107
VALORES E SENTIDOS ATRIBUÍDOS À PAISAGEM AMBIENTAL URBANA NO PARQUE ECOLÓGICO OLHOS D’ÁGUA, EM BRASÍLIA - DF Danielle Abud Pereira BRASÍLIA, DF 2013 Universidade de Brasília Faculdade de Educação Programa de Pós Graduação em Educação

2013_DanielleAbudPereira

Embed Size (px)

DESCRIPTION

tese mestrado

Citation preview

  • VALORES E SENTIDOS ATRIBUDOS PAISAGEM AMBIENTAL URBANA NO PARQUE ECOLGICO OLHOS

    DGUA, EM BRASLIA - DF

    Danielle Abud Pereira

    BRASLIA, DF

    2013

    Universidade de Braslia Faculdade de Educao

    Programa de Ps Graduao em Educao

  • VALORES E SENTIDOS ATRIBUDOS PAISAGEM AMBIENTAL URBANA NO PARQUE ECOLGICO OLHOS

    DGUA, EM BRASLIA - DF

    Aluna: Danielle Abud Pereira

    Orientadora: Professora Doutora Claudia Mrcia Lyra Pato

    BRASLIA, DF

    Maro de 2013

    Dissertao de Mestrado submetido ao Programa de Ps Graduao em Educao da Universidade de Braslia, como requisito obteno do ttulo de Mestre em Educao, rea de concentrao Ecologia Humana e Educao Ambiental.

    ii

    Universidade de Braslia Faculdade de Educao

    Programa de Ps Graduao em Educao

  • Universidade de Braslia Faculdade de Educao

    Programa de Ps Graduao em Educao

    DISSERTAO DE MESTRADO

    VALORES E SENTIDOS ATRIBUDOS PAISAGEM AMBIENTAL URBANA NO PARQUE ECOLGICO OLHOS DGUA, EM

    BRASLIA - DF

    Danielle Abud Pereira

    Orientadora

    Professora Doutora Claudia Mrcia Lyra Pato

    BANCA EXAMINADORA:

    Professora Doutora Claudia Mrcia Lyra Pato Universidade de Braslia / Faculdade de Educao Presidente

    Professor Doutor Philippe Pomier Layrargues

    Universidade de Braslia / Faculdade de Planaltina

    Professora Doutora Rosngela Azevedo Corra

    Universidade de Braslia /Faculdade de Educao

    Professora Doutora Vera Margarida Lessa Catalo Universidade de Braslia / Faculdade de Educao Suplente

    BRASLIA DF, 2013

    iii

  • DEDICATRIA

    iv

    Aos meus filhos Lucas e Maria Lusa essncias do meu viver e a memria da minha me e do meu av Abud.

  • AGRADECIMENTOS

    Aos meus filhos, pela ausncia fsica de horas divertidas no compartilhadas;

    Ao meu marido, pela compreenso e amor;

    A minha querida tia Albemar por no me deixar desistir, em momento nenhum, dos meus desejos e sonhos;

    Kumiko Mizuta, pelas oportunidades, incentivo e carinho;

    Maria Anglica Quemel, pela reviso dos primeiros ensaios do projeto de pesquisa;

    A professora Vera Catalo, por disciplinas poticas e por emoes compartilhadas;

    As amigas do grupo de pesquisa, em especial Ednalva pelos artigos e amizade construda; e Claudia Moraes pela leitura e contribuies dissertao.

    A professora Rosngela Corra, pelo exemplo de perseverana e dedicao Educao Ambiental.

    A professora Maria Rita Avanzi pelas sugestes e ao professor Philippe Layrargues, pela ateno dispensada ao projeto de qualificao e a indicao valiosa de artigos e livros.

    minha querida orientadora Claudia Pato pelo carinho, pacincia e ensinamentos compartilhados, de forma to generosa, nesses anos de convivncia.

    v

  • vi

    Eu sou eu porque sou, antes de tudo, essncia. E uno, nico, indivisvel. Posso ser copiado, imitado, mas no duplicado em mente e alma. Sou o resultado de meus pais, meus avs, meus ancestrais, todos vivendo dentro de mim e ao mesmo tempo agora. Sou tambm fruto das circunstncias, do impondervel, do ambiente. Das pessoas que me cercam, das com quem me relaciono, das que me do ouvidos e das que me do palavras. Daquelas que ao me encontrarem levam um pouco de mim e deixam um pouco de si. Que me depuram, que me lapidam, que me transformam. Mas certo que so minhas circunstncias posto que posso eleg-las.

    Jos Ortega y Gasset

  • RESUMO

    O estudo dos parques no contexto das cidades descrito por diferentes reas do conhecimento. No entanto, ainda so poucos os ensaios que buscam compreender a relao dos usurios, a partir dos valores pessoais e dos sentidos atribudos a estas paisagens. Considerando a estrutura da relao de valores, com interferncia sobre o comportamento ecolgico das pessoas e a significao dessas reas importante reconhecer e explorar estas dimenses, para compreender as motivaes que levam os indivduos a adotarem uma conduta mais sustentvel com o ambiente. Este estudo pesquisou os valores pessoais e os sentidos dos usurios do Parque Ecolgico Olhos Dgua, em Braslia DF. A adoo do modelo terico de Schwartz conduziu o eixo epistemolgico dessa pesquisa de mtodo misto concomitante, na qual participaram 137 sujeitos na etapa quantitativa e trs na etapa qualitativa (dois comerciantes e um representante da escola - que compem o entorno do Parque). As anlises evidenciaram uma maior concentrao do tipo motivacional benevolncia, o que refora a cultura coletivista dos brasileiros descrita na literatura. Os sentidos atribudos ao Parque apresentam maior frequncia dos sentimentos de bem estar, tranquilidade e paz. As anlises categricas descrevem o valor do Parque sob a perspectiva do valor imobilirio e da relao de uma educao ambiental em um processo de transformao paradigmtica. Os resultados obtidos sugerem o reconhecimento da Educao Ambiental como um pressuposto capaz de mediar a relao dos usurios com o Parque e promover o entendimento e o enfrentamento da complexidade dos conflitos ambientais.

    Palavras-chave: valores pessoais; sentidos; comportamento ecolgico; parques urbanos e educao ambiental.

    vii

  • ABSTRACT

    The study of parks within cities is described by different areas of knowledge. However, there are few trials that seek to understand the relationship of users, from personal values and meanings attributed to these landscapes. Considering

    the structure of the relationship of values with interference on the ecological behavior of people and the significance of these areas is important to recognize and explore these dimensions in order to understand the motivations that lead individuals to adopt a more sustainable behavior to the environment. This study investigated the personal values and senses of users Ecological Park of Olhos Dgua in Brasilia - DF. The adoption of the theoretical model of Schwartz led the axis of this epistemological concomitant mixed method research in which 137 subjects participated in the quantitative phase and three in the qualitative stage (two traders and a representative of the school - that make up the area around the Park). The analyzes showed a higher concentration of benevolence motivational type, which reinforces the collectivist culture of Brazilians described in the literature. The meanings attributed to the Park have a higher frequency of feelings of wellness, tranquility and peace. The categorical analyzes describe the value of the park from the perspective of real estate value and the relationship of environmental education in a process of paradigmatic change. The results suggest the recognition of environmental education as a prerequisite able to mediate the relationship between users and the Park and promote understanding and coping with the complexity of environmental conflicts.

    Keywords: personal values; senses; ecological behavior; urban parks and environmental education.

    viii

  • LISTA DE QUADRO

    Quadro 1 Tipos e objetivos motivacionais dos valores pessoais....................21

    ix

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 Estrutura terica de relao entre valores...........................................22

    Figura 2 - Perspectiva de Superquadras, croquis de Lucio Costa........................45

    Figura 3 - Funo das reas Verdes....................................................................47

    Figura 4 Distribuio de parques no Distrito Federal/Dcada............................52

    Figura 5 Localizao do Parque Ecolgico Olhos dgua.................................55

    Figura 6 - Matriz de mtodo misto........................................................................71

    Figura 7 Representao da estrutura terica dos valores citados pelos

    participantes da pesquisa......................................................................................80

    Figura 8 Sentidos atribudos ao Parque Ecolgico Olhos Dgua.....................81

    Figura 9 Representao da correlao bivariada entre o fator comportamento ecolgico e a varivel idade e pertencimento a ONG ambientalista......................85

    Figura 10 Categorias classificadas pela expresso temtica...........................86

    Figura 11 Sentidos atribudos ao Parque Ecolgico Olhos Dgua...................87

    x

  • LISTA DE TABELA

    Tabela 1 Caracterizao dos Sujeitos da Pesquisa Fase Quantitativa...........64

    Tabela 2 Razes que motivam os usurios a irem ao Parque...........................82

    Tabela 3 Mdia e desvio padro por itens de comportamento ecolgico..........83

    Tabela 4: Cargas fatoriais, comunalidades (h), percentual de varincia e covarincia do fator principal com extrao sobre os itens da Escala de Comportamento Ecolgico ECE.........................................................................84

    xi

  • xii

    SUMRIO

    INTRODUO ...................................................................................................... 14

    CAPTULO 1 CONSTRUO TERICA .......................................................... 18

    1.1 Valores e a sua natureza epistemolgica ........................................................ 18

    1.2 Teoria de Valores de Schwartz ....................................................................... 20

    1.3 A crise ambiental e a emergncia do comportamento ecolgico ................... 24

    1.4 Comportamento Ecolgico .............................................................................. 27

    1.5 O sentido da paisagem ................................................................................... 31

    1.6 Espao e Lugar .............................................................................................. 35

    CAPTULO 2 - PARQUES URBANOS E O DISTRITO FEDERAL ...................... 39

    2.1 Parques Urbanos ............................................................................................ 39

    2.2 Parques urbanos no Brasil .............................................................................. 43

    2.3 O contexto dos Parques no Distrito Federal .................................................... 51

    2.4 Parque Ecolgico Olhos dgua ...................................................................... 54

    2.5. Situao Problema: os diferentes olhares sobre Parque ............................... 58

    CAPTULO 3 METODOLOGIA .......................................................................... 62

    3.1 Descrio do Mtodo ...................................................................................... 62

    3.2 Sujeitos da Pesquisa ....................................................................................... 63

    3.3 Estratgia metodolgica .................................................................................. 65

    3.4 Instrumentos.................................................................................................... 67

    3.5 Procedimentos ................................................................................................ 69

    3.6 Anlises de Dados .......................................................................................... 72

    CAPTULO 4 RESULTADOS ............................................................................ 79

  • xiii

    CAPTULO 5 DISCUSSO ................................................................................ 88

    CONSIDERAES FINAIS .................................................................................. 95

    REFERNCIAS..................................................................................................... 97

    ANEXOS..............................................................................................................105

    ANEXO A - Instrumento adotado na fase quantitativa.........................................105

    ANEXO B - Termo de autorizao da pesquisa...................................................107

  • 14

    INTRODUO

    A natureza nos impe uma dimenso de responsabilidade cada vez

    mais discutimos e rediscutimos sobre o excesso de objetividade que coisifica o

    ambiente e o torna elemento de uma racionalidade econmica. O bem imaterial

    emprega em si um valor que se reveste por vezes, em capital a natureza

    intocada e buclica desempenha, na ps-modernidade, outros papis.

