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Cid Seixas e-book.br EDITORA UNIVERSITÁRIA DO LIVRO DIGITAL coleção literatura na bahia / 2 (Livro 2) https://issuu.com/e-book.br/docs/1928 1928: Modernismo e maturidade A LITERATURA NA BAHIA 1928: Modernismo e maturidade

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Cid Seixas

e-book.brEDITORA UNIVERSITÁRIA

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1928: Modernismoe maturidade

A LITERATURA NA BAHIA

1928: Modernismoe maturidade

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A LITERATURANA BAHIA | 2

Com o subtítulo Impas-ses e confrontos de umavertente regional, esta cole-ção, segundo o projeto doautor, pretende reunir diver-sos textos escritos ao longodas suas atividades jornalís-ticas e acadêmicas. sobre ospercursos e característicasda literatura na Bahia.

Inicialmente, o plano com-preende as primeiras mani-festações do modernismo naregião e seu desdobramentoimediato propiciado pelosacontecimentos dos anostrinta do século passado.

Desse modo, os primeirose-books da coleção, conco-mitantemente lançados são:Tradição e modernidade;1928: Modernismo e matu-ridade; e Três temas dosanos trinta.

Outros e-books serão dis-ponibilizados na net aindaao longo deste ano, permi-tindo acesso a qualquer lei-tor a informações sobre avida cultural baiana.

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Tipologia: Garamond, corpo 12Formato: 12 x 18

Número de páginas: 96

Endereço deste e-book:https://issuu.com/ebook.br/docs/1928https://issuu.com/cidseixas/docs/1928

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e-book.brEDITORA UNIVERSITÁRIA

DO L IVRO DIGITAL

Cid Seixas

(Livro 2)A LITERATURA NA BAHIA

1928: MODERNISMOE MATURIDADE

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CONSELHO EDITORIAL:Adriano Eysen

Cid SeixasItana Nogueira NunesFlávia Aninger Rocha

Francisco Ferreira de Lima

EDITORA UNIVERSITÁRIA DO LIVRO DIGITAL

Coleção Literatura na Bahia, vol. 2

2016

A LITERATURA NA BAHIAImpasses e confrontos de uma vertente regional

1 |Tradição e modernidade2 | 1928: Modernismo e maturidade

3 | Três temas dos anos trinta4 | Final do século XX

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SUMÁRIO

Do modernismo paulistaao regionalismo do Nordeste .............................. 9

Uma gesta caboclado modernismo brasileiro .................................... 23

O sumiço da santa:síntese do romance urbano de Jorge Amado .... 41

O romancinho dos turcos .................................. 57

Edsos Carneiro,o etnólogo e o poeta desconhecido ................... 63

Referências ................................................................ 81

Livros do autor ........................................................ 85

O que é a e-book.br ............................................ 89

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DO MODERNISMO PAULISTAAO REGIONALISMO

DO NORDESTE

Agradeço inicialmente o convite da doutoraSudha Swarnakar para proferir esta conferência deabertura do Colóquio Jorge Internacionalmente Amado,na Universidade Estadual da Paraíba. É de justiçatambém estender o agradecimento ao doutorHumberto Oliveira, meu ex-aluno e atualmentedestacado colega na UEFS, que propiciou esta par-ticipação no evento. Dito isso, passemos ao temada nossa fala.

A partir de 1928, com a guinada telúrica dosmodernistas de 22, o Nordeste, até então refratá-rio às novidades europeizantes da Semana de ArteModerna, encontra uma possível identidade entreas suas embrionárias vertentes de modernidade

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literária e as propostas “futuristas” e modernistascapitaneadas pela nova metrópole econômica do país.

Seguindo, deliberadamente ou não, o exemplopioneiro de Gilberto Freyre, em Pernambuco, Jor-ge Amado e outros jovens intelectuais da provín-cia inserem a Bahia no quadro do pensamento ar-tístico e social do Século XX. Posturas contráriasaos gritos histriônicos da paulicéia desvairada eramvistas como forma de atraso cultural do Nordes-te, enquanto os escritores dessa região brasileiraperseveravam na gestação de uma nova consciên-cia crítica que explodiria dois anos depois, com ochamado Romance de 30.

Enquanto a arte concebida pelos jovens docentro metropolitano construía sua identidade apartir do alimento antropofágico digerido na Eu-ropa, os jovens da “roça” tiravam da terra as raízescom que se alimentavam. Mesmo em São Paulo,um intelectual como Monteiro Lobato, umbilical-mente moderno quando visto no quadro de qual-quer literatura de recepção mundial, adotou, pio-neiramente, postura similar a que viria a caracteri-zar a literatura nordestina, sendo de prontoexecrado pela vaia juvenil e visto como um passa-

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dista. Tais fatos – que daqui a pouco serão anciõescentenários, quando a Semana de 22 completaráum século – exigem um reexame com olhos dohoje.

Em fevereiro de 2022 o Brasil estará celebran-do a aventurosa eclosão da Semana de Arte Mo-derna, nome pomposo para os três dias de even-tos realizados no Teatro Municipal de São Paulo.Artes plásticas, literatura e música foram os temascentrais das discussões e performances distribuí-das na segunda-feira, dia 13, na quarta, dia 15, e nasexta-feira, dia 17 de fevereiro de 1922. Espera-seque, no bojo do centenário, sejam vistos e com-preendidos os fatos que, ao longo do século XX,ganharam um estatuto mítico capaz de enublartudo aquilo que não representasse uma aceitaçãopassiva e contritamente religiosa dos feitos e fatostraquinados pelos seus corifeus.

O espírito de corpo dos chamados modernis-tas conduzia um rolo compressor capaz de esma-gar, como uma camada de lama asfáltica, a todosaqueles que não demonstrassem uma aceitaçãoincondicional do pensamento considerado novo.Todos conhecem o estigma imposto pelos van-

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guardistas ao “passadista” Monteiro Lobato. Comoo furacão da botocúndia derrubou os cavaletes daexposição de Anita Malfatti, diagnosticada porLobato como paranóia ou mistificação, os pon-tas-de-lança do modernismo conseguiram, poralgum tempo e em vários contextos, esvanecer oesplendente vendaval com que Lobato enrique-ceu a cultura brasileira, desenterrando os tesourosescondidos no mato e nas ruas obscuras. As idéi-as do Jeca Tatu, ironicamente esboçadas porMonteiro Lobato como proposta de construçãoda identidade nacional, não foram percebidas nummomento em que o Brasil buscava uma fisionomiaeuropéia.

É verdade que a partir de 1928 o modernismobrasileiro passou a merecer este adjetivo [brasilei-ro], mas o fosso estava cavado e dividia profunda-mente os territórios da arte. Convém lembrar queOswald de Andrade, passados os embates da cha-mada fase demolidora do modernismo, mostrouo significativo fato de Urupês ser anterior a Pau Brasile à obra de Gilberto Freyre. Reconhecia, assim, ovalor e a consistência do pensamento de MonteiroLobato, aproximando a guinada de 28 do pionei-

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rismo do velho amotinado de Taubaté, com a se-guinte confissão: “nós também trazíamos nas nos-sas canções, por debaixo do futurismo, a dolênciae a revolta da terra brasileira.” (Andrade, 1971, p. 4)

O episódio constituído pela crítica de Lobatoà pintora Anita Malfatti, publicada em dezembrode 1917, oito dias após a abertura da exposição,demorou para ser superado, especialmente peladeclarada admiração do autor pela arte clássica epela crença na sua permanente e irretocável per-feição. Contraditoriamente ao que ele realizoucomo escritor e como intelectual sensível à cultu-ra brasileira, no famigerado artigo cometeu umequívoco, aí sim, passadista ao pontificar: “Todasas artes são regidas por princípios imutáveis, leisfundamentais que não dependem da latitude nemdo clima.” (Lobato, 1917/1967, p. 60)

Ao tempo em que arguía ferozmente a adesãode Anita às vanguardas européias, o escritor exal-tava seu talento e suas qualidades. No pensamen-to crítico de Monteiro Lobato estava fortementeembutida a proposta de construção de uma estéti-ca brasileira independente, livre de qualquer he-rança colonial que representasse perda de identi-

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dade. Daí a intolerância que causou ressentimen-tos.

O caso Monteiro Lobato é, essencialmente,paradigmático porque antecipa uma perspectivaartística similar que fez com que o modernismodo nordeste só eclodisse plenamente – ou só fos-se percebido como tal – com o romance regiona-lista de 30. As manifestações anteriores, por te-rem sido confundidas como contrárias à moder-nidade “desvairada”, não foram assimiladas pelahistoriografia literária brasileira.

O modernismo paulista figura na memória na-cional como um inexcedível núcleo do pensamen-to de vanguarda, excluindo de modo maniqueístatoda e qualquer oposição aos seus trejeitos, sob apecha de passadismo. Por isso, convém tentar equi-librar a balança de Diké – Filha de Themis –, assi-nalando que o movimento moderno correspondea um momento da história do país dominado pelachamada “política café com leite”. As oligarquiase as elites quatrocentonas produziram seu contra-veneno, representado pelas manifestações de re-beldia estética da Semana de Arte Moderna. Criou-se toda uma mitologia de apanágio ao Modernis-

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mo do centro econômico do país, anulando qual-quer significado possível a ser atribuído à cons-trução da modernidade artística em outras regiõesdo país. Na Bahia, nós, por exemplo,1 bem inten-cionados intelectuais de província, fomos respon-sáveis por interpretar os avanços e recuos do pen-samento artístico da década de vinte como a maisenfadonha forma de conservadorismo.

Como se sabe, a própria dinâmica social pro-duz, em qualquer parte, seus mecanismos de con-servação das estruturas envelhecidas e de irrupçãodas novas formas. Tanto no Nordeste patriarcalquanto no Centro Sul capitalista os padrões esté-ticos europeus mais tradicionais constituíam mo-eda de grande valor. A substituição automática dasformas emboloradas, anteriormente trazidas daEuropa, por todo e qualquer grito de rebeldia que

1 “Nós, por exemplo” foi o título do espetáculo musical deinauguração do Teatro Vila Velha, em 1964 na Bahia. Serviude estopim do tropicalismo, que eclodiu três anos depoisem São Paulo. Participaram do show Caetano Veloso,Fernando Lona, Gal Costa, Gilberto Gil, Maria Bethânia,Tom Zé e outros.

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atravessasse o Atlântico era a grande tentação dosjovens artistas brasileiros. Tanto lá, no Centro Sul,quanto cá, no Nordeste, o atraso com relação àmodernidade européia era um fato sensível. Asduas regiões do país reagiram de modo diverso ede acordo com fatores culturais distintos. Ao con-trário do que afirmou Lobato em 1917, as artesnão são regidas por princípios imutáveis, nem porleis fundamentais que não dependem da latitudenem do clima. As artes são parcialmente condici-onadas, antes que possam obedecer a princípiosimutáveis. A grande metrópole econômica do paísestava marcada, para o bem e para o mal, por umarealidade diversa daquela constituída em outraslatitudes.

É desse modo que a obra de Jorge Amado de-senvolve, de forma consequente e definida, umavertente identitária da nacionalidade destinada asubstituir a figura do índio, idealizada por Alencar,por outros atores, incluindo a mistura de sanguesdos diversos cantos do mundo. Desde os árabes,que aqui chegaram para mercar suas quinquilhari-as, até os africanos trazidos em porões de aviltantesnavios do mercantilismo. Assim, tem lugar de re-

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levo, na obra amadiana, o negro real e palpávelque conseguiu afirmar a sua cultura, a despeito doaniquilamento do sujeito propiciado pela escravi-dão. Centrando a noção de valor de um povo mes-tiço para além da história oficial, Amado realizacom maior propriedade desde Tenda dos Milagres(obra que explicita as questões levantadas comexemplar picardia desde quando despiu a camisa-de-força do Partido Comunista), até a maduraconstrução de obras como Tocaia grande e O sumiçoda santa.

