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ESTRUTURA E F U N Ç Õ E S DO C Ó R T E X CEREBRAL 261 4.2 FILOGENÉTICA DO CÓRTEX Do ponto de vista pode-se divi- dir o córtex cerebral em arquicórtex, tex e conforme já foi exposto no capítulo 8 (item No homem, o arquicórtex está localizado no hipocampo, enquanto o pa- ocupa o uncus e parte do giro para-hi- pocampal. Todo o resto do córtex classifica-se como Arqui e ocupam, pois, áreas corticais antigas ligadas à olfação e ao comportamento fazendo parte do rinencéfalo e do sistema límbico, como será estudado no próximo capítulo. 4.3 — CLASSIFICAÇÃO ESTRUTURAL DO CÓRTEX córtex cerebral tem sido objeto de meticu- losas nas quais fo- ram estudados diversos aspectos de sua estru- tura, tais como a composição e característica das diversas camadas, espessura total e espes- sura das camadas, disposição e espessura das raias e estrias base nestes estudos, o córtex cerebral pode ser dividido em numerosas áreas havendo vários mapas de divisão. Assim, von Economo distinguiu no córtex cerebral do homem áreas, enquanto o casal Vogt conseguiu identificar mais de 200 áreas. Contudo, a divisão mais aceita é a de que identificou 52 áreas designadas por números (Figs. 27.2 e 27.3). As áreas de Brodmann são muito conhecidas e amplamente utilizadas na clínica e na pesquisa médica. As diversas áreas corticais podem ser clas- sificadas em grupos maiores de acordo suas características comuns, da maneira indi- cada na chave que granular Isocórtex é o córtex que tem seis camadas nítidas, ao menos durante o período embrioná- rio. Alocórtex é o córtex que nunca, em fase alguma de seu tem seis cama- das. No isocórtex as seis camadas corticais são sempre individualizadas faci- lidade. Já no isocórtex heterotípico as seis ca- madas não podem ser claramente individuali- zadas no adulto, uma vez que a estrutura lami- nar típica encontrada na vida fetal, é mascarada pela grande quantidade de células granulares ou piramidais, que invadem as camadas II a VI. Assim, no isocórtex heterotípico granular, ca- das áreas sensitivas, há uma enorme quantidade de células granulares que invadem, inclusive, as camadas piramidais (III e V) um desaparecimento quase completo das célu- las piramidais. Já no isocórtex heterotípico agranular, característico das áreas motoras, há considerável diminuição de células granulares e uma enorme quantidade de células piramidais que invadem, inclusive, as camadas granulares (II e IV). isocórtex ocupa da cortical e corresponde ao ou seja, ao córtex filogenicamente recente. alocórtex ocupa áreas antigas do cérebro e corresponde ao arqui e — CLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL DO CÓRTEX Do ponto de vista funcional, as áreas corti- cais não são homogêneas, como se acreditava no início do século XIX. A primeira comprova- ção desse fato foi feita em pelo cirurgião francês Broca, que pôde correlacionar lesões em áreas restritas do lobo frontal (área de Bro- ca) a perda da linguagem falada. Pouco mais tarde, surgiram os trabalhos de e que conseguiram provocar movimentos de certas partes do corpo por estimulações elé- tricas em áreas específicas do córtex do cão. Esses autores fizeram assim o primeiro mapea- mento da área motora do córtex, estabelecendo pela primeira vez o conceito de somatotopia das áreas corticais, ou seja, de que existe correspon- dência entre determinadas áreas corticais e cer- tas partes do corpo. conceito das localizações funcionais no córtex sofreu um abalo quando se conseguiu causar movimento por estimulação de áreas corticais, tidas como exclusivamente Entretanto, a existência de locali- zações funcionais é geralmente aceita, e seu estudo tem grande importância não só para a compreensão do funcionamento do cérebro,

Cap. 27 - Neuroanatomia Machado

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:Cap. 27 - neuroanatomia machado

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  • ESTRUTURA E F U N E S DO C R T E X CEREBRAL 261

    4.2FILOGENTICA DO CRTEX

    Do ponto de vista pode-se divi-dir o crtex cerebral em arquicrtex,tex e conforme j foi exposto no captulo 8 (item No homem, o arquicrtex est localizado no hipocampo, enquanto o pa-

    ocupa o uncus e parte do giro para-hi-pocampal. Todo o resto do crtex classifica-se como Arqui e ocupam, pois, reas corticais antigas ligadas olfao e ao comportamento fazendo parte do rinencfalo e do sistema lmbico, como ser estudado no prximo captulo.

    4.3 CLASSIFICAO E S T R U T U R A L DO CRTEX

    crtex cerebral tem sido objeto de meticu-losas nas quais fo-ram estudados diversos aspectos de sua estru-tura, tais como a composio e caracterstica das diversas camadas, espessura total e espes-sura das camadas, disposio e espessura das raias e estrias base nestes estudos, o crtex cerebral pode ser dividido em numerosas reas havendo vrios mapas de diviso. Assim, von Economo distinguiu no crtex cerebral do homem reas, enquanto o casal Vogt conseguiu identificar mais de 200 reas. Contudo, a diviso mais aceita a de

    que identificou 52 reas designadas por nmeros (Figs. 27.2 e 27.3). As reas de Brodmann so muito conhecidas e amplamente utilizadas na clnica e na pesquisa mdica.

