Conhecimento e conservação dos peixes marinhos e ... · ... no. 4 Conhecimento e conservação dos peixes marinhos e ... no. 4 da biodiversidade são determinados por fenômenos

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Biota Neotrop vol 13 no 4

Conhecimento e conservaccedilatildeo dos peixes marinhos e estuarinos (Chondrichthyes e Teleostei) da costa norte do Brasil

Alexandre Pires Marceniuk125 Rodrigo Antunes Caires3 Wolmar Benjamin Wosiacki2 amp Fabio Di Dario4

1Instituto de Estudos Costeiros Universidade Federal do Paraacute ndash UFPA Campus de Braganccedila Alameda Leandro Ribeiro sn CEP 68600-000 Braganccedila PA Brasil

2Setor de Ictiologia Museu Paraense Emiacutelio Goeldi CP 399 CEP 66040-170 Beleacutem PA Brasil 3Museu de Zoologia Universidade de Satildeo Paulo ndash USP CP 42494 CEP 04218-970 Satildeo Paulo SP Brasil

4Nuacutecleo em Ecologia e Desenvolvimento Socioambiental ndash NUPEM Universidade Federal do Rio de Janeiro ndash UFRJ Campus Macaeacute CP 119331 CEP 27910-970 Macaeacute RJ Brasil

5Autor para correspondecircncia Alexandre Pires Marceniuk e-mail a_marceniukhotmailcom

MARCENIUK AP CAIRES RA WOSIACKI WB amp DI DARIO F Knowledge and conservation of the marine and estuarine fishes (Chondrichthyes and Teleostei) of the north coast of Brazil Biota Neotrop 13(4) httpwwwbiotaneotropicaorgbrv13n4enabstractinventory+bn02613042013

Abstract The tropical western South Atlantic which includes a substantial portion of the Brazilian Exclusive Economic Zone is a region of endemism broadly recognized as being of prime importance for the conservation of the marine biodiversity The north coast of Brazil which comprises the states of Amapaacute Paraacute and Maranhatildeo from the mouth of the rio Oiapoque to the mouth of the rio Parnaiacuteba harbors the largest continuous mangrove in the world with approximately 8900 km2 The high discharge of freshwater and continental sediments in the delta of the Amazonas affects the regime of tides ocean currents and several oceanographic processes of the north coast with direct impact on the composition of the biota found in the region Despite its economic value and intrinsic biological relevance several aspects of the diversity of the marine and estuarine fishes of the region are poorly known This situation results mainly from a historical imbalance in terms of the number of studies devoted to increasing the knowledge of the marine biota along the Brazilian coast such as those dealing with species inventory and taxonomic revisions which are typically concentrated in the south and southwestern portions of the country The scientific production focused on marine organisms of the north coast is also imbalanced and reflects the relatively small number of taxonomists and research groups working on that subject The insufficient knowledge of the biodiversity of the marine and estuarine fishes of the north coast is an impediment to the implementation of adequate public policies aimed at the management of natural resources in the region In the long term that situation is potentially harmful in terms of conservation of a still poorly known biota A better understanding of the marine fish fauna of the north coast of Brazil will be achieved only through the investment in scientific research and personnel training in systematics and biogeography coupled with the modernization of the current infrastructure and expansion of scientific collections of the regionKeywords biodiversity inventory natural resources zoological collections Exclusive Economic Zone

MARCENIUK AP CAIRES RA WOSIACKI WB amp DI DARIO F Conhecimento e conservaccedilatildeo dos peixes marinhos e estuarinos (Chondrichthyes e Teleostei) da costa norte do Brasil Biota Neotrop 13(4) httpwwwbiotaneotropicaorgbrv13n4ptabstractinventory+bn02613042013

Resumo A regiatildeo tropical do Atlacircntico Sul ocidental que inclui uma porccedilatildeo substancial da Zona Econocircmica Exclusiva brasileira eacute uma regiatildeo de endemismo amplamente reconhecida como sendo de importacircncia primaacuteria para a conservaccedilatildeo da biodiversidade marinha A costa norte do Brasil que inclui os Estados do Amapaacute Paraacute e Maranhatildeo desde a foz do rio Oiapoque ateacute a foz do rio Parnaiacuteba abriga o maior manguezal contiacutenuo do mundo com aproximadamente 8900 km2 A alta descarga de aacutegua doce e sedimentos continentais no delta do Amazonas afeta o regime das mareacutes correntes oceacircnicas e uma seacuterie de processos oceanograacuteficos da costa norte com impactos diretos na composiccedilatildeo da biota encontrada na regiatildeo Apesar de seu valor econocircmico e relevacircncia bioloacutegica intriacutenseca diversos aspectos da diversidade de peixes marinhos e estuarinos da regiatildeo satildeo pouco conhecidos Esta situaccedilatildeo resulta principalmente de um desequiliacutebrio histoacuterico em termos do nuacutemero de estudos voltados ao conhecimento da biota marinha ao longo da costa brasileira como aqueles que tratam do inventariamento de espeacutecies e revisotildees taxonocircmicas que satildeo tipicamente concentrados nas porccedilotildees sul e sudeste do paiacutes A produccedilatildeo cientiacutefica focalizada nos organismos marinhos da costa norte tambeacutem eacute desequilibrada e reflete o nuacutemero relativamente baixo de taxonomistas e grupos de pesquisa trabalhando com o tema O conhecimento insuficiente da biodiversidade dos peixes marinhos e estuarinos da costa norte eacute um impedimento agrave implantaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas adequadas voltadas para o manejo dos recursos naturais na regiatildeo Agrave longo prazo essa situaccedilatildeo eacute potencialmente prejudicial em termos da conservaccedilatildeo de uma biota ainda pouco conhecida Um melhor conhecimento da fauna de peixes marinhos da costa norte do Brasil seraacute atingido apenas atraveacutes do investimento em pesquisas cientiacuteficas e formaccedilatildeo de pessoal em sistemaacutetica e biogeografia acoplado agrave modernizaccedilatildeo da infra-estrutura e expansatildeo das coleccedilotildees cientiacuteficas da regiatildeoPalavras-chave biodiversidade inventariamento recursos naturais coleccedilotildees zooloacutegicas Zona Econocircmica Exclusiva

