + bxn+1 + cxn = 0
x(0) = x0, x(1) = x1
(3.19)
sendo a, b, c ∈ R com a ̸= 0. Aplicando a transformada discreta de Laplace
em (3.19), temos:
ℓd{axn+2}+ℓd{bxn+1}+ℓd{cxn} = 0 ⇒ (ae2s+bes+c)X(s) = C1e2s+C2e
s
onde C1 = ax0 e C2 = ax1+bx0. Assim, para achar a solução xn do PVI (3.19)
devemos calcular
ℓ−1d
{C1e
2s + C2es
ae2s + bes + c
}Para esta expressão, temos três casos conforme o discriminante ∆ = b2 − 4ac
da equação ae2s + bes + c = 0 é positivo, nulo ou menor que zero.
Caso 1: Raízes Reais Distintas
Neste caso, o discriminante da equação quadrática ae2s + bes + c = 0 é
positivo, e portanto, ela admite duas raízes reais distintas.
Proposição 3.22 Sejam C1 e C2 de�nidos acima. Se o discriminante ∆ da
equação ae2s + bes + c = 0 é positivo, então a solução do PVI (3.19) é dada
por:
xn = ℓ−1d
{C1e
2s + C2es
ae2s + bes + c
}=
(C1r2 + C2)rn2 − (C1r1 + C2)r
n1
a(r2 − r1)
onde r1 e r2 são as raízes reais da equação quadrática.
59
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: Se r1 e r2 são as raízes da equação ae2s+ bes+ c = 0, então
ae2s + bes + c = a(es − r1)(es − r2)
Assim,
X(s) =es(C1e
s + C2)
a(es − r1)(es − r2)
Usando frações parciais, podemos escrever
C1es + C2
(es − r1)(es − r2)=
A
es − r1+
B
es − r2⇒
C1es+C2 = A(es−r2)+B(es−r1) ⇒ A = −C1r1 + C2
r2 − r1e B =
C1r2 + C2
r2 − r1
de modo que
X(s) =A
a
es
es − r1+
B
a
es
es − r2
Aplicando a transformada discreta inversa de Laplace nesta expressão, segue
o resultado.
�
Exemplo 3.16 Resolva o PVI:xn+2 + xn+1 − 2xn = 0, n ∈ N
x0 = 6, x1 = 3
Resolução: Neste caso, a = b = 1, c = −2 de modo que ∆ = 9 e as raízes
são r1 = −2 e r2 = 1. Sendo x0 = 6 e x1 = 3, segue que C1 = 6 e C2 = 9.
Logo,
xn =(6 · 1 + 9)1n − [6(−2) + 9](−2)n
1 · (1 + 2)= 5 + (−2)n
Exemplo 3.17 A sequência de Pell satisfaz o seguinte PVI:pn+2 = 2pn+1 + pn, n ∈ N
p0 = 0, p1 = 1
Ache pn.
60
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Resolução: Aplicando a transformada discreta de Laplace na equação acima,
temos:
ℓd{pn+2} − 2ℓd{pn+1} − ℓd{pn} = 0 ⇒
e2sP (s)− e2sp0 − esp1 − 2(esP (s)− esp0)− P (s) = 0 ⇒
[(es − 1)2 − 2]P (s) = es ⇒ P (s) =es
(es − 1 +√2)(es − 1−
√2)
Usando frações parciais, temos
1
(es − 1 +√2)(es − 1−
√2)
=A
es − 1 +√2+
B
es − 1−√2
de modo que
A = −√2
4e B =
√2
4
Logo,
P (s) = −√2
4· es
es − (1−√2)
+
√2
4· es
es − (1 +√2)
⇒
pn =
√2
4(1 +
√2)n −
√2
4(1−
√2)n =
√2
4(δn − δ̄n)
Equações não-homogêneas também podem ser resolvidas. Além disso, ao invés
de usar frações parciais, podemos usar o teorema da convolução conforme o
exemplo a seguir.
Exemplo 3.18 Resolva o PVI:yn+2 − 3yn+1 + 2yn = 3n
y0 = 0, y1 = 1
Resolução: Aplicando a transformada discreta de Laplace no PVI acima,
temos:
e2sY (s)− e2sy0 − esy1 − 3[esY (s)− esy0] + 2Y (s) =es
es − 3⇒
(e2s − 3es + 2)Y (s) = es[1 +
1
es − 3
]=
es(es − 2)
es − 3⇒
61
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Y (s) =1
es − 1· es
es − 3
Aplicando a transformada discreta inversa de Laplace, segue que
yn = ℓ−1d
{1
es − 1· es
es − 3
}= [1− δ0(n)] ∗ 3n = 1 ∗ 3n − δ0(n) ∗ 3n
=n∑
k=0
3k −n∑
k=0
δ0(k)3n−k =
3n+1 − 1
3− 1− 3n =
3n − 1
2
Caso 2: Raízes Reais Repetidas
Neste caso, o discriminante da equação quadrática ae2s+bes+c = 0 é nulo,
ou seja, ∆ = b2 − 4ac = 0. Assim,
ae2s+bes+c =1
4a(4a2e2s+4abes+4ac) =
1
4a(4a2e2s+4abes+b2) =
1
4a(2aes+b)2
de modo que
X(s) =4aC1e
2s
(2aes + b)2+
4aC2es
(2aes + b)2
=C1
a
e2s(es +
b
2a
)2 +C2
a
es(es +
b
2a
)2 := F (s) +G(s)
Aplicando a transformada discreta inversa de Laplace em F (s), temos:
f(n) = ℓ−1d {F (s)} = ℓ−1
d
{C1
a
e2s
(es + b/2a)2
}=
C1
aℓ−1d
{es
es + b/2a· es
es + b/2a
}=
C1
a
(− b
2a
)∗(− b
2a
)=
C1
a
n∑k=0
(− b
2a
)k(− b
2a
)n−k
=C1
a
n∑k=0
(− b
2a
)n
=C1
a
(− b
2a
)n
(n+ 1)
Sendo
g(n) =C2
aℓ−1d
{es
(es + b/2a)2
}=
C2
aℓ−1d
{− d
ds
(1
es + b/2a
)}=
C2
a· nℓ−1
d { 1
es + b/2a
}=
C2
a· n
[(− b
2a
)n−1
+δ0(n)
2
]= −2C2n
b
(− b
2a
)n
62
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
segue que
xn = f(n) + g(n) =1
a
(− b
2a
)n[(C1 −
2aC2
b
)n+ C1
]é a solução do PVI (3.19) no caso em que ∆ = 0, sendo C1 = ax0 e C2 =
ax1 + bx0.
Na prática, ao invés de usar a expressão acima, é preferível repetir os passos
em cada problema proposto conforme os exemplos abaixo.
Exemplo 3.19 Ache a solução do PVI:xn+2 + 4xn+1 + 4xn = 0
x0 = 0, x1 = 1
Resolução: Aplicando a TDL na equaação dada, temos
ℓd{xn+2}+ 4ℓd{xn+1}+ 4ℓd{xn} = 0 ⇒
e2sX(s)− es + 4esX(s) + 4X(s) = 0 ⇒
(es + 2)2X(s) = es ⇒ X(s) =es
(es + 2)2= − d
ds
(1
es + 2
)⇒
xn = −ℓ−1d
{d
ds
(1
es + 2
)}= nℓ−1
d
{1
es + 2
}= n
[(−2)n−1 +
δ0(n)
2
]= n(−2)n−1 +
nδ0(n)
2= n(−2)n−1
Caso 3: Raízes Complexas
Neste caso, o discriminante da equação quadrática ae2s + bes + c = 0 é
negativo, ou seja, ∆ = b2 − 4ac < 0 ⇒ −∆ > 0. Como os coe�cientes da
equação acima são reais, as raízes são complexas conjugadas, ou seja, r1 =
α + βi e r2 = α − βi, onde α = −b/2a e β =√−∆/2a. Como as raízes são
complexas, faz sentido calcular o módulo delas, ou seja,
r := |r1| = |r2| =√α2 + β2 =
√(α+ βi)(α− βi) =
√r1 · r2 =
√c
a
63
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Note que c/a > 0, pois sendo ∆ = b2 − 4ac < 0, temosc
a=
4ac
4a2>
b2
4a2≥ 0.
Tomando θ = arctanβ
α, segue que r1 = r cos θ e r2 = r sin θ, de modo que
r1 = α+βi = r(cos θ+ i sin θ) = reiθ e r2 = αiβi = r(cos θ− i sin θ) = re−iθ
Por outro lado,
ae2s + bes + c = a
(e2s +
b
aes +
c
a
)= a
[(es +
b
2a
)2
+4ac− b2
4a2
]= a
[(es +
b
2a
)2
− ∆
4a2
]= a
[(es +
b
2a
)2
−(√
−∆i
2a
)2]= a
(es +
b
2a−
√−∆
2ai
)(es +
b
2a+
√−∆
2ai
)= a
[es −
(− b
2a+
√−∆
2ai
)][es −
(− b
2a−
√−∆
2ai
)]= a(es − r1)(e
s − r2) = a(es − reiθ)(es − re−iθ)
Vimos também que
X(s) =C1e
2s + C2es
a(es − r1)(es − r2)=
es(C1es + C2)
a(es − reiθ)(es − re−iθ)(3.20)
3.9.3 Equações de Diferenças Finitas Lineares
de Segunda Ordem Não-Homogênea
Exemplo 3.20 Resolva o PVI não-homogêneo abaixo.xn+2 + 2xn+1 + xn = n
x0 = 1, x1 = 0
Resolução: Aplicando a transformada discreta de Laplace, temos:
(e2s + 2es + 1)X(s) = e2s + 2es +es
(es − 1)2= es
[(es + 2)(es − 1)2 + 1
(es − 1)2(es + 1)2
]Usando frações parciais, escrevemos
(es + 2)(es − 1)2 + 1
(es − 1)2(es + 1)2=
A
(es − 1)2+
B
es − 1+
C
(es + 1)2+
D
es + 1⇒
64
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
(es+2)(es−1)2+1 = A(es+1)2+B(es−1)(es−1)2+C(es−1)2+D(es+1)(es−1)2
Fazendo es = 1, obtemos A = 1/4. Para es = −1, temos C = 5/4. Fazendo
es = 0 e es = −2, obtemos o sistema linearB −D = −32
B + 3D = 144
cuja solução é B = −1/4 e D = 5/4. Assim,
X(s) =es
4(es − 1)2− es
4(es − 1)+
5es
4(es + 1)2+
5es
4(es + 1)⇒
xn =1
4ℓ−1d
{es
(es − 1)2
}− 1
4ℓ−1d
{es
es − 1
}+
5
4ℓ−1d
{es
(es + 1)2
}+
5
4ℓ−1d
{es
es + 1
}=
n
4− 1
4− 5
4ℓ−1d
{d
ds
(1
es + 1
)}+
5
4(−1)n
=n− 1
4+
5
4(−1)n +
5n
4
[(−1)n−1 + δ0(n)
]=
n− 1
4+
5
4(−1)n(1− n) =
(n− 1)
4[1− 5(−1)n]
3.9.4 Equações de Diferença do Tipo Volterra
3.9.5 Sistemas de Equações de Diferenças Finitas
Lineares de Primeira Ordem
3.10 Exercícios Propostos
1. Veri�que o teorema do valor inicial e �nal para as sequências abaixo:
65
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
(a) xn = 2n
(b) yn =(n2
)(c) xn = 3 + n
(d) xn = nrn−1 R: X(s) = es/(es − r)2
2. Calcule a transformada discreta direta de Laplace das sequências abaixo.
3. Use a Prop. (3.6) e ℓd{1} para calcular ℓd{n}.
4. Use a Prop. (3.6) e calcule:
(a)∞∑n=1
n cos(nπ/2)
2n
(b)∞∑n=1
n sin(nπ/4)
2n
5. Use a Prop. (3.7) e calcule ℓd{(−1)n}, sabendo que
ℓd
{cos
(nπ
2
)}=
e2s
e2s + 1
6. (a) Mostre que
ℓd
{cos
(nπ
2
)}=
1 + tanh s
2
(b) Mostre que
ℓd
{sin
(nπ
2
)}=
sech s
2
7. Sejam r1, r2 ∈ R. Mostre que
rn1 ∗ rn2 =rn+12 − rn+1
1
r2 − r1
8. Se r1, r2 são as raízes reais da equação ae2s + bes + c = 0, mostre que
(a)
ℓ−1d
{e2s
ae2s + bes + c
}=
rn1 ∗ rn2a
66
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
(b)
ℓ−1d
{es
ae2s + bes + c
}=
rn1 ∗ rn2 − rn1ar2
9. Use o Exem. (3.2) e mostre que
(a)∞∑n=0
2−n
n+ 1= ln 4
(b)
ℓd
{ n∑k=0
1
k + 1
}=
e2s
es − 1[s− ln(es − 1)]
10. Resolva os PVI's abaixo através da transformada discreta de Laplace.
a)
an+1 = 3an, n ∈ N
a0 = 2
b)
xn+2 − 2xn+1 + xn = 2n, n ∈ N
x0 = 2 e x1 = 1
c)
xn+1 = 2xn + 2n, n ∈ N
x0 = 0
67
Capítulo 4
Funções Geradoras
4.1 Introdução
Se as variáveis de um problema mudam de forma discreta ou descontinua-
mente, ao invés de variarem continuamente, as equações de diferenças ao invés
das equações diferenciais são as ferramentas mais adequadas para expressar
essas mudanças. As equações de diferenças �nitas ou recorrentes surgem em
Administração e na Análise Econômica, onde muitos dados econômicos são
registrados em períodos de tempo uniformemente espaçados. Tais estudos das
variáveis ao longo de conjuntos discretos de valores de tempo são denominados
análise de período, e as equações de diferenças oferecem as bases para tais
análises.
