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ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE MINISTÉRIO PÚBLICO 3ª Promotoria de Justiça de Mossoró Defesa do Meio Ambiente Rua José de Alencar, s/n, Centro, Mossoró – RN (84-33153350) EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ______ VARA CÍVEL DA COMARCA DE MOSSORÓ O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, através do seu órgão de execução ao final subscrito, no uso regular de suas atribuições legais, notadamente a prevista no art. 129, III da Constituição Federal, art. 25, IV, ‘a’, da Lei Federal n. 8.625/93 e art. 60, I, da Lei Complementar Estadual n. 141/96, vem perante Vossa Excelência, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÃO CIVIL COM PEDIDO DE LIMINAR em face de 1

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÃO … - Associacao de Passaros.pdf · com amparo nos autos do PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL Nº ... Foto realizada pelos

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ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

MINISTÉRIO PÚBLICO3ª Promotoria de Justiça de Mossoró

Defesa do Meio AmbienteR u a J o s é d e A l e n c a r , s / n , C e n t r o , M o s s o r ó – R N ( 8 4 - 3 3 1 5 3 3 5 0 )

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ______ VARA

CÍVEL DA COMARCA DE MOSSORÓ

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO

NORTE, através do seu órgão de execução ao final subscrito, no uso regular de suas

atribuições legais, notadamente a prevista no art. 129, III da Constituição Federal, art.

25, IV, ‘a’, da Lei Federal n. 8.625/93 e art. 60, I, da Lei Complementar Estadual n.

141/96, vem perante Vossa Excelência, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DISSOLUÇÃO DE

ASSOCIAÇÃO CIVIL COM PEDIDO DE LIMINAR

em face de

1

ASSOCIAÇÃO DOS CRIADORES DE PÁSSAROS DE

MOSSORÓ/RN - ACPM, entidade privada, inscrita no CNPJ sob o

nº 04.002.400/0001-97, registrada no 5º Cartório Serviço Notarial e

Registral da Comarca de Mossoró, sediada na Rua Nossa Senhora

Aparecida, 05, Costa e Silva, nesta urbe, CEP 59600-900, que deverá ser

citada na pessoa de seu Diretor-Presidente, ANTÔNIO RAFAEL DA

COSTA, brasileiro, nascido em 17/11/1965, filho de MARIA LOBO

COSTA, CPF nº 7049001651, domiciliado na Rua Nossa Senhora

Aparecida, 05, Costa e Silva, CEP 59.600-970, Mossoró – RN,

com amparo nos autos do PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL Nº

007/2010-3ªPJM, pelos fundamentos de fato e de direito que passa a aduzir:

I – DOS FATOS

Após o recebimento de inúmeras denúncias anônimas, desde o ano de

2007, acerca da realização de rinhas de canários na sede da Demandada, o IBAMA

(Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) passou a

acompanhar as movimentações no local.

Desde o princípio, eram fortes os indícios de que o referido ente jurídico

estaria sendo utilizado como “fachada”, com o intuito de dissimular seu verdadeiro

propósito, isto é, a formação de quadrilha voltada para a prática habitual de crimes

ambientais, notadamente maus tratos contra animais silvestres e sua manutenção em

cativeiro sem autorização do órgão competente, além de outros delitos associados.

Por provocação daquela autarquia ambiental, a Polícia Federal chegou a

realizar diligências de campo, utilizando-se de estória cobertura para colher

informações com populares, bem como realizando campanas aos finais de semana,

tendo chegado à conclusão de que os eventos ocorriam semanalmente na sede da

Demandada e contavam com grande movimentação de pessoas e veículos.

2

Posteriormente, com base no inquérito policial nº 106.09.003067-7, o

Ministério Público Estadual obteve autorização judicial para infiltração de agentes

estatais no seio da quadrilha supramencionada, vindo a confirmar todas as suspeitas

iniciais, tudo devidamente documentado em vídeo e áudio, em consonância com

permissão judicial (mídia inclusa).

A materialidade do crime foi reforçada, ainda, durante abordagem policial

realizada pelo 3º Pelotão de Polícia Ambiental, aos 03 de julho de 2010, na sede da

referida Associação, oportunidade em que parte de seus integrantes foi surpreendida em

flagrante (vide cópias dos boletins de ocorrência e autos de infração inclusos).

As atividades operacionais de campo (infiltração) tiveram início em 14 de

outubro de 2009, após deferimento judicial. Já nessa primeira fase dos trabalhos,

constatou-se que os participantes da ação delituosa atuam com bastante cautela,

justamente para dificultar a aproximação das autoridades, apenas aceitando no seu

restrito círculo pessoas devidamente “recomendadas” por membros já conhecidos.

Porém, o agente estatal logrou ingressar no seio da quadrilha, vindo a

participar – por diversas ocasiões – dos eventos, quase todos devidamente

documentados em vídeo e áudio, em que eram promovidas rinhas de canários para

deleite dos que ali estavam.