Desconstruir a herança colonial européia e for-talecer a auto-estima da gente mestiça – ou do povobrasileiro – é o que Jorge Amado começou a fa-zer, a partir dos anos 70, por entre as frestas dahistória contada e por entre as festas dos sentidosincendiados na tempestade do texto. O apimenta-do, o gorduroso e o farto uso de frutos africanos,ao contrário de diminuir o valor da obra amadiana,como queria uma prestigiada vertente da críticauniversitária, vieram a se impor como elementosdefinidores de um valor identitário já simbolizadonas coisas da cozinha por Gilberto Freire.

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Quando o escritor traça seu próprio caminho,muitos estudiosos de formação socialista passama ver Jorge Amado como uma espécie de desertorda causa do proletariado. Depois de aderir, comfervor juvenil e sem nenhuma crítica, aos princí-pios do realismo socialista, ele se deixa tomar pelodesencanto e do desencontro que se apoderaramda esquerda após a necrose do totalitarismo stali-nista. Os crimes do autoritarismo foram expostosaos olhos do mundo e, nesse balanço de perdas eganhos, houve quem descobrisse que os fins nãojustificam os meios.

Outros, no entanto, continuaram impermeáveisao senso do lugar comum: os fins não justificam.Mas continuaram usando todos os meios parachegar aos fins sonhados.

Considerado este quadro, por que os anos ses-senta principiaram a negação do valor da obraamadiana? Até a metade do século, o arrebatamen-to pelo seu texto era quase unânime, vindo, emseguida, um gradativo obscurecimento crítico. Nosanos setenta, esta obra conheceu verdadeiro mas-sacre, tanto do ponto de vista político quanto cul-tural. No Brasil, a exemplo do que ocorreu nos

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Estados Unidos, setores envolvidos com questõesraciais apontaram a valorização da mestiçagem nouniverso de Jorge Amado como mistura impura,ou como apagamento da pureza racial negra. (Êpa,rei! Este filme já passou em algum lugar. E deu noque não deu.)

De um lado e do outro, o mito da pureza étni-ca gera segregações. Não é exagero afirmar que aobra de Jorge Amado chegou a ser rejeitada porduas razões contrárias: de um lado, os feitores dapureza africana desconfiavam da construção ro-manesca de uma civilização negro-mestiça (vendona mestiçagem o embranquecimento); do outrolado, arianos e quase-brancos não toleravam a ele-vação do negro e do mestiço à categoria mítica deherói incondicional (vendo na exaltação da mesti-çagem a apologia de raças até então ocupantes deespaços exclusivamente periféricos).

A valorização de uma mitologia crioula pelaobra amadiana punha em pé de igualdade velhosmitos europeus e novos mitos afro-brasileiros.Valores, quer sejam politicamente corretos ou não,machistas, patriarcais, ou desconstrutores do es-tabelecido – valores integrantes dos costumes cri-

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oulos da Bahia – constituíram a isto que chamode “mitologia crioula” da obra amadiana.

Sabemos que a cultura impõe preceitos e pre-conceitos, mutáveis em vários tempos. Se, hoje, aacademia revaloriza a obra de Jorge Amado, con-vém lembrar que, há dez ou vinte anos atrás, oscursos de Literatura das universidades baianas, seulugar de origem, não dedicavam nenhuma disci-plina ao estudo dos livros do maior contador dehistórias da raça brasileira.

Hoje, estudos de gênero admitem observar olugar da mulher nos romances de Jorge Amado,estudos étnicos percorrem a construção do orgu-lho negro e mestiço, estudos culturais encontramimportantes estratégias de descolonização do pen-samento.

Mas por que a obra desse contador de históri-as da civilização mestiça atravessou turbulências ecalmarias, quedas e baixas na bolsa de valores dacrítica da cultura?

Uma hipótese é que isso decorre do fato deJorge Amado ter sido, de início, um fiel tradutordos princípios e mandamentos do marxismo so-viético, para em seguida abandoná-los em favor

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do flerte mais aberto com os festins da pequenaburguesia. Se o romancista dos primeiros livrosescrevia para comunista nenhum botar defeito, aose desligar das imposições do Partido, ele experi-mentou a liberdade absoluta de criar, renuncian-do inclusive ao princípio segundo o qual a litera-tura deve pôr em primeiro plano a sua função deconstrutora e forma do conhecimento. Livre paracriar, Amado procura a antítese da obra engajada:a literatura feita para divertir.

Por entre o riso solto e a narrativa de aparênciameramente anedótica, o romancista produz omelhor da sua obra, ocultando e entremostrando,velando e revelando o compromisso social porentre as dobras de um tecido alegre. Do discursomarcado pelo cumprimento de tarefas partidárias,evoluiu para um discurso pleno de sentidos, ar-madilhas, sugestões e arremedilhos.

Ora, o leitor habituado ao romance de tese,onde a mensagem política sobrepujava o jogo doprazer, veria o novo figurino amadiano com amesma suspeita dirigida à figura intelectual do ex-comunista. Deixar o Partido por discordar das suaspráticas era um fato considerado equivalente à trai-

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ção aos seus princípios. Daí a metralhadora gira-tória do patrulhamento ter varrido a obra de Jor-ge Amado, estimulando-o a aprofundar odistanciamento com as práticas ditadas pela esté-tica marxista dos anos de ferro.

Voltando ao tema proposto, podemos concluirque as diferenças entre o modernismo paulista e aolvidada modernidade nordestina permitiram tan-to a fixação dos traços mais nítidos tanto do ro-mance de 30 quanto de obras como a de JorgeAmado, cujos cem anos o Brasil e o mundo agoracomemoram, em eventos como este Colóquio JorgeInternacionalmente Amado, na Universidade Estadu-al da Paraíba.

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UMA GESTA CABOCLADO MODERNISMO BRASILEIRO

Ao mestre Afrânio Coutinho, que discutiueste texto durante o seminário

SIMBOLISMO E MODERNISMO NA BAHIA.

A poesia de Sosígenes Costa permaneceu porbastante tempo desconhecida do público brasilei-ro. O poeta teve o mesmo destino literário deKilkerry, também baiano, e do maranhenseSousândrade, cujo inventário poético somente foiavaliado postumamente – ambos os autores reve-lados através de revisões críticas devidas aos ir-mãos Augusto e Haroldo de Campos.

Coube a José Paulo Paes a tarefa de realizar umameticulosa pesquisa destinada a repor o texto dopoeta grapiúna na mira dos estudiosos brasileiros,que resultou no livro Pavão, parlenda, paraíso: umatentativa de descrição crítica da poesia de Sosígenes Costa,publicado em 1977 e em alguns outros trabalhos.

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Em seguida, o estudioso paulista reuniu originais,manuscritos e publicações esparsas de SosígenesCosta e editou a Obra poética, em 1978. Ressalte-se,todavia, que já em 1952, Andrade Muricy na suaobra essencial – Panorama do Movimento SimbolistaBrasileiro –, incluiu alguns textos do autor dos So-netos Pavônicos.

Foi em 1979 que o mesmo José Paulo Paes nosrevelou, pela primeira vez na íntegra, um longopoema narrativo, fragmentariamente incluídona Obra poética, ao editar o volume Iararana. Tantoa fixação do texto quanto o erudito ensaiointrodutório de sua autoria colocam a literaturabrasileira, mais uma vez, como devedora ao em-penho e ao rigor crítico do autor de Meia Palavra.

Escrito por volta de 1933, Iararana documentaos resultados do contato de Sosígenes Costa comas idéias estéticas que constituíram a espinha dorsalda revolução modernista, iniciada em 1922. Mas,ao mesmo tempo, marca os pontos de diferencia-ção entre o seu programa poético e o do grupopaulista, numa frutífera e personalíssima indepen-dência, apesar dos pontos de convergência ou dasconcessões às novidades da Semana. Contando a

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história da raça brasileira a partir da imposição dosvalores civilizatórios grecorromanos às culturasnativas do país, Iararana é a grande epopéia domodernismo grapiúna.

A expressão grapiúna é referente aos nascidosno sul do estado da Bahia, na região cacaueira, cujasaga escrita por Sosígenes Costa e convertida emprosa por Jorge Amado, Adonias Filho e muitosoutros escritores das terras do sem fim, documentaum ciclo da economia rural baiana em vias de to-tal extinção.

O texto de Sosígenes revela a compreensão deque à arte moderna cabe realizar a tarefa – que,aliás, já foi proposta pelo romantismo – de digeriros conceitos do mundo clássico, depois de des-truí-los e devorá-los, antropofagicamente. A pro-posta cultural da nossa Antropofagia não é umasimples formulação teórica do manifestooswaldiano, mas a tradução de uma prática elabo-rada pelo processo criador de escritores brasilei-ros; ou de qualquer escritor de várias regiões, com-prometido com a modernidade pós 28.

A região onde o poeta nasceu e viveu quasetoda a sua vida, o sul da Bahia, é a mesma em que

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a esquadra de Cabral aportou em 1500, trazendopara cá os mitos, misérias, valores e vícios da Eu-ropa. Iararana inscreve-se como uma odisséia ca-bocla, que conta a origem da cultura do cacau,usada como metonímia da civilização brasileira.O cenário da sua gesta é o mesmo do ensaiadodescobrimento do Brasil; o herói de alguns dosquinze cantos do poema é Tupã-Cavalo, nome como qual os caboclos da terra batizaram o centauroque atravessou o mar Atlântico e se adentrou pe-las águas míticas do rio Jequitinhonha. Umcentauro que fugiu do Olimpo para uma pontinhada Europa, no dizer do poeta, que representa atrajetória dos mitos e da civilização da velha Grécia,passando por Portugal, até chegar ao Brasil.

A violência com que o centauro se impõe aosíndios do lugar simboliza no poema a destruiçãoda cultura primitiva das terras de Pindorama, di-ante da força e do poder dos invasores, que seapresentaram, perante os séculos, como descobri-dores. O centauro “fugido da Oropa” violenta amãe d’água, a Iara dos nativos caboclos, gerandoassim a raça mestiça, simbolizada por Iararana –do tupi, ig, «água»; iara, «senhor» ou «senhora»;

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e rana, sufixo que significa «parecido com», «fal-so»; falsa iara, portanto.

Não se pode tomar a presença de um mito dacultura helênica no poema de Sosígenes Costa – ocentauro aculturado sob a denominação de Tupã-Cavalo – como uma mera alusão erudita, ao gostodos beletristas de ontem e sempre. Antes de reve-renciar a tradição clássica macaqueada pelas lite-raturas modernas, o autor de Iararana promove asua desmistificação, do mesmo modo como o DomQuixote, de Cervantes, desmistificou a novela decavalaria e a secular instituição cavalariana, atravésda sua penetrante e bem humorada caricatura. Adiferença fundamental é que Dom Quixote pas-sou à história como o típico personagem de cava-laria, mesmo sendo o antiherói, sem os poderesprenunciadores do super-homem que esta narra-tiva, medieval por excelência, prepara para eclodirnas histórias em quadrinhos do século XX e nasaventuras dos megaheróis do cinema.

Embora sustentada em mitos que o modernis-mo de 22 procurou exorcizar, a gesta grapiúna nãodeixa de ser um texto de feição modernista. Osmitos helênicos são protagonistas imponentes mas,

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finalmente, vencidos pelos mitos da gente cabo-cla, que constituem o novo elenco de divindadese figuras que habitam o poema.

Tupã-Cavalo, o centauro vindo de outras ter-ras para assustar, dominar e, consequentemente,escravizar os nativos encarna a figura coletiva doconquistador e colonizador ibérico; mais interes-sado em explorar as riquezas nativas do que colo-nizar, no sentido de construir uma nova culturana terra dominada.

Depois que vence e toma o que pertencia aosvencidos, ele retorna ao seu país, como no cantoXIII de Iararana:

“E quando na Oropa se soubeque estava de volta o cavalo-do-mar,os bichos da Oropa que enxotaram aquele cavalodo lugar mais bonito de lá,disseram assim:

– Olhem, menino, voltou do país das araraso cavalo-do-mar.Está queimado que nem salgo fugidomas voltou com dinheiro.

