11
Dr. Georges Kaskantzis Neto MAUI/DEQ/UFPR/UNI STUTTGART/ SENAI-PR Série – Laudos de Perícia Judicial Ambiental – 02/05, 2015

Analise Do Recipiente

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Analise Do Recipiente

Dr. Georges Kaskantzis Neto MAUI/DEQ/UFPR/UNI STUTTGART/ SENAI-PR

Série – Laudos de Perícia Judicial Ambiental – 02/05, 2015

Page 2: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

1

ANÁLISE DO RECIPIENTE DA EXPLOSÃO

Introdução

No segundo texto da Série Laudos de Perícia Judicial Ambiental deve-

rão apresentam-se os resultados da análise mecânica detalhada do recipiente

de armazenamento de álcool gel comercial. O escopo foi investigar a pressão

máxima suportada pelo recipiente no momento da explosão.

O material de fabricação do recipiente era polietileno de alta densi-

dade. Para analisar os tesões de ruptura e as deformações da peça foi constru-

ído um recipiente modelo, cujas capacidades mássica e volumétrica eram

iguais as do recipiente original.

FIGURA 1. Recipiente modelo elaborado para calcular as tensões de ruptura e as

deformações do recipiente original.

533 mm

34 mm

166 mm

126 mm

Page 3: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

2

Na FIGURA 1 se encontra ilustrado o recipiente modelo empregado

para investigar o original. O recipiente foi definido associando um cilindro reto

com um tronco de cone. Com o recipiente modelo foi calculada a variação do

volume e altura da solução no recipiente em virtude do aquecimento, expan-

são e evaporação dos compostos que constituíam a solução de álcool gel co-

mercial. As principais dimensões do recipiente modelo definido para estudar a

explosão se encontram apresentadas na TABELA 1.

TABELA 1. Dimensões do recipiente modelo usado no estudo da explosão.

Elemento Dimensão Altura total (m) 0,533 Altura do cilindro reto (m) 0,367 Altura do troco de cone (m) 0,166 Diâmetro da base (m) 0,126 Diâmetro do orifício superior (m) 0,034 Espessura da parede (m) 0,002 Massa do recipiente (kg) 0,150 Material de fabricação PAD * Volume do recipiente (m3) 0,0055 Área lateral (m2) 0,1886

*PAD – Polietileno de alta densidade

Análise da resistência mecânica

O estudo da resistência mecânica do recipiente de polietileno de alta

densidade possibilitou a obtenção do valor da máxima pressão suportada pelo

recipiente no momento da explosão. Com a obtenção do valor máximo da

pressão foi analisada a dinâmica do escoamento compressível dos produtos

formados pelas reações de combustão do álcool etílico, do ácido acrílico e do

1-amino-1-metil-2-propanol.

Neste trabalho adotou-se factível de que o estabelecimento da con-

dição favorável para a explosão foi decorrente do avanço das reações de io-

nização e polimerização do ácido acrílico, as quais se desenvolveram no interior

do recipiente de modo lento e progressivo. Os resultados apresentados neste

artigo indicam que a energia liberada nas citadas reações foi suficiente o ne-

cessário para aumentar a temperatura da solução, desde a temperatura ambi-

ente até o ponto de ebulição, tendo provocado a formação de uma nuvem

Page 4: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

3

inflamável de vapor e o aumento da pressão interna do recipiente, que ao to-

car a fonte de ignição explodiu imediatamente.

O estudo da resistência mecânica do polietileno elaborado por JO-

NHSON (1998) revelou que a tensão de ruptura do PEAD varia com a tempera-

tura. Os resultados do estudo indicaram que a 20º C a tensão de ruptura variou

de 9 a 14 Mpa, enquanto na temperatura de 80º C, a tensão variou entre 2,5 e

5,0 MPa, significando que a medida que a temperatura do sistema aumenta a

tensão de ruptura diminui.

O trabalho elaborado por COUTINHO (2003) comparou as proprieda-

des físicas e mecânicas do PEAD original com o PEAD misturado com materiais

reciclados. Os resultados revelaram que temperatura de amolecimento sob

carga de 445 kPa era de 76ºC e que a temperatura de amolecimento do PEAD

sob a carga de 9,8N era 126ºC. O autor relata também que a tensão de esco-

amento do PEAD é da ordem de 30MPa e que o modulo de flexão secante do

material varia entre 80 -105 MPa.