Neste texto usaremos as funções geradoras para resolver as equações recor-
rentes que é uma forma compacta de exprimir uma sequência. Através dessas
funções podemos também achar o valor de um somatório, a média e outros
valores estatísticos, além de provar algumas identidades combinatórias. Além
disso, daremos destaque as notações operacionais G e do seu inverso G−1, semel-
hante ao que se faz quando se usa as transformadas de Laplace.
68
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
4.2 Conceitos e Propriedades
De�nição 4.1 Uma série de potências formal ou função geradora é uma ex-
pressão da forma
a0 + a1x+ a2x2 + . . . =
∞∑n=0
anxn
Uma sequência de inteiros (an)n≥0 é a sequência dos coe�cientes.
Exemplo 4.1 A série
A(x) = 1 + x+ 22x2 + 33x3 + . . .+ nnxn + . . .
converge apenas para x = 0. Na teoria formal, esta expressão de�ne uma
função geradora com a sequência de coe�cientes (an)n≥0 cujo termo geral é
dado por an = nn.
Observação 4.1 Sequências e seus elementos serão várias vezes denotadas
por pelas letras latinas minúsculas (a, b, c, . . .), enquanto que suas funções ge-
radoras serão denotadas respectivamente pelas letras latinas maiúsculas
A,B,C, . . .
Exemplo 4.2 Determine a função geradora da sequência an =1
n!, n ∈ N.
Resolução: A(x) =∞∑n=0
xn
n!= ex, que converge para todo x ∈ R.
De�nição 4.2 Duas funções geradoras A =∞∑n=0
anxn e B =
∞∑n=0
bnxn são
iguais se suas correspondentes sequências são iguais, isto é, an = bn para
todo n ∈ N.
De�nição 4.3 A soma e a diferença de duas funções geradoras são de�nidas
por∞∑n=0
anxn ±
∞∑n=0
bnxn =
∞∑n=0
(an ± bn)xn
69
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
o produto pelo escalar c é de�nido por∞∑n=0
canxn = c
∞∑n=0
anxn
e o produto de duas funções geradoras são de�nidas por∞∑n=0
anxn
∞∑n=0
bnxn =
∞∑n=0
cnxn, cn =
n∑j=0
ajbn−j
Ao invés de A · A, escrevemos A2, e mais geralmente An+1 = A · An. Observe
também que 0 é o elemento neutro da adição e 1 é o elemento neutro da
multiplicação.
De�nição 4.4 A função geradora B é a recíproca da função geradora A se
AB = 1.
A função geradora recíproca de A será denotada por 1/A. Desde que a multi-
plicação é comutativa então AB = 1 é equivalente a BA = 1. Portanto, A e
B são multuamente recíprocas.
Exemplo 4.3 Sendo a série geométrica 1/(1− x) dada por
1
1− x= 1 + x+ x2 + . . .
segue que 1 − x e 1 + x + x2 + . . . são séries formais ou funções geradoras
recíprocas.
Teorema 4.1 Uma função geradora A =∞∑n=0
anxn admite uma recíproca se e
somente se a0 ̸= 1. A função geradora recíproca é única.
Demonstração: Assume que A tem uma recíproca dada por 1/A =∞∑n=0
bnxn.
Então A · (1/A) = 1, donde segue que 1 = a0b0, portanto, a0 ̸= 0. Para n ≥ 1,
temos∞∑k=0
akbn−k = 0, de modo que os coe�cientes de A(x) são unicamente
determinados por
bn = − 1
a0
n∑k=0
akbn−k
70
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Por outro lado, se a0 ̸= 0 podemos determinar todos os coe�cientes bn de forma
única usando a expressão anterior, o que gera a série 1/A.
�
De�nição 4.5 Se A =∞∑n=0
anxn é uma função geradora, A(B(x)) denota a
função geradora A(B(x)) =∞∑n=0
anA(x)n.
De�nição 4.6 Dizemos que as funções geradoras A e B são inversíveis se e
somente se A(B(x)) = B(A(x)) = x.
Teorema 4.2 Se A e B são funções geradoras inversíveis, então
A(x) = a1x+ a2x2 + . . . e B(x) = b1x+ b2x
2 + . . .
Demonstração: De fato, por de�nição A(B(x)) e B(A(x)) não deve conter
o termo nulo. Assume que A(x) = arxr + . . . e B(x) = bsx
s + . . .. Então,
A(B(x)) = x = arbrsx
rs + ..., donde segue que rs = 1 ou r = 1 e s = 1.
�
De�nição 4.7 A derivada da função geradora A =∞∑n=0
anxn é de�nida por
A′ =∞∑n=1
nanxn−1
A derivada de ordem n > 1 é de�nida recursivamente por A(n+1) = (A(n))′.
Teorema 4.3 Valem as seguintes propriedades sobre as derivadas:
i) (A+B)(n) = A(n) +B(n);
ii) (AB)(n) =n∑
k=0
(n
k
)A(k)B(n−k).
71
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração:
i) Usaremos indução �nita. Para n = 1, temos
(A+B)′ =
( ∞∑k=0
akxk +
∞∑k=0
bkxk
)′
=
( ∞∑k=0
(ak + bk)xk
)′
=∞∑k=1
k(ak + bk)xk−1
=∞∑k=1
kakxk−1 +
∞∑k=1
kbkxk−1 = A′ +B′
Assumindo que
(A+B)(n) = A(n) +B(n)
mostraremos que esta expressão é válida para n+ 1. De fato,
(A+B)(n+1) = [(A+B)(n)]′ = [A(n) +B(n)]′ =
=
( ∞∑k=n
k(k − 1) . . . (k − n+ 1)akxk−n +
∞∑k=n
k(k − 1) . . . (k − n+ 1)bkxk−n
)′
=∞∑
k=n+1
(k + 1)k . . . (k − n)akxk−n−1 +
∞∑k=n+1
(k + 1)k . . . (k − n− 1)bkxk−n−1
=∞∑
k=n+1
(k + 1)k(k − 1) . . . (k − n)(ak + bk)xk−n−1
ii) É semelhante a regra de Leibniz para derivação do produto de duas funções
e �ca como exercício.
�
4.3 A Notação Operacional GDe�nição 4.8 Indicaremos por G{an} a função geradora da sequência (an)n≥0,
isto é,
G{an} =∞∑n=0
anxn = A(x)
Proposição 4.1 (Linearidade) Sejam A(x) e B(x) as funções geradoras das
sequências (an)n≥0 e (bn)n≥0. Se c1, c2, então
G{c1an + c2bn} = c1G{an}+ c2G{bn}
72
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Demonstração: Segue diretamente da Def. (4.3).
�
Proposição 4.2 (Escala) Sejam A(x) a função geradora da sequência (an)n≥0
e c ∈ R, entãoG{cnan} = A(cx)
Demonstração: De fato,
G{cnan} =∞∑n=0
cnanxn =
∞∑n=0
an(cx)n = A(cx)
�
Observação 4.2 No caso particular em que c = −1, temos:
G{(−1)nan} = A(−x)
Exemplo 4.4 Seja c ∈ C. Mostre que G{cn} =1
1− cx.
Resolução: Da série geométrica, sabemos que para | x | < 1,
1
1− x=
∞∑n=0
xn
Assim, G{1} = 1/(1− x) e pela Prop. (5.2), segue que
1
1− cx=
∞∑n=0
(cx)n = G{cn}
Exemplo 4.5 Determine a função geradora da sequência an = enπi/2.
Resolução: Usando a propriedade acima e a sequência an = 1, temos
G{enπi/2} = G{(eπi/2)n · 1} = G{in · 1} =1
1− ix=
1 + ix
(1− ix)(1 + ix)=
1 + ix
1 + x2
Pela fórmula de Euler, eiθ = cos θ+ i sin θ. Assim, pela propriedade de lineari-
dade, segue que
G{cos
(nπ
2
)+ i sin
(nπ
2
)}=
1
1 + x2+ i
x
1 + x2
73
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
ou seja,
G{cos(nπ/2)} =1
1 + x2e G{sin(nπ/2)} =
x
1 + x2
Proposição 4.3 (Translação) Seja A(x) a função geradora da sequência
(an)n≥0, então:
i) G{an+1} =A(x)− a0
x;
ii) G{an+2} =A(x)− a0 − a1x
x2.
Demonstração:
i) Sendo G{an} =∞∑n=0
anxn, segue que
G{an+1} =∞∑n=0
an+1xn
Fazendo m = n+ 1, temos
G{an+1} =∞∑
m=1
amxm−1 =
1
x
∞∑m=1
amxm =
1
x
( ∞∑n=0
anxn − a0
)=
A(x)− a0x
ii) Seja bn = an+1. Assim,
G{an+2} = G{bn+1} =B(x)− b0
x=
B(x)− a1x
(4.1)
Mas,
B(x) = G{bn} = G{an+1} =A(x)− a0
x(4.2)
Substituindo (5.2) em (5.1), temos
G{an+2} =
A(x)− a0x
− a1
x=
A(x)− a0 − a1x
x2
�
74
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Observação 4.3 Se m ∈ N, então por indução �nita, segue que
G{an+m+1} =A(x)− a0 − a1x− . . .− amx
m
xm+1
Exemplo 4.6 Determine uma equação algébrica aplicando o operador G no
problema de valor inicial abaixo: an+2 + an+1 − 2an = 5
a0 = 0 e a1 = 1
Resolução: Aplicando o operador G na equação acima, temos:
G{an+2 + an+1 − 2an} = G{5} ⇒
G{an+2}+ G{an+1} − 2G{an} =5
1− x⇒
A(x)− 0− x
x2+
A(x)− 0
x− 2A(x) =
5
1− x⇒
A(x)− x+ xA(x)− 2x2A(x) =5x2
1− x
Logo,
A(x) =5x2
(1− x)(1 + x− 2x2)+
x
1 + x− 2x2
=5x2
(1− x)2(1 + 2x)+
x
(1− x)(1 + 2x)
De�nição 4.9 (Operador xD) O operador xD é de�nido por
(xD)A(x) = xA′(x) = xdA
dx
Teorema 4.4 Seja A(x) a função geradora da sequência (an)n≥0, então
G{nman} = (xD)mA(x) m ∈ N
Demonstração: Usaremos indução �nita. Para m = 1, temos:
G{nan} =∞∑n=0
nanxn = x
∞∑n=0
an nxn−1 = x∞∑n=0
anD(xn)
= xD
( ∞∑n=0
anxn
)= (xD)A(x)
75
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Suponhamos a validade param = k, isto é, G{nkan} = (xD)kA(x), provaremos
que
G{nk+1an} = (xD)k+1A(x)
De fato,
(xD)k+1A(x) = xD(xD)kA(x) = xDG{nkan} = xD∞∑n=0
nkanxn
= x∞∑n=0
nkanD(xn) =∞∑n=0
xnkan nxn−1
=∞∑n=0
nk+1anxn = G{nk+1an}
Exemplo 4.7 Calcule a função geradora da sequência an = n.
Resolução: Sendo G{1} =1
1− xpara | x | < 1, temos:
G{n} = G{n · 1} = (xD)G{1} = xD
(1
1− x
)= x · (−1)
(1− x)2· (−1) =
x
(1− x)2
4.4 Os Números de Stirling do Segundo Tipo
4.5 A Notação Operacional G−1
4.6 Exercícios Propostos
1. Calcule a função geradora de cada uma das sequências abaixo:
(a) an = 2n cos(nπ/2);
(b) an = 2n sin(nπ/2);
(c) an = n2 + n;
(d) an =n
2n;
76
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
(e) an =(−1)n
(2n+ 1)!;
(f) an =(−1)n
(2n)!;
(g) an = 1 se n é par e an = 0 se n é ímpar.
