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Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. Crédito, capital fictício, fragilidade financeira e crises: discussões teóricas, origens e formas de enfrentamento da crise atual 1 Maria de Lourdes Rollemberg Mollo 2 Resumo O artigo discute a crise atual, comparando concepções marxista e pós-keynesiana. A primeira seção examina as razões teóricas para a inerência das crises no capitalismo conforme as duas visões. A segunda mostra como e por que o neoliberalismo agravou a crise, ainda que inerente ao capitalismo. A terceira examina criticamente os limites das políticas atuais de enfrentamento da crise. Palavras-chave: Crise financeira; Capital fictício; Marxismo; Pós-keynesianismo. Abstract Credit, fictitious capital, financial fragility and crises: theoretical discussions, origins and ways of addressing the current financial crisis The article discusses the current crisis, comparing Marxian and Post-Keynesian views. The first section examines the theoretical reasons why crises are inherent in the functioning of capitalism, according to each theory. The second shows why and how neoliberalism has caused the crisis to worsen, even though it is inherent to capitalism. The third section critically examines the limits of the current policies in addressing the crisis. Keywords: Financial Crisis; Fictitious capital; Marxism; Post-Keynesianism. JEL B51; B59; E44. Introdução A crise econômica atual abalou as convicções liberais conservadoras no poder autorregulador do mercado, levando mesmo alguns liberais a, pragmaticamente, intitularem-se keynesianos com a defesa da intervenção salvadora do Estado nas economias. Não há, porém, consenso, mesmo de última hora, porque as prescrições de política econômica dependem de teorias que permitam inferir sobre a ocorrência de eventos como as crises e, desvendando suas razões, proponham formas de enfrentamento mais adequadas. Nesse sentido, as teorias ortodoxas liberais conservadoras não têm muito a dizer, uma vez que a crença nos preços livres e flexíveis como os melhores reguladores econômicos tornam a crise financeira atual e as anteriores, inexplicáveis. Afinal, não há mercados em que os preços (1) Trabalho recebido em 17 de dezembro de 2009 e aprovado em 11 de novembro de 2010. (2) Professora do Departamento de Economia da Universidade de Brasília e pesquisadora do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Brasília, DF, Brasil. E-mail: [email protected] . A autora agradece a Alfredo Saad Filho e Joanílio Teixeira por comentários que melhoraram muito o trabalho, embora se responsabilize inteiramente pelas ideias aqui expostas.

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  • Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens e formas de enfrentamento da crise atual

    1

    Maria de Lourdes Rollemberg Mollo 2

    Resumo

    O artigo discute a crise atual, comparando concepes marxista e ps-keynesiana. A primeira seo

    examina as razes tericas para a inerncia das crises no capitalismo conforme as duas vises. A

    segunda mostra como e por que o neoliberalismo agravou a crise, ainda que inerente ao capitalismo.

    A terceira examina criticamente os limites das polticas atuais de enfrentamento da crise.

    Palavras-chave: Crise financeira; Capital fictcio; Marxismo; Ps-keynesianismo.

    Abstract

    Credit, fictitious capital, financial fragility and crises: theoretical discussions, origins and ways

    of addressing the current financial crisis

    The article discusses the current crisis, comparing Marxian and Post-Keynesian views. The first

    section examines the theoretical reasons why crises are inherent in the functioning of capitalism,

    according to each theory. The second shows why and how neoliberalism has caused the crisis to

    worsen, even though it is inherent to capitalism. The third section critically examines the limits of the

    current policies in addressing the crisis.

    Keywords: Financial Crisis; Fictitious capital; Marxism; Post-Keynesianism.

    JEL B51; B59; E44.

    Introduo

    A crise econmica atual abalou as convices liberais conservadoras no

    poder autorregulador do mercado, levando mesmo alguns liberais a,

    pragmaticamente, intitularem-se keynesianos com a defesa da interveno

    salvadora do Estado nas economias.

    No h, porm, consenso, mesmo de ltima hora, porque as prescries de

    poltica econmica dependem de teorias que permitam inferir sobre a ocorrncia

    de eventos como as crises e, desvendando suas razes, proponham formas de

    enfrentamento mais adequadas. Nesse sentido, as teorias ortodoxas liberais

    conservadoras no tm muito a dizer, uma vez que a crena nos preos livres e

    flexveis como os melhores reguladores econmicos tornam a crise financeira

    atual e as anteriores, inexplicveis. Afinal, no h mercados em que os preos

    (1) Trabalho recebido em 17 de dezembro de 2009 e aprovado em 11 de novembro de 2010. (2) Professora do Departamento de Economia da Universidade de Braslia e pesquisadora do CNPq

    (Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico), Braslia, DF, Brasil. E-mail:

    [email protected]. A autora agradece a Alfredo Saad Filho e Joanlio Teixeira por comentrios que melhoraram

    muito o trabalho, embora se responsabilize inteiramente pelas ideias aqui expostas.

    mailto:[email protected]
  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    450 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    sejam mais flexveis que os financeiros e, apesar disso, foi neles que ela

    desencadeou-se.

    Ampliam-se, no contexto, oportunidade e espao para discutir teorias e

    ideias fora da ortodoxia e dela, crticas, de forma a entender a crise que se vive

    hoje, suas origens e agravantes e, assim, concluir sobre as formas de

    enfrentamento mais adequadas. Entre as teorias crticas da ortodoxia, costuma-se

    mencionar mais o ps-keynesianismo, pois seu contedo no ameaa o

    capitalismo, sendo, por isso, uma concepo mais prxima das vises

    dominantes3. Muito, porm, foi dito e continua a ser escrito na concepo marxista

    sobre a crise, sua inerncia na lgica capitalista, as razes mais profundas e

    agravantes conjunturais, tudo fundamental apreenso da crise atual.

    Discutir de forma mais ampla as vises marxista e ps-keynesiana,

    compar-las teoricamente e tirar concluses sobre os antecedentes e a evoluo da

    crise e o que esperar no futuro o objetivo deste artigo. No primeiro item, sero

    abordadas as razes tericas que tornam a crise inerente ao funcionamento do

    capitalismo, distinguindo marxistas e ps-keynesianos, No segundo, destacar-se-

    como o neoliberalismo agravou a crise, apesar de sua inerncia no capitalismo. No

    terceiro, a partir da discusso comparativa anterior nas duas abordagens, sero

    analisados os acertos, equvocos e limites das formas de enfrentamento que vm

    sendo implementados. Algumas consideraes finais encerram o artigo.

    1 A inerncia da crise: por qu?

    Para Marx (1970, 1972, 1974), crise algo inerente ao capitalismo, fruto

    do desenvolvimento de oposies e conflitos de interesse que caracterizam esse

    sistema, e em particular, provm da luta de classes, forjada em lucro que se faz

    pela explorao da classe trabalhadora pela capitalista e da maximizao dele sob

    a presso da concorrncia, prpria um conflito de interesses dentro da classe

    capitalista. Importa aqui, em particular, explorar a inerncia da crise financeira,

    sua relao com a lgica prpria do modo de produo capitalista a partir do

    crdito e do capital fictcio. Ela a forma particular de crise que pode ser

    produzida por si mesma como um fenmeno independente de tal forma a reagir

    somente indiretamente na indstria e no comrcio. O piv dessas crises deve ser

    encontrado no capital monetrio e sua esfera de ao direta ento a esfera deste

    capital, bancos, bolsa de valores e finana (Marx, 1972, p. 138).

    O tratamento da noo de capital fictcio, na obra de Marx (1972, 1974),

    surpreendentemente atual, para algo desenvolvido h cerca de um sculo e meio.

    (3) As ideias de Keynes mais frequentemente mencionadas so as do incio da carreira, prximas aos

    ortodoxos, desconhecendo-se, em geral, aquelas que rompem de fato com a economia neoclssica, as exploradas

    pelo ps-keynesianismo.

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 451

    O capital dito fictcio porque perde relao com a produo real em que o valor

    gerado e ampliado de forma a reproduzi-lo como valor que se valoriza.

    Dependente do desenvolvimento do crdito para se expandir, o capital

    fictcio no , no entanto, o prprio crdito, embora sejam associados por alguns

    marxistas (Nelson, 2008; Meacci, 1998).

    Meacci (1998, p. 194), por exemplo, afirma que ... the money capital lent

    to (deposited at) a bank is in turn turned into nothing but a claim on the bank, and

    therefore again into fictitious capital.

    Marx (1974), porm, define o capital fictcio em contraposio ao real,

    mas como algo distinto do capital dinheiro de emprstimo ou capital portador de

    juros que constitui o crdito bancrio. Enquanto o capital real, no processo de

    produo, por meio da explorao da fora de trabalho, gera mais valia que

    garante sua prpria expanso, o capital fictcio analisado como o que ocorre ao

    se desenvolver o sistema de crdito e perde relao com a produo real.