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– Oé! Então vamos convidá-lopra comer manjar do céu.”

Tupã-Cavalo, ao mesmo tempo que representao conquistador, pode incorporar na sua carga se-mântica a trajetória de todo o emigrante – expul-so das suas terras pelas circunstâncias da socieda-de – que, ao retornar, endinheirado, é recebidocomo filho pródigo. Os versos mágicos e de sim-plicidade primitiva de Iararana remetem, quasesempre, a múltiplos referentes, ora assemelhados,ora inteiramente contraditórios, numa evidente li-ção da natureza polissêmica do texto poético.

Significando como um todo a história da gentebrasileira, os versos de Iararana também pretendemsignificar desde a postura ideológica do autor atécada um dos fatos históricos que constituíram afisionomia da nossa cultura.

José Paulo Paes, no seu estudo crítico introdutório,embora revele uma compreensão penetrante eesclarecedora do poema, ao tentar avaliar a im-portância do texto, no quadro da literatura brasi-leira, é demasiadamente severo com o material dasua investigação, atribuindo um caráter anacrôni-co a Iararana; o que não perece justo.

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Levando-se em conta o fato de a Semana deArte Moderna ter ocorrido em 1922, enquantosomente em 1933 Sosígenes Costa assimilaria efe-tivamente as novas tendências, e realizaria a epo-péia grapiúna, pode-se dizer que estamos diantede um texto retardatário. Ressalte-se, porém, queembora o poema Iararana tenha sido escrito, naforma hoje conhecida, por volta de 1933, segun-do José Paulo Paes (1979), anteriormente foi feitauma versão em prosa, além de terem sido publica-dos fragmentos da gesta grapiúna, como textosautônomos, datados de época anterior a esta daconclusão do poema narrativo.

Mas não se pode proceder a uma revisão daliteratura brasileira a partir de uma cronologia rí-gida e de padrões cosmopolitas, tomando São Pau-lo como metrópole e exclusivo centro irradiadordos modelos estéticos. Evidentemente, não po-demos ignorar o fato da Semana de 22 ter se tor-nado um pólo difusor da nova arte brasileira, mastambém não é criterioso transformar este aconte-cimento em medida e parâmetro únicos da inven-ção moderna, esquecendo de outros critériosesclarecedores, trazidos pelas diversas manifesta-

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ções regionais. Tanto isso é essencial que o regio-nalismo de trinta propôs uma guinada na cenamodernista brasileira.

Se toda literatura está comprometida com ascondições sociais em que se dá a produção – eisto não somente a estética marxista considera umponto passivo, ou pacífico, mas quase toda cor-rente filosófica –, considerar autores ou obras deregiões distantes dos grandes pólos industrializa-dos e de consequentes influências econômico-cul-turais, conduzirá a resultados discutíveis. Esperaruma correspondência, a partir de confrontos cro-nológicos com obras e autores de núcleos e eixostomados como centros levará igualmente a con-clusões imprecisas e parciais.

O homem da velha Belmonte do poeta é comoo crocodilo de João Guimarães Rosa: um mestrede metafísica, para quem sua pequena lagoa é omundo inteiro que ele desconhece; um mar desabedoria.

Se quisermos falar em anacronismo estético,teremos que incluir nesta categoria quase toda aprodução literária brasileira que, vista a partir depadrões e marcos cronológicos europeus, somen-

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te em raros momentos pode ser considerada inte-grada ao quadro cultural do momento históricoem que foi produzida. Não é justo tomarmos al-gumas obras capitais da nossa literatura como demenor significado pelo fato de terem surgido anosapós a superação dos seus padrões formais naFrança ou até mesmo em Portugal. Estas obrassão importantes porque representam a respostada inteligência de um povo a determinadas circuns-tâncias da sua história. Os parâmetros para medira importância de uma obra literária são as condi-ções sociais em que ela é produzida, razão pelaqual a poesia de Gregório de Matos, por exemplo,não perde seu valor, diante do fato de Portugal, daEspanha e da Europa em geral terem produzidoanteriormente as formas que constituíram esta lí-rica.

O mesmo podemos dizer do poema Iararana,de Sosígenes Costa, em face das primeiras experi-ências modernistas da poesia brasileira. Escrito porum grapiúna, que vivia no sul da Bahia, entre asroças de cacau e as praias que viram, pela primeiravez, as naus dos conquistadores europeus, o poe-ma marca uma nova postura diante da arte. Uma

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postura eminentemente moderna e destinada arever os pontos da tradição que estabeleceramobstáculos ao livre fluir da sensibilidade e da ex-pressão poética brasileira.

É conveniente levarmos em conta o fato de omodernismo ter chegado à Bahia, enquanto pro-dução e recepção plenas, somente em 1928, coma publicação e a imediata DESPUBLICAÇÃO do livroSamba Verde, de Godofredo Filho, e a criação darevista Arco & Flexa (escrita com x), a primeira ten-tativa de grupo em favor da nova estética. Mesmoassim, um modernismo que se pretendia e autodenominava “tradicionismo dinâmico”, expressãousada por Carlos Chiacchio e que trazia no seubojo as contradições e variantes identitárias (termoque insisto em usar para marcar a diferença da es-crita) do modernismo baiano. Godofredo Filho,saudado e festejado no Rio de Janeiro – a entãocapital do país – e em São Paulo como modernis-ta de primeira água, recolheu seu livro de estréia, aser lançado pela Pongetti, o que não deixa de me-recer maior reflexão por parte dos estudiosos. Se-ria gratuito o gesto do poeta, ou a tradição pro-vinciana mantinha seu renovado prestígio?

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Um fato altamente significativo é negligencia-do pela crítica quando se trata da reação que omodernismo, nos moldes propostos pela Semanade 22, sofreu em diversos outros pontos do país.A fase iconoclasta, destinada mais a chamar a aten-ção do público do que a implicar uma propostaartística, conforme reconheceu o sempre atentoMário de Andrade, foi substituída pela consistên-cia propositiva de uma arte brasileira marcada pelaprodução surgida a partir de 1928, data da publi-cação de obras das mais representativas da nossaarte moderna. Desse modo, aspectos polêmicosda revolução estética de 22 que foram rejeitadospelos seguidores da nova corrente literária já esta-vam sendo substituídos pelos integrantes do nú-cleo propagador do Modernismo quando surgi-ram as reações nos diversos estados brasileiros.

Como em vários pontos do país o modernis-mo só ganhou forma a partir do final da décadade vinte, aí também se levantou uma consciênciacrítica capaz de rejeitar os cacoetes e as frases deefeito do primeiro instante demolidor. Uma inda-gação a ser feita é se esta não teria sido a razãopela qual Godofredo Filho retirou de circulação o

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livro Samba Verde, fortemente marcado pelas pri-meiras atitudes modernistas, enquanto sua poesiaposteriormente publicada está mais perto de pen-sada serenidade artística.

A posição de Sosígenes Costa não é diferente.Requintado poeta simbolista, Sosígenes se liga aogrupo de Jorge Amado, a Academia dos Rebeldes,experimentando os novos modelos e, posteriormen-te, incorporando as conquistas da modernidade aoseu fazer poético, que não abdicou do encanta-mento da forma do soneto.

Do ponto de vista de uma resposta cronológi-ca imediata, se a capital do estado procurava sub-meter aos usos do tempo provinciano os ecos darevolução estética que vinha da Europa, chegavacom atraso a São Paulo e era despachada para aBahia num trem ainda mais vagaroso; pouco po-dia se esperar das cidades do interior, como a Ilhéusonde Sosígenes Costa morava e publicava seuspoemas. O modernismo, na Cidade da Bahia, foimais uma acomodação das novas formas à forçada tradição, que uma mudança de atitude dianteda arte e da vida. Mas uma acomodação ruidosa,com ares de rebeldia, capaz de diluir o ímpeto dos

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poucos escritores da província dispostos a umanova atitude estética. Por isso mesmo, contraria-mente ao esperado, deslocado do horizonte deexpectação provinciano, Iararana se afigura comoum poema moderno; à frente de tudo o que sevinha fazendo na capital da Bahia. Um poema tãoimportante como Cobra Norato, de Raul Bopp, porexemplo, cuja primeira versão impressa apareceuapenas dois anos antes de Iararana, e que, por sisó, foi suficiente para colocar seu autor na primei-ra linha do modernismo brasileiro.

Abgar Bastos, no estudo introdutório “Bopp,Belém, Antropofagia e Cobra Norato” (1978), ligaeste texto ao segundo momento modernista, o de28: “A primeira edição de Cobra Norato é de 1931,mas o poema foi escrito em 1928.” Iararana foiescrito, portanto, mais ou menos na mesma épocaem que Cobra Norato ou, pelo menos, na época dapublicação do poema de Raul Bopp. Após a edi-ção de 1931, enquanto Bopp reescrevia CobraNorato, fiel aos novos rumos ditados pelo com-promisso estético assumido, Sosígenes Costa tam-bém reescrevia o seu Iararana; que, nas palavrasde José Paulo Paes – talvez impregnadas pelo ra-

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ciocínio topocêntrico da paulicéia desvairada – se-ria um reflexo do “modernismo visto do quintal”.Apesar de reconhecer vários aspectos positivos nopoema narrativo sosigeniano, Paes insiste no ca-ráter retardatário do mesmo, o que, de certo modo,justificaria a ausência do autor no quadro princi-pal do modernismo brasileiro.

Penso que a questão nuclear é que a história daliteratura nacional sempre foi escrita a partir dosdois maiores centros econômicos; considerando-se ainda o fato de os estudos publicados em revis-tas, jornais e livros de circulação regional não ob-terem repercussão semelhante àqueles editados noRio e em São Paulo. Daí a quase obrigatoriedadedos escritores de todos os estados brasileiros iremresidir nas duas grandes capitais. Continuar mo-rando nas cidades de origem sempre implicou emum ineditismo perante a crítica brasileira e a his-tória da literatura.

Desse modo, a gesta cabocla do modernismograpiúna de Sosígenes Costa, somente poderia serclassificada como uma obra intempestiva, ou comoum simples texto poético destinado a manter acontinuidade de uma velha atitude estética, se se

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tratasse de um texto de repetição. Mas, longe dis-so, é um poema vigoroso que, antes de propagarprogramas literários, se vale de novos recursospara, aliados à erudição do autor, realizar um pro-grama ideológico que difunde as idéias deSosígenes Costa em face ao problema da consti-tuição da raça brasileira. Longe, portanto, de serum texto de repetição do deslumbramento mo-dernista da Semana de 22, Iararana assume umcompromisso com a própria poesia narrativa mo-derna.

Anacrônico é o poema que se esgota enquantoatitude de adesão de um autor a um momento quese extingue, não cabendo o epíteto às obras quese colocam para além das formas da expressão,usando os estilos de época e correntes literáriascomo pretextos de redimensionamento do texto– como o faz Iararana.

Prova inequívoca do valor do poema deSosígenes Costa é o prazer estético despertado pelasua leitura ainda hoje, mais de meio século depois.Iararana não é somente uma obra que conta a his-tória de uma região e atribui uma origem mitoló-gica à cultura do cacau. É, principalmente, pelo

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seu enfoque metonímico, uma Moderna EpopéiaBrasileira, com iniciais maiúsculas.

O presente texto, revisto e modificado nas suas suces-sivas versões, foi originalmente publicado com o título de“Iararana, a grande epopéia do modernismo grapiúna”. BeloHorizonte, Minas Gerais Suplemento Literário, 29 de março de1980, p. 4-5. Republicado na Revista Brasileira de Língua eLiteratura, Ano III, nº 7, Rio de Janeiro, 1º trimestre de1981, p. 56-58.

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Capa de Iararana e foto de Sosígenes Costa.

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O SUMIÇO DA SANTA:SÍNTESE DO ROMANCE

URBANO DE JORGE AMADO

Um outro grande escritor brasileiro, emboramarinheiro de águas diversas, João GuimarãesRosa, nos dá a chave de um dos segredos da escri-ta de encantado, ou do ebó do filho de Oxóssi,Amado. Ao responder a uma pergunta do ensaístaalemão Günter Lorenz a propósito da ideologiada ficção latino-americana, ou mais especificamen-te de Asturias, numa margem do rio, e de JorgeAmado, na terceira, Guimarães Rosa discute o pro-blema do compromisso do escritor com a socie-dade em que vive.

