25
www.ancestralidadeafricana.org.br 1 Associação dos Moradores e Produtores Rurais das Comunidades de Macuco, Mata Dois, Pinheiro e Gravata APRONPIG Associação Quilombola de Macuco Minas Novas/ Minas Gerais Sumário 1 17-2-2013 Comunidade Quilombola do Macuco reunião mensal dos associados e apresentação da pesquisa. 2 18-2-2013 Reunião com Associação Quilombola do Macuco 5 20-2-2013 Comunidade Quilombola do Gravatá 8 21-2-2013 Comunidade Quilombola do Macuco 11 22-2-2013 Comunidade Quilombola do Pinheiro 14 23-2-2013 Comunidade Quilombola de Mata Dois 16 23-2-2013 Comunidade Quilombola do Macuco Encontro com os Jovens 18 24-2-2013 Comunidade Quilombola do Macuco Encontro com mais idoso - da. Maria Nunes Rodrigues, 93 anos 20 19-2-2013 - Minas Novas - Entrevista com Mestre Antonio Bastião 21 23-2-2013 Minas Novas Entrevista com Itamar Alves de Souza Assessor da Associação e de comunidades quilombolas no Vale do Jequitinhonha. 23 Entrevistas com o governo local 21-2-2013 - Entrevista com Secretaria Municipal da Educação 25 19-2-2013 - Entrevista com Secretaria com Secretaria Municipal de Cultura 25

DIÁRIO DE CAMPO Macuco

Embed Size (px)

DESCRIPTION

 

Citation preview

www.ancestralidadeafricana.org.br

1

Associação dos Moradores e Produtores Rurais das Comunidades de Macuco,

Mata Dois, Pinheiro e Gravata – APRONPIG

Associação Quilombola de Macuco

Minas Novas/ Minas Gerais

Sumário

1

17-2-2013 – Comunidade Quilombola do Macuco – reunião mensal dos associados e

apresentação da pesquisa. 2

18-2-2013 – Reunião com Associação Quilombola do Macuco 5

20-2-2013 – Comunidade Quilombola do Gravatá 8

21-2-2013 – Comunidade Quilombola do Macuco 11

22-2-2013 – Comunidade Quilombola do Pinheiro 14

23-2-2013 – Comunidade Quilombola de Mata Dois 16

23-2-2013 – Comunidade Quilombola do Macuco – Encontro com os Jovens 18

24-2-2013 – Comunidade Quilombola do Macuco – Encontro com mais idoso - da. Maria

Nunes Rodrigues, 93 anos 20

19-2-2013 - Minas Novas - Entrevista com Mestre Antonio Bastião 21

23-2-2013 – Minas Novas – Entrevista com Itamar Alves de Souza – Assessor da

Associação e de comunidades quilombolas no Vale do Jequitinhonha. 23

Entrevistas com o governo local

21-2-2013 - Entrevista com Secretaria Municipal da Educação 25

19-2-2013 - Entrevista com Secretaria com Secretaria Municipal de Cultura 25

www.ancestralidadeafricana.org.br

2

17/2/13 – Comunidade Quilombola do Macuco – reunião mensal dos associados e

apresentação da pesquisa.

Depois de uma viagem desde Montes Claros, chegamos a Minas Novas, aparentemente uma

cidade pequena, e sendo domingo quase todo comércio está fechado.

Encontramos o Itamar Alves de Souza, que é um articulador das comunidades, e fomos

diretos para a Associação Quilombola do Macuco, que agrega os quilombos de Macuco, Mata

Dois, Gravatá e Pinheiro.

Distante cerca de 9 Km da cidade, chega-se a uma bela sede, construção nova, com divisões

internas para as atividades.

No momento eles estão lendo uma ata da formação do Conselho, apresentada à Diretoria da

Associação e aos associados. Uma reunião grande havia mais de 50 pessoas.

Na formação do conselho dizem que assume, Rosa do sindicato, Geraldo, como representante

da Associação Quilombola. E André Ferreira de Matos, o presidente da associação, faz uma

fala de próxima eleição para a diretoria, indicando que ele deixará a presidência e pedindo

candidatos voluntários.

Em seguida discutem algumas questões:

● Chegada de 1080 caixas (cisternas). Dizem que no Estado saiu um milhão de cisternas

adaptadas a região para todo o semiárido, no entanto Minas Novas ficou fora do

semiárido.

● Atualmente há essa cessão de 1080 caixas- mas a condução de receber é ser produtor

reconhecido ou receber algum programa do governo, como bolsa família, ou qualquer

outro.

○ Depois nos explicaram que há um problema entre o uso da cisterna x o

consumo da família, x a pequena produção, X o cultivo de mudas e sementes.

○ Na próxima 4ª. Feira haverá uma reunião no IDENE (Instituto de

Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas Gerais), para levantar o

número de famílias aptas a se candidatar ao benefício de cisternas.

● Também falam da distribuição de mudas e semente que chegaram para 30 pessoas da

associação, que tinham os documentos adequados e assinaram o recebimento. Mas

serão distribuídas para cerca de 100 pessoas, conforme suas condições de poder fazer

‘vingar’ as mudas. Acham que 3 ou 4 mudas seria uma medida pra cada um cuidar, por

conta da necessidade da água.

● Informam que vai voltar o programa ProJovem¹1

Entra em debate as seguintes questões:

● Falta de água, que é suficiente para consumo diário, porém insuficiente para plantio.

● As vezes os programas sociais não chegam às pessoas que realmente precisam.

● Atualmente só vai receber cisterna se estiver vinculado a algum programa do governo.

Mas criticam como uma incoerência: se o produtor não tem água como produzir? Se

não produz não pode estar no programa do governo... forma um circulo vicioso.

1 Criado em 2005 e reestruturado em 2008 quando passa a ser denominado de Projovem Integrado, o programa

federal é uma extensão da Política Nacional de Juventude e se divide em quatro modalidades (Adolescente, Urbano,

Campo, Trabalhador), voltada aos jovens com diferentes perfis. Cada uma é gerida por um órgão federal diverso, mas

sempre conta com a parceria de estados e municípios.

www.ancestralidadeafricana.org.br

3

Chega a hora de nos apresentar e falar um pouco sobre a que viemos.

Fomos apresentados como representantes da Biblioteca Nacional, a importância do programa

de Pontos de Leitura, que deveríamos explicar o funcionamento, a importância dos outros

projetos que a Associação tinha conquistado, particularmente sob a direção do Sr. Geraldo

Fernandes Barroso.

● Apresentamos ao projeto e dissemos o que pretendemos.

● Falamos um pouco da questão da ancestralidade e da importância da afirmação da

identidade, da nossa pesquisa em quilombos e terreiros (aparentemente gerou um

desconforto, sic)

● Numa altura dessa conversa falou um senhor que havia chegado pelo meio do

encontro. Mestre Antonio, que pareceu entusiasmado com a nossa fala. Ele parece

carregar a questão da ancestralidade africana como uma de suas batalhas.

● Fizemos uma breve agenda para as entrevistas:

○ Dia 18 – uma reunião com a Diretoria da Associação

○ Dia 20 – 14 hs comunidade do Gravatá. Mas também iremos as 13hs encontrar

com a secretaria no Macuco, pra organizar o encontro de domingo.

○ Dia 21 – 14 hs comunidade do Macuco

○ Dia 22 – 14 hs Comunidade Pinheiros

○ Dia 23- sábado - 9 hs – encontro com os Jovens na Associação

● 14 hs – encontro com a responsável da Comunidade Mata

Dois

● 15 hs – comunidade Mata Dois.

○ Dia 24 – domingo as 14 hs – Encontro com todos na Associação. (proposta de

vir também o conjunto da Congada)

○ Previu-se também encontros na cidade com:

■ Secretário da Cultura, (dia 19/2 falamos um pouco com ele)

■ Grupo da Congada

■ Entrevista na Radio Local

■ Conversa com Mestre Antônio Bastião – um senhor de 73 anos,

quilombola, produtor de tambores e artesão e que tem uma longa

história de defesa da ancestralidade africana, com história narrada no

Museu da Pessoa, e recebeu várias referencias como personalidade

quilombola. (feita 19/02/13)

■ Possibilidade de encontros com o Sr. Geraldo Fernandes Barroso, que

foi presidente da Associação e parece ter muita história pra contar.