    Quando as funes tcnicas do dinheiro, no processo de circulao do

    capital produtivo, transformam-se em funo autnoma de um capital particular,

    surge o capital financeiro que, ao estruturar-se nos bancos e demais instituies

    financeiras, permite amplo desenvolvimento do chamado sistema de crdito.

    Uma soma de valor ou dinheiro, uma vez transformada em fora de

    trabalho e meios de produo, d origem, no processo de produo, a uma mais-

    valia. Esse dinheiro que se valoriza passa, ento, a ser capital e seu valor de uso, o

    de gerar capital. Segundo Marx (1074, p. 392), a qualidade de capital potencial

    do dinheiro permite que ele se torne mercadoria de gnero peculiar, o capital

    portador de juros. Conforme o prprio Marx (1974, p. 404), emprestar dessa

    maneira , portanto, a forma adequada de ceder valor como capital e no como

    dinheiro ou mercadoria.

    preciso passar pelo processo de produo para gerar valor e, assim,

    tornar-se capital, ou seja, dinheiro que se valoriza. Em seu processo de

    circulao, o capital nunca capital e sim, mercadoria ou dinheiro ... (Marx,

    1974, p. 397). Com o capital produtor de juros:

    o dono do dinheiro, para valorizar seu dinheiro como capital, cede-o a terceiro,

    lana-o na circulao, faz dele a mercadoria capital; capital no s para si, mas

    tambm para os outros; capital para quem o cede e a priori para o cessionrio,

    valor que possui o valor de uso de obter mais-valia, lucro....

    justamente a valorizao do dinheiro nesse processo que permite o

    pagamento do juro ao cedente, o capitalista financeiro e o lucro de empresrio ao

    que tomou o emprstimo para empreg-lo na produo.

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

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    O crdito, usado pelo capitalista industrial, potencializa a produo,

    apressando a reproduo do capital e aumentando sua escala. Permitir, assim, a

    gerao maior de mais-valia. A utilizao de recursos de terceiros possibilita que o

    capitalista invista em meios de produo e contratao da fora de trabalho antes

    de obter lucro suficiente para financiar com recursos prprios tal investimento.

    Isso justifica a afirmao de Marx (1972, p. 381) de que capital produtor de juros

    s produz juros verdadeiramente na medida em que o dinheiro emprestado

    efetivamente convertido em capital e um excedente produzido, do qual o juro

    uma parte

    Se o dinheiro empregado na produo e as mercadorias produzidas so

    vendidas, o crdito pago e o capital se reproduz em maior escala e ritmo,

    permitindo que, da mais-valia aumentada, saiam os lucros de empresrio e os juros

    do capital emprestado. Diz Marx, porm, que com o capital fictcio as coisas so

    diferentes: primeiro se transforma o dinheiro embolsado em juros e quando se

    tem os juros se acha em seguida (por clculo de capitalizao) o capital que o

    produziu (Marx 1972, p. 464).

    O processo de capitalizao descrito por Marx como decorrente do

    hbito j difundido do uso do crdito, potencializando a produo. S essa prtica

    social amplamente difundida permite que toda renda monetria determinada e

    regular aparea como juro de um capital, derive ela ou no de um capital (Marx,

    1974 p. 534).

    Assim, toda renda regular capitalizada taxa de juros vigente e a soma

    obtida considerada capital, mesmo que no tenha sido convertida em meios de

    produo e fora de trabalho, no gerando, portanto, valor novo. A esse no

    capital, Marx chama de capital fictcio.

    Ainda, segundo Marx (1974, p. 534),

    a coisa simples. Seja de 5% o juro mdio anual. Nessas condies, soma de 500

    libras renderia anualmente, se transformada em capital produtor de juros, 25 libras

    esterlinas. Assim, considera-se toda receita fixa anual de 25 libras esterlinas juro

    de um capital de 500 libras. Todavia, essa ideia puramente ilusria, excetuado o

    caso em que a fonte das 25 libras seja diretamente transfervel ou assuma forma em

    que se torne transfervel.

    Essa a definio de Marx de capital fictcio. Ttulos que tm movimento

    prprio, mas quando se tornam invendveis, desfaz-se essa aparncia de capital

    (Marx, 1974, p. 535).

    Conforme destaca Brunhoff (1990), no h como gerar valor novo maior,

    porque ele no passa pelo processo de explorao, por isso o capital dito fictcio.

    Marx associa esse capital, em primeiro lugar, aos ttulos da dvida pblica,

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

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    porque a soma emprestada ao Estado no apenas no existe mais, mas ainda porque

    ela jamais foi destinada a ser despendida como capital, a ser investida, e seria

    apenas seu investimento como capital que teria podido fazer dela um valor

    suscetvel de se conservar por si mesmo (Marx, 1972, p. 465).

    Marx associa, tambm, o capital fictcio s aes que se transformam em

    mercadorias cujo valor de mercado se determina diversamente do valor nominal,

    sem que se altere o valor (embora se modifique a valorizao do capital efetivo

    (Marx, 1972, p. 467)4.

    O crdito, apesar de ser dvida e penhora sobre o futuro, uma vez

    despendido na produo, permite a obteno de mais valia maior, reproduzindo o

    capital de forma ampliada, o que viabiliza seu pagamento. Diferente , porm, a

    valorizao de ttulos como as aes, quando se distanciam dos valores reais que

    lhe deram origem e tanto mais quanto se distanciarem deles. Foley (2005, p. 45),

    com quem se est de acordo, diz que loans to productive capitalists are real

    capital..The value of existing stock....is largely fictitious capital, and bears only

    a very loose relation to the value of the corporate assets that it legally represents.

    A perda de relao ocorre porque os valores das aes dependem de expectativas

    de dividendos capitalizados e lucros provenientes da mera venda a preos maiores

    das aes sem relao direta com a produo real.

    O capital fictcio , pois, uma categoria da circulao, um caso claro de

    autonomia da circulao em que seu valor aparece, cresce ou cai conforme oferta e

    demanda, sem relao direta com a produo cujos valores-trabalho so gerados.

    Os valores fictcios ampliam-se com o uso dos valores das aes para caucionar

    emprstimos ou os chamados derivativos de crdito, ou seja, dvidas derivadas de

    dvidas. Isso tambm ocorre com os produtos financeiros compostos de dvidas

    negociados ao longo do crescimento da bolha imobiliria que desencadeou a crise.

    Sobre tal fato, Marx j falava em duplicao ou multiplicao do capital bancrio,

    graas s diversas formas em que o mesmo capital ou crdito aparece em mos

    diferentes (Marx, 1974).

    O desenvolvimento do capital fictcio na economia mundial contou, em

    particular, conforme resume bem Guttmann (2008), na segunda metade dos anos

    1980, com os chamados junk bonds, ajudados pela onda de ofertas hostis de

    compras que opem os interesses dos acionistas (buscando valorizar suas aes) e

    diretores. Oposio que levou imposio da lgica da maximizar o valor de

    mercado das aes. No final dos anos 1990, a combinao de busca de ganhos

    com elevados riscos e lanamentos primrios de aes, IPO (Initial Public

    Offering), assim como a revitalizao da NASDAQ (National Association of

    Securities Dealers Automated Quotations) criaram mistura potente para

    (4) Na edio francesa (Marx, 1970, p. 433), ao invs de capital efetivo, h capital real.

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    consolidao industrial centrada na internet. Finalmente, em meados de 2000, foi a

    vez das hipotecas imobilirias e canais no tradicionais de securitizao que

    inflaram o valor dos ativos financeiros.

    Os ganhos especulativos ocorrem quando se espera a valorizao dos

    ttulos os quais so embolsados sempre que seus preos sobem. Para que tal

    valorizao ocorra, contudo, necessrio renda maior, proveniente de lucros e

    salrios gerados na produo para sustentar demandas e ampliar, ento, preos. O

    prprio crdito, porm, ampliado e usado de forma a caucionar novas dvidas e

    compras de ativos financeiros, permitiu que a autonomia entre circulao e

    produo aumentasse ao longo dos ltimos anos.

    Como j analisava Marx em sua poca, o processo de reproduo do

    capital, elstico por natureza, poder ser tensionado ao extremo e a crise, adiada

    pela demanda fictcia. Esta, por sua vez, ser criada pela fluidez de pagamentos

    que o acesso a crdito permite e pela prpria produo aumentada (Mollo, 1989,

    p. 127).

    Zerbato (2001), analisando o processo de financeirizao das economias,

    lembra que, quanto mais a engenharia financeira sofisticada, maior a liquidez e

    menor parece ser a aposta individual dos aplicadores nos ativos financeiros. Maior

    poder ser, ento, a divergncia entre preos dos ttulos e aes e os capitais reais

    que lhe deram origem. Para os aplicadores individuais no mercado financeiro, as

    compras de ttulos e vendas rpidas a preos maiores permitem aliar liquidez e

    rentabilidade e ampliam o carter especulativo das operaes (Chesnais, 1996).

