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6 COMO DIZER O INDIZÍVEL? Daniel Soares Lins o insizível Ajouter n'est pas ici autre chose que donner à lire. (J. Derrida, Introdução a La pharmacie de Platon) Eu não me considero um filósofo ou um pensador, muito menos um sociólogo. Meu desejo é um desejo de escrita. (A. Khatibi, em. Pro-Culture 12, 1986, p. 10) Travailler, c'est entreprendre de penser autre chose que ce qu'on pensait avant. (Michel Foucault3 Meu objetivo principal é ajuntar, quer dizer, acrescentar uma xäo ao tema da Diferença, situando-a não como "Direito à rença", mas tentando mergulhar, embora de forma sucinta e 69

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filosofia, linguagem, cultura, deleuze.

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  • 6COMO DIZER O INDIZVEL?

    Daniel Soares Lins

    o insizvel

    Ajouter n'est pas ici autre chose que donner lire.

    (J. Derrida, Introduo a La pharmacie dePlaton)

    Eu no me considero um filsofo ou umpensador, muito

    menos um socilogo. Meu desejo umdesejo de escrita.

    (A. Khatibi, em. Pro-Culture 12, 1986, p. 10)

    Travailler, c'est entreprendre de penser autrechose que

    ce qu'on pensait avant. (Michel Foucault3

    Meu objetivo principal ajuntar, quer dizer,acrescentar uma

    xo ao tema da Diferena, situando-a nocomo "Direito

    rena", mas tentando mergulhar, embora deforma sucinta e

    69

  • Khatibi, rnaneira de Foucault, parte da anlise multipolarizada

    embrionria, no pensar a Diferena no interior do pensamento da das temporalidades como instrumento para interrogar ao mesmo

    Diferena, do Intratvel. Ajuntar guarda aqui sua significao tempo "a diferena que nos mantm distncia de um pensamentooriginria presente na raiz etimolgica do grego symballem - no qual reconhecemos a origem do nosso, e a proximidade que

    reunir, juntar, acrescentar. permanece, apesar desse afastamento, e que aprofundamos sem

    Tema de grande atualidade, a Diferena ou o "Direito cessar". Khatibipretende escrutar "a dialtica sempre recomeada do

    Diferena" emerge, muitas vezes, sob o signo da desconfiana ou, Mesmo e do Outro"(Foucault 1961, p. 631; 1984, p. 35).

    de forma radical, da descompostura. As referncias de Khatibi, veremos, so habitadas por uma

    Meu esforo maior consistir em acrescentar ao exercicio de estranheza que radicalizaa posio do leitor eo obriga a uma

    repensar a Diferena uma escrita desejante que passa pela vontade "ascese hermenutica":

    de apontar um pensamento-outro, forjado no exerccio de "des-

    construo", em um pensamento-plural que no reduz os outros - Em relao aos filsofos que ele cita(poucos, diga-se de

    (sociedade e indivduo) esfera de sua auto-suficincia. Trata-se, passagem, apenasalguns eminentes filsofos muulmanos como

    de fato, de propor uma "visita guiada" ao interior da Diferena.Ghazali e Ibn Khaldoun, e outros grandes pensadores contem-

    . . porneos --- de Heidegger aDeleuze passando por Nietzsche,

    Diferena qual o "Diferente" est subordinado ou determinado Freud, Foucault e Derrida), Khatibi faz referncia ao nome

    no seu exterior como forma de pensar o Fora que o funda. dessespensadores como "substituto" da "verdade". (Benabdelali

    Ao revisitar a Diferena e, se possvel, ao revitaliz-la, acres-1987, p. 82)

    centando aos paradigmas da Diferena uma diversidade do Dentro

    e do Fora, proponho, embora em filigrana, ao pensamento-outroVerdade que soa quase sempre na obra de Khatibi como um

    uma outra margem, um pensamento-outro "que fala em lnguas,"jogo de verdades" - numa abordagem, aqui tambm, foucaultiana.

    pondo-se escuta de toda palavra de onde quer que ela venha".Jogos "entre o verdadeiro eo falso, atravsdos quais o ser se constituihistoricamente como experiencia, isto , como podendo e devendo

    Trs autores fundamentais vo alicerar minhas reflexes: ser pensado (...) numa 'histria da verdade' que consiste em 'analisar

    Abdelkebir Khatibi,1 Victor Segalen e J. de Gaultier. Dialogaremos ' no os comportamentos nem as idias, no as sociedades nem suas

    numa relao vertical, com Christine Buci-Glucksmann, Jacques ideologias, mas as problematizaes pelas quais o ser se d como algo

    Hassoun, Marc Gontard, Abdesslam Benabdelali, e outros pensa- que pode ser pensado e as prticas com base nasquais essas

    dores que de longe ou de perto influenciaram Abdelkebir Khatibi problematizaes se formam" (Foucault 1984, pp. 13 e 17),

    na construo do pensamento-outro, no pensar o Intratvel, a

    Diferena, o Diverso.Em Khatibi, como em Foucault, uma filosofia da verdade

    acopla-se necessariamente a uma filosofia da liberdade num movi-

    1. Abdelkebir Khatibi, professor do Institut Universitaire de la RechercheScientifique, diretor

    mento binrio, num vaivm que no estratifica os conceitos, mas d

    do programa no Collge Philosophique, redator-chefe do Bulletin conomiqueet Social ao exerccio ou ao "programa" de uma "histria da verdade" uma

    du Maroc. Autor de uma vasta obra, publicou, entre outras: Le roman maghrbin.Maspero autonomia. No se trata de opor o verdadeiro ao falso, pois, maneira

    1969; La mmoire tatoue. Paris: Denol, 1971; La blessure dunom propm. Paris:

    Denol/Lettres nouvelles, 1974; Vomito blanco, le sionisme et la conscience malheureusede Foucault, Khatibi no "designa a verdade do objeto, numa

    Col.10/18.Paris,1974;Lelivredusang.Gallimard,1979;Amourbilingue.Montpellier:Fata descoberta que abole ou apaga o erro. Sabe-se que essas verdades

    Morgana, 1982; Figums de ltranger Paris: Denol, 1987.

    '

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    70

  • mesmo na cincia, no so definitivas. Newton sucede a Descartes, epela qual "o que emerge em Khatibi como verdades prontas e

    Einstein a Newton. A histria das cincias no conta as passagensintroduo de idias deve ser compreendido como um progranr

    sucessivas do erro verdade: ela tem, sobretudo, a forma de umae uma estratgia" (Benabdelali 1987, p. 83).

    cadeia da verdade" (Ewald, Farge e Perrot 1985, p. 11) Khatibi convida-nos a discutir o que chamou, na obraacim-

    No livro Magbreb pluriel, Khatibi fala, no entanto, de suacitada, um pensamento-outro, e a criar uma "nova margem" que

    relao com os pensadores ocidentais nos seguintes termos:no seja "uma margem cega" dependente do "eurocentrismo". Ele

    prope uma ruptura radical, no caso, do "saber rabe" com o Texto

    por isso que, quando dialogamos com os pensamentos ociden- Ocidental. Mas, para Khatibi,esse saber s poder "se livrar de see-

    tais da diferena (o pensamento de Nietzsche, de Heidegger e ' fundamentos teolgicos e teocrticos graas a uma ruptura radicoentre nossos contemporneos prximos, o de Maurice Blanchot

    e de Jacques Derrida), levamos em considerao no apenas seuque s poder acontecer como saber duplo" (ibid., p. 84).

    estilo de pensamento como tambm sua estratgia e sua maqui-

    naria de guerra. (Khatibi 1983a, p. 20)O autor privilegia a idia de que a "ruptura radical" s ser vive

    como saber bilnge e no com base em um isolamento, de um luga-

    "Maquinaria de guerra", conceito deleuziano que Khatibi usa margem da eDisteme ocidental ou de um exlio interior de um-

    sem aspas, integrando-o sua escrita, mais do que a seu pensa-cultura do Impensado. Assim, diz o autor, poder-se- "opor episteme

    mento. Era como se o contato com o pensamento-outro de Deleuzeocidental seu Fora impensado, radicalizando ao mesmo tempo -

    significasse, igualmente, um encontro com o corpo deleuziano damargem, no s em um pensamento rabe, mas em um pensamente-

    escrita, numa relao nmade que o faz trabalhar no com osoutro que fala em lnguas, pondo-se escuta de toda palavra de once

    conceitos do pensador, mas com os sonhos inscritos no corao daquer que venha (...)". Esse pensamento-outro, esse ainda inumerve .

    escrita daquele que a engendra. No caso, Gilles Deleuze, o arteso, talvez uma promessa, o signo de um devir em um mundo .

    juntamente com Felix Guattari, da escrita do desejo: "Desejo-deser_transformar. Tarefa sem fim, evidentemente. Mas, no pensamento, nc

    to que rene as entidades heterogneas. (...) Cada entidade existe milagre, s existem rupturas (Khatibi 1983, pp. 6143).

    mltipla, ao mesmo tempo que est em relao com diversas outras No se deve interpretar essa "promessa" como um apelo-

    entidades" (Deleuze 1993, p. 150) criao de uma "nova filosofia", mas como uma no-filosofla, "lem-

    brandnos das diferentes transformaes que a filosofia conhecesDo Esquizo e as linguas (Wolfson 1964) produo de quando de sua formao, com e aps Hegel" (Benabdelali 1987, p. 8e

    linhas de fuga", nas pegadas das quais as "palavras" e a linguagem

    "deixam de ser representativas para se aproximar de seus extremos Ou ainda, comopensa Foucault, quando a filosofia "no tinir.

    ou de seus limites", encontramos o "estar na sua lngua como um de continuar o edifcio deabstrao (e quando) ela devia sempre fica-

    estrangeiro", levando "lentamente, progressivamente, a lngua para distncia, romper com asgeneralizaesadquiridas e se remeter ac

    o deserto" (Deleuze e Guattari 1975, p. 48; Bensmaa 1987, p. 136). contato da no-filosofia;ela deveria se aproximar, o mais perto, nc

    do que a acaba, mas do que a precede, do que no foi ainda acordade

    Pensar a diversidade do Dentro e do Fora significa, para sua inquietao" (Foucault 1984, pp. 77-78).Khatibi, pensamento-outro, pensamento da Diferena (pense-au-

    tre, pense de la Diffrence). Ele prope considerar, de fato, aKhatibi, por sua vez, como que se "protegendo" da ilusc

    filosofia como uma "estratgia" e como um "programa". a razomonstica de identidade, fala sobre o Ocidente por meio de um

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  • exerccio de "desconstruo" e de embaralhamento permanentePara Hassoun, o pensamento-outro significa "liberar-se

    das

    dos cdigos:reminiscncias, que dizer do monoltico e do casal de tenses que

    ele representa, reconhecendo-o como presente emnosso discurso

    Esse Ocidente, esse fora (dehors) conquistador, no uma

    totalidade diablica. Ele representa uma cadeia de situaescomo estilhaos (do grego) e como fragmentos (do

    sirio), parte

    hegemnicos socioeconmicas, mediante uma variedade de lu-fecunda do esquecimento. (...) O pensamento-outro no

    nem

    tas de classes, de ideologias em conflito. Em sntese,constatamos pensar para O Outro, nem no Outro na unio

    nausente ou na

    um descentramento de lugares hegemnicos, e nenhumcentro,

    1

    bainamoration. O pensamento-outro poder escrutar, distncia.

    uma tota idade, um sistema perfeito de coero e dedominao.