No conjunto dos estudos analisados destaca-se aquele elabo-

rado por USP(2005), na sua tese de doutorado a qual foi desenvolvida na USP.

Neste detalhado estudo foram analisadas amostras de PEAD de diferentes co-

lorações. No teste de tração a tensão máxima de escoamento observada va-

riou de 21,85 a 22,24MPa. No citado teste, a tensão máxima de ruptura supor-

tada pelo PEAD variou de 14,15 – 15,36 MPa. O modulo de elasticidade tan-

gente determinado neste variou de 547 MPa, para amostras de PEAD vermelho

até 547 MPa para as amostras brancas.

O teste de compressão executado por FERREIRA (2007) indicou que a

tensão de escoamento do PEAD varia entre 14,1 e 14,25 MPa. O modulo de

elasticidade do PEAD determinado por Ferreira neste teste variou entre 245 – 300

MPa. No ensaio de flexão, a força máxima para a deformação de 5% do corpo

de prova foi 75N. O modulo de elasticidade tangente determinado por Ferreira

no teste de flexão variou entre 719-805 MPa. A variabilidade dos valores relativos

as tensões de ruptura e módulos de elasticidade encontrados na literatura difi-

cultou a escolha dos parâmetros que foram aplicados ao presente caso. Para

contornar a dificuldade, os dados da literatura foram submetidos a análise

tendo sido classificados em função do tipo de ensaio no qual foram obtidos.

Page 5: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

4

Os dados analisados desta forma encontram-se descritos na TABELA

10. Os valores das propriedades físico-químicas do PEAD encontrados na litera-

tura (UNIOESTE, 2009) foram os descritos, a seguir: cp = 1850 (J kg-1 K-1); k = 0,46 –

0,50 (W m-1 K-1); alfa = 106 – 198 (°C x 10-6)

TABELA 10. Propriedades mecânicas do PEAD identificadas na literatura.

Parâmetro Ensaio Valor Fonte

Tensão de ruptura Compressão 6,9 – 7,2 MPa Ferreira (2007)

Tensão de ruptura Tração 14,5 – 15,36 MPa Ferreira (2007)

Tensão de ruptura Tração 8,25MPa Unicamp (2009)

Tensão de ruptura T= 20º C 9,0 – 14,0 MPa Johnson (1995)

Tensão de ruptura T= 80º C 2,5 – 5,0 MPa Johnson (1995)

Tensão de ruptura Flexão 7,05 MPa Coutinho (2003)

Tensão de ruptura Compressão 2,875 MPa Unioeste (2008)

Modulo de elasticidade Flexão 548,50 MPa USP (2004)

Modulo de elasticidade Tração 661,25 MPa USP (2004)

Modulo de elasticidade Compressão 646,25 MPa USP (2004)

Coeficiente de Poisson ν 0,4188 PUCRS (2007)

Coeficiente de Poisson ν 0,4163 PUCRS (2007)

Levando em consideração os resultados da análise das forças prepon-

derantes que atuavam no recipiente de PEAD e considerado o recipiente como

elemento de paredes finas definiram-se os valores, a saber: tensão de ruptura

na flexão 7,05MPa, módulo de YOUNG 548,50 MPa e coeficiente de Poisson 0,42.

Cálculo da pressão de ruptura

Considerado que os recipientes cilíndricos de pressão, em geral, apre-

sentam paredes finas, os esforções internos que atuam nas paredes são tangen-

tes a superfície (Referência). Em razão da simetria do cilindro e de seu conteúdo

nenhuma tensão de cisalhamento atua no recipiente. Assim, as tensões normais,

σ1 e σ2, são as tensões principais do plano de tensões. A tensão σ1 denomina-

se como tensão tangencial e a tensão σ2 é chamada como tensão longitudinal.

Page 6: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

5

Na FIGURA 2, apresenta-se o elemento cilíndrico adotado para realizar

o balanço das tensões que agiam no recipiente no instante da explosão deste.

A partir da definição das tensões principais obtiveram-se as deformações.

FIGURA 2. TENSÕES CIRCUNFERENCIAIS OU DE MEBRANA QUA ATUAM EM ELEMENTOS DE

PAREDES FINAS, NOS QUAIS PREPONDERAM AS TENSÕES DE FLEXÃO.

Para calcular o valor da tensão tangencial, σ1 adotaram-se dois pla-

nos paralelos a seção transversal, separados por uma distância ∆x. O corpo livre

definido desta forma estava submetido as forças que atuavam na direção z, as

quais, por sua vez, são formadas pelas forças elementares σ1dA, e pressão p⋅dA,

sendo p a diferença entre a pressão interna e a pressão externa do recipiente.

