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--- , ç 1! I J " } I , t ~ I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, com projeto inserido na linha de pesquisa "Direitos sociais no contexto dos direitos humanos': Mestre em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba e especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Professor da disciplina de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Procurador do Trabalho em Campinos/SP Direitos Humanos Inclui: Teoria Geral dos Direitos Humanos, Direitos FUndamentais na Constituição e Direito in- ternacional dos Direitos Humanos. Principais temas dos conteúdos programáticos de todos os concursos de carreira e do Exame Unificado de Ordem Assuntos mais relevantes tratados no ensino de graduaçáo Análise de decisões das Cortes nacionais e internacionais Abordagem mais aprofundada, indicada para provas objetivas e dissertativas Sistematização do conteúdo relevante em ilustrações Resolução de questões Revisão final 2015 2 a edição EDITORA jUsPODIVM www.editorajuspodivm.com.br

Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

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Page 1: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

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SILVIO BELTRAMELLI NETODoutorem Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade

de Satildeo Paulo com projeto inserido na linha de pesquisa Direitos sociais no contextodos direitos humanos Mestre em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba

e especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifiacutecia UniversidadeCatoacutelica de Campinas Professor da disciplina de Direitos Humanos da Faculdade

de Direito da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de CampinasProcurador do Trabalho em CampinosSP

DireitosHumanos

Inclui

Teoria Geral dos Direitos Humanos Direitos FUndamentais na Constituiccedilatildeo e Direito in-ternacional dos Direitos Humanos

Principais temas dos conteuacutedos programaacuteticos de todos os concursos de carreira e doExame Unificado de Ordem

Assuntos mais relevantes tratados no ensino de graduaccedilaacuteo

Anaacutelise de decisotildees das Cortes nacionais e internacionais

Abordagem mais aprofundada indicada para provas objetivas e dissertativas

Sistematizaccedilatildeo do conteuacutedo relevante em ilustraccedilotildees

Resoluccedilatildeo de questotildees

Revisatildeo final

20152a ediccedilatildeo

EDITORAjUsPODIVM

wwweditorajuspodivmcombr

EDITORAjusPODIVM

1JoNoIWedito raj uspod ivm com b r

Rua Mato Grosso 175 - Pituba CEP 41830-151 - Salvador - BahiaTel (71) 3363-8617 I Fax (7I) 3363-5050 E-mail faleeditorajuspodivmcombr

Conselho Editorial Eduardo Viana Portela Neves Dirley da Cunha Jr Leonardo de Medeiros GarciaFredie Didicr 1r Joseacute Henrique Mauta Joseacute Marcelo Vigliar Marcos Ehrhardt Juacutenior Nestor TaacutevoraRobeacuterio Nunes Filho Roberval Rocha Ferreira Filho Rodolfo Pamplona Filho Rodrigo Reis Mazzeie Rogeacuterio Sanches Cunha

Capa Rene Rueno e Daniela Jardim (wwwbllenojardimcombr)

Diagramaccedilatildeo Maitecirc Coelho (maifescoelhoyahoocombr)

Todos os direitos desta ediccedil~o reservados acirc Ediccedilotildees JlIsPODlVM

Copyrighf Ediccedilotildees JusPODlVM

Eacute tennillanlemente proibida a reproduccedilatildeo total ou parcial desta obra por qualquer meio ou processo sem a expressaaulorizaccedilatildeo do autor e da EdiccedilotildeesJlIsPODlVM A violaccedilatildeo dos direitos autorais caracteriza crime descrito na legislaccedilatildeoem vigor sem prejui20 das sanccedilotildees civis cabiacuteveis

Ao Rafael filho amado

Aos meus professores e alunoscomo singelo agradecimento pela diferenccedila que fizeram e fazem na minhavida

5

SILVIO BHTllAMpoundLLI NETO

uacuteltimo oacutergatildeo mencionado no ato que constituiu a UNI Tal fusatildeo pretende criarum uacutenico oacutergatildeo jurisdicional com competecircncia para apreciar casos relativos a di-reitos humanos e a outros temas afetos a UA em seccedilotildees especializadas de juiacutezesEsse protocolo de 2008 foi ateacute o momento assinado por apenas cinco Estadonecessitando no entanto de quinze adesotildees para entrar em vigor72 Prevista amanutenccedilatildeo da sua sede em Arusha na Tanzacircnia esta nova Corte permaneceriadependendo da declaraccedilatildeo autorizadora expressa dos Estados para receber apeticcedilatildeo de indiviacuteduos

Ainda no acircmbito da UA deliberouse em 2003 a implementaccedilatildeo do Mecanis-mo Africano de Revisatildeo Pelos Pares (African Peer Review Mecanism) que aexemplo do RPU- Revisatildeo Perioacutedica Universal existente junto acirc ONU aposta naevoluccedilatildeo da efetividade dos direitos humanos baseada no diaacutelogo construtivoentre naccedilotildees Esse mecanismo tem por objetivo promover a adoccedilatildeo de poliacuteticasnormas e praacuteticas voltadas agrave estabilidade poliacutetica ao crescimento econocircmicoao desenvolvimento sustentaacutevel e agrave aceleraccedilatildeo da integraccedilatildeo econocircmica sub--regional e continenta173bull

7l UNIAtildeOAFRICANAprotocol on The Stature of the Africon Court of justice And Human Rights Disponiacutevel emhn pllwwwauintensilesdelaultfil espROTOCOl_STATUTE_AFRICAN~COURT_ JUSTlCE_ANO_HUMAN_RIGHTSpdfgt Acesso em 1S jan 2015

72 UNIAtildeOAfRICANAlist of Countries Which Have Signed RatifiedAcceded to lhe Protocol on rhe Statute of rheAfricon COllrt of jusfice Ilnd Humon RighIS Disponiacutevel em httpwwwauintensitesdefaultfIIesproto-co 1200n20Sta tuteb200f20the20Africa n20Court2ool20J usl ice2oa nd k20HRpdff Acesso em 15jan 2015

73- AFRICANPEERREVIEWMECANISMMission Disponiacutevel em hupaprm-auorgmissiongt Acesso em 15 jan2015

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Capiacutetulo VJl

Efetividade do DireitoInternacional dos Direitos

Humanos no acircmbito nacionalSumaacuterio 1Os sistemas de proteccedilatildeo internacional frente ao direito interno - 2 Cumpri-mento das decisotildees dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos - 3 Osagentes do Estado e o dever de observar o Direito Internacional dos DireitosHumanos _ 4Osdireitos sociaisdentro dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos - 5As instacircncias juriacutedicas nacionais e o Direito Internacional dos DireitosHumanos da retoacutericaagrave praxe

1 OS SISTEMAS DE PROTECcedilAtildeO INTERNACIONAL FRENTE AO DIREITO IN-TERNO

Interessa agora evidenciar o quatildeo interativos e mutuamente influentesdevem ser o direito brasileiro e o Direito Internacional dos Direitos Humanos(DIDH) assim potencializando o avanccedilo pracirctico da proteccedilatildeo da dignidade dapessoa humana

Sob esta inspiraccedilatildeo e de antematildeo haacute que se superar o claacutessico debateentre as correntes monista e dualista historicamente travado nas fileiras dodireito internacional Eacute que a polecircmica envolvendo a existecircncia ou natildeo de duasordens juriacutedicas distintas e estanques (a domeacutestica e a internacional) soacute fazprejudicar a efetividade dos direitos humanos A uma porque tanto os direi-tos nacionais (em regra) quanto o direto internacional encontram-se hodier-namente calcados na concepccedilatildeo material central da proteccedilatildeo intransigenteda dignidade da pessoa humana denotando unidade de significado A duasporque como visto o monitoramento e a apuraccedilatildeo da violaccedilatildeo de direitoshumanos no plano internacional foram construiacutedos como espaccedilos imbuiacutedos doobjetivo de fazer avanccedilar a mateacuteria na seara interna dos Estados E finalmentea trecircs porque a Constituiccedilatildeo Federal de 988 expressa e definitivamente ad-mite-se natildeo exaurida em seu proacuteprio texto mas ao contraacuterio complementadano que tange aos direitos humanos pelas normas internacionais sobretudo nostermos dos ~ 2deg do seu art 5deg Jaacute desde o texto constitucional portanto vecirc-seque o ordenamento juriacutedico brasileiro compreende o Direito Internacional dosDireitos Humanos dele natildeo se separando

Nesta linha intensa criacutetica deve ser dirigida aos movimentos de retrocessodo Estado brasileiro em se tratando de submissatildeo aos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo dos direitos humanos ainda que tais movimentos felizmente natildeorepresentem tendecircncia nos dias de hoje

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------~~~~~------~--9_SILVIO BmRAMELlI NETO

A este propoacutesito cite-se por exemplo a natildeo submissatildeo brasileira agrave jurisdiccedilatildeoda Corte Internacional de Justiccedila e a natildeo autorizaccedilatildeo ao Comitecirc sobre os DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais e ao Comitecirc sobre os Direitos da crianccedila parao recebimento e apuraccedilatildeo de peticcedilotildees individuais acerca do descumpriment~pelo Brasil respectivamente da Convenccedilatildeo sobre Direitos Econocircmicos Sociais eCulturais e da Convenccedilatildeo sobre 05 Direitos da Crianccedila ratificadas pelo paiacutes nomarco da ONU Igualmente mencione-se a denuacutencia brasileira agrave Convenccedilatildeo nO158 da OITsobre o teacutermino da relaccedilatildeo de trabalho por iniciativa do empregador(ratificada em 1995 e denunciada em 1996)

O uso da denuacutencia a tratados como instrumento de mitigaccedilatildeo dos compromis-sos internacionais contudo vem tendo cada vez menos forccedila para desvincularos Estados das obrigaccedilotildees relacionadas aos direitos humanos notadamente emrazatildeo da irrefreaacutevel consolidaccedilatildeo das normas costumeiras e das normas impe-rativas (jus cogens) como produto de um consenso qualificado obtido no seioda comunidade internacional e sufragado pelas instacircncias de monitoramento eapuraccedilatildeo de violaccedilotildees para aleacutem do vetusto apego agrave loacutegica da ratificaccedilatildeo comocondiccedilatildeo sine qUQ non para a responsabilizaccedilatildeo estatal por afronta a direitoshumanos

Esta substituiccedilatildeo do consentimento estatal pelo consenso muito bem iden-tificada por CANCcedilADOTRINOAOEe aqui estudada quando da abordagem do temadas fontes do direito internacional se revela em inuacutemeras ocasiotildees respeitan-tes aos sistemas internacionais de proteccedilatildeo de direitos humanos tais como aimputaccedilatildeo de cogecircncia pelos oacutergatildeos quase-judiciais e judiciais agraves Declaraccedilotildeesde Direitos Humanos (ex vi a Declaraccedilatildeo Universal e a Declaraccedilatildeo Americana) ogradual reconhecimento da existecircncia de normas imperativas pela jurisprudecircnciainternacional e a adoccedilatildeo da Declaraccedilatildeo de Princiacutepios e Direitos Fundamentais doTrabalho pela 01T

Sob o prisma brasileiro encontra-se vigente um rico arcabouccedilo de normas einstrumentos procedimentais internacionais aos quais cumpre dar maacutexima efeti-vidade na dimensatildeo domeacutestica Mas se eacute assim por que entatildeo a despeito detiacutemidos avanccedilos em situaccedilotildees pontuais a maioria dos paiacuteses engajados nos sis-temas de proteccedilatildeo internacional dos direitos humanos ainda encontra resistecircnciaem fazer valer sobretudo no campo juridico os padrotildees de interpretaccedilatildeo asrecomendaccedilotildees e as decisotildees dos diversos oacutergatildeos de monitoramento e apuraccedilatildeode violaccedilatildeo integrantes dos mecanismos internacionais de proteccedilatildeo Para falarde Brasil por que os Trecircs Poderes do Estado brasileiro satildeo tatildeo timidos quandose trata de atuar expressamente com base nas normas e na jurisprudecircncia pro-duzidos por exemplo pelos oacutergatildeos do sistema interamericano de proteccedilatildeo dosdireitos humanos Esse eacute um tema aacutespero e ao mesmo tempo decisivo para atatildeo buscada efetividade do DIOH

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EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS NO AcircM81TO NACIONAL

Paradoxalmente agrave vista das normas em vigor natildeo haacute qualquer duacutevida deque os Estados submetidos agraves instacircncias internacionais protetoras dos direitoshumanos estatildeo obrigados como jaacute estudado em absolutamente todas as suasinstacircncias (administrativas legislativas e judiciaacuterias) a respeitar (natildeo intervir)proteger (legislar e criar aparato que coiacuteba as violaccedilotildees) e promover (adotarpoliacuteticas que fomentem o gozo efetivo) as normas de DIOHque lhes sejam apli-caacuteveis Tal obrigaccedilatildeo juriacutedica embora decorra logicamente o princiacutepio da boa-feacuteque rege a celebraccedilatildeo e a interpretaccedilatildeo dos tratados internacionais (art 3 daConvenccedilatildeo de Viena) eacute corriqueiramente enunciada nos pactos Cite-se a essepropoacutesito os seguintes enunciados normativos

Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos (ONU)

Artigo 2

lo Os Estados Partes do presente pacto comprometem-se a respeitar e ga-rantir a todos os indiviacuteduos que se achem em seu territoacuterio e que estejamsujeitos a sua jurisdiccedilatildeo os direitos reconhecidos no presente Pacto semdiscriminaccedilatildeo alguma por motivo de raccedila cor sexo liacutengua religiatildeo opiniaopoliacutetica ou de outra natureza origem nacional ou social situaccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer condiccedilatildeo

2 Na ausecircncia de medidas legislativas ou de outra natureza destinadas atornar efetivos os direitos reconhecidos no presente Pacto os Estados Partesdo presente Pacto comprometem-se a tomar as providecircncias necessaacuteriascom vistas a adotaacute-Ias levando em consideraccedilatildeo seus respectivos procedimentos constitucionais e as disposiccedilotildees do presente Pacto (destacado)

Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos (OEA)

Artigo 1deg - Obrigaccedilatildeo de respeitar os direitos

lo Os Estados-partes nesta Convenccedilatildeo comprometem-se a respeitar os di-reitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exer-ciacutecio a toda pessoa Que esteja sujeita agrave sua jurisdiccedilatildeo sem discriminaccedilatildeoalguma por motivo de raccedila cor sexo idioma religiatildeo opiniotildees poliacuteticas oude qualquer outra natureza origem nacional ou social posiccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer outra condiccedilatildeo social

c)

Artigo 2deg - Dever de adotar disposiccedilotildees de direito interno

Se o exerciacutecio dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda natildeoestiver garantido por disposiccedilotildees legislativas ou de outra natureza os Es-tados-partes comprometem-se a adotar de acordo com as suas normasconstitucionais e com as disposiccedilotildees desta Convenccedilatildeo as medidas legislati-vas ou de outra natureza que forem necessaacuterias para tornar efetivos taisdireitos e liberdades (destacado)

Na mesma linha estatildeo redigidos o art 2deg do Pacto Internacional de DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais (ONU) e os arts O e 2deg do Protocolo de San Sal-vador (OEA)

38

SILVIO BElTRAMUU NElo

Conforme adverte de forma enfaacutetica PEDRONIKKENexJuiz e ex-Presidenteda Corte IOH disposiccedilotildees normativas como as citadas de aplicaccedilatildeo imediata(autoexecutaacuteveis ou selfexecuting) impotildeem deveres de respeitar garantir satisfazer proteger e legislar deixando claro que o Estado eacute juridicamente o ente chomado a por em execuccedilatildeo o sistema internacional de proteccedilatildeo de direitos humanosltAfinal o OIOHnatildeo passaria de ficccedilatildeo se natildeo produzisse efeitos diretos nos planosdomeacutesticos dos Estados aos quais se direciona

Eacute nesta perspectiva consagrada pelo art 27 da Convenccedilatildeo de Viena sobre oOireito dos Tratados (Uma pane natildeo pode invocar as disposiccedilotildees de seu direitointerno para justificar o inadimplemento de um tratado) que os oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos sejam eles de natureza poliacutetica qua-se-judicial ou judicial rechaccedilam ostensivamente o argumento da inobservacircnciade certa norma de OIOHpor incompatibilidade com o ordenamento juriacutedico na-cional Como visto em decorrecircncia dos deveres de respeito proteccedilatildeo e promo-ccedilatildeo eacute dever do Estado adequar sua ordem juridica poliacutetica e administrativa agravesobrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacional ainda queisso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas aleacutem eacute claro da proibiccedilatildeo de se legislar contrariamente ao assumi-do No sentido da obrigaccedilatildeo estatal de ateacute mesmo revogar normas nacionais emdecorrecircncia do art 20 da Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos a CorteIOHjaacute se manifestou em distintas oportunidades

Frise-se o OIDHnatildeo descreve ou impotildee o modo como o Estado deveraacute colocar em execuccedilatildeo as obrigaccedilotildees assumidas - ateacute porque cada ente estatal contacom mecanismos proacuteprios de internalizaccedilatildeo das normas internacionais e deseu adimplemento - todavia natildeo se aceita qualquer argumento que intentesustentar a impossibilidade juriacutedica de fazecirclo Em assim sendo acerca da ceieuma monismodualismo em mateacuteria de direitos humanos natildeo haacute outro caminhoa ser seguido 0 conceito monista eacute sem duacutevida o uacutenico adequado ao direitodos direitos humanos baseado na dignidade inerente agrave pessoa humana a qualnatildeo admite ser concebida de uma maneira diferente no acircmbito nacional e nointernacional

I Neste sentido jaacute se manifestou o Comitecirc de Direitos Humanos do PIDCPda ONU(Comentaacuterio Geral n- 31bullde 20004)e diversas vezes a Cone IOH(Opinillo Consultiva OC-786 e casos Cantos $ Argentina OlmedoBustos e Outros IS Chile e Hilaire Conslantine y Benjamin e OUlros IS Trinidade e Tobago)

2 NIKKENPedro EI Derecho Internacional de los Derechos Humanos em ti derccho interno Revisro IrDH51(jon-jumoo3) JS

3 Vide Casos Cacircstillo Pedruzzl e Outros IS Peruacute Baena Ricardo e Outros IS Panamaacute Ourand e ugane 1$

Peruacute Suaacuteres Rosero IS Equador Olmedo Bustos e Outros IS Chile e Herrera ulhoa 5 Costa Rica-i NIKKENPedro op til p 21

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q

EfEllV1DAO 00 DIREITO INTERNtCIOfM DOS DUlfiOS HUMANOS NO -MaITO IU(IOHAL

I) Importante

Decorre da natureza do DIOHda boafeacute na ratificaccedilatildeo dos tratados e no mais das vezes dedisposiccedilotildees expressas dos proacuteprios tratados o dever do Estado adequar sua ordem juriacutedicapoliacutetica e administrativa agraves obrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacionalainda que isso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas

Ateacute aqui abordou-se a questatildeo da efetividade da proteccedilatildeo internacional dosdireitos humanos sob o prisma da necessaacuteria compatibilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo do-meacutestica com o DIOH em favor desse uacuteltimo Cumpre agora pensar o mesmoproblema mas lanccedilando foco sobre os operadores do Oireito dentro da esferajudicial

2-CUMPRIMENTO DAS DECISOtildeES DOS OacuteRGAtildeOS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Como jaacute se supotildee pressuposto da efetividade dos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo de direitos humanos eacute o grau de acatamento das recomendaccedilotildees edecisotildees emanadas de seus oacutergatildeos pelo Estado a quem se dirigem