    Pensar o Ocidente como uma totalidade simplesmenterecon- a reunio, mais do

    que o conglomerado de diferenas" (Hassoun

    duzir a teologia. (Khatibi 1977)1987, pp. 14 e 16).

    Na sua tentativa de pensamento-outro, pensamento da Dife-Todavia, o pensamento-outro, na sua economia do

    Diverso, no

    rena, Khatibi encontra a lngua "no como identidade selvagem',deveria se transformar em uma nova palavra de ordem,

    em um

    ' novo slogan ou em uma retrica publicitria da"ps-modernida-

    mas num duelo e numa situao bilnge "que pensa o outro de",sob pena de elaborar, por sua vez, o mesmo ou o

    indiferen-

    traduzindo-o". Ora, a traduo supe uma profuso de lnguas naciado. At porque "o pensamento-outro no diria

    nunca, no

    mltipla compreenso de uma polissemia infinita que se extasia nopoderia nunca dizer a ltima palavra. Essa fica

    (sempre) por

    .escrever. O pensamento-outro o pensamento".

    Ubid., p. 16)

    Diverso, evitando o lugar da singularidademcludente/excludente

    da Diferena, que pode circular como uma pedra desangue no Escapando tentao messinica ou vontade de verdades

    corpo da poesia ou como um garrote sufocando amultipolaridade acabadas, Khatibi define o pensamento-outro como "essencialmen-

    dos sentidos e do corpo da escrita: te minoritrio,fragmentrio e inacabado. (...) Um pensamento

    ser pensamento-outro um pensamento em unguas,uma mun.

    encontrado nas margens, na distncia e nas questessilenciosas.

    dializao tradutora de cdigos, de sistemas e deconstelaes (...) O pensamento de 'ns

    para o qual nos voltamos no se coloca.

    de signos que circulam no mundo. (Khatibi 1983b,p. 59) j no se desloca no crculo da metafsica

    (ocidental), nem segundo

    a teologia do Isl, porm na sua margem. Umamargem em alerta'

    Uma das mais belas metforas do pensamento-outro, do (Khatibi 19832, p. 17).

    pensamento com lnguas de Khatibi, encontra-se numa sintaxe do

    grito, sintaxe do amor bilnge. Era como se na poticakhatibiana Os conceitos de Diferena,

    de Outro, de Fora harmonizaram-

    a mudana de lngua implicasse uma "mudana de sexo":se no apenas entre si, mas na "desconstruo" do

    "logocentrismo

    ocidental" (Derrida) numa ressurgncia indefinida "doirredutvel

    Um dia - faz pouco tempo -- ele amou uma mulher,ele mudou

    ,,

    no homogneo .de sexo. Um sexo no sexo circunciso, sexo com

    lingua, como

    uma serpente. De seu nus, emergia a figura deum Deus Os mltiplos paradigmas" da Diferena no

    saturaram a

    invisvel. Ele foi ento violado por uma lingua estrangeira.Jogado no cho, ele sofria atrozmente. Mas

    - situao bizarraproblemtica -- ela continua em aberto. Contudo, a questo.

    - ele se encontrava atrs do seu violador, no openetrando por permeada talvez pelo modismo,

    banalizada ao extremo, at ser

    sua vez, porm penetrado pelo gozo da lingua; suahomossexua-

    lidade foi repertoriada no dicionrio do mundo inteiro.(Khatibi

    1982, p. 30)2. Construo lacaniana com base na juno

    dos dois vocbulos bain(e) (dio) e

    (e')namouration (enamoramento).

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  • reduzida ao estado de novidade, gadget, e ao famoso "Direito Empregada em muitos casos como o "falar" da Diferena.

    .

    Diferena", deveria nos motivar a fazer do "Direito Diferena" umgria sofre igualmente os efeitos perversos

    de uma assimilac

    pensamento-outro, o pensamento do Diverso na sua infinita reci-Fruto de um mimetismo ou de um modismo

    de classe? Os homos-

    procidade, na sua intensidade nmade que busca no o sentido,sexuais gregos, a fim de escapar dos castigos da

    ditadura militt

    mas as "conexes", o "acontecimento", numa perspectiva deleuzia-criaram nos anos 60-70, uma "nova lngua", um lxico

    limitado y

    na. O pensamento do Diverso no reconhece nenhum "Fora dogrupo. Os jovens dos guetos de Chicago, como

    as gangues ce

    Texto" (Derrida). Sua vocao ser o contrrio do isolacionismo,adolescentes no Brasil -- essa "inteligncia da rua"

    -- tm tambm.

    da doxa que concorre ao exilio das lnguas e canta as virtudes dealm de seu capital de "virao", um falar

    prprio emergente ce

    um amor, em detrimento de amores. Amores que se comprazemum tribalismo urbano.

    dos encontros polimorfos dos signos, da festa do amor bilnge, etrabalham para a desconstruo do amor isolado, do saber do

    As mudanas, as migraes dos smbolos, ascriaes ce

    confessionrio ou da objetividade de significados, presos, asfixia-novos cdigos de linguagem integram a dinmica

    da giria. Uma se

    dos, tetanizados numa verdade imposta como "ltima palavra".conhecida ou usada revelia, ela corre o risco de

    perder se

    carter secreto, seu lugar de uma possveldissidncia, seu corp

    No se trata, em nenhum caso, de sobrepor o imaginrio do transgressor. O conhecimento eofalar da gria - por uma elite c

    Diverso ao imaginal- quer dizer, ao fenomenal, ao fantstico, ao.

    pela mdia - representam no apenas uma"assimilao" de cur-

    extraordinrio e, finalmente, ao "extico" -, nem tampouco de para baixo, mas uma recuperao, emforma de possesso, de um

    pensar a Diferena com base num simples exerccio semntico-

    capital lingstico ou simblico (Bourdieu), produompar de um

    acoplado a uma escrita narcsica. A reduo da Diferena ao-

    outro s voltas com o significado cristalizadoda Diferena. O q=

    extico, no s no Ocidente, deveria impor uma certa prudncia ' nos leva a pensar que umfalar da Diferena torna-se, muitas veze

    uma vigilncia diante dos efeitos perversos de uma "Apologia da,,

    um falar contra a Diferena. Ou seja, se agria se renova, se a a

    Diferena , com a qual construmos nossas "reservas" de ndios ' dada, constantemente,uma outra roupagem, no s pelo praze

    nossos guetos urbanos, nossos exrcitos de desempregados-

    .

    de mudar, mas pela vontade que tem osujeito de, pelo mence

    pobres, negros, nordestinos, homossexuais, desclassificados, sem-. duranteum lapso de tempo, guardar sua onginalidade.Ao

    exprirr -

    terra, loucos etc. Para esses, um lxico foi elaborado em forma de-

    numa "lngua estrangeira" uma emoo, uma revolta,uma alegr

    gramtica envenenada pela inocncia paranica do falar da gria um modus vivendi, umaclandestinidade, uma cultura outra, a

    como maneira de dizer o indizvel, escrever o dio, confinar o ator pensamento outro, ele fazemergir uma dialtica do Diverso.

    na es era do pensamento prtico, dificultando sua emergncia

    como sujeito autnomo. Se a giria " uma linguagem do dio", dos Onde se situariaento a gria como "linguagem do dio"? En=

    "malfeitores" ou "malandros", o "lxico da gria, pela sua estranhe outros, no uso que osprprios espoliadores fazem da gria. Ess

    za, por sua prpria violncia e, sobretudo, porque o leitor nern espoliadores, cujo capitaleconmico nem sempre conta com

    sempre a compreende, de toda forma um meio radical de respaldo do capitalcultural ou lingstico, ao "falarem popuiar

    separao, de rejeio no limite do dio. A gria produz o emba- encontram na semnticado outro as palavras para dizer o Indiziva

    amento, quase um corte semntico no interior dos enunciados

    que pontua e ritma" (Kristeva 1980, p. 226). 3. CL anteriormente weWacquant. "The Zonel

    76

  • para nomear o Impensvel. Pouco importa que o uso de tal ou tal ria8 pelos grupelhos neonazistas da Alemanha ou de So Paulo, oesteja "superado" por aqueles que a inventaram. O preconceito ."Direito Diferena" ideal generoso engendrado nos anoscristaliza a gria como estigma e sufoca o Diferente na sua prpria

    '.

    criao: "Amlia!" "Baianada!" "Cabea chata!" "Baitola!" "Bichinho!,,tormentosos (aps Maio-68), tornou-se uma apelao em si

    "Breguice!" "Cafona!" "Candango!" Canho!" "Crioulo!" "Jeca!" "Nego!',excludente e, em alguns casos, ambgua, perigosa. Perigosa pois

    "Paraba!" "Perua!" "Pobreto!" "Puta!" "Pau-de-arara!""Mulher-macho! oque se observa a tentao de cristalizar o sujeito da Diferena

    "Rosco!" "Sapato!" "Trombadinha!" "Tribufu!" "Veado!" etc. em umcampo minado pela intolerncia, em nome da defesa de

    uma memria coletiva minoritria, cujo imaginrio alerta-- com

    No se deve, contudo, esquecer que a recuperao da gria, na. ou sem razo

    - contra o perigo de uma "integrao" ou de umarelao piramidal, de alto para baixo, mostra tambm --- alm do gozo .

    od d"assimilao" radical histria majoritria ('dominante") do

    pr uzi o pela nomeao pejorativa do outro, mediante a usurpao .d

    Outro da modernidade. Esse fenmeno acontece no apenase sua inveno lxica -- as diferentes formas de dominao. Domi-

    nao dos signos, da palavra e da poesia. Dominao igualmente dacom grupelhos de extrema-direita, com aclitos de um catolicis-

    emoo e do desejo presentes na sintaxe corporal da gria. Gria quemo integrista e carismtico, ou com uma nfima minoria muul-

    encontra no erotismo, nos sentidos e no sexo da emoo os elementos manasimpatizante do jihad, da "guerra santa", do jihad

    estmturantes de um "falar popular" que passa, necessariamente, pela "expancionista"ou "revolucionrio", mas no seio de repre-

    "mitologia privada" de seus criadores. sentaes sociais asmais diversas.

    Confinar a Diferena numa sintaxe "especial" ou num espao Mark Terkessidis (1995) chama aateno para o fato de que os

    geogrfico -- utopia degenerada - equivale, embora simbolica- tericos da Nova Direita j norecorrem s categorias biologistas

    mente, a "estigmatizar a inanidade de um pensamento da Diferena desacreditadas -- como "raa" --,mas a noes menos comprome-

    que s situaria o outro apenas fora-de-si, em vez de pens-lo, ao tedoras como, por exemplo, a de "cultura".Suas teorias, elaboradas

    mesmo tempo, como 'aquele-sem-o-qual-no-se-poderia-viver', e com base em uma semntica imaginriaprogressiva, recebem uma

    como interior de si mesmo" (Fay 1987, p. 8). outra roupagem, uma sorte dereleitura ou reinterpretao num

    sentido inverso daquilo que enunciado. Terkessidis mostra aindaReivindicado pelas esquerdas, pelos anarco-desejantes .como a categona de diferena, cara aos movimentos de libertao e

    nos anos 70-80, pelas feministas e pelos homossexuais no s minorias, invocada numa defesa do etnopluralismo: "Nenhuma

    Ocidente, aps Maio-68 - sobretudo pelas lsbicas francesas cultura superior a outra; torna-se necessrio, pois, salvaguardar suas

    autodenominadas "Sapates Vermelhos" (Gouines Rouges) - o' diferenas, evitando assim mistur-las.

