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Revista Olhar Científico – Faculdades Associadas de Ariquemes – V. 01, n.2, Ago./Dez. 2010 154
A Clínica Da Psicossomática (Considerações Psicanalíticas)
Zeno Germano– [email protected]
Psicólogo dos Juizados Especiais Criminais do Poder Judiciário do Estado de Rondônia. Doutorando em Psicologia pela Universidad de Ciencias Sociales y Empresariales/Argentina
Resumo
Este artigo tem o objetivo de trabalhar com a compreensão psicanalítica da psicossomática a partir do tratamento possível na clínica. Traz as conceituações dos autores que criaram as condições, desde Freud, para que se possa pensar o fenômeno hoje e tenta-se apresentar as características que marcam a direção do tratamento da psicossomática naquilo em que ela se diferencia da neurose.
Palavras-chaves: Psicossomática, Psicanálise, corpo, clínica, fenômeno.
Introdução
Nas últimas décadas do século XX, o uso do termo “psicossomática” passou a
ser freqüente tanto no meio médico e psicológico quanto no meio da comunidade
científica, sendo que também já não era novidade no seio das sociedades
psicanalíticas, que desde as manifestações conversivas da histeria anunciadas por
Freud no início do pensamento psicanalítico, colocam os analistas diante da lida com
a questão do adoecimento do e no corpo.
Entretanto, mesmo se configurando como tema assíduo entre os analistas e
tendo uma literatura relativamente abundante, é preciso cada vez mais reconhecer
que a psicossomática é um terreno ainda com aspectos misteriosos e de contornos
imprecisos, o que leva os pesquisadores do fenômeno a necessidade de aprofundar
constantemente seus conceitos.
A Problemática da psicossomática: delimitando o campo.
Para se ter uma visão geral atual da psicossomática, vamos nos remeter aos
estudos tanto de cunho psicanalítico quanto os oriundos do discurso médico, a
chamada medicina psicossomática. Nicolau (2008) enfatiza que, apesar de mudanças
que passaram a ocorrer no saber médico no século XX, quando a medicina passou
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cada vez mais a inserir a dimensão humana como fator decisivo para a compreensão
das enfermidades, os médicos de modo geral continuam a associar o diagnóstico de
uma doença a seu correlato orgânico. Escreve Nicolau (2008);
(...) no campo da medicina, quando não se encontra um referente orgânico da doença, o diagnostico fica essencialmente associado aos tipos clínicos decorrentes dos sintomas apresentados, abordando o tratamento das enfermidades psicossomáticas como uma patologia que se manifesta equitativamente. Assim, diante de uma lesão de órgão ou de uma dor que não se inscreve no discurso médico, são comuns os diagnósticos de “distúrbios neuro-vegetativos”,” stress” ou” doença psicossomática” e os pacientes já vem com um diagnóstico previamente estabelecido. (p.964).
A autora ainda cita que mesmo que o paciente não chegue a ter um
diagnóstico pré-estabelecido, já ficam rotulados pelo médico; - “Você não tem nada.
Vá ao psicólogo.”.
Fonseca (2007) escreve sobre a atenção que a Medicina passou a dar ao
fenômeno, principalmente com o desenvolvimento das pesquisas sobre o câncer, e ao
mesmo tempo, que tipo de demanda passa a ser construída a estes pacientes
psicossomáticos;
Fonseca (2007) afirma;
(...) pesquisas importantes tem sido publicadas como a do Departamento de Saúde Pública da Universidade de Helsinque com 10.808 mulheres portadoras de câncer de mama admitindo que (...) “os eventos da vida e as reações psicológicas que os acompanham podem também aumentar o risco de câncer de mama” (...) e concluindo que o stress causado por fatores psíquicos pode interferir no aumento ou diminuição de secreção de vários hormônios e acelerar o desenvolvimento do câncer. Médicos, enfermeiras, assistentes sociais, profissionais psi, dedicam-se ao cuidado desse tipo de paciente, ás vezes chamado de “psicossomático”, que talvez seja o mais difícil que se apresenta para o tratamento, pelo fato do seu “mal” resistir aos cuidados que lhe são dispensados. (...) sua demanda é geralmente dedicada ao médico numa tentativa de certificação da causalidade física e principalmente, de uma terapêutica salvadora que lhe resgate a saúde e até mesmo a vida. (p.96)
Não resta dúvida de quanto inegável é a contribuição do campo da medicina
psicossomática para a ampliação e revelação da complexidade deste fenômeno, o que
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inclusive serviu para apontar questões a serem investigadas pela Psicanálise. No
campo médico é necessário elaborar e assimilar para a compreensão da
psicossomática, as descobertas mais recentes da biologia molecular e da
neuroimunologia, por exemplo. Neste aspecto ressalta-se a necessidade de refletir
sobre os processos de que dependem estes sintomas em seus registros tanto
somáticos quanto psíquico na singularidade de cada sujeito.
