CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

Embed Size (px)

Citation preview

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A s o c io lo g ia n o B r a s i l *A n to n io C a n d id o

    I n t r o d u c a o

    No B ra sil, p od em os d istin gu ir n itid am en te , n a e vo lu ca o d a S oc lo lo gla , d oisperiodos bern configurados (1880-1930 e depois de 1940), com um a im -portante fase interm edla de transicao (1930-1940). N o prim eiro , e prati-cada por intelectuais nao especializados, interessados principalm ente emform ular principios teoricos ou in terpretar de m odo global a sociedade bra-s ile ira . AMm d iss o, n ao s e r eg is tr a 0 seu ensino, nem a exlstencla da p esqu i-sa emp iric a so bre a sp ec to s d elim ita do s d a re alid ad e p re se nte .D epois de 1930 ela penetra no ensino secundarlo e superior, com eca a

    ser invocada com o instrum ento de analise social, dando lugar ao apareci-m ento de urn m im ero apreciavel de cultores especializados, devendo-senotar que os prim eiros b rasileiros de form acao unlversltaria soclologlcaadquirida no proprio pais form aram -se em 1936. 0 decenio de 1930,rico e decisivo, pode ser considerado fase transitoria para 0 a tu a l p er io doque, in iciado m ais ou m enos em 1940, corresponde a consolldacao e ge-neralizacao da socio logia com o disciplina universltaria e ativid ad e social-mente reconhecida, assinalada por uma producao regular no cam po dateoria, da pesquisa e da aplicacao,

    'R e di gi do em 1956, e st et ex to f oi p ub lic ad o em1959 na Encic lopediaDelts -Lsrouse (R io d eJaneiro , D elta S A, pp .2216-2232; 2a ed .1964, tomo IV , pp.2107-2123). Tendoaceito 0 e nc ar go d e c o-ordenar 0s etor de C ien -c l a s Soc ia is,Fernando deAz ev ed o me c onvi do upa ra e labora- lo , a o mes-mo temp o q ue c on vi da -va F lores ta n Fe rnande spara 0basico, "Socio lo-g i a " . Meio secu lodepois ,o s eu interes se e apenaso d e u r n " do cume nto d ee p o c a " . Por isso concor-de i que fosse reproduz i-d o, com to do 0 inevita-v el d es ga st e d o t empo.N iio m e preocupei em

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    corrig ir er ros eventuais,mas ha urn, talvez 0maio r, q ue m e in com o-d a: a a v a l i a c a o deficien-te da obra de M anoelBonfim , cu ja lmpor tan -c ia e ve rdade iro s ign if i-c ad o s 6 m ais ta rd e c om -preendi . (Ve r, po r exem-plo, 0ar tlgo "Radica l is -mos", texto de um a pa-le stra d e 1 98 8 p ub lic a-da em 1990 na revistaE r t u d o s A v a n r a d o s , v . 4,n. 8 , e re co lh id o n o m eulivro V ; i r i o s e . s c r i t o s , cuja4a e dl ca o, p el a Ed it or aOuro sobre A z u l , R io d eJaneiro, e de 2004 .)Este artlgo foi publ ica-do originalmente em1959 na Enc ic loped t eD e l t a - L a r o U J J e (R io d eJaneiro, D elta S A, pp .2216-32) (N. E.).

    F o r m a c a o

    1 - D uas palavras devem ser invocadas para se entender a form acao daSoclologla brasileira: D ireito e E volucionism o. E la apareceu e encorpou,com efeito, a partir da preocupacao de alguns juristas possuidos pelas dou-tr in as d o E vo lu cio nism o c ie ntific o e filo s6 fic o.

    C oube aos juristas pa pel so cial d om in ante no B ra sil oito centista, dada s astarefas fundam entais de definir urn E stado m odem o e interpretar as relacoesentre a vida economica e a estrutura politica. Foi a fase de elaboracao dasn ossas leis, aquisicao d as te cnlca s parla men tares, de flnlc ao da s con dutas ad -m inistrativas. 0 jurista foi 0 interprete por ex celencla da sociedade, que 0req ueria a c ada pa sso e so bre a qua l estende u 0seu prestigio e m aneira de veras coisas. M as com o as teorias dom inantes na segunda m etade do seculo seachavam m arcadas pelo surto cientifico de entao, notadam ente a B lologla,que saiu dos laborat6rios para se divulgar de m aneira triunfante, os juristasm ergulharam na fraseologia cientifica e se aproxim aram , neste terreno, dosseus pares m enos aquinhoados, m edicos e engenheiros, que com eles form a-y am a triade dom inan te da In tellg encla b rasileira. V em os enta o, na S ociolo -g ia , o s ju rista s in au gu ra rem uma o rle nta ca o c ie n t iD c i s ta - com o se dizia - quecontou desde logo com a cooperacao de engenheiros e sobretudo m edicos.A so ciolo gia b rasile ira fo rm ou-se, portanto , sob a eglde do evo lucio nis-

    m o e recebeu dele as preocupacoes e orlentacoes fundam entais, que aindahoje m arcam varies dos seus aspectos. D ele recebeu a obsessao com os fato-re s n atu ra is, n ota dame nte 0 blologlco (raca): a preocupacao com etapashist6ricas; 0 gosto pelos estudos dem asiado gerais e as grandes sinteses ex-plicativas. D ai a predornlnancla do criterio evolutivo e a preferencla pelahist6ria social, ou a reconstrucao hist6rica, que ainda hoje m arcam os nos-sos soclologos e os tom am continuadores loglcos da linha de lnterpretacaoglobal do Brasil, herdada dos "juristas fil6sofos" (para falar com o C l6visB evilaqua) do seculo passado [X IX ]. E p re ciso s alie nta r q ue 0 evolucionis-m o nao constituiu lm portacao artificial de modas europelas, m as se ade-q uo u a v arla s d as n ossa s re alid ad es lo ca is , d e p ov o q ue p ro cu ra va ju stame n-te construir de si m esm o um a representacao coerente no plano ideol6gico,preocupado com 0 peso do passado escravocrata, as possibilidades do de-s en vo lv imento f utu ro , 0 significado positivo ou negativo que teriam nesteprocesso as racas dis pares e a decorrente m estlcagem . G racas a ele, ou m e-lh or, g ra ca s a sua superacao, a partir de Euclides da C unha, foi possivelelaborar um a f6rm ula bern brasileira de estudos sociais, em que a recons-

    272 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    trucao d o p assa do se amo ld av a a certo s p on to s d e v ista d o p resen te; em q ueo estudo se m isturava a intulcao pessoal e 0 cientista ao retorlco, ou aoescrito r, d an do lu gar as o bra s ca pita is d e A lb erto T orres, O liv eira V ia na ,G ilb erto F re yre , S erg io Bua rq ue d e Ho la nd a e C a io P ra do J un io r, a ca demi-c amente inde fin idos e ntr e Soc io logia e H l sto ria .2 - T alv ez a p rim eira manife sta ca o do que s eria c on sid era do Socio lo gia

    n o B ra sil d uran te q uase m eio secu lo se en co ntre n a In t roduc io a hist6ria d sl it e ra tu ra bras il e ir a ( 1881 ), onde S ilv io Romero e stabe le ce a s d ir etr iz es queo rien ta ram p or m uito tem po o s estu do s so cia is n o B rasil, a o in terp reta r 0se ntid o d a evolucao c ultu ra l e in stitu cio na l se gundo o s fa to re s n atu ra is d om eio e da raca, Mas 0 p rime ir o e sc rito te or ic o de c er to vulto s ob re a ma te ria(d eix an do d e la do a s rep etlc oes a utomatlc as d os p ositiv ista s) fo i p oss iv el-m en te d ev id o a T ob ia s B arreto e o bed eceu - v ale m en cio na r - a u rn criterion eg ativ ista . S ao a s "G lo sa s h etero do xa s a u rn dos mo te s d o d ia , o u v arla co esa ntl-so clo lo glc as " (1 884 a p rim eira p arte ; 1 88 7 a se gund a), o nd e c on te sta ,com a v iv acid ad e co stumeira , a v alid ad e e a uto nomia d a n ossa d iscip lin a.Levando 0 naturali smo cienti fi co a s c onse quencla s f in ais , a rgumenta que a sleis so cia is n ao sa o n atu rais, p ois sa o n orm ativ as; lo go , n ao esta o reg id asp elo p rin cip io d o d ete rm in ismo , sem 0qu al nao ha ciencta, Os f ato s s oc ia isper te nc em a uma e sf er a "mec an ic amente lnexpllcavel",A sua argum entacao e brilhante m as p ouco convincente, a despeito de

    r ac io cin ar c om loglc a den tr o da concepc ao ado tada . Tobia s r eje ita c om bo rns en so a a ss lm lla cao da soc ie dade ao o rgan ismo, 0 que fo i a ce ito p elo s e stu -d io so s que 0 seg uiram e d ele receb eram ln flu en cia , m as q ue, a ex ceca o d ep ou co s (en tre o s q uais A rtu r O rla nd o), v iam n ela u rn o rg an ism o p ecu liarsu bm etid o as leis g era is d a ev olu ca o, ap ro xim an do -se assim d e S pen cer eg aran tin do a su a a uto nomia. T alv ez d ev id o a T ob ias, n em to do s 0 fizeramex plic itam en te , c omo , p or e xemp lo , F au sto C a rd oso , m agn etiz ad o p elo fa -m oso principio biogenetico fun dam ental de H aeck el, cuja apllcacao aosf ato s s oc ia is Tobia s r epelir a e e le p rocu ra ju stif ic ar de mane ir a nao r ar o f eliz ,f irmando -s e no monismo mecanic is ta c on tr a 0monismo te le ologic o, e des -te modo , d izia , p ermanec endo ma is fiel a o fllo so fo a lemao,Procurando aplicar ao direito as teorias dele, foi sem duvida urn dos

    p rime ir os s is tematiz ador es da soc io logia b lo log lc a no Bra sil, em A c ien ciada h i st 6 ri a (1 89 5) e so bretu do em E s tu d os de ta x in om ia s oc ia l( 18 9 8) , ante-ce did os p ela b as e te oric a g era l d e A c on ce p ra om o n istic a d o u niv er so ( 18 94 ),ond e c omb a te a " ilu sa o te leo lo gic a" d e Tobia s e d efin e 0 seu mecanic ismoestrito. Sao livros brilhantes e nem sem pre coerentes, cruzados aqui e ali

    A nto nio C an dido

    junho 2006 273

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    por lances de grande intui~ ao sociologtca, como quando, em A c on ce pra o enos Estudos, estabelece um a especie d e teo ria da m ud an ca social p ela dlaleticad a m aioria co nservado ra, qu e se apega a o rd em , d a m in oria tran sfo rm ad ora ,q ue forja as u top ias, e da m ino ria refratarla do s reacion arios,P ara e le, 0 erro de Spencer consistia em tom ar 0 hom em com o unidade

    social, qu an do esta d ev eria ser b uscada n o grup o, segun do deixara im plicitoComte ao estudar a familia. No mundo fisico, no btologico e no social, asu nidades sao sem pre agregad os com plex os, ao s quais se deve referir a aplica-~ ao das leis; 0 argumento de que 0 principio de H aeckel vern abaixo seaferirmos 0 desenvolvim ento individual ao da H ist6ria insubsiste, se aten-tarmos que ele se aplica, em ciencta social, a cada povo em confronto comoutro ou com a humanidade total.

