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Pneumonia por Staphylococcus aureus resistente à meticilina comunitário (CA-MRSA): relato de caso Autores: Matheus Cordeiro Marchiotti; Guilherme de Almeida Costa; Ricardo Beneti; Alexandre Martins Portelinha Filho INTRODUÇÃO O Staphylococcus pertence à família Micrococaccea, possui células esféricas, são gram-positivas, que podem ser encontradas isoladas ou em pares e em grupamentos irregulares. São imóveis, não esporuladas e anaeróbia facultativa 1 . O Gênero Staphylococcus é composto por 35 espécies, contudo apenas oito são de importância médica. Pode-se dividir as espécies de importância médica em dois subgrupos, o Staphylococcus aureus (coagulase positiva) e as outras sete espécies (coagulase negativa) 1 . O Staphylococcus aureus (S. aureus) Resistente à meticilina (MRSA) é um grave problema de saúde pública. Segundo Mejía, MRSA foi isolado em 45% das cepas de S. aureus de hospitais terciários na

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Pneumonia por Staphylococcus aureus resistente à meticilina comunitário (CA-MRSA): relato de caso

Autores: Matheus Cordeiro Marchiotti; Guilherme de Almeida Costa; Ricardo Beneti; Alexandre Martins Portelinha Filho

INTRODUÇÃO

O Staphylococcus pertence à família Micrococaccea, possui células esféricas, são gram-positivas, que podem ser encontradas isoladas ou em pares e em grupamentos irregulares. São imóveis, não esporuladas e anaeróbia facultativa1.

O Gênero Staphylococcus é composto por 35 espécies, contudo apenas oito são de importância médica. Pode-se dividir as espécies de importância médica em dois subgrupos, o Staphylococcus aureus (coagulase positiva) e as outras sete espécies (coagulase negativa)1.

O Staphylococcus aureus (S. aureus) Resistente à meticilina (MRSA) é um grave problema de saúde pública. Segundo Mejía, MRSA foi isolado em 45% das cepas de S. aureus de hospitais terciários na Colômbia, 28% nos hospitais do Equador, 62% no Peru e 26% na Venezuela2.

O Staphylococcus aureus pode ser classificado de acordo com a resistência aos antibióticos: sensível à meticilina (MSSA), resistente à meticilina hospitalar (HA-MRSA), S. aureus resistente à meticilina comunitário (CA-MRSA)3, sensibilidade intermediária à Vancomicina (GISA), ou resistente aos glicopeptídeos (GRSA)4. O S. aureus resistente à meticilina pode ser dividido em: hospitalar (HA-MRSA) e comunitário (CA-MRSA)3.

De acordo com o Center for Control and Disease Prevention (CDC) para se classificar uma infecção por CA-MRSA é necessário preencher os

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seguintes critérios: 1) Cultura positiva para MRSA colhida no máximo em 48 horas de admissão hospitalar. 2) Paciente sem dispositivos hospitalares de longa permanência. 3) Não pode haver história prévia de infecção por MRSA. 4) Sem passado de hospitalização recente ou residente em casas de saúde4.

Existem alguns fatores de risco para o desenvolvimento de CA-MRSA, como o uso prévio de antibióticos, pacientes usuários de drogas intravenosas, indivíduos vindo de sistema carcerário, fumantes, portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica e esportistas5-6-7.

A infecção por S. aureus resistente à meticilina comunitário é rara, sendo descrita pela primeira vez em 1993, na Austrália, em populações indígenas locais. Os primeiros relatos na América do Sul foram observados em 2001, no Uruguai. No Brasil os primeiros casos isolados foram identificados em pacientes com furunculose e artrite séptica9.

OBJETIVOS

Demonstrar um caso de Pneumonia por Staphylococcus aureus resistente à meticilina comunitário.

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 22 anos de idade, privado de liberdade, solteiro. Deu entrada no Hospital do Interior do Estado de São Paulo em abril de 2018, com queixa de tosse há 3 semanas, acompanhada de febre, (não aferida), perda de peso de 10 kg no período e hemoptise há 5 dias. Na admissão paciente se encontrava taquipneico, febril (38,5oC), com estertores em base pulmonar bilateral, Glasgow 14 e lesões pustulosas em membro superior esquerdo. Devido à presença de opacidades pulmonares heterogenias na radiografia de tórax (Fig. 1) e à presença de leucocitose com desvio à esquerda (leucócitos: 47.000, bastões: 15% e metamielócitos: 3%), foi solicitado tomografia computadorizada de tórax (Fig. 2 e 3),

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hemocultura, bacterioscopia de escarro e introduzido piperacilina com tazobactan 4,5 gramas via intravenosa de 8 em 8 horas.

(Fig. 1 - Radiografia de Tórax com opacidades pulmonares heterogenias)

A tomografia de tórax demonstrou nódulos de dimensões variadas, a maioria com escavação, levantando a hipótese de embolia séptica e sendo necessária a sua investigação.

