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Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, Vol. 9, N. 4, 2018, p. 2267-2292. Vinícius Casalino DOI: 10.1590/2179-8966/2018/29868| ISSN: 2179-8966 2267 A dialética de Karl Marx e a crítica marxista do direito Karl Marx's dialectics and the marxist criticism of law Vinícius Casalino 1 1 Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0003-3315. Artigo recebido em 3/08/2017 e aceito em 16/01/2018. This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.

A dialética de Karl Marx e a crítica marxista do direito · 7 A primeira edição de Teoria geral do direito e marxismo foi publicada em 1924. 8 No contexto do debate marxista,

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AdialéticadeKarlMarxeacríticamarxistadodireitoKarlMarx'sdialecticsandthemarxistcriticismoflaw

ViníciusCasalino11Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil. E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0003-0003-3315.Artigorecebidoem3/08/2017eaceitoem16/01/2018.

ThisworkislicensedunderaCreativeCommonsAttribution4.0InternationalLicense.

Rev.DireitoPráx.,RiodeJaneiro,Vol.9,N.4,2018,p.2267-2292.ViníciusCasalinoDOI:10.1590/2179-8966/2018/29868|ISSN:2179-8966

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Resumo

O artigo busca compreender de modo aprofundado as peculiaridades da dialética

materialista, de Karl Marx, em oposição à dialética idealista, hegeliana. Com

fundamento em O capital, ressalta a ausência de preocupações metodológicas mais

acuradas no interior da crítica marxista do direito, o que redunda na adoção de

premissas,métodoseconclusõesdiscrepantesecontraditórias.Asconclusõesindicama

urgência do debate sobre o método dialético-marxiano e a importância de sua

incorporaçãorigorosaàcríticamarxistadodireito.

Palavras-chave:Marxismoedireito;DialéticadeKarlMarx;EvgeniPachukanis.

Abstract

The article seeks to understand in depth the peculiarities of KarlMarx’s materialistic

dialectic, as opposed to the idealistic, Hegelian dialectic. Grounded in Capital, it

highlights the absence of more accurate methodological concerns within theMarxist

critiqueof law,which leads to theadoptionofdiscrepantandcontradictorypremises,

methods and conclusions. The conclusions indicate the urgency of the debate on the

Marxian-dialectical method and the importance of its rigorous incorporation into the

Marxistcritiqueoflaw.

Keywords:Marxismandlaw;DialecticsofKarlMarx;EvgenyPashukanis.

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“Ora,emboraestanãosejamaisdoqueamerarepetiçãodoprocessodeproduçãonamesmaescala,essamerarepetiçãoou

continuidadeimprimeaoprocessocertascaracterísticasnovasou,antes,dissolveascaracterísticasaparentesqueeleostentavaquando

transcorriademaneiraisolada”.KarlMarx.

Introdução

UmdosgrandesméritosdePachukanis,reconhecidoporquasetodosquantostenham

sedebruçadosobreTeoriageraldodireitoemarxismo, éo rigormetodológicocomo

qualprocedeuàanálise críticadasprincipais categoriasque formama teoria geraldo

direito.1Essacaracterísticapodeserdetectada,demodomuitoevidente, jánonúcleo

essencial de seu pensamento, que consiste na original aproximação entre a forma do

direito e a forma da mercadoria.2 Assim, no lugar de situar sua análise no âmbito

relativamente abstrato das relações entre infraestrutura e superestrutura,

compreendendo o direito como mera expressão ideológica3, ou introduzir a forma

jurídica, abruptamente, no contexto da luta de classes4, Pachukanis segue os passos

metodológicosdeMarxeassociaodireitoàmercadoria, istoé,à formaelementarda

riquezanomododeproduçãocapitalista.Comisso,desvendaafiguramíticadosujeito

de direito, elemento central para a teoria geral do direito, descobrindo sua origem

1 Cerroni compara aobradePachukanis à de Stutchkanos seguintes termos: “Masdois elementos, pelomenos, diferenciam profundamente a sua perspectiva da de Stutchka. O primeiro refere-se a umamaisnítida acentuação do caráter objetivo (extraconsciencial) de toda a problemática jurídica (...) O segundoelemento diz respeito a umamaior agudeza metodológica, que se insere numa cultura filosófica maisprofunda e numa meditação muito penetrante sobre o método de O capital. Não é por acaso quePachukanisétalvezoprimeiroestudiosomarxistaquetrabalhanabasedaIntroduçãode1857,umtextodeMarxquepormuito tempo ficoude ladona tradiçãodaexegesemarxista” (CERRONI,1976,p.65, grifosmeus).2Noprefácioà2ªedição,Pachukanisanota:“OcamaradaP.I.Stutchkadefiniucombastantepropriedademinhaabordagemda teoriageraldodireitocomo ‘umatentativadeaproximaçãoda formadodireitodaformadamercadoria’.Nemedidaemquepossojulgarpeloscomentários,essaideia,nãoobstanteressalvaspontuais, foi reconhecida em seus fundamentos como acertada e frutífera” (PACHUKANIS, 2017, p. 60;2003,p.36).3Como faz,porexemplo,Reisner.Cerroniexplica: “Em1912,Reisnerdáestadefiniçãododireito:éumaideologia que ‘se apoia, dentro da nossa consciência, principalmente no conceito de verdade, justiça eigualdadenadistribuiçãoenaigualizaçãodoshomensedascoisas”(CERRONI,1976,p.51).4TalqualStutchka:“Quandonosvimosforçados,em1919,a formular,noComissariadodaJustiça,nossaconcepçãodeDireito, lapidamosaseguintesentença,queadquiriu,alémdisso,caráteroficial, tendosidoacolhida,emrusso,nospreceitosfundamentaisdoDireitoCriminal (videCompilaçãodasLeisde1919,nº66,art.590):‘ODireitoéumsistema(ouumaordem)derelaçõessociais,quecorrespondeaosinteressesdaclassedominanteeque,porisso,éasseguradopeloseupoderorganizado(oEstado)’”(STUTCHKA,2001,p.76).

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concretanos“guardiõesdasmercadorias”,valedizer,naspessoasinstadasalevarseus

valoresdeusoaomercadoparaefetuaratroca.

Alémdeumapreocupaçãosubstancialcomosproblemasmetodológicos,oque

oconduziuàanálisecríticadascategoriasqueconformamateoriageraldodireitoàluz

da apresentação marxiana presente em O capital, Pachukanis demonstra uma

preocupaçãoformaltambém,namedidaemquereservaumcapítulodesuaobraparaa

apresentação dos métodos de construção do concreto nas ciências abstratas.5 Com

fundamento na Introdução à crítica da economia política, um texto de Marx pouco

utilizadoàépoca,oautorrussoassinalatrêsquestõesfundamentais:emprimeirolugar,

aimportânciadesepartirdosimplesparaocomplexo,daformapuraàsmaisconcretas,

demodoque, no casoda ciência jurídica, o Estadoé umpontode chegada e nãode

partida;emsegundo lugar,anecessidadedeconsiderarqueosconceitosdosquais se

valeaciênciasocialtêmumahistória,querdizer,nãosãoformasdepensamentocriadas

pela mente humana, mas correspondem a relações sociais precisas e historicamente

delimitadas – como, por exemplo, o conceito de valor, de direito etc.; por fim, a

observaçãomarxianadequeacompreensãodosentidodasformaçõessociaispassadas

dá-se por meio da análise das configurações mais tardias e, por conseguinte, mais

desenvolvidas,comoasociedadecapitalista.6

EmboraaobradePachukanistenhasignificadoummonumentalavançonoque

concerneàspreocupaçõesmetodológicasnointeriordacríticamarxistadesuaépoca,7

verifica-se,atualmente,umcerto“paradoxo”.Curiosamente,mesmoatradiçãomarxista

que se formou na esteira de Teoria geral do direito e marxismo, não logrou avançar

significativamente no que toca às questões demétodo. Os apontamentos elaborados

peloautorrussoforamtomadoscomocorretos,adequadose,sobretudo,suficientes,e

parou-se neles. Desse modo, categorias centrais do aparato pachukaniano, como a

figura do sujeito de direito, a preeminência do direito privado em face do público, a

extinção da forma jurídica etc., são tomados de modo relativamente acrítico8, sem

maiorespreocupaçõesnoqueconcerneaumanecessáriaeinafastávelavaliaçãocrítico-

5Capítulo01deTeoriageraldodireitoemarxismo(PACHUKANIS,2017,pp.81-86;2003,pp.63-70).6Pachukanisassinala:“Apenasnessecasoconceberemosodireitonãocomoacessóriodeumasociedadehumanaabstrata,mascomocategoriahistóricaquecorrespondeaumambientesocialdefinido,construídopelacontradiçãodeinteressesprivados”(PACHUKANIS,2017,p.86;2003,p.70).7AprimeiraediçãodeTeoriageraldodireitoemarxismofoipublicadaem1924.8 No contexto do debatemarxista, evidentemente. Quando comparada à teoria tradicional do direito, acríticamarxistadespontanavanguardadetodasasanálisesemvoga.