    Assim como as relaes do humano com o ambiente ganham, ao seu

    tempo, diferentes leituras. Algumas recodificadas por modelos enraizados no

    contexto de nossa prpria histria; outras assinaladas por uma relao

    engendrada em novos critrios normativos, de valorizao da natureza e

    proteo do ambiente. Estes caminhos deslocam interesses diversos e

    evidenciam, como descreve Leff (2006, p.226), a incomensurabilidade entre os

    sistemas econmico e ecolgico.

    No contexto das cidades, as reas verdes tambm ganham o seu valor

    a paisagem urbana modificada pelas relaes de uso e ocupao do solo

    tornam estas reas elementos da identidade social e contribuem para

    caracterizar a importncia relativa oferecida pelos indivduos ao ambiente.

    Esta preocupao ambiental pode ser considerada como um fator

    determinante indireto de comportamentos ambientais; assim os aspectos

    relacionados a esta conduta evidenciam motivaes que levam o indivduo a

    agir em defesa do meio ambiente ou de maneira no prejudicial a ele. (PATO,

    2011, p.126).

    De tal modo, as reas verdes, em especial, os parques urbanos se

    apresentam como testemunhos importantes dos valores sociais e culturais das

    populaes urbanas, como ressalta Kliass (2010, p.13). So estas reas

    responsveis por proporcionar espaos para lazer contemplativo, atividades

  • 15

    fsicas e recreativas e ao mesmo tempo manter fragmentos remanescentes de

    vegetao nativa, em meio aos prdios erguidos no contraste da paisagem.

    Da mesma forma em que as reas verdes podem conduzir a

    manifestao de uma maior qualidade de vida e bem estar, estes ambientes

    tambm agregam valor imobilirio paisagem urbana alternando de maneira

    significativa a estrutura de relaes entre valores.

    Portanto, a partir da ambiguidade de valores que podem ser atribudos

    paisagem evidenciamos o contexto dessa pesquisa, que se constri em razo

    de um possvel conflito de interesses motivado pela incorporao de uma rea

    localizada na entrequadra 213/214 norte, contgua ao Parque Ecolgico Olhos

    dgua, em Braslia Distrito Federal, que no Decreto de criao no foi

    anexada poligonal da unidade e por decorrncia desse fato foi posteriormente

    vendida pelo Governo iniciativa particular.

    Os entraves desencadearam o processo de mobilizao social para

    garantir a manuteno da rea em contraposio construo de um

    empreendimento comercial. No entanto, convergimos nosso eixo sobre os

    sentidos e os valores pessoais dos usurios do Parque sujeitos no ativistas

    que se beneficiam indiretamente com as aes realizadas por grupos que

    promovem a mobilizao em torno da conservao do Parque Ecolgico Olhos

    dgua.

    De tal modo, em que medida os usurios deste lugar valorizam este

    espao como um valor em si mesmo? Igualmente, at que ponto, estes sujeitos

    apresentam a mesma relao de afinidade, preocupao e proteo com o

    Parque?

    Dessa forma, o objetivo dessa pesquisa se traduz em compreender os

    valores pessoais e os sentidos dos usurios do Parque Ecolgico Olhos dgua

    relacionados ao processo de conservao e preservao desta paisagem

    urbana. Tendo como objetivos especficos: (i) identificar os valores pessoais

    dos visitantes e comerciantes do entorno do Parque; (ii) verificar a relao

  • 16

    entre valores pessoais e comportamento ecolgico dos visitantes do Parque e

    (iii) compreender os sentidos atribudos ao Parque tendo em vista a formao

    de sujeitos ecolgicos.

    O eixo epistemolgico adotado para alicerar as diferentes leituras sobre

    a paisagem urbana do Parque Ecolgico Olhos dgua est fundamentado nos

    valores pessoais, naquilo que acreditamos como importante para nossas vidas

    e que, de forma intrnseca, dialoga com a paisagem, com aquilo que vemos e

    sentimos.

    Nesse contexto, o conceito de valor adotado para compreenso desta

    pesquisa fundamenta-se nos pressupostos descritos por Schwartz (2005), que

    considera os valores como crenas, capazes de eliciar sentimentos e orientar

    padres e critrios, modos de conduta adotados pelas pessoas para guiarem

    seus comportamentos e suas atitudes.

    Para compor esta lente terica sob a perspectiva do comportamento

    ecolgico destacamos as referncias de Pato (2005, p.7), que o descreve como

    sendo um conjunto de aes intencionais dirigidas e efetivas que respondem a

    exigncias sociais e individuais e resultam em proteo do meio ambiente.

    Para Carvalho (2008), ao considerar o ambiente natural como um bem

    em si, a Educao Ambiental traz de certa forma a relao com os seres no

    humanos para o contexto educativo e nos revela a necessidade de uma tica

    capaz de sustentar uma atitude de respeito e prudncia com os bens

    ambientais.

    Subjacente a estas referncias emerge o sentido da paisagem, que na

    viso de Santos (1998) a concebe como formas que exprimem as heranas

    que representam o sentido das sucessivas relaes entre o homem e a

    natureza. Esta concepo dialoga com o reconhecimento da impossibilidade de

    um conceito objetivo que neutraliza a expresso da paisagem e a remete para

    um reducionismo biolgico.

  • 17

    A associao dos instrumentos escolhidos para o alcance dos objetivos

    descritos nesta pesquisa est baseada na adoo de uma metodologia que

    contempla uma investigao baseada em uma matriz de mtodos mistos

    concomitantes, na qual os procedimentos ocorrem de forma complementar, ou

    seja, na convergncia das abordagens quantitativa e qualitativa.

    Assim, tratamos de estruturar este trabalho em cinco partes. A primeira

    delas, o Captulo 1 descreve o aporte terico adotado e a elucidao de seus

    conceitos - aborda as referncias sobre valores pessoais, comportamento

    ecolgico, descrio de espao e lugar como elementos estruturantes para

    articulao dos eixos adotados. No Captulo 2 so apresentados o contexto

    dos Parques Urbanos e a configurao destas unidades, no mbito do Distrito

    Federal. No Captulo 3 so descritos os elementos que compem a concepo

    metodolgica adotada para investigao do objeto de estudo e as anlises

    realizadas nas fases quantitativa e qualitativa. O Captulo 4, por sua vez expe

    os resultados obtidos na pesquisa. Por fim, no Captulo 5 so apresentadas, a

    discusso e as consideraes finais que compem no conjunto dos elementos

    propostos, a contribuio sobre os valores e os sentidos atribudos paisagem

    ambiental urbana, no Distrito Federal.

  • 18

    CAPTULO 1 CONSTRUO TERICA

    1.1 Valores e a sua natureza epistemolgica

    A expresso valor nos remete a vrias distines conceituais, isso

    porque a ubiquidade relativa ao termo permeia diferentes reas do

    conhecimento. Por quantas vezes nos deparamos com os valores

    testemunhando nossas reflexes ou por outro lado expressando a eleio de

    nossas escolhas pessoais?

    Essas relaes se fazem porque dentro do nosso processo histrico o

    termo valor dialoga com as mais diversas teorias transculturais. Por essa

    razo, dada a permeabilidade proporcionada pelas diferentes acepes do

    termo adotaremos como referencial terico os valores pessoais,

    fundamentados na psicologia ambiental que imprime o sentido da construo

    enunciada na inter-relao e realidade dos sujeitos, imbricados com o

    comportamento ecolgico.

    Esta eleio descreve uma possibilidade de buscar, a partir da sujeio

    do ser, uma leitura para os processos de relao simblica com a natureza.

    Assim, passaremos a tratar em princpio do desenvolvimento terico dos

    valores.

    Nesse contexto destaca-se a abordagem conceitual dos valores a partir

    de Rokeach, pela relevncia dos estudos precursores e de Schwartz, pela

    concretizao da tipologia dos contedos dos valores humanos fundamentados

    em construtos motivacionais que aliceram o desenvolvimento desta pesquisa.

    Rokeach (1981, p.132) define valores como crenas que guiam

    transcendentalmente nossas aes e julgamentos; so o componente central

    da nossa personalidade, ordenados ao longo de um continuum de importncia.

    Para o autor uma vez internalizado, o valor se torna consciente ou

    inconscientemente, um padro ou critrio para guiar a ao, desenvolver e

  • 19

    manter as atitudes em relao a objetos e situaes relevantes, para julgar

    moralmente a si e aos outros e para se comparar com outros.

    Os estudos realizados por Rokeach ainda nos anos 70 evidenciaram,

    segundo Tamayo (2005, p.8) a preocupao preditiva dos valores pessoais em

    relao ao comportamento e o vnculo com as atitudes. Por essa razo, seus

    esforos possibilitaram novas investigaes e salientaram a importncia da

    compreenso dos valores a partir do indivduo.

    Para Ros (2006, p.30) as principais contribuies oferecidas por

    Rokeach consolidaram-se em torno do desenvolvimento do instrumento para

    medir valores (RVS) e a criao do mtodo de autoconfrontao de valores.

    Estas referncias propiciaram para as dcadas seguintes o desenvolvimento

    de estudos que objetivaram a integrao dos valores tanto no plano pessoal

    quanto cultural.

    Schwartz amplia a perspectiva do trabalho realizado por Rokech e

    produz uma teoria integrada do contedo e da estrutura universal dos valores

    humanos. Segundo o autor, a teoria descreve aspectos da estrutura

    psicolgica humana que so fundamentais, aspectos presumivelmente comuns

    a toda a humanidade. (SCHWARTZ, 2005, p.21)

    Segundo Schwartz (ibid., p.22) quando pensamos em valores

    pensamos naquilo que importante para ns, um sentido particular que

    atribumos por razes ou motivaes prprias. Para o autor os valores so

    crenas e esto intrinsecamente relacionados emoo, podem ser

    considerados como construtos motivacionais - os quais se referem a objetivos

    desejveis, porm abstratos que as pessoas se esforam para ter,

    hierarquizados em sistema de prioridades axiolgicas - importncia relativa

    dada a cada tipo motivacional - que nos caracterizam enquanto indivduos.

