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Curso: Noções Básicas em Cosmetologia Componente Curricular: História da Beleza Professor: Viegas Fernandes da Costa Aula: 10/03/2014 TEXTO 1: O SORRISO DESDENTADO DE MONALISA Viegas Fernandes da Costa Alunos nos perguntam coisas surpreendentes. Outro dia, lecionando História Moderna para uma turma de curso noturno, fui arrebatado por uma questão, no mínimo, curiosa. Discutíamos a arte renascentista, os quadros de Rafael e Da Vinci, quando Gisele, lá do alto da sua dúvida e da frescura da sua adolescência, questionou-me a respeito dos dentes de Monalisa. Haveria dentes na boca da burguesa de sorriso enigmático, pintada pelo visionário Leonardo? Eis a pergunta que me foi feita, e calcule, amigo leitor, amiga leitora, se é possível respondê-la. E além, haveria dentes nos quadros do Renascimento? Confesso que procurei: Rafael, Botticelli, Van Eyck, Michelangelo, Dürer... nada! Nenhum molar sequer! Lábios cerrados, bocas fechadas! Eis tudo e o mistério: acaso não possuía dentes toda esta burguesia recém enriquecida? Custaria, não os olhos da cara, mas os dentes da boca, o trabalho de um exímio pintor daquela época? Temos um problema, e para todo problema, hipóteses. Formulei a minha: ainda não haviam inventado a escova de dentes. Sim, a escova de dentes! Talvez algum leitor melhor conhecedor das curiosidades históricas venha me informar que escovas de dentes já existem há pelo menos cinco mil anos, invenção dos egípcios. Não duvidarei, mas sei também que foram os chineses sempre eles que, lá por volta de 1498, inventaram a primeira escova dental de cerdas, feitas de pêlos de animais (leia-se porcos) amarrados à pedaços de ossos ou bambus e que, devido o mofo, enchiam a boca de fungos. Daí até a invenção chegar à Europa, passou-se um bom tempo. E mais, ainda que conhecedores de tão curioso e fedorento instrumento para limpar os dentes, havia uma grande distância entre o conhecer e o usar, principalmente se considerarmos que hábitos de higiene não eram lá muito comuns entre os europeus da época, cujos banhos de uma vida contavam-se nos dedos das mãos. Fico então imaginando uma linda cena de amor acompanhada de um profundo beijo de bocas: lábios, línguas e os restos da refeição do dia anterior. Um romantismo digno de Shakespeare, este também renascentista. Pois é! Escovas de cerdas de nylon, higiênicas e que não feriam as gengivas, só mesmo a partir de 1938. Século XX, portanto. E segundo uma pesquisa realizada junto à população dos Estados Unidos pelo Instituto de Tecnologia de Massachussets em 2004, este invento foi a maior criação humana de todos os tempos. Seria esta a opinião de quem vive rindo dos outros? Hum... mas bem, fato é que se a mesma pergunta fosse feita aos brasileiros, mais de oitenta milhões talvez dariam alguma outra resposta, já que é este o número de pessoas que não possuem escovas dentárias. Pelo menos é o que dizem as estatísticas.

Aula 1:Textos de apoio

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Textos de apoio para a aula 1 do componente curricular de História da Beleza. Curso de Noções Básicas de Cosmetologia. Instituto Federal de Santa Catarina - IFSC, Campus Garopaba. Professor: Viegas Fernandes da Costa. Semestre 2014/1.

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Curso: Noções Básicas em Cosmetologia

Componente Curricular: História da Beleza

Professor: Viegas Fernandes da Costa

Aula: 10/03/2014

TEXTO 1:

O SORRISO DESDENTADO DE MONALISA

Viegas Fernandes da Costa

Alunos nos perguntam coisas surpreendentes. Outro dia, lecionando História

Moderna para uma turma de curso noturno, fui arrebatado por uma questão, no mínimo,

curiosa.

Discutíamos a arte renascentista, os quadros de Rafael e Da Vinci, quando

Gisele, lá do alto da sua dúvida e da frescura da sua adolescência, questionou-me a

respeito dos dentes de Monalisa. Haveria dentes na boca da burguesa de sorriso

enigmático, pintada pelo visionário Leonardo? Eis a pergunta que me foi feita, e calcule,

amigo leitor, amiga leitora, se é possível respondê-la. E além, haveria dentes nos

quadros do Renascimento? Confesso que procurei: Rafael, Botticelli, Van Eyck,

Michelangelo, Dürer... nada! Nenhum molar sequer! Lábios cerrados, bocas fechadas!