■ Entrevista com Itamar, que é o articulador das comunidades (19/02)

● Dizem que na comunidade há poucos velhos – geralmente chegam até 80 e poucos

anos. E que os velhos não gostam de falar com estranhos.

● Na Associação há uma sala de computação, com 13 computadores recebidos para o

programa do Banco do Brasil, para um telecentro, sala de leitura, sala de artesanato,

onde se encontram vários tambores e outros artesanatos de tecidos produzidos em

oficinas que já ocorreram na Associação e tem uma área maior para os encontros.

● Observamos que os materiais do Ponto de Leitura já haviam chegado, embora ainda

aguardem a instalação e exposição dos livros. Têm também outras bibliotecas

recebidas de outros projetos.

www.ancestralidadeafricana.org.br

4

● São Joaquim é o padroeiro da comunidade, e estão pelejando pra terminar a

construção da sua igreja, ao lado da Associação, que esta ainda em construção, só

tem as paredes levantadas.

● A maior festa da cidade é a de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de

Minas Novas, em junho.

No caminho da volta viemos conversando com Mestre Antonio e definimos que será

interessante uma conversa com ele.

www.ancestralidadeafricana.org.br

5

18/2/13 – Reunião com a diretoria da Associação Quilombola do Macuco

● Trocamos de hotel e fomos para uma pousada bem no centro da cidade. Melhor pra se

articular as visitas e etc.

● Amanhecemos dia 18 com toda a cidade sem comunicação de celular- essa situação

dificultará nossa programação.

Cedo ainda recebemos ligação do secretário da Cultura, para marcar um papo, que ficamos de

confirmar pelo celular. – não conseguimos.

Outros contatos são impossíveis

Fizemos um reconhecimento da cidade.

As 14 hs – encontro com a diretoria da Associação, na Associação Quilombola de Macuco.

Começamos com uma roda de apresentação, que acabou sendo engrossada por muitas

histórias.

> Sr. André Ferreira de Matos – atual presidente da Associação Quilombola do Macuco,

nasceu e mora no Macuco.

A Associação foi fundada em 1996, tem um Conselho e uma Diretoria.

Em 2005 – o Quilombo foi reconhecido pela Fundação Palmares como seus integrantes sendo

remanescentes de quilombolas. Mas ainda não houve a delimitação das terras e não se sabe

quando haverá.

A medição da terra foi feita, mas disseram que está invalidada. Terá que se fazer outra.

Discussão - No quilombo todos as famílias tem o seu terreno, que dizem receberam de

herança dos avós, pais, agora eles e deixam pros filhos. Alguns tem documentos de

propriedade, outros tem documentos que atestam a herança.

Sr. Geraldo levanta a questão: Terra pra nós não é problema, o problema é a AGUA.

Se não fosse as caixas (cisternas) e as barraginhas todos tinham ido embora.

- Por que falta água?

O problema foi o uso da terra, o assoreamento e fechamento de nascentes, secagem

de brejo para plantar arroz, drenagem de brejos, ocupação nas várzeas, desmatamento

e plantação de eucaliptos realizados por firmas de fora como a Suzano, a Cosipa. Em

1975 começam as plantações de eucaliptos, e foram ocupando e sugando os rios

Fanado, rio Capivari. Todos tinham muita água, agora só um córrego quando chove.

.....

> Sr Joaquim Oliva da Silva (Joaquim Barulho), de Mata Dois. Está na diretoria desde a

fundação.

Nasceu na barra do Mata Dois e voltou pra cabeceira. Quando criança ficou órfão e foi criado

por família em outros lugares, um dia voltou pro Mata Dois, pois soube que existia a família

Machado e foi buscar. Encontrou e ficou por lá como o seu lugar.

Já saiu muitas vezes na “migração” – ir colher cana, trabalhar na construção civil, em São

Paulo, várias cidades, Belo Horizonte. Trabalham uma época do ano depois voltam pra casa e

vão novamente.

Os filhos moram no terreno, mas os homens vão todos trabalhar fora, e deixam as mulheres e

filhos ali. Ele agora se sente velho e, portanto fica também no terreno, já não vai pra fora.

> Geraldo Fernandes Barroso, foi presidente da Associação durante 8 anos, e na sua

fundação era vice-presidente. Atualmente é vice-presidente.

Fez o projeto de construção da sede, programa executado junto ao Centro de Referencia da

Cultura Negra de Belo Horizonte, e financiado pela Petrobras.

www.ancestralidadeafricana.org.br

6

Fez o projeto e acompanhamento do programa Pontos de Leitura, do projeto Arca das Letras,

e outros.

Nasceu e vive na Comunidade Pinheiro. Migrou pra São Paulo, durante 16 anos trabalhou na

colheita de algodão, da cana, na indústria de açúcar e álcool, em 1979 foi pra capital, em 1988

– migração.

Fala que já esteve trabalhando nas indústrias da cana de Barrinha, Guariba, e em toda a região

de Jaboticabal. Referiu-se à vida dos “boias-frias”, dos barracões e também das lutas dos

trabalhadores rurais da cana, que começou em Guariba, com as greves dos cortadores de

cana. Ele estava lá.

Discussão - Diz que desde essas greves é que começou a mudar e melhorar um

pouco a situação dos cortadores, definindo melhor o tipo de contrato e pagamento,

limitando a ação dos “gatos” (empreiteiros).

Hoje está muito diferente a situação da migração – a gente já vai com um contrato e

definição do ganho, o acerto geralmente é feito pela própria usina, tem um alojamento

melhor. Tem os direitos trabalhistas definidos, como os impostos, quando acaba a safra

e vai voltar pra casa.

> Geraldo Nunes de Macedo – do Macuco, vice-tesoureiro da Associação.

Trabalha na lavoura e, muito tímido, precisou que o outro Geraldo dissesse que ele é artesão,

um artista, faz tambores.

Começou com o Paulo do Gravatá, fez oficinas na Associação (tem alguns tambores ali) e

vende na feira. Nas feiras da Chapada, feiras anuais em RJ, SP, BH. Faz tambores, reco-reco,

xique-xique, etc.

Produz pra Minas Novas Congada. Diz que já houve época de boa produção e venda. Tem

muitos pedidos.

> Maria Ivonete Barros de Matos, casada com o André, é vice-secretária desde muito tempo.

Nasceu em Capivari e vive no Macuco desde que casou há 24 anos. Diz que é descendente de

quilombola do Capivari. Faz uma fala provocativa, dizendo-se mais negra que muitos negros

dali, o que causa certo desconforto. Fala um pouco da ancestralidade – seu tataravô foi casado

com uma índia pega “de Cachorro” (na época soltavam cachorro no mato para pegar as

caças/presas e escravizados fugitivos. Algumas vezes resultava em descobrir/ encontrar

indígenas, em especial mulheres e recolhiam para escravizar e casar), depois os avós se

casaram fora da comunidade.

> Maria Odete Leite da Rocha, 55 anos, da comunidade do Gravatá. É do conselho fiscal da

Associação desde 2002.

Trabalha como distribuidora no Poço Artesiano da “Copa Norte” – que é uma empresa que tem

plantação de eucalipto no entorno, e que construiu o poço artesiano.

Ela é o distribuidor da água para as famílias – as famílias pagam uma taxa para a empresa

para pagar a energia gasta para trazer a água (de 7 a 60 reais por mês) e também as famílias

cotizam (geralmente cada uma dá $10 reais, pra remunerar o distribuidor, no caso a Maria

Odete.

Há uma discussão sobre essas empresas e a produção de eucalipto, e também ainda

não muito explícito a questão do cercamento de grandes áreas e da pressão sobre as

terras dos quilombolas.

> Sandra Machado Rocha é do Mata Dois e do Conselho fiscal. Diz que é viúva e, portanto pai

e mãe de sua família. Tem filho e uma mãe bem idosa precisando de cuidados. É uma senhora

bastante disposta e diz que tem vários trabalhos nos cultos da igreja católica, visita famílias

www.ancestralidadeafricana.org.br

7

necessitadas, velhinhos da comunidade etc. também trabalhou nas oficinas de artesanato e

bate tambor. Nasceu e se criou no Mata Dois. Recebeu a terra de herança do marido.

> Antonio Soares Machado, é do Mata Dois e do Conselho Fiscal. Faz “migração” pras

empresas e lavouras de São Paulo.