    As diversas reas corticais podem ser clas-sificadas em grupos maiores de acordosuas caractersticas comuns, da maneira indi-cada na chave que

    granular

    Isocrtex o crtex que tem seis camadas ntidas, ao menos durante o perodo embrion-rio. Alocrtex o crtex que nunca, em fase alguma de seu tem seis cama-das. No isocrtex as seis camadas

    corticais so sempre individualizadas faci-lidade. J no isocrtex heterotpico as seis ca-madas no podem ser claramente individuali-zadas no adulto, uma vez que a estrutura lami-nar tpica encontrada na vida fetal, mascarada pela grande quantidade de clulas granulares ou piramidais, que invadem as camadas II a VI. Assim, no isocrtex heterotpico granular, ca-

    das reas sensitivas, h uma enorme quantidade de clulas granulares que invadem, inclusive, as camadas piramidais (III e V)um desaparecimento quase completo das clu-las piramidais. J no isocrtex heterotpico agranular, caracterstico das reas motoras, h considervel diminuio de clulas granulares e uma enorme quantidade de clulas piramidais que invadem, inclusive, as camadas granulares (II e IV).

    isocrtex ocupa da cortical e corresponde ao ou seja, ao crtex filogenicamente recente. alocrtex ocupa reas antigas do crebro e corresponde ao arqui e

    CLASSIFICAO F U N C I O N A L DO CRTEX

    Do ponto de vista funcional, as reas corti-cais no so homogneas, como se acreditava no incio do sculo XI X . A primeira comprova-o desse fato foi feita em pelo cirurgio francs Broca, que pde correlacionar leses em reas restritas do lobo frontal (rea de Bro-ca) a perda da linguagem falada. Pouco mais tarde, surgiram os trabalhos de e

    que conseguiram provocar movimentos de certas partes do corpo por estimulaes el-tricas em reas especficas do crtex do co. Esses autores fizeram assim o primeiro mapea-mento da rea motora do crtex, estabelecendo pela primeira vez o conceito de somatotopia das reas corticais, ou seja, de que existe correspon-dncia entre determinadas reas corticais e cer-tas partes do corpo. conceito das localizaes funcionais no crtex sofreu um abalo quando se conseguiu causar movimento por estimulao de reas corticais, tidas como exclusivamente

    Entretanto, a existncia de locali-zaes funcionais geralmente aceita, e seu estudo tem grande importncia no s para a compreenso do funcionamento do crebro,

  • 262 F UN CIO N A L

    mas tambm para diagnstico das diversas leses que podem acometer rgo.

    As localizaes funcionais devem no entanto ser consideradas como especializaes funcio-

    nais de determinadas reas e no comotimentos isolados c estanques. Assim, a possi-bilidade de se obter movimento porda rea somestsica (rea da so-

  • ESTRUTURA E DO C R T E X CEREBRAL 263

    no invalida o fato de que, pelo menos nos se trata de uma rea primordial-mente sensitiva. Alm do mais, as localizaes funcionais do crtex e a distino entre reas motoras e encontram apoio na pr-pria do crtex, como ser visto mais adiante.

    As vrias reas funcionais do crtex foram inicialmente classificadas em dois grandes gru-pos: reas projeo e reas associao. As reas de projeo teriam conexes cen-tros enquanto as reas de asso-ciao teriam conexes apenas outras reas corticais. Essa conceituao inicial no pode mais ser mantida, uma vez que est demons-trado que todas as reas corticais tm conexes

    centros subcorticais, especialmente o sistema ativador reticular ascendente, cuja ao ativadora se exerce sobre todo o crtex. Contu-do, a diviso do crtex cerebral em reas de projeo e de associao, embora bastante es-

    ainda til e pode ser usada dentro de uma conceituao nova: reas de projeo so as que recebem ou do origem a fibras relacionadas diretamente a sensibilidade e

    a motricidade. As demais reas so coasi- de associao e, de modo geral, esto

    relacionadas a funes psquicas complexas. Assim, leses nas reas de projeo podem causar paralisias ou alteraes na sensibilidade, o que no acontece nas reas de associao. Leses dessas reas, entretanto, podem causar

    psquicas.

    As reas de projeo podem ser divididas em dois grandes grupos, de funo e estrutura dife-rentes: reas sensitivas e reas motoras. Nas reas sensitivas do existe isocrtex

    do tipo granular, o que est de acordo a funo primordialmente recepto-ra das clulas granulares. Nas reas motoras existe isocrtex heterotpico agranular, o que est de acordo a funoefetuadora das clulas piramidais, que, como j foi visto, predominam nesse tipo de crtex. J nas reas de associao no existe

    a distino as reas motora e somestsica difcil cm mamferos mais primitivos. Assim, no

    gamb e na a rea motora coincidea (Magalhcs-Castro, B. Saraiva, P.E.S.

    Brain Research, 34:291-299 c Saraiva, P.E.S. & Magalhcs-Castro, B. 1975 Brain193).

    isocrtex tpico, pois, no sendo elas nem sensitivas nem motoras, no h grande predo-mnio de clulas granulares ou o que permite a fcil individualizao das seis cama-das corticais. russo Alexan-dre props uma diviso funcional do crtex baseada no seu grau de relacionamento

    a motricidade e a sensibilidade. As reas ligadas diretamente sensibilidade e motricidade, ou seja, as reas de projeo, so coasideradas reas primrias. As reas de as-sociao podem ser divididas em secundrias e tercirias. As primeiras so tambm chamadas de reas unimodais, pois esto ainda relaciona-das, embora indiretamente, uma determi-nada modalidade sensorial ou a motrici-dade. As conexes de uma determinada rea de associao uni modal se fazem predominante-mente a rea primria da mesma funo. Assim, por exemplo, a rea de associao

    visual recebe fibras predominantemente da rea visual primria ou rea de projeo visual.

    J as reas tercirias so supramodais, ou seja, no se ocupam mais do processamento motor ou sensitivo, mas esto envolvidasatividades psquicas superiores como, por exemplo, a memria os processos simblicos e o pensamento abstrato. Mantm conexes com vrias reas unimodais ou outras reas supramodais, e sua leso causa alteraes ps-quicas sem qualquer conotao motora ou sen-sitiva.