Eis tudo e o mistério: acaso não possuía dentes toda esta burguesia recém enriquecida?

Custaria, não os olhos da cara, mas os dentes da boca, o trabalho de um exímio pintor

daquela época? Temos um problema, e para todo problema, hipóteses. Formulei a

minha: ainda não haviam inventado a escova de dentes.

Sim, a escova de dentes! Talvez algum leitor melhor conhecedor das

curiosidades históricas venha me informar que escovas de dentes já existem há pelo

menos cinco mil anos, invenção dos egípcios. Não duvidarei, mas sei também que

foram os chineses – sempre eles – que, lá por volta de 1498, inventaram a primeira

escova dental de cerdas, feitas de pêlos de animais (leia-se porcos) amarrados à pedaços

de ossos ou bambus e que, devido o mofo, enchiam a boca de fungos. Daí até a

invenção chegar à Europa, passou-se um bom tempo. E mais, ainda que conhecedores

de tão curioso e fedorento instrumento para limpar os dentes, havia uma grande

distância entre o conhecer e o usar, principalmente se considerarmos que hábitos de

higiene não eram lá muito comuns entre os europeus da época, cujos banhos de uma

vida contavam-se nos dedos das mãos. Fico então imaginando uma linda cena de amor

acompanhada de um profundo beijo de bocas: lábios, línguas e os restos da refeição do

dia anterior. Um romantismo digno de Shakespeare, este também renascentista. Pois é!

Escovas de cerdas de nylon, higiênicas e que não feriam as gengivas, só mesmo

a partir de 1938. Século XX, portanto. E segundo uma pesquisa realizada junto à

população dos Estados Unidos pelo Instituto de Tecnologia de Massachussets em 2004,

este invento foi a maior criação humana de todos os tempos. Seria esta a opinião de

quem vive rindo dos outros? Hum... mas bem, fato é que se a mesma pergunta fosse

feita aos brasileiros, mais de oitenta milhões talvez dariam alguma outra resposta, já que

é este o número de pessoas que não possuem escovas dentárias. Pelo menos é o que

dizem as estatísticas.

Mas vamos retornar à questão principal, não é mesmo? Se não escovavam os

dentes, supomos serem desdentadas ou podres as bocas destes que hoje vemos sorrir

comedidamente nas imagens renascentistas. Hipótese plausível, o leitor, a leitora, há de

concordar. E penso mais: será também por isso que ao sorrirem, escondiam as damas

das cortes suas bocas sob enormes e decorados leques? Quem sabe?

E assim respondemos a um dos maiores enigmas da história da arte: o sorriso

de Monalisa, que tantas especulações já alimentou. Faltava-lhe os dentes, e pronto!

TEXTO 2.

Fonte: Kury, Lorelai; Hargreaves, Lourdes; Valença, Máslova Teixeira.

Ritos do corpo. Rio de Janeiro: Senac, 2000.

CORPO E CULTURA

TODOS OS SERES HUMANOS SÃO IGUAIS do ponto de vista biológico. As inúmeras

variações - de cor, de estatura, de traços, de textura dos cabelos, etc. - que diferenciam os

povos e os indivíduos não alteram as características básicas da espécie homo sapiens. Os

homens e mulheres são animais como todos os outros que habitam o planeta Terra, porém

são os únicos que possuem cultura. Isto quer dizer que suas ações não são guiadas unicamente

pelos instintos biológicos de sobrevivência e de reprodução. Suas ações seguem a lógica

própria de cada cultura, ou seja, os diferentes grupos humanos criam para si sistemas de

crenças e de valores que dão sentido às suas vidas e orientam suas condutas. Por exemplo,

todas as sociedades humanas definem o que elas acham certo ou errado, bom ou mau, bonito

ou feio. Não existe um único sistema de valores que seja válido para todos os seres

humanos do planeta.

