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ANALISANDO CRITICAMENTE AS PROPOSTAS CONTIDAS NA PUBLICAÇÃO OS INSTITUTOS FEDERAIS: UMA REVOLUÇÃO NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA Nilene Matos Trigueiro1 (Doutoranda em Educação pela Universidade Federal da Paraíba, Docente do Instituto Federal do Ceará) Samara Taveira de Oliveira 2 (Docente do Instituto Federal do Ceará) 1 INTRODUÇÃO A discrepância entre o discurso apresentado pelos políticos brasileiros e a realidade das políticas públicas em educação, despertou a curiosidade em analisar as propostas que se projetam sobre uma vertente progressista, expressas na publicação Os Institutos Federais: uma revolução na educação profissional e tecnológica, assinado por Pacheco (2010) e produzido pelo Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). No intuito de desvendar a questão proposta, o trabalho assume como objetivo geral: Analisar os discursos que apontam para uma educação progressista e libertadora, presentes na publicação Os Institutos Federais: uma evolução na educação profissional e tecnológica, produzidas no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Como objetivos específicos: Compreender as propostas contidas no documento em questão, situando-as no contexto do programa de governo apresentado pelo Partido dos

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ANALISANDO CRITICAMENTE AS PROPOSTAS CONTIDAS NA PUBLICAÇÃO OS INSTITUTOS FEDERAIS: UMA REVOLUÇÃO NA EDUCAÇÃO

PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA

Nilene Matos Trigueiro1 (Doutoranda em Educação pela Universidade Federal da Paraíba, Docente do Instituto Federal do Ceará)

Samara Taveira de Oliveira 2 (Docente do Instituto Federal do Ceará)

1 INTRODUÇÃO

A discrepância entre o discurso apresentado pelos políticos brasileiros e a realidade

das políticas públicas em educação, despertou a curiosidade em analisar as propostas que se

projetam sobre uma vertente progressista, expressas na publicação Os Institutos Federais: uma

revolução na educação profissional e tecnológica, assinado por Pacheco (2010) e produzido

pelo Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN).

No intuito de desvendar a questão proposta, o trabalho assume como objetivo geral:

Analisar os discursos que apontam para uma educação progressista e libertadora, presentes na

publicação Os Institutos Federais: uma evolução na educação profissional e tecnológica,

produzidas no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Como objetivos específicos: Compreender

as propostas contidas no documento em questão, situando-as no contexto do programa de

governo apresentado pelo Partido dos Trabalhadores (PT); Apontar a partir de uma análise

fundamentada em autores de pedagogia crítica, os elementos necessários para a concretização

de uma educação progressista e libertadora de homem e sociedade.

Torna-se responsabilidade de todo sujeito, inserido em uma sociedade que se declara

democrática, acompanhar os rumos que os discursos de governo e suas práticas assumem na

realidade social concreta. Enquanto docente e acadêmica de um programa público de

doutorado em educação a responsabilidade amplia-se, posto que, a educação torna-se um

objeto de análise que culminará com respostas que auxiliem a sociedade a compreendê-la de

forma crítica, sob uma visão de mundo dialética.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Houve a preocupação em situar historicamente o governo do PT, no intuito de

conhecer a origem dos seus discursos, que assumem uma abordagem crítica e progressista,

apresentada no documento Os Institutos Federais: Uma revolução na Educação Profissional e

Tecnológica.

Apesar de não ter mantido em suas políticas públicas sociais a defesa de “[...] uma

linha de ação na qual o desenvolvimento nacional reflita os interesses dos trabalhadores e não

os interesses do grande capital nacional e internacional” (PARTIDO DOS

TRABALHADORES, 1995) como prometido em suas campanhas, o PT ainda manteve muito

do discurso progressista e politicamente engajado com a formação social crítica e de combate

ao capitalismo.

Não há surpresas no discurso de educação progressista dos IFETs, visto que o PT,

criador dos IFETs, até meados da década de 1980 assumia-se como um “partido das massas”,

sob uma abordagem classista e socialista, declarando-se representante das vozes do povo que,

cansado de esperar por respostas da elite dominante, mobiliza-se, no intuito de procurar

soluções na situação social e política para seus interesses e dos setores explorados pelo

capitalismo (PARTIDO DOS TRABALHADORES, 1980).

