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VIII PRÊMIO TESOURO NACIONAL DE MONOGRAFIA
Tema: Dívida Pública
Dívida Pública como Indicador de Sustentabilidade Fiscal
e Sinalizador de Política Governamental
Outubro de 2003
1
SUMÁRIO Cap. 1. Fatores Relevantes e a Experiência Internacional .........................................5
1.1 Fatores relevantes para análise da evolução da dívida pública ..................................5 1.2 A experiência internacional....................................................................................................8
Cap. 2. Diferença entre Indicadores de Demanda Agregada e de Solvência ......17
2.1 Indicadores de Demanda Agregada...................................................................................19 2.2 Indicadores de Sustentabilidade da Política Fiscal.......................................................25 2.3 Análise comparativa dos Indicadores ...............................................................................29
Cap. 3. Análise da Dívida Líquida do Setor Público...................................................32
3.1 O Caso Brasileiro ....................................................................................................................32 3.2 Ajuste na metodologia...........................................................................................................32 3.3 Critérios para Escolha dos Componentes da DLSP......................................................35 3.4 Dívida Líquida do Setor Público Ajustada: Hipóteses de Trabalho ..........................37 3.5 Reavaliação dos Ativos .........................................................................................................38 3.6 Reavaliação dos Passivos....................................................................................................41 3.7 Ajuste dos Ativos e Passivos para Valores de Mercado..............................................45 3.8 Impacto do Novo Indicador sobre a Percepção de Solvência ....................................49
Cap. 4. Regime Fiscal como Instrumento de Sinalização ........................................56
4.1 Equilíbrio Agregador e Equilíbrio Separador ..................................................................56 4.2 Aplicação do Modelo ao Caso Brasileiro Recente .........................................................61
Conclusão..............................................................................................................................69
Anexo I....................................................................................................................................73
Anexo II...................................................................................................................................75
Bibliografia Consultada .....................................................................................................76
2
Introdução
Essa monografia pretende lançar luz sobre dois pontos importantes para
melhor qualificar o debate sobre dívida pública: a criação de um indicador para
correta mensuração e acompanhamento da sustentabilidade da dívida e a sua
utilização como sinalizador de política governamental. Primeiramente, pretendemos
analisar o principal indicador calculado e divulgado pelo Governo Brasileiro para
mensurar a dívida pública, a Dívida Líquida do Setor Público – DLSP. Nesse sentido,
avaliaremos sua adequação como parâmetro que expressa de forma eficiente a
condição de solvência do governo, vis a vis as características básicas que espera-se
de um indicador com essa finalidade. Na seqüência, apresentamos um indicador
alternativo que acreditamos ser mais apropriado para atingia esse objetivo.
A monografia também examina a função que um regime fiscal pode
desempenhar como instrumento de sinalização para separar os governos
comprometidos com a sustentabilidade da dívida pública dos não comprometidos.
Testaremos, então, empiricamente, se o esforço fiscal recente do Governo brasileiro
foi suficiente para que evitar qualquer dúvida quanto à sustentabilidade de sua
dívida.
No primeiro capítulo, discorreremos sobre os antecedentes em relação ao
tema, quando serão apresentadas as discussões acadêmicas e entre os analistas
econômicos sobre as características relevantes de um indicador que pretenda
monitorar a sustentabilidade da dívida pública. Tais discussões tratam do universo a
ser considerado, dos ativos e passivos relevantes e dos critérios de
3
mensuração mais apropriados, considerando a finalidade do indicador.
No segundo capítulo, serão apresentadas, em bases teóricas, as
particularidades que envolvem a definição de dois importantes tipos de indicadores
econômicos: (i) aquele que pretende mensurar os impactos das políticas monetária e
fiscal sobre a demanda agregada e (ii) aquele que busca monitorar a
sustentabilidade da dívida pública. Em relação ao primeiro indicador, serão
introduzidos os principais argumentos sobre os impactos das políticas econômicas
em relação às variáveis reais da economia. Em relação ao segundo, serão
apresentados os argumentos para construção de um modelo de sustentabilidade da
dívida, considerando os parâmetros relevantes. Ao final desse capítulo, serão
comparados os dois indicadores e ressaltadas suas particularidades.