Discussão sobre – migração- os jovens desde 16 anos e também mulheres vão pra colheita do

café. De abril até novembro todo jovem da comunidade, a partir dos 18 anos migra pra colheita

da cana ou pra construção civil. Hoje muitas mulheres também fazem essa migração. Vem um

empreiteiro conversar com a comunidade e vão todos juntos.

Hoje os jovens não querem mais continuar na roça, preferem ir trabalhar fora, geralmente

abandonam os estudos.

Há falas de como antes se esforçavam pra estudar, passavam fome, e hoje tem mais direitos,

tem merenda etc e ainda assim os jovens abandonam.

Escola tinha só do 1º. Ao 4º ano, mas agora estão acabando com as escolas nos quilombos e

em vez de criar uma escola que reunisse as crianças dos quilombos, preferem mandar todos

pra cidade.

Nas escolas públicas de Minas Novas e no período em que as escolas funcionavam nas

comunidades, não havia ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira, conforme

obrigatoriedade da Lei 10.639/03.

Há várias discussões sobre a questão da negritude, de quem se reconhece como negro, que

há alguns mesmo no quilombo que tem dificuldade de aceitar e se diz moreno ou pardo. Fala-

se também do preconceito que existe na cidade, atualmente um pouco atenuado.

Fala-se que os jovens tem dificuldades de se aceitar como quilombola, (“culpa mesmo nossa,

diz Sr. Geraldo, pois desde que fomos reconhecidos, nos devíamos fazer reuniões com os

jovens e explicar a eles o que é quilombo, o que é essa nossa descendência ou

remanescentes de quilombolas, qual o nosso papel na construção disso tudo”.

Herança e começo do quilombo – diante da pergunta “o que é ter terra de herança, o que era

essa terra”, vem muitas respostas controvertidas- o meu avô comprou 2 hectares... comprou

mas não tem documento de propriedade, tem papel de direito de herança... somos posseiros

que tivemos terra reconhecida...

“quem eram os avós? Os bisavós? E como começou esse quilombo?”

Respostas ainda mais controvertidas ... era dos negros.

Os negros tinham a terra e um padre tentou tomar.

Tinha um padre Barreiro, grande fazendeiro, os negros tomaram a terra e puseram o padre a

correr...

No Macuco – eram 3 famílias – a origem de tudo.

No Macuco família Machado, no Pinheiro, família Rosendo e Nunes.

Depois foram se estendendo casando um com outro, ou trazendo pessoa de fora. Foi

ampliando a área de pequenos produtores, que mais recente foi reconhecido como quilombo.

www.ancestralidadeafricana.org.br

8

20-2-2013 – Comunidade Quilombola do Gravatá

Esta Comunidade, que se vincula à Associação Quilombola do Macuco, se divide em Gravatá

de cima, no município de Minas Novas e o de baixo, que se estende ao município Chapada do

Norte. E ainda ao Gravatá se juntam moradores do Córrego da Parceira e do Córrego de

Barreirinha.

Lugar cheio de morros, para alcançar as casas da comunidade significa descer grandes

ladeiras em caminho de terra. O carro desce penosamente uma parte do caminho. Depois,

temos que seguir a pé. Chegar e andar (o pouco que andamos) por esta comunidade é

defrontar-se com a seca e os seus efeitos. Apesar de ser agora tempo de chuva, esta regateia

e não tem vindo, “e quando vem, ela desce pelos grotões e fica muito pouco. Já se perdeu o

plantio deste ano. No meio do ano, agosto isso tudo está completamente seco.”

Na roda de conversa, após falarmos sobre a nossa visita e do projeto, pedimos que se

apresentassem.

A apresentação de cada um dos participantes vai revelando a proximidade parental entre eles,

até que se apresenta uma família de sobrenome Soier, que diz que o pai, ou o avô era francês

que casou com moça do quilombo.

Exceto os estudantes (mais jovens) todos se declararam lavradores e lavradoras, a maioria

nascido no Gravatá ou em comunidade vizinha. Pelo casamento eles migram entre as

comunidades. Plantam milho, mandioca, abóbora, cana de açúcar, feijão andu (tropeiro ou de

vara, de corda), criam galinhas e as vezes vendem e também aos ovos, e criam porco que é só

pra consumo.

Nesta comunidade tem um engenho, para produção de rapadura e tem um responsável por

sua produção, embora o engenho atenda a todos.

A farinha é produção caseira, e todos tem uma forma para ralar e também os fornos nas suas

casas. Mas a Associação tem uma casa de farinha, com motores elétricos que é facultado aos

associados.

No Gravatá tinha uma escola para as crianças do 1º. ao 4º. ano do ensino fundamental, mas

foi desativada, e isso é motivo de discussão, pois dizem que tinha poucos alunos frequentando

a escola e assim a Prefeitura unificou enviando as crianças para escolas na cidade.

Por um lado consideram que é bom porque assim eles frequentam salas separadas por níveis,

mas por outro, tem a questão de distancia pra chegar até o ponto do ônibus escolar que passa

só na estrada principal e ainda tem o risco de as crianças pequenas irem sozinhas pra cidade.

Também tem uma visita de médico, a cada quinzena, para atender os casos rotineiros.

Jucilene Alves Costa Soier (Leninha), que é secretaria da Associação do Macuco, e está

cursando Magistério, nos acompanhou em todas as comunidades, e também Elisabete Costa

Machado (Betinha), mãe de Leninha, a quase todas comunidades. Ambas moram no Macuco e

colaboraram muito nas rodas de conversa. Betinha, que participa do Congado de São

Benedito, estimula a discussão, dizendo que desde sua avó que participam dançando e

cantando. Esse congado nasceu só com pretos. Ela já foi chefe/presidente do Congado.

Betinha também conta que sua mãe Josefina e sua avó, Rosa eram parteiras e tanto ela como

Leninha e também outros moradores do quilombo utilizam a medicina natural, cultivando ervas

para chás e tratamentos.

À pergunta de como começou a comunidade, há várias tentativas de resposta. Dizem que

antes em Minas Novas tinha muitos negros escravizados. Não sabem bem como começou o

quilombo. Dizem que os avós vendiam o que sobrava do consumo, mas era venda na base da

troca de produtos. Forçando um pouco a lembrança, eles fazem uma lista de nomes das

pessoas mais velhas que conheceram ou ouviram falar – Antonio Machado, Antonio Rodrigues,

www.ancestralidadeafricana.org.br

9

Zefina, Maria Timóteo, Mané Fel, José Fel, Adão Fel, e Adelaide. Dizem que antes tinham

poucas casas no quilombo e que a vida era muito dura.

A Festa do Divino durava 45 dias e 45 noites. Começava no dia das cinzas (4ª.feira de cinzas)

e ia até o dia de Pentecostes. Com novenas, cantos e visitação das casas, no final tinha uma

festa na cidade e era erguido o mastro do divino e tinha a Folia do Divino. Dos instrumentos

lembram-se das caixas, viola, tocados pelos homens; e os cantos se compunham de versos,

onde os homens cantam a primeira parte e as mulheres respondem.

O grupo de Congada participa da festa do Rosário, na cidade de Minas Novas. Nesta data,

os/as integrantes se reúnem bem cedo e vão até o rio buscar água para lavar a igreja de Na.

Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Minas Novas. Na cerimônia os tocadores de

instrumentos (caixa, tambor, pandeiro, chocalhos) vestem uma “guarda” – roupa composta de

calça e um casaco de manga comprida, vestindo tanto homens como mulheres (essas apenas

são aceitas como “tocadoras”, nos dias de hoje, devido a escassez de instrumentistas do sexo

masculino) . As mulheres trajam vestidos brancos, compridos e rodados, um lenço na cabeça e

outro na mão, e dançam em roda e cantam também num movimento de pergunta e resposta.

Este mesmo grupo participa também da festa de São Benedito.

Gravatá deve seu nome a uma frutinha parecida com o abacaxi, que era abundante naquele

local, hoje tem quase nada mais. No Gravatá em julho tem a festa de Santana, comemorada

com novena, quadrilha e congado.