    A chave seguinte o que j foi expos-to sobre a classificao funcional das reas cor-ticais e as Figs. 27.6 e 27.7 mostram a dis-posio dessas reas no crebro.

    reas funcionais do cr tex cerebral

    sensitivas de proje o

    de associao

    secundrias (unimodais)

    Luria, A. R. cortical functions in man". from Russian by Haigh. Basic Books

    York, 634 pp.

  • NEUROANATOMIA FUNCIONAL

    REAS DE PR OJE O (REAS PRIMRIAS)

    j foi visto, reas, tambm cha-madas reas primrias, relacionam-se direta-mente a ou a motrici-dade. Existe uma s rea primria motora, si-tuada no lobo frontal, e vrias reas primrias sensitivas nos demais lobos. De modo geral, a cada tipo de sensibilidade especial corresponde

    rea primria, enquanto todas as formas de sensibilidade geral convergem para uma s

    a rea somestsica. As reas corticais pri-mrias so estudadas a seguir.

    5.1 REAS SENSITIVAS PRIMRIAS

    Somestsica

    A rea somestsica primria ou rea da sen-sibilidade somtica geral est localizada no giro ps-central, corresponde reas 3, 2, 1 do

    de (Fig. 27.6). 3 locali-za-se no fundo do sulco central, enquanto as reas 1 c 2 aparecem na superfcie do giro

    A chegam radiaes talmicas que originam nos ncleos pstero-lateral

    e ventral do tlamo e trazem, por conseguinte, impulsos nervosos relaciona-dos temperatura, dor, presso, tato c proprio-cepo consciente da metade oposta do corpo. Quando sc estimula a rea somes-tsica. o indivduo tem manifestaes sensitivas em partes determinadas do porm mal

    do tipo ou formigamento. Por outro lado, se so estimulados receptores exteroceptivos ou se so leitos movimentos em determinadas articulaes de modo a ativar re-ceptores tomar poten-ciais evocados nas partes correspondentes da rea somestsica. concluir, assim, que existe correspondncia entre partes do corpo e partes da rea somestsica

    Para representar essa somatotopia,e imaginaram um sen-

    (Fig. 27.4) dc cabea para baixo no giro ps-central. Na poro superior desse giro, na parte medial do hemisfrio, localiza-se a rea dos rgos c do p, seguida, j na parte spero-lateral do das reas da per-na, do tronco e do brao, todas pequenas. Mais

    abaixo a rea da mo, que muito grande, seguida da rea da onde a e a boca tm representao tambm bastante gran-de. Segue-se, j prxima ao sulco lateral, a rea da lngua e da faringe. Essa somatotopia fun-damentalmente igual observada na rea mo-tora e nela chama ateno o territrio de repre-sentao da mo, especialmente dos o qual grande. Esse fato de-monstra o princpio, amplamente confirmado em estudos feitos cm animais, de que a extenso da representao cortical dc uma parte do corpo depende da importncia funcional dessa parte para a biologia da espcie e no de seu

    Leses da rea somestsica podem ocorrer, por exemplo, como conseqncia de acidentes vasculares cerebrais que comprometem as art-rias cerebral mdia ou cerebral anterior.ento, perda da sensibilidade do lado oposto leso. doente perde a capaci-dade dc discriminar dois pontos, perceber mo-vimentos de partes do corpo ou reconhecer di-ferentes dc estmulo. Apesar de distinguir as diferentes modalidades de est-mulo, ele incapaz de localizar a parte do corpo tocada ou de distinguir graus de temperatura, peso c textura dos objetos tocados. Em decor-rncia disso, o doente perde a estereognosia. ou seja, a capacidade de reconhecer os objetos colocados em sua mo. interessante lembrar que as mais grosseiras delidade (sensibilidade como o tato no discriminativo c a sensibilidade trmi-ca c dolorosa, permanecem praticamente inal-teradas, pois, j foi elas se tornam conscientes em nvel

    rea Visual

    nos lbios do sulco e corresponde 17 de Brodmann (Figs. 27.6,

    na rea do tamandu destaca-se gran-de representao cortical da est dc acordo

    importncia desse rgo na biologia do animal (Saraiva, EG. e 1972 Cinci a e

    A rea somestsica acima descrita tambm conhecida rea somestsica tambm rea somes-

    tsica muito situada borda sulco adjacente insula. Ambas recebem projees dos

    mesmos ncleos talmicos, mas organizao somatotpi- em mais precisa que em

    das partes do corpo Sll bilateral.

  • ESTRUTURA E F U N E S DO C R T E X CEREBRAL 265

    27.7). A chegam as fibras do tracto originadas no corpo geniculado late-

    ral. eltricas da 17 causam alucinaes visuais, nas quais o indivduo v crculos brilhantes, nunca objetos bem defini-dos. pontos especficos da reti-na com um jato de luz pode-se tomar potenciais eltricos evocados em partespecficas da rea Verificou-se, assim, que a metade superior da retina projeta-se no lbio superior do sulco calcarino e a inferior, no lbio inferior desse sulco. A parte posterior da retina (onde se localiza a mcula) projeta-se na parte posterior do sulco calcarino, enquanto a parte anterior projeta-se na poro anterior desse sulco. Existe, pois, correspondncia per-feita entre retina e crtex visual. A ablao bilateral da rea causa cegueira completa na espcie humana. Em outros mamferos, o sen-tido da viso no est completamentezado e pode persistir alguma sensao lumino-sa, que permite ao animal desviar-se dos objetos em seu caminho, mesmo aps leso bilateral da rea visual.