Basta pensarmos em uma cultura muito diferente da nossa para percebermos como os

valores culturais variam. Esses valores incluem não apenas padrões de beleza, mas também

hábitos alimentares, higiênicos, modelos de comportamento e todas as práticas e crenças

que envolvem nossas vidas. Na China, por exemplo, é considerado de bom gosto arrotar

depois das refeições para demonstrar satisfação; cuspir na rua e dentro dos prédios e casas

também é considerado normal. Nesse mesmo país, cérebros de macaco e gafanhotos são comidos

com prazer. Aliás, os chineses apreciam comer tudo aquilo que se move ...

E o corpo? De que forma carne, osso, pele e pêlos – o que temos de mais animal- podem

expressar os diferentes valores culturais?

Desde os tempos mais remotos da história e da pré-história, o ser humano faz de seu corpo

um objeto cultural. Os homens e mulheres nunca estão inteiramente nus, como

ocorre com os animais. Mesmo que os seios e os órgãos genitais não estejam cobertos, há

sempre um adereço, uma pintura ou um penteado que demonstram o cuidado em se diferenciar da

simples natureza. A preocupação com o corpo, ao contrário do que se pode pensar à primeira

vista, não diz respeito apenas à beleza.

Os milhares de recursos que o homem encontra para se vestir ou para se adornar podem assumir

uma infinidade de significações próprias à cada cultura. Assim, alguns

detalhes dos ritos corporais - maquiagem, corte de cabelo, joias e roupas servem para distinguir

homens e mulheres, para além das diferenças criadas pela própria natureza. Outros recursos

ajudam ainda a mostrar o lugar que cada indivíduo ocupa na sociedade: os reis, por exemplo,

são os únicos a usar coroas; os sacerdotes egípcios raspavam totalmente a cabeça. Em alguns

países, as prostitutas são obrigadas a usar cores especiais - como o vermelho - para não serem

confundidas com as outras mulheres. Em alguns casos, os doentes também são diferenciados

dos sãos: na Idade Média, os leprosos só podiam andar com sinos presos ao corpo, de forma a

anunciarem sua presença, mesmo a distância. Até o século passado, as pessoas que haviam

cometido delitos considerados graves eram, algumas vezes, marcadas com ferro em brasa, para

carregarem para sempre a marca de sua culpa. Na Europa no século XVII, as prostitutas que

eram pegas com soldados podiam ter as orelhas ou a ponta do nariz cortada. Em alguns países

do Oriente, até hoje, cortam-se as mãos dos ladrões. Os escravos, no Brasil, tinham o corpo

marcado com ferro em brasa para ostra r quem eram seus donos.

Nosso corpo exprime, dessa forma, diversas significações que permitem que os outros

nos reconheçam e nos identifiquem. Bonito/feio, rebelde/conformado, puro/impuro, sujo/

limpo, rico/pobre, homem/mulher, adulto/criança, livre/escravo são algumas das características

que cada indivíduo mostra com sua aparência.

Na realidade, tudo o que usamos como marca ou enfeite parece um prolongamento de

nós mesmos. Quem nunca ficou insatisfeito diante de um espelho, achando que sua forma

de se apresentar não tem nada a ver com o que realmente é? Os objetos que ajudam a

compor nossa aparência devem, assim, se integrar perfeitamente à imagem que queremos

passar de nós mesmos.

CULTURA, TEMPO E ESPAÇO

A APARÊNCIA DE CADA UM é sempre comparada a modelos que a sociedade vê como

perfeitos. Quando achamos uma mulher bonita, muitas vezes dizemos que ela se parece com

uma artista de televisão ou com uma cantora famosa. Um homem elegante provavelmente se

este de acordo com os padrões divulgados pelas revistas de moda ou pelo cinema. Quando

decidimos cortar os cabelos num salão de beleza, pedimos ao cabeleireiro que faça um corte

igual ao da heroína da novela, ou olhamos as revistas especializadas, que nos mostram as

modas mais recentes. Isso quer dizer que existem padrões que tentamos seguir, mesmo que

nosso físico ou nossos cabelos sejam muito diferentes do modelo que escolhemos.

Evidentemente, isso pode causar descontentamento com relação a nós mesmos.