Em se tratando de Brasil esta questatildeo afigura-se ainda mais sensiacutevel emvirtude da ausecircncia de qualquer regulamentaccedilatildeo especiacutefica a respeito do cumprimento do quanto emanado daqueles oacutergatildeos Em que pese reconheccedila-se aevoluccedilatildeo da postura brasileira frente aos referidos sistemas evidenciada pelaatenccedilatildeo conferida aos relatoacuterios produzidos e pela adoccedilatildeo de providecircncias emobservacircncia a inuacutemeras recomendaccedilotildees e decisotildees vindas dos diversos mecanis-mos eacute cena que o Estado brasileiro ainda ressente-se de disciplina juriacutedica maisrobusta acerca do cumprimento imediato das decisotildees internacionais vinculantesjaacute que as recomendaccedilotildees em tese conforme a praacutetica jusinternacional natildeo ensejam sanccedilatildeo acaso olvidadas

Por ora como visto conta-se apenas com o entendimento essencialmentedoutrinaacuterio segundo o qual no 8rasil uma sentenccedila condenatoacuteria emanada deoacutergatildeo internacional judicial (vg a Corte IOH) unicamente no tocante a valorespecuniaacuterios poderaacute ser executada perante a Vara Federal territorialmente com-petente

Isto ainda eacute muito pouco Urge a criaccedilatildeo de uma verdadeira estrutura brasileira de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais para muito aleacutem da quitaccedilatildeode indenizaccedilotildees

A favor desta empreitada poderaacute vir a estar o resultado do Projeto de lein 4667 de 2004 que pretende disciplinar os efeitos juridicos das decisotildees dosOrganismos Internacionais de Proteccedilatildeo aos Direitos Humanos Quando de sua

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1

StvlO BmllAMHU NpoundTO

apresentaccedilatildeo este Projeto de lei versava apenas sobre as indenizaccedilotildees esta-belecidas em decisotildees internacionais e a possibilidade de accedilotildees regressivas doEstado brasileiro em face das pessoas fisicas ou juriacutedicas promotoras do ato deviolaccedilatildeo declarado pela instatildencia internacional Nada foi dito sobre o adimple-mento das demais formas de reparaccedilatildeo (que natildeo a indenizaccedilatildeo) porventura de- terminadas ao Estado brasileiro algo que mantinha tal iniciativa legislativa muitoaqueacutem do necessaacuterio

Ateacute que em 2006 a relataria do Projeto de lei procedeu a vaacuterias alteraccedilotildeesincluindo prazos para cumprimento das medidas cautelares da CloH e das me-didas provisoacuterias da cone 10H bem como para pagamento de indenizaccedilotildeespreservado o direito estatal de regresso contra o violador imediato inclusivemediante glosa de repasses devidos pela Uniatildeo a Estados e Municipios se for ocaso Do mesmo modo o novo texto prevecirc a constituiccedilatildeo de oacutergatildeo especifico incumbido de acompanhar a implementaccedilatildeo de todas as obrigaccedilotildees internacional-mente imputadas ao Brasil (obrigaccedilotildees de fazer natildeo-fazer e pagar) para tantodotado de poderes de notificaccedilatildeo dos entes aos quais cabe executar as medidasdecorrentes da condenaccedilatildeo havida visando a apresentaccedilatildeo de plano de cumpri-mento e de relatoacuterio de providecircncias adotadas

Em setembro de 2010 editou-se acerca deste mesmo Projeto de lei NotaTeacutecnica elaborada por Procuradores Regionais da Repuacuteblica para isso nomeadospela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadatildeo Nesta Nota Teacutecnica diversassugestotildees adicionais estatildeo consolidadas de modo a imprimir maior clareza eefetividade agrave proposta de regulamentaccedilatildeo do cumprimento das decisotildees inter-nacionais vinculantes em mateacuteria de direitos humanos Dentre as propostas danota teacutecnica destacamse

que o texto da lei contemple de modo amplo as decisotildees dos organismosinternacionais de direitos humanos incluindo os tribunais que julguemcrimes contra direitos humanos (atualmente apenas o TPI)

bull que a regulamentaccedilatildeo diga respeito apenas agrave decisotildees vinculantes exclu-iacutedas as recomendaccedilotildees porquanto destituidas de consequecircncias juridicassancionatoacuterias no plano internacional em caso de inobservacircncia

bull que os processos e procedimentos de execuccedilatildeo da decisatildeo internacionalvinculante tenham prioridade sobre quaisquer outros agrave exceccedilatildeo do habe-as corpus e do mandado de seguranccedila

bull que esta lei seja compreendida comoo primeiro passo para a estruturaccedilatildeode um mecanismo nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais

5 NOTATtCNICA Disponiacutevel em lthttpwwwacademiaedu1628080Nota_Tecnlca_-_projeto_deJei_JmplementaC3IA71q~30_deciSLC31B5esJnternacionais_Brasilgt Acesso em 15 jan 2015

390

EmMOAOt 00 DllllUO INTERNAClONM DOS OlRErros HUMANOS NO AgraveMBt10 NACIOtItt

em mateacuteria de direitos humanos portanto necessariamente demandantede iniciativas sobretudo normativas posteriores de detalhamento e con-solidaccedilatildeo dessa estrutura

O Projeto de lei jaacute recebeu no acircmbito da Cacircmara de Deputados pareceresfavoraacuteveis da Comissatildeo de Direitos Humanos e Minorias (aprovaccedilatildeo de textosubstitutivo) em 2006 da Comissatildeo de Relaccedilotildees Exteriores e de Defesa Nacionalem 2007 e da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e de Justiccedila e de Cidadania em 2010

Desde entatildeo a proposta legislativa foi encaminhada ao Senado Federai estandono momento a aguardar deliberaccedilatildeo final da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccediladessa Casa Parlamentar jaacute contando com parecer favoraacutevel do Relator designa-do embora com sugestatildeo de alteraccedilatildeo (a nosso ver indesejada) de texto para asupressatildeo do trecho que imprime efeitos imediatos agraves decisotildees internacionaisJ

A ausecircncia dessa estrutura diretamente incumbida do cumprimento das deciosotildees internacionais relativas a direitos humanos natildeo impediu que se instituiacutesseminiciativas e instituiccedilotildees que dentro de suas aacutereas de aplicaccedilatildeo e atuaccedilatildeo vecircmse consolidando como as principais vias de difusatildeo e implementaccedilatildeo interna dospadrotildees desenvolvidos por todas as instacircncias da proteccedilatildeo internacional dos di-reitos humanos incluindo as quase-judiciais e judiciais Como jaacute foi dito o Brasilconta com programas e oacutergatildeos com atribuiccedilotildees gerais ou especiacuteficas atinentesagrave proteccedilatildeo dos direitos humanos os quais a despeito da necessidade de incre-mento apresentaratildeo resultados mais eficazes quanto mais se aproximem e demodo aniculado estatildebeleccedilam padrotildees de interpretaccedilatildeo promoccedilatildeo e proteccedilatildeodos direitos humanos tal quai delineado pelos mecanismos internacionais Atiacutetulo de exemplo citemse uma vez mais os Programas Nacionais de DireitosHumanos de 1996 2002 e 2009 (PNoH I 2 e 3 respedivamente) editados pelaPresideacutencia da Repuacuteblica na forma de Decretos na esteira do Programa de Accedilatildeoda Conferecircncia de Viena de 1993 e a Secretaria de Direitos Humanos (SoH) vin-culada em 2003 de modo direto agrave Presidecircncia da Repuacuteblica assumindo statusde Ministeacuterio

Nas instacircncias executiva e legislativa embora ainda se esteja demasiado dis-tante do cenaacuterio ideal - idealizado como aquele em que as decisotildees poliacuteticas enormativas de modo expliacutecito e integrai pautem-se pela proteccedilatildeo e promoccedilatildeodos direitos humanos - jaacute natildeo satildeo tatildeo raros os episoacutedios de redirecionamentode condutas promovido por forccedila de recomendaccedilotildees ou decisotildees emanadasdos mecanismos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilotildees de

6 BRASIL CAcircMARA DOS DEPUTADOS Projelo de lei n 4667 de 2004 Disponiacutevel em hllpfwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadelram1tacao7idProposicaO2736501 Acesso em 15 jan 2015

1 BRASIL SENADO FEDERAL projelo de lei n 4661 de 2004 Disponiacutevel em hnpwwwsenadogovbralividademateriadelalhesasp]p_cod_mate9S3601 Acesso em 151an 101S

391

i

SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 2: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

EDITORAjusPODIVM

1JoNoIWedito raj uspod ivm com b r

Rua Mato Grosso 175 - Pituba CEP 41830-151 - Salvador - BahiaTel (71) 3363-8617 I Fax (7I) 3363-5050 E-mail faleeditorajuspodivmcombr

Conselho Editorial Eduardo Viana Portela Neves Dirley da Cunha Jr Leonardo de Medeiros GarciaFredie Didicr 1r Joseacute Henrique Mauta Joseacute Marcelo Vigliar Marcos Ehrhardt Juacutenior Nestor TaacutevoraRobeacuterio Nunes Filho Roberval Rocha Ferreira Filho Rodolfo Pamplona Filho Rodrigo Reis Mazzeie Rogeacuterio Sanches Cunha

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Eacute tennillanlemente proibida a reproduccedilatildeo total ou parcial desta obra por qualquer meio ou processo sem a expressaaulorizaccedilatildeo do autor e da EdiccedilotildeesJlIsPODlVM A violaccedilatildeo dos direitos autorais caracteriza crime descrito na legislaccedilatildeoem vigor sem prejui20 das sanccedilotildees civis cabiacuteveis

Ao Rafael filho amado

Aos meus professores e alunoscomo singelo agradecimento pela diferenccedila que fizeram e fazem na minhavida

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SILVIO BHTllAMpoundLLI NETO

uacuteltimo oacutergatildeo mencionado no ato que constituiu a UNI Tal fusatildeo pretende criarum uacutenico oacutergatildeo jurisdicional com competecircncia para apreciar casos relativos a di-reitos humanos e a outros temas afetos a UA em seccedilotildees especializadas de juiacutezesEsse protocolo de 2008 foi ateacute o momento assinado por apenas cinco Estadonecessitando no entanto de quinze adesotildees para entrar em vigor72 Prevista amanutenccedilatildeo da sua sede em Arusha na Tanzacircnia esta nova Corte permaneceriadependendo da declaraccedilatildeo autorizadora expressa dos Estados para receber apeticcedilatildeo de indiviacuteduos

Ainda no acircmbito da UA deliberouse em 2003 a implementaccedilatildeo do Mecanis-mo Africano de Revisatildeo Pelos Pares (African Peer Review Mecanism) que aexemplo do RPU- Revisatildeo Perioacutedica Universal existente junto acirc ONU aposta naevoluccedilatildeo da efetividade dos direitos humanos baseada no diaacutelogo construtivoentre naccedilotildees Esse mecanismo tem por objetivo promover a adoccedilatildeo de poliacuteticasnormas e praacuteticas voltadas agrave estabilidade poliacutetica ao crescimento econocircmicoao desenvolvimento sustentaacutevel e agrave aceleraccedilatildeo da integraccedilatildeo econocircmica sub--regional e continenta173bull

7l UNIAtildeOAFRICANAprotocol on The Stature of the Africon Court of justice And Human Rights Disponiacutevel emhn pllwwwauintensilesdelaultfil espROTOCOl_STATUTE_AFRICAN~COURT_ JUSTlCE_ANO_HUMAN_RIGHTSpdfgt Acesso em 1S jan 2015

72 UNIAtildeOAfRICANAlist of Countries Which Have Signed RatifiedAcceded to lhe Protocol on rhe Statute of rheAfricon COllrt of jusfice Ilnd Humon RighIS Disponiacutevel em httpwwwauintensitesdefaultfIIesproto-co 1200n20Sta tuteb200f20the20Africa n20Court2ool20J usl ice2oa nd k20HRpdff Acesso em 15jan 2015

73- AFRICANPEERREVIEWMECANISMMission Disponiacutevel em hupaprm-auorgmissiongt Acesso em 15 jan2015

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Capiacutetulo VJl

Efetividade do DireitoInternacional dos Direitos

Humanos no acircmbito nacionalSumaacuterio 1Os sistemas de proteccedilatildeo internacional frente ao direito interno - 2 Cumpri-mento das decisotildees dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos - 3 Osagentes do Estado e o dever de observar o Direito Internacional dos DireitosHumanos _ 4Osdireitos sociaisdentro dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos - 5As instacircncias juriacutedicas nacionais e o Direito Internacional dos DireitosHumanos da retoacutericaagrave praxe

1 OS SISTEMAS DE PROTECcedilAtildeO INTERNACIONAL FRENTE AO DIREITO IN-TERNO

Interessa agora evidenciar o quatildeo interativos e mutuamente influentesdevem ser o direito brasileiro e o Direito Internacional dos Direitos Humanos(DIDH) assim potencializando o avanccedilo pracirctico da proteccedilatildeo da dignidade dapessoa humana

Sob esta inspiraccedilatildeo e de antematildeo haacute que se superar o claacutessico debateentre as correntes monista e dualista historicamente travado nas fileiras dodireito internacional Eacute que a polecircmica envolvendo a existecircncia ou natildeo de duasordens juriacutedicas distintas e estanques (a domeacutestica e a internacional) soacute fazprejudicar a efetividade dos direitos humanos A uma porque tanto os direi-tos nacionais (em regra) quanto o direto internacional encontram-se hodier-namente calcados na concepccedilatildeo material central da proteccedilatildeo intransigenteda dignidade da pessoa humana denotando unidade de significado A duasporque como visto o monitoramento e a apuraccedilatildeo da violaccedilatildeo de direitoshumanos no plano internacional foram construiacutedos como espaccedilos imbuiacutedos doobjetivo de fazer avanccedilar a mateacuteria na seara interna dos Estados E finalmentea trecircs porque a Constituiccedilatildeo Federal de 988 expressa e definitivamente ad-mite-se natildeo exaurida em seu proacuteprio texto mas ao contraacuterio complementadano que tange aos direitos humanos pelas normas internacionais sobretudo nostermos dos ~ 2deg do seu art 5deg Jaacute desde o texto constitucional portanto vecirc-seque o ordenamento juriacutedico brasileiro compreende o Direito Internacional dosDireitos Humanos dele natildeo se separando

Nesta linha intensa criacutetica deve ser dirigida aos movimentos de retrocessodo Estado brasileiro em se tratando de submissatildeo aos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo dos direitos humanos ainda que tais movimentos felizmente natildeorepresentem tendecircncia nos dias de hoje

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A este propoacutesito cite-se por exemplo a natildeo submissatildeo brasileira agrave jurisdiccedilatildeoda Corte Internacional de Justiccedila e a natildeo autorizaccedilatildeo ao Comitecirc sobre os DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais e ao Comitecirc sobre os Direitos da crianccedila parao recebimento e apuraccedilatildeo de peticcedilotildees individuais acerca do descumpriment~pelo Brasil respectivamente da Convenccedilatildeo sobre Direitos Econocircmicos Sociais eCulturais e da Convenccedilatildeo sobre 05 Direitos da Crianccedila ratificadas pelo paiacutes nomarco da ONU Igualmente mencione-se a denuacutencia brasileira agrave Convenccedilatildeo nO158 da OITsobre o teacutermino da relaccedilatildeo de trabalho por iniciativa do empregador(ratificada em 1995 e denunciada em 1996)

O uso da denuacutencia a tratados como instrumento de mitigaccedilatildeo dos compromis-sos internacionais contudo vem tendo cada vez menos forccedila para desvincularos Estados das obrigaccedilotildees relacionadas aos direitos humanos notadamente emrazatildeo da irrefreaacutevel consolidaccedilatildeo das normas costumeiras e das normas impe-rativas (jus cogens) como produto de um consenso qualificado obtido no seioda comunidade internacional e sufragado pelas instacircncias de monitoramento eapuraccedilatildeo de violaccedilotildees para aleacutem do vetusto apego agrave loacutegica da ratificaccedilatildeo comocondiccedilatildeo sine qUQ non para a responsabilizaccedilatildeo estatal por afronta a direitoshumanos

Esta substituiccedilatildeo do consentimento estatal pelo consenso muito bem iden-tificada por CANCcedilADOTRINOAOEe aqui estudada quando da abordagem do temadas fontes do direito internacional se revela em inuacutemeras ocasiotildees respeitan-tes aos sistemas internacionais de proteccedilatildeo de direitos humanos tais como aimputaccedilatildeo de cogecircncia pelos oacutergatildeos quase-judiciais e judiciais agraves Declaraccedilotildeesde Direitos Humanos (ex vi a Declaraccedilatildeo Universal e a Declaraccedilatildeo Americana) ogradual reconhecimento da existecircncia de normas imperativas pela jurisprudecircnciainternacional e a adoccedilatildeo da Declaraccedilatildeo de Princiacutepios e Direitos Fundamentais doTrabalho pela 01T

Sob o prisma brasileiro encontra-se vigente um rico arcabouccedilo de normas einstrumentos procedimentais internacionais aos quais cumpre dar maacutexima efeti-vidade na dimensatildeo domeacutestica Mas se eacute assim por que entatildeo a despeito detiacutemidos avanccedilos em situaccedilotildees pontuais a maioria dos paiacuteses engajados nos sis-temas de proteccedilatildeo internacional dos direitos humanos ainda encontra resistecircnciaem fazer valer sobretudo no campo juridico os padrotildees de interpretaccedilatildeo asrecomendaccedilotildees e as decisotildees dos diversos oacutergatildeos de monitoramento e apuraccedilatildeode violaccedilatildeo integrantes dos mecanismos internacionais de proteccedilatildeo Para falarde Brasil por que os Trecircs Poderes do Estado brasileiro satildeo tatildeo timidos quandose trata de atuar expressamente com base nas normas e na jurisprudecircncia pro-duzidos por exemplo pelos oacutergatildeos do sistema interamericano de proteccedilatildeo dosdireitos humanos Esse eacute um tema aacutespero e ao mesmo tempo decisivo para atatildeo buscada efetividade do DIOH

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EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS NO AcircM81TO NACIONAL

Paradoxalmente agrave vista das normas em vigor natildeo haacute qualquer duacutevida deque os Estados submetidos agraves instacircncias internacionais protetoras dos direitoshumanos estatildeo obrigados como jaacute estudado em absolutamente todas as suasinstacircncias (administrativas legislativas e judiciaacuterias) a respeitar (natildeo intervir)proteger (legislar e criar aparato que coiacuteba as violaccedilotildees) e promover (adotarpoliacuteticas que fomentem o gozo efetivo) as normas de DIOHque lhes sejam apli-caacuteveis Tal obrigaccedilatildeo juriacutedica embora decorra logicamente o princiacutepio da boa-feacuteque rege a celebraccedilatildeo e a interpretaccedilatildeo dos tratados internacionais (art 3 daConvenccedilatildeo de Viena) eacute corriqueiramente enunciada nos pactos Cite-se a essepropoacutesito os seguintes enunciados normativos

Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos (ONU)

Artigo 2

lo Os Estados Partes do presente pacto comprometem-se a respeitar e ga-rantir a todos os indiviacuteduos que se achem em seu territoacuterio e que estejamsujeitos a sua jurisdiccedilatildeo os direitos reconhecidos no presente Pacto semdiscriminaccedilatildeo alguma por motivo de raccedila cor sexo liacutengua religiatildeo opiniaopoliacutetica ou de outra natureza origem nacional ou social situaccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer condiccedilatildeo