    "Direito Diferena" foi finalmente recuperado na Frana pelaextrema-direita e pelo integrismo catlico de Dom Lefvre. O Pierre Taquieff, ao analisar o

    que chama ironicamente de "A

    "Direito Diferena" tornou-se igualmente a bandeira, em mui. Fase da Diferena" ou a"Diferena Integrista", conclui:

    tos pases europeus e em alguns estados norte-americanos, do O uso sistemtico da estratgia de "retorso" referente s pala-movimento contra o aborto - Laissez-les-vivre

    -,conhecido vras e aos valores do anti-racismo, cuja ideologia foi fixada sob

    como "Deixe-os viver!". Galvanizado, entre outros, pelos beli- alegao do elogio da diferena,contribuiu para tornar irreco-

    gerantes de diversos campos na guerra da antiga Iugoslvianhecivel e, portanto, inapreensivel o novo racismo da diferena.

    ' (...) A transformao racista do "direito diferena" e da temtica

    78 79

  • etnopluralista representou a primeira realizao ideolgica de coletivo portador de historicidade", ele considerado,sobretudo

    importncia na estratgia e na retorso postas em prtica pelas no ensamento atual de Touraine, como umsujeito individual

    novas direitas" na Frana. (1988, p. 16) procura de sentido.

    Alain Touraine (1994c), por sua vez, chama a ateno contra Jacques Hassoun, numa referncia explcita a Khatibi,afirma

    o perigo de uma defesa exacerbada da "Diferena", da "Memria que no basta apenas clamar o "Direito Diferena", mas com-

    Coletiva" ou da "Identidade", propondo, obsesso da identidade preender, antes de tudo, o que essa expresso, nasua polissemia,

    pela identidade, por exemplo, a sntese entre a pertena eo prope como significao, como separao, como justificao deenraizamento comunitrio. Resta saber se "fazer de sua vida uma uma excludncia ou da gesto de um sistema

    institudo sob os

    narrao" ou "reconhecer o outro como sujeito", como pretende signos de um despotismo esclarecido, ou de umencontro impos-

    Touraine, no seria um discurso "etreo" e "idealista" svel com as diferenas inerentes aoDiverso.

    Digo, s vezes, que deveramos ser um pouco mais judeus, poisos judeus so os que melhor conseguiram ligar o universal da

    No basta dizer "O Direito a Diferena", pois Vorster,na Africa

    razo ao particularismo de uma tradio da famlia. O fato de doSul, conjugava em africner essa mesma

    proposio em todos

    que se tenha tentado destru-los no muda em nada o sucesso ostons e de todas as maneiras. (Hassoun 1987, pp.

    14-16)

    na combinao da interioridade e da exterioridade. (Touraine1994c, p. 56) Khatibi na sua j citada obra,

    Maghreb pluriel, anuncia que

    est na hora de relembrar que um "Direito Diferena, que se

    Para Touraine, a questo da Diferena no deve se limitar contente de sua reivindicao sem pr em questo e semtrabalhar

    demanda ou exigncia de "integrao" do outro, do pensamen- os lugares ativos e reativos de sua insurreio,no constitui uma

    to-outro minoritrio - o estrangeiro, o imigrante, o deficiente transgresso. (...) Se o Ocidente no habita de maneira alguma

    fsico, o "drogado", o transexual etc. -, mas "ao reconhecimento nosso ser ntimo como uma exterioridade absoluta edevastadora,

    do outro" e possibilidade da emergncia do sujeito no outro, na nem como um controle eterno, mas como umaDiferena. um

    altendade, no Diverso, no de Fora aglomerado de diferenas a perguntar como tal atodo pensamento

    uma sociedade democrtica uma sociedade que reconhece oda Diferena, de onde quer que ela venha, ento,

    nesse caso, tudo

    outro no na sua Diferena, mas como sujeito, no seu trabalho deve ser aindapensado".

    para tornar-se um sujeito, quer dizer, para unir o universal aoparticular. Ubid.)

    Acredito que as linguagens da Diferena podem apresentar

    aspectos positivos se empregadas como veculos decomunicao,

    Os dois ltimos livros de Touraine, Critique de la modernit como "jogos de linguagem". Oque vai permitir aos mltiplos -cen-

    (1992) e Qu'est-ce la dmocratie (1994b), reforam a idia de que tros" se falar e seconhecer como se no fossem centros, ou aceitando

    a sociedade produto da ao social. Ou seja, a sociedade no um instante de se"descentrar", num exerccio em que o amor

    concebida como um conjunto de "estruturas e funes", rnas como incondicional pelaDiferena encontra no Diverso o territrio das

    "o produto de ao e de grupos organizados". Em ambas as obras, Diferenas. nesseterritrio que o sujeito dependente do xenon,

    aprofundando o que o autor j havia esboado em Le retour de do mikton, a recusa de semisturar ao "Diferente", com medo de

    l'acteur (1984), observa-se uma inflexibilidade da concepo de nele se perder ou se "sujar",vai encontrar no Outro uma possvel

    "ator social". Pensado durante muito tempo como "um movimento interao ao Mesmo, numatica filosfica bem prxima de Plato:

    80

    81

  • do imaginrio da Diferena para encontrar o Diverso da prpna

    Diferena. Porm, a entrada na modernidade supe a compreensus(...) o Mesmo s se concebe e s pode se definir em relao aoOutro, multiplicidade dos outros. Se o Mesmo permanece voltado do homem como pura

    conscincia o que nos eva a pensar --- com.

    sobre si mesmo, no h pensamento possvel. E acrescente-se: no Touraine - que a modernidade se ope a essa concepo aoafirma.

    h tampouco civilizao. (apud Vernant 1991, p. 34) simultaneamente que "a natureza deve ser compreendida sem rete

    rncia ao sujeito, e que o sujeito no natureza, mas purameneNo se trata, em todo caso, de buscar uma fuso na diferena conscincia. Concretamente, essa dualidade fundamental entre

    nem tampouco uma entrada na psicose, mas pensar diferentemente razo eo sujeito implica separao da vida pblica e da vida privacea diferena, permitindo ao pensamento "se libertar do senso comum"' Voc vive num mundo moderno quando, paralelamente ao seu

    papeempurrando-o, como sugere Foucault, em forma de interrogao-su-

    social, voc tem tambm o direito a seu imaginrio, sua vida sexuposio, a pensar apenas "na fase extrema de sua singularidade. Se'

    a suas prprias opinies. Ningum chamar moderna uma sociedacem vez de procurar o comum na diferena, pensasse diferencialmente niaosta na qual todos se mobilizam numa nica e mesma direca diferena, esta j no seria um carter relativamente geral que . -(Tourame 1994a, p. 35).trabalha a generosidade do conceito, seria - pensamento diferentee pensamento da diferena - um puro acontecimento; e quanto Mas, ao renunciar ao discurso do "Direito Diferena

    repetio, j no seria um triste emaranhado do idntico, mas abre-se mo, simultaneamente, de um lugar que poderia constiturdiferena descoberta" (Foucault 1980, p. 59) de fato, um espao privilegiado. Resta saber, com efeito, quem falo

    toda uma desconstruo - que o contrrio de um De onde fala? Para quemfala? Quem o Diferente de quem?

    paradigma - que se anuncia. Desconstruo que passa necessaria- culto exacerbado daDiferena pode condenar o ator sua histrio

    mente pelo pensamento, pela experimentao do transe, do navegar levando-o a fazer de suaDiferena uma priso, uma fatalidade, um

    nas singularidades habitadas, mltiplas e multiplicadas, numa harmo- destino. Ao "proteger" aDiferena, termina-se, na melhor hiptese

    nia que no consola nem d esperana, mas fortifica a solido por possu-la e, na pior,por se deixar possuir por ela numa

    inaugural provocada pela certeza da finitude, num devir multipolari- identificao crmica,fatalista:

    zado em que diferena e semelhana, fugindo de toda fragmentao,"No escolhi ser deficiente fsico!"

    extasiam-se numa globalizao de palavras, conceitos e desejos. "Ningum nasce homossexual porque quer!""Deus me fez como sou: pobre e negro!"

    "Foi o destino que fez de mim o que eu sou" (Lampio)

    Como tratar o intratvel? Isso me leva a pensar num dilogo, em Gate of India, er

    vejam vocs, eu falo todas as lnguas, mas em ifdiche uBombaim, em 1979, entre um jovem intelectual hindu e um compa-

    Kafkanheiro de viagem francs, canesiano "puro e duro". A fim de guarda-

    o anonimato, cham-los-ei, respectivamente, de Vijay e Jean:

    possvel, ento tratar a Diferena, tratar o Intratvel? Para Jean: Por que voc, to jovem, to belo, fica a se arrastar pelo

    alguns, s existe um mtodo: tratar a Diferena compreend-la i cho?V^e-se que voc no aleijado... E uma promessa? Uma

    como Diverso, inserindo-a, finalmente, na modernidade, isentando-a autopunio?Por que tamanho castigo contra um corpo tao

    82

  • rperfeito? Voc encontra nos ensinamentos da filosofiahindusta sentido empregado por Heidegger. No

    interior do Diverso, vamo

    uma justificao "humana" para seu gesto? encontrar uma rede dediferenas complexas, numa escala social

    Vijay: Por que voc, to jovem, to belo, verdadeiro deus,no anda

    se "arrastando pelo cho"? Meu amigo, existemcoisas que no se

    simblica, binria ou multipolarizada, num vaivmalimentado pe

    podem compreender... A compreenso supe o amor pluralidade, atrao e pela repulso. Essa

    Diferena que, ao mesmo temp

    ao mltiplo... Deve ser dificil para voc, meuamigo, perceber a repele e atrai igualmente da ordem do

    fetiche: "Cor da pele

    minha trajetria, pois seu corao parece pulsar comoum touro na

    .

    arena, procura da palavra para nomear aDiferena... que vai dar

    dos cabelos, forma dos olhos, do nariz, da boca,das orelhas, a

    a voc o espao privilegiado do julgamentocomo condenao, mos, dos

    ps, dos seios, dos ombros, do ventre, dosexo

    isentando-o da culpa... Como voc no compreende...se agarra Fascinante, e tambm repulsiva, conclui julia

    Kristeva. "uma

    ento s varas secas e s razes mofadas de sua cultura,esperando

    o instante para a pronunciao doantema! Quando o esprito

    confrontao expe o sujeito a suas admiraes e a suasabjeo

    (mind) no compreende, voc inventa... dando umnome ao encon- mais

    primitivas" (Kristeva 1984-1985, p. 212).

    tro/desencontro com a perplexidade, salvando a voc mesmo(your-

    self) de seu prprio espanto!Mesmo se, como observa Kristeva, nenhuma teoria

    biolgic

    . modernaconfirmasse a existncia de "diferenas profundas, qum

    Vijay, ator indiano, formado em filosofia em Londres,fre-

    cas, celulares ou outras, entre as naes eas raas", uma questa

    qentou o CollgeInternationalde Philosophie de Paris;estudioso importante subsistiria: "A atrao ou a repulso que so

    na verdac

    do pensamento vdico, tinha feito uma promessa aXiva. Durante

    . de ordem sexual".Isso no quer dizer que s uma educao sexu-

    um ano, para "corrigir minha beleza" e"purificar o olhar guloso

    ,,

    salvar o sujeito do dio e da recusa da Diferena.Todavia. conco

    dos outros sobre mim, sobre meu envelopecorporal , Vijay pro-

    . Kristeva, "seexiste uma salvao, ela dever ser procurada na no:

    meteu andar "se arrastando como um animal". Assim,dizia ele, "eu. obscura dos particularismos,

    em que cada um se defronta, bem

    no exorcizo apenas o olhar do outro sobreminha beleza fsica,

    ,,mal; e isso antes mesmo de encontrar

    seu prximo', de encom

    mas aprendo a experimentar, na carne, o meudevir animal ,,com seus prprios demnios - com seus

    objetos parciais, se

    (Soares Lins 1978-1980). fetiches, suas nuseas,seus ideais tirnicos (ibid.).