    5.1.3 rea Auditiva

    A rea auditiva est situada no giro temporal transverso anterior (giro de Heschl) e corres-ponde s reas 41 e 42 de Brodmann (Fig. 27.6). Nela chegam fibras da radiao que se originam no corpo geniculado Estimu-laes eltricas da rea auditiva de um indi-vduo acordado causam alucinaes auditivas que, entretanto, nunca so muito precisas, ma-nifestando-se como zumbidos. Leses bilaterais do giro temporal transverso anterior causam surdez completa. Leses unila-terais causam auditivos pequenos, pois, ao contrrio das demais vias da sensibilidade, a via auditiva no totalmente cruzada. Assim, cada cclea representa-se no crtex dos dois hemisfrios. Na rea auditiva existe tonotopia, ou seja, sons de determinada freqncia proje-tam-se em partes especficas desta o que implica uma correspondncia dessas partes

    as partes da cclea.

    rea Vestibular

    Fig. 27.4 das do corpo na rea sensitivo e Rasmussen).

    ma ao territrio da rea somestsica correspon-dente face. Assim, a rea vestibular est mais relacionada a rea de projeo da sensibi-lidade do que a auditiva. Alis, os receptores do vestbulo j foram clas-sificados como proprioceptores especiais, pois informam sobre a posio e o movimento da cabea. Foi sugerido que a rea vestibular do crtex seria importante para apreciao cons-ciente da orientao no espao.

    Area

    A rea olfatria, muito grande em alguns mamferos, ocupa no homem apenas uma pe-quena rea situada na parte anterior do uncus e do giro para-hipocampal (Fig. Certos casos de epilepsia local do uncus causam aluci-naes olfatrias, nas quais os doentesmente se queixam de cheiros, em geral desagra-dveis, que na realidade no existem. So as chamadas crises que podem ter ape-nas essa sintomatologia ou completar-se uma crise epilptica do tipo

    Sabe-se hoje que a rea vestibular localiza-se no lobo parietal, em uma pequena regio

    * Mais precisamente nas reas e que constituem a poro anterior do lobo

  • 266 NEUR OANAT OMIA FU NCIO NA L

    Area Gustativa

    Corresponde rea 43 dc (Fig. 27.6) e se localiza na inferior do giro ps-central, prxima cm umaadjacente da rea somestsica corres-pondente lngua. Estimulaes eltricas ou crises epilpticas cujo loco se inicia nessa re-gio causam alucinaes guslativas. Leses dessa rea provocam uma diminuio da gus-tao na metade oposta da lngua.

    5.2 REA M O T O R A PRIMRIA

    Ocupa a parte posterior do giro pr-central correspondente rea 4 de Brodmann (Fig. 27.6). Do ponto dc vista um isocrtex agranular caracterizado pela presena das clulas piramidaisou clulas dc Bctz. A eltrica da rea 4 determina movimentos de grupos mus-culares do lado por exemplo, da mo, do brao Do mesmo modo, focos epilpti-cos situados na 4 causam movimentos de grupos musculares isolados, podendo se esten-der progressivamente a outros grupos, medida que o estmulo se propaga. auxlio desses dois estimulao eltrica e observa-o de casos de focal foi possvel

    o crtex motor primrio de acordo com a representao das diversas partes do cor-po, ou seja, foi possvel fazer sua somatotopia. Essa somatotopia corresponde j descrita para a somestsica e pode ser representada por um homnculo cabea paramostra a Fig. 27.5. interessante notar a grande extenso da rea correspondente mo quando comparada com as reas do tronco e membro inferior. Isso mostra que a extenso da repre-sentao cortical dc parte do corpo na rea 4 proporcional no a seu mas delicadeza dos movimentos realizados pelos grupos musculares a localizados. Os primeiros estudos sobre eltrica da rea 4 levaram idia errnea de que em um determi-nado ponto dessa rea estariam representados movimentos elementares envolvendo vrios msculos. Entretanto, tcnicas mais moder-nas, em a estimulao se faz

    foi possvel evidenciar a de msculos isolados. Sabe-se tambm que o mes-mo msculo pode estar representado mais

    27.5 Representao das do na motora. Homnculo (segundo c

    de um ponto, indicando a existncia de conver-gncia desses pontos sobre mesmo grupo de neurnios motores. As conexes afe-rentes da motora so com o tlamo atravs do qual recebe do cerebelo

    a rea somestsica e as reas c motora suplementar. Por sua vez,

    no homem, a rea 4 d origem maior parte das libras dos tractos crtico-espinhal c corticonu-clear, principais responsveis pela motricidade voluntria.

    6.0 REAS DE ASSOCIAO DO CRTEX

    pode-sereas de associao do crtex aquelas que no se relacionam diretamente a motricidade ou a sensibilidade. Os efeitos das leses ou estimulaes dessas reas so de avaliao mais difcil, especialmente animais, pois geral-mente no resultam em alteraes da motrici-dade ou da sensibilidade. Por isso, essas reas foram durante muito tempo denominadas reas silenciosas do crtex.

    Durante a filognese, houve um aumento das reas corticais de associao, que no homem ocupam um territrio cortical muito maior que o das reas de projeo. Esse fato pode ser correlacionado o grande desenvolvimento das funes psquicas do homem.

  • ESTRUTURA E F U N E S DO C R T E X CEREBRAL 267

    A seguir sero estudadas as reas de as-sociao mais importantes, agrupadas de acor-do a classificao vista anteriormente em

    secundrias c reas

    6.1 REAS DE ASSOCIAO SECUNDRIAS

    Como j foi visto, essas reas so unimodais, ou seja, relacionam-se, ainda que indiretamen-te, alguma modalidade de sensao oua motricidade, estando geralmente justapostas s reas primrias correspondentes (Figs. 27.6, 27.7). Podem ser sensitivas ou motoras.