Os eventos documentados ocorreram todos na sede da Associação dos

Criadores de Pássaros de Mossoró/RN, localizada à Rua Nossa Senhora Aparecida, 05,

Costa e Silva, nesta urbe, nos dias 08, 15, 22 de maio e 05 de junho, com participação

do seu atual presidente, que também reside no local.

No dia 03 de julho de 2010, às 14h., sem conhecimento da infiltração, a

CIPAM-PM (Companhia Independente de Proteção Ambiental) realizou abordagem

policial no endereço supra, em face de denúncias anônimas, oportunidade em que, como

dito, deu voz de prisão a algumas pessoas que se encontravam presentes, promovendo

rinha de canários.

3

Durante a abordagem policial supracitada, os milicianos apreenderam 33

(trinta e três) aves silvestres em cativeiro sem anilhas, ou seja, sem autorização do órgão

ambiental competente (IBAMA).

As imagens produzidas durante o cumprimento da infiltração e os

depoimentos colhidos revelam que a sede da “associação de fachada” era, de fato, uma

arena destinada à promoção habitual de rinhas, contando, inclusive, com arquibancada

em alvenaria para alojar o público (vide cópia do laudo de vistoria do ITEP).

Foto realizada pelos policiais do CIPAM, durante abordagem policial, que apresenta o local em que são

realizadas as rinhas de canários. Ao centro, uma mesa que comporta duas gaiolas. Nas laterais, as

arquibancadas.

Ouvidos pelo Ministério Público, os policiais que participaram da

abordagem na sede da Demandada prestaram depoimentos esclarecedores:

4

“(...) que tem informação que a referida rinha existe há bastante tempo,

pois o depoente nasceu naquele setor da cidade; (…) que no local em

que ocorrem as rinhas existe um bar que serve como “disfarce” para os

confrontos entre os animais, que ocorrem nos fundos do imóvel; (…)

que percebeu no local a existência de uma espécie de arena em que

várias pessoas se aglomeravam e, no centro, havia duas gaiolas sobre

uma mesa, cada uma delas com um animal; que as gaiolas estavam

próximas; que o depoente acredita que a rinha estava sendo iniciada;

que acredita que estavam presentes no local entre 20 (vinte) e 30

(trinta) pessoas; (…).” (JOSAFÁ PAULINO DE SOUZA). (Destaque

nosso).

“(...) que a equipe se deparou com cerca de 40 (quarenta) pessoas no

local e vários animais (canários), cerca de 72 (setenta e dois) canários,

além de outras espécies, bem como equipamentos utilizados em rinhas;

que havia duas gaiolas posicionadas em uma mesa, no centro de uma

espécie de arena; (…) que verificou muitas gaiolas para transporte de

aves escondidas no recinto, inclusive no telhado da casa e outras

escondidas em pias e entre materiais de construção; que essas gaiolas

continham canários; que restou evidenciado o intuito de ocultar os

animais da ação policial; que no local havia toda uma estrutura de

arquibancadas em alvenaria, para que os presentes pudessem assistir

as disputas; que há informações que dão conta da existência de

apostas de valores de até R$ 5.000,00 (cinco mil reais); que tem

conhecimento de que no local funcionava uma associação de criadores

de pássaros, mas pode perceber que, na verdade, a entidade servia

apenas de fachada para dificultar a ação dos órgãos de fiscalização;

(…) que a grande maioria dos pássaros não dispunham de anilha

(autorização); que as informações dão conta da existência de comércio

de animais e de instrumentos que auxiliavam na disputa, tais como

gaiolas especiais utilizadas para medicação dos canários; (…) que um

dos autuados chegou a reconhecer que, de fato, realizavam rinhas

naquele local; que o autuado MARCELO DIÓGENES DE CARVALHO

5

ROSADO foi o autor dessa afirmação; (…).” (JOÃO JOSÉ DE SOUZA

ALMEIDA). (Destaque nosso).

“(...) que no local havia grande movimentação de pessoas e veículos,

sendo necessário pedir reforço; que foi realizado um cerco; que

percebeu várias pessoas arremessando as gaiolas juntamente com os

animais no telhado do imóvel; (…) que percebeu outras gaiolas

escondidas com animais (canários) em diversos locais, tais como: sacos

de carvão, dentro do lixo, dentro de baldes coberto com pano, no

banheiro, etc; que aproximadamente entre 20 (vinte) e 30 (trinta)

pessoas se encontravam no local; que no local havia uma espécie de

arena, com uma mesa armada no centro e arquibancadas em

alvenaria no seu entorno; que na mesa do centro havia duas gaiolas;

que não havia mais animais no interior dessas duas gaiolas; que

acredita que os autuados tiveram tempo de soltar os animais que

estavam nas referidas gaiolas; que faz tal afirmação porque ao subir no

telhado percebeu a presença de animais soltos; (…) que os

proprietários de alguns animais se identificaram, alguns, inclusive,

confirmaram a ocorrência de rinhas no local; (…) que foram

apreendidos entre 60 (sessenta) e 70 (setenta) animais; (…) que os

próprios participantes do evento afirmaram que nas rinhas havia

apostas de altos valores; (…) que foram encontrados animais

apresentando lesões físicas; (…) que foram encontradas gaiolas

especiais, chamadas prensas, as quais são utilizadas para medicar os

animais; (…).” (MARCO ANTÔNIO ALBUQUERQUE FONTES).