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da biodiversidade satildeo determinados por fenocircmenos climatoloacutegicos e oceanograacuteficos (Amaral amp Jablonski 2005) que combinados ao componente filogeneacutetico (histoacuterico) influenciam o conjunto de espeacutecies encontradas nestas regiotildees (eg Nelson amp Platnick 1981)

A costa norte do Brasil compreende os estados do Amapaacute Paraacute e Maranhatildeo estendendo-se por mais de 2500 km com uma linha da costa bastante diversa (Isaac amp Barthem 1995) (Figura 1) No Amapaacute a linha da costa eacute retiliacutenea enquanto no nordeste do Paraacute e noroeste do Maranhatildeo eacute profundamente recortada tornando-se novamente retiliacutenea a partir da baiacutea do Tubaratildeo no Maranhatildeo (El-Robrini et al 1992) A regiatildeo eacute altamente instaacutevel em termos geomorfoloacutegicos em decorrecircncia da accedilatildeo de erosatildeo com grande deposiccedilatildeo de sedimentos que contribuem para o desenvolvimento de planiacutecies alagadas e grande nuacutemero de ilhas As reentracircncias e recortes da linha costeira favorecem a existecircncia de ecossistemas estuarinos dominados pela vegetaccedilatildeo de manguezal Os estados do Amapaacute Paraacute e Maranhatildeo abrigam a maior aacuterea de manguezal contiacutenuo do planeta com cerca de 8900 km2 que fornece uma grande quantidade de nutrientes para as aacuteguas marinhas adjacentes (Dittmar 1999) Os Golfotildees Marajoara e Maranhense representam complexos estuarinos bastante dinacircmicos com elevada descarga de sedimento de origem fluvial Somente o rio Amazonas descarrega no oceano entre 80000 e 250000 m3 de aacutegua doce por segundo (Isaac amp Braga 1999) e ateacute 14 milhatildeo de toneladas anuais de sedimentos (Milliman amp Meade 1983) contribuindo para a formaccedilatildeo de um substrato predominantemente lamoso na faixa costeira e na plataforma continental interna A descarga de um volume tatildeo elevado de aacutegua doce no ambiente marinho resulta em um sistema dinacircmico e altamente energeacutetico interferindo nas condiccedilotildees das mareacutes e ondas alterando a influecircncia das correntes marinhas

Introduccedilatildeo

O termo biodiversidade tem sido amplamente utilizado por bioacutelogos ambientalistas liacutederes poliacuteticos e cidadatildeos comuns desde meados da deacutecada de 1980 A popularizaccedilatildeo do termo coincide com o aumento da degradaccedilatildeo do meio ambiente e a perda de espeacutecies nas uacuteltimas deacutecadas do seacuteculo XX quando foram reconhecidas as regiotildees mais ricas biologicamente ou hotspots de biodiversidade (Myers et al 2000) A porccedilatildeo tropical do Atlacircntico Sul ocidental incluiacuteda na Zona Econocircmica Exclusiva brasileira (ZEE) eacute uma importante aacuterea de endemismo marinho e uma aacuterea prioritaacuteria para conservaccedilatildeo da biodiversidade (McKenna amp Allen 2002) Entretanto a regiatildeo permanece insatisfatoriamente conhecida em relaccedilatildeo a sua diversidade bioloacutegica (Couto et al 2003 Amaral amp Jablonski 2005)

A costa brasileira possui aproximadamente 8500 km de extensatildeo do rio Oiapoque (AP) ao Arroio Chuiacute (RS) com uma grande diversidade de caracteriacutesticas geoloacutegicas geograacuteficas climaacuteticas hidrograacuteficas e sedimentoloacutegicas que constituem uma grande diversidade de ambientes como estuaacuterios lagoas lagunas praias arenosas costotildees rochosos e recifes de coral (Brasil 2007) Ekau amp Knoppers (1999) com base nestas variaacuteveis reconheceram cinco regiotildees no litoral brasileiro regiatildeo Norte da foz do rio Oiapoque (4deg 16rsquo N) no Amapaacute agrave foz do rio Parnaiacuteba (3deg S) no Maranhatildeo regiatildeo Nordeste da foz do rio Parnaiacuteba agrave baiacutea de Todos os Santos (13deg S) na Bahia regiatildeo Leste da baiacutea de Todos os Santos ao cabo de Satildeo Tomeacute (22deg S) no Rio de Janeiro regiatildeo Sudeste do cabo de Satildeo Tomeacute ao cabo de Santa Marta (28deg 40rsquo S) em Santa Catarina e regiatildeo Sul do cabo de Santa Marta ao arroio Chuiacute (34deg 45rsquo S) no Rio Grande do Sul Nestas regiotildees os traccedilos distintivos

Figura 1 Costa norte do Brasil ressaltando as fronteiras entre os Estados do Amapaacute (AP) Paraacute (PA) e Maranhatildeo (MA) Setas indicam a foz dos rios Oiapoque (norte) e Parnaiacuteba (sul) Estrela vermelha indica o Cone do Amazonas Linha pontilhada indica o limite da Zona Econocircmica Exclusiva brasileira Coordenadas geograacuteficas em Graus Decimais (DD)Figure 1 North coast of Brazil highlighting boundaries between the States of Amapaacute (AP) Paraacute (PA) and Maranhatildeo (MA) Arrows indicate mouth of rivers Oiapoque (north) and Parnaiacuteba (south) Red star indicates the Amazon Cone Dotted lines indicate the limit of the Brazilian Exclusive Economic Zone Geographic coordinates in Decimal Degrees (DD)

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Peixes marinhos e estuarinos da costa norte do Brasil



e atuando em uma seacuterie de processos oceanograacuteficos com reflexo direto na composiccedilatildeo e distribuiccedilatildeo dos recursos naturais (Costa amp Figueiredo Junior 1998)

