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LEONARDO DA VINCI - O GRANDE GÊNIO DO RENASCIMENTO Leonardo é um dos gênios mais extraordinários de que a Humanidade se pode glorificar, um dos exemplos mais espantosos da cultura universal e um homem de infinita curiosidade, radicalmente interessado em todos os campos do saber e do conhecimento. Pela diversificação de áreas de interesse e pela genialidade revelada, Leonardo transcende, em muito, os limites do seu tempo. Possuía quase dons a mais, incluindo um físico magnífico, uma beleza masculina superlativa, uma voz excelente para o canto, uma ousadia científica, uma excelência matemática, enfim, uma superabundância de talentos. Foi pintor, escultor, arquiteto, engenheiro, anatomista, músico e naturalista. A sua arte lírica e as suas ideias científicas, muitas escondidas em cadernos de anotações, revelam a sua crença na Natureza como fonte de inspiração. Mas foi como artista que obteve o reconhecimento dos seus contemporâneos. Declarou-se a si próprio, um uomo senza lettere pois representava outro tipo de cultura de pendor humanista, que não fazia ostentação do livresco, pelo contrário, desconfiava abertamente desse saber que considerava “rarefeito e produto de charlatanice, território dominado pelo dogmatismo e por critérios de autoridade inaceitáveis”. Ele próprio salientaria, numa passagem do seu Codex Atlanticus, que desdenhava dos doutos que supunham que ele não poderia exprimir as suas ideias teoricamente por carecer de uma formação estritamente académica. Era o saber baseado na experiência, o seu único saber legítimo: “la sapienza è figliola della sperienza” (a sabedoria é filha da experiência), pois “todo o nosso conhecimento tem o seu fundamento nas sensações”. Para Leonardo, experiência, observação e invenção constituem a tríade do verdadeiro saber. Nasceu no lugarejo de Anchiano, da aldeia de Vinci, perto de Florença, a 15 de Abril de 1452, sábado, às 22.30 horas, filho de Pedro de Vinci, notário, e de Catarina, camponesa, mulher formosíssima “de olhos celestes e cabelos louros” por quem Pedro se apaixonara profundamente, mas com quem teve uma ligação um pouco irregular. Leonardo viveu com a mãe até aos três anos, tendo ido depois para casa dos avós onde se criou, sem nunca esquecer a mãe que visitava a “horas propícias do dia e de noite”, e que por ele uma profunda ternura. Tão secreta afeição por aquela que lhe dera o ser, e que ele retratava na formosura dos olhos e no loiro dos cabelos, revelava um traço bem característico da profunda humanidade de Leonardo. Cresceu na casa dos avós, em plena liberdade do campo, na experiência direta com a Natureza, para a qual os sentidos e a múltipla curiosidade do seu espírito se abriam. Aos sete anos frequentou a escola de uma Igreja próxima mas, refratário ao estudo livresco, antipatizou, em particular, com a gramática latina. Fascinava-o mais observar a construção de uma habitação, vendo os operários fazerem as paredes, nivelarem as pedras, guiá-las por meio de máquinas, tendo surpreendido o arquiteto da obra, que, falando com ele, ficou assombrado com a subtileza da sua inteligência. Começou, então, a ensinar-lhe

APOSTILA 2º ANO_LEONARDO DA VINCI

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LEONARDO DA VINCI - O GRANDE GÊNIO DO RENASCIMENTO

Leonardo é um dos gênios mais extraordinários de que a Humanidade se pode glorificar, um dos exemplos mais espantosos da cultura universal e um homem de infinita curiosidade, radicalmente interessado em todos os campos do saber e do conhecimento.

Pela diversificação de áreas de interesse e pela genialidade revelada, Leonardo transcende, em muito, os limites do seu tempo. Possuía quase dons a mais, incluindo um físico magnífico, uma beleza masculina superlativa, uma voz excelente para o canto, uma ousadia científica, uma excelência matemática, enfim, uma superabundância de talentos. Foi pintor, escultor, arquiteto, engenheiro, anatomista, músico e naturalista.

A sua arte lírica e as suas ideias científicas, muitas escondidas em cadernos de anotações, revelam a sua crença na Natureza como fonte de inspiração. Mas foi como artista que obteve o reconhecimento dos seus contemporâneos.

Declarou-se a si próprio, um uomo senza lettere pois representava outro tipo de cultura de pendor humanista, que não fazia ostentação do livresco, pelo contrário, desconfiava abertamente desse saber que considerava “rarefeito e produto de charlatanice, território dominado pelo

dogmatismo e por critérios de autoridade inaceitáveis”. Ele próprio salientaria, numa passagem do seu Codex Atlanticus, que desdenhava dos doutos que supunham que ele não poderia exprimir as suas ideias teoricamente por carecer de uma formação estritamente académica. Era o saber baseado na experiência, o seu único saber legítimo: “la sapienza è figliola della sperienza” (a sabedoria é filha da experiência), pois “todo o nosso conhecimento tem o seu fundamento nas sensações”. Para Leonardo, experiência, observação e invenção constituem a tríade do verdadeiro saber.