(Destaque nosso).

“(...) que no imóvel existe uma residência; que após a residência há um

corredor que dá acesso a um bar; que no salão contíguo a esse bar foi

montada uma arena em alvenaria; que no meio da arena existe uma

mesa onde são colocadas gaiolas, numa espécie de ringue; que nas

gaiolas havia escrito R1 e R2, significando, provavelmente, ringue 1 e

6

ringue 2; (…) que aproximadamente 30 (trinta) pessoas se encontravam

no local; (…) que diversos animais, contudo, encontravam-se sem

anilhas, ou seja, sem autorização do órgão ambiental para cativeiro;

(…) que foram apreendidos aproximadamente 70 (setenta) canários,

além de pássaros de outras espécies; (…) que foram encontrados

animais apresentando lesões físicas; (…) que foram encontradas

gaiolas especiais, chamadas prensas, as quais são utilizadas para

medicar os animais; (…) que no local verificou que também havia

comércio de gaiolas.” (MANOEL CARMO DE MOURA JÚNIOR).

(Destaque nosso).

Restou apurado, portanto, que a entidade Demandada, ao contrário dos

objetivos preservacionistas contidos no seu estatuto, vinha sendo utilizada exatamente

para o oposto: abusos, maus-tratos e criação não autorizada de canários e aves de outras

espécies.

Ademais, a logística envolvida na ação criminosa ora descrita, bem como

as técnicas de contrainteligência utilizadas para dificultar a ação das autoridades exigem

nível de “profissionalismo” e organização próprios da ação de quadrilhas ou bandos,

razão pela qual foi oferecida (e recebida) denúncia criminal perante o Juízo da 3ª Vara

Criminal (vide doc. incluso).

No interior da Associação de Criadores de Pássaros de Mossoró – ACPM,

os animais são instigados e submetidos ao confronto, mediante técnicas específicas e

cruéis. Essas técnicas, que por si já configuram maus tratos, consistem em criar

artificialmente uma atmosfera de disputa entre dois canários machos, fazendo-os

acreditar que estão disputando uma fêmea da mesma espécie, que fica à mostra para

ambos, mas separada por divisórias da gaiola.

Comumente, essa tortura psicológica tem início dias antes do confronto,

com o isolamento do animal e submissão deste a estímulos diversos com o intuito de

instigar sua agressividade.

7

II – DA ADMISSIBILIDADE DA PROVA OBTIDA

PARA FINS CRIMINAIS EM PROCEDIMENTOS CÍVEIS

Incumbe, preliminarmente, tecer breves considerações no que se refere à

utilização de prova que, ab initio, fora produzida e destinada a instruir processo

criminal determinado, mas que, posteriormente, é transportada para procedimento

diverso, seja de natureza criminal, cível ou, até mesmo, administrativa, a que a doutrina

denomina de 'prova emprestada'.

Trazendo à baila a lição de Fredie Didier Jr. sobre o tema, entende-se que

“prova emprestada é a prova de um fato, produzida em um processo, seja por

documentos, testemunhas, confissão, depoimento pessoal ou exame pericial, que é

trasladada para outro processo, por meio de certidão extraída daquele”1.

Assim, diante de tal consideração, reside uma questão de acentuado relevo

em meio à doutrina e jurisprudência pátria no que diz respeito à possibilidade de

utilização de material(is) probatório(s) obtidos para fins criminais em qualquer outro

processo vinculado a outros ramos do direito, nesse caso, a área cível.

A interpretação prima facie do inciso XII, do art. 5º da Constituição da

República de 1988, no tocante especificamente à inviolabilidade de dados e das

comunicações telefônicas – que não é o caso vertente –, leva à conclusão de que não

seria possível essa importação, na medida em que dispõe, de maneira expressa, que essa

prova somente pode ser utilizada para fins de investigação criminal ou instrução

processual penal.

Sendo assim, observando-se apenas o aspecto literal e restritivo do referido

artigo, não haveria, de fato, como utilizar-se o material colhido para outro fim que não o

inicialmente almejado (pelo menos no que se refere à interceptação telefônica).

1 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do processo e processo de conhecimento. 6. ed. Salvador: JusPodivm, 2006, p. 523.

8

Todavia, além de considerar-se o princípio da proporcionalidade, deve

haver um discernimento entre as várias possibilidades e, sobretudo, prevalecer a lógica

do razoável, porquanto seja fundamental que se busque sempre uma efetiva prestação

jurisdicional aos conflitos de interesses submetidos ao exame do Poder Judiciário,

possibilitando uma verdadeira tutela dos direitos dos cidadãos.

Analogamente, não obstante a divergência de entendimentos, predomina a

inteligência de ser possível o empréstimo de provas colhidas até mesmo na

interceptação telefônica – desde que haja autorização judicial e seja respeitado o

devido processo legal, sob pena de nulidade –, que é uma medida de caráter

excepcionalíssimo, vinculada, por disposição constitucional expressa, à apuração de

crime.

