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Relatório de Estágio Mestrado Integrado em Medicina CUIDADOS CIRÚRGICOS NUM HOSPITAL DA AMÉRICA DO SUL Cátia Denise Ferreira Rodrigues Orientador António José Polónia Coelho da Silva Porto 2011

Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

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Page 1: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

Relatório de Estágio

Mestrado Integrado em Medicina

CUIDADOS CIRÚRGICOS

NUM HOSPITAL DA AMÉRICA DO SUL

Cátia Denise Ferreira Rodrigues

Orientador

António José Polónia Coelho da Silva

Porto 2011

Page 2: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

1  

ÍNDICE

Resumo 2

Summary 3

Lista Abreviaturas 4

Introdução 7

Contextualização – Brasil 7

Objectivos 10

Metodologia 10

Discussão 11

Tempo de Estágio 11

Local de Estágio 11

Enfermarias 12

Consulta Externa 12

Centro Cirúrgico 13

Pronto-Socorro 18

Casos Clínicos 19

Conclusão 32

Bibliografia 34

Anexos 37

 

Page 3: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

2  

RESUMO

Perante o enquadramento da unidade curricular “Dissertação/Projecto/relatórios Estágio"

optei por direccionar a minha acção para a realização de um estágio profissionalizante, na área

de “Cirurgia”, por se apresentar como uma área que me aliciava, para além de querer aumentar o

meu conhecimento nesta vertente. A oportunidade de realizar um estágio em São Paulo permitiu

implementar mais um objectivo, o de conhecer um sistema de saúde de um país como o Brasil.

São Paulo é uma metrópole assustadora com ruas intermináveis, o som familiar dos

helicópteros, o trânsito infernal, a agitação constante da população. O HSP é um ponto de

referência dos paulistas dependentes do Sistema Único de Saúde.

O estágio decorreu entre 1 de Março e 2 de Abril de 2011 principalmente no Pronto-

Socorro e, ocasionalmente no Centro Cirúrgico do Hospital São Paulo, totalizando 108 horas,

embora também tenha passado pelas enfermarias e pelas consultas externas das diversas

disciplinas no mesmo período. A estrutura do relatório incorporou alguns casos clínicos e a

descrição das actividades realizadas, seguido de uma discussão dos temas com apoio de dados

estatísticos brasileiros bem como um breve recurso à literatura em determinados pontos

considerados pertinentes.

No final fica a certeza que absorvi algum conhecimento novo, consolidei informações

prévias, mas, principalmente, enriqueci a minha curta formação profissional com a consciência

que ainda tenho um longo caminho a percorrer. Acompanhar diariamente e integrar a equipa de

cuidados reforçou uma percepção que é alheia ao estudante do 1º ano de Medicina, a de que o

médico lida mais vezes do que seria desejável com a sensação de impotência e frustração.

 

 

 

 

 

 

 

Page 4: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

3  

SUMMARY

In the framework of the syllabus “Dissertation / Project / Traineeship Report” I chose to focus my action for the achievement of a professional traineeship in the field “Surgery” by presenting itself as an attractive area, besides wanting to increase my knowledge in this aspect. The opportunity to have this traineeship in Sao Paulo has allowed me implement another goal, get to know the health care system in a country like Brazil.

Sao Paulo is a scary metropolis with endless streets, the familiar sound of helicopters, infernal traffic, and the hustle and bustle of big cities. Sao Paulo Hospital is a reference point for the paulistas dependent on the public health system.

The traineeship period ran between 1st March an 2nd April, 2001, mainly in the emergency room and, occasionally, at the surgical center of Sao Paulo Hospital, where I spent 108 hours, although also has past by wards and external consultation of the various specialties, in the same period. The structure of this report includes some clinical cases and the description of activities carried out, followed by a discussion of the issues with support on brazilian statistical data, as well as a brief appeal to literature in some points considered relevant.

In the end it is sure to be absorbed some knowledge new, reinforced previous information, enriched my short professional training with the awareness that I still have a long way to go. Monitor daily and join the team of care has strengthened a perception that is distant to the medicine beginner, that the physician deals more than would be desirable with the feeling of powerlessness and frustration.

 

   

Page 5: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

4  

LISTA DE ABREVIATURAS

µL – microlitro

AC – auscultação cardíaca

ALT – alanina transaminase

AP – auscultação pulmonar

AST – aspartato transaminase

bpm – batimentos por minuto

CC – centro cirúrgico

CK – creatinofosfoquinase

CL – colecistectomia laparoscópica

cm – centímetro

cpm – ciclos por minuto

CPRE – colangiopancreatografia retrógrada endoscópica

dL – decilitro

DM – Diabetes Mellitus

ECD – exame complementar de diagnóstico

ECG – electrocardiograma

EDA – endoscopia digestiva alta

EV – endovenoso

FC – frequência cardíaca

FR – frequência respiratória

GGT – gama glutamil transferase

h – hora

Page 6: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

5  

HD – hipótese diagnóstico

HTA – hipertensão arterial

kg – quilograma

L – litro

mEq – miliequivalente

mg – miligrama

mm – milímetro

mmHg – milímetro mercúrio

mmol – milimol

MS – membro superior

MV – murmúrio vesicular

ºC – graus Celsius

PA – pressão arterial

pCO2 – pressão parcial de CO2

PCR – proteína C reactiva

PO – per os

pO2 – pressão parcial de O2

PS – Pronto-socorro

QP – queixa principal

RA – ruídos adventícios

RHA – ruídos hidroaéreos

RM – ressonância magnética

RNI – relação normatizada internacional

Page 7: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

6  

RTU – ressecção transuretral

SatO2 – saturação O2

seg - segundos

SF – soro fisiológico

SG – soro glicosado

sic – segundo informação colhida

SU – serviço urgência

T – temperatura

TAC – tomografia axial computorizada

TGO – transaminase glutamato oxalacetato

TGP – transaminase glutamato piruvato

TP – tempo protombina

TTPA – tempo tromboplastina parcial activado

UI – unidade internacional

UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo

US – ultrassonografia

UTI – Unidade Terapia Intensiva

Page 8: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

7  

INTRODUÇÃO

A escolha deste estágio em São Paulo prendeu-se com a vontade de conhecer uma

diferente realidade, um sistema de saúde distinto daquele que fui conhecendo ao longo da minha

formação no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar.

A área “Cirurgia Geral” é para mim de grande interesse, portanto, esta foi uma opção

centrada na necessidade de descobrir mais alguns dados, especialmente nesta fase em que nos

impõem escolhas mais direccionadas.

Contextualização - Brasil

A República Federal do Brasil faz fronteira com todos os países da América do Sul com

excepção do Chile e Equador. (Figura 1) É um sistema constitucional com um governo

presidencial, com três ramos independentes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Compreende 26

estados divididos em 5 macrorregiões e 5,561 municípios.

 

Figura 1 - Mapa Brasil (CIA World Factbook 2004)

Page 9: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

8  

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2009 - a população

brasileira contava com cerca de 191,8 milhões de habitantes cuja densidade demográfica média é

de 22,5 habitantes por quilómetro quadrado (km2).

Em 2010, o PIB per capita alcançou $ 11906, após ter registado variação, em volume, de

6,5% em relação a 2009. O número de famílias com rendimento familiar per capita até metade

do salário mínimo caiu de 32,4% para 22,6%, em dez anos. No entanto, em 2008 metade das

famílias brasileiras ainda vivia com menos de $ 259 per capita. (WHO, 2009)

Os dados acima indicam que o Brasil ainda apresenta importantes desigualdades

socioeconómicas entre os grupos populacionais e regiões. Além disso a violência urbana está a

aumentar de forma alarmante, afectando a qualidade de vida e segurança da população.