O Cone do Amazonas localizado na plataforma continental adjacente agrave foz do rio Amazonas eacute formado pelo acuacutemulo de sedimentos oriundos do rio Amazonas que ultrapassa os limites da Zona Econocircmica Exclusiva Na regiatildeo do Cone do Amazonas natildeo existe um talude ou elevaccedilatildeo continental tiacutepicos definidos por gradientes de profundidades Ao inveacutes disso existe um talude contiacutenuo que se estende ateacute a planiacutecie abissal interrompido por paleocanais e outras feiccedilotildees geoloacutegicas construtivas ou erosivas de origem natildeo tectocircnica (Alberoni et al 2007) Em relaccedilatildeo agraves correntes marinhas a costa norte eacute influenciada pela Corrente Norte do Brasil ou Corrente das Guianas que transporta as aacuteguas da plataforma externa e do talude na direccedilatildeo noroeste (Kuehl et al 1986) O ciclo de mareacutes e a pluviosidade fornecem nutrientes para a manutenccedilatildeo da fauna encontrada no sedimento lodoso e arenoso favorecendo o crescimento de larvas e juvenis de peixes crustaacuteceos e moluscos (Isaac amp Braga 1999) Como efeito a regiatildeo possui uma alta produtividade bioloacutegica sustentando uma elevada biomassa e uma complexa teia alimentar que influencia positivamente a atividade pesqueira local e de regiotildees adjacentes (Neiva amp Moura 1977 Wolff et al 2000) O ambiente pelaacutegico da plataforma por outro lado eacute considerado oligotroacutefico sem aacutereas de ressurgecircncias ou grandes arrecifes que poderiam influenciar o aumento da produtividade A zona eufoacutetica eacute pouco profunda e mantida por nutrientes provenientes da regeneraccedilatildeo bentocircnica dos setores costeiros rasos e pela vazatildeo dos rios e estuaacuterios que acabam promovendo a fertilizaccedilatildeo das aacuteguas (Brasil 2006) A biota da costa norte do Brasil tambeacutem eacute influenciada pela bacia do rio Orenoco que possui aproximadamente 830000 kmsup2 (Lundberg et al 1998) A descarga combinada de aacutegua doce do rio Amazonas e do rio Orenoco forma a ldquoPluma do Amazonas-Orenocordquo que confere agrave regiatildeo caracteriacutesticas oceanograacuteficas particulares (Ekau amp Knoppers 1999 Brasil 2007) e representa uma importante barreira separando as proviacutencias biogeograacuteficas do Caribe e do Brasil (Luiz et al 2012) Desta forma as caracteriacutesticas bioacuteticas e abioacuteticas da costa norte do Brasil permitem o reconhecimento de uma ecorregiatildeo distinta no Atlacircntico ocidental (eg Sullivan Sealey amp Bustamante 1999 Spalding et al 2007) A ictiofauna da costa norte do Brasil possui grande valor comercial e social A atividade pesqueira eacute predominantemente artesanal caracterizada pela utilizaccedilatildeo de barcos de madeira e operaccedilatildeo manual dos aparelhos de pesca (Isaac-Nahum 2006 Bentes et al 2012) A atuaccedilatildeo da frota pesqueira restringe-se agrave aacuterea costeira e agrave plataforma interna entre o limite norte do Brasil e o litoral do Maranhatildeo (Isaac et al 2008) A pesca na regiatildeo baseia-se em artes de pesca variadas como linhas de matildeo simples espinheacuteis de fundo redes de emalhe de grande porte currais e covos com destaque para aquelas de maior importacircncia econocircmica como redes de espera e tapagem (Espiacuterito-Santo et al 2005)

Apesar de sua relevacircncia em termos biogeograacuteficos ecoloacutegicos e comerciais a fauna de peixes da costa norte do Brasil eacute pouco conhecida representando a regiatildeo menos amostrada e estudada de toda ZEE brasileira Neste artigo apresentamos um panorama geral do conhecimento dos peixes estuarinos e marinhos da costa norte do Brasil Aleacutem disso procuramos identificar as principais razotildees pelas quais a ictiofauna da regiatildeo eacute pouco conhecida sugerindo medidas para que a situaccedilatildeo seja revertida

Material e Meacutetodos

Os cataacutelogos de 14 coleccedilotildees ictioloacutegicas brasileiras com livre acesso na internet foram consultados atraveacutes dos siacutetios dos projetos Neodat (httpwwwmnrjufrjbrsearchhtm) e SpeciesLink (http

wwwsplinkorgbr) com dados completos da Coleccedilatildeo de Peixes do Museu Paraense Emiacutelio Goeldi (MPEG) e do Museu Nacional Universidade Federal do Rio de Janeiro (MNRJ) obtidos diretamente com os curadores dessas coleccedilotildees totalizando 279890 lotes O nuacutemero de famiacutelias de peixes marinhos (Chondrichthyes e Teleostei) citados para as diferentes regiotildees da costa brasileira foi estimado com base nos acervos da coleccedilatildeo de Peixes do Museu Paraense Emiacutelio Goeldi (MPEG) do Museu Nacional Universidade Federal do Rio de Janeiro (MNRJ) Museu de Ciecircncias e Tecnologia da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Rio Grande do Sul Porto Alegre Rio Grande do Sul (MCP) e do Museu de Zoologia da Universidade de Satildeo Paulo (MZUSP) que satildeo as mais representativas em relaccedilatildeo aos peixes marinhos e estuarinos brasileiros A Figura 1 foi produzida no Quantum GIS (QGIS) com livre acesso em httpwwwqgisorg