    Para Tamayo (2005, p.161) os valores pessoais so representaes

    cognitivas, ademais so estabelecidos necessariamente como uma

    preferncia, uma meta que segundo o autor pode ser entendido como sendo

  • 20

    uma distino entre o que importante para o indivduo e o que secundrio,

    entre o que tem valor e o que no tem valor.

    Na perspectiva de Pato (2011) os valores podem ser entendidos por

    meio de uma orientao ou atitude humana preferencial que se apresenta de

    forma positiva e desejada se a considerarmos em relao a objetos, pessoas

    ou ainda situaes.

    Estas afirmaes tericas de convergncia epistemolgica nos

    rementem a construo do estudo de valores pessoais sob a perspectiva de

    uma relao hierrquica, motivados pelo seu grau de importncia e sob o

    ponto de vista daquilo que elegemos como prioridade para nossas vidas e que

    de forma intrnseca relacionam-se com o nosso comportamento.

    Assim, para compreenso do estudo de valores apresentamos a Teoria

    de Valores descrita por Schwartz que consolida a fundamentao deste

    arcabouo terico que ser necessrio para o desenvolvimento desta pesquisa.

    1.2 Teoria de Valores de Schwartz

    Segundo Schwartz (2005, p.23) os valores podem ser caracterizados como:

    1) Crenas. Crenas esto intrinsecamente ligadas emoo e no

    ideias objetivas e frias.

    2) Construto motivacional: referem-se a objetivos desejveis que as

    pessoas se esforam por obter.

    3) Transcendem situaes e aes especficas: so objetivos abstratos

    4) Guiam a seleo e avaliao de aes, polticas, pessoas e eventos:

    isto valores servem como padres ou critrios.

    5) Ordenados pela importncia relativa aos demais: os valores das

    pessoas formam um sistema ordenado de prioridades axiolgicas que

    as caracterizam como indivduos.

  • 21

    De acordo com o autor as caractersticas no indicam seu contedo

    substantivo, no entanto descreve que o aspecto essencial do contedo que

    diferencia os valores o tipo de meta motivacional por ele expressada.

    (SCHWARTZ, 2005 p.58).

    Dessa forma podemos compreender a Teoria dos Valores a partir dosdez

    tipos motivacionais preconizados pelo autor, os quais se diferenciam pelo tipo

    de meta motivacional que eles expressam, conforme descrito no Quadro1.

    A declarao dos tipos motivacionais passou por uma verificao

    emprica e foi sistematizada pelo autor no intuito de estrutur-los pelo seu

    carter universal e ademais pela motivao que o valor expressa.

    Quadro 1 Tipos e objetivos motivacionais dos valores pessoais

    Tipo Motivacional Objetivo

    1 Autodeterminao Pensamento e ao independente escolher, criar e explorar.

    2 Estimulao Excitao, novidade, desafio na vida.

    3 Hedonismo Prazer ou gratificao sensual (prazer associado a sua satisfao).

    4 Realizao Sucesso pessoal por meio de demonstrao de competncia de acordo com padres sociais.

    5 Poder Status social e prestgio, controle ou domnio das

    pessoas.

    6 Segurana Segurana, harmonia e estabilidade da sociedade, dos relacionamentos e de sim mesmo.

    7 Conformidade Restrio de aes, inclinaes e impulsos que tendem a chatear ou prejudicar outros e que violam expectativas ou normas sociais.

    8 Tradio Respeito, compromisso e aceitao dos costumes e ideias que a cultura ou religio do indivduo fornecem.

    9 Benevolncia Preservao e fortalecimento do bem estar

    daqueles com que o contato pessoal do indivduo

    mais frequente.

    10 Universalismo Compreenso, agradecimento, tolerncia e

    proteo do bem-estar de todos e da natureza.

    Fonte: Valores humanos bsicos: seu contexto e estrutura intercultural (SCHWARTZ,

    2005, p. 21-55).

  • 22

    Embora classificados em razo de seus objetivos (contedo), os tipos

    motivacionais apresentam relao qualitativa entre si e caracterizam-se pelo

    agrupamento de valores. Outro aspecto descrito na teoria refere-se estrutura

    de natureza circular apresentada na Figura 1, na qual se observa a relao de

    oposio estabelecida entre tipos motivacionais antagnicos:

    autrotranscendncia versus autopromoo; e autodeterminao e estimulao

    versus conformidade, tradio e segurana.

    Segundo o autor, a dimenso que contrasta abertura a mudana e

    conservao captura o conflito entre a nfase no pensamento e aes

    independentes do indivduo que favorecem a mudana; a segunda dimenso

    descrita pela oposio entre autopromoo e autotranscendncia captura o

    conflito entre a nfase na aceitao dos outros como iguais e a preocupao

    com o seu bem-estar e a busca pelo seu prprio sucesso relativo e domnio

    dos outros. (SCHWARTZ, 2005, p.29).

    Figura 1 Estrutura terica de relao entre valores

    Fonte: Valores humanos bsicos: seu contexto e estrutura intercultural (SCHWARTZ,

    2005, p. 21-55).

  • 23

    Na compreenso de Schwartz a estrutura circular dispe o padro total

    de relaes tericas de conflito e congruncia entre tipos motivacionais, para o

    autor:

    Quanto mais prximos dois tipos motivacionais esto em qualquer uma das direes ao redor do crculo, mais semelhantes so suas motivaes subjacentes. Quanto mais distante, mais antagnicos. (SCHWARTZ, 2005, p. 29).

    A teoria descrita condensa a dimenso da bipolaridade entre tipos

    motivacionais os quais configuram no mbito desta pesquisa, objeto da

    discusso, pois a orientao valorativa (autotranscedncia/autopromoo)

    possibilita refletir o espao da bidimensionalidade, no padro da estrutura

    circular, ou seja, nos possibilita identificar se os valores eleitos podem afetar

    um comportamento pr-ecolgico ou ambiental.

    Nos estudos realizados por Karp (1996) com adoo da tipologia de

    Schwartz (1992, 1994) das quatro categorias de valores descritas pelo autor,

    autotranscendncia e abertura mudana apresentaram influncia positiva no

    comportamentopr ambiental, por outro lado, autopromoo e conservao

    apresentaram relao oposta. Isso significa que, pessoas com valores de

    autotranscedncia e abertura mudana apresentam maior predisposio a

    comportamentos ecolgicos.

    Alm dos valores adotados como precedentes, as atitudes, a

    preocupao ambiental, a percepo de risco, as condies ambientais e os

    estilos de vida tambm podem ser descritos como antecedentes significativos

    (PATO 2006, p. 129).

    Corraliza e Martin (2000, p.34) descrevem que os valores pessoais

    sobre el mundo y la prpria practica permitem identificar os grupos sociais

    aos quais pertencem e defini-los em razo dos diferentes estilos de vida que os

    definem. De um modo geral, acrescentam os autores que, os valores indicam

    os diferentes estilos de vida das pessoas assim podemos considerar que os

  • 24

    valores descrevem uma relao compatvel com os estilos de vida, ou seja,

    dependendo do estilo de vida das pessoas elas podero ser mais ou menos

    ecolgicas.

    Assim, ao considerarmos os valores, na sua complexidade em si e na

    maneira de nos situarmos diante das expectativas do mundo, evocamos para

    esse contexto e de forma intrnseca o comportamento ecolgico, um agir de

    forma responsvel e um comportar-se de forma cuidadosa com o ambiente.

    Dessa forma, segue a tessitura desse eixo epistemolgico o contexto

    sobre o comportamento ecolgico, um interesse terico inerente teoria dos

    valores, que converge com os preceitos da sustentabilidade e abriga na sua

    essncia as inquietudes com a irrefrevel degradao ambiental e a

    necessidade de resignificar a concepo racional sobre a natureza para imbu-

    la de significado e apropriao.

    1.3 A crise ambiental e a emergncia do comportamento ecolgico

    Descrever um comportamento que manifesta um sentido ecolgico

    mais que desnudar um conceito apresent-lo sob a condio de sua

    existncia e deline-lo sob o enredar de um movimento de transformao

    paradigmtica de um transitar para um mundo complexo que demanda

    tambm outras subjetividades.

    Assim, torna-se essencial abordar antes do comportamento ecolgico, a

    razo que impulsionou sua concepo. Para tanto iremos descrever elementos

    significantes, como a percepo da crise ambiental e a emergncia de um

    pensamento que contribui para a narrativa de um processo de conscincia das

    relaes humanas com o ambiente.

    A poca que vivemos hoje no da luz nascente da aurora, que a luz do primeiro olhar, nem a luz das sombras que afoga mais do que revela; a luz que tambm brilha na noite, a luz da fogueira, a luz amarela da lua que, nos diz Sapho, circula para lembrar aos homens a presena da luz na prpria escurido Unger (2000 p.25).

  • 25

    Leff (2006, p.133) ao se referir crise ambiental, a reconhece como uma

    crise que veio para questionar os fundamentos ideolgicos e tericos que

    impulsionaram e legitimaram o crescimento econmico, negando a natureza e

    a cultura, deslocando a relao entre o Real e o Simblico.

    A essncia da crise a incerteza [...] Vive-se no do sculo XXI, uma emergncia que, mais que ecolgica, uma crise do estilo de pensamento, dos imaginrios sociais, dos pressupostos epistemolgicos e do conhecimento que sustentaram a modernidade Uma crise do ser no mundo que se manifesta em toda sua plenitude: nos espaos internos do sujeito, nas condutas sociais autodestrutivas e nos espaos externos, na degradao da natureza e da qualidade de vida das pessoas. (JACOBI, 2005, p. 240).

    Na perspectiva de Grn (2005, p.45) o problema ecolgico no

    somente um problema tcnico, mas tambm um problema tico a relao

    descrita pelo autor enfatiza ainda que o fundamento da crise ambiental se

    alicera no antropocentrismo que se firmou no mundo com a postura que

    apregoa o ser humano como centro de tudo, e cuja separao entre sujeito

    objeto; natureza cultura apontada como um dos pivores da crise ecolgica.

    Makiuchi (2011, p. 85) corrobora a percepo de Grn ao descrever que

    a crise apresenta-se como uma crise tica, que se abrevia ao final das contas

    na relao que os homens estabelecem entre si e com o mundo, onde a ideia

    de que tudo pode tornar-se recurso tem sustentao na instrumentalizao da

    razo, na operacionalizao dos lucros e na atomizao dos indivduos.

    Assim, abordar a crise apreend-la sob a gide de um processo

    relacional, na qual a acelerao das relaes predatrias estabelece mudanas

    radicais natureza; onde o poder das foras desencadeadas num lugar

    ultrapassa a capacidade local de control-las, nas condies atuais de

    mundialidade e de suas repercusses nacionais. (SANTOS, 2008, p. 253).