2 Na ausecircncia de medidas legislativas ou de outra natureza destinadas atornar efetivos os direitos reconhecidos no presente Pacto os Estados Partesdo presente Pacto comprometem-se a tomar as providecircncias necessaacuteriascom vistas a adotaacute-Ias levando em consideraccedilatildeo seus respectivos procedimentos constitucionais e as disposiccedilotildees do presente Pacto (destacado)

Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos (OEA)

Artigo 1deg - Obrigaccedilatildeo de respeitar os direitos

lo Os Estados-partes nesta Convenccedilatildeo comprometem-se a respeitar os di-reitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exer-ciacutecio a toda pessoa Que esteja sujeita agrave sua jurisdiccedilatildeo sem discriminaccedilatildeoalguma por motivo de raccedila cor sexo idioma religiatildeo opiniotildees poliacuteticas oude qualquer outra natureza origem nacional ou social posiccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer outra condiccedilatildeo social

c)

Artigo 2deg - Dever de adotar disposiccedilotildees de direito interno

Se o exerciacutecio dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda natildeoestiver garantido por disposiccedilotildees legislativas ou de outra natureza os Es-tados-partes comprometem-se a adotar de acordo com as suas normasconstitucionais e com as disposiccedilotildees desta Convenccedilatildeo as medidas legislati-vas ou de outra natureza que forem necessaacuterias para tornar efetivos taisdireitos e liberdades (destacado)

Na mesma linha estatildeo redigidos o art 2deg do Pacto Internacional de DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais (ONU) e os arts O e 2deg do Protocolo de San Sal-vador (OEA)

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SILVIO BElTRAMUU NElo

Conforme adverte de forma enfaacutetica PEDRONIKKENexJuiz e ex-Presidenteda Corte IOH disposiccedilotildees normativas como as citadas de aplicaccedilatildeo imediata(autoexecutaacuteveis ou selfexecuting) impotildeem deveres de respeitar garantir satisfazer proteger e legislar deixando claro que o Estado eacute juridicamente o ente chomado a por em execuccedilatildeo o sistema internacional de proteccedilatildeo de direitos humanosltAfinal o OIOHnatildeo passaria de ficccedilatildeo se natildeo produzisse efeitos diretos nos planosdomeacutesticos dos Estados aos quais se direciona

Eacute nesta perspectiva consagrada pelo art 27 da Convenccedilatildeo de Viena sobre oOireito dos Tratados (Uma pane natildeo pode invocar as disposiccedilotildees de seu direitointerno para justificar o inadimplemento de um tratado) que os oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos sejam eles de natureza poliacutetica qua-se-judicial ou judicial rechaccedilam ostensivamente o argumento da inobservacircnciade certa norma de OIOHpor incompatibilidade com o ordenamento juriacutedico na-cional Como visto em decorrecircncia dos deveres de respeito proteccedilatildeo e promo-ccedilatildeo eacute dever do Estado adequar sua ordem juridica poliacutetica e administrativa agravesobrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacional ainda queisso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas aleacutem eacute claro da proibiccedilatildeo de se legislar contrariamente ao assumi-do No sentido da obrigaccedilatildeo estatal de ateacute mesmo revogar normas nacionais emdecorrecircncia do art 20 da Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos a CorteIOHjaacute se manifestou em distintas oportunidades

Frise-se o OIDHnatildeo descreve ou impotildee o modo como o Estado deveraacute colocar em execuccedilatildeo as obrigaccedilotildees assumidas - ateacute porque cada ente estatal contacom mecanismos proacuteprios de internalizaccedilatildeo das normas internacionais e deseu adimplemento - todavia natildeo se aceita qualquer argumento que intentesustentar a impossibilidade juriacutedica de fazecirclo Em assim sendo acerca da ceieuma monismodualismo em mateacuteria de direitos humanos natildeo haacute outro caminhoa ser seguido 0 conceito monista eacute sem duacutevida o uacutenico adequado ao direitodos direitos humanos baseado na dignidade inerente agrave pessoa humana a qualnatildeo admite ser concebida de uma maneira diferente no acircmbito nacional e nointernacional

I Neste sentido jaacute se manifestou o Comitecirc de Direitos Humanos do PIDCPda ONU(Comentaacuterio Geral n- 31bullde 20004)e diversas vezes a Cone IOH(Opinillo Consultiva OC-786 e casos Cantos $ Argentina OlmedoBustos e Outros IS Chile e Hilaire Conslantine y Benjamin e OUlros IS Trinidade e Tobago)

2 NIKKENPedro EI Derecho Internacional de los Derechos Humanos em ti derccho interno Revisro IrDH51(jon-jumoo3) JS

3 Vide Casos Cacircstillo Pedruzzl e Outros IS Peruacute Baena Ricardo e Outros IS Panamaacute Ourand e ugane 1$

Peruacute Suaacuteres Rosero IS Equador Olmedo Bustos e Outros IS Chile e Herrera ulhoa 5 Costa Rica-i NIKKENPedro op til p 21

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q

EfEllV1DAO 00 DIREITO INTERNtCIOfM DOS DUlfiOS HUMANOS NO -MaITO IU(IOHAL

I) Importante

Decorre da natureza do DIOHda boafeacute na ratificaccedilatildeo dos tratados e no mais das vezes dedisposiccedilotildees expressas dos proacuteprios tratados o dever do Estado adequar sua ordem juriacutedicapoliacutetica e administrativa agraves obrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacionalainda que isso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas

Ateacute aqui abordou-se a questatildeo da efetividade da proteccedilatildeo internacional dosdireitos humanos sob o prisma da necessaacuteria compatibilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo do-meacutestica com o DIOH em favor desse uacuteltimo Cumpre agora pensar o mesmoproblema mas lanccedilando foco sobre os operadores do Oireito dentro da esferajudicial

2-CUMPRIMENTO DAS DECISOtildeES DOS OacuteRGAtildeOS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Como jaacute se supotildee pressuposto da efetividade dos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo de direitos humanos eacute o grau de acatamento das recomendaccedilotildees edecisotildees emanadas de seus oacutergatildeos pelo Estado a quem se dirigem

Em se tratando de Brasil esta questatildeo afigura-se ainda mais sensiacutevel emvirtude da ausecircncia de qualquer regulamentaccedilatildeo especiacutefica a respeito do cumprimento do quanto emanado daqueles oacutergatildeos Em que pese reconheccedila-se aevoluccedilatildeo da postura brasileira frente aos referidos sistemas evidenciada pelaatenccedilatildeo conferida aos relatoacuterios produzidos e pela adoccedilatildeo de providecircncias emobservacircncia a inuacutemeras recomendaccedilotildees e decisotildees vindas dos diversos mecanis-mos eacute cena que o Estado brasileiro ainda ressente-se de disciplina juriacutedica maisrobusta acerca do cumprimento imediato das decisotildees internacionais vinculantesjaacute que as recomendaccedilotildees em tese conforme a praacutetica jusinternacional natildeo ensejam sanccedilatildeo acaso olvidadas

Por ora como visto conta-se apenas com o entendimento essencialmentedoutrinaacuterio segundo o qual no 8rasil uma sentenccedila condenatoacuteria emanada deoacutergatildeo internacional judicial (vg a Corte IOH) unicamente no tocante a valorespecuniaacuterios poderaacute ser executada perante a Vara Federal territorialmente com-petente

Isto ainda eacute muito pouco Urge a criaccedilatildeo de uma verdadeira estrutura brasileira de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais para muito aleacutem da quitaccedilatildeode indenizaccedilotildees

A favor desta empreitada poderaacute vir a estar o resultado do Projeto de lein 4667 de 2004 que pretende disciplinar os efeitos juridicos das decisotildees dosOrganismos Internacionais de Proteccedilatildeo aos Direitos Humanos Quando de sua

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1

StvlO BmllAMHU NpoundTO

apresentaccedilatildeo este Projeto de lei versava apenas sobre as indenizaccedilotildees esta-belecidas em decisotildees internacionais e a possibilidade de accedilotildees regressivas doEstado brasileiro em face das pessoas fisicas ou juriacutedicas promotoras do ato deviolaccedilatildeo declarado pela instatildencia internacional Nada foi dito sobre o adimple-mento das demais formas de reparaccedilatildeo (que natildeo a indenizaccedilatildeo) porventura de- terminadas ao Estado brasileiro algo que mantinha tal iniciativa legislativa muitoaqueacutem do necessaacuterio

Ateacute que em 2006 a relataria do Projeto de lei procedeu a vaacuterias alteraccedilotildeesincluindo prazos para cumprimento das medidas cautelares da CloH e das me-didas provisoacuterias da cone 10H bem como para pagamento de indenizaccedilotildeespreservado o direito estatal de regresso contra o violador imediato inclusivemediante glosa de repasses devidos pela Uniatildeo a Estados e Municipios se for ocaso Do mesmo modo o novo texto prevecirc a constituiccedilatildeo de oacutergatildeo especifico incumbido de acompanhar a implementaccedilatildeo de todas as obrigaccedilotildees internacional-mente imputadas ao Brasil (obrigaccedilotildees de fazer natildeo-fazer e pagar) para tantodotado de poderes de notificaccedilatildeo dos entes aos quais cabe executar as medidasdecorrentes da condenaccedilatildeo havida visando a apresentaccedilatildeo de plano de cumpri-mento e de relatoacuterio de providecircncias adotadas

Em setembro de 2010 editou-se acerca deste mesmo Projeto de lei NotaTeacutecnica elaborada por Procuradores Regionais da Repuacuteblica para isso nomeadospela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadatildeo Nesta Nota Teacutecnica diversassugestotildees adicionais estatildeo consolidadas de modo a imprimir maior clareza eefetividade agrave proposta de regulamentaccedilatildeo do cumprimento das decisotildees inter-nacionais vinculantes em mateacuteria de direitos humanos Dentre as propostas danota teacutecnica destacamse

que o texto da lei contemple de modo amplo as decisotildees dos organismosinternacionais de direitos humanos incluindo os tribunais que julguemcrimes contra direitos humanos (atualmente apenas o TPI)

bull que a regulamentaccedilatildeo diga respeito apenas agrave decisotildees vinculantes exclu-iacutedas as recomendaccedilotildees porquanto destituidas de consequecircncias juridicassancionatoacuterias no plano internacional em caso de inobservacircncia

bull que os processos e procedimentos de execuccedilatildeo da decisatildeo internacionalvinculante tenham prioridade sobre quaisquer outros agrave exceccedilatildeo do habe-as corpus e do mandado de seguranccedila

bull que esta lei seja compreendida comoo primeiro passo para a estruturaccedilatildeode um mecanismo nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais

5 NOTATtCNICA Disponiacutevel em lthttpwwwacademiaedu1628080Nota_Tecnlca_-_projeto_deJei_JmplementaC3IA71q~30_deciSLC31B5esJnternacionais_Brasilgt Acesso em 15 jan 2015

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EmMOAOt 00 DllllUO INTERNAClONM DOS OlRErros HUMANOS NO AgraveMBt10 NACIOtItt

em mateacuteria de direitos humanos portanto necessariamente demandantede iniciativas sobretudo normativas posteriores de detalhamento e con-solidaccedilatildeo dessa estrutura

O Projeto de lei jaacute recebeu no acircmbito da Cacircmara de Deputados pareceresfavoraacuteveis da Comissatildeo de Direitos Humanos e Minorias (aprovaccedilatildeo de textosubstitutivo) em 2006 da Comissatildeo de Relaccedilotildees Exteriores e de Defesa Nacionalem 2007 e da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e de Justiccedila e de Cidadania em 2010

Desde entatildeo a proposta legislativa foi encaminhada ao Senado Federai estandono momento a aguardar deliberaccedilatildeo final da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccediladessa Casa Parlamentar jaacute contando com parecer favoraacutevel do Relator designa-do embora com sugestatildeo de alteraccedilatildeo (a nosso ver indesejada) de texto para asupressatildeo do trecho que imprime efeitos imediatos agraves decisotildees internacionaisJ

A ausecircncia dessa estrutura diretamente incumbida do cumprimento das deciosotildees internacionais relativas a direitos humanos natildeo impediu que se instituiacutesseminiciativas e instituiccedilotildees que dentro de suas aacutereas de aplicaccedilatildeo e atuaccedilatildeo vecircmse consolidando como as principais vias de difusatildeo e implementaccedilatildeo interna dospadrotildees desenvolvidos por todas as instacircncias da proteccedilatildeo internacional dos di-reitos humanos incluindo as quase-judiciais e judiciais Como jaacute foi dito o Brasilconta com programas e oacutergatildeos com atribuiccedilotildees gerais ou especiacuteficas atinentesagrave proteccedilatildeo dos direitos humanos os quais a despeito da necessidade de incre-mento apresentaratildeo resultados mais eficazes quanto mais se aproximem e demodo aniculado estatildebeleccedilam padrotildees de interpretaccedilatildeo promoccedilatildeo e proteccedilatildeodos direitos humanos tal quai delineado pelos mecanismos internacionais Atiacutetulo de exemplo citemse uma vez mais os Programas Nacionais de DireitosHumanos de 1996 2002 e 2009 (PNoH I 2 e 3 respedivamente) editados pelaPresideacutencia da Repuacuteblica na forma de Decretos na esteira do Programa de Accedilatildeoda Conferecircncia de Viena de 1993 e a Secretaria de Direitos Humanos (SoH) vin-culada em 2003 de modo direto agrave Presidecircncia da Repuacuteblica assumindo statusde Ministeacuterio

Nas instacircncias executiva e legislativa embora ainda se esteja demasiado dis-tante do cenaacuterio ideal - idealizado como aquele em que as decisotildees poliacuteticas enormativas de modo expliacutecito e integrai pautem-se pela proteccedilatildeo e promoccedilatildeodos direitos humanos - jaacute natildeo satildeo tatildeo raros os episoacutedios de redirecionamentode condutas promovido por forccedila de recomendaccedilotildees ou decisotildees emanadasdos mecanismos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilotildees de

6 BRASIL CAcircMARA DOS DEPUTADOS Projelo de lei n 4667 de 2004 Disponiacutevel em hllpfwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadelram1tacao7idProposicaO2736501 Acesso em 15 jan 2015

1 BRASIL SENADO FEDERAL projelo de lei n 4661 de 2004 Disponiacutevel em hnpwwwsenadogovbralividademateriadelalhesasp]p_cod_mate9S3601 Acesso em 151an 101S

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i

SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

401

Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 3: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

SILVIO BHTllAMpoundLLI NETO

uacuteltimo oacutergatildeo mencionado no ato que constituiu a UNI Tal fusatildeo pretende criarum uacutenico oacutergatildeo jurisdicional com competecircncia para apreciar casos relativos a di-reitos humanos e a outros temas afetos a UA em seccedilotildees especializadas de juiacutezesEsse protocolo de 2008 foi ateacute o momento assinado por apenas cinco Estadonecessitando no entanto de quinze adesotildees para entrar em vigor72 Prevista amanutenccedilatildeo da sua sede em Arusha na Tanzacircnia esta nova Corte permaneceriadependendo da declaraccedilatildeo autorizadora expressa dos Estados para receber apeticcedilatildeo de indiviacuteduos

Ainda no acircmbito da UA deliberouse em 2003 a implementaccedilatildeo do Mecanis-mo Africano de Revisatildeo Pelos Pares (African Peer Review Mecanism) que aexemplo do RPU- Revisatildeo Perioacutedica Universal existente junto acirc ONU aposta naevoluccedilatildeo da efetividade dos direitos humanos baseada no diaacutelogo construtivoentre naccedilotildees Esse mecanismo tem por objetivo promover a adoccedilatildeo de poliacuteticasnormas e praacuteticas voltadas agrave estabilidade poliacutetica ao crescimento econocircmicoao desenvolvimento sustentaacutevel e agrave aceleraccedilatildeo da integraccedilatildeo econocircmica sub--regional e continenta173bull

7l UNIAtildeOAFRICANAprotocol on The Stature of the Africon Court of justice And Human Rights Disponiacutevel emhn pllwwwauintensilesdelaultfil espROTOCOl_STATUTE_AFRICAN~COURT_ JUSTlCE_ANO_HUMAN_RIGHTSpdfgt Acesso em 1S jan 2015

72 UNIAtildeOAfRICANAlist of Countries Which Have Signed RatifiedAcceded to lhe Protocol on rhe Statute of rheAfricon COllrt of jusfice Ilnd Humon RighIS Disponiacutevel em httpwwwauintensitesdefaultfIIesproto-co 1200n20Sta tuteb200f20the20Africa n20Court2ool20J usl ice2oa nd k20HRpdff Acesso em 15jan 2015

73- AFRICANPEERREVIEWMECANISMMission Disponiacutevel em hupaprm-auorgmissiongt Acesso em 15 jan2015

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Capiacutetulo VJl

Efetividade do DireitoInternacional dos Direitos

Humanos no acircmbito nacionalSumaacuterio 1Os sistemas de proteccedilatildeo internacional frente ao direito interno - 2 Cumpri-mento das decisotildees dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos - 3 Osagentes do Estado e o dever de observar o Direito Internacional dos DireitosHumanos _ 4Osdireitos sociaisdentro dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos - 5As instacircncias juriacutedicas nacionais e o Direito Internacional dos DireitosHumanos da retoacutericaagrave praxe

1 OS SISTEMAS DE PROTECcedilAtildeO INTERNACIONAL FRENTE AO DIREITO IN-TERNO

Interessa agora evidenciar o quatildeo interativos e mutuamente influentesdevem ser o direito brasileiro e o Direito Internacional dos Direitos Humanos(DIDH) assim potencializando o avanccedilo pracirctico da proteccedilatildeo da dignidade dapessoa humana

Sob esta inspiraccedilatildeo e de antematildeo haacute que se superar o claacutessico debateentre as correntes monista e dualista historicamente travado nas fileiras dodireito internacional Eacute que a polecircmica envolvendo a existecircncia ou natildeo de duasordens juriacutedicas distintas e estanques (a domeacutestica e a internacional) soacute fazprejudicar a efetividade dos direitos humanos A uma porque tanto os direi-tos nacionais (em regra) quanto o direto internacional encontram-se hodier-namente calcados na concepccedilatildeo material central da proteccedilatildeo intransigenteda dignidade da pessoa humana denotando unidade de significado A duasporque como visto o monitoramento e a apuraccedilatildeo da violaccedilatildeo de direitoshumanos no plano internacional foram construiacutedos como espaccedilos imbuiacutedos doobjetivo de fazer avanccedilar a mateacuteria na seara interna dos Estados E finalmentea trecircs porque a Constituiccedilatildeo Federal de 988 expressa e definitivamente ad-mite-se natildeo exaurida em seu proacuteprio texto mas ao contraacuterio complementadano que tange aos direitos humanos pelas normas internacionais sobretudo nostermos dos ~ 2deg do seu art 5deg Jaacute desde o texto constitucional portanto vecirc-seque o ordenamento juriacutedico brasileiro compreende o Direito Internacional dosDireitos Humanos dele natildeo se separando

Nesta linha intensa criacutetica deve ser dirigida aos movimentos de retrocessodo Estado brasileiro em se tratando de submissatildeo aos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo dos direitos humanos ainda que tais movimentos felizmente natildeorepresentem tendecircncia nos dias de hoje

