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AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ESTERILIZANTE DO PARAFORMALDEÍDO * Kazuko Uchikawa Graziano ** Támara Iwanow Cianciarullo *** Paulo Pinto Gontijo Filho *** ÜRAZIANÜ, K.U.; CIANCIRULLO, T.I.; GONTIJO FILHO, P.P. Avaliação da ati- vidade esterilizante do paraformaldeído. Rev. Esc. Enf. USP, v. 25, n. 1, p. 83-94, abr. 1991. A atividade esporocida das pastilhas de paraformaldeído foi avaliada segundo a técnica da Association of Official Analytical Chemists (1984) exigida no Brasil para registro junto ao Ministerio da Saúde, desta categoria de saneante. O parafor- maldeído apresentou atividade esterilizante na concentração de 3% (3g/cm J ) em um periodo de exposição de 4h à temperatura de 50 °C na presença de umidade relativa. UNITERMOS: Paraformaldeído. Esterilizantes químicos. 1. INTRODUÇÃO A variedade de materiais utilizados no hospital pode ser classifica- da segundo os riscos potenciais de transmissão de infecções para os pa- cientes, em três categorias: críticos, semi-críticos e não críticos (BRA- SIL, 1985b). Segundo EIKHOFF (1981) e GARNER (1986), a esterilização de artigos críticos e, se possível, semi-críticos é prática de comprovada efi- cácia na prevenção e controle de infecções hospitalares. Embora o pro- cesso de esterilização que maior segurança oferece seja o da autoclava- ção com vapor saturado sob pressão, a escolha depende da natureza do material a ser esterilizado. Os artigos termossensíveis são submetidos a esterilização à frio em autoclaves de óxido de etileno (ETO) ou em so- luções de glutaraldeído ou formaldeído em condições adequadas (BRA- SIL, 1985b). * Trabalho elaborado a partir da dissertação de mestrado apresentada a EEUSP em abril de 1989. *' Professora Assistente do Departamento de Enfermagem Médico Cirúrgico da Escola de Enfermagem da Universidade de Sâo Paulo. »** Professora Associada do Departamento de Enfermagem Médico Cirúrgico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. **** Professor Titular do Instituto de Microbiología da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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A V A L I A Ç Ã O D A A T I V I D A D E E S T E R I L I Z A N T E DO P A R A F O R M A L D E Í D O *

Kazuko Uchikawa Graziano **

Támara Iwanow Cianciarullo ***

Paulo Pinto Gontijo Filho ***

Ü R A Z I A N Ü , K . U . ; C I A N C I R U L L O , T . I . ; G O N T I J O FILHO, P.P. Avaliação da ati­vidade esterilizante do paraformaldeído. Rev. Esc. Enf. USP, v. 25, n. 1, p. 83-94, abr. 1991.

A atividade esporocida das pastilhas de paraformaldeído foi avaliada segundo a técnica da Association of Official Analytical Chemists (1984) exigida no Brasil para registro junto ao Ministerio da Saúde, desta categoria de saneante. O parafor­maldeído apresentou atividade esterilizante na concentração de 3% (3g/cmJ) em um periodo de exposição de 4h à temperatura de 50 °C na presença de umidade relativa.

U N I T E R M O S : Paraformaldeído. Esterilizantes químicos.

1. INTRODUÇÃO

A variedade de materiais utilizados no hospital pode ser classifica­da segundo os riscos potenciais de transmissão de infecções para os pa­cientes, em três categorias: críticos, semi-críticos e não críticos (BRA­SIL, 1985b).

Segundo EIKHOFF (1981) e G A R N E R (1986), a esterilização de artigos críticos e, se possível, semi-críticos é prática de comprovada efi­cácia na prevenção e controle de infecções hospitalares. Embora o pro­cesso de esterilização que maior segurança oferece seja o da autoclava-ção com vapor saturado sob pressão, a escolha depende da natureza do material a ser esterilizado. Os artigos termossensíveis são submetidos a esterilização à frio em autoclaves de óxido de etileno (ETO) ou em so­luções de glutaraldeído ou formaldeído em condições adequadas (BRA­SIL, 1985b).