Não nos esqueçamos que o autor de GrandeSertão: Veredas rejeitava a imposição de um discur-so partidário ao narrador de ficção, reservando

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para o artista um compromisso maior e menosimediato, um compromisso com a vida. Daí o fatoda referência feita por Rosa ser, mais apropriada-mente, aplicável à obra da maturidade de JorgeAmado e não aos seus romances da primeira fase.

Em janeiro de 1965, no Congresso de Escrito-res Latino-Americanos, realizado em Gênova, aquestão política e o engajamento do escritor erampalavras de ordem. Vejamos como, nestas circuns-tâncias, Guimarães Rosa via a obra de Jorge Ama-do. Para isto daremos a palavra, por um instante, aGünter Lorenz e a Guimarães Rosa, flagrando osdois num momento de diálogo durante o encon-tro na Itália.

Pergunta Günter Lorenz:

– “E Amado, o senhor não acha que estefabulista magnífico e amigo dos homens tambémpensa ideologicamente?”

Rosa responde:

– “Com certeza, ele também é um ideólogo,mas sua ideologia me é mais simpática do que a deAsturias. Asturias tem algo daquele distanciamento

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incorruptível de um Sumo Pontífice. Ele pronun-cia sempre novos dez mandamentos. Isto é admi-rável, mas não encanta. As palavras de Asturias sãopalavras de um pai, um patriarca, que pronunciasentenças no gênero do Velho Testamento. Ama-do é um sonhador, ele é com certeza também umideólogo, mas é a ideologia da fábula, com suasregras de justiça e expiação. Amado é uma crian-ça” – prossegue Guimarães Rosa, “uma criança –que continua acreditando na vitória do bem. Eledefende a ideologia menos ideológica e mais amá-vel que eu conheço. Asturias é a grande voz doJuízo Final. Amado dá pinceladas à toa até maisnão poder. Ele quer na verdade mandar para o di-abo várias coisas, mas isto ele faz com tanto charmeque a gente lhe acredita com maior razão.” (Rosa,1971, p. 285)

Creio que Guimarães Rosa sintetiza de modoinequívoco o que chamei de um dos segredos daescrita de encantado, ou do ebó do filho Amadode Oxóssi. Jorge não usa a sua pena como umalança de matar dragões, mas como uma vara decondão, querendo transformar a serpente do malem serpentinas do carnaval. Sim, a festa, a felici-dade, a alegria dos homens e das mulheres são o

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sonho obsessivo do velho contador de históriasda nossa gente. A literatura para Jorge Amado nãoé um catecismo onde se diz como devemos rezar,ela é um jogo, que nos convida ao riso. Ele alegrae diverte os seus leitores. Mas não se enganem:este menino sonhador de oitenta anos não temnada de ingênuo. Enquanto um olho dorme ooutro pisca malicioso e certeiro. Por isso, quandosugere, por entre breves clarões do raio, a gente lheacredita com maior razão. Jorge Amado é um fingidor.Finge tão amadamente que ensinou a Gabriela etambém a Dona Flor.

O texto de Jorge é maroto, matreiro. As armasdo cavaleiro, o santo do dragão, e os poderes deOxóssi, guerreiro imbatível, não são depostos naescrita do nosso Jorge, o não santo. Nele, os po-deres do Orixá e do Santo se escondem, numatocaia grande, para o golpe certeiro.

Na tradição luso-brasileira, desde Gil Vicente,com suas pantomimas e presepadas, que o textode um escritor hábil distrai e destrói a hipocrisia, ausura e a injustiça. Ridendo castigat mores é a divisaaplicada à obra vicentina. Rindo, corrige os costumes, aambição da obra amadiana.

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Mas esse objetivo o escritor baiano não con-fessa. Suas armas são certeiras, mas silenciosas. Ve-jamos o que dizem as palavras finais do pórticodo livro O sumiço da santa:

“Projeto de romance anunciado há cerca devinte anos, sob o título de A Guerra dos Santos, so-mente agora, no verão e no outono de 1987, naprimavera e no verão de 1988, em Paris, coloqueio enredo no papel. Escrevendo-o, diverti-me; se,com sua leitura, alguém mais se divertir, me dareipor satisfeito.” (Amado, 1988, p. 11)

Muita gente ingênua, intelectual, que só sabeler palavra grave, sisuda, acredita que as palavrasdeste livro são apenas “deliciosos divertimentospara adultos”, expressão feliz do poeta Carlos PenaFilho. (1969, p. 151) Não esqueçamos, porém, queo velho Jorge é um narrador dissimulado e sinuo-so, como se fosse Oxum a dona da sua escrita.Ou, como foi dito há pouco, o autor de D. Florquer que tudo mais vá pro inferno. Com uma di-ferença, elê não o faz com a revolta e ainconsequência juvenil dos protestos. O discretocharme da burguesia reside em dizer as coisas maisdesagradáveis de forma mais agradável possível.

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Ao trocar o nome original do livro A guerra dossantos, de aspecto épico e grandiloquente por umprosaico O sumiço da santa: Uma história de feitiçaria,Jorge Amado encena diante do leitor o papel dojogral alegre que se diverte ao fazer os outros sedivertirem. Ou melhor: que se diverte ao despis-tar o divertido leitor.

Evidentemente, não podemos dizer se a inten-ção consciente do autor era divertir ou despistar.Mas este texto nos diz que seu autor não é so-mente um escritor divertido. É um feiticeiro fingi-do que esconde os poderes do seu ebó. O sumiçoda santa é, na verdade, uma guerra de demiurgos,de deuses poderosos, um confronto de culturas eraças em busca de caminhos.

O realismo mágico da escrita amadiana con-verte-se em alegoria épica de um povo.

De um lado os valores sacrossantos da civiliza-ção européia cristã, representados pelo padre es-panhol José Antonio Hernadez, exemplo de bomcristão aos olhos inquisidores do Santo Ofício,valores estes reafirmados pela arquidiocese, na fi-gura de D. Rudolph, Bispo Auxiliar; pelos pode-res do Estado, através do coronel Raul Antônio

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ou do doutor D’Ávila, juiz de menores e falangistada Cruzada Anticomunista.

Do outro lado, a “gentinha”, a “ralé”, os cava-los de encantados trazidos da África nos porõesdos navios negreiros, a gente mestiça da Bahia,seus orixás, suas crenças, sua ética adversa à moraldominante.

O narrador dos romances de Jorge Amado si-mula a perspectiva do dominador, dos bem-nasci-dos homens da terra. A escolha vocabular marcadapelo preconceito das expressões usuais para de-signar os párias da pátria ganha relevo em con-fronto com a gesta plebéia, o canto das façanhasde heróis anônimos. Ironia e exaltação épica per-passam o texto numa fusão insólita: aquilo que eledesigna, entre irônico e sério, de “romancebaiano”. (No frontispício do livro, logo abaixo dotítulo O sumiço da santa: Uma história de feitiçaria, selê: “romance baiano”. Na contracapa, aparece oapelo festivo a gosto paulista: “só na Bahia podiaacontecer”.)

A nação negra e mestiça, que constitui cerca deoitenta por cento da população de Salvador, é oherói plural da narrativa amadiana.

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Assim como os poetas épicos e dramáticos daantiguidade clássica estabelecem um discurso re-corrente aos mitos e à tradição da sua cultura, acultura helênica, o texto amadiano se instauracomo diálogo intertextual com a cultura popularda Bahia, os mitos e tradições dos descendentesde príncipes e súditos africanos trazidos comoescravos.

As formas poéticas iorubanas, comuns na po-esia oral deste povo e rediviva nas manifestaçõesreligiosas do candomblé, em forma de saudação eapresentação, perpassam o discurso do narradoramadiano. São os orikis, ou saudações à cabeça doiniciado, ou ainda, para usar um termo da nossacultura chapa branca, um pequeno curriculum dequem se apresenta, pronunciando seu oriki.

Seguindo esta perspectiva crítica, Jorge Ama-do deve ser visto como um clássico da cultura doseu povo e do seu tempo, cujos temas constróemo perfil do herói coletivo: o homem comum.

Um clássico de um tempo agreste, mas um clás-sico, de uma civilização dita moderna, que segre-ga a maioria da população em relações econômi-cas e sociais tipicamente medievais. Não é por

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outra razão que, há muito tempo, Monteiro Lobatopercebeu: “Na planura da literatura brasileira, Jor-ge Amado vai ficar como um bloco súbito de mon-tanha híspida, cheia de alcantis, de cavernas, deprecipícios, de massas brutas da natureza.” (Loba-to, in: Amado, 1977, contracapa.)

Outros clássicos de todos os tempos, comoPlauto, Shakespeare, Molière, Gil Vicente ou Ma-chado de Assis, também fizeram dos homens edos costumes, das misérias e das pequenezas, dasgrandezas imperceptíveis e das coisas simples, amatéria ficcional mais densa e mais duradoura.

A simplicidade discursiva da obra amadiana, asua intenção de ser lido por toda gente, como umcontador de histórias, ao invés de afastá-lo damelhor literatura, como pode supor o pedantis-mo intelectual, ou o teórico engomado, como bem apropósito dizia Ezra Pound, insere Jorge Amadono rol de criadores universalmente lembrados. Masa presença física do autor, o seu grande prestígiopessoal , não permite ao nosso tempo umdistanciamento necessário para o julgamento se-guro e desapaixonado que só o próximo séculopropiciará. Quem viver verá.

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De forma incompleta e redutora ao âmbito deuma conversa breve, podemos dizer que a teia cen-tral do romance O sumiço da santa, ou o pretexto daalegoria, gira em torno de Adalgisa, abicun rebeldeque teima em impedir a passagem do seu santo. Opreceito ensina que quando uma mulher grávidase submete aos rituais de iniciação, o filho aindaem gestação também se liga ao axé do orixá. Foi oque aconteceu com Adalgisa, pequeno óvulo fe-cundado sem que a mãe o soubesse.

Para relembrar o trecho do livro em que seconta a iniciação da Andreza, a mãe de Adalgisa,nos mistérios de encantado, peçamos ao próprioJorge Amado para falar. É ele quem conta:

“Nem por amigada com espanhol branco e rico,Andreza desdenhou de sua gente negra e pobre,seguiu frequentando candomblés, cumprindo obri-gações de santo e normas de amizade. Quando oconheceu, acabara de acertar com mãe Aninha, doAxé do Opô Afonjá, que se recolheria à camarinhano próximo barco de iaôs para raspar a cabeça ereceber Yansã, seu orixá de frente. Assim o fez,deixando-o [ao amante] a ver navios, contando nosdedos os dias da iniciação. Apenas não sabia que

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levava no ventre o produto dos amores com ogringo que a seduzira e lhe montara casa: estavaprenha de Adalgisa. Ao descobrir, já era tarde: iaôde éfun completo, cabeça raspada, corpo pintado,banhos de maionga, o encantado dentro dela jun-to com o abicun. Não lhe pertenceria o filho quepalpitava em seu ventre, pertencia à santa. No diado ôrunkó, da festa do nome, Andreza saltara duasvezes, dera dois nomes, um era o seu, o outro, o doabicun.”

E prossegue o narrador:

“Sendo Adalgisa ainda menina nova, acabara deultrapassar a primeira etapa, a dos sete anos,Andreza lhe contara o acontecido com abundân-cia de detalhes, informando-a acerca da condiçãoespecial dos abicuns. [...] Adalgisa recusou-se aouvir, sua crença era outra, outros seus santos, seuspreceitos e obrigações, seus fundamentos. Nãoadiantou lhe revelar o preço que pagara substituin-do o abicun nos dois limites, aos sete e aos quatorzeanos: no derradeiro, aos vinte e um, o preço era amorte. Adalgisa, espanhola, tinha outros compro-missos, a coroa de espinhos, a cruz de Cristo, des-prezava crendices e feitiçarias.