Resultados e Discussatildeo

A compilaccedilatildeo mais completa e confiaacutevel sobre a ictiofauna marinha do Brasil realizada por Menezes et al (2003) apresenta um sumaacuterio das espeacutecies com ocorrecircncia documentada ou altamente provaacutevel na costa brasileira totalizando 1297 espeacutecies vaacutelidas das quais 925 satildeo registradas ou potencialmente ocorrem na costa norte do Brasil Das 200 famiacutelias de peixes reconhecidas por Menezes et al (2003) 146 supostamente satildeo encontradas na costa norte brasileira No entanto a maioria absoluta dos registros atribuiacutedos agrave regiatildeo proveacutem de inferecircncias feitas a partir de espeacutecies com registros mais ao norte como na regiatildeo das Guianas ou no nordeste do Brasil Dados de ocorrecircncia documentados a partir de exemplares coletados na costa norte do Brasil satildeo escassos e refletem a ausecircncia de material representativo em coleccedilotildees cientiacuteficas (Menezes et al 2003)

O levantamento do acervo das coleccedilotildees ictioloacutegicas brasileiras mostra o desequiliacutebrio no esforccedilo de inventariamento da fauna marinha nas diferentes regiotildees do Brasil A diferenccedila no conhecimento da biodiversidade marinha da regiatildeo Norte brasileira eacute significativamente expressa pelo nuacutemero de famiacutelias de peixes marinhos e estuarinos representados em coleccedilotildees zooloacutegicas brasileiras com 91 famiacutelias atribuiacutedas agrave regiatildeo Nordeste 109 famiacutelias agrave regiatildeo Sudeste 117 famiacutelias agrave regiatildeo Sul e apenas 48 famiacutelias agrave regiatildeo Norte (Tabela 1)

Em nuacutemeros absolutos o acervo de peixes marinhos e estuarinos da regiatildeo Norte representa apenas 39 do total dos lotes catalogados em coleccedilotildees brasileiras contra 40 da regiatildeo Sudeste e 399 da regiatildeo Sul e os 162 restantes da regiatildeo Nordeste (Figura 2) Consequumlentemente as espeacutecies da regiatildeo Norte encontradas em coleccedilotildees zooloacutegicas possuem baixa representatividade mesmo aquelas abundantes e de faacutecil amostragem em zonas costeiras e estuarinas Os bagres marinhos da famiacutelia Ariidae satildeo um bom exemplo desta situaccedilatildeo (Marceniuk amp Menezes 2007) A famiacutelia eacute representada por 176 lotes de 15 espeacutecies na regiatildeo Norte contra 357 lotes de 10 espeacutecies na regiatildeo Sudeste e 628 lotes de 4 espeacutecies na regiatildeo Sul com uma meacutedia de 117 lotes por espeacutecie para a regiatildeo Norte 357 para a regiatildeo Sudeste e o expressivo nuacutemero de 157 lotes por espeacutecie para a regiatildeo Sul Condiccedilatildeo similar eacute observada em outras famiacutelias comercialmente importantes e com taxonomia complexa como Centropomidae e Mugilidae

O desequiliacutebrio no conhecimento da biota marinha do Brasil tambeacutem eacute evidenciado pela literatura disponiacutevel para as diferentes regiotildees do paiacutes Ateacute o final do seacuteculo XX menos de 10 dos mais de 100 estuaacuterios brasileiros haviam sido estudados com o nuacutemero de espeacutecies de peixes citados variando entre 21 a 118 (Vazzoler et al 1999) No mesmo periacuteodo existia uma clara diferenccedila do esforccedilo de inventariamento e estudo da biologia dos peixes das diferentes regiotildees do Brasil O estuaacuterio Amazocircnico (0deg S-3deg S) e a Lagoa dos Patos (32deg S) os dois principais sistemas estuarinos-lagunares brasileiros

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Marceniuk AP et al



servem como exemplo do descompasso existente em relaccedilatildeo ao conhecimento da biodiversidade estuarina das regiotildees Norte e Sul do Brasil Ateacute o iniacutecio do seacuteculo XXI havia sido publicado apenas um estudo sobre os peixes do estuaacuterio Amazocircnico e da plataforma continental adjacente (Barthem 1985) condiccedilatildeo bastante diferente daquela observada para a Lagoa dos Patos intensamente estudada em relaccedilatildeo agrave composiccedilatildeo da ictiofauna (ver Chao et al 1985) e agrave biologia das espeacutecies (ver Haimovici 1997)

Atualmente praticamente inexistem publicaccedilotildees a respeito da composiccedilatildeo de peixes marinhos-estuarinos da costa Norte do Brasil e os poucos trabalhos disponiacuteveis tecircm caraacuteter local (Martins-Juras et al 1987 Camargo amp Isaac 2001 Rocha amp Rosa 2001 Espiacuterito-Santo et al 2005 Feitoza et al 2005) impedindo a realizaccedilatildeo de extrapolaccedilotildees regionais da biodiversidade Na revisatildeo da literatura sobre a ictiofauna estuarina do Brasil realizada por Ribeiro (2007) eacute reconhecida a elevada riqueza de espeacutecies estuarinas com o registro 530 espeacutecies pertencentes a 114 famiacutelias Contudo Ribeiro (2007) concluiu que o conhecimento da biodiversidade estuarina brasileira eacute bastante heterogecircneo sendo as costas do Nordeste e do Sudeste detentoras da maior riqueza de espeacutecies (279 spp pertencentes a 83 e 81 famiacutelias respectivamente) e a regiatildeo Sul com a menor riqueza (223 spp incluiacutedas em 72 famiacutelias) Por sua vez os estuaacuterios da regiatildeo Amazocircnica apresentam uma riqueza intermediaacuteria (242 spp e 75 famiacutelias) O resultado reflete o parco conhecimento sobre a ictiofauna marinha da regiatildeo Norte existindo apenas 27 artigos publicados referentes agraves regiotildees Norte e Nordeste incluindo estudos de biologia ecologia e inventariamento contra 74 trabalhos referentes agrave regiatildeo Sudeste e 105 trabalhos referentes agrave regiatildeo Sul (sensu Ribeiro 2007) Recentemente prospecccedilotildees realizadas pelo Programa REVIZEE propiciaram avanccedilos no conhecimento da ictiofauna brasileira especialmente nas regiotildees Sudeste-Sul (eg Figueiredo et al 2002 Bernardes et al 2005) Central (Rocha amp Costa 1999) e Nordeste (Lessa amp Noacutebrega 2000 Coelho 2004 Vaske Junior et al 2004) Os resultados disponiacuteveis ateacute o momento para costa Norte satildeo em grande parte focalizados em poucas espeacutecies de

importacircncia pesqueira (eg Asano-Filho et al 2005 Freacutedou amp Asano-Filho 2006) Embora relevantes esses estudos natildeo representam uma adiccedilatildeo significativa ao conhecimento da diversidade alfa de peixes da regiatildeo

