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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ CURSO DE DIREITO - NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO, À LUZ DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. LIZANDRA KARYN NUNES HOROSTECKI São José, junho de 2007.

A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO ...siaibib01.univali.br/pdf/Lizandra Karyn Nunes Horostecki.pdf · honestidade, a dignidade, a integridade e acima de tudo a humildade

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉCURSO DE DIREITO - NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICACOORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO, À LUZ DO PRINCÍPIO DA

PROPORCIONALIDADE.

LIZANDRA KARYN NUNES HOROSTECKI

São José, junho de 2007.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉCURSO DE DIREITO - NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICACOORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO, À LUZ DO PRINCÍPIO DA

PROPORCIONALIDADE.

LIZANDRA KARYN NUNES HOROSTECKI

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Msc. Jádel da Silva Júnior

São José, junho de 2007.

AGRADECIMENTOS

À Deus, pela vida e força para atravessar as

situações difíceis.

Ao meu orientador Profº. Msc. Jádel da Silva

Júnior pela presteza e assistência no decorrer

desta pesquisa.

Ao meu noivo Rodrigo pelo seu companheirismo e

apoio incondicional.

Ao meu colega e amigo Jozelito por viabilizar o

acesso irrestrito à biblioteca do Tribunal de

Justiça de Santa Catarina.

À minha amiga Taiara pela constante troca de

informações.

E às minhas amigas, Graziela, Daniela, Izabelita e

Geovana, companheiras nessa jornada

acadêmica.

DEDICATÓRIA

À minha mãe por toda a sua dedicação e carinho,

por sempre ter acreditado em mim e no meu

potencial, por ter me ensinado aquilo que

nenhuma faculdade pode lecionar, valores

preciosos inerentes ao ser humano: o caráter, a

honestidade, a dignidade, a integridade e acima

de tudo a humildade.

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito e o Orientador de toda e

qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

São José, junho de 2007

Lizandra Karyn Nunes HorosteckiAluno

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Lizandra Karyn Nunes Horostecki,

sob o título A admissibilidade das provas ilícitas derivadas no processo penal

brasileiro, à luz do princípio da proporcionalidade foi submetida em 11 de junho de

2007 à avaliação pelo Professor Orientador e pela Banca Examinadora, e

aprovada com a nota ___.

São José, junho de 2007.

Professor MSc. Jádel da Silva JúniorUNIVALI – Centro de Educação de São José

(Orientador e Presidente da Banca)

Professor MSc. Giovani de PaulaUNIVALI – Centro de Educação de São José

Professor MSc. Rodrigo MiotoUNIVALI – Centro de Educação de São José

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF Constituição Federal

CPP Código de Processo Penal

art. Artigo

STF Superior Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

TJ Tribunal de Justiça

SUMÁRIO

RESUMO................................................................................................................................................................. 9

INTRODUÇÃO..................................................................................................................................................... 10

CAPÍTULO 1.........................................................................................................................................................13

1.1 O PROCESSO PENAL À LUZ DO GARANTISMO................................................................................. 13

1.2 OS SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS.................................................................................................. 18

1.2.1 Sistema Inquisitivo............................................................................................................................... 19

1.2.2 Sistema Misto....................................................................................................................................... 20

1.2.3 Sistema Acusatório...............................................................................................................................22

1.2.4 Sistema Processual Adotado pela Constituição Brasileira..................................................................24

1.3 OS PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS ORIENTADORES DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO... 26

1.3.1 A DISTINÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS.......................................................................................................27

1.3.2.1 Princípio do Devido Processo Legal............................................................................................................... 29

1.3.2.2 Princípio do Contraditório...............................................................................................................................31

1.3.2.3 Princípio da Ampla Defesa..............................................................................................................................32

1.3.2.4 Princípio da Verdade Real...............................................................................................................................33

1.3.2.5 Princípio do Livre Convencimento ou Persuasão Racional............................................................................ 34

1.3.2.6 Princípio da Inadmissibilidade da Prova Ilícita...............................................................................................35

1.4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE............................................................................................36

1.4.1 Breve Apontamento Histórico.............................................................................................................. 36

1.4.2 Terminologia, Compreensão e Conceito de Proporcionalidade......................................................... 38

1.4.3 Elementos Parciais do Princípio da Proporcionalidade..................................................................... 41

1.4.3.1 Subprincípio da Adequação.............................................................................................................................41

1.4.3.2 Subprincípio da Necessidade ou Exigibilidade............................................................................................... 42

1.4.2.3 Subprincípio da Proporcionalidade em Sentido Estrito...................................................................................43

1.4.4 Aplicabilidade do Princípio da Proporcionalidade.............................................................................44

1.4.5 Previsão Constitucional da Proporcionalidade...................................................................................45

CAPÍTULO 2.........................................................................................................................................................48

A PROVA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO.........................................................................................48

2.1 INTRODUÇÃO AO TEMA.........................................................................................................................48

2.2 A PROVA EM MATÉRIA CRIMINAL......................................................................................................49

2.3 AS RESTRIÇÕES INERENTES A ATIVIDADE PROBATÓRIA............................................................61

2.4 A PROVA ILÍCITA..................................................................................................................................... 63

2.4.1 Prova Ilícita e Constituição ................................................................................................................ 66

2.4.2 A (In) Admissibilidade das Provas Obtidas por Meios Ilícitos............................................................67

2.4.3 Efeito Processual do Reconhecimento da Prova Ilícita.......................................................................69

2.4.4 A Prova Ilícita por Derivação..............................................................................................................71

O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE APLICADO ÀS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO

PROCESSO PENAL.......................................................................................................................................... 72

3.1 A TÍTULO DE INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 72

3.2 A PROVA ILÍCITA DERIVADA E A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA.......... 72

3.3 A INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL

BRASILEIRO.....................................................................................................................................................76

3.4 A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL

BRASILEIRO ATRAVÉS DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ..................................................84

3.5 A UTILIZAÇÃO DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NA VISÃO DO PESQUISADOR............... 90

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................................... 92

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................... 95

RESUMO

A Constituição da República Federativa do Brasil assegurou

em seu art. 5°, inciso LVI, a inadmissibilidade das provas ilícitas. Todavia, uma

parcela da doutrina e da jurisprudência vem procurando amenizar esta regra

mediante a aplicação do princípio da proporcionalidade. Este trabalho monográfico

teve por objetivo analisar a aceitação da prova ilícita derivada, à luz do Princípio da

Proporcionalidade. Para alcançar este desígnio foi utilizado o método indutivo,

associado às técnicas do referente, da categoria e da pesquisa bibliográfica. Através

da pesquisa, verificou-se que, por meio da aplicação do princípio da

proporcionalidade para ponderação dos direitos fundamentais em conflito – direito

individual à liberdade e tutela coletiva -, é possível aceitar no processo a prova ilícita

derivada que beneficie a defesa, pois em um Estado Democrático de Direito não

interessa ao Estado a punição de um inocente.

Palavras chaves: provas ilícitas derivadas, direitos

fundamentais, princípios, proporcionalidade.

10

INTRODUÇÃO

No estudo do processo penal, a questão da prova tem se

destacado cada vez mais, na medida em que a correta apuração dos fatos é

condição primordial para um julgamento justo. Ao mesmo tempo, tem sido

considerada a sua extrema complexidade, pois a busca da verdade processual não

constitui um procedimento neutro, envolvendo sempre outros aspectos ligados a

valores sociais e políticos1.

A Constituição da República estabelece uma série de direitos e

garantias fundamentais que sofrem, entretanto, limitações, uma vez que os direitos

fundamentais não são mais vistos como uma garantia individual absoluta, mas sim,

como direitos do homem inserido em sociedade.

Neste diapasão, o direito à prova no processo penal não é

irrestrito, sua forma de obtenção é limitada ao que está garantido na Constituição da

República e normas processuais penais. Este direito é uma garantia das partes, que

vêem no Estado o mecanismo para a solução de seus conflitos de interesses.

Quanto às garantias inerentes à prova, a Carta Magna dispõe

de forma expressa em seu art. 5°, inciso LVI, que “são inadmissíveis no processo as

provas obtidas por meios ilícitos”. Assim, as provas obtidas por meios ilícitos não

serão admitidas, pois ferem as garantias constitucionais do indivíduo, principalmente

sua liberdade individual.

Porém, atualmente, sabe-se que estas prerrogativas não são

mais absolutas e encontram seus limites nos demais direitos e garantias igualmente

consagrados na Constituição da República (princípio da relatividade ou convivência

das liberdades públicas).

Como forma de ponderar os interesses em conflito e valorar as

contraposições entre os princípios constitucionais, muitos doutrinadores e julgadores

aderem ao conceito alemão da proporcionalidade. Esta forma de resolução de

1 ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Provas ilícitas e proporcionalidade. Rio de Janeiro: Lúmen júris. 2007. p. 15.

11

conflitos entre princípios constitucionais está centrada sob três diretivas básicas

(adequação, necessidade e proporcionalidade strito sensu), que visam juntas buscar

o equilíbrio entre o exercício de poder e a preservação dos direitos dos cidadãos.

Para analisar o tema, este trabalho tem por parâmetro

responder a seguinte questão: é possível sob a égide do princípio da

proporcionalidade admitir a utilização das provas ilícitas derivadas no processo

penal?

A pesquisa tem por objetivo demonstrar a admissibilidade, em

determinados casos, da prova ilícita derivada no processo penal brasileiro, à luz do

princípio da proporcionalidade.

Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de

investigação foi utilizado o método indutivo, na fase de tratamento de dados o

método cartesiano, e o relatório dos resultados expresso na presente monografia é

composto na base lógica indutiva.

Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas,

do referente, da categoria e da pesquisa bibliográfica.

Para um melhor desenvolvimento do estudo e proporcionar

maior coerência lógica da pesquisa, a monografia foi dividida em três capítulos.

O primeiro capítulo trata da visão garantista do processo penal,

com a distinção entre direitos e garantias fundamentais. Destaca os sistemas

processuais penais e qual deles é recepcionado pela Constituição da República.

Aborda-se ainda a conceituação e diferenciação entre princípios e regras,

enfatizando os princípios constitucionais que informam a prova penal e o processo

penal. Ao final do capítulo buscou-se uma análise do princípio da proporcionalidade,

ressaltando sua origem, terminologia, conceito, os subprincípios que os integram,

bem como sua aplicabilidade e previsão constitucional.

O segundo capítulo aprecia a prova em matéria criminal,

apresentando sua inserção como garantia fundamental, seu conceito, finalidade,

objeto, meios, ônus, classificação, o procedimento probatório e os sistemas de

valoração. Na seqüência verifica-se acerca das restrições probatórias e concluindo o

12

capítulo definem-se o que seja prova ilícita, a previsão constitucional de sua

inadmissibilidade, as teorias de (in) admissibilidade e os efeitos processuais

decorrentes da admissão no processo de provas obtidas por meios ilícitos.

O último capítulo discorre, inicialmente, sobre a conceituação

de provas ilícitas derivadas, enfatizando a teoria dos frutos da árvore envenenada.

Conhecida esta teoria, passa-se à análise das correntes doutrinárias e

jurisprudenciais acerca da inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas no

processo penal, bem como a análise da admissibilidade das provas ilícitas derivadas

quando utilizadas em favor da defesa, através da aplicação do princípio da

proporcionalidade. Para arrematar o capítulo é exposta a visão do pesquisador

sobre o tema.

Encerrando o conteúdo investigativo, apresenta-se nas

considerações finais uma síntese da pesquisa, aferindo a confirmação dos objetivos

traçados para a mesma.

13

CAPÍTULO 1

ASPECTOS GERAIS DO GARANTISMO PENAL, DOS SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS, DOS PRINCÍPIOS QUE ORIENTAM O

PROCESSO PENAL E DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

1.1 O PROCESSO PENAL À LUZ DO GARANTISMO

Com a promulgação da Constituição da República Federativa

do Brasil em 1988, foram instituídos diversos direitos e garantias fundamentais para

assegurar a população maior segurança jurídica em face da arbitrariedade do

Estado que se fazia presente ao longo da história ditatorial vivida pelo Brasil.

Neste diapasão, procura-se distinguir direitos de garantias

fundamentais “os direitos são bens e vantagens conferidos pela norma, enquanto as

garantias são meios destinados a fazer valer esses direitos, são instrumentos pelos

quais se asseguram o exercício e o gozo daqueles bens”.2 Seguindo o mesmo

entendimento Alexandre de Moraes3 revela que os direitos fundamentais são

separados em direitos propriamente ditos e direitos e garantias fundamentais, os

direitos representam propriamente os bens e, já as garantias destinam-se à proteção

destes bens.

A distinção mais bem aceita é a de Rui Barbosa, citada na obra

de Paulo Rangel4, in verbis:

Ruy Barbosa já dizia que uma coisa são os direitos, outra as garantias, pois devemos separar, nos textos da Lei Fundamental, as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos; limitam o poder. Aquelas instituem os direitos, estas, as garantias; ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a

2José Afonso da Silva citado por Fernandes. FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 4. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005. p. 20, na nota 173 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo : Atlas, 2004. p.614 RANGEL, Paulo. Investigação criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003 p. 23

14

fixação da garantia, com a declaração do direito.

Assim, os direitos individuais fundamentais a existência do

homem, são aqueles alusivos à pessoa, são inerentes ao homem e qualificam sua

natureza, enquanto convivem socialmente dentro do Estado5, sendo que as

garantias surgem como mecanismo de proteção a estes direitos violados, com o

intuito de assegurar a ordem jurídica e limitar o poder abusivo do Estado6.

Com o propósito de assegurar a positivação constitucional dos

direitos fundamentais com sua consagração nas garantias penais e processuais

penais, surge o garantismo penal.

A teoria do garantismo penal foi desenvolvida pelo professor e

jurista italiano, Luigi Ferrajoli, a partir do Movimento Democrático da Magistratura

Italiana no ano de 1964, que por sua vez deu origem ao Direito Alternativo, cujo

objetivo fundamental foi fortalecer a normatividade da Constituição Italiana em face

às normas infraconstitucionais infringidoras dos direitos e garantias fundamentais.7

Rangel citando Ferrajoli, 8 ao dar o significado de garantismo,

revela que:

Segundo um primeiro significado, garantismo designa um modelo normativo de direito: precisamente, no que diz respeito ao direito penal, o modelo da estrita legalidade, próprio do Estado de direito, que se caracteriza como um sistema cognitivo ou de poder mínimo, sob o plano jurídico, como um sistema de vínculos impostos à função punitiva do Estado em garantia dos direitos dos cidadãos. É conseqüentemente, garantista todo o sistema penal que se conforma normativamente com tal modelo e que o satisfaz efetivamente.

Neste sentido, o garantismo9 visa à utilização de um sistema

normativo constitucional limitador dos abusos aos direitos fundamentais e do

exercício arbitrário do poder do Estado. Tem como principal finalidade à tutela das

liberdades individuais em face à arbitrariedade do poder público, buscando a

5 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. 2. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.52.6 RANGEL, 2003, p. 24.7 RANGEL, 2003, p. 41.8 RANGEL, Op.cit. p. 28.9 RANGEL, Op.cit. p. 41

15

efetividade das normas constitucionais. Os direitos fundamentais adquirem a função

de instituir limites ao direito penal nas sociedades democráticas.

Carvalho e Carvalho10 salientam que “o garantismo penal é um

esquema tipológico baseado no máximo grau de tutela dos direitos e na fiabilidade

do juízo e da legislação, limitando o poder punitivo e garantindo a (s) pessoa (s)

contra qualquer tipo de violência arbitrária, pública ou privada”.

Para o garantismo o Direito Penal é um dos vários

instrumentos de prevenção de delitos, podendo ser acionado somente em última

hipótese11, quando os meios extra penais forem insuficientes, preza o garantismo

assim, o mínimo de intervenção do Estado com a proteção máxima das garantias

das liberdades individuais e dos demais Direitos Fundamentais12.

Cerqueira menciona em sua obra que Ferrajoli utiliza dois

modelos que descrevem a estrutura do Direito Penal, estes modelos são pautados

em pressupostos filosóficos advindos do Direito Penal fruto da concepção iluminista.

Num primeiro modelo o Direito Penal é considerado num Estado de Direito ideal,

referindo ao “dever ser”, que representa o garantismo máximo e o segundo modelo é

vinculado a um Direito penal autoritário, inquisitorial. 13

O modelo de Direito Penal de máximas garantias14 preza a

intervenção mínima do Estado e a maximização das garantia Constitucionais. O

Direito Penal mínimo corresponde não somente a máxima proteção às liberdades

públicas em face do poder arbitrário do Estado, mas também está condicionado a

um ideal de certeza e racionalidade, sendo condicionado e limitado às máximas

garantias.

Este modelo é composto por uma série de garantias, que

constituem cada uma delas um conjunto de condições sine qua non para a

afirmação da responsabilização penal e posterior aplicação da pena. São os 10 CARVALHO, Amilton Bueno ; CARVALHO, Salo de. Aplicação da Pena e Garantismo. 3 ed.,Rio de Janeiro: Lumem Júris,. 2004. p. 2111 O Direito Penal deve ser a última ratio, isto é, deve atuar somente quando os demais ramos do Direito revelam-se incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes na vida do indivíduo e da própria sociedade. RANGEL, 2003. p. 32. 12 DALABRIDA, Sidney Eloy. Prisão Preventiva: uma análise à luz do garantismo penal. Curitiba : Juruá. 2004 p. 23.13 CERQUEIRA, Atílio Antônio. Direito Penal Garantista e Nova Criminalidade. Curitiba, Juruá, 2002. p.43.14 CERQUEIRA, loc.cit.

16

seguintes:

[...] a) pena somente com crime; b) crime somente como lei anterior que o defina como tal; c) lei definindo o que seja crime somente com necessidade; c) necessidade de definição como crime somente com lesão extrema; e) lesão extrema somente com ação; f) ação somente com culpa; g) culpa somente com julgamento; h) julgamento somente com acusação separada de quem decide; i) acusação somente mediante a comprovação; j) comprovação somente com defesa. 15

Os dez axiomas citados acima servem como instrumento para

medir o grau do garantismo no sistema penal, este irá diminuir conforme faltarem um

ou mais princípios no ordenamento jurídico. Estes postulados representam um

sistema ideal de Direito Penal, que busca a proteção das liberdades individuais,

sendo que os postulados “a” até “f” representam as garantias penais e os

mencionados entre “g” e “j” as garantias processuais.

O segundo modelo desenvolvido por Ferrajoli, vincula o Direito

Penal a forma autoritária, inquisitorial, que põe em risco alguns princípios protetores

dos direitos individuais. De acordo com o autor o modelo autoritário deve ser

subdividido em outros três modelos 16: a) De processo penal autoritário: neste

sistema estão ausentes os axiomas da defesa e comprovação, representando desta

forma um Direito Penal pautado na legalidade formal, pelo qual a verdade

processual17 tem permissão de ser atingida pela interpretação subjetiva do juiz,

inexistindo a defesa e a apreciação de provas auferidas pela estrita legalidade. Esse

sistema impossibilitaria que os argumentos da defesa e acusação fossem

verificáveis e refutáveis, sendo apenas argumentáveis; b) De direito penal

autoritário: a ausência aqui é dos axiomas nula pena sem necessidade, necessidade

de definição do crime somente com lesão extrema e ação somente com culpa. Tais

ausências implicam que a condenação do acusado vai estar baseada na sua

15CERQUEIRA, 2002, p. 43-44.16 CERQUEIRA, op.cit., p. 44-46.17 Cerqueira revela que Luigi Ferrajoli assevera que o fim último do processo penal é o estabelecimento de uma verdade a respeito dos fatos investigados, atribuídos ao réu, verdade esta que deve ser produzida dentro de limites que garantam o imprescindível respeito aos direitos individuais do acusado, regras estas que impõe contenção ao arbítrio do Estado e do próprio juiz. [...] Ferrajoli identifica como verdade processual àquela produzida dentro de regras garantistas que viabilizam ao máximo possível o saber ao juiz, aproximando o poder do mesmo a zero, diferenciando-a, destarte, das outras duas formas da verdade referentes ao processo: a verdade formal e a verdade material, tendo em vista que a primeira pode ser obtida através de um processo em que tais garantias sejam pequenas, e a segunda, obtida mediante processo em que não haja qualquer limite à atuação da acusação e do próprio julgador. CERQUEIRA, 2002, p. 45, nota 47.

17

subjetividade, considerada perigosa para o ordenamento jurídico; c) Do Direito Penal

punitivo irracional: faltam os postulados da nula pena sem crime, nulo crime sem lei

anterior que o defina e nula culpa sem julgamento. Sem o primeiro axioma o sistema

penal é chamado de “mera prevenção”, pois inexistindo o delito pune-se a suspeita

da prática e faltando os dois outros se tem um sistema penal absolutista com um

estado discricionário.

Para uma aplicação mais humanitária do Direito Penal e

Processual Penal, deve-se observar o correto emprego dos princípios que envolvem

a teoria garantista. Estes princípios permitem a individualização e identificação dos

modelos de Sistema Penal, bem como a arbitrariedade de seus sistemas de

controle. São eles:

[...] princípio da retributividade, princípio da estrita legalidade, princípio da economia do direito penal, princípio da lesividade, principio da exterioridade da ação, principio da culpabilidade, princípio da estrita jurisdicionalidade, princípio acusatório, princípio do ônus da prova para a acusação e princípio do contraditório. 18

Dentre estes princípios é na legalidade que o sistema

garantista encontra seu ápice. A legalidade aqui mencionada não corresponde

apenas à ligação entre norma e forma, mas com a preocupação no conteúdo dos

direitos fundamentais constitucionalmente assegurados. O princípio da estrita

legalidade vincula todas as demais garantias, sendo pressuposto da estrita

jurisdicionalidade do sistema. 19

As garantias processuais constituem o alicerce do processo

penal, colocando-se a serviço das liberdades individuais frente ao poder arbitrário do

Estado. Dentre essas garantias estão a jurisdicionalidade, inderrogabilidade do juízo,

separação de julgar e acusar, presunção de inocência, contraditório, motivação, juiz

natural, publicidade e oralidade. Pelo modelo punitivo, o maior ou menor

distanciamento destes princípios em relação aos direitos fundamentais, permitirá

qualificar o sistema como garantista ou arbitrário. 20

18 DUCLERC, Elmir. Prova penal e garantismo: uma investigação crítica sobre a verdade fática construída através do processo. Rio de Janeiro: Luman Juris, 2004. (Coleção: Pensamento Crítico). p. 124.19 DALABRIDA, 2004, p. 26.20 DALABRIDA, 2004, p. 26.

18

Uma visão garantista do processo penal preocupa-se com a

instrumentalidade do processo, que deve funcionar como mecanismo de proteção às

liberdades públicas. Nesta perspectiva o processo penal se direciona a realizar uma

dupla missão; de um lado, realizar a pretensão punitiva estatal através da imposição

da pena em busca da pacificação social e por outro lado, funcionar como

instrumento destinado a garantir os direitos fundamentais dos cidadãos em face do

poder punitivo arbitrário do Estado. 21

Os direitos e garantias fundamentais são consagrados em

maior ou menor grau dentro do processo penal de acordo com o sistema processual

escolhido pelo ordenamento jurídico. Menores serão as garantias se for adotado o

sistema inquisitório e maiores se forem concebidas pelo processo penal o sistema

acusatório.

1.2 OS SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

Os sistemas são uma totalidade ordenada, um conjunto de

entes entre os quais existe uma certa ordem, sendo que para que possa falar de

uma ordem, é necessário que os entes que a constituem não estejam somente

relacionados com o todo, mas também num relacionamento de coerência entre si22 .