    Nos E n sa io s d e filo so fia d o d ire ito (1895), Silvio R om ero consagra doisl ongos c ap it ul os a refutacao do pessim ism o de T obias e a s leis d e C ard oso ,argum entando a favor da necessidade e autonom ia da Sociologia, contra 0prim eiro; e lem brando, quanto ao segundo, que a extensao por ele operada,no seu extremo mecanicismo, de leis naturais ao dominio do social teriacom o consequencla loglca a lncorporacao das clenclas sociais a B io lo gia . Asua atitude pessoal era m ais com preensiva gracas a acettacao quas e in tegr aldo sistem a de Spencer, que perm itia vlsio m ais fecunda dos fen6m enos so-ciais. D estes, procura no m esm o livro estabelecer um a classiflcacao - inspi-rada, em bora nao 0m encione, na que fizera 0 seu mestre - do que chamava"produtos superorgantcos", T ratava-se, no seu intuito, de estabelecer quaisas "criacoes fundam entais e irredutiveis da hum anidade", os fatos culturais aque se reduzem todos os que vemos manifestarem-se na realidade, e quepara ele eram cinco: rellglao, econom ia, politica, estetica e ciencia. A suacontribuicao te6rica nao vai alem : nao e nela que devemos buscar a suaimportancla na form acao d a n ossa So ciolog ia, m as na atividade d e p esquisa-dor das tradicoes orais, que foi 0 prim eiro a co lh er e sistem atizar ( A po e si ap op ula r n o B ra sil, 1880; Can to s p o pu la re s d o B ra sil , 1883; Con tos popu ls re sd o B r a si l, 1885), alern da propaganda constante, em breves escritos e refe-rencias, im pondo com 0 seu prestigio ajo vem clencla: fin alm en te, pela ado -~ao, na ultim a fase da carreira, dos m etodos da escola de L e P lay, que divul-g ou e q ue in flu iram , com bin ad os a s te oria s a ntro po ss oc io l6 gic as d e L apougee Ammon, em estudiosos m ais jovens, com o O liveira V iana.No mesmo sentido que ele - isto e , do que se poderia chamar urn

    biologism o m itigado - escreveram C l6vis B evilaqua (critico inteligente dopessim ismo de Tobias e do darw inismo extremado de Gumplow icz) e urn

    274 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    d iscip ulo ama do , A ug usto F ra nco , d iv ulg ad or e c om en ta do r d a co rre nte aque s e f iliavam todos .3 - M ais q ue q ua lqu er o utro , S ilvio R om ero se lig a em esp irito aos q ue,simultaneamente a s ua a tiv id ad e, p as sa ram da divagacao ou d a te oriz ac aoma is o u me no s re to ric a a os e stu do s monogr aflc os e a in te rpre tacao s is tema-t ic a da rea li dade. E u rn seg un do a sp ecto d en tro d o p erio do q ue estu damo s,e no qual devem os considerar os autores dos prim eiros trabalhos que sep re nd em d ire tamen te a o e sp irito s oc to lo gic o p ela a titu de em fa ce d a re ali-dad e, a con sciencia d os p ro blem as o u a m arch a d a in vestlg acao d e cu nh omon og ra flco : L iv io d e C astro , P au lo E gid io e E uclid es d a C un ha .L iv io d e C a str o, mo rto a os 2 7 ano s c om uma ponde ra ve l b ag ag em Ine dita ,p ub lic ad a d epois em par te s ob a d lr ec ao d e S ilv io Romero , s eu me stre , ta lv ez

    nunc a te nha e sc rito a pa lavr a " soclo log ia ". E r a medic o in te re ss ado em an tr o-po log ta f is ic a e f ls io log la ne rvosa , mas com pendor i rr es is ti ve l para os prob le -m a s so cia is . A su a obra p rin cip al, A m ulher e a so cio gen ia , e sc rita em 1887,q uando tin ha 2 3 ano s, e e dita da n o d ec en lo s eg uin te , te rn p or o bje to d efin iro p ap el d a m ulh er n a so cied ad e m od ern a, esco po so clo lo glco q ue p ro cu rafu nd am entar com um a p rim eira parte blo log lca e uma u ltim a p arte q ue sediria edu cacio nal. 0 liv ro tern d e com um com o s do tem po 0 dogmatismonatura li st a mal d ls fa rcado em obje ti vi dade c ien ti fi ca , a i nf lex ib il idade e faci -lid ade da s c onclu soes , 0[a rg ao te cn lc o. Ma s s ep ara -se d ele s p elo rig or d e-mons tra ti vo , a seguranca do ro te iro , 0senso prat ico e uma e loquenc ia con ti dapela s ob rie dade e 0 sen so d e m ed id a. A pesa r d o q ue h a d e o bso leto n os se uspo ntos de ap oio e no sup erado cient i f ic ismo do tom , e urn raro exem plar dem en ta lid ad e cie ntific a n o B ra sil d e en ta o, m orm en te se a ten ta rm os p ara 0camp o d os e stu do s so cia is, em q ue o s m elh ores, como u rn S ilv io R omero ,pouco m ais faziam que jogar urn disfarce pseudo-sistem atico sobre agrat uidade dos pa lp it es , a lc ados a ve rdades ob je ti vamente de te rminadas.L iv io d e C astro p arte d o estu do a ntro po lo glco d a m u lh er e, p or m eio d e

    e xtr apo lacoes ba se ada s na c raniome tr ia de Broc a, a ce ita s s em d is cr epanclan o tempo , c on clu i p ela s ua in fe rio rid ad e in te le ctu al, q ue s e a ce ntu a re la ti-v amen te no cor re r da e vo lucao f llogenetic a. I sto , s egundo e le ( e aqu i p rin ci-p ia cer to d iscemimento sodologlco), p orq ue a s s ocied ad es h um an as d ao a ohomem o po rtu nid ade de se em pen har n a lu ta p ela v ida , q ue p ro po rcio na ae vo lu ca o por me io d a s ele ca o: n o d ec or re r d ela , v erif ic a-s e u rn a pe rf eic oa -m en to p ro gressiv o d e q ue a m ulh er e p riv ad a p ela su a co nd ica o, h oje d iria -mos al ienada, d e "an im al domestico d o h ornem ". S ao po rtan to fa tores deo rdem cultu ra l que in te rf er em na evo lucao b io log ic a , g er ando a in fe rio rid a -

    A nto nio C an dido

    junho 2006 275

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    de intelectual do sexo oprim ido. M as na sociedade m oderna nao e maispossivel conflna-la a especla lizacao domest ica : e preciso , pelo contrario , lnlcia-la na m esm a ordem de atividades m entais consideradas privativas do ho-memo A edu cac ao a de qu ad a mostra ra a su a ca pac id ad e d e d ese nv olv imen toe e la a tln gira , c om 0 p assa r d o tempo, c ap ac id ad e c ra nia na c ompa tiv el c omo m aior nivel de que a especle e capaz.S en te -se q ue p ara 0 autor a parte fundam ental do livro era a laboriosa

    a rg umen ta cao a ntro po lo gic a, ilu stra da p elo meto do e tn og ra flco a o sa bo r d eL etourneau - isto e, justam ente a que nad a vale para 0 le ito r mod ern o. Ma sperm anece a idela geral da mulher como sex o alien ado na hist6ria, e, conse-q iie ntemen te , a s con clu so es d e o rd em soc io logtc a e educa ciona l. P e la s eri e-dade, loglca, apelo aos m im ero s, esforco de provar com dado s b rasileiros,orientacao progressista q ue rompe sob a tentativ a alg o Ingenua e nao rarop ed an te d e obj eti vid ad e, A m ulher e a so c io gen ia constitui urn dos m aisimpo rta nte s marc os n a fo rmaca o d a n ossa S ocio lo gia .A urn organicism o atenuado pela lnfluencla de T arde, filiou-se P aulo

    Egid io , c uja p re ocu pa ca o c en tra l fo i d ese nv olv er em S ao P au lo , d esd e o s f in sdo decenlo de 1 880 ate 0primei ro des te s eculo [XX] ,ve rdadei ra p ropagandas oc lo loglc a p ela imp rens a, o s curs os e 0 liv ro . A su a o bra mais impo rta nte sa oos Er tudosde soc io log ia c r im ina l (1900 ), critica a s Begrasdometodosoc io l t ig ico ,d e Durk he im (1 89 6), so bre tu do a o ca pitu lo I II , re la tiv o a "dl st lncao do nor -m al e do patologlco", que feriu cruam ente a consclencia juridica de P auloEgid io , c uj os d itame s e le p ro cu ra e nta o c on cilia r c om a s e x lg en cla s in te le c-tu ais. C omo e sc re vi n ou tra o po rtu nid ad e, " tu do se p re nd e a conhecida a fi r-m acae do soclologo frances de que os fatos verificados com intensidade er egula ri dade sao norma is a uma dada s oc iedade , e p ato l6gicos o s que abe rr amda norma". T ra ta -se d e s ub stit uir 0j uiz o d e v alo r p el a v er ifl ca cao empir ic a,superando 0 sub jetivism o. E , assim , afirm a q ue 0 crime e normal, dada ar egula ri dade com que oco rr e, p ois 0pato logi co import a s emp re em excec ao ,que contraria 0ri tmo o rd in ar io dos fa to s. P au lo Eg id io re ag iu v iv amente , ma sprocurou dar a sua reacao 0mesm o rigor dem onstrado nos argum entos deDurk heim . P odemos interpretar esta atitud e como fru to de urn conflito en-tre a c on scle nc ia ju rid ic a - v ez ad a a d isc ern ir 0 bern e 0m al em termos deimpe rativ o e tic o - e a su a c on vlc ca o d ete rm in ista - p ro nta a a ceita r a re la tiv i-d ad e d as ln stit ulc oe s e 0 carater soc ia l dos valores .P ro cu rou so lv er 0 lmpssse apl icando os p r6pr io s c ri te rios metodo log lcos

    d e Durk he im e , t oman do 0c rime pela sua man if es tacao ex te rior apenas, a rgu-men to u q ue a e xlste nc la d esta e xp rime a re pu lsa d e to da so cie da de em fa ce d o

    276 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    delito; 0 horror ao crim e seria cientificam ente com provado pela evolucao,in clu siv e d os sistem as rep ressiv os, e 0pensador paulista chega a postular a suadlm inulcao progressiva, num otim ismo condizente com a sua formacaospenceriana e, no caso, fracam ente baseado em precarias estatisticas locais.N otam os, todavia, a adm lracao despertada nele pela obra de Durkheim , queo lev ou a tentativa de conciliar ao maximo sua consclencla juridica com acoerencla de urn m etodo que vinha trazer a Soc io lo gia a p os sib ilid ad e d e s up e-rar as generalidades do evolucionism o, criando balizas pa ra a determ lnacaoem pirica dos tipos sociais. T alvez P aulo E gidio nao tenha com preendido istologicam ente, m as com certeza 0 s e n t i u ; tanto assim que consagra a m etade dolivro a ex posicao proba e inteligente das regras durk heim ianas, procurando,adem ais, na segunda parte, conciliar a sua apllcacao com a rejei~ ao do crlteriod is tin tiv o e ntre n orma l e p ato lo gic o. E sem duvida prova de capacidade havercom preendido no fim do seculo X IX , ainda que por oposicao, a im portanciada obra de Durkheim , e have-la divulgado, mais de vinte anos antes da suaincorporacao a nos sa r ot in a sociologtca.o engenheiro Euclides da Cunha (que nos conduz agora a uma esferam uito m ais elevada de talento) escreveu sobre um a situacao social diretam en-te observada. E nviado para noticiar a cam panha contra os fanatlcos de C anu-dos, 0soclologo brota nele de im previsto, pelo encontro fortuito do geografocom 0 reporter e 0patriota republicano. A ngustiado pelo dram a que viu e aluz do qual m editou os problem as sociais que 0c on dic io na ram , d es cr ev eu -ocom urn espirito parecido ao de L ivio de C astro - buscando expllcacao rigoro-sa no determ inism o naturalista, representado pelas forcas do m eio fisico e daconstitutcao racial, que tracou com urn toque de fatalidade.A s suas notorias lnfluenclas sao 0 darw lntsm o social de G um plow icz,

    sublinhando 0 conflito dos grupos na disputa da supremacia, e a teoria deBuck le, h ipe rt ro fi ando 0papel dos fatores geograflcos na form acao e desen-volvimento dos grupos humanos, ja amplamente divulgada e aplicada noB ra sil n a H i st6 ri a d a ii te ra tu ra b ra si ie ir a, de Silvio R om ero. H a, portanto,como que 0 reconhecimento de uma divida no fato de Euclides da Cunha 0haver escolhido para sauda-lo na A cadem ia B rasileira - 0que S ilvio fez numdiscurso onde boa parte e consagra da aos problem as sociais do B ra sil, enca-ra do s s eg un do 0 ponto de vista da escola de Le Play, que entao divulgavacom a rd or.