No terceiro capítulo, detalharemos a DLSP e, a partir dos argumentos
apresentados no segundo capítulo, analisaremos a necessidade de modificações no
referido indicador para aproximá-lo de um verdadeiro parâmetro de solvência. Ao
final desse capítulo, avaliaremos o impacto das alterações propostas sobre o atual
valor da DLSP e sobre a percepção de solvência do setor público.
No quarto e último capítulo, consideraremos a utilização do indicador de
sustentabilidade fiscal como sinalizador de política governamental. A esse respeito,
daremos especial destaque à assimetria de informação existente entre devedor e
credor, tendo em vista que esse último desconhece as reais intenções do primeiro
em relação ao pagamento ou não de sua dívida. Abordaremos, então, a
4
situação em que o devedor atingirá um nível de endividamento tal que o credor
exigirá mudança em seu comportamento, que deverá ocorrer por meio da geração
de um esforço fiscal suficientemente elevado para retornar ao ponto de equilíbrio
anterior, sob pena de ser tratado como um devedor que irá repudiar a sua dívida.
Com base na hipótese de comportamento descrita, analisaremos se o Brasil teria
ultrapassado seu “limite máximo de endividamento”, bem como se o esforço fiscal
recente foi suficiente para que o País tenha tratamento equivalente aos devedores
considerados solventes.
5
Cap. 1. Fatores Relevantes e a Experiência Internacional
1.1 Fatores relevantes para análise da evolução da dívida pública
A dívida pública é um dos indicadores mais importantes das finanças
públicas de um país. O estoque dessa dívida em relação à riqueza do país, bem
como sua trajetória esperada, a partir de indicadores econômicos tradicionais,
possibilitam analisar a capacidade de solvência intertemporal do setor público.
Embora a evolução da dívida seja considerada a variável de análise mais relevante,
acreditamos que alguns outros aspectos devam ser acompanhados para melhor
apuração da sustentabilidade fiscal1 de um país. Nesse sentido, devem ser também
destacadas a própria estrutura da dívida (em termos de distribuição temporal e
sensibilidade a variações nos diversos indicadores econômicos), a capacidade dos
mercados, principalmente o doméstico, em financiá-la e as variáveis político-
institucionais de cada país.
A estrutura da dívida pública de um país é reflexo, principalmente, da
estabilidade macroeconômica e do desenvolvimento de seu mercado financeiro. Um
país estável e com mercado financeiro desenvolvido tem maior capacidade de obter
financiamento a taxas reduzidas e prazos mais longos. Além disso, esses fatores
permitem que possam ser emitidos títulos com características tais, que uma
volatilidade de curto prazo nos indicadores financeiros não afetará negativamente o
estoque da dívida pública.
1 Entende-se por sustentabilidade ou solvência fiscal o equilíbrio entre o valor presente dos impostos e o valor presente dos gastos, nesses incluídos os juros e principal da dívida, de modo que a continuidade da política fiscal ocorra sem mudanças no ambiente macroeconômico, tais como monetização ou reestruturação da dívida pública.
6
Por outro lado, países que sofrem constantemente reveses econômicos,
como é o caso da experiência recente do Brasil, e que não possuem mercado
financeiro doméstico muito desenvolvido, tendem a ter problemas que se refletem na
estrutura de suas dívidas, tais como concentração em títulos remunerados pela
variação cambial e/ou por taxas de juros de curto prazo e com consideráveis
vencimentos no curto e médio prazos. Essa situação impõe riscos adicionais para a
estabilidade macroeconômica, realimentando o processo de endividamento público
(Bevilaqua e Garcia, 1999, Bevilaqua et al., 2001, e Dornbusch e Draghi, 2000).
O caso brasileiro é um exemplo clássico pois, embora o país esteja
gerando superávits primários superiores a 3,5% do PIB ao ano desde 1999, valores
que poderiam ser, em tese, suficientes para equilibrar, e até reduzir, a relação
dívida/PIB, as fortes desvalorizações cambiais observadas em 1999, 2001 e 2002,
acompanhadas de taxas de juros reais elevadas e do relativamente baixo
crescimento do PIB, fizeram com que tal relação subisse de 41,7% em dezembro de
1998 para 56,5% em dezembro de 2002, tendo atingido 63,6% em setembro de
2002, no ápice da crise. Tal elevação ocorreu principalmente pelo fato de a dívida
pública estar fortemente exposta à variação cambial2 e às taxas de juros de
curtíssimo prazo (Medeiros, 2001).