Os ideais de beleza nem sempre são adequados à realidade de cada país. Por que eu não eu

não tenho 1,70 m de altura, olhos azuis e cabelos louros? - poderia perguntar uma brasileira. Por

que meus cabelos não são cacheados? - lamentaria uma japonesa. Parece que estamos

sempre querendo alcançar metas impossíveis; os profissionais da beleza teriam que ser mágicos

para atender aos pedidos de suas clientes. Felizmente, a grande maioria das pessoas não é

como os modelos que idealizamos; do contrário, todos seríamos muito parecidos. No dia a

dia, acabamos descobrindo maneiras de valorizar nossas diferenças, ou seja, a beleza de cada

um. Assim, com criatividade e personalidade, é possível escapar da ditadura das modas e

continuar sendo elegante e moderno. Conhecer os modelos de beleza do passado e de culturas

diferentes pode ser útil para a afirmação do estilo pessoal. Em primeiro lugar, tomamos

consciência de que os padrões estéticos não são eternos o que hoje é considerado lindo já

foi exemplo de feiúra séculos atrás e poderá ser totalmente cafona daqui a 10 ou 20 anos Em

segundo lugar, esses conhecimentos nos revelam uma infinidade de maneiras de adornar e

modificar as aparências que podem estimular nossa criatividade.

Os padrões de beleza e os cuidados com o corpo variam culturalmente, no tempo e no

espaço. Variar no tempo quer dizer que os modelos estéticos mudam de geração para geração. O

tipo de roupas, cabelos, maquiagem e mesmo de corpo de nossos pais e avós difere bastante dos

padrões de beleza atuais. As moças altíssimas e muito magras, que povoam nossas revistas e

programas de televisão, seriam consideradas muito feias quarenta anos atrás. Se algumas décadas

fazem grande diferença, alguns séculos podem alterar profundamente a relação das pessoas com

seus corpos.

Os padrões de beleza também variam em função do espaço, ou seja, de uma região a outra.

Visualmente, um chinês e um francês são bastante diferentes. O cuidado que eles têm com seus

corpos varia tanto quanto seus hábitos alimentares ou suas concepções religiosas. Sem precisar ir

tão longe, podemos ver numa mesma cidade diferenças culturais relacionadas a bairros. No

Brasil, a maneira de se vestir e de se enfeitar de um carioca é diferente da de um paulista ou de

um cearense. Muitas diferenças culturais se relacionam com o clima: é completamente diferente

morar em Londres ou em Manaus. A temperatura e a umidade de uma dada região, bem como

a intensidade do sol, o regime de ventos e a vegetação influenciam a escolha dos elementos de

vestuário e dos cuidados com o corpo.

O uso de chapéus é um hábito de países de climas bem quentes ou bem frios, pois pode proteger contra os raios do sol e contra baixas temperaturas. Nas regiões mais frias do planeta, é comum que tanto homens como mulheres usem cremes ou óleos para proteger a pele contra o ressecamento.

Os habitantes das regiões tropicais costumam besuntar o corpo com produtos que repelem insetos. Nós, brasileiros, que vivemos em país de clima quente, estamos quase sempre com roupas leves, braços e pernas de fora, além de costumarmos buscar praias, rios, lagos e cachoeiras para nos refrescarmos. Ou seja, vemos e expomos nosso corpo frequentemente. Em países frios, é necessário usar roupas e casacos pesados durante boa parte do ano. A parte mais visível do corpo é, nesse caso, o rosto. Diversos hábitos são influenciados pelas diferenças climáticas. Basta pensar que as brasileiras precisam se depilar com mais frequência, pois nem sempre podem esconder seus pelos com meias e roupas. Outra diferença dos habitantes de países quentes e frios é o bronzeado. Os brasileiros de pele clara sempre acabam "pegando uma corzinha", mesmo sem querer. Os europeus só podem se bronzear no verão, a. não ser que viajem ou recorram ao bronzeamento artificial. Felizmente, para nós a cor morena da pele é considerada bonita e dá um aspecto saudável. Algumas décadas atrás, ao contrário, as mulheres fugiam do solou usavam sombrinhas e chapéus para manterem a pele branca, mesmo morando em regiões quentes à beira-mar.

Mas o clima não explica tudo. Há também as crenças religiosas, a história de cada sociedade, os regimes políticos, os sistemas econômicos, etc, que ajudam a explicar as diferenças culturais entre povos.