A idéia central de um sistema alude a noção de um conjunto de temas colocados em

relação a um princípio maior e que a partir dele forma-se um todo, com uma

finalidade específica.

Paulo Rangel23 conceitua o sistema processual penal como “o

conjunto de princípios e regras constitucionais e processuais penais de acordo com

o momento político de cada Estado, que estabelece as diretrizes a serem seguidas

para a aplicação do direito penal a cada caso concreto”.

Neste contexto os sistemas processuais penais são um

agrupamento de técnicas, normas e conceitos relacionados de forma harmoniosa,

formando um modelo, com fim de atender as necessidades do processo penal. “Não

se tratando de um conjunto solto e desarticulado de normas e instituições, mas sim

21 DALABRIDA, op.cit. p. 34-35.22 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10 ed. Brasília: UNB, 1999. p. 71.23 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 10 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris. 2005. p.45.

19

uma realidade medida exatamente em virtude da coerência interna destas mesmas

normas e instituições”. 24

De acordo com as formas com que se apresentam e os

princípios que os informam, os sistemas processuais penais utilizados ao longo da

historia pelo direito são três: o inquisitivo, o acusatório e o misto.

1.2.1 Sistema Inquisitivo

O sistema inquisitivo nasceu com as monarquias absolutistas e

se aperfeiçoou com o direito canônico, sendo adotado por quase a totalidade dos

paises europeus no século XVI, XVII e XVIII. Este sistema retratava-se como um

instrumento de poder dos Estados autoritários que não reconheciam os interesses

individuais trazendo para si o poder de reprimir as práticas delitivas. 25

Sob a égide de tal sistema ficou demonstrada a vinculatividade

da atuação estatal na resolução dos conflitos de interesse e solução de casos na

espera penal, bem como as diretrizes políticas que modelaram a estrutura do Estado

e definiram seus fins. 26

A maior característica do sistema inquisitório está na

concentração das três funções do processo penal, quais sejam: acusar, defender e

julgar nas mãos de um único sujeito. Essas atribuições são exercidas

exclusivamente pelo juiz acusador, a quem compete dar inicio à ação penal, tendo

sobre ela total domínio. Neste diapasão, o juiz preside e conduz as investigações,

formula a acusação e julga o feito, inexistindo a imparcialidade.

O procedimento é regido de forma secreta, escrita e sem a

publicidade dos atos processuais. Quanto a esta particularidade Dalabrida 27

comenta que neste sistema:

A investigação é secreta, escrita e descontínua, servindo-lhe de fonte a denúncia oral ou escrita, o rumor público e a autodenúncia. Sem contraditório, a defesa não passava de mera formalidade. A

24 PRADO, Geraldo. Sistema acusatório: a conformidade constitucional das Leis Processuais Penais. 4 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris. 2006. p. 54.25 RANGEL, 2003, p.203.26 PRADO, op.cit. p. 85.27 DALABRIDA, 2004, p. 43.

20

incomunicabilidade do acusado e seu encarceramento preventivo constituíam a regra.

Em situação de total submissão, o acusado é considerado

mero objeto do processo, não possui qualidades de sujeito de direitos, podendo,

inclusive, sofrer suplícios para que se chegue à verdade dos fatos, através de sua

confissão28. O inquisitorismo não permite nem assegura garantias processuais ao

acusado, não contemplando o processo, a ampla defesa, o contraditório e a

presunção de inocência.

No campo probatório, o juiz tem total liberdade na colheita das

provas, com objetivo principal de buscar a verdade real. 29 “O sistema de provas

adotado é o das provas legais ou prova tarifada, onde a lei estabelece uma série de

condições para que possa provar um fato tendo como centro a confissão”. 30 Cada

prova possui um valor pré-estabelecido pelo legislador, o que obriga o magistrado a

seguir a ordem preexistente.

A função predominante do sistema inquisitório versa na

realização do direito penal material, com o poder punitivo do Estado sendo o objetivo

principal do processo. Portanto, “equivale dizer que o juiz cumpre a função de

segurança pública no exercício do magistério penal”. 31

1.2.2 Sistema Misto

Com o fim do absolutismo que adotava o sistema inquisitório,

surge a necessidade de adaptação do processo penal às novas realidades de um

Estado de Direito. Procurou-se, para tanto, um modelo que substituísse o anterior.

Porém, o que sucedeu foi à fusão entre o sistema acusatório privado e o sistema

inquisitivo, surgindo assim, um terceiro sistema denominado misto, napoleônico ou

28 No procedimento inquisitório, não existe relação jurídico – processual, podendo haver, quando muito, uma relação que traduza a submissão do indivíduo ao Estado, com o aumento dos poderes de sujeição estatal. MARQUES, Jose Frederico. Estudos de direito processual penal. Rio de Janeiro: Forense, 1960. p.22.29 Nicola Palansky citado por Frederico Marques citando revela que “O processo inquisitório foi historicamente o gerador do principio da verdade material, pois a teoria formal da prova que limitou o poder discricionário do juiz, no referido processo, não lhe é inerente e foi historicamente estabelecida para servir de contrapeso a esse poder”.

MARQUES, Jose Frederico. Elementos de direito processual Penal. v.1, 2. ed. atual. Campinas : Millennium, 2000, p. 65, nota 12.30 RANGEL, 2003, p. 204.31 PRADO, 2006, p.105

21

sistema acusatório formal. 32

Ensina Badaró 33 que o sistema é misto por que:

Nele o processo se desdobra em duas fases: a primeira é tipicamente inquisitória, a outra é acusatória. Naquela faz-se à instrução escrita e secreta, sem acusação e, por isso mesmo, sem contraditório. Apura-se o fato em sua materialidade e autoria, ou seja, a imputação física do fato ao agente. Nesta o acusador apresenta a acusação, o réu se defende e o juiz julga. É pública e oral.

Na primeira fase, denominada instrução preliminar, o juiz é

quem dirige o processo, procedendo às investigações, colhendo todos os elementos

probatórios a instruir a ação penal. A função da polícia judiciária fica subordinada a

prender os infratores e indicar os meio de prova. Nesta etapa, o procedimento é

secreto, escrito e o acusado é mero objeto de investigação, não havendo

contraditório e ampla defesa. 34

Para Geraldo Prado35 “a etapa preliminar, ou de instrução,

atende ao propósito declarado de otimizar os meios de apreensão dos elementos

que constituirão o núcleo do trabalho a ser desenvolvido na fase seguinte, e ao

objeto implícito, de realização pública e obrigatória do direito penal [...]”.

É na fase judicial que ocorre a acusação propriamente dita,

feita, via de regra, pelo Ministério Público. Formulada a acusação e aceita pelo juiz

competente, inicia-se o procedimento principal, marcado pela separação das

funções de acusar, defender e julgar. 36

O acusado, nesta segunda fase, é considerado sujeito de

direitos, gozando de uma posição jurídica que lhe assegure o estado de inocência,

devendo o órgão acusador provar sua culpa, através do devido processo legal. Aos

procedimentos é garantido o contraditório, permitindo ao acusado à ampla defesa,

sendo os atos processuais públicos e praticados em audiências. “Na segunda fase

32 RANGEL, 2003, p.205.33 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Correlação entre acusação e sentença. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2000. p 24 e 25.34 RANGEL, 2003, p.206.35 PRADO, 2006, P.92.36 RANGEL, loc.cit.

22

[...] todas as acusações realizavam-se publicamente, perante um tribunal colegiado

ou júri, com a controvérsia e o debate entre as partes, no maior nível possível de

igualdade”.37

Nota-se que na primeira etapa o juiz, de maneira secreta,

quebra sua imparcialidade buscando indícios de autoria e materialidade. Na

segunda fase, a do julgamento, é que surgem às garantias da ampla defesa e do

contraditório. Daí por este sistema ter sua denominação mista.

1.2.3 Sistema Acusatório

Na busca por um sistema distinto dos dois modelos (inquisitório

e misto) anteriores e pela preservação das garantias fundamentais, muito afetadas

por um sistema misto, preponderantemente inquisitório, surge à necessidade da

busca da justiça penal e defesa da coletividade. 38 Tal sistema nasceu na Inglaterra e

França após a Revolução de 1789, sendo adotado na atualidade pela maioria dos

países europeus e americanos.

O sistema acusatório retirou das investigações preliminares a

formação de um juízo de valor condenatório, por parte do magistrado, prevalecendo

o contraditório, a ampla defesa, a publicidade dos atos processuais, o livre

convencimento e a imparcialidade do magistrado. 39

No entendimento de Paulo Rangel40, sistema acusatório público

é aquele:

Em que a imputação penal é feita por um órgão distinto do juiz, em regra o Ministério Público, que estabelece a persecutio crimminis, dando ao acusado o status de sujeito de direitos com exercício da ampla defesa e do contraditório e não o tratando como mero objeto de investigação.

No mesmo sentido Ferrajoli, citado por Geraldo Prado41,

enfatiza que o sistema acusatório “é todo sistema processual que concebe o juiz

37 PRADO, 2006, p.91.38 PRADO, loc.cit.39 PRADO, op.cit., p.96.40 RANGEL, 2000, p.199.41 PRADO, 2006, p.163.

23

como sendo um sujeito passivo rigidamente separado das partes e do processo com

iniciativa da acusação, a quem compete o ônus da prova, garantindo-se o

contraditório, oral e público, e resolvido pelo juiz segundo sua livre convicção”.

O sistema acusatório tem como principal característica à

separação das funções inerentes da persecutio crimminis in judicio dos órgãos que

nela atuam, ou seja, a separação entre acusar, defender e julgar. No processo

penal42 o autor da ação penal é o Ministério Público que exerce a persecução

criminal; o réu, por meio da ampla defesa e de todos os meios inerentes, exerce

resistência à pretensão do autor e o juiz, por meio de sua imparcialidade, é mantido

distante do processo, prestando a tutela jurisdicional.

Tal sistema é caracterizado ainda por outros elementos como:

a) existência de um órgão jurisdicional, estabelecido em lei, com capacidade

imparcial de julgar os casos submetidos a sua apreciação; b) a separação do órgão

que irá iniciar a persecução criminal do que irá julgar a ação penal; c) como

conseqüência do principio do contraditório e ampla defesa os sujeitos processuais

ficam em igualdade de condições, o acusado é considerado sujeito de direitos e não

objeto de investigação, sendo-lhe asseguradas todas as garantias constitucionais; d)

resguardado o segredo de justiça, os atos processuais são regidos pelo princípio da

publicidade; e) no campo probatório o sistema de provas adotado é o do livre

convencimento, o juiz está livre para valorar as provas, desde que pertencentes ao

processo, sendo que toda e qualquer decisão deve ser fundamentada sob pena de

nulidade. 43

Para Frederico Marques44 no sistema acusatório,

O autor e o réu encontram-se em pé de igualdade, sobrepondo-se a ambos, como órgão imparcial de aplicação da lei, o titular da jurisdição, ou juiz, (....). A titularidade da pretensão punitiva pertence ao Estado, representado pelo Ministério Público, e não pelo juiz, órgão estatal tão somente da aplicação imparcial da lei para dirimir conflitos entre o jus puniendi e a liberdade do réu.

O processo acusatório é essencialmente um processo de

42 RANGEL, 2003, p.201.43 RANGEL, op.cit., p.202.44 MARQUES, 2000, vol. 1, p.66.

24

partes, com o contraditório estabelecido entre a acusação e a defesa em igualdade

de condições, onde o magistrado apresenta-se sobreposto a ambas as partes. Há

nesse sistema uma nítida separação das funções, permitindo a caracterização do

processo como um verdadeiro actum trium personarum.45

Diante dos direitos e garantias fundamentais, o sistema

acusatório deve ser o pilar que assegura ao acusado sua liberdade de locomoção e

o cerceamento de direitos que dela decorram. Faz parte ainda deste sistema o

princípio do promotor natural, pois a acusação deve ser feita pelo órgão do

Ministério Público, com suas atribuições previstas em lei.

Estes sistemas processuais apresentados46 são frutos do

período político de cada época, pois na medida em que o Estado torna-se

autoritário, diminuem-se as garantias do acusado. Porém, quando se aproxima do

Estado Democrático de Direito, as garantias constitucionais lhe são asseguradas.

1.2.4 Sistema Processual Adotado pela Constituição Brasileira

Há na doutrina brasileira um forte discenso quanto à

qualificação do sistema processual pátrio, Tornaghi47 e Lauria Tucci48, classificam-no

como misto, já Frederico Marques49, Tourinho Filho50, Prado51, Rangel52, Badaró53 e

Silva Jardim54, sustentam sua filiação ao sistema acusatório.

Para Tucci55 o processo penal é caracterizado pelo sistema

misto, com a inquisitoriedade dirigia a apuração da verdade material, na primeira

fase da persecução criminal, onde o poder inquisitivo é conferido ao órgão

jurisdicional para a formação de seu convencimento. A acusatoriedade é

45 BADARÓ, 2000, p. 20.46 RANGEL, 2005, p.51.47 TORNAGHI, Helio. Curso de processo penal. v.1, 8.ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p.18.48“[...] o moderno processo penal delineia-se inquisitório, substancialmente em sua essencialidade, e, formalmente, no tocante ao procedimento na segunda fase da persecução penal, acusatório.”

TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudo sistemático). São Paulo : Revista dos Tribunais, 2002. p. 180.49 MARQUES, 2000, vol. 01, p. 66-67.50 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 6 ed. São Paulo : Saraiva, 2004. p. 35.51 PRADO, 2006, p.195.52 RANGEL, 2005, p. 52.53 BADARÓ, op.cit., p.25.54 JARDIM, Alfrânio Silva. Direito Processual Penal. 11 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2002. p. 47.55 TUCCI, 2002, p. 179.

25

especificada na segunda fase da persecução, sendo a ação penal pública conduzida

pelo Ministério Público, caracterizada pela imparcialidade do juiz e pela existência do

contraditório e da ampla defesa por parte do acusado, separando-se assim, as

funções das partes no processo.

Segundo a opinião dos doutrinadores que partilham da corrente

acusatória, afirmam estes que o sistema acusatório não se encontra em nossa

legislação pátria em sua forma pura, pois traz em sua essência traços de

inquisitoriedade, como, por exemplo, quando permite que nos autos do processo

conste o inquérito policial e dele se aproveite às informações colhidas para que se

efetive ou não a condenação do acusado.

Paulo Rangel56 corrobora com este entendimento ao ressaltar

que:

O Brasil adota um sistema acusatório que, no nosso modo de ver, não é puro em sua essência. Pois o inquérito policial regido pelo sigilo, pela inquisitoriedade, tratando o indivíduo como objeto de investigação, integra os autos do processo, e o juiz, muitas vezes, pergunta, em audiência se os fatos que constam nos inquéritos policiais são verdadeiros. Inclusive, ao tomar depoimento de uma testemunha, primeiro lê seu depoimento prestado, com o crivo do contraditório, durante a fase de inquérito para ver se confirma ou não, e, depois passa a fazer perguntas que entende ser necessárias. Nesse caso, [...] o procedimento meramente informativo, inquisitivo e sigiloso dá o pontapé inicial na atividade jurisdicional à procura da verdade processual. Assim, não podemos dizer, (..) que o sistema acusatório adotado entre nós é puro. Há resquícios do sistema inquisitivo [...]

Pode-se verificar que os resquícios de inquisitoriedade

existentes no procedimento penal não permitem considerar o sistema processual

penal como absolutamente acusatório, porém a Constituição através dos princípios

que asseguram os direitos e garantias processuais, dentre outros, permitem a

presunção de que adotou tal sistema.

Outro posicionamento que vem ao encontro do disposto acima

56 RANGEL, 2005, p.51.

26

pertence a Geraldo Prado57:

Se aceitarmos que a norma constitucional que assegura ao Ministério Público a privatividade do exercício da ação penal pública na forma da lei, que garante aos acusados o devido processo legal, [...], a presunção de inocência, [...] o julgamento por juiz competente e imparcial, [...] que a Constituição prevê a oralidade [...] e a publicidade [...], Concluiremos que se filiou, sem dizer, ao sistema acusatório. Porém se notarmos o concreto estatuto jurídico dos sujeitos processuais nos tribunais [...] não nos restara alternativa salvo admitir [...] que prevalece no Brasil, a teoria da aparência acusatória porque muito dos princípios opostos ao acusatório verdadeiramente são implementados todo dia.

Embora não tenha feito de forma expressa, a Constituição

Federal adotou o sistema acusatório, pois conferiu ao Ministério Público a

privacidade do exercício da ação penal pública, consagrando o devido processo

legal, a imparcialidade do órgão julgador, a ampla defesa e o contraditório, dentre

outras garantias.

De exposto, pode-se concluir que “o sistema acusatório,

naquilo que tem de essencial e básico, é a melhor forma de processo que pode ser

aceito pelo direito hodierno”58. ·Isso ocorre, pois, no sistema acusatório o réu é

tratado como sujeito de direitos, possuindo suas garantias constitucionais

respeitadas, devendo o Estado estar vinculado às normas de direito. O Estado por

meio do Ministério Público, ou querelante, submete sua demanda a um juiz

imparcial. A imparcialidade originada pela separação das funções representa um

considerável avanço na construção de uma democracia participativa. 59

1.3 OS PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS ORIENTADORES DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

57 PRADO, 2006, p. 19558MARQUES, 1960, p.22.59MIRZA, Flávio. Os Sistemas Processuais Penais e o Processo Penal Brasileiro. Breves Notas. Mundo jurídico. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br/cgi-bin/upload/texto251.doc Acesso 10 set. 2006.

27

Neste item tratar-se-á acerca dos princípios que regem o

processo penal e a prova penal. Para maior compreensão acerca dos princípios que

regem o processo penal, faz-se necessária, inicialmente, à definição do conceito de

princípio e sua distinção quanto às regras.

1.3.1 A Distinção Entre Princípios e Regras

Pode-se conceituar princípios como sendo “uma regra geral e

abstrata que se obtém indutivamente, extraindo o essencial de normas particulares,

ou como uma regra geral preexistente”60. Eles impõem a otimização de um bem

jurídico, de um direito, levando em conta a reserva do possível, seja fática ou

jurídica.

Segundo Canotilho61, para realizar a distinção destes dois

institutos, há de ser utilizado os seguintes critérios:

a) O grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstração relativamente reduzida; b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras [...], enquanto as regras são susceptíveis de aplicação direta; c) Caráter de fundamentalidade no sistema de fontes de direito: os princípios são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes [...] ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico [...]. d) ‘Proximidade da idéia de direito’: os princípios são ‘standards’ juridicamente vinculantes radicados nas exigências de ‘justiça’ [...] ou na ‘idéia de direito’ [...]; as regras podem ser normas vinculantes com um conteúdo meramente formal. e) “Natureza normogenética: os princípios são fundamentos de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante”.

Assim, as regras descrevem uma situação jurídica, atrelam

fatos hipotéticos específicos, que, preenchidos os pressupostos por ela descritos,

60 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Princípios Penais Constitucionais da Oportunidade da Moralidade e da Proporcionalidade como Limitação ao Poder Punitivo do Estado. Revista dos Tribunais, São Paulo, v.802, p. 452-463, ago. 2002. p. 45361 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6.ed. Coimbra : Almedina. 1993. p. 166.

28

exigem, proíbem ou permitem algo em termos definitivos sem qualquer exceção. Os

princípios, por sua vez, refletem o valor ou uma diretriz, sem relatar uma situação

jurídica, ou citar um fato específico, estabelecendo, porém, a realização de algo, da

melhor maneira possível depois de observadas as possibilidades fáticas e jurídicas.

“Possuem um maior grau de abstração e, portanto, irradia-se por diferentes partes

do sistema, informando a compreensão das regras, dando unidade e harmonia ao

sistema normativo.” 62

Os princípios situam-se no topo do sistema jurídico. A respeito

de seu grau de abstração, eles são normas jurídicas e não normas programáticas

dependentes de regulamentação. Toda “norma jurídica fundamental tem eficácia

plena e imediata”63. As regras, no entanto, tem seu campo de atuação restrito. No

caso de colisão entre princípios e regras, o juiz deverá aplicar os princípios, pois

estes se encontram numa situação hierárquica superior às regras. Já no caso de

conflito entre princípios fundamentais, “o juiz deverá aplicar aquele que melhor se coaduna com ao valor da dignidade da pessoa humana”64. (grifo nosso)

Os princípios compõem as idéias centrais do ordenamento

jurídico, são as normas chaves de todo o sistema, servindo de base à compreensão

jurídica. A interpretação constitucional deve ser sempre de seus princípios,

identificando aqueles que regem o tema.

1.3.2 Os Princípios Constitucionais Que Orientam o Processo Penal e a Prova Penal

Os princípios que regem o processo penal constituem a base

elementar para a construção de toda a dogmática jurídica processual constitucional.

São as regras mais gerais e amplas que se consubstanciam numa regra jurídica não

escrita, com objetivo no processo de realizar o bem comum.

As respostas para problemas surgidos no curso do processo

criminal estão, muitas vezes, nos princípios que o orientam, porém, o operador

jurídico não os visualiza, aplicando normas em contraposição aos elementos

62LIMA George Marmelstein. A força normativa dos princípios constitucionais. Disponível em http://www.georgemlima.hpg.ig.com.br/doutrina/forcanormativa.doc Acesso 01 dez. 2006. 63 SIRVINSKAS, 2002, p. 454.64SIRVINSKAS, op. Cit., p. 455.

29

primários que constituem o processo65. Desta forma, os princípios são considerados

os pilares de todo o ordenamento jurídico, pois guiam o interprete na maneira de

como agir diante das normas jurídicas e das situações concretas a ele apresentadas

no cotidiano.

Serão analisados agora os princípios constitucionais que

orientam o processo penal, não com o objetivo de averiguar toda a matéria relativa

ao tema, mais tendo como principal interesse abordar de maneira geral os princípios

pertinentes ao tema em questão.

1.3.2.1 Princípio do Devido Processo Legal

O “devido processo legal” (due process of law, em inglês) é o

termo referente ao princípio constitucional que garante ao indivíduo direito de ser

processado segundo as normas jurídicas vigentes antes do fato que ensejou o

processo. 66. Está explicitamente elencado na Constituição Federal de 1988, em seu

art. 5°, LIV, que preceitua: “ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens

sem o devido processo legal".

O due process of law é a síntese, o princípio-vetor do processo

penal, consiste no direito da pessoa em não ser privada de sua liberdade e seus

bens, sem a garantia da tramitação de um processo pautado na legalidade. 67 Tem

aplicação tanto no processo civil ( no caso dos bens), como no processo penal (no

caso de privação de liberdade), é uma conquista do humanismo britânico,

repartindo-se em procedural due process68 ( sentido processual, ou formal ou

adjetivo) e substantive due process 69(sentido substantivo ou material).

André L. Borges Netto70 sustenta que:65 RANGEL, 2005, p. 03.66 WIKIPEDIA. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Devido_processo_legal Acesso em: dez. de 2006.67 TOURINHO FILHO, 2004, p. 25 e 26.68 De acordo Tavares citado por Ferreira a doutrina o Devido processo legal, no âmbito processual, ou formal ou adjetivo, "significa a garantia concedida à parte processual para utilizar-se da plenitude dos meios jurídicos existentes", tendo como decorrência a paridade de armas, contraditório, ampla defesa, dentre outras garantias e direitos processuais.

