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TEORIA GERAL DO ESTADO Prof. Me. Hugo Garcez Duarte “Não se conhece, pois, a Constituição de nenhum país pela leitura do seu texto. Para conhecermos a Constituição precisamos conhecer a jurisprudência, a leitura que os tribunais fazem do texto diante dos casos concretos. Toda leitura é contextualizada”. (José Luiz Quadros de Magalhães). 1 Origem e evolução do Estado Antes de analisarmos como o Estado nasceu e evoluiu necessário compreender a origem da sociedade, pois a criação daquele se deve exatamente à existência desta. A vida em sociedade ao mesmo tempo em que traz evidentes benefícios ao homem, propicia uma série de limitações que em certos momentos e em determinados locais são tão numerosas e freqüentes que chegam a afetar seriamente a própria liberdade humana. Apesar do referido o homem permanece vivendo em sociedade. Contudo, duas perguntas clamam por respostas: 1 Haveria uma coação irresistível, impedindo a liberdade dos indivíduos obrigando-os a viver em sociedade mesmo contra sua vontade?

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TEORIA GERAL DO ESTADO

Prof. Me. Hugo Garcez Duarte

“Não se conhece, pois, a Constituição de nenhum país pela leitura do seu texto. Para conhecermos a Constituição precisamos conhecer a jurisprudência, a leitura que os tribunais fazem do texto diante dos casos concretos. Toda leitura é contextualizada”.

(José Luiz Quadros de Magalhães).

1 Origem e evolução do Estado

Antes de analisarmos como o Estado nasceu e evoluiu necessário

compreender a origem da sociedade, pois a criação daquele se deve exatamente à

existência desta.

A vida em sociedade ao mesmo tempo em que traz evidentes benefícios ao

homem, propicia uma série de limitações que em certos momentos e em

determinados locais são tão numerosas e freqüentes que chegam a afetar

seriamente a própria liberdade humana.

Apesar do referido o homem permanece vivendo em sociedade. Contudo,

duas perguntas clamam por respostas:

1 Haveria uma coação irresistível, impedindo a liberdade dos indivíduos

obrigando-os a viver em sociedade mesmo contra sua vontade?

2 A própria natureza do homem o leva aceitar, voluntariamente e como

uma necessidade, as limitações impostas pela vida social?

1.1 A sociedade

Conceito – A Sociedade é uma coletividade de indivíduos reunidos e

organizados para alcançar um objetivo comum.

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Origem – Duas teorias pretendem explicar a origem da sociedade. A

teoria da sociedade natural aponta que este seja fruto da própria natureza humana,

enquanto a teoria contratualista sustenta que a sociedade é tão-somente a

consequência de um ato de escolha.

1.1.1 Sociedade natural – É a que tem maior número de adeptos e a que

exerce maior influência na vida concreta do Estado sem, contudo, excluir a

participação da consciência e da vontade humana. No século IV a. C., Aristóteles

afirmou que “o homem é naturalmente um animal político”. Para ele só o indivíduo

de natureza vil ou superior ao homem procuraria viver isolado dos outros homens

sem que a isso fosse constrangido.

Quanto aos irracionais, que também vivem em permanente associação,

preleciona Aristóteles, constituem meros agrupamentos formados pelo instinto, pois,

o homem, dentre todos os animais, é o único que possui a razão, o sentimento do

bem e do mal, do justo e do injusto.

Neste mesmo sentido, Cícero afirmava que “a primeira causa da

agregação de uns homens a outros é menos a sua debilidade do que um certo

instinto de sociabilidade em todos inato; a espécie humana não nasceu para o

isolamento e para a vida errante, mas com uma disposição que, mesmo na

abundância de todos os bens, a leva a procurar o apóio comum.”

Assim, não seriam as necessidades materiais o motivo da vida em

sociedade, havendo, independente dela, uma disposição natural dos homens para a

vida associativa.

Complementando Aristóteles, São Tomás de Aquino afirmava que a vida

solitária é exceção, que pode ser enquadrada numa de três hipóteses: excellentia

naturae, quando se tratar de indivíduo notavelmente virtuoso, que vive em

comunhão com a própria divindade, como ocorria com os santos eremitas; corruptio

naturae, referente aos casos de anomalia mental; mala fortuna, quando só por

acidente, como no caso de naufrágio ou de alguém que se perdesse numa floresta,

o indivíduo passa a viver em isolamento.

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Modernamente, são muitos os autores que se filiam a esta corrente, como

o italiano Ranelletti, que dizia: “só na convivência e com a cooperação dos

semelhantes o homem pode beneficiar-se das energias, dos conhecimentos, da

produção e da experiência dos outros, acumuladas através de gerações, obtendo,

assim, os meios necessários para que possa atingir os fins de sua existência,

desenvolvendo todo o seu potencial de aperfeiçoamento, no campo intelectual,

moral ou técnico.”

1.1.2 Sociedade contratual - Nega o impulso associativo natural, aduzindo

que só a vontade humana justificaria a existência da sociedade.

Tomas Hobbes – Para Hobbes o homem vive inicialmente no estado de

natureza, sendo, em tal estado egoísta, luxurioso, inclinado a agredir os outros. É o

que ele denomina uma permanente “guerra de todos contra todos”. Pois o estado de

natureza é uma permanente ameaça para a sociedade, que pode irromper sempre

que a paixão sobrepor-se à razão.

Por serem iguais no estado da natureza, e, inicialmente, igualmente dotados,

cada um vive constantemente temeroso de que o outro venha tomar-lhe os bens ou

causar-lhe algum mal, sendo que todos têm capacidade para tal. Esse temor gera

um estado de desconfiança no homem levando-o a tomar a iniciativa de agredir

antes de ser agredido.