2. Calcule o valor de∞∑n=0
n2
2n
3. Mostre que
G{n3} =x3 + 4x2 + x
(x− 1)4
4. Use indução �nita e mostre que
1
(1− x)k+1=
∞∑n=0
(n+ k
n
)xn, k ∈ N
77
Capítulo 5
Técnicas Para o Cálculo
Somatórios
5.1 Introdução
Os somatórios e as séries numéricas estão presentes no mundo matemático
desde da Grécia Antiga. Por exemplo, o paradoxo de Zenão da corrida entre
Aquiles e a tartaruga envolve de certo modo a soma de uma série in�nita.
Temos também exemplos de séries geométricas nos trabalhos de Arquimedes,
tais como a quadratura da parábola e a reti�cação da espiral que leva o seu
nome. As séries in�nitas só voltaram aparecer na Matemática 1500 anos de-
pois, principalmente com os estudos do matemático medieval Nicole Oresme
(1325-1382) que provou que a série harmônica
∞∑k=1
1
k= 1 +
1
2+ . . .+
1
n+ . . .
diverge. Outro episódio interessante sobre somatórios na história da matemática
ocorreu com Carl F. Gauss (1777-1855) quando tinha 7 anos. Seu profes-
sor para mantê-los ocupados, pediu para que eles calculasse a soma dos cem
primeiros números naturais. Rapidamente, o pequeno Gauss colocou sua pe-
quena lousa sobre a mesa e disse: Aqui está!
A função zeta de Euler, está estreitamente relacionada com os números
78
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
primos, de�nida para qualquer s > 1 é dada por
ζ(s) = 1 +1
2s+
1
3s+
1
4s+ . . .+ =
∞∑n=1
1
ns
Euler calculou de forma engenhosa os valores de ζ(s) para s par. Anos mais
tarde, Bernard Riemann (1826-1866), estudando esta função substituiu a var-
iável real s por uma variável complexa e obteve mais resultados extraordinários,
sendo que um deles conhecido por hipótese de Riemann é um problema aberto
e um grande desa�o para os matemáticos deste século.
Neste capítulo, apresentaremos algumas técnicas para calcular somatórios,
tais como, o teorema das colunas e das diagonais no triângulo de Pascal, o uso
de derivadas e integrais, uso da função beta, da transformada de Laplace e da
técnica de soma por partes.
5.2 Conceitos e Propriedades
Um somatório é um operador matemático que nos permite representar facil-
mente somas muito grandes ou até in�nitas. É representado com a letra grega
sigma (Σ) e é de�nido por:
n∑i=m
ai = am + am+1 + . . .+ an
A variável i é o índice do somatório que designa um valor inicial chamado
limite inferior, m. A variável i percorre os valores inteiros até alcançar o limite
superior, n. Necessariamente tem-se m ≤ n. Prova-se facilmente que
n∑i=m
(ai + bi) =n∑
i=m
ai +n∑
i=m
bi en∑
i=m
cai = c
n∑i=m
ai
sendo c ∈ R.Em matemática, o conceito de série, ou ainda, série in�nita, surgiu da
tentativa de generalizar o conceito de soma para uma seqüência de in�nitos
termos. Esta generalização, longe de acontecer de forma impune, traz diversas
di�culdades:
79
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
• Nem sempre é possível de�nir um valor resultante da soma para uma
série;
• Não é possível em geral trocar a ordem dos termos da série;
• Algumas séries possuem soma in�nita.
Embora a idéia de soma de in�nitos seja bastante antiga, uma formulação
matemática rigorosa só veio a surgir no século XV III, com o advento da
análise real, que denota e de�ne uma série de termos a1, a2, a3, . . . , da seguinte
forma:∞∑n=1
an := limN→∞
N∑n=1
an
Se o limite acima existe, dizemos que a série é convergente, caso contrário,
dizemos que ela é divergente. Existem vários testes sobre convergência de
séries numéricas, tais como, o teste da comparação, o teste da razão, o teste
da raiz, o teste da integral, etc. Como estamos interessados em obter a soma
de uma série, �ca claro que sua convergência foi garantida por algum teste
citado acima.
5.3 Somatórios Através do Teorema das Colunas
Teorema 5.1 (Teorema das Colunas) A soma dos coe�cientes binomiais
situados na p-ésima coluna até a linha n é igual ao coe�ciente binomial situado
na (n+ 1)-ésima linha e (p+ 1)-ésima coluna, ou seja:(p
p
)+
(p+ 1
p
)+. . .+
(n
p
)=
(n+ 1
p+ 1
)ou
n∑k=p
(k
p
)=
(n+ 1
p+ 1
)(5.1)
Demonstração: Usaremos indução �nita sobre n. Se n = p, temos:(p
p
)= 1 =
(p+ 1
p+ 1
)Suponhamos que
n∑k=p
(k
p
)=
(n+ 1
p+ 1
)(5.2)
80
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Assim,
n+1∑k=p
(k
p
)=
n∑k=p
(k
p
)+
(n+ 1
p+ 1
)=
(n+ 1
p+ 1
)+
(n+ 1
p
)=
(n+ 1
p+ 1
)�
Exemplo 5.1 Calculen∑
k=1
k.
Resolução: Usando o teorema das colunas com p = 1, temos:n∑
k=1
k =n∑
k=1
(k
1
)=
(n+ 1
2
)=
(n+ 1)n
2
Exemplo 5.2 Mostre quen∑
k=1
k2 =n(n+ 1)(2n+ 1)
6.
Resolução: Usando o teorema das colunas com p = 2, segue quen∑
k=2
(k
2
)=
n∑k=2
k(k − 1)
2=
(n+ 1
3
)⇒ 1
2
n∑k=2
k2 − 1
2
n∑k=2
k =
(n+ 1
3
)ou
n∑k=1
k2 =n∑
k=1
k + 2× (n+ 1)n(n− 1)
3!
=n(n+ 1)
2+
(n+ 1)n(n− 1)
3
=n(n+ 1)(2n+ 1)
6
81
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
5.4 A Técnica de Soma Por Partes
No Cálculo Integral, temos várias técnicas para calcular as integrais. Mas
uma das fórmulas mais importantes descoberta por Leibniz é a fórmula de
integração por partes dada por∫ t
s
f(x)g(x)dx = F (t)g(t)− F (s)g(s)−∫ t
s
F (x)g′(x)dx
onde F (x) é uma primitiva de f(x). É interessante observar que existe uma
versão discreta desta fórmula para somatórios.
Teorema 5.2 (Teorema da Soma por Partes) Seja Ak =∑k
j=1 aj. En-
tãon∑
k=1
akbk = Anbn −n−1∑k=1
Ak(bk+1 − bk)
Demonstração: Note que a1 = A1 e para k > 1,
Ak − Ak−1 =k∑
j=1
aj −k−1∑j=1
aj = ak
Assim,n∑
k=1
akbk = a1b1 + a2b2 + . . .+ anbn
= A1b1 + (A2 − A1)b2 + . . .+ (An − An−1)bn
= Anbn − A1(b2 − b1)− . . .− An−1(bn − bn−1)
= Anbn −n−1∑k=1
Ak(bk+1 − bk)
o que conclui a demonstração.
�
Exemplo 5.3 (1978 IMO) Seja n um inteiro positivo e a1, a2, . . . , an uma
sequência de inteiros positivos. Prove quen∑
k=1
akk2
≥n∑
k=1
1
k:= Hn (números harmônicos)
82
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Resolução: De fato, desde que a′js são inteiros positivos distintos, então
Ak := a1 + a2 + . . .+ ak ≥ 1 + 2 + . . .+ k =k(k + 1)
2
Aplicando a técnica de soma por partes, temos:
k2∑k=1
akk2
=An
n2+
n−1∑k=1
Ak
[1
k2− 1
(k + 1)2
]
≥ n(n+ 1)
2n2+
n−1∑k=1
k(k + 1)
2· [ (k + 1)2 − k2
k2(k + 1)2]
=n+ 1
2n+
1
2
n−1∑k=1
2k + 1
k(k + 1)
Usando frações parciais, podemos escrever
2k + 1
k(k + 1)=
1
k+
1
k + 1
Assim,
n∑k=1
akk2
≥ 1
2
[1 +
1
n+
n−1∑k=1
(1
k+
1
k + 1
)]=
1
2
[ n∑k=1
1
k+
n−1∑k=0
1
k + 1
]=
1
2
n∑k=1
1
k+
1
2
n∑j=1
1
j=
n∑k=1
1
k= Hn
Exemplo 5.4 Mostre que a série
∞∑k=1
sin k
k
converge.
Resolução: Seja ak = sin k e bk = 1/k. Usando a identidade trigonométrica
sinm · sin 1
2=
cos(m− 12)− cos(m+ 1
2)
2
83
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
segue que
Ak :=cos(1
2)− cos(3
2)
2 sin 12
+ . . .+cos(k − 1
2)− cos(k + 1
2)
2 sin 12
=cos 1
2− cos(k + 1
2)
2 sin 12
Assim,
|Ak| ≤2
2 sin 12
=1
sin 12
de modo que
limn→∞
Anbn = 0
Aplicando a fórmula de soma por partes, temos:
∞∑k=1
sin k
k= lim
n→∞
n∑k=1
akbk = limn→∞
[Anbn −
n−1∑k=1
Ak(bk+1 − bk)
]
= limn→∞
[Anbn −
n−1∑k=1
Ak(1
k− 1
k + 1)
]
= limn→∞
[An
n+
An−1
n− 1− An
n+
n−1∑k=1
Ak
(1k− 1
k + 1
)]donde segue que
∞∑k=1
sin k
k=
∞∑k=1
Ak(1
k− 1
k + 1)
Desde que
∞∑k=1
∣∣∣∣Ak
(1
k− 1
k + 1
)∣∣∣∣ = ∞∑k=1
|Ak| ·(1
k− 1
k + 1
)≤ 1
sin 12
∞∑k=1
(1
k− 1
k + 1
)=
1
sin 12
a série converge.
84
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
5.5 A Notação de Iverson Para Somatórios
O matemático Kenneth E. Iverson criou uma notação que denota 1 se a
condição entre colchetes P é satisfeita e 0, caso contrário. Matemáticamente,
temos
[P ] =
1, se P é verdadeira
0, se P é falsa
Alguns casos particulares desta notação são muitos utilizados; por exemplo,
se A for um conjunto, então [x ∈ A] é a função característica ou indicadora
do conjunto A que também é denotada por IA. Se i e j são números naturais,
então [i = j] é simplesmente δij (delta de Kronecker) . A aplicação imediata da
notação de Iverson é no cálculo de somatórios. Por exemplo, podemos escrever
n∑i=1
f(i) =∑i
[1 ≤ i ≤ n]f(i)
sendo o somatório à direita uma série em que há somente um número �nito de
termos não-nulos. Com esta notação, podemos fazer muitas coisas de forma
muito mais simples.
Exemplo 5.5 Use a notação de Iverson e calcule o somatório
n∑k=1
(−1)kk
Resolução: Analisando a paridade de n, obtemos
n∑k=1
(−1)k =(−1)n − 1
2
85
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Assim,
n∑k=1
(−1)kk =n∑
k=1
(−1)kk∑
j=1
1 =n∑
k=1
k∑j=1
(−1)k
=n∑
k=1
[1 ≤ j ≤ k](−1)k =∑j,k
[1 ≤ k ≤ n][1 ≤ j ≤ k](−1)k
=∑j,k
[1 ≤ j ≤ k ≤ n](−1)k =∑j,k
[1 ≤ j ≤ n][j ≤ k ≤ n](−1)k
=∑j
[1 ≤ j ≤ n]1
2[(−1)n − (−1)j−1] =
1
2
n∑j=1
[(−1)n + (−1)j]
=1
2
n∑j=1
(−1)n +1
2
n∑j=1
(−1)j =1
2(−1)nn+
1
2· (−1)n − 1
2
=2n(−1)n + (−1)n − 1
4=
(−1)n(2n+ 1)− 1
4
Exemplo 5.6 Seja f(i, j) uma função de�nida em N2. Prove que
n∑i=1
n∑j=1
f(i, j) =n∑
j=1
j∑i=1
f(i, j)
Resolução: Analisando a �gura abaixo, temos:
n∑j=1
( j∑i=1
f(i, j)
)=
n∑i=1
n∑j=1
f(i, j)
Através da notação de Iverson, provamos esta identidade do seguinte modo:
n∑i=1
n∑j=1
f(i, j) =∑i,j
[1 ≤ i ≤ n][1 ≤ j ≤ n]f(i, j) =∑i,j
[1 ≤ i ≤ j ≤ n]f(i, j)
=∑i,j
[1 ≤ i ≤ j][1 ≤ j ≤ n]f(i, j) =n∑
j=1
j∑i=1
f(i, j)
Exemplo 5.7 Calcule a soman∑
k=1
k2k.