FERREIRA, Otávio Augusto Viana Alves. O devido processo legal substantivo e o supremo tribunal federal nos 15 anos da Constituição Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_60/Artigos/Art_Olavo.htm . Acesso em dez. 2006.69 Segundo Barroso citado por Ferreira: Trata-se de princípio por meio do qual se controla o arbítrio do Legislativo e a discricionariedade dos atos do Poder Público, ou seja, "é por seu intermédio que se procede ao exame da razoabilidade (reasonableness) e da racionalidade (rationality) das normas jurídicas e dos atos do Poder Público em geral". (FERREIRA, [s.d.])70 BORGES NETTO, André L. A razoabilidade Constitucional: o princípio do devido processo legal substantivo

30

Duas são as facetas do devido processo legal, a adjetiva (que garante aos cidadãos um processo justo e que se configura como um direito negativo, porque o conceito dele extraído apenas limita a conduta do governo quando este atua no sentido de restringir a vida, a liberdade ou o patrimônio dos cidadãos) e a substantiva (que, mediante autorização da Constituição, indica a existência de competência a ser exercida pelo Judiciário, no sentido de poder afastar a aplicabilidade de leis ou de atos governamentais na hipótese de os mesmos serem arbitrários, tudo como forma de limitar a conduta daqueles agentes públicos)".

Cintra, Grinover e Dinamarco71, afirmam que o princípio do

devido processo legal é o “conjunto de garantias constitucionais que, de um lado

asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de

outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição”.

No campo judicial, segundo Tucci72, este princípio é

apresentado como um dos elementos imprescindíveis para que processo possa

atingir a sua finalidade compositiva de litígios (no âmbito extra penal) ou

solucionadora de conflitos (no campo penal), pautado, sobretudo, nas garantias

previstas na Constituição, que objetivam assegurar os direitos denominados

fundamentais73, através da efetivação do direito ao processo, materializado num

procedimento desenvolvido de forma corretamente, com a concretização de todos os

seus corolários, e realizado em um prazo razoável.

Significa dizer que, para que haja o cerceamento de liberdade

(qualquer que seja) ou de bens (não apenas em sentido patrimonial), o processo

deve tramitar respeitando todas as formalidades previstas em lei, sejam elas de

ordem material ou instrumental. Sendo assim, para resguardar as garantias

fundamentais, o enfoque do devido processo legal exige do operador jurídico o

respeito aos preceitos tutelados na Constituição.

aplicado a casos concretos. Revista Jurídica Virtual do Palácio do Planalto. v.2, n. 12, maio 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/revista/Rev_12/razoab_const.htm .Acesso em: dez. de 2006.71 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo ; GRINOVER, Ada Pellegrini ; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 13.ed. rev. e atual. São Paulo : Malheiros, 2000. p. 82. 72 . TUCCI,op.cit., p. 205.73 Tucci, elenca de modo sucinto, as garantias constitucionais pertinentes ao devido processo penal, quais sejam: as referentes ao acesso à justiça criminal, as concernentes a inafastabilidade do juiz natural, as atinentes ao tratamento paritário dos sujeitos parciais do processo penal, as referentes à plenitude de defesa, às relativas à publicidade dos atos processuais, a determinante de fixação de prazo razoável para o processo e as alusivas ã legalidade da execução penal. . TUCCI, 2004, p. 218 e 219.

31

Sendo o processo penal concebido nestes termos, é inegável

que nasça dele o direito à prova no processo penal, tanto para a acusação quanto

para a defesa.

1.3.2.2 Princípio do Contraditório

A Constituição Federal dispõe em seu art. 5°, LV, que “ aos

litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são

assugurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos inerentes”.

Decorre também este princípio do disposto no art. 8° 74 do Pacto de São José da

Costa Rica, aprovado pelo Congresso Nacional sob o Decreto Legislativo n

27/1992.

O princípio do contraditório vem ao encontro da estrutura do

sistema acusatório, decorrendo da concepção de que as partes são sujeitos da

relação processual, com direitos, deveres, ônus, poderes e sujeições. O

contraditório, no dizer de Jardim 75, é a “bilateralidade dos atos processuais. As

partes hão de ser postas em situações que as habilite a constatar as afirmações e

as provas produzidas”.

O contraditório pressupõe que as partes estejam em situações,

pelo menos, formalmente opostas no plano processual, tendo assegurada à ciência

dos atos e termos da parte contrária, com a possibilidade de refutá-los.

Segundo Paulo Rangel76, a instrução contraditória é inerente ao

próprio direito de defesa, pois é inconcebível que se alcance a verdade dos fatos no

processo penal, sem que o acusado tenha a oportunidade de rebater os fatos

imputados a ele na denúncia oferecida pelo Ministério Público.

A existência lógica do contraditório implica em duas figuras, a

do dizer e a do contradizer. Assim, em razão da garantia constitucional do

contraditório no processo penal, que deve ser efetiva e integral, não pode ser

admitido que uma das partes fique sem o conhecimento dos atos praticados pela

74 Art. 8°: Garantias Judiciais 1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias dentre de um prazo razoável, por um juiz o u tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, a apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem sus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.75 JARDIM, Alfrânio Silva. Direito processual penal. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 40.76 RANGEL, 2005, p 69.

32

parte contrária. Sendo esta garantia pertinente não só ao acusado, mas também ao

membro do Ministério Público77, porque a existência do contraditório em relação à

acusação é a garantia da certeza de que o processo tramita em igualdade de

condições.

Existem situações em que por medidas inaldita altera pars,

dado seu caráter de provisoriedade, não tem o acusado a possibilidade de

contradizer os fatos no momento da decisão. Nestes casos, o contraditório é

denominado posticifato ou diferido, não restando a garantia da bilateralidade

prejudicada, uma vez que o contraditório é postergado para momento ulterior a

pronunciação de ato decisório liminar. Este efeito diferido ocorre, pois nem sempre o

contraditório é compatível com a natureza da medida que se pretende atingir. 78

Em razão da previsão constitucional do princípio do

contraditório em termos amplos e abertos, deve ele ser compreendido no sentido

pleno e efetivo, com a participação do juiz que deve respeitar e implementar o

contraditório quando preciso, não apenas às questões fáticas, mas também às

pertinentes de direito, para que as partes não sejam surpreendidas por decisões

repentinas no curso do processo.79

1.3.2.3 Princípio da Ampla Defesa

A Constituição Federal, em seu art. 5°, LV, declara que a lei

assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos a ela inerentes. Nestes

termos, é garantido ao acusado ampla possibilidade de intervenção na produção da

prova e no debate das mais variadas quaestionis juris.

No conceito de Greco Filho80, o direito de defesa “consiste na

oportunidade de o réu contraditar a acusação, através da previsão legal de termos

processuais que possibilitem a eficiência da defesa”. É numa garantia que possui

alguns requisitos importantes, dentre eles, pode-se citar o conhecimento claro e

completo da acusação; a instrução processual contraditória; a ampla produção de

provas e o direito de verificar sua instrução; a argumentação após a acusação; a

77 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 4.ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 6678 TUCCI, 2004, p.224-226.79 BADARÓ, 2000, p. 3780 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 4.ed. São Paulo : Saraiva, 1997. p. 73.

33

manifestação diante dos atos e termos processuais em que o acusado estiver

presente e o direito de recorrer quando estiver em desacordo.

No processo penal a defesa apresenta-se sob dois aspectos: a

defesa técnica e a autodefesa. A primeira, exercida por meio de advogado, é

indisponível ao acusado por ser garantia constitucional a ele assegurada. 81 A

segunda é um direito disponível, com a possibilidade de o réu ser interrogado e

presenciar a todos os atos introdutórios.

Segundo Demercian e Maluly 82.

O direito de defesa dever ser visto em seu duplo aspecto: o subjetivo, consistente na faculdade de, em abstrato, infirmar a imputação deduzida; e o objetivo, que conduz a defesa concretamente exercida, consubstanciada na auto defesa (por meio do interrogatório, participação em audiência, etc.), defesa técnica (direito de ser defendido por profissional habilitado) e direito de produzir provas lícitas, direito de ver as provas apreciadas, e em suma, influir no convencimento do julgador (assegurado no axioma in dubio pro reo).

A ampla defesa encontra-se intimamente ligada ao principio do

contraditório, porém mesmo com influências recíprocas estes princípios não se

confundem, o contraditório se manifesta em relação a ambas às partes, já a defesa,

diz respeito apenas ao acusado83.

1.3.2.4 Princípio da Verdade Real

A função punitiva do Estado deve ser direcionada à pessoa que

verdadeiramente cometeu o crime, desta forma, o processo penal deve ser dirigido à

verificação e descoberta da verdade real ( também colocada como verdade material

ou substancial), como fundamento da sentença.84

Segundo Avólio 85, o princípio da verdade real “diz respeito ao

81 O art. 133 da Constituição Federal. Dispõe “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.82 DEMERCIAN, Pedro Henrique ; MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 3 ed. Rio de Janeiro : Forense. 2005, p. 20-21.83 BADARÓ, 2000, p.38 e 39.84 TOURINHO FILHO, 2004, p.1785 AVÓLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3 ed., rev., ampl. e atual. em face das leis 9246/96 e 10.217/2001 e jurisprudência. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2003. p.38.

34

poder dever inquisitivo do juiz penal, tendo como objeto a demonstração da

existência do crime e da autoria. A prova penal é assim, uma reconstrução histórica,

devendo o juiz pesquisar além da convergência das partes sobre os fatos, a fim de

conhecer a realidade e a verdade dos fatos”.

A importância da liberdade concedida ao juiz na busca da

verdade real, durante o litígio penal, é apontada por José Frederico Marques86 ao

citar Jean Patarin. Afirma o autor que:

A defesa da sociedade e o interesse da repressão exigem que se empreguem todos os meios para a descoberta do culpado e para a aquisição de exato conhecimento de todas as circunstâncias da infração, além disso, no Direito Penal moderno, acrescenta-se à necessidade de informação, igualmente completa e segura, sobre a personalidade do culpado, a fim de individualizar-se a pena, ou mesmo adaptar-se a sanção às possibilidades de reeducação do delinqüente conforme o que preconizam as doutrinas da defesa social. Por fim, os interesses ameaçados pela persecução penal não são menos dignos de atenção.

Nestes termos, o processo penal e a atividade probatória

devem ser baseados na busca incessante da verdade, aproximando-se tanto quanto

possível da reconstrução do fato, das circunstâncias relevantes, possibilitando que o

julgador forme seu convencimento e decida sobre o caso em análise. 87

1.3.2.5 Princípio do Livre Convencimento ou Persuasão Racional

O princípio do livre convencimento, hoje consagrado pela

doutrina processual como a mais recomendável forma de valoração probatória, está

expressamente disposto no art. 157 do Código de Processo Penal que dispõe, in

verbis: “O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova”.

Significa que o juiz não mais fica preso ao formalismo da lei,

sendo que vai embasar suas decisões pautado nas provas existentes nos autos,

levando em conta sua livre convicção pessoal motivada.

86 MARQUES, 2000, v.2. p.351-352 87 NASCIMENTO, José Carlos do. As provas produzidas por meios ilícitos e sua admissibilidade no Processo Penal. Jus Navigandi, Teresina, v. 9, n. 779, 21 ago. 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7180 Acesso em: 18 jan. 2007.

35

Para Cintra, Grinover e Dinamarco.88, tal princípio está situado

entre o sistema da prova legal e o sistema do julgamento secumdum conscientiam.

“O primeiro (prova legal) significa atribuir aos elementos probatórios valor inalterável

e prefixado, que o juiz aplica mecanicamente. O segundo coloca-se no pólo oposto,

o juiz pode decidir com base na prova dos autos, mas também sem provas, e até

mesmo contra a prova”, julga os fatos sem a necessidade de motivação. Já o livre

convencimento leva o juiz a pesar o que lhe pareça mais correto e de acordo com a

motivação lógica apontada na sua decisão.

Nesse sentido, deve o juiz obrigatoriamente fundamentar sua

decisão, sob pena de nulidade, pois o livre convencimento não se dá de forma

arbitrária, é motivado devendo o magistrado respeitar as normas legais e as

máximas de experiência. 89

Pelo princípio do livre convencimento, o juiz é livre para

escolher a prova que julgar necessária à formação de sua convicção, livre para

aceitá-la e valorá-la de acordo com o que lhe parecer mais adequado, sendo, para

tanto, obrigado a justificar e fundamentar sua decisão.

1.3.2.6 Princípio da Inadmissibilidade da Prova Ilícita

O princípio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios

ilícitos assumiu nova dimensão após a promulgação da Constituição de 1988, que

estabeleceu a proibição das provas ilícitas como direito e garantia fundamental.

Assim dispõe a Constituição Federal em seu art. 5°, LVI “são inadmissíveis, no

processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

Pretendeu-se, através desse princípio, vedar a utilização no

processo das provas obtidas com infringência às normas de direito material,

sobretudo as de índole constitucional, uma vez que na Constituição Federal estão

assegurados os direitos e garantias inerentes às liberdades públicas.

Ao instituir a vedação das provas ilícitas como uma garantia

constitucional, o legislador pretendeu estabelecer uma limitação ao princípio da

liberdade probatória, o juiz será livre para investigar os fatos alegados na denúncia,

88 CINTRA ; GRINOVER ; DINAMARCO, 2000, p.67-68.89 CINTRA ; GRINOVER ; DINAMARCO, loc.cit.

36

encontrando restrições pautadas em um processo ético, movido por princípios

políticos e sociais voltados à manutenção de um Estado Democrático de Direito. 90

Violada alguma das garantias fundamentais para a produção

da prova, será esta considerada ilícita. Como estas provas não são admitidas no

processo, serão elas ineficazes, pois não existirão juridicamente. E se por ventura

uma sentença for fundamentada com base em provas ilícitas, será decretada nula.

São várias as inviolabilidades asseguradas pela Constituição Federal que

resguardam os direitos fundamentais, dentre elas, destaca Fernandes:91:

Resguardo dos direito fundamentais da pessoa: inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem (at. 5° XII), inviolabilidade de domicílio (art. 5°, XV), das comunicações em geral e de dados (art. 5 , XII). A Carta Magna protege, ainda, o homem contra a tortura ou tratamento desumano ou degradante (art. 5 ,III), e ampara o preso em sua integridade física e moral (art. 5 , XLIX).

A vedação da prova pode ser de natureza processual ou

material92, no próximo capítulo o tema será mais bem desenvolvido.

1.4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

1.4.1 Breve Apontamento Histórico

A evolução do principio da proporcionalidade acompanha a

história dos direitos fundamentais e vai surgir como conseqüência da passagem de

um Estado de Polícia para o Estado de Direito, quando é invocado para limitar o

poder coativo dos monarcas. A origem do princípio da proporcionalidade, segundo

Barros93, consiste na idéia de assegurar a liberdade individual em razão do arbítrio

do Estado. Essa concepção de que existem direitos oponíveis aos do Estado e que

este deveria respeitá-lo, decorreu das teorias jusnaturalistas formuladas na

Inglaterra nos séculos XVII e XVIII.

Embora tenha sido a Inglaterra o primeiro país a ter

90 RANGEL, 2003, p.106.91 FERNADES, 2005, p. 91.92 A prova será ilegítima quando violar normas de caráter processual e prova ilícita quanto à ofensa for ao direto material.93 BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle das leis restritivas de direitos fundamentais. 3.ed. Brasília : Brasília Jurídica, 2003...p. 37.

37

documentos escritos sobre os direitos humanos, foi na Europa Continental e nos

Estados Unidos que o princípio adquiriu índole constitucional, por motivos históricos

e pela consagração de suas Constituições escritas, contrariamente do que ocorreu

na Inglaterra que optou pela common law.94

Foi especialmente no campo do direito administrativo, na antiga

Alemanha Federal, que a proporcionalidade ganhou expressão. O termo

“proporcional” é empregado por Von Berg em 1802, ao tratar da limitação da

liberdade em face do direito de polícia, referindo-se à indenização da vítima pelo

prejuízo sofrido. Neste período, o cânone foi utilizado apenas para tratar da

regulamentação da atividade policial, com intuito de evitar os excessos de sua

prática. 95

O direcionamento para o campo constitucional ocorreu após a

segunda guerra mundial, quando os tribunais alemães começaram a proferir

decisões limitando o pode do legislador em formular leis que restringissem os

direitos fundamentais. Com a promulgação da Lei Fundamental de Bon, o princípio

da proporcionalidade teve seu marco inaugural na esfera constitucional, ao coroar os

direitos e garantias fundamentais como centro da ordem jurídica. Para julgamento

das decisões, a Corte Suprema Alemã passou a referir-se com freqüência aos

termos “excessivo”, “inadequado”, “necessariamente exigível” e “proibição de

“excesso”, a uma clara alusão ao princípio da proporcionalidade”. 96

Segundo Avólio97, a concepção atual do termo

proporcionalidade, é, pois,

dotada de um sentido técnico no direito público e teoria do direito germânicos, correspondente a uma limitação do poder estatal em benefício da garantia de integridade física e moral dos que lhe são sub-rogados. Confunde-se, ademais, com a origem do Estado democrático de direito, nascido sob a égide de uma fundamental entendida como um documento formalizador do propósito de se manter o equilíbrio entre os diversos poderes que formam o Estado e o respeito mútuo entre este e aqueles a ele submetidos, a quem são

94 BARROS, 2003, p. 39-4095AVÓLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas Ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. p.57.96 BARROS, 2003. p. 47.97 AVÓLIO, 2003, p.57.

38

reconhecidos direitos inalienáveis.

No sistema jurídico brasileiro, o princípio foi recepcionado a

partir da influencia da doutrina portuguesa, a qual retirou seu conceito nas fontes do

direito alemão.

1.4.2 Terminologia, Compreensão e Conceito de Proporcionalidade

Cabe ressaltar, inicialmente as várias denominações do

princípio em estudo. A doutrina traz diferentes nomenclaturas, há autores que

identificam a proporcionalidade como princípio da razoabilidade, ou ainda como

princípio da proibição do excesso.

Os americanos utilizam o termo razoabilidade. O termo tem

significado amplo e qualifica tudo que seja conforme a razão. Este princípio traz a

idéia de adequação, idoneidade, aceitabilidade, logicidade, equidade, tão somente o

que é admissível. Tendo significados ainda de bom senso, prudência e moderação98.

Já os alemães empregam, indiscriminadamente, a expressão

proporcionalidade ou proibição de excessos, num sentido mais literal e limitado, pois

representa a ponderação o equilíbrio de interesses conflitantes. 99

Rezek Neto100 ressalta que os dois princípios são distintos, uma

vez que “o principio da proporcionalidade é vinculado à racionalidade ou

racionalização dos atos estatais enquanto a razoabilidade é um principio negativo

capaz tão somente de evidenciar que dado ato administrativo não cumpre sua

finalidade por absurdo ou arbitrário”.

O Supremo Tribunal Federal, conforme sua jurisprudência trata

os dois princípios similarmente, não fazendo distinções de relevo, usando mais

freqüentemente a expressão proporcionalidade, porém não deixando de fazer

referencia à razoabilidade101.

Por ser expressão de maior uso nos sistemas de direito

98 BARROS, op.cit., p.71-7299 BARROS, 2003, p. 71100 REZEK NETO, Chade. O princípio da proporcionalidade e sua aplicação no direito brasileiro. Revista Jurídica da Universidade de Franca. Franca, v.9, jul. p. 65-69.2002. p.66101 BARROS, 2003, p.75-76.

39

europeus, para este trabalho será utilizado o termo proporcionalidade.

O princípio da proporcionalidade é, antes de tudo, uma forma

de concretizar direitos, um princípio de ponderação. Chamado também pelos

alemães de teoria do balanceamento ou preponderância de interesses. 102

Representa uma garantia do indivíduo em face dos abusos praticados no exercício

do poder; “é instrumento utilíssimo a serviço da efetividade dos direitos

fundamentais e, especialmente, da liberdade”. 103

Bonavides104, respaldado no entendimento de Pierre Muller,

considera o princípio da proporcionalidade como um dos princípios mais fáceis de

compreender do que definir, estabelecendo provisoriamente duas noções de

proporcionalidade. A primeira, de caráter amplo, considera a proporcionalidade uma

regra fundamental em que todos devem obedecer, sejam os que exercem como os

que padecem de poder. A segunda, numa acepção estrita, caracteriza a

proporcionalidade na presunção de existência da relação adequada entre o fim

determinado e os meios empregados para atingi-los. Nessa acepção, respalda que

sempre os meios aplicados não atinjam o fim proposto, ele será arbitrário ou

desproporcional ao resultado.

Tal princípio pressupõe o contexto de uma relação meio-fim, na

qual o fim é o alvo ou desígnio perseguido pela limitação, e o meio são as próprias

decisões normativas, legislativas ou judiciais, que pretende viabilizar o alcance do

fim pretendido. “O princípio ordena que a relação entre o fim que se pretende

alcançar e o meio utilizado deve ser proporcional, racional, não excessivo e não

arbitrário. Isso significa que entre meio e fim deve haver uma relação adequada,

necessária e racional ou proporcional” 105.

Na compreensão de Luiz Roberto Barroso106, o principio da

102 RODRIGUES, Rebeca Mignac de Barros. Do princípio da proporcionalidade e sua aplicação quanto à utilização de provas ilícitas no processo penal. Revista da Escola Superior da Magistratura de Pernambuco. Pernambuco, v. 10, n. 21, p. 407-434, jan./jun. 2005. p.413.103 GIMENO, Vicente apud FERNADES, 2005, p.52.104 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, 17.ed. São Paulo : Malheiros, 2005. p. 392-393.105ANTUNES, Roberta Pacheco. O princípio da proporcionalidade e sua aplicabilidade na problemática das provas ilícitas em matéria criminal. Jus Navigandi, Teresina, v. 10, n. 999, 27 mar. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8153. Acesso em: 27 mar. 2006.106 BARROSO, Luiz Roberto. Princípio da razoabilidade e proporcionalidade no direito constitucional. Cadernos de direito constitucional e ciência política. v.23. [s.l.] : Revista dos Tribunais. p.65-78, 1998. p.69

40

proporcionalidade é:

Um parâmetro de valoração dos atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça. Sendo mais fácil de ser sentido do que conceituado o princípio se dilui em um conjunto de proposições que não o libertam de uma dimensão excessivamente subjetiva. É; razoável o que seja conforme a razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia, o que não seja arbitrário e caprichoso, o que corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento ou lugar.

A maioria dos doutrinadores relaciona o princípio da

proporcionalidade à limitação do poder estatal diante das garantias fundamentais,

sendo permitida apenas quando o ato for comprovadamente adequado, necessário e

estritamente proporcional, decidindo de maneira menos gravosa a restrição a ser

adotada. 107

Assim, o cânone é caracterizado quando na solução de

conflitos, o legislador utiliza os meios adequados e exigíveis ao fim almejado. “O

meio é adequado quando, com seu auxílio, se pode promover o resultado desejado,

ele e exigível quando o legislador não poderia ter escolhido outro igualmente eficaz,

mas que seria um meio não prejudicial ou portador de uma limitação menos

perceptível a direito fundamental”. 108

Acerca da compreensão da proporcionalidade, Helenilson Silva

Pontes, citado por Pamplona109, em sua dissertação, assevera que:

Terminologicamente contém uma noção de proporção, adequação, medida justa, e apropriada à necessidade exigida pelo caso presente. Proporção, no entanto é um conceito relacional, ou seja, diz-se que algo é proporcional quando guarda uma adequada relação com alguma coisa a qual está ligada. Em suma, a idéia de proporcionalidade contém um apelo à prudência na determinação da

107 OPILHAR, Maria Carolina Milani Caldas. A prova ilícita e o princípio da proporcionalidade no Direito Processual Penal Brasileiro. 2004, Dissertação de (Mestrado) - Universidade do Vale do Itajaí, Curso de Mestrado em Ciência Jurídica. p. 53.108 BROCHADO, Maria. O princípio da proporcionalidade e o devido processo legal. Revista de Informação Legislativa. Brasília, [s.d.]. p. 132.109 PAMPLONA, Otávio Roberto A prova ilícita e o principio da proporcionalidade no processo penal brasileiro. 2003, Dissertação de (Mestrado) - Universidade do Vale do Itajaí, Curso de Mestrado em Direito. p. 125.