No adoecimento somático, o corpo passa a ser a grande referência daquele
que sofre. A enfermidade que se apresenta ao analista, muitas vezes já nomeada pelo
saber médico, regula a vida e os pensamentos do paciente. Este revela assim uma
dificuldade muito grande em se desvencilhar, em dar novo sentido a seu sofrimento. Ai
se pode perceber as barreiras para que estes pacientes possam se analisar, pois
dificilmente conseguem subjetivar seu sofrimento, investindo constantemente na
dimensão corporal.
Nicolau (2008) levanta questionamentos importantes para a Psicanálise; Que
escuta oferecer quando a queixa se concentra no órgão doente ou na dor?
Como intervir nestes casos? Serão eles, invariavelmente, abordados a partir de um modelo pré-estabelecido e catalogados como somatização ou doença psicossomática? Como explicar esses fenômenos do ponto de vista do sujeito nele implicado? Qual a direção do tratamento quando este não vem pela via da implicação do sujeito com sua dor? (p.963)
Portanto, percebemos com a autora que há muito para se refletir sobre a clínica
com pacientes portadores de distúrbios psicossomáticos, que caso se limite apenas
aos fenômenos em si correria o risco de reduzir o sujeito a sua dificuldade.
A Psicanálise, com sua escuta dirigida á singularidade de cada sujeito, não
aceita o deslocamento do sentido para o da causalidade, nem vai transpor uma
causalidade orgânica em causalidade psicológica, pois em sua origem não se limita ao
viés “médico-funcional”, nem focaliza o sintoma para estabelecer diagnósticos.
Mas, o que diz a Psicanálise sobre os processos e desdobramentos que
conduzem á enfermidade psicossomática?
Na obra de Freud, as formulações que mais se aproximam do que se conhece
atualmente como psicossomática estão em sua definição de neuroses atuais. Freud
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(1895/1987) mencionou um grupo de neuroses de transferência que se assemelham
ás afecções psicossomáticas denominando-as neurose atuais e classificando-as em
neurastenia e neurose de angustia. A neurastenia tinha origem na satisfação sexual
realizada de forma inadequada e nas neuroses de angustia, o sujeito não obtém uma
descarga de excitação sexual, produzindo angustia diante da relação sexual
incompleta.
Em 1912, Freud sustenta que as neuroses atuais deveriam ser pensadas de
forma diferente das psiconeuroses (histeria, fobias e neuroses obssesiva-compulsiva);
“A prisão de ventre, as dores de cabeça e a fadiga do chamado neurastênico não
admitem serem remontadas histórica ou simbolicamente, a experiências operantes, e
não podem se compreendidas como substitutos da satisfação sexual ou como
conciliações entre pulsões, como é o caso dos sintomas psiconeuróticos.” (Freud, p.
314).
Freud (1915) ainda trabalha outros conceitos que estão relacionados com a
questão do corpo. No artigo “Sobre o Narcisismo; Uma introdução” menciona a
distribuição, os destinos da libido e articula á doença orgânica, á hipocondria e ás
neuroses atuais. No mesmo ano, em “Pulsões e seus destinos”, introduz a noção de
prazer do órgão como modo de satisfação auto-erótica, parcial e sem objeto externo,
onde a excitação se encerra no órgão próprio onde começou.