    Para Vijay, "se exilar na Diferena 'negativo', pois aidia

    terrorista de Destino (carma) asfixia o sujeito, aniquilando-onuma

    .Diferena, lugar de identidade achatada, espao

    fechado

    mstica niilista". Contudo, diz ele: "Criticar aexperincia, embora tragdia. O "Direito Diferena" integra o discurso

    do senhor

    passageira, de um estgio na Diferena, tolice; acreditardemais . .significaao" falando para o outro-da-dependncia:

    patsoa falan

    na razo Ocidental, razo que, como sabemos,abre-se tanto para

    ,,

    para a empregada domstica, psiquiatradiscursando sobre se

    o Bem quanto para o Mal.- .

    paciente "esquizofrenico". Papa "compreendendo" ohomossexu

    A Diferena em Khatibi deve ser compreendidacomo Diver- mas condenando-o

    como Diferena inominvel; carismtico faze

    so, como alteridade que vai criar mltiploscampos de reciprocida- do do

    Diferente (do drogado que ele "cura" pela palavra deDe

    de, numa possvel vivncia ou em intercmbiosque fazem circular e da morte

    da vontade e do desejo) a escada xamnicaque

    tanto o capital cultural ou lingstico quanto o capitaleconmico, conduzir at Deus,

    no comrcio e na capitalizao do Sagraco

    jurdico ou simblico (Bourdieu 1977, 1980, 1982).Esse Diverso, Proprietrio de

    um jornal exibindo a diferena de classe como

    no qual esto includas mltiplas diferenas,vai possibilitar a direito

    autocensura por convenincia, em tempos de democ--

    descoberta do sendo heideggeriano, mediante o Dasein, oEu no cia"; intelectual

    "sulista", bem intencionado, elogiando o talento e

  • . me um antroplogo japons, em Londres, em 1989. Eles parecemseu colega "nordestino", confmando-o, contudo, segundo a "lgi~ser os exilados da Diferena. Diferena que para eles noca" do "Fora do Texto", na sua Diferena. apenas umimaginrio, no sentido de imaginao ficticia. mas umimaginrio nacional. Ou, como diz Nicole Loraux, um imaginrioNesse contexto, como no pensar, uma vez mais, em Hassoun,da "representao mtica de uma terra que d luz um homem,que afirma que a nica metodologia possvel para tratar a Diferena numa adorao de um logos autctone que perpetua o recome-seria "se curar da Diferena". A Diferena como lugar de excluso e ar do Mesmo". (Loraux 1982, p. 242)

    de negao do Diverso, do nomadismo, poder e tem levado algunsa propor a "cura da Diferena" por meio de uma pedagogia "do Mas o "Direito Diferena" tem sua lgica organizacioreinsulto ou da discriminao, ou ento pela metralhadora ou pela uma hierarquia piramidal. No caso do Japo, o exemplo am .cmara de gs", conclui Hassoun (1987, p. 12). neurose de lugares e de classes de suma importncia. NL.

    Diferente quem quer, nem de qualquer maneira. Existe a DiferenDe fato a ideologia da Diferena pode aprisionar o "Diferen-de dentro, a "boa" Diferena, e a de fora (out), a "m" Diferente" na sua prpria nomeao ou autonomeao - o caso do ,..sem genos - a evitar, a esconder, a negar. A "ma DiferencJapo, onde o racismo e a xenofobia extremos so interpretados . -defmida como identidade e a identidade como destmo, cocorno proteo da "memria social e do nacionalismo". Como fatalidade ou "erro gentico .nao Diferente, os japoneses presos a uma vaga atual de nostalgia

    das origens no devem se misturar ao "Diverso Ocidental", mas Em 1983, os burakumin - japoneses de "baixa casta" -fazer do exlio uma morada:excludos do crescimento, pois Diferentes, sem genealogia, into

    principalmente no seu imaginrio e nos seus sentimentos naciona- veis, vivendo nos guetos, representavam trs milhes, ou sejolistas que os japoneses criam, a respeito deles e sobretudo dos minoria mais importante do Japo. Jean-Franois Sabouret, au:outros, idias racistas. Assim, assistimos h uns 20 anos, um grande de uma valiosa pesquisa sociolgica sobre os burakumin, afirm-trabalho de pesquisa acerca do carter nacional dos japoneses, desua cultura e de suas origens. (Akiyo Yuki 1984, p. 154)

    Assunto tabu por excelncia no Japo, a discriminao dosburakumin nunca constituiu o objeto de uma problemticaEstudos recentes mostram como essa volta s razes temfundamental no seio da antropologia e da histria japonesa. Umaenclausurado cada vez mais os japoneses na sua Diferena: problemtica que obrigaria os especialistas dessas disciplinas arepensar sua prpria cultura em virtude dessa discriminaoOs milhares de artigos consagrados "japonologia" servem antes (Sabouret 1983, p. 93)de tudo para reforar a idia de uma identidade nacional que

    representa no Japo a experincia concreta de um racismo .cotidiano. (...3 necessrio saber que a vida social no Japo Os burakumm, denegados sobretudo por serem descendentorganizada de maneira a excluir os cidados no japoneses. (...) de prias do antigo governo militar do xogum: os eta e os hineParticularidade, complexidade, impenetrabilidade aos estrangei vivem a "diferena" como um castigo, uma condenao. Suros so, com efeito, noes que orgulham sempre o narcisismo .. , comunidade se ocupava de enterrar os mortos e de recuperar anacionalista. No por acaso que muitos japoneses no ficam avontade, ou sentem uma certa repugnncia, diante de um estran- peles dos animais. Antigamente, o budismo e a religio animistgeiro que tem um perfeito domnio da lngua japonesa. (Ibid.) xintosta consideravam-nos impuros por causa de seu contato corrCultivamos nossas diferenas porque temos uma identidade e a morte. "Ainda hoje", conclui Sabouret, "essa mesma oposicuma memria a proteger. Nossa Diferena nossa fora, disse- entre o puro eo impuro justifica sua excluso".

    86 8

  • Desempregados, relegados ao lugar de prias e confinados E eleitoralmente poder mandar na poltica e dominar os postos-nos guetos, os burakumin representam para os japoneses a abje- chave" (Moura 1988, p. 99).o, a sujeira, a vergonha: "Trs milhes de japoneses no podem

    Comentando o que chamou de "a sndrome do medo", ose casar livremente fora de sua comunidade nem podem integrar,socilogo Clvis Moura, conclui:sem problemas, o mundo do trabalho" (ibid., p. 38).

    O mais sintomtico que essa tese racista foi aprovada por esseExclu-los equivale, nesse contexto, a "respeit-los" na sua rgo (GAP) de assessoramento do govemo de So Paulo, na pocaDiferena, deixando-os no seu gulag existencial. Mas por que tanta dirigido pelo govemador Paulo Salim Maluf. A tese de esterilizaorejeio? Porque os burakumin tm a morte no sangue, porque da populao no-branca foi aprovada e cpias do seu texto,entre eles existem muitos idiotas e deficientes fsicos, porque, ao

    distribudas a todos os integrantes dos divemos Gaps. (Ibid.)

    casar com um deles, corre-se o risco de ter um filho anormalEsse modelo pedaggico, engendrado em pleno sculo XX.

    Porque os burakumin e seus ancestrais tinham costumes es eciais ' parece mostrar, por um lado, como a tentao fascista umaformavam um outro mundo, uma outra sociedade, tinham uma realidade, e, por outro, como o imaginrio da "boa origem" continuamoral diferente da maioria dos outros japoneses, responderam os presente no apenas na cabea dos "malucos" ou dos grupelhosjaponeses entrevistados por Sabouret (ibid.) neonazistas, mas no interior de uma burocracia s voltas com c

    As autoridades japonesas, por sua vez, criam leis "de defesas problema da "boa" genealogia, embusca de uma "boa" identidade.

    dos burakumin e, embora confinando-os na sua Diferena, tentam de uma "boa" Diferena. Ora, precisamenteao abordar o problema

    amenizar seu cotidiano e punir as manifestaes racistas quando, da origem que o sujeito vai criar as cadeiasimaginrias de solidane-

    ao ultrapassar os "limites" da excluso, contribuem para a prtica dade em cima de um lutoimpossvel, de um luto radical. -Ah! Se

    de uma cultura de morte da Diferena, a Diferena dos excludos fssemos colonizados pelos holandeses!",murmura uma certa elite

    do "milagre japons"! que lamenta a transmisso "ideal", "justa". Ela continua a sonhar com

    a "boa me" imaginria, com o bom "objeto". Essa mgoa impossvelOutro exemplo de tentao delirante, cujo objetivo era vai se transformar, no sul do Brasil, numa crise histrica, tentativa

    limitar o Diferente em nmero e em representao, e se "purificar", suicida de anulao de si mesmo passando pela recusa do Outro.embora simbolicamente, da Diferena, aconteceu no Brasil, em So considerado ento como o pecado original, a origem de todo "mal'"Paulo. Em 1984, o economista Benedito Pio da Silva, assessor doGAP do Banespa (So Paulo), apresentou um trabalho intitulado: No fundo, ningum

    quer ser "filho da puta"! No. minha

    "O censo no Brasil e no Estado de So Paulo, suas curiosidades e me no transou nemcom os cegos nem com os aleijados; no.

    preocupaes". Entre as vrias propostas, o documento apontou a ela no transou nem com osnegros nem com os ladres.

    necessidade de organizar uma campanha nacional que visasse "ao passageiros imaginrios das naus portuguesas, vagandodurante

    controle de natalidade dos negros, mulatos, cafuzos, mamelucos e meses nas guas turvas de um oceano enfurecido! No, ela no

    ndios". O argumento essencial consistiu em alertar para o fato de se entregou ao coito; no se deleitou com os sexos afiados dosque "se mantida a atual tendncia de crescimento populacional", marginais, aventureiros em busca de uma nova ptria! E concluino ano 2000, "a populao parda e negra ser da ordem de 60% na sua dor, a elite pobre em capital cultural: se ela transou com(do total de brasileiros), por conseguinte, muito superior branca. a horda selvagem... ela no gozou! Saber que a me transou com

    88 89

  • a "escria" dos navios portugueses machuca, dilui oamor-pr- encontrada em si mesmo uma vez curado

    do xnos e como a deusa

    prio, mas pode, at certo ponto, ser compreendido pelosujeito Artemis, da Grcia antiga, "convertido"

    ao belo e cultura, almejando

    obcecado pelo imaginrio da "boa transmisso". Mas, ao pensar odevir de um ser civilizado, algum que

    "ao contrrio do brbaro,

    que a me no s se entregou, no mar e na terra, aocomrcio do selvagem, reserva um

    lugar para o que no ele mesmo, para o

    do sexo com os "marginais" ou escravos, mas quegostou de xnos", para a

    alteridade, num desejo de entrada nacivilizao,

    transar e gozar, abre uma ferida profunda e leva o sujeito a umacompreendida aqui como uma "atitude espiritual

    que no tem valor

    impotncia marcada por um transbordamento perverso, atoda apenas moral e

    poltico, mas propriamenteintelectual, e que se

    prova. Esse romance de uma transmisso sem genealogia, dechama tolerncia" (Vernant, op. cit., p.