O Brasil está a passar por uma transição epidemiológica em que as doenças não

transmissíveis e causas externas (actos de violência) estão a ultrapassar progressivamente as

doenças infecciosas e parasitárias. O sistema de saúde brasileiro é formado por uma rede

complexa de instituições públicas e privadas que providenciam, financiam e gerem os serviços

de saúde; produzem e distribuem os ganhos em saúde e as investigações; treinam recursos

humanos na área da saúde; regulam, legislam e inspeccionam o sistema de saúde. O Sistema

Único de Saúde (SUS) é exclusivamente responsável pela cobertura de saúde de 78,8% da

população brasileira, e é a rede primária de instituições públicas de saúde que fornece, financia e

gere os serviços de saúde. O restante 21,2% da população, que é coberta pelo Sistema

Suplementar, também tem acesso aos serviços de saúde disponíveis no SUS. Adicionalmente a

estas funções, o SUS também é responsável pela vigilância de saúde, controlo de doenças e

regulação do sector da saúde. Facilitar o acesso a fármacos essenciais faz parte dos cuidados

básicos e é conseguido através de mecanismos especiais de financiamento e das “farmácias

populares”, pertencentes ao governo. (WHO, 2009)

Em 2010 o gasto total com saúde foi de $168 mil milhões, sendo $79 mil milhões de

recursos públicos e $89 mil milhões do privado. Pelo quadro acima o recurso público representa

47% do total do gasto em saúde no Brasil ficando o recurso privado com 53%. (WHO, 2009)

Page 10: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

9  

A taxa de mortalidade infantil obteve importantes reduções no período entre 1980 e 2009:

em 1980 correspondia a 69,12 óbitos de menores de 1 ano para cada mil nascidos vivos e, em

2009, passou para 22,47. A taxa de mortalidade infantil brasileira já alcançou um patamar

incontestavelmente inferior ao de países como Costa do Marfim e Serra Leoa, mas ainda precisa

trilhar um longo caminho para atingir, no médio prazo, níveis mínimos de mortalidade infantil,

como os observados em Portugal, França, Noruega, Finlândia, Japão, Singapura e Islândia.

(WHO, 2009)

Como óbitos de natureza violenta atingem com mais intensidade a população masculina,

a consequência directa é o aumento do diferencial entre as expectativas de vida de homens e

mulheres. Em 2009, a esperança de vida masculina alcançou 69,42 anos e para as mulheres a

vida média ao nascer foi de 77,01 anos. (WHO, 2009)

Os dados mais pertinentes desta análise da situação socioeconómica e de saúde no Brasil

estão resumidos na tabela 1.

Tabela 1 - Tabela adaptada de WHO World Health Organization – Global Health Observatory, 2009

População Total 193734000

Produto Interno Bruto (PIB) per capita ($) 10080

Esperança de vida ao nascimento M/F (anos) 70/77

Probabilidade de morrer abaixo dos 5 anos (por

1000 nascimentos) 21

Probabilidade de morrer entre os 15 e 60 anos

M/F (por 1000 pessoas) 205/102

Total gasto em saúde per capita ($) 943

gasto em saúde como % do PIB 9.0

Page 11: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

10  

Preliminarmente, é importante frisar a grande dimensão da demanda por serviços de

saúde no Estado. Ferreira et al, 2006 afirmam que 36% da população, aproximadamente 14

milhões de pessoas, declarou ter procurado por serviços de saúde nos 30 dias anteriores. Desse

total, 92,5% foram atendidos no mesmo dia e 64% utilizou o serviço público de saúde,

correspondendo a cerca de 9 milhões de usuários do sistema. Em outras palavras,

aproximadamente um quarto da população do Estado é atendido pelo SUS em apenas um mês.

Objectivos

A elaboração deste relatório teve como principais preocupações aprofundar

conhecimentos da área de Cirurgia Geral (que fossem além dos conhecimentos apreendidos nas

disciplinas Cirurgia I e II) e estabelecer um ponto de confrontação com a realidade médica

portuguesa e brasileira. Tal só seria possível através da experiência nas duas realidades, com o

acompanhamento dos cirurgiões de várias áreas nas suas práticas diárias, em particular nas

enfermarias, consultas externas, serviço de urgência e bloco cirúrgico.

Metodologia

O estágio decorreu entre 1 de Março e 2 de Abril de 2011 no Pronto-Socorro (PS) e no

Centro Cirúrgico (CC) do Hospital São Paulo, no Brasil, num total de 108 horas. Adiciono a este

documento (anexo 1) a declaração de permanência nos serviços assinada pelos coordenadores da

Comissão de Mobilidade Académica, Prof. Dr. Alfredo Gragnani e Prof. Dr. José Carlos da

Silva, bem como pelo Chefe do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de São Paulo

– Escola Paulista de Medicina (UNIFESP – EPM), Prof. Dr. João Branco.

A metodologia consistiu no acompanhamento de diferentes residentes (internos de

especialidade) de Cirurgia no Pronto-Socorro e, fortuitamente, no Centro Cirúrgico, tendo

recorrido às enfermarias sempre que necessário complementar os dados de cada caso.

Page 12: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

11  

DISCUSSÃO

Descrevo agora, brevemente, algumas das actividades realizadas no âmbito da cirurgia

nos diversos serviços onde estive durante este mês, com destaque no acompanhamento de um

cirurgião num serviço de urgência no país em questão.

 

Tempo de estágio

O estágio decorreu num período total de 108 horas em PS, aos sábados das 8 horas até às

20 horas, nos dias semanais entre as 17 horas e as 21horas, entre os dias 1 de Março e 2 de Abril

de 2011. No mesmo mês foi feito o estágio da unidade curricular Cirurgia, entre as 7 e as 16

horas, em locais diversos como enfermarias, centro cirúrgico e consultas externas.

Local do estágio

O HSP teve sua pedra fundamental lançada em 30 de Setembro de 1936. Actualmente é

um Hospital Universitário geral, de tratamento de doenças de alta complexidade, que atende

diariamente mais de 2150 pacientes em ambulatório e 340 no Pronto-Socorro, é responsável na

Grande São Paulo, pela cobertura de uma área que abrange mais de 5 milhões habitantes, além

de atender pacientes oriundos de outros estados da federação. (Tabela 2) Ao lado desta intensa

actividade assistencial, destaca-se a vasta produção científica, que o qualifica, no cenário

nacional e internacional, como uma instituição séria e de excelência, fazendo parte do selecto

grupo de instituições de ensino que integram a Rede Nacional de Pesquisa Clínica (RNPC),

criada e coordenada pelos Ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia brasileiros.

Page 13: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

12  

Tabela 2 – tabela adaptada da Directoria Administrativa do HSP referente ao ano de 2009 

Total de leitos 775

Atendimentos Ambulatórios 785.056

Pronto Atendimento 191.338

Atendimentos no Pronto-Socorro 124.397

Número internamentos 26.347

Número de Cirurgias Realizadas 14.461

Exames Laboratoriais 2.779.503

Exames de Imagem 271.944

Enfermarias 

Ao entrar nos diferentes serviços fui surpreendida pelas peculiaridades deste hospital

onde cada serviço é gerido pela disciplina correspondente do curso de Medicina.

As actividades na enfermaria englobam a avaliação diária dos doentes juntamente com o

residente, seguida da visita matinal em que os casos são apresentados aos médicos responsáveis.

Uma das particularidades é a existência dos registos de “Evolução Multiprofissional” onde

escrevem médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e outros profissionais envolvidos na avaliação do

doente. Este método permite que, através de uma rápida leitura, se aceda a todos os dados

relevantes referentes aos dias de internamento.