    Se deixarm os de lado as suas consideracoes ja superadas sobre a form acaoetnica do tipo sertanejo, ou 0 rigor algo estrito com que expoe 0condiciona-m ento fisico, ainda nos surpreende hoje a acuidade soclologlca dem onstrada

    A nto nio C an dido

    junho 2006 277

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    na descricao e analise da sociedade sertaneja, com o fruto do isolam ento. D asegregacao geograftca e cu ltu ra l, p arte p ara a po ntar 0qu e con stitui (d o ang u-10q ue n os in teressa ) a su a m elh or c on trlb uica o: 0 estudo da situacao de con-flito entre essa cultura e a q ue se d esen vo lv ia n as reg to es lito raneas sob 0 slgnodo progresso m oderno. Do acontecim ento, E uclides extrai lim pidam ente ateo r ia , s al ien tando 0 sign ificado so cial d a coex lsten cla d e d o is B rasis, cu jasrelacoes poderiam tom ar periodicam ente urn sentido de grande tragedla co-letiva, se nao se d esen vo lv esse uma p olitica adequ ada para sup erar a dlstanciae ntre ambos .A le rn d a v isa o soctologica, 0 livro v ern m arcado po r qu alidad es llterarlas

    de tao elevado teor, que a penetracao na sociedade enos fatos estudados seopera com profundidade dlvlnatoria, revelando bruscam ente, com o de fatorev elou , a com plexid ade d ram atica da so cied ad e b rasileira a consclencia alg oadorm ecida do s seu s intelectuais e p olitico s. O s s e r to e s (1 902) c on stitu emurn m arco: a partir dai os estudiosos seriam levados irresistivelm ente a in-tensificar 0 estudo da nossa sociedade de urn ponto de vista sistematico,superando tanto as preocupacoes de ordem estritamente juridica como asesp eculacoes dem asiado academ lcas, E uclides da C un ha im pu sera definiti-v am en te a " rea lid ad e b rasile ira" .

    4 - C hegam os, assim , no periodo de form acao, a terceira etapa ou aspec-to, que engloba certas preocupacoes anteriores e anuncia outras, que vlrao aseguir. E 0 momento em que dominam as preocupacoes de elaborar, dlga-mos, uma "teoria geral do Brasil" do ponto de vista da sua evolucao social ed as ca ra cteristica s o rg an lzato rlas, c om a cen tu ad a p refe re nc la p elo s asp ecto spoliticos. O s escritores e pensadores se prendem ainda, m ais ou men os, a sconcep co es evolu cion istas, n otan do-se in fluencia de S ilv io R om ero n a ado -~ao de varies pontos de vista da escola de Le Play .o desejo de construir uma teoria geral do Brasil no plano social e ur np ro gresso , comparado as esp eculacoes teo ricas q ue ficaram registrad as; m ase de certa form a regresso, com parado a preocupacao m onograflca (teorlca eaplicad a) tam bem referida. A ssim vem os O liveira V ian a censurar em E uclid esd a C unh a 0 fato de haver ficado dem asiado preso a urn aspecto lim itado darealidade nacional, em lugar de atirar-se a generallzacoes visando a todo 0pais. No entanto, Silvio R om ero havia indicado a im possibilidade de atin-gir sem elhante visao global sem "algum as centenas de m onografias" - cui-dado que nao se teve em seguida.E sta atitude m etodologica se explica pela ideologia que norteava 0 tra-

    balho destes hom ens, ainda ai seguidores de Silvio: 0 nacionalismo, 0 em -

    278 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    p en ho d e d esv en da r n ecessid ad es e ca racteristica s n acio na is com 0 fimprecipuo de servir ao progresso do pais, em relacao a o q ua l se v erificav aa ce ntu ad o p es sim ismo no p rim eiro q ua rtel d este se cu lo [XX ], a p6 s a s es pe -ran cas iniciais da R epublica. N o fundo, im portava m enos 0 cuidado dainves tigacao ou 0 rig or d a ln fe ren cla d o que a in te rp re ta ca o c oe re nte d o p aisn o seu co nju nto , p ara se a po nta rem remedies de ordem polit ico -admin is -trativa. A isso se cham ou Sociologia entre n6s, des de entao quase ate osnossos dias, nao faltan do quem ainda a con ceba sob este aspecto, que cor-resp on deu , rea lm en te, a u rn d ecisiv o m om en ta n a toma da d e co nscien claIdeo log lca da nossa sociedade .P od emo s aponta r, d a p ub lic ac ao d e Osser toes (1902) a e ss e ou tr o g randem arco que foi Casa-grande &senzala ( 1933 ), tr es auto re s c ar ac te ris tic os da

    o rien ta ca o d efin id a: Mano el Bon fim , A lb erto To rre s e O liv eira V ia na .o prim eiro , e m enos im portante, publicou em 1 905 urn livro que cau -so u certo m ov im en to , p r6 e co ntra , A Am eric a L atin a , ond e in au gu ra e ntr en6s 0 q ue se p od eria ch am ar sen tim en to d e so lid aried ad e co ntin en tal n oses tu do s so cia is . Embo ra d ecla re s ep ara r-s e d os q ue v ee rn n a s oc ie da de u rno rg an ism o an im al, a ch a q ue ela e u rn o rg an ism o v iv o e se reg e p or leis p r6 -p ria s. No s eu e studo , par ec e todav ia pende r ir re sis tiv elmente par a 0 prime i -ro p on to d e v is ta , a plica ndo c om e stre ite za a na lo gla s o rg an icista s. 0 se ualv o e an alisa r as ca usa s d o a tra so e m au fu ncio namen to d as lnstltulcoes naAmerica ; p ara isso reco rre ao m eto do g en etlco , a b usca d as o rig en s d o m al.Ve rdadei ro e st udo pa to log ico , 0 l ivro anali sa 0 fe nomeno do " pa ra sitismoso cia l" , a sltu acao p ara sitaria d as m aes p atrlas em relaca o a s co lo nla s, q uemanif es tam , em conse quencia , f enornenos de a tr as o e c on fu sao, Ma is ta rde,em v arlas o bras, estu do u a ev olu ca o so cia l d o B ra sil, sem pre p reo cu pa docom 0 f at or b lo log lco , mas mi ti gando 0 r igor ismo inic ial.Em 0Bra si l n a Ame ri ca ( 1929) , por e xemplo , s e de u rn lado superva lo riz a

    a lg o in ge nu amen te a c on trib uica o ra cia l e c ultu ra l d o in dio , tra ca d e outrouma co nceltu aca o muito comp reen siv a d o fen om en o d a m estica gem e su afuncao b io l6g ic a e c ultu ra l no Bra sil, c ombate ndo com f irmez a a s te ndenci-a s ra cista s d e u rn O liv eira V ia na .A lb erto T orres fo i p en sa do r d e m aio r tomo e muito m ais lm po rta ncia n a

    h is t6 ri a das nossas ldelas,0 seu ob je ti vo imedia to e ra a reforma cons ti tuc io -n al e a reg en era ca o a dm in istrativ a, p ois en ten dia q ue, n um p ais sem p ov oconsc ie nte e p orta nto s em opln la o pub lic a fo rmada , in cumbiam ao E sta do a starefa s fu nd am en ta is d e o rg an lza ca o e d ecisao . Um a refo rm a d o E sta do se-ria a ch av e, im ag in an do ele p ara ta nto u rn P od er C oo rd en ad or a lg o fa nta s-

    A nto nio C an dido

    junho 2006 279

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    tico e francam ente inoperante, pelos m esm os m otivos em que fundava a suacritica.Interessa, porem , a Sociologia notar que fundou as suas oplnloes numaconcepcao coerente da sociedade brasileira. P artindo da funcao exercida naevolucao social pela m aior ou m enor adaptacao dos grupos hum anos ao m eio,com bate a teoria da superioridade constitucional dos povos nordic os euro-peus sobre os m eridionais, de onde proviem os, bern com o da inferioridadedos povos de cor, autoctones ou im portados pela escravldao. A s racas se ajus-tam d ifere ntemen te ao s d ife re nte s m eio s; 0no sso e fav orav el ao s p ov os m ed i-terran eo s, d ev en do -se n otar qu e o s d a P en in sula Ib erica sao m esclad os larg a-m ente de sangue africano; e tam bem evidentem ente favoravel ao africano e aonosso indio; neste caso, os nordicos e que seriam aqui m esologicam ente infe-riores, Torres conclui que temos, de modo geral, a populacao adequada ec ap az p ar a 0 nosso m eio, nao havendo razao para pessim ism o racista.No entanto, e contra a m esticagem , entendendo que 0 cruzam ento en-

    fraquece as qualidades das racas originais, que deveriam ser m antidas lade alade - raciocinio que mostra quanta de mecanlco e utoplco havia no seupensam ento, que recuou ante a realidade baslca da nossa hlstoria no terrenoetnico, com o havia indicado Silvio R om ero desde 1880, ao nos definir com op ov o caracterizad o p ela m estlcagem fisica o u esp iritu al.

    As reflexoes sobre a raca eo m eio servem -lhe de introducao ao estudo dop ro blem a, p ara ele b aslco , d e apro veitam en to e o rg an izacao d os b en s p ro po r-cionados pela exploracao dos recursos naturais. N este passo e que se toea nofulcro do seu pensam ento, podendo-se sentir a coerencla, inedita entre nos,com que procura relacionar a vida dos grupos as necessidades gerais da socie-dade nacional. A base onde assentam as form as organlzatortas, culm inadaspelo E stado, e a dinam lca dos grupos hum anos, com suas caracteristicas ra-ciais, ajustados a determ inado m eio com certos recursos a sua dlsposlcao,C ab e a o e stu dio so a na lisa r e ssa d in am ic a c omp le xa p ara e xtra ir co ere ntem en -te as n orm as p olitic as.

    Tallinha e nitida em O liveira V iana, sem duvlda 0m ais em inente dessafase, inspirado pelas indicacoes de Silvio R om ero quanta a teoria soclologl-ca da escola de Le P lay e da antropossociologia de Am mon e Lapouge, m asdiscipulo direto e confess ado de A lberto Torres na m aneira de encarar 0problem a, para ele fundam ental, da organlzacao politica, segundo as dire-t ri zes apontadas.

    C om o para A lberto T orres, a preocupacao de O liveira V iana e sobretudopolitica, podendo-se considerar toda a sua longa obra com o preparacao do

    280 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    livro final sobre as nossas lnstitulcoes politicas. E nquanto, porem , 0 maisvelho se preocupava diretam ente e des d e logo com os problem as de aplica-\;ao pratica, ele se dedicou m ais acuradam ente ao estudo da form acao social,buscando nela as raizes para a doutrinacao teo rica no terreno da politica eda admlnl st racao ,Do seu equipamento teorico, ja referido, guardou sobretudo a im p or-

    tancia dada ao fator racial e a Idela, de que nunca se desprendeu totalm en-te, apesar de protestos em contrarto, de superioridade e inferioridade ra-cia is. A ssim , p ro cu ra e xp lic ar c erto s trac es e stru tu ra is, in stitu cio na is, e c erta stendenclas na vida politica brasileira pela diferenca da capacidade dos gru-pos colonizadores - portugueses do Norte ou do SuI, louros ou morenos,com preponderancia celta ou gotlca, N o terreno da pura fantasia, estabele-ce para a colonia uma estratlflcacao social em que os senhores rurais deorigem germ anica ou celtica ocupam 0 plnaculo, os m orenos algarvios oualentejanos 0 degrau m edlo, os m estlcos e hom ens de cor a plebe rural...M as, fora tais deslizes que procurou corrigir em seguida, hauriu na in-

    fluen cia lep layan a certas in sp traco es q ue 0 conduziram a algum as das suasmelhores reallzacoes quanto ao m eto do e a lnterpretacao, Na sua obra, enotorla neste sentido a importancia dada ao m eio fislco com o base im ediatada vida econom ica, que por sua vez determ ina de perto a organfzacao dafam ilia, celula da sociedade. Sao classicos os seus estudos sobre a fam iliarural do Brasil-C olonia, que analisou com o grupo m ultifuncional (isto e,desem penhando "funcao sim plificadora"), centralizando toda a vida m ate-rial e espiritual do pais. C om esta base, passa ao estudo do particularism opolitico, 0 mandonismo das camaras, que retoma a partir do velho JoaoF rancisco L isboa e the parece condicionar a dinam lca da nossa vida politica,entrecortada de tensoes entre os poderes locais (com a sollda base econom l-co-social da fam ilia) e os poderes centrais, no seu esforco de uniflcacao e, emsegu ida , p rog re ss iva r ac lonal iz ac ao admini st ra ti va .A pesar das restrico es, so bretu do m eto do lo glcas, q ue se p od em o po r, e sem

    du vld a im po nen te e fecu nd a a su a co nstru cao , culm in ad a pela d eterm ln acaode "tip o s so ciais" , d efin id os seg und o a b ase eco no rn ica, v arian do esta po r suavez conform e as condlcoes regionais. 0 seu livro baslco, Popularoesmerid io -na i sdoBras i l (1919; 2 volum e postum o, 1952), estudajustam ente os tiposhum anos de M inas, Sao Paulo, R io de Janeiro e R io G rande do SuI, ligados aobandeirism o, ao pastoreio e a ag ric ultu ra d o c afe .