    35).

    uma "mancha" original - calcado na nau dos"desesperados" ou O aspecto xenofbico da

    psicologia do skinhead "sulista"

    "degenerados", apesar de j no contar hoje com o respaldo da afoga-se nacontradio triunfante de um desejo e de

    uma aspira-

    histria - persegue, desde sua origem, o ideal identitrio do omimtica-patolgica que vai desencadear numa

    adorao e

    brasileiro, provocando, em certos casos, efeitosperversos e numa crise sem limites do ideal

    xenmano. O skinhead, nariz

    atitudes que beiram a melancolia travestida de delrio-achatado, lbios de guerreiro, cabelos

    crespos, "quase louro",

    olhos claros, vomita, do fundo de sua alma,o xtase do impossvel:

    Um exemplo dessa perverso se encontra nas cartasdiscri-

    ,,,

    "Ns somos descendentes doseuropeus.

    minatrias enviadas a Erundina, contra o nordestino, epublicadas,

    entre outras, pela revista Veja no ms de janeiro de1992. Acres- Ele no se diz apenas

    "descendente", ele "pensa" ser real-

    cente-se a isso a recrudescncia de grupelhos neonazistas eracistas mente descendente. De fato, nesse

    contexto, dizer "eu penso"

    do estilo dos skinbeads, dos "Carecas"- ciso do Skinhead/White supe o ser "cortado", o eu

    "dividido" (Laing); ora, eu "penso" seria

    Power-, cujo discurso : "Temos orgulho de ser brancos, descen- o eu do desejoimpossibilitado de anunciar sua prpria humanida-

    dentes de europeus e no devemos abrir mo disso".Concluso: "O de. Ou seja, a incapacidade de

    contemplar o belo alm do que o

    migrante nordestino/nortista s atrasa nosso lado- fora nordesti- olho v, alm da tirania das

    aparncias, da redundncia vazia que

    nos! Estas terras so nossas!!!"naata no ovo os encontros das

    caravanas, as trocas de saberes, os

    Esse grito de dio representa tambm umademanda de

    nuxos inominveis, amorosos, nosdesertos imaginrios ou reais.

    reconhecimento. No se pode deixar de ver nesse vmito exttico-

    ' Um outro exemplo atesta apossibilidade de fazer da Diferena

    nessa radical nostalgia, nessa extenuante tristeza, a dennciade um

    -

    no mais uma apostasia ou um crime,mas uma filosofia, uma ddiva

    fracasso social ou da falncia de instituies nas quaisacreditavam e de si mesmo. Ou seja, no campo

    da Diferena, os conflitos de classe

    pensavam ser por elas representados e defendidos na suavontade de

    .perduram, as intensidades circulam, elas

    so organizadas sob o signo

    reparao. Uma melancolia em forma de nusea ou de lutoemerge -do social, da distino e da

    neurose de lugares. A ideologia da boa

    do dio assim exteriorizado. Luto de um centroimpossvel, de uma

    . .Diferena absolve porm o ator da

    Diferena. o caso do "Direito

    nostalgia de uma identidade perdida. Nostalgia que spoder ser Diferena", por exemplo, de mulheres que

    "optaram" pela virgindade

    - religiosas ou leigas - e tornaram-secastas e puras, escolhendo o

    4, Editorial do jornal neonazista Raa ePtria, n 1,maio/junho de 1989, apreendido pela Pai eo Esposo Sagrado

    em um casamento mstico comDeus. Essa

    Polcia Federal.Diferena, como a dos padres, integra a

    "boa" Diferena do convento,

    90

    91

  • lsituada alm das classes sociais, alm do estigma, do julgamento. Essa eu Mdico vos falo";"Prostituta, eu Juiz, eu Padre, eu Policial vos falo"

    Diferena , na sua grandeza, na gesta do sacrificio e da imolao, -, o sujeito do Diversofratura essa barreira social e emocional,

    inominvel! Mesmo quando afogada numa crise violenta, como na triturando a camisa-de-foraconceitual qual tinha sido condenado.

    viagem mstica de Santa Teresa de Lisieux, e que a mulher escolhe Ao investir em outrospontos de fuga, ele cria outros imaginrios e

    como noivo e esposo Jesus, e opta por uma sexualidade da Diferena, torna-se, pela foradas coisas, um dissidente da nomeao do Texto.

    numa relao crepuscular entre o martrio eo esfacelamento do corpo Ele busca a alteridade,o Diverso num "encontro marcado", que

    masoquista, essa Diferena do Divino exclui o olhar que v, dando significa- em grego - tanto o encontro amoroso quanto o encontro

    s fantasias e aos fantasmas o selo da graa, numa compreenso sem entre combatentes,gladiadores.

    explicao, sem condenao, "neutra". O conceito do Diverso no deveria favorecer o discursoda

    O "Direito Diferena" dos grandes msticos foi louvado e informao como doxa- da intimao, da delao ou do estigma

    santificado pelo imaginrio catlico: Teresa de Lisieux, ao observar, _-, mas da comunicao, donomadismo, das trocas simblicas. Ou

    quando de suas menstruaes, o fio vermelho de sangue que seja, de um possvel conhecimentoque no signifique uma fuso

    escapava de seu corpo, fazia uma analogia com o Divino, com o dos logos, mas uma distncia- que nunca significa supresso -

    sangue das chagas de seu esposo Jesus, e acordava "a paixo da "distino" inerente neurosede classes.

    sdica da mulher enfermeira, da eterna cuidadora, atrada peloodor de sangue quente" (Reich 1972, p. 147; Mabille 1975, p. 53). Diverso,

    espao de identificao multipolarizada, abre as

    portas da percepo e festeja o encontro com o outro, numfluxo

    Do outro lado da barreira, Eleonor Marx escreve em 1887 una e refluxo de criatividade e de espanto, em que aquele quefala

    panfleto feminista contra a sublimao sexual, o misticismo, a casti poder se encontrar na resposta do outro. O outro do desejo,o

    dade e a Diferena impossvel: a "m" Diferena a ser combatida' outro como exclamao ou campo potico.

    renegada: "(...) Afirmamos maioria socialista que a castidade algo

    sagrado, porm malso. Consideramos a castidade um crime." Sabemos, contudo, quepensar-outro no significa nem im-

    Mas a ideologia, ao tentar demarcar o excludo na suaplica "pensar para o outro", "pensar no outro" ou "pensar

    com o

    Diferena, no elimina, contudo, a capacidade dele -- mimetismooutro". No se trata da repetio da culpabilidade crist,

    mesmo

    ou necessidade de sobrevivncia? - de tornar-se, por sua vez,porque ningum matou o Cristo. A morte do Cristo tambm

    uma

    excludente: o excluido tambm exclui, ele se auto-exclui. Tem-seinveno imaginria, da sua fora na desorganizao dos

    senti-

    o exemplo de pobres que discriminam os negros pobres; pode-sementos e na fixao da dvida eterna a outrem. No, no se

    trata

    dizer o mesmo de alguns homossexuais pobres, mas brancos, emde "fazer justia ao outro", "ser justo com o outro",

    em nome do

    relao ao homossexual negro porm pobre. Quem o excludoPai e pelo amor ao Pai, nem da ideologia do resgate

    presente no

    de quem? Quem o judeu de quem? Quem o negro de quem?discurso atual de uma elite intelectual brasileira. Na realidade,

    a

    Quem o Diferente de quem?sociedade s pode existir ao criar a significao eo sentido. Ora o

    "fazer justia" eo "resgatar" do s elites o papel de Salvador. Algo

    Enquanto ao falar (denunciar?) a Diferena, o "senhor da a salvar, algum a ajudar- "salvar" ou "ajudar" incluem uma

    sigmficao", em seu papel do Outro, do Absoluto, no sentido budista semntica crstica- equivale ao mesmo tempo negao ao outro

    do termo, encontra-se a prion no lugar privilegiado - "Toxicmano, do estatuto de maioridade e,em conseqncia, cristalizao da

    9293

  • heteronomia acoplada Diferena como sina ou destino - divino Hassoun. Ambos participaram ativamente do colquio sobre Kha-

    ou social. Essa transformao do Diverso potencial em Diferena tibi intitulado "Pense de la diffrence intraitable", organizado, em

    instituda, condensa o ator na sua menoridade, impedindo-o o 11 e 12 de maio de 1985, na Maison de la Culture et del'Universite

    acesso ao pensamento, linguagem e ao desejo de significao, ao de Sciences Sociales de Grenoble, Frana.

    mesmo tempo em que instaura o "Direito Diferena" em detri-

    mento do engendramento e da gesto do Diverso.Se de fato "esquecer no um crime", resta saber: Esquecer

    o qu? Quem fala? Para quem se fala? De quem se fala?Quem deve

    A Diferena fixa o ator na sua Diferena: Eurico Dutra e a esquecer?Escola Preparatria de Cadetes de So Paulo, Benedito Pio da Silva

    e sua metodologia letal proposta como "tratamento" Diferena.Jacques Hassoun:

    Paulo Francis e seu dio visceral contra si, contra o outro, contra Esquecer no um crime. Seria mesmo a condio paraque um

    o nordestino, a mulher, o Diverso. Essa pedagogia da Diferena, pensamento outro,portador de diferenas (ser que a diferena

    antes de ser nomeada, foi porm pensada, analisada." Nesseexiste?), pudesse encontrar seu espao. A memria, naquilo

    que

    re resenta de venervel, nasce do silncio e dano-escrita da

    sentido, nunca demais afirinar o sentido do outro. O sentido, ou histria. A memria que nos embaraa, orientais eocidentais,

    seja, a significao do imaginrio social em um mundo que se a das suspenses, dasrecusas, da falsificao da histria. Os

    mantm unido, maneira da unidade dos astros, em relao vida,exilados, os bilnges, todos os que escolhem no poder

    ainda

    se autorizar a escrever na margem esto atufados nasreminis-

    existncia. Uma vida na qual o representado do sujeito que cncias, porque algo, na sua histria, em sua cultura foi-lhes

    emerge possa ser positivo e, ao mesmo tempo, tencionado pelo ser furtado. Resta-lhes a memria,fundadora no de mitos, mas de

    hurnano. E isso que vai dar ao sendo do ser (Heidegger) o sentidomitologias. O esquecimento como o recalcado de Freud, uma

    e a significaao, mesmo porque nao se pode falar de sentido semparte traumtica, uma outra faz trabalhar. Sem esse trabalho,

    no teremos acesso ao estatuto de sujeito. Foi nessesentido que

    supor ao rnesmo tempo que a sociedade s poder se instituir ou quis dizer: esquecer no um crime. Ocrime, ao contrrio,

    instituir sua ontologia prpria - "seu sentido" - por meio do quando voc jogado ao lado da memria para que a histria

    magma das instituies imaRinrias (Castoriadis 1982).no seja escrita, para que acontea uma sncope da

    histria.