A resultante dos esforços internos, σ1⋅dA, era igual ao produto da ten-

são σ1 pela área 2t∆x, enquanto, a resultante das forças elementares, p⋅dA, era

definida pelo produto da p e pela área 2r∆x. Fazendo o balanço de forças na

direção z, obteve-se:

�Fz = 0 (3)

σ1 ∙ (2t ∙ ∆x) − p ∙ (2r ∙ ∆x) = 0 (4)

Assim,

σ1 =p ∙ r

t (5)

Sendo: p – pressão (MPa); r – raio do elemento (m); t – espessura da parede (m)

Para a determinação da tensão longitudinal, adotou-se um plano per-

pendicular ao eixo das abcissas, e, neste caso, as forças livres que atuavam no

corpo livre eram as forças elementares, σ2⋅dA, as quais atuavam na seção trans-

versal da parede do elemento e as forças elementares devido a pressão, p⋅dA.

Page 7: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

6

A área da seção do fluido é π⋅r2. A área da seção da parede obtém-se

fazendo o produto do comprimento da circunferência do elemento pela espes-

sura da parede t. Na condição do equilíbrio de forças, tinha-se:

� Fx = 0 (6)

σ2 ∙ (2 ∙ π ∙ r ∙ t) − p ∙ (π ∙ r2) = 0 (7)

Isolando a tensão,

σ2 =p ∙ r2t

(8)

Comparando as eq. das tensões, eq. (5) e (8) verificou-se que,

σ1 = 2 ∙ σ2 (9)

Tendo identificado as principais tensões que atuam no recipiente no

momento da explosão, adotaram-se os valores no módulo de elasticidade E do

módulo de Poisson adequados ao presente caso, os quais foram obtidos na lite-

ratura, visando a estimativa da pressão de ruptura do recipiente investigado.

Considerando o recipiente como um tanque de pressão de paredes

finas, os valores dos citados parâmetros adotados foram: E = 548,5 MPa; ν= 0.48

e σ1 = 7,05 (MPa), os quais foram substituídos na equação (5), tendo sido obtidos

os resultados, a saber:

p =σ1 ∙ t

(r − t) =7,05 × 106 (Pa) × 0,002(m)

(0,063 (m) − 0,002(m)) = 23.1147,54 (Pa) = 2,31 (bar)

O resultado determinado dessa maneira indicou que a pressão de rup-

tura do recipiente foi de aproximadamente 23.1147,54 Pascais, a qual é equiva-

lente a pressão de 2,3 bar.

Uma vez determinada a pressão de ruptura do recipiente, determina-

ram-se as tensões tangenciais, longitudinais, cisalhamento máxima no plano e

fora do plano das tensões principais.

Tensão Tangencial

σ1 =p ∙ r

t=

0,2312 ∙ 106 × 0,0630,002

= 7,283 × 106(Pa)

Page 8: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

7

Tensão Longitudinal

σ2 =p ∙ r2t

=0,2312 ∙ 106 × 0,063

0,004= 3,6414 × 106(Pa)

Tensão máxima de cisalhamento

τmax, =12σ2 =

p ∙ r4 ∙ t

=0,2312 × 106 ∙ 0,063

0,008= 1,8207 × 106(Pa)

Cálculo das deformações

Empregando os valores das tensões normais σ1, σ2, σ3 = p, calcularam-

se as deformações do recipiente referentes ao comprimento, diâmetro e espes-

sura. O cálculo das deformações foi realizado empregando a Lei Hooke Gene-

ralizada (Referência), cujas expressão são definidas como:

ε1 =1E

× [σ1 − ν ∙ (σ2 + σ3)] (11)

ε2 =1E

× [σ2 − ν ∙ (σ1 + σ3)] (12)

ε3 =1E

× [σ3 − ν ∙ (σ1 + σ2)] (13)

Sendo: ε- a deformação (%); E – o módulo de elasticidade (MPa); ν- o coefici-ente de Poisson (-); σ- as tensões de membrana ou circunferenciais (MPa).