    Guttmann (2008), contudo, chama ainda ateno para o fato de que,

    financiadas por crdito, tais operaes ampliam muito a rentabilidade esperada.

    Marx analisou, tambm, a separao entre propriedade e funo do capital,

    ou seja, sua aplicao pelos no proprietrios, como potencializadora do

    crescimento da especulao. Dizia ele:

    se o sistema de crdito o propulsor principal da superproduo e da especulao

    excessiva no comrcio, s porque o processo de reproduo, elstico por natureza,

    se distende at o limite extremo, o que sucede em virtude de grande parte do capital

    social ser aplicada por no-proprietrios (sic) dele, que empreendem de maneira

    bem diversa do proprietrio que opera considerando, receoso, os limites de seu

    capital (Marx, 1974, p. 510).

    A autonomia entre circulao e produo que define o capital fictcio,

    porm, no mais que relativa. Seus limites encontram-se justamente no processo

    de gerao das rendas que sustentam as compras de ativos. Elas precisam crescer

    para fornecerem a demanda necessria manuteno da valorizao fictcia do

    capital. Quando tais rendas (lucros e altos salrios provenientes da produo)

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 455

    param de crescer ou crescem pouco, a demanda e o preo dos ttulos e aes caem,

    mostrando todo o seu carter fictcio.

    Na crise atual, os limites objetivos originam-se de uma produo que

    cresceu menos do que as finanas. Se os recursos aplicados nos mercados

    financeiros no voltam para investimento na produo, como ocorreu com o

    predomnio das operaes financeiras sobre as produtivas na chamada

    financeirizao, conforme Chesnais (1996 e 2004) e Epstein (2005), faltaro

    recursos para, aplicados nos mercados financeiros, manter a valorizao dos ttulos

    e os consequentes ganhos fictcios obtidos com eles. Essa foi a razo objetiva para

    a crise.

    A propsito disso, diz Marx,

    interest and rent, which anticipate surplus value pressupose that the general

    character of reproduction will remain the same. .Secondly, it is presupposed

    more over that the specific relations of this mode of production remain the same

    during a certain period, Thus the result of production crystallizes into a

    permanent and therefore prerequisite condition of production that is, it becomes a

    permanent attribute of the material conditions of production. It is crises that put an

    end to these apparent independence of the various elements of which the

    production processes continually counts and which it continually reproduces

    (Marx, 1976, p. 518 , grifo nosso).

    A relao da crise com o andamento normal do capitalismo, assim como a

    questo da separao entre o capitalista e o especulador na tarefa de investir so

    encontradas, tambm, nos trabalhos de Keynes (1970, 1983) e dos ps-

    keynesianos, em particular, Minsky (1977, 1982a, 1982b). So, contudo,

    argumentos distintos que conduzem essas anlises.

    Para Keynes (1983), o crdito amplia o investimento ao permitir a

    satisfao do chamado motivo financiamento, viabilizando a concretizao das

    primeiras etapas dos investimentos. Os mercados financeiros so fundamentais

    para atrair a poupana para produtos financeiros com liquidez e rentabilidade

    distintas. Assim fazendo, acomoda a preferncia pela liquidez dos poupadores e,

    ao mesmo tempo, permite a consolidao das dvidas dos investidores, desde que

    tal preferncia seja pequena, viabilizando emprstimos aos investidores de mdio

    e de longo prazo, prazos estes compatveis com as maturaes dos investimentos

    (Studart, 1995; Herman, 2003).

    Keynes (1983) destaca a importncia dos bancos e mercados financeiros

    para o processo de finance-investimento-poupana e funding e, em particular,

    dando liquidez aos investimentos. Em suas prprias palavras h um incentivo

    para empenhar em nova transao o que poderia parecer uma soma extravagante,

    se essa transao pode ser liquidada na bolsa de valores com lucro imediato

    (Keynes, 1970, p. 148). Chama a ateno para o seguinte:

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    456 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    que uma cotao alta para os ttulos existentes supe um aumento na eficincia

    marginal do tipo de capital correspondente e portanto tem o mesmo efeito que uma

    diminuio na taxa de juros (uma vez que o fluxo de investimento depende de uma

    comparao entre a eficincia marginal do capital e a taxa de juros) (Keynes, 1970,

    p. 149).

    Keynes (1970, p. 149, 156) alerta tambm para a arbitrariedade da

    conveno que guia tais mercados, para sua precariedade que cria uma parte no

    pequena do nosso problema contemporneo de conseguir um volume suficiente de

    investimento e a influncia excessiva e mesmo absurda das flutuaes dirias

    dos lucros nesses mercados. Isso ocorre em particular quando a propriedade e a

    gesto separam-se e certas categorias de investimento so menos governadas

    pelas previses genunas dos empresrios profissionais do que pela previso mdia

    dos que operam na bolsa de valores, tal como se manifesta no preo das aes.

    Chama ateno, assim, para a possibilidade de predomnio da especulao definida

    como a a atividade que consiste em prever a psicologia do mercado, sobre o

    empreendimento, quando este se converte em borbulha no turbilho

    especulativo.

    De fato, a tnica internacional que gestou a crise estimulou a busca de

    ganhos rpidos e levou preferncia generalizada por ativos lquidos, punindo os

    investimentos produtivos. Da, a preocupao de diferentes autores em destacar o

    baixo crescimento dos investimentos produtivos em desfavor dos financeiros o

    qual caracterizou a financeirizao. Crotty (2005) atenta para o paradoxo

    neoliberal a que isso levou. Para ele, a forma como as corporaes no

    financeiras passaram a reagir menor rentabilidade, aplicando no mercado

    financeiro, envolvendo-se em fraudes e rebaixando salrios e benefcios dos

    trabalhadores, implicou em queda de demanda, comprometendo o prprio

    crescimento futuro da acumulao.

    Quanto idia de inerncia da crise, Minsky (1977, 1982a, 1982b) faz a

    melhor anlise sobre o assunto do lado ps-keynesiano. Para ele, quando tudo

    caminha bem na economia, as perspectivas dos investidores so animadoras e

    sancionadas pelo otimismo do sistema bancrio. As empresas tendem a endividar-

    se de forma exagerada e a estrutura financeira torna-se sem solidez, apresentando

    fragilidade definida pelo montante elevado de unidades especulativas e Ponzi, cujo

    grau de prudncia do endividamento pequeno.

    Para Minsky (1977, 1982a, 1982b), h trs tipos de unidades empresariais:

    i) as hedge, cuja necessidade de liquidez pequena, porque as sadas de recursos

    para pagamentos de dvidas so facilmente cobertas pelas entradas de rendimentos

    esperadas com a atividade normal das empresas e elas no tm necessidade de

    refinanciar-se; ii) as unidades especulativas, cujas sadas monetrias em

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 457

    pagamento de dvidas superam, a curto prazo, as entradas esperadas e as empresas

    precisam refinanciar-se; iii) as empresas Ponzi, cujos pagamentos de dvidas

    superam as entradas de recursos em quase todos os perodos significativos, sendo

    o valor de seu investimento lquido negativo.

    Dadas tais definies, a economia ser mais frgil quanto maior for o

    nmero de unidades especulativas e Ponzi. Isso porque qualquer endurecimento

    das condies de emprstimos inviabiliza os refinanciamentos, transformando as

    unidades especulativas em Ponzi e exigindo que tanto as unidades hedge quanto as

    especulativas vendam ativos para pagar dvidas. Trata-se, pois, de uma razo

    subjetiva para a inerncia da crise, uma vez que ela decorre do otimismo

    observado quando tudo anda bem na economia, fragilizando-a. O mesmo para o

    desencadeamento da crise, pois ele depende do pessimismo do sistema bancrio ao

    endurecer as condies de emprstimos.

    A piora nas condies de emprstimos ocorre, de fato, por razes

    subjetivas. Percebe-se isso bem quando considerado, conforme Mollo (1988 b),

    que Minsky (1977, 1982a, 1982b) deixa vago o porqu das perspectivas dos

    bancos serem diferentes das dos empresrios, os quais acabam endurecendo as

    condies dos emprstimos, apesar de tais perspectivas serem convergentes

    durante a fase otimista de crescimento econmico. Se na fase otimista, os

    emprstimos, investimentos e a produo crescem, permitindo o pagamento dos

    crditos j tomados e novos investimentos, no clara a razo pela qual os bancos

    tornam-se pessimistas de repente e endurecem as condies de refinanciamento.

    Segundo Keynes, o enfraquecimento do crdito suficiente para levar a uma

    crise (Keynes, 1970, p. 155).