    (Hassoun 1987, p. 165)

    Christine Buci-Glucksmann:

    "Esquecer no um crime " (Hassoun) Amemria tal qual critica Nietzsche instituiu-se sob o modelo da

    culpabilidade, o que faz com que no se possa esquecer. Ele

    mostra que existe um esquecimento ativo que permitesair da

    Sobre esse tema ultra-sensvel - "esquecer no um crime"culpabilidade e se abrir para a afirmao da Diferena como

    , gostaria de propor para reflexo os pontos de vista de umapositiva. o esquecimento ativo se probe um questionamento da

    .origem. Isso tambm capital, tanto para a escrita quanto

    para

    filsofa, Christine Buci-Glucksmann, e de um psicanalista, Jacques a histria. "Ser queperguntamos a uma apario a origem de

    seu brilho?" (Glucksmann 1987, p. 166)

    5. "Durante o Estado Novo vigorou uma norma discriminatria na Escola Preparatria de

    Cadetes de Sao Paulo, quando se proibia a entrada de negros, mulatos, judeus e filhos 6. Uma pane dessa discussofoi transcrita com base em gravaes ou notas pessoais. C

    de operrios. A norma foi baixada pelo ento ministro da Guerra. Eurico Gaspar Dutra" texto completo docolguio foi publicado pela editora Harmattan, Paris, em 1985, a

    (Aloura, op. cit., p. 98) referncias reenviam ao textoeditado.

    949

  • A preocupao maior de Glucksmann escapar da armadi- na androginia", numa alegria, numa embriaguez do esprito, numalha que consiste em reivindicar a "identidade a qualquer preo". "aventura que exigia ser vivida sem nenhuma reserva. Ele erravaTrata-se de evitar na discusso sobre a memria, o esquecimento de pas em pas, de corpo em corpo, de lngua em lngua...e a Diferena, a defesa radical de uma "lgica identitria" que (Khatibi 1983b, p. 30).valoriza a Diferena pela Diferena. Para Glucksmann, "uma rea Hassoun:propriao sem fim da histria, de dores, de lnguas e de identida-des negadas, pode levar a uma nova excluso integrista e religiosa

    Como conceber um pensamento que no seja outro? (...) Lacan,do Outro" (ibid., p. 20) em Unstant de la lettre dans l'inconscient, lembrou que falar desi no coincide em nada com aquele que fala, da mesma formaGlucksmann convoca o leitor ao espao do "duplo" como que a imagem no a pessoa que se olha no espelho. isso,

    negao ativa, "esquecimento ativo": por sinal, que distingue o Eu do sujeito. Falar o ser acreditandonuma coincidncia entre o sujeito eo ser funda algumas certe-

    Se o duplo - a lngua, a dupla cultura - nos coloca numa zas, mas essas revelam to-somente miragens do amor prprio.(...) Ao falar h pouco, referi-me imagem que Lacan prope doDiferena intratvel e sem retorno, ele deixa aberta a possibilidade esquecimento, ou seja: um homem que segue um animal por sua

    desse "saber rfo" do Lutador de classe maneira taoista: marca numa praia eo acossa. Ao mesmo tempo que avana, ohomem apaga suas pegadas a fim de no ser, por sua vez,

    Peux-tu te retourner seguido. No existe nenhum rastro, mas a vida passou por aqui.contre tes propres mirages O significante consiste, para Lacan, no apagamento do rastro. Otout le monde chrit l'identit par esquecimento/memria funciona em permanncia no sujeitotout le monde cherche 1 origine eo escrito da Histria vem escrever o que se representa comoet moi j'enseigne le savoir orphelin (Khatibi 1976, p. 14)' trama para os povos. (Hansoun, op.cit., p. 166)

    O duplo como pensamento oblquo, como "esquecimento Perdura, todavia, a questo das questes. Quem a mulher?ativo" (Nietzsche) desconstri as oposies metafisicas pelo simpli- Quem o homem? Quem o Diferente? Quem o estrangeiro?cismo que rege o mesmo eo outro, o universal eo particular, o Quem o "nordestino" de quem? Quem o "negro" de quem?masculino eo feminino. Pois, na distncia do que Roland BarthesbQuem o "perverso" de quem? Quem o "po re" de quem? Ochamava sentido bvio (querido, codificado) e sentido obtuso

    hhomem um estrangeiro para o prprio omem?(aberto ao infinito da linguagem), surge ' o dialoguismo"... ummodo de construo do outro (ibid., p. 20).

    Como uma mulher e um homem erguidos face a face na nudez de. seus corpos, sem a miragem do amor, na crueza da repugnncia eOu, como diz Khatibi na sua escrita da paixo do entre

    do desejo, na distrao de suas contrariedades recprocas e incomu-dois,"o bilingismo pode "traduzir o impuro no puro, a prostituio nicveis, cada um se tomando pelo outro por um lapso de tempo,para retornar infalivelmente a sua prpria sede de gratificao e depoder. Quem o homem, quem a mulher? Quem o estrangeiro

    7. Podes te voltar/contra tuas prprias miragens?/todo mundo louva a identidade/todo de quem? (Kristeva 1984-1985, pp. 212-213)mundo busca a origem/e eu, eu ensino o saber rfo.8. O "entre-dois", ou o que Khatibi chamou bilangue, no pode ser analisado de maneira

    puramente estatistica. Como disse Derrida, o "entre" essencialmente plural, plurali- Homem? mulher? Muthna - que significa em rabe efemi-zante e disseminador, disseminando a si mesmo PLa double sance". In: La dissmi-nation, 1967, p. 251). nado, hermafrodita, andrgino? Essas interrogaes, aparentemen-

  • te histricas, Khatibi prefere dilu-las numa escrita quente e fria,coisas e assim que somos revelados a ns mesmos na nossa

    desejante e mstica. Na sua obra Le livre du sang, ele faz deipseidade, na nossa identidade prpria, singularizada, nica" (Heideg-

    Muthna, personagem feminina, o elemento que acorda as paixes,ger 1987, p. 197).

    desorganiza e desestrutura os cdigos fazendo do incesto, por Diverso/Diferena, diferenas constituem pois oproblema

    exemplo, do arnor ao duplo e do "mal esttico", um Eros mstico fundamental do ser. toda a questo dosendo e da alteridade.

    construtor de uma escrita carnal e divina trespassada pelo sexo antes de tudo pela alteridade que se revela o sendointramundanc

    como beleza e pela emoo do sexo como orao. que Heidegger define como"presente-subsistindo". A Diferena

    com efeito, o que "torna possvel a descoberta do sendo peleQuern o homem? Quern a mulher? Quem Muthna? Num . .Dasein (o Eu no sentido heideggeriano do termo) (...) Essa dife

    estilo que beira a tragdia mstica, alimentado pelo xtase da rena permite o conhecimento e constitui o que a ontologi:beleza de urna escritura construda com base no amor bilngue e .. nomeia transcendncia do Dasein" (Gontard 1987, p. 73).numa composio escrita com lgrimas, esperma e sangue, Khatibi

    exulta e suas palavras queimam as ltimas esperanas de encon- A Diferena, diramos,permite no apenas "a descoberta do

    trarmos uma verdade concluda: sendo", mas esse "saparece ao sujeito sob a forma de Diverso

    A concepo do sendo levou Segalen, corno veremos ulteriormen-

    Ah! Se eu pudesse subitamente despejar sobre ti todo o esperma,te, a aderir s teorias da descontinuidade: "O Diverso, pelo qual se

    todos os suores e todo teu sangue que me inundam desde o meumanifesta o sendo, no outro seno o descontnuo que

    nascimento; se eu pudesse aliviar um instante a exacerbao de caracteriza" (ibid.).meus nervos avivados, de meu pnis erguido no vazio e na

    toro de meu corpo (...) E tu, filha de pedra e de algas, O Diverso seria uma forma de Diferena positiva,uma

    levanta-te de minha cama, levanta-te! Quase ca desmaiado sobre Diferena que j no estivesse encapuzada pelo peso da histriateu corpo adormecido. Sou eu um homem? Sou eu uma mulher?

    Sou eu uma pedra? S a Esfinge responder e a palavra reveladaou da memria. A Diferena positiva corresponderia assim ac

    atingir meu rosto - como um murro. (1979, pp. 63, 162-163) Diverso nietzschiano, um Diverso no maiscondenado a recordar.

    a lembrar ou a no mais esquecer. Fazemos referncia aqui =

    Em um texto intitulado "O que devo a Khatibi", Roland BarthesGenealogia da moral, em que Nietzsche mostrou como a atrocida-

    escreveu: "De repente, porque ele desloca as formas tais quais eu asde da memria o castigo que o homem fez sofrer a si mesmo.

    vejo, porque ele me leva para longe de mim, para seu territrio (...)Ou seja, se a memria funda a identidade eo esquecimente

    Khatibi me ensina algo de novo, abala meu saber... Pois o que ele"permite" a alteridade, os dois se fundem mutuamente.

    prope, paradoxalmente, reencontrar ao mesmo tempo a identida-

    de e a diferena (apud Khatibi 1979, contracapa do livro).. , Exotismo como estratificao da Diferena

    guisa de concluso deste tpico, diria que o Diverso e

    to-somente a outra face da identidade do Outro. Pouco importa a

    forma dessa busca, de qualquer maneira, o Diverso contribui para oExtico: "Que no indgena; estrangeiro. Esquisito, excn-

    conhecimento do Eu. Ns nos encontramos, escreve Heidegger,trico, esdrxulo, extravagante. Malfeito, desajeitado" (Novo Dicio-

    "antes de tudo e cotidianamente, a maior parte das vezes, a partir dasnrio Aurlio).

    90

  • Contaminados pela ideologia colonial, pela semntica turs- anormais", influenciado por Gobineau e pelopositivismo francs

    tica ou pela tentao discursiva de uma socioantropologia etnocn- do sculo XIX, na falta de uma autonomiade pensamento. engen-

    trica, o substantivo exotismo apresenta trs significados dra um estilo literrio compulsivo que d ao discurso umcorpo e

    primordiais: uma carne histricas, fazendo respirar cada palavra eoutorgando

    ao vocbulo, embora sem nome4o, o selo daDiferena. A

    compromisso Diferena compreendida por NinaRodrigues, embora implicita-

    perigo mente, como "sintoma", fecha asportas reciprocidade do Diver-

    equvoco so. Considerando-a"anormal" -- algo que deve ser, no melhor dos

    casos, "cientificamente" compreendido ou, na pior dashipteses.