O acesso dos doentes às diversas unidades de internamento de Cirurgia está previsto

através do PS, das consultas externas ou por doentes em lista de espera para procedimentos

programados, no entanto, observa-se com maior frequência a primeira situação.

Consultas Externas

Ao caminhar nas longas ruas que rodeiam o hospital, na Vila Clementino, observa-se

“Casa da Mão e do Braço”, a “Casa da Arritmia”, a “Casa da Hipertensão”, entre outras. O

hospital está disperso nestes edifícios, de um ou dois andares, onde se realizam a maioria dos

ambulatórios das várias especialidades.

As consultas externas decorrem quase sempre no período da tarde e cada ambulatório

dura cerca de 3 horas. Tive oportunidade de assistir a avaliação pré-operatória, a “primeiras

Page 14: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

13  

consultas” de doentes, maioritariamente encaminhados de outros serviços do HSP, e ainda, a

acompanhamento pós-operatório.

Tabela 3 ‐ Patologias mais observadas em cada disciplina 

Disciplina Exemplos patologias observadas

Cirurgia Plástica

Carcinoma basocelular

Melanomas

Abdominoplastia (após cirurgia bariátrica)

Feridas crónicas

Cirurgia Gástrica

Refluxo gastroesofágico

Megaesófago (Doença Chagas)

Litíase Biliar

Obesidade mórbida

Carcinoma cólon e recto

Urologia

Carcinoma próstata

Hiperplasia Benigna Próstata

Litíase renal

Cirurgia Cardíaca

Valvulopatia aórtica

Aneurismas aorta

Insuficiência coronária

Cirurgia Pediátrica

Hérnia umbilical

Fimose

Hidrocele

 

Centro Cirúrgico

Habitualmente as cirurgias programadas de doentes internados são realizadas pela manhã

num Centro Cirúrgico modernizado composto por 24 salas onde actuavam diversas áreas

cirúrgicas.

 

 

 

 

Page 15: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

14  

Tabela 4 ‐ Cirurgias observadas, de acordo com data, disciplina, procedimento, identificação do paciente e patologia 

Data  Disciplina  Procedimento  Identificação  Patologia 03/03/2011  Plástica  Desbridamento cirúrgico  Sexo feminino, 

21 anos Queimadura em 32% da área corporal 

04/03/2011  Plástica  Plastia mamária de redução  Sexo feminino, 27 anos 

 

04/03/2011  Plástica  Plastia mamária de redução  Sexo feminino, 31 anos  

 

04/03/2011  Plástica  Substituição de material de prótese mama 

Sexo feminino, 30 anos 

Contractura Capsular  

14/03/2011  Gástrica  Coledocoduodenostomia  Sexo feminino, 49 anos 

Coledocolitíase sem colangite 

15/03/2011  Gástrica  Tratamento hérnia inguinal  Sexo masculino, 28 anos 

Hérnia Inguinal Indirecta 

16/03/2011  Gástrica  Gastrectomia sub‐total  Sexo feminino, 78 anos 

Adenocarcinoma gástrico 

16/03/2011  Gástrica  Duodenopancreatectomia  Sexo masculino, 19 anos 

Tumor de Franz 

17/03/2011  Gástrica  Cardiomiotomia com fundoplicatura 

Sexo feminino, 45 anos 

Doenças Chagas com megaesófago II 

27/03/2011  Cardíaca  Substituição aorta ascendente e válvula aórtica com tubo valvulado  

Sexo masculino, 57 anos 

Insuficiência aórtica 

30/03/2011  Pediatria  Laparoscopia exploradora  Sexo masculino, 9 anos 

Suspeita de diverticulite de Meckel 

 

Seleccionei um dos casos citados acima para descrever com maior pormenor porque foi

aquele acompanhado mais estritamente, nomeadamente no período pré, intra e pós-operatório,

mas também por ser uma patologia frequente que ainda está sujeita a uma demora grande no que

refere à execução de exames complementares e de tratamento.

Caso 1 (15/03/2011)

JSP, sexo feminino, 78 anos.

Queixa Principal - Epigastralgia intensa

Page 16: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

15  

Doente refere epigastralgias intensas com inicio há mais de 1 ano, em cólica, sem

irradiação, agravada pela alimentação gordurosa, sem factores aliviantes, de frequência elevada

(quase diária), acompanhada de náuseas e vómitos nos episódios de agudização da dor. Ainda

associado à dor refere distensão abdominal e sensação de plenitude pós-prandial.

Ocasionalmente experimenta regurgitação e pirose. Nega icterícia, febre, acolia ou alterações na

urina.

Devido às queixas supracitadas procurou médico assistente em Maio de 2010 que

orientou a realização de uma endoscopia digestiva alta com biopsia. De acordo com indicação na

primeira EDA realizada, em Setembro de 2010 repetiu EDA. Os resultados dos exames serão

discutidos adiante.

Relativamente ao estado de saúde a doente refere perda ponderal de 17kg nos últimos 6

meses. Tem hipertensão há 7 anos, medicada. Não faz uso de tabaco, álcool ou outras drogas

ilícitas. Relativamente à sua dieta refere ingestão aumentada de pimenta e café, bem como de

carne, mas declina consumo de refeições industrializadas.

Antes do internamento estava em uso de omeprazol 20mg/dia (medicada desde a

realização da primeira EDA), nifedipina 20 mg 12/12h e enalapril 20 mg 12/12h.

Ao exame físico apresentava-se orientada no tempo e espaço. Mucosas e conjuntivas

coradas e hidratadas, escleróticas anictéricas, acianótica. Apirética (T 36.5ºC). Eupnéica

(frequência respiratória 16cpm), pressão arterial 135/80mmHg, frequência cardíaca 86bpm.

Auscultação pulmonar – murmúrio vesicular presente bilateralmente, sem ruídos adventícios.

Auscultação cardíaca – S1 e S2 presentes, rítmicos, normofonéticos, sem sopros. Abdómen

flácido, sem organomegalias, indolor, ruídos hidroaéreos presentes.

EDA (14/05/2010) - Lesão gástrica antral ulcero infiltrativa; esofagite não-erosiva distal.

Os resultados da anatomia patológica da amostra colhida na EDA foram: fundo e superfície da

lesão ulcerado com infiltrado de células atípicas; alterações degenerativas e inflamatórias com

aspecto regenerativo e displasia glandular de baixo grau. O patologista sugeriu a repetição dos

exames.

Page 17: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

16  

EDA (07/12/2010) - Lesão gástrica pré-pilórica estenosante; esofagite erosiva distal dos

ângulos gástricos; resíduos gástricos em câmara gástrica; lesão ulcero-vegetante infiltrativa pré-

pilórica Borrmann’s III. A anatomia patológica avançou com o diagnóstico de adenocarcinoma.

TAC abdomino-pélvica (11/12/2010) - Discreta dilatação da via biliar intra-hepática;

ateromatose aorto-ilíaca acentuada; fígado de aspecto normal; quistos no rim direito com cerca

de 1,1cm no pólo inferior e 1,6cm no terço médio; espessamento mucoso da grande curvatura e

espessamento antral com diminuição do calibre do lúmen gástrico; sem comprometimento de

linfonodos; sem invasão de vasos.

Hipótese Diagnóstica - Adenocarcinoma gástrico

Plano - Gastrectomia sub-total com anastomose em Billroth II – realizada no dia

16/03/2011.

 

 

À escala mundial, a incidência do cancro de estômago configura-se como a quarta causa

mais comum e, em termos de mortalidade, é a segunda causa de óbitos por cancro. Em geral, sua

magnitude é de duas a três vezes maior nos países em desenvolvimento e é maior no sexo

masculino que no feminino. No Brasil, o Instituto Nacional de Cancêr (INCA) estima que no ano

2010 surjam 14 casos novos a cada 100 mil homens e 8 para cada 100 mil mulheres.