Importante salientar ainda que Freud, ao pensar sobre o corpo, acabou por
desenvolver o conceito de conversão somática, que seria uma junção do psíquico e do
físico remetendo a outra cena. Freud denominou conversão a uma manifestação
somática idêntica ao desejo em que está em jogo uma satisfação substitutiva de uma
fantasia de conteúdo sexual e onde esta outra cena fala do sujeito através de seu
corpo.
Lacan (1954-1955/1985) trabalha a diferença entre o sintoma neurótico e o
fenômeno psicossomático quando diz que o primeiro está enquadrado pela estrutura
narcísica, visto que se acha organizado na relação com o outro enquanto o fenômeno
psicossomático aparece como resultado do investimento da libido no interior do corpo.
Se o sintoma neurótico se encontra na identificação possível com o outro, o
fenômeno psicossomático aparece como resultado do investimento sobre o órgão e
não sobre um objeto, ou seja, é uma manifestação da pulsão em forma pura, ficando o
órgão lesionado fora da constituição imaginária do eu. Podemos então, com Lacan,
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falar em curto-circuito na montagem pulsional onde o que entra em jogo na relação
com o outro é o órgão, imagem especular do próprio corpo.
Lacan entende a psicossomática como fenômeno e não como sintoma na
medida em que esta não comporta a intermediação simbólica, em uma aproximação
direta com fenômenos psicóticos como o delírio.
No seminário “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise” (1964-
1965/1988), Lacan refere-se ao desejo do Outro, dizendo que o fenômeno
psicossomático é fruto da indução significante, onde o desejo do Outro não aparece no
sujeito como falta, sendo um desejo inquestionável que aponta para a falha do
simbólico, um desaparecimento ou afânise, onde o sujeito aparece sempre
representado por outro significante. Lacan (1964-65/1985); “A psicossomática é algo
que não é significante, mas que, mesmo assim, só é concebível na medida em que a
indução significante, no nível do sujeito, se passou de maneira que não põe em jogo a
afânise do sujeito.” (p.215-216).
Esse fenômeno é resultado do fracasso do recalcamento primordial, ou seja, da
marcação do Nome-do-Pai. Não há barra que incida e faça separação entre os
significantes (Lacan os nomeou então significantes holofraseados). Assim, quando
ocorre a “gelificação” da cadeia significante, pode se produzir não apenas a
psicossomática, mas também a psicose.
Aqui podemos entender porque diversos teóricos lacanianos fazem
aproximação entre a psicossomática e a psicose, principalmente porque Lacan
apresentou uma série onde inclui a psicose, a debilidade mental e a psicossomática
como resultante da holófrase, uma lógica que aponta para o congelamento dos
significantes.
Guir (1988) conclui que o fenômeno psicossomático diz respeito a uma falha na
função da Metáfora Paterna resultado de uma arranhadura na operação de castração;
“O problema de fundo do fenômeno psicossomático é este: a metáfora paterna
funciona em certos sítios do discurso e não em outros. Somente alguns momentos
específicos do discurso provocam um desencadeamento no corpo.” (Guir, 1988, p.49).
Já Nasio (1993) afirma que o fenômeno psicossomático corresponde a uma
formação do objeto a e não a uma formação do inconsciente. A doença estaria do lado
das alucinações e da passagem ao ato, onde o Nome-do-Pai não se mantém, não
oferecendo consistência ao sujeito.
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Seguindo a linha de pensamento lacaniana, podemos pensar que quando o
sujeito está petrificado pela doença, seu corpo se torna fonte ilimitada de gozo,
apontando para um corpo onde, ao contrário da histeria de conversão, a palavra está
como que desertada, não havendo uma escrita legível. Dizendo de outro modo, faltam
palavras ao sujeito em psicossomática, daí percebe-se a carência e impossibilidade de
associação livre em seus discursos e o investimento intenso no corpo, marcas também
da diferença entre analisar um neurótico e um paciente psicossomático.