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Não chegou a saber que Andreza às vésperasdo aniversário fatal, para que a sentença ao se cum-prir não fulminasse o abicun, propusera a Oyá atroca de cabeças: no dia da festa da maioridade dafilha mais velha, amanhecera morta. Adalgisa nãosabia o que fosse troca de cabeças e a palavra abicunnada lhe dizia.” (Amado, 1988, p. 233.)

A partir da recusa de Adalgisa em aceitar o cul-to dos orixás, uma série de outros binômios, oude outras dicotomias, põe em confronto, de umlado, os valores civilizacionais da Europa cristã e,do outro lado, os valores mestiços que se impõemao povo baiano. Todo o livro de Jorge Amado éuma exaltação à cultura popular, suas crenças, seusmistérios, e é também uma divertida sátira à gentebem-nascida do lugar. Neste sentido, O sumiço dasanta se estrutura como uma síntese criativa dopróprio universo ficcional amadiano, onde adicotomia de valores que desemboca na demoli-ção do eurocentrismo é o tema recorrente. Carac-terística das suas últimas obras, a síntese do uni-verso ficcional construído, O sumiço da santa segueo mesmo rastrear operado por Tocaia grande, em-bora a oposição rural versus urbano trace a linha

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divisória entre estes dois romances e duas gran-des vertentes da obra amadiana.

Ao contar os feitos da gente do povo, especial-mente do negro, Amado é generoso e pródigo emexaltação. O dominado, quer pelas antigas leis daescravidão, quer pelas modernas leis do liberalis-mo econômico, é herói incondicional, numa in-versão violenta da perspectiva da tradição literá-ria. Sabemos que a literatura, durante sua longahistória, até o realismo, marcado pelo determinis-mo reducionista, tratou as camadas submetidas àscondições humilhantes de vida como personagensmoralmente tão miseráveis quanto sua própriacondição material. Somente um novo realismo,inaugurado no Brasil com o romance de 30, foicapaz de redesenhar a caricatura do homem dopovo de modo a despertar maior solidariedade.

Como na velha Cidade da Bahia o trabalhador,o proletariado, se confunde com o negro e o mes-tiço, este, com suas crenças, seus valores, sua cul-tura portanto, é o herói permanente da gestaamadiana. Embora mudando o tom do seu dis-curso, abandonando as sentenças partidárias dosprimeiros romances, Jorge Amado não abando-nou a sua crença na redenção do homem sofrido.

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Toda alegoria do texto do contador de históri-as do povo tem uma só e redundante finalidade:afirmar os valores dos vencidos e sua olvidada con-dição de vencedores. Mas o ódio, o ressentimen-to, é um fantasma que não tem lugar na obra damaturidade amadiana. A conciliação, a fusão e oentendimento são a pedra de toque da construçãoda sua república, do seu universo ficcional. Esteselementos desembocam num outro: o sincre-tismo. No realismo fantástico de Jorge Amado aimagem de Santa Bárbara se confunde com Yansã,negra sensual que abandona o andor e sai cami-nhando pelos becos e ladeiras da Bahia.

Enquanto a santa católica é apenas uma ima-gem inerte, objeto de veneração, o orixá é umacriatura viva que participa das virtudes e das fra-quezas da sua gente. Assim, Santa Bárbara se tor-na forte, quando encarna Oyá, a Yansã das tem-pestades dos homens.

Se o seu discurso de hoje encanta e seduz odespreocupado e bem nascido burguês, a que quasetodos aspiram ser; se ele quer divertir e alegrar;seus livros são também um palimpsesto, onde porvezes brotam as palavras sob as palavras. Raspada

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a tinta da escrita fácil e divertida, pelo leitor atentona busca do que se esconde por sob as cores lu-minosas, surge o cerne da sua alegoria, como amoral da fábula.

É esta escrita escondida e, às vezes, quase apa-gada que me encanta na obra amadiana. Uma obraque possibilita a cada um de nós o encontro dasraízes da sua própria formação, seu próprio cará-ter, o caráter do homem do lugar, do baiano, mís-tico e manhoso como as histórias de encantadodo velho e amado romancista.

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Salvador nos tempos dos bondes.

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Ainda hoje há quem ache que a literatura e asartes foram feitas para atazanar o juízo do vivente.

A escola, a universidade, as instituições acadê-micas são responsáveis, por um lado, pelo enri-quecimento teórico do fazer artístico e, por outrolado, pela construção de uma barreira entre estaatividade criadora e o público. As obras de artepreferidas pela escola, pelo gosto acadêmico, são,quase sempre, aquelas que mais se distanciam dogosto comum. O teórico engomado suspeita dotexto alegre e brincalhão, tendo uma queda todaespecial por tudo aquilo que causa desprazer edesconforto.

O ROMANCINHODOS TURCOS

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O pior é que esta doença pega. Muita gente vaipelo mesmo beco sem saída. Assim, filme paraintelectual degustar (êta palavra pedante da por-ra), com múltiplos orgasmos mentais, é filme cha-to, perverso, sustentado numa trama sadomaso-quista que faz o pobre do pagante sair do cinemacom a cara na fossa. Aí o cidadão que já se acostu-mou a sofrer, na fila do banco, nos malfeitos dogoverno, na saia da sogra, acha que o filme é den-so, é forte e outras coisas mais. Livro é a mesmacoisa. Autor divertido, alegre, não é autor para serlevado a sério. Autor de peso é aquele cuja leiturapesa, entedia.

Veja o caso de Jorge Amado. Até hoje tem genteque não se conforma que o antigo escritor dasmisérias e mazelas da classe proletária tenha “ade-rido ao romance burguês”; tenha feito da sua penauma pluma leve, que leva ao riso breve e faz cóce-gas na cabeça.

Mas o gosto de sofrer já vem de longe: tudoque é bom é pecado ou engorda.

Nós, brasileiros, estamos em boa companhia: osportugueses. Foram eles que aqui chegaram e resol-veram acabar com a alegria dos nativos: tinha índia

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pelada pra todo canto e índio vivendo em peca-do com as vergonhas – lá deles – balançando pratodo lado.

Mas os portugueses não gostavam de folga.Eram gente de bem. De bigodes bigs. Veja que lápros tempos de Dom João Corno, em mil quatro-centos e tantos, os poetas palacianos resolveramcompor a chamada poesia de folgar. Feita para diver-tir a corte e conquistar as damas. Não deu outra:com o passar do tempo, esta poesia passou para ahistória como coisa sem valor literário. Os anosquinhentos, que vieram em seguida, quiseram exi-gir do poeta o papel de condutor espiritual do seupovo. A arte está a serviço das causas nobres. Ale-grar e divertir é papel dos palhaços. Por isso, ain-da hoje há quem ache que a literatura e as artesforam feitas para atazanar o juízo do vivente.

Se você pensa desse modo, então passe por lon-ge do livrinho que Jorge Amado acaba de publi-car: A Descoberta da América pelos Turcos, ou aindaOs Esponsais de Adma. Feito para rir e divertir, otexto conta as aventuras de sírios e libaneses pelasterras grapiúnas. Somente um escritor maduro esenhor do seu ofício poderia escrever um livro que

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é só riso. Nada de siso. Uma história divertida, comfinal feliz e tudo que a gente tem direito. Afinal,quando um escritor amadurece, descobre que im-por histórias tediosas é coisa do adolescente queo adulto ainda quer ser.

No mais, é uma história de safadeza, contadacom o jeitão bem brasileiro que só um cantadordas roças de cacau ou um pescador do mar de to-dos os santos sabe contar. Com malícia e graçaque transformam o erótico num jogo inocentecomo o sorriso de uma puta.

Na fala desse contador de histórias as coisas seconfundem, tudo é possível. A lógica da ilógicarealidade perde sua logicidade. Isto sois, minha Bahia,isto passa em vosso burgo. Esta é a forma fantásticaque o realismo assumiu na obra de Jorge Amado,este é o seu realismo fantástico. Tão diferente etão próximo do realismo fantástico de outros narradores do continente íberoamericano.

A Descoberta da América pelos Turcos é um livropara a gente ler de uma sentada, rir, rir e não pen-sar em nada. Em nada de ruim. Guimarães Rosajá disse que Jorge Amado é uma criança que con-tinua a acreditar na vitória do bem sobre o mal. É

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isso que este livrinho ensina. Para quem busca umamensagem, a moral da fábula, Jorge Amado quermesmo é mostrar com olhos de menino, comolhos de ternura e generosidade, os emigrantesárabes que ajudaram a construir a nossa cultura, acultura brasileira. E isso em boa hora, quando ára-bes palestinos sofrem na carne os horrores do ódiomútuo para com os seus irmãos de um mesmooriente médio e de um outro credo. No livro deJorge todos são boa gente: “sertanejos, sergipanos,judeus, turcos – dizia-se turcos, eram árabes, síriose libaneses –, todos eles brasileiros”.

É mais um livro a serviço da ideologia dohumanismo fraternal pregado e praticado pelovelho romancista. A condição de um lugar edênico,onde a diversidade racial não provoca conflitos,mas une a todos – árabes, judeus, arianos e ne-gros, sem esquecer de nós mesmos, brasilíndios –em torno de uma nova nação: a nação dos brasi-leiros de todas as cores e credos.

Publicado originalmente como recensão crítica a A Desco-berta da América pelos Turcos. Colóquio/Letras, n.º 140/141,1996, p. 341.

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O etnólogo Edison Carneiro.

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EDISON CARNEIRO,O ETNÓLOGO E O POETA

DESCONHECIDO

A pesquisa de fontes no âmbito dos estudosliterários tem ganho especial relevância no mun-do acadêmico pela constante possibilidade de re-visão do saber estabelecido. Até alguns anos atrás,o trabalho de recuperação ou de resgate dos do-cumentos da memória cultural era pouco valori-zado em meio aos estudiosos universitários dasletras. Somente após a chegada tardia dos Estu-dos Culturais ao Brasil, em substituição aos estu-dos orientados pelo método estrutural, foi plena-mente reconhecida a importância do paciente e,muitas vezes, infrutífero, ou não recompensado,trabalho de exploração das fontes documentais.

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Como a inteligência universitária brasileira in-siste em se realimentar sob o signo da exclusão,somos periodicamente assaltados pela tentativa dedesqualificação dos métodos, recursos e técnicasque, após passarem pela relativamente longa faseufanista, conseguem se estabelecer como instru-mentos auxiliares do trabalho de investigação. Pas-sada a deslumbrada adolescência de um modismointelectual, ele consegue, finalmente, se integrarao sistema de produção da cultura e imprimir re-sultados que ultrapassem as circunstâncias em quefoi produzido. Nesse momento, infelizmente, aerudição apressada em seguir a moda dos estilistase costureiros da academia decreta a obsolescênciadas práticas de domínio socializado, para proporincertas incursões por novos caminhos que, porsua vez, também serão destituídos, ou destruídos,antes de imprimirem resultados permanentes.

O mais produtivo, sabemos, sempre será a di-versidade, assegurando a continuidade dos cami-nhos abertos por uns e a tentativa de descobertade novos recursos e métodos por outros estudio-sos, permitindo através da pluralidade uma cons-tante realimentação cultural. O gosto arraigado pela

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exclusão prefere, no entanto, desqualificar o defi-nido para estabelecer o ainda difuso e confuso.

Tal aconteceu com a investigação das fontes edocumentos da memória cultural que, finalmente,anos atrás, voltou a ser valorizada. Aqui e ali, in-vestigadores solitários dão continuidade aos seustrabalhos sem preocupação de sintonia fina coma direção dos ventos acadêmicos da estação. Comum pé na academia e outro no mundo da rua, GilFrancisco continua se ocupando de uma velhapredileção, adquirida quando colaborava com pes-quisadores do campo da história. Ao longo de al-guns anos, esse baiano radicado em Aracaju vemreunindo, nas bibliotecas e nos arquivos públicosdaqui, de lá e de outros cantos, documentos domodernismo brasileiro e das suas manifestaçõesna Bahia.