41

adequada relação entre as coisas. Nesse sentido, vale apontar que a palavra alemã para designar a proporcionalidade (Verhältniismässigkeit) deixa claro o conteúdo semântico da expressão, pois o termo Verhältnis, naquela língua, significa proporção e também relação.

A proporcionalidade permite a coexistência entre princípios

divergentes contidos na Constituição Federal em uma relação direta de implicação,

com sopesamento de valores, colocando em ordem a aplicação para que haja o

maior atendimento a certos princípios, com a mínima desatenção aos demais.

Na atuação do princípio da proporcionalidade, a doutrina

aponta dois pressupostos fundamentais; um, formal, o da legalidade e outro,

material, o da justificativa teleológica. Segundo Fernandes110, em razão do princípio

da legalidade, a restrição a direito fundamental não poderia ser aceita sem prévia lei,

elaborada por órgão competente, colocada e interpretada de forma escrita. Do

pressuposto da justificativa teleológica, procede que só existe razão para a limitação

de direito individual se o objetivo for concretizar valores relevantes do sistema.

Há ainda os requisitos extrínsecos e intrínsecos para a

aplicação da proporcionalidade. Aquele corresponde à verificação da judicialidade (o

órgão do qual é proferida a decisão judicial deve ser competente e respeitar as

hipóteses de restrição da lei) e motivação. E este, a adequação, necessidade e a

proporcionalidade em sentido estrito.

1.4.3 Elementos Parciais do Princípio da Proporcionalidade

O cânone proporcionalidade tem por conteúdo três elementos

ou princípios parciais, quais sejam da adequação, da necessidade ou exigibilidade e

da proporcionalidade em sentido estrito. Os três elementos juntos darão a densidade

indispensável para o alcance da funcionalidade pretendida pelo operador do direto.

1.4.3.1 Subprincípio da Adequação

O juízo de adequação da medida adotada para alcançar o fim

pretendido deve ser o primeiro considerado na verificação da proporcionalidade. O

controle intrínseco da legislação no que respeita a relação meio e fim restringe-se ao

110 FERNADES, 2005, p.56.

42

seguinte questionamento: o meio contribui para a obtenção do resultado pretendido?

Assim, no tocante à adequação, exclui-se com este questionamento o grau de

eficácia dos meios escolhidos para o alcance dos objetivos. 111

Sendo o princípio da proporcionalidade balizador da conduta

do legislador quando estejam em causa limitações a direitos fundamentais, a

adequação dos meios aos fins faz-se necessária para que a medida restritiva seja

correta para atingir o objetivo pretendido, pois se não for será considerada

inconstitucional. 112

Guerra Filho113 destaca que o subprincípio da adequação

determina que dentro de uma situação concreta o meio empregado deve ser o mais

adequado para atender o fim estabelecido. Não será permitida restrição a um direito

fundamental se o meio utilizado para dirimir o conflito não for idôneo à consecução

do resultado pretendido.

A adequação, segundo Fernandes114, deve ser verificada de

maneira objetiva, como adequação qualitativa ou quantitativa, e de forma subjetiva,

atrelada à idoneidade em face do sujeito passivo. Segundo o autor:

A medida deve, assim, ostentar qualidade essencial que a habilite a alcançar o fim pretendido (adequação qualitativa), a sua duração ou intensidade deve ser condizente com sua finalidade (adequação quantitativa) e deve a medida ser dirigida a um indivíduo sobre o qual incidam as circunstâncias exigíveis para ser atuada (adequação subjetiva).

A análise da adequação é feita de maneira excludente

(enfoque negativo), pois, caso se verifique que o meio empregado não atinja o fim

desejado, sua utilização dever ser imediatamente repelida e afastada.

1.4.3.2 Subprincípio da Necessidade ou Exigibilidade

Pelo subprincípio da necessidade ou exigibilidade, a medida a 111 BARROS, 2003, p.78. A eficácia do meio escolhido, menos gravoso ao cidadão, recai sobre a esfera da necessidade.112 BARROS, loc.cit.113 GUERRA FILHO, Willis Santiago. O Princípio da Proporcionalidade em Direito Constitucional e em Direito Privado no Brasil. 09 out. 2005. Disponível em http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=701 Acesso em 20 nov. 2006.114 FERNANDES, 2005, p. 57.

43

ser adotada não deve exceder os limites indispensáveis ao fim legítimo que almeja

atingir. O pressuposto deste princípio é o de que “a medida restritiva seja

indispensável para a conservação do próprio ou de outro Direito fundamental e que

não posa ser substituída por outra igualmente eficaz e menos gravosa”.115

Seguindo esse entendimento, Fernandes116 revela que não

basta o meio ser adequado, o mais idôneo, deve ainda oferecer a menor restrição

possível. Para não ser desproporcional, é preciso que o meio utilizado seja

necessário ao objetivo traçado, verificando-se as alternativas colocadas para se

atingir o fim. Desta forma, dentre as opções colocadas, a quem exerce o poder , não

deve ser escolhida a que trará menores benefícios, ou seja, maiores restrições à

obtenção do resultado, deixando de lado outras que atingiriam o fim de maneira

menos danosa. A análise da necessidade é realizada por um juízo positivo, por meio

do qual se indica, dentre vários meios para se alcançar um objetivo, aquele que é

mais adequado.

O objetivo deste princípio é verificar se a opção do legislador

era, no instante da escolha, além de imprescindível para assegurar o exercício do

direito fundamental objeto da restrição, o instrumento mais eficaz e menos oneroso

ao indivíduo.

1.4.2.3 Subprincípio da Proporcionalidade em Sentido Estrito

A proporcionalidade em sentido estrito refere-se a um sistema

de valoração, no sentido de que muitas vezes, para se garantir um direito é

necessário restringir outro, situação juridicamente aceitável somente após a

realização um estudo teleológico, no qual se conclua que o direito restringido

apresenta conteúdo valorativo inferior ao direito que está sendo juridicamente

protegido por determinada norma. 117 Desta forma, o juízo de proporcionalidade

respeita o equilíbrio entre o fim pretendido e o meio utilizado, ou seja, o resultado

pretendido com a restrição aos direitos fundamentais de determinado indivíduo deve

ser proporcional à carga coativa do mesmo. 118

115 BARROS, 2003, p.81.116 FERNADES, op.cit. p.58.117 SOUZA, Carlos Afonso Pereira de ; SAMPAIO, Cristina Regina Pinheiro. O princípio da razoabilidade e o princípio da proporcionalidade: uma abordagem constitucional. Disponível em: http://www.pucrio.br/sobrepuc/depto/direito/pet_jur/cafpatrz.html Acesso em 1 dez. 2006. p. 15118 Assim, para Raquel Stum citada por Carlos Souza e Cristina Sampaio, o juízo de ponderação entre os pesos

44

No entendimento de Guerra Filho119, o princípio da

proporcionalidade em sentido estrito determina que:

se estabeleça uma correspondência entre o fim a ser alcançado por uma disposição normativa e o meio empregado, a qual deve ser juridicamente o melhor possível. Isto significa, acima de tudo, que não se fira o conteúdo essencial, de direito fundamental, com o desrespeito intolerável do valor/princípio que o define: dignidade da pessoa humana. Significa que pelo estado de colisão potencial que se encontram, vão implicar o princípio da proporcionalidade.

Assim, mesmo havendo desvantagens, individual ou

coletivamente consideradas, trazidas pela disposição normativa em apreço, as

vantagens que traz para outra ordem superam as desvantagens oriundas da

limitação que impôs a escolha.

O princípio da proporcionalidade será observado se

preponderar o valor de maior importância, evitando-se, desta maneira, que se

imponham restrições desproporcionais aos direitos fundamentais, se comparadas ao

fim a ser atingido. Assim, “o meio, adequado e necessário para determinado fim, é

justificado se o valor por ele resguardado prepondera sobre o valor protegido pelo

direito a ser restringido”120. Ressalta Barros121, que enquanto o princípio da

necessidade representa a otimização das possibilidades fáticas, o principio da

proporcionalidade em sentido estrito representa a otimização das possibilidades

jurídicas.

1.4.4 Aplicabilidade do Princípio da Proporcionalidade

Quanto à sua destinação, a essência do principio da

proporcionalidade é a mesma de uma Constituição que pretenda desempenhar o

papel que lhe está reservado em um Estado Democrático de Direito: a preservação

dos direitos fundamentais. Neste contexto, a proporcionalidade funciona como

verdadeiro principio orientador do direito.

dos direitos e bens contrapostos deve ter uma medida que permita alcançar a melhor proporção entre os meios e os fins. [...] Decorre da natureza dos princípios válidos a otimização das possibilidades fáticas e jurídicas de uma determinada situação.” SOUZA ; SAMPAIO, p. 15.119 GUERRA FILHO, 2005, p. 59.120 FERNADES, 2005, p.58121 BARROS, 2003, p.85

45

Quando dois ou mais princípios constitucionais estiverem em

conflito “o critério de solução da proporcionalidade fará o sopesamento, decidindo

qual deles será utilizado no caso concreto, sem que isto signifique a eliminação dos

demais, ordenando assim o sistema jurídico”. 122

Segundo Bonavides123, uma das aplicações mais proveitosas

contidas na proporcionalidade é aquela que o faz instrumento de interpretação, cada

vez que ocorre a colisão entre direitos fundamentais e se busca uma solução

conciliadora para o conflito.

Por ser o princípio da proporcionalidade considerado

constitutivo e, logo, imanente em relação a todos os ramos do direito, ele pode ser

transposto ao processo penal. Segundo Avólio124, a proporcionalidade considera o

Direito Processual Penal como “Direito Constitucional aplicado”, o que exige dos

juízes respeito ao principio toda vez que aplicarem medidas restritivas de acordo

com ordenamento processual penal.

No âmbito deste estudo, em consonância com Avólio125, a

aplicação da proporcionalidade consiste numa construção doutrinária e

jurisprudencial que se coloca nos sistemas de inadmissibilidade das provas obtidas

por meios ilícitos, permitindo, em face de uma vedação probatória, que se proceda,

a uma escolha, no caso concreto, entre os valores constitucionalmente relevantes

em conflito.

1.4.5 Previsão Constitucional da Proporcionalidade

No ordenamento jurídico brasileiro o princípio da

proporcionalidade não está explicitamente previsto, apresenta-se, pois, de forma

implícita. O reconhecimento em nossa Constituição ocorre pela opção do legislador

por um Estado Democrático de Direito, e pela consagração de um rol de direitos

fundamentais e princípios jurídicos contraditórios entre si, que já garantem a

importância deste princípio no ordenamento jurídico, não necessitando este derivar

de outro.126 122 RODRIGUES, 2005, p. 414 e 415.123 BONAVIDES, 2005. p. 425.124 AVÓLIO, 2003, p.60.125 AVÓLIO, 2003, p.60.126 REZEK NETO, 2003, p.66.

46

A Constituição Federal de 1988 assegurou o Estado de Direito,

consagrando de forma expressa a dignidade da pessoa humana como um princípio

fundamental do Estado brasileiro (Art. 1º), além de aumentar em relação às

constituições anteriores o rol de direitos e garantias fundamentais, “conferindo-lhes

aplicabilidade imediata (art 5º, § 1º) e ainda a garantia de expansão expressa no art.

5º § 2º”.127 Este artigo preceitua que: “Os direitos e garantias expressos nessa

Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela

adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil

seja parte”.

Seguindo este entendimento Barros128 menciona que:

O principio da proporcionalidade, como uma das várias idéias fundantes da Constituição, tem acento justamente aí, nesse contexto normativo no qual estão inseridos os direitos fundamentais e os mecanismos da respectiva proteção sua aparição se dá a titulo de garantia especial, traduzida na exigência de que toda intervenção estatal, se de por necessidade, de forma adequada e na justa medida, objetivando a eficácia e otimização dos vários direitos fundamentais concorrentes.

Dentre estas idéias principais, o foco principal do principio da

proporcionalidade contempla ainda o princípio da reserva legal (art. 5°, II, CF),

entendido como submissão de uma determinada matéria (como por exemplo os

direitos fundamentais) unicamente à lei formal. A proporcionalidade ao

complementar e incorporar este princípio, a ele se incorpora, de tal forma a

converte-se no princípio da reserva legal proporcional ou devido processo legal

substancial. 129

Guerra Filho130 adota o posicionamento de que a

proporcionalidade deriva do princípio do devido processo legal, expresso no art. 5°,

LIV131 da CF/88, ressaltando que a vinculação entre aquele princípio e este vem

sendo considerado de tal forma tanto em sede doutrinária como jurisprudencial, que

“é comum ter-se o princípio incrustado naquele donde se assentariam as diversas

127 BARROS, 2003, p. 95.128 BARROS, 2003, p.95.129 BARROS, 2003, p.96.130 WILLIS, 2005.131 “Ninguém será privado de liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”

47

garantias processuais, de índole constitucional, a saber, o princípio do devido

processo legal”.

As duas linhas de construção constitucional acima apontadas

convergem para o mesmo resultado, a proporcionalidade integra a Constituição

devendo ser aplicada pelo legislador em qualquer caso,

“a primeira linha, mais inspirada na doutrina alemã, vislumbrará o principio como inerente ao Estado de Direito, integrando de modo implícito o sistema, como um princípio não escrito. De outro lado, os que optarem pela doutrina norte-americana, pretenderão extraí-lo da cláusula do devido processo legal, sustentando que a proporcionalidade leis torna-se exigível por conta do caráter substantivo que se deve dar a norma”132.

Assim, no que concerne respectivamente aos direitos

individuais, coletivos e públicos, o principio da proporcionalidade é Constitucional,

embora não esteja expresso em seu texto as disposições individuais a seu respeito.

132 BARROSO, 1998, p.77.

48

CAPÍTULO 2

A PROVA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

2.1 INTRODUÇÃO AO TEMA

É sabido que uma das finalidades do processo é buscar uma

decisão justa e baseada na verdade dos fatos ou o mais próximo possível deles133.

Nesses termos a prova representa, no entender de Tornaghi134, "o conjunto de atos

praticados pelas partes, por terceiros (testemunhas, peritos etc.) e até pelo juiz, para

averiguar a verdade e formar a convicção desse último (julgador)".

O assunto é, certamente, um dos mais importantes em matéria

processual, não só pelo valor da reconstrução dos fatos, “mas também para o

estudo das íntimas e complexas relações entre o processo e as estruturas sociais”. 135

O direito à prova decorre como garantia implícita do devido

processo legal. Liga-se aos direitos de ação e de defesa. Conforme Petry, “o direito

à prova é uma decorrência lógica do direito constitucional de ação. O cidadão, ao

requerer a tutela jurisdicional, necessita apresentar as provas preexistentes ao

ajuizamento do processo e postular a produção de outras cabíveis”. 136

Assim, “sendo a prova o instrumento de formação da convicção

do magistrado, inclui-se o direito à sua produção no direito de acesso ao judiciário,

constituindo, portanto, uma garantia fundamental, tanto de defesa, quanto de

acusação”. 137

Serão abordados neste capítulo os principais elementos 133 . NASCIMENTO, 2005.134 TORNAGHI, Helio. Curso de processo penal. v.1, 8 ed. São Paulo : Saraiva, 1991. p. 265. 135 GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1997. p. 13.136 PETRY, Vinícius Daniel. A prova ilícita. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 146, 29 nov. 2003. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4534 . Acesso em: 23 jan. 2007137 ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Provas ilícitas e proporcionalidade. Rio de Janeiro: Lúmen júris. 2007. p.88.

49

norteadores da teoria da prova em matéria criminal, conceitos, finalidades, objeto,

meios, ônus, classificação, procedimentos, além das restrições inerentes a

probatórias, dentre as quais estão as provas ilícitas e as ilícitas por derivação.

2.2 A PROVA EM MATÉRIA CRIMINAL

A expressão prova vem do latim probatio, que significa, prova,

verificação, experimentação, reconhecimento de um fato, uma coisa, e deriva do

verbo probare. Vem de probos, que significa bom, reto, honrado. Assim, o que

resulta provado é aquilo que é bom, correto. 138

No âmbito jurídico, a prova pode ser conceituada como a forma

instrumental pela qual os sujeitos processuais (autor, réu e juiz) comprovam os fatos

pertencentes à lide, ”ou seja, os fatos deduzidos pelas partes como fundamento do

exercício dos direitos de ação e de defesa”.139

Na terminologia processual140, a palavra prova pode apresentar

vários significados, todos correlatos entre si, podendo ser usada como sinônimo da

atividade probatória, como meio de prova, ou ainda como resultado da prova.

Para Gomes Filho141, a prova indica, de maneira mais ampla, o

conjunto de atividades realizadas pelo magistrado e pelas partes na reconstrução

dos fatos que constituem a base das pretensões deduzidas e da decisão proferida,

pode também referir-se aos instrumentos pelos quais as informações pertinentes

aos fatos são introduzidas no processo e, ainda, dar nome ao resultado dessas

atividades.

Da mesma forma, destaca Nucci142:

Há, fundamentalmente, três sentidos para o termo prova: a) ato de

138 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da Prova no Processo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p 156.139 RANGEL, 2005, p. 413.140 Segundo Prado, “Na esfera criminal, esse conjunto de atos deve convencer de tal forma o julgador, que seja capaz de sobrelevar o principio constitucional da presunção de inocência, assertiva obviamente válida em caso de sentença condenatória, porquanto para a prolação de sentença absolutória basta à dúvida”.

PRADO, Leandro Cadenas. Provas ilícitas no processo penal: Teoria da Interpretação dos Tribunais Superiores. Niterói : Impetus, 2006. p. 03.141 GOMES FILHO, 1997. p. 41-42.142 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p.363.

50

provar: é o processo pelo qual se verifica a exatidão ou a verdade do fato alegado pela parte no processo [...]; b) meio: trata-se do instrumento pelo qual se demonstra a verdade de algo [...]; c) resultado da ação de provar: é o produto extraído da análise dos instrumentos de prova oferecidos, demonstrando a verdade de um fato. [...]

Na mesma linha, Grinover et all143 ressaltam que o termo prova

não é unívoco, apresentando no processo três acepções. Em um primeiro sentido, a

prova indica o conjunto de atos processuais praticados para buscar a verdade dos

fatos e formar o convencimento do magistrado. Num segundo, indica o resultado

dessa atividade e num terceiro, direciona para os meios de prova.

Há doutrinadores que contemplam a prova sob um duplo

aspecto: o objetivo e o subjetivo: “o primeiro consiste no instrumento ou meio hábil

para demonstrar-se a existência de um fato, enquanto o segundo é a certeza

originada quanto ao fato, em razão da produção do instrumento de prova,

aparecendo, assim, como convicção formada no espírito do juiz em torno do fato

demonstrado” 144.

Segundo Malatesta145 , a prova pode ser vista em dois

aspectos, seja quanto à sua natureza e à sua produção, seja quanto ao efeito que

origina na mente daquele ante quem tenha sido produzida. Por esse segundo

aspecto, equivale à certeza, à probabilidade e à credibilidade.

De uma forma geral, pode-se expor que a prova é elemento de

convicção fornecido ao juiz e com os quais ele poderá restaurar os fatos

investigados estabelecendo uma certeza jurídica, o que equivale dizer a uma

probabilidade. Ela é a “determinação mediata, por meio de razões que suscitam a

mais alta probabilidade ou geram a mais aproximada convicção da verdade”.146

Nesse sentido, a prova tem por finalidade a formação do

convencimento do julgador e das partes sobre a existência dos fatos e da causa.

143 GRINOVER, Ada Pellegrini ; FERNANDES, Antonio Scarance ; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 8.ed., rev. e atual. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 141-142.144 PAMPLONA, 2003. p.08145 DEI MALATESTA, Nicola Framarino. A lógica das provas em matéria criminal. Campinas : Bookseller, 2003. p. 81.146 BADARÓ, 2003, p. 156.

51

Tem como destinatário principal o juiz, que dela necessita para formar seu

convencimento a respeito da verdade dos fatos narrados no processo e desta forma

estampar a própria convicção na sentença. Mas também, é de interesse das partes,

que são seus destinatários indiretos, que delas necessitam para aceitar como justa a

decisão proferida.147

Portanto, a prova tem uma dupla finalidade, formar o

convencimento do juiz sobre o que se alega e embasar a decisão final da demanda

perante a sociedade.

A prova é, assim, a constatação do thema probandum148 , ou

seja, a constatação do fato, do acontecimento, que deve ser conhecido pelo juiz. O

fato a ser provado, seja ele principal ou secundário, e que necessita de

comprovação, constitui o objeto da prova. Portanto, todas aquelas circunstâncias

relevantes, os fatos, os acontecimentos, que exijam comprovação e são úteis para

formar o convencimento de juiz, constituem o objeto da prova.

Segundo Greco Filho149, nem todos os fatos devem ser

submetidos à atividade probatória, devem constar no processo somente aqueles

pertinente à lide e que provocam interesse da parte em demonstrá-los, já os fatos

não relacionados com a causa, os chamados impertinentes, devem ser refutados

como prova pelo juiz150. Além de ser pertinente ao processo, o fato deve ser

relevante a ponto de influenciar em diferentes graus a decisão do magistrado.

Como regra geral no processo penal, todos os fatos devem ser

provados, porém há exceções. Dentre os fatos que não necessitam de prova estão

147 TOURINHO FILHO, 2004, p.490.148 “O thema probandum é o conjunto de todos os fatos principais ou acessórios de interesse para a decisão do juiz e que exigem verificação”.

AQUINO, José Carlos G. Xavier de; NALINI, José Renato. Manual de processo penal. 2. ed., rev. e atual. São Paulo : Saraiva, 2005. p.209. 149 GRECO FILHO, 1997, p.197.150 No mesmo entendimento, Frederico Marques expõe que “os fatos que não pertencem ao litígio e que relação alguma apresentam com o objeto da acusação, consideram-se fatos sem pertinência, e que, portanto, devem ser excluídos do âmbito da prova in concreto”. MARQUES, 2000, v.2, p. 332.

52

os fatos notórios151, os evidentes152, as presunções legais153, os inúteis154 e os

relativos ao direito155.

Excepcionalmente, o direito (a lei material) pode ser objeto de

prova, em se tratando “de direito municipal, estadual, estrangeiro ou

consuetudinário, o juiz pode determinar que a parte a quem aproveite lhe faça prova

do teor e da vigência”156.

Entretanto, no processo penal157, os acontecimentos,

controvertidos ou não, necessitam ser provados, em razão do princípio da verdade

real e devido processo legal, pois, mesmo que o acusado confesse todos os fatos

imputados na denúncia, sua confissão não tem valor absoluto, devendo assim ser

confrontada com os demais elementos probatórios existentes no processo158.

Diferente do processo civil, que trata de direitos disponíveis, os

fatos incontroversos não podem ser deixados de lado e devem ser analisados como

elementos de prova, uma vez que os direitos que são tutelados pelo processo penal

são indisponíveis: de um lado está a liberdade de locomoção do acusado e de outro

o interesse da sociedade na punição do acusado.