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A este propoacutesito cite-se por exemplo a natildeo submissatildeo brasileira agrave jurisdiccedilatildeoda Corte Internacional de Justiccedila e a natildeo autorizaccedilatildeo ao Comitecirc sobre os DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais e ao Comitecirc sobre os Direitos da crianccedila parao recebimento e apuraccedilatildeo de peticcedilotildees individuais acerca do descumpriment~pelo Brasil respectivamente da Convenccedilatildeo sobre Direitos Econocircmicos Sociais eCulturais e da Convenccedilatildeo sobre 05 Direitos da Crianccedila ratificadas pelo paiacutes nomarco da ONU Igualmente mencione-se a denuacutencia brasileira agrave Convenccedilatildeo nO158 da OITsobre o teacutermino da relaccedilatildeo de trabalho por iniciativa do empregador(ratificada em 1995 e denunciada em 1996)

O uso da denuacutencia a tratados como instrumento de mitigaccedilatildeo dos compromis-sos internacionais contudo vem tendo cada vez menos forccedila para desvincularos Estados das obrigaccedilotildees relacionadas aos direitos humanos notadamente emrazatildeo da irrefreaacutevel consolidaccedilatildeo das normas costumeiras e das normas impe-rativas (jus cogens) como produto de um consenso qualificado obtido no seioda comunidade internacional e sufragado pelas instacircncias de monitoramento eapuraccedilatildeo de violaccedilotildees para aleacutem do vetusto apego agrave loacutegica da ratificaccedilatildeo comocondiccedilatildeo sine qUQ non para a responsabilizaccedilatildeo estatal por afronta a direitoshumanos

Esta substituiccedilatildeo do consentimento estatal pelo consenso muito bem iden-tificada por CANCcedilADOTRINOAOEe aqui estudada quando da abordagem do temadas fontes do direito internacional se revela em inuacutemeras ocasiotildees respeitan-tes aos sistemas internacionais de proteccedilatildeo de direitos humanos tais como aimputaccedilatildeo de cogecircncia pelos oacutergatildeos quase-judiciais e judiciais agraves Declaraccedilotildeesde Direitos Humanos (ex vi a Declaraccedilatildeo Universal e a Declaraccedilatildeo Americana) ogradual reconhecimento da existecircncia de normas imperativas pela jurisprudecircnciainternacional e a adoccedilatildeo da Declaraccedilatildeo de Princiacutepios e Direitos Fundamentais doTrabalho pela 01T

Sob o prisma brasileiro encontra-se vigente um rico arcabouccedilo de normas einstrumentos procedimentais internacionais aos quais cumpre dar maacutexima efeti-vidade na dimensatildeo domeacutestica Mas se eacute assim por que entatildeo a despeito detiacutemidos avanccedilos em situaccedilotildees pontuais a maioria dos paiacuteses engajados nos sis-temas de proteccedilatildeo internacional dos direitos humanos ainda encontra resistecircnciaem fazer valer sobretudo no campo juridico os padrotildees de interpretaccedilatildeo asrecomendaccedilotildees e as decisotildees dos diversos oacutergatildeos de monitoramento e apuraccedilatildeode violaccedilatildeo integrantes dos mecanismos internacionais de proteccedilatildeo Para falarde Brasil por que os Trecircs Poderes do Estado brasileiro satildeo tatildeo timidos quandose trata de atuar expressamente com base nas normas e na jurisprudecircncia pro-duzidos por exemplo pelos oacutergatildeos do sistema interamericano de proteccedilatildeo dosdireitos humanos Esse eacute um tema aacutespero e ao mesmo tempo decisivo para atatildeo buscada efetividade do DIOH

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EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS NO AcircM81TO NACIONAL

Paradoxalmente agrave vista das normas em vigor natildeo haacute qualquer duacutevida deque os Estados submetidos agraves instacircncias internacionais protetoras dos direitoshumanos estatildeo obrigados como jaacute estudado em absolutamente todas as suasinstacircncias (administrativas legislativas e judiciaacuterias) a respeitar (natildeo intervir)proteger (legislar e criar aparato que coiacuteba as violaccedilotildees) e promover (adotarpoliacuteticas que fomentem o gozo efetivo) as normas de DIOHque lhes sejam apli-caacuteveis Tal obrigaccedilatildeo juriacutedica embora decorra logicamente o princiacutepio da boa-feacuteque rege a celebraccedilatildeo e a interpretaccedilatildeo dos tratados internacionais (art 3 daConvenccedilatildeo de Viena) eacute corriqueiramente enunciada nos pactos Cite-se a essepropoacutesito os seguintes enunciados normativos

Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos (ONU)

Artigo 2

lo Os Estados Partes do presente pacto comprometem-se a respeitar e ga-rantir a todos os indiviacuteduos que se achem em seu territoacuterio e que estejamsujeitos a sua jurisdiccedilatildeo os direitos reconhecidos no presente Pacto semdiscriminaccedilatildeo alguma por motivo de raccedila cor sexo liacutengua religiatildeo opiniaopoliacutetica ou de outra natureza origem nacional ou social situaccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer condiccedilatildeo

2 Na ausecircncia de medidas legislativas ou de outra natureza destinadas atornar efetivos os direitos reconhecidos no presente Pacto os Estados Partesdo presente Pacto comprometem-se a tomar as providecircncias necessaacuteriascom vistas a adotaacute-Ias levando em consideraccedilatildeo seus respectivos procedimentos constitucionais e as disposiccedilotildees do presente Pacto (destacado)

Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos (OEA)

Artigo 1deg - Obrigaccedilatildeo de respeitar os direitos

lo Os Estados-partes nesta Convenccedilatildeo comprometem-se a respeitar os di-reitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exer-ciacutecio a toda pessoa Que esteja sujeita agrave sua jurisdiccedilatildeo sem discriminaccedilatildeoalguma por motivo de raccedila cor sexo idioma religiatildeo opiniotildees poliacuteticas oude qualquer outra natureza origem nacional ou social posiccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer outra condiccedilatildeo social

c)

Artigo 2deg - Dever de adotar disposiccedilotildees de direito interno

Se o exerciacutecio dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda natildeoestiver garantido por disposiccedilotildees legislativas ou de outra natureza os Es-tados-partes comprometem-se a adotar de acordo com as suas normasconstitucionais e com as disposiccedilotildees desta Convenccedilatildeo as medidas legislati-vas ou de outra natureza que forem necessaacuterias para tornar efetivos taisdireitos e liberdades (destacado)

Na mesma linha estatildeo redigidos o art 2deg do Pacto Internacional de DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais (ONU) e os arts O e 2deg do Protocolo de San Sal-vador (OEA)

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SILVIO BElTRAMUU NElo

Conforme adverte de forma enfaacutetica PEDRONIKKENexJuiz e ex-Presidenteda Corte IOH disposiccedilotildees normativas como as citadas de aplicaccedilatildeo imediata(autoexecutaacuteveis ou selfexecuting) impotildeem deveres de respeitar garantir satisfazer proteger e legislar deixando claro que o Estado eacute juridicamente o ente chomado a por em execuccedilatildeo o sistema internacional de proteccedilatildeo de direitos humanosltAfinal o OIOHnatildeo passaria de ficccedilatildeo se natildeo produzisse efeitos diretos nos planosdomeacutesticos dos Estados aos quais se direciona

Eacute nesta perspectiva consagrada pelo art 27 da Convenccedilatildeo de Viena sobre oOireito dos Tratados (Uma pane natildeo pode invocar as disposiccedilotildees de seu direitointerno para justificar o inadimplemento de um tratado) que os oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos sejam eles de natureza poliacutetica qua-se-judicial ou judicial rechaccedilam ostensivamente o argumento da inobservacircnciade certa norma de OIOHpor incompatibilidade com o ordenamento juriacutedico na-cional Como visto em decorrecircncia dos deveres de respeito proteccedilatildeo e promo-ccedilatildeo eacute dever do Estado adequar sua ordem juridica poliacutetica e administrativa agravesobrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacional ainda queisso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas aleacutem eacute claro da proibiccedilatildeo de se legislar contrariamente ao assumi-do No sentido da obrigaccedilatildeo estatal de ateacute mesmo revogar normas nacionais emdecorrecircncia do art 20 da Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos a CorteIOHjaacute se manifestou em distintas oportunidades

Frise-se o OIDHnatildeo descreve ou impotildee o modo como o Estado deveraacute colocar em execuccedilatildeo as obrigaccedilotildees assumidas - ateacute porque cada ente estatal contacom mecanismos proacuteprios de internalizaccedilatildeo das normas internacionais e deseu adimplemento - todavia natildeo se aceita qualquer argumento que intentesustentar a impossibilidade juriacutedica de fazecirclo Em assim sendo acerca da ceieuma monismodualismo em mateacuteria de direitos humanos natildeo haacute outro caminhoa ser seguido 0 conceito monista eacute sem duacutevida o uacutenico adequado ao direitodos direitos humanos baseado na dignidade inerente agrave pessoa humana a qualnatildeo admite ser concebida de uma maneira diferente no acircmbito nacional e nointernacional

I Neste sentido jaacute se manifestou o Comitecirc de Direitos Humanos do PIDCPda ONU(Comentaacuterio Geral n- 31bullde 20004)e diversas vezes a Cone IOH(Opinillo Consultiva OC-786 e casos Cantos $ Argentina OlmedoBustos e Outros IS Chile e Hilaire Conslantine y Benjamin e OUlros IS Trinidade e Tobago)

2 NIKKENPedro EI Derecho Internacional de los Derechos Humanos em ti derccho interno Revisro IrDH51(jon-jumoo3) JS

3 Vide Casos Cacircstillo Pedruzzl e Outros IS Peruacute Baena Ricardo e Outros IS Panamaacute Ourand e ugane 1$

Peruacute Suaacuteres Rosero IS Equador Olmedo Bustos e Outros IS Chile e Herrera ulhoa 5 Costa Rica-i NIKKENPedro op til p 21

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EfEllV1DAO 00 DIREITO INTERNtCIOfM DOS DUlfiOS HUMANOS NO -MaITO IU(IOHAL

I) Importante

Decorre da natureza do DIOHda boafeacute na ratificaccedilatildeo dos tratados e no mais das vezes dedisposiccedilotildees expressas dos proacuteprios tratados o dever do Estado adequar sua ordem juriacutedicapoliacutetica e administrativa agraves obrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacionalainda que isso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas

Ateacute aqui abordou-se a questatildeo da efetividade da proteccedilatildeo internacional dosdireitos humanos sob o prisma da necessaacuteria compatibilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo do-meacutestica com o DIOH em favor desse uacuteltimo Cumpre agora pensar o mesmoproblema mas lanccedilando foco sobre os operadores do Oireito dentro da esferajudicial

2-CUMPRIMENTO DAS DECISOtildeES DOS OacuteRGAtildeOS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Como jaacute se supotildee pressuposto da efetividade dos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo de direitos humanos eacute o grau de acatamento das recomendaccedilotildees edecisotildees emanadas de seus oacutergatildeos pelo Estado a quem se dirigem

Em se tratando de Brasil esta questatildeo afigura-se ainda mais sensiacutevel emvirtude da ausecircncia de qualquer regulamentaccedilatildeo especiacutefica a respeito do cumprimento do quanto emanado daqueles oacutergatildeos Em que pese reconheccedila-se aevoluccedilatildeo da postura brasileira frente aos referidos sistemas evidenciada pelaatenccedilatildeo conferida aos relatoacuterios produzidos e pela adoccedilatildeo de providecircncias emobservacircncia a inuacutemeras recomendaccedilotildees e decisotildees vindas dos diversos mecanis-mos eacute cena que o Estado brasileiro ainda ressente-se de disciplina juriacutedica maisrobusta acerca do cumprimento imediato das decisotildees internacionais vinculantesjaacute que as recomendaccedilotildees em tese conforme a praacutetica jusinternacional natildeo ensejam sanccedilatildeo acaso olvidadas

Por ora como visto conta-se apenas com o entendimento essencialmentedoutrinaacuterio segundo o qual no 8rasil uma sentenccedila condenatoacuteria emanada deoacutergatildeo internacional judicial (vg a Corte IOH) unicamente no tocante a valorespecuniaacuterios poderaacute ser executada perante a Vara Federal territorialmente com-petente

Isto ainda eacute muito pouco Urge a criaccedilatildeo de uma verdadeira estrutura brasileira de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais para muito aleacutem da quitaccedilatildeode indenizaccedilotildees

A favor desta empreitada poderaacute vir a estar o resultado do Projeto de lein 4667 de 2004 que pretende disciplinar os efeitos juridicos das decisotildees dosOrganismos Internacionais de Proteccedilatildeo aos Direitos Humanos Quando de sua

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StvlO BmllAMHU NpoundTO

apresentaccedilatildeo este Projeto de lei versava apenas sobre as indenizaccedilotildees esta-belecidas em decisotildees internacionais e a possibilidade de accedilotildees regressivas doEstado brasileiro em face das pessoas fisicas ou juriacutedicas promotoras do ato deviolaccedilatildeo declarado pela instatildencia internacional Nada foi dito sobre o adimple-mento das demais formas de reparaccedilatildeo (que natildeo a indenizaccedilatildeo) porventura de- terminadas ao Estado brasileiro algo que mantinha tal iniciativa legislativa muitoaqueacutem do necessaacuterio

Ateacute que em 2006 a relataria do Projeto de lei procedeu a vaacuterias alteraccedilotildeesincluindo prazos para cumprimento das medidas cautelares da CloH e das me-didas provisoacuterias da cone 10H bem como para pagamento de indenizaccedilotildeespreservado o direito estatal de regresso contra o violador imediato inclusivemediante glosa de repasses devidos pela Uniatildeo a Estados e Municipios se for ocaso Do mesmo modo o novo texto prevecirc a constituiccedilatildeo de oacutergatildeo especifico incumbido de acompanhar a implementaccedilatildeo de todas as obrigaccedilotildees internacional-mente imputadas ao Brasil (obrigaccedilotildees de fazer natildeo-fazer e pagar) para tantodotado de poderes de notificaccedilatildeo dos entes aos quais cabe executar as medidasdecorrentes da condenaccedilatildeo havida visando a apresentaccedilatildeo de plano de cumpri-mento e de relatoacuterio de providecircncias adotadas

Em setembro de 2010 editou-se acerca deste mesmo Projeto de lei NotaTeacutecnica elaborada por Procuradores Regionais da Repuacuteblica para isso nomeadospela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadatildeo Nesta Nota Teacutecnica diversassugestotildees adicionais estatildeo consolidadas de modo a imprimir maior clareza eefetividade agrave proposta de regulamentaccedilatildeo do cumprimento das decisotildees inter-nacionais vinculantes em mateacuteria de direitos humanos Dentre as propostas danota teacutecnica destacamse

que o texto da lei contemple de modo amplo as decisotildees dos organismosinternacionais de direitos humanos incluindo os tribunais que julguemcrimes contra direitos humanos (atualmente apenas o TPI)

bull que a regulamentaccedilatildeo diga respeito apenas agrave decisotildees vinculantes exclu-iacutedas as recomendaccedilotildees porquanto destituidas de consequecircncias juridicassancionatoacuterias no plano internacional em caso de inobservacircncia

bull que os processos e procedimentos de execuccedilatildeo da decisatildeo internacionalvinculante tenham prioridade sobre quaisquer outros agrave exceccedilatildeo do habe-as corpus e do mandado de seguranccedila

bull que esta lei seja compreendida comoo primeiro passo para a estruturaccedilatildeode um mecanismo nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais

5 NOTATtCNICA Disponiacutevel em lthttpwwwacademiaedu1628080Nota_Tecnlca_-_projeto_deJei_JmplementaC3IA71q~30_deciSLC31B5esJnternacionais_Brasilgt Acesso em 15 jan 2015

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EmMOAOt 00 DllllUO INTERNAClONM DOS OlRErros HUMANOS NO AgraveMBt10 NACIOtItt

em mateacuteria de direitos humanos portanto necessariamente demandantede iniciativas sobretudo normativas posteriores de detalhamento e con-solidaccedilatildeo dessa estrutura

O Projeto de lei jaacute recebeu no acircmbito da Cacircmara de Deputados pareceresfavoraacuteveis da Comissatildeo de Direitos Humanos e Minorias (aprovaccedilatildeo de textosubstitutivo) em 2006 da Comissatildeo de Relaccedilotildees Exteriores e de Defesa Nacionalem 2007 e da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e de Justiccedila e de Cidadania em 2010

Desde entatildeo a proposta legislativa foi encaminhada ao Senado Federai estandono momento a aguardar deliberaccedilatildeo final da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccediladessa Casa Parlamentar jaacute contando com parecer favoraacutevel do Relator designa-do embora com sugestatildeo de alteraccedilatildeo (a nosso ver indesejada) de texto para asupressatildeo do trecho que imprime efeitos imediatos agraves decisotildees internacionaisJ

A ausecircncia dessa estrutura diretamente incumbida do cumprimento das deciosotildees internacionais relativas a direitos humanos natildeo impediu que se instituiacutesseminiciativas e instituiccedilotildees que dentro de suas aacutereas de aplicaccedilatildeo e atuaccedilatildeo vecircmse consolidando como as principais vias de difusatildeo e implementaccedilatildeo interna dospadrotildees desenvolvidos por todas as instacircncias da proteccedilatildeo internacional dos di-reitos humanos incluindo as quase-judiciais e judiciais Como jaacute foi dito o Brasilconta com programas e oacutergatildeos com atribuiccedilotildees gerais ou especiacuteficas atinentesagrave proteccedilatildeo dos direitos humanos os quais a despeito da necessidade de incre-mento apresentaratildeo resultados mais eficazes quanto mais se aproximem e demodo aniculado estatildebeleccedilam padrotildees de interpretaccedilatildeo promoccedilatildeo e proteccedilatildeodos direitos humanos tal quai delineado pelos mecanismos internacionais Atiacutetulo de exemplo citemse uma vez mais os Programas Nacionais de DireitosHumanos de 1996 2002 e 2009 (PNoH I 2 e 3 respedivamente) editados pelaPresideacutencia da Repuacuteblica na forma de Decretos na esteira do Programa de Accedilatildeoda Conferecircncia de Viena de 1993 e a Secretaria de Direitos Humanos (SoH) vin-culada em 2003 de modo direto agrave Presidecircncia da Repuacuteblica assumindo statusde Ministeacuterio

Nas instacircncias executiva e legislativa embora ainda se esteja demasiado dis-tante do cenaacuterio ideal - idealizado como aquele em que as decisotildees poliacuteticas enormativas de modo expliacutecito e integrai pautem-se pela proteccedilatildeo e promoccedilatildeodos direitos humanos - jaacute natildeo satildeo tatildeo raros os episoacutedios de redirecionamentode condutas promovido por forccedila de recomendaccedilotildees ou decisotildees emanadasdos mecanismos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilotildees de

6 BRASIL CAcircMARA DOS DEPUTADOS Projelo de lei n 4667 de 2004 Disponiacutevel em hllpfwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadelram1tacao7idProposicaO2736501 Acesso em 15 jan 2015

1 BRASIL SENADO FEDERAL projelo de lei n 4661 de 2004 Disponiacutevel em hnpwwwsenadogovbralividademateriadelalhesasp]p_cod_mate9S3601 Acesso em 151an 101S

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SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 4: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