* T r a b a l h o e l a b o r a d o a p a r t i r d a d i s s e r t a ç ã o d e m e s t r a d o a p r e s e n t a d a a E E U S P e m a b r i l

d e 1989.

* ' P r o f e s s o r a A s s i s t e n t e d o D e p a r t a m e n t o d e E n f e r m a g e m M é d i c o C i r ú r g i c o d a E s c o l a d e

E n f e r m a g e m d a U n i v e r s i d a d e d e S â o P a u l o .

» * * P r o f e s s o r a A s s o c i a d a d o D e p a r t a m e n t o d e E n f e r m a g e m M é d i c o C i r ú r g i c o d a E s c o l a d e

E n f e r m a g e m d a U n i v e r s i d a d e d e S ã o P a u l o .

* * * * P r o f e s s o r T i t u l a r d o I n s t i t u t o d e M i c r o b i o l o g í a d a U n i v e r s i d a d e F e d e r a l d o R i o d e

J a n e i r o .

A esterilização de materiais constitui um assunto de preocupação constante da enfermeira de centro de material, no que diz respeito ao processo mais adequado às técnicas de limpeza, à escolha dos invólucros e pacotes, à estocagem, à supervisão e treinamento de pessoal.

Pode-se afirmar com segurança que a maioria dos hospitais brasi­leiros dispõem de autoclaves e estufas para esterilização de materiais termorresistentes. Dificuldades e divergências surgem em relação à es­terilização de materiais termossensíveis.

A nossa vivência no campo hospitalar permite afirmar que o para-formaldeído, trioximetileno (H-CHO) 3 > um polímero sólido do formal-deído, é largamente utilizado nos hospitais e nos serviços para-hospita-lares como recurso importante na esterilização de materiais termossen­síveis. Alguns serviços utilizam-no em larga escala, outros de uma for­ma criteriosa e restrita como último recurso disponível.

Materiais cirúrgicos utilizados emurologia, ginecologia, oftalmolo­gía, cirurgia cardíaca e outros materiais como micropore, cabos de mo­tor, de endoscopios e canetas de eletrocautério são exemplos de materiais esterilizados em paraformaldeído ( L I M A ; BIER; M A C I E L ; LISBOA; FRASSON, 1988).

A diversidade do uso do paraformaldeído na prática, sem uma base teórica que assegure o processo, constitui a razão da realização deste trabalho.

O formaldeído, componente ativo do paraformaldeído, é um gás in-color (metanal ou aldeído fórmico), cáustico para pele e mucosa, que possui um odor característico, em mínimas concentrações. Em concen­trações superiores a 20 m g / l , polimeriza-se à temperatura ambiente, dando origem a um precipitado branco (o paraformaldeído) que conser­va o odor e as propriedades irritantes do gás. Esse polímero libera for­maldeído à temperatura ambiente ou sob aquecimento (BRASIL, 1985b).

O formaldeído tem sido usado há muito tempo para desinfecção e esterilização. As primeiras descrições sobre capacidades microbicidas do formaldeído datam de 1888 por Von Loew, na Alemanha (MECKE, 1984).

O processo apresenta desvantagens que incluem a origem de gás, seu baixo poder de penetração, a sua distribuição não uniforme, a ne­cessidade de calor e umidade para o processo de desinfecção e esterili­zação, a sua toxicidade, com um valor limite limiar de 2 p.p.m., explo­sivo na mistura de gás e ar, maior que 7% e formação de polímeros, conferindo instabilidade à solução estoque (NEWSON; MATTHEUS, 1981).

O mecanismo de ação do formaldeído é semelhante ao glutaraldeí-do. A aldoxila (CHO—) do formaldeído alquila os H lábeis dos radicais amino ( — N H 2 ) , hidroxila ( — O H ) , carboxila (—COOH) e sulfidrila (—SH) das proteínas e ácidos nucleicos microbianos, formando pontes metilênicas ou etilênicas que impedem que estes componentes vitais cumpram suas funções celulares ( JOKLIK; W I L L E T T ; AMOS, 1984; BRASIL, 1985b; R U T A L A , 1987).