    De forma clara descrever a crise expor a racionalidade fundada nas

    marcas do capitalismo, nos despir diante de ns mesmos desvelar

  • 26

    nossas compulses e consumismos que nos equipara por bens, ao mesmo

    tempo refletir sem, portanto negar o processo histrico que significou a

    natureza como capital, e ampliou a relao de uso em detrimento de uma

    racionalidade ambiental que na compreenso de Enric Leff pode ser descrita

    como:

    A sntese de valores, racionalidades e sentidos civilizatrios que emerge de potencialidades e possibilidades contidas em diferentes processos materiais, ordens ontolgicas e formaes simblicas. (LEFF 2006, p. 113).

    Na perspectiva de Unger (2000, p.15), a crise o retrato de uma

    sociedade em pedaos, de uma civilizao que dissocia o corpo e o esprito, a

    luz e o mistrio, o ser humano e o Cosmos. Simbolicamente essa referncia

    acolhe a reflexo da instrumentalizao das relaes sociais e da dissociao

    do carter atribudo relao humano natureza.

    A crise afeta os aspectos da vida e nos impulsiona a compreenso de

    uma nova realidade complexa na sua essncia e necessria frente a novas

    possibilidades de fluidez significada na religao do humano consigo e com a

    natureza.

    O mundo atual est enredado em uma encruzilhada entre a modernidade e a ps modernidade; transita por uma ponte sobre o vazio de determinao, casualidade, objetividade, estrutura e unidade do conhecimento que se afasta do paradigma mecanicista da cincia que corre sob seus ps ; avana atravs da incerteza e da perda de referencialidade emprica do conceito para chegar outra margem, a de um mundo complexo que demanda uma nova racionalidade para orientar aes polticas e estratgias emancipatrias que permitam fazer frente ao discurso da simulao que nos seduz (LEFF, 2006, p.129).

    Da crise que transborda inquietudes atravessamos, ainda que a passos

    lentos, para o outro lado da ponte, buscamos ento, um conhecimento segundo

    Moraes (2008, p.31) que nos possibilite encontrar solues para as dificuldades

  • 27

    que nos preocupam tanto no que se refere s condies sociais como

    ambientais enfrentadas pela humanidade, como tambm em relao

    necessidade de diminuio das brechas que nos separam do resto do mundo.

    A crise nos fez emergir para um processo de resignificao embora

    com as marcas de uma histria que no se apaga, o momento no qual vivemos

    nos incita a buscar no a declarao de conflito entre racionalidade econmica

    e ordem ecolgica, mas sim a evidencia da superao em busca de uma

    realidade sustentvel. , portanto nesse contexto que, tanto os valores, quanto

    o comportamento tornam-se to essenciais pois estamos nos dando

    oportunidade de pensar o que queremos e onde queremos chegar.

    A discusso em torno da sustentabilidade passa dessa forma e antes de

    tudo pelos nossos pensamentos, pelos nossos valores e pela maneira de como

    iremos nos comportar diante daquilo que elegemos como prioridade para as

    nossas vidas e que de forma prpria se ajuza no outro.

    Assim, o comportamento ecolgico engendrado pela crise ambiental e

    pela necessidade de novos critrios normativos para valorizao da natureza

    representa um importante construto, emergente e colaborativo para se alcanar

    o sentido da sustentabilidade; pois se transfere de um valor pessoal para

    encontrar uma grandeza maior - o carter coletivo.

    1.4 Comportamento Ecolgico

    Os primeiros estudos sobre comportamento ecolgico referiam-se

    segundo Corral-Verdugo & Pinheiro (1999, p.9) a natureza experimental o que

    os tornava limitados por necessidade ou naturalista que, em geral eram

    limitados por deciso dos pesquisadores. Foram os behavioristas, segundo o

    autor, os responsveis por conduzir a maior parte dos estudos experimentais

    nos quais se deseja aumentar a probabilidade de ocorrncia de condutas pr-

    ambientais; prestando dessa forma mais ateno ao controle dos fatores

  • 28

    externos ao comportamento, como por exemplo: as consequncias da conduta

    ambiental.

    Em contrapartida os cognitivistas manifestavam interesse por variveis

    internas dos indivduos por meio de estratgia observacional estes, ainda

    segundo os autores, associavam condutas ambientalmente responsveis a

    algumas caractersticas psicolgicas dos indivduos, tais como atitudes,

    conhecimentos e personalidade.

    Embora a natureza da sua essencialidade se faa presente, ainda so

    poucos os estudos que evidenciam a contribuio do comportamento ecolgico

    para o entendimento das questes ambientais. Segundo Pato (2005, p. 4),

    citando (Biaggio, Vargas, Monteiro, Souza & Tesche, 1999; Casal & Okamura,

    2002; Okamura, 2002; Pinheiro, 2002; Albino &Pinheiro, 2002):

    Os esforos para compreender o comportamento ecolgico dos brasileiros e seus antecedentes ainda so nfimos, carecendo de mais pesquisas empricas, que procurem elucidar a complexidade desse fenmeno na realidade brasileira (PATO, 2005, p.4).

    Pato (2005, p.27) assevera ainda que a compreenso de aspectos

    relacionados a comportamentos ecolgicos poder contribuir para o

    estabelecimento de estratgias de interveno mais eficazes, assim como

    para elaborao de polticas ambientais mais compatveis com a realidade

    brasileira.

    Assim, ao recorrer para uma definio de comportamento ecolgico,

    encontramos na literatura diferentes termos para o mesmo significado. Corral-

    Verdugo (2004, p. 2) descreve as seguintes expresses:

    Comportamiento ambiental (Bratt, 1999; Zelezny, 1999),

    Conductaproambiental (Leeming, Dwyer, Porter y Cobern, 1993; Corral-

    Verdugo,2001),

  • 29

    Conducta ecolgica (Kaiser y Shimoda, 1999),

    Conducta ambiental responsable(Cottrell y Graefe, 1997)

    Conductasustentable(Schmuck y Schultz, 2002)

    Embora ocorra a distino dos conceitos apresentados; Corral-Verdugo

    evidencia aspectos comuns que se referem a uma conduta sustentvel que se

    caracteriza segundo o autor:

    Pelo conjunto de aes efetivas, deliberadas e avanadas que resultam na preservao dos recursos naturais, incluindo a integridade de espcies animais e vegetais, assim como o bem estar individual e social das presentes e futuras geraes (CORRAL-VERDUGO, 2004, p.10).

    Dessa forma, a expresso conduta sustentvel tambm pode ser

    entendida como comportamento ecolgico, no qual segundo Pato (2004 apud

    Shultz & Zelezny, 1998; Karp, 1996) o comportamento que favorece o

    ambiente natural motivado por um valor interno sem expectativa de retorno

    porm com contribuio para um bem coletivo.

    Corral-Verdugo (2006, p.111) define comportamento pr-ecolgico,

    como sendo uma conduta efetiva, antecipada e dirigida preservao do

    ambiente ou a minimizao da degradao. Destaca o autor ser esta uma

    classe de aes prioritrias para garantir a sobrevivncia da espcie e

    alcanar um nvel de vida digno para os seres humanos.

    Para Corral-Verdugo (2004, p.10) uma conduta sustentvel aquela

    evidenciada por um conjunto de aes efetivas, deliberadas e antecipadas que

    resultam na preservao dos recursos naturais, incluindo a integridade das

    espcies animais e vegetais, assim como o bem estar individual e social das

    presentes e futuras geraes.

    Pato e Tamayo (2006) descrevem que o comportamento ecolgico pode

    ser entendido em sua complexidade, no sentido de envolver as intenes

    claras conscientes, como tambm as aes em favor do meio ambiente. A

    denominao adotada pelos autores manifesta um sentido positivo, ou seja,

  • 30

    revela-se como uma conduta em favor do meio ambiente caracterizada, ou

    no, por ao consciente e intencional.

    Pato (2005, p.29) define comportamento ecolgico como uma

    preocupao com o meio ambiente que reflete a utilizao dos recursos de

    maneira sustentvel, alm disso, considera a autora que subjacentes a este

    comportamento podemos considerar dois importantes aspectos, a tica e as

    motivaes que se afirmam em seu conjunto pelo agir em defesa do

    ambiente baseados em princpios de sustentabilidade e no reconhecimento

    entre relaes humanas e a sustentabilidade ambiental.

    Ao evidenciar estes pressupostos estamos considerando o

    comportamento ecolgico sob a perspectiva de sua complexidade e no to

    somente orientado para a relao simplificada de impacto e de convencimento

    sobre o contexto de uma crise ambiental, mas tambm e sobretudo, pelo

    reconhecimento de uma tica ambiental que permeia a forma de conhecer a

    realidade, portar-se diante dela e fazer-lhes frente.

    Segundo Freire e Vieira, (2006, p. 33) a perspectiva da tica ambiental

    implica segundo os autores de uma responsabilidade pelo outro da natureza

    ou pelo outro como ambiente exterior a mim e, ao mesmo tempo, da

    responsabilidade pelos outros que habitam o mundo, ou que viro a habit-lo.

    Assim, o emprego da terminologia comportamento ecolgico sob a

    compreenso desses atributos ampliam a perspectiva desse estudo, pois

    implica aqui uma noo arraigada tambm ao sentido que atribumos ao

    ambiente; pois o modo como s pessoas significam sua relao consigo

    (identidade pessoal) e com o mundo (identidade social) contribuem para

    identificarmos uma maior possibilidade de um comportamento de preservao

    ambiental. VALLERA E POL (1999 apud FREIRE E VIEIRA, 2006, p.34).

    Diante desse contexto, o comportamento ecolgico aqui referenciado

    dialoga com o movimento do sentido de conservar. Assim, a significao

  • 31

    adotada aparece de forma intrnseca, quando tratamos de estabelecer com o

    ambiente uma relao de cuidado e de respeito.

    Portanto, passaremos a tratar a seguir, do conjunto de categorias

    correlatas, fundamentais para a composio e compreenso deste estudo que

    nos remete a um contexto de ambiente urbano, no qual a paisagem permeia as

    diferentes leituras de um mesmo lugar.

    1.5 O sentido da paisagem

    O termo paisagem tem origem ainda no sculo XV, como vocbulo de

    origem germnica e introduzido na Inglaterra no sculo XVI, para descrio de

    uma representao pictria do campo. Porm na Itlia, em 1521 onde

    ocorre a referncia do termo paesaggio para designar obras com

    representao da natureza. (SALGUEIRO, 2001, p.38).

    A acepo da palavra paisagem, descrita no Houaiss designa, a

    extenso de territrio que o olhar alcana num lance; um conjunto de

    componentes naturais ou no de um espao externo que pode ser apreendido

    pelo olhar; o espao geogrfico de um determinado tipo ou pintura ou desenho

    no qual o tema principal a representao de formas naturais.