Estiveram presentes na roda de Conversa:

Cleide lavrador/lavradora nasceram e vivem no Gravatá

Luciano idem idem

Sônia “ “

Geraldo, 74 anos “ “

Paulo “ “

Maria Sebastiana “ “

Maria José “ “

Maria Antonia “ “

Herculana “ “

Afonso “ “

Dinalva “ “

João Leite Machado, 52 anos “ “

www.ancestralidadeafricana.org.br

10

Maria Hilda lavradora nasceu no Gravatá de baixo,

mudou para o de cima

Maria Hilda Rocha

de Matos

idem nasceu no Macuco e mora no

Gravatá

Ana Soares dos

Santos

idem nasceu no Córrego da Parceira e

mora na Bandeirinha

Vilma idem nasceu no Ribeirão da Folha,

casou e mora aqui.

Maria Geralda dirigente do Gravatá nasceu no Córrego da Barreirinha

Natalina dirigente do Gravatá Nasceu e vive no Gravata

Maria Odete trabalha na distribuição de água do

poço artesiano.

idem

Elisabete (Betinha) lavradora aposentada vive no Macuco

Jucilene (Leninha) secretaria Associação, estuda

magistério

vive no Macuco

estudantes: curso ou ano / todos nasceram e

vivem no Gravatá

Daniel 7o. Ano

Noé do supletivo e é pedreiro em BH

Jonata 6o. Ano

Dalian 7o. Ano

Luciana 8 anos 3o. Ano

João Paulo, 10 anos 5o.

Adenilson ensino médio, técnico

agropecuária

Bianca ensino médio

Thais, 7anos 2o

Jaene 7o.

www.ancestralidadeafricana.org.br

11

21-2-2013 – Comunidade do Macuco

A Comunidade do Macuco fica na área mais central e é onde se localiza a Associação que

reúne as quatro comunidades. André que é presidente da Associação trouxe mais informações.

Explica que no Município tem 120 associações, mas somente 35 delas funcionam

regularmente.

A Associação Quilombola do Macuco mantém documentação em ordem, com um contador que

colabora para registrar documentos, prestação de contas etc. A Associação sobrevive com a

colaboração dos associados que pagam uma taxa mensal por família. Conta com cerca de 200

associados, ou famílias associadas, sendo 37 famílias no Macuco, 28 no Mata Dois, 43 no

Pinheiro e 21 ou 23 no gravatá. Além disso, tem também associadas outras famílias das

comunidades do Curralinho, Capivari, Ribeirão do Meio, Laginha. A união de diversas

comunidades em apenas uma entidade se dá pelo fato de que não há um número mínimo

exigido, em cada comunidade, para a formação de uma associação comunitária.

Quanto aos programas sociais e ações voltados às comunidades quilombolas, além da

certificação, alguns destes moradores (associados) já foram beneficiados pelos Programas

Luz para Todos, Bolsa Família, PETI ¹(Programa de Erradicação do Trabalho Infantil),

distribuição de cestas básicas por ano, um caminhão de alimentos que a diretoria divide entre

os associados e que neste ano, dizem que a entrega está em atrasado.

A Associação orienta as pessoas na obtenção de documentos para conseguir aposentadoria

por idade ou por acidente. Todos os mais velhos são aposentados e recebem um salário-

mínimo mensalmente. Também divulga os processos para conseguir ‘bolsa família’ e bolsa

para os estudos.

A Associação tem desenvolvido projetos, além da sede da Associação e os projetos de

bibliotecas e telecentro (que ainda necessita de reparos das máquinas e atualizar o

funcionamento), conseguiram a casa de farinha mecanizada, onde os associados podem trazer

a mandioca e fazer farinha, polvilho, goma. O não associado pode usar também e paga 10%

da produção para cobrir parte dos gastos com energia e conservação.

Tem uma proposta antiga de ter um posto de saúde, e foi destinado inclusive um espaço no

terreno. Mas a Prefeitura não realizou e não explicou por que. Tem a proposta de construir

uma igreja católica, que está pela metade. A escola que atendia as crianças da comunidade foi

desativada e praticamente destruída pela gestão anterior da Prefeitura, que levou não só os

equipamentos, mas também o telhado e todas as janelas e vitros.

André tem uma afirmativa “hoje sabemos que somos quilombolas e que temos direitos. Mas

nós não sabemos quais são os nossos direitos”.

As informações parecem chegar fragmentadas e esparsas, de diferentes fontes. Isso indica a

necessidade de uma orientação integrada dos direitos e de uma capacitação especifica das

comunidades

Na roda de conversa com o interesse de estimular uma fala maior de cada um, propusemos

que ao fazer a apresentação individual, cada um dissesse também de um fato muito bom e

outro muito ruim que aconteceu com a comunidade, do qual se lembra ou que lhe contaram.

Abaixo uma síntese das respostas:

www.ancestralidadeafricana.org.br

12

André, presidente da Associação, nasceu e vive no Macuco. Faz uma comparação de que era

bom quando criança tinha mais gente vivendo no quilombo, eram mais unidos e tinham muitas

festas. Hoje a maioria migra em busca de trabalho, os homens pelo menos acabam se

mudando da comunidade, ficou mais triste o local.

Irani nasceu em Minas Novas e morava no Mata Dois, atualmente no Macuco. Conta a história

do nome do Mata Dois – teve dois homens (talvez irmãos) que buscavam ouro e encontraram

uma pedra grande. Não querendo dividir um tentou matar o outro, e ambos caíram no rio e

morreram afogados.

Leonino Viana nasceu em Chapada do Norte e mudou para o Macuco.

Gilvânia morava em Bandeirinha, veio pro Macuco quando casou. Lembrou de quando foi mãe,

como um bom acontecimento.

Enzo, 2 anos, filho de Gilvânia.

Maria Ivonete (Nete) nasceu em Capivari, casou e mudou pro Macuco. Reforçou a fala do

marido, André, dizendo que os vizinhos tinham mais tempo, faziam festas.

Rosa Alves. Era do Gravatá, casou e veio ao Macuco, onde vivia o marido.

Maria Geralda Alves Gomes nascida e criada em Macuco. Teve 10 irmãos, mas morreram,

ficando apenas dois.

Elisabete (Betinha) – nasceu, casou e desquitou no Macuco. Como bom acontecimento, aponta

seus nove filhos que criou com a força (solidariedade) da comunidade. Hoje tem 13 netos.

Tomé Lopes Soier nasceu e foi criado em Macuco;

Augusta Machado, nascida em Macuco, onde vive até hoje;

José Tomé Soier, 61 anos,diz que antes trabalhava muito e reclama que hoje os/as

adolescentes, crianças e jovens não querem e não trabalham mais na roça, como antigamente.

Durante muitos anos Sr. José foi para usinas de Ribeirão Preto, Bonfim, Santa Luíza,

trabalhava na costura de sacaria de açúcar. Teve um acidente de trabalho e se aposentou.

Neusa Soier nasceu e vive em Macuco. Trabalha há 4 anos na colheita de café no sul de Minas

Gerais.

Walace, 4 anos.

Marluce Soier mora no Macuco e estuda na APAE – ela é portadora de necessidades

especiais, embora seja bastante atenta ao que se passa e toma iniciativas para falar.

Geni Alves da Rocha Soier, nasceu no Gravatá, casou e veio pro Macuco. Marli, sua irmã,

gosta do Macuco. Lembrou como ruim perder a filha pequena, que morreu.

Jucilene (Leninha) é do Macuco e casou com gente daqui mesmo. Diz que as pessoas mais

velhas davam mais valor ao que tinham. Atualmente o desejo maior é de coisas de fora.

June Alves Costa (irmã de Leninha) nasceu no Macuco, mas mora em Minas Novas.

www.ancestralidadeafricana.org.br

13

Maria Aparecida Gomes Soares (Cida, doceira), nasceu em Misericórdia, ficou órfã e veio

pequena pro Macuco, foi criada por Maria Geralda. Casou aqui e tem 2 filhos e 4 netos.

A história que conhecem das origens do quilombo leva a lembrança de nomes de pessoas

mais velhas – Manuel Machado, Rosa, Augusta. Joaquim Alves, Sebastião Alves.

Nete (Maria Ivonete) diz que pesquisou um pouco sobre as origens, que eram três famílias,

Machado, Rosendo e Nunes. Quando as pessoas fugiram das lavras das minas, se escondiam

nessa região. Teve um padre, que aproveitou a terra dos fugidos e se apropriou. Mas os

fugidos expulsaram o padre e ficaram com a terra.