A infecção por Helicobacter pylori continua a ser o principal factor de risco, no entanto

existem outros como, consumo baixo de proteínas e gorduras, elevado teor de sal, elevado

consumo de produtos nitrogenados, preparação dos alimentos deficiente, falta de refrigeração,

pouca ingestão de água, tabagismo, baixa classe social, cirurgia gástrica prévia, atrofia gástrica e

gastrite, pólipos adenomatosos e sexo masculino. Noventa e cinco por cento das neoplasias

malignas gástricas são adenocarcinomas. A classificação de Borrmann de 1926 divide o

carcinoma gástrico em 5 tipos de acordo com a aparência macroscópica das lesões. Nesta doente

estamos perante um Borrmann’s III o que significa lesões ulceradas com infiltração na parede

gástrica. Como descrito neste caso, é frequente que as únicas queixas do doente sejam

epigastralgia e indigestão o que pode ser confundido com gastrite. Os sinais observados no

exame físico geralmente relacionam-se com doença localmente avançada ou metástases, por

exemplo gânglios linfáticos supraclaviculares (Virchow) ou periumbilicais (Mary Joseph)

palpáveis. Quando há suspeita de carcinoma gástrico a EDA é a modalidade diagnóstica de

Page 18: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

17  

escolha. Durante a EDA várias amostras de biopsia em torno da lesão ulcerada devem ser

colhidas para facilitar o diagnostico histológico. Quando isto acontece a especificidade do

procedimento ronda os 98%. Uma vez confirmado o diagnóstico, a investigação posterior deve

incluir hemograma, bioquímica, incluindo função hepática, estudo de coagulação, raio X

torácico, TAC abdominal e TAC ou US pélvica no caso das mulheres. (Townsend, et al 2007)

A doente esperou 7 meses para repetição de um exame que já tinha alterações atípicas

sugestivas de malignidade. O paulista que precisa marcar uma consulta na rede pública de saúde

tem de enfrentar, em média, uma espera de 61 dias. Se o médico pedir algum exame, o paciente

volta para a fila - desta vez para aguardar, em média, mais 76 dias. E se o diagnóstico indicar a

necessidade de procedimentos mais complexos ou cirurgias o tempo médio da demora é ainda

maior: 166 dias. Esta é a estatística dos indicadores de referência de bem-estar no município mas

neste caso o tempo de espera desde a primeira consulta foi ainda mais longo. (IBGE, 2008)

Quando finalmente chegou aos cuidados do serviço de Gastrocirurgia do HSP a

abordagem adoptada nesta doente foi gastrectomia sub-total com anastomose Billroth II.

Conforme Foukakis et al, 2007 não se verificaram diferenças significativas na sobrevida entre a

gastrectomia total e sub-total no grupo de doentes com tumor localizado no estômago distal ou

no corpo. A opção conservadora é válida sempre que seja possível obter margens negativas,

recomendando-se margens de 5 a 6 cm. Embora no Japão seja usado preferencialmente o método

de Billroth I e nos EUA a cirurgia Billroth II, Montesani et al, 2002 concluíram, a partir da

análise de vários estudos, que há menor refluxo gastroesofágico e esvaziamento gástrico mais

rápido e competente quando utilizado o método de anastomose em Y de Roux. Relativamente à

extensão da linfadenectomia há muito tempo este é um tópico controverso, mas entretanto as

recomendações actuais do Comité Americano de Estadiamento de Cancro aconselham que pelo

menos 16 gânglios linfáticos sejam analisados para aperfeiçoamento do estadiamento tumoral.

 

 

 

 

Page 19: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

18  

 Pronto-Socorro

Considerando que o estágio curricular que estava a realizar, por ser composto de áreas tão

diversas como Cirurgia Gástrica, Cirurgia Plástica, Cirurgia Pediátrica, Urologia, Cirurgia

Vascular, Cirurgia Cardíaca, Cirurgia Torácica e Técnica Operatórias, seria uma abordagem

demasiado vasta e porque queria complementar o meu estágio com a componente do serviço de

urgência em cirurgia foi requisitada a autorização ao Director-Geral do PS, Dr. Milton

Scalabrini, para observar e eventualmente realizar algumas actividades neste serviço (Tabela 5).

O atendimento do PS Cirurgia é feito na sala de sutura com 4 camas separadas por

biombos, e na sala de trauma com espaço para 4 camas. Habitualmente o atendimento é feito por

quatro residentes R1 (primeiro ano da especialidade) e um residente R2 que orienta os casos,

respondendo ao chefe de plantão. Além dos médicos ainda estavam no local 4 alunos de

medicina do 6º ano, distribuídos entre as duas salas. Os doentes com necessidade de

internamento no PS ocupam as 8 camas disponíveis na zona de observação masculina e feminina

distribuída por 2 salas ou, em dias de muito afluxo, permanecem no corredor.

Tabela 5 ‐ Procedimentos realizados e observados no PS 

Procedimentos Realizados Procedimentos Observados

Colheita histórias clínicas Paracentese

Preenchimento da requisição de exames subsidiários

de diagnóstico e interpretação de resultados

Toracocentese

Prescrição Intubação gástrica

Punção arterial Nefrostomia percutânea

Execução de pensos Estabilização de fractura exposta

Algaliação feminina Avaliação doente traumatizado

(Advanced Trauma Life Support)

Electrocardiograma simples de 12 derivações com

interpretação

Incisão e drenagem de quisto sebáceo

Sutura ferida cutânea

Toque rectal

Page 20: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

19  

Cada caso é avaliado inicialmente por residentes R1 e discutido posteriormente com o

residente R2 de plantão. Se em alguns dias acompanhava o R2 e observava um grande volume de

casos, noutras alturas acompanhei o R1 ou avaliei o doente sozinha, dependendo das

oportunidades que surgiam. A colheita de dados de casos clínicos com o intuito de exemplificar

algumas das patologias mais frequentes neste hospital nem sempre foi fácil. Assim, seleccionei

alguns casos observados, não tanto pela sua particularidade mas antes porque foram aqueles em

que pude ter acesso a dados mais completos do doente, ou uma intervenção maior. Ainda assim

em alguns deles não foi possível apresentar toda a informação, e aponto alguns factores, tais

como, lapso nos registos após a alta do doente, impossibilidade de aceder aos registos porque

consistem numa pequena folha que passa por vários profissionais de saúde, impedimento de

acompanhar o doente ao centro cirúrgico, limitação do número de casos por imposição dos

alunos do 6ºano da UNIFESP, entre outros.

Casos Clínicos

Caso 2 (10/03/2011)

DTC, sexo masculino, 63 anos.

QP – Lombalgia

Doente com diagnóstico de HTA e DM tipo II, há um ano iniciou quadro agudo de

obstrução urinária (oligúria, jacto intermitente e fraco), sendo avaliado por Urologia que

diagnosticou aumento da próstata mas não realizou biopsia (sic). Há 5 meses colocou uma sonda

vesical por progressão do quadro obstrutivo enquanto aguardava cirurgia, que realizou no mês

anterior. Após a ressecção transuretral da lesão iniciou quadro de astenia, icterícia e equimoses

de fácil aparecimento nos membros superiores.

Recorre ao PS por lombalgia intensa, contínua, sem irradiação, sem sintomas

acompanhantes, sem alívio após analgesia (codeína 30mg). Este sintoma surgiu após a cirurgia,

há cerca de 1 mês e o doente refere agravamento da dor.