A existência de um mercado financeiro doméstico grande e
suficientemente desenvolvido garante financiamento regular em bases mais
2 No Brasil, a exposição cambial da dívida pública está refletida tanto na dívida denominada em moeda estrangeira (dívida externa) quanto na parcela da dívida interna referenciada ao dólar, ambas bastante representativas.
7
estáveis, evitando que o país tenha obrigatoriamente de recorrer ao mercado
internacional, inacessível com freqüência pelas mais diversas razões. Assim,
minimiza-se o impacto de crises internacionais sobre as fontes de refinanciamento
da dívida pública.
Um terceiro fator relevante para avaliarmos a sustentabilidade
intertemporal da dívida pública refere-se às variáveis político-institucionais do país
diretamente relacionadas à capacidade de o Estado manter determinada
performance fiscal ao longo do tempo. Nesse sentido, fatores tais como
modificações legais que reflitam mudança em direção a maior responsabilidade
fiscal e procedimentos orçamentários que reduzam a necessidade de barganha, no
âmbito do legislativo, ou aumentem a força dos ministérios “controladores”, em
detrimento dos “gastadores”, tendem a refletir positivamente a capacidade do Estado
em manter o esforço fiscal necessário para garantir a solvência intertemporal da
dívida (Alesina et al., 1996).
Embora cientes da relevância da estrutura da dívida, da capacidade do
mercado em financiá-la e das variáveis político-institucionais para melhor avaliação
dos riscos associados à sua sustentabilidade, não se pretende, nessa monografia,
aprofundar tais temas. Como afirmado anteriormente, nos concentraremos na
análise das estatísticas mais adequadas para mensurar a dívida pública, com
atenção especial para a Dívida Líquida do Setor Público, avaliando a metodologia de
apuração, vis a vis os principais objetivos de seu monitoramento.
8
1.2 A experiência internacional
A experiência internacional demonstra que as estatísticas que pretendem
mensurar a dívida pública obedecem a metodologias distintas, dependentes das
particularidades econômicas, financeiras e legais de cada país. Sob o aspecto
teórico, podemos considerar que existem duas metodologias extremas para
mensurar o estoque da dívida pública de um país. A primeira, sob uma ótica de
dívida líquida, tem por referência o balanço consolidado do setor público3, nele
considerados todos os passivos e subtraídos todos os ativos, ambos tendo como
contraparte o setor privado. A metodologia alternativa utiliza a ótica da dívida bruta,
considerando simplesmente todos os títulos públicos em poder do mercado.
O problema com a primeira metodologia é que, uma vez que iniciamos o
mapeamento dos ativos a serem incluídos, é difícil decidir quando parar. Nesse
sentido, a segunda alternativa, considerada por alguns teóricos mais market friendly,
caminha para o limite oposto, ao considerar apenas os títulos da dívida pública,
interna e externa. Ou seja, não considera que o governo possui ativos que podem
gerar receitas para o pagamento da dívida, assumindo que o importante, do ponto
de vista dos credores do governo, é quanto “espaço” necessita ser gerado nos
portfolios privados para “acomodar” os títulos emitidos pelo governo e por outras
entidades do setor público (Favero e Giavazzi, 2002).
Em termos de experiência internacional, observamos, por um lado, países
3 Incluindo governo central, estados e administrações locais, empresas públicas e banco central.
9
que, para uma melhor avaliação dos riscos associados aos passivos públicos,
propõe modelo de Gerenciamento de Ativos e Passivos (do inglês Assets and
Liabilities Management), segundo o qual são considerados diversos ativos que
possam trazer receitas futuras para redução da necessidade de financiamento do
Estado. Alguns desses países, como a Nova Zelândia e a Bélgica (World Bank,
2000), chegam ao extremo de propor a inclusão de ativos reais (rodovias, prédios
públicos, e demais estruturas físicas pertencentes ao Estado) nas estatísticas de
dívida pública. A nosso ver, independente da estrutura legal desses países e mesmo
considerando o processo de privatização que se tornou ícone das políticas públicas
ao longo da década de 90, é difícil imaginar um governo alienando os prédios que
abrigam o poder público com a finalidade de utilizar os recursos para pagamento da
dívida.