    C om e le , a tin gim os 0m om ento decisivo na form acao da Sociologia bra-sileira , em q ue re pre se nta 0 divisor de aguas entre a tendencia para a "vista

    A nto nio C an dido

    junho 2006 281

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    sintetica", com o dizia Silvio R om ero, e a necessidade analitica de discrim i-nar tipos sociais, de que E uclides fora 0 precursor. O s seus m etodos, aindaligados a primeira o rle nt ac ao , n ao th e p erm itiriam pas sa r c onve nie ntemen -te a segunda, sendo todavia de notar que e 0 prim eiro a recorrer com regu-laridade a estatistica e a ten tar um a renovacao d a b ib lio grafia , p ara alem doevolucionism o e da escola de Le P lay.

    S - C hegada a este ponto, a form acao da Sociologia brasileira vai entrarnuma etapa culm inante, em que se preparam os elementos para sua defini-tiva con stitulcao e co nsolidacao . T en do ja con sclencla do s fatos essen ciais d arealidade brasileira que the competia estudar; tendo ja elaborado algunsp on to s de v ista coerentes so bre 0 p ais; tendo firm ado alg un s criterlo s exp li-c ativ os ( como 0 recurso a Hist6ria, 0 estudo da adaptacao ao m eio, a avalia-I ,; ao da s e tn ia s n a formacao social, 0 sen so da com plexidade cultural); tend ofirm ado esses e outros criterios, faltava-lhe dar 0 passo decisivo para se in-corporar a n ossa vid a intelectual: enriq uecim en to e modernlzacao da teor ia ,de urn lado; opcao decidida pelos m etodos diretos de pesquisa em pirica darealidade presente, de outro. N esse sentido, era condicao lndlspensavel ini-ciar 0 seu ensino , sem 0 qual nao have ria possib ilidade de fo rm ar os soclolo-g os profissio nais e, d e m an eira m ais lata, q uadros intelectuais tecn icam en tepreparados, livres dos caprichos do autodidatism o - que nao convem vitu-perar, porque foi 0 grande recurso do nosso progresso m ental; mas que emnossos dias vai perdendo cam po, com o etapa vencida pelas pr6prias exigen-c ia s des se p rog re ss o.Isto aconteceu d evid o a al,;ao do s q ue estabeleceram a So ciolog ia com o

    d iscip lin a c urricu lar e p ro po rcio naram e xp oslc oe s slstematlca s d os seu s p rin -cipios, na aula e no manual; e devido a lnfluencla que trouxeram aos estu-dos brasileiros as orientacoes m odem as, superando as sugestoes do seculoX IX , dentro das quais se moviam ate entao os estudiosos. D eixando paradaqui a pouco 0 primeiro grupo, mencionemos agora este ultim o, em quese destacam homens como Gilberto F reyre e Artur Ramos, aquele maispreso ao cam po que nos interessa, este ao da Psicologia Social e da A ntropo-lo gla d e o rle nta ca o p slc olo glc a.

    Se O liveira V iana e urn fim da linha de "teo ria geral do Brasil" sob urnponto de vista evolutivo, G ilberto F reyre, em bora ligado a ela, e urn com eco,p ela reno vacao do s m eto do s e a larg a in fo rm acao te6 rica em qu e se fun dou . Assuas obras sao ainda tributarlas da H ist6ria; m as, com o esta entre n6s nao seo rien tara d ecididam en te para 0 estu do das estruturas e lnstituico es, p erm a-necendo, mesmo entre os melhores, como urn levantamento de erudicao, a

    282 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    su a o bra a pa rec eu d esd e lo go , a o modo d a dos p re dec ess ore s q ue e stu damos,como Soc io lo gia - como a f6 rmu la b ra sile ira d a in ve stig aca o so clo lo glc a.Al ias, G i lbe rt o F rey re e u rn e sp ir ito antia cadem lc o por e xc ele nc ia , liv re dasin juncoes da compar timentacao unlver slta rla , d es pr eocupado em e sta r " fa -z endo soc lo logla " e in te re ss ado apena s em dar s en tido e p ro fundidade a su aanal is e da soci edade brasi le ir a, c ir cu lando l iv remente da Antropo log ia F is ic ae Social a Geograf ia Humana , a Economia, a Pslc olog la . Mas como se apa re -lh ou d e formacao t ecn lca sem renunc ia r aos pendore s pe la in tu ic ;ao arti sti ca ,a sua obra e limp idamente e labo rada e r ic a de suges to es , te ndo s ignif ic adou rn marc o dec is ivo e in sp ir ado r nao apena s par a s oc to logo s e antr opologos,mas para geografos, hlglenls tas , poli tl cos , c ri ti cos , hi storiadores . Casa-gran-de &senzala (1933) e , pois, legit imamente, 0 eixo em tomo do qual gira aevolucao que e stamos e studando , ao r ever a s o r ie nta coes do pas sado s egundoc rite rio s que s e ab rem par a 0 fu tu ro da d isci pl ina .Fo rmado numa quadr a em que a Soc io logia te 6r ic a e stava dec aden te , G il-

    b er to F re yr e s e o rie ntou ma is par a a An tr opologia , no que a lia s c o rr es pondeua s te ndencia s da nos sa e vo lucao soc io l6gic a. G r ac as aos c once ito s modemosde cu ltu ra, adap tacao , cont ato rac ia l e cu ltu ral , d is tancl a socia l, mobil idade -h au rid os em h om en s como Boa s, W issler, S oro kin , B og ard us -, b ern como aurn pendor decidid o pela ecolo gla hum ana e os estudos de m lsdgenacao,retomou , fu n d iu e tra nsfig uro u numa sin tes e o rig in al, c omo fa zem o s re no -v adore s, tema s que s e e sb oc av am , d iss oc ia do s e fra gmen ta rio s, n a p en a dosnos so s p re -s oc lo logo s, d es de 0 ultim o quartel do seculo X IX : papel dase tn ias cons ti tu tivas, mest ic agem, e sc rav ldao, fami li a pa tr ia rc a l, mandonis -mo , var ia coes r eg iona is e tc . E s tabe le ce u uma cor re la cao amplamen te f unda -mentada entr e 0 r eg ime de propriedade ( la tl fundlo) , 0 de tr abalho ( es cr av i-d ao ) e o s is tema agrico la (mono cu ltu ra ), p ara so bre e le d efin ir a e stru tu ra ea fu nca o d a familia d a camad a d om in an te, como fu lcro d e to da a o rg an iza -c;a od a so cied ad e co lo nia l, u nlco p on to d e a po io a q ue se p od iam referir a sn orm as so cia is n os secu lo s d e fo rm aca o. D elin eo u o s tip os h um an os d a ca -mada s enho ria l e da c amada s ervil, c omp le tando-os em S o br ad o s em o e am b o s(1 936) c om o s que se in terp use ram en tre amba s, n o p ro ce sso d e mobilid ad ev ertic al q ue fo i, a o lo ngo do se cu lo X IX , a te nu ando a s d lsta ncia s e e sb oc an -do os e str ato s lntermedlos,Os d ois liv ro s m en cio n a do s co nstitu em a su a m aio r co ntrib uica o a so -

    c iologia e a his t6 ri a soci al b rasi le ir a, devendo-se jun ta r a e le sNorde st e ( 1937 ) ,e speci e de d ig re ssao a m argem do tem a, onde se patenteia a sua acuidadeeco log ica e que e possivelmente 0mais h armonio so dos tres . E prec iso notar

    A nto nio C an dido

    junho 2006 283

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    que, inteiram ente desligado de preconceitos academ lcos, com o ficou assi-nalado, utiliza um a linguagem viva e insinuante, m ais llteraria que cientifi-ca na sua estrutura, em bora nao no lexlco, e que e nele urn instrum ento deinterpretacao pela riqueza das im agens, a sugestao dos longos periodos emque da vida e graca ao esqueleto da erudicao e da analise. C om o em E uclidesda Cunha, temos aqui uma obra cujas virtudes literarias estao no nivel dac apac idade c ient if ic a.

    C ontem poraneam ente, isto e , no decenlo de 1930, deu-se 0 fato m aisim portante para a form acao da Sociologia, que foi, com o dissem os, a suaem ergencia no ensino. R essalta ai a atuacao dos educadores, que vinhamsentindo a sua necessidade para a form acao profissional do professor prim a-rio e para a elaboracao de um a teoria educacional adequada, sentindo logo ase gu ir a n ec essid ad e d e e sta bele ce r 0 seu ensino em nivel superior. A s refor-mas de Fernando de Azevedo no entao D istrito Federal e em Sao Paulo(1927; 1933) incluem -na no curriculo das E scolas Normais e cursos deaperfelcoam ento: a reform a federal de F rancisco C am pos (1931), nos cursoscom plem entares. N a E scola L ivre de Sociologia e Politica e na Faculdade deF ilo sofia, C len cias e L etras d a U niv ersid ad e, am bas em S ao P au lo , b ern comona F aculdade de F ilosofia da U niversidade do D istrito F ederal, fundam -seem 1933, 1934 e 1935 os primeiros cursos superiores de C lenclas Sociais,fig urand o ela en tre as m aterias,

    L lgados as necessidades de ensino, surgem entao varies m anuais e com -pendios que perm item a divulgacao cientifica e a a~ao sobre publico m aisamplo, como os de Delgado de Carvalho, Fernando de Azevedo, V . d e M i-ran da R eis; 0 prim eiro orientado pelas teorias am ericanas e de acentuadoin tu ito p ra tic o, 0 segundo filiando-se principalm ente a influencla de D ur-k heim , com nitida preocupacao te6rica, eo ultim o com binando varias orien-taco es, n um sen tid o m ais ex po sitiv o.

    E stes acontecim entos se ligam as condlcoes politicas e sociais que suce-deram a revolucao de 1930, exprim indo uma curiosidade acentuada deconhecer 0 pais e, em sentido mais amplo, a sociedade moderna e os seusp ro blem as. A ex pre ssao " re alid ad e b ra sile ira " e tipica do m om ento, tornan-do-se verdadeiro lugar-com um a que recorriam indiscrim inadam ente jor-nalistas, politicos, escritores e estudiosos; havia no am biente, alem disso,um a sollcitacao intensa pelos estudos sociais, que se m ultiplicaram nos di-ferentes cam pos da hist6ria, da econom ia, da politica, da educacao, concor-rendo para criar um a atm osfera de receptividade e expectativa em torno daSociologia.