    Em seu "Essai sur l'exotisme" (1978), Victor Segalen prope afastado e"tratado" como uma patologia --, a Diferena conde-

    retomar o sentido etimolgico do prefixo exo "purificando-o" de nada a uma economiade abjeo. Ao contrrio de Euclides da

    suas "inmeras prostituies". Cunha, NinaRodrigues cristaliza a Diferena em uma estranheza.

    evitando assim correr o risco de errar no ddalo da fascinao do

    Exo tudo aquilo que se encontra fora de nossos fatos de Indizvel ou na "desordem do Impensado". A estratificao doconscincia atuais, cotidianos, tudo o que no nossa totalidade Diverso sertanejo pelo texto brasileiro em geral, esvazia a dinmica

    mental habitual (Segalen 1978, p. 20) do Diverso, enclausurando-o na ferida da Diferena. Diferena

    O exotismo torna-se a experincia da alteridade no sentido como muro emergncia do Diverso, da alteridade, do possvel

    mais geral do termo. A definio de exotismo proposta por Segalen fluxo e refluxo de umareciprocidade na qual a luta de lugares e

    acopla-se noo de alteridade e inaugura, sua maneira, o mais importante doque a luta de classes.

    paradigma no mais da Diferena, porm do Diverso: o exotismo, Tomado por um entusiasmo marcado por uma fascinao

    eu o compreendo como algo universal, ou seja, o sentimento que extica, Euclides da Cunha, em Os sertes, inaugura, suamaneira.

    eu tenho do Diverso o sertanejo como categoria, Diferena, usando uma sintaxe,por

    Vemos aparecer aqui a palavra-chave da reflexo acerca da meio de umacascata de signos, que marca o limite de uma escrita

    alteridade: o Diverso como forma da Diferena. O que Segalen no qual o autor indexaos contornos de um pas imaginal. Pas

    nomeia Diverso " tudo o que at hoje chamado forasteiro fenomenal,fantstico e extico, chamado Norte ou Serto. A

    estranho, estranheza, inslito, inesperado, surpreendente, misterio_ economia semnticade Euclides da Cunha recorre a um alfabetc

    so, amoroso, sobre-humano, herico e mesmo divino, em sntese de pesadeloscujas convulses crepusculares do Indizvel do horror

    tudo o que Outro" (Gontard 1987, pp. 67-79).' anunciam algo que vai acontecer com as palavras. Do "feio" ac

    "desengonado", do "preguioso" ao "mal alimentado", do "brba-

    O Diverso seria o aspecto fenomenal da alteridade. Essa ro" ao "sublime", a escrita escorre como um rio sombrio introdu-definio um convite para repensar o exotismo, numa oposio zindo no ato inaugural a inveno do Diferente e engendrando no

    clara definio proposta pela tradio representada, sobretudo na corpo da escrita o "instinto" do "sertanejo do Norte". Na suaFrana, por Loti e Fartre, e no Brasil, em escalas diversas, por eloqncia, na qual uma parte de mentira aparece colada medulaRaimundo Nina Rodrigues, Euclides da Cunha, Gustavo Barroso, da linguagem, o autor inscreve o sertanejo no espao da relao

    Gilberto Freyre etc. O primeiro, com sua teoria das "coletividades

    100101

  • distncia. Ele abre, assim, o campo das percepes para uma quem olha, sobrepondo-o ao olhar de quem olhado,provocano

    estranha viagem dos significantes cujos efeitos, no texto brasileiro assim uma mistura radical de cdigos e de lugares:

    sobre o sertanejo, sobre o "nortista", anunciam o ser como sintomaeo sintoma como abjeto. Esse abjeto acuado pelo sublime aparece

    Eles disseram o que viram, o que sentiram na presena das coisas

    e das pessoas inesperadas com as quais iam procurar o choque.

    e desaparece como um fantasma numa escrita s voltas com a Ser que revelaram o que essas coisas e essas pessoas pensavam

    "conscincia infeliz", denunciada por Khatibi. de siprprias e deles? Pois existe talvez - do viajante ao

    espetculo - um outro choque do retorno, que faz vibrar aquele

    A escrita de Euclides da Cunha - Os sertes - apresenta oque o v, (Segalen 1978, p. 18)

    sertanejo sob o signo de um imaginrio estranho que , ao mesmotempo, ameaador e cativante. Monstro e anjo. Monstro como

    Escrever, diz Deleuze, "no contar suas lembranas, sua

    conseqncia infeliz de um "atavismo" tpico das "raas inferiores".viagens, seus amores e seus lutos, seus sonhos e suas fantasias 2

    Anjo como "algo" que no tem nem comeo nem fim, nem origema mesma coisa que pecar por excesso de realidade ou de imagino-

    nem corpo. Anjo como engendramento de uma mstica sem Deus.o: nos dois casos, o eterno papai-mame, estrutura edipian:

    No fluxo e refluxo constante, entre a embriaguez eo medo-pnico, quens projetamos no real ou que introjetamos no imaginrio. 2

    Os sertes circunscreve o sertanejo no espao do imaginal-exticoum pai que vamos buscar no trmino da viagem, como num sonhc

    e no do ser ou do sujeito. J no se trata de confirmar a angstianuma concepo infantil da literatura. Escreve-se para seu pm-

    universal paralisada no grito metafsico do "quem sou eu?", mas deme" (Deleuze 1993, p. 12).

    cristalizar o pensamento prtico do "onde estou eu?", em detrimen- .. .

    . A anhse da Diferena, proposta pelo "senhor dasignificaac

    to de um pensamento conceitual parido pela escurido das trevas. pelo dspota esclarecido ou pelo viajante, habitados pela sndromEra como se o campo de preocupao do "sertanejo do Norte" do extico ou ninados pelos "bons sentimentos", atesta a busc-significasse, de fato, o lugar do excluido, visto que "o espao que radical, no da Diferena nem do Diverso, mas do Mesmo: "Escreve-preocupa o jogado fora, o excludo, nunca um, nem homogneo,. se para seu pai-me!" Mesmo quando a escrita extica tradicional

    se

    nem totalizvel, mas essencialmente divisvel, dobrvel, catastrfi- mostra sensvel "estranheza" do outro, trata-se quase sempre de umco" (Kristeva 1980, pp. 15-16). desafio formal, de uma alegria estilstica da ordem da histena que, e-

    Euclides da Cunha em Os sertes, Gilberto Freyre em Casaalguns casos, refora o sentimento de uma fantasmtica da supe

    grandeesenzalaouaindaofilmedeLimaBarreto,Oscangaceiros, rioridade. O exotismo, nessecaso, conduz produo de um

    padecem da mesma sndrome: assimilar o Outro ao Mesmo numanarrao paternalista, doentia, da Diferena:

    economia narcsica que visa reforar o sentimento de supe-rioridade do Eu: "Seu objetivo essencial continua sendo a observa- O sertanejo antes de tudo um forte. No tem o raquiusmo

    o de sua prpria personalidade (...) O escritor no se apaga exaustivo dosmestios neurastnicos do litoral. A sua aparncia,

    diante de seu modelo. Ao contrrio, ele se pe no centro de seuentretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrrio. Falta-

    lhe a plstica impecvel, o desempenho, a estrutura corretssima

    quadro" (Jourda 1956, p. 280) das organizaes atleticas. desgracioso, desengonado, torto.Hrcules-Quasmodo, reflete no aspecto a fealdade tpica dos

    Segalen prope a forma "imperialista do ponto de vista fracos. (Cunha 1995, p. 129)

    extico", uma outra economia do olhar, que questiona o olhar de

  • Em Euclides da Cunha, ahainamoration lacaniana permeia

    Euclides da Cunha apela paraum modelo ecolgico a fim de

    a escrita como umagangrena no corao do

    "inocente" exotismo:explicar a histria do

    sertanejo. Ele ope "fartura dospampas' a

    amor morte, dio morte. Aofalar do sertanejo, ele impe

    na"seca" e a terra abrupta do

    serto. Regiorida ousemi-rida, o serto

    sua retrica ideolgicaperfumada por uma

    pseudo-antropologia,de E. da Cunha lugar

    de desesperana, deacesso impossvel

    uma relao dicotmica:existe sempre o Diferente do

    Diferente."civilizao", a um pensamento

    elevado. Tudo se explica em confor-

    No caso acima citado osertanejo, negado e reafirmado.

    Negaomidade com uma pretensa lei

    ecolgica: "Perfeita traduo dos

    e reafirmao quepassam fatalmente pela

    comparao entreagentes fsicos da sua

    terra, o sertanejo do Norteteve uma rdua

    "sub-raas" diferentes. A Diferenasertaneja - parece querer dizer

    aprendizagem de reveses. (...) Aprimeira coisa em que so emeritos

    o autor --- menos ruimdo que a Diferena do

    mestio. aprender o abc e,

    afinal, toda a exigncia daarte em que so

    emritos: conhecer os ferros dassuas fazendas e das

    circunvizinhas.

    Ao comparar, porm, osertanejo - "figura vulgar do

    tabaru (...) Insuladodesse modo no pas que o

    no conhece, em luta aberta

    canhestro" - com o gacho, a"boa" Diferena, o autor faz

    do com o meio(...) nmade ou mal fixo

    na terra, o sertanejo no tem,

    "sertanejo do Norte" uma feridada lngua, um sujeito

    dominado por bem dizer,ainda capacidade orgnica

    para se afeioar situao

    pelo surto psictico e atado auma preguia vegetativa. O

    "vaqueiro mais alta"(ibid., pp. 135, 137 e 154).

    do Norte" ao cavalgarnuma "atitude indolente,

    acompanhando

    morosamente, a passo, pelas chapadas,o passo tardo das

    boiadas, Naretrica euclidiana, dois

    modos de formulao do racismo

    o vaqueiro preguiosotransforma o campio que cavalga

    na rede entram deimediato em concorrncia: o

    elogio da diferena -

    amolecedora em que atravessadois teros da existncia

    (...) heterofilia- eo rejeito da diferena

    -heterofobia. Como observou

    Vimo-lo neste steeple-chasebrbaro". Ele vtima de um

    "atavis- Taquieff (1988),"os enunciados racistas se

    deslocam indefinidamente

    mo" e de umecossistema que o condenam a

    ser o que : nointerior do gnero de discurso

    que Aristteles nomeavaepiditico

    "Inconstante como ela (anatureza). natural que o seja.

    Viver (elogio ecensura); oscilam de um plo

    a outro, da exaltao

    adaptar-se. Ela o talhou a suaimagem: brbaro, impetuoso, abrup-

    humilhao, da celebrao excluso da diferena" (p. 16).

    to..." (ibid., pp. 130-135). Aoignorar o peso de uma

    identidade coletiva, consciente ou

    Mesmo quando positiva, aescrita extica subjuga a "boa"

    inconsciente, histrica emitolgica - o que Castonadis

    chama o

    Diferena a uma construoimaginria dominada pelos

    fantasmas

    .

    imaginrio social de um povo -,Euclides da Cunha, na sua

    ou fantasias daquele que ointerpreta - "Interpretar julgar?"

    .

    ,,

    mvenao romantica, deixou-seguiar por uma ideologia em

    forma

    Interpretar matar? .de biologismo gentico,

    numa "compreenso cientfica"da exclu-

    so, justificada (?)pelo logocentrismo

    europeu da poca. Ao

    o gacho do sul, aoencontra-lo nesse instante,

    sobreolha-lo-iaescamotear a necessidade de

    procurar o contedo das particulari-

    comiserado. O vaqueiro do Norte sua anttese. Na postura, no

    dades que formam ogrande Diverso sertanejo, o

    autor enclausu-

    gesto, na palavra, nandole e nos hbitos, no h

    como equipa-

    r-los. O primeiro, filho dosplainos sem fins, afeito s

    correriasrou-se no Mesmo,

    acreditando no que seu olho dizia,pouco

    fceis nos pampas eadaptado a uma natureza

    carinhosa que oligando para o que o

    "observado" poderia ver e pensar arespeito

    encanta, tem certo feiomais cavalheirosa e

    atraente. A luta

    pela vida no lhe assumeo carter selvagem da

    dos sertes do

    Norte. (Ibid., p. 132) 105

  • do observador. necessrio, talvez, como fez Lacan, colocar o olhoimperialismo de natureza religiosa e moral, ope-se, com o sentido

    que olha no lugar do sujeito (Lacan 1975, p. 82).esttico, o amor do real" (Gontard 1987, pp. 65-69).

    Com efeito, o serto aparece como um trao, uma homogra-Pouco presente nos textos dos autores citados, a palavra

    fia de guerra de cls (Maria Isaura Pereira de Queiroz), de secas eexotismo encontra-se inserida na idia de compromisso/peri-

    fome (Roger Bastide), um mundo "primitivo e retrgrado" (Eucli-go/equvoco - seno como definio do exo, como prtica

    des da Cunha). O sertanejo "sombrio como um animal dos pasesdiscursiva. Num exerccio de estilo discriminatrio e redundante.

    agrestes" (Gustavo Barroso) e vive num universo inspirador deconseqncia direta do que Pierre Bourdieu nomeou "o racisme

    mornentos de profundo barroco (Glauber Rocha) - o barrocode inteligncia" e que Freud chamou "o retorno do

    recalcado"

    compreendido como a regulao da alma pela fotografia corporal.constata-se uma tentativa, quase impossvel, de pensar o Impens-

    vel. O serto, na construo imaginria do Diferente,proposta.

    entre outros, por Euclides da Cunha e Gustavo Barroso, abre tantc

    ao belo quanto ao miastna.