Betinha tem uma versão diferente – os avós dos avós moravam aqui. Tinha também um padre

Barreiro que morava no Tapera e tinha as terras. Mas o povo do lugar, o avô na irmandade dos

filhos deles comprou o terreno. Aqui era a ‘Porta do Marmelada’ (nome). O seu avô comprou o

terreno do padre. O Padre Barreiro era de Minas Novas e veio para cá, lá no Capivari e morava

aqui. Lembrou de Zabel (talvez Isabel) do começo, a avó de sua avó. O tataravô Nunes casou

com Maria Nunes.

As histórias diferentes geram uma discussão e afirmação de lado a lado sobre qual a verdade,

que somente se acalmou quando argumentamos que na história oral facilmente se encontram

diversas versões dos fatos, particularmente fatos passados, e que todas as versões tem o

mesmo valor. Cada um contribui com aquilo que sabe que lembra, visto que até o momento

não há registro documentais.

Betinha lembrou a sua avó Rosa, e diz que seu avô deixou um documento em seu poder de

1890, onde a escrita está quase apagada e a letra a mão é difícil de decifrar, ficando claro

apenas a data sobre o selo.

Antes os negros daqui casavam entre si. Teve um tempo que só tinha negro casado com negro

daqui. Depois foi misturando, casando com pessoas de fora, ‘estragando a cor, desrraciando’,

segundo ela. Veja o Tomé Lopes Soier era lá da cidade e veio pra cá. O Padre era de Minas

Novas e veio para aqui. Teve também um padre italiano que comprou terra e veio pra cá,

depois foi embora.

A roda conclui que “sabíamos que somos negros, depois veio a Fundação Palmares e

soubemos que somos quilombolas – remanescentes de quilombos. Temos orgulho disso, mas

não conhecemos a nossa história.”

www.ancestralidadeafricana.org.br

14

22-2-2013 – Comunidade Quilombola do Pinheiro

Nessa comunidade chegamos primeiro na casa do Sr. Geraldo Fernandes, que foi presidente

da Associação Quilombola do Macuco em duas gestões e atualmente é vice-presidente.

Mostra-nos a sua casa que é razoavelmente grande e toda pintada de branco, e nos diz que é

toda feita de adobe. Sr. Geraldo vive com a filha e o genro, e a esposa morreu há pouco

tempo, o que entristece muito a família.

A área do entorno é bastante verde, com muitas plantas e flores, o que além dos cuidados,

provavelmente se deve a uma barraginha que tem logo ao lado no terreno.

Da casa de Sr. Geraldo seguimos ao encontro com o grupo do Pinheiro que estava reunido sob

uma frondosa mangueira – aqui é mais fresco, dizem. Na Comunidade teve uma escola, mas

foi desativada e semi demolida, assim que geralmente fazem as reuniões e cultos sob a

mangueira. Nessa comunidade apareceu a questão da existência de barbeiros na comunidade

e da doença de chagas que inclusive afeta alguns da roda.

Solicitados para a roda de conversa, Sr. Geraldo inicia a apresentação falando das

barraginhas, existentes no quilombo, feitas pela Embrapa, pelo sindicato, pela Prefeitura,

enquanto a Associação construiu 30 barraginhas, com projetos com o Canadá. Existem

também quatro barragens de maior porte feito pelo PPP- Produção de Pequenos Projetos.

Diz que existia um grupo de pequenos produtores, Grupo do Nico, que era reconhecido na

Itália e em outros países. Eram orientados por um ex padre, italiano, Paulo, que se casou e

mora no Pinheiro. O padre Silvano mora em Turmalina. Outro padre, Pedro, também italiano,

foi o fundador na região das pequenas comunidades de base – daí o nome de comunidade e o

Sr. Geraldo nos dá uma chave para essa denominação. De fato, tratavam-se das CEBs – as

Comunidades Eclesiais de Base, ações dos padres católicos progressistas, que aderiam a

Teologia da Libertação, tão atuantes nas décadas de 60 e 70 no país.

● Sr. Joaquim Rodrigues da Rocha, nasceu no Córrego e veio pra o Pinheiros. Saiu

durante muito tempo – 36 safras - na migração para as usinas Bonfim, Santa Luíza, São

Francisco, em São Paulo. Desde 2007 que não vai mais, adoeceu e se aposentou. Conta

que quando pequeno, seu pai e mãe garimpavam, e carregava tudo nas costas até a

cidade.

● Sr. Joaquim (outro), nasceu e vive no Pinheiro. Desde os 15 anos que migra para o

trabalho na cana. Parou em 2002, também se aposentou por doença. Lembra que em outro

tempo era melhor, tinha muita água.

● Geraldo nasceu no Pinheiro e saiu umas vezes na migração no interior de São Paulo e

na capital, até 1987. Aposentou. Falou da doença de chagas. Diz que antes tinha água,

chovia mais, enquanto que financeiramente era mais apertado. Hoje melhorou com alguns

direitos, como a aposentadoria, assistência social, programas do governo, projetos de

cisterna, barraginhas. Hoje com a Associação pressiona e consegue. A comunidade

Pinheiro tem 43 famílias. Também hoje melhorou porque reduziu o preconceito. Antes

quando passava um preto, logo alguém chamava de urubu. Hoje o branco tem inveja de

preto.

● Pedro Rodrigues de Souza nasceu e vive no Pinheiro e trabalhou até 1997 no interior

de São Paulo e Minas. Atualmente toca a roça. Diz que trabalhar fora era difícil, mas

precisava pois mandava dinheiro para o filho não passar fome.

www.ancestralidadeafricana.org.br

15

● Alcides Ramos nasceu no Pau D’Alho, casou e veio pro Pinheiro. Durante oito anos foi

lavrador no corte de cana.

● Luiz, do Córrego Pinheiro. Trabalha no corte de cana. Diz que a água sumiu.

● Ronaldo Adriano Souza. Nasceu no Morro Branco, veio há 3 meses para Pinheiro, pois

casou.

● Mailde nasceu e vive no Pinheiro. Estudante do 1º. Ano médio.

● Leandra nasceu e cresceu no Pinheiro.

● Maria da Penha nasceu e criou no Pinheiro. Antes era melhor.

● Maria Rosa, lavradora, nasceu no Pinheiro. Tem nove filhos.

● Neusa nasceu e cresceu na comunidade.

● Ivanilde nasceu em Buriti e mudou pro Pinheiro. Há nove anos foi colher café em

Ribeirão Preto.

● Geidiana nasceu em Chapada do Norte, há 3 anos casou e mudou pro Pinheiro. Ano

passado foi pra colheita do café.

● Simone nasceu no Pinheiro, estudou até 2º.grau.

● José Aníbal nasceu aqui e vai pro corte de cana.

A conversa volta a comunidade Pinheiro. Dizem que tinha aqui 8 famílias. Em 1979 começou

com Padre Pedro a comunidade de base. Ele falava das comunidades dos índios e dos

quilombos – há uma mistura de negro com índio. Com a migração os jovens foram perdendo o

gosto das raízes, como a dança de roda, o Congado. Na comunidade tem uma banda ‘Serena

e Companhia’.

Com as comunidades de base, antes foi fundada como Associação. Em 1985 é que muda o

estatuto como Associação Quilombola.

Em 2005 reconhece como remanescentes de quilombos.

Falam um pouco da associação, que tem alguns critérios para associar tem que trabalhar ou

morar na comunidade. Também tem obrigatoriedade de frequentar as reuniões - se falta em

três reuniões sem justificar fica excluído. Mas de alguma maneira a Associação acabou

admitindo gente de outras comunidades.

A conversa caminha um pouco mais em torno do reconhecimento como quilombola. E da

importância que tem sido ver outros negros que começaram a aparecer também em postos de

comando. No posto tem uma médica negra, as pessoas tem dificuldade de reconhecer. “Depois

a gente fica orgulhosa”. Outro dia veio o ex- Ministro da Seppir, Edson Santos, negro. “Parecia

que eu tinha um irmão lá”. Depois veio o Obama, negro. “A gente começa a se reconhecer

como também sendo capaz, que não somos inferiores.”

www.ancestralidadeafricana.org.br

16

23-2-2013 – Macuco – Comunidade Mata Dois

Sábado à tarde, muito sol e a comunidade do Mata Dois nos esperava num espaço rodeado de

árvores – aqui é mais fresco! dizem. A comunidade tem 35 famílias.