Ora, como bem sustenta Barbosa Moreira, ao admitir a utilização da

interceptação telefônica como prova emprestada no processo cível, deve ser

considerado que, "sacrificado o direito da parte à preservação da intimidade, não

faria sentido que continuássemos a preocupar-nos com o risco de arrombar um cofre

já aberto". E, exemplificando, finaliza: "a sentença penal é título executivo judicial no

âmbito cível e o devedor-executado não poderá formular qualquer objeção no sentido

de que a sentença se fundara em interceptação telefônica, que não pode ter eficácia no

juízo cível (a eficácia preclusiva da coisa julgada impediria essa conduta)"2 (Grifos

acrescidos).

Esse entendimento, ao que parece, tornou-se a orientação jurisprudencial

prevalecente, tendo o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já admitido a utilização de

interceptação telefônica obtida mediante autorização judicial para fins não penais.

Senão, vejamos:

2 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A Constituição e as provas ilicitamente obtidas. Temas de direito processual: 6ª série, p. 120-121.

9

"INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA - OBJETO - INVESTIGAÇÃO

CRIMINAL - NOTÍCIA DE DESVIO ADMINISTRATIVO DE

CONDUTA DE SERVIDOR. A cláusula final do inciso XII do artigo

5º da Constituição Federal - "... na forma que a lei estabelecer para

fins de investigação criminal ou instrução processual penal" - não é

óbice à consideração de fato surgido mediante a escuta telefônica

para efeito diverso, como é exemplo o processo administrativo-

disciplinar. (...)" (STF, RMS 24956/DF, Relator Min. MARCO

AURÉLIO, Primeira Turma, DJ 18-11-2005).

No mesmo sentido:

"EMENTA: PROVA EMPRESTADA. Penal. Interceptação Telefônica.

Escuta ambiental. Autorização judicial e produção para fim de

investigação criminal. Suspeita de delitos cometidos por autoridades

e agentes públicos. Dados obtidos em inquérito policial. Uso em

procedimento administrativo disciplinar, contra os mesmos

servidores. Admissibilidade. Resposta afirmativa a questão de ordem.

Inteligência do art. 5º, inc. XII, da CF, e do art. 1º da Lei federal nº

9.296/96. Voto vencido. Dados obtidos em interceptação de

comunicações telefônicas e em escutas ambientais, judicialmente

autorizadas para produção de prova em investigação criminal ou em

instrução processual penal, podem ser usados em procedimento

administrativo disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em

relação às quais foram colhidos. (...)” (STF, INQ 2.424/RJ –

25/04/2007 – TRIBUNAL PLENO, Relator Min. Cezar Peluso).

(Grifos acrescidos).

10

O bem jurídico constitucionalmente resguardado pela vedação das

interceptações telefônicas, como se sabe, é a intimidade. Descortinada esta, de forma

lícita, em razão do permissivo constitucional, nada mais resta, portanto, a preservar.

Sendo assim, pode-se dizer que seria uma demasia negar-se a recepção da prova obtida

dessa maneira – ressaltando-se que sequer ocorreu tal medida extrema no caso em

disceptação –, sob a argumentação de que estaria indiretamente desrespeitando o

comando normativo insculpido em nossa Carta Magna vigente.

Outrossim, quanto à produção e apresentação das provas, o art. 332, da Lei

Instrumental Civil, preceitua, in verbis:

“Art. 332 – Todos os meios legais, bem como os moralmente

legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para

provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa".

Ora, se até mesmo a interceptação telefônica, como visto, pode ser

utilizada em esferas não penais (cível e administrativa), menos rigor deve-se exigir de

outras provas que não estão constitucionalmente vinculadas à apuração de crime, como

no caso da gravação de som e imagem, quando produzida por um dos interlocutores.

O pedido de autorização judicial para fins de gravação de som e imagem,

como ocorreu no caso vertente, pode ser considerado um excesso de zelo por parte do

Ministério Público, porquanto, mesmo que não haja conhecimento do outro interlocutor,

a gravação feita por um dos participantes do diálogo é moral e legalmente admissível,

independentemente de autorização do Poder Judiciário, conforme entendimento dos

Tribunais Pátrios, a seguir transcritos:

“EMENTA: ELEIÇÕES 2008 - RECURSOS - INVESTIGAÇÃO

JUDICIAL ELEITORAL - (...) ACUSAÇÃO FUNDAMENTADA EM

GRAVAÇÃO AMBIENTAL - LEGALIDADE DO MEIO

PROBATÓRIO - (...) - RECURSO PRINCIPAL DESPROVIDO.

1. A orientação jurisprudencial contemporânea empresta licitude

à prova que decorre de gravação ambiental efetivada por um dos

11

interlocutores, ainda que não conhecida e consentida pelo outro. A

elucidação de fatos que possam ter interferido na regularidade e

legitimidade do pleito eleitoral constitui garantia constitucional não

somente de caráter individual, mas também de interesse coletivo, pelo

que não pode ser suplantada pelo direito à privacidade, devendo, sim,

com ele coexistir em obediência ao princípio interpretativo

constitucional da harmonização ou da concordância prática,

amplamente difundido na doutrina constitucionalista.” (TRE-SC,

RDJE 1709/SC, Relator NEWTON TRISOTTO, DJE 29-01-2010, p. 6-

7). (Grifos acrescidos).