    6.1.1 reas de Associao Secundrias Sensitivas

    So conhecidas trs reas sensitivas secun-drias ou reas sensitivas dc associao:

    a) rea somestsica situa-se no lbulo superior, logo atrs da rea somestsica primria, e corresponde rea 5 e parte da rea 7 de Brodmann (Figs. 27.6, 27.7);

    b) visual secundria at h pouco tempo acreditava-se que essa rea estaria limitada ao lobo occipital, situando-se adiante de rea visual primria, corres-pondendo s reas c 19 de Brodmann. Sabe-se hoje, entretanto, que nos prima-tas, inclusive no homem, ela estende ao lobo temporal, onde tambm ocupa as reas 20, 21 e 37 dc Brodmann (Figs. 27.6, 27.7);

    c) rea auditiva secundria situa-se no lobo temporal, circundando a rea auditi-va primria, e corresponde rea 22 de Brodmann (Fig. 27.6).

    As reas secundrias recebemprincipalmente das reas primrias correspon-dentes e repassam as informaes recebidas s outras reas do crtex, em especial s reas supramodais.

    Para que possa entender melhor ocado funcional das reas secundrias, cabe des-crever os processos mentais envolvidos na iden-tificao de um objeto. Essa identificao se faz

    * No deve ser confundida a rea descri-ta no rodap da pg. 264.

    em duas etapas: uma de sensao e outra de interpretao. Na de sensao toma-se

    das caractersticas do ob-jeto, sua forma, dure/a. cor. tamanho Na etapa interpretao, ou tais caracte-rsticas so o con-ceito do objeto existente na memria do in-divduo, o que permite sua identificao.

    Essas duas etapas dependem de reas corti-cais diferentes. A etapa dc sensao faz-se em uma rea sensitiva de ou rea prim-ria; j a etapa de interpretao, ou gnosia, en-volve processos psquicos muito mais comple-xos, que dependem da integridade das reas de associao secundrias acima descritas e, em conseqncia disso, so s denominadas reas Esse fato pode ser demonstrado

    o emprego de tcnicas modernas dc visua-lizao do fluxo sangneo em reas restritas do crebro. Assim, quando se estimula o sistema visual de um indivduo simplesmente luz branca, h aumento do fluxo (em conseqncia elo aumento do metabolismo) apenas na rea visual primria. Por outro lado, quando a es-timulao se faz a apresentao de uma cena visual mais complexa, contendo objetos a serem ativao da rea primria segue-se ativao das reas se-cundrias. A existncia de duas reasenvolvidas na identificao dc objetos torna possvel que elas sejam lesadas separadamente. Como j foi visto, a leso das reas primrias causa deficincias como cegueira e surdez, o que no ocorre nas leses das reas secundrias. Nesse caso, entretanto, ocorrem os quadros clnicos denominados agnosias, nos quais h perda da capacidade de reconhecer objetos, apesar de as vias sensitivas e das reas de projeo cortical estarem perfeitamente nor-mais. Distinguem-se agnosias auditi-vas e somestsicas, estas ltimas geralmente

    Assim, um indivduo com agnosia visual ser incapaz de reconhecer objetos pela viso, embora possa reconhec-los por outra forma de sensibilidade, como tato, olfato

    Tipos especiais de agnosia visual e auditiva so os defeitos de linguagem res-pectivamente, verbal c surdez.nos quais os perdem total ou parcial-mente a capacidade de reconhecer os smbolos visuais ou sonoros constituem a linguagem escrita ou falada. Estas agnosias enquadram-se

  • 268 NEUROANATOMIA FUNCIONAL

    Fig. 27.6 corticais primrias (em secundrias (cm c (em azul), cm relao as dc Brodmann. do crebro.

    entre os defeitos de linguagem denominados afasias, que sero estudados no item 8.0. Um aspecto importante relacionado reas secun-drias que, do ponto de vista funcional, elas no so simtricas. Assim, leses da mesma rea resultam em sintomatologia diferente con-forme o lado lesado. Por exemplo, leso da rea auditiva secundria no hemisfrio esquerdo le-va a uma afasia, ou seja, a uma dificuldade de compreenso de sons de linguagem. J a mesma leso no hemisfrio direito pode causar uma

    ou seja, dificuldade de compreenso de sons musicais. A questo da assimetria das funes cerebrais ser estudada mais minucio-samente no item 8.0.

    6.1.2 reas de Associao Secundria Motoras

    Adjacentes rea motora primria, existem reas motoras secundrias as quais ela se

    relaciona. Leses dessas reas ou de suas fre-qentemente causam apraxias, que so quadros clnicos correspondentes s agnosias j descri-tas a propsito das reas secundrias. Nas apraxias h incapacidade de executar de-terminados atos voluntrios, sem que exista qualquer motor. Nesse caso, a leso est nas reas corticais de associao relacionadas

    o dos atos voluntrios e no na execuo desses atos. Por exemplo, um indivduo aprxico incapaz de executar cor-retamente a seqncia de movimentos necess-rios para acender um cigarro e coloc-lo na boca. So consideradas reas motoras secun-drias ou reas de associao motoras a rea motora suplementar, a rea pr-motora e a rea Estas reas sero estudadas a seguir*.

    Alguns autores colocam tambm as reas motoras secun-drias centro frontal, situado no giro mdio (rea 8), prximo da motora para a

  • ESTRUTURA E F U N E S DO C R T E X CEREBRAL 269

    20

    Fig. 27.7 Arcas e (cm azul), cm relao as reas de medial do crebro.

    Motora Suplementar

    A rea motora suplementar ocupa a parte mais alta da rea 6, situada na face medial do giro frontal superior (Fig. 27.7). Suas principais conexes so o corpo estriado, via tlamo c a rea motora primria. Do ponto dc vista funcional, relaciona-se a concepo ou planejamento de seqncias complexas de mo-vimentos, envolvendo, por exemplo, os dedos, e sabe-se que ela ativada juntamente a rea motora primria, quando esses movimen-tos so executados. Fato curioso que a rea motora quando a pessoa solicitada a repetir mentalmente a se-qncia dos movimentos entretanto execu-t-los. Admite-se que para essa funo de pla-nejamento de movimentos complexos sejam importantes as amplas conexes aferentes que a rea motora suplementar recebe do corpo estriado, que, como j foi visto, est tambm envolvido no planejamento motor.