Enquanto aguardávamos os demais, Da. Alzira nos conta que sua mãe, Joana Cordeiro, era

benzedeira e parteira. Esta andava todo o povoado para atender as mulheres parturientes –

andou tanto no vento e no frio. A própria Da. Alzira diz que teve 10 filhos, nove que a mãe

ajudou e um foi a sua sogra que também era parteira.

A Dona Joana benzia quebranto, cobreiro, com arruda, sala, fazia simpatias, chamava as

pessoas e punha mulher com os pés na soleira da porta quando o parto parecia difícil, fazia

defumadores de semente de mostarda e chás para ajudar meninos a nascerem. Morreu aos 55

anos porque tomava muita friagem, andava demais na sua missão de parteira. Diz que teve

épocas de muitas dificuldades, comiam erva ora-pro-nóbis em farofa, que era o único alimento.

● Alzira Cordeiro Machado nasceu e vive no Mata Dois e diz que queria muito estudar, mas o

pai não deixou, assim que ficou analfabeta e se ressente disso. Diz que os seus irmãos

foram pra escola, mas também trabalhavam na roça pela manhã. Teve onze filhos e um

deles mora com ela, mas ela se mostra muito preocupada, pois ele gosta de frequentar o

bar e beber ficando pouco sociável.

● José Joaquim Alves Machado, chamado, Tinem, diz que casou viajou e trabalhou no

quebra bateia (garimpo), vivia no Gravatá de baixo. Ficou viúvo e veio pro Mata Dois e

mora aqui casado com outra companheira. Diz que trabalhou muito tempo no corte de cana

(migração) e parou quando aposentou.

● Maria Aparecida Alves Macedo nasceu aqui e foi trabalhar em São Paulo.

● Maria Bento dos Santos nasceu no Córrego Grande e veio para aqui, onde diz ter muita

união. Tem dez filhos todos empregados.

● Maísa Aparecida Gomes Machado, 10 anos, estuda no 5º. ano.

● Maria Elisa Moreira Gomes Machado, 49 anos, veio com 17 anos com a família, e depois

casou com pessoa daqui do Mata Dois.

● José Eustáquio Machado nasceu aqui e mora em São Paulo, em Ferraz de Vasconcelos.

Está na comunidade no momento para construir uma casa. Em São Paulo é armador de

ferragem para a construção civil. Trabalhou por 25 anos em São Paulo e perdeu uma vista,

durante acidente de trabalho. Aposentou-se e agora pretende voltar a morar na

comunidade.

● Eva Maria Soares, 47 anos, tem um filho de 19 anos e tem uma mãe, da. Alice Rodrigues

Pereira com 85 anos, que ela cuida. Tem também uma tia com 96 anos. Eva trabalha em

serviços gerais na escola na cidade, diz que levanta as 4hs da madrugada. Conta como

uma coisa ruim que passou foi que ela tinha um irmão gêmeo. O pai e a mãe foram para

Guariba/SP pra trabalhar e houve um acidente com o irmão e quando soube que Eva

estava grávida, o pai foi embora. Ela cuida da mãe.

● Diego e Tatiana,18 anos, são jovens e estiveram na roda de conversa dos jovens.

● Maria Aparecida Ramos Machado morou no Ribeirão do Meio e em Barra, agora aqui. Faz

serviços domésticos.

● Helena Soares Macedo tem filha de 16 anos. Nasceu aqui e os pais moram fora. Já foi

colher laranja, café e trabalhou em casa de família. Hoje capina e amasiou, segundo ela,

com um dos Machados e vive aqui.

● Claudiane Soares Rodrigues, 22 anos. Estudante no 3º.ano, nasceu em Minas Novas e

casou com moço daqui do Mata Dois.

● Maria de Lurdes Machado Soares, 43 anos, nasceu casou e mora aqui.

● Osvaldo Alves Machado nasceu aqui e morou 22 anos em São Paulo, aposentou e voltou

pra Mata Dois.

www.ancestralidadeafricana.org.br

17

● Antonio Soares Machado nasceu e mora aqui, mas vai pra migração . Atualmente está

trabalhando na construção civil em Minas Novas.

● Santa Machado Costa é coordenadora da Comunidade e diretora da Associação do

Macuco.

Fica logo claro, que muitos deles tem por sobrenome Machado. Qual o motivo? Do que se

lembram a comunidade começou com dois irmãos. Lembram-se do Sr. Antonio Machado,

casado com Rosa Machado, e era avô do Sr. José Joaquim, o Sr. Tinem. Daí as pessoas

foram se casando, muito entre os próprios quilombolas. A história não vai muito a frente.

Contam que a maioria dos homens sai pra trabalhar nas safras de cana de açúcar ou café,

laranja em São Paulo.

Repetem a história dos dois homens que encontraram ouro e não queriam dividir, assim que

um matou o outro e ambos caíram e se afogaram no rio, daí que chamou Mata Dois.

A escola que tinha no quilombo também foi fechada e isso gera uma discussão sobre se é

melhor ou não. Os jovens dizem que é muito melhor ir pra cidade, conhecem mais gente, se

relacionam mais. Algumas mulheres mais novas dizem que fizeram a escola no quilombo e que

verificou que quando vai estudar o colegial ou quando comparam o que os filhos aprendem na

cidade se dão conta de que aprenderam muito pouco, pois aqui a escola tinha uma professora

para ensinar para as quatro séries na mesma sala, e isso confundia muito a cabeça, além de

não dar tempo de dar toda a matéria.

Quando alguém levanta da oportunidade de haver uma escola para os quatro quilombos, o que

teria mais crianças e poderia ter as quatro séries, concordam também que teria que ter ônibus

que pegasse as crianças em casa de cada um dos quilombos para levar e trazê-las, pois são

muito distantes e ruins os caminhos.

A comunidade tem um posto médico, de fato, uma sala cedida na casa do Sr. Joaquim Alves

Machado, onde atende a cada dois meses. Dizem que no Macuco tem um agente de saúde

que mede a pressão, pesa gestante, bebês, vacinação e marca consultas para medico e

dentista na cidade.

Tem um poço artesiano e a Eva controla a distribuição da água e tenta solucionar os

problemas que volta e meia surgem com essa distribuição.

www.ancestralidadeafricana.org.br

18

23-2-2013 – Macuco – Encontro com os Jovens

Sábado de manhã marcamos com os jovens de todos os quilombos que compõem a

Associação, na sua sede.

Apesar de ter muitos jovens naquela população, vieram relativamente poucos – a maioria do

próprio quilombo do Macuco, que ficava mais perto, além de mais três que vieram do Mata

Dois.

Com os jovens, após a apresentação, a conversa demorava a fluir – eles se mostram muito

menos tímidos quando em reunião com o conjunto do seu quilombo.

Todos estudam, duas das meninas disseram que ajudam nos trabalhos de casa e quatro dos

rapazes, que ajudam na roça da família.

A primeira conversa foi sobre os seus planos, e eles afirmam que pensam como se organizar

para o seu futuro principalmente, enquanto uma das moças, que pretende fazer medicina disse

que pensa na sua função social.

Os planos são de ampliar os estudos para melhorar a vida.

Os rapazes maiores tem oportunidade de fazer Cursos Técnicos em Agropecuária em

Veredinha, onde podem passar uma quinzena na própria escola que é pública e tem um

alojamento para hospedá-los. Com isso os que para lá se dirigem fazem o colegial durante o

dia e a escola técnica à noite. Os dois que estão cursando se mostraram insatisfeitos com a

escolha e pretender cursar informática.

As meninas que pretendem fazer o curso técnico em agropecuária tem mais dificuldades pois

dependem de conseguir formar uma turma para a escola abrir o curso. Uma das jovens cursa o

Magistério, que é a única alternativa existente em Minas Novas. Duas delas pretendem estudar

engenharia e uma, medicina dizem que precisam ir morar em Belo Horizonte, onde tem

parentes que podem acolhê-las.

Os que ainda cursam o ensino fundamental e ensino médio vão todos os dias para Minas

Novas e se mostraram contentes com isso. Dizem que quando tinha a escola no quilombo, por

conta da quantidade de estudantes, havia uma professora que ministrava curso para todas as

séries na mesma sala, o que dificulta o aprendizado.

Com relação ao lazer, passeios e festas – dizem que tem muito pouco e raramente saem, pois

teriam que ir a Minas Novas e o transporte é difícil.