86
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Resolução: Note que k2k = 2k + 2k + . . .+ 2k =k∑
j=1
2k.
Assim,
n∑k=1
k2k =n∑
k=1
k∑j=1
2k =∑j,k
[1 ≤ k ≤ n][1 ≤ j ≤ k]2k
=∑j,k
[1 ≤ j ≤ k ≤ n]2k =∑j,k
[1 ≤ j ≤ n][j ≤ k ≤ n]2k
=∑j,k
[1 ≤ j ≤ n](2n+1 − 2j) =n∑
j=1
(2n+1 − 2j)
= n2n+1 − (2n−1 − 2) = (n− 1)2n+1 + 2
O exemplo anterior ilustra uma técnica semelhante usada em integrais duplas,
em que trocamos o ordem de integração para simpli�car os cálculos. Vejamos
uma situação concreta em que o cálculo do somatório é facilitado com o a uso
da notação de Iverson.
Exemplo 5.8 Suponhamos que temos um algoritmo que calcula o valor de
f(k) em um tempo que é o valor aproximado por falta de√k. Quanto tempo
demorará esse algoritmo a tabelar os valores de f entre 1 e n?
Resolução: Note que ⌊6, 7⌋ = 6, 0 =6∑
j=1
1 =∑j
[1 ≤ j ≤ 6]. Assim, em
geral,
⌊p⌋ =∑j
[1 ≤ j ≤ p]
87
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Para o nosso problema, o tempo total T é dado por:
T =n∑
k=1
⌊√k⌋ =
∑k
[1 ≤ k ≤ n]⌊√k⌋
=∑j,k
[1 ≤ k ≤ n][1 ≤ j ≤√k] =
∑j,k
[1 ≤ j ≤√k ≤
√n]
=∑j,k
[1 ≤ j ≤√n][j2 ≤ k ≤ n] =
∑j
[1 ≤ j ≤√n](n+ 1− j2)
ou seja,
T =∑j
[1 ≤ j ≤√n](n+ 1)−
∑j
[1 ≤ j ≤√n]j2
= (n+ 1)⌊√n⌋ −
√n∑
j=1
j2 = (n+ 1)⌊√n⌋ −
√n(√n+ 1)(2
√n+ 1)
6
5.6 Usando Derivadas Para Calcular Somatórios
Uma das séries mais importantes na Matemática é a série geométrica dada por
1
1− x= 1 + x+ x2 + . . . =
∞∑k=0
xk para | x |< 1 (5.3)
Esta série in�nita é a PG cuja razão x ∈ (−1, 1). Dentro do intervalo
de convergência de uma série in�nita podemos derivar ou integrar termo a
termo, que obteremos uma série convergente. Usando esta propriedade, iremos
calcular a soma de algumas séries numéricas.
Exemplo 5.9 Calcule a soma da série numérica
∞∑n=1
n
2n
Resolução: Seja
f(x) =1
1− x=
∞∑n=0
= xn
88
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Derivando ambos os lados desta expressão, temos
f ′(x) =1
(1− x)2=
∞∑n=1
nxn−1 para | x |< 1
Multiplicando por x, segue que
x
(1− x)2=
∞∑n=1
nxn
Fazendo x = 1/2, nesta expressão, obtemos
∞∑n=1
n
2n=
1/2
(1− 1/2)2= 2
Exemplo 5.10 Mostre que
n∑k=2
(k
2
)(n
k
)=
(n
2
)2n−2
Resolução: Seja
f(x) = (x+ 1)n =n∑
k=0
(n
k
)xk
e
g(x) = f ′′(x) = n(n−1)(x+1)n−2 =n∑
k=2
k(k−1)
(n
k
)xk−2 = 2
n∑k=2
(k
2
)(n
k
)xk−2
Note que
g(1) = n(n− 1)2n−2 = 2n∑
k=2
(k
2
)(n
k
)donde segue que
n∑k=2
(k
2
)(n
k
)=
n(n− 1)
22n−2 =
(n
2
)2n−2
Observação 5.1 Este resultado pode ser generalizado, ou seja,
n∑k=p
(k
p
)(n
k
)=
(n
p
)2n−p
89
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
De fato, derivando p vezes (p ≥ 1) a função
f(x) = (x+ 1)n =n∑
k=0
xk
obtemos f (p)(x) = n(n − 1) . . . (n − p + 1)xn−p =(np
)p!(1 + x)n−p. Por outro
lado,
f (p)(x) =d
dxp
[ n∑k=0
(n
k
)xk
]=
n∑k=p
(n
k
)k(k−1) . . . (k−p+1)xk−p =
n∑k=p
(n
k
)(k
p
)p!xk−p
Fazendo x = 1 nas duas expressões segue o resultado.
Exemplo 5.11 Mostre que a soma alternada dos n primeiros inteiros posi-
tivos ao quadrado é dada por
n∑k=1
(−1)kk2 =(−1)nn(n+ 1)
2
Seja
f(x) =n∑
k=0
xk = 1 + x+ x2 + . . .+ xn
Para x ̸= 1, temos:
f(x) =(1 + x+ x2 + . . .+ xn)(x− 1)
x− 1=
xn+1 − 1
x− 1
Derivando f(x), obtemos:
f ′(x) =(n+ 1)xn
x− 1− xn+1 − 1
(x− 1)2⇒ (5.4)
f ′′(x) =(n+ 1)nxn−1(x− 1)− (n+ 1)xn · 1
(x− 1)2− (n+ 1)xn(x− 1)2 − (xn+1 − 1)2(x− 1)
(x− 1)4
=(n+ 1)nxn−1
x− 1− (n+ 1)xn
(x− 1)2+
2(xn+1 − 1)
(x− 1)3− (n+ 1)xn
(x− 1)2
=(n+ 1)nxn−1
x− 1− 2(n+ 1)xn
(x− 1)2+
2(xn+1 − 1)
(x− 1)3
90
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Fazendo x = −1 na expressão acima, segue que
f ′′(−1) =(n+ 1)n(−1)n
2− (n+ 1)(−1)n
2− (−1)n+1 − 1
4
=(−1)n(n2 − 1)
2+
(−1)n
4+
1
4=
(−1)n(2n2 − 1) + 1
4
(5.5)
Mas,
f ′′(x) =n∑
k=2
k(k − 1)xk−2 ⇒ f ′′(−1) =∞∑k=2
k(k − 1)(−1)k (5.6)
Comparando (5.5) e (5.6), temos:
∞∑k=2
[(−1)kk2 − (−1)kk] =(−1)n(2n2 − 1) + 1
4⇒
−1 +∞∑k=2
(−1)kk2 = −1 +n∑
k=2
(−1)kk +(−1)n(2n2 − 1) + 1
4⇒
n∑k=1
(−1)kk2 =(2n+ 1)(−1)n − 1
4+
(2n2 − 1)(−1)n + 1
4=
(−1)nn(n+ 1)
2
5.7 Usando Integrais Para Calcular Somatórios
Alguns somatórios e séries convergentes podem ser resolvidos usando ade-
quadamente uma integral de�nida de 0 a 1. Especi�camente, usaremos o fato
que ∫ 1
0
xndx =1
n+ 1para n ̸= 1
Além disso, estamos admitindo que a permutação entre integrais e séries seja
permitida. O primeiro exemplo é uma série alternada que relaciona o inverso
dos números ímpares com π/4, descoberta pelo matemático G. W. Leibniz
(1646-1716).
Exemplo 5.12 Mostre que
∞∑k=0
(−1)k
2k + 1=
π
4
91
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Resolução:
∞∑n=0
(−1)n
2n+ 1=
∞∑n=0
(−1)n∫ 1
0
x2ndx =
∫ 1
0
∞∑n=0
(−1)nx2ndx
=
∫ 1
0
∞∑n=0
(−x2)ndx =
∫ 1
0
1
1 + x2dx = arctanx
]10
=π
4
Exemplo 5.13 Prove que
n∑k=0
(nk
)k + p+ 1
=
∫ 1
0
xp(1 + x)ndx, p > 0
Resolução: De fato,
n∑k=0
(nk
)k + p+ 1
=n∑
k=0
(n
k
)∫ 1
0
xk+pdx =
∫ 1
0
n∑k=0
(n
k
)xk+pdx
=
∫ 1
0
xp
n∑k=0
(n
k
)xk1n−kdx =
∫ 1
0
xp(1 + x)ndx
Exemplo 5.14 Calcule o somatório
n∑k=0
(−1)k
k + 1
(n
k
)Resolução:
n∑k=0
(−1)k
k + 1
(n
k
)=
n∑k=0
(−1)k(n
k
)∫ 1
0
xkdx =
∫ 1
0
n∑k=0
(n
k
)(−1)kxkdx
=
∫ 1
0
n∑k=0
(n
k
)(−x)kdx =
∫ 1
0
(1− x)ndx = −(1− x)n+1
n+ 1
]10
=1
n+ 1
5.7.1 Uma Identidade Entre Séries e Integrais
Sejam m ∈ N∗, a, b ∈ N com a < b. A série numérica
∞∑k=0
1
(mk + a)(mk + b)
92
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
é convergente. De fato,
1
(mk + a)(mk + b)≤ 1
m2k2≤ 1
k2
e a série∞∑k=1
1
k2= ζ(2). Além disso, é válida a seguinte proposição:
Proposição 5.1 Sejam a, b e m dados acima. Então
∞∑k=0
1
(mk + a)(mk + b)=
1
b− a
∫ 1
0
xa−1 − xb−1
1− xmdx
Demonstração: Usando frações parciais, temos:
1
(mk + a)(mk + b)=
A
mk + a+
B
mk + b⇒ A =
1
b− ae B = − 1
b− a
Assim,
∞∑k=0
1
(mk + a)(mk + b)=
1
b− a
∞∑k=0
1
mk + a− 1
b− a
∞∑k=0
1
mk + b(5.7)
Mas,1
mk + a=
∫ 1
0
xmk+a−1dx (5.8)
e1
mk + b=
∫ 1
0
xmk+b−1dx (5.9)
Substituindo (5.9), (5.8) em (5.7), segue que
∞∑k=0
1
(mk + a)(mk + b)=
1
b− a
[∫ 1
0
xa−1
∞∑k=0
xmkdx−∫ 1
0
xb−1
∞∑k=0
xmkdx
]=
1
b− a
[∫ 1
0
xa−1
1− xmdx−
∫ 1
0
xb−1
1− xmdx
]=
1
b− a
∫ 1
0
xa−1 − xb−1
1− xmdx
�
93
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Exemplo 5.15 Mostre que
∞∑k=0
1
(2k + 1)(2k + 2)= ln 2
Resolução: Usando a Prop. (5.1) com m = 2, a = 1 e b = 2, segue que
∞∑k=0
1
(2k + 1)(2k + 2)=
1
2− 1
∫ 1
0
(x1−1 − x2−1)
1− x2dx =
∫ 1
0
1
1 + x= ln 2
Exemplo 5.16 Veri�que a identidade∫ 1
0
dx
1 + x+ x2 + x3=
∞∑k=0
1
(4k + 1)(4k + 2)
Resolução: De fato, usando a Prop. (5.1) com m = 4, a = 1 e b = 2, temos:
∞∑k=0
1
(4k + 1)(4k + 2)=
∫ 1
0
x1−1 − x2−1
1− x4dx =
∫ 1
0
1
1 + x+ x2 + x3dx
5.8 Somatórios Através das Funções Beta e Gama
De�nição 5.1 A função beta é de�nida por
B(m,n) =
∫ 1
0
xm−1(1− x)n−1dx
sendo m e n reais positivos.
Outra função relacionada com a função beta é a função gama.
De�nição 5.2 A função gama é de�nida por:
Γ(x) =
∫ ∞
0
e−ttx−1dt para x > 0
Fazendo a mudança de variável x = sin2 θ na função beta, obtemos:
B(m,n) =
∫ π/2
0
sin2m−2 θ cos2n−2 θ·2 sin θ cos θdθ = 2
∫ π/2
0
sin2m−1 θ cos2n−1 θdθ
94
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Teorema 5.3
Γ(x+ 1) = xΓ(x) para x > 0
Demonstração: Note que
Γ(x+ 1) =
∫ ∞
0
txe−tdt = limb→∞
∫ b
0
txe−tdt (5.10)
Fazendo u = tx ⇒ du = xtx−1dt e dv = e−tdt ⇒ v = −e−t e
integrando por partes, temos:∫ b
0
txe−tdt = −txe−x
]b0
−∫ b
0
−e−txtx−1dt = x
∫ b
0
tx−1e−tdt (5.11)
Substituindo (5.11) em (5.10), segue que
Γ(x+ 1) = limb→∞
x
∫ b
0
txe−tdt = xΓ(x)
�
Corolário 5.1 Γ(n+ 1) = n!, para n ∈ N.