    284 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    N otamos entao incremento nos estudos sobre 0 negro e 0 indio, comsentido d escritivo o u acen tu ad a ten dencla para as exp llcacoes psicologtcas,nos de folclore, nos de politica, notando-se em todos eles uma especle dedecanta faocom a passagem (que m arca to do 0 esforco do decenlo) do pontod e v is ta sociologico para a ciencia da Sociologla, da exposicao dldatlca paraa pesquisa, da dlvulgacao para a construcao. Neste processo, foram partem ag na, po dem os d izer decisiva, os professo res un lv ersltarios, estran geirosou naturalizados, que constituem a prim eira equipe, no Brasil, de estudio-so s esp ecificam ente p reparado s para os estudo s soclo loglcos e an trop olog l-cos: H orace Davies, Sam uel Low rie, C laude Levi-Strauss, Paul A rbousseB astide, E milio W illem s, H erbert B aldus, Jacques L am bert, R oger B astide,Donald P ierson - americanos, franceses, alem aes que nos vieram trazer acultura unlversltarla no setor das clenclas sociais. D entre os brasileiros quetrabalham no mesmo movimento, destaca-se Fernando de Azevedo, que,passando dos estudos de educacao para a Sociologia, ensinou-a e organizouas suas atividades, em Sao Paulo, primeiro no ensino rnedlo, depois nosuperior, sem lnterrupcao desde 1931, sendo desde a sua fundacao, em1947,0 Chefe do Departamento de Sociologia e Antropologia da U niver-sidade de Sao Paulo, onde se agrupam num erosos especialistas em coopera-c ;a o d ld atic a e c ie ntific a.A sua obra soclologlca principia com 0 decenio de 1930, apos uma

    atividade intensa de escritor, voltado sobretudo para 0 h um anism o classl-co, a educacao e a critic a, que 0 foram fazend o len tam en te preo cu par-secom a im portancla do fator social na cultura didatlca e cientifica.A sua p rin cipal con trlbu lcao teorica se encon tra em Soc io log ia educaciona l

    (1940), onde procura dar a esta disciplina um a fundam entacao sociologlcaco eren te, escap an do as tend en cias dem asiad o pragmaticas d os am erican os nosentido d e uma "so clolog la aplicada a edu cacao ", qu e m elhor se diria p ed ag o-gia soclologlca. Trata-se neste livro de inverter de algum m odo a poslcao,co nsid eran do a edu cacao com o u rn d os cam pos de inv estlg acao so clolog lca,arm ad a de urn sistem a de co nceito s, procuran do definir 0processo educacio-nal no que tern de sociallzacao, para, em seguida, estuda-lo em conexao comas institulcoes so ciais, tan to as genericas, como a fam ilia e 0E stado, quanta asesp ecific as, c omo a esco la . S urg e assim a n ece ssid ad e d e a nalisa r a emerg en clado s papels sociais lig ado s a ele, a p artir d os tip o s p rim itiv os de transm issao daex perlen cla cu ltu ra l. P ara isto , F ern an do d e A zev ed o d esen vo lv e as su gesto esapontadas por Durkheim , utilizando os dados da A ntropologia m oderna e as ua p rop ri a exper le nc la ,

    A nto nio C an dido

    junho 2006 285

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    Na lin ha ja tra dic io na l d a S oc io lo gia b ra sile ira , p ro du ziu uma o bra d eint erp re tacao g loba l da nossa cu ltura espi ri tua l, Cu l tu ra brasi le i ra ( 19 43 ), eu rn e stu do d o e lemen to p olitic o n a s oc ie da de q ue s e d es en vo lv eu c om b as en a e co nom ia d o a cu ca r, Can a vi ai se e n ge n ho sn a v id a p o l i t i c do BrasU(1948 ) .o p rimeiro con st it ui u rn lev an tamento exau st iv o da no ss a v id a i nt ele ctu a l ea rt is ti ca , q u e ana li sa num enquadramen to f ecundo, r ef er in do-a p rimei ro a scond lcoe s d e formacao h ls to ric o -soc la l, p ar a comp le ta -la em segu id a p el oe stu do d os me ca nismo s d e tra nsm iss ao , q ue g ara ntem n o temp o a v id a d asc on qu is ta s e sp ir itu ais . E r a ln ed lta , e ntr e n os , a mane ir a p or q ue e ntr os a n av id a c ultu ra l a e du ca ca o, q ue a pa re ce em sua f un ca o h ls to rlc a e s oc ia l, in ti-m amen te s olld arla a v id a d o p ais.Em C a na via is e e ng en ho s, en cara a relacao d os fatos po litico s com osd ema is a sp ec to s d a v id a s oc ia l, c omo d e in te rc on ex ao , is to e , c omo a qu eles is tem a d e n orm a s q ue e stab ele ce as c on dic oe s d e fu ncio namen to d as o u-tr as n ormas s oc ia is , v in cu la nd o u ns a os o utr os o s d if er en te s e lemen to s d ao rg an lz ac ao . S em de sp re za r, a nte s apon tando devi dament e 0 p ap el d os fa -to re s me so lo glc os , s ep ar a- se d a tra dic ao b ra sile ir a em ta is e stu do s p ela s u-pe racao das anal ise se tn lcas e 0 i nt ere sse d ireto pe los fenomenos es tru tu rai s,estudando a dlnam ica das cam adas e dos tipos de vida na form acao das oc ie da de em e stu do . S ob re e sta a na lis e, e la bo ra f in almente 0 p ap el d asideologias.Em ilio W i llem s, radicado desd e m uito m oco no B rasil, aq ui realizou

    toda a sua obra e pertence de fato e dire ito a nossa Socio logia. O s seusp rime ir os e stu do s f or am no c ampo d a S oc io lo gia Ed uc ac io na l, em que e fe -t uou pe squ is as , n o tadamente sob re 0 p ap el d e p en eir amento e xe rc id o p elae du ca ca o em S ao P au lo . In flu en cia do p ela te oria am eric an a d os c on ta to sra cia is e c ultu ra is, e stu do u so b e ste p rism a a c olo niz ac ao a lem a d o S uI d oBras il em AJSimi la fao e Popu la f o es ma r g in a i s ( 1940) , r et omando 0 temac om ma io r amplitu de e r en ov ad o e qu ip amento te o ric o em A a cultu ra fa o d ossle m ie s n o B ra sil ( 19 46 ), o nd e a plic a, d e mane ir a c oe re nte e s is tematic a, o smode rn os c on ce ito s d a a ntr op olo gia c ultu ra l amer ic an a. B a se ad o em p es -q uisa d e cam po (sob retu do o bservacao participan te) e levantam ento d emater ia l impresso (notadamen te co lecoes de jo rna is ) , e s tudou 0desenvolvi-m e nto d e ln stitu ic oe s, tip os d e c on du ta e ma nife sta co es Id eo lo glc as q uee xp rim em a a co rn od ac ao d os im ig ra nte s a o n ov o me io , d an do lu ga r a umac ultu ra ma rg in al te uto -b ra sile ir a, p re sa e ntr e s en timento s d e f id elid ad e aterra d e o rig em e am or a terra no va, para se reso lv er afin al n um a situacaoambiv ale nte q ue e nc on tra e xp re ss ao ma is tip ic a n o " pa trio tismo lo ca l" -

    286 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    especie de raclonallzacao elaborada com o m ecanism o adaptativo. N outrostrab alh os, estud ou varies aspecto s da acu ltu racao d os japo neses.Em Cunha , trsdicio e tra nsifa o n um a c ultu ra ru ra l d o B ra sil (1947) eBuz ios I s land(1952) , este em colaboracao com G ioconda M ussolini, iniciao estudo dos agrupam entos caboclos, utilizando os m etodos, lneditos entrenos, das pesquisas de com unidade. N estes e noutros trabalhos orientou-sedecididam ente para a investigacao em pirica, esforcando-se por fazer a So-ciologta entrar na fase de pesquisa direta da realidade presente. E stas dire-trizes fecu nd as, q ue tiv eram ln flu encia decisiv a n as n ov as g erat;o es d e so clo -logos, foram por ele am pliadas atraves da sua atividade docente e da revistaSoc i o l og i a , que fundou em 1939 com Antenor Romano Barreto e aindacontinua em plena atividade, a prim eira e por m uito tem po (m ica publica-t;ao esp ec ia liza da n o ramo .A tividade de certo m odo paralela, inspirada em fontes por vezes as m es-

    m as, desem penhou e vern desem penhando Donald Pierson, soclologo am e-ricano radicado no Brasil des de 1935, com poucas lnterrupcoes. Da suaintensa atividade destaquem os os do is livros principais: N e g ro e s i n B ra zil(1942; traducao de 1945: B r a nc o s e p re to sn a Bahia) e C ruz d as a lm as, aB ra zilia n V illa g e (1953), este em colaboracao com varies discipulos. 0p rim eiro liv ro e fruto de uma pesquisa de dois anos na Bahia, segundo asorientacoes teoricas da "escola de C hicago", a que se filia 0 a uto r, n ota da -m ente no que tange aos conceitos de contatos raciais e culturais. Para ele (ed os se us e stu do s lo ca is g en eraliz a p ara 0B rasil), n ao h a en tre n os p reco ncei-to racial propriam ente dito, com o se verifica nos E stados U nidos (a preocu-p ac ao c ompar ativ a e perm anente no livro, servindo de base para orientarvarias conclusoes), E mbora haja dlscrim lnacao de cor, ela e condicionadaem grande parte pela poslcao social segundo urn esquema de classes, emq ue a mob ilid ad e e possivel e constante; nao do tipo casta, em que tende ase perpetuar segundo a origem etnica. Dai 0 seu otim ism o quanta a nossadem ocracia racial e a form ula "preconceito de classe nao de casta".

    C ruz d as s lmss baseado em pesquisa intensiva num a pequena vila dointerior, levada a cabo com espirito diverso do que presidiu a e la bo ra cao d eCunha e mais proximo do roteiro de Bu zi os Is la n d Seguindo a linha dasm onografias etnograflcas de com unidade, pro cede ao levantam ento descri-tivo dos diversos aspectos da cultura m aterial, crencas, trabalho, organiza-t;ao social, sem esquecer os dados previos de natureza geograflca, E semduvida 0 prim eiro levantam ento exaustivo de um a com unidade cabocla,em bora num sentido m ais inform ativo que interpretativo. E m num erosos

    A nto nio C an dido

    junho 2006 287

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    a rtigo s, P ie rs on vern comp le tando , nes se s en tido , a publlc ac ao in ic ia l. Men -c ionemos a inda que the foi c on fiado 0 l evan tamento sociocu lt ura l do va le doSao F r ancis co pela r es pe ctiv a Comis sao, te ndo e le o rganiz ado 0 tr aba lho deuma e qu ip e.Be rn d if er en te da dos do is soclologos i nd ic ados fo i a a~aode Roge r Bas ti de ,

    q ue a qu i en sin ou e p esq uiso u d e 1 93 7 a 1 95 4. E sp irito m en os sistem aticoe ma is in qu ie to , d eu s ob re tu do u rn e xemplo d e to le ra nc la te o r ic a e lib e rd a-d e c ritic a, u tiliz an do pon to s d e v is ta d a Soc io lo gia fra nc es a, a lema e ameri-c ana , d a An tr opo log ia amer ic ana e ing le sa , d a tr ad ic ional " etnogr af la " f ran-cesa , d a p slca na llse e d a filo so fia so cia l. P reo cu pa do p rin cip alm en te em" in te rp re ta r" , d es envolveu em seus d is cipu lo s a c on flanca nos f ato re s ind i-v id ua is d o p esq uis ad or, fu nd ame nta do s to davia p elo rig or d a p oslc ao te or i-c a. A su a p re oc up ac ao fu nd ame nta l f or am sempre o s e stu do s a fr o- br asile i-ro s, a q ue v ern co nsa gra nd o tra ba lh os d e v aria n atu reza , c om p referen clap elo s fe n6menos maglc o- re llg lo so s, n os q ua is th e in te re ss am s ob re tu do aa na lise e comp reen sa o d os cu lto s: Es tudos a f ro - b ras il e ir o s (3 s erie s, 1 946,1 95 1, 1 95 3) ; A poes ia a f ro - b ras il e ir a (1943); Im a ge ns d o n ord este m istic o e mb ra n co e p re to (1945); R ela fo es ra cia is e ntre n eg ro s e b ra nc os e m S ao P au lo(1 95 5), im po rta nte p esq uisa d lrig id a p or ele e F lo re sta n F ern an des, com aco laboracao de ou tros e speci al is tas .AMm dos e stu do s s ob re 0 neg ro b ra sile ir o, Bastid e tr abalhou e enc am i -