O PT nasce da mobilização dos trabalhadores no Brasil, em meio a greves que

reivindicavam por terra, trabalho e liberdade, entre os anos de 1978 e 1990 e traria propostas

associadas a reformas estruturais (GODEIRO, ANDREASSY, NAZARENO, 2014). O

momento da criação do partido convergiu de distintas experiências e tendências, dentre as

quais lideranças sindicais provenientes de grandes lutas denominadas de novo sindicalismo

(REIS, 2005).

O manifesto contido no estatuto do partido dos trabalhadores, com as alterações

aprovadas na convenção nacional de 22 de dezembro de 1995, afirmava que,

O Partido dos Trabalhadores nasce da vontade de independência política dos trabalhadores, já cansados de servir de massa de manobra para os políticos e os partidos comprometidos com a manutenção da atual ordem econômica, social e política. Nasce, portanto, da vontade de emancipação das massas populares [...].O PT pretende ser uma real expressão política de todos os explorados pelo sistema capitalista. Somos um Partido dos Trabalhadores, não um partido para iludir os

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trabalhadores. Queremos a política como atividade própria das massas que desejam participar, legal e legitimamente, de todas as decisões da sociedade. O PT quer atuar não apenas nos momentos das eleições, mas, principalmente, no dia-a-dia de todos os trabalhadores, pois só assim será possível construir uma nova forma de democracia, cujas raízes estejam nas organizações de base da sociedade e cujas decisões sejam tomadas pelas maiorias (1995, p. 17).

Segundo o Manifesto do PT (1980, s. p.), o partido nasce do desejo de emancipação e

“[...] da vontade de independência política dos trabalhadores, já cansados de servir de massa

de manobra para os políticos e os partidos comprometidos com a manutenção da atual ordem

econômica, social e política”.

Em 1980, o partido apontava em seus discursos para a necessidade de construção de

uma política democrática, de conquista da “[...] liberdade para que o povo possa construir

uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores. O PT manifesta sua

solidariedade à luta de todas as massas oprimidas do mundo” (PARTIDO DOS

TRABALHADORES, 1980, s. p.).

De acordo com Reis (2005), as lideranças do partido que surgiram nas duas últimas

décadas do século XX eram “[...] carismáticos, verticalistas e centralistas, como a estrutura

que os gerou, mais afeitos a negociação e ao diálogo com o Estado e os patrões do que a

mobilização e a organização das bases” (REIS, 2005, p. 69).

Foram incorporados ao PT além dos líderes sindicais; os sujeitos das lideranças

progressistas católicas oriundos da teologia da libertação, aqueles localizados nos centros

urbanos, denominados de consenso progressivo, inclinados ao reformismo moderado e

propensos à negociação com os patrões e os pertencentes às organizações revolucionárias dos

anos de 1960 (REIS, 2005).

No programa de fundação do PT não constava uma menção direta a política externa,

contudo em seu plano de ação era clara a escolha por uma plataforma política típica dos

partidos de esquerda da América Latina, em que eram apontadas propostas como:

independência nacional contra o imperialismo, política independente e de combate à

espoliação do capital internacional, autodeterminação e solidariedade aos povos oprimidos

(ALMEIDA, 2002).

Moderando suas posturas com o decorrer dos anos, o PT modifica suas propostas e em

2002, com a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, demonstrou uma “[...] expressão

inédita de um novo realismo diplomático, a começar pela política de alianças buscada pelo

candidato Lula, desta vez não unicamente à esquerda, mas envolvendo em especial o Partido

Liberal, que forneceu seu candidato a vice” (ALMEIDA, 2002). A proximidade e discussões

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com banqueiros, industriais e investidores financeiros enfatizavam o realismo diplomático e

econômico que assumira o PT (ALMEIDA, 2002).

No plano econômico o objetivo apresentado pelo governo foi reduzir à dependência

financeira do capital internacional e dar continuidade a política externa iniciada pelo governo

Fernando Henrique Cardoso de desenvolver relações econômicas com países como China,

Rússia e Índia.

