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30 . IBASE INSTITUTO BRASILEIRO DE ANÁLISES SOCIAIS E ECONÔMICAS CAPÍTULO 4

caPÍtulo - Ibase · de comprar fiado. Já as compras em feiras e mercados municipais, supermercados e mercados de médio porte, sacolões, varejões, frutarias têm como motivo

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30 . IBASE instituto brasileiro de análises sociais e econômicas

caPÍtulo4

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BOLSA FAMÍLIA relatório-sÍntese . 31

4.1 - Principais formas de acesso

A aquisição no mercado foi considerada pelos(as) titulares das famílias uma das prin-cipais formas de obtenção de alimentos, seguida pela alimentação na escola e pela ajuda de parentes e amigos. Vale destacar o baixo alcance dos programas públicos de assistência alimentar.

a alimentação das famÍlias

Formas de acesso Total Brasil

Regiões

Centro - Oeste Nordeste Norte Sudeste Sul

compra de alimentos no mercado 96,3% 97,0% 95,5% 93,7% 98,5% 96,6%

alimentação na escola 33,4% 44,3% 25,4% 24,2% 48,3% 37,2%

ajuda de parentes e amigos 19,8% 17,3% 21,0% 15,7% 22,9% 10,2%

Produção de alimentos para autoconsumo 16,6% 7,0% 21,3% 16,5% 10,6% 13,5%

doação de alimentos 9,7% 7,5% 6,2% 1,8% 19,9% 9,6%

caça, pesca e/ou extrativismo 8,5% 5,6% 10,1% 20,4% 3,8% 2,1%

Programas públicos de assistência alimentar 4,7% 8,4% 2,2% 1,5% 8,5% 8,7%

Tabela 2 – Principais formas de acesso à alimentação por grandes regiões*

Os percentuais não se diferenciam muito entre as regiões quanto à ordem de importância, conforme mostra a tabela 2. Todavia, algumas diferenças regionais devem ser ressaltadas.

A alimentação na escola aparece bem citada nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, enquanto nas regiões Norte e Nordeste, fica comprovada a fragilidade dessa forma de acesso.

A ajuda de parentes e amigos aparece com maior destaque nas regiões Sudes-te e Nordeste.

* Pergunta aberta, com opção de até três respostas.

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32 . IBASE instituto brasileiro de análises sociais e econômicas

Formas de acessoEbia

San IA leve IA moderada IA grave

compra de alimentos no mercado 17,2 28,6 34,2 20,0

alimentação na escola 13,5 29,7 32,7 24,1

ajuda de parentes e amigos 5,6 21,2 41,3 31,9

Produção de alimentos p/ autoconsumo 15,5 28,2 37,3 19,0

doação de alimentos 9,0 31,3 32,4 27,3

caça, pesca e/ou extrativismo 10,6 22,3 42,0 25,1

Programas públicos de assistência alimentar 14,9 31,7 32,8 20,6

Tabela 3 – Relação entre o grau de insegurança alimentar e as formas de acesso à

alimentação

A produção de alimentos para autoconsumo na Região Nordeste é três vezes superior à da Região Centro-Oeste.

As atividades de caça, pesca e/ou extrativismo na Região Norte são quase qua-tro vezes maiores que a média nacional.

A presença de programas públicos de assistência alimentar ainda é muito inex-pressiva nas regiões Norte e Nordeste, explicando o baixo número de citações.

A doação de alimentos se destaca na Região Sudeste como uma das principais formas de acesso.

Na área rural, a alimentação escolar teve menor expressão do que na urbana: 29,8%, no primeiro caso, e 34,4%, no segundo. Os resultados apontam diferenças tam-bém quanto à ajuda de parentes e amigos: a prática é mais comum na área urbana, com 21,6% de citações, enquanto na área rural houve 13,4% das referências. O mesmo ocor-re com relação às doações de alimentos (10,8% na área urbana e 5,8% na rural).