A incursão pelo ainda pouco conhecido rastrodeixado pela Academia dos Rebeldes é um dosresultados desse largo e longo caminho paciente-mente percorrido. Tenho insistido em artigos so-bre o tema que a imagem que nos foi passada daAcademia dos Rebeldes – inclusive por JorgeAmado, durante muitos anos – foi a de uma mera

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e falhada reunião de adolescentes malcriados. Ca-pitaneados pela, contraditoriamente, constelar edesagregadora figura de Pinheiro Viegas, os jo-vens rebeldes de 1928 teriam apenas deixado seufel escorrer pelas ladeiras oleosas da Bahia – con-forme a versão ainda corrente.

Nada mais impreciso. Esta antiacadêmica Aca-demia dos Rebeldes, apesar das aparentes e reaiscontradições, marcou uma resposta da culturabaiana, através da melhor aquilatação do seusubstrato negro-mestiço identificado com o po-pular, aos caminhos do modernismo paulista deimportação. Se o modernismo eclodido com aSemana de Arte Moderna de 22 valorizava a expe-riência nacional como moldagem de um figurinovindo de fora, os baianos do final da década devinte pareciam menos modernos e maisregionalistas porque partiam do local, do regionale do popular para – atingir a utópica universalida-de. Tanto assim que os rebeldes baianos de 28 aju-daram a formar uma nova consciência que ganhouvisibilidade com o romance regionalista de 30.

O etnólogo, o homem negro-mestiço que seintegraria – como intelectual bem formado nos

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cânones europeus – aos valores ancestrais da suagente, Edison Carneiro, teve um papel decisivona aproximação de Jorge Amado com a culturaplural e mestiça da Bahia. Desde muito jovem, oentão poeta e futuro etnólogo conduzia outrosrebeldes – erês desdgarrados – aos terreiros deencantado, onde foi dignificado com o posto deogã. Ao saudar a aparição do seu primeiro livro deestudos antropológicos, Religiões negras: Notas deetnografia religiosa, de 1936, Jorge Amado não so-mente ombreia o jovem estreante de apenas 24anos aos clássicos do tema e dos estudos correlatos(Nina Rodrigues, Artur Ramos, Manoel Quirinoou mesmo o grande Gilberto Freire) como ressal-ta a importância até então impar do trabalho deEdison Carneiro: um estudioso da cultura negraque viveu a realidade concreta do seu objeto deestudo, por se tratar, ele-mesmo, de um entre osmuitos agentes do mundo de mistérios dos orixás.

“É, além de tudo, um estudo feito por um ho-mem da mesma raça que os estudados. EdisonCarneiro nesses estudos nada tem de diletante. Coma raça africana da Bahia, ele sofreu, ele riu em gran-des gargalhadas, ele dançou nas macumbas, comeu

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comidas de estranhos nomes, amou. É um deles eassim esse estudo, esse depoimento, ganha em for-ça e em verdade. Não fala um estudioso das religi-ões Negras. Fala um membro das religiões negrasque é ao mesmo tempo um dos sujeitos mais cul-tos do Brasil.” (Amado, 1936, p. 43)

O texto acima, do então jovem e já consagradoromancista, que a exemplo do etnólogo tinha ape-nas 24 anos, traz nas suas poucas palavras muitodo que o futuro autor da grande epopéia negro-mestiça da Bahia percebe e elabora do caráter psí-quico e social da cultura de raízes africanas. Ob-serve-se que, com brevidade concisa, ele chamaatenção para o mal-estar do homem negro numacultura que se percebia e se queria branca: “elesofreu”. Logo em seguida, Amado assinala a ex-traordinária força de resistência cultural: “ele riuem grandes gargalhadas...” É esta capacidade –dentre algumas outras – de reagir à adversidade,através da alegria e do riso, legada pela raça negraà cultura mestiça, que constitui um aspecto funda-mental da identidade brasileira.

Convém firmar que a etnografia de EdisonCarneiro não tinha nada da visão exterior e este-

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reotipada evidenciada por um Nina Rodrigues, porexemplo. Daí, o jovem rebelde ter sido capaz –conforme já na época sublinhava Jorge Amado –de reafirmar ou corrigir as especulações anterio-res, fundado tanto em pesquisas de campo quantoem “documentação notável”.

O futuro autor de Jubiabá encerra o seu artigosobre Religiões negras, de Edison Carneiro, com umaconfissão que fornece os indícios para que procu-remos mais no companheiro de geração e menosno olímpico Gilberto Freire as bases da sua visãosociológica do negro: “Eu o admiro e o amo comoa um irmão que sabe muito, que todo dia me ensi-na uma coisa nova”.

Mas voltemos um pouco mais no tempo, dei-xando em suspenso a aparição do cientista socialcom o já nascido clássico Religiões negras: Notas deetnografia religiosa, conforme a crítica favorável doscompanheiros da época. Voltemos no tempo paraflagrar o poeta adolescente.

Em 1928, quando começam as atividadesetílicas, boêmias e intelectuais da Academia dosRebeldes, tanto Jorge Amado quanto Edison Car-neiro, os dois mascotes do grupo, tinham apenas

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dezesseis anos. Antes de se aventurarem nas pági-nas mais duradouras dos livros, ambos os escrito-res se valeram das voláteis páginas dos jornais paradar vazão à inquietação intelectual e à rebeldiaincontidas. Assim, Edison Carneiro publica umacoletânea formada por trinta poemas em moldesde folhetim. Embora esta palavra seja habitualmen-te usada para os romances e novelas editados emfragmentos nas páginas dos jornais, acreditamosser também a que melhor define a publicação igual-mente fragmentária de Musa Capenga nas colunasdo diário A Noite, de Salvador, no período de 24de setembro a 27 de novembro de 1928.

Curiosamente, embora chamado de poeta, aexistência do livro em folhetim não era lembradamesmo pelos amigos e admiradores que ainda tra-zem na memória a atuação intelectual de EdisonCarneiro. Bem verdade que Jorge Amado sempreo identificou como poeta; inclusive, no já citadoartigo “O jovem feiticeiro”, o romancista reafir-ma a vocação poética do companheiro e justifica,em termos condizentes com as crenças esposadasnos anos trinta, a manifestação de um talento líri-co através da pesquisa e do ensaio também cha-

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mado de sociológico. Ao explicar a transmutaçãodo lirismo, da sensualidade e da sentimentalidadebaiana – fatos tão próximos da poesia – em pro-sa, Amado também dá conta da sua própria voca-ção poética que se espraiou nos primeiros roman-ces. A crítica da época destacava com frequência apoesia inerente à prosa amadiana, generosamentederramada nas narrativas e nas falas do povo mes-tiço. Observe-se como as palavras ditas a respeitodo jovem etnólogo também se aplicam ao roman-cista das terras e mares da Bahia:

“Leva na sua alma a alma mística e sensual daCidade da Bahia, corre as suas ruas de nomespoemáticos e doces; é, por assim dizer, o seu filhomais amado. Noutra época menos angustiosa que anossa, Edison Carneiro não seria o ensaísta. Seriao grande poeta desta Cidade da Bahia de Todos osSantos, poeta amado nas escolas e nos salões pelosmeninos, pelas moças e mesmo pelos almofadinhas,porque cantaria os costumes e a vida da sua Cida-de, a ingenuidade das meninas, a sabedoria dos mole-ques.” (Amado, 1936, p. 42)

Os grifos da palavra amado, que aparece duasvezes nesta passagem, são nossos, para sublinhar

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– através de uma aligeirada hipótese de mani-festação de uma fala subjacente – a possível pre-sença inconsciente de Amado na compreensão daobra do amigo. A expressão a sabedoria dos mole-ques, que também sublinhamos, traduz outro bor-dão característico da obra amadiana.

Mas voltemos ao poeta Edison Carneiro, dei-xando para um outro texto o enfoque da passa-gem do Jorge Amado poeta para o Jorge Amadoromancista. Dizíamos que, curiosamente, emborachamado de poeta, o fato da existência do livroem folhetim não era lembrado mesmo pelos ami-gos e admiradores que ainda trazem na memória aatuação intelectual de Edison Carneiro. E tal con-tinuaria ocorrendo não fosse a acu idadeinvestigatória de Gil Francisco. Pesquisando do-cumentos sobre Pinheiro Viegas e a Academia dosRebeldes, este bendito e ladino “rato de arquivose bibliotecas” que é Gil Francisco atirou no queviu e acertou no que não viu: resgatou, para sur-presa de todos nós, o tão citado e até então desco-nhecido poeta Edison Carneiro, revivificado numretrato de corpo inteiro.

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A Musa Capenga, de Edison Carneiro, e agoratambém um pouco de Gil Francisco, nesta suanova roupagem em moldes de livro, é uma coletâ-nea formada por trinta poemas curtos e vazadoem versos de deliberada irreverência modernista.O insólito da dicção corre por conta da ousadaoriginalidade de um talento intelectual em buscada sua própria expressão, que só chegaria a termoanos mais tarde através da prosa ensaística. Aquiestá um poeta ainda sem maiores recursos, semlograr a plena identificação com o leitor, mais jádespontando como um intelectual do seu tempo,sensível às questões que identificariam sua futuraobra de ensaísta.

Bem verdade que, muitas vezes, a abordagemdos temas ainda estava preso aos preceitos e pre-conceitos que viriam a ser, por ele mesmo, derru-bados, como o tratamento dispensado ao negro,frequente na época mas hoje rechaçado como es-tratégia de afirmação. Num poema intitulado “Ra-lhando”, o objetivo visado é inteiramente apaga-do, na perspectiva do leitor de hoje, pela experi-ência do irreverente humor do poema piada quefecha o texto.

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O poema é aberto com os versos:

“Ah, negra faceira!Que tolice, minha negra,[...]que você tenhaespichadoseu cabelo.Para queessa belezaartificial?”

Ao começar defendendo a identidade negra ea valorização dos encantos inerentes a esta raça,Edison Carneiro antecipa-se a todos que viriam aexaltar as qualidades positivas do negro, a exem-plo de Jorge Amado e de Dorival Caymmi, na suaprópria geração, ou de Caetano Veloso, numa dasgerações posteriores. Mas o poema perde a suaeficiência e se desvia do objetivo pretendido quan-do cede à piada de gosto duvidoso. Com os pri-meiros anos do modernismo surgiu o poema-pia-da, uma forma apressada de interpretar adesconcertante simplicidade da linguagem propos-ta pela mais sólida concepção de modernidade

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estética. Como consequência, os jovens intelectu-ais ainda pouco imbuídos do sentido artístico damodernidade tomavam como regra os pontos pi-torescos e a aparente natureza pouco densa dasinovações no processo de construção literária. Éo que se vê nos poemas da juventude de EdisonCarneiro. Para censurar o fato da sua “negrafaceira” ter transformado os cabelos em “ligasmelenas”, isto é, em cabelos longos e soltos, elerecorre a uma forma de humor corrosivo, senãodepreciativo e desprovido de graça. Fazendo refe-rência às estradas de ferro e de rodagem em cons-trução na época, o jovem poeta Edison Carneiroarremata:

“E vocêbem que podiaconcorrercom o pixaimpara cercá-lasa farpas de arame.”

A conclusão do poema, nada poética, sem dú-vida, surpreenderia ao futuro leitor do habitual-

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mente correto e atento etnólogo Edison Carnei-ro. Pode-se argumentar que, do mesmo modo queo irreverente compositor Gabriel, o Pensador, fazhumor em “Loura burra”, o poeta modernista dosanos vinte estaria adotando similar efeito cômico.Mas, na perspectiva atual, quando se afirmam osvalores de uma raça e de uma cultura anteriormentehumilhadas pela escravidão e pela posterior con-denação à desgraça econômica, qualquer sátira quepermita ser usada como valoração negativa podeser evitada, para não reforçar os preconceitos.