Ao exame físico o doente demonstrava orientação no tempo e espaço, mas com sinais de

desconforto. Mucosas e conjuntivas hipocoradas e hidratadas, escleróticas ictéricas, acianótico.

Page 21: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

20  

Apirético (T 35.1ºC). Taquipnéico (FR 36 cpm), SatO2 96%, PA 90/60 mmHg, FC 96 bpm,

glicemia 147 mg/dl. AP – MV presente bilateral, sem RA. AC – S1 e S2 presentes, rítmicos e

normofonéticos, sem sopros. Abdómen mole e depressível, fígado palpável a 5-6 cm da grade

costal, sem dor à palpação superficial e profunda. MS – Equimoses extensas nos dois membros.

HD - Carcinoma próstata com metastização hepática e óssea

Plano - Solução de morfina (4 mg) e soro fisiológico 0.9% (500 ml) endovenoso. Alta e

orientação para a consulta externa do Serviço de Urologia do HSP.

O cancro da próstata é actualmente reconhecido como um dos principais problemas

médicos enfrentados pela população masculina. Esta doença representa 9% de todas as mortes

por cancro entre os homens. No Brasil, o câncer de próstata é o segundo mais comum entre os

homens com 52350 casos estimados em 2010. (INCA, 2009)

A Cochrane Collaboration, em revisão sistemática realizada em 2011, demonstra que os

ensaios clínicos até o momento não apresentam evidências de que o rastreio do cancro da

próstata tenha impacto na mortalidade pelo mesmo, além de não abordarem questões importantes

como a qualidade de vida e o custo (Ilic et al, 2011). Assim, o Instituto Nacional de Câncer

considera que não há lugar para o rastreio organizado de cancro da próstata e recomenda que,

quando os exames de rastreio são requisitados pelo paciente, os médicos devem esclarecer sobre

os riscos e benefícios associados a esta prática.

Até que haja metástases ou esteja localmente avançado, o cancro da próstata não causa

sintomas. A maioria dos casos é diagnosticada pelo aumento do valor de antigénio específico da

próstata (PSA) ou toque rectal da próstata anormal. Aproximadamente 25% dos doentes com

PSA superior a 4 ng/ml e cerca de 50% daqueles que reúnam aumento do PSA e toque rectal

anormal terão alterações na biopsia. Apesar da controvérsia em torno do rastreio deste cancro, é

de salientar que a maioria dos casos detectados em resultado de aumento do PSA ou alteração no

toque rectal são clinicamente significativos e devem ser tratados em homens com esperança de

vida superior a 10 anos. O diagnóstico é feito por biopsia que vai permitir a classificação a partir

do sistema de Gleason que descreve padrões de crescimento tumoral (grau 1-5). O estadiamento

é mais comum através do sistema TNM. Os locais mais comuns de metástases são os ossos e os

gânglios linfáticos pélvicos. (Brunicardi et al, 2010)

Page 22: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

21  

O facto de o doente ser seguido em outro serviço e não ter consigo os exames realizados

ou uma descrição da sua condição, dificulta a actuação do médico na situação de urgência. As

informações colhidas junto da filha do doente foram a principal determinante na conduta do

caso. Segundo a acompanhante, não foi realizada biopsia e após a cirurgia o doente teve alta do

hospital em questão. Esta conduta não é, presumidamente, a mais correcta o que me levou a

questionar se não é pertinente o pedido de informações junto da equipa responsável pelo doente.

Foi decidido o encaminhamento para a consulta externa de Urologia do HSP para melhor

avaliação do caso. De acordo com a Sociedade Europeia de Urologia, o tratamento hormonal não

deve ser negado a doentes com carcinoma avançado e sintomáticos. (Heidenreich et al, 2011)

Caso 3 (19/03/2011)

CM, sexo feminino, 65 anos.

QP - dor no flanco direito

Doente com antecedentes de HTA e DM tipo II recorre ao SU às 12h00 por dor no flanco

direito que irradia para a região lombar, em cólica, de intensidade moderada a grave, com

evolução de aproximadamente 10 horas, sem alívio com analgésicos (Buscopan®

butilescopolamina). Associada a náuseas e episódio de vómito, pós-prandial, de conteúdo

alimentar, sem hematemese. Anorexia desde o jantar do dia anterior. Nega sintomas colestáticos.

Nega febre. A doente refere um episódio semelhante no ano anterior que levou a internamento de

4 dias com diagnóstico de pancreatite aguda originada por litíase vesicular. Estava em lista de

espera desde Dezembro de 2010 para realização de colecistectomia. (sic)

Ao exame físico apresentava-se orientada no tempo e espaço. Mucosas e conjuntivas

coradas e hidratadas, escleróticas anictéricas, acianótica. Apirética (T 36.1ºC). Eupnéica (FR 20

cpm), SatO2 97%, PA 120/70 mmHg, FC 80 bpm, glicemia 160 mg/dl. AP – MV presente

bilateralmente, sem RA. AC – S1 e S2 presentes, rítmicos e normofonéticos, sem sopros.

Abdómen flácido, doloroso à palpação superficial na zona periumbilical e epigástrica, sem

organomegalias ou massas palpáveis. Murphy vesicular negativo.

HD - Colecistite; Pancreatite aguda; Colangite

Page 23: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

22  

Plano - Hemograma, ionograma, glicemia, ureia, creatinina, albumina, prova de hemólise,

LDH, TGO e TGP, bilirrubinas, amílase e lípase; raio X abdominal; US abdominal; RM

abdómen superior. Encaminhada para a sala de medicação IV com a seguinte prescrição: SF

0.9% (500ml); Tramal® tramadol (100mg); Plasil® metoclopramida (100mg); jejum.

Hemograma e Bioquímica sem alterações.

Raio X abdominal - sem sinais de cronicidade/calcificação pancreática, sem aerobilia,

nem outras alterações significativas.

US abdominal – cálculos no interior da vesícula; paredes vias biliares 3.6mm; dilatação

de vias biliares intra e extra-hepáticas; colédoco 5.2mm.

No dia seguinte, por volta das 15h, a doente subiu ao CC para a realização da

colecistectomia laparoscópica, sendo acompanhada por outro interno do 6ºano que já estava

destacado para assistir esta cirurgia.

Cálculos biliares são a patologia gastrointestinal que mais leva a hospitalização e

frequentemente ocorrem em jovens com uma prevalência em relatórios de autópsia entre os 11 e

36%. Sexo feminino, obesidade, gravidez, alimentação rica em gorduras, doença de Crohn,

ressecção ileal terminal, cirurgia gástrica, esferocitose hereditária, doença falciforme e

talassemia estão associados ao risco aumentado de desenvolver cálculos.

A maioria dos pacientes permanece assintomática no entanto alguns desenvolvem

complicações como, colecistite aguda, coledocolitíase com ou sem colangite, pancreatite aguda,

íleo biliar e carcinoma da vesícula biliar. A ultrassonografia é o melhor exame diagnóstico de

imagem com uma sensibilidade e especificidade de 85% e 95%, respectivamente. A US é, na

maioria das vezes, suficiente para avaliação da vesícula biliar neste contexto, no entanto foi

solicitada uma RM abdominal superior. Este método de diagnóstico, reservado aos casos de

dificuldades na realização da US ou avaliação da via biliar principal na suspeita de colangite ou

presença de icterícia, apresenta limitações, como pouca sensibilidade nos casos de microlitíase,

incapacidade de testar o sinal ecográfico de Murphy, menor especificidade e maior custo. (Oh et

al, 2003)

Após estabelecido o diagnóstico a reposição de fluidos EV, antibioterapia e analgesia

devem ser iniciados, conduta que não se verificou, uma vez que não foi instituído nenhum

Page 24: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

23  

antibiótico. A antibioterapia deveria cobrir aeróbios gram-negativos e anaeróbios, uma vez que

mais de metade dos doentes com colecistite aguda revela culturas positivas. (Brunicardi et al,

2010)

A colecistectomia laparoscópica (CL) precoce diminui o número de dias de internamento

e permite um retorno mais precoce do doente ao trabalho tendo assim impacto económico

significativo. Idealmente a CL deve ser realizada nas primeiras 72 horas após o episódio agudo

pois após este período as adesões e a inflamação crónica dificultam a dissecção e exposição das

estruturas do triângulo de Calot. (Maduekwe et al, 2011) O maior receio na intervenção precoce

é a lesão do ducto biliar, porém Gurusamy et al, 2010 afirmaram que apesar dos estudos

observacionais sugerirem um grande número de lesões nas cirurgias precoces, nos ensaios

clínicos randomizados são necessários diversos estudos para demonstrar uma grande diferença

entre cirurgia precoce e tardia.