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metodológica da própria teoria de Pachukanis. O resultado não poderia ser mais

desanimador:asabordagensmarxistassobreodireitoingressaramnumcírculovicioso,

nointeriordoqualpermanecem“girando”sobreaspectosconstantementereiteradose

ruminadosàexaustão.

O propósito deste artigo é chamar a atenção para este problema que tem

passadodespercebidopelacríticamarxistadodireito:asquestõesrelativasàelucidação

do“método”utilizadoporMarx,eque impõemumaanálisenecessáriadoscontornos

particulares de sua dialética, ainda não foram devidamente solucionados em outros

“campos”domarxismo,comoafilosofia,aeconomia,apolíticaetc.,paraseremdados

comodefinitivamente“resolvidos”epostosdelado.Pelocontrário,essetrabalhoainda

estáemcursoeasabordagensmarxistasnoâmbitododireitonãopodemsedaraoluxo

desimplesmentedesconhecê-lo.Porisso,oobjetodestaanálisecompreendeumaparte

doconjuntodepesquisasquetêmsedesenvolvidoemtornodadialéticamarxiana,com

vistasàidentificaçãodecertoselementosquelhesãopeculiares.Sustenta-seahipótese

de que a crítica marxista do direito precisa incorporar a seu campo de interesses a

problemática do método marxiano, sob pena de estacionar em categorias

constantementereiteradas,ou,oqueéaindapior,perder-senumecletismoradicalde

premissas, métodos e conclusões tão díspares que a aproximam perigosamente do

approachpós-moderno, tão em voga na teoria tradicional. Para tanto, estabeleceu-se

umrecorteanalíticodoLivroIdeOcapital,queconsisteprecisamentenaapresentação

daconversãodasleisdepropriedademercantilemleisdeapropriaçãocapitalista.Àluz

desta passagem, analisou-se o sentido conceitual da forma da propriedade privada

capitalistaemPachukanis,paraconstataremquemedidaseupontodevistaaproxima-

semaisoumenosdaperspectivamarxiana.Aconclusãoapontaparacertainsuficiência

metodológica da análise pachukaniana. Finalmente, o método utilizado não pode ser

outro que não o dialético-materialista de Karl Marx, cujos traços fundamentais

encontram-seincorporadosemOcapital.

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1.Problemas(antigos)dadialéticadeMarx

Os problemas relacionados à dialética de Karl Marx são antigos. Já no posfácio à

segundaediçãodesuaobramagna,em1873,oautorafirmava:“Ométodoaplicadoem

O capital foi pouco compreendido, como já o demonstram as interpretações

contraditórias que se apresentaram sobre o livro” (MARX, 2013, p.88; 1962, p.25).

IgualmenteantigassãoastentativasdeaproximarseumétodoaodeHegel.Namesma

ocasião, em tom de queixa, assinala: “Os resenhistas alemães bradam, naturalmente,

contraasofísticahegeliana”(MARX,2013,p.88;1962,p.25).Desdesempre,noentanto,

o autor se esforça para reivindicar a autonomia do seu método dialético. Após

mencionar extratos de uma crítica aO capital, observa: “Ao descrever de modo tão

acertadomeuverdadeirométodo,bemcomoaaplicaçãopessoalquefaçodesteúltimo,

queoutra coisa fez o autor senãodescrever ométododialético?” (MARX, 2013, p.90;

1962,p.27;grifosmeus).

Após um período de relativo “desinteresse”, em que predominaram debates

estritamente “econômicos” sobre a obra de Marx, os temas “filosóficos” voltaram à

cena,sobretudopormeiodossubstanciaisestudoselaboradosporKarlKorsch(2008)e

GeorgLuckács (2003),publicadosnadécadade19209.Nãoobstante, se,porum lado,

empenhavam-se no resgate da dialética, especialmente no que concerne a uma

necessária reincorporação de Hegel ao debate marxista, por outro, não lograram

enfrentar,demododetidoerigoroso,ascomplexasquestõesapresentadaspelodesafio

dedesvendaroscontornosconceituaisdeumadialéticaespecificamentemarxiana.Esta,

por sua vez, longe de antagonizar ou repelir a análise das formas econômicas,

pressupõe-nas como elementos constitutivos de seu próprio modo de ser. Nesse

sentido, não parece exagero afirmar o importante papel desempenhado Isaak Illich

Rubin(1987),aoapresentar,tambémnadécadade1920,ateoriamarxianadovalorde

modonão-autonomizado.

No entanto, alguns anos teriam de passar, ainda, para que viesse à tona um

resgatemaisprecisodasrelaçõesentreeconomiaedialéticanopensamentodeMarx.

Emmeadosdadécadade1950,RomanRosdolsky(2001)sedebruçasobreosGrundrisse

(MARX, 2011) para extrair dali importantes indicações sobre como se estrutura o

9Confira-se:(ANDERSON,2004),sobretudoocapítulo03.

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métodomarxiano, sobretudonoqueconcerneàs íntimasrelaçõesquemantémcoma

LógicadeHegel.10Aofazê-lo,Rosdolskylidacomtemasespecificamente“econômicos”

(dinheiro,capitaletc.),queconstituem,afinaldecontas,oobjetopropriamenteditodo

“rascunho”deMarx.Entretanto,somenteapartirdadécadade1960,talvezporconta

de um bem-vindo afastamento dos estudos acadêmicos com relação às vicissitudes

políticas da época, surge no cenário intelectualmarxista uma “nova leitura” deMarx,

cujo objetivo consiste em encarar certos desafios ligados à interpretação da obra

marxianademodorelativamenteautônomo,semrender“satisfações”àsinterpretações

“oficiais”atéentãoestabelecidas.

Esse “novo horizonte” deu ensejo a um enfrentamento mais direto dos

problemas relativos aométodo dialético queMarx “aplicou” às questões econômicas.

HelmutReichelt, umdosexpoentesdesta “nova leitura”, captoudemodoperspicaz a

problemática:

Entrementes o interesse foi se voltando cada vezmais para a obratardiadeMarx,masparecequenãosechegounemumpassomaisperto da esperada aclaração dos problemas metodológicos. Ocomentário redigido por Rosdolsky tampouco mudou muita coisanesse tocante. Embora ele diga que exatamente o Rascunho nosmostraoquantoa“estruturaçãodeOcapitaldeMarxédialéticadocomeço ao fim”, no final das contas, isso não passa de umaasseveração. Uma das debilidades do seu livro consisteespecialmenteno fatode apenas chamar a atençãoparaousodascategorias hegelianas e, no mesmo fôlego, reproduzir quase semcomentários passagens inteiras que se distinguem por suasformulações de cunho altamente especulativo e, por isso mesmo,extremamente carentes de interpretação. Isso suscita ao natural apergunta se Rosdolsky não teria incorrido igualmente nasuperficialidadeporelecensurada;se–apesardeafirmar isso–elechegoumesmoaabandonaraposiçãoquevênadialéticapresenteem O capital apenas um ingrediente estilístico que permaneceexterioraoassuntotratado(REICHELT,2013,p.24).

Segundo esta “nova leitura”, a compreensão mais precisa dos elementos

dialéticosdaexposiçãomarxianapassanecessariamentepeloescrutínio internodesua

obra,istoé,pelarevelaçãodasdeterminaçõesdialéticasdascategoriasporintermédio

dasquaisacríticadaeconomiapolíticaéestruturadaeapresentada.Emoutraspalavras,

nãobastadelimitaroscontornosdesteoudaqueleconceito,ouapontarneleaorigem

10“NãohátematratadocommaisdescuidopeloscomentadoresdateoriaeconômicadeMarxdoqueodeseumétodoe,particularmente,desuarelaçãocomHegel”(ROSDOLSKY,2001,p.15).Umaabordagematualdaquestãoencontra-seem:(ARTHUR,2016),noconjuntodaobraesobretudonocapítulo05(OcapitaldeMarxeaLógicadeHegel).