    A ferida do nome prprio:Segalen ou o extico como "viso do mundo"

    Resta saber por que existe esse "algo" (Kristeva) que no e

    nern sujeito nem objeto, mas que retorna sem cessar,revulsa.

    . repulsa, fascina? Porque o sertanejo? Por que o Impensve:

    Gaultier prope, por sua vez, contra o "totalitansmo dos cristaliza nessa escrita o abjeto acornpreender, a amar, a 'resgatar

    metafsicos", uma viso "espetacular" do universo. Sente-se sua.

    a evitar ou a odiar? Corno dizer o dio que permeia aescrita de

    influncia na obra de Abdelkebir Khatibi, sobretudo em La blessure,

    "abjeto"? Corno separar os "bons sentimentos' eo horror de

    du nom propre (1974) - A fenda do nome prprio. Aqui, Khatibi intocvel, do sem casta que, como umacasa mal-assombrada.

    examina as rnanifestaes multipolarizadas do tecido cultural coti- persegue, muitas vezes, a alma do narrador,do viajante ou dc

    diano por meio da linguagem, da tatuagem, da caligrafia, do sertanista?amor-bilnge, dos paradigmas do Diverso, da Diferena, do Outro

    e do de Fora. Na sua abordagem, o autor abrange um campoEsse abjeto do qual ele no pra de se separar , em suma,

    para

    inicitico acoplado a uma desconstruo do "logocentrismo oci-ele,umaterradeesquecimentoconstantementerememorada.Em

    dental". Pela anlise da multiplicidade de lnguas, de culturas e deum tempo apagado, o abjeto deve ter sido plo

    magnetizado

    pela cobia. Mas a cinza do esquecimento fez agorapra-vento

    mitologias, ele mergulha na construo de uma intersemitica e reflete a averso,a repugnncia. O limpo (no sentido cie

    "inscrita nas nervuras do imaginrio". Imaginrio que deve serincorporar e de incorporveD torna-se sujo, o procurado torna-

    compreendido nesse contexto como uma "imagem virtual que sese banido, a fascinao, oprbrio. (...) O tempo da

    abjeo

    duplo: tempo de esquecimento e de trovoada, de infinito vedado

    rene com o objeto real e, inversamente, para constituir um cristal e de momento emque a revelao explode. (Kristeva 1980, p.16)

    do inconsciente" (Deleuze 1993, p. 83).

    Gaultier, no artigo "Victor Segalen eo sentido do Diverso",A primeira ilustrao concreta dessa manifestao extica,

    escreve algo que daria certamente, como observou Marc Gontard,"quer dizer, esttica, do mundo, fundada sobre a Diferena, con-

    muito prazer a Khatibi: "Contra o imperialismo da verdade vidasiste no desvio do olhar do exote sobre o Outro" (Gontard 1987,

    p.

    de reduzir o mundo forma nica do verdadeiro absoluto, a esse70). Ou seja, o ponto de vista extico tradicional aponta uma viso

    107

  • egocntrica que visa assimilar "o Outro ao Mesmo",ao Eu, ao Em outro registro, Segalen

    v o extico como viso positiva

    indiferenciado, uma sorte de "inferno do mesmo", naexpresso de do mundo, na perspectiva de

    Rimbaud: "Eu um outro" C Je est

    Ren Girard (1972).un autre").

    Para Segalen, no basta apenas "dizer"para falar o outro, A apreenso do Diferente

    est acoplada ao paradigma da

    narrar o visto. O olhar do turista ou doviajante, na viso de sensao do extico pensado por

    Segalen. Para ele, todo estudo

    Segalen, aproxima-se da "pulso escpica"(Lacan) ou do "exotis- "estar relacionado com as

    sensaes tratadas, de certa maneira.

    mo espacial": o sujeito olha sem ver, oureduz o que v ao olho como entidades irredutveis"

    (ibid., p. 20).

    Ele aponta no seu romance Lesimmmoriaux a emergncia de um

    outro olhar olhando o Outro, numa construoadmirvel em que Outro

    elemento-chave de seu sistema de pensamento repou-

    o autor prefere "dizer", narrar "nocruamente sua viso, mas, por sa na

    definio dessa sensao extica que "no outra coisa

    meio de uma transferncia instantnea,constante, (dizer) o eco de seno a noo

    de Diferena, a percepo do Diverso"; o conheci-

    sua presena" (Segalen 1978, p. 55; Gontard1987, pp. 70-71). mento de

    algo que no si mesmo. Dessa faculdade particular

    emerge o poder do exotismo, de ordem individual, que nada mais

    Duro para com o colono, Segalen o definecomo "nada mais do que "o

    poder de se conceber o Outro" (ibid., p. 23).

    do que um exote", para o qual "o Diversoexiste apenas enquanto

    servir como meio de ludibriar os outros" (ibid.,p. 34).

    Assim definida, a sensao extica constitui o fundamento

    de uma tica e de uma esttica. Conceito-chave de umcomporta-

    Seu dio contra os turistas, que ele chamade "os proxenetas

    mento da sensao: "Sentir fortemente, agir igualmente, tal o

    da sensao do Diverso", no menosforte do que pelo colono.

    preceito que conduz definio de sensao extica: oexotismo

    Segalen planejava escrever um ensaiosobre ambos intitulado

    torna-se a lei fundamental da intensidade da sensao, daexalta-

    "Rebanhos errantes", no qual iria descreverseus costumes.

    o do sentir, portanto, do viver" (ibid., p. 75).

    . pelo Diversoque se exalta a existncia. Essa intensidade

    Uma frase terrvel de Les immmoriawcilustra o dio radical

    ,,

    de sensao determina uma sorte de sncope dapercepeo. O

    de Segalen contra os "rebanhos errantes :.

    poder do exotismo defme-se como arte de viverembriagado.

    .embriaguez que no passa necessariamente pelo vinho ou pelo

    No meio das piores velocidades e dospiores afastamentos, eles

    reencontram seus pes-de-meia, suas economias,suas poltronas

    pio, mas, sim, como em Deleuze, por um simples copod'gua.

    e suas siestas (...), mas tambm asmodificaes que eles provo-

    cam. Seus estragos. Suas escoriaes.(Ibid., p. 47) A respeito da

    sensao extica, Segalen aconselha a no se

    "tentar descrev-la, mas indic-la queles que se sentemaptos a

    Da escrita catrtica de Segalen contra o colono,o "funcion- degust-la como numa

    bebedeira. Esses s podem se dizer exotes

    rio do colonialismo", ou o turista, de suaimplicao pessoal e de quando souberem gozar do

    prprio jogo das leis do ser universal

    sua forma de dizer o dio, o que nosinteressa, sobremaneira, o e provar dessa

    bebedeira do sujeito, a fim de poder conservar seu

    fato de que, para o autor, o exotismotorna-se uma verdadeira objeto" (ibid., p. 24).

    Ou seja, conhecer-se Diferente do sujeito e

    "viso do mundo".sentir-se Diverso.

    108

    109

  • A embriaguez do espetculo das coisas e dos seres, quemais lugar? Aqui emerge o dio "slido" que Lacan liga ac

    caracteriza a arte de viver do exote, manifesta, em Segalen, osignificante "abafado", e que "se dirige ao ser, ao prprio ser de

    encontro do tico e do esttico. Assim, o exotismo torna-se umaalgum que no obrigatoriamente Deus" (Lacan 1972-19'3, p. 91:

    "esttica do Diverso" e no uma economia da Diferena. O estticoBoons 1985, pp. 97-98).

    , para Gaultier, algo mais do que um simples estetismo, ouseja, Ao tentar refletir sobre o Dizvel eo Indizvel, ao tentar

    o esttico no apenas a arte de conceber as formas, porm,um "acrescentar" ao pensamento-outro da Diferena e do Diverso um

    modo de conhecimento do real, "uma viso do mundo" (Gontard pensar bilnge,vamos ao encontro doincompreensvel, do opaco.

    1987, p. 79). Mesmo porque, diante dainjria racista, sentimo-nos mudos.

    Segalen, por sua vez, afirma:paralisados pelo estupor, excludos de uma linguagem comum.

    Com efeito, nessa brutalidade, opera sem dvida uma matria que

    Guardo da palavra "esttica" o sentido preciso, que o de uma desmorona a prpria idia de uma sociedade humana. Que se tratecincia precisa que os profissionais do pensamento impuseram

    ,,

    esttica, e que ela mantm at hoje. A esttica acincia ao de racismo de cor, de

    "raas , de religio, de racismo sob a forma

    mesmo tempo do espetculo e do embelezamento doespetcu- radical, espria, de excluso social, ou sob qualquer outra mani-

    lo, o instrumento mais maravilhoso doconhecimento (...) a festao, estamos diante de uma violncia que ameaa os alicerces

    viso prpria de mundo (uma imago mundi nesseexemplo: a

    minha). (Segalen 1978, p. 82)e a alma de uma civilizao.

    Diferena e identidade constituem, pois, o "problema funda-

    mental do ser e, na sua busca do Diverso, Segalenencontra-se Bibliografia

    constantemente levado do ser objetivo no qual ele apreende a

    Diferena ao ser subjetivo, o Eu... Esses dois aspectos da existncia MYO, Yuki. (1984-1985) "Mmoire sociale et nationalisme au lapon". Lese reencontram no Ser universal. dessa maneira que sua

    teoria Genre Humain 11. Paris, Blgica: Complexe. Akiyo Yuki eo pseu-

    do exotismo o conduz ao terreno da ontologia e as leituras de Kant,dnimo de um grupo de pesquisadores de Tquio.

    Schopenhauer e Bergson, aps a leitura de Nietzsche, testemu- BENABDELALI, Abdesselem. (1981) Science et idologie. Rabat: Smer

    nham a profundidade de seu pensamento" (Gontard 1987, p. 66). . (1987) "Tradition, traduction, Khatibi et la tradition philosophique

    A degradao do Diverso - como pensamento filosfico, Em: Imaginairesde l'autre-- Khatibi et lammoire littraire. Paris:

    tico, esttico, multiplicidade e abertura autnoma sdiferenas L'Harmattan.

    - por meio do discurso das novas direitas, das novas teologias da..

    ' .BENSMAIA, Rda. (1987) "Traduire ou 'blanchir' la langue - Amour

    Diferena e da paixo identitria, exprime uma nova ordem social bilingue d'Abdelkebir Khatibi". Em: Imaginaires de l'autre- Khatibique convm ser repensada. Mesmo porque a identidade tambem et la mmoire littraire.

    Paris: L'Harmattan.

    uma inveno imaginada e, como tal, social. Nesse contexto,a

    identidade pode ser repensada, desconstruda.BOONS, Marie-Claire. (1985) "Dire la haine?". In: L'indpendanceamoureu-

    se. Paris: Les Cahiers du Grief, Editions Tierce.

    Resta saber como repensar o dio, como possvel pensar o BOURDIEU, Pierre. (1977) "Sur le pouvoir symbolique", AnnalesESC32-33

    dio fora da demanda de amor? Fora da splica de amor, deuma

    carncia absoluta na qual a ddiva daquilo que no se tem no tem. (1980) Le sens pratique. Paris: Minuit.

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