------~~~~~------~--9_SILVIO BmRAMELlI NETO

A este propoacutesito cite-se por exemplo a natildeo submissatildeo brasileira agrave jurisdiccedilatildeoda Corte Internacional de Justiccedila e a natildeo autorizaccedilatildeo ao Comitecirc sobre os DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais e ao Comitecirc sobre os Direitos da crianccedila parao recebimento e apuraccedilatildeo de peticcedilotildees individuais acerca do descumpriment~pelo Brasil respectivamente da Convenccedilatildeo sobre Direitos Econocircmicos Sociais eCulturais e da Convenccedilatildeo sobre 05 Direitos da Crianccedila ratificadas pelo paiacutes nomarco da ONU Igualmente mencione-se a denuacutencia brasileira agrave Convenccedilatildeo nO158 da OITsobre o teacutermino da relaccedilatildeo de trabalho por iniciativa do empregador(ratificada em 1995 e denunciada em 1996)

O uso da denuacutencia a tratados como instrumento de mitigaccedilatildeo dos compromis-sos internacionais contudo vem tendo cada vez menos forccedila para desvincularos Estados das obrigaccedilotildees relacionadas aos direitos humanos notadamente emrazatildeo da irrefreaacutevel consolidaccedilatildeo das normas costumeiras e das normas impe-rativas (jus cogens) como produto de um consenso qualificado obtido no seioda comunidade internacional e sufragado pelas instacircncias de monitoramento eapuraccedilatildeo de violaccedilotildees para aleacutem do vetusto apego agrave loacutegica da ratificaccedilatildeo comocondiccedilatildeo sine qUQ non para a responsabilizaccedilatildeo estatal por afronta a direitoshumanos

Esta substituiccedilatildeo do consentimento estatal pelo consenso muito bem iden-tificada por CANCcedilADOTRINOAOEe aqui estudada quando da abordagem do temadas fontes do direito internacional se revela em inuacutemeras ocasiotildees respeitan-tes aos sistemas internacionais de proteccedilatildeo de direitos humanos tais como aimputaccedilatildeo de cogecircncia pelos oacutergatildeos quase-judiciais e judiciais agraves Declaraccedilotildeesde Direitos Humanos (ex vi a Declaraccedilatildeo Universal e a Declaraccedilatildeo Americana) ogradual reconhecimento da existecircncia de normas imperativas pela jurisprudecircnciainternacional e a adoccedilatildeo da Declaraccedilatildeo de Princiacutepios e Direitos Fundamentais doTrabalho pela 01T

Sob o prisma brasileiro encontra-se vigente um rico arcabouccedilo de normas einstrumentos procedimentais internacionais aos quais cumpre dar maacutexima efeti-vidade na dimensatildeo domeacutestica Mas se eacute assim por que entatildeo a despeito detiacutemidos avanccedilos em situaccedilotildees pontuais a maioria dos paiacuteses engajados nos sis-temas de proteccedilatildeo internacional dos direitos humanos ainda encontra resistecircnciaem fazer valer sobretudo no campo juridico os padrotildees de interpretaccedilatildeo asrecomendaccedilotildees e as decisotildees dos diversos oacutergatildeos de monitoramento e apuraccedilatildeode violaccedilatildeo integrantes dos mecanismos internacionais de proteccedilatildeo Para falarde Brasil por que os Trecircs Poderes do Estado brasileiro satildeo tatildeo timidos quandose trata de atuar expressamente com base nas normas e na jurisprudecircncia pro-duzidos por exemplo pelos oacutergatildeos do sistema interamericano de proteccedilatildeo dosdireitos humanos Esse eacute um tema aacutespero e ao mesmo tempo decisivo para atatildeo buscada efetividade do DIOH

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EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS NO AcircM81TO NACIONAL

Paradoxalmente agrave vista das normas em vigor natildeo haacute qualquer duacutevida deque os Estados submetidos agraves instacircncias internacionais protetoras dos direitoshumanos estatildeo obrigados como jaacute estudado em absolutamente todas as suasinstacircncias (administrativas legislativas e judiciaacuterias) a respeitar (natildeo intervir)proteger (legislar e criar aparato que coiacuteba as violaccedilotildees) e promover (adotarpoliacuteticas que fomentem o gozo efetivo) as normas de DIOHque lhes sejam apli-caacuteveis Tal obrigaccedilatildeo juriacutedica embora decorra logicamente o princiacutepio da boa-feacuteque rege a celebraccedilatildeo e a interpretaccedilatildeo dos tratados internacionais (art 3 daConvenccedilatildeo de Viena) eacute corriqueiramente enunciada nos pactos Cite-se a essepropoacutesito os seguintes enunciados normativos

Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos (ONU)

Artigo 2

lo Os Estados Partes do presente pacto comprometem-se a respeitar e ga-rantir a todos os indiviacuteduos que se achem em seu territoacuterio e que estejamsujeitos a sua jurisdiccedilatildeo os direitos reconhecidos no presente Pacto semdiscriminaccedilatildeo alguma por motivo de raccedila cor sexo liacutengua religiatildeo opiniaopoliacutetica ou de outra natureza origem nacional ou social situaccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer condiccedilatildeo

2 Na ausecircncia de medidas legislativas ou de outra natureza destinadas atornar efetivos os direitos reconhecidos no presente Pacto os Estados Partesdo presente Pacto comprometem-se a tomar as providecircncias necessaacuteriascom vistas a adotaacute-Ias levando em consideraccedilatildeo seus respectivos procedimentos constitucionais e as disposiccedilotildees do presente Pacto (destacado)

Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos (OEA)

Artigo 1deg - Obrigaccedilatildeo de respeitar os direitos

lo Os Estados-partes nesta Convenccedilatildeo comprometem-se a respeitar os di-reitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exer-ciacutecio a toda pessoa Que esteja sujeita agrave sua jurisdiccedilatildeo sem discriminaccedilatildeoalguma por motivo de raccedila cor sexo idioma religiatildeo opiniotildees poliacuteticas oude qualquer outra natureza origem nacional ou social posiccedilatildeo econocircmicanascimento ou qualquer outra condiccedilatildeo social

c)

Artigo 2deg - Dever de adotar disposiccedilotildees de direito interno

Se o exerciacutecio dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda natildeoestiver garantido por disposiccedilotildees legislativas ou de outra natureza os Es-tados-partes comprometem-se a adotar de acordo com as suas normasconstitucionais e com as disposiccedilotildees desta Convenccedilatildeo as medidas legislati-vas ou de outra natureza que forem necessaacuterias para tornar efetivos taisdireitos e liberdades (destacado)

Na mesma linha estatildeo redigidos o art 2deg do Pacto Internacional de DireitosEconocircmicos Sociais e Culturais (ONU) e os arts O e 2deg do Protocolo de San Sal-vador (OEA)

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SILVIO BElTRAMUU NElo

Conforme adverte de forma enfaacutetica PEDRONIKKENexJuiz e ex-Presidenteda Corte IOH disposiccedilotildees normativas como as citadas de aplicaccedilatildeo imediata(autoexecutaacuteveis ou selfexecuting) impotildeem deveres de respeitar garantir satisfazer proteger e legislar deixando claro que o Estado eacute juridicamente o ente chomado a por em execuccedilatildeo o sistema internacional de proteccedilatildeo de direitos humanosltAfinal o OIOHnatildeo passaria de ficccedilatildeo se natildeo produzisse efeitos diretos nos planosdomeacutesticos dos Estados aos quais se direciona

Eacute nesta perspectiva consagrada pelo art 27 da Convenccedilatildeo de Viena sobre oOireito dos Tratados (Uma pane natildeo pode invocar as disposiccedilotildees de seu direitointerno para justificar o inadimplemento de um tratado) que os oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos sejam eles de natureza poliacutetica qua-se-judicial ou judicial rechaccedilam ostensivamente o argumento da inobservacircnciade certa norma de OIOHpor incompatibilidade com o ordenamento juriacutedico na-cional Como visto em decorrecircncia dos deveres de respeito proteccedilatildeo e promo-ccedilatildeo eacute dever do Estado adequar sua ordem juridica poliacutetica e administrativa agravesobrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacional ainda queisso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas aleacutem eacute claro da proibiccedilatildeo de se legislar contrariamente ao assumi-do No sentido da obrigaccedilatildeo estatal de ateacute mesmo revogar normas nacionais emdecorrecircncia do art 20 da Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos a CorteIOHjaacute se manifestou em distintas oportunidades

Frise-se o OIDHnatildeo descreve ou impotildee o modo como o Estado deveraacute colocar em execuccedilatildeo as obrigaccedilotildees assumidas - ateacute porque cada ente estatal contacom mecanismos proacuteprios de internalizaccedilatildeo das normas internacionais e deseu adimplemento - todavia natildeo se aceita qualquer argumento que intentesustentar a impossibilidade juriacutedica de fazecirclo Em assim sendo acerca da ceieuma monismodualismo em mateacuteria de direitos humanos natildeo haacute outro caminhoa ser seguido 0 conceito monista eacute sem duacutevida o uacutenico adequado ao direitodos direitos humanos baseado na dignidade inerente agrave pessoa humana a qualnatildeo admite ser concebida de uma maneira diferente no acircmbito nacional e nointernacional

I Neste sentido jaacute se manifestou o Comitecirc de Direitos Humanos do PIDCPda ONU(Comentaacuterio Geral n- 31bullde 20004)e diversas vezes a Cone IOH(Opinillo Consultiva OC-786 e casos Cantos $ Argentina OlmedoBustos e Outros IS Chile e Hilaire Conslantine y Benjamin e OUlros IS Trinidade e Tobago)

2 NIKKENPedro EI Derecho Internacional de los Derechos Humanos em ti derccho interno Revisro IrDH51(jon-jumoo3) JS

3 Vide Casos Cacircstillo Pedruzzl e Outros IS Peruacute Baena Ricardo e Outros IS Panamaacute Ourand e ugane 1$

Peruacute Suaacuteres Rosero IS Equador Olmedo Bustos e Outros IS Chile e Herrera ulhoa 5 Costa Rica-i NIKKENPedro op til p 21

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EfEllV1DAO 00 DIREITO INTERNtCIOfM DOS DUlfiOS HUMANOS NO -MaITO IU(IOHAL

I) Importante

Decorre da natureza do DIOHda boafeacute na ratificaccedilatildeo dos tratados e no mais das vezes dedisposiccedilotildees expressas dos proacuteprios tratados o dever do Estado adequar sua ordem juriacutedicapoliacutetica e administrativa agraves obrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacionalainda que isso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas

Ateacute aqui abordou-se a questatildeo da efetividade da proteccedilatildeo internacional dosdireitos humanos sob o prisma da necessaacuteria compatibilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo do-meacutestica com o DIOH em favor desse uacuteltimo Cumpre agora pensar o mesmoproblema mas lanccedilando foco sobre os operadores do Oireito dentro da esferajudicial

2-CUMPRIMENTO DAS DECISOtildeES DOS OacuteRGAtildeOS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Como jaacute se supotildee pressuposto da efetividade dos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo de direitos humanos eacute o grau de acatamento das recomendaccedilotildees edecisotildees emanadas de seus oacutergatildeos pelo Estado a quem se dirigem

Em se tratando de Brasil esta questatildeo afigura-se ainda mais sensiacutevel emvirtude da ausecircncia de qualquer regulamentaccedilatildeo especiacutefica a respeito do cumprimento do quanto emanado daqueles oacutergatildeos Em que pese reconheccedila-se aevoluccedilatildeo da postura brasileira frente aos referidos sistemas evidenciada pelaatenccedilatildeo conferida aos relatoacuterios produzidos e pela adoccedilatildeo de providecircncias emobservacircncia a inuacutemeras recomendaccedilotildees e decisotildees vindas dos diversos mecanis-mos eacute cena que o Estado brasileiro ainda ressente-se de disciplina juriacutedica maisrobusta acerca do cumprimento imediato das decisotildees internacionais vinculantesjaacute que as recomendaccedilotildees em tese conforme a praacutetica jusinternacional natildeo ensejam sanccedilatildeo acaso olvidadas

Por ora como visto conta-se apenas com o entendimento essencialmentedoutrinaacuterio segundo o qual no 8rasil uma sentenccedila condenatoacuteria emanada deoacutergatildeo internacional judicial (vg a Corte IOH) unicamente no tocante a valorespecuniaacuterios poderaacute ser executada perante a Vara Federal territorialmente com-petente

Isto ainda eacute muito pouco Urge a criaccedilatildeo de uma verdadeira estrutura brasileira de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais para muito aleacutem da quitaccedilatildeode indenizaccedilotildees

A favor desta empreitada poderaacute vir a estar o resultado do Projeto de lein 4667 de 2004 que pretende disciplinar os efeitos juridicos das decisotildees dosOrganismos Internacionais de Proteccedilatildeo aos Direitos Humanos Quando de sua

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StvlO BmllAMHU NpoundTO

apresentaccedilatildeo este Projeto de lei versava apenas sobre as indenizaccedilotildees esta-belecidas em decisotildees internacionais e a possibilidade de accedilotildees regressivas doEstado brasileiro em face das pessoas fisicas ou juriacutedicas promotoras do ato deviolaccedilatildeo declarado pela instatildencia internacional Nada foi dito sobre o adimple-mento das demais formas de reparaccedilatildeo (que natildeo a indenizaccedilatildeo) porventura de- terminadas ao Estado brasileiro algo que mantinha tal iniciativa legislativa muitoaqueacutem do necessaacuterio

Ateacute que em 2006 a relataria do Projeto de lei procedeu a vaacuterias alteraccedilotildeesincluindo prazos para cumprimento das medidas cautelares da CloH e das me-didas provisoacuterias da cone 10H bem como para pagamento de indenizaccedilotildeespreservado o direito estatal de regresso contra o violador imediato inclusivemediante glosa de repasses devidos pela Uniatildeo a Estados e Municipios se for ocaso Do mesmo modo o novo texto prevecirc a constituiccedilatildeo de oacutergatildeo especifico incumbido de acompanhar a implementaccedilatildeo de todas as obrigaccedilotildees internacional-mente imputadas ao Brasil (obrigaccedilotildees de fazer natildeo-fazer e pagar) para tantodotado de poderes de notificaccedilatildeo dos entes aos quais cabe executar as medidasdecorrentes da condenaccedilatildeo havida visando a apresentaccedilatildeo de plano de cumpri-mento e de relatoacuterio de providecircncias adotadas

Em setembro de 2010 editou-se acerca deste mesmo Projeto de lei NotaTeacutecnica elaborada por Procuradores Regionais da Repuacuteblica para isso nomeadospela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadatildeo Nesta Nota Teacutecnica diversassugestotildees adicionais estatildeo consolidadas de modo a imprimir maior clareza eefetividade agrave proposta de regulamentaccedilatildeo do cumprimento das decisotildees inter-nacionais vinculantes em mateacuteria de direitos humanos Dentre as propostas danota teacutecnica destacamse

que o texto da lei contemple de modo amplo as decisotildees dos organismosinternacionais de direitos humanos incluindo os tribunais que julguemcrimes contra direitos humanos (atualmente apenas o TPI)

bull que a regulamentaccedilatildeo diga respeito apenas agrave decisotildees vinculantes exclu-iacutedas as recomendaccedilotildees porquanto destituidas de consequecircncias juridicassancionatoacuterias no plano internacional em caso de inobservacircncia

bull que os processos e procedimentos de execuccedilatildeo da decisatildeo internacionalvinculante tenham prioridade sobre quaisquer outros agrave exceccedilatildeo do habe-as corpus e do mandado de seguranccedila

bull que esta lei seja compreendida comoo primeiro passo para a estruturaccedilatildeode um mecanismo nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais

5 NOTATtCNICA Disponiacutevel em lthttpwwwacademiaedu1628080Nota_Tecnlca_-_projeto_deJei_JmplementaC3IA71q~30_deciSLC31B5esJnternacionais_Brasilgt Acesso em 15 jan 2015

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EmMOAOt 00 DllllUO INTERNAClONM DOS OlRErros HUMANOS NO AgraveMBt10 NACIOtItt

em mateacuteria de direitos humanos portanto necessariamente demandantede iniciativas sobretudo normativas posteriores de detalhamento e con-solidaccedilatildeo dessa estrutura

O Projeto de lei jaacute recebeu no acircmbito da Cacircmara de Deputados pareceresfavoraacuteveis da Comissatildeo de Direitos Humanos e Minorias (aprovaccedilatildeo de textosubstitutivo) em 2006 da Comissatildeo de Relaccedilotildees Exteriores e de Defesa Nacionalem 2007 e da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e de Justiccedila e de Cidadania em 2010

Desde entatildeo a proposta legislativa foi encaminhada ao Senado Federai estandono momento a aguardar deliberaccedilatildeo final da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccediladessa Casa Parlamentar jaacute contando com parecer favoraacutevel do Relator designa-do embora com sugestatildeo de alteraccedilatildeo (a nosso ver indesejada) de texto para asupressatildeo do trecho que imprime efeitos imediatos agraves decisotildees internacionaisJ

A ausecircncia dessa estrutura diretamente incumbida do cumprimento das deciosotildees internacionais relativas a direitos humanos natildeo impediu que se instituiacutesseminiciativas e instituiccedilotildees que dentro de suas aacutereas de aplicaccedilatildeo e atuaccedilatildeo vecircmse consolidando como as principais vias de difusatildeo e implementaccedilatildeo interna dospadrotildees desenvolvidos por todas as instacircncias da proteccedilatildeo internacional dos di-reitos humanos incluindo as quase-judiciais e judiciais Como jaacute foi dito o Brasilconta com programas e oacutergatildeos com atribuiccedilotildees gerais ou especiacuteficas atinentesagrave proteccedilatildeo dos direitos humanos os quais a despeito da necessidade de incre-mento apresentaratildeo resultados mais eficazes quanto mais se aproximem e demodo aniculado estatildebeleccedilam padrotildees de interpretaccedilatildeo promoccedilatildeo e proteccedilatildeodos direitos humanos tal quai delineado pelos mecanismos internacionais Atiacutetulo de exemplo citemse uma vez mais os Programas Nacionais de DireitosHumanos de 1996 2002 e 2009 (PNoH I 2 e 3 respedivamente) editados pelaPresideacutencia da Repuacuteblica na forma de Decretos na esteira do Programa de Accedilatildeoda Conferecircncia de Viena de 1993 e a Secretaria de Direitos Humanos (SoH) vin-culada em 2003 de modo direto agrave Presidecircncia da Repuacuteblica assumindo statusde Ministeacuterio

Nas instacircncias executiva e legislativa embora ainda se esteja demasiado dis-tante do cenaacuterio ideal - idealizado como aquele em que as decisotildees poliacuteticas enormativas de modo expliacutecito e integrai pautem-se pela proteccedilatildeo e promoccedilatildeodos direitos humanos - jaacute natildeo satildeo tatildeo raros os episoacutedios de redirecionamentode condutas promovido por forccedila de recomendaccedilotildees ou decisotildees emanadasdos mecanismos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilotildees de

6 BRASIL CAcircMARA DOS DEPUTADOS Projelo de lei n 4667 de 2004 Disponiacutevel em hllpfwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadelram1tacao7idProposicaO2736501 Acesso em 15 jan 2015

1 BRASIL SENADO FEDERAL projelo de lei n 4661 de 2004 Disponiacutevel em hnpwwwsenadogovbralividademateriadelalhesasp]p_cod_mate9S3601 Acesso em 151an 101S

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SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

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ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

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pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

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Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 5: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