Neste contexto, sendo os fatos o objeto da prova, cuja

finalidade é a formação da convicção do magistrado, cumpre ressaltar que sua

utilização deve ocorrer através de meios judicialmente aceitos.

Para Rangel159, os meios de prova:

são todos aqueles que o juiz, direta ou indiretamente, utiliza para

151 “Fatos notórios são aqueles cujo conhecimento faz parte da cultura normal e própria de determinada esfera social no temo em que ocorrer a decisão”.

ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. 3. ed. Atual. e ampl. São Paulo : Saraiva, 1994. p.26.152 Os fatos evidentes são as verdades axiomáticas do conhecimento. ARANHA, op.cit., p. 25153 A presunção legal é a conclusão decorrente de lei, podendo ser absoluta (não admite prova em contrário) ou relativa (podem ser afastadas por provas que as contradizem) ARANHA, op.cit., p. 25.154 Inúteis são os fatos que não influem na decisão, em nenhum sentido, sendo fatos supérfluos e não devem ser admitidos como prova. . ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. p. 26155 O direito, decorrente de normas de âmbito federal, não deve ser objeto de prova, uma vez que deve ser de conhecimento do julgador.156 GRECO FILHO, 1997, p.198.157 RANGEL, 2005, p. 414.158 Assim dispõe o art. 197 do CPP: “O valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância”.159 RANGEL, 2005, p. 415.

53

conhecer a verdade dos fatos, estejam eles previstos em lei o não. Em outras palavras, é o caminho utilizado pelo magistrado para formar a sua convicção acerca da verdade dos fatos ou coisas que as partes alegam. 160

O meio para exercer a atividade probatória, é, assim, o

instrumento que se usa para demonstrar o que se alega, não existindo, em regra,

limitações para o uso desta faculdade, sempre no intuito de alcançar a verdade dos

fatos, garantindo acima de tudo a ampla defesa e o contraditório. 161 A partir deste

pressuposto, vige no processo penal a liberdade probatória, com as exceções

enumeradas na legislação, que estabelecem de forma específica alguns casos.

O Código de Processo Penal elenca alguns meios de provas e

suas peculiaridades, os relacionados na seguinte ordem162:

O exame de corpo de delito e as perícias em geral (arts. 158 a 184); o interrogatório do acusado (arts. 185 196); a confissão (arts. 197 a 200); as perguntas ao ofendido (arts. 202 a 225); o reconhecimento de pessoas ou coisas (arts. 226 a 228); a acareação (arts. 229 e 230); os documentos (arts. 231 a 238); e a busca e apreensão (arts. 240 a 250).

Importante salientar que os meios de prova não se exaurem

nas previsões enumeradas na lei, eles não precisam estar especificados de maneira

taxativa, bastando que não encontrem nela formas de proibição ou vedação.

Portanto, os meios de prova podem ser tanto os enumerados na lei, quanto todos os

outros que forem legítimos, embora não previstos no ordenamento jurídico (as

chamadas provas inominadas)163.

As restrições probatórias serão objetos de análise do próximo

item deste trabalho.

Cabe ressaltar a quem cabe o ônus da prova no processo

penal. Sob o ponto de vista jurídico processual, pode-se dizer que o ônus é o 160 Nesse entendimento seguem NUCCI, 2006, p. 364, GRECO FILHO, 1997, p.199, TOURINHO FILHO, 2004, p. 491, DEMERCIAN ; MALULY, 2005, p.285 e MARQUES, 2000, v.2, p.333.161PRADO, 2006, p. 07.162 BARROS, Marco Antonio de. A busca da verdade no processo penal. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2002. p.110.163 Segundo Tourinho Filho (2004, p.17), “não há, em tese, nenhuma restrição aos meios de prova, com ressalva, apenas e tão somente, aqueles que reputam a moralidade ou atentam contra a dignidade da pessoa humana”.

54

encargo que as partes têm de provar as alegações que fizeram em seus pedidos.

Produzir provas constitui um ônus processual, pois, coloca as partes diante de uma

alternatividade, podem ou não produzir provas de acordo com sua conveniência.164

O ônus nesse contexto, não é uma obrigação, mas sim uma

faculdade processual. De acordo com Marco Antônio de Barros165, o ônus “' não se

trata de um dever, porque quem alegar e não comprovar a veracidade de sua

alegação não será punido por essa omissão, embora corra o risco de ter de suportar

o prejuízo que dela decorre”.

Portanto, a distinção entre ônus e obrigação está na

titularidade do interesse em relação a quem ocorrerá o prejuízo se não restar o fato

provado; quando há interesse alheio, existe obrigação; se for interesse próprio,

existe o ônus.

Segundo Badaró166, os ônus estão relacionados aos próprios

interesses, estão situados no campo das liberdades, pelo que representam posições

jurídicas lícitas, mesmo quando ocorre seu descumprimento. Diferentemente da

obrigação167 cujo descumprimento “gera uma situação de ilicitude e traz como

conseqüência a possibilidade de uma sanção Já o descumprimento do ônus

configura um ato licito e não é sancionado”.

Via de regra no processo penal (art 156168, CPP), o ônus da

prova cabe a acusação, que apresenta a imputação em juízo através da denúncia ou

queixa crime. Porém, embora não o faça de forma absoluta, pode o acusado chamar

para si o ônus probandi, v.g., quando alega algum fato em seu benefício, seja para

comprovar a exclusão da ilicitude ou exclusão da culpabilidade. 169

A maioria da doutrina170, ao estudar a divisão171 do ônus da

164 ARANHA, 1994, p.08.165 BARROS, 2002. p. 111.166 BADARÓ, 2003, p.176-177.167 A obrigação corresponde ao direito subjetivo, que é a faculdade, e assegurada por lei, de exigir determinada conduta de alguém, que, por lei ou ato ou negócio jurídico, está obrigado a observá-la. RANGEL, 2005, p. 456.168Art. 156 - A prova da alegação incumbirá a quem a fizer; mas o juiz poderá, no curso da instrução ou antes de proferir sentença, determinar, de ofício, diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.169 NUCCI, 2006, p. 367.170 ARANHA, 1994, p. 10, TOURINHO FILHO, 2004, p. 499-500, TORNAGHI, 1991, p. 308, DEMERCIAN, 2005 p.294, AQUINO, 2005, p 215. 171 Tomando por critério a conseqüência que decorre do não cumprimento do ônus, Goldschimidt, citado por Badaró, classifica o ônus em “perfeitos” e “menos perfeitos”. “'Há ônus perfeito quando o prejuízo que é uma

55

prova, perpetua que sua sedimentação é pautada no interesse da própria afirmação,

ou seja, o ônus incumbe a quem alega o fato.

Na visão de Camargo Aranha172,

[...] à acusação cabe o ônus de provar a existência de um fato penalmente ilícito, a sua realização pelo denunciado e a culpa (stritu sensu); a defesa compete demonstrar a inexistência de dolo, causas extintivas de punibilidade, causas excludentes de antijuridicidade e eventuais excluidoras de culpabilidade.Resumindo:a) A cada uma das partes compete o ônus de fornecer as provas das alegações que fizeram.b) Em regra, ao autor compete à prova dos fatos constitutivos, enquanto ao réu a dos fatos extintivos, impeditivos, ou modificativos.c) O juiz pode determinar, de ofício, as diligências probatórias que entender necessárias para a apuração da verdade. [...]

No mesmo entendimento segue Aquino173, ressaltando que

deve o acusador, provar os fatos afirmados no pedido inicial, ou seja, os fatos

constitutivos, como a tipicidade e autoria. Ao acusado cabe provar durante o

contraditório, os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos. 174

Por fim, para concluir estes posicionamentos, o entendimento

de Tourinho Filho175:

Cabe, pois, à parte acusadora provar a existência do fato e demonstrar sua autoria, também lhe cabe demonstrar o elemento subjetivo que se traduz por dolo ou culpa. Se o réu goza de presunção de inocência, é evidente que a prova do crime, quer a parte objecti, quer a parte subject, deve ficar a cargo da acusação.

Divergente deste entendimento, que divide o ônus da prova

conseqüência de seu descumprimento ocorre necessária e inevitavelmente Um ônus é menos que perfeito quando os prejuízos que são a conseqüência de seu descumprimento se produzem somente arbitrio iudicis. Por fim, esclarece que não existem ônus completamente imperfeitos, posto que, quando uma omissão não pode acarretar prejuízos oara i nomitente, não há ônus nenhum”. BADARÓ, 2003, p.173.172 ARANHA, 1994,. p. 14.173 AQUINO, 2005, p. 210.174 “Extintivos são os fatos que fazem cessar a relação jurídica – prescrição, decadência, perdão, casamento da ofendida, etc. Impeditivos são aqueles que excluem o elemento da vontade livre e consciente, quando da prática do ato ilícito – coação irresistível, erro de fato. Modificativos, pro fim, são os fatos que se contrapões à relação jurídica litigiosa, portanto na exclusão de antijuridicidade”. AQUINO, loc.cit.175 TOURINHO FILHO, 2004, p.500.

56

entre acusação e defesa, Paulo Rangel176, assegura que há de se interpretar a regra

do ônus da prova não exclusivamente no art. 156 do CPP, mas sim, fazer uma

interpretação da lei ordinária de acordo com a Constituição e não o inverso, “sob

pena do ônus da culpa recair sobre o réu e não sobre quem lhe fez a imputação de

fato, proibida na lei penal”, segue o autor:

[...] se o Ministério Público tem que narrar um fato criminoso com toda as suas circunstâncias, o ônus de provar que este fato é típico [...]; é ilícito [...] e que não está açambarcado por nenhuma excludente de ilicitude e que o autor é culpável, ou seja, se possui as condições mínimas indispensáveis para atribuir-se-lhe esse fato, o que significa dizer, se está mentalmente são ou conhece a antijuridicidade do fato pertence-lhe. Não há como entregar ao réu, dentre de um Estado Constitucional dito Democrático de Direito e que tem como fundamentos a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III,CF), o ônus da prova de sua inocência.177

Neste diapasão, o ônus da prova é de incumbência do parquet,

que possui a liberdade de utilizar todos os meios legais e legítimos, para demonstrar

a veracidade dos fatos alegados, uma vez que insuficientes às imputações restará o

réu absolvido.

Se, no processo penal, o ônus da prova incumbe às partes,

não necessariamente deverá o julgador ficar inerte perante o processo. Poderá o

juiz, determinar, de ofício, a produção de provas para dirimir dúvidas provenientes

da instrução de forma a chegar ao verdadeiro conhecimento da verdade. 178

Sustenta Frederico Marque179, embasado no do disposto no art

156, in fine, CPP, “que enquanto não averiguada devidamente a matéria da

acusação ou da defesa, e existindo fonte de prova que possa ser explorada, deve o

juiz ordenar as diligências instrutórias que se fizerem necessárias”. No entanto, o

juiz deve aturar com cautela, mantendo sua imparcialidade e atuando de maneira

suplementar as partes, com o propósito de buscar, sempre a verdade real180

Em suma, para a análise do ônus da prova, o importante é 176 RANGEL, 2005, p. 455.177 RANGEL, Paulo. 2005, p. 455.178 PAMPLONA,, 2003, p.20.179 MARQUES, 2000, vol. 2, p. 349-50.180 No mesmo entendimento ARANHA, 1994, p.16.

57

defini-lo como uma faculdade jurídica181, em que a lei estabelece certas condutas

para que o sujeito possa obter um resultado favorável. Em outros termos, “para que

o sujeito onerado obtenha o resultado favorável, deverá praticar ato previsto no

ordenamento jurídico, sendo que a não realização da conduta implica a exclusão de

tal benefício, sem, contudo, configurar ato ilícito”. 182

Outro aspecto que merece ser analisado com referência a

teoria das provas é sua classificação. A respeito dela, por ser baseada em critérios

distintos, não encontramos na doutrina um entendimento consolidado. Utiliza-se no

trabalho, a doutrina183 que estabelece a classificação da prova em relação a três

critérios: quanto ao objeto, quanto ao sujeito e quanto à forma.

Quanto ao objeto, diz-se que a prova é direta ou indireta. Pode

ser direta, quando estiver relacionada ao próprio fato provando, quando não se

necessita de nenhum processo lógico para sua construção. “É aquela que

demonstra a existência do próprio fato narrado nos autos.” Já a prova indireta é

aquela que afirma outro fato, que não se confunde com o fato que está para ser

provado, mas que, por uma construção lógica, via raciocínio, chega-se ao fato que

se quer provar (os indícios são autenticas provas indiretas).184

Em relação ao sujeito185, a prova poder ser pessoal ou real. É

pessoal quando toda afirmativa é consciente e destina-se a mostrar a veracidade

dos fatos. É real quando se origina dos próprios vestígios deixados pelo crime186.

No tocante à forma, maneira como se apresenta em juízo à

veracidade das alegações, classificam-se como testemunhal, documental e material.

“A prova testemunhal é aquela feita por afirmação pessoal oral, e, em alguns casos,

expressamente previstos em lei, por escrito [...]. Documental é a prova produzida por

afirmação escrita ou gravada”.187 A forma material188, é obtida por um meio químico,

físico ou biológico que sirva como meio de condução ao fato a ser provado.

181 Faculdade jurídica é o campo de atuação livre do individuo, em que faz o que a lei manda ou deixa de fazer o que ela permite, como o escopo de satisfazer o interesse legítimo. RANGEL, 2005, p. 455.182 BADARÓ, 2003, p.173.183 Seguem essa corrente ARANHA, 1994, p. 22, RANGEL, 2005, p. 415, BARROS, 2002, p. 106-107.184 BARROS, 2002, p. 107.185 Entende-se por sujeito a pessoa ou coisa de quem ou de onde promana a prova.186 RANGEL 2005, p. 417.187 RANGEL loc.cit.188 ARANHA, 1994, p. 23.

58

Para se estabelecer à realização prática dos meios de prova,

de forma que alcancem mais rapidamente a certeza jurídica dos fatos objeto da lide,

tem-se o procedimento probatório. Na visão de Camargo Aranha, o procedimento

probatório “vem a ser a marcha dos atos processuais relativos à prova, na forma

prevista em lei e de maneira coordenada e concatenada”. 189

A doutrina190 não é dominante quanto à divisão das fases do

procedimento probatório, adota-se neste estudo o entendimento de que o

procedimento probatório ocorre em quatro fases: a proposição da prova, admissão

da prova, produção da prova e a valoração da prova.

A proposição da prova consiste num ato das partes, “por

intermédio da qual elas indicam os meios que pretendem provar o alegado para

obter a prestação jurisdicional desejada”191. A proposição está ligada ao momento

processual previsto para a indicação, se não indicada no instante correto, ocorrerá

preclusão.

No sistema processual penal brasileiro, normalmente192, as

provas devem ser introduzidas no processo através da denúncia ou queixa crime,

com as alegações preliminares, ou, então, com o libelo ou contrariedade. Nos arts.

41 e 399 de CPP vêm designados os momentos ou fases do processo em que deve

ser feito o pedido genérico de produção de provas, existindo, ainda, uma fase

complementar de requisição prevista no art. 499 CPP. 193

Requeridas as provas, passa-se à segunda fase, a verificação

pelo juiz de sua admissibilidade. “A admissibilidade da prova é ato processual

específico do juiz, que, por ele, examinando as provas propostas pelas partes e o

seu objeto, defere ou não a produção”194

189ARANHA, 1994, p. 33.190 Entendem que tem quatro fases: GRINOVER ; FERNANDES; GOMES FILHO, 2004, p. 500, RANGEL 2005, p. 456. Entendem que tem três GRECO FILHO, 1997, p. 207, MARQUES, 2000, vol.2, p. 259, ARANHA, 2004, p.33. Para esses últimos doutrinadores, o momento da avaliação da prova não se inclui no procedimento probatório.191 ARANHA, 1994, p. 33.192 A prova documental pode ser introduzida no processo em qualquer fase processual, com exceção das hipóteses previstas nos arts. 406 e 475 do CPP. PAMPLONA, 2003, p. 24.193 MARQUES, 2000, v.2, p. 365.194PAMPLONA, 2003, p. 36.

59

De acordo com Gomes Filhos195, a admissibilidade “consiste

numa valoração prévia feita pelo legislador, destinada a evitar que elementos de

fontes espúrias, ou meios de prova reputados inidôneos, tenham ingresso no

processo e sejam considerados pelos juiz na reconstrução dos fatos [...]”. Cabe

salientar, que no momento de análise da admissibilidade, deve o magistrado, ater-se

apenas na relevância, pertinência e ilicitudes do material probatório, não

manifestando qualquer juízo de valor sobre seu conteúdo.

A apreciação judicial poderá ser feita em qualquer momento

processual, com exceção da fase do art. 499 do CPP e do libelo ou contrariedade,

em que a admissibilidade deverá ser decidida de imediato.

Admitido os meios de prova, estes serão juntados ao processo,

se forem pré-existentes, ou passará a sua produção no decorrer do próprio

processo. A produção de prova, segundo Couture apud Aranha196, “vem a ser o

conjunto de atos processuais que é mister para trazer a juízo os diferentes

elementos de convicção oferecidos pelas partes”.

Nesta fase, as provas que foram indicadas pelas partes, são

submetidas ao contraditório, uma vez que a produção da prova é a própria valoração

do thema probandum feita pelas partes. 197

O momento derradeiro do procedimento probatório é o da

avaliação das provas. É neste instante que o juiz irá apreciar as provas e motivar

sua decisão para dar a cada um aquilo que lhe pertence. A avaliação é um ato

próprio do magistrado, “mediante o qual, examinando, pesando e estimando os

elementos oferecidos pelas partes, chega a uma conclusão sobre o alegado”.198

Entre os ordenamentos jurídicos conhecidos três foram os sistemas de avaliação de

provas adotados. São eles: o da íntima convicção, da prova legal e do livre

convencimento.

No sistema da intima convicção ou da certeza da moral do juiz, 195 GOMES FILHO, 1997, p.95.196 PAMPLONA, 2003, p. 37.197 Existem provas que não se produzem em juízo, mas sim no inquérito policial, são as chamadas provas não renováveis, como por exemplo, a prova pericial. Entretanto, as provas que são produzidas oralmente são chamadas de renováveis, pois podem ser realizadas tanto na fase do inquérito quanto em juízo, sendo assim submetidas ao contraditório. RANGEL, 2005, p. 458.198 ARANHA, 1994, p. 55.

60

o legislador impõe ao julgador a responsabilidade pela avaliação das provas, lhe

concedendo toda a liberdade para decidir de acordo com sua consciência. O juiz não

está obrigado a fundamentar sua decisão, podendo para tanto utilizar ou não as

provas contidas nos autos, bem como valer-se de sua experiência pessoal. O

“fundamento da sentença é a certeza moral do juiz. [...] é o seu sentimento íntimo

com base em qualquer prova ou experiência pessoal, expressos ou não no

processo. Não importa se há ou não provas nos autos”.199 É o sistema adotado nos

julgamentos do Tribunal do Júri em que os jurados decidem sem a necessidade de

fundamentar seu voto.

No sistema da prova legal, ou tarifada, o julgador manifesta a

decisão em conformidade com o valor legal de cada prova e não de acordo com a

convicção resultante delas. Cada uma das provas no processo tem “um valor certo,

constante e inalterado, preestabelecido pela norma, de tal sorte que ao juiz só é

permitida a apreciação dentro da eficácia que a lei lhe atribuiu.”200 O juiz é órgão

passivo, pois a ele é apenas atribuída a função de verificar o valor tarifado pela lei à

prova, reconhecendo-o na sentença, sem poder utilizar de sua convicção na

valoração da prova.

O terceiro sistema, do livre convencimento ou persuasão

racional, trata-se de uma conjugação dos dois sistemas anteriores. Ao juiz é

devolvido o livre arbítrio, a ampla liberdade para a apreciação de provas, valorando-

as de acordo com sua consciência. No entanto, o julgador deve motivar sua decisão,

que deve ser pautada em elementos de convencimento colhidos nos autos, não

podendo ignorar o conteúdo do material probatório nem tampouco as alegações

aduzidas pelas partes, sob pena de proferir decisão absolutamente nula. 201

O Código Processual Penal em vigor recepcionou o sistema do

livre convencimento motivado, dispondo em seu art. 157 que “o juiz formará sua

convicção pela livre apreciação da prova”. Nesse sentido, as provas não possuem

valor diferenciado, podendo o magistrado valorá-las de acordo com sua convicção,

desde que o faça motivadamente.

199 RANGEL, 2005, p. 459.200 ARANHA, 1994, p. 56.201 DEMERCIAN, 2005, p.296.

61

2.3 AS RESTRIÇÕES INERENTES A ATIVIDADE PROBATÓRIA

Como corolário do princípio da verdade real, vigora no

processo penal a liberdade probatória202, ou seja, se o juiz deve buscar sempre a

verdade dos fatos que lhe são apresentados, deve também ter toda a liberdade de

agir, com o fim de reconstruir os fatos praticados, e, assim, aplicar a norma jurídica

pertinente. 203

Porém, essa liberdade probatória, decorrente do princípio da

livre convicção e da busca da verdade real, não implica na aceitação de todo e

qualquer meio de prova, já que a verdade formal é legitimada pela observância dos

procedimentos que garantem às partes uma ampla participação na atividade

probatória, e limitam as provas produzidas em desacordo com esses padrões.

Assim, “o Estado de Direito deve, ao mesmo tempo, procurar averiguar a verdade e,

em situações de violações de seus parâmetros de conduta, limitar essa verdade

para instituir um sistema de respeito aos direitos fundamentais”. 204

Nesse sentido, o direito das partes de introduzirem no processo

as provas que entendam necessárias à demonstração dos fatos que assentam suas

pretensões, embora de índole constitucional, não é absoluto. Ao contrário, como

qualquer outro direito, a restrições provenientes da tutela que o ordenamento jurídico

concede a outros valores e interesses são igualmente merecedores de proteção. 205

Paulo Rangel206 também leva em consideração que o

fundamento para essa limitação está no fato de que a lei considera de maior valor a

proteção de certos interesses, do que a simples prova de um fato, mesmo que este

fato seja ilícito, “pois, os princípios constitucionais de garantia da pessoa humana

impedem que a procura da verdade utilize-se de meios e expedientes condenáveis

dentro de um Estado Democrático de Direito”.

202 “Esse princípio probatório está consagrado no artigo 155 do Código Processual Penal, o qual estabelece que os meios de provas serão irrestritos, com exceção ao estado civil das pessoas, onde deverão ser observadas as restrições às provas estabelecidas em lei.”

RANGEL, Ricardo Melchior de Barros A prova ilícita e a interceptação telefônica no Direito Processual Penal Brasileiro. Rio de Janeiro : Forense, 2000. p.51.203 RANGEL, 2005, p. 420.204 ÁVILA, 2007, p. 91.205 GOMES FILHO, 1997, p.91.206 RANGEL, 2005, p. 420.

62

Segundo Grinover207, o direito à prova, por estar inserido nas

garantias constitucionais de ação, defesa e contraditório, não é absoluto. Uma vez

que os direitos do homem não podem ser apreciados de forma absoluta, em razão

do princípio da conveniência das liberdades, pelo que não permite que qualquer

delas seja praticada de modo prejudicial à ordem pública e às liberdades alheias. Os

direitos individuais, com a transformação da sociedade, passaram a ser visto como

direito do homem inserido em sociedade. É a partir deste enfoque que se justificam

no Estado Social de Direito, tanto os direitos como suas limitações.