Também:

“EMENTA: RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO

ELEITORAL. ELEIÇÃO MAJORITÁRIA 2008. CAPTAÇÃO ILÍCITA

DE SUFRÁGIO. (…) GRAVAÇÃO AMBIENTAL. LICITUDE. (…)

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

(...)

3 - Na exegese do TSE, a gravação efetuada por um dos

interlocutores é prova lícita, até porque a conversa entre duas

pessoas, desde que não seja sigilosa por força de lei, pode ser

objeto de gravação.

(...)” (TRE-GO, RE 5929/GO, Relator JOÃO BATISTA FAGUNDES

FILHO, DJ 26-07-2010, p. 10-11).

Para finalizar, cumpre observar que se trata de prova irrepetível cujo uso

não encontra qualquer vinculação necessária ao âmbito penal.

III – DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

12

Visando garantir a efetividade do exercício real e permanente do direito ao

meio ambiente saudável, portanto essencial à sadia qualidade de vida, assegurada a

todas as pessoas, sem exceção, a Constituição da República de 1988 complementa o

raciocínio contido no caput do art. 225, definindo expressa e harmonicamente, novas e

específicas competências ao Poder Público (União, Estados e Municípios), como dentre

outras atribuições relevantes e interdependentes à preservação do meio ambiente, com

suas espécies, seus ecossistemas, seu patrimônio genético, enfim, com todos os seus

recursos naturais e culturais, vivos ou não vivos (art. 225, § 1°, I a VI, da CF), as

seguintes:

i) proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as

práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção da

espécie ou submetam os animais a crueldade (CF, art. 225, § 1°, VII);

ii) conservar o patrimônio público, considerado como o próprio

meio ambiente a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso

coletivo (art. 23, I, da CF, c/c o art. 2°, I, da Lei n. 6.938/81);

iii) preservar as florestas, a fauna e a flora (art. 23, VII, c/c art.

225, § 1°, VII, da Constituição)3.

Evidentemente, por força das vigentes normas constitucionais,

consolidadoras dos expressos conceitos legais, todos os animais, correspondendo à

fauna existente no Brasil em todas as suas espécies e categorias, estão compreendidos

no meio ambiente, pertencem ao meio ambiente ou fazem parte integrante dele, seja

periférico ou urbano, externo ou interno, tanto natural como artificial (CF, art. 225, c/c

arts. 182, 186, 200, VIII, 215, 216, 220, § 3°, II).

Conforme leciona ELÁDIO LECEY, “A fauna silvestre, como elemento

do ambiente, recurso natural que é, se revela como um bem de uso comum do povo”4

3 Brilhante argumentação formada pela Promotora de Justiça do Meio Ambiente de Salvador-BA à época, Sheila Santos de Almeida Costa, quando do ajuizamento de Ação Civil Pública perante a 21ª Vara Cível e Comercial da Comarca de Salvador-BA, em face de Centro Esportivo constituído e utilizado exclusivamente com o fim de promover rinhas de galo, na capital baiana.4 Revista de Direito Ambiental, ano 12, nº 48, out-dez./2007, p. 90.

13

Garantindo a Carta Magna, como visto, a proteção de todos os animais

existentes no Brasil, independente de sua espécie e de sua categoria, não previu nem

adotou quaisquer expressões indeterminadas, vagas, discriminatórias ou duvidosas.

Muito pelo contrário, em harmonia com o sistema jurídico brasileiro, previu e adotou,

de forma expressa, clara e inconfundível, a correta expressão determinada "os animais",

ou seja, todos os animais são constitucionalmente e legalmente protegidos contra

quaisquer tipos de crueldade, na forma da lei (CF, art. 225, § 1°, VII).

Aliás, impende considerar que a vida e a higidez física dos animais é

protegida constitucionalmente como um bem em si mesmo, não se tratando

absolutamente de uma proteção meramente utilitária para o ser humano

(antropocentrismo).

Dessa forma, “a Constituição Brasileira, de forma compatível com as

normas internacionais e nacionais vinculadas aos permanentes processos de evolução

educacional, evolução humanitária, evolução consuetudinária ou dos costumes,

evolução cultural ou civilizatória, assegura a defesa, a proteção e a preservação de todos

animais, proibindo expressamente – portanto condenando ou responsabilizando na

forma da lei –, as práticas de crueldade, em todas as suas desumanas e danosas formas,

contra os animais em geral, sem qualquer discriminação de espécie ou categoria”5.

A própria Corte Suprema, por exemplo, possui postura acurada no

sentido de “repudiar autorização ou regulamentação de qualquer entretenimento que,

sob a justificativa de preservar manifestação cultural ou patrimônio genético de raças

ditas combatentes, submeta animais a práticas violentas, crueis ou atrozes”, porque

violam, justamente, o preceito insculpido pelo art. 225, § 1º, VII, da Constituição da

República (ADin 3.776-5/RN – Sessão Plenária – STF – j. 14.06.2007 – v.u. - rel. Min.