O atual estado do conhecimento da costa norte brasileira tambeacutem eacute reflexo do nuacutemero reduzido de sistematas atuando na regiatildeo Norte e da distribuiccedilatildeo desigual das coleccedilotildees zooloacutegicas no Brasil Das 54 coleccedilotildees de peixes conhecidas em territoacuterio brasileiro 35 estatildeo situadas na regiatildeo Sudeste-Sul e 12 estatildeo na regiatildeo Nordeste enquanto apenas seis estatildeo localizadas na regiatildeo Norte O nuacutemero insuficiente de sistematas atuando de maneira ativa tambeacutem representa um problema seacuterio para o conhecimento da biodiversidade (UNESCO 1988 Gaston amp May 1992) Nesse sentido a falta de sistematas trabalhando com organismos marinhos na costa norte eacute particularmente dramaacutetica (Couto et al 2003 Amaral amp Jablonski 2005) Em levantamento recente sobre o panorama atual da sistemaacutetica no Brasil foram identificados 542 pesquisadores que se autodenominam sistematas ou taxonomistas (Marques amp Lamas 2006) Destes apenas 105 atuam na regiatildeo Norte contra um nuacutemero significativamente maior atuando na regiatildeo Sudeste (517) Em termos do nuacutemero de publicaccedilotildees em sistemaacutetica produzidas no Brasil entre 2000 e 2005 a regiatildeo Norte ocupa a uacuteltima colocaccedilatildeo contribuindo com apenas 45 do total de publicaccedilotildees contra 706 da regiatildeo Sudeste Marques amp Lamas (2006) tambeacutem ressaltaram que essa situaccedilatildeo eacute mais extrema em relaccedilatildeo ao conhecimento da fauna marinha onde a amostragem eacute praticamente nula sendo toda a fauna bentocircnica da regiatildeo pouco conhecida (Kempf et al 1967 Kempf 1970 Aller amp Aller 1986) O proacuteprio Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG) detentor da maior coleccedilatildeo zooloacutegica da regiatildeo Norte do Brasil possui uma pequena amostragem da biodiversidade marinha e estuarina refletindo a ausecircncia histoacuterica de pesquisadores vinculados agrave instituiccedilatildeo com foco no ambiente marinho A situaccedilatildeo eacute preocupante pois enquanto uma parte consideraacutevel da biodiversidade permanece desconhecida os recursos naturais vecircm sendo explorados em ritmo cada vez mais intenso

Figura 2 Valores relativos (em porcentagem) do nuacutemero de lotes de peixes depositados em coleccedilotildees zooloacutegicas nas cinco regiotildees geopoliacuteticas brasileiras Em azul satildeo indicados os valores totais incluindo espeacutecies de aacutegua doce e marinhas Em vinho apenas espeacutecies de aacutegua doce satildeo indicadas Em amarelo apenas espeacutecies estuarinas e marinhas satildeo indicadasFigure 2 Relative values (in percentages) of the number of fish lots deposited in zoological collections in the five Brazilian geopolitical regions In blue total value is indicated including freshwater and marine species In wine only freshwater species is indicated In yellow only estuarine and marine species is indicated

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Tabela 1 Lista das 143 famiacutelias de peixes marinhos e estuarinos (Chondrichthyes e Teleostei) com lotes depositados em coleccedilotildees zooloacutegicas brasileiras A ausecircncia de registros de famiacutelias em coleccedilotildees zooloacutegicas nas quatro regiotildees geopoliacuteticas do Brasil eacute indicada por ldquoXrdquo Abreviaturas regiatildeo Norte (N) regiatildeo Nordeste (Nd) regiatildeo Sudeste (Sd) e regiatildeo Sul (S) ldquoTotalrdquo refere-se ao nuacutemero de famiacutelias registradas em cada regiatildeoTable 1 List of 143 families of marine and estuarine fishes (Chondrichthyes and Teleostei) with lots deposited in Brazilian zoological collections Absence of records of families in zoological collections of the four geopolitical regions of Brazil is indicated by ldquoXrdquo Abbreviations North (N) Northeast (Nd) Southeast (Sd) and Southern (S) ldquoTotalrdquo refers to the number of families recorded in each region