Demonstração: Pelo teorema anterior, tem-se:
Γ(0 + 1) = Γ(1) = 1
Γ(1 + 1) = Γ(2) = 1 · Γ(1)...
......
Γ(n+ 1) = Γ(n+ 1) = nΓ(n)
Multiplicando todos os termos membro a membro, temos:
Γ(1) · Γ(2) · Γ(3) · . . . · Γ(n)Γ(n+ 1) = 1 · 1Γ(1) · 2Γ(2) · . . . · nΓ(n) ⇒
Γ(n+ 1) = 1 · 2 · 3 · . . . · n = n!
Por esta razão que Γ(n) também recebe o nome de função fatorial.
Observação 5.2 Segue diretamente do Teorema (5.3) que Γ(x) = (x−1)Γ(x−1). Esta relação é muito útil para cálculos de valores da função gama para
números fracionários.
95
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Uma expressão muito útil relacionando as funções beta e gama é dada no
seguinte teorema:
Teorema 5.4 Para m > 0 e n > 0, temos
B(m,n) =Γ(m)Γ(n)
Γ(m+ n)
Demonstração: Seja u = x/(1 − x) na de�nição de função beta. Deste
modo,
x =u
1 + ue
du
dx=
1 · (1− x)− x(−1)
(1− x)2⇒ dx = (1− x)2du =
du
(1 + u)2
Assim,
B(m,n) =
∫ 1
0
xm−1(1−x)n−1dx =
∫ ∞
0
(u
1 + u
)m−1(1
1 + u
)n−1du
(1 + u)2⇒
B(m,n) =
∫ ∞
0
um−1
(1 + u)m+ndu (5.12)
Por outro lado, fazendo a mudança de variável, s = pt na integral abaixo,
temos:∫ ∞
0
e−pttx−1dt =
∫ ∞
0
e−s
(s
p
)x−1ds
p=
1
px
∫ ∞
0
e−ssx−1ds =Γ(x)
px(5.13)
Desta expressão, segue que
1
(1 + u)m+n=
1
Γ(m+ n)
∫ ∞
0
e−(1+u)ttm+n−1dt (5.14)
Substituindo (5.14) em (5.12), obtemos:
B(m,n) =
∫ ∞
0
um−1
Γ(m+ n)du
∫ ∞
0
e−(1+u)ttm+n−1dt
=1
Γ(m+ n)
∫ ∞
0
e−ttm+n−1dt ·∫ ∞
0
e−utum−1du
Usando a expressão (5.13) na segunda integral acima, segue que
B(m,n) =1
Γ(m+ n)
∫ ∞
0
e−ttm+n−1dt·Γ(m)
tm=
Γ(m)
Γ(m+ n)
∫ ∞
0
e−ttn−1dt =Γ(m)Γ(n)
Γ(m+ n)
96
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
�Vejamos agora aplicações destas funções no cálculo de somatórios e soma
de séries convergentes.
Exemplo 5.17 Mostre que
∞∑k=0
(k+bn−1
)(k+bn
)(k+1+b
n
) =
(b
n
)−1
Resolução: Usando a de�nição de coe�ciente binomial, temos:
∞∑k=0
(k+bn−1
)(k+bn
)(k+1+b
n
) =∞∑k=0
(k + b)!
(k + b− n+ 1)!(n− 1)!
(k + b)!(k + b+ 1)!
n!(k + b− n)!n!(k + b+ 1− n)
=∞∑k=0
(n!)2(k + b− n!)
(k + b+ 1)!(n− 1)!= n
∞∑k=0
n!(k + b− n)!
(k + b+ 1)!
Usando o Corolário (5.1) e o Teorema (5.4), segue que
∞∑k=0
(k+bn−1
)(k+bn
)(k+1+b
n
) = n∞∑k=0
Γ(n+ 1)Γ(k + b− n+ 1)
Γ(k + b+ 2)
= n
∞∑k=0
B(k + b− n+ 1, n+ 1) = n
∞∑k=0
∫ 1
0
xk+b−n(1− x)ndx
= n
∫ 1
0
xb−n(1− x)n∞∑k=0
xkdx = n
∫ 1
0
xb−n (1− x)n
1− xdx
= n
∫ 1
0
xb−n(1− x)n−1dx = nB(b− n+ 1, n) =n(b− n)!(n− 1)!
b!
=1
b!
n!(b− n)!
=
(b
n
)−1
Exemplo 5.18 Mostre que
∞∑n=1
(−1)n−1
n2n(2nn
) =ln 2
3
97
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Resolução: Usando novamente a de�nição de coe�ciente binomial, temos:
∞∑n=1
(−1)n−1
n2n(2nn
) = −∞∑n=1
n!n!(−1)n
n2n(2n)!= −
∞∑n=1
n!(n− 1)!
(2n)!
(−1
2
)n
= −∞∑n=1
Γ(n+ 1)Γ(n)
Γ(2n+ 1)
(−1
2
)n
= −∞∑n=1
B(n+ 1, n)
(−1
2
)n
= −∞∑n=1
∫ 1
0
xn(1− x)n−1
(−1
2
)n
dx = −∫ 1
0
1
1− x
∞∑n=1
[x(1− x)(−1)
2
]n
= −∫ 1
0
1
1− x
∞∑n=1
(x2 − x
2
)n
dx = −∫ 1
0
1
1− x
[1
1− (x2 − x)/2− 1
]dx
= −∫ 1
0
1
1− x· x2 − x
2 + x− x2dx = −
∫ 1
0
xdx
(x+ 1)(x+ 2)
= −1
3
[2
∫ 1
0
dx
x− 2+
∫ 1
0
dx
x+ 1
]= −2
3ln |x− 2|
]10
−1
3ln |x+ 1|
]10
=2
3ln 2− 1
3ln 2 =
ln 2
3
Exemplo 5.19 Calcule:∞∑k=0
1
(2k + 1)(2kk
)Resolução:
∞∑k=0
1
(2k + 1)(2kk
) =∞∑k=0
(k!)2
(2k + 1)!=
∞∑k=0
Γ(k + 1)Γ(k + 1)
Γ(2k + 2)
=∞∑k=0
B(k + 1, k + 1) =∞∑k=0
∫ 1
0
xk(1− x)kdx =
∫ 1
0
∞∑k=0
(x− x2)kdx
=
∫ 1
0
1
1− x+ x2dx =
∫ 1
0
dx(x− 1
2
)2+ 3
4
dx
=
∫ 1/2
−1/2
du
u2 + 34
= 2
∫ 1/2
0
du
u2 + 34
Fazendo a mudança de variável u =√32tan θ, segue o resultado.
98
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
5.9 Somatórios Através da Transformada de Laplace
De�nição 5.3 A transformada de Laplace é de�nida por
F (s) = L{f(t)} =
∫ ∞
0
e−stf(t)dt
Um resultado clássico a�rma que se a função f é contínua por partes e de
ordem exponencial, então existe sua transformada de Laplace. Através dela,
iremos transformar o cálculo da soma de uma série em uma integral imprópria
através do seguinte teorema:
Teorema 5.5 Se f(t) = L−1{F (n)}. Então,∞∑n=0
F (n) =
∫ ∞
0
f(t)
1− e−tdt =
∫ ∞
0
etf(t)
et − 1dt
Demonstração: De fato,
∞∑n=0
F (n) =∞∑n=0
L{f(t)} =∞∑n=0
∫ ∞
0
e−ntf(t)dt
=
∫ ∞
0
∞∑n=0
e−ntf(t)dt =
∫ ∞
0
f(t)∞∑n=0
(e−t)ndt
=
∫ ∞
0
f(t)
1− e−tdt =
∫ ∞
0
etf(t)
et − 1dt
donde segue o resultado. Na penúltima passagem usamos a soma de uma série
geométrica de razão e−t.
�
Proposição 5.2 Sendo L{e−bt} = 1/(s+ b) para s > b, então para a ̸= 0,
L−1
{1
as+ b
}=
1
ae−bt/a
Demonstração: De fato,
L
{1
ae−bt/a
}=
1
aL{e−bt/a} =
1
a· 1
s+ b/a=
1
as+ b
donde segue o resultado.
99
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Exemplo 5.20 Mostre que
∞∑n=0
1
(3n+ 1)(3n+ 2)=
π
3√3
Resolução: Usando frações parciais, temos:
1
(3n+ 1)(3n+ 2)=
A
3n+ 1+
B
3n+ 2⇒ 1 = A(3n+ 2) +B(3n+ 1)
Para n = −1/3 ⇒ A = 1 e para n = −2/3 ⇒ B = −1. Assim,
F (n) =1
3n+ 1− 1
3n+ 2⇒ f(t) = L−1
{1
3n+ 1
}+L−1
{1
3n+ 2
}=
1
3e−t/3−1
3e−2t/3
pela Proposição (5.2). Assim, pelo Teorema (5.5), temos:
∞∑n=0
1
(3n+ 1)(3n+ 2)=
1
3
∫ ∞
0
et(e−t/3 − e−2t/3)
et − 1dt
=1
3
∫ ∞
0
et/3(et/3 − 1)
et − 1dt =
∫ ∞
1
du
u2 + u+ 1
A última passagem foi obtida fazendo a mudança de variáveis u = et/3. Com-
pletando quadrados, podemos escrever a última integral na forma
∞∑n=0
1
(3n+ 1)(3n+ 2)= 4
∫ ∞
1
du
(2u+ 1)2 + 3=
4
3
∫ ∞
1
du(2u+ 1√
3
)2
+ 1
Fazendo v =2u+ 1√
3, segue que
∞∑n=0
1
(3n+ 1)(3n+ 2)=
2√3
∫ ∞
√3
dv
v2 + 1=
π
3√3
Exemplo 5.21 Calcule a soma da série
∞∑n=1
(−1)n+1
n
100
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Resolução: Neste caso, usaremos diretamente a transformada de Laplace.
Note que1
n=
∫ ∞
0
e−ntdt
Assim,
∞∑n=1
(−1)n+1
n=
∞∑n=1
∫ ∞
0
(−1)n+1e−ntdt = −∫ ∞
0
∞∑n=1
(−e−t)ndt
= −∫ ∞
0
(−e−t)
1 + e−tdt = − ln(1 + e−t)
]∞0
= ln 2
Exemplo 5.22 Calcule a soma da série
∞∑n=0
1
(4n+ 1)(4n+ 2)
Resolução: Usando frações parciais, temos:
1
(4n+ 1)(4n+ 2)=
A
4n+ 1+
B
4n+ 2⇒ A = 1, B = −1
Assim,
f(t) = L−1
{1
4n+ 1− 1
4n+ 2
}=
1
4(e−t/4 − e−t/2)
Usando o Teorema (5.5), segue que
∞∑n=0
1
(4n+ 1)(4n+ 2)=
1
4
∫ ∞
0
et(e−t/4 − e−t/2)
et − 1dt
=1
4
∫ ∞
0
(e3t/4 − et/2)
et − 1dt =
1
4
∫ ∞
0
et/2(et/4 − 1)
et − 1dt
A seguir, faz-se a mudança de variável u = et/4 na última integral, du =
et/4dt/4, de modo que:
∞∑n=0
1
(4n+ 1)(4n+ 2)=
1
4
∫ ∞
1
u(u− 1)
(u2 − 1)(u2 + 1)du =
∫ ∞
1
u
(u+ 1)(u2 + 1)du
Novamente usando frações parciais, escrevemos
u
(u+ 1)(u2 + 1)=
A
u+ 1+
Bu+ C
u2 + 1⇒ u = A(u2 + 1) + (Bu+ C)(u+ 1)
101
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Para u = −1, temos A = −1/2, para u = 0, temos C = 1/2 e �nalmente para
u = 1, obtemos B = 1/2. Assim,
∞∑n=0
1
(4n+ 1)(4n+ 2)= −1
2
∫ ∞
1
du
1 + u+
1
2
∫ ∞
1
udu
u2 + 1+
1
2
∫ ∞
1
du
u2 + 1
=1
4ln(u2 + 1)
]∞1
−2
4ln(u+ 1)
]∞1
+1
2arctanu
]∞1
=1
4ln
[u2 + 1
(u+ 1)2
]∞1
+1
2
(π
2− π
4
)=
1
4ln
[1 + 1/u2
1 + 2/u+ 1/u2
]∞1
+π
8=
ln 2
4+
π
8
Exemplo 5.23 Vimos na Introdução que para p > 0,
ζ(p) =∞∑n=1
1
np
Mostre que
ζ(p) =1
Γ(p)
∫ ∞
0
tp−1dt
et − 1
Resolução: Note que se f(t) = tm, então L{tm} =m!
sm+1, de modo que
F (n) := L
{tp−1
(p− 1)!