    Esse enfraquecimento, como descreve muito bem Minsky (1977, 1982a,

    1982b), desencadeia o processo deflacionrio que ocorre na crise atual. Perdas

    financeiras e dificuldade de crdito para rolar dvidas levam venda generalizada

    de ativos e os preos, de modo geral, caem. Empreendimentos com dvidas sob

    controle tambm se tornam especulativos ou Ponzi, mesmo que no haja negcios

    fraudulentos. Assim, independentemente das fraudes, o objetivo de se ter lucro

    mximo que leva ao aparecimento de negcios muito alavancados, fato tpico da

    fragilizao das estruturas financeiras dentro do desenvolvimento normal do

    capitalismo inerente a ele. No se trata, portanto, de irresponsabilidade pessoal

    como querem os defensores do mercado5.

    (5) Observe-se, a esse respeito, que as unidades Ponzi so assim chamadas em referncia a um

    especulador cujas operaes financeiras do tipo pirmide so fraudulentas. Aqui, porm, a fraude consequncia

    de uma lgica especulativa que tende a aprofundar-se no capitalismo, no sendo um fator exgeno que provoca as

    crises, como o caso nas concepes ortodoxas.

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    458 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    Como j destacava Minsky (1982a, p. 26), os bancos e outras instituies

    financeiras so mercadores de dbitos. Comercializam seus dbitos com

    detentores de ativos e financiam vrios tipos de atividades. A troca de depsitos,

    que so obrigaes de curto prazo, por emprstimos, ou seja, financiamentos de

    prazo maior ou longo prazo, constitui o negcio dos bancos. Assim, segundo

    Minsky (1982a, p. 26) os bancos e outras instituies financeiras so estimuladas

    a induzir financiamentos especulativos e Ponzi.

    O carter mais subjetivo da inerncia da crise financeira para ps-

    keynesianos aparece aqui, com mais clareza. A fragilizao financeira ocorre uma

    vez que a estrutura financeira torna-se mais suscetvel a crises, mesmo porque os

    banqueiros e homens de negcios extrapolam o xito no cumprimento das

    obrigaes financeiras e reduzem a proteo contra a crise financeira (Minsky,

    1982a, p. 26).

    Assim, o otimismo de empresrios e bancos que leva fragilizao

    financeira da economia e ela transforma-se em crise quando os banqueiros, ainda

    por motivos subjetivos, reveem suas estimativas de ganhos e endurecem as

    condies de crdito6.

    Para Marx e os marxistas, ao contrrio, a crise surge porque o crdito,

    atendendo ao af capitalista de acumular para maximizar lucros, tensiona a

    acumulao ao extremo e, assim fazendo, penhora o futuro. Manter, porm,

    valorizaes contando com o futuro depende de rendas geradas na produo, para

    comprar os papis na circulao. Assim, a autonomia da produo referente

    circulao somente relativa ou limitada, colocando termo ao desenvolvimento do

    capital fictcio. Quando faltam tais rendas provenientes de lucros e salrios altos

    gerados na produo, os papis no so comprados, depreciam-se e o valor fictcio

    dos ttulos desaba, desencadeando objetivamente a crise.

    No caso da financeirizao atual, o desenvolvimento do capital fictcio

    durou muito porque a globalizao financeira ligou os mercados de crdito do

    mundo inteiro Ampliou, tambm, suas bases de recursos a serem aplicados

    pontualmente em poucos mercados desenvolvidos e, em bem menor proporo,

    em alguns mercados emergentes. Isso permitiu valorizar bastante e durante muito

    tempo, ficticiamente, os papis. Adiante, haver mais detalhes sobre essa lgica ao

    desenvolver as razes ligadas ao neoliberalismo que impulsionaram o capital

    fictcio e esto, por isso, na base da crise atual.

    A maior subjetividade na concepo ps-keynesiana para o aparecimento

    da crise encontra-se relacionada teoria do valor. Mesmo que se deixe de lado a

    (6) Para uma descrio do papel dos bancos racionando crdito como estratgia de sobrevivncia, ver

    Silva (2008). Ainda assim, possvel verificar um contedo subjetivo grande no que desencadeia e no desenrolar

    da crise.

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 459

    teoria do valor-utilidade, apreendendo a tentativa ps-keynesiana mais atual de

    desenvolver uma teoria do valor ligada preferncia pela liquidez, ela continua

    subjetiva, como possvel verificar na frase de Wray (1992, p.304-305):

    Liquidity preference theory is () a theory of asset prices or a theory of value for

    the whole spectrum of assets, including those on the balance sheets of banks. When

    liquidity preference rises, asset prices adjust to restore equality among expected

    returns (the marginal efficiencies of each). Prices of the most illiquid assets will

    fall the most, while prices of liquid assets may not fall (and those of the most liquid

    assets, such as treasure bills, might even rise). In summary, falling liquidity

    preference occurs in conjunction with rising prices of illiquid assets and with rising

    money demand, and is met by expansion of the money supply as spending rises and

    physical assets are produced. Asymmetrically, rising liquidity preference is

    associated with falling demand and spending (and with reduced output of real

    assets), and will cause interest rates to rise (and asset prices, to fall) in the face of

    an inelastic money supply.

    Na concepo marxista, porm, a teoria do valor essencialmente

    objetiva, baseada no tempo de trabalho, mesmo que Marx (1970, 1972, 1974)

    conceba a possibilidade de autonomia relativa dos preos na circulao, referente

    ao valor gerado no processo produtivo. Assim, o que causa a crise a ausncia de

    rendas para sustentar a demanda por ativos financeiros, iniciando a espiral

    deflacionria. A lgica de maximizao do lucro no processo de acumulao

    explica o desenvolvimento do crdito no capitalismo, potencializando esse

    processo. Ao mesmo tempo, porm, permite o aparecimento e o desenvolvimento

    do capital fictcio, resultado da tentativa de o capital desvencilhar-se dos limites

    impostos pela produo para desenvolver-se e ampliar lucros. A valorizao na

    circulao, porm, tem seu desenvolvimento limitado pelas rendas provenientes da

    produo. A crise mostra exatamente tais limites.

    A esse respeito, possvel dizer que, tanto na concepo marxista quanto

    na ps-keynesiana, o que move o capitalista no processo de acumulao de capital

    a rentabilidade. A nfase dos ps-keynesianos, contudo, est na rentabilidade

    esperada do capital e o que se torna importante em seu comportamento o que,

    subjetivamente, os agentes esperam no futuro. Assim, a crise, para iniciar-se,

    depende muito do otimismo ou pessimismo dos investidores e dos bancos.

    Para Marx e os marxistas, todavia, a posio do capitalista como tal e seu

    objetivo de maximizar lucros, potencializando a acumulao de capital, o que

    principalmente conduz ao desenvolvimento do crdito e, com ele, do capital

    fictcio. Por outro lado, ao analisarem a crise, importa o que objetivamente falta,

    em termos de renda e demanda, pois interrompe o desenvolvimento, at ento, do

    capital fictcio e desencadeia a deflao.

    Para explicar a crise, no argumento ps-keynesiano, destaca-se o que

    subjetivamente ir acontecer e, no marxista, o que j ocorreu no passado ou est

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    460 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    ocorrendo no processo de explorao e concorrncia. Nesse sentido, o argumento

    marxista explica melhor o desencadear da crise, levando perda de confiana,

    enquanto o ps-keynesiano traduz bem os encadeamentos da crise financeira e a

    transmisso para a acumulao real, uma vez que essa confiana foi perdida.

    Isso no significa, porm, que Marx e os marxistas no assumam razes

    subjetivas ao analisarem as crises concretas em andamento. Ao contrrio, ser

    visto adiante, Marx mencionando razes subjetivas para o agravamento das crises

    como a preferncia absoluta pela reteno de dinheiro. So, no entanto,

    comportamentos vistos como decorrentes de problemas j existentes no processo

    de acumulao de capital, que agravam as crises, embora no sejam suas causas

    primeiras.

    2 O neoliberalismo e o desenvolvimento da especulao e do capital fictcio

    Embora a crise seja inerente ao capitalismo, a forma financeira tomada por

    ela, caracterizada pelo desenvolvimento do capital fictcio ou especulativo, ou

    ainda, chamada mais recentemente por financeirizao das economias, foi, em

    particular, estimulada pelo neoliberalismo que dominou na economia mundial

    desde o final dos anos 1970. Da, a crtica ao neoliberalismo tanto por marxistas

    quanto ps-keynesianos desde h muito.

    Observe-se, porm, que a anlise marxista, h muito tempo afirma que o

    neoliberalismo no surgiu por acaso, mas como forma de desvencilhar o capital

    dos limites impostos pelas regulamentaes do Estado do Bem-Estar que vigorou

    no Ps-Guerra, perodo dito de compromisso com as classes assalariadas e de

    represso da finana (Dumnil; Lvy, 2004).