Já a produção de alimentos para o próprio consumo e a caça, pesca e/ou extra-tivismo aparecem com peso bem mais pronunciado na área rural (49,5%, no primeiro caso, e 17,3%, no segundo), como era de se esperar. Na área urbana, representaram 7,4% e 6%, respectivamente. Ficou patente na pesquisa a quase inexistente presença de programas de assistência alimentar na área rural.

As famílias com renda de até R$ 60 per capita dão maior relevância à ajuda de paren-tes e amigos (24.1%), à produção de alimentos para autoconsumo (25,8%) e à caça, pes-ca e/ou extrativismo (12,1%), em comparação às que possuem renda superior a R$ 60.

As famílias que dependem da ajuda de parentes e amigos são as que se encon-tram em condições mais grave de insegurança alimentar.

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Compra de alimentos no mercadoO crescimento da população residente nas áreas urbanas do país, fenômeno ocorrido ao longo de todo o século 20, implicou diretamente a reorganização do sistema agro-alimentar, em particular nos processos agroindustriais e de abastecimento alimentar. A aquisição dos alimentos no mercado passou a predominar, mediante a consolidação dos circuitos de produção e comercialização. Nesse contexto, a renda monetária tor-nou-se determinante.

Nos grupos focais, pôde-se observar que, além da busca pelos melhores preços, fatores como a possibilidade de comprar fiado e a proximidade também influenciam a escolha dos estabelecimentos fornecedores de alimentos. Embora os produtos nos pequenos comércios de bairros e vilas tendam a ter preços superiores aos das redes de supermercados, distantes das moradias, o acesso a esses estabelecimentos demanda o uso de meios de transporte, o que acaba aumentando o custo da alimentação.

Além disso, a proximidade da moradia das famílias com os pequenos comercian-tes dos bairros e o conhecimento firmado entre si levam a uma relação de confiança que passa a ser de fundamental importância para as famílias. Elas recorrem a esses es-tabelecimentos para a compra de alimentos e outros produtos, efetuando o pagamento no fim do mês, quando recebem o salário ou os recursos do Bolsa Família. Como parte desses mecanismos de crédito, os juros são por vezes altos e resultam na dependência financeira em médio e longo prazos, que pode ser perversa.

Com base nas observações dos grupos focais sobre esse aspecto, conclui-se que famílias residentes em locais de mais difícil acesso, como favelas e pequenos povoados, tendem a pagar mais caro pelos produtos alimentares que consomem. Justamente nessas localidades vivem as mais pobres e com maior dificuldade de acesso à alimentação.

Tipos de estabelecimento

TotalBrasil

Áreas Renda per capitaPrincipal forma de pagamentoUrbana Rural Até

R$ 60,00Mais de R$ 60,00

supermercados e mercados de médio porte 67,9% 68,6% 65,1% 59,1%% 71,5%

à vista 64,6%

a prazo* 35,3%

Pequenos mercados de bairro/ povoado 33,4% 63,6% 64,5% 68,7% 61,8%

à vista 51,6%

a prazo 48,2%

feiras e mercados muni-cipais 19,8% 41,2% 30,1% 38,4% 39,0%

à vista 94,8%

a prazo 5,0%

sacolão/varejão/frutaria 16,6% 20,4% 7,0% 11,1% 20,1%à vista 88%

a prazo 11,9%

Tabela 4 – Tipos de estabelecimento para a compra de alimentos por área, renda per capita

e as formas de pagamento correspondentes

* São consideradas compras a prazo aquelas realizadas por cartões de crédito, sistema de cadernetas e fiado.

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Figura 18 – Motivos de compra por tipo de estabelecimento

Supermercado e mercado de médio porte

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Variedade de produtoS

poSSibilidade de comprar

fiado

proximidade de caSa

melhor qualidade

Única opção

pequenos mercados do bairro/povoado

feiras/mercados municipais Sacolão/varejão/frutaria

melhor preço

6,1%

5,7%

5,9%

4,6%

57,8%

24,6%

58,1%

48,9%

3,2%

1,87%

8,4%

13,7%

12,4%

46,0%

8,9%

19,4%

11,5%

21,1%

1,5%

2,5%

8,7%

0,8%

17,2%

10,8%

Na tabela 4, chama a atenção o elevado percentual de famílias de área rural que informam comprar alimentos em estabelecimentos como supermercados e mercados de médio porte (65,1%), dado próximo aos 68,6% das famílias residentes na área ur-bana que fazem o mesmo.