É justamente neste momento que a razão (RACIONALIDADE) humana

interfere levando aos homens celebrarem um contrato social, que é a mútua

transferência de direitos, com o propósito de que cada homem esforce-se pela paz e

a defesa de si mesmo.

É a força desse ato racional que estabelece a vida em sociedade, cuja

preservação depende da existência de um poder visível denominado ESTADO, apto

a manter os homens dentro dos limites consentidos obrigando-os, por temor ao

castigo, a realizar seus compromissos.

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Montesquieu – Fomenta existência, no que tange o homem, de um

estado natural, anterior ao estabelecimento da sociedade. Neste estado o homem

sentia-se fraco, estando constantemente atemorizado, inferior e dificilmente

encararia outrem de igual maneira, sendo a paz a primeira lei natural, pois ninguém

atacaria outro alguém.

Para ele existem leis naturais que levam o homem a escolher a vida em

sociedade: O desejo da paz; o sentimento das necessidades (procura de alimentos

principalmente); a atração entre sexos opostos; o desejo de viver em sociedade,

motivado pela consciência que o homem tem de sua condição e de seu estado.

Baseados no referido os homens unem-se, sentem-se fortes, a igualdade

natural que existia entre eles desaparece e o estado de guerra começa, ou entre

sociedades, ou entre indivíduos da mesma sociedade.

Rousseau – Adotou posição semelhante à de Montesquieu no que toca

a predominância da bondade humana no estado da natureza.

Seguia, porém, a mesma linha de Hobbes, de modo a explicar a vida e

organização em sociedade por meio de um contrato social em sua obra mais

famosa: “O Contrato Social”.

Para Rousseau, é a vontade, não a natureza humana, o fundamento da

sociedade.

Segundo ele, certos obstáculos atentam à conservação do homem no estado

natural, excedendo sua força no que tange manter-se nesse estado. Não podendo

persistir então tal estado primitivo, estando o gênero humano fadado ao perecimento

se não mudasse o seu modo de ser.

Na impossibilidade de ser aumentada a força de cada indivíduo, o homem,

consciente de que a liberdade e a força constituem os instrumentos fundamentais de

sua conservação, pensa num modo de combiná-los. Ou seja, o homem visa

encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de

cada associado, de qualquer força comum; e pela qual cada um, unindo-se a todos,

não obedeça, portanto a si mesmo, ficando, assim, tão livre como dantes.

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É então que ocorre a alienação de cada associado, com todos seus direitos a

favor da comunidade. Nesse instante, o ato de associação produz um corpo moral e

coletivo, que é o Estado, enquanto mero executor de decisões, sendo o soberano

quando exercita o poder de decisão. O soberano, portanto, continua a ser o conjunto

das pessoas associadas, mesmo depois de criado o Estado.

O autor sustenta haver uma igualdade natural entre os homens, fomentando

ainda, que longe de destruí-la, o pacto fundamental procede a uma correção,

suprindo as deficiências resultantes de desigualdade física e fazendo com que os

homens, podendo ser desiguais em força ou engenho, se tornem iguais por

convenção e de direito.

John Locke – Segundo o autor, todos os homens, ao nascerem, teriam

direitos naturais como os direitos à vida, à liberdade e à propriedade e, para garantir

esses direitos naturais criaram governos. Se esses governos, contudo, não

respeitassem referidos direitos (naturais), o povo tinha o direito de se revoltar contra

eles. Nestes moldes, poder-se-ia contestar um governo injusto, possibilitando-se às

pessoas não se obrigarem a aceitar suas decisões.

Pode-se afirmar predominar atualmente a aceitação de que a sociedade

resulta de uma necessidade natural do homem, sem excluir a participação da

consciência e da vontade humanas. É inegável, entretanto, que o contratualismo

exerceu e continua exercendo grande influência prática.

Contudo, há que se apreciar as palavras do mesmo Rousseau: “O primeiro

que, cercando um terreno, se lembrou de dizer: Isto me pertence, e encontrou

criaturas suficientemente simples para acreditar, foi o verdadeiro fundador da

sociedade civil. Que de crimes , de guerras, de assassinatos que de misérias e de

horrores teria poupado ao gênero humano aquele que, desarraigando as estacas ou

atulhando o fosso, tivesse gritado aos seus semelhantes: Guardai-vos de escutar

este impostor! Estais perdidos e vos esqueceis que os frutos a todos pertencem e de

que a terra não é de ninguém”.

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De tal posicionamento, resulta em nós a visão negativa do Estado sufragada

por Karl Marx, que, afirma ser o Estado produto da sociedade ao chegar a uma

determinada fase de seu desenvolvimento. Para o autor, o Estado é um instrumento

de proteção dos interesses da classe dominante. O Estado seria o meio (legítimo)

pelo qual, os detentores dos meios de produção oprimem a classe operária

(proletariado). Ou seja, o Estado estaria a serviço dos interesses da classe

dominante.

Esta é a visão negativa do Estado. Karl Marx defendia o desaparecimento do

Estado, pois se o Estado é instrumento para proteger os interesses da classe

dominante, em não havendo mais classes sociais após uma revolução proletária,

não haveria também, mais razão para a existência de um aparato como o Estado,

que, em uma sociedade harmonizada, entinguir-se-á naturalmente.

1.2 O Estado

Conceito de Estado – Trata-se da organização político-jurídica de uma

sociedade para realizar o bem público/comum, com governo próprio e território

determinado.