    n ho u discip ulo s em so ciolo gia da arte, cam po tam bern de su a pred llecao(A rte e so cie da de , 1945 ), p slc olog la s oc ia l ( S oc io l o gi a e p s ic am iJ is e, 1 9 48) ,n ao c on ta ndo uma in te ns a a tiv id ad e d e c ritic a llte ra rla e d a a rte , p ara a q ua ltr ou xe a c on trib uic ao d a s ua c ultu ra c ie ntific a e fllo so flc a.J acq ues L ambert, d e esta da cu rta en tre n os, o rien to u o s seu s tra ba lh os

    no rum o da dem ografia ( Pr obl em e s d emog raph iq u es c on tempo ra i n s, 1. LesiaitS'[1944], em c ola bo ra ca o c om L. A. Co sta P in to ), p ub lic an do ma is ta r-d e, n a lin ha d as " te oria s d o B ra sil" , q ue hoje p are ce s er p re fe rid a s ob re tu dop elo s e stra ng eir os , uma s in te se e xc ele nte , L e B re sil' stru ctu re s so cia le s e tinst i tut ionspoli t iques(1953), a q ue se po dem ju nta r o utras, d a m esm a natu -r ez a, d e ma is do i s p ro fe ss o re s f rance se s que ens in a ram aqui: L e s tr oi s a g e s d uBresil , de C harles M oraze (1954), e L e B re si l, d e P ierre Mo nb eig (1 95 4).Numa lin ha a lg o d iv ers a, d e d oc ume nta ca o e p esq uisa ma is a cu ra da , temo sB r az il, i ts 'p e op le a n d i ns ti tu ti on s (1 94 7), d e T . L yn n-Sm ith , ta rn bem resi-d en te a lg un s a no s en tre n os.

    288 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    J e n d e n d a s a tu a isDiante do exposto, compreende-se melhor em que sentido foi dito, a

    principio, que a Sociologia s6 se constituiu realm ente entre n6s, com o ati-vidade am p la, reconhecida e produtiva, contando com pessoal m ais ou m e-nos num eroso e devidam ente especializado, depois de 1940. E ssa data e emparte convencional e aproxim ativa, pois na o apenas os sociologos da "fasetransit6ria" trabalhavam e continuam trabalhando no sentido que se apon-tara aqui, e que foram eles a estabelecer, com o varies soci6logos jovens pro-longam orientacoes do periodo inicial; ela m arca, todavia, perspectivas no-vas que m ostram a consolldacao da sociologta com o clencia e proflssao,diferenciada das disciplinas afins. C onseqiientem ente, a producao m uda deasp ecto , co nstitu in do -se cad a v ez m ais d e estud os em pirico s m eto dicam en -te co nd uzido s o u teo rias em piricam en te fun dam entad as.

    E sse p rog resso p od e ser verificado em tres vias: 1 ) na organizaraodo traba-lho sociol6gico; 2 ) no novo espiritoque 0 p re si de ; 3 ) na s ob ra sr ea li zadas .

    1 ) Q uanto a o rg an izacao , as ativid ad es so cio l6 gicas d ev em ser co nsid era-das sob tres aspectos: (a) ensino; (b) pesquisa; (c) dlvulgacao,

    (a) V im os que 0 ensino se desenvolveu depois de 1930, m as s6 no dece-n io seg uin te as esco las su periores p assaram a fomecer d e m an eira p on derav elp ro fe sso res e p esq uisa do re s p ara ab aste cer o s c urs o s tec nlc os, a s fac uld ad es,os services de investigacao no setor social, que entao se estabeleceram . Asituacao e particularm ente favoravel no estado de Sao Paulo, cujo ensinooficial e bastante desenvolvido, exigindo-se dos professores concurso de ti-tulos e provas, e onde, no grau superior, existe 0 regim e de tem po integral.U ma com paracao entre os program as de ha vinte anos e agora, m ostra com oaum entou em com plexidade e coerencla 0 c urric ulo d os c urso s su pe rio re sde sociologia, superada a etapa inicial, de teor dem asiado geral, apoiadasobretudo no estudo das teorias e da hist6ria da sociologia.

    (b ) N o setor da pesquisa e que 0 avanco foi m ais sensivel, surgindo asp rime ir as v er ba s a e la d es tin ad as , e sb oc ando -s e 0 tra ba lh o d as e qu ip es, c ria n-do-se a m entalidade em pirica, elaborando-se os prim eiros pIanos m et6di-co s d e ln vestlg acao , N esse sen tid o, foi d ecisiv a a lnflu en cia d as n ov as co nd i-~6es sociais, impondo aos governos e as organlzacoes privadas urnco nh ecim en to racio nal d a realid ad e em v ista das n ecessid ad es cad a v ez m aio -res de planejam ento e orlentacao racional das suas atividades. P ara sistem a-tizar 0 assunto, podem os distinguir quatro tip os de pesquisa que se vernprocessando no B rasil: (1) pesquisas individuais, de finalidade academ ica

    A nto nio C an dido

    junho 2006 289

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    ou outra qualquer; (2) pesquisas didatlcas, visando ao treinam ento de alu-nos, isoladam ente ou em grupos; (3) pesquisas em equipe, com finalidadecie ntifica; (4) pesq uisas em e quip e com finalid ade p ratlc a,N o prim eiro caso, tem os a m aioria dos trabalhos de soctologos de car re i-

    ra, ligados a institulcoes de ensino e pesquisa, ou dos estudiosos isoladosem centros de pouca ou nenhum a organlzacao do trabalho cientifico. T ernside ate agora a pedra de toque para a quallflcacao do especialista e ja pro-du ziu resu ltado s apre clave ls em pouc os a nos de floresc im en to. N o segun docaso, tem os atividades geralm ente confinadas ao am bito academ ico, resul-tando em trabalhos individuais ou de grupos de estudantes m ais ou m enoscapazes, trabalhando sob orlentacao, geralm ente com finalidade de treina-m ento, m as podendo em certos casos produzir resultados dlgnos de publi-cacao, G en eraliza-se , contu do, cada v ez m ais, a tende ncla de asso ciar 0 alu-n o ao s traba lhos do terceiro e quarto tip o, em que urn planejamen to adeq uad oe a finalidade ex tradldatlca perm item nao so maior aproveitam ento dose sforco s como ve rdade ir a i ni ci al ,; ao p ro fi ss iona l.o terceiro caso, em fase inicial, e por exem plo 0 da pesquisa sobre pre-conceito de cor, realizada ha alguns anos sob os auspicios da U nesco emvaries pontos do pais. Por ultim o, tem os investigacoes de carater pratlco,sem prejuizo do metodo cientifico, visando a contribuir para a analise deuma situacao ou de urn problema, que se pretende enfrentar prox ima ourem otam ente. S irva de exem plo 0 levantam ento socio-cultural do vale doSao F rancisco, realizado com o parte do plano de recuperacao e valorizacaodaquela vasta area; ou a lnvestlgacao dos niveis de vida em to do 0 p ais, p oriniciativa do G ovem o Federal; ou, ainda, a atividade do C entro Brasileirode P esquisas E ducacionais no sentido da m elhoria da instrucao e seu ajustesatlsfatorio a s n ecessidad es atu ais do pa is.H a neste ultim o setor, por vezes, tendencia para sair da S ociologia, com

    recurso a crlterios que se aproxim am dos da "pesquisa social" , isto e, a pes-quisa a curto prazo norte ada por finalidade pratlca im ediata, com interesseapenas incidental pelos aspectos teorlcos. M as a sua lm portancla e grandepara 0 progresso cientifico, visto com o nao so apela cada vez m ais para osespecia lista s, com o va i levan do a s ln stltu lcoes p ublicas e priv adas de admi-nistracao, producao, cornercio, etc., a preyer urn setor de investlgacao dosn iveis de vida, p oder aqu isitivo, h ablta cao, sociab ilid ade, op inla o, atitu desco le ti va s, e tc .

    (c ) A d iv ulg ac ao d o tra ba lh o so cio lo glc o e nc on tra a in da c erta s d ific uld a-des, estando abaix o do volum e e teor da producao cientifica. C resce todavia

    290 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    a p ossib ilid ad e d e p ub lic ar liv ro s esp ecia liza do s, em bo ra q ua se n ao h ajas ubvencoes p iib llc as e par tic ula re s nes te s en tido . As entid ade s o fic ia is quee ditam , d istr ib uem ma l. A re vista e sp ec ia liz ad a d e tira gem re gu la r e Soc io-log ia , mas a lg uma s outr as r ec eb em tr ab alh os sociologtcos, entre os de A n-t ropologia, folc lore , services publlcos , e tc .: R e vi sta d o Mu se u P a ul is ta , R e vis -ta d e A ntro po lo gia , R evista d o A rq uivo , R evista d e A dm in istra {a o, em SaoP aulo . C abe no tar aind a a R e vi sta P er nam b uc a na d e S o ci ol og ia e a s public a-~ o es d a Un iv er sid ad e d e M in as Ge ra is .A v id a a ss oc ia tiv a e mu ito fra ca e 0 ln te rc amb lo s e d a em bas e p es so al. A

    Socie dade Bras ile ir a de Socio log la , em que s e tr an sf ormou a an tig a Socie da -d e P au lis ta d e S oc lo lo gia , re aliz ou u rn Cong re ss o em 1954 n a c id ad e d e S aoP au lo e p ub lic ou em s eguid a o s re sp ec tiv os a na is. A p ro pria tro ca d e pub li-cacoes e lim itada e, a na o ser n o R io e S ao P au lo, o s estud io so s dep en demdo acaso das relacoes para se porem a par do m ovim ento sociologlco nopais. E mais fa cll c on hec er a m arc ha d as p esq uisa s e p ub llca co es n os E sta -dos U nidos e na Europa do que no Brasil - e 0 p re se nte a rtigo , e sc rito po ru rn s oc io lo go d e S ao P au lo , c er tamen te a pre se nta la cu na s n es te se ntid o.2 ) D ev emo s ago ra in dic ar b re vemen te 0 esp irito q ue v ern p resid in do a

    e ste des envolv imen to , d e que e a o mesmo tempo c ondic ao e c on se qu en cta ,T alv ez se p ud esse resumir d izen do q ue, n o p an orama d a n ossa h lsto ria

    intelectual, 0 adven to r ela tiv amen te r ec en te de uma soc io log ia c ie ntif ic a s ed eu n a m ed id a em q ue o s e stu do s so cia is co nseg uiram, a qu i, su pe ra r a m en -talid ade llterarla a qu e se h aviam ate enta o lig ad o ind isso lu velm en te. Aliteratura foi entre nos um a especie de m atriz , de solo com um , que, porm ais tem p o q ue em o utro s p aises, a lim en to u o s estu do s so bre a so cied ad e,d ando- lh es v iab ilid ade numa cultu ra in te le ctu almen te pouco d if er enciada.O s brasileiros que lidaram ate os nossos dias com as cienclas do hom emfizeram-n o em g ra nd e p arte como escrito res - com a titu de m en ta l, lin gu a-g em , meto do s ma is a de qu ados a c ria ~ ao lite ra rla ( no s en tid o amplo ) d o quea o o bjeto d e estu do q ue e sco lh iam.No s u ltimo s v in te a no s, p ore rn , temos v is to s urg ir , c ad a v ez ma is, jo ve ns

    q ue , a o s e in te re ssa rem pelo e stu do d a v id a s oc ia l, f az em -no d esp re oc up a-do s de qualquer ln te nc ao e ste tic a, v is ando a aborda r c om e sp ir ito e xc lu siv a -mente c ie ntif ic o, ou pelo menos te cn lc o, a s s ua s d is cip lin a s, e nc ar adas ago-ra como esp ecia lid ad es d esta ca da s d o tra tamen to litera rio . A s o bra s m aiss ign if ic ativ a s do pen samen to p re -s oc lo log lc o s e haviam s itu ado , no Bras il,em te rre no dub io , o nd e a p re cis ao s e d is fa rc av a s ob a s su ge sto es a rtis tic as ,ou 0 r igo r da obse rvacao e ra s ub stitu ido po r gener aliz ac oe s de cunho in tu i-