    Em particular, essas regulamentaes, ao sustentarem salrios diretos e

    indiretos que permitissem a demanda de massa, caracterizando o fordismo e ao

    limitarem a taxa de juros em situao inflacionria, reduziram a rentabilidade do

    capital e a possibilidade de avanos da mesma, levando a presses por mudanas.

    No por acaso, o mercado de eurodlares ser a primeira base de operao

    internacional do capital portador de juros (Chesnais, 2004).

    A tendncia a desvencilhar-se das amarras que as normas regulamentares

    estatais representavam leva inovao financeira, no caso, de um mercado de

    dlares fora do controle americano e aplicaes europeias em uma moeda, o dlar,

    cuja gesto est fora da alada dos vrios pases europeus. No por acaso, tambm

    o fato emblemtico do incio do perodo neoliberal o aumento, pelo Federal

    Reserve, da taxa de juros americana, em 1979 (Dumnil; Lvy, 2004), marcando o

    trmino da chamada represso financeira.

    A partir da, seguiram-se diferentes formas de liberalizao dos mercados

    com liberdade para o trnsito de mercadorias e servios, abertura dos movimentos

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 461

    de capitais, liberalizao dos cmbios, descompartimentalizao ou

    dessegmentao e desintermediao dos sistemas bancrios, desregulamentao

    generalizada, privatizaes e desestatizao das economias, caracterizando o que

    se chama de globalizao como o neoliberalismo na prtica7. Todos esses

    processos funcionaram no sentido de estimular o crescimento da especulao em

    desfavor da produo e, por isso, acham-se na base da crise atual.

    A falta de regulamentao dos mercados acirrou a concorrncia e esta

    pressionou por lucros rpidos, passveis de serem obtidos em operaes

    especulativas, ao contrrio dos lucros obtidos em investimentos produtivos, em

    geral, muito mais demorados. Como ressalta Crotty (2005), os preos dos ativos

    financeiros cresceram pressionados pela demanda ao mesmo tempo em que o

    crescimento das economias, como um todo, estagnava. A queda do crescimento,

    por um lado, deve-se ao aumento das taxas de juros e o desestmulo ao lanamento

    de aes, privilegiando-se os ganhos especulativos com a recompra das mesmas

    (Dumnil; Lvy, 2004).

    Os recursos disponveis para aplicaes financeiras foram viabilizados,

    conforme j mencionado, pela juno dos mercados de crdito e injeo de

    recursos em poucos mercados, mas tambm, muito ampliados com o desmonte das

    previdncias pblicas. De fato, esse desmonte liberou recursos vultosos que

    formaram e/ou alimentaram os fundos de penso e os fundos mtuos, no por

    acaso fundos institucionais de importncia especial na globalizao financeira

    (Sauviat, 2004). A lgica privada de tais fundos os conduz a buscar ganhos

    rpidos para mostrar eficincia e atrair clientes. Assim, ao invs de aplicarem em

    papis de longo prazo, como convinha ao provimento de penses a que se

    destinam, acabam tambm envolvidos na lgica especulativa (Parenteau, 2005).

    A esse respeito, Farnetti (1996) destacou a contradio entre recursos dos

    trabalhadores que os prejudicam quando, os fundos nos quais eles aplicam, ao

    seguirem uma lgica especulativa, provocam instabilidade e crises. Tais crises

    punem, em primeiro lugar e em maior proporo, os trabalhadores, especialmente,

    os menos qualificados e mais pobres. Alis, isso d razo a Brunhoff (1982), para

    quem a gesto da fora de trabalho, por meio das previdncias e seguridade social,

    papel do Estado, uma vez que, nas mos dos prprios trabalhadores, pe em

    risco o lucro, fortalecendo movimentos sindicais. J, nas mos dos capitalistas, por

    perseguirem uma lgica de lucro, os fundos previdencirios deixam de cumprir

    seu papel, que o de garantir a manuteno do exrcito industrial de reserva. A

    (7) Observe-se que a retirada do poder regulamentador dos Estados no significa que eles desaparecem,

    at porque foi necessrio que os Estados, comeando pelos mais poderosos, admitissem e estimulassem as

    liberalizaes. Por outro lado, a formao de mercados financeiros liberalizados que define a globalizao

    financeira serviu tanto aos que centralizavam a poupana, quanto aos governos, no financiamento das dvidas

    pblicas (Chesnais, 2005).

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    462 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    busca de lucro pelos prprios trabalhadores, com os fundos de penso privados,

    pune-os como classe, quando as aplicaes especulativas so responsveis por

    desemprego na esfera produtiva ou pelas crises financeiras.

    Como mostra a anlise de Sauviat (2004), os consumidores americanos

    foram estimulados a operar nas bolsas em vista da transferncia para os

    assalariados do risco e custo das aposentadorias, levando ao desenvolvimento dos

    fundos mtuos americanos. A elevao da taxa de juros em regime de baixa

    inflao, o desenvolvimento da Bolsa e a liberalizao dos mercados ampliaram

    muito as oportunidades de aplicaes. Isso, como mostra Parenteau (2005), inicia

    o processo e a lgica de alavancagem (ou desenvolvimento do capital fictcio) e

    justifica a longa durao do processo. Devido aos primeiros ganhos, os

    consumidores americanos apostaram mais, inclusive com base em crditos

    obtidos, estimulados ainda por anlises e informaes gerais obtidas via internet.

    Os fundos hedge, embora com maiores informaes sobre os negcios reais que

    lastreavam os ttulos, ao operarem no mercado financeiro, preferiram adivinhar a

    opinio comum antes dos demais ao invs de usarem tais informaes ou

    fundamentos. Buscavam, assim, ganhar com os crescimentos dos valores dos

    ttulos acima de seus valores reais, seguindo os demais ou, conforme Parenteau

    (2005, p. 122), optando por ride the way. Afinal, se todos erram, no h punio.

    Isso os estimulava a arriscar mais na lgica mimtica especulativa. O processo de

    aplicaes especulativas amplia-se ainda com as operaes dos fundos

    institucionais j citados.

    Para Parenteau (2005), a entrada dos fundos de penso na lgica

    especulativa relacionou-se com uma tentativa de regulamentao, usando a prpria

    lgica do mercado. Isso porque o Employment Retirement Income Security Act

    (ERISA), tentando evitar prticas abusivas desses fundos, impunha multa aos

    diretores. Buscando cobrir-se contra perdas e insucessos, sempre passveis de

    ocorrncia, contratavam-se consultores especialistas para indicarem empresas de

    gesto dos fundos financeiros em um processo de transferncia de risco.

    Tal comportamento espalhou a tnica especulativa e permitiu que a

    mesma tomasse uma proporo enorme e durasse muito tempo. O efeito

    indesejado das medidas reguladoras colocava, particularmente em cheque, a lgica

    de mercado, uma vez que a forma de regulao escolhida, dentro da tnica

    neoliberal, buscava justamente respeitar essa lgica. Da porque, no ERISA, foram

    estabelecidas punies pecunirias ao invs de fiscalizao das operaes e

    regulamentao estrita, determinando o tipo de aplicao de recursos possvel para

    os fundos de penso. Aplicam-se mecanismos de mercado, uma vez que o Estado

    considerado um alocador de recursos ineficiente, mas, assim fazendo,

    produziram-se crculos viciosos de especulao acima descritos.

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 463

    A liberalizao generalizada dos mercados de cmbio e de capital tambm

    estimulou muito a especulao. Tal liberalizao, por si s, j a estimula, porque

    as flutuaes cambiais so usadas para obteno de ganhos especulativos,

    comprando uma moeda na baixa para vend-la na alta. Com a abertura ao

    movimento de capitais tem-se o que Aglietta (1986) chamou de mistura

    explosiva, pois grandes montantes de recursos podem entrar e sair rapidamente

    dos pases, ampliando ainda mais as flutuaes e a especulao.

    A tentativa de reduzir tais flutuaes, impedindo a sada brusca de grande

    volume de capitais, pressiona os pases a elevarem a taxa de juros e, assim

    fazendo, colocarem risco suas polticas internas. Tais polticas tornam-se

    dependentes dos mercados externos e restringem crescimento e emprego. Isso

    particularmente importante para explicar a maior vulnerabilidade dos pases

    menos desenvolvidos ou perifricos, decorrente de assimetrias monetria e

    financeira entre esses e os mais desenvolvidos ou pases centrais. Prates (2005,

    p. 282) alerta para os problemas e instabilidades dos pases perifricos, cujas

    moedas, hierarquicamente inferiores s dos pases mais desenvolvidos, funcionam

    mal como reserva de valor. Passam a ser, particularmente, sujeitos a movimentos

    de fuga nos momentos de incerteza to comuns no mundo liberalizado. Isso e seu

    elevado prmio de risco comprometem a independncia de suas polticas

    monetrias. Do ponto de vista financeiro, a assimetria entre pases centrais e

    perifricos explicita-se em fluxos financeiros para os ltimos que dependem de

    fatores ligados dinmica externa fora de seu controle. Derivam, ainda, da

    insero marginal dos pases emergentes nos fluxos de capitais globais uma vez

    que a venda de moedas e ativos financeiros emitidos por eles tem efeitos

    marginais sobre a rentabilidade dos portflios dos investidores globais, enquanto

    os efeitos potencialmente instabilizadores sobre os mercados de cmbio e capitais

    emergentes so significativos frente ao pequeno tamanho de tais mercados.