Dentre as demais idéias consideradas importantes no campo psicanalítico que
tentam explicar a psicossomática estão as de Alexander, Grodeck, McDougall e a
Escola Psicossomática de Paris onde se destacam Marty e M’Uzan.
Alexander (1952) postulou a idéia de que um “simbólico” estaria ausente na
formação dos transtornos somáticos. Segundo este autor, a doença é conseqüência
de emoções, impulsos não satisfeitos, desviados e reprimidos em um efeito direto dos
afetos sobre o corpo.
Godreck (1991) defendeu a idéia de que o Id é o criador e todas as doenças,
sendo estas originadas de um desejo, portadoras, portanto, de um sentido.Para ele, o
adoecer orgânico é regido pelo processo primário e pelos mecanismos de
deslocamento e condensação.
Para Marty e M’Uzan (1994), percebe-se no paciente psicossomático a pobreza
da associação subjetiva, dificuldade no estabelecimento da transferência, limitação
das capacidades simbólicas e carências de elaboração fantasística.
Marty (1993) aponta comportamentos automáticos e adaptativos, uma ruptura
com o inconsciente e com a sexualidade, alienação da própria história, negligencia do
passado e incapacidade de projeção para o futuro, o que Marty denominou
Pensamento Operatório.
Ás dinâmicas afetivas específicas destes pacientes, Marty (1966) denominou
Depressão Essencial, que diferente do que se percebe na depressão neurótica, no luto
ou na melancolia, não denota nenhum trabalho de elaboração, uma depressão sem
objeto que se constitui na essência mesma da depressão.
Já para McDougall (1983), existe a vinculação dos transtornos psicossomáticos
á primeira infância, por isso estes pacientes não podem utilizar palavras como veículo
diante do sofrimento. McDougall constrói uma definição do que acontece na
psicossomática que ajuda a estabelecer sua diferença em relação á histeria e
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consequentemente á neurose. McDougall (1983) sustenta que essa explosão no
corpo, que não é uma comunicação neurótica nem uma restituição psicótica, tem uma
função de ato, de descarga, que provoca um curto-circuito no trabalho psíquico.
O curto-circuito que postula McDougall é importante então para estabelecer a
diferença fundamental para a clínica psicanalítica entre psicossomática e a neurose.
No fenômeno psicossomático não pode surgir o trabalho psíquico, a elaboração, em
uma linha que se afasta consideravelmente do que postulou Godreck, por exemplo, e
se alinha aos pensamentos conceituais propostos por Lacan, que já havia pensado a
compreensão de um curto-circuito no aparelho psíquico.
Outro autor que merece referência é Dejours (1988). Este psicanalista francês
aprofunda questões ligadas ás somatizações e ao pensamento operatório e constrói a
hipótese da terceira tópica apoiado na idéia de uma dupla clivagem do sujeito, na qual,
por um lado, se desenvolveria uma relação mediada pelo recalcamento e pelo pré-
consciente e por outro, uma relação entre o “inconsciente primitivo” contido pela
própria consciência e pelo pensamento lógico-conceitual.
Seguindo a linha de pensamento da escola francesa, Sami Ali (1995), no livro
“Pensar o Somático-Imaginário e patologia”, enfatiza as Patologias de Adaptação nos
pacientes psicossomáticos. Aponta ausência quase absoluta de sonhos, de sintomas
neuróticos, de lapsos, de devaneios ou de atividade criativa, pouco contato com seus
desejos, uma utilização empobrecida da linguagem além, de uma aderência extrema
ao factual e á realidade material.
Na esfera da América Latina, uma contribuição a ser considerada é a do
psicanalista argentino David Maldavsky (1992) que propõe uma leitura da afecção
psicossomática como “Afecção Tóxica” relacionando o quadro a um mecanismo de
defesa específico que denomina “Desestimação do afeto”.
Este mecanismo de defesa produz a desaparição do afeto sentido e tem a ver
com a forma originária do desenvolvimento da consciência no sentido de qualificar os
estados pulsionais. Maldavsky aponta que existem dois tipos de excitação: As
químicas e as mecânicas, estando as primeiras vinculadas a neurose atual e a
segunda ás neurose traumáticas.