Caso 4 (23/03/2011)

ZTP, sexo feminino, 80 anos.

QP - dor no hipocôndrio direito

A paciente com antecedentes de HTA, DM tipo II e dislipidemia, inicia 5 dias antes,

quadro de dor no hipocôndrio direito, em cólica, intermitente, de forte intensidade, sem

irradiação, sem factores de agravamento, melhoria com o repouso. A dor associa-se a diminuição

do apetite, náuseas e um episódio de lipotímia seguido de vómitos de conteúdo alimentar, sem

hematemese. Nega febre ou sintomas colestáticos.

Ao exame físico apresenta-se orientada no tempo e espaço. Mucosas e conjuntivas

coradas e hidratadas, escleróticas anictéricas, acianótica. Febril (T 38.5ºC). Eupnéica (FR

18cpm), SatO2 95%, PA 130/90mmHg, taquicárdica (FC 112bpm). AP – MV presente

bilateralmente, sem RA. AC - S1 e S2 presentes, rítmicos, normofonéticos, sem sopros.

Abdómen globoso, pouco distendido, doloroso à palpação superficial e profunda no hipocôndrio

direito, sem massas ou organomegalias. Murphy vesicular negativo. Blumberg negativo.

HD - Colecistite; Pancreatite aguda; Colangite; infecção trato urinário

Page 25: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

24  

Plano – Algaliação; Hemograma; Creatinina; Ureia; Na+; K+; bilirrubinas; transaminases;

FA; GGT; amílase; PCR; sedimento urinário; Raio X abdominal; US abdominal; colangio-RM;

colangiopancreatografia retrógrada endoscópica; internamento na sala de observação feminina

com a seguinte prescrição:

− Dieta geral hipogordurosa

− SF 0.9% 500mL (12/12h)

− Buscopan® butilescopolamina simples 1 amp (8/8h)

− Ranitidina 50mg (8/8h)

− Metoclopramida 10mg (8/8h)

− Rocefin® ceftriaxona 1g (12/12h)

− Flagyl® metronidazol 500mg (8/8h)

Nos exames laboratoriais verificou-se aumento das aminotransferases (AST 99U/L; ALT

150 U/L; GGT 291 U/L) e do PCR (80 U/L). Bilirrubinas total e directa normais.

Sedimento urinário: leucócitos 109000 células/ml; hemácias 9000 células/ml; sem células

epiteliais; sem dismorfismo eritrocitário.

Raio X abdominal sem alterações.

US abdominal: esteatose hepática moderada; colecistite crónica calculosa; vias biliares de

paredes espessadas (4.3 mm); dilatação de vias biliares intra e extra-hepáticas; dilatação

colédoco.

No dia 27/03/2011 ainda não tinha sido possível a realização da CPRE, o que

condicionou a alta da doente com retorno mais tarde para completar a investigação.

A CPRE apresenta-se como escolha diagnóstica e potencialmente terapêutica nos casos

de suspeita de cálculos no ducto biliar comum (presentes em 6 a 12% dos pacientes com

colelitíase). Esta suspeita tem base na cólica biliar, na dilatação do colédoco e no aumento das

transaminases num doente com cálculos na vesícula biliar, embora o valor dos exames

laboratoriais não seja sensível ou especifico para a presença de cálculo no ducto comum. A

colangio-RM fornece detalhe anatómico excelente e tem sensibilidade e especificidade de 95 e

89%, respectivamente, na detecção de colangite. (Petrov et al, 2009)

Page 26: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

25  

Vários estudos sugerem que, comparativamente, a principal vantagem da colangio-RM

em relação à CPRE diagnóstica diz respeito às taxas de complicações que variam entre 5 e 6% na

CPRE. No entanto este método invasivo tem o potencial de permitir o tratamento imediato. Se os

exames preliminares, US ou TAC, indicarem claramente a necessidade de CPRE terapêutica

então a colangio-RM é, provavelmente, injustificada. (Kaltenthaler et al, 2006)

Caso 5 (18/03/2011)

FMM, sexo masculino, 44 anos.

QP - Ferida corto-contundente

O doente recorreu ao SU por ferida corto-contundente na região palmar do 2º dedo da

mão direita com aproximadamente 3 cm de comprimento e maior profundidade no centro da

ferida que nas extremidades. O doente refere que o corte resultou de um acidente de trabalho

com uma faca. Quando questionado sobre vacinação anti-tetânica não soube especificar a

situação. Sem outras queixas.

Foi realizada lavagem da ferida com soro fisiológico, avaliação neurológica, vascular e

motora, anestesiou-se a borda da lesão com 5 ml de lidocaína 2% (20mg/mL) utilizando uma

agulha hipodérmica, após campo e mãos devidamente esterilizados. Depois de verificar a

ausência de corpos estranhos e de lesão no sistema flexor, foi realizada sutura com fio nylon 3.0.

Plano - Cefalexina PO 500mg durante 7 dias; aconselhado a procurar o Posto de Saúde

para actualizar a vacinação e remoção dos pontos no prazo de uma semana.

 

 

  Um pequeno segmento corporal apresenta uma grande complexidade estrutural. Até

mesmo pequenos ferimentos podem produzir lesões tendinosas e nervosas. Em caso de

ferimentos nas extremidades superiores deve sempre pesquisar-se lesões de outras estruturas

incluindo nervos, tendões, vasos, assim como a presença de corpos estranhos. O mais importante

nesta localização é avaliar o tendão do flexor profundo dos dedos, através da capacidade ou não

de flexão da articulação interfalângica distal.

Page 27: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

26  

Esta foi uma das suturas que tive oportunidade de efectuar durante o estágio, constituindo

uma mais-valia visto que é um procedimento que, até chegar a São Paulo, nunca tinha realizado.

Caso 6 (21/03/2011)

TY, sexo masculino, 68 anos.

QP - Dor abdominal intensa

Doente com antecedentes de HTA, DM tipo II, dislipidemia e doença cardíaca não

especificada, recorreu ao SU por dor abdominal intensa, de localização difusa, sem irradiação,

com evolução de cerca de 14horas (surgiu cerca de 2 horas após o jantar na noite anterior), sem

factores de alívio ou agravamento, associada a náuseas. Nega vómitos ou febre. Refere um

episódio isolado de melena na madrugada anterior.

Ao exame físico mantinha-se orientado no tempo e espaço. Mucosas e conjuntivas

hipercoradas e pouco hidratadas, escleróticas anictéricas, pupilas isofotorreactivas, acianótico.

Sem sinais de irritação meníngea. Glasgow 15 (4+5+6). Apirético (T 36.3ºC). Eupnéico (FR 23

cpm), PA 60/40 mmHg, FC 60 bpm. AP – MV presente bilateralmente, com roncos esparsos.