Famiacutelia N Nd Sd S Famiacutelia N Nd Sd S Famiacutelia N Nd Sd SAcanthuridae Ephippidae Percophidae x xAchiridae Exocoetidae x Peristediidae xAcropomatidae x x x Fistulariidae x Phosichthyidae x x xAlbulidae x x Gempylidae x x Phycidae x xAntennariidae x Gerreidae Pinguipedidae x xApogonidae x Ginglymostomatidae x x x Pleuronectidae x xArgentinidae x x Gobiesocidae x PolymixiidaeAriidae Gobiidae Polyprionidae x x xAriommatidae x x Grammatidae x x Pomacanthidae xAtherinidae Grammicolepididae x x x Pomacentridae xAtherinopsidae Gymnuridae x Pomatomidae xAulostomidae x x Haemulidae Priacanthidae xBalistidae x Hemiodontidae x Pristidae x x xBatrachoididae Hemiramphidae x Pristigasteridae x x xBelonidae Holocentridae x Rachycentridae x x xBerycidae x x x Kyphosidae x Rajidae xBlenniidae Labridae x Rhinobatidae xBothidae Labrisomidae x Scaridae xBramidae x x x Lobotidae SciaenidaeBregmacerotidae x x x Lophiidae x x x Scomberesocidae x x xBythitidae x x x Lutjanidae ScombridaeCallionymidae x Macroramphosidae x x x Scorpaenidae xCallorhynchidae x x Macrouridae x x x Scyliorhinidae x xCaproidae x Malacanthidae x SerranidaeCarangidae Megalopidae x x Sparidae xCarapidae x x Merlucciidae x x SphyraenidaeCarcharhinidae Microdesmidae x x Sphyrnidae x x xCentrolophidae Mobulidae x x x Squalidae x xChaenopsidae x Monacanthidae x Squatinidae x xChaetodontidae x Moringuidae x x x Sternoptychidae x x xCheilodactylidae x x Mugilidae Stomiidae x x xChlopsidae x x x Mullidae StromateidaeChlorophthalmidae x x x Muraenesocidae x x x Synaphobranchidae x x xCirrhitidae x x Muraenidae Syngnathidae xClinidae x x Myctophidae x x x Synodontidae xClupeidae Myliobatidae x TetraodontidaeCongridae x Narkidae Torpedinidae x x xCoryphaenidae x x Neoscopelidae x x x Trachichthyidae x x xCynoglossidae Nettastomatidae x x x Trachinidae x x xDactylopteridae x Nomeidae x x x Triakidae x xDactyloscopidae x x Odontaspididae x x TrichiuridaeDasyatidae Ogcocephalidae TriglidaeDiodontidae Ophichthidae x Tripterygiidae x xEcheneidae x Ophidiidae x Uranoscopidae x xEleotridae Opistognathidae x Xiphiidae x x xElopidae Ostraciidae x Zeidae x x xEngraulidae Paralichthyidae Total 48 91 109 117

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Marceniuk AP et al



1 Perspectivas do desenvolvimento de estudos em sistemaacutetica e taxonomia de peixes marinhos e estuarinos

O conhecimento da diversidade bioloacutegica realizado atraveacutes da descoberta e descriccedilatildeo de espeacutecies (taxonomia alfa) eacute relativamente completo em algumas regiotildees do mundo especialmente no que diz respeito a famiacutelias com maior interesse comercial Entretanto lacunas importantes de conhecimento ainda existem Nos uacuteltimos anos novas espeacutecies de peixes marinhos tecircm sido descritas a uma taxa de cerca de 100-150 por ano (Eschmeyer et al 2010) Segundo Mora et al (2008) com base em registros do banco de dados do ldquoOcean Biogeographical Information System (OBIS)rdquo (httpwwwobisorg) cerca de 21 do total de espeacutecies de peixes marinhos aproximadamente 3200 espeacutecies precisam ser descritas Diversos autores consideram essas estimativas ilusoacuterias e reconhecem um nuacutemero muito maior de espeacutecies de peixes marinhos nesta situaccedilatildeo Eschmeyer et al (2010) estimaram que o nuacutemero de peixes marinhos natildeo descritos estaria ao redor de 5000 o que equivale a duas vezes o nuacutemero de espeacutecies descritas nos uacuteltimos 19 anos Os autores tambeacutem argumentam que aacutereas menos amostradas ou que possuem pouco material representativo em coleccedilotildees zooloacutegicas guardam um maior nuacutemero de espeacutecies a serem descritas Por exemplo apenas duas espeacutecies marinhas foram descritas no Canadaacute nos uacuteltimos 40 anos contra 38 espeacutecies marinhas descritas nos uacuteltimos nove anos em aacuteguas brasileiras nuacutemero inferior somente ao da Austraacutelia (240 spp) Japatildeo (90 spp) e Taiwan (43 spp) (Eschmeyer et al 2010)

A expectativa de Eschmeyer et al (2010) vem sendo confirmada nos uacuteltimos anos a partir de coletas realizadas principalmente nas regiotildees Nordeste e Sudeste do Brasil que possibilitaram a descriccedilatildeo de novas espeacutecies pertencentes a grupos filogeneticamente distintos como Myxiniformes Chondrichthyes Tetraodontiformes e Perciformes A maior parte das espeacutecies descritas ocorre em ambientes recifais (eg Moura 1995 Sazima et al 1997 1998 2008 2009 Gasparini et al 1999 Heiser et al 2000 Moura et al 2001 Pinheiro et al 2010) ou de aacuteguas profundas (eg Mincarone 2000 2001 Soto 2001ab Gomes amp Paragoacute 2001 Soto amp Vooren 2004 Carvalho et al 2005 Anderson amp Mincarone 2006 Melo 2007 Mincarone amp Anderson 2008 Nielsen 2009) ambientes historicamente mal amostrados Aleacutem disso diversos trabalhos tecircm registrado novas ocorrecircncias de espeacutecies ateacute entatildeo natildeo assinaladas no Atlacircntico Sul (eg Barreiros et al 2004 Lima amp Mincarone 2004 Mincarone amp Sampaio 2004 Feitoza et al 2005 Mincarone amp Smith 2005 Mincarone et al 2008 Carvalho-Filho et al 2009 2010a b 2011 2012 Franco et al 2009 Melo et al 2009 2010 Lima et al 2011) O exame de seacuteries maiores de exemplares e ferramentas moleculares tambeacutem vecircm contribuindo para o melhor conhecimento da biodiversidade marinha com a revalidaccedilatildeo de espeacutecies nominais sinonimizadas (eg Marceniuk 2005 2007 Carvalho-Filho et al 2010c)

Da mesma forma coletas em aacutereas marinhas da costa norte brasileira podem revelar uma fauna desconhecida Carvalho-Filho (1999) por exemplo indicou a possiacutevel ocorrecircncia das sardinhas de pequeno porte Etrumeus teres (De Kay 1842) e Jenkinsia lamprotaenia (Gosse 1851) na regiatildeo Essas espeacutecies fazem parte de Dussumieriinae (Clupeidae) um grupo de sardinhas altamente modificado em termos morfoloacutegicos ainda muito pouco conhecido filogeneacutetica e biologicamente (Di Dario 2005) A confirmaccedilatildeo da ocorrecircncia destas espeacutecies no Brasil representaria uma adiccedilatildeo interessante ao patrimocircnio bioloacutegico brasileiro O mesmo certamente se aplica a diversos grupos de peixes marinhos que satildeo mais comuns na porccedilatildeo norte da Ameacuterica do Sul e Caribe e que natildeo possuem registros no Brasil