As condições de esterilização dos materiais por este agente químico são bastante divergentes entre varios autores.

Um dos trabalhos pioneiros, foi o de S A L Z A N O (1968) que chegou à conclusão de que o parafórmico à temperatura ambiente, mesmo em concentrações elevadas, num período de exposição de 18 horas, não es­teriliza o material. No entanto, quando colocado na estufa a 50°C, por um período de exposição de duas horas e numa concentração de 5%, esteriliza o material cirúrgico previamente limpo e seco. Esse trabalho foi de importancia ímpar, com repercussão nacional, sendo utilizado ainda, nos dias atuais, como suporte teórico para a prática de esterili­zação.

SCHILLING; WIGERT; W E U F F E N ; DOBEBERKAU (1982), es­tudando a ação do paraformaldeído, chegaram às seguintes conclusões: a esterilização de materiais requer 10 tabletes por dm3., com tempo de exposição de 15 a 24 horas, sem submeter os materiais ao aquecimento, além da temperatura ambiente. Os autores alertam que o material es­teja previamente limpo e que os processos se efetuem em recipientes herméticamente fechados, com umidade relativa de 80%.

Neste estudo de SCHILLING; WIGERT; W E U F F E N ; DOBEBER­K A U (1982) a concentração do parafórmico utilizada fica inconclusiva, visto que os autores não explicitam o peso dos tabletes de parafórmico.

Na Extra Pharmacopeia dos Estados Unidos, de Dale (1972) encon­tramos referências sobre a ação do parafórmico como método de este­rilização de superfície de ampolas, quando estas são colocadas em reci­pientes herméticos de 8x4x4 polegadas, com 2 ou 3 tabletes de para­formaldeído, cada um de l g tendo coberto o recipiente com uma camada de gaze levemente úmida, à temperatura de 16°C. Como esta é a tempe­ratura mínima exigida, podemos inferir que, segundo esta fonte biblio­gráfica, a esterilização faz-se à temperatura ambiente não inferior a 16°C. Surpreendente é constatar que, segundo este autor, a concentra­ção exigida do parafórmico para esterilização é mínima, da ordem de 0,1% e 0,15%.

MECKE (1984), alertou que a esterilização pelo uso de formaldeí-do em condições ambientais de pressão e temperatura é bastante duvi­dosa, pois o poder de penetração do vapor nestas condições é precário. O aumento da temperatura e da pressão no recipiente onde o material é colocado, ajuda a penetração do vapor no material.

Baseado nesta questão, autoclaves, semelhantes às utilizadas para óxido de etileno, foram construídas (GIBSON, 1980; KROUTHEN, 1983; ROBERTSHAW, 1983; HANDLOS, 1984). O vapor de formaldeído nes­tes aparelhos é conduzido por meio de conduítes para uma câmara de autoclave e atua sob pressão a uma temperatura de 60° a 80° C e umi­dade relativa controlada.

A esterilização nestas condições, em autoclaves de formaldeído, pa­rece ser uma forma mais segura de esterilização, percebendo-se a evo-

lução do interesse de pesquisadores nessa área, pela incidência de tra­balhos enfocando os detalhes da sua construção e comprovação da sua eficácia através de testes biológicos.

Porém, esse avanço tecnológico não tem sido encontrado em nosso meio. O que acontece em nossos centros de materiais é o uso do para­formaldeído em condições ambientais de pressão.

Analisando a dinâmica e os recursos dos centros de materiais com os quais temos tido contato, notamos que muitos dos materiais termos-sensíveis e os considerados delicados, são esterilizados por meio do pa-raformaldeído embasado no estudo de S A L Z A N O (1968), ou seja, os materiais são aquecidos a 50°C por um tempo de 2 horas, só que numa concentração de paraformaldeído variável, não obedecendo aos 5% pre­conizados pela autora.