    Area pr-motora* localiza-se no lobo fron-

    tal, adiante da rea motora e ocupa toda a extenso da rea 6. situada na face lateral do hemisfrio (Fig. 27.6). muito menos exci-

    que a rea motora primria, exigindo cor-rentes eltricas mais intensas para que se

    respostas motoras. As respostas obtidas so menos localizadas que as que se obtm por estmulo da rea 4 e envolvem grupos muscu-lares maiores, como os do tronco ou base dos membros. Nas leses da rea pr-motora esses msculos tm sua fora diminuda o que impede o paciente de elevar completamente o brao ou a perna. Admite-se que isso se deva ao de que a rea pr-motora tem projees para a formao reticular dc onde sc origina o

    retculo-espinhal, principal responsvel

    * A rea pr-motora era considerada a principal rea extrapi- do em oposio rea 4, considerada a

    piramidal. Estas entretanto, caram em desuso.

  • 270 NEUROANATOMIA FUNCIONAL

    pelo controle motor da musculatura axial e pro- dos membros no homem. A rea pr-mo-

    tora projeta-se tambm para a rea motora pri- e recebe aferncias do cerebelo (via tla-

    mo) e de vrias reas de associao do crtex. Seu significado funcional ainda objeto de muitas c at mesmo sua coloca-o entre as reas corticais de associao pode ser questionada, pois tem algumas caracters-ticas que se aproximam s de uma rea primria. Atravs da via que nela se origina, a rea pr-motora coloca o corpo, especialmente os membros, em uma pos-tura bsica preparatria para a realizao de movimentos mais delicados, a cargo da muscu-latura dos membros. Existe tambm evi-dncia dc que participa do processo dc progra-mao de determinadas atividades, motoras, es-

    daqueles movimentos guiados por estmulos externos.

    reaSituada nas partes opercular e triangular do

    giro frontal inferior, correspondendo rea 44 e parte da rea 45 de Brodmann (Fig. 27.6), a rea de Broca responsvel pela programao da atividade motora relacionada a expres-so da Para isto est muitosituada em frente quela parte da rea motora que controla os msculos relacionados a

    Leses da rea de Broca resultam em de linguagem denominadosque sero estudadas mais adiante, no item 7.0.

    6.2 REAS DE ASSOCIAO TERCIRIA S

    Segundo Luria, as reas tercirias ocupam o topo da hierarquia funcional no crtex cerebral. Elas so supramodais, ou seja, no se relacio-nam isoladamente nenhuma modalidade sensorial. Recebem e integram as informaes

    j elaboradas por todas as reas se- e so responsveis tambm pela ela-

    borao das diversas estratgias As funes dessas at h algum

    tempo denominadas reas do cr-

    tex, s h relativamente pouco tempo comeam a ser esclarecidas.

    A seguir, estudaremos cada uma das reas tercirias do crebro, ou seja, a rea

    area e as reas

    rea

    A rea pr-frontal compreende a parte ante-rior no-motora do lobo frontal (Figs. 27.6, 27.7). Essa rea desenvolveu-se muito durante a evoluo dos mamferos e no homem ocupa cerca de 1/4 da superfcie do crtex cerebral. Suas conexes so muito complexas. Atravs dos fascculos dc associao do crtex (Captu-lo 26, item ela recebe libras de todas as demais reas dc associao do crtex, ligando-se ainda ao sistema lmbico. Especialmente im-portantes so as extensas conexes recprocas que ela mantm o ncleo do tlamo. Informaes sobre o significado fun-cional da rea pr-frontal tm sido obtidas prin-cipalmente atravs de experincias feitas em macacos e observao de casos clnicos nos quais houve leso nessa rea. Destes, um dos mais famosos ocorreu em 1868, quandoGage, funcionrio de uma ferrovia americana, teve seu crtex pr-frontal destrudo por uma barra de ferro, durante uma exploso. Ele con-seguiu sobreviver ao acidente, mas sua perso-nalidade, antes caracterizada pela responsabi-lidade e seriedade, mudou dramaticamente. Embora suas funes cognitivas basica-mente normais, ele perdeu totalmente o senso de suas responsabilidades sociais e passou a vaguear de um emprego para outro, dizendo "as mais grosseiras c exibindo a bar-ra de ferro que o vitimara. "Sua mente estava to radicalmente mudada que seus amigos di-

    ele no era mais o mesmo Harlow*.

    No que se refere s observaes cm animais, a experincia mais famosa foi feita em 1935. por Fulton c Jacobscn, cm duas macacas

    que tiveram suas reas pr-frontais remo-vidas. Depois da operao, as macacas pas-saram a no resolver mais certos problemas simples, como achar o alimento escondido pou-co tempo antes. Isso levou os autores a sugerir

    * Para uma reviso sobre Wise, of

    * 186X from of an iron bar the head". Mass. Med.