    A nto nio C an dido

    junho 2006 291

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    tiv o e te cn lc a retorica, A restricao atual da soberania llterarla indica um adellm ltacao de esferas que e verdadeiro indice de maturidade cultural egarante a autonom ia de cada um a das cienclas hum anas.T odavia, as condlcoes segundo as quais se desenvolveu a Sociologia no

    B rasil convergem para the dar certas caracteristicas proprlas, num sentidode m aior sincretism o, ou se quiserem , m aior indiferenclacao que noutroslug are s. A ssim , e ba stan te largo 0 se u ambito d e comp re en sao , en glo ba ndoa tiv id ad es q ue , n ou tro s p aise s, s er iam ro tu la da s d e h lsto ria s oc ia l, e tn olo gla ,antropologia cultural, folclore, politica. S incretism o que pode parecerind evido e ta lv ez 0 se ja em c erta m ed id a, m as c orre sp on de a c arac te ristic asd a n oss a evolucao m ental e necessidades ainda sentidas de com preensao danossa realidade. E la so tern sido prejudicial na medida em que nao criaambiente favoravel para 0 desenvolvim ento pleno das pesquisas sobre associedades urbanas e seus aspectos proprios, com tecnlcas quantitativas erecursos a estatistica, a via preferencial por que deve entrar a Sociologiam oderna, depois que os estudos de carater descritivo, de tonalidade quali-tativ a, foram in corpo ra dos p ela A ntro polog ia. M as, p or o utro lad o, p erm iteao espirito e aos m etodos soclologlcos estenderem -se por varies setores quelhe estariam vedados em paises de especlalfzacao a cad em ic a m ais e strita,enriquecendo 0 conhecim ento da realidade e facultando m aior plenitude apersonalidade dos estudiosos. A atual tendencla para a convergencia dasc ie nc ia s h um an as e nc ontra m esm o, n o B ra sil, terre no fa vo ra vel, d ad as esta sc on dlc oe s d a n os sa e vo lu ca o in te le ctu al.3 ) P ela falta d e re cu o e c on seq iien te d ificu lda de em av alia r a s c ontribu i-

    ~ oes, nao e facll um a apreciacao com preensiva da obra dos soclologos brasi-leiros cuja atividade com o grupo principia pouco antes de 1940 e da frutonos dois ultim os decenlos, H a atualm ente no B rasil pelo m enos m eio centoem producao ativa, contando-se por centenas os pesquisadores, tecnlcos eprofessores, m ais ou m enos especializados. N a relacao abaixo, figuram osque, exercendo a Sociologia ou, em alguns casos, a A ntropologia com o ati-v ida de pro fissio na l, ja ap re se ntam o bra d efin id a, salvo ra ra s e xce co es ja p u-blicada sob a form a de livro, e que ordenarem os (sem preocupacao de urnquadro ex austivo de nom es e orlentacoes) pelos topic os seguintes: (a) teo-ria; (b) sociedades prim itivas; (c) grupos afro-am ericanos; (d) sociedadesn is tic as: ( e) a cu ltu ra ca o d e im ig ra nte s; (f) fe nom en os d e u rb an iz ac ao : ( g )" so c io log ia s e sp eci ai s" .(a) E mbora m uitos soclologos tenham registrado em prefacios ou arti-

    gos os seus pontos de vista e poslcoes teoricas, poucos publicaram , ate ago-

    292 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    ra, livros consagrados a problem as gerais de teoria, propriam ente ditos.M erecem ser citados M ario L ins, G uerreiro R am os e Florestan Fernandes.A ssim com o nas prim eiras etapas da evolucao da nossa Sociologia os estu-diosos procuraram elaborar teorias fundadas num a apllcacao m ais ou m enosrigorosa de conceitos tornados as ciencia s blologlcas, M ario L ins, trilhandouma senda ja aberta por Pontes de M iranda com menos forca sistematica nocam po do D ireito, procura aproveitar no m esm o sentido certos principios daflsica m oderna. Em Espa fo - tempo e Re l a fo e sSoc ia i s( 1940 ), d es eja d ar a S ocio -logia conceitos com pativeis ao rigor das clencias exatas, na m edida em que tale possivel nas cienclas do hom em . O s conceitos de espaco e tem po, relacao em obilidade, sao tratados em funcao das m odernas teorias fisicas, levandotam bem em conta Pareto, Sim mel, V on W iese e Sorokin. R ejeita, porern, asep ara ca o fo rm alis ta en tre fo rm a e co nteu do , a lem d e reg istra r a s d ificu ld ad esde estender esquem as fislcos aos fatos sociais tornados na sua com plex idade.Em A tr an sf orma ra o d a l ag ic a c o nc e ptu a l d a s oc io lo g ia (1947 ), procura rever assuas bases conceituais a luz das novas teorias, fundadas na flsica m oderna. Afm alidade e garantir-Ihe nao apenas urn rigor interpretativo coerente com 0pensam ento cientifico, m as preparar a sua aplicacao adequada a realidade. O snovos conceitos de causalidade sao estudados com o garantia de afinidadeen tre a ex pllca ca o so clo lo gica e a d as cien cla s fisica s.

    G uerreiro R am os principiou por divulgar entre nos as teorias m odernassobre organfzacao racional do trabalho (A soci o log i a i ndus tr ia l , 1951), aomesm o tempo em que se dedicava aos problemas sociais brasileiros, que 0levaram a preocupacao acentuada com a velha "teoria geral do Brasil" . 0seu ponto de vista e que 0 trabalho soclologtco se vern perdendo em inves-tigal,;oes de deta lhe, em preendida s segundo m etodos torna dos de em presti-m o a os estra ng eiro s, in ad eq ua do s a n ossa rea lid ad e, g era nd o em co nse qu en clafa lso s p ro blem as, q ue d esv iam 0 soclologo da sua verdadeira finalidade. E staconsiste precipuam ente em construir um a lnterpretacao geral do pais, quesirva de ponto de partida aos estudos diretamente ligados aos problemasimediatos. No debate de tais ldeias, Guerreiro Ramos ainda apresenta decom um com os seus predecessores 0 metoda polemico e a apaixonada to-mada de poslcao, a maneira de urn Silvio Romero (C a rtilh a d o sp re nd izs o ci a logo , 1955 ).

    A obra teorica de F lorestan Fernandes compreende, alem de quase umadezena de artlgos m enores, tres livros: A an ;i /i se f un c io n a li sl a d a g u er ra : pom -b il id sd e s d e a p li ca ra o a s o ci ed s de t up i namba (1949), En sa io s ob re 0m eto da d ei nte rp re ta ra o f un c io n a li sta n a s oc io lo g ia (1953), Apon tame n to ss ob re o sp ro b le -

    A nto nio C an dido

    junho 2006 293

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    m as d a in dufa o n a so cio lo gia ( 1954) . Ap re se ntam , c omo tr ac e ger al, a c ar ac te -r is tic a de suc eder em a in te ns a a tiv id ade c ie ntif ic a, que perm itiu ao au to r, aoc on tr ario d e v ar ie s te oric os , a f am ilia rid ad e c om a ma te ria e 0 senso praticodos prob lemas.o p rim e iro liv ro e uma in ve stig ac ao a cu ra da s ob re a s p oss ib ilid ad es d eestabelecer 0 c onhec imento s is tematic o da s s oc ie dade s p rim itiv a s po r me ioda ana lis e da s f on te s p rima rla s de c ar ate r nao- cie ntlf lc o (pr e- de ntlf lc o) , noc as o o s c ro nis ta s e v ia ja nte s d os s ec ulo s XV I e XVI I s ob re o s tu pin ambas , Euma d is cu ss ao e xaus tiv a, em que 0 a uto r d em on stra a v alid ad e d o m eto dofu ncio na lista n a re co nstru ca o d o p assa do e n a slstem atiza ca o d e a sp ec to sd ou tro modo n ao c oo rd en av els p ara uma in te rp re ta ca o c oe re nte .No Ensaio, sao ab ordad os a lgu ns top lcos d e m aior im po rtan cla para aSociologia modema. 0 ponto de partida e 0 co nceito de fu ncao, q ue 0au to r, c on fo rme a lgumas te ndencia s a tu a is , ap lic a me tod ic amente ao tr aba-lh o s oc lo lo glc o, q ua ndo v in ha s en do u tiliz ad o s ob re tu do p elo s a ntro po lo -gos. 0 m etodo de que se trata aqui nao deve ser confundido com 0 destes,m as eng lob a-o d e certo m odo , n um sen tido m ais amp lo e comp reen sivo .T r ata -s e em u ltima analis e de r ec once itu a r 0me to do " po sitiv e" d e a lg uma ste ndencia s tr ad ic ionais da soc io log ia " re alis ta " , r enovado pela per spec tiv aatual. E 0 m etod o qu e pressu p6e um a preced encla lo glca do "to do " n a in -te rp re ta cao dos a spec to s pa rtic ula re s da v ida soc ia l, in te re ss ando- se nao po rinterpretar 0 sig nifica do d o comp ortamen to d os a gen tes (m eto do d e com-p re en sa o), n em por a fe ri- Io a o c ondic io namen to d e d ete rm in ado fa to r (m e -to do d ia le tic o, v . g .), m a s p or d ete rm in ar 0 p ap el d os fa to s s oc ia is n a in te -g ra ~ ao d e d ete rm in ado s is tema. 0 a uto r fu nd a-s e n a a na lis e d a c on trib uic aode tr es e stud io so s que the pa re cem rep re se nta r, a titu lo s d iver so s, a o rie nta -~aoe s tudada: Du rkheim , Radclif fe -B rown , Me rton . Co loca -s e, po rem , naon um a a titu de g en erlca em fa ce d a ex pllca ca o so clo lo glca , m as n um p on tod e v ista d elim ita do , p ro cu ra nd o d eterm in ar p oslco es a deq ua da s a o tra ta -mento de s itu acoes empir ic as def in id a s.E sta d ellm ita ca o e lo gicame nte a pro fu nd ad a n os Apontamentos , onde

    toma pos lc ao por uma s oc io lo gia empiric a, b as ea da no a cumulo me to dic o d edados s egundo d ir etr iz es h ipo te tic as def in id a s, a f im de fomece r ba se par a a soper ac oe s indutiv a s, que analis a em suas var la s modalid ade s, tanto s ob 0 as-p ec to q uantita tiv o c omo s ob 0 qualita tivo . As con tr ibu lc oe s de Durkheim ,Webe r e Marx s ao e studada s, n es te s en tido , a l uz das orl en tacoe s mai s mode r-na s da me todolog ia das c le nc la s. A posic ao do auto r e c ompre en siv a e despidade dogma tismo, no rte ada pela c onv lc cao, j a man if es ta no tr aba lho ante rio r,

    294 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    de que a S ociologla so m archara para form as m ais rigorosas de explicacao sepe rsistir na an alise de situacoes de lim ita das po r m eio do s proc essos em piri-cos. Julgada no conjunto a contr ibulcao me to do lo glc a d e F lo re sta n F er na n-de s, e aferid a a o se ntido d a n ossa evolucao s oc io lo gi c a , v emo s q ue r ep re se nt aa g ra nd e expressao teor ica do processo pelo qual vim os passando de umaSociologia global para um a S ociologia com objeto definido, de urn metodoev olu tiv o e c om pa ra tivo pa ra form as m ais rigorosas de Inducao. Representa 0sina l d e qu e rea lizamo s n o B ra sil, p or varies m odos, a m archa geral da S ocio-logia a busca de carater cientifico: restrlcao de cam po, deflnicao de objeto ,d ete rm ln ac ao d e m eto do .