Origem do Estado – Quanto a origem do Estado existem três posições:

I O Estado, assim como a própria sociedade, sempre existiu visto que o

homem desde que vive na terra está integrado numa organização social, dotada de

poder e com autoridade para determinar o comportamento social de todo o grupo;

II Outros autores defendem que a sociedade existiu sem o Estado durante

um certo período e depois, por diversos motivos, foi se constituindo o Estado para

atender às necessidades dos grupos sociais;

III Alguns autores somente admitem como Estado a sociedade política

dotada de certas características bem definidas, o que só ocorreu a partir do século

XVII.

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Formação do Estado – Existem duas teorias sobre a formação

originária do Estado:

1 Formação natural – Que afirma que o Estado se formou naturalmente e

não por ato voluntário;

2 Formação Contratual – Segundo esta corrente um acordo de vontades

de alguns homens ou de todos levou à criação do Estado.

No que tange às causas do aparecimento do Estado existem as seguintes

teorias:

1 Origem patriarcal (família) – Defende que cada família primitiva se

ampliou e deu origem a um Estado;

2 Origem em atos de força, de violência ou conquista – Abarca que a

superioridade de força de um grupo social permitiu-lhe submeter um grupo mais

fraco, nascendo o Estado dessa conjunção dominantes e dominados;

3 Origem em causas econômicas ou patrimoniais – Segundo esta teoria o

acúmulo de riquezas individuais deteriorou a convivência harmônica, surgindo assim

a necessidade do reconhecimento de novas formas de aquisição da propriedade,

que se desenvolviam umas sobre as outras, num acúmulo acelerado de riquezas

que dividia a sociedade em classes, sendo a classe possuidora exploradora da não-

possuidora, dominando a, nascendo a instituição Estado;

4 Origem no desenvolvimento interno da sociedade – Para esta corrente é

o próprio desenvolvimento espontâneo da sociedade que deu origem ao Estado.

A evolução do Estado

1 O Estado Oriental, Antigo ou Teocrático – Trata-se de antigas

civilizações no Oriente ou do Mediterrâneo.

A família, a religião, o Estado, a organização econômica formavam um

conjunto confuso, não se distinguindo o pensamento político da religião, da moral,

da filosofia ou outras doutrinas econômicas, sendo marcas características a

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natureza unitária e a religiosidade. O Estado aparece como uma unidade geral, sem

divisão interior, territorial ou de funções. A religiosidade denomina este Estado de

Teocrático, onde a autoridade dos governantes e as normas de comportamento

individuais e coletivos são a expressão da vontade de um poder divino. Em alguns

casos o governante é considerado representante do poder divino e, noutros, o poder

do governante é limitado pela vontade divina.

2 O Estado Grego – Trata-se de um Estado cuja característica

fundamental é a cidade-Estado, a polis, cujo ideal era a auto-suficiência, a autarquia.

Há uma elite que compõe a classe política, com intensa participação nas decisões

de caráter público do Estado, sendo restrita a autonomia individual nas relações de

caráter privado. Quando citado como governo democrático significava que uma parte

restrita da população (os cidadãos) é que participavam das decisões políticas, pois,

além destes, habitavam a cidade os Metecos (estrangeiros) e os escravos, que não

participavam do poder político.

3 O Estado Romano – No Estado Romano a família é a base da

organização, dando-se aos descendentes dos fundadores do Estado privilégios

especiais. O povo, que compreendia uma pequena parte da população, participava

diretamente do governo que era exercido pelo Magistrado. Com o tempo, novas

camadas sociais surgiram, adquirindo e ampliando direitos. Com a idéia do

surgimento do Império, Roma pretendeu a integração dos povos conquistados,

mantendo um sólido núcleo de poder político para assegurar a unidade e

ascendência da Cidade de Roma. Com a liberdade religiosa assegurada por

Constantino (Edito de Milão) a noção de superioridade dos romanos desapareceu

em face do cristianismo.

4 O Estado Medieval – O Estado Medieval tem como característica

marcante o Cristianismo, as invasões bárbaras e o feudalismo. O Cristianismo é a

base da aspiração à universalidade, superando a idéia de que os homens valiam

diferentemente, de acordo com a origem de cada um, sendo todos iguais, inclusive

os ainda não convertidos. O alvo era que todos fossem cristãos e adotassem mesma

norma de comportamento público e particular. Com este intuito o Papa Leão III

confere a Carlos Magno o título de Imperador, que tinha sua autoridade contestada

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em face multiplicidade de centros de poder (os reinos, os senhorios, as comunas, as

organizações religiosas).

O Próprio Imperador recusava-se a se submeter à autoridade da igreja,

terminando esta luta no Estado Moderno com a afirmação da supremacia absoluta

dos monarcas.

A invasão dos bárbaros, iniciada no século III e reiteradas até o século VI,

com suas influências estimularam as regiões invadidas a se afirmarem como

unidades políticas independentes, originando vários Estados, mantendo com os

bárbaros relações econômicas, caracterizando o Estado Medieval numa ordem

precária com indefinições das fronteiras políticas. Com o feudalismo valorizou-se a

posse da terra, onde ricos e pobres tiravam a subsistência, desenvolvendo um

sistema administrativo e uma organização militar ligados à situação patrimonial.

Pela vassalagem os proprietários menos poderosos colocavam-se a serviço

do senhor feudal, obrigando-se a dar-lhe apoio nas guerras e contribuir

financeiramente em troca de proteção. Também existia o benefício, contrato entre o

senhor feudal e o chefe de família que não possuísse patrimônio, sendo que este

recebia uma faixa de terra para cultivar e sustentar sua família, repassando parte da

produção ao senhor feudal, que tinha pleno domínio sobre as regras de

comportamento social e privado de toda esta família. Já a imunidade era o ato pelo

qual se concedia a isenção de tributos às terras sujeitas ao benefício.