    Para Santos (2012, p.67) a paisagem pode ser entendida como um

    conjunto de formas que num dado momento, exprime as heranas que

    representam as sucessivas relaes localizadas entre homem e natureza [...]

    considera ainda o autor que tudo aquilo que ns vemos e que nossa vista

    alcana, paisagem. Ela pode ser definida como o domnio do visvel, aquilo

    que a vista abarca. No formada apenas de volumes, mas tambm de cores,

    movimentos, odores, sons etc.

    Compreendida por muitos como uma expresso tpica da geografia, o

    conceito de paisagem anterior organizao da prpria cincia geogrfica,

    como descreve Jackeline Myanaki:

  • 32

    Os termos paysage, paesaggio, paisaje e paisagem so contemporneos ao momento em que a paisagem, como gnero da pintura, comea a ser explorada por artistas, portanto, muito mais prximo das artes plsticas do que da geografia. (MYANAKI, 2003, p.19).

    Podemos considerar, entre outras premissas, serem os artistas a

    manifestarem as primeiras impresses da paisagem. No Brasil a expedio

    russa conhecida como Langsdorff realizada nos anos de 1821 a 1829

    contribuiu para o registro da paisagem e inventrio da flora brasileira no sculo

    XIX, no percurso de dezessete mil quilmetros entre as provncias do Rio de

    Janeiro, Minas Gerais, So Paulo, Mato Grosso e Par.

    Para Teresa Salgueiro:

    A fruio da natureza como espetculo esttico, implcita inveno da paisagem implica o afastamento entre o sujeito e o objeto de contemplao (a natureza), a mobilizao dos sentidos e a aprendizagem de cdigos de seleo, apreciao e valorizao, os quais fazem parte de um modelo cultural, pois

    a paisagem uma maneira de ver o mundo (SALGUEIRO, 2001, p.38).

    A pintura cumpriu um relevante papel no que diz respeito construo

    de cdigos estticos de apreciao da natureza. Na leitura de Salgueiro esta

    forma de expresso imprimiu uma nova relao do humano com a natureza.

    Efetivamente a paisagem, impressa na forma da arte, incentivou ao seu modo -

    o caminho da descoberta de outras leituras da prpria paisagem e ao mesmo

    tempo introduziu o ensaio sobre a prpria relao de distanciamento do

    humano sobre o ambiente, para impresso da arte.

    Porm, so nos estudos cuja referncia se faz em Paisagem e

    Geografia, descrito por Salgueiro (2001) que a autora analisa na linha do

    tempo, a convergncia e as definies antagnicas para a expresso do termo

  • 33

    paisagem. Para tal razo, justifica a autora serem as escolas de pensamento

    ponto determinante para diferenciao do objeto de anlise.

    Para a autora a paisagem identificada por modos diferentes, entre eles

    destacam-se ainda segundo Salgueiro (2001, p.40) - uma corrente que se

    fundamenta na caracterizao da forma que recorre basicamente ao mtodo

    morfolgico, cujos pressupostos so acolhidos por Brunhes e outros alemes.

    E outra linha de estudo revelada pela autora que privilegia as caractersticas

    de uma rea expressa nos atributos fsico-naturais e humanos e o estudo das

    inter-relaes dos fenmenos nesse territrio.

    Embora o destaque a estas duas vertentes, outras grandes tradies

    ainda so consideradas pela autora, porm o fato a que nos dedicamos, est

    em revelar a paisagem enquanto um conceito integrador que se manifesta

    no sculo XXI, em particular, como uma expresso que se associa a

    concepo de sistemas de inter-relaes e que de forma intrnseca aflui para

    o enredar de uma cincia que se integra tambm a uma ecologia humana.

    Para Bertrand (1968 apud Salgueiro 2001 p.44):

    A paisagem uma certa poro do espao, o resultado da combinao dinmica, portanto instvel de elementos fsicos ou abiticos, biolgicos e antrpicos que reagindo dialeticamente uns sobre os outros fazem da paisagem um elementos nico e indissocivel que evoluciona em bloco.

    Segundo Tuan (1965) a paisagem pode ser considerada como um

    campo que se estrutura na relao do eu com o outro, o reino onde ocorre

    nossa histria, onde encontramos as coisas, os outros e a ns mesmos. Essa

    definio nos encaminha para o conceito de meio ambiente que dialoga de

    forma intrnseca quando adotamos o parque como uma paisagem para

    compreenso.

    Igualmente, o meio ambiente aqui concebido ser adotado na

    singularidade da expresso ambiente que segundo Tuan so condies sob

  • 34

    as quais qualquer pessoa ou coisa vive ou se desenvolve; a soma total de

    influncias que modificam ou determinam o desenvolvimento da vida ou do

    carter" (TUAN, 1965, p.6).

    Chatelin (1986 apud Holzer 1997, p.81) descreve que:

    Meios e paisagens so formados desses objetos que todo mundo pode ver, que alguns estudam, e que todos utilizam de diversas maneiras: as rvores e as terras, as rochas e as colinas... Pensar os meios e as paisagens empreender a reunificao ou de colocar todas as atitudes que se pode adotar, em face destes objetos para perceber, compreender sentir e se exprimir.

    Assim, ainda que ao tratar de um tema to afeito a uma cincia como a

    geografia gostaramos aqui de revelar um ambiente, uma paisagem sem

    letreiros de uma corrente conceitual e sim de uma abordagem que privilegia a

    representao e o sentido da paisagem de uma paisagem que traduz a

    relao do sentido, do visvel e tambm do invisvel.

    Para Fgoli (2004) ao contrrio do olhar apresentado pela geografia a

    paisagem muito mais que o simples espao exterior ao homem, representa

    segundo o autor um signo (dizvel) integrante de um imaginrio social que

    aponta para um sentido (indivizvel) mais que lhe serve de referncia.

    Acrescenta ainda que a paisagem tem feito do entorno exterior e visvel a

    chave para compreenso do sentido da vida humana.

    Segundo Peres e Barbosa (2010) a paisagem pode ser descrita como sendo:

    Um objeto vivo, um espao dinmico que integra o corpo social e que faz parte da sua cultura, por isso no pode ser descontextualizada, dependendo sempre do seu poder de sobrevivncia. A paisagem objeto conscientizado, no pode ser considerada muito menos interpretada com um processo parte e distinto da apropriao til e da relao vivencial que sustenta a vida do sujeito (PERES E BARBOSA, 2010, p.200).

  • 35

    Dessa forma, para o estudo da paisagem ser adotado a pluralidade de

    concepes cujas referncias descritas trazem para o mbito desta pesquisa

    uma relao de carter subjetivo portanto, a centralidade da paisagem ser

    dada na forma como o sujeito v o mundo a representao daquilo que

    emerge da sua relao consigo e com o parque.

    Contudo, conceber o Parque Olhos Dgua sob essa perspectiva

    considerar ainda a necessidade de outras importantes abordagens conceituais

    tais como as referncias de espao/ lugar. Pois, ao tratamos de atribuir sentido

    a paisagem estamos ao mesmo tempo nos referindo a uma paisagem que no

    est avulsa, mas ao mesmo tempo afeita ao contexto de uma unidade de

    conservao. Por essa razo passaremos a discorrer sobre a distino do

    espao e de lugar, pois estas diferenciaes ganham contedo ao delinearmos

    o decorrer deste estudo.

    1.6 Espao e Lugar

    O conceito de espao notadamente se apresenta nessa seo por meio

    da leitura de Santos (2012, p. 80) que o descreve como sendo o resultado da

    soma e da sntese, sempre refeita, da paisagem com a sociedade por meio da

    espacialidade.

    Ainda segundo o autor, o espao pode ser considerado como paisagem

    em razo da vida que nela existe a sociedade encaixada na paisagem, a

    vida que palpita conjuntamente com a materialidade, acrescenta ainda que o

    valor atribudo a cada frao da paisagem pela vida o que metamorfoseia

    a paisagem em espao. Assim considera o autor que, o valor individual

    representado pelo valor que a sociedade atribui a cada pedao da matria.

    Dessa forma, quando uma sociedade age sobre o espao ela no o

    faz sobre uma realidade fsica, mas como uma realidade social assim, o

  • 36

    espao pode ser considerado segundo o autor, como o resultado da interao

    humana o espelho da condio de sociedade.

    Tuan (1983, p. 39) descreve o espao como sendo um termo abstrato

    para um conjunto complexo de ideias cuja maneira de dividi-lo se assemelha

    no fato de que repousa no homem a medida de todas as coisas. Para o autor,

    o espao pode ser considerado como:

    Um constructo do ser humano a necessidade biolgica de todos os animais , tambm para os seres humanos uma necessidade psicolgica, um requisito social, e mesmo um atributo espiritual (TUAN, 1983, p.66).

    Na reviso da literatura quando tratamos de atribuir sentido ao espao

    encontramos a denominao de lugar. Porm, ambos os termos indicam

    segundo Tuan (1983, p. 3) experincias comuns vivemos no espao e estes

    so elementos do meio ambiente.

    No entanto, o espao ganha outro contedo quando atribumos a ele um

    sentido - essa definio transborda para o conceito de lugar que na leitura de

    Cavalcante e Nbrega (2011, p. 182), pode ser entendido como sendo o

    espao com qual se estabelece relao que ganha valor pela vivncia e

    pelos sentimentos. O espao no qual fazemos referncia se veste ento de

    uma complexidade para justificar a abordagem trazida para o contexto da

    paisagem do Parque Ecolgico Olhos dgua.

    O lugar aqui referenciado o parque imbudo pelo sentimento a

    singularidade das afeies individuais ordenadas pelas prioridades

    manifestadas pelos valores pessoais. Para Tuan (1983, p. 6) o que comea

    como espao indiferenciado transforma-se em lugar medida que o

    conhecemos melhor e o dotamos de valor.

    Tuan (1985, p. 224) descreve que o sentido de lugar uma qualidade

    do equilbrio, do conhecimento entre sentir-se enraizado no lugar - que

  • 37

    inconsciente, e sentir-se estranho, que est associado conscincia

    exagerada.

    Cavalcante e Nbrega ao enfocar a descrio de lugar o fazem

    evidenciando que:

    O lugar propicia e materializa, simultaneamente, uma noo de continuidade e de diviso temporal; sintetiza nosso passado, presente e futuro, pois ao mesmo tempo em que memria, aglutina vivncias e apresenta possibilidades ele uma totalidade existencial. (CAVALCANTE E NBREGA, 2011, p. 188)

    Kuhnem (2011, p. 255) ressalta que compreender como uma pessoa

    representa internamente a organizao do espao to importante quanto

    necessrio para o entendimento de como os significados e valores determinam

    interferncia na relao das pessoas com o ambiente. Ainda segundo a autora

    os significados atribudos pelas pessoas ao seu ambiente nos permitem

    compreender seus comportamentos no tocante ao entorno em que vivem e

    que de certa forma se relaciona com os valores atribudos paisagem.