A pesquisa direcionada ao melhor conhecimento da ictiofauna da costa norte do Brasil tambeacutem eacute importante para o monitoramento de espeacutecies invasoras no Atlacircntico como o peixe leatildeo Pterois volitans (Linnaeus 1758) e P miles (Bennett 1828) da famiacutelia Scorpaenidae que satildeo naturais do Indo-Paciacutefico Os primeiros registros do peixe leatildeo no Atlacircntico Central ocidental foram feitos em meados da deacutecada de 1980 na Floacuterida (Schofield 2009) O primeiro registro de P volitans na Ameacuterica do Sul ocorreu em 2008 na Colocircmbia (Schofield 2009 Gonzaacutelez et al 2009) Atualmente o peixe leatildeo eacute encontrado nas Bahamas e em outras regiotildees do Caribe incluindo as Ilhas Cayman Cuba Jamaica Repuacuteblica Dominicana Porto Rico Honduras Costa Rica Haitiacute Meacutexico e Panamaacute (Schofield 2009) e tambeacutem na Venezuela (Lasso-Alcalaacute amp Posada 2010) Ainda natildeo existem registros confirmados de P volitans na Guianas Suriname e Brasil Apesar disso o ritmo de expansatildeo resiliecircncia e capacidade de colonizaccedilatildeo de novos ambientes sugerem que a espeacutecie poderaacute expandir sua aacuterea de distribuiccedilatildeo no Atlacircntico Sul ocidental (Luiz et al 2013) O reconhecimento precoce da presenccedila da espeacutecie na costa norte do Brasil pode representar uma chance para o desenvolvimento de medidas de controle minimizando possiacuteveis impactos aos ambientes recifais brasileiros

Conclusatildeo

Os resultados apresentados indicam uma diferenccedila marcante no esforccedilo de inventariamento dos peixes marinhos nas diferentes regiotildees do pais Na costa norte essa diferenccedila eacute reflexo do pequeno nuacutemero de pesquisadores trabalhando com a sistemaacutetica biologia e ecologia de peixes marinhos O conhecimento insatisfatoacuterio sobre a diversidade das espeacutecies marinhas e estuarinas da costa norte do Brasil implica na incapacidade de desenvolver poliacuteticas puacuteblicas adequadas de conservaccedilatildeo com consequecircncias deleteacuterias natildeo apenas agrave manutenccedilatildeo da biodiversidade mas tambeacutem para agrave utilizaccedilatildeo racional dos recursos naturais da regiatildeo O Brasil eacute signataacuterio da Convenccedilatildeo da Diversidade Bioloacutegica Nesse sentido o inventariamento e a disponibilizaccedilatildeo do conhecimento sobre a biodiversidade dos peixes marinhos satildeo passos importantes para o cumprimento de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil durante a Conferecircncia das Naccedilotildees Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada em junho de 1992 (Brasil 2002)

O melhor conhecimento da ictiofauna marinha da costa norte do Brasil passa pelo investimento em projetos de pesquisa nas aacutereas de sistemaacutetica taxonomia e biogeografia Aleacutem disso as coleccedilotildees cientiacuteficas localizadas na regiatildeo Norte precisam receber maior estiacutemulo para o trabalho de inventariamento e formaccedilatildeo de sistematas especializados em grupos marinhos possibilitando o avanccedilo na compreensatildeo da biodiversidade de uma das regiotildees cientificamente mais carentes do Brasil Outra accedilatildeo importante que pode trazer um aumento significativo na compreensatildeo da ictiofauna marinha da regiatildeo eacute a criaccedilatildeo de bancos de DNA associados agraves coleccedilotildees cientiacuteficas da regiatildeo que poderatildeo ser utilizados no esclarecimento de diversas questotildees relacionadas agrave biologia da conservaccedilatildeo como a identificaccedilatildeo de espeacutecies ou populaccedilotildees isoladas (Nash et al 1998 Walpole et al 2001) o desenvolvimento de estrateacutegias de manejo (Geyer et al 1993 Miller 1995) e a determinaccedilatildeo do estado de conservaccedilatildeo com base em paracircmetros de estruturaccedilatildeo da diversidade geneacutetica bem como o desenvolvimento de anaacutelises filogeneacuteticas e filogeograacuteficas (OrsquoBrien et al 1985 Avise et al 1987 1995) Estudos espaciais e temporais de espeacutecies ou populaccedilotildees utilizando marcadores moleculares tambeacutem podem melhorar nosso conhecimento sobre aspectos da biogeografia e evoluccedilatildeo da fauna brasileira revelando relaccedilotildees de ancestralidade comum possiacuteveis rotas de migraccedilatildeo e padrotildees de dispersatildeo de espeacutecies (Excoffier et al

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1992 Avise et al 1995 Culver et al 2000) Esse conhecimento eacute essencial por exemplo para a definiccedilatildeo de aacutereas prioritaacuterias para conservaccedilatildeo e manejo de espeacutecies com importacircncia comercial para pesca (Avise et al 1987 1995 Walpole et al 2001)

Agradecimentos

Os autores agradecem a Marcelo R Britto (MNRJ) pela disponibilizaccedilatildeo dos dados da Coleccedilatildeo de Peixes do Museu Nacional Universidade Federal do Rio de Janeiro e pelo incentivo agrave confecccedilatildeo do manuscrito e a Flaacutevio C T Lima (UNICAMP) Naeacutercio A Menezes (MZUSP) Ierececirc Maria de Lucena Rosa (UFPB) e Michael Maia Mincarone (UFRJ) pelos comentaacuterios e sugestotildees que melhoraram substancialmente o texto final O primeiro autor agradece ao CNPq e a FAPESPA pelas bolsas de pesquisa PDS e DCR (processo 1517312010-1 e 3507902012-4) WBW agradece ao CNPq pela bolsa de produtividade em pesquisa (processo 3047542011-0) e FDD pelo apoio financeiro da FAPERJ e CNPq