Gostam de música, e inclusive alguns dos rapazes presentes disseram que tocam órgão e

violão. Também que em Mata Dois tem uma banda ‘Serena’ formada por moradores jovens.

Afirmam que há poucas festas na região. Eles falam das festas do Rosário, Carnaval, Semana

Santa na cidade, mas alegam que não se interessam em participar. As festas estão mudando,

perdendo a tradição, tem muito luxo e pouca tradição. O Congado conta a história do passado.

Esses jovens além dos que estiveram nas reuniões da comunidade mostraram interesse com o

Ponto de Leitura e a oportunidade de aprender mais sobre as suas identidades como

negros/negras e quilombolas. Dizem ter orgulho de serem quilombolas, e a conversa gira sobre

os muitos preconceitos que sofreram em épocas anteriores por conta da sua cor e afirmam que

atualmente mudou bastante, são menos discriminados.

Começam uma história fantástica de que as vezes aparecem pela mata uma luz de fogo.

“Onde tem luz é porque tem ouro”. Contam que antes tinha muito ouro naquele espaço. Um dia

apareceu uma luz de fogo, muito forte e sumiu. Um deles diz que o seu pai já viu. Outra vez

apareceu uma ‘bonequinha de fogo’ e a pessoa foi atrás, o fogo entrou na terra e sumiu.

Ninguém confirmou que acharam ouro depois nos lugares!

Contam que atualmente, apesar da pouca chuva ainda é tempo bom, o problema é a seca de

julho em diante, em agosto é o ‘tempo duro’.

www.ancestralidadeafricana.org.br

19

Estiveram presentes – Samuel, 15 anos, faz o 1º.ano e ajuda na roça; Lucas, 16ª e Jair, 18a,

estudam agrotécnica em Veledinha; Olavo, 15a, 9º ano e trabalha na roça; Carina, 16a, 2º.ano

e trabalha em casa, Diego, 15a estuda no 2º.ano e trabalha na roça; Tatiana, 18ª e faz 3º.ano e

trabalha em casa; Letícia, 6a e está no 1º.ano; Eduardo, 10a está na 4ª.serie, Daniel, 9a, 3ª.

Serie; Samuel, 10 a. 3ª.serie; Pedro, 7 a, 2ª.serie; Caetano, 17 a ajuda na roça.

Estiveram presentes também duas mulheres adultas, Rosimar e Dona Silvia de 67 anos,

lavradora.

www.ancestralidadeafricana.org.br

20

23-2-2013 – Macuco – Encontro com mais idoso - Dona Maria Nunes Rodrigues, 93 anos

Nascida e criada na Comunidade de Macuco se casou aos 19 anos e teve sete filhos e é viúva

há 14 anos. Filha de dona Maria Nunes de Oliveira e senhor Modesto Rodrigues Machado

(lavrador), neta de dona Luzia (avó materna), teve 13 irmãos de mãe e pai, e quase 20 outros,

pois o pai casou-se por duas vezes.

Alguns irmãos: Antonio Machado, Mané Machado. Pedro machado, sobrinho.

Lembra que no começo tinha umas três famílias na comunidade. Em Macuco, nome de um

pássaro, tinha um rio muito grande e muitos pássaros.

Dona Maria diz que o passado foi muito ruim. Pra ajudar criar os filhos lavava roupa para as

pessoas da comunidade e ia a Minas Novas 4 vezes na semana. Também vendia leite do

irmão a ‘meia’ – o irmão tinha o gado, ela ia a Minas Novas vender e dividiam o dinheiro.

Sempre que podia ‘ia pro rio bateiar’ (garimpava) pra achar algum pouco de ouro pra comprar

comida. O marido trabalhava na terra, na roça.

Ela era muito pobre, não tinha comida, roupa (conta que uma vez não tinha roupa para vestir o

filho e este sentia tanto frio, que ela pediu e recebeu de doação de uma comadre, um vestido

para cobri-lo, e ele ficou extremamente contente). Da. Maria conta que já passou muita fome

com o marido e os filhos, tempos de muita seca, tempos em que tinha que comer qualquer

folha do mato e não conseguia dinheiro pra poder comprar.

Criou seus filhos todos com remédios caseiros. Conhecia os chás que dava como remédio,

hortelã, poejo, sabugueiro e outros.

Um filho dela, quando conseguiu emprego ‘na migração’ construiu uma casa pra ela morar.

Diz que sua vida só melhorou quando conseguiu a aposentadoria – tem um salário todo mês,

daí é que pôde comprar uma mesa, uma geladeira, um fogão a gás...

Atualmente tem uma filha que mora perto e a uma nora que cuida dela.

Já foi muito em festas, e dançou nove anos no Congado. Havia mutirão de homens e mulheres

dançando. Principalmente na festa de Na. Sra. do Rosário.

www.ancestralidadeafricana.org.br

21

19-2-2013 Macuco - Entrevista com Mestre Antonio Bastião

Vamos aprendendo um pouco do que é viver em Minas Novas- se desde ontem o dia todo

estamos sem sinal no celular do único provedor, TIM, hoje, além disso, amanhecemos também

sem energia elétrica. “é uma constante ... esse sinal de telefonia funciona um dia, no outro

não”. No nosso dia, tudo voltou a funcionar por volta das 13 hs.

Pela manhã, fomos até a Secretaria da Cultura, já que andar era o único meio de comunicação.

Não encontramos o secretário, mas pudemos observar um museu com objetos e documentos

antigos e uma pequena exposição dos artesãos da região. Consta principalmente de produção

de barro, - jarros, vasos e figuras, tecidos de teares, de tricô e de palha.

19-02-2013 - Conversa com Mestre Antonio Bastião

Figura 1: Mestre Antônio Bastião, durante entrevista ao Projeto de Memória da Ancestralidade Africana nos Pontos de

Leitura Tematicos. Crédito: Cintia Sampaio

Para chegar a sua casa, basta perguntar pela cidade, que todo mundo conhece e vai

indicando.

Mestre Antônio Luiz de Matos, ou Antonio Bastião, é referencia por sua arte de luteria de

tambores e caixas de linha africana e por suas muitas apresentações, oficinas, prêmios e

caminhos na cultura popular.

Mestre Antônio diz que ‘mora mesmo na sua roça’, na comunidade de São Bendito do Capivari,

zona rural de Minas Novas, tem 70 e poucos anos. Mas tem também uma casa em Minas

Novas onde passa alguns dias da semana, onde tem muitas sacolas de documentos e

gravações em CD-ROM e DVD de suas apresentações, oficinas e pelas paredes, grande

quantidade de certificados, desde premiações e reconhecimento de sua identidade de Mestre,

como das muitas oficinas a que foi convidado a ministrar.

Entre esses certificados ele nos mostra um onde foi reconhecido como Mestre artesão lutier em

27/2/2001 pela Fundação Artística de Ouro Preto (FAOP), que ele chama de “patente”. A partir

dai o Mestre passou a ministrar oficinas sobre seus conhecimentos de luteria e se tornou uma

figura representativa do Vale do Jequitinhonha e das artes da produção de tambores, dos

melhores em qualidade e como o único mestre artesão que domina o oficio de “tamborzeiro”

(conforme Revista Raiz,

www.ancestralidadeafricana.org.br

22

http://revistaraiz.uol.com.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=342&Itemid=1

90

Também conta que esteve em uma reunião de mestres tamborzeiros do mundo inteiro, no

Cariri.

Em sua linhagem ele lembra de sua bisavó, Tereza, que era uma índia fugida, de Salina.

Fumava cachimbo e era mãe do seu avô Artur, que de fato foi quem o criou e ensinou as artes

de tambozeiro. Dona Tereza segundo diz era índia fugida que se escondeu no mato e foi

‘pegada por cachorro’ do caçador, que a encontrou no mato. Ela talvez não foi escravizada,

mas alguém perto dela foi, pois ela contava e também ela escondia o corpo, e não gostava de

mostrar, pois tinha sinal de chicotada e também outra mulher por perto, da. Rosa, que tinha

marcas de ferros nos pés.