SILVIO BElTRAMUU NElo

Conforme adverte de forma enfaacutetica PEDRONIKKENexJuiz e ex-Presidenteda Corte IOH disposiccedilotildees normativas como as citadas de aplicaccedilatildeo imediata(autoexecutaacuteveis ou selfexecuting) impotildeem deveres de respeitar garantir satisfazer proteger e legislar deixando claro que o Estado eacute juridicamente o ente chomado a por em execuccedilatildeo o sistema internacional de proteccedilatildeo de direitos humanosltAfinal o OIOHnatildeo passaria de ficccedilatildeo se natildeo produzisse efeitos diretos nos planosdomeacutesticos dos Estados aos quais se direciona

Eacute nesta perspectiva consagrada pelo art 27 da Convenccedilatildeo de Viena sobre oOireito dos Tratados (Uma pane natildeo pode invocar as disposiccedilotildees de seu direitointerno para justificar o inadimplemento de um tratado) que os oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo dos direitos humanos sejam eles de natureza poliacutetica qua-se-judicial ou judicial rechaccedilam ostensivamente o argumento da inobservacircnciade certa norma de OIOHpor incompatibilidade com o ordenamento juriacutedico na-cional Como visto em decorrecircncia dos deveres de respeito proteccedilatildeo e promo-ccedilatildeo eacute dever do Estado adequar sua ordem juridica poliacutetica e administrativa agravesobrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacional ainda queisso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas aleacutem eacute claro da proibiccedilatildeo de se legislar contrariamente ao assumi-do No sentido da obrigaccedilatildeo estatal de ateacute mesmo revogar normas nacionais emdecorrecircncia do art 20 da Convenccedilatildeo Americana Sobre Direitos Humanos a CorteIOHjaacute se manifestou em distintas oportunidades

Frise-se o OIDHnatildeo descreve ou impotildee o modo como o Estado deveraacute colocar em execuccedilatildeo as obrigaccedilotildees assumidas - ateacute porque cada ente estatal contacom mecanismos proacuteprios de internalizaccedilatildeo das normas internacionais e deseu adimplemento - todavia natildeo se aceita qualquer argumento que intentesustentar a impossibilidade juriacutedica de fazecirclo Em assim sendo acerca da ceieuma monismodualismo em mateacuteria de direitos humanos natildeo haacute outro caminhoa ser seguido 0 conceito monista eacute sem duacutevida o uacutenico adequado ao direitodos direitos humanos baseado na dignidade inerente agrave pessoa humana a qualnatildeo admite ser concebida de uma maneira diferente no acircmbito nacional e nointernacional

I Neste sentido jaacute se manifestou o Comitecirc de Direitos Humanos do PIDCPda ONU(Comentaacuterio Geral n- 31bullde 20004)e diversas vezes a Cone IOH(Opinillo Consultiva OC-786 e casos Cantos $ Argentina OlmedoBustos e Outros IS Chile e Hilaire Conslantine y Benjamin e OUlros IS Trinidade e Tobago)

2 NIKKENPedro EI Derecho Internacional de los Derechos Humanos em ti derccho interno Revisro IrDH51(jon-jumoo3) JS

3 Vide Casos Cacircstillo Pedruzzl e Outros IS Peruacute Baena Ricardo e Outros IS Panamaacute Ourand e ugane 1$

Peruacute Suaacuteres Rosero IS Equador Olmedo Bustos e Outros IS Chile e Herrera ulhoa 5 Costa Rica-i NIKKENPedro op til p 21

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EfEllV1DAO 00 DIREITO INTERNtCIOfM DOS DUlfiOS HUMANOS NO -MaITO IU(IOHAL

I) Importante

Decorre da natureza do DIOHda boafeacute na ratificaccedilatildeo dos tratados e no mais das vezes dedisposiccedilotildees expressas dos proacuteprios tratados o dever do Estado adequar sua ordem juriacutedicapoliacutetica e administrativa agraves obrigaccedilotildees de direitos humanos assumidas no plano internacionalainda que isso importe na criaccedilatildeo alteraccedilatildeo ou revogaccedilatildeo de normas ou jurisprudecircnciasdomeacutesticas

Ateacute aqui abordou-se a questatildeo da efetividade da proteccedilatildeo internacional dosdireitos humanos sob o prisma da necessaacuteria compatibilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo do-meacutestica com o DIOH em favor desse uacuteltimo Cumpre agora pensar o mesmoproblema mas lanccedilando foco sobre os operadores do Oireito dentro da esferajudicial

2-CUMPRIMENTO DAS DECISOtildeES DOS OacuteRGAtildeOS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Como jaacute se supotildee pressuposto da efetividade dos sistemas internacionaisde proteccedilatildeo de direitos humanos eacute o grau de acatamento das recomendaccedilotildees edecisotildees emanadas de seus oacutergatildeos pelo Estado a quem se dirigem

Em se tratando de Brasil esta questatildeo afigura-se ainda mais sensiacutevel emvirtude da ausecircncia de qualquer regulamentaccedilatildeo especiacutefica a respeito do cumprimento do quanto emanado daqueles oacutergatildeos Em que pese reconheccedila-se aevoluccedilatildeo da postura brasileira frente aos referidos sistemas evidenciada pelaatenccedilatildeo conferida aos relatoacuterios produzidos e pela adoccedilatildeo de providecircncias emobservacircncia a inuacutemeras recomendaccedilotildees e decisotildees vindas dos diversos mecanis-mos eacute cena que o Estado brasileiro ainda ressente-se de disciplina juriacutedica maisrobusta acerca do cumprimento imediato das decisotildees internacionais vinculantesjaacute que as recomendaccedilotildees em tese conforme a praacutetica jusinternacional natildeo ensejam sanccedilatildeo acaso olvidadas

Por ora como visto conta-se apenas com o entendimento essencialmentedoutrinaacuterio segundo o qual no 8rasil uma sentenccedila condenatoacuteria emanada deoacutergatildeo internacional judicial (vg a Corte IOH) unicamente no tocante a valorespecuniaacuterios poderaacute ser executada perante a Vara Federal territorialmente com-petente

Isto ainda eacute muito pouco Urge a criaccedilatildeo de uma verdadeira estrutura brasileira de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais para muito aleacutem da quitaccedilatildeode indenizaccedilotildees

A favor desta empreitada poderaacute vir a estar o resultado do Projeto de lein 4667 de 2004 que pretende disciplinar os efeitos juridicos das decisotildees dosOrganismos Internacionais de Proteccedilatildeo aos Direitos Humanos Quando de sua

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1

StvlO BmllAMHU NpoundTO

apresentaccedilatildeo este Projeto de lei versava apenas sobre as indenizaccedilotildees esta-belecidas em decisotildees internacionais e a possibilidade de accedilotildees regressivas doEstado brasileiro em face das pessoas fisicas ou juriacutedicas promotoras do ato deviolaccedilatildeo declarado pela instatildencia internacional Nada foi dito sobre o adimple-mento das demais formas de reparaccedilatildeo (que natildeo a indenizaccedilatildeo) porventura de- terminadas ao Estado brasileiro algo que mantinha tal iniciativa legislativa muitoaqueacutem do necessaacuterio

Ateacute que em 2006 a relataria do Projeto de lei procedeu a vaacuterias alteraccedilotildeesincluindo prazos para cumprimento das medidas cautelares da CloH e das me-didas provisoacuterias da cone 10H bem como para pagamento de indenizaccedilotildeespreservado o direito estatal de regresso contra o violador imediato inclusivemediante glosa de repasses devidos pela Uniatildeo a Estados e Municipios se for ocaso Do mesmo modo o novo texto prevecirc a constituiccedilatildeo de oacutergatildeo especifico incumbido de acompanhar a implementaccedilatildeo de todas as obrigaccedilotildees internacional-mente imputadas ao Brasil (obrigaccedilotildees de fazer natildeo-fazer e pagar) para tantodotado de poderes de notificaccedilatildeo dos entes aos quais cabe executar as medidasdecorrentes da condenaccedilatildeo havida visando a apresentaccedilatildeo de plano de cumpri-mento e de relatoacuterio de providecircncias adotadas

Em setembro de 2010 editou-se acerca deste mesmo Projeto de lei NotaTeacutecnica elaborada por Procuradores Regionais da Repuacuteblica para isso nomeadospela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadatildeo Nesta Nota Teacutecnica diversassugestotildees adicionais estatildeo consolidadas de modo a imprimir maior clareza eefetividade agrave proposta de regulamentaccedilatildeo do cumprimento das decisotildees inter-nacionais vinculantes em mateacuteria de direitos humanos Dentre as propostas danota teacutecnica destacamse

que o texto da lei contemple de modo amplo as decisotildees dos organismosinternacionais de direitos humanos incluindo os tribunais que julguemcrimes contra direitos humanos (atualmente apenas o TPI)

bull que a regulamentaccedilatildeo diga respeito apenas agrave decisotildees vinculantes exclu-iacutedas as recomendaccedilotildees porquanto destituidas de consequecircncias juridicassancionatoacuterias no plano internacional em caso de inobservacircncia

bull que os processos e procedimentos de execuccedilatildeo da decisatildeo internacionalvinculante tenham prioridade sobre quaisquer outros agrave exceccedilatildeo do habe-as corpus e do mandado de seguranccedila

bull que esta lei seja compreendida comoo primeiro passo para a estruturaccedilatildeode um mecanismo nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais

5 NOTATtCNICA Disponiacutevel em lthttpwwwacademiaedu1628080Nota_Tecnlca_-_projeto_deJei_JmplementaC3IA71q~30_deciSLC31B5esJnternacionais_Brasilgt Acesso em 15 jan 2015

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EmMOAOt 00 DllllUO INTERNAClONM DOS OlRErros HUMANOS NO AgraveMBt10 NACIOtItt

em mateacuteria de direitos humanos portanto necessariamente demandantede iniciativas sobretudo normativas posteriores de detalhamento e con-solidaccedilatildeo dessa estrutura

O Projeto de lei jaacute recebeu no acircmbito da Cacircmara de Deputados pareceresfavoraacuteveis da Comissatildeo de Direitos Humanos e Minorias (aprovaccedilatildeo de textosubstitutivo) em 2006 da Comissatildeo de Relaccedilotildees Exteriores e de Defesa Nacionalem 2007 e da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e de Justiccedila e de Cidadania em 2010

Desde entatildeo a proposta legislativa foi encaminhada ao Senado Federai estandono momento a aguardar deliberaccedilatildeo final da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccediladessa Casa Parlamentar jaacute contando com parecer favoraacutevel do Relator designa-do embora com sugestatildeo de alteraccedilatildeo (a nosso ver indesejada) de texto para asupressatildeo do trecho que imprime efeitos imediatos agraves decisotildees internacionaisJ

A ausecircncia dessa estrutura diretamente incumbida do cumprimento das deciosotildees internacionais relativas a direitos humanos natildeo impediu que se instituiacutesseminiciativas e instituiccedilotildees que dentro de suas aacutereas de aplicaccedilatildeo e atuaccedilatildeo vecircmse consolidando como as principais vias de difusatildeo e implementaccedilatildeo interna dospadrotildees desenvolvidos por todas as instacircncias da proteccedilatildeo internacional dos di-reitos humanos incluindo as quase-judiciais e judiciais Como jaacute foi dito o Brasilconta com programas e oacutergatildeos com atribuiccedilotildees gerais ou especiacuteficas atinentesagrave proteccedilatildeo dos direitos humanos os quais a despeito da necessidade de incre-mento apresentaratildeo resultados mais eficazes quanto mais se aproximem e demodo aniculado estatildebeleccedilam padrotildees de interpretaccedilatildeo promoccedilatildeo e proteccedilatildeodos direitos humanos tal quai delineado pelos mecanismos internacionais Atiacutetulo de exemplo citemse uma vez mais os Programas Nacionais de DireitosHumanos de 1996 2002 e 2009 (PNoH I 2 e 3 respedivamente) editados pelaPresideacutencia da Repuacuteblica na forma de Decretos na esteira do Programa de Accedilatildeoda Conferecircncia de Viena de 1993 e a Secretaria de Direitos Humanos (SoH) vin-culada em 2003 de modo direto agrave Presidecircncia da Repuacuteblica assumindo statusde Ministeacuterio

Nas instacircncias executiva e legislativa embora ainda se esteja demasiado dis-tante do cenaacuterio ideal - idealizado como aquele em que as decisotildees poliacuteticas enormativas de modo expliacutecito e integrai pautem-se pela proteccedilatildeo e promoccedilatildeodos direitos humanos - jaacute natildeo satildeo tatildeo raros os episoacutedios de redirecionamentode condutas promovido por forccedila de recomendaccedilotildees ou decisotildees emanadasdos mecanismos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilotildees de

6 BRASIL CAcircMARA DOS DEPUTADOS Projelo de lei n 4667 de 2004 Disponiacutevel em hllpfwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadelram1tacao7idProposicaO2736501 Acesso em 15 jan 2015

1 BRASIL SENADO FEDERAL projelo de lei n 4661 de 2004 Disponiacutevel em hnpwwwsenadogovbralividademateriadelalhesasp]p_cod_mate9S3601 Acesso em 151an 101S

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SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

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ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

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pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 6: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

StvlO BmllAMHU NpoundTO

apresentaccedilatildeo este Projeto de lei versava apenas sobre as indenizaccedilotildees esta-belecidas em decisotildees internacionais e a possibilidade de accedilotildees regressivas doEstado brasileiro em face das pessoas fisicas ou juriacutedicas promotoras do ato deviolaccedilatildeo declarado pela instatildencia internacional Nada foi dito sobre o adimple-mento das demais formas de reparaccedilatildeo (que natildeo a indenizaccedilatildeo) porventura de- terminadas ao Estado brasileiro algo que mantinha tal iniciativa legislativa muitoaqueacutem do necessaacuterio

Ateacute que em 2006 a relataria do Projeto de lei procedeu a vaacuterias alteraccedilotildeesincluindo prazos para cumprimento das medidas cautelares da CloH e das me-didas provisoacuterias da cone 10H bem como para pagamento de indenizaccedilotildeespreservado o direito estatal de regresso contra o violador imediato inclusivemediante glosa de repasses devidos pela Uniatildeo a Estados e Municipios se for ocaso Do mesmo modo o novo texto prevecirc a constituiccedilatildeo de oacutergatildeo especifico incumbido de acompanhar a implementaccedilatildeo de todas as obrigaccedilotildees internacional-mente imputadas ao Brasil (obrigaccedilotildees de fazer natildeo-fazer e pagar) para tantodotado de poderes de notificaccedilatildeo dos entes aos quais cabe executar as medidasdecorrentes da condenaccedilatildeo havida visando a apresentaccedilatildeo de plano de cumpri-mento e de relatoacuterio de providecircncias adotadas

Em setembro de 2010 editou-se acerca deste mesmo Projeto de lei NotaTeacutecnica elaborada por Procuradores Regionais da Repuacuteblica para isso nomeadospela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadatildeo Nesta Nota Teacutecnica diversassugestotildees adicionais estatildeo consolidadas de modo a imprimir maior clareza eefetividade agrave proposta de regulamentaccedilatildeo do cumprimento das decisotildees inter-nacionais vinculantes em mateacuteria de direitos humanos Dentre as propostas danota teacutecnica destacamse

que o texto da lei contemple de modo amplo as decisotildees dos organismosinternacionais de direitos humanos incluindo os tribunais que julguemcrimes contra direitos humanos (atualmente apenas o TPI)

bull que a regulamentaccedilatildeo diga respeito apenas agrave decisotildees vinculantes exclu-iacutedas as recomendaccedilotildees porquanto destituidas de consequecircncias juridicassancionatoacuterias no plano internacional em caso de inobservacircncia

bull que os processos e procedimentos de execuccedilatildeo da decisatildeo internacionalvinculante tenham prioridade sobre quaisquer outros agrave exceccedilatildeo do habe-as corpus e do mandado de seguranccedila

bull que esta lei seja compreendida comoo primeiro passo para a estruturaccedilatildeode um mecanismo nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees internacionais

5 NOTATtCNICA Disponiacutevel em lthttpwwwacademiaedu1628080Nota_Tecnlca_-_projeto_deJei_JmplementaC3IA71q~30_deciSLC31B5esJnternacionais_Brasilgt Acesso em 15 jan 2015

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EmMOAOt 00 DllllUO INTERNAClONM DOS OlRErros HUMANOS NO AgraveMBt10 NACIOtItt

em mateacuteria de direitos humanos portanto necessariamente demandantede iniciativas sobretudo normativas posteriores de detalhamento e con-solidaccedilatildeo dessa estrutura

O Projeto de lei jaacute recebeu no acircmbito da Cacircmara de Deputados pareceresfavoraacuteveis da Comissatildeo de Direitos Humanos e Minorias (aprovaccedilatildeo de textosubstitutivo) em 2006 da Comissatildeo de Relaccedilotildees Exteriores e de Defesa Nacionalem 2007 e da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e de Justiccedila e de Cidadania em 2010

Desde entatildeo a proposta legislativa foi encaminhada ao Senado Federai estandono momento a aguardar deliberaccedilatildeo final da Comissatildeo de Constituiccedilatildeo e Justiccediladessa Casa Parlamentar jaacute contando com parecer favoraacutevel do Relator designa-do embora com sugestatildeo de alteraccedilatildeo (a nosso ver indesejada) de texto para asupressatildeo do trecho que imprime efeitos imediatos agraves decisotildees internacionaisJ

A ausecircncia dessa estrutura diretamente incumbida do cumprimento das deciosotildees internacionais relativas a direitos humanos natildeo impediu que se instituiacutesseminiciativas e instituiccedilotildees que dentro de suas aacutereas de aplicaccedilatildeo e atuaccedilatildeo vecircmse consolidando como as principais vias de difusatildeo e implementaccedilatildeo interna dospadrotildees desenvolvidos por todas as instacircncias da proteccedilatildeo internacional dos di-reitos humanos incluindo as quase-judiciais e judiciais Como jaacute foi dito o Brasilconta com programas e oacutergatildeos com atribuiccedilotildees gerais ou especiacuteficas atinentesagrave proteccedilatildeo dos direitos humanos os quais a despeito da necessidade de incre-mento apresentaratildeo resultados mais eficazes quanto mais se aproximem e demodo aniculado estatildebeleccedilam padrotildees de interpretaccedilatildeo promoccedilatildeo e proteccedilatildeodos direitos humanos tal quai delineado pelos mecanismos internacionais Atiacutetulo de exemplo citemse uma vez mais os Programas Nacionais de DireitosHumanos de 1996 2002 e 2009 (PNoH I 2 e 3 respedivamente) editados pelaPresideacutencia da Repuacuteblica na forma de Decretos na esteira do Programa de Accedilatildeoda Conferecircncia de Viena de 1993 e a Secretaria de Direitos Humanos (SoH) vin-culada em 2003 de modo direto agrave Presidecircncia da Repuacuteblica assumindo statusde Ministeacuterio

Nas instacircncias executiva e legislativa embora ainda se esteja demasiado dis-tante do cenaacuterio ideal - idealizado como aquele em que as decisotildees poliacuteticas enormativas de modo expliacutecito e integrai pautem-se pela proteccedilatildeo e promoccedilatildeodos direitos humanos - jaacute natildeo satildeo tatildeo raros os episoacutedios de redirecionamentode condutas promovido por forccedila de recomendaccedilotildees ou decisotildees emanadasdos mecanismos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilotildees de

6 BRASIL CAcircMARA DOS DEPUTADOS Projelo de lei n 4667 de 2004 Disponiacutevel em hllpfwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadelram1tacao7idProposicaO2736501 Acesso em 15 jan 2015