Embora mudanças tenham sido promovidas no discurso do partido, ainda persistiam

dúvidas fundadas nas propostas apresentadas em campanhas anteriores. No intuito de

“acalmar” a política internacional, Lula da Silva redigiu um documento denominado carta ao

povo brasileiro, em que se comprometia em dar continuidade ao projeto neoliberal do governo

anterior, como destacado no texto que segue:

Superando a nossa vulnerabilidade externa, poderemos reduzir de forma sustentada a taxa de juros. Poderemos recuperar a capacidade de investimento público tão importante para alavancar o crescimento econômico. Esse é o melhor caminho para que os contratos sejam honrados e o país recupere a liberdade de sua política econômica orientada para o desenvolvimento sustentável (SILVA, 2002, s. p.).

Conforme Moraes e Saad-Filho (2011), o governo do PT adotou o modelo econômico

denominado de novo-desenvolvimentismo, que se baseia, principalmente, em duas fontes

teóricas distintas, uma delas seria o keynesianismo e as teorias de economistas

contemporâneos, como Paul Davidson e Joseph Stiglitz, que inspiram o conceito de

complementaridade entre Estado e mercado. A segunda fonte provém do neoestruturalismo

cepalino, interpretado por Fernando Fajnzylber, Luiz Carlos Bresser Pereira e Yoshiaki

Nakano, cuja ênfase se encontra na industrialização e no progresso técnico, como forma de

possibilitar o desenvolvimento da equidade social, no intuito de compatibilizar o crescimento

econômico com a distribuição de renda (SICSU, PAULA, MICHEL, 2007).

Os princípios do neoliberalismo não foram abandonados pelo governo Lula da Silva,

contudo, ainda assim, não se pode afirmar que o respectivo governo manteve, literalmente,

uma continuidade sem diferenciações com o governo Fernando Henrique Cardoso. O governo

Lula da Silva optou pela adoção de políticas com base na corrente novo-desenvolvimentista

que, consoante Moura e Saad-Filho (2011), busca, além da estabilidade monetária,

estabilidade macroeconômica, um conceito mais abrangente capaz de acalmar o mercado,

reduzindo as incertezas em relação às demandas futuras, possibilitando, assim, um ambiente

favorável aos investimentos privados.

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3 METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa exploratória, que se propõe a analisar se o discurso

apresentado na publicação Os Institutos Federais: uma revolução na educação profissional e

tecnológica, publicado em 2010.

Foi empreendida uma análise bibliográfico-documental a partir da incursão na referida

publicação, bem como em leis, livros, dissertações, revistas entre outros, relevantes à

compreensão do processo.

No intuito de compreender os discursos contidos nos documentos, o trabalho dispôs da

leitura de autores que se fundamentam na dialética. A técnica de análise de conteúdo, sob a

perspectiva de uma abordagem qualitativa de pesquisa foi utilizada na interpretação dos

dados.

Ao realizar uma breve análise do histórico e programa de governo do Partido dos

Trabalhadores (PT), o artigo pretende desvendar os questionamentos que motivaram a

referida pesquisa, no intuito de situar política e filosoficamente a origem do discurso

progressista assumido pelo respectivo governo na construção dos IFETs.

4 ANÁLISE DE RESULTADOS

A publicação os Institutos Federais: uma revolução na Educação Profissional e

Tecnológica foi veiculada, em sua primeira versão, em 2010, pela Editora do IFRN, sob a

autoria de Eliezer Moreira Pacheco. Em 2011, ela foi publicada novamente pela Editora

Moderna, em uma versão ampliada, incorporando outras publicações.

Devido ao curto espaço de tempo para a análise mais acurada de toda a produção, o

que requer mais aprofundamento e ampliação da pesquisa, o referido artigo centrou suas

análises em sua primeira versão, de 2010, que corresponde ao primeiro tópico da revisão já

ampliada, denominada Os Institutos federais: uma revolução na educação profissional e

tecnológica.