AC – S1 e S2 presentes, rítmicos e normofonéticos, sem sopros. Abdómen semi-globoso,

discretamente distendido, doloroso à palpação superficial e profunda, RHA diminuídos. Sinal de

Blumberg positivo.

HD - abdómen agudo por isquemia mesentérica

Plano - Gasimetria arterial; Hemograma; Na+; K+; CK; CK-MB; Troponina I; FA; ECG;

Interconsulta Cirurgia Vascular; SF 0.9% 1000mL.

Após localizar o pulso da artéria radial direita, procedeu-se à assepsia do local e

introduziu-se a agulha hipodérmica colhendo depois o sangue arterial para uma seringa

heparinizada. Os resultados da avaliação laboratorial foram consistentes com acidose metabólica

compensada (pH 7.38, HCO3- 16.5 mEq/L; PCO2 28.1 mmHg) e anemia (Hb 8.2 g/dL).

Page 28: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

27  

ECG – foram colocados os eléctrodos sobre a pele do doente nas regiões pré-

estabelecidas (extremidade superior, inferior e tórax), obtendo as 12 derivações

electrocardiográficas. Observarmos o seguinte resultado: ritmo sinusal (frequência cardíaca 75

bpm; área eléctrica inactiva inferior (ondas Q> 0.04s nas derivações aVF, D2 e D3); sem outras

alterações significativas.

A isquemia mesentérica aguda é uma emergência vascular potencialmente fatal (60 a

80%). Engloba um grupo de processos fisiopatológicos que apresentam um desfecho comum –

necrose intestinal. Classifica-se em 4 tipos relativamente à etiologia: embolismo arterial (40 a

50%) com origem frequentemente cardíaca e acometimento da mesentérica superior; trombose

arterial (25 a 30%) consequência de doença aterosclerótica severa; não-oclusiva (20%) com

patogénese pouco esclarecida mas relacionada com baixo débito cardíaco; trombose venosa

(10%). Geralmente os doentes surgem com inicio abrupto dos sintomas, como dor abdominal,

náuseas, vómitos e urgência na defecação. Um alto grau de suspeição é necessário para

estabelecer o diagnóstico nas primeiras 24h e diminuir a taxa de mortalidade. (Townsend, et al

2007)

As alterações nos resultados laboratoriais mais comuns são leucocitose e acidose

metabólica com anion gap elevado. O Raio X abdominal e a TAC surgem com um papel

complementar mas não diagnóstico, enquanto a angiografia, na ausência de indicação clínica

para laparotomia de emergência, é o procedimento de escolha. Neste doente em que havia uma

forte suspeita de etiologia vascular a conduta foi orientada nesse sentido, sendo requisitada uma

interconsulta de cirurgia vascular e determinada a preparação pré-operatória necessária à

laparatomia de emergência, uma vez que apresentava sinais peritoneais de possível enfarte

intestinal. Assim, a abordagem cirúrgica das isquemias intestinais constitui-se, quase na

totalidade das intervenções, na ressecção do segmento lesado e anastomose primária ou

derivação intestinal (colostomia, ileostomia e eventualmente jejunostomia). Os grandes dilemas

enfrentados pelo cirurgião geral nestas situações são, a garantia de vascularização dos segmentos

intestinais restantes e, se a extensão de intestino remanescente é suficiente para não dar lugar a

um síndrome de intestino curto. (Oldenburg et al, 2004)

Caso 7 (19/03/2011)

Page 29: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

28  

MJSC, sexo feminino, 81 anos

QP - Dor abdominal

Paciente com antecedentes de HTA e aneurisma da aorta torácica e abdominal recorreu

ao SU por queixa de dor abdominal em região periumbilical e flanco esquerdo, em pontada,

contínua, com irradiação para coluna tóraco-lombar, pouca melhora com tramadol, sem factores

de piora. Referiu que esta é uma dor antiga (há cerca de 5 anos teve o primeiro episódio) mas nos

últimos 6 meses notou um agravamento progressivo e no dia anterior a intensidade da dor

aumentou consideravelmente o que a levou a procurar o SU. Há 3 dias refere um episódio de

vomito de conteúdo alimentar, cerca de 2 horas após a refeição, sem hematemese. Desde esse dia

que apresenta queixa de diminuição do apetite.

Ao exame físico apresentava-se orientada no tempo e espaço. Mucosas e conjuntivas

coradas e hidratadas, escleróticas anictéricas, acianótica. Apirética (T 35.7ºC). Eupnéica (FR 20

cpm), PA (E) 120/80 PA (D) 120/85, FC 84 bpm (pulsos amplos e simétricos). AP – diminuição

do MV no terço inferior do pulmão esquerdo, sem RA. AC - S1 e S2 presentes, rítmicos,

normofonéticos, sem sopros. Abdómen doloroso à palpação superficial e profunda

principalmente no flanco direito onde se denota uma massa pulsátil de aproximadamente 5 cm.

Nas extremidades verifica-se perfusão diminuída mas sem lesões tróficas.

Sem alterações significativas nos exames laboratoriais.

Angio-TAC tóraco-abdominal: Enfisema centro-lobar difuso. Arco aórtico alargado com

contornos irregulares apresentando os ramos supra-aórticos deslocados anterior e lateralmente

para a direita. Arco aórtico de 42mm, no istmo com 35mm. O istmo apresenta imagem de adição

em seus contornos, com massa perivascular não opacificada pelo contraste, com diâmetro

máximo de 87mm. Presença de varias imagens de realce irregular no interior da massa indicando

extravasamento do meio de contraste. Esta dilatação aneurismática determina a atelectasia do

lobo pulmonar inferior esquerdo. Na transição tóraco-abdominal a aorta está tortuosa e

acotovelada com diâmetro de 28mm. Outra dilatação com extensão de 50mm na aorta infra-

renal, com paredes trombosadas, que se estende até próximo da bifurcação aorto-ilíaca, colo

infra-renal mede 27mm de diâmetro. Diâmetro maior da dilatação aórtica abdominal com 65mm.

Acentuada tortuosidade da aorta abdominal e ilíacas comuns. Ilíaca comum direita com 13mm e

esquerda com 18mm.

Page 30: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

29  

HD – Dissecção aneurisma aorta

Plano - monitorização contínua; dois acessos endovenosos; algaliação; Interconsulta de

Cirurgia Vascular.

A doente permaneceu na sala de trauma, em monitoramento, a aguardar vaga na UTI,

para posterior acompanhamento pela cirurgia vascular.