Cezar Peluso – DJU 29.06.2007), conforme se infere também dos arestos a seguir

transcritos:

5 Idem, 03.

14

“Ação direta de inconstitucionalidade. Lei 11.366/2000 do Estado de

Santa Catarina. Ato normativo que autoriza e regulamenta a criação e

a exposição de aves de raça e a realização de 'brigas de galo'. A

sujeição da vida animal a experiências de crueldade não é compatível

com a Constituição do Brasil. Precedentes da Corte. Pedido de

declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.” (ADIn

2.514/SC – Sessão Plenária – STF – j. 29.06.2005 – v.u. - rel. Min.

Eros Grau – DJ 09.12.2005). (Grifos acrescidos)

“Constitucional. Meio ambiente. Animais: proteção: crueldade. 'Briga

de galos'. 1. - A Lei 2.895, de 20.03.1998, do Estado do Rio de Janeiro,

ao autorizar e disciplinar a realização de competições entre 'galos

combatentes', autoriza e disciplina a submissão desses animais a

tratamento cruel, o que a Constituição Federal não permite: CF, art.

225, § 1º, VII. II. - Cautelar deferida, suspendendo-se a eficácia da Lei

2.895, de 20.03.1998, do Estado do Rio de Janeiro.” (ADIn 1.856/RJ

– Sessão Plenária – STF – j. 03.09.1998 – v.u. - rel. Min. Carlos

Velloso). (Grifos acrescidos)

Assim, observa-se que o Excelso Pátrio detém firmado entendimento no

que tange à prevalência do interesse/proteção ambiental em detrimento do lazer e da

diversão angariados por uma prática deplorável, ainda mais quando a atividade é

acompanhada de um viés financista, como no caso vertente (uso de apostas).

Ademais, os fatos praticados no interior e sob o manto da Demandada são

tipificados como crime pela legislação penal brasileira, a saber:

III.I) Formação de quadrilha

Art. 288 - Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de

cometer crimes:

Pena - reclusão, de um a três anos. (CPB)

15

III.II) Maus tratos contra animais

Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres,

domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. (Lei nº 9.605/98)

III.III) Manutenção de animal silvestre em cativeiro

Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos

ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade

competente, ou em desacordo com a obtida:

Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas:

(...)

III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depó-

sito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em

rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadou-

ros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade

competente. (Lei nº 9.605/98)

IV– DA DISSOLUÇÃO DA PERSONALIDADE

JURÍDICA

A Associação dos Criadores de Pássaros de Mossoró-RN, que é conhecida

pela sigla ACPM, foi fundada em 03 de setembro de 1990, com destinação e objetivos

assim descritos em seu Estatuto Social, registrado no 5º Serviço Notarial e Registral de

títulos e documentos e pessoas jurídicas (doc. incluso):

16

“Art. 2º – O objetivo social é a seleção e criação de pássaros visando a

preservação das espécies na fauna brasileira de moro a apurar as

qualidades das aves, segundo a sua própria natureza, tornando-as mais

resistentes às moléstias, ao clima e aos parasitas. A seleção das

espécies se fará em competições esportivas livres, sem artifícios ou

recursos ilícitos na sede social; em comparação ou encostamento para

averiguação e resistência.”

A análise sistemática do dispositivo retro, portanto, é conducente à

conclusão de que o referido ente jurídico vinha sendo utilizado como “fachada” ou

“cortina de fumaça”, com o intuito de dissimular seu verdadeiro propósito, isto é, a

prática habitual de crimes ambientais, notadamente, maus tratos contra animais

silvestres e sua manutenção em cativeiro sem autorização do órgão competente, além de

outros delitos.

Inclusive, comentando acerca da Carta Constitucional de 1967, Pontes de

Miranda apontava que as associações em geral deveriam possuir finalidade lícita, ao

afirmar que “o que é contra a lei penal, ou contra os bons costumes, lícito não é; assim

as expressões "fins contrários à lei penal" e "fins contrários aos bons costumes" valiam

o mesmo que "não ter fim lícito.6”

O próprio Código Civil de 1916, aliás, já declarava, naquela época, o

término da existência da pessoa jurídica em seu art. 21, notadamente quando incorresse

na prática de atos opostos aos seus fins ou nocivos ao bem público, isto é, quando

houvesse dissociação de seus objetivos com seus atos ou comprometimento do interesse

público.

Convém, nesse sentido, ressaltar a posição de Clóvis Beviláqua, porquanto

este enfatizava, à época, que “se a sociedade, qualquer que seja, promover fim ilícito

ou se servir de meios ilícitos, será dissolvida por sentença do poder judiciário,

mediante denúncia do Ministério Público.7”

6 MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967, n. 6, Tomo V, ed. Forense, 1987, p. 608.7 BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, n. 7, ed. Rio, p. 234.