Seu avô paterno, Artur Luiz Pereira dos Santos, ou Artur Barreiro, era tropeiro, garimpeiro,

construiu uma olaria em Bananal, perto de Teófilo Otoni, veio fugido pra região. A sua avó

paterna, Flozinha, fazia peneiras, era ‘bugre’ (segundo ele, os bocudos africanos), e tinha

conhecimento sobre as plantas curativas e as histórias; também era parteira e caminhava por

toda a região ajudando as mulheres no parto. O pai, Sebastião Luiz dos Santos, quando a mãe

Maria das Dores de Matos morreu foi para o Paraná, e quando voltou, morreu logo. Sua tia

Luzia, irmã do seu pai tinha um terreiro em Belo Horizonte, mas a filha desta não continuou

depois de sua morte.

A partir dos conhecimentos ensinados por seu avô e sua avó, Mestre Antonio constrói os

instrumentos, tambores ‘de linha africana’, como os denomina o Mestre, e que são utilizados

pelos grupos de músicas regionais, como o Congado de São Benedito, a Banda de Taquara,

Tamborzeiros da Irmandade do Rosário, entre outras.

Construir instrumentos se constitui num ritual sagrado para Mestre Antonio – de permissões,

busca, cheiros, toques e audição do som que indica o material adequado na mata. Segundo

ele, a mata – o Rei da Mata exige respeito. “houve um tempo em que os homens e as plantas

conversavam, depois elas pararam de falar e de ouvir”, ele nos diz.

(Nós pesquisadores poderíamos perguntar – se não será que os humanos é que se

afastaram da natureza e que já não podemos ouvi-los, deixamos de compreender a

fala da mata e dos animais?)

Desde o seu reconhecimento como Mestre Artesão Lutier passou a ministrar oficinas para

ensinar grupos todas essas suas artes – e isso justifica todos os certificados que ele guarda

nas paredes e em sacolas em sua casa. São muitas oficinas que realiza e diz 'vou continuar

ensinando até que eu tenha vida.”

Conta-nos que está construindo na sua roça um espaço de história da trajetória de seu avô e a

sua própria. Um lugar pra deixar para os netos, bisnetos e para o mundo, que para que não

esqueçam e possam continuar nessa arte.

Museu da Pessoa registrou a história do Mestre Antônio, que é apresentada no seu livro

impresso e faz parte do acervo na página de internet - www.museudapessoa.net

www.ancestralidadeafricana.org.br

23

23-2-2013 – Macuco – Itamar Alves de Souza – Assessor e Articulador da Associação e

de comunidades quilombolas no Vale do Jequitinhonha.

Itamar vincula-se a uma ONG – ASCOP, que fica em Minas Novas e tem a sede na CEADES,

em Chapecó. O Ceades é uma organização grande e tem muitos projetos com trabalhadores

rurais e quilombolas.

Conta que já trabalhou em muitas coisas, teve bar, vendas, etc e a partir de 2003 tem se

dedicado a comunidades quilombolas. Ele percorre a região, visitando-as, algumas como

trabalho, outras como trabalho voluntário, procurando contribuir.

Diz que em Minas Novas tem 15 quilombos identificadas pelo Cedefes, sendo três certificadas

pela Fundação Palmares.

São comunidades/Associações: Bem Posta, Ribeirão da Folha, Quilombo (que reúne 5

quilombos), Cabeana, Moeur (4 quilombos), Maria Pinto, Macuco (4 quilombos). A comunidade

Nagô, apesar do nome não é quilombola. Itamar diz ter contato com todas elas, em 23

municípios do Vale do Jequitinhonha (que é muito maior e tem muitos outros).

Existe uma série de direitos a partir da certificação de quilombos, e o município também pois

passa a receber recursos para melhorar o atendimento à esta população:

- como o valor da merenda que deve ser o dobro para os quilombolas, tem diversas linhas de

crédito que se destinam a melhorias para comunidades. Cita como exemplo a disponibilidade

de recursos para construir e equipar escolas e casa para o professor/a dentro dos quilombos, o

que a Prefeitura de Minas Novas ignorou. Atualmente há também linhas de crédito para

beneficiar o trabalho rural, distribuição de tratores, prainadeiras, etc disponíveis para os

municípios utilizarem exclusivamente às melhorias das comunidades remanescentes de

quilombos.

- Todos identificados podem participar dos editais públicos.

- Tem o programa de cisternas para os lavradores, cuja ampliação está em curso no momento.

- Próximos – são dedicados às mulheres educadoras de saúde, produção ambiental,

independente da certificação e do município

- Tem relação direta com o governo federal.

- Diz que existem leis que obrigam a ter escola nos quilombos, ou a proibição dos meninos e

meninas quilombolas serem transportados para a escola da cidade.

Problema da água

No Macuco houve muita desmata das nascentes. Diz que o problema das reflorestadoras como

causadoras da seca é real, mas se refere a outras regiões do município.

Minas Novas foi o primeiro município brasileiro a ter barragens (barraginhas, que resulta de um

estudo técnico para construir pequenas barragens no rio, que funciona como retenção e

umedecedor do solo ao redor para o plantio. Existem seis mil barraginhas no município. Tem o

programa das cisternas de placas (que facilita a construção, pois já vem pronta e é só montar,

diferente das anteriores que tinha que construir no local e as vezes dava problema de

vazamentos ou inadequação com a terra do lugar.

Considera que o problema da água é a necessidade de assistência a agricultura, num

programa de convivência com a seca, estimulando plantios mais adequados a região.

Panorama da Associação do Macuco.

Negros. No inicio tinha 70 famílias ligadas a Associação. Aumentou a participação, com os

benefícios e conquistas como o autorreconhecimento, conquistas sociais, recebeu dois

ministros, construiu a sede, tem benefícios do governo do Estado e Federal, editais etc.

www.ancestralidadeafricana.org.br

24

Considera que no momento se faz necessário um programa de maior reconhecimento dos

direitos conquistados e de empoderamento dos programas sociais.

Mais conhecimento da lei 10639.

Tem que solucionar a questão de ter admitido mais gente de fora do quilombo e aumentado

muito o número de famílias que dividem entre si os benefícios.

Será necessário trabalhar a cláusula de venda da terra, pois não se estabelece no estatuto, o

fato de que as terras, os terrenos individuais somente podem ser vendidos para pessoas do

próprio quilombo. Com a mudança de famílias para outras cidades, e a venda das terras,

correm o risco de integrar pessoas não quilombolas.

www.ancestralidadeafricana.org.br

25

Entrevistas com o governo local

21-2-2013 Entrevista com Secretaria Municipal de Educação

Articulado pelo Secretário da Cultura, tivemos um encontro com a Secretaria de Educação do

Município, Sra. Maria Lina Silva Guedes, que nos recebeu atenciosamente, e pudemos

observar que é bastante atenta quanto as questões de sua área, inclusive como professora da

rede estadual.

Ela também iniciou neste ano a sua função e nos disse que tem saído a visitar algumas

comunidades quilombolas, mas que ainda não conhecia a Associação do Macuco.

Apresentamos as entidades, o nosso projeto e as questões referidas ao funcionamento e

atividades do Ponto de Leitura de Matriz Africana.

Mostrou-se interessada em conhecer quais as ações esperadas da Prefeitura para este Ponto

de Leitura e inclusive em visitar a Associação.

Consideramos que seria interessante ela conversar com a Associação para essa parceria. Nos

dias seguintes consultamos os integrantes da Associação sobre a conveniência de convidá-la

para a reunião no próximo domingo, quando faríamos a devolutiva de nossa pesquisa na

semana. Assim, convidamos a Secretária que aceitou e esteve presente no domingo,

conhecendo e conversando com os integrantes da Associação.

19-2-2013 - Entrevista com Secretaria Municipal de Cultura

Dada a intermitência de sinal de celular na cidade, sempre foi difícil conseguir agendar

conversas por telefone.

Depois de vários recados, visitas pessoais etc., conhecemos e conversamos com o Secretário

da Cultura João André.

A entrevista foi rápida, pois ele nos alcançou na casa do Mestre Antônio, onde estávamos

fazendo outra entrevista.

Falou de sua recente posse no cargo e que ainda está se familiarizando com as possibilidades

e projetos da cultura.

Iniciou-se uma discussão sobre a Lei 10.639/032, e o Secretário considerou a importância de

um encontro com a Secretária da Educação, o que se empenhou em agendar.

2 A Lei 10.639/2003, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/1996), e inclui no currículo

oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira". Os conteúdos devem ser

ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e

História Brasileiras (Seppir, 2013).