Em outra ordem de consideração, a processualista ressalta que

o limite à atividade probatória faz-se necessário porque o processo só pode ocorrer

dentro de uma escrupulosa regra moral, que rege a atividade do juiz e das partes. A

necessidade de limitação no processo penal torna-se mais nítida, já que o que está

em pauta é a liberdade individual.

Leandro Prado208 apresenta exemplos das principais limitações

quanto aos meios probatórios, são eles: a prova quanto ao estado de pessoa (art.

155 CPP); exame de corpo de delito obrigatório para quando o crime deixar

vestígios (art. 158 CPP), restrições de pessoas que não possam depor ou podem

deixar de fazê-lo (arts. 206 e 207, CPP) e a proibição de provas obtidas por meios

ilícitos (art. 5°, LVI, /88).

As restrições probatórias, como ressalta Gomes Filho209,

podem ter fundamentos, extraprocessuais, como acontece em relação à proibição

de introdução no processo de provas obtidas com violação aos direitos fundamentais

ou processuais, quando se excluem dos autos as provas que podem levar o julgador

a uma conclusão errônea, como no caso das provas impertinentes, irrelevantes etc.

Neste panorama, em que o direito à prova não é absoluto,

encontrando limitações no escopo dos direitos e garantias fundamentais, além das

estipuladas na lei processual, é que torna-se relevante o estudo das provas ilícitas e

ilícitas por derivação, as quais serão objeto dos próximos itens deste trabalho.

207GRINOVER ; FERNANDES, 2004, p. 152-153.208 PRADO, 2006, p.07.209 GOMES FILHO, 1997, p.93.

63

2.4 A PROVA ILÍCITA

O estudo da prova ilícita vem ganhando destaque entre as

preocupações fundamentais do direito processual. Em razão do grande avanço

tecnológico, a vida privada, a intimidade, a honra e a dignidade da pessoa humana,

tornaram-se mais vulneráveis. Estes fatores são importantes para que ao legislador

seja cuidadoso, quando na outorga de mecanismos hábeis ao eficiente combate à

criminalidade, não autorize invasões desmedidas na vida das pessoas. 210

Importante salientar, que não há unanimidade, na doutrina

pátria, a respeito do tema, inclusive sobre a terminologia utilizada para o instituto em

questão. Quanto à nomenclatura, os autores utilizam-se das expressões “prova

proibida”, “prova ilegal”, “prova ilicitamente obtida”, “restrições probatórias”, “prova

vedada”, “prova ilícita”, e, ainda, “prova ilicitamente obtida”. 211

Camargo Aranha212 utiliza para o tema em questão o termo

prova proibida, que “num conceito genérico, é toda aquela que é defesa, impedida

mediante uma sanção, impedida que se faça pelo direito. A que deva ser

conservada a distancia pelo ordenamento jurídico”. Por força do preceito

constitucional (art. 5°, LVI), são proibidas as provas obtidas de forma contrária à lei,

à moral, afrontadoras dos costumes e princípios gerais do direito. Considera que

quando a prova proibida transgredir uma norma de direito material fala-se em prova

ilícita e quando colidir com normas instrumentais chama-se prova ilegítima.

Nos ensinamentos de Paulo Rangel213, a prova ilícita enquadra-

se na categoria da prova vedada. A prova ilegal é gênero do qual a prova ilegítima,

ilícita e irregular são espécies. Conclui seu entendimento revelando que:

A prova ilícita é violadora do direito material, seja porque a norma proíbe aquele tipo de prova [...], seja porque permite, mas desde que se cumpra com o que a morna exige [...]. A prova ilegítima é aquela que é proibida pelo direito processual [...]. A prova irregular é aquela colhida com desrespeito às formalidades legais existentes, não obstante permitida por lei. (grifos no original)

210 FERNANDES, 2005, p. 89.211RABONEZE, Ricardo. Provas obtidas por meios ilícitos. 2.ed. rev. e ampl. Porto Alegre:Síntese, 1999. p 13.212 ARANHA, 1994, p. 43.213 RANGEL, 2005, p. 427.

64

Na doutrina brasileira a terminologia mais difundida é a

utilizada por Ada Pellegrini Grinover214, que por sua vez adota a conceituação de

Pietro Nuvolone, segundo ele, as provas ilícitas encontram-se na categoria das

provas vedadas ou ilegais, que compreendem as provas licitas propriamente ditas e

as ilegítimas. 215

Para Nuvolone, a prova é sempre vedada, tanto em sentido

absoluto, quanto em sentido relativo, quando desrespeitar normas legais ou

princípios gerais do direito, sendo estes de natureza processual ou material. A prova

é ilegal em sentido absoluto, quando o direito proíbe sua produção em qualquer

caso, assim, proíbe-se sua admissibilidade em juízo. Em sentido relativo, será

vedada quando o ordenamento jurídico, apesar de admitir o meio de prova,

condiciona sua legalidade à observância de certas formalidades216. A prova vedada é

o gênero, do qual são subespécies as provas ilícitas e ilegítimas.

Para a distinção das provas ilícitas e ilegítimas, deve ser

levada em consideração a natureza substancial ou processual da proibição. A

vedação tem natureza processual quando for imposta em função de interesses

concernentes à lógica e finalidade do processo; pelo contrário, tem natureza

substancial, quando, mesmo servindo a interesses processuais, é colocada de

maneira essencial em relação aos direitos e garantias fundamentais, independente

do processo. 217

De acordo com Scarance “a violação de uma vedação será

sempre ilegal, mas a violação de uma vedação de natureza substancial torna o ato

ilícito, enquanto a violação de impedimento de ordem processual faz com que o ato

seja ilegítimo”. 218

Neste contexto, é possível fazer a distinção entre as provas

ilícitas e ilegítimas. De acordo com os ensinamentos de Avólio.219

A prova ilegítima é aquela cuja colheita estaria ferindo normas de 214 AVÓLIO, 2003, p. 42.215 Revela a autora, que a importância desta nomenclatura, está no fato de que a expressão “vedada”, já indica a sua opção pela inadmissibilidade de utilização, no processo, das provas obtidas por meios ilícitos.216 GRINOVER, 2004, p.96.217 GRINOVER, op.cit., p.97.218 FERNANDES, 2005, p. 90.219 AVÓLIO, 2003, p. 42-43.

65

direito processual. [...]. A sanção para o descumprimento dessas normas encontra-se na própria lei processual. Então, tudo se resolve dentro do processo, segundo os esquemas processuais que determinam as formas e as modalidades de produção da prova, com a sanção correspondente a cada transgressão, que pode ser uma sanção de nulidade.Diversamente, por prova ilícita, ou ilicitamente obtida, é de se entender a prova colhida com a infração a normas ou princípios de direito material-sobretudo de direito constitucional, porque, [...] a problemática da prova ilícita se prende sempre a questão das liberdades públicas, onde estão assegurados os direitos e garantias atinentes à intimidade, à liberdade, à dignidade humana; [...]. Para a violação dessas normas, é o direito material que estabelece sanções próprias.

Pode-se observar que a prova será ilícita quando existir ofensa

à norma material ou a um princípio do direito positivo; e prova ilegítima quando

houver violação à norma processual. Por prova ilícita, em sentido estrito, entende-se

a prova colhida com infração às normas ou princípios elencados na Constituição

Federal e pelas leis, freqüentemente para a proteção das liberdades públicas, dos

direitos da personalidade e intimidade. 220

Assim, as provas ilícitas não surgem somente quando houver a

conduta descrita na norma penal incriminadora, mas também quando sua produção

transgredir os preceitos elencados na Constituição, principalmente os que se

referem às liberdades públicas, como a garantia à intimidade, honra, liberdade etc.221

Necessário salientar que as provas ilicitamente obtidas,

constituídas mediante violação a normas materiais ou a princípios gerais de direto,

podem, ao mesmo tempo, serem consideradas ilegítimas, no caso da lei processual

também impedir sua produção em juízo.

Independente do aspecto da natureza da violação da norma

para a constatação da ilicitude ou ilegitimidade, outra distinção inerente a estes

institutos, faz-se no momento da transgressão. Enquanto “na prova ilegítima a

ilegalidade ocorre no momento da produção no processo, a prova ilícita pressupõe

uma violação no momento da colheita da prova, anteriormente ou

220GRINOVER , 2004, p.99.221 PAMPLONA, 2003, p.69-70.

66

concomitantemente ao processo, mas sempre externamente a este”. 222

Desta forma, quando houver violação à norma material no

momento da colheita da prova, portanto, anteriormente ao procedimento probatório,

a prova será considerada ilícita. A ilegitimidade, por sua vez, é auferida se o vício

ocorrer no momento da produção ou inserção da prova no processo, em razão da

não obediência aos preceitos processuais estabelecidos.

Assim, são consideradas ilícitas as provas obtidas com

violação ao domicílio (art. 5°, XI, da CF/88), ao sigilo das comunicações telefônicas,

sem autorização judicial (art. 5°, XII, da CF/88 c/c art. 1° da Lei n 9.296/96); as

conseguidas mediante tortura e maus tratos (art. 5°, III, da CF/88), as colhidas com

desrespeito à intimidade (art. 5°, X, da CF/88). Já as ilegítimas são aquelas colhidas

com violação ao disposto nos arts. 207 c/c 210 c/c 226 c/c § 2 do art. 243, todos do

Código de Processo Penal.

2.4.1 Prova Ilícita e Constituição

A Constituição Federal de 1988 tratou do tema em seu art. 5 ,

LVI, ao dispor que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meio

ilícitos”. O referido dispositivo abarca todos os processos indistintamente, seja na

área administrativa, civil, penal ou outros ramos do direito, em qualquer processo

com a participação de particulares ou o Estado.

Tendo em vista a expressa vedação constitucional, não

poderão as partes que compõe uma lide, via de regra, utilizarem em seu favor,

provas ilicitamente colhidas.

A ilicitude probatória não é prevista somente para o processo,

pois quando a norma constitucional expressa o termo “no processo”, deve-se

interpretá-la de forma a incluir a inadmissibilidade ao inquérito policial e a qualquer

outra forma de investigação criminal. Uma vez que, se existe a restrição probatória

para proteger o acusado, faz-se mister estendê-la também ao indiciado, sob pena de

violação ao principio da isonomia.223

222 AVÓLIO, 2003, p. 43223 VILLELA JÚNIOR, Gerson Ney Ribeiro; LIMA, Janete Melo D´Albuquerque ; LIMA, Sárvia Silvana

Santos. Das provas ilícitas no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da proporcionalidade. Revista da Procuradoria do Estado do Acre, 2003. Disponível:

67

2.4.2 A (In) Admissibilidade das Provas Obtidas por Meios Ilícitos

O assunto relativo à admissibilidade das provas ilícitas no

processo penal tem ensejado, tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, várias

orientações a esse respeito, especialmente quando no ordenamento, inexiste norma

processual que declare sua inadmissibilidade. Pode-se dizer que são quatro as

principais teorias224, uma posicionando-se a favor da admissibilidade, duas contra e

a outra segue um caminho intermediário225.

O posicionamento que admite a prova ilícita parte do

pressuposto de que somente podem ser excluídas do processo as provas

transgressoras de normas instrumentais, ou seja, as provas consideradas ilegítimas,

uma vez que somente elas é que são passíveis de sanções especificamente

processuais.

Segundo Camargo Aranha226, para os seguidores dessa teoria:

A violação de uma norma material traz a sua sanção específica, que não é o afastamento do processo. Vale dizer: na prova ilícita reconhece-se a ofensa ao direito material, devendo ser aplicada ao ofensor à sanção correspondente a penalidade adequada; todavia, não pode ser afastada do processo, pois neste só podem ser rejeitadas as ofensas com sanção especificamente processual.

Conclui este entendimento227 que as provas obtidas por meios

ilícitos devem ser sempre reconhecidas pelo ordenamento jurídico como válidas e

eficazes, pois o que deve prevalecer é o interesse da justiça na busca pela verdade,

http://www.pge.ac.gov.br/biblioteca/revista/revista3/DAS%20pROVAS%20Ilicitas.pdf Acesso em: 20 de jan. de 2007. p. 173.224 GRINOVER, 2004, p.103-13; AVÓLIO, 2003, p.45-73. ARANHA, 1994, p.53-55.

LIMA, Marcellus Polastri. A prova penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 133, PAMPLONA, 2003, p. 71-73, FERNANDES, 2005, p. 90.225 Alguns autores referem-se a este tema apontando que as correstes de admissibilidade dividem-se em três: a teoria obstativa, a permissiva e teoria intermediária. Dentre os doutrinadores podemos citar:

VILLELA JÚNIOR, Gerson Ney Ribeiro ; LIMA, Janete Melo D´Albuquerque ; LIMA, Sárvia Silvana Santos. Das provas ilícitas no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da proporcionalidade. Revista

da Procuradoria do Estado do Acre, 2003. Disponível: http://www.pge.ac.gov.br/biblioteca/revista/revista3/DAS%20pROVAS%20Ilicitas.pdf Acesso em: 20 de jan. de 2007.

MEDEIROS, Adalcy Laurentino de. Utilização das provas ilícitas sob o manto do princípio da proporcionalidade. Revista Cearense Independente do Ministério Público, v. 5/6, n. 19/20, p. 15-26, out. 2003/jan. 2004. 226 ARANHA, 1994, p. 48.227 Antonio Scarance aponta como defensores desta teoria, Cordero, Tornaghi e Mendonça Lima. FERNANDES, 2005, p. 90.

68

onde a ilicitude na obtenção da prova não deve ter a capacidade de retirar o valor

que esta possui, como elemento essencial à formação do convencimento do

julgador. Não obstante a validade e eficácia das aludidas provas, o infrator ficará

sujeito às infrações correspondentes ao ilícito cometido e o teor do elemento

probatório deverá servir como meio de prova. 228

Para a segunda teoria, totalmente contrária à primeira, o

ordenamento jurídico é uma unidade, e por ser assim, não é possível concordar que

uma prova ilícita, vedada pela Constituição Federal ou por lei substancial, possa ser

aceita no âmbito processual.

Entendem que, se a prova ilícita, afronta ao direito em seu

universo, não deve ser admitida no processo, mesmo que fira o direito instrumenta.

Não se pode admitir que seja possível que o mesmo fato seja objeto de julgamentos

diferentes: aceitar ou não o uso da prova, apenas porque se dividiu o direito em

ramos autônomos. O ilícito, desde que reconhecido, contamina todo o direito e não

somente partes separadas. 229

A terceira teoria230 parte do pressuposto de que toda prova

obtida de forma ilícita atenta contra a Constituição, por atingirem valores

fundamentais do indivíduo, inseridos no capítulo dos direitos e garantias

fundamentais. 231

Esta doutrina, conforme Grinover232 sustenta que:

A prova ilícita deve ser rejeitada, mesmo que inexista norma processual que a considere inadmissível: e sua rejeição se deve fazer por inconstitucionalidade, sempre que através de seu colhimento venha a ser atingida norma constitucional expressa, ou até mesmo um princípio geral da Constituição. Isto especialmente nas constituições que estabeleçam um critério amplo quanto ao reconhecimento dos direitos e garantias fundamentais.

Assim, toda vez que a prova for colhida com violação às

228 VILLELA JÚNIOR, LIMA, J.; LIMA, S. 2007, p. 168.229 ARANHA, 1994, p. 48.230 Antonio Scarance aponta como defensores desta teoria, Capelletti, Vogoriti e Comoglio. FERNANDES, loc.cit., além da própria Ada Pellegrini Grinover.231 ARANHA, o.cit., p. 49.232 GRINOVER, 2004, p. 111.

69

liberdades públicas, será fulminada pela inconstitucionalidade, não devendo

prevalecer em qualquer campo do direito, não importando qual a natureza de sua

violação.

Por fim, a última corrente procura buscar um equilíbrio, não

defende nem a inadmissibilidade absoluta da prova ilícita, nem tampouco sua

admissibilidade absoluta. A admissão das provas produzidas com violação às regras

Constitucionais, é permitida somente em situações excepcionais e graves, quando,

no caso, objetiva-se proteger valores mais relevantes daqueles infringidos na

colheita da prova e também os direitos constitucionalmente assegurados. 233

Tal corrente reconhece234, a princípio, a inconstitucionalidade

da prova produzida ilicitamente, entretanto, cortejando-a com o malefício provocado

pelo criminoso à sociedade, estabelece um juízo de admissibilidade ou não.

2.4.3 Efeito Processual do Reconhecimento da Prova Ilícita

A Constituição brasileira considera inadmissível no processo as

provas obtidas por meios ilícitos, porém não estabelece de forma explicita a

conseqüência do ingresso no processo de uma prova ilícita já admitida pelo

magistrado.

Todavia, baseando-se nos princípios gerais, relativos aos

direitos e garantias fundamentais, pode-se afirmar que a conseqüência da

introdução de provas ilicitamente obtidas no processo será a nulidade absoluta.

Segundo Grinover235, “as provas ilícitas, sendo consideradas pela Constituição

inadmissíveis, não são por esta tidas como prova. Trata-se de um não ato, de não

prova, que as reconduz à categoria de inexistência jurídica”.

Há de se ressaltar que a simples presença de uma prova ilícita

no processo não o vicia completamente de nulidade. O que ocorre é que a prova

vedada é considerada nula e deve ser desentranhada dos autos, devendo o restante

do processo, desde que não contaminado pela prova ilícita, permanecer válido, 233 FERNANDES, 2005, p. 90.234 É o chamado princípio da proporcionalidade, ao qual nos referimos no capítulo anterior. Através deste principio busca-se uma proporção entre a infringência da colheita da norma e os valores que a sociedade deve preservar, trazendo o juízo de admissibilidade ou não. Adotam esta teoria, Camargo Aranha, Barbosa Moreira, Moniz Aragão e Ségio Demoro Hamilton. LIMA, 2002, p. 134.235 GRINOVER, 2004, p. 169-70.

70

desde que restem outras provas autônomas e independentes.236

Lima237 destaca que ao ser verificada pelo juiz a presença de

uma prova ilícita no processo, a solução dependerá do momento de sua

constatação. Segue o autor mencionando que:

Uma vez verificada a ilicitude da prova no momento de sua aquisição para o processo, o juiz não pode aceitá-la, devendo indeferir sua produção ou rejeitar a aquisição, pois esta será uma prova inadmissível, nos termos do art. 5°, LVI, da Constituição Federal, mas caso tal ilicitude venha a ser constatada após a incorporação da prova ao processo, o juiz não poderá levá-la em conta para formar seu convencimento, devendo excluí-la do processo, dando-se o desentranhamento, por interpretação extensiva ao art. 145, VI [...]

Caso a prova não seja excluída pelo magistrado, caberá a

parte requerer seu desentranhamento.

Quando a prova ilícita foi obtida no inquérito policial, sendo

considerada fundamental para o oferecimento da denúncia, a solução do caso é o

trancamento com o arquivamento do procedimento, por falta de justa causa para a

continuidade da investigação, não impedindo que outro procedimento seja

instaurado em outros elementos de prova. No caso de existirem outras provas,

independentes, que tornem possível o prosseguimento da investigação, apenas

deve ser requerido o desentranhamento das provas ilícitas do inquérito policial. 238

Se a prova for obtida no curso da ação penal e os elementos

que a consubstanciam forem todos ilícitos, deve a mesma, ser trancada. A questão

da ilicitude poderá ser argüida em qualquer momento ou nas alegações finais, se

indeferido o pedido, o acusado poderá impetrar habeas corpus requerendo o

desentranhamento da prova antes da decisão. 239

No caso de sentença baseada em provas ilícitas, esta será

nula e poderá ser desconstituída via revisão criminal em que o juízo rescisório

poderá absolver o réu. Ou ainda, nos casos de habeas corpus, o tribunal deverá 236 PRADO, 2006, p. 10.237Não há no Código de Processo Penal norma genérica em relação à prova ilícita, neste caso aplica-se de forma extensiva o art. 145, VI, que determina o desentranhamento de documento falso. FERNANDES, 2005 p. 97. 238 FERNANDES, op.cit., p. 97-98. 239 FERNANDES, 2005, p. 98.

71

anular a sentença, indicando as provas viciadas e determinando seu

desentranhamento. 240

Em relação aos processos do tribunal do júri, verificam-se duas

situações: sendo as provas produzidas anteriormente a pronúncia, deverá o

magistrado determinar seu desentranhamento, não levando em conta seu conteúdo

para proferir a decisão. Porém, se a decisão de pronúncia nela tiver se apoiado, o

tribunal deverá, em habeas corpus ou recurso, determinar o desentranhamento e

anular o julgamento, para que outro ocorra, se outras provas lícitas existirem, haja

vista a impossibilidade de se aferir se a prova ilícita foi ou não considerada pelo

júri.241

2.4.4 A Prova Ilícita por Derivação

Questão atual e importante é a que se convencionou chamar

de prova ilícita por derivação. Trata-se das hipóteses em que a prova foi obtida de

maneira lícita, mas a partir de uma informação extraída de prova ilícita. A prova é

licita em si mesma, porém sua produção derivou de outra prova colhida com

infringência às normas processuais ou materiais.

Esta espécie de prova ilícita será abordada com maior

profundidade no próximo capítulo.

240 FERNANDES, op.cit., p. 171.241 FERNANDES, op.cit., p. 98-99.

72

CAPÍTULO 3

O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE APLICADO ÀS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL

3.1 A TÍTULO DE INTRODUÇÃO

Este capítulo tem o propósito de fornecer as linhas gerais para

a aplicação do princípio da proporcionalidade através de parâmetros para uma

interpretação mais razoável acerca da problemática da inadmissibilidade das provas

ilícitas derivadas no processo penal, tema este amplamente discutido na doutrina e

jurisprudência.

Quanto à admissibilidade ou não das provas contaminadas, a

doutrina brasileira divide-se em duas correntes, a primeira, defende a

inadmissibilidades destas provas, respaldada no propósito de que os vícios contidos

na prova ilícita se transmitem às provas que derivaram dela, acatando assim a teoria

dos frutos da árvore envenenada. A segunda corrente filia-se à posição de que as

provas ilícitas derivadas devem ser utilizadas, através da aplicação do princípio da

proporcionalidade, apenas em situações que beneficiem o réu.

Nos próximos itens trazem considerações acerca da prova

ilícita derivada, bem como cada posicionamento doutrinário e jurisprudencial, por

sua admissibilidade ou não no processo e ao final a posição do pesquisador.

Cabe ressaltar ainda, que será utilizado neste trabalho os

posicionamentos dos Tribunais Superiores e de Tribunais de Justiça.

3.2 A PROVA ILÍCITA DERIVADA E A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA

Como mencionado anteriormente a prova ilícita derivada é

aquela que foi colhida a partir de uma informação advinda de uma prova ilícita, no

entanto a ilicitude da prova originária contaminou todas as provas dela

subseqüentes.

73

Trata-se, por exemplo, dos casos em que mediante tortura o

acusado informa onde se encontra o produto do crime e este produto vem a ser

posteriormente apreendido de forma lícita e regular 242 ou de interceptação telefônica

sem autorização judicial, através da qual se venha a obter a indicação de

testemunha que, posteriormente, prestando depoimento de forma regular, confirme

os dados extraídos da referida interceptação telefônica. 243

Uma das teorias utilizadas para inadmitir a prova ilícita

derivada no processo é a “teoria dos frutos da árvore envenenada” (the fruits of

poison tree), doutrina norte americana na qual entende que a informação obtida

ilicitamente se projeta sobre as diligencias subseqüentes, aparentemente legais,

maculando-as e transmitindo-as a ilicitude da prova primária. 244

Segundo esta teoria, a prova ilícita é uma árvore que se

contaminou com uma mancha (um vício); em decorrência disto, todas as outras

provas que derivem desta árvore envenenada, ainda que sua obtenção tenha

ocorrido de forma lícita (prova considerada lícita em si mesma), também estariam

contaminadas com a ilicitude da prova originaria. 245

Esta doutrina foi desenvolvida pela Suprema Corte norte-

americana a partir do caso “Silversthorne Llumber Co. v. United States”, de 1920, as

Cortes passaram a não admitir as provas derivadas daquelas obtidas ilicitamente.