Para Maldavsky, as afecções tóxicas tem a ver com o modelo das neuroses
traumáticas pois estas são potenciais introdutores da tendência á inércia pulsional. Há
então, no início, uma consciência primordial que se constitui como condição para o
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registro dos afetos e das percepções e sensações. É o primeiro aspecto organizador
do psiquismo e que nas afecções tóxicas encontra-se alterado.
Psicoterapia psicanalítica de pacientes psicossomáticos
Com a análise das histerias aprendemos que certas manifestações corporais
admitem uma leitura, pois expressam um discurso. Através do sintoma, torna
presentes uma ausência que mantém o sujeito em equilíbrio e evita a angústia da
aproximação com o desejo, aí então, inconsciente.
Isto posto, formam um sentido que, evidenciado ao sujeito, o liberta do sintoma,
sintoma este “amarrado” em uma relação simbólica, isto é, a relação entre a
representação recalcada e o produto consciente, o sintoma. Assim, falamos de um
corpo neurótico. Nas manifestações psicossomáticas, já entendemos se tratar de outra
coisa.
Santos Filho (1992), chama a atenção para o fato de que os pacientes
psicossomáticos em geral não buscam tratamento de maneira espontânea e sim foram
encaminhados por um médico clínico, por exemplo, o que faz a demanda ser mal
definida. O autor afirma;
Enquanto o fenômeno neurótico nos faz pensar em uma relação de qualidade, mediado pela representação significante, o fenômeno psicossomático, com seu caráter de descarga, nos sugere uma relação econômica. (...) a impossibilidade precoce de inclusão da dor psíquica numa cadeia simbólica, nomeada e articuladora, que tornaria possível de ser vivenciada, cria uma desintegração potencial na unidade psicossomática. Esta, ao ver-se ameaçada por uma perda, por exemplo, propicia o surgimento no corpo da manifestação de descarga-ato, que são os sintomas psicossomáticos. (p. 355)
Santos Filho (1992) faz também uma sintetização da psicossomática para
nortear os aspectos técnicos da psicoterapia;
Admite uma diferença da histeria na medida em que no fenômeno somático não se consegue avançar pelos mesmos meios de acesso.
A via biológica admite uma história, mas é ligada a vivencias traumáticas.É uma via anatômica com seu substrato fisiopatológico.
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Relaciona-se com as noções de descarga e ato, fazendo-nos encará-la mais do ponto de vista metapsicológico econômico do que dinâmico.
Tem como correlato o pensamento operatório e a aprendizagem como meios de ligação e controle das possíveis desorganizações internas e externas, no lugar da articulação associativa simbólica.
É possível ser pensada como curto-circuito, devido á insuficiência mediadora do pré-consciente.
Como conseqüência, é melhor equacionada na primeira tópica, enquanto os processos neuróticos o são pela segunda tópica.
Relaciona-se á supressão e á clivagem do ego.
É desencadeada por um acontecimento da ordem da perda ou equivalente.
Esta perda não é relacionada pelo sujeito ao fenômeno e em geral é minimizada e “bem tolerada”.
É uma via estabelecida precocemente, geneticamente antes do advento da palavra como organizador simbólico, ou seja, se estabelece em um período pré-verbal, relacionando-se á diferenciação eu - outro, á organização do sentimento de ser e de existir. Pode ser pensada como uma via que protege, anacronicamente, o sujeito de angústias dessa época, portanto angústias de aniquilamento ou psicóticas.