A justificativa apresentada é a de que a quantidade é excessiva, a ponto de faltar espaço físico dentro do recipiente para colocar o mate­rial a ser esterilizado, em função das pastilhas. Um outro ponto levan­tado para justificar o uso de concentrações de paraformaldeído meno­res que 5% é que essa alta concentração contribui significativamente para a corrosão dos materiais. Sendo assi, a concentração do parafor­maldeído passou a ser diminuída arbitrariamente, algumas vezes sem suporte que desse garantia, outras, baseadas em falsa segurança de cul­turas bacteriológicas negativas dos materiais assim processados, pois, não se controlava os detalhes das culturas realizadas.

Uma vez que a temperatura de 50° C preconizada por S A L Z A N O (1968), não constitui problema na dinâmica dos centros de materiais e nas autoclaves de formaldeído usadas em alguns países, o ciclo de este­rilização é conduzido a temperatura de aproximadamente 70° C e, con­siderando que o aumento da temperatura intensifica a sublimação do paraformaldeído, mantivemos esta temperatura no nosso trabalho com tempos de exposição variados, iniciando o experimento pela mais baixa concentração do paraformaldeído encontrada na revisão bibliográfica que foi de 0,1% ( D A L E , 1972).

A diversidade dos resultados obtidos por vários autores sobre as condições de esterilização pelo paraformaldeído mostra que há uma falta de concordância dos pesquisadores quanto à padronização de todos os componentes do método escolhido, e que todos esses fatores influenciam na resistência, sobrevivência e recuperação dos microrganismos teste, podendo conduzir a uma variedade de resultados.

A maioria dos países não têm normas oficiais para avaliação de agentes antimicrobianos. Os Estados Unidos foram os pioneiros na pa­dronização de métodos, seguidos pelo Reino Unido, pela Alemanha, Ho­landa e França. Em alguns países foram estabelecidas definições e cri­térios, mas testes não foram propostos. No momento, não existe método padronizado internacionalmente (CRÈMIEUX; FLEURETTE, 1983).

No Brasil, o Ministério da Saúde, no sentido de equacionar o grave problema de infecção hospitalar, adotou uma série de medidas que culmi-

naram com a emissão da Portaria n- 196 de 24 de junho de 1983, obje­tivando oferecer uma orientação aos hospitais no manuseio dos proce-dimetos para controle das infecções hospitalares (BRASIL, 1985a).

Essa Portaria aprovou normas para registro de saneantes domis-sanitários com ação antimicrobiana, incluindo definições, classificação e requisitos específicos.

A Poratria, conceitua os esterilizantes químicos ou germicidas de alto nível, os antimicrobianos de toxicidade não seletiva, capazes de des­truir bactérias, fungos, virus e endosporos bacterianos em um intervalo de tempo operacional que normalmente varia entre 4 e 18 horas, depen­dendo do agente utilizado, da espécie microbiana e do número de espo­ros presentes.

Essa Portaria reconhece a importância dos testes microbiológicos na análise prévia dos esterilizantes para seu registro na Divisão de Sa­neantes Domissanitários (DISAD) do Ministério da Saúde e exige que sua ação antimicrobiana seja documentada contra esporos do Bacüus sübtilis e Clostridium sporogenes, seguindo os testes da "Association of Official and Analytical Chemists" ( A O A C ) (GONTIJO F I L H O ; RO-MÃO, 1986; BRASIL, 1985b), o mesmo adotado pela "Environmental Protection Agency" ( E P A ) dos E U A .

Com a finalidade de atender as normas regulamentares do registro de produtos saneantes antimicrobianos, o propósito desta investigação foi verificar em que condições de uso as pastilhas de paraformaldeído mostram ação esporocida.

2. OBJETIVO

Avaliar a utilização de pastilhas de paraformaldeído como agente esterilizante a 50°C através do monitoramento microbiológico realizado segundo a técnica da ASSOCIATION OF O F F I C I A L A N A L Y T I C A L CHEMISTS (1984).