Entretanto, Lopes citado por Avólio246, adverte que apesar deste caso ser o pioneiro

no assunto, o termo the fruits of the poison tree somente foi utilizado expressamente

no caso “Nardone v. United States” em 1939, que tratava de provas obtidas

mediante gravações de conversas telefônicas do acusado sem a autorização

judicial. E somente em 1963, no caso “Wong Sun v. United States”, é que de forma

inovadora há menção a uma prova verbal, pois até então as exclusiorary rules

(regras de exclusão) baseavam-se em materiais físicos e tangíveis.

Assim, a doutrina norte-americana, concluiu que somente a

242 AVÓLIO, 2003, p.68.243 Exemplo retirado do texto de SOUZA, Alexandre Araújo. A inadmissibilidade, no processo penal, das provas obtidas por meios ilícitos: uma garantia absoluta? Disponível em: http://www.congressovirtualmprj.org.br/site/uploads/Provas-il%C3%ADcitas.doc Acesso em: 28 abr. 2006, p. 6.244LIMA, 2002, p. 65.245 ÁVILA, 2007, p.102.246 AVÓLIO, op.cit., p. 68-69.

74

vedação às provas ilícitas não seria suficiente para conter a má conduta dos

policiais, uma vez que eles poderiam através de uma prova obtida por meios ilícitos,

obter uma outra prova de maneira lícita.

Oportuno mencionar que o direito às regras de exclusão

(exclusionary rules) deriva de um conjunto de princípios, normas e práticas

jurisprudenciais, suscetíveis de serem referenciadas como o sistema americano de

restrições probatórias. Essas normas surgiram com uma intenção normativa própria,

com a intenção de primeiramente reprimir e prevenir as manifestações ilegais da

polícia criminal na interação com o cidadão e suas garantias constitucionais, e,

conseqüentemente, a estrita conformidade da sua atuação pertinente às atividades

processuais. 247

Porém, vale observar que a teoria dos frutos da árvore

envenenada não é absoluta, o próprio Supremo norte-americano, criador desta

doutrina, reconhece algumas limitações, também mencionadas pela doutrina

internacional. Neste contexto, destaca Grinover248:

Excepcionam-se da vedação probatória as provas derivadas da ilícita, quando a conexão entre umas e outra é tênue, de modo a não se colocarem as primárias e as secundárias. Como causa e efeito; ou, ainda, quando as provas derivadas da ilícita poderiam ser de qualquer modo ser descobertas de outra maneira. Fala-se no primeiro caso, em independet sourse e, no segundo, inevitable Discovery. Isso significa que se a prova ilícita não foi absolutamente determinante para o descobrimento das derivadas, ou se estar derivam de fonte própria, não ficam contaminadas e podem ser produzidas em juízo.

No primeiro caso citado, “limitação da fonte independente”, se

os fatos forem apurados através de uma violação às garantias constitucionais e

estes tivessem condições de serem provados por uma fonte independente da que

proporcionou seu conhecimento, poderia desta forma, ser utilizada como meio

probatório. É imprescindível para o reconhecimento desta limitação, a exigência da

demonstração cabal de que a prova a ser valorada pelo magistrado originou-se de

uma fonte autônoma, sem qualquer relação de dependência com a prova ilícita

247 DEMERCIAN, 2005, p.291-292.248 GRINOVER, 2004, p. 162-163.

75

original. 249

Já no segundo caso, “limitação da descoberta inevitável”,

sendo a prova decorrente de uma violação constitucional, ela poderia ser aceita no

processo, desde que pudesse, inevitavelmente, ser descoberta por outros meios

legais. Aqui não importa em saber se a prova foi derivada ou não, porque de

qualquer maneira ela é inconstitucional, resta saber se a referida prova seria

hipoteticamente descoberta através de outros meios jurídicos disponíveis. 250

No ordenamento jurídico brasileiro não há qualquer menção

legal acerca das provas ilícitas derivadas, sendo que a solução é buscada na

doutrina e jurisprudência.

Importante mencionar que há no Congresso Nacional projeto

de Lei nº 4.025/2001, referente a mudanças no Código de Processo Penal, em

relação às provas o projeto acrescenta ao art 157 o § 1º, cuja redação será: “são

também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, quando evidenciado o nexo

de causalidade entre umas e outras, e quando as derivadas não puderem ser

obtidas senão por meio das primeiras”.

Quanto aos efeitos processuais decorrentes da inclusão de

uma prova derivadas no processo, é importante salientar que a ilegalidade desta

prova não compromete a existência do processo, uma vez que não tenha sido

colhida com infringência às leis processuais, bem como não proporciona a

absolvição do acusado, se sua sentença foi baseada em outras provas produzidas

de forma lícita no processo. A prova derivada, não sendo a única e principal dos

autos, não contamina as demais dela não decorrentes. Neste caso, prevalece a

hipótese de não comunicabilidade entre as provas. 251

Se por ventura existir no processo uma prova derivada da

ilícita, deverá ocorrer o desentranhamento da mesma, procedimento idêntico ao que

ocorre na prova ilícita originária.

249 VILLELA JÚNIOR; LIMA, J.; LIMA, S., 2003, p.170.250 VILLELA JÚNIOR; LIMA, J.; LIMA, S., op.cit., p. 171.251 DEMERCIAN; MALULY, 2005, p. 291.

76

3.3 A INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

Quanto à (in) admissibilidade das provas ilícitas derivadas, a

doutrina não é uniforme, contudo, aqueles que preconizam a inadmissibilidade no

processo penal da provas ilícitas, vêem este entendimento às ilicitamente derivadas,

pois a elas se transferem a mácula da obtenção, apoiados na teoria americana dos

frutos da árvore envenenada.

No estudo das provas ilícitas na doutrina brasileira, Ada

Pellegrini Grinover252 é favorável à inadmissibilidade processual das provas ilícitas

derivadas, por entender que esta é a “posição mais sensível em relação às garantias

da pessoa humana, e conseqüentemente mais intransigente com os princípios e

normas constitucionais”. Para a autora de nada valeria o entendimento de que as

provas ilícitas são consideradas como garantias constitucionais, se houvesse a

possibilidade de admissibilidade das provas ilícitas derivadas.

Avólio253, analisando a questão da ilicitude da prova

contaminada, apoiado em Grinover e Trocker, sustenta que:

Não resta dúvida, como afirmou Ada Grinover, que a Constituição deixou em aberto a questão da admissibilidade das provas ilícitas por derivação. Mas nos afigura primordial, como pareceu a Troker, perquirir a ratio das normas violadas pelo comportamento contrário à Constituição. Desta forma, efetuando o mesmo raciocínio utilizado pelo autor peninsular, se a prova ilícita tomada por referência comprometer a proteção de valores fundamentais, como a vida, a integridade física, a privacidade ou a liberdade, essa ilicitude há de contaminar a prova dela referida, tornando-a ilícita por derivação, e, portanto, igualmente inadmissível no processo.

Nesse sentido, se a prova ilícita derivada ferir os direitos

fundamentais do acusado, ela será considerada inadmissível, não podendo ser

apreciada pelo julgador. Apesar da prova derivada não estar prevista na

Constituição, não pode ser admitida, em virtude ao efeito preventivo contido no art.

5º, LVI da Constituição Federal.

252 AVÓLIO, 2003, p. 71.253AVÓLIO, op.cit., 72-73.

77

Gomes Filho254 assinala ser impossível inicialmente negar a

contaminação das provas derivadas da inicial, não somente por um critério de

causalidade, mas, sobretudo em razão da finalidade com que são estabelecidas as

vedações. De nada valeriam as limitações de admissibilidade da prova, se, por via

derivada, as informações obtidas através de meios ilegais pudessem servir de

convencimento ao juiz, nesse contexto, cabe salientar o caráter profilático,

envidando condutas atentatórias aos direitos e garantias fundamentais e à própria

administração correta da justiça penal.

Outro doutrinador que adota posicionamento favorável à

inadmissibilidade da prova ilícita derivada é Scarance255, segundo ele, através da

vedação da provas contaminadas, leva-se em conta o resguardo à dignidade da

pessoa humana e a unidade o ordenamento jurídico. “Sua aceitação constituiria

estímulo à violação de direitos fundamentais da pessoa humana”.

À luz do sistema constitucional vigente, para Ricardo

Ranbonese256, a aceitação da provas ilícitas contaminadas não seria a melhor

solução, pois importaria na cessação da eficácia da garantia constitucional

preceituada no art. 5°, LV da Constituição Federal.

Segundo Ávila257, a inadmissibilidade da prova contaminada

não decorre do texto expresso na Constituição, mas sim de interpretação, como

propósito de “otimização da norma, de acordo com o incremento de proteção fática e

jurídica dos direitos fundamentais (princípio da máxima efetividade)”.

Sobre o tema das provas ilícitas derivadas, o Supremo Tribunal

Federal não tinha posição tranqüila até o ano de 1993. Posteriormente, em duas

decisões, HC 69.912/RS e HC 72.588/PB, o STF posicionou-se favorável à tese de

inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas.

O julgamento do Habeas corpus n 69.912-0258 RS discutiu de 254GOMES FILHO, 1997, p.110. Também entendem pela inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas no processo penal: TOURINHO FILHO, 2004, p. 498-99. RANGEL, 2000, p.84-85. Merece por hora, a referência de que alguns autores utilizam o princípio da proporcionalidade para admitir no processo as provas ilícitas derivadas em defesa do réu, tal questão será tratada no próximo item. 255FERNADES, 2005, p. 92-93.256RANBONESE, 1999, p. 37.257ÁVILA, 2007, p. 262.258 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas corpus 69.912-0-RS. Tribunal Pleno. Impetrante: Aluísio Martins. Impetrado: Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Brasília, 16 de

78

forma contundente a questão das provas ilícitas por derivação, decidindo por maioria

dos votos sua ineficácia. Como ressalta Ricardo Ranbonese259, este acórdão faz

uma análise detalhada sobre o assunto, quando o Tribunal, em segundo julgamento,

confirma a inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas.

Em primeiro julgamento, o Tribunal Pleno do Supremo

entendeu que na falta de lei que regulamentasse as interceptações telefônicas,

estas seriam consideradas ilícitas, porém as provas derivadas destas deveriam ser

aceitas no processo.

Participou como Relator do julgamento o Ministro Sepúlveda

Pertence afirmando que:

[...] vedar que se possa trazer ao processo a própria desgravação das conversas telefônicas, mas admitir que as informações nelas colhidas possam ser aproveitadas pela autoridade, que agiu ilicitamente, para chegar a outras provas, que sem tais informações, não colheria, evidentemente, é estimular, e não reprimir, a atividade ilícitas da escuta e gravação clandestina de conversas privadas.260

Com este posicionamento, o Ministro acolheu a tese de

contaminação enfatizando esta seria a única maneira “capaz de dar eficácia à

garantia constitucional da inadmissibilidade da prova ilícita”261. No mesmo sentido

votaram os Ministros Francisco Resek, Ilmar Galgão, Marco Aurélio e Celso Melo.

Como voto divergente o Ministro Carlos Velloso concordou com

a questão da ilicitude da prova originária, porém discordou da contaminação das

provas adquiridas a partir desta, por entender que restavam nos autos outras

elementos de prova que demonstravam que a condenação não ocorreu baseada

exclusivamente em provas ilícitas, não ensejando a nulidade do processo.

Acompanharam o voto divergente os Ministros Paulo Brossard, Luiz Callotti, Moreira

Alves e Sydney Sanches, Néri da Silveira e Octávio Galloti.

Inicialmente, o STF julgou pela maioria de 6 votos a 5, o

indeferimento do referido habeas corpus, tendendo a admissibilidade das provas

dezembro de 1993. Diário Oficial da União. Brasília, 25 de mar. de 1994.259 RANBONESE, 1999, p. 33.260 BRASIL, op.cit., p. 129-130.261 BRASIL, op.cit., p.129.

79

ilícitas derivadas. Ocorre que, este julgamento foi posteriormente anulado devido ao

impedimento do Ministro Néri da Silveira262. Realizado novo julgamento, a ordem foi

deferida pelo empate e como o Regimento Interno do STF (art. 150, § 3º) determina

que neste caso quem se beneficia é a defesa, desta forma, julgou-se pela

contaminação da provas derivadas das ilícitas.263

Assim, com o deferimento do habeas corpus abriu-se

precedente para o acolhimento da teoria americana do “The fruits of the poisouns

tree”, decidindo que a ilicitude da interceptação telefônica contaminou as

informações oriundas da escuta. Eis a emenda oficial do acórdão264:

EMENTA: Prova ilícita: escuta telefônica mediante autorização judicial: afirmação pela maioria da exigência de lei, até agora não editada, para que, ‘nas hipóteses e na forma’ por ela estabelecida, possa o juiz, nos termos do artigo 5º, XII, da Constituição, autorizar a interceptação de comunicação telefônica para fins de investigação criminal; não obstante, indeferimento inicial do habeas corpus pela soma dos votos, no total de seis, que, ou recusaram a tese da contaminação das provas decorrentes da escuta telefônica, indevidamente autorizada, ou entenderam ser impossível, na via processual do habeas corpus, verificar a existência de provas livres da contaminação e suficientes a sustentar a condenação questionada; nulidade da primeira decisão, dada a participação decisiva, no julgamento, de Ministro impedido (MS 21.750, 24.11.93, Velloso); conseqüente renovação do julgamento, no qual se deferiu a ordem pela prevalência dos cinco votos vencidos no anterior, no sentido de que a ilicitude da interceptação telefônica – à falta de lei que, nos termos constitucionais, venha a discipliná-la e viabilizá-la – contaminou, no caso, as demais provas, todas oriundas, direta ou indiretamente, das informações obtidas na escuta, nas quais se fundou a condenação do paciente. (grifo nosso)

Em outro julgamento, HC 72.558-1/PB, o STF consolidou, após

novas divergências, este entendimento, não admitindo a permanência no processo

das provas ilícitas derivadas, prevalecendo, assim, a tese da contaminação. Segue o

262O paciente entrou com mandado de segurança alegando seu impedimento, uma vez que seu filho teria atuado no processo como membro do Ministério Público.

VIÉGAS, Rommél Cruz. As provas ilícitas por derivação. Disponível em http://www.amma.com.br/conteudo.php?cat=2&id=0000000067 Acesso 13 abr. 2007. p. 26-46.263 BRASIL. Jurisprudência brasileira criminal 47. Provas ilícitas. Curitiba, Juruá, 2004. p. 31.264 BRASIL, 1994.

80

acórdão265:

EMENTA: HABEAS-CORPUS. CRIME QUALIFICADO DE EXPLORAÇÃO DE PRESTÍGIO (CP, ART. 357, PÁR. ÚNICO). CONJUNTO PROBATÓRIO FUNDADO, EXCLUSIVAMENTE, DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA, POR ORDEM JUDICIAL, PORÉM, PARA APURAR OUTROS FATOS (TRÁFICO DE ENTORPECENTES): VIOLAÇÃO DO ART. 5°, XII, DA CONSTITUIÇÃO. 1. O art. 5°, XII, da Constituição, que prevê, excepcionalmente, a violação do sigilo das comunicações telefônicas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, não é auto-aplicável: exige lei que estabeleça as hipóteses e a forma que permitam a autorização judicial. Precedentes. a) Enquanto a referida lei não for editada pelo Congresso Nacional, é considerada prova ilícita a obtida mediante quebra do sigilo das comunicações telefônicas, mesmo quando haja ordem judicial (CF, art. 5°, LVI). b) O art. 57, II, a, do Código Brasileiro de Telecomunicações não foi recepcionado pela atual Constituição (art. 5°, XII), a qual exige numerus clausus para a definição das hipóteses e formas pelas quais é legítima a violação do sigilo das comunicações telefônicas. 2. A garantia que a Constituição dá, até que a lei o defina, não distingue o telefone público do particular, ainda que instalado em interior de presídio, pois o bem jurídico protegido é a privacidade das pessoas, prerrogativa dogmática de todos os cidadãos. 3. As provas obtidas por meios ilícitos contaminam as que são exclusivamente delas decorrentes; tornam-se inadmissíveis no processo e não podem ensejar a investigação criminal e, com mais razão, a denúncia, a instrução e o julgamento (CF, art. 5°, LVI), ainda que tenha restado sobejamente comprovado, por meio delas, que o Juiz foi vítima das contumélias do paciente. 4. Inexistência, nos autos do processo-crime, de prova autônoma e não decorrente de prova ilícita, que permita o prosseguimento do processo. 5. Habeas-corpus conhecido e provido para trancar a ação penal instaurada contra o paciente, por maioria de 6 votos contra 5. (grifo nosso)

O referido writ foi impetrado por advogado que teve conversa

telefônica com seu cliente gravada através de escuta telefônica, autorizada pelo Juiz

de Direito da 5° Vara Criminal de Campina Grande/PB. A escuta foi deferida para

apurar, mediante interceptação telefônica, suspeita de tráfico de entorpecentes,

porém, na gravação foi apurado fato diverso do autorizado.

265 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Habeas corpus 72.558-1-PB. Tribunal Pleno. Impetrante: Antonio Pereira de Almeida Filho. Impetrado: Superior Tribunal de Justiça. . Relator: Ministro Maurício Corrêa. Brasília, 12 de junho de 1996. Diário Oficial da União. Brasília, 04 de ago. de 2000.

81

Em tal conversa o paciente requereu a seu cliente que

adiantasse os honorários para que pudesse, via colaboração do Juiz da 5° Vara

Criminal, conseguir sua liberdade, haja vista a facilitação pelo pagamento de

propina. A partir de tais afirmações foi instaurada sindicância pela Corregedoria

Geral de Justiça, aonde restou confirmada a ofensa ao dispositivo mencionado na

denúncia (exploração de prestígio, art. 357, parágrafo único do CPP). A prova que

possibilitou chegar a tal entendimento foi a própria gravação efetuada e outros

elementos que dela derivaram.

Participou como relator nesse julgamento o Ministro Maurício

Correa que votou pelo deferimento do Habeas corpus por entender que as provas

obtidas por meios ilícitos contaminaram as que são exclusivamente delas

decorrentes; tornam-se inadmissíveis no processo e não podem ensejar a

investigação criminal e, com mais razão, a denúncia, a instrução e o julgamento266.

No mesmo entendimento seguiram os Ministros Ilmar Galvão, Celso de Mello,

Sepúlveda Pertence e Fracisco Resek.

Votaram favoráveis à utilização da prova ilícita derivada, os

Ministros Carlos Velloso, Octávio Galloti, Sydney Sanches, Moreira Alves e Néri da

Silveira. Em suas argumentações, os Ministros reportaram-se aos votos proferidos

no Habeas corpus 69.912/RS para embasar a decisão, mencionando principalmente

que a adoção veemente da teoria americana pode servir de biombo encobridor de

delitos, haja vista o crescimento da violência e os crimes de narcotráfico.

Em decorrência da aposentadoria do Ministro Paulo Brossard,

adepto a não contaminação e a participação do Ministro Maurício Correa, o Plenário

da Corte Suprema modificou sua maioria (seis votos a cinco), adotando em relação

às provas derivadas a teoria dos frutos da árvore envenenada. 267

A tese foi acolhida em decisões posteriores e após tais

precedentes a questão não foi mais reexaminada e por apenas um voto a posição

do Supremo Tribunal Federal manteve-se pela inadmissibilidade das provas

contaminadas.

266 BRASIL, 1996, p. 296-310.267 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 5.ed. atual. c/ a Refor. do Judiciário EC nº 45. São Paulo: Atlas, 2005, p. 384.

82

Ao encontro do entendimento da Corte Suprema está o

posicionamento do Superior Tribunal de Justiça. Em recente julgado, caso de

repercussão nacional, o tribunal aplicou a teoria dos frutos da árvore envenenada

para desconsiderar prova obtida através de gravação clandestina entre cliente e

advogado. Segue a ementa268:

EMENTA: Advogado. Sigilo profissional/segredo (violação). Conversa privada entre advogado e cliente (gravação/impossibilidade). Prova(ilicitude/contaminação do todo). Exclusão dos autos (caso).Expressões injuriosas (emprego). Risca (determinação). 1. São invioláveis a intimidade, a vida privada e o sigilo das comunicações. Há normas constitucionais e normas infraconstitucionais que regem esses direitos. 2. Conversa pessoal e reservada entre advogado e cliente tem toda a proteção da lei, porquanto, entre outras reconhecidas garantias do advogado, está a inviolabilidade de suas comunicações. 3. Como estão proibidas de depor as pessoas que, em razão de profissão, devem guardar segredo, é inviolável a comunicação entre advogado e cliente. 4. Se há antinomia entre valor da liberdade e valor da segurança, a antinomia é solucionada a favor da liberdade. 5. É, portanto, ilícita a prova oriunda de conversa entre o advogado e o seu cliente. O processo não admite as provas obtidas por meios ilícitos. 6. Na hipótese, conquanto tenha a paciente concordado em conceder a entrevista ao programa de televisão, a conversa que haveria de ser reservada entre ela e um de seus advogados foi captada clandestinamente. Por revelar manifesta infração ética o ato de gravação – em razão de ser a comunicação entre a pessoa e seu defensor resguardada pelo sigilo funcional –, não poderia a fita ser juntada aos autos da ação penal. Afinal, a ilicitude presente em parte daquele registro alcança todo o conteúdo da fita, ainda que se admita tratar-se de entrevista voluntariamente gravada – a fruta ruim arruína o cesto. 7. A todos é assegurado, independentemente da natureza do crime, processo legítimo e legal, enfim, processo justo. 8. É defeso às partes e aos seus advogados empregar expressões injuriosas e, de igual forma, ao representante do Ministério Público. 9. Havendo o emprego de expressões injuriosas, cabe à autoridade judiciária mandar riscá-las. 10. Habeas corpus deferido para que seja desentranhada dos autos a prova ilícita. 11. Mandado expedido no sentido de que sejam riscadas as

268 BRASIL, Superior Tribunal De Justiça. Habeas Corpus 59.967/SP; T6 – Sexta Turma. Impetrante: Mário de Oliveira Filho e outro. Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Relator Ministro NILSON NAVES. Brasília 29 de junho de 2006. Diário de Justiça. Brasília, 25 de set. de 2006.

83

expressões injuriosas. (grifo nosso)

No caso em tela impetrou-se habeas corpus para desentranhar

dos autos fitas de gravação do programa “fantástico” da Rede Globo onde a

paciente aparece recebendo instruções de seu advogado. A conversa foi captada

clandestinamente, sem autorização da paciente ou seus defensores, desta forma

não poderia ter sido exibida, devido às garantias de sigilo profissional asseguradas

na relação cliente e advogado. Requereu-se a desconsideração da prova em toda

sua extensão, haja vista tratar-se de prova ilícita.