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Recebido em 20032013 Versatildeo reformulada recebida em 17102013

Publicado em 20112013

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da biodiversidade satildeo determinados por fenocircmenos climatoloacutegicos e oceanograacuteficos (Amaral amp Jablonski 2005) que combinados ao componente filogeneacutetico (histoacuterico) influenciam o conjunto de espeacutecies encontradas nestas regiotildees (eg Nelson amp Platnick 1981)

A costa norte do Brasil compreende os estados do Amapaacute Paraacute e Maranhatildeo estendendo-se por mais de 2500 km com uma linha da costa bastante diversa (Isaac amp Barthem 1995) (Figura 1) No Amapaacute a linha da costa eacute retiliacutenea enquanto no nordeste do Paraacute e noroeste do Maranhatildeo eacute profundamente recortada tornando-se novamente retiliacutenea a partir da baiacutea do Tubaratildeo no Maranhatildeo (El-Robrini et al 1992) A regiatildeo eacute altamente instaacutevel em termos geomorfoloacutegicos em decorrecircncia da accedilatildeo de erosatildeo com grande deposiccedilatildeo de sedimentos que contribuem para o desenvolvimento de planiacutecies alagadas e grande nuacutemero de ilhas As reentracircncias e recortes da linha costeira favorecem a existecircncia de ecossistemas estuarinos dominados pela vegetaccedilatildeo de manguezal Os estados do Amapaacute Paraacute e Maranhatildeo abrigam a maior aacuterea de manguezal contiacutenuo do planeta com cerca de 8900 km2 que fornece uma grande quantidade de nutrientes para as aacuteguas marinhas adjacentes (Dittmar 1999) Os Golfotildees Marajoara e Maranhense representam complexos estuarinos bastante dinacircmicos com elevada descarga de sedimento de origem fluvial Somente o rio Amazonas descarrega no oceano entre 80000 e 250000 m3 de aacutegua doce por segundo (Isaac amp Braga 1999) e ateacute 14 milhatildeo de toneladas anuais de sedimentos (Milliman amp Meade 1983) contribuindo para a formaccedilatildeo de um substrato predominantemente lamoso na faixa costeira e na plataforma continental interna A descarga de um volume tatildeo elevado de aacutegua doce no ambiente marinho resulta em um sistema dinacircmico e altamente energeacutetico interferindo nas condiccedilotildees das mareacutes e ondas alterando a influecircncia das correntes marinhas

Introduccedilatildeo

O termo biodiversidade tem sido amplamente utilizado por bioacutelogos ambientalistas liacutederes poliacuteticos e cidadatildeos comuns desde meados da deacutecada de 1980 A popularizaccedilatildeo do termo coincide com o aumento da degradaccedilatildeo do meio ambiente e a perda de espeacutecies nas uacuteltimas deacutecadas do seacuteculo XX quando foram reconhecidas as regiotildees mais ricas biologicamente ou hotspots de biodiversidade (Myers et al 2000) A porccedilatildeo tropical do Atlacircntico Sul ocidental incluiacuteda na Zona Econocircmica Exclusiva brasileira (ZEE) eacute uma importante aacuterea de endemismo marinho e uma aacuterea prioritaacuteria para conservaccedilatildeo da biodiversidade (McKenna amp Allen 2002) Entretanto a regiatildeo permanece insatisfatoriamente conhecida em relaccedilatildeo a sua diversidade bioloacutegica (Couto et al 2003 Amaral amp Jablonski 2005)

A costa brasileira possui aproximadamente 8500 km de extensatildeo do rio Oiapoque (AP) ao Arroio Chuiacute (RS) com uma grande diversidade de caracteriacutesticas geoloacutegicas geograacuteficas climaacuteticas hidrograacuteficas e sedimentoloacutegicas que constituem uma grande diversidade de ambientes como estuaacuterios lagoas lagunas praias arenosas costotildees rochosos e recifes de coral (Brasil 2007) Ekau amp Knoppers (1999) com base nestas variaacuteveis reconheceram cinco regiotildees no litoral brasileiro regiatildeo Norte da foz do rio Oiapoque (4deg 16rsquo N) no Amapaacute agrave foz do rio Parnaiacuteba (3deg S) no Maranhatildeo regiatildeo Nordeste da foz do rio Parnaiacuteba agrave baiacutea de Todos os Santos (13deg S) na Bahia regiatildeo Leste da baiacutea de Todos os Santos ao cabo de Satildeo Tomeacute (22deg S) no Rio de Janeiro regiatildeo Sudeste do cabo de Satildeo Tomeacute ao cabo de Santa Marta (28deg 40rsquo S) em Santa Catarina e regiatildeo Sul do cabo de Santa Marta ao arroio Chuiacute (34deg 45rsquo S) no Rio Grande do Sul Nestas regiotildees os traccedilos distintivos

Figura 1 Costa norte do Brasil ressaltando as fronteiras entre os Estados do Amapaacute (AP) Paraacute (PA) e Maranhatildeo (MA) Setas indicam a foz dos rios Oiapoque (norte) e Parnaiacuteba (sul) Estrela vermelha indica o Cone do Amazonas Linha pontilhada indica o limite da Zona Econocircmica Exclusiva brasileira Coordenadas geograacuteficas em Graus Decimais (DD)Figure 1 North coast of Brazil highlighting boundaries between the States of Amapaacute (AP) Paraacute (PA) and Maranhatildeo (MA) Arrows indicate mouth of rivers Oiapoque (north) and Parnaiacuteba (south) Red star indicates the Amazon Cone Dotted lines indicate the limit of the Brazilian Exclusive Economic Zone Geographic coordinates in Decimal Degrees (DD)

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Conhecimento e conservação dos peixes marinhos e ... · ... no. 4 Conhecimento e conservação dos peixes marinhos e ... no. 4 da biodiversidade são determinados por fenômenos