Assim, no Estado Medieval existiu um poder superior exercido pelo

Imperador, uma infinita pluralidade de poderes menores, sem hierarquia definida,

várias ordens jurídicas (norma Imperial, eclesiástica, monarquias inferiores, direito

comunal desenvolvido, ordenações dos feudos e as regras estabelecidas no fim da

Idade Média pelas corporações de ofício), instabilidade social, política e econômica,

gerando uma intensa necessidade de ordem e autoridade, germe do Estado

Moderno.

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2 O Estado Moderno

O Estado absoluto – Primeira versão do Estado moderno, cujas

características são: concentração de todos os poderes nas mãos dos monarcas

(monarquias absolutistas); chega-se a personificar o Estado na figura do rei –

Exemplo: Luiz XIV, rei sol: “o Estado sou eu”; poder como origem divina – soberania

do monarca perpétua, originária e irresponsável em face de qualquer outro poder

terreno; instrumentos de garantia do poder – Burocracia (legal-racional) e exército; O

homem passa de servo do senhor feudal para súdito do rei.

Estado Liberal – (Estado burguês) - O Estado Liberal foi o primeiro tipo

de Estado Constitucional.

Aponta-se como marcos para afirmação do Estado Moderno (ocorreram neste

período):

I A Revolução Norte-Americana de 1776;

II A Constituição da Federação Norte-Americana de 1787;

III Revolução Francesa de 1789.

Este Estado tem como características: separação entre Estado e Sociedade

Civil – mediada pelo Direito – Direito como ideal de justiça – submissão da soberania

estatal à lei – divisão dos poderes ou funções; as constituições declaram direitos

individuais – entendidos como aqueles que regulam condutas individuais – protegem

a esfera dos direitos individuais contra o Estado; Estado tem um papel reduzido –

apresenta-se como Estado Mínimo – Assegurando a liberdade de atuação do

indivíduo; omissão estatal perante problemas sociais e econômicos – não consagra

direitos sociais e econômicos – regra básica da não-intervenção no domínio

econômico; o alicerce teórico da liberdade é a propriedade – cidadão são aqueles

que participam da ordem econômica de forma produtiva; direitos políticos (sentido

restrito) – votar e ser votado – apenas proprietários que tenham uma renda anual

acima de um determinado patamar (muitas vezes constitucionalmente previsto); em

fase posterior conquista-se o direito ao voto secreto, periódico e igualitário – voto em

razão de sexo só desaparece em sua grande maioria no século XX.

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O liberalismo levou a economia do século XIX a um processo de crescimento

jamais visto até então e a uma acumulação e concentração de riquezas

insuportáveis.

A concentração de riqueza levou à eliminação da livre concorrência e da livre

iniciativa (idéias basilares do liberalismo), ao mesmo tempo em que acentuava a

limites alarmantes a miséria e outras formas excludentes de exclusão social.

Impera uma crescente marginalidade, criminalidade bem como revoltas

sociais de trabalhadores.

Pensou-se em tal momento, numa alternativa para incorporação das

reivindicações dos trabalhadores e propostas socialistas. O Estado liberal passa a

admitir uma mudança de postura no que toca questões socioeconômicas, garantindo

determinados direitos sociais, como a limitação da jornada de trabalho, a

regulamentação do trabalho do menor e previdência social.

Estado Social (Constitucionalismo social) – Estado cuja Constituição

matriz foi a de Weimar (Alemanha 1919), embora cronologicamente a Constituição

Mexicana de 1917 tenha sido a primeira.

Este Estado tem como características: intervencionismo Estatal - Estado

deixa de ter conduta abstencionista; busca-se preservar a livre concorrência e a livre

iniciativa; interrupção pelo nazismo e fascismo; pós-guerra - segunda guerra –

retomada do Estado social (Estado de bem-estar social); Estado consagra os

direitos sociais como fundamentais – visa-se a concretização dos direitos individuais;

assegura-se direito de livre expressão e livre concorrência; Estado deve promover

saúde, educação, trabalho, etc.

Estado Democrático – Com este Estado pretende-se conjugar o ideal

democrático: conquistas democráticas; garantias jurídico-legais; preocupação social.

Seu principal objetivo é promover a igualdade, no sentido de solucionar o

problemas das condições essenciais de existência, tendo como características e

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aspirações: Constitucionalidade – vinculação do Estado democrático a uma

constituição como instrumento básico de garantia jurídica; organização democrática

da sociedade; divisão dos poderes e funções; sistema de direitos fundamentais

individuais e coletivos – assegura ao homem autonomia perante os poderes

públicos, sendo também um “Estado amigo” – respeitando a dignidade da pessoa

humana e empenhando-se na defesa e garantia da liberdade, justiça e

solidariedade; justiça social como mecanismo corretivo das desigualdades;

igualdade formal e material – articulação de sociedade justa.

3 Elementos do Estado

Os elementos constitutivos do Estado são o território, o povo e o poder

(soberania).

Território – Segundo Ivo Dantas trata-se da parte do globo em que

certo governo pode exercer seu poder de constrangimento, organizar e fazer

funcionar os diversos serviços públicos.

O território detêm as seguintes funções:

I Função positiva – significa dizer que tudo e todos que se encontram em

seus limites estejam sujeitos à sua autoridade.

II Função negativa – em conseqüência lógica do item anterior, há no local

onde delimita-se o território, a exclusão de toda e qualquer autoridade diversa

daquela do Estado.

Pode-se apontar como componentes de um território:

I Terra;

II Rios, lagos, mares interiores, portos, golfos e estreitos;

III Águas territoriais;

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IV Navios;

V Embaixadas;

VI Camada atmosférica;

VII Subsolo.