17

A respeito, note-se que o fim da associação, segundo Clóvis Beviláqua,

pode ser lícito, mas ela não poderá servir-se de meios ilícitos para consecução de seus

fins, caso em que haverá dissolução, tanto quanto na hipótese de possuir fins ilícitos

(aliás, associações de fins ilícitos sequer podem ser registradas, isto é, existirem

juridicamente, segundo o art. 115 da Lei Federal n. 6.015/73).

É nessa compreensão que se deve encarar a liberdade de associação,

garantida no patamar constitucional brasileiro. É bem certo que a vigente Constituição,

em seu art. 5º, inciso XVII, garante a liberdade de associação. Todavia a garantia é

dirigida a associação para fins lícitos, decorrendo, daí, a impossibilidade absoluta da

associação constituir-se para consecução de fins ilícitos ou de servir-se de meios ilícitos

para atingir seus fins, como dito anteriormente:

“XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos,

vedada a de caráter paramilitar;”.

Ora, enquanto pessoa jurídica, a associação adquire direitos e assume

obrigações em razão das atividades desenvolvidas para alcance de sua finalidade

estatutária e, para que haja a validade do ato jurídico, exige-se objeto lícito, o que faz da

associação com finalidade ilícita uma excrescência jurídica.

Nesse diapasão, a conclusão a que se depara, inexoravelmente, é que se

impõe a vedação da continuidade da existência de pessoa jurídica que tem por

destinação e objeto atividades ilícitas, marcadas pela contrariedade, nocividade e

periculosidade ao interesse público, ao bem estar geral, à ordem pública, à moral e aos

bons costumes, como no caso em disceptação, pois esse desvio configura,

inegavelmente, autêntico abuso do direito constitucional de associação.

E, para tanto, o Ministério Público poderá promover ação visando a

dissolução judicial de associação, bastando, pois, que ela promova atividade ilícita ou

imoral, como já demonstrado, considerando que as imagens produzidas durante o

cumprimento da infiltração e os depoimentos colhidos revelam que a sede da associação

Demandada é, de fato, uma arena destinada à promoção habitual de rinhas, contando,

inclusive, com arquibancada em alvenaria para alojar o público.

18

Na mesma esteira percorre o teor contido no art. 1.218, VII, do Código de

Processo Civil, ao dispôr que:

“Art. 1.218. VII – A sociedade civil com personalidade jurídica, que

promover atividade ilícita ou imoral, será dissolvida por ação direta,

mediante denúncia de qualquer do povo, ou do órgão do Ministério

Público.”

O Decreto-Lei n. 41/66, por sua vez, trata da dissolução de entidades,

disciplinando que:

“Art 1º - Toda sociedade civil de fins assistenciais que receba auxílio

ou subvenção do Poder Público ou que se mantenha, no todo ou em

parte, com contribuições periódicas de populares, fica sujeita à

dissolução nos casos e forma previstos neste decreto-lei.

Art 2º - A sociedade será dissolvida se:

I - Deixar de desempenhar efetivamente as atividades assistenciais a

que se destina;

II - Aplicar as importâncias representadas pelos auxílios, subvenções

ou contribuições populares em fins diversos dos previstos nos seus atos

constitutivos ou nos estatutos sociais;

III - Ficar sem efetiva administração, por abandono ou omissão

continuada dos seus órgãos diretores.

Art 3º - Verificada a ocorrência de alguma das hipóteses do artigo

anterior, o Ministério Público, de ofício ou por provocação de qualquer

interessado, requererá ao juízo competente a dissolução da

sociedade.

Parágrafo único. O processo da dissolução e da liquidação reger-se-á

pelos arts. 655 e seguintes do Código de Processo Civil.”

19

Importante ressaltar que, com a entrada em vigor do novo Código Civil,

deixou de existir a figura da sociedade civil sem fins lucrativos, passando a existir, tão

somente, a associação, sem que isso implique revogação dos dispositivos transcritos,

como se pode observar da leitura do art. 44, do referido estatuto, in verbis:

“Art. 44 – São pessoas jurídicas de direito privado:

I – as associações;

II – as sociedades;

III – as fundações;

IV – as organizações religiosas;

V – os partidos políticos”.

Desse modo, o Decreto-Lei nº 41/66, após o Código Civil de 2002, é

aplicável às associações, visto tratar-se de entidade sem fins lucrativos mantida por

contribuição periódica de populares, nos termos de seu Estatuto Social.

Finalmente, ressalte-se que, no presente caso, por se tratar de matéria

ambiental, incide a norma contida no art. 24, da Lei nº 9.605/98 (Lei dos Crimes

Ambientais), que prevê a possibilidade de dissolução do ente jurídico (de qualquer

espécie) que seja utilizado preponderantemente para a prática de crime ambiental, nos

seguintes termos:

“Art. 24. A pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemen-

te, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido

nesta Lei terá decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será

considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo

Penitenciário Nacional.”

Assim, diante da evidente utilização da Associação dos Criadores de

Pássaros de Mossoró-RN para a facilitação e ocultação de crimes ambientais, não há

outra alternativa que não a sua dissolução, com perdimento e seus bens em favor da

união, conforme dispositivo supra.