    Assim, as variaes de entradas e sadas de capitais representam pouco

    para os pases desenvolvidos de onde os capitais saem e para onde retornam e

    muito para os mercados dos pases receptores que enfrentam, ento, grandes

    flutuaes ao longo dos ciclos de liquidez nos mercados internacionais, tendo seu

    crescimento sido moldado e abalado por tais ciclos (Amado; Resende, 2007).

    So essas flutuaes acentuadas de cmbio que tambm atraem os

    especuladores e ampliam o peso dos investimentos especulativos relativamente

    aos voltados produo real. Uma vez desencadeada a crise, porm, sua

    transmisso para as economias dos pases perifricos d-se mais pelos impactos da

    queda de demanda externa e da entrada de capitais especulativos, afetando o

    cmbio, do que pela cadeia de crdito, por ser pequeno com relao produo e

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    464 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    tanto mais quanto menor for a proporo. Assim, a economia domstica pode

    reagir mais facilmente8.

    A dessegmentao do sistema bancrio verificou-se no mundo todo com a

    transformao generalizada dos bancos comerciais, de investimento,

    desenvolvimento etc. em bancos universais ou mltiplos, cumprindo vrias

    funes ao mesmo tempo. Essa dessegmentao dificulta a fiscalizao sobre o

    sistema bancrio que passa a ter possibilidades amplas de ganhar em vrios

    mercados com operaes especulativas. Como observa Guttmann (2008), a

    informatizao dos mercados financeiros aumenta muito a habilidade do sistema

    para inovar e, como j dizia Minsky (1957), em seus primeiros trabalhos, a

    inovao surge na busca para escapar do controle das autoridades monetrias e

    maximizar lucros.

    A liberalizao aumenta tambm a especulao e o risco do sistema

    porque os bancos, mais informados sobre a situao dos tomadores de crdito,

    passam a concorrer com os mercados financeiros menos informados, segundo

    Aglietta (1995). Alm disso, a liberalizao, com a concorrncia acirrada, torna a

    informao a ser obtida mais difcil e cara, facilitando o aparecimento de

    operaes muito arriscadas.

    Todos os fatores analisados ao longo de muitos anos pelos crticos do

    neoliberalismo levaram a um crescimento da especulao ou do capital fictcio

    enorme. A referncia aos estudos heterodoxos, neste artigo, permite perceber que,

    ao contrrio do esperado pelos economistas ortodoxos do mainstream, os tericos

    heterodoxos marxistas e ps-keynesianos, ao analisarem criticamente o processo

    de financeirizao das economias, anteciparam os problemas que conduziram

    crise atual. Na anlise do que provocou a crise, o destaque dos trabalhos est no

    crescimento menor do investimento e da produo real, quando comparados ao

    crescimento da finana. isso que define o prprio processo de financeirizao

    das economias e mostra bem o que, objetivamente, est na base da crise: o

    descolamento entre a finana e a acumulao produtiva, dando razo aos

    argumentos marxistas. Em tal sentido, a causa primeira a reduo da valorizao

    dos ttulos com as rendas provenientes da produo crescendo pouco. Quanto ao

    encadeamento da crise, a preferncia pela liquidez ampliada com a maior

    instabilidade da economia liberalizada e a perda de confiana do sistema

    financeiro em geral e do sistema produtivo depois dele so muito bem descritas

    pelos argumentos de Minsky (1982a, 1982b).

    (8) No caso do Brasil, a crise freou o crescimento e o emprego, mas o impacto foi reduzido no apenas

    porque a participao do crdito pequena com relao produo, mas tambm porque a ameaa da crise

    mundial tirou poder do chamado novo consenso de poltica monetria de carter neoliberal e permitiu que as

    taxas de juros cassem, assim como levou a um papel mais ativo do governo na poltica fiscal. Finalmente, as

    polticas de elevao do salrio mnimo e das transferncias de rendas sustentaram a demanda.

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 465

    Os custos sociais do neoliberalismo, mesmo antes da crise, foram

    incalculveis. Ela pune os que perderam com o neoliberalismo, ou seja, os

    trabalhadores, no incio, com o fim do chamado compromisso keynesiano,

    conforme Dumnil e Lvy (2004). Em seguida, com a concorrncia acirrada, a

    busca de reduo de custos acentuou-se em particular sobre os salrios, dada a

    dominao do capital financeiro sobre o produtivo, que aumentava as taxas de

    juros e, de forma a compensar tais custos, pressionava para a reduo dos salrios,

    explicitando um dos fatores que levam a financeirizao a ser excludente, de

    acordo com Salama (1996). As exigncias de rendimentos elevados dos

    investidores institucionais, dentro da lgica que privilegia o acionista, so

    ajustadas por meio da queda da massa salarial (Plihon, 1999).

    Alm disso, a presso da concorrncia leva ao progresso tecnolgico

    acentuado, conduzindo ao desemprego tecnolgico, enquanto o crescimento

    contido da produo real constitui-se outro fator que contribui para a pequena

    capacidade de absoro do mercado de trabalho. Caem, assim, as participaes dos

    salrios no total das rendas de diversos pases, conforme relatado por Epstein e

    Jayadev (2005). Os salrios que caem no so apenas os diretos, mas os indiretos,

    com o desmonte das previdncias pblicas e, nas privadas, com a transferncia

    gradativa dos riscos para os trabalhadores (Sauviat, 2005).

    Para Salama (2005), a presso da concorrncia em pases menos

    desenvolvidos exigiria elevao substancial da taxa de investimento para fornecer

    os bens equivalentes aos importados. Na ausncia de taxas de investimento e

    crescimento elevadas e, em vista das condies financeiras contracionistas, a

    valorizao do capital faz-se pela piora das condies de explorao com

    aumentos da mais-valia absoluta, intensificando o trabalho por meio de reduo

    dos tempos mortos de trabalho (trabalhador polivalente), trabalho informal,

    precarizao dos empregos etc.

    Do ponto de vista da organizao dos trabalhadores, Epstein e Jayadev

    (2005) mostram que os ganhos dos rentistas ao longo da financeirizao das

    economias foram maiores quanto menor era o poder de organizao dos

    trabalhadores, o que, dados os danos dos aumentos das taxas de juros para os

    trabalhadores, mostrou que a solidariedade deles funcionou como elemento de

    resistncia importante em sua relao com o capital.

    Ainda quanto organizao dos trabalhadores, porm, preciso destacar

    estudos mostrando que, alm de serem resultado de processo de reduo de

    salrios indiretos e de transferncia de riscos para o trabalhador, o sistema de

    fundos de penso funcionou como uma forma de disciplinar os assalariados,

    conforme Sauviat (2005), envolvendo alguns segmentos, cujos rendimentos

    parcialmente dependiam da bolsa na defesa da lgica de valorizao acionria,

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    466 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    contrria lgica do investimento produtivo, segmentando o mercado de trabalho

    e aumentando as desigualdades. Mesmo os sindicatos saram em defesa da lgica

    acionria, enfraquecendo o que havia de direitos adquiridos pelos trabalhadores.

    Se as perdas dos trabalhadores foram substanciais com o neoliberalismo,

    ainda piores tm sido os nus uma vez desencadeada a crise financeira. O impacto

    sobre a economia real destas perdas tem-se tornado devastador e, por enquanto,

    incalculvel. As perdas no mercado financeiro que, objetivamente, refletem

    valores fictcios, afetam muito a economia real ligada pelo crdito. Por um lado,

    elas significam de per se quedas de demanda, parcialmente destinadas produo

    real, por outro, dvidas no cobertas com consequentes quebras no sistema

    bancrio e, provocando restries de crdito. Estas, por um lado, obrigam os

    devedores venda de ativos, levando onda deflacionria (Minsky, 1982a,

    1982b).

    Ademais, as perdas nos mercados financeiros interrompem investimentos

    e giro dos negcios, ampliando o desemprego e levando ao cancelamento de

    encomendas de mquinas, matrias-primas e outros insumos. Novamente, outra

    onda de desemprego, em crculos viciosos, cujo fim imprevisvel. Perdem nesse

    processo, em particular, os trabalhadores menos qualificados e de baixa renda,

    com menos reservas para que se mantenham, uma vez desencadeada a crise.