As famílias com renda de até R$ 60 têm maior acesso a pequenos mercados de bairro do que a supermercados e mercados de médio porte. Como os primeiros são aqueles que praticam os maiores preços, os dados quantitativos corroboram a hipótese levantada na fase qualitativa, de que as famílias mais pobres acabam pagando mais caro pela alimentação.

O pagamento à vista é o principal meio em todos os tipos de estabelecimento. A possibilidade de pagamento a prazo aparece principalmente nos pequenos mercados de bairro e povoados, sendo citado por 48,2% daqueles que realizam compra nesse tipo de estabelecimento. As feiras e os mercados municipais praticamente não aceitam essa forma de pagamento.

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Figura 19 – Acesso à alimentação escolar gratuita por integrantes das famílias matriculados

em escola por grandes regiões

centro-oeSte

nordeSte

norte

SudeSte

Sul

TOTAL BRASIL

Sim não nS/nr

83,4 16,0

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

90,4 9,4

88,1 11,1

83,6 16,0

79,7 19,7

84,9 14,4

Os dados reforçam que a proximidade de casa é o principal motivo pelo qual as fa-mílias optam pelos pequenos mercados de bairro, nos quais se destaca a possibilidade de comprar fiado. Já as compras em feiras e mercados municipais, supermercados e mercados de médio porte, sacolões, varejões, frutarias têm como motivo mais citado o melhor preço. A variedade de produtos motiva a compra de alimentos, em primeiro lugar, em feiras e mercados municipais, enquanto a melhor qualidade é o principal mo-tivo para a compra em sacolões, varejões, frutarias e, em menor proporção, em feiras e mercados municipais.

Alimentação na escolaDo total de participantes da pesquisa, 33,4% citam a alimentação escolar como uma das principais formas de garantirem a alimentação para seus componentes. Essa forma de acesso é especialmente relevante em áreas urbanas e nas regiões Centro-Oeste e Sudeste. Dentre os membros das famílias beneficiadas que freqüentavam escola no mês anterior à pesquisa, 83,4% estão matriculados em escolas que ofere-cem merenda gratuita.

Na Região Sul, concentra-se o maior percentual dos que recebem alimentação na escola, enquanto a Região Nordeste é a que menos oferece a opção. Apesar de reconhecida a importância dessa forma de acesso, surgiram, nos grupos focais, relatos de uma série de problemas relacionados à alimentação escolar, como a irregularidade na sua freqüência, a insuficiência na quantidade diária oferecida, a qualidade da ali-mentação e a não-aceitação dos alimentos por parte dos(as) alunos(as). A maior parte dos(as) beneficiados(as) escolares (71,4%) consome a alimentação escolar todos os dias. Pode-se observar diferenças regionais significativas. Nas regiões Centro-Oeste e

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Figura 20 – Famílias que plantam alimentos ou criam animais por grande regiões

Sul, com 87,9% e 86,9%, respectivamente, observam-se os maiores índices de consu-mo diário, enquanto na Região Nordeste, a merenda escolar é consumida com menos freqüência (65,7%).

Nos grupos focais, a alimentação escolar foi considerada por um número significativo de participantes como importante não só para as crianças, mas para toda a família, pois representa redução nos gastos com alimentação. Isto se confirmou na fase quantitativa, como pode ser observado por meio da questão referente ao impacto da alimentação durante o período de férias escolares. As famílias da Região Nordeste são as que mais sentem a piora na alimentação: 39,4%. As que menos sentem vivem na Região Sul (20,1%). No país, a média foi de 32,9%.

Produção para autoconsumoA plantação de algum tipo de alimento ou a criação de animais para consumo próprio é uma das principais formas de acesso à alimentação para 16,6% dos(as) beneficiados(as). O percentual chega a 21,3% na Região Nordeste, índice muito superior ao da Região Centro-Oeste, com apenas 7%.