}=
1
np
Assim,
ζ(p) =∞∑n=1
1
np=
∞∑n=1
L
{tp−1
(p− 1)!
}=
∞∑n=1
1
(p− 1)!
∫ ∞
0
e−nttp−1dt =1
Γ(p)
∫ ∞
0
tp−1
∞∑n=1
e−ntdt
=1
Γ(p)
∫ ∞
0
tp−1 e−t
1− e−tdt =
1
Γ(p)
∫ ∞
0
tp−1dt
et − 1
Observação 5.3 Em 1734, Leonhard Euler provou que ζ(2) = π2/6. Por-
tanto, ∫ ∞
0
t
et − 1dt = Γ(2)ζ(2) =
π2
6
102
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Exemplo 5.24 Mostre que
∞∑n=0
1
(n+ 1)(n+ 2)= 1
Resolução:
10 modo: Seja
Sn =n∑
k=0
1
(k + 1)(k + 2)=
n∑k=0
(1
k + 1− 1
k + 2
)= 1− 1
n+ 2
pois trata-se de uma soma telescópica. Logo,
∞∑n=0
1
(n+ 1)(n+ 2)= lim
n→∞Sn = lim
n→∞
(1− 1
n+ 2
)= 1
20 modo: Usando frações parciais, temos:
f(t) = L−1
{1
n+ 1
}− L−1
{1
n+ 2
}= e−t − e−2t
=
∫ ∞
0
et(e−t − e−2t)
et − 1dt =
∫ ∞
0
1− e−t
et − 1dt =
∫ ∞
0
et − 1
et(et − 1)dt
=
∫ ∞
0
e−tdt = L{1}∣∣∣∣s=1
= 1
5.10 Somatórios Através das Funções Geradoras
Podemos usar as funções geradoras para calcular o valor numérico de uma
série convergente. Para isto, veremos a proposição sobre a convergência de
uma série numérica.
Proposição 5.3 Se a série numérica∑
an converge, então lim an = 0.
Demonstração: Considere a sequência das somas parciais Sn =n∑
k=0
ak.
Assim,
limn→∞
an = limn→∞
(Sn+1 − Sn) = limn→∞
Sn+1 − limn→∞
Sn = 0− 0 = 0
103
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Observação 5.4 Podemos interpretar esta Proposição do seguinte modo, con-
hecido por teste da divergência: "Se o termo geral de uma série numérica não
converge para zero, então a série diverge". Baseado neste teste, é fácil ver que
a série∞∑n=1
sin(nπ/2) diverge.
O estudo da convergência de séries numéricas é tratado em um curso de
Séries In�nitas, e por isso, não irei entrar em detalhes sobre este assunto. É
interessante citar a importância dos testes da razão e da raiz para a análise
da convergência de uma série numérica. Além disso, dentro do intervalo de
convergência de uma série de potências, podemos derivar ou integrar termo a
termo que a série resultante continua convergente.
Nos exemplos abaixo, usaremos as funções geradoras para calcular a soma
de algumas séries numéricas, supondo que a convergência está garantida por
algum dos métodos comentados acima.
Exemplo 5.25 Calcule a soma∞∑n=0
n
2n.
Resolução: Seja an = n. Pelo Exemplo (4.7) anterior, vimos que
A(x) =∞∑n=0
nxn =x
(1− x)2
Como x = 1/2, pertence ao domínio D(A) então,
∞∑n=0
n
2n= A(1/2) =
1/2
(1− 1/2)2=
1/2
1/4= 2
5.11 Exercícios Propostos
1. Use o Teorema das Colunas e calcule:
(a)n∑
k=1
k(k + 1)
(b)n∑
k=1
k(k − 1)(k − 2)
104
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
2. Use o fato que k2 = k(k − 1) + k e mostre que
n∑k=0
k2
(n
k
)= 2n−2(n+ 1)n
3. Use a técnica de derivada �nita e calcule os somatórios abaixo:
(a)n∑
k=1
(−1)kk2 R :(−1)nn(n+ 1)
2
(b)n∑
k=1
1
4kR :
4
3− 1
34n
(c)n∑
k=6
k2 R :1
6(2n3 + 3n2 + n− 330)
(d)n∑
k=1
1
(k + 1)(k + 2)R :
n
2(n+ 2)
(e)n∑
k=1
kk! R : (n+ 1)!− 1
(f)n∑
k=0
cos(kπ) R : [1− (−1)n]/2
4. Use a técnica de integração e calcule o somatório
n∑k=1
(n
k
)1
k + 1
R: (2n+1 − n− 2)/(n+ 1)
5. Use a Prop. (5.1) e calcule:
(a)∞∑n=0
1
(2n+ 1)(2n+ 3)R: 1/2
(b)∞∑k=0
1
(2k + 1)(2k + 3)(2k + 5)R: 1/12
6. Use transformadas de Laplace e calcule:
105
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
(a)∞∑n=0
1
(n+ 1)(n+ 2)R : 1
(b)∞∑n=1
1
(n+ 2)(n+ 4)R : 7/24
(c)∞∑n=0
1
(n+ 1)(n+ 3)R : 3/4
(d)∞∑n=1
1
(n+ 1)(n+ 4)R : 13/36
(e)∞∑n=0
1
(n+ 1)(n+ 2)(n+ 3)R : 1/4
(f)∞∑n=0
1
(n+ 1)(2n+ 1)R : 2 ln 2
(g)∞∑n=0
1
(3n+ 1)(3n+ 2)R :
π
3√3
(h)∞∑n=0
1
(2n+ 1)(2n+ 2)R : ln 2
(i)∞∑n=0
1
(4n+ 1)(4n+ 2)R : π/8 + (ln 2)/4
7. Use a transformada de Laplace da função f(t) ≡ 1 e mostre que
∞∑n=0
(−1)n+1
n(n+ 2)=
1
4
106
Capítulo 6
Apêndices
6.1 A Hipótese de Riemann: Um Problema de
um Milhão de Dólares
6.1.1 Introdução
Figura 6.1: Bernhard Rie-
mann
Em agosto de 1900, o grande matemático David
Hilbert inaugurou o Congresso Internacional de
Matemática realizado em Paris, apresentando
uma lista de 23 problemas que, segundo ele, di-
tariam o rumo dos exploradores matemáticos do
século XX. De todos os desa�os lançados por
Hilbert, o oitavo tinha algo de especial. Há um
mito alemão sobre Frederico Barba-Ruiva, um
imperador muito querido que morreu durante
a Terceira Cruzada. Segundo a lenda, Barba-
Ruiva ainda estaria vivo, adormecido em uma
caverna nas montanhas Ky�hauser, e só desper-
taria quando a Alemanha precisasse dele. Conta-
se que alguém perguntou a Hilbert: "E se, como
Barba-Ruiva, você pudesse acordar 500 anos, o
que faria?"Hilbert respondeu: Eu lhe perguntaria: "Alguém conseguiu provar
107
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
a hipótese de Riemann?"
Os matemáticos sabem que a prova da hipótese de Riemann terá um sig-
ni�cado muito maior para o futuro da matemática do que saber se a equação
de Fermat tem ou não tem soluções. Este problema matemático, procura com-
preender os objetos mais fundamentais da matemática - os números primos.
A busca pela origem secreta dos primos já dura mais de dois mil anos. At-
ualmente, é oferecida uma recompensa de um milhão de dólares para a solução
da hipótese de Riemann. Em 1997, Andrew Wiles recebeu 75 mil marcos por
sua prova do último teorema de Fermat, graças a um prêmio oferecido por
Paul Wolfskehl em 1908.
Durante gerações, os matemáticos estiveram obcecados pela tentativa de
prever a localização precisa do próximo número primo, produzindo fórmulas
que gerassem esses números. Por exemplo, em 1772, Euler observou que a
expressão p(n) = n2 + n+ 41, produz números primos para 0 ≤ n ≤ 39. Carl
F. Gauss, teve uma ideia inovadora e deparou com uma espécie de padrão ao
fazer uma pergunta mais ampla buscando descobrir a quantidade de primos
entre um e um milhão em vez de localizar os primos com precisão. Apesar
da importância dessa descoberta, Gauss não a revelou a ninguém, mas um de
seus alunos, Riemann, foi quem realmente desatou toda a força das harmonias
ocultas por trás da cacofonia desses números.
O pai de Riemann, que era o pastor de Quickoborn, tinha muitas expecta-
tivas em relação ao �lho. Embora Bernhard Riemann fosse infeliz na escola,
trabalhava �rme e era muito dedicado a não decepcionar seu pai. Porém, tinha
de lutar contra um perfeccionismo quase incapacitante. Schumalfuss foi quem
encontrou uma maneira de animar o jovem a explorar sua obsessão pela per-
feição, oferecendo a Riemann sua biblioteca, com uma ótima coleção de livros
de matemática, onde o rapaz poderia escapar das pressões sociais dos colegas.
A família de Riemann era pobre, e o pai de Bernhard esperava que o �lho tam-
bém entrasse na vida clerical, o que lhe faria uma fonte de renda regular com a
qual poderia sustentar suas irmãs. A única universidade do Reino de Hanover
que oferece a cátedra de teologia - a Universidade de Göttingen - não era um
desses novos estabelecimentos, havendo sido fundada mais de um século antes,
em 1734. Assim, atendendo aos desejos de seu pai, Riemann rumou, em 1846,
108
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
para a úmida Göttingen.
Em 1859, George F. B. Riemann, com 32 anos, foi eleito para a Academia
de Ciências de Berlim. Como regra desta instituição, os novos membros deviam
fazer um relatório sobre o assunto que estava pesquisando. O seu relatório era
curto (foi publicado com 8 páginas) e tinha por título Sobre a quantidade de
número primos que não excedem uma grandeza dada. Essas oito páginas de
densa matemática foram as únicas que Riemann publicou, em toda sua vida,
sobre os números primos, mas o artigo teria um efeito fundamental sobre a
maneira como eram percebidos. Escondido neste documento de oito páginas,
estava declarado o problema cuja solução possui hoje uma etiqueta com o valor
de um milhão de dólares: a hipótese de Riemann.
Apesar de sua relevância, temos uma escassa literatura em língua por-
tuguesa sobre o assunto. O presente trabalho é uma pequena contribuição
para aqueles que tenham interesse, ou mesmo curiosidade a respeito da função
zeta de Riemann, e não tenham acesso à literatura estrangeira.
6.1.2 A Função Zeta de Euler
Para compreender o problema, convém recuar a 1650, ano em que foi publicado
o livro Novae quadraturae arithmeticae seu se additione fractionum, de Pietro
Mengoli. É um sobre somas de séries, duas das quais são
ζ(1) = 1 +1
2+
1
3+
1
4+ . . .
e
ζ(2) = 1 +1
22+
1
32+
1
42+ . . .
É aí demonstrado que a primeira (a série harmônica) diverge e o autor levanta
o problema de saber qual é a soma da segunda. Este problema foi novamente
levantado por Jacques Bernoulli em 1689. Três anos mais tarde, o mesmo
Jacques Bernoulli começa a estudar as séries
ζ(s) = 1 +1
2s+
1
3s+
1
4s+ . . .
para s ∈ N− {1}.
109
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Figura 6.2: Leonhard
Euler
Em 1735, Euler provou que a soma da série
acima para s = 2 é π2/6 e, pouco tempo depois,
mostrou que
ζ(2n) =(2π)2n
2(2n)!|B2n|, n = 1, 2, . . .
onde Bk são os números de Bernoulli de�nidos como
os coe�cientes da expansão de Taylor da função
t/(et − 1), isto é,
t
et − 1=
∞∑k=0
Bk
k!tk
Os primeiros números de Bernoulli são
B0 = 1, B1 = −1
2, B2 =
1
6, B3 = 0, B4 = − 1
30, . . .
Uma questão ainda em aberto é se o mesmo é verdadeiro quando o argu-
mento de ζ é um inteiro positivo ímpar. Por exemplo, será que ζ(3) é propor-
cional a π3?. Em 1978, R. Apéry provou que ζ(3) é pelo menos irracional. Nos
pontos ímpares negativos o valor da função zeta também pode ser expresso em
termos dos números de Bernoulli, a saber
ζ(1− 2n) = −B2n
2n, n = 1, 2, . . .
Usando o teste da razão, vemos que se s > 1 a série
ζ(s) =∞∑n=1
1
ns
é convergente.