Ainda neste grupo, as estatísticas sobre dívida pública divulgadas pela
Organização Econômica para Cooperação e Desenvolvimento (OCDE, 2000)
consideram tanto os passivos quanto os ativos financeiros de cada um dos mais de
trinta países membros da referida organização. O próprio FMI, em seu Government
Finance Statistics – GFS (IMF, 2002b), apresenta estrutura de ativos e passivos
públicos batizada de Net Wealth, que poderia ser visto como uma proxy
aperfeiçoada da dívida líquida, considerando-a o índice que melhor monitora o grau
de endividamento público de um país.
No outro extremo da avaliação, pela ótica da dívida encontramos o critério
adotado pelo Tratado de Maastricht e aceito por todos os integrantes da União
10
Européia, o qual determina no art. 1° do Protocol on the Excessive Déficit, o limite de
“60% of the ratio of government debt to gross domestic product at market prices”
para um país se tornar membro da UE e, em seu art. 2°, define que, para o referido
tratado, “debt means total gross debt at nominal value at the end of the year ...”
(Treaty on European Union, 1992).
É importante salientar que esse critério é também utilizado pela agência
de classificação de risco soberano Fitch (Fitch, 2001a) para avaliação da situação
fiscal de um país e do resultado primário necessário para manter a dívida pública
sob controle. Para gerar seu indicador de sustentabilidade, a agência, a partir das
informações disponibilizadas pelos governos sobre seus ativos e passivos, exclui a
base monetária (por considerá-la um passivo não exigível), os passivos das
empresas estatais e todos os ativos públicos. Tal procedimento tem por objetivo a
preservação das estatísticas de comparação entre diversos países, evitando que
alguns considerem ativos que não possam ser utilizados para reduzir a necessidade
de financiamento do setor público, como é tradicionalmente o caso dos ativos não
financeiros.
Neste ponto, faz-se necessário apresentar um breve comentário que irá
basear toda a defesa futura do indicador proposto. Embora esta última metodologia
caminhe em direção à simplicidade - fator importante quando se cria regra fiscal para
diversos países, com toda a complexidade que cada um traz consigo - não cremos
que a desconsideração de todo e qualquer ativo seja o critério mais justo para se
avaliar a sustentabilidade fiscal de um país.
11
Muitos países possuem ativos cujo fluxo de receitas por eles gerados
estão legal ou contratualmente direcionados ao pagamento da dívida pública4.
Nesse sentido, o tratamento igual de desiguais não nos parece o método mais justo,
principalmente quando estamos considerando que tais análises, seja para
comparação internacional, ou, mais importante, para calcular qual o esforço fiscal
necessário para estabilizar a relação dívida/PIB em patamares confortáveis, alteram
a percepção de risco de crédito do país e, conseqüentemente, o custo de
financiamento exigido pelos investidores para refinanciar a dívida vincenda.
Nesse sentido, acreditamos que cada país deve considerar, entre os
ativos que comporão o indicador de solvência fiscal, aqueles que possuem direta,
clara e inquestionável relação com a dívida bruta. Caberia às agências de
classificação de risco e instituições multilaterais de crédito avaliarem se os
argumentos apresentados por cada país são válidos, lembrando que a
responsabilidade pela qualidade e transparência das informações deveria caber
sempre aos devedores.
Entretanto, apesar de particularidades legais, institucionais e históricas de
cada país serem fundamentais para a definição dos ativos e passivos a serem
considerados, questões gerais, e que se referem indistintamente a todos os ativos e
passivos, surgem. A primeira delas refere-se a qual aspecto da sustentabilidade
4 Como é o caso, no Brasil, dos contratos de renegociação da dívida dos estados.
12
seria mais relevante, solvência ou liquidez5. Segundo o FMI (IMF, 2002a), para
países pobres e altamente endividados, que não recorrem ao mercado de capitais
privados, mas possuem a quase totalidade de suas dívidas financiada por agências
internacionais, liquidez parece ser um problema de menor relevância que solvência.
Já no caso de países emergentes, principalmente para aqueles cujo nível de
endividamento possa ser considerado moderado, o principal risco de
sustentabilidade advém de problemas de liquidez.