Quando perguntadas se suas famílias plantavam algum tipo de alimento ou cria-vam animais para a alimentação, 20,8% dos(as) titulares disseram que sim. As varia-ções regionais podem ser observadas na figura abaixo.

centro-oeSte

nordeSte

norte

SudeSte

Sul

TOTAL BRASIL

Sim não

20,8 79,2

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

19,4 80,6

14,5 85,5

21,3 78,7

25,3 74,7

10,6 89,4

Como era de se esperar, esse tipo de atividade predomina em áreas rurais, onde 57,7% das famílias plantam ou criam animais. Nas áreas urbanas, apenas 10,5% o fa-zem. Em todo o país, essas atividades são majoritariamente desenvolvidas visando a subsistência. As regiões Sudeste e Centro-Oeste são aquelas onde as famílias menos se dedicam à comercialização.

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centro-oeSte

nordeSte

norte

SudeSte

Sul

TOTAL BRASIL

exclusivamente para o sustento da sua família

para o sustento da sua família e para comercialização

78,3 21,0

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

78,9 18,0

89,7 9,7

76,1 23,5

74,7 24,9

90,6 9,4

exclusivamente para a comercialização

Figura 21 – Destino da produção das famílias que plantam alimentos e/ou criam animais

por grandes regiões

A falta de acesso à terra é apontada por 31,3% das famílias como a principal dificul-dade enfrentada para a agricultura e/ou a criação de animais, resultado semelhante ao de famílias que dizem não enfrentar dificuldades (29,5%). Outros problemas citados foram a escassez de água, com 25,9% das respostas, e o alto custo dos insumos (25,1%).

Dentre as famílias que plantam ou criam animais, a maioria é proprietária da terra em que trabalha. O maior percentual está na Região Norte, e o menor, no Sudeste. Quanto ao tamanho das propriedades, 61,5% têm até 2 hectares. No Sudeste, 75,9% das famílias enquadram-se nesse perfil, enquanto no Norte elas somam 46%.

Figura 22 – Relação com a terra das famílias que plantam alimentos e/ou criam animais por

grandes regiões

centro-oeSte

nordeSte

norte

SudeSte

Sul

TOTAL BRASIL

proprietária não proprietária

56,6 43,4

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

63,9 36,1

53,1 46,9

70,9 29,1

53,8 46,2

68,9 31,1

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Figura 23 – Relação entre o grau de insegurança alimentar e a propriedade da terra

17,3

21,5

proprietÁrioS

não -proprietÁrioS

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

San ia leve ia moderada ia Grave

6,9 29,1

19,5 30,1 32,9

42,3

3,8aSSentadoS 26,5 31,5 38,0

O risco do endividamento é apontado por 56,6% daqueles que não acessaram crédito como o principal motivo do não-acesso. Essa precaução aumenta na Região Nordeste, onde o percentual chega a 62%.

Dentre as famílias produtoras de alimentos para subsistência que participam do Programa Bolsa Família, 95,5% não recebem nenhum tipo de assistência técnica para a prática da agricultura e/ou criação de animais, sendo o menor acesso registrado na Região Norte (0,14%), e o maior, no Sul (11,9%).

Os crescentes riscos produtivos vêm dificultando o segmento de trabalhadores(as) beneficiados(as) pelo Programa Bolsa Família em reconhecer, na agricultura familiar, uma perspectiva de geração de renda que possa tirá-los(as) da pobreza. A desvaloriza-ção da atividade agrícola por parte das famílias beneficiadas pelo programa pode tam-bém ser percebida por meio dos dados da fase quantitativa da pesquisa, que mostram as resistências dos(as) filhos(as) de continuarem com as atividades de plantio e criação de animais.

Para avaliar a relação entre o grau de IA das famílias e a posse da terra foram ob-servadas três categorias: proprietárias, não-proprietárias e assentadas. Como pode ser observado no caso de assentamento rurais, quando as famílias têm acesso à terra e a políticas de fortalecimento da agricultura familiar, aumentam suas chances de atingirem a condição de SAN.