    (b ) N os e stu do s sob re a s so cie da des p rim itiv as e fr eq ue ntem en te d if ic ildistinguir os que dependem de outras disciplinas e os que cabem na Socio-logia, a despeito de os autores os enquadrarem ou nao sob a sua egtde, NoB rasil, constituem terreno bastante palm ilhado, visto com o a E tnografia foientre nos, bern cedo, urn dos ram os prediletos dos que se interessavam peloestudo das sociedades. D eix ando de lado trabalhos baseados na descrtcao ena lnterpretacao de aspectos puram ente culturais, m encionem os apenas osq ue d ed ic am a te nc ao so bre tu do a os a sp ec to s o rg an lz ato rio s, a f un ca o s oc ia ldos traces, apresentados com referenda ao contex to. N este sentido pode-m os m encionar a atividade de E gon Schaden, G ioconda M ussolini, L ucilaH errm ann , F lo resta n F erna nde s, F erna ndo A lte nfelde r S ilv a.A E gon Schaden devem os principalm ente dois livros, Ensai o e tno -s o ci -

    o la gic o s ab re a m ito lo gia h era ic a d e a lg um as trib os in dig en as d o B ra sil (1 94 5)e Aspec to s f undament ai s da cu ll ur a guaran i ( 19 5 4) . Aque le c on sti tu i p or ventu raa prim eira contribuicao brasileira ao estudo dos m itos segundo as teoriasm odernas, interessadas m enos na analise etlologica ou com parativa quena determ lnacao do significado funcional. N o segundo, sobrelevam preo-cupacoes de ordem m ais estritam ente antropologlca, centralizadas peloproblem a da aculturacao, que 0 a uto r foc aliz a em varies s et ores , mos tr an -do particularm ente a lm portancia das representacoes religiosas na inte-gracao do grupo e seu contato com as com unidades luso-brasileiras. "Eno sistem a religioso que, apesar das grandes diferencas de urn subgrupopara outro , a cultura guarani en contra a expressao m axim a de sua unida-de fundamental. E e na rellglao que os m ecanism os de defesa e as condi-~oes de resistencla cultural aparecem de m aneira m ais m anifesta." D ai alm portancla do estudo sobre 0m ito do Paraiso, a "terra sem m ales", paracom preender os m ecanism os de frustracao coletiva e sua consequencla nasre la co es in tr a e in te rg ru pa is .

    A nto nio C an dido

    junho 2006 295

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    A G io cond a Muss olin i, v olta da s ob re tu do p ara o s e stu do s d e c ultu ra c a-bocla , d e vemos O s m e ios de defe sa co ntra a m olestia e a m orte em d uas tribosbra sile ira s: K ain ga ng d e D uq ue d e C axia s e B oro ro O rie nta l (1946). E um ae sp ec ie d e " so cto lo gta d a d oen ca ", em q ue a a uto ra e stu da (so bre m ateria lt or nado a sob r a s de Ju le s Hen ry , Co lbacc hi ni e A l bis etti ) a ge ne se ,0 conceitoe a funcao da doenca e da m orte em duas culturas preocupadas com taisp robl emas , mos trando 0 p ap el d a in te gra ca o s ocia l, d a c on cep ca o d e v id a,b ern c omo o s e f eito s d a doe nc a n a d ef ln lc ao d e status, na expre ssaogrupa l e tc .Sobre 0 ric o ma te ria l c olh id o p elo ma lo gr ad o m is sio na rlo b en ed itin o

    dom M auro W irth , L ucila H errm ann escreveu A o rg an iza r8 0 so cia l d osV ap id ia na d o t emtor io d o R io B ra nco ( 19 46 ), a na lis ad a a p ar tir d os g ru po sd ia le ta is , r es id enc la e c ic lo de v ida , p a ss ando em segu ida a s assoclacoes porp are nte sc o, te rr lto rio , c on viv en cla o u c omemora ca o, p ara fin aliz ar c om a sfo rm as d e co ntro le p olitico , o nd e a bo rd a m ais d e p erto p ro blem as d e m u-danca cu lt ura l.F lo re stan Fe rnande s publi cou em 1949 Orga n iz a r8 o s oc ia l d o s T u pi namba

    e em 1952 A f un r8 0 so cia l d a g ue rra n a so cie da de tup insmbs; baseados numave rdade ir a r eavall ac ao analiti ca do ma te ria l c ons tit uido pe la s c ron ic as e r e-la to s d os sec ulo s XV I , XV I I e XV I II . N o p rim eiro , p ro ce de a rec on stru ca od a o rg an iz ac ao s oc ia l d os Tupln amba, c omb in ando a e xe ge se t ex tu al o s re -c u rs os me todol og lc os da Soci olog ia moderna . Sob e ste ponto de v is ta , pode -s e d iz er q ue 0 tr aba lho ap re se n ta duas c ontr ibu lc oes ba sl ca s: r enovacao daste cn lc as d e le itu ra e c omp re en sa o dos c ro nis ta s, e a pllc ac ao do me to do fu n -c ional is ta a s ls tema tlz ac ao dos dados a ss im reun ido s. Med ia tamente r es ultaem ren ov aca o d os p on to s d e v ista ate a qu i ex pen did os so bre a organfzacaod os in dig en as estu da do s, e a a flrm a ca o d as p oss ib ilid ad es d a S oc io lo glamoderna na r ec on s tr uc ao de s is temas soc ia is nao s at is fa to riamente e xplic a-d os p elo tr atamen to h is to ric o o u e tn og ra flc o,o segundo l iv ro acen tua a inda mai s as possi bi li dade s funciona li st as apre-sen ta das n o a nterio r, seg un do a comb ln aca o a gu da d o q ue se p od eria ch a-mar 0 " se ns o d a f un ca o" c om 0 "senso da e s tru tu ra" , c a rac te ri st ico de vari estra balh os d a a ntro po lo gia so cial in glesa. 0 a uto r m ostra, n este sen tid o,a po s ex au stiv a a na lise co ntex tu al, c om o a g uerra e a v in dita d esemp en ha -v am , n a s oc ie da de tu pln amba, f un ca o in te gr ad ora , m e rc e d as imp llc ac oe smag lc o -r ellg lo s as , e conom i c a s e tc ., que t ra zi am cer ta s atls fa cao ne ce ss ar iaa o e qu ilib rio d a p er so na lid ad e e d as r ela co es g ru pa is .Em Mudsac s oc ia l d o s T e re n a ( 1951 ), F e rnando A l te nf eld er S il va anal i-

    sa 0 p ap el, n es se fe nomeno que e stu dou in lo co , d a tro ca d e m eio g eo gra fl-

    296 Tem po S ocia l, re v is ta de soc io log ia da U SP , v . 18 , n . 1

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    co , c on ta to com a s popula co es ma to -g ro sse nse s, c ate qu ese , n ovos meio s d ev id a, q ue in flu iram dec id id amen te n o s en tid o d a d es trib allz ac ao . O s a tu aisT ere na s ao ca to llco s o u p ro tes ta nte s, b llin gu es, in te gra do s n a ec onom ia la -tlfu nd la rla , p ra tica ndo d an ca s e fo lg uedos d a c ultu ra c ab ocla embora c on -servem pra tic as maglco- re ll gl osas e a consclenci a e tn ic a - 0que n ao p erm iteconsidera-los assimilados.(c ) 0 es tu do dos g ru po s a fro -b ra sile iro s, o u a fro -americ an os em s en tid o

    ma is amplo , p roce ss ou -s e, n a ma io ria , a margem de p re ocupacoe s s oc io lo -glcas , t endendo a ps ico log ia , h ls to ri a, folc lo re , an tropo log ia cu lt ural , s et o-res em que co nstitui objeto de um a producao abund ante, e nao raro de boaqua lid ad e, s ob a ln flu en cia d e A rtu r R amo s (h erd eiro , ele p ro prio , d a tra di-c;a o de N in a Rodrig ues ), G ilb erto F re yre e o utro s.Num se ntid o ma is p ro ximo a Sociolog la , ou seenquadrando in te ir amen-

    te n ela , d esta qu emo s O ta vio d a Co sta E dua rd o, R uy Coelh o, T ale s d e Aze ve -do, L. A . d a Co sta P in to e a p ub llc aca o c ole tiv a R e la f o es r a ci a is e n tr e n e g ro s ebrancos em Sao Paulo , s ob a d lr ec ao de Roger Bastid e e F lo re stan Fernandes .Em T he n eg ro in N o rth ern B ra zil (1 94 8), d iz O tav io d a C osta E du ard o

    que 0 n eg ro d as comu nid ad es m ara nh en ses, ru rais e u rb an as, a ju sto u-sebern a s ltuacao aculturat iva. Conservando t races d a cu ltu ra d e o rig em , a do -tan do o utro s d o m eio em q ue v iv e, alcan ca uma sin tese q ue g ara nte 0 equi-lib r io da sua per sona lid ade, v is to c omo te rn n itid a c on sc ie nc la do s a spec to sc on flitu ais da c ultu ra que des envo lveu . Nao s e r e gis tr a, a ss im , amblvale nc laou tensao psiquica, em bora os negros da cidade rev elem m aior indice deInseguranca, Para a ti ng ir 0 objetivo, 0 a uto r e stu dou o s meio s d e v id a, o rg a-n lza ca o d a familia , re llg ia o, ritu al d a mo rte .Em The b la ck C arib o f H ondura s (1954), R uy C oelho, discipulo de

    H ersk ov its, como O ta vlo E du ard o, estu da a a cu ltu ra cao d esse g ru po cen -tr o- ame ric ano a tr aves da o rgan lz ac ao soc ia l, f uncao e conom ic a da f am ilia ,p ap el d o so bre na tu ra l, p ara co nclu ir p ela e xlste nc ia d e nota ve l u nid ad e cu l-tu ra l, a p artir d a fu sa o dos tre s e lemen to s etn ic os o rig in ais: a fr ic an o, eu ro -peu , indigena. E s ta homogene idade e d ev id a, d o pon to d e v is ta h is to rlco , afa lta d e u rn g ru po africa no comp acto d a m esm a o rig em q ue p ud esse p red o-m in ar n o p ro ce ss o; a o c re sc im en to p ela in clu sa o d e in div id uo s n os g ru po s;a p re ss ao do coloniz ador e uropeu , le vando a unia o p ara so bre viv en cla . Doponto de v is ta i ns ti tuc ional , a f le xib ilid ade da e str utu ra s oc ia l e c ultu ra l d aAfr ica Ocidental ; a re ln te rp re ta ca o, a tu an do s ob re e lemen to s d as tre s o ri-g en s. D o p on to d e v ista p slco lo gico , a lmport anci a confer ida a iniciativain div id ua l, p erm itin do a a do cao h armonio sa d os e lemen to s c ultu ra is.

    A nto nio C an dido

    junho 2006 297

  • 5/14/2018 CANDIDO, Antonio. Sociologia No Brasil [Rev. Tempo Social] (1)

    http:///reader/full/candido-antonio-sociologia-no-brasil-rev-tempo-social

    A soc io lo gia no B ra sil, p p. 2 71-3 01

    E nquanto estes trabalhos se enquadram m elhor nos m oldes antropolo-gicos e visam a fornecer elem entos para 0 estudo dos grupos negros "em sl",os seguintes sao feitos conforme ponto de vista soclologlco e estudam aposlcao dos negros e m esticos no conjunto da vida social.Em L es e lite s d e c ou le ur d an s u ne v ille b ris ilie nn e (1953, 0 o ri gi na l b ra si -

    leiro foi publicado em 1955), T ales de A zevedo investiga a ascensao socialdos elem entos de cor na B ahia, chegando a conclusoes sensivelm ente analo-gas as de Pierson: ausencia de dlscrim lnacao violenta; ascensao possivelmediante 0 ex ito pe ssoal; co nceito c onve ncio nal de bran cura sanc iona ndo apo si cao adqu ir id a .Ja em 0 negro no R io de Jane iro (1953),1. A. da Costa P into se colocaem poslcao diversa. E studando a situacao racial do ponto de vista dem ogra-

    fico, estrutural, ecologtco