    As formas de enfrentamento de tal crise tm sido vrias, nem todas

    defendidas com o mesmo vigor por marxistas e ps-keynesianos, pelas diferenas

    tericas aqui apontadas. o que veremos no prximo item.

    3 As formas de enfrentamento da crise e seus limites

    Vrias tm sido as formas de enfrentamento propostas e adotadas para a

    crise e cumpre aqui coment-las no apenas para mostrar a relao com a anlise

    terica feita anteriormente, mas para destacar maior ou menor relao com o

    pensamento neoliberal e seus limites como soluo dentro do modo de produo

    capitalista.

    Uma vez desencadeada a crise, tambm so os marxistas e os ps-

    keynesianos que podem explicar a preferncia absoluta pelo dinheiro, nas palavras

    de Marx (1972, 1974), ou a preferncia pela liquidez, para Keynes (1970) e os

    ps-keynesianos. Nas duas concepes, a importncia da moeda no capitalismo

    aparece com toda a fora e explicita-se, em particular, em relao s crises. No

    caso de Marx (1972, 1974) e dos marxistas, porm, essa busca de reteno da

    moeda consequncia da crise e busca do poder social que o dinheiro representa

    na sociedade, observado mais sofregamente na crise em vista da falta de segurana

    que ela mostra. No caso de Keynes e ps-keynesianos, causa da crise ao inibir

    investimento e crescimento (Mollo, 1988a).

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 467

    De qualquer forma, durante a crise, h concordncia entre as duas

    concepes quanto busca generalizada pela reteno de dinheiro, o que conduz

    inevitavelmente queda das vendas, interrupo da concesso de crdito e queda

    brusca e prolongada dos preos das mercadorias. Como destaca Marx (1972,

    p. 516), o dinheiro aparece de repente diante da mercadoria como meio de

    pagamento nico e verdadeiro modo de existncia do valor. Da, a depreciao

    geral das mercadorias, a dificuldade e mesmo impossibilidade de convert-las em

    dinheiro.

    A deflao de preos no faz mais do que mostrar que a crise de

    superproduo com valores fictcios a serem depreciados, cumprindo, de forma

    brutal, a lei do valor. Isso significa que limites da autonomia observada entre os

    valores fictcios, formados na circulao e processo de produo gerando

    rendimentos reais que mantm sua demanda, sustentando a valorizao,

    estabelecem-se de forma brutal. Faltam rendas (lucros e salrios) do processo

    produtivo debilitado. Falta, objetivamente, demanda para sustentar as valorizaes

    fictcias.

    Assim, Marx diz que toda crise aparece como crise de crdito e dinheiro,

    porque se mostra na dificuldade de converso de ttulos em dinheiro. Diz ele:

    Mas essas letras representam, na maioria dos casos, compras e vendas reais cuja

    expanso ultrapassa de longe as exigncias da sociedade, o que constitui em ltima

    anlise a razo de toda a crise. Ademais, massa enorme dessas letras representa

    especulaes puras que desmoronam luz do dia ou especulaes ... malsucedidas;

    finalmente, capitais mercadorias que se depreciaram ou ficaram mesmo

    invendveis... (Marx, 1974, p. 563)9.

    Keynes (1970) v uma preferncia pela liquidez que produz a crise. Ela

    decorre da falta de confiana nas expectativas dos agentes diante da incerteza, ou

    falta de otimismo e confiana nas previses dos agentes econmicos sobre o que

    podem receber no futuro como rentabilidade do capital que investem hoje. A

    preferncia pela liquidez inibe o investimento e o crescimento e, nesse sentido,

    causa a crise.

    Observe-se, que tambm a preferncia pela liquidez mais subjetiva para

    Keynes e ps-keynesianos porque depende do que esperam acontecer no futuro.

    Ao contrrio da percepo marxista, em que o ocorrido no passado e o que est

    (9) Nos Grundrisse Marx tambm explicita essa idia de crise impondo limites de forma brutal, dizendo

    que absolutamente necessrio que os elementos separados pela fora, que em essncia vo juntos, se

    manifestem por meio de exploses violentas como separao de algo que, essencialmente anda junto. A unidade

    se estabelece pela violncia (G., p. 84). Se o crdito surge por presso da lgica de maximizao de lucro e

    desenvolve o capital fictcio procurando se desvencilhar dos limites da produo real, a crise que vem mostrar o

    carter limitado desta autonomia (Mollo, 1989).

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    468 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    ocorrendo no presente, objetivamente, que conduzem busca pelo poder social

    que a moeda representa no capitalismo.

    De forma a tratar tal preferncia pela moeda ou liquidez, a primeira

    medida de enfrentamento da crise no mundo todo foi a injeo de liquidez pelos

    Bancos Centrais. Ela vem para impedir, conforme bem analisou Minsky (1982a,

    1982b), que uma crise de liquidez transforme-se em crise de insolvncia

    generalizada. Nesse sentido, os Bancos Centrais exercem seu papel de

    emprestador em ltima instncia, de forma a acalmar os bancos e forar a baixa da

    taxa de juros, permitindo que maior nmero de investidores potenciais, as

    expectativas de rentabilidade dos investimentos superem as taxas de juros e o

    processo de investimento prossiga e, com ele, o crescimento da renda e do

    emprego.

    Procura-se, assim, interromper o processo de deflao de preos dos

    ativos, vistos anteriormente o qual caracteriza a crise. Sobre esse aspecto, Aglietta

    (1995) destaca que, com a queda geral dos preos dos ativos os bancos, apesar de

    mais informados do que o mercado financeiro, no podem mais discriminar bons e

    maus tomadores de crdito o que justifica que contraiam este ltimo de forma

    generalizada. Da, a importncia de facilitar-lhes a liquidez para se acalmarem. Ao

    facilitar e melhorar as condies de oferta de crdito, as autoridades monetrias

    impedem que problemas de liquidez transformem-se em insolvncia generalizada.

    Tal tipo de injeo de liquidez serviu de socorro, de fato, em diversas crises

    recentes.

    Tanto Marx (1972, 1974) quanto Keynes (1970) percebiam, em sua poca,

    os limites desses tipos de soluo. Marx alertava, dizendo que:

    todo esse sistema artificial de extenso forada do processo de reproduo no

    saberia naturalmente ser colocado em p porque ... o Banco da Inglaterra d aos

    especuladores em papel moeda emitido por ele o capital que lhes falta para comprar

    a totalidade das mercadorias depreciadas (Marx, 1972, p. 490).

    Tambm, Keynes (1970) via a chamada armadilha da liquidez que tornava

    a politica monetria inefetiva. Em momentos de grande incerteza e desconfiana,

    qualquer liquidez recebida retida, no se destinando ao investimento ou criao

    de postos de trabalho e renda que reverteriam a situao e justamente o que vem

    ocorrendo com as medidas mais recentes de injeo de liquidez ou grande parte

    delas.

    Tal anlise, feita por Keynes (1970), faz com que ele proponha uma

    participao ativa e discricionria do Estado para criar sem objetivo de lucro

    renda e emprego e, assim, reverter o crculo vicioso da deflao de ativos. Esse

    tipo de sugesto, porm, como possvel ver com os impedimentos impostos ao

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 469

    Estado para definir investimentos e aes dos bancos e empresas que recebem seus

    recursos, em particular nos EUA, o neoliberalismo resiste a aceitar.

    O prprio Keynes (1970) afirmou que a preferncia pela liquidez

    resultado das percepes subjetivas sobre o que esperar do futuro em termos de

    ganhos, podendo tornar incuas injees de liquidez para estmulo iniciativa

    privada, porque possvel a liquidez ser toda retida. Isso se mostrou frequente e

    geral aps as primeiras injees de liquidez no mundo todo, levando os governos a

    se voltarem para as prprias empresas com problemas, injetando nelas diretamente

    a liquidez, mas tambm obtendo pouco sucesso.

    O objetivo anunciado de impedir o desemprego e, se possvel, aumentar o

    nmero de postos de trabalho disponveis, no foi cumprido a contento, seja

    porque a crise em andamento levava a outras falncias e demisses, seja porque a

    preferncia pela liquidez dos beneficiados fazia com que no destinassem a

    liquidez injetada a gastos, investimentos e aumento de emprego.

    O socorro nas formas de enfrentamento atuais nunca pensado para os

    prejudicados, porque a defesa da propriedade privada no o permite mesmo que

    permita salvar bancos. Assim, no se empresta para os moradores das habitaes

    hipotecadas. A razo o temor de deixar o sistema de mercado. A crena nos

    mercados divulgada e defendida de forma dominante impede a percepo de seu

    insucesso. Da, a proposta de enfrentar a crise, financiando pacotes quando os

    crditos podres ou as dvidas entrariam e, dessa forma, seriam precificados pelos

    mercados. Difcil aceitar que o mesmo mercado que precificou to mal e provocou

    a crise possa ser chamado, novamente, a regular as economias.