Com relação ao crédito, financiamento ou empréstimo para custeio da produção e/ou investimento, 83,1% das famílias que praticam a agricultura de subsistência não firmaram nenhum contrato nos três meses anteriores à pesquisa. Na Região Centro-Oeste, 91,5% não acessaram financiamento agrícola no mesmo período. A Região Sul foi a que concentrou maior número de pessoas com acesso a créditos agrícolas, oriun-dos em sua quase totalidade do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf): 23,1%. Em todo o país, apenas 13,5% das famílias receberam recur-sos desse programa.

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centro-oeSte

nordeSte

norte

SudeSte

Sul

TOTAL BRASIL

Sim não

10,1 89,9

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

96,6

5,0 95,0

23,4 76,6

11,8 88,2

7,0 93,0

Figura 25 – Famílias que praticam caça, pesca e/ou extrativismo por grandes regiões

Figura 24 – Desejo dos(as) filhos(as) das famílias que plantam alimentos e/ou criam ani-

mais em continuar com estas atividades por grandes regiões

centro-oeSte

nordeSte

norte

SudeSte

Sul

TOTAL BRASIL

Sim não

41,4 29,7

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

26,0

32,5 38,1 27,1

36,6 31,7 30,3

39,4 27,2 32,4

45,1 28,1 22,9 4,0

27,4 33,0 22,9

nS/nr na

Caça, pesca e extrativismoNa etapa qualitativa da pesquisa, observou-se que a caça, a pesca e/ou o extrativis-mo são usados como meios de acesso à alimentação, sobretudo nas áreas rurais e litorâneas do país. Foi observado também que essas práticas vêm diminuindo, dado o acelerado processo de degradação ambiental, causador de fortes impactos na oferta de alimentos encontrados na natureza. As famílias que usam esses meios de alimentação representaram apenas 8,5% do total de citações no país. No entanto, na Região Norte, o acesso sobe para 20,4%.

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Tabela 5 – Tipos de assistência alimentar por origem identificada

Na maior parte dos casos, os produtos obtidos nas atividades da caça, da pesca e/ou do extrativismo são exclusivamente para o sustento da família (89,1%). Na Região Norte, a produção para a comercialização é relativamente mais significativa (19,7%).

Doações de alimentos, programas e ações públicas de assistência alimentarJá na fase qualitativa, pode-se perceber que os(as) participantes dos grupos focais que haviam sido beneficiados por algum tipo de assistência alimentar, na maior parte das ve-zes, não sabiam identificar a origem do benefício, se governamental ou não. Além disso, como muitas organizações governamentais são intermediárias de programas públicos de assistência alimentar, essa origem tampouco pode ser tão bem delimitada. Nesse sentido, optou-se por agregar a forma de acesso “doação de alimentos”, que do ponto de vista da segurança alimentar se dá no âmbito privado, a programas e ações públicas de assistência alimentar, que, geralmente, são coordenados pelas prefeituras municipais ou pelas secretarias de estado, ou, ainda, por organizações da sociedade civil em parceria com o poder público. Mesmo reconhecendo que o limite de diferenciação entres as duas formas de acesso não é percebido de forma clara, buscou-se identificar as associações de origem, governamental e não-governamental, feitas pelos(as) titulares.

As famílias que citaram a doação de alimentos como uma das principais formas de acesso à alimentação representam 9,7% do total. A Região Sudeste é onde esta forma de acesso mais se destaca, chegando a 19,9%, enquanto na Região Norte está o menor percentual: 1,8%.

Já as que apontaram os programas públicos de assistência alimentar como uma das principais formas de acesso à alimentação representam apenas 4,7% do total de famílias beneficiadas. As regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste apresentam percentual maior de famílias integrantes desse grupo, com 8,7%, 8,5% e 8,4%, respectivamente. A Região Norte, com 1,5%, e a Região Nordeste, com 2,2%, são as que apresentam os menores percentuais.