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precisa na dialética hegeliana;11 trata-se, muito mais, de apanhar a lógica interna da

exposiçãoe,apartirdestacaptação,compreenderseusnexoscategoriaisconstitutivos

demaneiratalqueestalógicasignifique,elamesma,oobjetodaapresentação,ouseja,

omodo de produção capitalista e suas correspondentes leis de produção e circulação

que,apartirdaí,podeserapreendidocomoconcretopensado.

Há, entretanto, um elemento paradoxal no esforço empreendido pela “nova

leitura”. O impulso para superar as limitações que se verificam, por exemplo, em

Rosdolsky, ou seja, a apreensão meramente externa dos elementos dialéticos da

exposição marxiana, no lugar de conduzir ao “mergulho” na lógica interna da

apresentaçãoqueéOcapital,conduziuaoutroobjeto,qualseja,osGrundrisse,istoé,o

rascunhodacríticadaeconomiapolítica,enãoaestacríticaemsimesmaconsiderada.

Reicheltéclaroaesterespeito:

Essa concepçãoé sugeridaexatamentepeloRascunho deOcapital.AopassoquedeOcapital, casonecessário,aindasepodemextrairteoremasisoladosediscuti-losnohorizontedaciênciaespecializadasemlogoserpegoemflagranteviolaçãodatotalidadedaconcepção,nos Grundrisse da crítica da economia política, no Rascunho de Ocapital, isso não é mais possível. Neles aparece muito maisclaramente do que em O capital que o “modo hegeliano deexpressar,difícildecompreender”,écomponente integraldacríticamarxiana. Neles, o entrelaçamento de temas que tradicionalmentesão atribuídos à ciência econômica com uma forma de exposiçãodesses temas orientada na lógica hegeliana é tão estreito que setornainviávelabordaracoisaseparadamente(REICHELT,2013,p.25).

Mas o paradoxo que se apresenta é justamente este: não seria um aspecto

essencial da dialética marxiana a ocultação dos traços relativos às regras

metodológicas? O escondimento do “modo hegeliano de expressar, difícil de

compreender”, que se verifica em O capital, não seria um elemento específico da

dialéticadeMarx,umaparticularidadesuajustamenteparadiferenciá-ladadialéticade

Hegel?Noprefáciode2001,Reicheltobserva:

Duranteapreparaçãodestainvestigaçãosobreaestruturalógicadoconceito de capital emMarx, apresentada na forma de dissertaçãocomo primeira tentativa de reconstrução do método dialético deMarxemOcapital,nãomedeicontadeumaindicaçãocentral:logodepoisdapublicaçãodoescritoParaa críticadaeconomiapolítica,

11“Atéinvestigadoresdemodogeralcuidadosos,comoVorländer,acreditavampoderdemonstrarqueMarx‘narealidadesóhaviaflertadocomconceitoshegelianosemdoistrechos’(emboralogoacrescentassemumterceiro).Deixavamdeadvertirquecategoriasdecisivasdeseumétodo,reiteradamenteutilizadas,provêmdiretamentedaLógicadeHegel.Basta lembraraorigemhegelianaea importânciametodológicadeumadiferenciaçãofundamentalparaMarx,entremediaçãoeimediação”(ROSDOLSKY,2001,p.16).

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noanode1859,MarxescreveuaEngels,dizendoqueacontinuaçãoserá“muitomaispopulareométodomaisbemescondidodoquenaParte I” (III.3/49). Ou seja,Marx não facilitou a coisa para os seusleitores:porumlado,eleapresentaumaobracomumnívelelevadode exigência científica; por outro lado, ele “esconde” justamente ométodo pelo qual se define sua cientificidade. Gerd Göhler jáconstatouqueadialéticasofreu“redução”emOcapital,edefatoépossível provar que, já na segunda edição de O capital, Marxsimplesmente riscou passagens metodológicas essenciais para acompreensãodoseuprocedimento.Razões,amplitudeesignificadodessa“redução”aindanãoforamesclarecidos.Porém,sequisermosinvestigá-laereconstruirométodo,evidentementeéprecisoater-seaos escritos em que ele se apresenta, por assim dizer, “nãoescondido”,asaber,nostrabalhosdiretamentepreparatóriosparaOcapital,ouseja,sobretudonoassimchamadoRascunhodeOcapitale no Texto original do escrito Para a crítica da economia política(REICHELT,2013,p.11).

Pois então, a construção do sentido da dialética marxiana não passa,

justamente, por pressupor como elemento essencial de seu método justamente a

exigência de que ele permaneça “escondido”? Ou será que, como assinala Reichelt,

Marx “riscaria” trechos inteiros com referências metodológicas importantes

simplesmente por “descuido”? Difícil acreditar. Não seria urgente, então, iniciar o

enfrentamento das questões relativas às “razões, amplitude e significado dessa

‘redução’”,que“aindanãoforamesclarecidos”?12

Dessemodo,oquesepropõenesteartigoéumaespéciede“inversão”noque

concerneaospressupostosda“nova leitura”, istoé,aextraçãodométodomarxianoa

partirdaleiturarigorosadeOcapital.Enãoapenasisso,mastambémaconsideraçãode

queelementofundamentaldesuadialéticaconsistejustamenteem“ocultar”ométodo,

fazendo com que as determinaçõesmetodológicas “brotem” da própria exposição do

conteúdo, sem se ocupar com uma apresentação explícita desta ou daquela regra

metodológica.13

12Apropósitodesta“ocultação”,confira-setambém:(REICHELT,2011).13 Vale lembrar que parte essencial da dialética de Marx consiste numa apresentação circunstancial deelementosmetodológicos,emmomentosestratégicos,como,porexemplo,oclássicoparágrafoqueencerraocapítulo17doLivroIdeOcapital:“Deresto,comaformademanifestação‘valorepreçodotrabalho’ou‘salário’,emcontrastecomarelaçãoessencialquesemanifesta,istoé,comovaloreopreçodeforçadetrabalho,ocorreomesmoquecomtodasas formasdemanifestaçãoe seu fundooculto.Asprimeiras sereproduzem de modo imediatamente espontâneo, como formas comuns e correntes de pensamento; osegundo tem de ser primeiramente descoberto pela ciência. A economia política clássica chega muitopróximoàverdadeirarelaçãodascoisas,porémsemformulá-lasconscientemente.Elanãopoderafazê-loenquantoestivercobertacomsuapeleburguesa”(MARX,2013,p.612;1962,p.564,grifomeu).

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Isso não significa, evidentemente, sugerir um desprezo, subestimação ou

afastamento com relação aos monumentais avanços teóricos produzidos pela “nova

leitura”.Antes,ocontrário.Trata-sedeincorporá-losàanálisedasquestõesrelativasàs

peculiaridadesdadialéticamarxianapresentesemOcapital,mas“realizandoocaminho

devolta”,istoé,introjetandoasargutasobservaçõesmetodológicasextraídasàanálise

dosGrundrisseedaContribuiçãoàcríticadaeconomiapolíticaàapreensãodométodo

peloqualMarxapresentousuaobramagna.Trata-se,pois,deinterpretaroRascunhoà

luzdeOCapital,enãoesteàluzdaquele.

O que se almeja, em suma, é uma compreensão mais aprofundada das

características particulares da dialética de Marx, ou seja, o alcance das formas e

conteúdoscategoriaisespecíficosdeseu“método”, sobretudoemoposiçãoàdialética

idealista,hegeliana.Nãosetrata,contudo,deafirmar,comousualmentesefaz,queo

autordeOcapitalsimplesmente“inverteu”adialéticadeHegel,afastando,comisso,os

traços“idealistas”alipresentes.Trata-se,comosugereJorgeGrespan,deconstatarque

são duas dialéticas distintas, opostas, com pressupostos próprios e características

particulares:

Deacordocomestetextoconhecidoe,semdúvida,crucial,nãoéocasodeapenasdepuraradimensão“racional”dadialéticahegelianapara obter aquilo que dela semantém emMarx. Trata-se de duasdialéticasdistintas.Maisainda,“nãosódiversas”,comodiretamente“opostas”. Com isso, o procedimento de obtenção do “caroçoracional” passa a se definir como uma “inversão”, pela qual o que“está de cabeça para baixo” assume sua posição verdadeira(GRESPAN,2002,p.30,grifomeu).