Nasceu no lugarejo de Anchiano, da aldeia de Vinci, perto de Florença, a 15 de Abril de 1452, sábado, às 22.30 horas, filho de Pedro de Vinci, notário, e de Catarina, camponesa, mulher formosíssima “de olhos celestes e cabelos louros” por quem Pedro se apaixonara profundamente, mas com quem teve uma ligação um pouco irregular.Leonardo viveu com a mãe até aos três anos, tendo ido depois para casa dos avós onde se criou, sem nunca esquecer a mãe que visitava a “horas propícias do dia e de noite”, e que por ele uma profunda ternura. Tão secreta afeição por aquela que lhe dera o ser, e que ele retratava na formosura dos olhos e no loiro dos cabelos, revelava um traço bem característico da profunda humanidade de Leonardo.

Cresceu na casa dos avós, em plena liberdade do campo, na experiência direta com a Natureza, para a qual os sentidos e a múltipla curiosidade do seu espírito se abriam. Aos sete anos frequentou a escola de uma Igreja próxima mas, refratário ao estudo livresco, antipatizou, em particular, com a gramática latina. Fascinava-o mais observar a construção de uma habitação, vendo os operários fazerem as paredes, nivelarem as pedras, guiá-las por meio de máquinas, tendo surpreendido o arquiteto da obra, que, falando com ele, ficou assombrado com a subtileza da sua inteligência. Começou, então, a ensinar-lhe rudimentos de aritmética, geometria e mecânica, achando incrível a facilidade com que aprendia tudo.

No entanto, foi em Florença que o pai ficou admirado com o talento revelado e o apresentou a seu amigo Andrea Verrocchio, importante artista na época, que ficou verdadeiramente surpreendido e recebeu Leonardo em sua casa como aprendiz. Verrocchio passou a ser o seu grande mestre e amigo, iniciando-o não só nos segredos da pintura e da escultura mas ainda na filosofia, nas matemáticas, na música e na sabedoria da vida.Muitos autores afirmam que a formação artística provém da observação pessoal e da aplicação prática das suas ideias. Da Vinci torna-se, assim, o talento mais versátil da Itália renascentista.

Aos 20 anos, é oficialmente aceite como pintor na corporação dos artistas de Florença, o que significa que, a partir desta data, pode trabalhar por conta própria e receber encomendas. Os seus desenhos, combinando uma precisão científica com um grande poder imaginativo, refletem a sua enorme vastidão de interesses e, com tantos e tão variados atributos, passou a estar ao serviço de todos os grandes mecenas italianos, tornando-se um dos mais notáveis pintores do seu tempo.

Em 1481, Leonardo abandonou Florença e partiu para Milão, sentindo-se atraído pela estimulante atmosfera da corte de Ludovico Sforza, por onde circulavam muitos médicos, cientistas, engenheiros e matemáticos. Foi o grande período da sua atividade, dos 30 aos 40 anos, na força do seu poder criador.

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Em 1498, quando Milão fica sob o domínio de França, Da Vinci ainda permanece aí por mais algum tempo, partindo, em seguida, para Mântua acompanhado pelo seu muito amigo Luca Pacioli, matemático, que tinha conhecido na corte de Ludovico e de quem se tornara aluno.

Durante os sete anos que Pacioli e da Vinci passaram juntos, os dois entreajudaram-se para criar duas obras-primas que iriam ficar para a posteridade. Da Vinci ilustrou o segundo mais importante livro de Pacioli “De Divina Proportioni”. Pacioli, por sua vez, ensinou a da Leonardo perspectiva e proporcionalidade, permitindo-lhe criar uma das suas maiores obras-primas – um mural na parede norte do claustro Dominicano de Santa Maria de Graça. Muitos dos últimos trabalhos de Da Vinci revelam a aplicação dos estudos de geometria de Pacioli.

No seu livro “De Divina Proportioni”, Pacioli deu a explicação lógica do significado da divina proporção dos números, também chamada “Razão Áurea”, isto é, a mais agradável proporção entre duas medidas. Esta proporção áurea, também chamada “Número de Ouro” ou “Número Áureo” é uma constante real algébrica irracional, presente na Natureza, no Corpo Humano e no Universo. Na história da arte renascentista a perfeição da beleza foi bastante explorada com base nesta constante. O “número de ouro” aparece, por exemplo, em vários pontos da obra “Mona Lisa”, nas relações entre o seu tronco e a cabeça ou entre os elementos do rosto.

O HOMEM COMO MEDIDA DO UNIVERSO

A Quadratura do Círculo, o mais famoso dos três problemas clássicos da geometria grega que se pôs ao hom em, juntamente com a duplicação do cubo e a trissecção do ângulo, foi o de, dado um círculo, construir geometricamente um quadrado com a mesma área, e terá sido Enópides de Quios (séc. V a.C.) o primeiro a

estabelecer que os meios permitidos na sua execução, se restringissem à régua e compasso.

Leonardo, face a este problema, demonstrou que a figura humana poderia ser inscrita no círculo e no quadrado, figuras geométricas básicas da natureza, segundo inscrições encontradas no tratado “Os 10 Livros de Arquitetura”, do arquiteto romano Marcus Vitruvius Pollio, do séc. I a.C..