Não esqueçamos, porém, que o momento vi-vido por Edison Carneiro era outro e que o con-ceito persecutório do politicamente correto, útil porum lado e caricato por outro, ainda não ditava aconduta norte-americana, politicamente incorre-ta. Pulando do político para o poético, digamos,portanto, que não é poeticamente correto julgar umtexto dos anos vinte numa perspectiva de quaseum século depois.

Mas em compensação ao mau gosto (e ao ara-me farpado) da chave de ouro besouro do poema “Ra-lhando”, um pouco antes, em “Ameaça”, o poeta-rebelde vai buscar na cultura negro-mestiça da

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Bahia e nas suas crenças mais fortemente arraiga-das o tema e o título do texto. Diante de umahistorinha de amor malsucedida e da desditosa dorde cotovelo, o jeitinho brasileiro mais uma vez seaplica através da usual chantagem mística, evocan-do a macumba, seu ebó ou seu padê:

“Vou ao Pau Miúdoe trago,para botar na sua portauma coisa feita,dessas que fazemmorrer de amor,preparada,minha beleza,pelas mãosdo grande magoJubiabá.”

Jorge Amado, anos depois, tomaria Jubiabácomo tema de um dos seus romances; muito pro-vavelmente em consequência do conhecimento deEdison Carneiro com o babalorixá do Pau Miúdoque incorporava o caboclo Jubiabá. Este poema é

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talvez a primeira referência literária a Jubiabá que,mais recentemente, na década de oitenta, reapare-ceria nos versos da chamada axé music, na sua fasecriativa e ainda não desvirtuada pela homofoniada indústria cultural. Jerônimo, que foi um dos maisimportantes criadores da música baiana dessa épo-ca, evocava Jubiabá e seus poderes sobre os pro-tegidos pelos despachos e padês, nos versos dopoema musical que diz:

“Toda nega faz amor com ele,Toda branca tem o maior tesão.”

Confirmam-se assim, meio século depois, ospoderes e as delícias dos feitiços de amor.

Os incipientes poemas de Edison Carneiro, emMusa capenga, não obstante denunciarem a procurade uma elocução literária inovadora e de uma per-sonalidade expressiva característica do seu autor,servem de manancial a muitos cursos de água quepodem ser derivados da sua cachoeira de suges-tões e aportes culturais.

Bem verdade que o próprio autor – apesar dosdezesseis anos, idade em que a razão e a autocrítica

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não são parceiras constantes – vê a precariedadeda sua musa ou do seu invento artístico, propon-do como referencial definidor o epíteto capenga.Mas esta poesia gauche não foi vã. Foi um primeirocampo de prova para as idéias e as palavras de umrebelde que deixaria seu nome inscrito entre asmais fidedignas contribuições ao estudo da cultu-ra popular brasileira; estudo fundado na consti-tuição étnica deste caleidoscópio vivo chamadocultura brasileira.

A partir da descoberta destes textos por GilFrancisco, passamos, todos nós que chegamosdepois do seu achado, a dever ao abelhudo e afor-tunado investigador o primeiro impulso ao estu-do da gênese da escritura do poeta e etnólogoEdison Carneiro. Estamos, portanto, diante de umcaso bem-sucedido de pesquisa de fontes e docu-mentos da memória cultural. O mérito de Gil Fran-cisco reafirma a máxima de Pessoa que, pequena,aqui ressoa:

Tudo vale a pena...

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O “burro sem rabo”, do início do século XX.

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REFERÊNCIAS

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AMADO, Jorge. Tereza Batista cansada de guerra. Rio de Ja-neiro, Record, 1972.

AMADO, Jorge. Tocaia Grande: a face obscura. Rio de Janeiro,Record, 1984.

AMADO, Jorge. Navegação de cabotagem; apontamentos para umlivro de memórias que jamais escreverei. Rio de Janeiro, Record,1992.

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BASTOS, Abgar. Bopp, Belém, Antropofagia e CobraNorato. In Raul Bopp: Mironga e outros poemas. Rio, Civi-lização Brasileira, 1978, p. 132-136.

BOPP, Raul. Mironga e outros poemas. Rio, Civilização Brasi-leira, 1978.

CAMPOS, Augusto de. ReVisão de Kilkerry. 2ª ed. São Pau-lo, Brasiliense, 1985.

CAMPOS, Augusto de; CAMPOS, Haroldo de. ReVisão deSousândrade. 2ª ed. São Paulo. Invenção, 1979.

CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. 5ª ed. São Pau-lo, Nacional, 1967.

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COSTA, Sosígenes. Obra poética. 2ª ed., revista e ampliadapor José Paulo Paes. São Paulo, Cultrix / INL, 1978.317 p.

CRUZ, Gutemberg. Édison Carneiro. Blog do Gutem-berg,2007. http://blogdogutemberg.blogspot.com/2007/05/dison-carneiro.html

DELLA VOLPE, Galvano. Sociologia. São Paulo, Ática, 1980.

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1928: Modernismo e maturidade

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GILFRANCISCO. Musa Capenga – Poemas de Edison Carnei-ro. Salvador, Letras da Bahia, 1996.

GODOFREDO FILHO. Samba Verde, Rio de Janeiro,Pongetti, 1928.

MONTEIRO LOBATO. Crítica. In: AMADO, Jorge: Tietado Agreste. Rio de Janeiro, Record, 1977.

MONTEIRO LOBATO. Paranóia ou mistificação [Críticaoriginalmente publicada em dezembro de 1917]. Idéiasde Jeca Tatu. São Paulo, Brasiliense, 12ª ed. 1967, p. 59-65.

MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da Cultura brasileira. 3ªed. São Paulo, Ática, 1977.

PAES, José Paulo. Iararana ou o modernismo visto do quin-tal. In Sosígenes Costa: Iararana; introdução, apuraçãodo texto e glossário por José Paulo Paes; apresentaçãode Jorge Amado; ilustrações e capa de Aldemir Martins.São Paulo, Cultrix, 1979, p. 3-19.

PAES, José Paulo. Meia palavra. São Paulo, Cultrix, 1968. 58p.

PAES, José Paulo. Pavão, parlenda, paraíso: uma tentativa de des-crição crítica da poesia de Sosígenes Costa. São Paulo, Cultrix/ PACCE, 1977. 127 p.

PENA FILHO, Carlos: Livro geral; poesia. Recife, Universi-dade Federal de Pernambuco, 1969.

ROSA, João Guimarães. Literatura deve ser vida. Um diá-logo de Günter W. Lorenz com João Guimarães Rosa.In: Exposição do novo livro alemão. Frankfurt am Main,Ausstellungs und Messe-GmbH des Börsenvereins desDeustschen Buchhandels, 1971.

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SEIXAS, Cid. Modernismo e diversidade: impasses e con-frontos de uma vertente regional. Légua & meia: Revistade literatura e diversidade cultural. Feira de Santana, UEFS,v. 3, nº 2, 2004, p. 52-61.

SEIXAS, Cid. O tom épico do modernismo na Bahia. Sal-vador, Letra Viva, Suplemento do Diário Oficial e da Se-cretaria de Cultura do Estado da Bahia, nº 1, nov. 1987,p. 4-5.

SEIXAS, Cid. Recensão crítica a A Descoberta da Américapelos Turcos. Colóquio/Letras, n.º 140/141, 1996, p. 341.

SEIXAS, Cid. Jorge Amado: Da guerra dos santos à demolição doeurocentrismo. Salvador, CEDAP, 1993.

SEIXAS, Cid. Triste Bahia, oh! Quão dessemelhante. Notas sobrea literatura na Bahia. Salvador, EGBA / Secretaria daCultura e Turismo, 1996. (Coleção As Letras da Bahia)

SERRA. Ordep. Jorge Amado, sincretismo e candomblé. In:Águas do rei. Petrópolis, Vozes, 1995, p. 289-360.

VVAA. Arco & Flexa. Edição fac-similar – 1928/1929. Sal-vador, Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1978.

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POESIATemporário; poesia. Salvador, Cimape, 1971 (Coleção Auto-

res Baianos, 3).Paralelo entre homem e rio: Fluviário; poesia. Salvador, Impren-

sa Oficial da Bahia, 1972.O signo selvagem; metapoema. Salvador, Margem / Departa-

mento de Assuntos Culturais da Secretaria Municipalde Educação e Cultura, 1978.

Fonte das pedras; poesia. Rio de Janeiro, Civilização Brasilei-ra; Brasília, Instituto Nacional do Livro, 1979.

Fragmentos do diário de naufrágio; poesia. Salvador, Oficina doLivro, 1992.

O espelho infiel; poesia. Rio de Janeiro, Diadorim, 1996.

ENSAIO E CRÍTICAO espelho de Narciso. Livro I: Linguagem, cultura e ideologia no

idealismo e no marxismo; ensaio. Rio de Janeiro, Civiliza-ção Brasileira; Brasília, Instituto Nacional do Livro, 1981.

LIVROS DO AUTOR

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86 A Literatura na Bahia | 2

A poética pessoana: uma prática sem teoria; ensaio. Salvador,CEDAP; Centro de Editoração e Apoio à Pesquisa, 1992.(Tiragem fora do comércio.)

Godofredo Filho, irmão poesia; ensaio. Salvador, Oficina doLivro, 1992. (Tiragem fora do comércio.)

Poetas, meninos e malucos; ensaio. Salvador, Universidade Fede-ral da Bahia, 1993. (Cadernos Literatura & Lingüística, 1.)

Jorge Amado: Da guerra dos santos à demolição do eurocentrismo;ensaio crítico. Salvador, CEDAP, 1993.

Literatura e intertextualidade; ensaio. Salvador, CEDAP, 1994.Herberto Sales. Ensaios sobre o escritor. Salvador, Oficina do

Livro, 1995. (Tiragem fora do comércio.)O viajante de papel. Perspectiva crítica da literatura portugue-

sa. Salvador, Oficina do Livro, 1996. (Tiragem fora docomércio.)

Triste Bahia, oh! quão dessemelhante. Notas sobre a literaturana Bahia. Salvador, Egba; Secretaria da Cultura, 1996.

O lugar da linguagem na teoria freudiana; ensaio. Salvador, Fun-dação Casa de Jorge Amado, 1997. (Col. Casa de Palavras)

O silêncio do Orfeu Rebelde e outros escritos sobre Miguel Torga;ensaios. Salvador, Oficina do Livro, 1999. (Tiragem forado comércio.)

O trovadorismo galaico-português; ensaio crítico e antologia. Feirade Santana, UEFS, 2000.

Três temas dos anos trinta; textos de crítica literária. Feira deSantana, UEFS, 2003. (Cadernos de sala de aula, 1)

Os riscos da cabra-cega. Recortes de crítica ligeira. Org., intr. enotas Rubens Alves Pereira e Elvya Ribeiro Pereira. Feirade Santana, UEFS, 2003. (Col. Literatura e diversidadeCultural, 10)

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1928: Modernismo e maturidade

NO EXTERIORThe savage sign / O signo selvagem; poesia; trad. Hugh Fox.

Lansing, Ghost Dance, 1983. (Edição bilingue norte-americana.)