2.Aconversãodasleisdepropriedademercantilemleisdeapropriaçãocapitalista

Obviamente, a abordagem dos problemas metodológicos presentes em O capital é

trabalho hercúleo, a ser realizado coletivamente e num longo período de tempo. Os

limitesdesteartigonãopermitemumaanálisemaisamplaesistemáticasobreotema.

Justamente por isso, é preciso estabelecer um “recorte” dentro do qual o problema

pode ser situado de maneira mais precisa e as questões enfrentadas de modo mais

adequado.

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Nesse sentido, há uma passagem do Livro I de O capital que pode ser

considerada um daquelesmomentos fundamentais em queMarx apresenta demodo

explícito um cânone de seu método. Trata-se do início da Seção VII (O processo de

acumulação do capital), especificamente os capítulos 21 (Reprodução simples) e 22

(Transformaçãodomais-valoremcapital),emqueseencontraaexposiçãodaconversão

das leisdepropriedadeque regemaproduçãodemercadoriasem leisdeapropriação

capitalista.Noitem01desteúltimocapítulo,Marxobserva:

Namedidaemqueomais-valordequesecompõeocapitaladicionaln. 1 resultou da compra da força de trabalho por uma parte docapitaloriginal,compraqueobedeceuàsleisdatrocademercadoriase que, do ponto de vista jurídico, pressupõe apenas, da parte dotrabalhador,alivredisposiçãosobresuasprópriascapacidades,edapartedopossuidordedinheirooudemercadorias,alivredisposiçãosobre os valores que lhes pertencem; namedida em que o capitaladicionaln.2etc.nãoémaisdoqueoresultadodocapitaladicionaln.1e,portanto,aconsequênciadaquelaprimeirarelação;namedidaemquecadatransaçãoisoladaobedececontinuamenteàleidatrocademercadorias,segundoaqualocapitalistasemprecompraaforçadetrabalhoeotrabalhadorsempreavende–e,supomosaqui,porseu valor real –, é evidente que a lei de apropriação ou lei dapropriedade privada, fundada na produção e circulação demercadorias, transforma-se, obedecendo à sua dialética própria,interna e inevitável, em seu direto oposto.A troca de equivalentes,queapareciacomoaoperaçãooriginal,torceu-se(gedreht)aopontode que agora a troca se efetiva apenas na aparência, pois, emprimeiro lugar, a própria parte do capital trocada por força detrabalhonãoémaisdoqueumapartedoprodutodotrabalhoalheio,apropriado sem equivalente; em segundo lugar, seu produtor, otrabalhador, não só tem de repô-la, como tem de fazê-lo com umnovoexcedente.Arelaçãodetrocaentretrabalhadorecapitalistaseconverte, assim, em mera aparência pertencente ao processo decirculação, numamera forma, estranha ao próprio conteúdo e queapenasomistifica.Acontínuacompraevendadaforçadetrabalhoéa forma. O conteúdo está no fato de que o capitalista trocacontinuamenteumapartedo trabalhoalheio jáobjetivado,doqualelenãocessadeseapropriarsemequivalente,porumaquantidademaior de trabalho vivo alheio. Originalmente, o direito depropriedadeapareceudiantedenósfundadonoprópriotrabalho.Nomínimo esse suposto tinha que ser admitido, porquanto apenaspossuidoresdemercadoriascomiguaisdireitosseconfrontavamunscomosoutros,masomeiodeapropriaçãodamercadoriaalheiaeraapenas a alienação de sua mercadoria própria, e esta só se podiaproduzir mediante trabalho. Agora, ao contrário, a propriedadeaparece do lado do capitalista, como direito a apropriar-se detrabalhoalheionãopagooudeseuproduto;doladodotrabalhador,comoimpossibilidadedeapropriar-sedeseupróprioproduto.Acisãoentre propriedade e trabalho torna-se consequência necessária deuma leique,aparentemente, tinhaorigemna identidadedeambos.Portanto, por mais que o modo capitalista de apropriação pareça

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violar as leis gerais daproduçãodemercadorias, elenão seoriginaem absoluto da violação,mas, ao contrário, da observância dessasleis(MARX,2013,p.658-659;1962,p.609-610,grifomeu)14.

A reprodução do capital não significa senão a repetição do processo de

produção,istoé,areiteraçãodomovimentorealizadopelaquantiadevalorinicialmente

lançadanacirculaçãoeconvertidaemmeiosdeprodução,matérias-primase forçade

trabalho.Umavezqueasmercadoriasresultantesdoprimeiroatodeproduçãoderam

seu“saltomortal”,ouseja,foramreconvertidasemdinheiro,ocapitalistatememmãos

aquelaquantiaoriginalmenteinvestida,maisumacréscimo,queconsistenomais-valor.

A continuaçãodestemovimento significauma “nova”produção,mas, perceba-se,nos

mesmo termos, quer dizer, reiterando os pressupostos iniciais – o que configura,

portanto,reproduçãodocapital.

Se a quantia relativa aomais-valor produzido é inteiramente consumida pelo

capitalista, não retornando ao circuito produtivo, tem-se o que Marx chama de

reproduçãosimples;se,poroutrolado,essemais-valoroupartedeleéreintroduzidono

processo de produção, tem-se a chamada reprodução ampliada ou acumulação de

capital. Emambosos casos verifica-se a reiteraçãodos pressupostos de existência do

capital: propriedade privada dos meios de produção nas mãos dos capitalistas;

“liberdade”dotrabalhadoremduplosentido, istoé,separaçãocomrelaçãoaosmeios

deproduçãoelivredisponibilidadedesuaforçadetrabalho;integraçãodotrabalhador

aosmeiosdeproduçãoporintermédiodecontratojurídico“livremente”pactuadocom

ocapitalistanaesferadacirculação.

Do ponto de vista da apresentação categorial das leis que regem a produção

capitalista,aexposiçãodareproduçãodocapitalintroduzumelementoimportante.Seo

primeiromomentodaproduçãoaindapermitequesemantenhaopressupostosegundo

o qual capitalista e trabalhador se encontram livremente no mercado e trocam

equivalentes; portanto, que o ajuste original envolve partes cujas propriedades têm

origemnoprópriotrabalho(umatransaçãojurídica“perfeita”,fundadanaigualdadede

14 Em nota de rodapé a esta passagem,Marx anota: “A propriedade do capitalista sobre o produto dotrabalho alheio ‘é a consequência rigorosa da lei de apropriação, cujo princípio fundamental era, pelocontrário,otítulodepropriedadeexclusivodecadatrabalhadorsobreoprodutodeseuprópriotrabalho’,Cherbuliez, Richesse ou pauvreté, cit, p. 58, em que, no entanto, essa conversão dialética (dialektischeUmschlag)nãoécorretamentedesenvolvida”(MARX,2013,p.659,notanº23;1962,p.610,notanº23,grifomeu).Naedição francesaocomentáriodeMarxapareceassim:“L’autersent lecontre-coupedialectique,maisl’expliquefaussement”(MARX,1971,p.27,notanº01,grifomeu).