Aneurisma da aorta é definido como uma dilatação permanente resultando num aumento

de, pelo menos, 50% de diâmetro da artéria. As causas de aneurisma da aorta torácica incluem

doença degenerativa da parede aórtica, dissecção aórtica, infecção e trauma. Para os aneurismas

maiores que 6 cm de diâmetro as taxas anuais de complicações catastróficas como ruptura,

dissecção ou morte são, respectivamente, 3.6%, 3.7%, 10.8%. Grandes aneurismas podem causar

pressão nas estruturas adjacentes e originar sintomas como por exemplo rouquidão por paralisia

das cordas vocais devido a compressão do nervo laríngeo recorrente esquerdo ou nervo vago,

hipertensão pulmonar devida a pressão da artéria pulmonar, ou disfagia por compressão do

esófago. (Brunicardi et al, 2010)

Os aneurismas da aorta estão mais frequentemente localizados na porção infra-renal,

sendo uma patologia comum que afecta cerca de 1.7 milhões de pessoas nos EUA. A história

natural consiste na expansão do aneurisma que varia de acordo com o tamanho do mesmo e,

quanto maior o diâmetro, maior o risco de ruptura, a complicação mais comum e letal. Neste

caso com um diâmetro maior de 65 mm a expansão está em torno dos 10% ao ano e corresponde

a uma taxa de ruptura entre 10 e 20%. Muitos doentes (30%) surgem com uma dor crónica

abdominal que irradia para as costas. Dor lombar severa na ausência de ruptura é descrita como

resultado de erosão de um grande aneurisma na coluna ou inflamação. Esta apresentação

significa iminente ruptura e requer avaliação urgente e tratamento. (Brunicardi et al, 2010)

Apesar das várias modalidades disponíveis, a angio-TAC ultrapassou largamente a

angiografia convencional na avaliação de doença aórtica aneurismática e planeamento da

intervenção cirúrgica. Estes doentes apresentam muitas vezes doença cardíaca, pulmonar ou

renal concomitante tornando a determinação destas comorbilidades uma prioridade na

estratificação do risco cirúrgico. No entanto, nos casos de ruptura e hipotensão a intervenção

cirúrgica imediata está indicada. (Brewster et al, 2003)

Page 31: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

30  

Caso 8 (25/03/2011)

WLC, sexo masculino, 49 anos.

QP – Hematúria

Paciente hipertenso e diabético, há 19 dias com queixas de hematúria e retenção urinária,

foi atendido noutro serviço onde fizeram irrigação vesical que resultou em melhoria do quadro e

posterior alta. De regresso a casa os sintomas voltaram (só conseguia urinar na posição deitada

mas sem hematúria). Três dias antes deste internamento regressa a hematúria e a retenção mas

nega disúria.

Terminou o tratamento de 14 dias com ciprofloxacina dois dias antes do internamento.

Em medicação crónica com losartan, nifedipina e glibenclamida.

Ao exame físico apresenta-se orientado no tempo e espaço. Mucosas e conjuntivas

coradas e hidratadas, escleróticas anictéricas, acianótico. Apirético (T 36.2ºC). Eupnéico (FR 16

cpm), SatO2 97%, PA 165/98 mmHg, FC 92 bpm. AP – MV presente bilateral sem RA. AC – S1

e S2 presentes, rítmicos e normofonéticos, sem sopros. Abdómen flácido, sem organomegalias

ou massas palpáveis, indolor, RHA presentes.

HD - Neoplasia renal

Plano - Hemograma; Na+; K+; Creatinina; Ureia; TP; TTPA; RNI; RM abdominal

superior; pedida vaga na enfermaria de Urologia; internamento na sala de observação masculina

com a seguinte prescrição:

− Jejum

− SG 500mL + NaCl 20% 20mL + KCl 19.1% 7mL (6/6h)

− SF 0.9% (12/12h)

− Ranitidina 50mg (8/8h)

− Dipirona 1g (6/6h)

− Plasil® 10mg (6/6h)

Page 32: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

31  

− Losartan 50mg PO (12/12h)

− Nifedipina 20mg PO (12/12h)

− Propanolol 40mg PO (12/12h)

 

Os exames laboratoriais vieram sem alterações.

Após 2 dias de internamento, a aguardar vaga na enfermaria de Urologia e realização da

RM abdominal superior, foi diagnosticada neoplasia renal direita (ainda não estava disponível o

relatório do exame mas foi comunicado verbalmente a existência de uma massa sólida no pólo

inferior do rim direito com contornos irregulares). O paciente teve alta (28/03/2011) com

orientação para retornar à consulta externa de Urologia no dia 06/04/2011.

 

   

O carcinoma renal no Brasil tem uma incidência de 7 a 10 casos por 100000 habitantes

nas áreas mais industrializadas. O carcinoma de células renais, originado no córtex renal, é

responsável por 80 a 85% da totalidade de carcinomas renais primários. O diagnóstico

diferencial de hematúria inclui malignidade, infecção, cálculos e trauma. Os cancros do rim e

bexiga normalmente apresentam-se como hematúria indolor. As alterações laboratoriais mais

comuns são: elevação da VHS, hipercalcemia, hemoglobina <10 em mulheres e <12 em homens,

eritrocitose, trombocitose e fosfatase alcalina elevada. (Brunicardi et al, 2010)

Pacientes com suspeita devem ser avaliados por meio de US ou TAC, reservando a RM

para casos em que não seja possível aplicar a TAC (insuficiência renal, alergia ao contraste ou

rim único) ou permaneçam dúvidas após este exame. Uma massa sólida no rim tem 90% de

hipótese de ser carcinoma de células renais. (Wunsch-Filho, 2002)

Page 33: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

32  

CONCLUSÃO

No comentário a este estágio considero que foi uma experiencia muito positiva, de grande

importância para a minha formação. Foi um mês muito intenso mas, sem dúvida, igualmente

gratificante. Apesar de, previamente, apenas ter passado umas poucas horas num SU sempre tive

interesse por aumentar a minha experiência no âmbito da medicina de urgência. E,

indubitavelmente, consegui esse propósito em São Paulo. No fim, ficou a sensação que gostaria

de passar mais tempo lá, a variedade de situações passíveis de se encontrar num serviço como

este fazem com que o tempo seja escasso para absorver tudo.

Senti que, apesar de nos serem transmitidos os ensinamentos necessários sobre cirurgia

clínica, no que se refere a procedimentos os alunos da UNIFESP têm uma preparação muito mais

completa. Apesar de entender o modelo de ensino português, que visa formar clínicos gerais,

para um aluno que sinta interesse pelas áreas cirúrgicas esta curiosidade não é estimulada. Penso

que este foi um dos meus erros, se me tivesse preparado melhor em termos teóricos sobre

procedimentos sentiria maior à vontade na hora de realizar os procedimentos e teria solicitado

mais essas oportunidades. O grau de exigência imposto aos alunos da UNIFESP, nomeadamente

a excessiva carga horária, faz com que parte deles se sinta em constante competição. Por

algumas vezes os alunos questionaram a legitimidade da minha presença no PS, sendo todos os

casos passíveis de serem atendidos por internos feitos prioritariamente por eles, restando-me as

fases em que eles não estavam presentes para ter oportunidade de praticar, sendo este um

importante factor limitante no âmbito deste estágio.

Tinha considerado de grande interesse a permanência na sala de trauma, até porque os

acidentes e a violência influenciam marcadamente a saúde dos brasileiros, no entanto tal não foi

possível porque no mesmo período em que eu estava nas urgências também se encontravam lá

alunos do 6º ano que tinham prioridade sobre mim, em particular, num espaço de trabalho tão

restrito onde várias pessoas podem condicionar o trabalho dos profissionais.

Apesar das dificuldades encontradas, este estágio proporcionou-me a oportunidade de

participar de uma forma mais activa na execução de procedimentos cirúrgicos no âmbito do

serviço de urgência e até mesmo uma participação como instrumentista numa cirurgia para

tratamento de hérnia inguinal que, pela proximidade do campo cirúrgico e função, me

possibilitou uma maior compreensão das diferentes fases de uma cirurgia.

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Um dos objectivos deste trabalho foi a confrontação dos cenários de saúde português e

brasileiro. Apesar de esperar uma maior discrepância entre as patologias de cada país, constatei

que as principais causas de procura de cuidados cirúrgicos não diferem muito.

No entanto, o propósito de contactar mais com a rotina de um cirurgião foi alcançado e

percebi que a cirurgia é uma área muito diversa, por vezes frustrante, muito objectiva e exigente,

mas que desperta em mim um fascínio e uma curiosidade muito grandes.

Page 35: Cuidados Cirúrgicos num Hospital da América do Sul

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Anexo 1 ‐ Declaração de permanência no serviço de Cirurgia do Hospital São Paulo