Povo – O povo é o elemento pessoal constitutivo do Estado.

De toda forma, far-se-á necessário, a título de esclarecimento, tecermos

estritos comentários acerca dos termos população, povo e nação.

I População – O conceito engloba todas as pessoas que habitam

determinado território, mesmo que de permanência temporária. Trata-se de um

conceito demográfico-matemático.

II Povo – Realça o aspecto jurídico do grupo vinculado a uma

determinada ordem normativa em certo território. Estamos diante de um conceito

jurídico-constitucional.

III Nação – Diz respeito a identidade referente a origem, interesses,

credos, etc. É fruto de conceito psicossocioantropológico.

Poder (Soberania) – Segundo Miguel Reale traduz-se no poder que

tem uma nação de organizar-se juridicamente e de fazer valer dentro de seu

território a universalidade de suas decisões nos limites dos fins éticos de

convivência.

Aponta-se como características deste elemento de um Estado.

I Uno – decorrente da impossibilidade de convivência simultânea de

dois poderes soberanos.

II Indivisível – conclusão lógica ante sua unidade, que não impede a

divisão do seu exercício dentro de determinado território.

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III Imprescritível – não tem prazo de duração.

IV Inalienável – o poder (soberania) é indisponível.

Deve-se destacar, igualmente, que o poder (soberania), seja concebido em

dois aspectos: um interno e outro externo.

I Interno – refere-se ao fato de que haja insubordinação a poder superior.

II Externo – reside na evidência de ser independente de qualquer outro

Estado.

4 Formas de Estado

Os Estados adotam, geralmente, as seguintes formas de Estado:

Estado Unitário – prima por monopolizar o poder político nas mãos de um único núcleo (poder central).

São características do Estado unitário:

I Configuração por lei ordinária;

II Centralização na execução das leis e gestão de serviços públicos;

III Um único centro de decisão aliado a um instrumento de execução

burocratizado – hierarquia – agentes locais tem atribuição de competências – uma

parcela do poder público é passada mas não a autonomia;

IV Não há agentes administrativos independentes.

Há quem aponte fundamentos positivos e negativos acerca desta forma

estatal.

Apontamentos positivos:

I Existência de uma só ordem jurídica, econômica e social;

II Burocracia única – Eficaz e racionalizada.

III Haveria um fortalecimento da autoridade estatal.

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Apontamentos negativos:

I Sobrecarga administrativa do poder;

II Temas de interesse local resolvidos no plano da legislação nacional;

III Retardamento das decisões administrativas.

Estado Federado (Federação)

É a forma de Estado onde há um união, aliança, pacto entre Estados.

O primeiro país a adotar esta forma estatal foi os EUA (séc. XVIII), que a

partir de 1787, transforma sua confederação em federação.

São características da federação:

I Configuração constitucional;

II Descentralização do poder político;

III Repartição rígida de competências entre o órgão do Poder Central

(União), e as organizações regionais (Estados Membros). OBS – No território

brasileiro há um terceiro nível, vale dizer, os municípios, que também participam da

referida repartição de competências;

IV Poder político partilhado – significa haver poderes próprios a cada ente

federado;

V Estado – detém a soberania;

VI Entes federados – detém autonomia;

VII É uma estrutura forte sem a destruição das peculiaridades dos

Estados membros.

5 Formas de governo

É o modo pelo qual o poder se organiza e se exerce, permitindo agrupar os

Estados em seu modo de ser substancial, determinando a situação jurídica e social

dos indivíduos em relação à autoridade.

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A classificação mais antiga das formas de governo que se conhece é a de

Aristóteles, baseada no número de governantes. Distingue ele três espécies de

governo: a monarquia, quando é um só indivíduo quem governa em prol do bem

geral; a aristocracia, que é o governo exercido por um grupo de minoria privilegiada

da nobreza em benefício da sociedade; e a democracia quando o poder é exercido

pelo povo com o objetivo do bem comum. Cada uma destas formas de governo pode

sofrer uma degeneração, quando quem governa deixa de se orientar pelo interesse

geral e passa a decidir segundo conveniências particulares. Assim, as formas puras

de governo são substituídas por forma impuras: a monarquia degenera em tirania

(um só quem governa em proveito próprio); a aristocracia degenera em oligarquia

(governo exercido por um grupo de minoria privilegiada da nobreza em benefício

próprio); e a democracia degenera em demagogia (o governo nas mãos da multidão

revoltada ou esta domina diretamente os governantes, implantando um regime de

violência e de opressão).

Maquiavel sustentou a existência de ciclos de governo, ou seja, o ponto de

partida é um estado anárquico, inicio da vida humana em sociedade. Para se

defenderem melhor os homens escolheram o mais robusto e valoroso, nomeando-o

chefe e obedecendo-o. Não dando certo, mudaram as características para o mais

justo e sensato, tendo esta monarquia eletiva se tornado hereditária, sendo que

algum tempo depois os herdeiros começaram a degenerar, surgindo a tirania. Para

coibir seus males, os que tinham mais riquezas organizaram conspirações e se

apoderaram do governo, instaurando a aristocracia, orientada no bem comum.

Contudo, os descendentes dos governantes aristocratas, despreocupados com o

bem comum, passaram a utilizar o governo em proveito próprio convertendo a

aristocracia em oligarquia. O povo não suportando mais esta situação destituiu os

oligarcas e resolveu governar a si mesmo, surgindo o governo popular ou a

democracia. Mas o próprio povo sofreu um processo de degeneração e cada um

passou a utilizar em proveito pessoal a condição de participante no governo,

gerando a anarquia e voltando-se ao estágio inicial e recomeçando-se o ciclo que já

foi cumprido várias vezes na vida de todos os povos.