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posições);arepetiçãodaprodução,ouseja,areproduçãodocapital,namedidaemque

implicaaextraçãocontínuademais-valor,desembocanoresultadoinexoráveldeque,a

partirdecertomomento,atotalidadedovalorinseridonocircuitoproveiodetrabalho

alheioapropriadosemequivalente.Restacaracterizadaumarelaçãodeexploração,de

modoqueaquelepressupostoinicialdeequivalêncianãoconseguemaissesustentarde

modoautônomo.15

3.Atorçãodialéticacomointerversão:crítica

Opontofulcralresidenomodocomoesta“conversão”deveserapreendida,istoé,seu

sentido categorial específico e, a partir desta apreensão, em averiguar que

consequências acarreta, do ponto de vista metodológico, à compreensão geral da

exposição dialética marxiana. Em outras palavras, deve-se afirmar uma modificação

objetiva nas leis que regem o processo de produção capitalista; ou, pelo contrário, a

dissolução do caráter pretensamente essencial daquele fenômeno, de maneira que

passea ser apreendido comomeraaparência ensejadapelomovimentoda circulação

quandocaptadodemodoisolado?Certasleiturasveemnesta“conversão”umagenuína

interversão, apoiando-se, portanto, no primeiro dos pontos de vistas acima

mencionados.RuyFausto,apropósito,assinala:

Essa mudança de perspectiva, que representa na realidade umamudança de sentido, objetiva, do processo, constitui o que Marxchama de interversão da lei da apropriação ou da propriedade,interversão cujos dois momentos poderiam ser resumidos daseguinte maneira: uma volta do capital ou cada volta do capitalobedece à lei de apropriação ou de propriedade das economiasmercantis,leisegundoaqualaapropriaçãodosprodutossefazpelatroca de equivalentes e depende, em última instância, do trabalhopróprio. Mas a repetição das voltas do capital – e portanto ocumprimento reiterado da lei de apropriação pelo trabalho e pelatroca de equivalentes – interverte esta lei na lei de apropriação

15EisopontodepartidaparaarespostaàquestãoformuladaporEdelman:“Vendoascoisasdeperto,nãosabemosmuitobemcomoe sobque formas jurídicas precisas seopera a extraçãodemais-valor. E essasemi-ignorâncianoscegaparaaprópriaforçadessasformas,dessastécnicas,paraasuaeficáciaconcretaeideológica. Por exemplo, sabemos verdadeiramente que o contrato de trabalho está ligado ao capital ecomoodireitodepropriedadeestá ligadoaocontratodetrabalho?Nãosabemosnadaverdadeiramente,aforaasbanalidadescomquenoscumulam:ocontratodetrabalhointroduzuma‘falsa’igualdadeentreaspartes,avontadedooperárioéuma‘ficção’...trivialidadescomquenoscontentamospreguiçosamenteporfaltadeirvernapráticacomoascoisassepassamdefato”(EDELMAN,2016,p.27).

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capitalista,apropriaçãosemequivalentedotrabalhoalheio(FAUSTO,2015,p.76).16

Poisbem,doisproblemasseapresentamdesdelogo.Emprimeirolugar,atéque

pontoécorretoafirmarque“umavoltadocapitaloucadavoltadocapitalobedeceàlei

de apropriação ou de propriedade das economias mercantis”, “segundo a qual a

apropriaçãodosprodutossefazpelatrocadeequivalentes”?

Ora,nocapítulo05,doLivroI,deOcapital,Marxapresentaaproduçãodomais-

valorabsoluto,emqueexplicitaadiferençaentreoprocessodetrabalhoqueredunda

naformaçãodevaloreaquelequeresultanavalorizaçãodovalor.Naquele,oprocesso

prolonga-seatéomomentoemqueovalordaforçadetrabalhoésubstituídoporum

equivalentedaquiloquefoipagopelocapitalistaaotrabalhador;nosegundo,oprocesso

alonga-se a tal ponto que o valor produzido excede o valor da força de trabalho,

superandoaquelarelaçãoinicialdeequivalênciaedandoorigemaomais-valorabsoluto,

“núcleoduro”domododeproduçãocapitalista.17Alémdomais,nocapítulo14,doLivro

I,Marxobserva:

A extensão da jornada de trabalho além do ponto em que otrabalhador teriaproduzidoapenasumequivalentedovalorde suaforçadetrabalho,acompanhadadaapropriaçãodessemais-trabalhopelocapital–nissoconsisteaproduçãodomaisvalorabsoluto.Elaforma a base geral do sistema capitalista e o ponto de partida daproduçãodomais-valorrelativo.Nestaúltima,ajornadadetrabalhoestá desde o início dividida em duas partes: trabalho necessário emais-trabalho.Paraprolongaromais-trabalho,otrabalhonecessárioéreduzidopormeiodemétodosquepermitemproduziremmenostempooequivalentedo salário.Aproduçãodomais-valor absolutogiraapenasemtornodaduraçãodajornadadetrabalho;aproduçãodomais-valorrelativorevolucionainteiramenteosprocessostécnicosdotrabalhoeosagrupamentossociais(MARX,2013,p.578;1960,p.532/533,grifomeu).

E,noiníciodaSeçãoVII,oautorexplica:

16“Consuma-seentãoanegaçãodaleideapropriaçãodacirculaçãosimples,edeseufundamento,atrocadeequivalentes.Aleidaapropriaçãopelotrabalhopróprioeointercâmbiodeequivalentessetransformana lei de apropriação sem trocado trabalhodeoutrem.ÉoqueMarxdenomina ‘interversãodas leis dapropriedadedaproduçãodemercadoriasem leisdaapropriaçãocapitalista’ (W.23,K. I,p.605.Oeuvres.Économie I. Op. cit., p. 1081). E o que há de importante nessa interversão – e é por isso que hárigorosamente interversão–équea inversãose fazpelaprópriaaplicaçãodas leisdecirculaçãosimples”(FAUSTO,2015,p.276,grifomeu).17“Ora,secompararmosoprocessodeformaçãodevalorcomoprocessodevalorização,veremosqueesteúltimonãoémaisdoqueumprocessodeformaçãodevalorqueseestendeparaalémdecertoponto.Setalprocessonãoultrapassaopontoemqueovalordaforçadetrabalhopagopelocapitalésubstituídoporumnovoequivalente,eleésimplesmenteumprocessodeformaçãodevalor.Seultrapassaesseponto,elesetornaprocessodevalorização”(MARX,2013,p.271;1960,p.209).

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Atransformaçãodeumaquantiadedinheiroemmeiosdeproduçãoeforçadetrabalhoéoprimeiromovimentorealizadopelaquantiadevalorquedevefuncionarcomocapital.Elaagenomercado,naesferada circulação. A segunda fase do movimento, o processo deprodução, é concluída assim que os meios de produção estãoconvertidosemmercadoriascujovalorsuperaovalordesuaspartesconstitutivas e, portanto, contémo capital originalmente adiantadoacrescidodeummais-valor.Emseguida,essasmercadoriastêm,porsua vez, de ser lançadas novamente na esfera da circulação. Oobjetivo é vendê-las, realizar seu valor emdinheiro, converter essedinheiro novamente em capital, e assim consecutivamente. Esseciclo, percorrendo sempre as mesmas fases sucessivas, constitui acirculaçãodocapital(MARX,2013,p.639;1960,p.589,grifomeu).

Ficaclaroqueoprimeiro“ato”daprodução,istoé,aprimeira“volta”docapital,

ou cada “volta” do capital, produz, de maneira autônoma, quer dizer,

independentementedeoutrastantasvoltas,otrabalhoexcedente,logo,asubstânciado

mais-valor.Dessemodo,asuperaçãodarelaçãodeequivalência,ouseja,aviolaçãoda

leideapropriaçãomercantil,ocorredesde logo,naproduçãodocapital,enãoemsua

reprodução.

Em segundo lugar, não parece adequado afirmar, como faz Fausto, que a

reprodução do capital faz com que a lei da apropriação pelo trabalho próprio e

intercâmbiodeequivalentessetransformanaleideapropriaçãosemtrocadotrabalho

de outrem. Pois esta lei, vale dizer, a lei de apropriação capitalista, já está operando

desdeomomentoemqueaprimeiraquantiadevalor,naformadedinheiro,étrocada

pormeiosdeprodução,matérias-primaseforçadetrabalhoparadarinícioaoprocesso

produtivo de valorização.18 Não é a reprodução que “viola” a lei de equivalência; a

produção do capital o faz. Por isso, parece mais adequado afirmar que aquela, a

reprodução,nolugardeimprimiraoprocesso“certascaracterísticasnovas”,naverdade

“dissolveascaracterísticasaparentesqueeleostentavaquandotranscorriademaneira

deisolada”(MARX,2013,p.642;1960,p.592).

Dessemodo,édeseconsiderarqueosentidocategorialdatorçãodialéticapela

quala leidepropriedademercantilse“transforma”emseudiretooposto,istoé,na lei

deapropriaçãocapitalista,nãodevesercompreendidacomointerversãonosentidode

uma modificação essencial do processo, porém, antes, como conversão em sentido

materialista, vale dizer, modificação pela qual o fenômeno projetado pela esfera da

circulação, ou seja, a relação de equivalência entre capitalista e trabalhador, é18Aindaqueestaquantiadedinheiroapareçasimplesmentecomodinheiroenãocomocapital.