Tipo PercentualOrigem

Governamental Não-governamental

cesta básica 12,1% 21,5% 78,5%

refeições prontas 3,5% 11,7% 88,3%

leite 12,7% 73,7% 26,3%

alimentos de hortas comunitárias 1,6% 13,8% 86,2%

alimentos de cozinhas comunitárias 0,1% – –

Os principais tipos de assistência alimentar recebidos pelas famílias são as doa-ções de leite e de cestas básicas, com 12,7% e 12,1% de citações, respectivamente. No primeiro caso, a origem principal são programas governamentais, enquanto no se-gundo, provêm de instituições não-governamentais.

Nos grupos focais, essas formas de acesso apareceram freqüentemente associ-adas a relações clientelistas, despertaram importantes debates, de modo especial naqueles realizados no estado do Rio de Janeiro, onde a prática está mais arraigada.

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Foram também bastante citadas as doações feitas por igrejas, organizações não-go-vernamentais e comércios. Houve ainda relatos de famílias que, como último recurso em situações de escassez alimentar, recorrem a alimentos descartados por restauran-tes, supermercados, feiras livres e demais comércios.

Ainda no âmbito dos programas públicos de segurança alimentar e nutricional 5,7% das famílias tiveram acesso à suplementação de ferro em postos de saúde, 3,9% à suplementação de vitamina A, e 1,1% à alimentação do trabalhador. Embora se desta-quem pelo potencial, os programas públicos de segurança alimentar e nutricional recen-temente implementados em todo o país ainda são insuficientes.

Ajuda de parentes e amigosA ajuda de parentes e amigos foi apontada por 19,8% dos(as) titulares como uma das formas mais importantes de obtenção de alimentos. Essa alternativa se destaca princi-palmente nas regiões Sudeste (22,9%) e Nordeste (21,0%), sendo menos expressiva na Região Sul (10,2%).

Para os grupos sociais mais vulneráveis, trata-se de uma estratégia comum no enfrentamento de situações de escassez alimentar. Durante os grupos focais, pôde-se observar que, muitas vezes, a ajuda se dá por meio de trocas e prestação de pequenos serviços. É muito presente entre pessoas que já passaram por situações de insegurança o espírito de solidariedade e a crença de que, ao ajudar hoje, serão ajudadas amanhã.

Entre as que citam essa forma de acesso como uma das mais importantes, es-tão as famílias nos casos mais graves de insegurança alimentar. Tal forma de acesso também aparece como mais relevante para aquelas em situação de extrema pobreza: 24,1% das que apresentam renda per capita de até R$ 60 e 18% daquelas com renda per capita superior a esse valor.

Metade dos titulares (50,4%) passaram, alguma vez em sua vida, por situações nais quais faltaram alimentos no domicílio. A principal estratégia adotada nessas situa-ções foi recorrer à ajuda de amigos e parentes.

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42 . IBASE instituto brasileiro de análises sociais e econômicas

Figura 26 – Estratégias adotadas em situação de falta de alimentos

ajuda de amiGoS e parenteS

preStaram pequenoS SerViçoS em troca de

alimentoS

compraram fiado

deixaram de comprar alimentoS

aproVeitaram SobraS de alimentoS

pediram ajuda

ficaram Sem comer

outroS

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

72,7%

10,0%

49,8%

15,6%

4,1%

4,9%

1,1%

1,5%

4.2 – Padrões de consumo

Perfil de consumo Diferentes relatos dos grupos focais indicam que as famílias priorizam a compra e o consumo de alimentos considerados básicos e de baixo preço. A melhor relação cus-to-benefício que pauta as escolhas define-se, principalmente, a partir da capacidade da alimentação em suprir as necessidades essenciais que envolvem a saciedade e a possibilidade de provisão de energia. Nesse sentido, os alimentos prioritariamente es-colhidos para a compra são: arroz, feijão, batata, óleo, macarrão, farinha de mandioca, farinha de milho, angu, café, pão, sal e açúcar. Eles se enquadram na categoria do que é considerado “alimento essencial”, manifestada em expressões como “o principal”, “o grosso”, “o que se come todo dia”.