3. M A T E R I A L E MÉTODO

3.1 Agente Químico Utilizado

Formol pastilha — Miyako do Brasil Ind. Com. Ltda., contendo cerca de 0,45g do princípio ativo/pastilha.

Concentrações testadas por volume do recipiente:

0,lg/cm 3 , 0,5g/cm3, l ,0g/cm 3 , 2,Og/cm3, 3,0g/cm 3,

4,0g/cm3, 5,Og/cm3 (Fase 1 ) .

3,0g/cm3 (Fase 2 ) .

Período de exposição: 2h, 4h, 6h, 12h, 18h, 24h (Fase 1 ) . 4h (Fase 2 ) .

Temperatura: 50°C.

A escolha dessa diversidade de concentração e tempos de exposição na fase 1, baseou-se em referências bibliográficas onde encontram-se va­riações de 0,1% até 5% como concentrações necessárias para esteriliza­ção e tempos de exposição de 2 a 24 horas.

3.2 Microrganismos Teste:

Bacülus subtilis INCQS * n" 02 (ATCC ** n" 19659) Clostridium sporogenes INCQS * n" 04 (ATCC5 ** n? 3584)

3.3 Teste:

Foi realizado segundo a técnica da ASSOCIATION OF OFFICIAL A N A L Y T I C A L CHEMISTS (1984), e utilizado pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde. (ROMÃO, M I Y A Z A K I , S ILVEIRA, 1987).

O estudo foi realizado em duas etapas: na primeira empregou-se apenas 10 carreadores de alça (feitos de fio de sutura de seda) para cada microorganismo teste, nas diferentes condições investigadas, (Fase 1) visando definir aquela a ser usada na fase 2, com 120 carreadores de porcelana (adquiridos da Fisher Scientific Co. ny 7907), contaminados com cada um dos microorganismos teste.

Em todos os experimentos os esporos dessecados sobre os carrea­dores foram reidratados com água destilada estéril antes de submetê-los a ação do paraformaldeído.

O sulfito de sódio na concentração de 0,1% em caldo tioglicolato foi empregado como neutralizante da ação residual do paraformaldeído.

A viabilidade dos esporos carreados foram garantidas por meio de testes de controle com ácido clorídrico 2,5 N .

Na avaliação da eficácia do paraformaldeído considerou-se como dotada de atividade esterilizante aquela que não ocorreu crescimento algum dos microorganismos testados nos 480 (240 subculturas + 240 ressubculturas) tubos de tioglicolato.

4. RESULTADOS

Os resultados da atividade esporicida são apresentados nas tabelas I (rastreamento) e I I (teste completo).

* I N C Q S — I n s t i t u t o N a c i o n a l d e C o n t r o l e d e Q u a l i d a d e e m S a ú d e .

** A T C C . — . A m e r i c a n T y p e C u l t u r e C o l l e c t i o n s .

Analisando os dados da tabela I , podemos afirmar que o parafor-maldeído apresentou indícios de ação esterilizante nas seguintes condi­ções de períodos de exposição e concentração requeridas:

Período de exposição de 2h — concentração requerida > 5%

Período de exposição de 4h — concentração requerida 1%

Período de exposição de 6h — concentração requerida 0,12%

Período de exposição de 12h — concentração requerida 0,5%

Período de exposição de 18h — concentração requerida 0,5%

Período de exposição de 24h — concentração requerida 0,12%

Considerando esses dados, há várias opções de escolha das condições possíveis de esterilização, conforme o elemento que se quer priorizar: se o período de exposição ou a concentração do paraformaldeído.

Conforme foi mencionado na introdução desse trabalho em relação às dificuldades detectadas na prática da esterilização com o paraformal­deído, foi interessante que se estudasse a possibilidade de garantir a es­terilização com o menor número possível de pastilhas.

O período de exposição escolhido deveria ser o mínimo possível, para possibilitar uma maior rotatividade do material processado pelo para­formaldeído e minimizar os danos que a exposição de 50°C pudesse cau­sar no material termossensível.

Frente a esses fatores, optou-se para os experimentos da Fase 2, o período de exposição de 4 horas.