    Pinheiro e Elali (2011, p.) descrevem que ns somos seres espaciais

    usamos o espao para nos relacionarmos uns com os outros e tambm

    estabelecermos relaes especficas com o ambiente de forma consciente ou

    no nossas inter-relaes no espao refletem, entre outras, a natureza da

    interao social.

    Para Mouro e Cavalcante (2011, p.212) os lugares por ns eleitos

    apresentam funo primria gerar um senso de pertencimento e conexo

    tornando-se espaos apropriados, ou seja, lugares que nos abrigam e que se

    apresentam dotados de valor afetivo, pois o que subjaz a apropriao do

    espao o valor e o sentido que atribumos ao lugar.

    Assim, adiante no contexto iremos abordar a configurao dos Parques

    Urbanos, pois o entendimento sobre a criao dessas reas possibilita

    compreender a atual fase de valorizao desses stios e a configurao

  • 38

    adotada para o Distrito Federal. Alm disso, a descrio sobre o Parque

    Ecolgico Olhos dgua traz o elemento central que traduz a existncia desse

    estudo e revela a constituio de seus elementos histricos e as relaes de

    interesses por vezes conflitantes.

  • 39

    CAPTULO 2 - PARQUES URBANOS E O DISTRITO FEDERAL

    2.1 Parques Urbanos

    Em reas urbanas as retas delineiam os espaos de uma cidade, aqui e

    ali a configurao do trao vai moldando a paisagem instalando ao mesmo

    tempo espaos vazios e lugares significados. A geografia das cidades revela a

    viso do homem sobre o espao. Nesse sentido, a concepo da cidade que

    queremos representa, entre outros aspectos, parte de nossos valores e o modo

    de vida da populao.

    Nessa seo apresentamos o surgimento dos parques urbanos levando

    em considerao o processo de transformao ocorrido com o passar dos

    anos, sob a perspectiva do conceito e da referncia desses lugares.

    Na linha do tempo, os parques foram se tornando elementos do

    planejamento de uma cidade. Porm, o seu significado pode por vezes atender

    a diferentes leituras. Isto se vale porque o prprio entendimento sobre o que

    um parque evoluiu com o passar dos anos e essa evoluo, representada na

    forma de lidar com essas reas, vem acompanhada das mudanas

    urbansticas das cidades tornando os parques, segundo Kliass (2010, p.7) um

    testemunho importante dos valores sociais e culturais das populaes

    urbanas.

    Ao introduzir a questo dos parques no cotidiano urbano, Macedo e

    Sakata (2010) o fazem de forma a caracteriz-lo como um elemento tpico da

    cidade moderna e em constante processo de recodificao. Alm disso,

    podemos enfatizar que a diversidade das funes atribudas aos parques, os

    tornam objetos de atendimento das necessidades da vida moderna. Para

    entendimento dessa relao, no contexto dessa pesquisa evidenciamos aqui o

    parque como elemento constituinte da paisagem urbana.

  • 40

    No contexto histrico e no encontro com a literatura sobre parques

    observamos na origem do conceito deste elemento, a materialidade da forma,

    na figura inspiradora dos jardins, que se revelam ainda no sculo XVI em razo

    de seu valor esttico, pelo simbolismo e pela exuberncia do Barroco e

    ademais, pela concepo da dominao do humano sobre a natureza.

    Nesse perodo, o desenho dos jardins elementos precursores dos

    parques, expressa o pensamento racional da poca na compreenso de

    Terra citado por Ferreira (2005, p.22) as plantas tratadas como figuras

    geomtricas representam a afirmao desse ideal no espelho de uma

    tendncia matemtica.

    No sculo XVII, a influncia de intelectuais e artistas em prol da natureza

    exerce uma nova representao para os jardins, em especial os jardins

    ingleses, que passam a reproduzir a paisagem natural e singularizar uma nova

    concepo destes espaos (TERRA, 2004).

    Para Terra (2004 apud Ferreira, 2005, p.22) o jardim ingls com seus

    elementos sinuosos, seu romantismo, sua nova estrutura, seus componentes

    engraados e loucos cria, com rvores plantadas pelo homem, um ambiente

    com aspecto de natural; uma intencionalidade que buscava compor uma

    paisagem que pudesse despertar reflexes da alma. (SANTUCCI, 2003, p.

    25).

    De acordo com Ferreira (2005, p.22) os jardins do sculo XVII seguiram

    a tendncia de ser um autntico parque natural. O encontro com a referncia

    que buscamos aparece de forma pouco expressiva ainda neste sculo e

    substancialmente atrelada ao conceito de jardim.

    Contudo, a meno que queremos manifestar est mais adiante no

    tempo, no sculo XVIII, pois neste contexto que os jardins passam a ser

    considerados espaos ajardinados destinados ao uso pblico refletindo o

  • 41

    incio das caractersticas do que mais adiante se revelaria no conceito de

    parque.

    neste sculo que os parques se consolidam em contraponto a um

    contexto histrico que se transformou em razo da Revoluo Industrial, da

    urbanizao crescente das cidades e da destruio das florestas. Estes fatores

    contriburam para consolidar uma nova forma de conceber o uso dos espaos,

    em especial os de uso pblico, de carter coletivo.

    No contexto do sculo XVIII evidenciamos a ruptura da idealizao

    destes jardins, que embora continuassem a existir passam a dar margem para

    outra construo os parques pblicos. De carter coletivo, esses lugares

    passam a fazer parte do cotidiano das cidades com o propsito de garantir

    benefcios atrelados sade. (SANTUCCI, 2003, p.12).

    Ainda segundo a autora, o processo de urbanizao impulsionou uma

    nova forma de reconhecer a necessidade de criao de espaos livres

    pblicos como locais de lazer para encontro de grupos sociais, de interaes

    nas atividades humanas, alm da procura de um contato com o ambiente mais

    natural. (SANTUCCI, 2003, p.12).

    Esta iniciativa associa-se aos interesses dos mdicos higienistas do

    sculo XIX, que ainda segundo Santucci (2003, p.25), defendiam a criao de

    espaos ajardinados nas cidades a fim de promover um modo de vida

    saudvel, comparando os parques aos pulmes, necessrios para revigorar a

    atmosfera.

    Desse modo, as reivindicaes promovidas pelos Arquitetos da

    Paisagem landscape architects impulsionaram o delineamento do conceito do

    sistema de parques e a insero dessa perspectiva no planejamento urbano.

    (SANTUCCI, 2003, p. 33).

  • 42

    Da mesma forma, destaca a autora, que os parques incitados por este

    ideal passam a ser caracterizados como um espao livre de grande dimenso,

    em que predominam elementos naturais e onde as massas edificadas da

    cidade so visualizadas com uma silhueta de pano de fundo. (SANTUCCI,

    2003, p. 33).

    Para Ferreira (2005, p. 24) os parques do sculo XIX representavam um

    modelo idealizado em bairros burgueses e com finalidade de exibio social.

    Estes espaos, ainda segundo o autor, traziam na sua essncia o ideal

    paisagstico.

    Embora o fato merea destaque o que podemos considerar para bem

    dessas reas que desde o surgimento dos parques nas cidades, estes tem

    assumido diferentes configuraes e significados. Na realidade brasileira

    podemos considerar a inteno de criao dos parques inspirados nos moldes

    europeus, porm com um panorama ambiental e social avesso aquele mesmo

    momento.

  • 43

    2.2 PARQUES URBANOS NO BRASIL

    Peres e Barbosa (2011, p.201) referem-se aos parques urbanos no

    contexto daquilo que eles proporcionam como sendo a apropriao mais

    completa de uma paisagem que se oferece alcanar pela fruio direta e plena,

    que inspira a ideia para alm da simples viso. Para os autores os parques

    so a prpria paisagem com ideia de mundo, um espao de acolhimento do

    Homem na sua condio singular e individual.

    Segundo Macedo e Sakata (2010) o parque urbano brasileiro,

    diferentemente da concepo adotada pelo seu congnere europeu, no est

    vinculado ao atendimento das necessidades das massas urbanas, nem to

    pouco ao processo de industrializao, da ento metrpole do sculo XIX. Para

    os autores:

    O Brasil do sculo passado no possua uma rede urbana expressiva, e nenhuma cidade, inclusive a capital, o Rio de Janeiro tinha o porte de qualquer cidade grande cidade europeia da poca. O parque criado, ento como uma figura complementar aos cenrios das elites emergentes, que controlavam a nova nao em formao e que procuravam construir uma figurao urbana compatvel com a de seus interlocutores internacionais, especialmente ingleses e franceses. (MACEDO E SAKATA, 2010, p.16).

    Nos elementos figurativos, influenciados pela geometria romntica e

    esttica dos paisagistas europeus encontramos os registros da organizao

    destes espaos, mais fortemente representados a partir de 1808, com a vinda

    da famlia real para o Brasil. Porm, ainda em 1783 inaugurado o primeiro

    parque pblico, na cidade do Rio de Janeiro: o Passeio Pblico. Posterior a ele

    encontram-se os registros do Campo de Santana e o Jardim Botnico, ademais

    h em outros Estados, a exemplo de Recife, a concepo de um Parque

    Nossos conceitos no esgotam o mundo, no abarcam nunca a totalidade do real.

    (Isabel Carvalho, 2005, p. 33).

  • 44

    Pblico criado nos moldes europeus, pelo entusiasmo do Conde Maurcio de

    Nassau.

    No entanto, os parques eram elementos paisagsticos para poucos

    poca. A beleza cnica distribuda s margens dos rios, praias tornavam estes

    espaos pouco atrativos. Ainda segundo Macedo e Sakata:

    As cidades brasileiras, durante todo o sculo XIX e mesmo no sculo XX, em especial na primeira metade; expandiram-se de um modo no contnuo sempre dotado de vazios urbanos, sendo o parque considerado equipamento desnecessrio para o lazer mediato e cotidiano da populao. O pas rico em recursos naturais de porte (guas, matas, praias) ofereceu por todos esses anos incontveis possibilidades de espaos para lazer (MACEDO E SACATA, 2010, p. 24).

    Entretanto, os vazios urbanos presentes nas cidades foram com o passar

    dos anos desaparecendo e ao mesmo tempo dando lugar para avenidas

    largas, shoppings, comrcios por toda parte, enfim - uma paisagem urbana

    preenchida pelo desejo da modernidade. Os quintais e pomares no fundo das

    casas so para alguns, apenas reminiscncias da infncia.