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apreendidacomoaparênciainvertidadomomentoprodutivoexploratório,este,sim,de

naturezaessencial.19-20

4.Torçãodialéticaeformajurídica:apropriedadeprivadacapitalista

Ocapítulo22doLivroIdeOcapital,emqueéapresentadaatransformaçãodomais-

valor em capital, introduz algumas questões importantes para a crítica marxista do

direito,que,noentanto,têmpassadorelativamentedespercebidas.Aconversãodasleis

de propriedade que regem a produção mercantil em leis de apropriação capitalista

imprimeaodireitodasociedadedocapitalcertascaracterísticasfundamentais.Omodo

comoseapreendeestaconversão,porsuavez,produzimpactonaanálisedasrelações

jurídicas,enviesando-a(aanálise)nosentidoidealistaoumaterialista,conformeocaso.

Aconcepçãomarxistafundamentalsobreodireitoencontra-se,evidentemente,

emOcapital21.Noiníciodocapítulo02(Oprocessodetroca),doLivroI,Marxobserva:

Asmercadoriasnãopodemirporsimesmasaomercadoetrocar-seumas pelas outras. Temos, portanto, de nos voltar para seusguardiões,ospossuidoresdemercadorias.Elassãocoisase,porisso,não podem impor resistência ao homem. Se não se mostramsolícitas, ele pode recorrer à violência; em outras palavras, podetomá-las à força. Para relacionar essas coisas umas com as outrascomomercadorias,seusguardiõestêmqueestabelecerrelaçõesunscomosoutroscomopessoascujavontaderesidenessascoisaseagirde modo tal que um só pode se apropriar da mercadoria alheia ealienarasuaprópriamercadoriaemconcordânciacomavontadedooutro, portanto, pormeio de um ato de vontade comuma ambos.Eles têm, portanto, de se reconhecer mutuamente comoproprietáriosprivados.Essarelaçãojurídica,cujaformaéocontrato,sejaela legalmentedesenvolvidaounão,éuma relaçãovolitiva,naqual se reflete a relação econômica. O conteúdo dessa relação

19AanálisesegueadeGrespan:“AproposiçãodosprincípiosformaisdacirculaçãosimplesnãoimplicaparaMarx, portanto, que de fato exista, tenha existido ou venha a existir uma sociedade estabelecidaunicamente sobreeles.Ao contrário, odesenvolvimentode suasdeterminações levanecessariamenteàscondições em que, no intercâmbio entre capital e força de trabalho, estes princípios são ‘torcidos’ einvertidos.Assim,aconservaçãodelesnaesferadacirculaçãoesuanegaçãopelavalorizaçãosãomomentosdistintose igualmenteválidosnareconstituiçãomarxianadaproduçãocapitalista.Estaprodução, tomadaemseuconjunto,envolvetantoasdeterminaçõesdacirculaçãodemercadoriascomoasquea invertem”(GRESPAN,1999,p.117).20Percebe-se,pois,quearespostaàpertinenteindagaçãodeEdelmanestáparaalémdesimplesmente“irvernapráticacomoascoisassepassamdefato”.Ela inclui, inexoravelmente,um“mergulho”rigorosonaanálise crítico-teórica e uma incorporação absolutamente necessária das “questões de método” queconformamaobramarxiana.21Apropósito,confira-se:(CASALINO,2016).

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jurídica ou volitiva é dado pela própria relação econômica (MARX,2013,pp.159-160;1962,pp.99-100,grifomeu).

O direito, paraMarx, é uma relação social caracterizada pela equivalência de

posições,querdizer,pelaconsideraçãorecíprocadeigualdade,liberdadeepropriedade

que qualifica os possuidores de mercadorias no momento em que se encontram no

mercado.Arelativaautonomiaquesuasvontadeshauremporocasiãodointercâmbio–

nosentidodepoderemdebater, sobestreitasmargens,preços, formasdepagamento

etc.–ensejaaaparênciadequemovimentamocircuitomercantil,quando,naverdade,

sãomovimentadasporele.Ospossuidoresaparecemcomopessoas,entesdotadosde

“direitosnaturais”: liberdade, igualdade,autonomiadavontadeepropriedadeprivada

fundadanatrocadevaloresequivalentes,oriundosdotrabalhopróprio.

O primeiro autor do campo marxista a captar a peculiaridade do sentido da

forma jurídicaemMarx foi, comodissemos,Pachukanis.Emsuaobra,Teoriageraldo

direito e marxismo, o russo associa, pela primeira vez, a figura do possuidor da

mercadoria à do sujeito de direito, categoria central para as teorias tradicionais do

direito. Nestas, entretanto, a gênese da pessoa é encontrada em pressupostos

idealistas,taiscomoo“direitonatural”oua“norma”positivadapeloEstado.Pachukanis

é o pioneiro na demonstração da condicionante material-econômica daquela figura

jurídica:

Dessa maneira, o vínculo social entre as pessoas no processo deprodução,reificadonosprodutosdotrabalhoequeassumeaformade princípio elementar, requer para sua realização uma relaçãoparticular entre as pessoas enquanto indivíduos que dispõem deprodutos,comosujeitos“cujavontaderesidenessascoisas”(...)Porisso, ao mesmo tempo que um produto do trabalho adquirepropriedade de mercadoria e se torna portador de um valor, ohomemadquireumvalordesujeitodedireitoesetornaportadordedireitos(PACHUKANIS,2017,p.120;2003,p.112).22

Não obstante, ainda que existam divergências no campo das pesquisas

marxistas23, pode-se afirmar, com alguma segurança, que a concepção de direito em

Marxavançaparamuitoalémdocapítulo02,doLivroI,deOcapital.Defato,osentido

22Oautorobserva:“DepoisdeMarxatesefundamental,asaber,dequeosujeito jurídicodasteoriasdodireitoseencontranumarelaçãomuitoíntimacomoproprietáriodasmercadorias,nãoprecisavaumavezmaisserdemonstrada”(PACHUKANIS,1988,p.08;2003,p.36).23 ParaMárcio Naves, por exemplo, haveria uma homologia entre a análise de Pachukanis e a deMarx:“Podemos dizer que a concepção de Pachukanis corresponde inteiramente às reflexões que Marxdesenvolve,sobretudonosGrundrisseeemOcapital,apropósitodolugarcentralqueocupaaanálisedaformaparacompreenderasrelaçõessociaiscapitalistas”(NAVES,2000,p.48).

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específicodaformajurídica,paraoalemão,apenaspodeseralcançadoplenamenteao

cabo do Livro III, quando as relações de produção e circulação do capital estão

plenamentedesenvolvidas.As análises dePachukanis, poroutro lado, acompanhama

concepçãomarxianapresente, sobretudo, no iníciodo Livro I, isto é, na apresentação

dos fenômenos da troca e circulação. Assim, o ponto de vista pachukaniano sobre a

propriedade privada capitalista, embora parta da circulação de mercadorias, não

desenvolveplenamenteaspotencialidadesdialéticasdoconceito,istoé,nãoapresenta

de modo adequado a maneira como a apropriação de mais-valor, que consiste

essencialmentenumarelaçãodeexploração,nãoapenasconvive,comovemàtona,ou

seja,éconstituídapor intermédiodeumarelaçãosocialmarcadapelaequivalênciade

valores.Emoutraspalavras,aausênciadeumdesenvolvimentoadequadofundadona

apresentaçãomarxianadaconversãodialética imprimeàanálisepachukanianaalguma

fragilidadenoqueconcerneàexplicaçãodaformadapropriedadeprivadasoboregime

deacumulaçãocapitalista.Veja-se,porexemplo,aseguintepassagem:

A propriedade capitalista é, em sua essência, a liberdade detransformar o capital de uma forma em outra e de transferi-lo deumaesferaparaoutracomoobjetivodeobteromáximolucrofácil.Estaliberdadededispordapropriedadecapitalistaéimpensávelsema presença de indivíduos desprovidos de propriedade, ou seja, deproletários. A forma jurídica da propriedade não está de modonenhumemcontradição comaexpropriaçãodeumgrandenúmerodecidadãos.Issoporqueacapacidadedesersujeitodedireitoéumacapacidade puramente formal. Ela qualifica todas as pessoas comoigualmente“dignas”deserproprietárias,maspornenhummeiofazdelas proprietárias. A dialética da propriedade capitalista estárepresentadademodomagníficoemOcapital,deMarx,sejanaquiloemqueelaassumeaforma“imutável”dodireito,sejaquandoabrecaminho através da violência (período da acumulação primitiva)(PACHUKANIS,2017,pp.132-133;2003,p.127,grifomeu).