1 BRASIL SENADO FEDERAL projelo de lei n 4661 de 2004 Disponiacutevel em hnpwwwsenadogovbralividademateriadelalhesasp]p_cod_mate9S3601 Acesso em 151an 101S

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SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

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ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

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pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

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Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 7: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

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SnVlO BUTAAMpoundWNoo

direitos humanos notadamente do sistema interamericano Destaquemse demodo sinteacutetico e exemplificativo os seguintes casos

Caso Joseacute Pereira - o Brasil assumiu diante do acordo formalizado perante a CIOHdiversos compromissos voltados agrave implementaccedilatildeo de medidas eficazes de combate ao trabalho escravo contemporacircneo tendoimediatamente apoacutes a conciliaccedilatildeo levada a efeito criado a Comissatildeo Nacional para a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo CDNATRAEoacutergatildeo colegiadovinculado agrave Secretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblicaque tem a funccedilatildeo primordial de monitorar a execuccedilatildeo do Plano Nacionalpara a Erradicaccedilatildeo do Trabalho Escravo

EC4504 e a Federalizaccedilatildeo dos casos de violaccedilatildeo dos Direitos Humanos- dentre as muitas alteraccedilotildees trazidas pela Emenda Constitucional nbull 45de 2004 que empreendeu a chamada Reforma do judiciaacuterio a criaccedilatildeodo IOC-Incidente de Deslocamento de Competecircncia respondeu de formadireta agraves constantes criacuteticas dos organismos internacionais de proteccedilatildeono sentido de que o Brasil de modo injustificado frequentemente deixavade prestar esclarecimentos satisfatoacuterios sobre acusaccedilotildees de violaccedilatildeo dedireitos humanos alegando desconhecimento dos fatos e dificuldade deobter informaccedilatildeo junto agraves instacircncias internas estaduais e municipais deinvestigaccedilatildeo e julgamento Daiacute que o IOCeacute instituiacutedo exatamente para areversatildeo deste quadro visando transferir agraves instaacutencias federais (PFMPFejusticcedila Federal) a apreciaccedilatildeo dos casos que podem ensejar e responsabilidade internacional brasileira por descumprimento de norma internacionalde direitos humanos

Caso Maria da Penha -+ em cumprimento agrave decisatildeo da C10H houve aaprovaccedilatildeo interna da lei nbull 11340 de 7 de agosto de 2006 conhecida(orno lei Maria da Penhaque busca impedir e reprimir a violecircncia domeacutestica contra mulheres no Brasil Do mesmo modo intensificou-se a ins-talaccedilatildeo de Delegacias da Mulher em todo o Paiacutes

Caso Gomes lund e Outros Vs Brasil _ a despeito da decisatildeo do STFna AOPFn 1530F que manteve intactos os amplos efeitos da chamadalei de Anistia o Estado brasileiro vem adotando algumas medidasvoltadas ao atendimento das determinaccedilotildees da sentenccedila condenatoacuteriada cone IDH no Caso Gomes lund e Outros do que satildeo exemplos a instituiccedilatildeo de diversas Comissotildees da Verdade (no plano federal vide leinbull 12528ll) com cena poder de investigaccedilatildeo a divulgaccedilatildeo de algunsdocumentos oficiais da eacutepoca da ditadura militar ateacute entatildeo sigilosos emais recentemente o recebimento pelo Poder Judiciaacuterio de accedilotildees penaiscontra agentes do regime militar responsabilizados por crimes cometi-dos agrave eacutepoca da Ditadura

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Caso Complexo Penitenciaacuterio de Pedrinhas (Estado do Maranhatildeo) _ adecisatildeo da C10Hem medida cautelar motivou a imediata mobilizaccedilatildeo dacuacutepula dos Poderes Executivos federal estadual e municipal com providecircncias de distintas naturezas comeccedilando pela transferecircncia de custodia-dos e reforccedilo da vigilatildencia do Complexo

Tais avanccedilos entretanto natildeo diminuem a imponacircncia do Brasil criar umaestrutura normativa e institucional nacional de implementaccedilatildeo das decisotildees inter-nacionais transbordando a simples execuccedilatildeo de indenizaccedilotildees pecuniaacuterias Natildeoobstante cabe a indagaccedilatildeo os agentes puacuteblicos em sentido lato e em especialos juiacutezes estatildeo a depender de algum ato iegisiativo para observar o OIOH

3 OS AGENTES DO ESTADO E O DEVER DE OBSERVAR O DIREITO INTERNA-CIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasiatildeo do estudo da responsabilidade internacional pela violaccedilatildeo dosdireitos humanos viuse que um ato praticado por agente estatal de qualquerinstacircncia que contrarie o DIDH torna o Estado internacionalmente responsaacutevelpela violaccedilatildeo Satildeo os chamamos atos de oacutergatildeos de jure A expressatildeo qualquerinstacircncia estaacute aqui empregada e deve ser apreendida em seu sentido maisamplo de forma a abranger todo e qualquer agente da Uniatildeo dos Estadose dos Municiacutepios bem como dos Poderes Executivo legislativo e Judiciaacuterioponanto do Presidente da Repuacuteblica ao servidor puacuteblico municipal passandopelos juiacutezes

Em cotejo com a jaacute citada obrigaccedilatildeo juriacutedica de respeito proteccedilatildeo e promoccedilatildeo das normas de OIOHa concepccedilatildeo de atos de oacutergatildeos de jure para fins deresponsabilidade internacional impona na conclusatildeo segundo a qual de umlado o Estado natildeo pode intentar eximirse de sua responsabilidade alegandoconduta pessoal do seu agente e de outro o agente estatal encontrase juridicamente impedido de atuar de forma a afrontar ao OIOH Embora pareccedila oacutebvioa consequecircncia que neste mo~ento interessa enfatizar diz respeito a que aessa obrigaccedilatildeo de abstenccedilatildeo (negativa) tambeacutem estatildeo submetidos dentre todosagentes do Estado legisladores e julgadores Dito de outro modo eacute vedado aolegislador produzir norma contraacuteria ao OIDHassim como eacute proibido ao julgadordar cumprimento a lei violadora desse mesmo Direito ainda que aprovada segundo os tracircmites do processo iegislativo nacional vigente

Acerca da atividade legislativa desconforme com o OIDHa cone IOHquandoconsultada a respeito concluiu que a promulgaccedilatildeo de uma lei manifestamentecontraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir agrave Conven-ccedilatildeo constitui violaccedilatildeo dessa e que na eventualidade de tal violaccedilatildeo afetar direitos e liberdades protegidas de determinadas indiviacuteduos gera responsabilidade

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SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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-~-

EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Page 8: Direitos Humanos - Arnaldo Lemos Filho€¦ · ç, --- 1! I J}" I •,• t ~ • I I j I I SILVIO BELTRAMELLI NETO Doutorem DireitodoTrabalhopela Faculdade deDireitodaUniversidade

SilVIO BELTRAMElll NETO

internacional do Estado (destacado) Atentese para o fato de que a exigecircnciade afetaccedilatildeo concreta de direitos ou liberdades de determinados indiviacuteduos paraa responsabilidade internacional do Estado carrega o pressuposto da aplicaccedilatildeoda lei violadora dos direitos humanos evidenciando por conseguinte censuradaquele que faz valer concretamente os efeitos da norma desconforme como DIDH A referida posiccedilatildeo da Cone IDH adotada em Opiniatildeo Consultiva restoureafirmada na atividade contenciosa em diversas oportunidades com destaquepara os casos em que com vigor o Tribunal negou efeitos juriacutedicos agraves leis de anis-tia aprovadas em paises da Ameacuterica Latina (inclusive o Brasil) por regimes militares ditatoriais que com elas pretendiam tornar os agentes da ditadura imunes agraveinvestigaccedilatildeo processamento e condenaccedilatildeo por crimes praticados supostamenteem nome da manutenccedilatildeo da ordem naciona19

Vale mencionar que NIKKENcritica com razatildeo a adoccedilatildeo pela Cone IDH da expressatildeo lei manifestamente contraacuteria agraves obrigaccedilotildees assumidas por entendecirc-lainjustificadamente restritiva

Com efeito segundo a reconhecida norma de direito internacional consue-tudinaacuterio encontrada na Convenccedilatildeo de Viena Sobre o Direito dos Tratadosjaacute citada uma parte natildeo poderaacute invocar a disposiccedilotildees de seu Direitointerno como justificativa do descumprimento do tratado (art 271) Essaregra natildeo faz distinccedilatildeo entre violaccedilotildees manifestas ou natildeo do direito inter-nacional por regras de direito interno Se a aplicaccedilatildeo do direito internoresulta em uma violaccedilatildeo dos direitos humanos de uma pessoa sob a juris-diccedilatildeo do Estado-Parte eacute irrelevante que a contradiccedilatildeo entre ordenamentojuriacutedico nacional e internacional seja manifesta se os direitos internacio-nalmente protegidos foram violados o Estado incorre em responsabilida-de por mais que o agente da violaccedilatildeo ignore que aplicando uma lei inter-na estava violando uma obrigaccedilatildeo internacional(destaque do original)deg

Portanto se eacute certo que o legislador natildeo pode legislar contra o OIDHtam-pouco o juiz pode aplicar a lei domeacutestica que afronte os direitos humanos inter-nacionalmente oponiacuteveis ao Estado

Essencial a essa anaacutelise eacute natildeo perder de vista que o DlDH natildeo eacute construiacutedotatildeo somente de textos de tratados mas tambeacutem - e dir-se-aacute atualmente so-bretudo - a panir da interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo desses tratados e das normasconsuetudinaacuterias pelos oacutergatildeos internacionais de monitoramento e apuraccedilatildeo deviolaccedilotildees de direitos humanos notadamente os de natureza judicial (as Cones)Daiacute natildeo haver qualquer motivo para que os agentes nacionais dos Trecircs poderes

8 CORTEINTERAMERICANADE DIREITOSHUMANOSOpiniatildeo Consultiva OC-14194 sobre a responsabilidade inter-nacional por promulgaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo de leis violadoras da Convenccedilatildeo (arts 1 e 2 da Convenccedilatildeo Americonasobre Direitos Humanos) de 9 de dezembro de 1994 Traduccedilatildeo livre Disponiacutevel em lthltpJjwwwcorteidhorcrdocsopinionesseriea_14_espdocgt Acesso em 09 jan 2015

9 Vide casos Barrios Altos vs Peruacute Almonacid Arellano e OUlros vs Chile e Gomes lund e OUlros V$ Brasil10 NIKKENPedro op ci p 32

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EFETlVIDADE DO DIREITO hHERNAClDNAl DOS DIREITDS HUMANOS NO AtildeMBITO NACIDNAL

atuem em dissonacircncia com os padrotildees de conduta estabelecidos por aquelesoacutergatildeos a panir da aplicaccedilatildeo do DIDH

Especificamente sobre as decisotildees dos tribunais internacionais para falardo Brasil e sua obrigaccedilatildeo de cumprimento lembrese o disposto no ano 68 daConvenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos Os Estados-Partes na Convenccedilatildeocomprometem~se a cumprir a decisatildeo da Corte em todo caso em que forempanes O princiacutepio da boafeacute sustenta igualmente a obrigatoriedade das recomendaccedilotildees advindas dos demais oacutergatildeos quase-judiciais como os Comitecircs dostratados da ONU e a CIDH de modo que a natildeo observaccedilatildeo de uma sentenccedila oude uma recomendaccedilatildeo advinda dos referidos oacutergatildeos acarreta nova violaccedilatildeo doDIDH distinta daquela que resultou a decisatildeo inadimplida

A vinculaccedilatildeo da atuaccedilatildeo jurisdicional domeacutestica ao DIDH eacute inferida para aleacutemda forccedila cogente da sentenccedila emanada de um tribunal internacional de direitoshumanos dos jaacute citados arts 2deg2 do PIDCPe 20 da Convenccedilatildeo Americana sobreDireitos Humanos quando se valem da mesma expressatildeo textual para afirmara obrigaccedilatildeo de respeitar proteger e promover os direitos garantidos por cadatratado mediante a adoccedilatildeo de medidas legislativas ou de outra natureza ca-tegoria essa que alcanccedila os agentes administrativos e judiciais

No contexto da Ameacuterica Latina diversas constituiccedilotildees sobretudo aquelasmais recentes que sucederam regimes ditatoriais fizeram questatildeo consignar demodo explccedilito a natureza proeminente das normas de DIDHem face das demaisleis do ordenamento nacional eou a obrigatoriedade do cumprimento das deci-sotildees emanadas das cortes internacionais de direitos humanos Disposiccedilotildees quereconhecem de modo geneacuterico status qualificados aos tratados internacionaisde direitos humanos satildeo encontradas com variaccedilotildees de texto nas cartas cons-titucionais de Boliacutevia Colocircmbia Equador Guatemala Meacutexico Repuacuteblica Dominicana e Venezuela Outras constituiccedilotildees nomeiam especificamente embora natildeona forma de rol cerrado quais as convenccedilotildees internacionais reconhecem comonormas de quilate constitucional tal qual por exemplo a Argentina a Nicaraacuteguae o Paraguai Sem duacutevida a existecircncia de um dispositivo constitucional dessa en-vergadura consubstancia-se importante ferramenta de explicitaccedilatildeo da submissatildeoirredarguiacutevel dos aplicadores do Direito ao DIDH

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 988 a despeito de natildeo contar com enunciado similar aos acima referidos permite que a obrigaccedilatildeo dos operadores dodireito para com o DIDHseja extraiacuteda do ~2do seu ano 5 natildeo se podendo deixar de considerar contudo a posiccedilatildeo atual do 5TF acerca da incorporaccedilatildeo dostratados internacionais de direitos humanos que embora tenha representadoavanccedilo em relaccedilatildeo aos posicionamentos histoacutericos do Pretoacuteria Excelso deixou

11 Id lbid p 38-41

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

401

Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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-SilVIO BELTRAMHLI NETO

de alcanccedilar um patamar ainda mais desejaacutevel de reconhecimento da naturezaconstitucional daqueles tratadosl

Neste contexto o esperado eacute que o proacuteprio Poder Judiciaacuterio nacional realizeo controle de convencionalidade das leis internas passiacutevel de ser levado a efeitopelos proacuteprios juiacutezes de primeira instacircncia ex officio porquanto serem agentesestatais vinculados agraves normas de DiDHe ao emprego que lhe eacute dado pelos oacutergatildeosinternacionais de proteccedilatildeol3bull Incumbe ao julgador portanto reparar as lesotildeesdecorrentes da violaccedilatildeo do DIDHaplicaacutevei ao Estado bem como deixar de aplicaras normas internas que o contraponham Eacute preciso que se coloque em praacuteticaa noccedilatildeo segundo a qual tal postura dos magistrados eacute obrigaccedilatildeo juriacutedica e natildeomera discricionariedade conferindo maior seguranccedila e tranquilidade para queo aplicador do Direito se paute pelos direitos humanos na atividade jurisdicionalcotidiana com isso aperfeiccediloando a efetividade desses direitos A propoacutesito ad-vene NII~IENque ao se afirmar que se trata de uma obrigaccedilatildeo do juiz nacionala ele confere-se proteccedilatildeo ante o ordenamento juriacutedico interno para que colo-que em praacutetica o controle difuso de convencionalidade Atuando nessa direccedilatildeo ojuiz nacional natildeo soacute procede como juiz interamericano em niacutevel domeacutestico bemcomo atua como oacutergatildeo executor das obrigaccedilotildees internacionais do Estado no quese refere aos seres humanos que estatildeo sob sua jurisdiccedilatildeo14

4 OS DIREITOS SOCIAIS DENTRO DOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PRO-TECcedilAtildeO DOS DIREITOS HUMANOS

Argumentos histoacutericos de cunho poliacutetico-econocircmico sempre enfatizarammarcante distinccedilatildeo entre os chamados direitos civis e poliacuteticos ou liberdadespuacuteblicas e os ditos direitos sociais com consequecircncias sempre prejudiciais emtermos de efetividade para os uacuteltimos

A repetida tese da maior dificuldade de implementaccedilatildeo dos direitos de se-gunda dimensatildeo por exigirem em regra promoccedilatildeo (um ato positivo) depen-dente de recursos financeiros em comparaccedilatildeo com a abstenccedilatildeo proacutepria da rea-lizaccedilatildeo dos direitos civis e poliacuteticos vem servindo haacute muito de subterfuacutegio parao deacuteficit de verificaccedilatildeo dos direitos sociais No plano das normas internacionaistalvez a simbologia mais marcante desta distinccedilatildeo ainda seja a aprovaccedilatildeo noacircmbito da ONU em tratados separados dos dois pactos de 966 Todavia estequadro de deacuteficit de efetividade natildeo se vecirc fundamentado em uma situaccedilatildeo debaixa proteccedilatildeo normativa dos direitos sociais nem mesmo na perspectiva dodireito internacional

12 o tema jaacute foi enfrentado no Capiacutetulo IV toacutepico 8113 Assunto abordado com mais detalhes no CapiacutetulO IV toacutepico 614 NIKKENPedro op cit p 66

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1I EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL DDS DIREITOS HUMANOS NO AcircMBITO NACIONAL

Desde que a comunidade internacional sufragou no art 50 da Declaraccedilatildeoe Programa de Accedilatildeo de Viena de 993 a interrelaccedilatildeo e a interdependecircncia detodos os direitos humanos natildeo haacute mais espaccedilo para mitigaccedilotildees de efeitos oude obrigatoriedade imputaacuteveis a quaisquer direitos dessa ordem inclusive ossociais

Reforccedila-se assim a necessidade de se perceber que mesmo nos tratadosinternacionais tidos por dedicados aos direitos civis e poliacuteticos haacute comandosque tocam direta ou indiretamente a direitos sociais Em verdade praticamentetoda sorte de direitos individuais apresentam dimensatildeo social do que satildeo exem-plos a vida e a integridade fiacutesica em relaccedilatildeo agrave sauacutede a igualdade (materia) emrelaccedilatildeo agraves oponunidades de educaccedilatildeo trabalho e habitaccedilatildeo a vida privada ea intimidade em relaccedilatildeo agrave moradia as liberdades de expressatildeo e religiosa emrelaccedilatildeo agrave cultura e assim por diante

Particularmente no que se refere ao trabalho existe farta previsatildeo normativaperpassante por todo tipo de documento juriacutedico internacional a comeccedilar pelaDeclaraccedilatildeo Universai dos Direitos Humanos (ans XXiii e XXIV) e pela DeclaraccedilatildeoAmericana de Direitos e Deveres do Homem (art XIV) Tratados pretensa mentededicados a direitos civis e poliacuteticos tambeacutem apresentam disciplina relativa aotrabalho como por exemplo o Pacto Internacional de Direitos Civis e Poliacuteticos de1966 (arts 80 e 22) e a Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (arts 60 e16) Diga-se o mesmo de diversos tratados que versam sobre temas especiacuteficosvg a Convenccedilatildeo Internacional sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas de Discri-minaccedilatildeo Racial (an V) a Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de Todas as Formas deDiscriminaccedilatildeo contra a Mulher (arts 80 11 e 14) Convenccedilatildeo sobre os Direitos daCrianccedila (art 32) e a Convenccedilatildeo Internacional sobre os Direitos das Pessoas comDeficiecircncia (arts 80 e 27) Isso sem falar na centenas de convenccedilotildees e recomen-daccedilotildees especificas da OIT