    Em Braslia, no muito distante de todas as mudanas ocorridas no

    restante do pas, temos a fotografia dos parques desenhada na concepo

    original, pelos traos do urbanista Lcio Costa, que ao idealizar as

    superquadras, como ilustra a Figura 2, trouxe como referncia a proposta do

    Parque Guinle, no Rio de Janeiro entre 1948-1954. (ZAPATEL, 2009).

    Fundada sob uma estrutura de solo pblico em quadras que conformam o eixo rodovirio residencial, a concepo da Superquadra considera tanto a exigncia de uma relao imediata com o espao aberto, como a densificao da habitao coletiva em blocos habitacionais. Equilbrio entre alta densidade e reas verdes, com a introduo de bem-feitorias pblicas servios e equipamentos comunitrios foram critrios de planejamento habitacional previstos para o suporte a novas formas de sociabilidade, decorrentes dos modos de vida, contemporneos ao desenvolvimento econmico e social do Brasil entre as dcadas de 50 e 60.

  • 45

    Figura 2 - Perspectiva de Superquadras, croquis de Lucio Costa

    Fonte: Arquivo Pblico do Distrito Federal, CITADO POR ZAPATEL, 2009. Disponvel em: Acesso, maio de 2011.

    Na atualidade, os parques, embora considerados como espaos livres,

    so classificados em razo de sua natureza e se diferenciam dos jardins e das

    praas por sua funo e tamanho de rea. Segundo Silvio Macedo e Francine

    Sakata, os parques urbanos podem ser considerados como:

    Espao de uso pblico destinado recreao de massa, qualquer seja o seu tipo, capaz de incorporar intenes de conservao e cuja estrutura morfolgica auto-suficiente, isto , no diretamente influenciada em sua configurao por nenhuma estrutura construda em seu entorno. (MACEDO E SAKATA, 2003, p.14)

    Bargos e Matias (2011, p. 176) classificam os parques urbanos como

    reas verdes, maiores que as praas e jardins, com funo ecolgica, esttica

    e de lazer. Porm, esta compreenso ampliada quando admitimos na razo

    desta categoria, outras funes que possibilitam enxergar os diferentes papis

    de um parque, incluindo neste aspecto as funes de natureza social,

    educacional e psicolgica.

    Assim, ao destacarmos as diferentes leituras sobre parques, em especial

    os urbanos, constatamos que no h uma fala comum que pluralize um

  • 46

    conceito ou uma funo ideal para estas reas, pois apesar de uma legislao

    federal especfica sobre o tema, o que observamos so diferentes modalidades

    de parques que se enquadram em razo de sua vocao, no contexto do

    planejamento das cidades e das normas estaduais e do Distrito Federal.

    Em razo desse fato comum encontrar parques urbanos classificados

    como unidades de conservao ou simplesmente parques, como elementos

    verdes constituintes dos projetos urbansticos das cidades. Como o caso

    especfico do Parque Ecolgico Olhos dgua que at bem pouco tempo era

    considerado com um Parque de Uso Mltiplo.

    De tal modo, no mbito do conceito Parque, ao unir expresses que

    referenciam a funcionalidades destas reas, destacamos os estudos de Vieira

    (2004); Bargos e Matias (2011) que ao inclurem os parques como reas

    verdes das cidades, os conectam sobre o prisma de uma perspectiva

    alicerada em funes inter-relacionadas no ambiente urbano, podendo ou

    no, serem estas reas classificados como unidades de conservao.

    Assim, adotaremos para este contexto, o conjunto da funo de parque

    urbano, a partir da proposta conceitual de Vieira (2004); Bargos e Matias

    (2011), representado por meio da Figura 3. Entretanto, ampliado na definio

    de seu conceito, com o complemento da obra de outros autores, numa

    perspectiva de alicerar, inclusive a leitura sobre a funo destas reas no

    contexto urbano.

  • 47

    Figura 3. Funo das reas Verdes

    Fonte: Bargos, 2010, p.180; modificado a partir de Veira, 2004.

    Na forma acima, as funes destacadas enredam um conjunto de

    dimenses que se integram por um interesse comum ampliar a perspectiva

    conceitual de rea verde urbana vinculada aos aspectos meramente

    preservacionista e observ-la sob a configurao do planejamento urbano,

    integrado com uma nova demanda social e por uma atual realidade ambiental.

    Dessa forma, os aspectos apresentados caracterizam-se segundo os

    autores pelas seguintes funes: social, esttica, ecolgica, educativa e

    psicolgica. Porm, ao analis-las percebemos que as caractersticas

    abordadas possibilitam expressar um sentido ainda maior que transborda a

    essncia j definida e conflui para abordagens complementares.

    De tal modo, ao descrever a funo educativa percebemos que embora

    reluzentes aos interesses desta pesquisa, podemos conciliar alguns aspectos

    FUNO DAS REAS VERDES

    (PARQUES)

    PARQUES

    Funo Social

    Funo Esttica

    Funo Ecolgica

    Funo Educativa

    Funo Psicolgica

  • 48

    destacados nas funes das reas verdes e complement-las sob a leitura de

    outros autores.

    Assim, o fizemos no intuito de expandir a funo destas reas para

    conceber um conjunto de atribuies que se aliceram na perspectiva da

    complexidade e da formao de sujeitos ecolgicos.

    a) Funo social: possibilidade de lazer que essas reas oferecem

    populao.

    b) Funo esttica: diversificao da paisagem construda e

    embelezamento da cidade. Relacionado a esse aspecto, deve ser

    ressaltada a importncia da vegetao.

    Ao descrever esta funo, o autor aborda, de um modo geral, os aspectos

    relacionados necessidade de beleza que embora pertinente, poder ser

    tambm, relacionada perspectiva de Morin (2005, p.132) que concebe a

    esttica a partir da definio original do termo aisthtikos, de aisthanesthai

    sentir. Trata-se, portanto de adotar uma funo esttica de paisagem como

    beleza, mas tambm como emoo, admirao, e no paroxismo, de sublime,

    o que de forma intrnseca se relaciona com a perspectiva da leitura da

    paisagem de Santos e dos sentidos atribudos ao Parque.

    c) Funo ecolgica: provimento de melhorias no clima da cidade e na

    qualidade do ar, gua e solo, resultando no bem-estar dos habitantes,

    devido presena da vegetao, do solo no impermeabilizado e de

    uma fauna mais diversificada nessas reas.

    d) Funo psicolgica: possibilidade de realizao de exerccios, de lazer

    e de recreao. Ampliada pela concepo de Carvalho (2008, p.184)

    podemos mostrar que o sujeito humano tem grande parte de suas

    motivaes para ao, formadas com base em experincias, afetos e

  • 49

    emoes que no se esgotam no plano da racionalidade e da

    conscincia.

    e) Funo educativa: possibilita oferecer por tais espaos como ambiente

    para o desenvolvimento de atividades educativas, extraclasses e de

    programas de educao ambiental.

    Para complementar a referncia para este estudo, associamos a esta

    caracterstica, a leitura da funo educativa, que segundo Isabel Carvalho a

    descreve como uma aventura pela qual o sujeito e os sentidos do mundo

    vivido esto se constituindo mutuamente na dialtica da

    compreenso/interpretao. (CARVALHO, 2008, p.83).

    O contedo da funo educativa introduz no contexto deste referencial

    terico o aspecto da educao ambiental, tema inerente aos parques urbanos

    quando tratamos de lidar com o potencial desses lugares na perspectiva dos

    valores pessoais e do comportamento ecolgico de seus usurios.

    Com isso, a Educao Ambiental aponta como forma de mediar relao

    entre uma paisagem e um sujeito-intrprete que desnuda esta fotografia e a

    torna significante e valorada. De um sujeito, nas palavras de Carvalho (2008,

    p.83), que se despe diante de um mundo-texto e mergulha na polissemia e na

    aventura de produzir sentidos, dentro do seu horizonte histrico.

    Assim sendo, a Educao Ambiental que referenciamos vem destacada na

    forma de pensar as relaes entre a sociedade e o ambiente - cuja

    compreenso segundo Isabel Carvalho:

    Auxiliar em uma compreenso do ambiente como conjunto de prticas sociais permeados por contradies, por problemas e conflitos que tecem a intricada rede de relaes entre modos de vida humanos e suas formas peculiares de interagir com os elementos fsico-naturais de seu entorno e signific-los e manej-los. (CARVALHO 2008, p.163).

  • 50

    Nesse sentido, a referncia de Isabel Carvalho (2008) que subsidia este

    encontro na literatura evidencia a perspectiva de uma Educao Ambiental que

    contribui para motivar relaes com a natureza e enfatizar a relao de co-

    pertena sobretudo quando se compromete com a formao de sujeitos

    ecolgicos.

    Na perspectiva da autora, os sujeitos ecolgicos evidenciam um ideal de ser

    que condensa no um modo individual, mas, a possibilidade de um mundo

    transformado (ibid.,p.69) compatvel com princpios ticos, com valores e

    comportamentos ecolgicos. De forma conceitual, o sujeito ecolgico designa

    um ideal ecolgico, uma utopia pessoal e social norteadora das decises e

    estilos de vida dos que adotam, em alguma medida, uma orientao ecolgica

    em suas vidas. (CARVALHO, 2007, p. 31).

    Adiante, descreveremos o Parque Olhos dgua, a configurao de seu

    histrico e as caractersticas que norteiam o problema desta pesquisa.

  • 51

    2.3 O contexto dos Parques no Distrito Federal

    A poltica de criao de parques constitui competncia do poder pblico

    amparado no art. 225 da Constituio Federal e na Poltica Nacional de Meio

    Ambiente, quando da incumbncia dos incisos I, II e III que regulam alm da

    preservao e restaurao dos processos ecolgicos, a definio, em todas as

    unidades da federao, de espaos a serem protegidos.

    Para Leal e Ganem (2002) a poltica de implantao de parques no

    Distrito Federal considerada recente e com elevao do nmero de reas

    marcado especialmente, na dcada de 1990. Para os autores os parques foram

    criados de forma desordenada e sem estudos prvios que garantissem a

    adequao da implantao. No entanto, com a instituio da Lei Complementar

    n 265, de 1999, que dispe sobre a criao de parques ecolgicos e de uso

    mltiplo, foram definidos os critrios para classificao desses elementos

    urbanos, no Distrito Federal.

    Ainda que o Sistema Nacional de Unidades de Conservao SNUC,

    institudo pela Lei n9.985, de 2000, tenha atribudo categorias especficas para

    os parques, estas unidades no mbito do DF apresentavam um carter distinto

    das demais unidades da federao.