Embora considerem saudáveis frutas, verduras e legumes, ao mesmo tempo, vêem esses alimentos como não-essenciais. Muitas vezes classificados como alimen-tos de luxo, figuram como itens a serem eliminados das compras de alimentos na escassez de dinheiro.

A carne foi denominada como “comida nobre” ou comida de “rico”, evidencian-do seu status social e a dificuldade de acesso. Ela é categorizada como um tipo de “mistura”, alimento que se acrescenta à “comida”: o feijão ou o arroz com feijão. Também são “misturas”: a salada, o frango, os ovos, a salsicha, entre outros. Quan-do não se tem a “mistura”, come-se a “comida” pura. Alguns alimentos substitutivos foram citados nos grupos focais. A carne, por exemplo, é comumente substituída pela salsicha ou sardinha, e o pão, pelo aipim ou cuscuz. O leite e o ovo são também valorizados, mas consumidos em menor quantidade e freqüência, por causa do custo mais elevado.

Page 14: caPÍtulo - Ibase · de comprar fiado. Já as compras em feiras e mercados municipais, supermercados e mercados de médio porte, sacolões, varejões, frutarias têm como motivo

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Outra concepção encontrada refere-se aos alimentos considerados “porcarias”, em geral, doces, biscoitos, iogurte, chocolates e refrigerantes. Eles formam um grupo de alimentos preferencialmente eliminado das compras na escassez de recursos finan-ceiros. No entanto, ainda assim, esses produtos têm seu consumo aumentado com o aporte de recursos do programa, como será posteriormente discutido, uma vez que fazem parte do elenco de produtos de demanda infantil.

A concepção de alimentação saudável variou nos diferentes grupos focais princi-palmente em torno da noção de alimentos naturais (frutas, verduras e legumes) e dos considerados essenciais. Em diferentes grupos focais, os alimentos industrializados, ricos em gorduras e conservantes químicos, foram apontados como pouco saudáveis. Cabe destacar que a concepção de saudável parece ser fortemente condicionada pelo discurso dos profissionais de saúde veiculado nos serviços públicos, considerando a própria referência encontrada nas falas às recomendações feitas, principalmente, por médicos com relação ao que seria uma alimentação saudável para as crianças. Percebe-se nos grupos focais que as famílias sabem o que é uma alimentação saudável, porém são diversos os fatores que as distanciam desse ideal.

– O que é um alimento mais saudável na opinião de vocês?– Eu acho assim: tem que ter uma alimentação balanceada, mas a gente não consegue porque a gente é pobre, pega o dinheiro pra comprar o básico, e o básico de muitos de nós aqui é açúcar, café, farinha e feijão. Esse é o básico do básico, a gente não pensa em outras coisas. Assim, a gente só tem vontade.– E o que você tem vontade?– A gente tem vontade, filho sonha, pensa em iogurte, a gente compra, eles pensam no chocolate, eles pensam em muita coisa. Às vezes, a gente dá, mas não pode dar sempre. Então, acho que pra a alimentação ser completa, falta muita coisa, né? Às vezes, assim, a gente bate o olho e dá vontade (Grupo Focal, Salvaterra-PA).

Ainda que o preço dos alimentos se apresente como principal barreira de acesso para uma alimentação mais diversificada, as escolhas alimentares não são condicio-nadas apenas por decisões baseadas numa racionalidade econômica ou em torno da saúde. Portanto, os dilemas que são postos para as famílias são vários, considerando: a ampla disponibilidade de produtos concentrados em energia e de baixo valor nutri-cional a preços relativamente acessíveis, a ampla disseminação de propagandas em torno desses alimentos, os valores simbólicos da alimentação que estão em pauta e seus efeitos, particularmente com relação ao público infantil, o reforço a determinadas demandas de consumo que decorrem desse processo e os conflitos que se impõem para pais e mães diante das demandas das crianças. Todos esses aspectos devem ser considerados no âmbito das políticas públicas destinadas à promoção de uma alimen-tação suficiente, saudável e adequada.