Alguns elementos foram selecionados por evidenciarem um discurso crítico, que

assume no texto um viés progressista, apesar do texto demonstrar contradições ao evocar as

palavras de ordem da Revolução Francesa, igualdade, liberdade e fraternidade, desenvolvidas

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em meio à revolução burguesa, no século XIX, o texto mantém um discurso que aponta para a

superação do capitalismo e para a construção de uma educação destinada à classe

trabalhadora.

Existe na publicação outros elementos passíveis de estudos e discussões, que merecem

ser ampliados para além do presente debate, contudo, devido ao curto espaço de tempo em

uma produção como um artigo, elementos considerados de maior relevância, pela autora,

foram priorizados, tais como: os objetivos presentes na formação do estudante, que estariam

vinculados a uma educação que possibilite o desenvolvimento de intelectuais na classe

trabalhadora; a proposta de educação dos IFETs, de construção de um projeto democrático e

popular; a concepção de projeto político-pedagógico como inovador e progressista capaz de

formar sujeitos históricos e de construir um novo mundo possível contra a barbárie neoliberal

e a concepção de EPT desenvolvida pelos IFETs.

É importante salientar que, na década de 1990 algumas mudanças nos discursos das

políticas públicas já puderam ser percebidas. Nos primeiros anos desta década predominavam

argumentos destacando a qualidade, a competitividade, a produtividade e a eficácia, já ao

final, os argumentos economicistas foram substituídos por questões mais humanistas

sugeridas pela ênfase nos conceitos de justiça, equidade, coesão social, inclusão,

empoderamento, oportunidade e segurança (WORD BANK, 2000 apud CHIROMA,

CAMPOS, GARCIA, 2005).

De acordo com Chiroma, Campos e Garcia (2005), o vocabulário da mudança foi

assumido em nível mundial pelos organismos internacionais, colonizando os discursos e o

pensamento educacional.

Neste viés de mudança do vocabulário nas reformas em educação, está à publicação

Os Institutos Federais: uma revolução na educação profissional e tecnológica, em que os

institutos são abordados como capazes de protagonizar um Projeto Político-Pedagógico

democrático, popular, inovador e progressista, comprometido com novos sujeitos históricos e

com a emancipação dos setores explorados, não coadunando com a lógica capitalista, esse

projeto seria capaz de superar a barbárie neoliberal e restabelecer o ideal da modernidade, de

liberdade, igualdade e fraternidade (PACHECO, 2011). Seu currículo vai além de um simples

treinamento de habilidades e técnicas destinadas à reprodução do capital (PACHECO, 2011).

É relevante compreender o termo democracia em uma perspectiva de totalidade. Na

publicação aqui analisada, a democracia é relativa, pois aponta para uma escola que está de

“portas abertas para receber a todos”, desconsiderando que “nem todos” podem ter acesso a

esta escola por questões sociais, políticas e econômicas, já que, a possibilidade de escolha de

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trabalho, com o objetivo de auxiliar na renda de sua família. De acordo com Saviani (2012, p.

79),

[...] os educandos são indivíduos concretos, manifestam-se como unidade da diversidade, “uma rica totalidade de determinações e relações numerosas” sínteses das relações sociais. Portanto, o que é do interesse deste aluno concreto diz respeito às condições em que se encontra e que ele não escolheu.

Saviani (2012, p. 45) também discute acerca da democratização da educação ao

afirmar que, [...] a plena democratização do saber pela educação escolar se constitui em uma

necessidade que foi produzida socialmente no capitalismo, mas não pode se efetivar

inteiramente nele [...]. No capitalismo a escola é a forma dominante de apropriação do saber,

todavia, a plena universalização do saber produzido pela humanidade entra em conflito com

as relações de produção nesta sociedade (SAVIANI, 2012).

Conforme Pacheco (2011, p. 10), o objetivo dos institutos,

não é formar um profissional para o mercado, mas sim um cidadão para o mundo do trabalho, o qual poderia ser tanto técnico, quanto filósofo, um escritor ou tudo isto. Significa superar o preconceito de classe de que um trabalhador não pode ser um intelectual, um artista [...].