Neste passo os direitos sociais (em sentido lato) permeiam todas as normasinternacionais de direitos humanos Entretanto agrave proteccedilatildeo normativa dos direi-tos sociais natildeo corresponde o mesmo niacutevel de atuaccedilatildeo dos sistemas internacio-nais dedicados ao monitoramento e agrave apuraccedilatildeo de violaccedilotildees Exceto na searados mecanismos da Oll poucas ainda satildeo as decisotildees internacionais vinculantesque instam os Estados a implementarem de modo amplo direitos econocircmicossociais e culturais baacutesicos incluindo os trabalhistas

Pensa-se que esta timidez pode e deve ser suplantada pela provocaccedilatildeo siste-maacutetica dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo para a apreciaccedilatildeo de situaccedilotildees deafronta a direitos sociais pressionando para que agrave luz de casos concretos con-ceitos como direitos meramente programaacuteticos e reserva do possiacutevel percamforccedila Haacute portanto uma necessidade e um espaccedilo (que deve ser aproveitado

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pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

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ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

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pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

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Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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SILVIO BElTRAMElu NElo

pelos legitimados ativos) para o aperfeiccediloamento dos sistemas internacionais deproteccedilatildeo no que se refere aos direitos econocircmicos sociais e culturais

Sob esta oacutetica afigura-se imprescindiacutevel um olhar mais atento para a experi-ecircncia histoacuterica e duradoura da OITTrata-se do primeiro organismo internacionala estabelecer um sistema perene de monitoramento e apuraccedilatildeo de violaccedilatildeo decertas normas de direitos humanos a ponto de se tornar o grande referencialdo sistema erigido (e depois aperfeiccediloado) a partir da criaccedilatildeo da ONUe da edi-ccedilatildeo da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos_ E destaque-se esse mesmoorganismo vanguardista estava como estaacute incumbido da proteccedilatildeo de normasessencialmente sociais atinentes agraves relaccedilotildees de trabalho

Por mais que se possa alegar que as relaccedilotildees de trabaiho verificam-se emgeral entre particulares tal natildeo basta para desqualificar a OIT como uma ex-periecircncia importante em mateacuteria de proteccedilatildeo internacional de direitos sociaisporquanto em uma sociedade capitalista tomada pela globalizaccedilatildeo financeiraa regulamentaccedilatildeo da venda da forccedila de trabalho toca o coraccedilatildeo de todo osistema e consequentemente do aspedo econocircmico ataacutevico agrave realizaccedilatildeo dequalquer direito social

Vista por este acircngulo a jaacute mencionada crise de efetividade da politica nor-mativa da OIT- resultante da aposta uacutenica nas normas dependentes de ratifica-ccedilatildeo estatal e vivenciada no final do seacuteculo XX- eacute produto da resistecircncia impingi-da pelo capital globalizado aos Estados e que encontrou contraponto na adoccedilatildeodas novas poliacuteticas estrateacutegicas que emergem sobre o alicerce da concepccedilatildeode Trabalho Decente as quais no campo juridico enfatizam a obrigatoriedadeirredarguivel das normas costumeiras em prejuiacutezo daquelas condicionadas agrave ade-satildeo estatal expressa e individual

Esta constataccedilatildeo talvez coloque a 01I mais uma vez como um exemplo a serseguido com atenccedilatildeo na medida em que esteja a demonstrar que o caminho paraum melhor desempenho dos sistemas internacionais de proteccedilatildeo em mateacuteria dedireitos sociais seja exatamente a propositura de demandas nas diferentes ins-tacircncias (natildeo-contenciosas quase-judiciais e judiciais) que natildeo apenas confrontemos Estados com as obrigaccedilotildees expressamente assumidas pela via dos tratadosmas tambeacutem com aquelas decorrentes de normas consuetudinaacuterias e imperativascujo rol tambeacutem deve ser posto agrave prova em favor dos direitos sociais

Em suma natildeo falta previsatildeo normativa internacional aos direitos sociaistampouco agrave sua categoria especificamente voltada agraves relaccedilotildees de trabalho Haacutecontudo que se conhececirclas natildeo apenas em seu texto mas na forma como vecircmsendo interpretadas e aplicadas pelos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo va-iendo-se desse conhecimento para manejaacute-Ias Isso porque as diversas normasinternacionais que protegem esses direitos satildeo o fundamento juriacutedico o pontode partida para com escopo de efetivaccedilatildeo por em marcha o aperfeiccediloamentO

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dos sistemas internacionais de salvaguarda bem como a instigaccedilatildeo dossistemasnacionais de proteccedilatildeo assunto a ser tratado no proacuteximo toacutepico

5 A51NSrAcircNCIA5 JURfDICAS NACIONAIS EO DIREITO INTERNACIONAL DOSDIREITOS HUMANOS DA RETOacuteRICA A PRAXE

De nada vale o estudo dos direitos humanos se ao final natildeo se puder deleextrair no miacutenimo ideias que permitam encontrar novos caminhos a serem incorparados nas rotinas profissionais e que sirvam agrave implementaccedilatildeo desses direitos

O conhecimento dos mecanismos e procedimentos internacionais voltados agraveproteccedilatildeo dos direitos humanos na perspectiva da atuaccedilatildeo dos operadores dodireito descortina para aleacutem de possivelmente ateacute entatildeo desconhecidas novasinstacircncias de demanda toda uma plecirciade de conceitos juriacutedicos e precedentesjurisprudenciais (em sentido lato) estabelecidos exclusivamente sob a inspiraccedilatildeodos direitos humanos e perfeitamente manejaacuteveis nas contendas domeacutesticas ex-trajudiciais e judicias

Para tanto haacute que se ter claras as vias de interlocuccedilatildeo em termos juriacutedicosexistentes entre o DIDH e o ordenamento juriacutedico brasileiro para aleacutem de umarelaccedilatildeo bilateral entre distintos universos (proacutepria da vetusta concepccedilatildeo dualis-ta) percebendo-os como pontos de um mesmo sistema Interessante estudo deMARCELONEVEScuida de modo cientiacutefico e detalhado dessa perspectiva sob aalcunha de transconstitucionalismo que nos dizeres do autor

o Estado deixou de ser um loeus privilegiado de soluccedilatildeo de problemasconstitucionais Embora fundamental e indispensaacutevel eacute apenas um dos diversos loci em cooperaccedilatildeo e concorrecircncia na busca do tratamento dessesproblemas A integraccedilatildeo sistecircmica cada vez maior da sociedade mundiallevou agrave desterritorializaccedilatildeo de problemascaso juriacutedicoconstitucionaisque por assim dizer emanciparamse do Estado Essa situaccedilatildeo natildeo develevar poreacutem a novas ilusotildees na busca de niacuteveis inviolaacuteveis definitivosinternacionalismo como ulUmo ratio conforme uma nova hierarquizaccedilatildeoabsoluta supranacionalismo como panaceia juriacutedica transnacionalismocomo fragmentaccedilatildeo libertadora das amarras do Estado localismo comoexpressatildeo de uma etlcidade definitivamente inviolaacutevel

Contra essas tendecircncias o transconstitucionalismo implica o reconheci-mento de que as diversas ordens juriacutedicas entrelaccediladas na soluccedilatildeo deum problema-caso constitucional - a saber de direitos fundamentais ouhumanos e de organizaccedilatildeo legitima do poder - que lhes seja concomilantemente relevante devem buscar formas transversais de articulaccedilatildeopara a soluccedilatildeo do problema cada uma delas observando a outra paracompreender os seus proacuteprios limites e possibilidades de contribuir parasolucionaacute-lo Sua identidade eacute reconstruiacuteda dessa maneira enquanto levaa seacuterio a alteridade a observaccedilatildeo do outro~

15 NEVES Marcelo TransconSI1tucionalismo sio Paulo WMf Manins fomes p 297298

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

401

Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

403

Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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SILVIO BEU1lAMEW Nno

Diga-se a sobredita transversalidade eacute aqui interpretada sob o prisma dosdireitos humanos e com cena liberdade como a inescapaacutevel correlaccedilatildeo e coor-denaccedilatildeo entre a normativa domeacutestica e a internacional porquanto ambas funda-mentamse no irrestrito compromisso com a dignidade da pessoa humana o QuesignificaQue seu objeto comum deveraacute sempre ser o avanccedilo na proteccedilatildeo dos direi-tos humanos no plano dos fatos (notadamente na soluccedilatildeo dos problemas-caso)

Contudo a operacionalizaccedilatildeo dessa transversalidade de forma instituciona-Iizada (Le como padratildeo de conduta juriacutedica) ainda se mostra um desafio quecomeccedila a enfrentar obstaacuteculos para sua superaccedilatildeo ainda nos bancos acadecircmicos ante o histoacuterico desequiliacutebrio verificado entre o estudo estanque das normasnacionais em face das internacionais reforccedilando uma percepccedilatildeo dualista queem nada favorece os direitos humanos Esta mesma percepccedilatildeo segue com ooperador do Direito nas distintas atividades profissionais desempenhadas (ad-vocacia magistratura promotoria defensorias etc) limitando nacionalmente osdebates e a aplicaccedilatildeo do direito internacional a casos episoacutedicos selecionados econduzidos unicamente sob a compatibilidade com o enunciado normativo inter-no e pior praticamente alijando qualquer interlocuccedilatildeo perene entre as jurispru-decircncias nacional e internacional

A alteraccedilatildeo deste contexto a bem dos direitos humanos exige necessaria-mente uma iniciativa dos operadores do direito na direccedilatildeo de intensificar aprovocaccedilatildeo das instacircncias juridicas decisoacuterias interQas para Que haja o enfren-tamento dos institutos e fundamentos juriacutedicos construiacutedos dentro dos sistemasinternacionais de proteccedilatildeo

Note-se natildeo se trata apenas de mera citaccedilatildeo de tratados internacionaiscomo incremento retoacuterico de peticcedilotildees Cuida-se de debater a panir de padrotildeesde entendimento e argumentaccedilatildeo acerca dos direitos humanos calcados emdoutrina e jurisprudecircncia desenvolvidas uacutenica e exclusivamente sob a teleologiada preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa humana e que por isso merecem serconsideradas pelas instacircncias juriacutedicas paacutetrias uma vez Que o caminho inversojaacute eacute trilhado afinal faz pane da rotina dos oacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeoconsiderar e avaliar os paracircmetros juriacutedicos nacionais alegados para o caso emcotejo com as normas internacionais aplicaacuteveis Daiacute a pertinecircncia da estrateacutegiadenominada por CARVALHORAMOSde Diaacutelogo das cones

Assim temos a seguinte situaccedilatildeo no plano nacional haacute juiacutezes e tribunaisQue interpretam cotidianamente esses tratados de direitos humanos Noplano internacional haacute oacutergatildeos internacionais Que podem ser acionadoscaso a interpreroccedilOo nacional desses tratados seja incompafiacutevef com o entendimento internacional

Por isso foi mencionada acima a necessidade de compatibilizaccedilatildeo entreo resultado do controle de convencionalidade nacional com o decididono controle de convencionalidade internacional Natildeo seria razoaacutevel por

400

ErfTMl)ADE 00 O1RUTO INTERNAOOHAl DOS DJRmos HuMANOS NO AacuteMBlTO NAOONol

exemplo Que ao julgar a aplicaccedilatildeo de determinado artigo da ConvenccedilOoAmericana de Direios Humanos o STf optasse por interpretaccedilatildeo natildeo acoIhida pela proacutepria Corte Interamericana de Direitos Humanos abrindo apossibilidade de eventual sentenccedila desta Cone contra o Brasil

Esse MDiaacutelogo das Cortes deve ser realizado internamente para impedirviolaccedilotildees de direitos humanos oriundas de interpretaccedilotildees nacionais eQuivocadas dos tratados Para evitar que o Diaacutelogo das (ortes seja meraretoacuterica judicial haacute Que se levar em consideraccedilatildeo os seguintes paracircmetrona anaacutelise de uma decisatildeo judicial nacional para Que se determine a exis-tecircncia de um Diaacutelogo efetivo

1) a menccedilatildeo agrave existecircncia de dispositivos internacionais convencionais ouextraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema

2) a menccedilatildeo agrave existecircncia de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as conseQuecircncias disso reconhecidas pelo Tribunal

3) a menccedilatildeo agrave existecircncia de jurisprudecircncia anterior sobre o objeto dalide de oacutergatildeos internacionais de direitos humanos aplos a emitir decisotildeesvinculantes ao Brasil

4) peso dado aos dispOSitivos de direitos humanos e agrave jurisprudecircncia in-ternacional bull~

A proposta do Diaacutelogo das Cortes eacute complementada pela teoria do duplocontrole ou crivo de direitos humanos a saber

Claro Que natildeo eacute possiacutevel obrigar os juiacutezes nacionais ao Diaacutelogo das Cortes

8

pois isso desnaturaria a independecircncia funcional e o Estado Democraacutetico de Direito Assim no caso do diaacutelogo inexistir ou ser insuficientedeve ser aplicada a teoria do duplo conrrole ou crivo de direitos humanosque reconhece a atuaccedilatildeo em separado do controle de constitucionalidade(STF e juiacutezos nacionais) e do controle de convencionalidade internacional(oacutergatildeos de direilos humanos do plano internacional)

Os direitos humanos entatildeo no Brasil possuem uma dupla garantia o controle de constitucionalidade nacional e o controle de convencionalidadeinternacional Qualquer aio ou norma deve ser aprovado pelos dois controles para Que sejam_ respeitados os direitos no Brasil f

Em suma natildeo basta para a sua validade que um ato ou norma Que passepelo crivo do controle de constitucionalidade nacional e natildeo o consiga perante ocontrole internacional de convencionalidade e viceversa

Na perspectiva deste panorama urge que os atores capazes de impulsionareste processo de interlocuccedilatildeo - que pode potencializar a implementaccedilatildeo estaacute-vel de conceitos complementares como o transconstitucionalismo o Diaacutelogo dasCortes e a Teoria do Duplo Controie - o faccedilam se possivel de modo aniculado

16 RAMOS Andreacute de carvalho Curso de direItos humanos Satildea Paulo sarai bullbulla 2014 p 4OS40617 Idlbid p 406

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

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Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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Casuiacutestica

Ano da decisatildeo 1985

Conselho de Seguranccedila da ONU

Instalado especialmente na Aacutefrica do Sul o regime do apartheid baseava-se naseparaccedilatildeo entre raccedilas inclusive no terreno juriacutedico estabelecendo urna hierar-quia segundo a qual a raccedila branca dominava o resto da populaccedilatildeo No planogeograacutefico promoveu se na deacutecada de 50 a criaccedilatildeo forccedilada de territoacuterios

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Capiacutetulos 11IVI e VIISumaacuterio 1 Caso Barcelona Traction - 2 Caso ApIrtheid - 3 Caso Lauui ys Itaacutelia - 4 CasoVelaacutesquez Rodrlguez vs Honduras - S Caso A Uacuteltima Tentaccedilatildeo de Cristo - 6Caso Maria daPenha - 7 OpiniAo Consultiva 14194 - 8 Opinilio Consultiva 18103 - 9 Caso Campo Algodo-eiro - 10 Caso XifTlfnes Lopes YS 8rasll -11Caso Noguelra de uacutervalho e Outro ~ 8rasll-12Caso Escher e Outros vs Brasil-13 CasoGaribaldi vs Brasll- 14Caso Gomes lund eOu-ttOS vs Brasil - 15 Caso Usina Belo Monte - 16 Caso Complexo Penitendaacuteriode fWrinhas

Oacutergatildeo prolator

Siacutentese do caso

Ano da decisatildeo 1970

Oacutergatildeo prolator Corte Internacional de Justiccedila

Em 1962 a Beacutelgica ajuIzara demanda contra a Espanha perante a Corte In-ternacional de Justiccedila pleiteando indenizaccedilatildeo para nacionais seus soacuteciosda Barcelona Tractian Light and Power Company Limited que tinha sede noCanadaacute e havia fornecido energia eleacutetrica na regiatildeo espanhola da Catalunhapor intermeacutedio de subsidiaacuterias Antes do caso chegar agrave CU inuacutemeras accedilotildeesintentadas pelos particulares interessados tinham tramitado por anos no Po

Siacutentese do casoder Judiciaacuterio espanhol Sustentou a Beacutelgica que aquela pessoa juriacutedica foralevada agrave falecircncia - e por conseguinte os soacutecios belgas haviam experimentado sensiacuteveis prejuiacutezos - em decorrecircncia de medidas abusivas do Governo- espanhol entre elas restriccedilotildees a transaccedilotildees financeiras da Barcelona Traetionadotadas na deacutecada de 3D sob o pretexto da Guerra Civil espanhola ACUen-tretanto negou agrave Beacutelgica legitimidade ativa (jus standl) para a defesa em faceda Espanha de interesses de nacionais seus tatildeo somente por sua condiccedilatildeode soacutecios da empresa canadense esta sim a imediatamente interessada nodesfecho da pendecircncia o que conferiria ao Canadaacute a legitimaccedilatildeo requerida

Adespeito do resultado do pleito pela primeira vez a jurisprudecircncia internacional reconhecia ainda que incidentalmente e natildeo para o caso analisado a existecircncia de obrigaccedilotildees erga omnes nascidas de graves violaccedilotildees de normas im-

Importacircncia perativas de direito internacional (juscogens) as quais por isso mesmo atingema toda a comunidade internacional acarretando a legitimidade de qualquerEstado para a busca da responsabilidade internacional do infrator e da corres-pondente reparaccedilatildeo do iliacutecito mesmo que esse Estado ou algum nacional seunatildeo tenha sofrido diretamente os efeitos praacuteticos da infraccedilatildeo

1 CASO BARCELONA TRACTlON

2 CASO APARTHEID

4D2

SIVlOBElJRAMfWNno

Eacute imperioso notar que a mudanccedila pretendida natildeo estaacute apenas a cargo do PoderJudiciaacuterio muito pelo contraacuterio

Haacute no Brasil uma atual multiplicidade de oacutergatildeos e instacircncias dos Trecircs Poderes incumbidos da proteccedilatildeo e da promoccedilatildeo dos direitos humanos estabelecidaem grande medida pelo protagonismo dos direitos fundamentais e pela abenurado paiacutes para o DIDH determinada pela Constituiccedilatildeo Federal de 988 bem comoe consequentemente pela adoccedilatildeo de recomendaccedilotildees e decisotildees emanadas dosoacutergatildeos internacionais de proteccedilatildeo

Citese a este propoacutesito e no acircmbito do Poder Executivo a jaacute referida Se-cretaria de Direitos Humanos da Presidecircncia da Repuacuteblica e seus diversos oacutergatildeosespeciacuteficos Junto ao Poder Legislativo atua a Comissatildeo de Direitos Humanos eMinorias da Cacircmara dos Deputados E no campo do Poder Judiciaacuterio (em sentidolato) haacute os proacuteprios juiacutezos singulares e tribunais (adstritos agrave observacircncia dosdireitos humanos em suas decisotildees por forccedila tanto dos mandamentos consti-tucionais quanto das normas internacionais oponiacuteveis ao Brasil) as DefensoriasPuacuteblicas (da Uniatildeo e Estaduais) o Ministecircrio Puacuteblico e a advocacia privada

Existe portanto um espaccedilo importante de interaccedilatildeo entre os sistemas in-ternacionais de proteccedilatildeo e as instacircncias juriacutedicas e poliacuteticas nacionais que podee deve ser fomentado em favor dos direitos humanos por todos os profissionaisdo Direito tendo como horizonte a tatildeo desejada efetividade

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