    A pretenso dos marxistas ao preferirem medidas diretas no salvar o

    capitalismo, mas reduzir para os trabalhadores e dentre eles os de renda mais baixa

    o nus da crise. Preferem, ento, que o emprego e a renda sejam poupados. Assim,

    mesmo desacreditando no capitalismo e buscando mudanas substanciais da

    economia e da sociedade, escolhem medidas que atinjam diretamente os

    trabalhadores, os quais nenhuma responsabilidade tiveram quanto crise e so

    responsveis pela produo, embora dela, excludos. Nesse sentido, para reduzir-

    lhes os nus da crise recente, melhor seria que os emprstimos fossem diretamente

    dados aos moradores das casas hipotecadas e devedores do sistema bancrio.

    Fosse isso feito, o poder de reverso do ciclo vicioso seria realizado por

    interrupo da queda dos preos das habitaes, aumento do consumo e, ento, do

    investimento e emprego.

    Tambm, seria o caso com a criao de empregos e renda generalizados,

    com os recursos empregados na injeo de liquidez. Isso, porm, o mercado e seus

    defensores no permitem. preocupante no apenas porque torna impossvel

    reverter os crculos viciosos de ampliao do desemprego, queda de demanda,

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    470 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    expectativas desfavorveis, quedas de investimento e mais desemprego..., mas

    ainda porque a crise passa a punir exatamente os que menos participaram das fases

    de bonana. D razo tal fato a Marx (1970, 1972, 1974) quando, ao desvendar o

    lado contraditrio e opressor do capitalismo, mostra que os mais prejudicados so

    sempre os trabalhadores, apesar de responsveis pela gerao de valor e

    enriquecimento no capitalismo.

    Outra forma de enfrentamento tentada a reduo de impostos na

    esperana de que se reduza o desemprego e aumente os postos de trabalho novos

    criados. Tambm, essa medida no segura em termos de resultado e, ao reduzir o

    poder de gasto dos governos, elimina seu poder de atuao anticclica, fragilizando

    suas finanas.

    Observe-se, porm, que todas as solues consideradas mais radicais pelos

    neoliberais so ainda limitadas, porque procuram reaver o chamado compromisso

    keynesiano em vigor no imediato ps-guerra. Este, todavia, j mencionamos, no

    desapareceu por acaso, mas por presso da lgica capitalista de lucro e lucro

    mximo. Assim, os problemas enfrentados no passado pelo compromisso

    keynesiano permanecem apontando, por si s, seus prprios limites e mostrando

    que preciso avanar, na crise, na busca de solues que sejam, de fato,

    transformadoras.

    Consideraes finais

    Houve, ao longo deste artigo, vises heterodoxas que, de diversas

    maneiras e por meio de diferentes anlises apreenderam as caractersticas da

    chamada financeirizao das economias e, assim fazendo, anunciaram a crise atual

    e seus desdobramentos. Foi vista, ainda, a sustentao terica dessas vises nas

    noes de Marx (1974) e Keynes (1970) sobre o desenvolvimento das ideias

    quanto ao capital fictcio ou o especulativo, a partir de noes distintas, mas

    igualmente interessadas em mostrar a crise como algo inerente ao capitalismo.

    Analisou-se que, apesar de inerente ao funcionamento do capitalismo, o capital

    fictcio e/ou a especulao podem ser desenvolvidos particularmente com o

    neoliberalismo, que esteve ento estreitamente ligado a seu aparecimento.

    O acirramento da concorrncia, com a liberalizao, levou busca de

    lucros rpidos, especulativos. A transformao dos bancos em universais

    dificultou a fiscalizao e a regulao do sistema bancrio, permitindo o

    desenvolvimento de inovaes financeiras de risco cada vez maior. A necessidade

    de transferir tal risco provocou aparecimento de produtos financeiros complexos

    que o escondiam. A liberalizao do cmbio ampliou suas flutuaes e o

    movimento liberalizado de capitais potencializou-as, aumentando as possibilidades

    de ganhos especulativos com o comrcio de moedas. Taxas de juros altas em fase

  • Crdito, capital fictcio, fragilidade financeira e crises: discusses tericas, origens...

    Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011. 471

    de inflao baixa estimularam as aplicaes financeiras, enquanto o

    desmantelamento do sistema pblico de previdncia, por sua vez, jogou nos

    fundos de penso privados enorme massa de recursos, justificando o papel

    importante que tiveram nos mercados e financerizao das economias. Enquanto

    se prolongava esse mimetismo especulativo, os recursos dedicados ao

    investimento produtivo e acumulao de capital real mostravam crescimento

    sempre menor, ampliando o descolamento da circulao com relao produo,

    o qual define o carter fictcio do capital em desenvolvimento.

    Na concepo ps-keynesiana, a crise decorre da incerteza que permeia as

    decises econmicas no capitalismo, incerteza esta provocada pelo futuro

    desconhecido e descentralizao das decises sem que se possa antever o resultado

    lquido delas. Tal situao conduz a uma preferncia pela liquidez que, seja da

    parte dos bancos ao endurecerem as condies de emprstimos, seja dos

    investidores, inibe o investimento e leva queda da renda e do emprego. Atribuda

    incerteza e perda de confiana dos agentes econmicos, em particular bancos e

    investidores, a concepo keynesiana ajuda, sobretudo, a entender o

    encaminhamento da crise, uma vez iniciada.

    O neoliberalismo deu origem, na concepo ps-keynesiana, ao

    aparecimento de inovaes financeiras cada vez mais arriscadas, alavancando

    muito a economia e fragilizando-a. Da mesma forma, porm, que Minsky (1982a,

    1982b) no deixa claro a razo pela qual os bancos endurecem o crdito,

    divergindo dos investidores quanto s rentabilidades esperadas, quando, at ento,

    compartilhavam do mesmo otimismo, fica obscuro o motivo da preferncia pela

    liquidez desses bancos ao desencadearem o processo deflacionrio, no

    concedendo crdito ou endurecendo as condies para sua obteno. Nesse

    sentido, considera-se que o corte de crdito por parte dos bancos explica bem o

    encadeamento da crise, embora diga pouco sobre sua razo primeira ou sobre o

    que a desencadeia.

    J, para os marxistas, no a incerteza subjetiva que provoca a crise, mas

    problemas objetivos colocados por uma lgica de lucro baseada na explorao de

    uma classe pela outra e premida pela concorrncia entre capitalistas. A busca de

    lucro mximo estimula o desenvolvimento do crdito e este, o desenvolvimento do

    capital fictcio que reflete o movimento do capital, buscando desvencilhar-se de

    barreiras e limites para obteno de lucros. A juno dos mercados de crdito ao

    longo da globalizao financeira representa uma massa enorme de recursos

    aplicados, sobretudo, em poucos mercados financeiros desenvolvidos e, em menor

    medida, em mercados emergentes. Isso d flego mais prolongado ao

    desenvolvimento do capital fictcio, que pode ento se desenvolver durante muito

    tempo. Ao longo do perodo, porm, a aplicao de recursos em ativos financeiros

    especulativos funciona como puno no sentido de inibir a acumulao de capital

  • Maria de Lourdes Rollemberg Mollo

    472 Economia e Sociedade, Campinas, v. 20, n. 3 (43), p. 449-474, dez. 2011.

    real ou o crescimento da atividade produtiva, de onde saem rendas (lucros e

    salrios altos) que sustentam a valorizao fictcia nos mercados financeiros.

    Assim, chega-se s primeiras dificuldades de valorizao que desencadeiam

    vendas significativas de ativos e iniciam a crise.

    Atribuda incerteza e ao neoliberalismo, possvel evitar as crises,

    segundo os ps-keynesianos, com o retorno ao reguladora do Estado o qual,

    embora no possa eliminar a incerteza, ir melhor administr-la por meio da

    centralizao de informaes. Principalmente, no agir como os demais

    participantes da economia, por motivos e decises econmicas afetados pela

    moeda, mas, com o objetivo de regulao econmica. Assim, no precisa

    participar do chamado clculo econmico.

    Para os marxistas, porm, a soluo que passa pelo Estado limitada.

    Esses limites mostraram-se no prprio aparecimento e desenvolvimento do

    neoliberalismo, que no foi mais do que uma reao regulao do perodo ps-

    Segunda Guerra Mundial. Tais limites vm-se explicitando na resistncia em

    aceitar um papel mais ativo, discricionrio e distributivo do Estado nas formas de

    enfrentamento atuais, que mostram como o pensamento neoliberal ainda

    dominante.

    Sem dvida, a regulao estatal fornece solues transitrias que

    melhoram a posio da classe trabalhadora na relao capital-trabalho, razo pela

    qual necessrio continuar defendendo-as. So, porm, solues limitadas,

    requerendo alternativas mais transformadoras.

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