Funcionou como relator o Sr. Ministro Nilson Naves, destacou

em seu voto que a comunicação entre cliente e advogado merece respeito, sendo

inviolável o seu sigilo de acordo com o preceituado na Constituição Federal e Lei

Federal. Que o comportamento para efetuar a gravação, antes de efetivamente

iniciar a entrevista, foi ilícito, a ilicitude dali decorrente alcançou toda a entrevista,

ainda que gravada de maneira voluntária. Assim mencionou “é que a parte ruim

contamina, com sua nocividade, todas as outras partes da coisa [...] a fruta ruim

contamina o cesto. É algo semelhante a teoria americana do s “frutos da árvore

envenenada” [...], segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus

frutos”.269

Diante destes argumentos deferiu o writ baseando-se no fato

de que a contaminação da gravação clandestina estendeu-se aos demais trechos da

entrevista, tornando a prova ilícita por derivação, devendo esta ser desentranhadas

dos autos.

Os Ministros Paulo Carvalhido e Paulo Galloti votaram o

relator, sendo voto vencido o Ministro Paulo Medina, que alegou que apenas a parte

inicial da entrevista deveria ser retirada dos autos, devendo permanecer o restante

da entrevista, por não ter sido contaminada.

A partir desse posicionamento depreende-se que o Superior

Tribunal de Justiça também se filia à teoria americana dos frutos da árvore

envenenada, considerando que as provas ilícitas derivadas devem ser

desentranhadas dos autos e não consideradas como meio probatório para a

269 BRASIL, 2006, p.09-10.

84

instrução criminal.

3.4 A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO ATRAVÉS DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Inicialmente, cabe ressaltar, que a doutrina não faz referência

expressa às provas ilícitas derivadas pro reo, apenas faz menção ao termo prova

ilícita pro reo.. No entanto, afirmam a possibilidade excepcional da prova ilícita ser

utilizada em favor da defesa. Ora, se a própria prova ilícita pode ser utilizada em

favor do réu, porque não a derivada da ilícita? Neste contexto, adotar-se-á o

entendimento de que a doutrina filia-se ao mesmo posicionamento para os casos de

provas contaminadas.

A inadmissibilidade das provas ilícitas, bem como as derivadas,

é a regra no processo penal, com orientação dominante na doutrina e jurisprudência

pátria. Porém, já é pacificado que o referido princípio não possui caráter absoluto, a

superar outros direitos, também constitucionalmente amparados.

De acordo com os seguidores desta corrente, a prova obtida

com infringência aos direitos fundamentais é inconstitucional, assim, em

conseqüência da vedação expressa no art. 5°, LVI da Constituição Federal, são

inadmissíveis. Entretanto, a vedação é amenizada, para aquisição de prova viciada,

em caráter excepcional e em situações extremamente graves, nos casos em que

sua obtenção e admissão forem à única maneira, possível e razoável, para se

proteger outros direitos fundamentais, considerados de maior relevância na concreta

avaliação do caso. 270

Para tal superação, aplica-se o princípio da proporcionalidade,

que por sua vez, não reconhece o valor absoluto à vedação probatória quando esta

estiver em choque com outras garantias fundamentais.

Nesse sentido, deve-se reconhecer que se o acusado está

sendo processado injustamente e “diligencia a produção de uma prova ilícita, estará

atuando em estado de necessidade, que sendo uma cláusula de excludente de

270 MOURA, Maria Thereza da Rocha de Assis. A ilicitude na obtenção da prova e sua aferição. Disponível em: http://www.aurylopes.com.br/art0025.html. Acesso em: 18 abril de 2007.

85

ilicitude (decorrente da proporcionalidade), torna lícita sua utilização”.271

Segundo Ávila quanto à admissibilidade da prova ilícita pro reo,

algumas considerações são pertinentes: a primeira é que alguns autores não

consideram a aplicação da proporcionalidade nestes casos, uma vez que, se o réu

utiliza-se de provas ilícitas para buscar sua defesa, estará assim agindo em legítima

defesa. Discorda o autor quanto a essa afirmação, ressaltando que não se trata de

legítima defesa e sim de estado de necessidade: ainda que o acusado seja inocente

e a acusação seja baseada em elementos inverídicos “não se pode afirmar que a

ação do Estado seja uma agressão injusta ao ponto de qualificar a ação do acusado

como legítima defesa”. 272

A segunda consideração menciona que independentemente de

ser a conduta do acusado legítima defesa ou estado de necessidade, ambas as

condutas são uma aplicação concreta do princípio da proporcionalidade: o acusado

pratica um fato típico na intenção de interromper “uma agressão injusta

(adequação), usando moderadamente os meios necessários (necessidade), em uma

circunstância em que o bem jurídico protegido por sua conduta é igual ou mais

valioso que o bem lesado (proporcionalidade estrita)”273, dentro de um contexto em

que o bem ofendido tem seu valor minimizado em razão de estar acobertado pela

conduta ilícita do acusado.274

Segue o autor275 mencionando que dessas duas

considerações, chega-se a conclusão que:

A prova obtida com violação de direitos fundamentais, se destinada a provar a inocência de um acusado (adequação), sendo a única forma de que este dispõe (necessidade), respeitando a proporcionalidade do bem lesado com o bem a ser protegido (proporcionalidade estrita), deve ser aceita pelo juízo pela aplicação da proporcionalidade. Afirmar que se trata de legítima defesa ou estado de necessidade não exclui a constatação de que dentro desse processo á ponderação de interesses própria da proporcionalidade. Em segundo lugar quando se aplica o princípio da proporcionalidade a

271 ÁVILA, 2007, p 203. 272 ÁVILA, loc.cit.273 ÁVILA, loc.cit.274 ÁVILA, op.cit., p 204.275 ÁVILA, loc.cit.

86

determinada prova, o que se está realizando, em verdade, é a exclusão da antinomia da vedação do direito substantivo com o ordenamento jurídico como um todo. O princípio da proporcionalidade legitima a conduta. Destarte, a prova obtida não é ilícita, apesar de formalmente violar uma norma atributiva de direito.

Nesse sentido, depreende-se que a admissibilidade da prova

ilícita pro reo deve ser acolhida, já que, a conduta praticada pelo acusado para

adquirir a prova, seja em legítima defesa ou estado de necessidade, respeita o

princípio da proporcionalidade, não sendo, portanto, antijurídica.

No caso da aplicação da proporcionalidade em favor do réu os

valores conflitantes estão diretamente atrelados à dignidade da pessoa do réu, que

está sendo injustamente acusado, correndo o risco de ter sua liberdade cerceada.

Para a admissão desta prova coloca-se em ponderação da garantia constitucional

da ampla defesa e a situação de seu estado de necessidade. No entendimento do

princípio da proporcionalidade o “direito à prova da inocência sempre prevalece, pois

a liberdade e a dignidade da pessoa humana são valores insuperáveis” 276.

Nesta situação, “entende-se haver confronto entre o princípio

da ampla defesa do réu e o princípio da proibição da prova ilícita” 277, duas normas

constitucionais de conteúdo processual, sendo que a última de caráter prevalente.

Avolio278 ressalta que a aplicação do princípio da

proporcionalidade atrelado ao direito de defesa, assegurado constitucionalmente, e

de forma prioritária no processo penal, onde vigora ainda o princípio do favor rei, é

de grande aceitação na doutrina e jurisprudência. Para o autor, mesmo quando a

prova ilícita for colhida pelo próprio acusado ou por terceiros, como meio de defesa,

entende-se que “a ilicitude é eliminada por causas de justificação legais da

antijuricidade”.

Grinover279 reconhece a aplicabilidade do princípio da

276 SILVA, Daiana Santos. Inadmissibilidade das provas ilícitas no Processo Penal. Boletim Jurídico. Uberaba, v. 4, n. 167. Disponível em: http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1090 Acesso em: 13 abr. 2007.277 MELLO, Fábia Amaral de Oliveira. A prova ilícita e a possibilidade de sua aplicação no processo penal. Revista da Esmape : Escola Superior da Magistratura de Pernambuco, Recife, Escola Superior da Magistratura de Pernambuco v.15, jan. p. 247-264, 2002. p. 257.278 AVÓLIO, 2003, p.67.279 GRINOVER; FERNANDES ; GOMES FILHO. 2004, p.161.

87

proporcionalidade no processo penal para assegurar ao acusado o uso de prova

ilícita em favor de sua defesa, pois o direito de defesa, também constitucionalmente

assegurado, deve prevalecer em relação ao princípio da inadmissibilidade das

provas ilícitas. Pamplona280 destaca o posicionamento de Ada Pelegrini Grinover:

Pensamos que, nesses casos (admissibilidade da prova ilícita que

beneficie a defesa, eventual adoção do principio da

proporcionalidade e vícios da prova regular derivada da ilícita obtida),

a Constituição brasileira não afasta radicalmente nenhuma

tendência: isso porque, como já se disse os direitos e garantias

fundamentais não podem ser entendidos em sentido absoluto, em

face natural restrição resultante do principio de sua convivência, que

exige interpretação harmônica e global das liberdades

constitucionais.

A doutrinadora consolida este entendimento ao mencionar que

sempre em caráter excepcional e em casos extremamente graves, a prova ilícita pro

reo tem sido aceita, baseando-se no princípio da proporcionalidade para garantir o

equilíbrio entre os direitos fundamentais contrastantes. Destaca ainda, que quando a

prova for colhida ilicitamente pelo próprio acusado, nestes casos, tem-se entendido

que a ilicitude é eliminada por causas que justificam a antijuricidade, como a legítima

defesa. 281

Seguindo o mesmo entendimento Maria Cecília282, revela que

havendo legítima defesa, a prova não deverá ser considerada ilícita e, portanto,

aceita no processo, “pois a ausência de antijuricidade, que beneficia a legitima

defesa, exclui a ilicitude da colheita da prova”. Seria um absurdo que nessas

circunstâncias a vítima encontrasse respaldo legal para violar o bem maior do

homem, qual seja a vida, mas não poder violar o direito à intimidade, privacidade

etc., para poder se defender.

Ao tecer suas considerações acerca do princípio da

proporcionalidade como forma de superação das vedações probatórias em sede

280 PAMPLONA, 2003, p. 145. 281 GRINOVER; FERNANDES ; GOMES FILHO, op.cit., p.161-162.282 CARNAUBA, Maria Cecília Pontes. Prova ilícita. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 78-79.

88

processual penal, Gomes Filho283 salienta que a Constituinte de 1988 parece ter

adotado tal critério, ao prever a quebra da inviolabilidade das comunicações

telefônicas para investigações criminais ou instrução processual penal; “trata-se, no

entanto, de casos taxativos, não sendo possível inferir sua adoção generalizada,

como regra permissiva de outras restrições a direitos fundamentais”.

Menciona o autor, ainda, que as considerações sobre a

ponderação dos interesses proporcionam a admissão da prova ilícita em favor da

defesa, assinala que no conflito entre uma proibição probatória, mesmo que ditada

para a proteção de um direito fundamental, e o direito a prova da inocência, este

deve prevalecer, não somente porque a liberdade e a dignidade da pessoa humana

são tidas como valores insuperáveis, sob a ótica de uma sociedade democrática,

mas também porque ao Estado não interessa a punição de um inocente. 284

Discorrendo acerca da valoração dos princípios constitucionais

e as provas ilícitas, Greco Filho285 argumenta:

[...] Entendo, porém, que a regra não seja absoluta, porque nenhuma regra constitucional é absoluta, uma vez que tem de conviver com outras regras ou princípios também constitucionais. Assim, continuará a ser necessário o confronto ou peso entre os bens jurídicos, desde que constitucionalmente garantidos, a fim de se admitir, ou não, a prova obtida por meio ilícito. Veja-se, por exemplo, a hipótese de uma prova decisiva para a absolvição obtida por meio de uma ilicitude de menor monta. Prevalece o princípio da liberdade da pessoa, logo a prova será produzida e apreciada, afastando-se a incidência do inc. LVI do art. 5° da Constituição, que vale como princípio, mas não absoluto, como se disse.

Assim, o doutrinador entende ser necessária a valoração dos

bens assegurados constitucionalmente para proceder a escolha daquele que irá

trazer um maior benefício na aferição das provas ilícitas, pois assinala que as regras

constitucionais não devem ser entendidas de maneira absoluta.

Luiz Flávio Gomes286, ao tratar sobre as interceptações

283 GOMES FILHO, 1997, p.106.284 GOMES FILHO, op.cit., p. 106-107.285 GRECO FILHO, 1997, p. 200-201.286 CERVINI, Raúl ; GOMES, Luiz Flávio. Interceptação telefônica: lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 147-148.

89

telefônicas, menciona que a inadmissibilidade das provas ilícitas só encontra

exceção no processo penal, podendo ser produzida e utilizada nos casos que

beneficiarem a defesa, pois o que mais interessa é a declaração da inocência do

que a preservação da intimidade ou privacidade alheia. O autor, amparado em

doutrinadores nacionais, segue aludindo que a questão central, na colisão direta dos

direitos fundamentais, é de um lado estar o direito a privacidade, e de outro, o direito

do acusado em provar sua inocência, sendo para estes casos perfeitamente válido e

eficaz o uso da proporcionalidade para fazer prevalecer o direito da inocência do

acusado.

Para Scarance287, seria inaceitável a condenação de um

acusado apenas porque a demonstração de sua inocência ocorreu por meio de

prova obtida de forma ilícita. Neste caso é possível admitir exceção à regra

constitucional, uma vez que, o valor constitucional da ampla defesa merece ser

protegido, possui maior relevância ao bem atingido na obtenção da prova.

Corroborando o entendimento doutrinário, a jurisprudência do

Tribunal de justiça de São Paulo admitiu a utilização de prova ilícita em favor do réu.

Segue abaixo a ementa:

A disposição contida no art. 5°, inc. XII da Constituição da República, veda a interferência de terceiro no interior do diálogo, sem aceitação do comunicador ou receptor. A conversa entre duas pessoas que se aceitam como comunicador e receptor, em livre expressão de pensamento, admite gravação por uma das partes, assim como seria possível gravar o teor de conversações diretas, sem uso de aparelho telefônico. 288

Adotando a teoria da proporcionalidade no sentido da

admissibilidade das provas ilícitas em favor da defesa, o Tribunal de Justiça de São

Paulo, entendeu que a gravação telefônica feita pela acusada, de conversa que

tivera com a vítima do crime, não violou a lei e nem a Constituição, uma vez que o

direito à intimidade não tem caráter absoluto e pode ceder quando em conflito com

outros direitos fundamentais, como, por exemplo, o da ampla defesa. 289

287 FERNANDES, 2005, p.92-93.288 BRASIL, Tribunal de Justiça de São Paulo. Correição Parcial n. 126.826-3 - Santa Cruz das Palmeiras - Relator: Denser de Sá, Data do Julgamento: 16.09.92.289 MOURA, 2007.

90

3.5 A UTILIZAÇÃO DAS PROVAS ILÍCITAS DERIVADAS NA VISÃO DO PESQUISADOR

É certo que o texto Constitucional assegura de maneira

expressa, como garantia fundamental dos indivíduos, a inadmissibilidade das provas

ilícitas no processo, entretanto, a garantia constitucional de inadmissibilidade das

provas ilícitas não deve ser tida como um dogma, mas sim como “um princípio

direcionado ao estabelecimento de instrumentos eficazes de proteção aos direitos

fundamentais que deve ser contemporizado com uma tutela penal eficiente”290.

Assim, se esta garantia foi criada com o intuito de realização dos ideais de proteção

à igualdade, à liberdade e à dignidade da pessoa humana, sua aplicação de forma

absoluta contraria sua própria finalidade.

Como ressalta Ada Pellegrini Grinover291, os direitos

fundamentais não devem ser entendidos de forma absoluta, em face da restrição

derivada do princípio da conveniência das liberdades, que preceitua que as

garantias não devem ser exercidas de forma danosa à ordem pública e às

liberdades alheias.

A rigidez da regra constitucional pela inadmissibilidade das

provas ilícitas vem sendo suavizada pela doutrina e jurisprudência pela aplicação do

princípio da proporcionalidade, sendo o mesmo, utilizado para ponderar a existência

de direitos fundamentais em colisão.

A aplicabilidade deste princípio vem sendo aceita entre nós,

com o objetivo de evitar a rigidez da aplicação da garantia constitucional da

inadmissibilidade das provas ilícitas, nos casos em que a ofensa a vedação

constitucional é realizada para a proteção de um bem maior também

constitucionalmente assegurado.

Apesar da falta de vedação expressa pela inadmissibilidade

das provas ilícitas derivadas no processo, a doutrina e a jurisprudência são

unânimes ao entender que a ilicitude originária transmite-se às provas derivadas,

pois de nada valeria um direito fundamental assegurado se por outros meios fosse

290 ÁVILA, 2007, p. 286.291 GRINOVER; FERNANDES ; GOMES FILHOS, 2004, p. 152-53.

91

possível burlar seus efeitos.

Porém, em ao menos uma situação não há dissenso quanto à

possibilidade de utilização em juízo da provas contaminadas: quando esta for o

único meio para provar a inocência de um acusado. Nesse sentido, a doutrina e a

jurisprudência pátria posicionam-se favoravelmente à admissibilidade, via aplicação

do princípio da proporcionalidade.

Através dessa exceção, pode-se confirmar a regra

constitucional da proporcionalidade e delimitar seu alcance à luz dos princípios

constitucionais contrapostos, quais sejam o direito a ampla defesa e o princípio da

inadmissibilidade das provas ilícitas. Segundo Ávila 292 “sendo a ampla defesa

também um princípio constitucional, no embate entre a eficiência do processo para

descobrir a verdade e inocentar um réu injustamente acusado e a garantia

fundamental da inadmissibilidade, a absolvição de um inocente tem um peso muito

maior”.

Não resta dúvida que tal aplicação deva ser acatada, haja vista

que não interessa ao Estado a punição de um inocente, pois política criminal de um

Estado de Direito, que se funda no valor primordial da dignidade da pessoa humana,

não deve se contentar com a condenação de um inocente.

De todo este estudo depreende-se que o melhor

posicionamento acerca do tema pertence à corrente que se filia a Ada Pellegrini

Grinover, entendendo, assim, pela inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas,

como garantia inerente ao preceito constitucional consagrado no art. 5 , LVI da Carta

Magna. Pois, de nada valeria essa máxima se por outros meios fosse possível obter

uma prova burlando os direitos fundamentais.

Assim, como forma de assegurar as máximas garantias,

excepciona-se esta vedação, podendo utilizar-se no processo penal a prova

contaminada apenas quando esta for utilizada em favor do réu em sua defesa, pois

os direitos e garantias expressos na Carta Manga expressam os limites para que o

processo seja justo e legal, não preceituando aquela velha máxima de que os fins

justificam os meios.

292 ÁVILA, 2007, p. 103.

92

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa teve por objetivo demonstrar a admissibilidade, em

determinados casos, da prova ilícita derivada no processo penal brasileiro, à luz do

princípio da proporcionalidade.

A Constituição da República estabelece de forma expressa em

seu art. 5°, inciso LVI uma série de direitos fundamentais, que na maioria das vezes

perfazem princípios constitucionais que servem como fundamento e validade para

todo o ordenamento jurídico, entretanto, os direitos fundamentais não devem ser

tidos como direitos individuais absolutos, mas sim, como direitos do homem

inseridos em sociedade.

No ordenamento jurídico ocorrem situações concretas em que

dois ou mais princípios constitucionais ou direitos fundamentais entram em colisão,

não sendo possível uma interpretação sistêmica para dirimir o conflito. Para estes

casos, utilizar-se-á o princípio da proporcionalidade para viabilizar a harmonização

entre os princípios conflitantes e ponderar qual deles deverá ser aplicado de forma

mais adequada e menos gravosa.

Dentre as garantias fundamentais está à inadmissibilidade das

provas produzidas por meios ilícitos. Decorrente desta garantia constitucional e de

normas processuais penais, o direito a prova não é irrestrito, estando limitado à sua

forma de obtenção. Será considerada ilícita a prova colhida com infringência às

normas ou princípios de direito material, sobretudo no âmbito constitucional.

As provas ilícitas, sendo consideradas inadmissíveis, não

devem ser aceitas no processo, muito menos, valoradas pelo magistrado. A doutrina

e a jurisprudência possuem o entendimento de que os meios de prova obtidos

ilicitamente são inválidos, devendo ser desentranhado dos autos.

Na garantia fundamental de inadmissibilidade das provas

ilícitas no processo, encontra-se também, a vedação à utilização das provas ilícitas

derivadas, aquelas provas lícitas em si mesmas, porém que se originaram a partir de

uma prova obtida de forma ilícita.

93

A questão da inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas

ficou em aberto na Constituição, não há proibição expressa para este instituto.

Porém, o posicionamento doutrinário e jurisprudencial dominante é pela sua

vedação, por entender que sua admissibilidade importaria na perda da eficácia da

garantia constitucional prevista no art. 5°, LVI, da Constituição. A inadmissibilidade

das provas contaminadas seria a posição correta para a preservação dos direitos e

garantias fundamentais.

A teoria da inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas

também é conhecida como teoria dos frutos da árvore envenenada criada pela

Suprema Corte Norte Americana, tal corrente defende que a informação obtida

ilicitamente se projeta às diligências subseqüentes, aparentemente legais,

maculando-as e transmitindo-as a ilicitude da prova originária (a árvore envenenada

gera frutos podres).

A ilicitude da prova contaminada é excepcionada quando os

fatos apurados a partir da prova ilícita tiverem condições de serem provados por

uma fonte independente da que proporcionou seu conhecimento (independent

sourse), além dos casos em que a prova seria inevitavelmente descoberta através

de outros meios legais (inevitablen Discovery).

A jurisprudência brasileira dos Tribunais Superiores é

dominante quanto à inadmissibilidade das provas ilícitas derivadas, adotando a

teoria dos frutos da árvore envenenada. O Supremo Tribunal Federal por várias

vezes acolheu a teoria americana, ressaltando em suas decisões que a

inadmissibilidade seria a melhor maneira de dar eficácia à garantia constitucional da

inadmissibilidade das provas ilícitas. No mesmo entendimento segue a

jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

A inadmissibilidade das provas ilícitas, bem como as derivadas,

é a regra no processo penal, com orientação predominante na doutrina e

jurisprudência pátria. No entanto, a doutrina menciona que a restrição é amenizada,

para aquisição de prova viciada, quando for utilizada em favor do réu. Trata-se da

aplicação da teoria da proporcionalidade para a aceitação no processo da prova

viciada, em caráter excepcional e em situações extremamente graves, nos casos em

94

que sua obtenção e admissão forem à única maneira para se proteger outros direitos

fundamentais.

No caso da aplicação do princípio da proporcionalidade em

favor do réu os valores conflitantes estão ligados à dignidade de sua pessoa, neste

caso, é posto em ponderação a garantia constitucional da ampla defesa e a garantia

da inadmissibilidade no processo das provas ilícitas. Pelo entendimento da

proporcionalidade, o direito a prova da inocência de um acusado deve sempre

prevalecer, pois a liberdade e a dignidade da pessoa humana são valores

insuperáveis.

Este entendimento é também aceito na jurisprudência,

verificou-se em julgamento do TJ/SP onde o princípio da proporcionalidade foi

aplicado para a aceitação de prova contaminada em favor da defesa.

Quanto à problemática destacada no início deste trabalho

pôde-se verificar que o critério da proporcionalidade pode ser aplicado para

aceitação das provas ilícitas derivadas, quando estas forem utilizadas em benefício

da defesa. Através da ponderação dos interesses em conflito, a garantia da ampla

defesa em contraponto com a inadmissibilidade das provas ilícitas, esta última deve

prevalecer, pois a liberdade e dignidade da pessoa humana são valores muito

superiores a uma vedação probatória.

95

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