  • ESTRUTURA E DO C R T E X CEREBRAL

    a rea pr-frontal poderia estar relacionada com algum tipo de memria para recentes. Alm os animais tornaram-se completa-mente distrados e no mais as caractersticas manifestaes emocionais dc descontentamento, cm situaes de frustrao.

    base nessas experincias, Egas Moniz e Almeida Lima. dois cirurgies portugueses, fizeram pela primeira em 1936. a loboto-

    (ou leucotomia) pr-frontal, para tratamen-to de doentes psiquitricos quadros de depresso e ansiedade. A operao consiste em uma seco bilateral da parte anterior dos lobos frontais, passando adiante dos cornos anteriores dos ventrculos laterais. Sabe-se que os resultados devem-se principalmente seco das conexes rea pr-frontal o ncleo

    do tlamo. Essa cirurgia melhora os sintomas dc ansiedade e depresso dos doentes, entram cm estado demento ou deixam de reagir a circunstncias que normalmente determinam alegria ou triste/a. Assim, por exemplo, pa-cientes dores intratveis causadas por um cncer e profundamente deprimidos, aps a

    embora continuem a sentir dor, me-lhoram do ponto dc vista emocional c passam a no dar mais importncia sua grave situao clnica. trabalho dc Egas c Almeida Lima sobre a leucotomia frontal grande repercusso, pois primeira vez empregou-se uma tcnica cirrgica para tratamento de doenas psquicas mtodo foi largamente usado, caindo cm desuso o aparecimento dc drogas de ao

    conseqncia indesejvel da leucotomia muitos pacientes perdem a capacidade de

    decidir sobre os comportamentos mais adequa-dos diante dc cada situao, podendo por exem-

    a maior naturalidade, urinar,ou masturbar-se cm pblico.

    Embora existam ainda muitas divergncias e especulaes em torno do significado funcional da rea pr-frontal, a interpretao s vezes difcil de dados experimentais c clnicos, como

    expostos acima, permite concluir esta rea est envolvida pelo menos nas seguintes funes:

    a) escolha das opes e estratgias compor-tamentais mais adequadas situaoca e social do indivduo, assim como a

    capacidade de alter-las quando tais si-tuaes se modificam;

    b) manuteno da ateno. Vimos que leses na pr-frontal causam distrao, ou

    os pacientes dificuldade dc sc concentrar e fixar voluntariamente a aten-o. Cabe lembrar que outras reas cere-brais a formao reticular inclusive tambm esto envolvidas no fenmeno da ateno. os aspectos mais complexos dessa funo, por exemplo, a capacidade de seguir seqn-cias ordenadas pensamentos, depen-dem fundamentalmente da rea pr-fron-tal;

    c) controle do comportamento emocional, funo exercida juntamente o hipo-tlamo e o sistema lmbico. ser es-tudada mais detalhe no Captulo 28.

    6.2.2 Temporoparietal

    Compreende todo o lbuloou seja, os giros rea 40, e an-gular, 39 (Fig. 27.6) estendendo-se tam-bm s margens do sulco temporal superior e parte do lbulo superior (Figs. 27.6,

    Situa-se pois entre as reas secundrias auditiva, visual e somestsica. funcionando co-

    centro que integra informaes recebidas dessas reas. im-portante para percepo espacial, ao indivduo determinar as relaes entre os obje-tos no espao Ela permite tambm que se tenha uma imagem das partes compo-nentes do prprio corpo, razo pela qual j foi

    denominada do esquema Essas funes ficam mais claras a

    descrio dos quadros clnicos ligados a leses que nela ocorrem. Um dos sintomas pode ser uma desorientao espacial que faz que o paciente no mais consiga deslo-car-se de casa para o trabalho e. nos casos mais

    nem mesmo dirigir-se dc uma cadeira para a cama.

    Entretanto, o quadro clnico mais caracters-tico das leses da

    segundo M-M in behavioral areas, the limbic sys-tem and in

    of behavioral neurology, Davis Co.,phia, pp.

  • 272 NEUROANATOMIA FUNCIONAL

    pecial de sua parte parietal a chamadadrome de negligncia ou sndrome de

    que se manifesta nas leses do lado direito, ou no hemisfrio mais relacionado os processos Pode-se considerar um quadro de negligncia em relao ao prprio corpo ou ao espao exterior. No primeiro caso, o

    perde a noo do seu esquema corporal, deixa de perceber a metade esquerda de seu corpo como fazendo parte do seu e passa a negli-genci-la Assim, ele deixa de se lavar, fazer a barba ou calar os sapatos do lado esquerdo, no porque no possa faz-lo mas simplesmente porque, para ele, a metade esquerda do corpo no lhe pertence. Alguns doentes com hemiple-gia esquerda sequer reconhecem que seu lado esquerdo est paralisado. No caso da sndrome de negligncia em relao ao espaoque pode ser o quadro anterior, o paciente passa a agir como se do esquerdo o mundo deixasse de existir de qualquer forma significativa para ele. Assim, ele s escreve na metade direita do s l a metade direita das sentenas e s come o alimento colocado no lado direito do prato. neurologista s poder conver-sar um doente como esse se abord-lo pelo lado direito.

    6.23 reas Lmbicas

    As reas de associao lmbicas (Fig. 27.7) compreendem o giro do cngulo, o giro para-hipocampal e o hipocampo*. Essas reas, relacionadas principalmente a memria e o comportamento emocional, integram o sistema lmbico e sero estudadas no prximo captulo.

    REAS R E L A C I O N A D A S C O M A L I N G U A G E M . AFASIAS

    A linguagem verbal um fenmeno com-plexo do qual participam reas corticais e sub-

    No resta a menor dvida, entretan-to, de que o crtex cerebral tem o papel mais importante. Modernamente, base sobretu-

    * Alguns autores incluem tambm as lmbicas do lobo temporal e o crtex da orbital do

    lobo ltimo por vrios autores na rea

    Sabe-se, por tlamo sobre fenmeno da linguagem.

    do nos trabalhos de Geschwind, admite-se a existncia de apenas duas reas corticais para a linguagem: uma anterior e outra posterior (Fig. 27.8), ambas de associao. Area anterior da linguagem (Fig. 27.8) corresponde rea de Broca j descrita no item e est relacio-nada a expresso da linguagem. A rea posterior da linguagem situa-se juno entre os lbulos temporal e parietal e corresponde parte mais posterior da 22 de Brodmann (Fig. Ela conhecida tambm como rea

    Wernicke, em homenagem a Carl Wernicke, que primeiro a descreveu. Est relacionada ba-sicamente a percepo da linguagem.