    Porm, com a publicao da Lei Complementar n827, de 23 de julho de

    2010 que regulamenta o art. 279, I, III, IV, XIV, XVI, XIX, XXI, XXII, e o art. 281

    da Lei Orgnica do Distrito Federal, instituindo o Sistema Distrital de Unidades

    de Conservao da Natureza SDUC, os parques passaram a integrar as

    unidades proteo na categoria de uso sustentvel. O objetivo compatibilizar

    a conservao da natureza com o uso sustentvel de parcela dos seus

    recursos naturais. Dessa forma, integram o grupo dessas unidades as

    seguintes categorias:

  • 52

    I rea de Proteo Ambiental;

    II rea de Relevante Interesse Ecolgico;

    III Floresta Distrital;

    IV Parque Ecolgico;

    V Reserva de Fauna;

    VI Reserva Particular do Patrimnio Natural.

    Atualmente, somam-se no Distrito Federal 68 parques, criados por meio

    de Decretos Legislativos. Este valor sofreu um incremento na ltima dcada se

    comparado aos estudos de Braga e Pires publicado em 2002; Leal e Ganen

    (2002) que apresentavam 44 parques, poca, no Distrito Federal, como

    demonstra a Figura 4, que descreve o crescimento dessas unidades.

    Figura 4 Distribuio de Parques no Distrito Federal/Dcada

    Fonte:Instituto Braslia Ambiental IBRAM/Braslia, 2008.

    0

    5

    10

    15

    20

    25

    30

    35

    40

    45

    1960 1970 1980 1990 2000 2010

    Distribuio de Parques no Distrito Federal/Dcada

  • 53

    Entretanto, ainda que a quantidade dessas reas caracterize um nmero

    expressivo no seu total, pouco desse percentual encontra-se efetivamente

    protegido. De acordo com Pires e Braga (2002, p. 33) o Distrito Federal no

    conseguiu estipular critrios mais firmes na garantia de espaos para a

    conservao ambiental.

    O demonstrativo da situao ainda perdura no contexto da regularizao

    dessas reas, especificamente no que concerne a preciso dos dados da

    poligonal; e ademais, pela no realizao de planos de uso, plano diretor e de

    manejo, alm da incompatibilidade quanto atribuio de suas funes e uso

    pela populao residente nos locais situao igualmente destacada nos

    estudos de Ganem e Leal (2002); Braga e Pires (2002).

    Os parques apresentados no documento de referncia, Parque por

    Regio Administrativa, do Instituto Braslia Ambiental, do Governo do Distrito

    Federal destaca sessenta e oito parques no DF. No entanto, dentre eles

    apenas seis possuem plano de manejo/plano de uso ou plano diretor.

    Por fim, h que se considerar que os Parques no contexto do Distrito

    Federal evidenciam, por meio de suas circunstncias e de seus decretos,

    caractersticas prprias que se manifestam de diferentes maneiras e os tornam

    singulares no mbito do processo histrico da gesto pblica, da declarao de

    seus objetivos, da delimitao de suas reas, da relevncia ambiental e social

    e ademais pelo grau de importncia e essencialidade que lhe so atribudos.

    No cenrio deste mapa de pressupostos necessrios implantao e

    consolidao de parques destacamos o contexto do Parque Ecolgico Olhos

    dgua. Primeiro, pela atribuio de ser um parque criado pela intencionalidade

    de sua vizinhana e pela mobilizao do desejo comum atributo da

    excepcionalidade quando dispomos a tratar dos parques no DF.

    Ademais, esses elementos garantiram no to somente a eleio deste

    Parque para objeto de estudo. Eles propiciaram a emergncia do problema de

  • 54

    pesquisa que se apresenta nesse contexto a partir da narrativa de uma

    possvel disputa de interesses sobre a salvaguarda de uma rea contgua ao

    Parque Olhos dgua manifestao igualmente vivenciada quando do ato de

    criao desta mesma unidade, ainda em 1994.

    Dessa forma, antes mesmo de apresentarmos o problema de pesquisa

    evidenciaremos o contexto dos elementos que contribuem para esse

    delineamento.

    2.4 Parque Ecolgico Olhos dgua

    O Parque Ecolgico Olhos dgua foi institudo pela Lei n 556, de 1993,

    publicada no Dirio Oficial da Unio, em 08 de dezembro do mesmo ano e

    regulamentado por meio do Decreto n 15.900, publicado em 12 de setembro

    de 1994, com a denominao de Parque Ecolgico e de Uso Mltiplo Olhos

    dgua.

    Este elemento da paisagem urbana se constituiu em razo da existncia

    de nascentes que inviabilizavam a construo no local e ademais pelo

    processo de mobilizao social que contribuiu para ressignificar esta rea, em

    uma unidade de conservao.

    O Parque est inserido no Plano Piloto de Braslia, como ilustra a Figura

    5 e compreende a rea das entrequadras 413/414 e SCLN 414/415. As

    coordenadas, no entanto, foram definidas no Decreto de criao e ampliadas,

    em maro de 2012, quando da incorporao da rea verde contgua ao parque

    localizada nas entrequadras 213/214 norte.

  • 55

    Figura 5 Localizao do Parque Ecolgico Olhos dgua

    Fonte: http://sosparqueolhosdagua.blogspot.com.br/. Acesso: dezembro de 2012.

    Este marco no processo de ampliao do Parque possibilitou tambm a

    recategorizao da unidade, que anteriormente era caracterizado como sendo:

    um parque ecolgico e de uso mltiplo, passando atualmente, a ser

    classificado somente como Ecolgico o que lhe permite a funo, de acordo o

    Sistema Distrital de Unidades de Conservao, Lei Complementar n827, de

    2010, de:

    Art. 18. Conservar amostras dos ecossistemas naturais, da vegetao extica e paisagens de grande beleza cnica; propiciar a recuperao dos recursos hdricos, edficos e genticos; recuperar reas degradadas, promovendo sua revegetao com espcies nativas; incentivar atividades de pesquisa e monitoramento ambiental e estimular a educao ambiental e as atividades de lazer e recreao em contato harmnico com a natureza.

  • 56

    Com a nova regulamentao passam a ser objetivos do Parque:

    I conservar amostras dos ecossistemas naturais, da vegetao

    extica e paisagens de grande beleza cnica;

    II propiciar a recuperao dos recursos hdricos, edficos e

    genticos;

    III recuperar reas degradadas, promovendo sua revegetao com

    espcies nativas;

    IV incentivar atividades de pesquisa e monitoramento ambiental;

    V estimular a educao ambiental e as atividades de lazer e

    recreao em contato harmnico com a natureza.

    Atualmente, o Parque Ecolgico Olhos dgua conta com uma rea de

    29 hectares. O acrscimo possibilitou o aumento de 30% da rea verde

    existente e a delimitao de uma zona de amortecimento de 200 metros em

    projeo horizontal a partir do permetro do Parque, a qual possibilitar

    minimizar os impactos negativos sobre a unidade e ademais normatizar a

    instalao de novos projetos, no que concerne especial ateno a: i) conduo

    das guas drenadas do subsolo para corpo hdrico natural mais prximo,

    mediante canalizaes subterrneas; e a ii) utilizao de tecnologias que

    permitam a permeabilidade das guas pluviais, visando recarga do aqufero

    quando de iniciativas de projetos de pavimentao, conforme descreve o Art. 3

    I,II do Decreto 33.588/2012.

    As novas atribuies que lhes foram conferidas, se comparadas ao

    Decreto n15.900, de 1994, ampliam a compreenso da essncia de um

    parque urbano e estabelecem uma releitura dos processos necessrios

    manuteno desta unidade de conservao, a partir do incentivo s pesquisas,

    do estmulo educao ambiental e recuperao de reas degradadas, com

    espcies nativas do Cerrado ou seja, uma recategorizao alicerada

  • 57

    tambm em novas perspectivas de sustentabilidade e convergente com a

    Poltica Nacional para Unidades de Conservao instituda no Pas.

    Quanto s caractersticas da vegetao do Parque, observa-se a

    descrio de Cerrado stricto sensu, alm de alguns trechos de mata de galeria.

    As espcies mais expressivas descritas no levantamento publicado pelo

    Instituto Braslia Ambiental (Ibram, 2007) referem-se ao registro de algumas

    espcies mais expressivas, como pau-jacar, angico, embaba, copaba,

    barbatimo e faveiro; alm de jacarand, pequi e faveiro e sucupira branca e

    ip amarelo.

    A fauna destacada no referido documento revela a presena de

    pequenos mamferos voadores, roedores e rpteis porm a maior diversidade

    est representada pela avifauna do local, que descreve exemplares de Fogo-

    apagou; Tiziu; Sa-andorinha; Suiriri-cinzento; Ariramba-de-cauda-ruiva e Beija-

    flor de barriga violeta.

    Quanto a Educao Ambiental no foram descritas atividades

    continuadas e o documento apresentado pelo Ibram referencia apenas no local

    - Centro de Visitantes, a realizao de atividades pontuais desenvolvidas por

    outras instituies de ensino.

    Ademais descrio dos elementos estruturantes que configuram este

    Parque destacamos o valor imobilirio da paisagem que transformou o entorno

    da unidade em objeto de especulao imobiliria, elevando o preo das

    projees, por agregar qualidade de vida e bem estar social. Assim, o parque,

    lcus desta pesquisa nos conduz a um universo de descobertas, uma unidade

    absoluta com diferentes compreenses.

  • 58

    2.5.Situao Problema:os diferentes olhares sobre Parque

    O problema de pesquisa emerge quando tratamos de observar o

    contexto de um possvel conflito de interesses, motivado pela incorporao de

    uma rea localizada na entrequadra 213/214 norte, contgua ao Parque

    Ecolgico Olhos dgua, que no Decreto de criao no foi anexada poligonal

    da unidade e por decorrncia desse fato foi posteriormente vendida pela

    Companhia Imobiliria de Braslia - Terracap para iniciativa particular.

    Os entraves desencadearam o processo de mobilizao social para

    garantir manuteno da rea, em contraposio construo de um

    empreendimento comercial. Para contextualizao do fato, destacamos a

    seguir elementos de uma narrativa noticiada em jornais locais, redes sociais e

    audincias pblicas.

    Na pgina da internet, por meio de uma petio pblica, o abaixo

    assinado SOS Parque Ecolgico Olhos dgua reveleva a preocupao dos

    usurios do Parque Olhos Dgua, por meio da seguinte manifestao:

    A sociedade do Distrito Federal solicita ao

    Governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, no

    mbito do Projeto Braslia Cidade Parque (Decreto n.

    32. 981, de 10/06/2011), a incluso das nascentes

    situadas nas entrequadras SQN 212/213 norte na

    poligonal do Parque Ecolgico Olhos Dgua.

    O Parque foi criado em 1994 por reivindicao

    dos moradores locais e das or