Assim, a única maneira de se quebrar o ciclo, segundo Maquiavel, seria a

conjugação da monarquia, da aristocracia e da democracia em um só governo.

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Mais tarde Montesquieu apontou três espécies de governo: o governo

republicano, o monárquico e o despótico, tendo grande influência prática.

Cita Montesquieu que “governo republicano é aquele que o povo, como um

todo, ou somente uma parcela do povo possui poder soberano; a monarquia é

aquela em que um só governa, mas de acordo com leis fixas e estabelecidas; e no

governo despótico, uma só pessoa governa sem obedecer a leis e regras, realiza

tudo por sua vontade e seus caprichos”. Na verdade, ainda hoje, a monarquia e a

república são as formas fundamentais de governo.

Monarquia – É a forma de governo em que um só indivíduo, ocupando

o cargo em caráter vitalício e sujeito à sucessão hereditária, governa em prol do bem

geral.

São características fundamentais da monarquia:

1 Vitaliciedade – O monarca pode governar enquanto viver ou enquanto

tiver condições para tanto;

2 Hereditariedade – A escolha do monarca se dá pela simples verificação

da linha de sucessão. Quando morre o monarca ou este deixa o governo por outra

razão, é imediatamente substituído pelo herdeiro da coroa;

3 Irresponsabilidade – O monarca não tem responsabilidade política, ou

seja, não deve explicações ao povo ou qualquer órgão sobre os motivos pelos quais

adotou certa orientação política.

República - É a forma de governo típica da coletividade, em que o

poder e o exercício da soberania são atribuídos ao povo, que elege os

representantes para um mandato pré-fixado. O desenvolvimento da ideia

republicana se deu através das lutas contra a monarquia absoluta e pela afirmação

da soberania popular que exigia participação do povo no governo, surgindo, assim, a

República, mais que uma forma de governo, um símbolo de todas as reivindicações

populares.

As características principais da República são:

Page 18: Apostila de teoria_geral_do_estado

1 Temporariedade – O Chefe do Governo recebe um mandato, como o

prazo de duração predeterminado;

2 Eletividade – Na república o Chefe do Governo é eleito pelo povo, não

se admitindo a sucessão hereditária ou por qualquer forma que impeça o povo de

participar da escolha;

3 Responsabilidade - O Chefe do Governo é politicamente responsável, o

que significa que deve prestar contas de sua orientação política ao povo diretamente

ou a um órgão de representação popular.

6 Sistemas de governo

Sistema de governo refere-se à organização e estruturação do governo de

cada Estado, donde aponta-se o Presidencialismo e o Parlamentarismo.

Parlamentarismo – Sistema de governo surgido na Inglaterra, em 1200.

Pode-se dizer que quantos Estados adotarem o sistema parlamentar, tantos

sistemas parlamentares existirão. Trata-se de um sistema complexo, não havendo

um sistema igual ao outro. Todavia, apontam-se como características deste sistema

de governo:

1 queda do governo pelo parlamento e dissolução do parlamento pelo

governo – o sistema parlamentar baseia-se em dois mecanismos fundamentais.

2 não há acúmulo de funções, sendo o primeiro-ministro chefe de governo

e o presidente ou monarca, chefe de Estado com função simbólica;

O modelo clássico do parlamentarismo – O modelo considerado

clássico do parlamentarismo previa a escolha, pelo parlamento, de todo o gabinete,

ou seja, do primeiro-ministro e dos ministros que o compunham. Desta forma,

assegurava-se que o primeiro-ministro fosse um igual entre pares. As decisões

seriam coletivas, de todo o gabinete, e o primeiro-ministro apenas um coordenador

dos trabalhos do governo coletivo e um representante deste.

Page 19: Apostila de teoria_geral_do_estado

O sistema parlamentar inglês atual – O sistema parlamentar inglês

atual caracteriza-se pela existência de um primeiro-ministro forte e de um governo

forte. O primeiro-ministro não é escolhido pelo parlamento, assim como os seus

ministros. O primeiro-ministro será sempre o líder do partido majoritário. Como o

sistema eleitoral distrital majoritário tem privilegiado os partidos tradicionais

(conservador e trabalhista), existe no Reino Unido um bipartidarismo de fato ainda

resistente, embora ameaçado e só mantido pelo voto distrital majoritário, uma vez

que são os partidos que recebem votação uniforme em todos os distritos eleitorais

(este sistema distrital fez com que, por exemplo, uma aliança entre sociais

democratas e liberais obtivesse, em 1983, 25 por cento dos votos, dois pontos

percentuais a menos que os trabalhistas, mas, no entanto, os trabalhistas obtiveram

32 por cento das cadeiras no parlamento contra apenas 3,5 por cento das cadeiras

para a aliança de sociais democratas e liberais, pois os votos destes últimos foi

territorialmente concentrado, a exemplo do que ocorre com os partidos nacionalistas

escocês e galês). Isto faz com que o primeiro-ministro tenha sempre maioria

absoluta do seu próprio partido político no parlamento, partido do qual ele é o líder

eleito.