De�nição 6.1 Seja s > 1. A função zeta de Euler é de�nida por:
ζ(s) =∞∑n=1
1
ns
110
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
A função zeta de Euler também pode ser expressa através de uma integral
imprópria dada na proposição seguinte:
Proposição 6.1 Se ζ(s) é a função zeta de Euler, então
ζ(s) =1
Γ(s)
∫ ∞
0
ts−1
et − 1dt
Demonstração: Note que se f(t) = tm, m ∈ N, então L{tm}(p) = m!
pm+1, de
modo que:
L
{ts−1
(s− 1)!
}=
1
ns
de modo que
ζ(s) =∞∑n=1
1
ns=
∞∑n=1
L
{ts−1
(s− 1)!
}=
∞∑n=1
1
(s− 1)!
∫ ∞
0
e−ntts−1dt
=1
Γ(s)
∫ ∞
0
ts−1
∞∑n=1
e−ntdt =1
Γ(s)
∫ ∞
0
ts−1e−t
1− e−tdt =
1
Γ(s)
∫ ∞
0
ts−1
et − 1dt
�A conexão entre a função zeta de Euler e os números primos é dado pela
seguinte proposição:
Proposição 6.2 (Produto de Euler) Se s > 1, então
∞∑n=1
1
ns=
∏p primo
1
1− 1ps
(6.1)
Demonstração: Seguindo as ideias de Euler para provar esta identidade,
notamos que1
1− x= 1 + x+ x2 + . . .
para |x| < 1. Logo, para cada p, temos
1
1− 1/ps= 1 +
1
ps+
1
p2s+ . . .
111
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Assim,
∞∏p primo
k=1
1
1− 1psk
=1
1− 1ps1
· 1
1− 1ps2
· 1
1− 1ps3
. . .
=∞∑k=0
1
ps1·
∞∑k=0
1
ps2·
∞∑k=0
1
ps3. . .
=
(1 +
1
ps1+
1
p2s1
)·(1 +
1
ps2+
1
p2s2
). . .
= 1 +∑1≤i
1
psi+
∑1≤i≤j
1
psipsj
+∑
1≤i≤j≤k
1
psipsjp
sk
+ . . .
= 1 +1
2s+
1
3s+ . . .+
1
ns+ . . . =
∞∑n=1
1
ns
�A última expressão foi obtida lembrando que cada inteiro n > 1 é ex-
presso de modo único como produto de potências de diferentes primos. Além
disso, esta proposição mostra que há uma relação entre a função ζ de Euler
e a distribuição dos números primos. Usando sua função, Euler deduziu dois
resultados importantes que apresentaremos a seguir.
Corolário 6.1 (Euclides) Existem in�nitos números primos.
Demonstração: Se houvesse um número �nito de primos, então o produto
do segundo membro de (6.1) seria um produto �nito e teria evidentemente um
valor �nito, de modo que a série do primeiro membro também seria �nita para
todo s > 0. Entretanto, a expressão do primeiro membro de (6.1) para s = 1
é a série harmônica
1 +1
2+
1
3+ . . .
que diverge pelo teste da integral. Logo, existem in�nitos primos.
�Na proposição a seguir, provaremos que a série dos inversos dos primos
diverge. Mas antes, veremos o lema seguinte:
112
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Lema 6.1 Para x ∈ [−1/2, 0), vale a desigualdade:
2x < ln(1 + x)
Demonstração: Seja f(x) = ln(1 + x) − 2x para x ∈ [−1/2, 0]. Note que
f(−1/2) = 1− ln 2 > 0 e f(0) = 0. Como
f ′(x) =1
1 + x− 2 ⇒ f ′′(x) = − 1
(1 + x)2< 0
para todo x ∈ R−{−1}. Assim, f é côncava para baixo, de modo que f(x) > 0
para x ∈ [−1/2, 0), donde segue o resultado.
�
Proposição 6.3 A série dos inversos dos primos diverge, ou seja:
+∞∑n=1
1
pn=
1
2+
1
3+
1
5+
1
7+
1
11+ . . . = +∞ (6.2)
Demonstração: A prova de (6.2) é semelhante a apresentada na Prop. (6.2),
tomando s = 1, ou seja,
1
1− 12
· 1
1− 13
· 1
1− 15
. . .1
1− 1pn
=∑
fp's ≤ pn
1
k(6.3)
Como todo inteiro maior que 1 expressa-se de modo único como produto de
potências de primos diferentes, o produto das séries geométricas acima repre-
senta a série dos inversos de todos os inteiros positivos cujos fatores primos
113
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
são menores ou iguais a pn. Em particular, vemos que
∑fp's ≤ pn
1
k≥
pn∑k=1
1
k(6.4)
Substituindo (6.4) em (6.3), temos:
1
1− 12
· 1
1− 13
· 1
1− 15
. . .1
1− 1pn
≥pn∑k=1
1
k(6.5)
Considere agora a função f(x) = 1/x para x ∈ [1, pn] representada no grá�co
abaixo:
Temos a seguinte desigualdade para a área aproximada:
Sn = (2− 1) · 1 + (3− 2) · 12+ (4− 3) · 1
3+ . . .+ (pn − pn + 1)
1
p− n
= 1 +1
2+
1
3+ . . .+
1
pn=
pn∑k=1
1
k>
∫ pn
1
1
xdx = ln pn
(6.6)
Substituindo (6.6) em (6.5), segue que
1(1− 1
2
)(1− 1
3
)(1− 1
5
). . .
(1− 1
pn
) > ln pn ⇒
(1− 1
2
)(1− 1
3
)(1− 1
5
). . .
(1− 1
pn
)<
1
ln pn(6.7)
Aplicando o logaritmo em ambos os lados de (6.7), temos
ln
(1− 1
2
)+ ln
(1− 1
3
)+ ln
(1− 1
5
)+ . . .+ ln
(1− 1
pn
)< ln ln p−1
n ⇒
114
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
n∑k=1
ln
(1− 1
pk
)< − ln ln pn (6.8)
Sendo pk ≥ 2, então −1/pk ≥ −1/2 para k ∈ N∗. Do Lema (6.1), segue
que
− 2
pk< ln
(1− 1
pk
)⇒
−2n∑
k=1
1
pk<
n∑k=1
ln
(1− 1
pk
)(6.9)
De (6.8) e (6.9), concluímos quen∑
k=1
1
pk>
1
2ln ln pn → +∞ quando n → +∞
Para ver isso, seja f(x) = ln ln x, para x > 1. Como f ′(x) = 1/(x ln x) > 0,
segue que f é crescente neste intervalo, de modo que limn→+∞
ln ln pn = +∞.
�
Observação 6.1 Viggo Brun, em 1919, demonstrou que a série dos recípro-
cos dos primos gêmeos converge. Esta série gera o número denominado de
constante de Brun.
B2 =
(1
3+
1
5
)+
(1
5+
1
7
)+
(1
11+
1
13
)+
(1
17+
1
19
)+
(1
29+
1
31
)+ · · ·
≈ 1, 9021605823
O teorema de Brun a�rma que mesmo que existam in�nitos termos nesta soma,
a série resultante é ainda assim convergente.
Há outras ligações da função zeta com à Teoria dos Números. Por exemplo,
se s > 1, então
ζ(s)2 =∞∑n=1
d(n)
ns,
onde d(n) é o número de divisores de n. Além disso, se s > 2, então
ζ(s)ζ(s− 1) =∞∑n=1
σ(n)
ns
onde σ(n) é a soma dos divisores de n.
115
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
6.1.3 O Teorema dos Números Primos
Ao perceberem das limitações de descobrir uma fórmula que gerasse o enésimo
número primo, os matemáticos voltaram-se para a estratégia de pesquisar sobre
a distribuição média dos primos ao longo dos números naturais.
De�nição 6.2 Para cada x ∈ R, de�nimos a função π(x) como sendo a quan-
tidade de números primos menores ou iguais a x, ou seja:
π(x) = quantidade de primos ≤ x
Figura 6.3: Carl F.
Gauss
O matemático francês Legendre, após um exame
árduo de uma tabela contendo um grande número
de primos observou que aparentemente se tem
π(x) ≈ x
lnx(6.10)
querendo isto dizer que o quociente das duas
funções tende para 1 quando x tende para +∞.
Pela mesma altura, Gauss com apenas 15 ou 16
anos de idade também conjecturou que se tem
(6.10), mas também fez a conjectura
π(x) ≈∫ x
2
1
ln tdt
Proposição 6.4 As conjecturas de Legendre e Gauss são equivalentes, ou
seja:
limx→+∞
xlnx∫ x
21ln t
dt= 1
Demonstração: Usando a regra de L'Hospital, temos:
limx→+∞
xlnx∫ x
21ln t
dt= lim
x→+∞
(lnx−1ln2 x
)1
lnx
= limx→+∞
lnx− 1
ln x= lim
x→+∞
(1− 1
ln x
)= 1
�No entanto,
∫ x
21/ ln tdt é uma melhor aproximação de π(x) do que x/ lnx
como se pode ver no grá�co abaixo. Esta �gura também sugere que π(x) é
116
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Figura 6.4: Grá�cos de π(x) (vermelho),∫ x
21/ ln tdt (verde), e x/ ln x (azul).
sempre maior do que x/ ln x e que a diferença vai aumentando à medida que
x cresce. Isto levou Legendre a conjecturar, em 1800, que uma função que
aproxima π(x) ainda melhor do que x/ ln x é
x
ln x− 1.08366
Gauss não publicou nada sobre este tópico, o que se sabe sobre as observações
dele sobre o assunto vem nas suas cartas pessoais e no seu diário. No en-
tanto, nem mesmo o grande Gauss conseguiu provar sua conjectura. Esforços
matemáticos foram feitos no sentido de que em 1848, o matemático russo
Chebyshev demonstrou que
0, 89×∫ x
2
1
ln tdt < π(x) < 1, 11×
∫ x
2
1
ln tdt
Em 1896, os matemáticos, Jacques Hadamard e De La Vallée Poussin,
trabalhando independentemente e baseando-se nos escritos de Riemann, con-
seguiram �nalmente demonstrar que
limx→+∞
π(x)
x/ ln x= 1
Este resultado passou a ser conhecido por Teorema dos Números Primos.
117
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Figura 6.5: Matemáticos que provaram a conjectura de Legendre-Gauss
6.1.4 A Função Zeta de Riemann
Riemann estendeu a de�nição da função Zeta de Euler para os números com-
plexos. Escrevendo s = σ + it, temos que:
|ns| = |es lnn| = |e(σ+it) lnn| = |eσ lnn| · |eit lnn| = |eσ lnn| = nσ
Usando este resultado, juntamente com o teste M de Weierstrass, segue-se que
a função zeta de Riemann dada por∞∑n=1
1
ns
é analítica para Re(s) > 1. Podemos estender a analiticidade de ζ, para
−1 < Re(s) < 1 e também para todo o plano complexo, exceto no ponto
z = 1, onde ocorre o único pólo da função ζ, como ilustrado na �gura abaixo.
A Proposição (6.1), apresentada anteriormente para a função zeta de Euler
também é válida para a função zeta de Riemann, ou seja:
Proposição 6.5 Seja s ∈ C. Se Re(s) > 1, então
ζ(s) =1
Γ(s)
∫ ∞
0
ts−1
et − 1dt (6.11)
onde Γ(z) é a função gama de Euler , de�nida por
Γ(s) =
∫ ∞
0
e−tts−1dt
118
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Figura 6.6: Grá�co da função |ζ(s)| para s ∈ C.
A prova desta Proposição pode ser encontrada em [13]. A expressão (6.11)
é conhecida por representação integral da função zeta de Riemann. Usando a
Prop. (6.4) é possível estender a função zeta de Riemann para−1 < Re(s) < 1,
obtendo a expressão
ζ(s) =1
Γ(s)
[∫ 1
0
(1
et − 1− 1
t+
1
2
)ts−1dt− 1
2s+
∫ ∞
1
(1
et − 1− 1
t
)ts−1
]Para maiores detalhes, consulte [13]. Além disso, notamos um aparente prob-
lema no ponto s = 0 o qual pode ser resolvido da seguinte forma: Sendo
Γ(s+ 1) = sΓ(s), então:1
2sΓ(s)=
1
2Γ(s+ 1)
obtendo 1/2 no ponto s = 0. Portanto, a função ζ está de�nida e é analítica
na faixa −1 < Re(s) < 1, com um pólo simples em s = 1.
A expressão a seguir válida para s ̸= 1 é uma relação de fundamental im-
portância na teoria da função zeta de Riemann cuja prova pode ser encontrada
em [15].
119
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Proposição 6.6 Se s ∈ C− {1}, então
ζ(s) = 2(2π)s−1ζ(1− s)Γ(1− s) sin(πs
2)
6.1.5 A Conjectura ou Hipótese de Riemann
Figura 6.7: Faixa crítica
A famosa conjectura ou hipotese de Rie-
mann está relacionada com os zeros da função
ζ. Os zeros da função zeta localizados em
zn = −2n, n = 1, 2, . . . são chamados zeros
triviais. Aquele grande matemático a�rmou
que a função ζ tem in�nitos zeros na faixa
0 ≤ Re(s) ≤ 1, conhecida por faixa crítica.