Perceba-sequeaexposiçãopachukanianaestádeacordocomaapresentação

de Marx e, no entanto, permanece insuficiente. A forma jurídica da propriedade

capitalista realmente não contradiz o fato da expropriação, como afirma Pachukanis.

Entretanto, é preciso ir além e demonstrar por que razão isso não ocorre, isto é,

apresentardemodopreciso justamentea torçãodialética que traduzapassagemdas

leisdepropriedademercantilàsleisdeapropriaçãocapitalista.24Essedesenvolvimento

24Aessênciadapropriedadecapitalistanãoconsiste,simplesmente,na“liberdadedetransformarocapitalde uma forma em outra e de transferi-lo de uma esfera para outra”. Esta “liberdade” é caraterísticaessencialdaformadapropriedademercantil.Apropriedadecapitalistaconservaestaliberdadeesomaaela

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estáausente,demodogeral,daexposiçãopachukaniana,oqueconduzàaberturade

certos“flancos”teóricosquepermitem,sejaoataquefrontalàsuaposiçãoteórica,seja

ainterpretaçãoinsuficientee“desviante”deseupontodevistarigorosamentemarxista.

Assim, o problema fulcral gira em torno da forma específica da relação de

propriedade captalista, cuja adequada apresentação dos elementos conceituais

depende da maneira como se apreende a conexão dialética entre as esferas da

circulação e produção. Se esta conexão for apreendida demodo abstrato, fazendo-se

vistasgrossasdapeculiaridadedialéticadeseusnexosconstitutivos,então,comoafirma

Marx, a percepção de que as partes que se encontram no mercado são legítimas

proprietárias de sua respectivas formas-valor (força de trabalho e dinheiro) assume

caráteressencial, demodoque a lei da troca demercadorias permanece intacta e os

vínculos de igualdade, liberdade e propriedade fundada no próprio trabalho são

respeitados.Se,noentanto,observa-searelaçãoentrecapitaletrabalhodopontode

vistadaproduçãodomais-valor(retere-se,antesdareproduçãodocapital)apanha-sea

negação da relação de equivalência, sua natureza meramente aparente e, por

conseguinte, o caráter essencialmente exploratório da produção capitalista. A forma

jurídicadarelaçãodepropriedadecapitalistaéconstituídaprecisamenteporintermédio

daquelaconversãodialética,demaneiraqueseumododeserconsiste justamenteem

projetar a aparência de uma relação de direito fundada na equivalência de posições,

mantendoobscura,noentanto,a relaçãoessencial,exploratória,deextraçãodemais-

valor.

5.Acríticadacríticamarxistadodireito

AaproximaçãoefetuadaporPachukanis,entreformajurídicaemercantil,abriuoflanco

para a alegaçãodeque sua teoria poderia ser qualificada como “circulacionista”, pois

teriafeitoodireitoderivardeformasproduzidaspelacirculação,enãopelaprodução,

como indicam as observações deMarx. À acusação de “circulacionismo”, entretanto,

a extração demais-valor, isto é, a relação de exploração (Aufhebung,mas no sentidomaterialista). Ora,ondeháliberdadenãoháexploraçãoeondeháexploraçãonãoháliberdade,anãoserqueaexpropriaçãonão apenas conviva, como também seja constituída por aquela liberdade.Daí a riqueza da apresentaçãomarxianadaconversãodialética,quepermitecaptar,aumsótempo,tantoaaparência,comoaessênciadapropriedadecapitalista.

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respondeu-se, aomenos no Brasil, com uma formulação que deita raízes na obra de

Althusser.De fato,predominahojenocenárionacionaluma interpretaçãodaobrade

Pachukanis que se funda no paradigma althusseriano de crítica ferrenha à “herança

hegeliana” supostamente presente na dialética de Marx. A propósito, Márcio Naves

sustenta:

“É verdade que há, para Pachukanis, uma relação de determinaçãoimediata entre forma jurídica e forma damercadoria, como vimos,mas a determinação em Pachukanis é, a rigor, umasobredeterminação. A esfera da circulação, que determinadiretamente as formas do direito, é por sua vez determinada pelaesfera da produção, no sentido preciso de que só o específicoprocessodeorganizaçãocapitalistadotrabalhopermiteaproduçãodemercadoriascomotais,istoé,comoresultadodeumtrabalhoquese limitaaserpurodispêndiodeenergia laborativa indeferenciada”(NAVES,2000,p.72).25

Embora a resposta pareça convincente, está marcada, no entanto, por um

problemade“nascença”:seufundamentoremontaaoconceitodesobredeterminação,

apresentadoporAlthusseremAfavordeMarx:

Essasobredeterminaçãotorna-seinevitávelepensável,desdequesereconheçaaexistênciareal,emgrandeparteespecíficaeautônoma,irredutívelpoisaumpurofenômeno,dasformasdasuperestruturaedaconjunturanacionaleinternacional.Éprecisoentãoiratéofim,edizer que essa sobredeterminação não se atém às situaçõesaparentementesingularesouaberrantesdahistória(porexemplo,aAlemanha),masqueelaéuniversal,quejamaisadialéticaeconômicaageemestadopuro,quejamaisnahistóriasevêessasinstânciasquesão as superestruturas etc., afastarem-se respeitosamente quandoelas realizaram a sua obra ou dissiparem-se como seu purofenômeno para deixar avançar no caminho real da dialética SuaMajestadea Economiaporqueos Tempos teriamchegado.Nemnoprimeiro, nem no último instante, a hora solitária da “últimainstância”jamaissoa(ALTHUSSER,1979,p.99).26

Estanoçãodesobredeterminação,pelaqualsereconheceaexistênciareal,em

grandeparte específica e autônomadas formas da superestrutura, quando aplicada à

análisedateoriadePachukanis,nãodeixadesugerirumasecção, istoé,umaruptura,

25Emnotaoautorexplicaaorigemdoconceitodesobredeterminação,alheioaomarxismo:“Esseconceito,deorigemfreudiana,foiutilizadoporLouisAlthusseremPourMarx,Paris,Maspero,1977”(Id.,ibid.,nota39).Note-sequeaabeturaparaum“estruturalismoenvergonhado”énítida.26À frente, observa: “(...) é preciso antesdizer que a teoria da eficácia específica das supesrestruturas eoutras‘circunstâncias’permanece,emgrandeparte,porelaborar;eantesdateoriadesuaeficácia,ouaomesmotempo(porqueépelaconstataçãodasuaeficáciaquesepodeatingirasuaessência)ateoriadaessênciaprópriadoselementosespecíficosdasuperestrutura”(ALTHUSSER,1979,pp.99/100).

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entreasrelaçõeseconômicasdeproduçãoeasrelações jurídicas.27Assim,no lugarde

colocar em evidência a torção dialética apresentada por Marx (ou seja, o liame

específico por cujo intermédioapropriedade fundadano trabalhopróprioconverte-se

emapropriaçãodotrabalhodeoutrem),procedejustamenteaseuocultamento.

Ora, namedida emque a forma jurídica é determinada em “última instância”

pela esfera produtiva; que as relações de direito, portanto, possuem umaautonomia

“relativa”;intensifica-seapercepçãodequeasleisdepropriedademercantil,fundadas

emposiçõesdeequivalência,são,naverdade,leisessenciais,istoé,únicasexistentesna

realidade efetiva do capitalismo. Assim, todo o esforço de Pachukanis, que tenta

conciliar a equivalência da circulação com a exploração da produção (ainda que de

modopoucodialético,diga-sedepassagem),acabasimplesmenteignorado,poissefaz

um “desvio”, isto é, “esquiva-se” do enfrentamento do problema ao sugerir-se uma

derivaçãojurídicadesegundograu.