O documento citado no parágrafo anterior conduz-nos a concluir que, ao
avaliarmos os ativos a serem considerados para mensuração da sustentabilidade
fiscal, devemos valorizar muito mais a sua capacidade de geração de caixa em
momentos de crise. A esse respeito, discordamos do argumento acima pois
acreditamos que os riscos de sustentabilidade e liquidez são distintos e, como tais,
devem ser acompanhados por indicadores diferentes. A própria definição de
sustentabilidade, que será detalhada no próximo capítulo, afirma que a situação
fiscal é sustentável se o valor presente do fluxo dos superávits fiscais é igual ao
estoque corrente da dívida pública. Entretanto, se fosse usado o critério de liquidez
de modo restrito, não deveríamos considerar nenhum fluxo de receita que não possa
ser antecipado. Ou seja, o critério de liquidez para escolha dos ativos levaria à
conclusão de que todo governo é insolvente, pois nem os superávits primários
futuros poderiam ser considerados.
5 Entende-se por liquidez o grau de facilidade que um ativo tem para ser vendido rapidamente, pelo seu valor cotado em mercado. Nesse sentido, quanto maior a capacidade de ser transformado em dinheiro, sem perda de valor, maior a liquidez desse ativo.
13
Outro ponto relevante para definição do melhor indicador de
sustentabilidade fiscal refere-se ao universo do setor público. Segundo o FMI (IMF,
2002a), o referido indicador deveria, idealmente, considerar todas as entidades do
setor público que tenham capacidade de acumular dívida, inclusive empresas
públicas6. Nesse sentido, se o universo não for completo, a dívida pública de um
país será subestimada, podendo parecer sustentável quando não o é.
Embora a maioria dos países europeus e membros da OCDE considere
apenas as dívidas do chamado governo geral (governo federal, governos
subnacionais e seguridade social), à medida que o mercado de capitais se torna
mais acessível, outras entidades governamentais podem passar a ter acesso a
linhas de crédito que permitem alto poder de alavancagem, como o mercado de
renda fixa7. Ao considerarmos que, na prática, a maioria dos países em
desenvolvimento realiza algumas operações de caráter fiscal fora da estrutura do
orçamento (seja em fundos extra-orçamentários ou por meio de empresas ou
instituições financeiras públicas), a ausência de estatísticas fiscais suficientemente
amplas pode levar a uma política fiscal sub-ótima e a uma percepção não correta do
grau de endividamento público.
Existe evidência de que a definição estreita do universo do governo cria
incentivos para ações de governo não transparentes. Quanto mais amplo o universo
do que se considera governo, menor a probabilidade de que operações “camufladas”
6 Especialmente na extensão em que seus rendimentos e dívidas reflitam obrigações não comerciais. 7 Relembrando um passado não tão distante, nas crises de dívida ao longo da década de 80, muito do endividamento do governo brasileiro havia sido gerado fora das estatísticas do governo central, tendo sido assumido por este apenas quando ficou evidente que as mais diversas categorias de entidades públicas não poderiam pagar a dívida por elas originalmente gerada.
14
ou desconhecidas possam surgir posteriormente sob a forma de uma desagradável
surpresa fiscal. Isto ocorre porque o que é contingente para o governo central pode
não sê-lo para uma definição de governo mais ampla.
Não obstante, passivos contingentes8 que têm um importante impacto na
percepção de sustentabilidade fiscal são freqüentemente difíceis de mensurar. Se
por um lado, informações sobre passivos contingentes do governo central - tais
como dívidas líquidas e certas que serão contabilizadas em um momento futuro e
avais e garantias a entes subnacionais ou empresas estatais9 - estão disponíveis
com freqüência, a experiência demonstra que dívidas não garantidas e riscos
financeiros10 têm se tornado, com freqüência, importantes contribuintes para o
crescimento inesperado da dívida pública, devendo ser monitorados com mais
atenção.
Nesse sentido, a exposição total do governo a riscos é tão mais
facilmente identificável quanto mais ampla a cobertura do setor público. Contudo,
existem usualmente passivos contingentes não cobertos pelo arcabouço fiscal
tradicional, por causa de limites à cobertura dos dados fiscais, ou porque alguns
passivos contingentes vão além do setor público. O Manual de Transparência Fiscal
(FMI, 1999) recomenda que seja gerado um relatório em anexo à lei orçamentária
8 Entende-se por contingente um passivo potencial, que pode ou não gerar impacto financeiro em função da ocorrência de um evento particular. Um exemplo clássico são as garantias, pois, caso o devedor original não tenha condições financeiras para pagar a dívida contraída (contingência), esta será devida pelo garantidor. 9 Para uma análise detalhada dos passivos contingentes do Governo Federal e seu impacto sobre a percepção de sustentabilidade da dívida pública brasileira, ver Ourives (2002). 10 Um risco financeiro que tradicionalmente gera grandes passivos fiscais é aquele constituído a partir do aumento do montante de dívida remunerada pela variação cambial em períodos de câmbio insustentavelmente valorizado.