20

V – DA CONCESSÃO DA LIMINAR

O decurso do tempo é uma realidade inexorável. Entretanto, em que pese

não poder o homem barrar o curso do tempo, especificamente no campo do Direito, o

legislador adotou mecanismos que procuram obviar as consequências funestas do fator

tempo sobre o direito tutelado.

O trâmite processual, naturalmente, demanda tempo necessário para a

devida instrução e consequentes atos que lhe são pertinentes, objetivando a melhor

solução da lide. Contudo, caso não se adote providência liminar que impeça a

continuidade e o agravamento do dano, a decisão final certamente não terá o poder de

obstar os males provocados pela realização das rinhas.

Ora, se nos próprios termos do art. 12, da Lei nº 7.347/85, é conferido ao

Magistrado o poder de conceder medida liminar sem justificação prévia, para evitar

dano irreparável ou ameaça de danos, bastando, para tanto, a presença do fumus boni

iuris e do periculum in mora, quanto mais figurando nos autos elementos que

evidenciam a situação fática e jurídica pertinente ao caso, tornando prescindíveis outras

inúteis e procrastinatórias discussões.

Frise-se que a prova trazida revela a prática habitual desses delitos

ambientais, o que, por si só, demonstra o risco iminente de sua reiteração (periculum in

mora).

A prática da atividade de rinhas de canário afronta a Constituição Federal

e, como se sabe, trata-se de crime previsto em Lei Federal (nº 9.605/98).

21

Assim, com base na explícita legislação em vigor, e elementos probatórios

colhidos, requer, respeitosamente, a V.Exa., a concessão de medida liminar,

determinando:

a) a suspensão das atividades da Associação dos Criadores de Pássaros de Mossoró-RN,

as quais, como restou evidenciado, são voltadas exclusivamente para a promoção,

facilitação e ocultação de rinhas de canário e manutenção de animais em cativeiro sem

autorização do órgão ambiental;

b) a indisponibilidade de bens móveis e/ou imóveis existentes em nome da Demandada,

inclusive ativos financeiros, os quais, nos termos do art. 24, da Lei nº 9.605/98, deverão

ao final ser perdidos em favor do fundo penitenciário nacional.

c) seja oficiado ao 5º Serviço Notarial e Registral de Títulos, para que averbe no

registro da Demandada a presente decisão liminar.

d) expedição de ofício ao IBAMA, cientificando-o do inteiro teor da decisão, para os

devidos fins.

VI – DO PEDIDO

ISTO POSTO, requer:

1- A concessão da liminar nos moldes supra e a intimação da Demandada

para imediato cumprimento, bem como sua citação para, querendo, oferecer resposta no

prazo legal;

2 - Ao final, que seja proferida sentença julgando procedente o pedido

inicial, para confirmar a liminar e, especialmente, para:

a) decretar a dissolução da Associação requerida ou, alternativamente,

suspender as suas atividades;

22

b) determinar o cancelamento do registro de seus respectivos atos

constitutivos e posteriores alterações nos Cartórios de Registro de Pessoas

Jurídicas;

c) determinar a destinação de seu patrimônio líquido ao fundo

penitenciário nacional ou, caso assim não entenda, às entidades previstas

no art. 61 do Diploma Civil Pátrio.

d) determinar a demolição física das estruturas de alvenaria utilizadas para

promoção de rinhas de canários na sede da Demandada, com vistas a

garantir a não repetição dessa prática à margem da lei.

Pugna por todos os meios de prova em Direito admitidos, notadamente a

prova documental, incluindo-se neste tipo de prova os documentos ora inclusos, que

fazem parte integrante desta petição.

A condenação da requerida ao pagamento de todas as despesas

processuais.

Embora inestimável, dá à causa, para os fins legais, o valor de R$

100.000,00 (cem mil reais).

Termos em que pede e espera deferimento

Mossoró (RN), 06 de abril de 2011.

Jorge Cruz de Carvalho3º Promotor de Justiça de Mossoró

Seguem em anexo:

1) contrato social da Demandada; 2) Portaria de instauração de PIC; 3) laudo ITEP; 4) termos de depoimentos de policiais; 5) cópia de denúncia crime; 6) cópia de autos de infração do IBAMA; 7) relatório de inteligência/GAECO; 8) 03 (três) DVDs.

Rol de Testemunhas:

1 – FRANCISCO LINDUARTE, Escritório Regional do IBAMA.

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2- JOSAFÁ PAULINO DE SOUZA, Policial Militar incorporado ao 3º Pelotão de Polícia Ambiental;

3 – JOÃO JOSÉ DE SOUZA ALMEIDA, Policial Militar incorporado ao 3º Pelotão de Polícia Ambiental;

4 – MARCO ANTÔNIO ALBUQUERQUE FONTES, Policial Militar incorporado ao 3º Pelotão de Polícia Ambiental;

5 – MANOEL CARMO DE MOURA JÚNIOR, Policial Militar incorporado ao 3º Pelotão de Polícia Ambiental.

Data e local supra.

Jorge Cruz de CarvalhoPromotor de Justiça

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