O sistema parlamentar alemão – O sistema parlamentarista alemão

também é um sistema com primeiro-ministro forte e estável, mas por motivações

diferentes do sistema inglês. O parlamento escolhe apenas o primeiro-ministro, que,

então, tem liberdade para escolher os seus ministros. Isto faz com que ele não seja

um igual entre pares, mas efetivamente o chefe do gabinete. Entretanto, a principal

característica é a estabilidade do sis¬tema alemão, conseguida através do

mecanismo de destituição do primeiro-ministro e seu gabinete. De forma diferente da

maioria dos sistemas parlamentares, a queda do governo não depende apenas da

aprovação de um voto de desconfiança (a crítica do governo), mas também da

aprovação de um novo nome de primeiro-ministro com o seu programa de governo

simultaneamente, o que torna o processo de queda do governo muito mais difícil,

mas, por outro lado, evita transições delicadas, o que ocorre quando cai o governo e

ainda não há uma nova maioria para constituir um novo.

Page 20: Apostila de teoria_geral_do_estado

Presidencialismo – O sistema presidencial surgiu nos Estados Unidos,

após a revolução iniciada em 1776, que culminou com a Constituição de 1787.

São características do presidencialismo:

1 acúmulo de funções na figura do Presidente da República, que é

simultaneamente chefe de Estado (função simbólica); chefe de governo (função de

poder político) e chefe da administração pública (função técnico-política);

2 separação de poderes ou de funções do Estado e busca do equilíbrio

entre os três poderes por meio de um sistema de freios e contrapesos;

3 mandatos fixos do chefe do Executivo e dos membros do Legislativo;

4 possibilidade de impeachment, ou processo de crime de

responsabilidade, que permite afastar o presidente, o qual será julgado pelo senado.

7 Estado, Direito e Política

Todo Estado desenvolve complexa atividade, que têm aspectos jurídicos e

conteúdo político, pois, toda fixação de regras de comportamento se prende a

fundamentos e finalidades, enquanto que a permanência de meios orientados para

certos fins depende de sua inserção em normas jurídicas. Assim, reduz-se a

margem de arbítrio e discricionariedade, assegurando a existência de limites

jurídicos à ação do Estado.

Enquanto sociedade política, voltada para fins políticos, o Estado participa da

natureza política, que convive com a jurídica, ocorrendo uma interação entre elas.

O caráter político do Estado é que lhe dá a função de coordenar os grupos e

indivíduos em vista de fins a serem atingidos, impondo a escolha dos meios

adequados, levando-se em conta:

1 A necessidade e possibilidade – deve se identificar as necessidades

preponderantes do povo (conjunto de condições e dos elementos que assegurem a

sobrevivência dos indivíduos e dos grupos sociais compatíveis com a natureza

humana) e os meios disponíveis de cada Estado para viabilizá-las.

Page 21: Apostila de teoria_geral_do_estado

2 Indivíduos e coletividade – Deve-se considerar, igualmente, ao tomar

decisões políticas a conciliação entre as necessidades dos indivíduos e as da

coletividade, pois, não se pode considerar as necessidades do indivíduo

isoladamente.

3 Liberdade e autoridade – Na escolha dos meios de satisfação das

necessidades será necessário, não raro, determinar limitações à liberdade individual

a fim de aumentar a eficácia dos meios disponíveis. Além disso, para que a dinâmica

social se oriente no sentido de um fim determinado, será preciso coordenar a

atuação dos indivíduos e dos grupos sociais com o uso da ordem, inclusive com a

possibilidade de se usar de coação.

ESTADO E NAÇÃO – No século XVIII foi criado o conceito de nação,

símbolo da unidade popular com forte conotação emocional, a fim de levar a

burguesia, economicamente poderosa, que manipulava emocionalmente o povo, à

conquista do poder político. Era em nome da Nação que se lutava contra a

monarquia absoluta, dando-se a entender que era justo e necessário que o povo

assumisse o seu próprio governo.

Com as Revoluções Americana e Francesa a Nação passou a ser identificada

com o próprio Estado pelo fato do termo Nação ser muito vago e já utilizado com

êxito como símbolo de reivindicações populares, se prestando mais para despertar

reações emocionais, o que culminou na derrubada ou enfraquecimento das

monarquias. Depois, os novos governantes passaram a utilizar a força mística da

expressão para justificar suas investidas sobre os pequenos Estados.

No século XX numa exploração de sentimentos nacionais eclodiram as duas

guerras mundiais sobre o pretexto de reunir numa só unidade política os

componentes da mesma nação e, além disso, a afirmação da existência de Nações

superiores.

Assim, o conceito de Nação foi um artifício para envolver o povo em conflitos

de interesses alheios, sem contexto jurídico.

Page 22: Apostila de teoria_geral_do_estado

A regra hoje é o plurinacionalismo, ou seja, em cada Estado existem

indivíduos pertencentes a várias Nações, evidenciando a existência, dentro do

mesmo Estado, de grupos sociais claramente distintos por sua cultura e costumes,

gerando uma unidade jurídica que respeita estas diferenças. Contudo, convém ao

Estado que haja a possibilidade de estabelecer o máximo possível de regras gerais

e uniformes para todo o povo.

Portanto, Estado é uma sociedade e Nação é uma comunidade, podendo-se

definir:

Estado – organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o

bem público, com governo próprio e território determinado;

Sociedade – coletividade de indivíduos reunidos e organizados para

alcançar uma finalidade comum;

Nação – grupo de indivíduos que se sentem unidos pela origem

comum, pelos interesses comuns, e principalmente, por idéias e aspirações comuns.

8 Mudanças do Estado por Reforma e Revolução

O Estado contemporâneo depara-se com um problema fundamental, que é

conciliar a ideia de ordem com o intenso dinamismo social, que ele deve assegurar e

promover e que implica a ocorrência de uma constante mutação. A incompreensão

de que o Estado é um todo dinâmico, submetido a um constante sistema de tensões,

mas, ao mesmo tempo, uma ordem que permite novas criações sem anular os

resultados já obtidos, tem sido desastrosa para a liberdade humana e a justiça

social. Ocorrem dois erros básicos:

1 Manutenção de organização inadequada;

2 Adoção de processos muito eficazes para objetivos limitados, mas

conflitantes com o objetivo de consecução do bem comum de todo o povo.