Os valores dos módulos de Young e Poisson adotados nessa etapa do

trabalho foram aqueles de flexão determinados nos ensaios do PEAD de labo-

ratório, os valores adotados foram E = 548,5 MPa e ν=0.48. Para os componentes

de deformação ε1, ε2 e ε3, obtiveram-se os resultados, a saber:

𝜀𝜀1 =1

548,5 ∙ 106× [7,283 ∙ 106 − 0.48 ∙ (3,6414 + 0,23115) ∙ 106] = 9,89 × 10−3

= 0,9900 %

Page 9: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

8

𝜀𝜀2 =1

548,5 ∙ 106× [3,6414 ∙ 106 − 0.48 ∙ (7.283 + 0,2312) ∙ 106] = 6,32 × 10−5

= 0,0063 %

𝜀𝜀3 =1

548,5 ∙ 106× [0,2312 ∙ 106 − 0.48 ∙ (7.283 + 3,6414) ∙ 106] = −1,949 × 10−2

= 1,9500 %

As deformações nas direções longitudinal, diametral e da espessura

foram calculadas com as relações:

∆L = L × ε1 = 550mm × 9,89 ∙ 10−3 = 5,44 mm (14)

∆d = d × ε2 = 126mm × 6,32 ∙ 10−5 = 0,008 mm (15)

∆t = t × ε3 = 2mm × (−1,949 ∙ 10−2) = −0,04 mm (16)

Os resultados dos cálculos das deformações sofridas pelo recipiente

envolvido no evento acidental indicaram que na direção radial a deformação

foi menor do que na direção longitudinal. O ponto de destaque dessa etapa foi

a redução da espessura da parede do recipiente causada por flexão, cujo valor

foi da ordem de 2%, tendo reduzido a espessura de 2 para 1,96mm, o que cer-

tamente provocou o colapso do recipiente.

Além desta parcela de contribuição da pressão, a dilatação térmica

do recipiente foi também responsável pela sua ruptura. Conforme descrito na

obra de LEES (1989), as dilatações térmicas uni, bi e tridimensionais para cilindros

podem ser estimadas com as equações (17) a (19). Aplicando os valores dos

parâmetros do presente caso, obtiveram-se os resultados, a saber:

Dilatação unidimensional

σ = −E ∙ α ∙ ∆T = −548,5 ∙ 106 × 152 ∙ 10−6 × 50 = −4,87 (MPa) (17)

Dilatação bidimensional

σ = −E ∙ α ∙ ∆T(1 − ν) = −

548,5 ∙ 106 × 152 ∙ 10−6 × 50(1 − 0,48) = −8,017 (MPa) (18)

Page 10: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

9

Dilatação tridimensional

σ = −E ∙ α ∙ ∆T(1 − 2ν) = −

548,5 ∙ 106 × 152 ∙ 10−6 × 50(1 − 2 × 0,48) = −104,22 (MPa) (19)

A existência de um gradiente de temperatura ao longo do recipiente,

no estado estacionário origina um campo de tensões térmicas cujo valor médio

é da ordem de,

σ = −E ∙ α ∙ ∆T

2 × (1 − ν) = −548,5 ∙ 106 × 152 ∙ 10−6 × 50

2 × (1 − 0,48) = −4,083 (MPa) (18)

E, no regime transiente de temperatura os valores do campo das ten-

sões podem ser determinados com a equação da dilatação bidimensional.

Considerações finais

Empregando os valores das estatísticas do conjunto de dados relativos

as tensões de compressão, tração e flexão, assim como, dos módulos de Young

e de Poisson do polietileno de alta densidade, que s encontram disponíveis na

literatura científica, obtiveram-se os valores da provável pressão de ruptura do

recipiente, cujo valor foi da ordem de 2,31 bar.

A partir destes resultados estimaram-se os valores das tensões longitu-

dinal e circunferencial, da tensão máxima de cisalhamento, tendo sido verifi-

cado que o máximo da tensão de cisalhamento no plano principal das tensões

era, cerca de,1,821 (MPa) e fora do plano o máximo foi o dobro da primeira,

3,642(MPa). Os resultados deste estudo indicaram que, além da contribuição

da pressão interna que atuou nas paredes do recipiente, as tensões térmicas

originadas pelas reações incompatíveis que se desenvolveram no recipiente

contribuíram também para o colapso deste.

Finalmente, observa-se que a determinação da pressão de ruptura do

recipiente foi de grande valia para estabelecimento das condições iniciais e de

contorno do problema matemático investigado, o que se encontra no 3º texto

desta Série de artigo denominada – Laudos de Pericial Judicial Ambiental.

Page 11: Analise Do Recipiente

--- Dr. Georges Kaskantzis Neto ---

10

Referencias