Jacques Hadamard foi o primeiro a provar
esta a�rmação, em 1893.
Uma das mais famosas questões em aberto
da Matemática é a hipótese de Riemann so-
bre os zeros não triviais da função zeta. A
hipótese de Riemann estabelece que todos os
in�nitos zeros da função ζ, pertencentes a faixa crítica 0 ≤ Re(s) ≤ 1, estão
sobre a reta Re(s) = 1/2, que é chamada de reta crítica . Desta forma, os
zeros não triviais da função ζ, de acordo com a conjectura de Riemann, são
in�nitos e da forma s = 1/2+ iσ, com σ real. Até o momento, nenhuma prova
foi apresentada para esta conjectura. Este problema não um tipo de problema
que pode ser abordado por métodos elementares. Já deu origem a uma extensa
e complicada bibliogra�a.
Riemann enunciou, também sem provar, a seguinte fórmula assintótica para
o número N(T ) de zeros da faixa crítica, 0 ≤ Re(s) ≤ 1, 0 < Im(s) ≤ T ,
N(T ) =1
2πT lnT − 1 + ln(2π)
2πT +O(lnT )
Uma prova rigorosa desta fórmula foi dada, pela primeira vez, por H. V. Man-
goldt em 1905 e pode ser vista em [15]. Nove anos mais tarde, G. H. Hardy
provou que existe uma in�nidade de zeros sobre a reta Re(s) = 1/2. Mas, uma
120
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
in�nidade não signi�ca que são todos. É interessante notar que se a parte real
de s é igual a 1, então a função ζ de Riemann não admite nenhum zero sobre
esta linha. Para ver uma prova deste fato, veja [15].
E. C. Titchmarsh mostrou em 1935 − 1936, que há 1041 zeros na região
0 ≤ Re(s) ≤ 1 e 0 < Im(s) < 1468. Todos estes zeros estão sobre a reta
crítica Re(s) = 1/2. Com o auxílio de supercomputadores, veri�cou que os
primeiros 10 trilhões de zeros estão sobre a linha crítica, sugerindo portanto,
que a hipótese deve ser realmente verdadeira.
Figura 6.8: Zeros da função
zeta sobre a linha crítica
Os matemáticos se referem ao problema de
Riemann como uma hipótese, e não como uma
conjectura, pela existência de muitos resulta-
dos que dependem de sua solução. A palavra
"hipótese" tem uma conotação muito mais
forte, pois representa uma premissa necessária
que o matemático aceita para poder con-
struir uma teoria. Uma "conjectura", por
outro lado, representa apenas uma previsão
do matemático sobre o modo como o mundo
se comporta. Muitas pessoas tiveram de as-
sumir sua incapacidade de resolver o enigma
de Riemann e decidiram adotar sua previsão
como uma hipótese de trabalho. Se alguém
conseguir transformar a hipótese em teorema,
todos esses resultados pendentes serão validados. (A Música dos Números Pri-
mos, pp 19).
É natural nesta fase ocorrer uma pergunta. O que é que tudo isto tem a
ver com o teorema dos números primos?
Para ver a relação entre as duas coisas, considere a função µ de�nida abaixo:
De�nição 6.3 A função de Möbius µ : N → {−1, 0, 1} é de�nida por:µ(n) = 0 se n for múltiplo de algum quadrado perfeito maior do que 1;
µ(n) = 1 se n possui um número par de fatores primos;
µ(n) = −1 se n possui um número ímpar de fatores primos.
121
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Figura 6.9: ζ(1/2 + it), para 0 < t < 50
Seja também a função logaritmo integral de�nida por:
De�nição 6.4 Para x ∈ (1,+∞), de�nimos a função logaritmo integral:
Li(x) =
∫ x
0
∫ x
0
1
ln tdt = lim
s→0+
(∫ 1−ϵ
0
1
ln tdt+
∫ x
1+ϵ
1
ln tdt
)Riemann conjecturou que
Li(x)− 1
2Li(
√x)− 1
3Li( 3
√x)− 1
5Li( 5
√x) +
1
6Li( 6
√x) + . . . =
∞∑n=1
µ(n)
nLi( n
√x)
(6.12)
seria uma excelente aproximação de π(x). Empiricamente isto é plausível; por
exemplo, se n ≤ 1.000.000, então a diferença entre π(n) e a soma dos quatro
primeiros termos não nulos da série (6.12) não excede 37. Convém ressaltar
que existe uma relação direta entre a função de Möbius e a função ζ: se s ∈ Ce se Re(s) > 1, então
1
ζ(s)=
∞∑n=1
µ(n)
ns
6.1.6 Problemas Relacionados
1. Condensados de Bose-Einstein
122
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
Os Condensados de Bose-Einstein (BECs) são nuvens de átomos ultra-
frios, com temperaturas próximas ao zero absoluto que se comportam
como um único e gigantesco objeto cujo comportamento só é conhecido
com a interpretação quântica, pois é um objeto de natureza quântica.
Este fenômeno foi teorizado nos anos 20 por Albert Einstein, ao gener-
alizar o trabalho de Satyendra Nath Bose sobre a mecânica estatística dos
Fótons (sem massa) para átomos (com massa). Einstein especulou que
arrefecendo os átomos bosónicos até temperaturas muito baixas os faria
colapsar (ou "condensar") para o mais baixo estado quântico acessível,
resultando numa nova forma de matéria.
Esta transição ocorre abaixo de uma temperatura crítica, a qual, para
um gás tridimensional uniforme consistindo de partículas não-interativas
e sem graus internos de liberdade aparentes, é dada por:
Tc =
(n
ζ(3/2)
)2/3h2
2πmkB
onde:
• Tc é a temperatura crítica,
• n a densidade da partícula,
• m a massa do bóson,
• h a constante de Planck,
• kB a constante de Boltzmann, e
• ζ a função zeta de Riemann, sendo ζ(3/2) ≃ 2, 6124.
2. Sistemas Dinâmicos, Caos, Probabidade e Estatística
As estatísticas dos zeros da função zeta de Riemann é um assunto in-
teressante devido a sua ligação com a hipótese de Riemann e com a
distribução dos números primos. Os pesquisadores descobriram que esta
hipótese também está relacionada com a teoria de matrizes aleatórias
e o caos quântico. Por exemplo, M. Berry apontou que as correlações
entre os zeros de ζ(s) são como as correlações entre os níveis de energia
123
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
de um sistema quântico caótico. Além disso, a regularização da função
zeta de Riemann é usada para regularizar séries divergentes que surgem
na Teoria Quântica de Campos. Num exemplo notável, a função zeta
de Riemann surge explicitamente no cálculo do efeito Casimir (Atração
entre duas pequenas placas metálicas que estão muito próximas entre si,
da ordem de vários diâmetros atômicos).
3. A Diferença Entre Primos Gêmeos
Outra questão envolvendo a hipótese de Riemann é referente aos números
primos consecutivos. Se pk denota o k−ésimo número primo (de modo
que p1 = 2, p2 = 3, p3 = 5 e assim por diante), um resultado provado por
Cramer em 1919 estabelece que a diferença entre dois números primos
consecutivos, pk+1 − pk, cresce "na mesma velocidade"que√pk ln(pk).
Mais especi�camente, existe uma constante real positiva M > 0 de modo
que vale a desigualdade
pk+1 − pk < M√pk ln(pk)
para todo k su�cientemente grande. Para provar este resultado, Cramer
utilizou crucialmente a Hipótese de Riemann, de maneira que este resul-
tado pode em princípio ser falso, caso a Hipótese também seja.
4. A Hipótese de Riemann e a Internet
Não é fácil elaborar um sistema de criptogra�a seguro na era dos su-
percomputadores. Contudo, os cientistas R. Rivest, A. Shamir e L.
Adleman, desenvolveram um criptosistema de chave pública, denominado
"RSA", que tem se mostrado inviolável. Esse criptosistema depende do
conhecimento matemático dos números primos e suas propriedades.
A pesquisa sobre a Hipótese de Riemann fornece informações tão pre-
ciosas, sobre o padrão dos números primos, que avanços nessa investi-
gação poderiam nos levar a um progresso substancial nas técnicas de
fatoração e, conseqüentemente, levar à quebra da segurança na trans-
missão de dados via Internet.
124
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
5. Palavras Finais
Tudo que foi comentado anteriormente explica porque a hipótese de Rie-
mann é uma problema em aberto tão famoso. Este problema desde de sua
formulação tem captado a imaginação de alguns dos maiores matemáti-
cos do mundo. Andre Weil, matemático inglês fascinado pela hipótese de
Riemann, declarou certa vez numa entrevista que, durante muito tempo
�cou obcecado em demonstrá-la e publicá-la em 1959, no centenário da
publicação da hipótese. Mas aquele ano passou sem que ele tivesse tido
sucesso. Depois, a sua ambição �cou apenas em compreender a demon-
stração quando alguém a publicasse. Perto do �m da vida, desejava
somente que a demonstração fosse feita enquanto ele estivesse vivo, mas
nem essa ambição foi satisfeita. Convém dizer que uma conjectura formu-
lada por Weil sobre os zeros de certas funções de uma variável complexa
análoga à hipótese de Riemann foi demonstrada por Pierre Deligne em
1974.
Em maio de 2000, o Clay Mathematics Institute (CMI) - ONG norte-
americana que desenvolve e dissemina conhecimentos matemáticos - ofer-
eceu sete prêmios no valor de um milhão de dólares cada. Para receber
a bolada, basta solucionar um dos problemas de matemática propostos.
Mas a riqueza não vem fácil; os problemas são considerados por um
comitê de matemáticos como os mais complicados e mais importantes
desta área em nossos dias. Esta lista com 7 problemas extremamentes
difíceis, contém a hipótese de Riemann e conjectura de Poincaré que foi
resolvida pelo matemático russo Grigory Perelmann, o qual recusou o
prêmio de 1 milhão de dólares.
A comunidade matemática está esperando surgir outro Grigori para solu-
cionar o enigma de Hipótese de Riemann.
6.2 Explorando a Torre de Hanói
125
Índice Remissivo
algoritmo, 87
antiderivada �nita, 19
Brook Taylor, 7
cálculo de diferenças �nitas, 7
coe�ciente binomial, 97
convolução, 33
David Hilbert, 107
delta de Kronecker, 85
derivada, 88
discriminante, 58
Einstein
condensados de Bose, 122
equações de diferenças �nitas, 52
escala, 73
Euclides, 112
existência da TDDL, 26
frações parciais, 83, 93, 100
função
beta, 94
característica, 85
gama, 94
gama de Euler, 118
zeta, 78
zeta de Euler, 111
fatorial, 95
zeta de Riemann, 118
funções
geradoras, 68
hipótese de Riemann, 79, 108
identidade, 92
indução �nita, 80
integral, 91
integral imprópria, 99
Leibniz, 91
Leonhard Euler, 78, 102, 108
linearidade
das funções geradoras, 72
linearidade
da transformada discreta de Laplace,
27
mudança de escala
na transformada discreta de Laplace,
33
multiplicação por n na TDDL, 30
multiplicação por r−an na TDDL, 29
números de Bernoulli, 110
números harmônicos, 82
notação de Iverson, 85
126
Tópicos de Matemática Discreta Paulo S. C. Lino
operador
diferença, 7
translação, 8
operador antidiferença, 19
pi, 91
polinômio
fatorial, 16
primos gêmeos, 115
problema de valor inicial, 75
produto de Euler, 111
PVI, 52
raízes complexas, 62
raízes reais
distintas, 58
repetidas, 60
recorrências, 24
regra de Leibniz, 72
relação de Stifel, 11, 32
reta crítica, 120
série geométrica, 28, 70, 88
série in�nita, 79
sequência
de Pell, 59
delta, 44
Sistemas de Diferenças Finitas Lineares,
65
soma por partes, 82
somas parciais, 103
somatórios, 79
teorema
das colunas, 80
teorema do valor inicial e �nal, 27
teorema dos números primos, 116
transformada
discreta, 25
transformada de Laplace, 99
transformada discreta inversa de Laplace,
41
transformada discreta inversa de laplace,
41
translação, 74
translação
na TDDL, 28
127
Referências Bibliográ�cas
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[2] Mathematical Excalibur, Vol 11. January, February, 2007.
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University of Pensilvânia. 1994.
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[21] http:// pt.wikipedia.org/wiki/Condensado-de-Bose-Einstein.
Acessado em 05/05/2012.
[22] http://pt.wikipedia.org/wiki/Série-dos-inversos-dos-primos.
Acessado em 05/05/2012.
129
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