Quanto à concentração, optou-se por 3%, apesar do rastreamento ter fornecido a informação de que, a partir de 1% de concentração de paraformaldeído há indícios de ação esterilizante no período de exposi­ção de 4h.

A escolha da concentração acima da mínima provável foi para ten­tar garantir resultados satisfatórios num investimento final, indicándo­se realização de estudos em concentrações menores que 3% e iguais ou maiores que 1%.

Os resultados da fase 2 estão projetados na tabela I I , onde se encon­tram os resultados finais das subculturas e ressubculturas do B. sübtüis e C. gporogenes, podendo afirmar que, segundo o método utilizado, o paraformaldeído apresentou resultados esterilizantes satisfatórios na concentração testada de 3% por um período de exposição de 4h a 50°C na presença de umidade relativa.

Os tubos referidos como contaminados, bem como aqueles que mos­traram crescimento de bacilos e clostrídeos, foram examinados quanto às seguintes características: morfología celular (coloração de Gram) e presença de esporos (coloração de Wi r t z ) .

A T I V I D A D E E S P O R O C T D A D O P A R A F O R M A L D E Í D O A 50*C, S O B R E B. S U B T I L I S E C. S P O R O G E N E S A V A L I A D A P E L A T É C N I C A D A A O A C .

R I O D E J A N E I R O , 1987.

Concentração Período de de Atividade *

Paraformaldeído Exposição B. ftubtUJa C. sporogenes

2 1/16 10/20 4 0/20 10/20

0,12% 6 0/20 0/20 12 0/20 8/20 18 0/20 2/20 24 0/20 0/20

2 0/16 0/20 4 1/20 0/20

0,5% 6 0/20 0/20 12 0/20 0/20 18 0/20 0/20 24 0/20 0/20

2 0/18 0/20 4 0/20 0/20

1,0% 6 0/20 0/20 12 0/20 0/20 18 0/20 0/20 24 0/20 0/20

2 0/18 0/20 4 0/20 0/20

2,0% 6 0/20 0/20 12 0/20 0/20 18 0/20 0/20 24 0/20 0/20

2 0/20 0/20 4 0/20 0/20

3,0% 6 0/20 0/20 12 0/20 0/20 18 0/20 0/20 24 0/20 0/20

2 0/20 0/20 4 0/20 0/20

4,0% 6 0/20 0/20 12 0/20 0/20 18 0/20 0/20 24 0/20 0/20

2 1/18 0/20 4 0/20 0/20

5,0% 6 0/20 0/20 12 0/20 0/20 18 0/20 0/20 24 0/20 0/20

* Número de tubos com crescimento/número de tubos testados

Atividade Carreadores O. sporogenea B. subtilis

S * R ** S * R * *

Sem crescimento 118 119 117 118

Com crescimento — — — — Contaminados 2 1 3 2

T o t a l 120 120 120 120

* S = Subcultura

** R = Ressubcultura

5. DISCUSSÃO

Muitas são as variáveis que interferem na esterilização a frio, com destaque para: temperatura, concentração do princípio ativo, umidade, tempo de exposição, pH, e presença de matéria orgânica (KOSTEN-BAUER, 1977; CRÈMIEUX; FLEURETTE, 1983).

A atividade de um germicida usualmente aumenta com a elevação da temperatura, sendo a de 20°C a selecionada para a realização dos testes da A O A C . Nesta investigação, utilizou-se a temperatura de 50°C, obtida numa estufa regulada.

Com poucas exceções, nas quais o formaldeído não está incluído, o aumento na concentração do agente químico intensifica sua eficácia e diminui o tempo necessário para a destruição microbiana. ( JOKLIK, W I L L E T T , AMOS, 1984). As concentrações escolhidas neste estudo (0,1%— 5,0%) basearam-se na literatura consultada.

O período de exposição para esterilização por agentes químicos de­pende do material e do grau de contaminação, variando normalmente entre 4 e 18h. (BRASIL, 1985b). Entre os dois agentes alquilantes (for­maldeído e glutaraldeído) o primeiro é o de ação bactericida mais lenta.