Nesse contexto, a crítica que Fausto dirige à interpretação althusseriana de

Balibar(1980)28noqueconcerneàanálisedareproduçãodocapitalpoderianosajudara

enfrentar a leitura que vê na obra de Pachukanis a presença da dita

“sobredeterminação”:

Comefeito,Balibarnãoapresentaarelaçãoentreosdoismomentos(o momento de uma volta isolada e o da reprodução) como umarelação de contradição, ou, se se quiser, ele não apresenta apassagememtermosdeumainterversão.Buscar-se-áinutilmenteemseutexto–oqueseexplica–aapresentaçãodainterversãodasleisde apropriação em termos de contradição. O conceito quepressupõemasanálisesdeBalibarnãoéodecontradição,masoderupturaou corte (...) Quemdiz contradição (dialética) diz “tensão”,separação,mastambémuniãoentredoistermos.Quemdizruptura,corte,diz“separação”:cadatermos“fora”dooutro.Comefeito,searelação entre os dois momentos é uma ruptura, não pode haverposiçãodapassagem–umcorteumarupturaéumvazio–equenãohaja posição da passagem significa que o primeiro momento estáfora do segundo, o segundo só pode aparecer como resultado (emsentidoabstrato),que substitui oprimeiro (...)Ora,é somente seo

27AsituaçãoétalqueFrançoisDossenãoexitaemsituarAlthussernocontextodoestruturalismofrancês:“Althusser substitui a vulgatamecanicista da teoria do reflexo por uma totalidade estruturada na qual osentidoéfunçãodaposiçãodecadaumadasinstânciasdomododeprodução.Assim,Althusserreconheceuma eficácia própria da superestrutura, a qual pode encontrar-se, em certos casos, em posição dedominância e, em todos os casos, figurar numa relação de autonomia relativa em comparação com ainfraestrutura”(DOSSE,2007,p.394-395,grifomeu).28 O trecho visado por Fausto é este: “Essas análises são, pois, aquelas nas quais Marx nos mostra omovimento de transição (mas essa transição é uma ruptura, uma inovação radical) de um conceito daprodução como ato, objetivação de um ou vários sujeitos, a um conceito de produção sem sujeito, quedeterminaemrecíprocacertasclassescomosuasfunçõespróprias”(BALIBAR,1989,p.230).

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segundomomento,aindaquecontradizendooprimeiro,oconservacomomomentonegado(ou,sesequiser,ésomenteseacontradiçãofor pensada em termos deAufhebung) que se poderia dizer que aclasse operária perde seu produto. Se for rompida toda acontinuidade entre os dois momentos, mesmo a continuidade nadescontinuidade que caracteriza a Aufhebung, só se apreenderá aapropriação intervertida e não a interversão da apropriação. ÉfinalmenteoúnicoresultadoaquechegaBalibar.Erroinversoàqueleque incorre a leitura antropologista da interversão, que faz doprimeiromomentoofundamentodosegundo–oqueabsolutamentenãosesupõeaqui–edainterversãonãoumanegação(tambémnosentido lógico), mas uma simples inversão real (em sentido fraco,semimplicarumanegaçãológica)domovimentofundador(FAUSTO,2013,p.77/78,passim).

AcríticadeFausto,entretanto,emboraprocureoferecerumarespostadialética

ao problema, não consegue solucioná-lo adequadamente, pois abstrai, em alguma

medida, dos elementosmaterialistas que caracterizam a apresentação marxiana. Ao

supor,comovimos,quea“interversão”ocorreapenasnomomentodareprodução;que,

portanto,a“torçãodialética”àqualserefereMarxtemlugarapenasna“segundavolta”

do capital, Fausto menoscaba a apresentação marxiana da produção do mais-valor

absoluto,ouseja, justamenteomomentoemqueocapitalextraidotrabalhadormais

trabalhodoqueaquelequesimplesmenterepõeovalordesuaforçadetrabalho.Ora,a

torçãodialéticaocorreporocasiãodaproduçãodocapital,enãodesuareprodução.

Sob a perspectiva de Fausto, contudo, a esfera da circulação, que sustenta a

existência autônoma da lei de propriedade mercantil, acaba por reter alguma

essencialidade, istoé,algumnívelderealidadedesconexadomomentoprodutivo(este

sim,elementofundamentalporcujoenfoqueseapanhaocaráteraparentedaquelalei).

Assim,seopontodevistadeFausto,porumlado,propiciaumganho,valedizer,evitaa

apreensão isolada da apropriação invertida, acaba, por outro lado, reificando a

interversão da apropriação, pois diminui a importância da produção do capital na

apresentaçãomarxiana,transferindoessestatusesclarecedor (nosentidodedesbastar

asaparências),aomomentodareprodução.

Assim, é preciso reiterar alguns pontos decisivos: em primeiro lugar, lembrar

que a conversão dialética por intermédio da qual a lei de propriedade mercantil se

transmudaem leideapropriaçãocapitalistaopera-seaindanomomentodaprodução

docapital (desua“primeiravolta”),demodoqueexposiçãoda reproduçãodocapital

apenasconsumaaapresentaçãodialéticadesta torção;emsegundo lugar,opontode

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vista de Fausto, na medida em que localiza essa “interversão” no momento da

reprodução,atribuiàleidepropriedademercantilalgumaessencialidade,portanto,uma

existência em certa medida desconexa do momento da produção; finalmente, a

resposta à crítica circulacionista à teoria de Pachukanis, porque fundada na noção de

sobredeterminação, além de inviabilizar um argumento dialeticamente adequado,

produzefeitoinverso, istoé,ocultaonóduloracionaldadialética,porcujointermédio

uma resposta fundada na concepção materialista poderia ser adequadamente

formulada.

Conclusão

À indagação “que método Marx ocultou?”,29 deve-se responder: o seu próprio. O

significado desta “ocultação” ainda precisa ser desvendado,mas a sugestão de que o

objetodoescondimentoteriasidoadialéticahegeliananãofazmuitosentido,anãoser

quesepretendaser“mais realistadoqueoRei”.De fato,numacartaaKugelmann,a

propósitodeumafigura“bemconhecida”domarxismo,Marxesclarece:

PossoagoracompreenderotomcuriosamenteembaraçadodacríticadeHerrDüring.Eleédeordinárioumindivíduomuitopresunçosoeimpudente, que se apresenta como revolucionário na economiapolítica.Elefezduascoisas.Publicouinicialmente(partindodeCarey)umFundamentoCríticodaEconomiaPolítica(cercade500páginas)edepois uma nova Dialética da Natureza (contra a hegeliana). Meulivroqueimou-oporambosos lados.EledeunotíciadissoporcausadesuaaversãoporRoscheretc.Deresto,emparteintencionalmentee em parte por falta de perspicácia, ele comete equívocos. Sabemuito bem que meu método de desenvolvimento não é hegeliano,umavezquesoumaterialistaeHegeléidealista.AdialéticadeHegeléaformabásicadetodaadialética,massomentedepoisqueelafoiextirpadadesuaformamística,eistoéprecisamenteoquedistinguemeumétodo(MARX,2002,p.228-229,grifomeu).

Pachukanis elevou a crítica marxista do direito a outro patamar quando

incorporouàanálisedasrelaçõesjurídicasumaprocupaçãometodológicamaisapurada.

Ele sem dúvida trabalhou à luz do “método” deMarx, portanto, a partir da dialética

marxiana.Entretanto,naépocaemqueTeoriageraldodireitoemarxismofoipublicada,

emmeadosdadécadade1920,omarxismoapenasiniciavaatentativadedesvencilhar-

29(REICHELT,2011).

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sedeuma certa tradição “economicista”, demodoqueodebate sobreo estatutodo

“método dialético” no interior do pensamentomarxiano começava a dar passosmais

substanciais. Paradoxalmente, a crítica marxista que seguiu os passos do autor russo

renunciou ao debate das questões metodológicas, dando-as por encerradas e

contentando-se em trabalhar com as categorias já solidificadas por Pachukanis,

sobretudoajárepisadafiguradosujeitododireito.

Doque se trata,portanto,édeumtrabalhoduplo:nãoapenas reincorporar à

críticamarxistadodireitoapreocupaçãoeosdebatesrelacionadosàdialéticamarxiana,

comotambémpromoverumaaberturaaoutroscamposdomarxismoparaauxiliarno

difíciltrabalhodedelimitaçãoeelaboraçãodeparâmetrosmaisprecisosquepermitam

identificar os contornos particulares dométodo dialético marxiano, em oposição ao

método idealistadeHegel. ConsiderandoqueOcapital é, por excelência, oobjetode

todaanálisequesepretendaséria,equeseencontraaliaapresentaçãodasformasdo

direito e da propriedade privada como elementos constituídos e constitutivos do

movimento de produção, circulação e acumulação do capital, não se deve estranhar,

absolutamente, a relevante contribuição que a crítica marxista do direito tem a

oferecer. Deve-se reconhecer que a tarefa é árdua; é também, no entanto,

absolutamentenecessária.

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