    Essas duas reas esto ligadas pelo fascculo longitudinal superior ou fascculo arqueado (Fig. 26.4), atravs do qual informaes rele-vantes para a correta expresso da linguagem passam da rea de Wernicke para a rea de Broca. Leses dessas reas do origem a dis-trbios de linguagem denominados afasias. Nas afasias, as perturbaes da linguagem no po-dem ser atribudas a leses das vias sensitivas ou motoras envolvidas na mas apenas leso das reas corticais de associao res-ponsveis pela linguagem. dois tipos bsicos de afasia: motora ou de expresso, cm que a leso ocorre na de Broca; sensi-tiva ou de percepo, em que a leso ocorre na rea de Wernicke. Nas afasias motoras, ou afa-sias Broca, o capaz de compreen-der a linguagem falada ou escrita, mas tem

    de se expressar adequadamente, fa-lando ou escrevendo. Nos casos mais comuns, ele consegue apenas produzir poucas palavras

    dificuldade e tende a encontrar as frases falando ou escrevendo de maneiraNas afasias sensitivas, ou afasias de Wernicke, a compreeaso da linguagem tanto falada como escrita muito deficiente. H tambm algum dficit na expresso da linguagem, uma vez que o perfeito funcionamento da rea de Broca de-pende de informaes que recebe da rea de Wernicke, atravs do fascculo arqueado. Nos raros casos em que esse fascculo lesado, temos a chamada afasia de conduo, que a compreenso da linguagem normal (pois a rea de Wernicke est ntegra), mas existe dfi-cit da expresso. Na realidade, o problema das alteraes corticais da linguagem bem mais complexo, e h inmeras classificaes para os diferentes tipos de afasias encontradas na pr-

  • ESTRUTURA E F U N E S DO C R T E X CEREBRAL 273

    \

    rea anterior da linguagem (rea de Broca)

    Fig. Arcas corticais cia

    tica clnica. Um fato extremamente importante que, na maioria dos indivduos, as reas cor-ticais da linguagem se localizam apenas no lado esquerdo, como ser visto mais detalhe no prximo item sobre a assimetria dascorticais.

    8.0 AS S I M E T R I A DAS FUNES C O R T IC A IS

    Desde o sculo passado, os neurologistas constataram que as esto quase sempre associadas a leses no hemisfrio esquerdo e que leses do lado direito scausam distrbios da linguagem. Esse fato de-monstra que, do ponto de vista funcional, os hemisfrios cerebrais no so simtricos e que na maioria dos indivduos as reas da lingua-gem esto localizadas apenas do lado esquerdo. Surgiu assim o conceito de que esse hemisfrio seria o hemisfrio enquanto o he-misfrio direito exerceria um papel secundrio. Na realidade, sabe-se que, se o hemisfrio es-querdo mais importante do ponto de vista da linguagem e do raciocnio matemtico, o no que diz respeito ao desempe-nho de certas habilidades artsticas como msi-ca e percepo de relaes espaciais ou ao reconhecimento da fisionomia das pes-soas. Entretanto, desde que entendido apenas como aquele hemisfrio no qual se localizam as

    rea posterior da linguagem (rea de Wernicke)

    reas da linguagem, o conceito de hemisfrio dominante pode ser empregado, mesmo porque ele a ser de uso corrente na prtica mdica. Convm assinalar que a assimetria fun-cional dos hemisfrios cerebrais se manifesta apenas nas reas de associao, uma vez que o funcionamento das reas de projeo, tanto mo-toras como sensitivas igual dos dois lados. Curiosas so as relaes entre ce-rebral na linguagem e o uso preferencial da mo. Em dos indivduos destros, o hemis-frio dominante o esquerdo, mas nos indi-vduos canhotos ou ambidestros esse valor cai para Isso significa que em um canhoto mais difcil prever o lado em que se localizam os centros da linguagem. Essa informao importante para um que preten-da operar regies prximas s reas de Broca ou de Wernicke de um indivduo, pois qualquer ao intempestiva nessas reas poderia causar uma afasia. Para saber segurana o lado em que os centros da linguagem, o cirurgio injeta em uma das cartidas um de ao muito rpida sdico) enquanto pede ao paciente que comece a contar em voz alta. A droga levada preferencialmente ao hemisfrio do mesmo lado em que foi injetada e nele causa um breve perodo de Se nesse hemisfrio estiverem os centros da lin-guagem, o paciente pra de contar e no respon-de ao comando para continuar.

  • 274 NEUROANATOMIA FUNCIONAL

    At pouco tempo acreditava-se que no haveria uma anatmica para a assimetria funcional observada nas reas de linguagem. Entretanto, sabe-se hoje que na maioria das pessoas a regio do lobo temporal correspondente rea de Wernicke maior

    do que direita*. A assimetria funcional entre os dois hemis-

    frios torna mais importante o papel do corpo caloso, de transmitir informaes entre eles. Isso ficou provado pelo estudo de pacientes em que essa comissura foi seccionada

    para melhorar certos quadros de epilep-sia. Esses indivduos no tm nenhum distrbio sensitivo ou motor evidente. Entretanto, so

    incapazes de descrever um objeto colocado em sua mo esquerda, embora possam faz-lo quando o objeto colocado na mo direita. Nesse caso, as impresses do objeto chegam ao hemisfrio esquerdo, dominante, onde esto as reas da linguagem, o que permite a descrio do objeto. J no caso em que o objeto colocado na mo esquerda, os impulsos

    chegam ao hemisfrio direito, onde no existem reas da linguagem. Como esto lesadas as fibras do corpo caloso, que, no in-

    normal, transmitem as informaes aos centros da linguagem do hemisfrio esquerdo, o indivduo, apesar de reconhecer o objeto, incapaz de descrev-lo.

    Para uma discusso mais minuciosa fato, N. & 1968 "Human brain:

    in region". Science 161:186-187.