Tem-se uma visão formalista e estática de ordem, que leva à utilização do

Estado como um embaraço às mudanças sociais, prestigiando valores já superados

pela realidade social. Assim é inevitável o uso da força para impor as novas

Page 23: Apostila de teoria_geral_do_estado

exigências da realidade e adotar o Estado adequado. Desta forma, a ordem jurídica

deve ter fundamento na realidade social, tendo sempre o caminho aberto a uma

permanente transformação que a acompanha.

Para se assegurar a permanência do Estado adequado deve se aceitar o

conflito de opiniões e de interesses como fatos normais, componentes da realidade

e participantes do processo dialético de que resulta a ordem capaz de promover e

assegurar o bem comum.

A observação dos fatos revela que os conflitos entre pessoas são produto de

necessidades naturais que cada indivíduo sente em fazer prevalecer sua opinião ou

interesse, devendo o Estado se organizar de maneira a permitir a livre expressão

das idéias e das aspirações, estabelecendo regras gerais e uniformes para a

escolha da vontade preponderante.

Se isso não for feito, somente através da força se manterá um Estado

inadequado, que não corresponde à vontade social preponderante, que se

enfraquecerá visto que o povo não se empenhará na manutenção de uma ordem

que não corresponde aos seus desejos e às suas necessidades.

Com a EVOLUÇÃO ocorre o desenvolvimento natural e progressivo das

idéias e dos costumes, da constante adaptação do Estado às novas condições de

vida social, caminhando-se com mais segurança, sendo mais fácil avaliar o sentido

real das mudanças verificadas nas condições de vida e nas aspirações dos

indivíduos, a fim de integrá-las na ordem jurídica.

Caso contrário, somente com a REVOLUÇÃO (movimento súbito e

generalizado, de caráter social e político, por meio do qual uma grande parte do

povo procura conquistar pela força o governo do país, a fim de dar-lhe outra direção

ou de transformar suas instituições fundamentais) se pode remover os obstáculos à

livre transformação do Estado, restaurando-se os mecanismos de adaptação

constantes às novas exigências da realidade social. A revolução não se caracteriza

pela simples substituição de governantes, ou a mudança de uma para outra ordem

formal, ou mera substituição do grupo dominante e introdução de modificações

superficiais que afetam apenas a burocracia do Estado.

Para que seja reconhecida a revolução ela deve ter os seguintes requisitos:

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1 Legitimidade – Será legítima se de fato houver um desacordo profundo

entre a ordem jurídica vigente e aquela que deveria corresponder à realidade social.

2 Utilidade – Exige que a revolução se processe de maneira eficaz e

apropriada, capaz de atingir os objetivos almejados, pois do contrário haverá a mera

destruição de uma ordem sem a colocação de outra mais adequada.

3 Proporcionalidade – Com o abatimento da ordem jurídica vigente há um

momento de incerteza jurídica, durante o qual ficam abertas as portas à

arbitrariedade, violência e ao uso indiscriminado dos meios de coação, sempre

havendo quem se utilize desse momento para resolver seus problemas particulares

em nome da revolução. A transição entre a velha e a nova ordenação deve ser

breve, restaurando-se os mecanismos de transformação evolutiva, para que o

Estado, mantendo a sua constante adequação à realidade social, seja um

instrumento do bem comum.

9 O Estado contemporâneo e sua função social

O Estado hodierno trata-se de um Estado Democrático de Direito. Estado

este, segundo Streck que tem como princípios a constitucionalidade, entendida

como vinculação deste Estado a uma Constituição, concebida como instrumento

básico de garantia jurídica; a organização democrática da sociedade; um sistema de

direitos fundamentais individuais e coletivos, de modo a assegurar ao homem uma

autonomia perante os poderes públicos, bem como proporcionar a existência de um

Estado amigo, apto a respeitar a dignidade da pessoa humana, empenhado na

defesa e garantia da liberdade, da justiça e solidariedade; a justiça social como

mecanismo corretivo das desigualdades; a igualdade, que além de uma concepção

formal, denota-se como articulação de uma sociedade justa; a divisão de funções do

Estado a órgãos especializados para seu desempenho; a legalidade imposta como

medida de Direito, perfazendo-se como meio de ordenação racional,

vinculativamente prescritivo de normas e procedimentos que excluem o arbítrio e a

prepotência; a segurança e correção jurídicas.

Em outras palavras, o Estado Democrático de Direito visa a promoção de um

processo de convivência social numa sociedade, livre, justa e solidária, em que o

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poder emana do povo, e deve ser exercido em proveito do povo, diretamente ou por

representantes eleitos; participativa, porque envolve a participação crescente do

povo no processo decisório e na formação dos atos do governo; pluralista, porque

respeita a pluralidade de ideias, culturas e etnias e pressupõe assim o diálogo entre

opiniões e pensamentos divergentes e a possibilidade de convivência de formas de

organização e interesses distintos da sociedade, há de ser um processo de

libertação da pessoa humana das formas de opressão que não depende apenas do

reconhecimento formal de direitos individuais, coletivos, políticos e sociais, mas

especialmente da vigência de condições econômicas, suscetíveis de favorecer o seu

pleno exercício

Neste viés, a função social do Estado contemporâneo, caracterizado pelo

intervencionismo e que agrega a questão social e a busca da igualdade nada mais é

do que a efetividade dos direitos fundamentais da pessoa humana, entendidos como

direitos individuais, sociais, econômicos e políticos.