Constitui-se sobre falhas nas relações primordiais, notadamente com a mãe ou
substituto. (p.356)
Nas primeiras entrevistas com pacientes psicossomáticos percebe-se que
estes não buscam uma subjetivação e sim uma necessidade de relação humana
mais próxima, de função imaginária, que consiga minimizar a intensidade das
angústias e das ameaças de desintegração. Sobre isto escreve Santos Filho (1992);
O que há de singular nestas entrevistas? Inicialmente a demanda, que é fornecida por um outro e é aceita ou “aprendida” pelo paciente. Funciona como se fosse uma receita ou pedido de exame complementar. (...) Há um pedido inicial de algo concreto, objetivo, algo que possa ser aprendido, ensinado e não desvendado, descoberto. (p.357)
Com o exposto pelo autor, não há então, o que descobrir. Notamos uma
dissociação absoluta entre o acontecimento traumático e os sintomas corporais que
nos leva a considerar a primeira grande ação terapêutica quando do atendimento de
pacientes psicossomáticos; a reconstituição histórica como enfatiza Santos Filho
(1992);
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Ai reside nossa tarefa primeira: a reconstituição histórica, a cronológica e a integração entre datas, acontecimentos e eclosões somáticas. Isso pode dar ao paciente uma primeira consciência da relação de seus sintomas com algo maior, de caráter existencial e ajudar a criar um sentido inicial e uma noção da razão de ser do tratamento. (p.357)
O mesmo autor considera importante este aspecto da reconstituição histórica
também para alertar sobre como se conduz o tratamento com o paciente
psicossomático. Tal perspectiva demarca ainda mais a diferença para o terreno da
neurose. Escreve Santos Filho (1992);
Se o analista fica em silêncio esperando o sentido brotar das associações livres tem uma amarga surpresa. Não brota sentido. Há também o silencio, forma-se um clima de incompreensão, de surpresa, decepção e comumente interrompe-se o tratamento. Admitida esta presença viva, constante, falante, questionadora e ativa do analista como algo necessário, é fácil imaginar que esta psicoterapia deve ser conduzida face a face e não com o paciente em posição deitada. (...) O paciente psicossomático não está em Tebas, á beira de um oráculo, á espera de decifração. Ele está em busca de uma relação humana, interpessoal, que possa ajudá-lo a constituir-se mais plenamente como sujeito e, quem sabe, um dia possa até desejar buscar um oráculo. (p. 357)
Volich (1998) ciente da diferença entre a condução de análise de um neurótico
e de um paciente psicossomático, defende uma visão ampla, onde somente a
compreensão psicológica é insuficiente. Acredita que o fenômeno exige uma
abordagem multiprofissional, devendo haver interlocução de saberes. Escreve Volich
(1998);
Em função de tudo isso, a prática da psicossomática não pode se restringir a uma atividade de consultório particular. Para que estas trocas e a função de interlocução sejam possíveis, é necessário que ela seja exercida em conjunto com outros profissionais, em um contexto institucional, de saúde, de educação, e mesmo empresarial, em enquadres interdisciplinares. (p.19)
Volich (1998) também enfatiza a importância da mentalização do pensamento e
dos afetos como elemento regulador essencial para uma adequada condução do
trabalho terapêutico. Partindo da compreensão de uma perspectiva econômica, onde
se infere que o organismo tem basicamente três vias de descargas de suas
excitações, a saber, a via orgânica, a ação e o pensamento, para este autor é evidente
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qual a via usada pelo paciente psicossomático e que a mentalização é o recurso que
precisa ser oferecido aos pacientes;
Compreendemos assim a função e a importância atribuída pela Psicossomática Psicanalítica ao aparelho mental, á mentalização do sujeito como reguladores da economia psicossomática. A mentalização consiste em operações simbólicas através das quais o aparelho psíquico garante a regulação das energias instintivas e pulsionais, libidinais e agressivas. A atividade fantasmática, o sonho, a criatividade são atividades essenciais ao equilíbrio psicossomático. A estruturação ou o funcionamento deficiente do aparelho psíquico traz como conseqüência a utilização de recursos mais rudimentares, da ordem da motricidade ou mesmo das reações orgânicas, como meios de regulação da energia do indivíduo. (p.15)
A mentalização se constituí então como o início de um processo de construir
conjuntamente ao paciente psicossomático um acesso ao mundo simbólico que lhe
falta. Neste sentido o terapeuta está na necessidade de verbalizar, de propor
assuntos, de colocar questões e de responder ás do paciente, de abrir vias e
caminhos que o paciente não consegue abrir sozinho.