E-BOOKS

Desatino romântico e consciência crítica. Uma leitura de Amor dePerdição, de Camilo Castelo Branco. Cedap, ColeçãoOficina do Livro, v. 1, E-book.br, 2014. Web: issuu.com/e-book.br/docs/camilo

O silêncio do Orfeu Rebelde e outros escritos sobre Miguel Torga, 2ed. Cedap; Oficina do Livro, E-book.br, 2015. Web:issuu.com/cidseixas1/docs/torga

Literatura e intertextualidade. Cedap; Oficina do Livro, E-book.br, 2015. Web: issuu.com/cidseixas1/docs/intertextualidade

Noventa anos do modernismo na Feira de Santana de GodofredoFilho. E-book.br; UEFS, 2015. Web: issuu. com/e-book.br/docs/godofredofilho

Os riscos da cabra-cega. Recortes de crítica ligeira. 2 ed., Cedap;Oficina do Livro E-book.br,, 2015. Web: issuu.com/cidseixas1/docs/cabra cega

Da invenção à literatura. Textos de teoria e crítica. Cedap, Cole-ção Oficina do Livro, E-book.br, v. 4, 2015. Web:issuu.com/e-book.br/docs/invencao

Orpheu em Pessoa. Org. Cid Seixas e Adriano Eysen. Cedap,Coleção Oficina do Livro, E-book.br, v. 6, 2015. Web:issuu.com/e-book.br/docs/orpheu

Do inconsciente à linguagem. Uma teoria da linguagem na descobertade Freud. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web:issuu.com/e-book.br/docs/inconsciente

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A Literatura na Bahia | 2

A Literatura na Bahia. Livro 1: Tradição e Modernidade. Feirade Santana, E-book.br, 2016. Web: issuu.com/e-book.br/docs/tradicaomodernidade

1928: Modernismo e Maturidade. Livro 2 de A Literatura naBahia. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web:issuu.com/e-book.br/docs/1928

Três Temas dos Anos 30. Livro 3 de A Literatura na Bahia.Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web: issuu.com/e-book.br/docs/anos30

A essência ideológica da linguagem. Livro I de: Linguagem, culturae ideologia. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web:issuu.com/e-book.br/docs/linguagem1

Linguagem e conhecimento. Livro II de: Linguagem, cultura e ideo-logia. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web: issuu.com/e-book.br/docs/linguagem2

Sob o signo do estruturalismo. Livro III de: Linguagem, cultura eideologia. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web:issuu.com/e-book.br/docs/linguagem3

O contrato social da linguagem. Livro IV de: Linguagem, cultura eideologia. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web:issuu.com/e-book.br/docs/linguagem4

A Linguagem: do idealismo ao marxismo. Livro V de: Linguagem,cultura e ideologia. Feira de Santana, E-book.br, 2016. Web:issuu.com/e-book.br/docs/linguagem5

Stravinsky: uma poética dos sentidos. Ou a música como linguagemdas emoções. E-book.br, 2016. Web: issuu.com/e-book.br/docs/stravinsky

Castro Alves e o reino de eros. E-book.br, 2016. Web: issuu.com/e-book.br/docs/eros

Espaço de transgressã e espaço de convenção. E-book.br, 2016.Web: issuu.com/e-book.br/docs/espaco

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PARTICIPAÇÃO

CUNHA, Carlos; SEIXAS, Cid. (Org.). Breve romanceiro donatal; antologia poética. Salvador, Beneditina, 1972.(Coautoria)

CUNHA, Carlos; SEIXAS, Cid. (Org.). Sete cantares de amigo;antologia poética. Salvador, Arpoador; FundaçãoCultural do Estado da Bahia, 1975. (Coautoria)

CUNHA, Carlos; SEIXAS, Cid. (Org.). Lira de bolso; poesia.Salvador, Arpoador/Fundação Cultural do Estado daBahia, 1975. (Coautoria)

VV.AA.: Antologia de Poetas da Bahia em Alfabeto Braille; poesia.Salvador, Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1976.(Coautoria)

TAVARES, Luis Henrique Dias et alii: Jorge Amado. Ensaiossobre o escritor. Salvador, Universidade Federal da Bahia,1983. (Participação com o poema “Bahia de Todos osSantos”, dialogando com a obra amadiana.)

TORGA, Miguel: Novos contos da montanha. Rio de Janeiro,Nova Fronteira, 1996. (“Apresentação à ediçãobrasileira”, p. 1-8.)

GUERRA, Guido: Vila Nova da Rainha Doida; contos. Riode Janeiro, Record, 1998. (“Os contos de GuidoGuerra”, abas 1-2.)

DAMULAKIS, Gerana: O rio e a ponte; à margem de leiturasescolhidas. Salvador, Secretaria da Cultura e Turismo, 1999.(“A obra e o leitor: uma ponte necessária”, abas 1 -2.)

TORGA, Miguel: Contos da montanha. Rio de Janeiro, NovaFronteira, 1999. (Artigo: “Os Sonhos do Sujeito e suaConstrução Social”, p. 1-10.)

BRASIL, Assis: A Poesia Baiana no Século XX. Antologia.Rio de Janeiro, Imago, 1999. (Participação com dois

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poemas: “Pasto das águas” e “Tebas revisitada: Cidadeda Bahia”, p. 213-215.)

CASTRO, Renato Berbert de. As candidaturas de AlmachioDiniz e Wanderley Pinho à Academia Brasileira. Salvador,Academia de Letras da Bahia; Assembléia Legislativa,1999. (Artigo: “Renato Berbert de Castro: o viajante depapel”, p. 7-12.)

AZEVEDO et alii. Um grapiúna no país do Carnaval. Org. erevisão Vera Rollemberg. Salvador, Fundação Casa deJorge Amado; Edufba, 2000. (Artigo: “O sumiço dasanta: Um painel colorido da cultura mestiça”, p. 333-340.)

BRASILEIRO, Antonio. A estética da sinceridade & outrosensaios. Feira de Santana, UEFS, 2000. (“Estéticabrasileira e identidade pessoal”, abas 1-2.)

GUERRA, Emília Leitão: Poemas escolhidos.  Salvador,Edições Cidade da Bahia, 2000. (“A poesia ‘familiar’ deEmília Leitão Guerra”, p. 7- 17.)

PEREIR, Roberval. A unidade primordial da lírica moderna.Feira de Santana, UEFS, 2000. (“Unidade do modernoe do contemporâneo”, abas 1-2.)

CUNHA, Carlos. A flauta onírica e novos poemas. Salvador,Edições Cidade da Bahia; Fundação Gregório de Mattos,2001. (Artigo: “Do velho preciosismo ao non sense pós-moderno”, p. 151-159.)

PÓLVORA, Hélio, org.  A Sosígenes, com afeto.  Salvador,Edições Cidade da Bahia; Fundação Gregório de Mattos,2001. (Artigo: “Sosígenes Costa, epopéia cabocla domodernismo na Bahia”, p. 75-84.)

RIBEIRO, Carlos, org. Com a Palavra o Escritor. Salvador,Casa de Palavras; Fundação Casa de Jorge Amado, 2002.(Artigo: “Com a palavra Guido Guerra”, p. 64-73.)

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BARROS, José Carlos. (Org.). Bahia: Poetas e PoemasContemporâneos. Salvador, Módulo, 2003. (Poemasescolhidos, p. 67-76.)

CANIATO, B. Justo; GUIMARÃES, Elisa, org. Linhas eentrelinhas: Homenagem a Nelly Novaes Coelho. São Paulo:Editora Casemiro, 2003. (Artigo: “Academia dosRebeldes: Revisitando uma proposta não esboçada”, p.71-76.)

GUERRA, Guido. Auto-Retrato. Salvador, FundaçãoGregório de Mattos, 2003. (Artigo: “Auto-Retrato doEscritor Guido Guerra”, p. 285-291.)

MATTOS, Cyro; FONSECA, Aleilton, org. O triunfo deSosígenes Costa. Ilhéus, Editus, 2005. (Artigo: “Iararana,um documento dos anos 30”, p. 143-156.)

LEITE, Oliveira. (Org.). Vertentes culturais da literatura naBahia. Salvador, Quarteto, 2006. (Artigo: “Jorge Amadoe o canto épico da mestiçagem”, p. 39-50. )

HOISEL, Evelina; RIBEIRO, M. de Fátima. (Org.). Viagens:Vitorino Nemésio e intelectuais portugueses no Brasil. Salvador,UFBA, 2007. (Artigo: “Hélio Simões e as relações luso-brasileiras”, p. 49-56.)

GILFRANCISCO. (Org.). Musa capenga (obra esquecida deEdson Carneiro). Salvador, Fundação Cultural doEstado da Bahia, 2007. (Artigo: “A poesia de ÉdisonCarneiro redescoberta por Gilfrancisco”, p. 11-19.)

GUERRA, Guido.  Imortal irr everênc ia: depoimentos eentrevistas. Salvador, Ponte da Memória; AssembléiaLegislativa do Estado da Bahia, 2009. (Artigo: “GuidoGuerra: do jornalismo à criação literária”, p. 15-22.)

GUERRA, Guido.  Imortal irr everênc ia: depoimentos eentrevistas. Salvador, Ponte da Memória; Assembléia

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A Literatura na Bahia | 2

Legislativa do Estado da Bahia, 2009. (Depoimento: “Atimidez escondida”, p. 119-138.)

HOISEL, Evelina; LOPES, Cássia. Poesia e Memória: A poéticade Myriam Fraga. Salvador, Edufba, 2011. (Artigo “Palavrade mulher, coisa fecunda”, p. 291-294.)

MATTOS, Cyro de. Berro de fogo e outras histórias. Ilhéus,Editos, 2013. (Artigo de introdução ao livro: “A forçaselvagem”, p. 9-12.)

SEIXAS, Cid; EYSEN, Adriano, org. Orpheu em Pessoa.Cedap, Coleção Oficina do Livro, E-book.br, v. 6, 2015.Web: issuu.com/e-book.br/docs/orpheu (Artigo:“Fernando Pessoa, centro constelar do grupo Orpheu”,p. 161-180.)

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A Editora Universitária do Livro Digital, identificadacomo e-book.br, é um projeto editorial do CEDAP, com-partilhado por instituições de ensino e pesquisa voltadaspara o trabalho de difusão do livro. Conta atualmente coma participação da UEFS, com vistas ao apoio da BibliotecaNacional.

Os trabalhos publicados pela Editora Universitária doLivro Digital são de acesso gratuito aos leitores.

Propõe-se a funcionar de modo integrado, com núcle-os independentes, ou unidades editoriais, em instituiçõesde ensino e pesquisa. Na qualidade de universidade à qualestá ligado o proponente da iniciativa, a UEFS sedia a e-book.br, em cujo campus funciona a Coordenação do pro-jeto.

Caberá a cada Unidade Editorial criar suas própriasColeções de Livros que, embora com linhas editoriais edesigns gráficos independentes, deverão utilizar a marca daEditora Universitária do Livro Digital | e-book.br.

Os livros eletrônicos da e-book.br também podem serimpressos em tiragens destinadas a divulgação, leitura embibliotecas e outras formas de distribuição.

O QUE É e-book.br

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A LITERATURA NA BAHIAImpasses e confrontos de uma vertente regional

1 |Tradição e modernidade2 | 1928: Modernismo e maturidade

3 | Três temas dos anos trinta4 | Final do século XX

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Cid Seixas é jornalista e escritor.Antes de se tornar professor univer-sitário, atuou na imprensa como re-pórter, copy desk e editor, trabalhandoem rádio, jornal e televisão. Fundoue dirigiu um dos mais qualificados su-plementos literários, o Jornal de Cultu-ra, publicado na Bahia pelos Diáriode Notícias. É graduado pela UCSAL,mestre pela UFBA e doutor pela USP.

Na área de editoração, dedica-se aplanejamento e projeto de livros eoutras publicações. Além de ter cola-borado com jornais e revistasespecializadas – entre os quais O Es-tado de S. Paulo e a Colóquio Letras, deLisboa –, assinou, durante cinco anos,a conceituada coluna “Leitura Críti-ca”, no jornal A Tarde.

Professor Titular aposentado daUniversidade Federal da Bahia e Pro-fessor Adjunto da Universidade Es-tadual de Feira de Santana, onde atuounos projetos de criação do Mestradoem Literatura e Diversidade Cultural,bem como da UEFS Editora.

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é o segundo volume deA LITERATURA NA BAHIA

1928: MODERNISMOE MATURIDADE

e-book.brEDITORA UNIVERSITÁRIA

DO L IVRO DIGITAL

“Do modernismo paulista ao regionalis-mo do Nordeste”, “Uma gesta cabocla domodernismo brasileiro”, “O sumiço da san-ta: síntese do romance urbano de Jorge Ama-do”, “O romancinho dos turcos” e “EdsonCarneiro, o etnólogo e o poeta desconheci-do” são os cinco textos aqui incluídos.

Com o subtítulo Impasses e confrontosde uma vertente regional, a série de e-booksA Literatura na Bahia leva gratuitamente aopúblico da rede mundial de computadoresimportantes informações sobre a vida cul-tural baiana.