Da Vinci acreditava na perfeição da figura humana, associando-a ao centro do Universo. As proporções gerais do homem adequar-se-iam, como um microcosmo, às das formas mais perfeitas do macrocosmo universal, dentro do espírito da doutrina platónica. Leonardo combinou nesta imagem ambas as posições dos membros, deixando como elementos comuns a cabeça e o tronco, ficando a circunferência tangente à base de um quadrado cujo lado é menor que o diâmetro daquela. Este estudo ficou celebrizado como “O Homem Vitruviano”, tornando-se o símbolo universal da humanidade.

CIENTISTA, INVENTOR, PINTOR

A liberdade de investigação e autonomia da razão do homem renascentista vão permitir o nascimento de uma nova ciência, radicada na observação direta e na experimentação, permitindo a explicação e compreensão dos fenómenos naturais. “Esta nova concepção de ciência e a nova concepção do mundo que ela instaura foram sendo laboriosamente construídas por Giordano Bruno (o universo é infinito), Copérnico (heliocentrismo), Kepler (órbitas dos planetas) e Galileu (lei da inércia). E esta concepção é a antítese da concepção anterior, de raiz aristotélico-medieval. O mundo não é finito e acabado, mas infinito e aberto. A ordem do mundo não é final, mas causal. O conhecimento do mundo não é fixo, imutável e concluído, mas apenas o resultado de renovadas tentativas sempre submetidas à verificação experimental. E o instrumento desse conhecimento não é uma razão supra sensível e infalível, mas poderes naturais, falíveis e corrigíveis, a razão e a experiência. O novo método científico, baseado na observação, na experiência e na experimentação, não é outra coisa senão esse mesmo diálogo entre a razão e a experiência”.

Devido às circunstâncias político-militares da época, da Vinci, um homem interessado em todos os ramos do saber, colocava-se ao serviço de outros mecenas, dando liberdade aos seus muitos talentos como engenheiro, planeando a defesa de cidades, criando máquinas de

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projéteis, escavadoras, a drenagem de pântanos, projetando sistemas de canais. Fascinado pelo fenómeno do voo dos pássaros, criou planos para máquinas voadoras e inventou um helicóptero e um planador. Os seus estudos são imensos como engenheiro e inventor. São exemplo um submarino, uma calculadora mecân ica, e o uso do poder do sol, através de espelhos côncavos, para aquecer a água no Vaticano. Desenvolveu instrumentos básicos da mecânica como a porca, o parafuso, a roldana, o sistema de travões e embraiagem, a correia, a manivela, a transmissão e a corrente, instrumentos utilizados, hoje, na produção de automóveis, tratores, motorizadas.

A anatomia foi outra das suas paixões. Participou em autópsias, produzindo muitos desenhos anatómicos extremamente detalhados. Fez o estudo de embriões, numa procura constante de saber, sobre o que ele chamava “o milagre da vida”.

Os seus famosos desenhos revelam conhecimentos com séculos de avanço. Nas suas famosas anotações científicas, há centenas de ilustrações de projetos nas mais diversas áreas, da hidráulica à cosmologia, da astronomia à geologia, passando pela paleontologia, geografia, mecânica, gastronomia, música e também por audaciosos projetos de engenharia, que provam a universalidade do seu saber.

Apesar de tudo isso, é fundamentalmente como pintor que é reconhecido. De todas as artes, a pintura era para Leonardo a mais sublime. Chamava-lhe “A ciência divina da pintura”. É uma ciência que se funda na matemática e na geometria. Para Leonardo, a matemática e a experiência revelam a natureza na sua verdade objetiva, reconhecendo nela uma ordem mensurável precisa porque na natureza tudo é razão, proporção. Como os pintores do Renascimento, Da Vinci, “brincou” com os conceitos de geometria projetiva para criar nos seus quadros um aspecto tridimensional.

Leonardo trabalhava sempre à mercê da fantasia e da universal curiosidade. A sua fama espalhou-se e as encomendas afluíam. Destacam-se obras notáveis como a “Pequena Anunciação”, no Louvre, o “S. Jerónimo”, inacabado, do Vaticano, a “Adoração dos Magos”, inacabado, de Florença, entre outros.

Os seus trabalhos são inconfundíveis pela delicadeza dos acabamentos, pelo uso do “sfumato”, uma maravilhosa combinação de esmaltes, criando a mais subtil transição entre tons e formas. A cena dos anjos da “Virgem dos Rochedos”, refletindo uma sabedoria interior e uma sabedoria artística nunca suplantadas, a “Última Ceia,” uma das mais conhecidas obras, pintada no Convento de Sta. Maria della Grazie, em Milão, assim como “Mona Lisa”, também conhecida por Gioconda, exposta no Museu do Louvre, em Paris, evidenciam, entre outras, um carácter antropocêntrico, numa época em que o homem se torna o elemento mais central e valorizado do Universo. Ao contrário da pintura medieval que se ocupava de temas religiosos, a pintura renascentista tem no Homem e na Natureza o seu tema principal.

Dama do arminho Monalisa O Batismo de Cristo