(Fig. 2 e 3 – Tomografia exibindo nódulos pulmonares)

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Devido a hipótese de embolia séptica foi associado vancomicina, 1 grama de 12/12hs e, por conta da piora do quadro clínico, encaminhado à unidade de terapia intensiva, na qual permaneceu por 3 dias. O resultado de 3 amostras de hemocultura, apresentou Staphylococcus aureus resistente à oxacilina e sensível a outras classes como: quinolonas, licosaminas e sulfonamidas, confirmando o caso como pneumonia por Staphylococcus aureus resistente à meticilina comunitário (Fig. 4). Três dias após a internação foi feito ecocardiograma trans-esofágico descartando presença de vegetação e possível quadro de endocardite, conferindo o foco primário da infecção à presença de furúnculos no braço esquerdo do paciente. Após 21 dias de antibioticoterapia com vancomicina e melhora do quadro clínico e radiológico (Fig. 5), recebeu alta hospitalar para acompanhamento no ambulatório de Pneumologia. Suas revisões ambulatoriais não apresentaram intercorrências.

(Figura 4- Antibiograma do paciente)

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(Figura 5- Radiografia após tratamento com 21 dias com Vancomicina)

DISCUSSÃO

A infecção por S. aureus resistente à meticilina comunitário é uma entidade rara, contudo, devido ao aumento da resistência bacteriana se torna cada vez mais prevalente nas admissões hospitalares. O agente etiológico tem característica de ser resistente aos beta-lactâmicos e sensível às múltiplas classes de antibióticos, como as quinolonas, sulfonamidas e tetraciclinas, diferente do HA-MRSA, que tem como característica ser resistente a diversas classes de antibióticos10.

Por conta da citocina produzida pela espécie, Panton-valentin-Leukocidin (PVL), que desencadeia uma destruição leucocitária, e uma necrose tecidual, essas infecções tendem a ter um pior prognóstico11. Segundo Correal et. al, 90% das cepas de CA-MRSA produzem a toxina PVL12.

As síndromes infecciosas causadas pelo S. aureus resistente à meticilina comunitário podem ter várias apresentações, desde infecções de pele e partes moles purulentas, até infecções graves como fasceíte necrotizante ou pneumonias12, como descrito no caso acima.

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CONCLUSÃO

A frequência da pneumonia por CA-MRSA em nosso meio é pequena, mas tem aumentado. Por se apresentar com maior frequência nos hospitais, devemos levar em consideração este agente etiológico, sobretudo em pacientes com fatores de risco, como os usuários de drogas injetáveis, os recebidos do sistema carcerário (como neste caso relatado), que não respondem à antibioticoterapia empírica para o tratamento de infecções pulmonares, pacientes com quadro clínico de pneumonia com presença de hemocultura positiva para S. aureus ou infecções do trato respiratório inferior com evolução grave. Este caso revela a importância da identificação do agente etiológico da pneumonia e seus diagnósticos diferenciais.

REFERÊNCIAS

1 - Veronesi R, Focaccia R. Tratado de Infectologia. 5ª ed. São Paulo: Ed Atheneu; 20015.

2 - Mejía, C; Zurita J; Guzman-Blanco M. Epidemiologia e vigilância de Staphylococcus aureus resistente à  meticilina na América Latina. Braz J Infect Dis,  Salvador ,  v. 14, n. 2, p. 79-86,  Dec.  2010 .

3 - Campanile F, Bongiorno D, Borbone S, Stefania S. Hospital Associated methicilin-resistant Staphylococcus auereus (HA-MRSA) in Italy. Ann Clin Microbiol Antimicrob. v. 8 n. 22 p. 1-10, 2009.

4 - Gardete S, Tomasz A. Mechanisms of vancomycin resistance in Staphylococcus aureus. J clinical Invest. v. 124. n. 7 p. 2836-2840 ,2014.

5 - Jalaf MA et al. Methicillin resistant Staphylococcus Aureus in emergency department patients in the United Arab Emirates. BMC Emergency Medicine v.18 n.12. p. 1-4, 2018.

6 - Como-Sabetti KJ et al. Risk factors for community-associated Staphylococcus aureus infections: results from parallel studies including

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methicillin-resistant and methicillin-sensitive S. aureus compared to uninfected controls. Epidemiol Infect v. 139. n. 3. p. 419-429, 2011.

7 - Wooten DA, Winston LG. Risk factors for methicillin-resistant Staphylococcus aureus in patients with community-onsetand hospital-onset pneumonia. Respiratory Medicine

8 - Braun T, Kahanov L. CA-MRSA Infection Rates and Management among Student-Athletes. Medicine & Science in Sports & Exercise. april, 21, 2018.9 - Castro CGC et al. Furúnculo Causado por CA-MRSA - Relato de Caso. SPDTV v.74. n. 1. p. 79-81, 2016.

10 - Cordenação de controle de infecção hospitalar UFRJ. INFECÇÃO POR Staphylococcus aureus. p. 1-7, 2012.

11 - Pham, J, Asif T, Hamarshi MS. Community-acquired Pneumonia with Methicillin-resistant Staphylococcus Aureus in a Patient Admitted to the Intensive Care Unit: A Therapeutic Challenge. Cureus. n.10. v.1 p. 1-7. Jan, 2018.12 - Correal JCD, Marques AE, Guilherme Wl, Leão RS, Damasco PV, Infecções por Staphylococcus aureus: mudança do perfil epidemiológico no Hospital Universitário Pedro Ernesto, Revista HUPE. n.3. v.12. p. 31-46, 2013.