Sabattini (2008) dentro da perspectiva psicanalítica escreve que;
El psicoanalisis há ido diferenciado um campo especifico para la afeccion psicosomatica. Para ello ha debido producir a partir de la investigacíon de los fenómenos, um cuerpo teórico novedoso, una nueva lectura diríamos de los esquemas intervenientes. Han surgido sub especialidades como la psicooncologia, la psicocardiologia, la psicodermatologia, etc.
Se consideraron desarrollos de otras ramas de la salud y también de la psicología de la salud. Tal el concepto de vulnerabilidad psicosomática. Podríamos decir que se ha hecho hincapié en lo temprano del desarrollo evolutivo que es hacia donde confluyen las problemáticas del narcisismo, y dentro de ellas, la psicosomática. Lo temprano y su vehículo, la díada primiaria, requiereron de mayores presiciones. (p.14)
Assim, o desenvolvimento das intervenções psicanalíticas no terreno do
fenômeno psicossomático está atrelado a toda uma gama de estudos que
inevitavelmente remete á compreensão dos vínculos objetais primitivos da criança,
aquilo que já se sabe relacionadas á fase pré-verbal. Neste sentido outros
psicanalistas como Bion e seu conceito de revérie materna, Winnicott e a função de
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holding e Spitz e a função materna introjetada, estudos voltados basicamente para a
díade mãe-filho, tornam-se requisitos essenciais.
Considerações Finais.
Fica evidente que a direção do tratamento com pacientes psicossomáticos traz
a necessidade de pensar a diferença do fenômeno em relação á neurose. Se nos
pacientes neuróticos a “interpretação simbólica” tem o efeito sutil de por a mostra um
sentido oculto, desconhecido para o paciente tal como uma metáfora, não vemos a
mesma possibilidade com os pacientes psicossomáticos.
A interpretação, tal qual a entendemos para a psicanálise de neuróticos, deve
ser evitada no trabalho com psicossomáticos. Como nestes pacientes, sua condição
se estabelece em uma fase pré-verbal, fica fácil imaginar a fragilidade pessoal com a
qual lidamos a realizar a análise com eles. Daí a compreensão de que não é de um
oráculo que eles precisam em terapia e sim de algo que se aproxime mais de uma
relação interpessoal.
Assim, estas psicoterapias acabam por exigir muito mais do analista. Exigem
tempo maior, paciência e uma disponibilidade interior de se colocar nesta posição que
em muito difere da posição diante do neurótico.
Os pacientes psicossomáticos relacionam-se mais com as disposições
verdadeiras, reais do analista como pessoa. Muito mais do que com as palavras que o
analista diz, embora seja por meio das palavras do analista, em sua forma claramente
sugestiva, que o paciente terá alívios em momentos de maior angústia.
Deste modo, será através do pré-consciente do analista que se poderá
organizar a capacidade simbólica do analisando. Ao analista caberá colocar as
palavras que faltam ao paciente e por meio das suas características pessoais, ofertar
uma relação de suporte e construção para o psiquismo do paciente. Enfim, um
trabalho árduo, lento e cuidadoso, no qual, mais do que em qualquer outro trabalho
analítico, a intuição e os afetos do analista e não sua inteligência forma o norte para se
alcançar alguma transformação em um fenômeno que insiste em se dar em um único
lugar: o corpo.
REFERÊNCIAS
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Title Psychosomatic clinic (psychoanalytical considerations)
Abstract This article aims to works over the psychoanalytical comprehension of psychosomatic
from the possible treatment at the clinic. It brings some conceptions from the authors
who created such conditions, since Freud, in order to enable some thoughts about this
phenomenon nowadays, and also tries to show the features which determine the
direction of psychoanalytical treatment of the psychosomatic on what it distinguishes
from neurosis.
Keywords
Psychosomatic, psychoanalysis, body, treatment, phenomenon.
http://www.faar.edu.br/revista
Recebido em: 12/11/2010 Aceito em : 16/11/2010