Além da análise microbiológica, a avaliação toxicológica é de maior importância, pois a toxicidade também afeta a escolha do produto (ROESSLER, 1977). O formaldeído, além de queratinizar e sensibilizar a pele por contato, pode provocar irritação das mucosas respiratória e ocular, asma, bronquite, pneumonite e câncer de vias respiratórias. O teor máximo permitido no ar é de 2 ppm. A precaução recomendada para

A T I V I D A D E E S P O R O C I D A D E P A R A F O R M A L D E Í D O A 3% S O B R E B. S U B T I X I S E O. S P O R O G E N E S , A T E M P E R A T U R A D E 50«C, A P Ô S 4H D E

E X P O S I Ç Ã O P E L A T É C N I C A D A A O A C . R I O D E J A N E I R O , 1988.

remoção do resíduo do agente químico no material por ele processado é enxaguar assepticamente em água esterilizada, antes do uso (COL­LINS , A L L W O O D , BLOOMFIELD, FOX, 1981; R U T A L A , 1987).

Em vários países, órgãos federais são responsáveis pelo controle e registro de germicidas e determinam os métodos microbiológicos para a avaliação desses produtos.

Nos Estados Unidos, esses produtos são controlados e regulamenta­dos pela "United States Environmental Protection Agency" ( E P A ) que adota as técnicas da AOAC, no Reino Unido a British Standards Ins­titution" ( B S I ) , na Alemanha pelo "German Society for Hygiene and Microbiology" ( D G H M ) , na Holanda pelo "Dutch Committee on Phyto-pharmacy" (DCP) e na França pela "Association Française de Norma­lisation" ( A F N O R ) (CRÈMIEUX; FLEURETTE, 1983).

N o Brasil, a regulmaentação dos germicidas está a cargo do Mi­nistério da Saúde, através da Divisão de Saneantes Domissanitários ( D I S A D ) , que cuida dos sanificantes e desinfetantes, e da Divisão de Medicamentos ( D I M E D ) , responsável pela normalização dos antissép-ticos.

É função do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde ( INCQS) , da Fundação Oswaldo Cruz, a realização de análises toxico-lógicas, químicas e para comprovação da ação microbiana para que o produto tenha condições de ser registrado junto à DISSAD. Através do manual técnico do INCQS ROMÃO, M I Y A Z A K I , S I L V E I R A (1987), verifica-se que foram adotadas, em linhas gerais, as técnicas da (ASSO­C I A T I O N OF OFFICIAL A N A L Y T I C A L CHEMISTS, 1984).

A o propor um estudo de avaliação da atividade esterilizante de um agente químico, o paraformaldeído, não poderia ter sido feito de outra forma, que por meio de uma metodologia oficial adotada pelo Ministério da Saúde.

A esterilização de artigos de alto e médio risco faz parte das ações racionais para prevenção de infecções hospitalares. No que diz respeito a artigos termossensíveis, o uso do paraformaldeído é um recurso im­portante dentro da heterogeneidade de recursos da realidade brasileira. Sendo assim, o presente trabalho corresponde a mais uma contribuição para uma base teórica que melhor fundamente a sua utilização.

Ü R A Z 1 A N Ü , K .U . ; C I A N C I A R U L L O , T . I . ; G O N T I J O FILHO, P .P. Evaluation of sterilizing activity of paraformaldehyde tablets. Rev. Esc. Enf. USP, v. 25, n. 1, p. 83-94, apr. 1991.

Sporocidal activity of paraformaldehyde tahlests was assessed by means of the Association of Official Analytical Chemists technic which is required in Brazil to register this class of sanitizing substances by the Health Ministery. According to this methodology paraformaldehyde showed sterilizing activity at the 3% (3,0 g/cms) concentration in 3 hour exposure period at 50 °C in the presence of relative humidity.

U N I T E R M S : Paraformaldehyde. Chemical sterilizing.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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R e c e b i d o e m 13/03/90