Ao tratar da formação para o desenvolvimento de intelectuais na classe trabalhadora, o

presente texto toma emprestado a leitura gramsciana acerca da formação dos intelectuais, que

acredita ser a educação técnica, no mundo moderno, a responsável pela construção da base do

novo tipo de intelectual e a escola o instrumento para elaborar os intelectuais nos diversos

níveis (GRAMSCI, 1982). Para Gramsci (1982, p. 3),

cada grupo social, nascendo originário no terreno da produção econômica, cria para si, ao mesmo tempo, de um modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econômico, mas no social e no político [...].

Mas os IFETs seriam a solução para a criação dos intelectuais, sua formação

possibilitaria a formação de sujeitos capazes de gerir a sociedade, de governá-la? Não deveria

também a sociedade permitir o seu acesso e a condição de fazê-lo?

A escola proposta por Gramsci era na verdade uma escola desinteressada, denominada

de escola unitária e de formação humanista ou de cultura geral, responsável por inserir os

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sujeitos na atividade social após desenvolver-lhes a autonomia e maturidade para a criação

intelectual e prática, e para a orientação e iniciativa (GRAMSCI, 1982).

Em outro momento do texto a concepção de EPT dos IFETs é caracterizada como

capaz de favorecer a integração entre ciência, cultura e tecnologia como dimensões da vida

humana, afirmando a necessidade do desenvolvimento da capacidade científica como

necessária a construção da autonomia intelectual dos sujeitos. O trabalho é apontado em seu

sentido ontológico e histórico.

Mas como favorecer uma educação destinada à autonomia intelectual dos sujeitos se o

trabalho na sociedade brasileira não é abordado sob uma perspectiva ontológica?

Para que a escola democrática, emancipadora, que desenvolva uma perspectiva

ontológica de sujeito possa existir, como proposto na publicação em questão, o Estado deve

ser o responsável não apenas por manter a escola, mas também por destinar subsídios a todos

os alunos de baixa condição financeira, assumindo as funções que estão a cargo de sua

família, no que se concerne a manutenção dos estudantes, deve haver também uma grande

mudança no orçamento destinado à educação nacional como um todo, além de que, todas as

escolas tornar-se-iam públicas, sem divisões e desigualdades de grupos (GRAMSCI, 1982).

Deveria haver a ampliação do corpo docente, a estrutura física deveria possibilitar ao aluno o

acesso a dormitórios, refeitórios, bibliotecas especializadas, salas informatizadas etc.

A construção da educação em uma perspectiva crítica implica diversas mudanças nos

processos pedagógicos, reconstruindo suas características e diretrizes; nas instituições de

ensino; nos agentes educativos; nos conteúdos curriculares; nos procedimentos pedagógico-

didáticos; mudanças capazes de munir os indivíduos dos conhecimentos necessários para uma

análise crítica, reflexiva e ontológica da sociedade em que estão inseridos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desconhecer a heterogeneidade da sociedade de classes, permeada por interesses

antagônicos, tem levado os trabalhadores a ilusão contida em propostas políticas irrealizáveis,

que objetivam eliminar o caráter classista do Estado e do direito, e humanizar o capitalismo

(TONÉ, 2011).

O governo do PT não foi capaz de realizar mudanças estruturais na sociedade

brasileira, tão pouco enfrentar a luta pelo socialismo, como expresso em suas declarações e

manifestações contidas na publicação aqui analisada, sua opção foi manter o Brasil sob o jugo

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do capitalismo internacional e dependente e desenvolver políticas públicas reformistas em

vários setores sociais, no intuito de conter as crises cíclicas e estruturais do capitalismo.

As declarações contidas no documento Os Institutos Federais: uma revolução na

educação profissional e tecnológica evidenciaram o discurso do PT, originário em ideais

críticos de educação e sociedade, entretanto sua prática não conseguiu estabelecer-se no nível

das declarações apresentadas.

Não se pode desconsiderar que mudanças e melhorias foram realizadas com a

ampliação da Rede Federal de Educação Tecnológica em todo o Brasil, que passou a atender

um maior número de estudantes, além de reformas estruturais nas instituições, mas ainda

assim, estas não foram capazes de possibilitar o desenvolvimento de “uma educação

progressista que rompa com a barbárie neoliberal” como prometido.

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