15
onde são identificados os passivos contingentes do governo e suas probabilidades
de ocorrência11.
Um último ponto a ser considerado quando abordamos a macro-estrutura
de um indicador de sustentabilidade fiscal refere-se à apropriação dos estoques dos
ativos e passivos pelo critério de caixa ou competência12. Este ponto parece ser o
menos controverso de todos, pois as estatísticas internacionais têm se movido nos
últimos anos claramente em direção ao registro pelo critério de competência, que
nos parece ser o mais correto do ponto de vista econômico13.
De fato, a partir de 1999, foi exigido aos países da União Européia
reportarem seus déficits pelo critério de competência para fins do Tratado de
Maastricht. Adicionalmente, um número de outros países da OECD tem mudado
suas estatísticas para o critério de competência e a estrutura do novo Government
Finance Statistics – GFS (IMF, 2002b), tem por base de construção o critério de
competência. Por fim, o Public Sector Committtee, pertencente à International
Federation of Accountants - IFAC tem desenvolvido padrões para a contabilidade do
setor público em direção a aumentar sua compatibilidade com a estatística do setor
privado, tradicionalmente por competência (IMF, 2000).
11 No caso do Brasil, por determinação da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000), cada uma das três esferas de governo deve apresentar, juntamente com a sua lei de diretrizes orçamentárias anual, anexo de riscos fiscais, onde constam todos os riscos contingentes aos quais o governo em questão pode estar exposto. 12 Entende-se por critério de caixa aquele que registra os fatos contábeis nas datas em que os fluxos financeiros ocorreram, sendo consideradas somente as despesas e receitas efetivamente realizadas. O critério de competência, por outro lado, registra as variações no valor do ativo ou passivo, tais como a correção monetária e os juros devidos pelo período decorrido desde a aquisição do ativo ou geração do passivo, independente de terem sido recebidos ou pagos. 13 “... from an economist’s perspective, a major aim of the shift to accrual accounting is to permit a more accurate gauge of the government’s impact on the economy, particularly now that countries are becoming less
16
Considerando os argumentos apresentados nesse capítulo, acreditamos
que um indicador que pretenda mensurar corretamente a sustentabilidade fiscal do
governo deverá: (i) monitorar os ativos e passivos de todos os entes públicos que
tenham capacidade de endividamento, e não apenas do governo federal; (ii)
considerar apenas os ativos aos quais é permitido, por determinação legal,
contratual ou, ainda, institucional, gerar receitas que sejam direcionadas para o
pagamento da dívida pública, independentemente de sua liquidez; e, por fim, (iii)
apropriar os estoques dos ativos e passivos pelo critério de competência. São estes
os princípios que seguiremos a partir do próximo capítulo, na busca de um indicador
eficiente da sustentabilidade fiscal do governo.
liquidity-constrained. Notably, spending will be recorded at the time the resources are used (i.e., when the demand pressure is felt), rather than when they are paid for.” (IMF, 2000).
17
Cap. 2. Diferença entre Indicadores de Demanda Agregada e de Solvência
Além de avaliar a capacidade de solvência intertemporal do setor público,
o acompanhamento da trajetória da dívida pública tem por objetivo fornecer
informações para a tomada de decisão sobre as políticas monetária e fiscal, a partir
da análise dos impactos da Necessidade de Financiamento do Setor Público - NFSP
sobre a demanda agregada, a formação da poupança nacional, a definição das
taxas de juros de curto e longo prazos e o crescimento econômico.
Talvez pelas características distintas desses objetivos, a construção de
um indicador único - que busque refletir tanto a capacidade de solvência do setor
público quanto o efeito das políticas públicas sobre as demais variáveis
macroeconômicas - pode gerar distorções, levando a conclusões errôneas para
tomada de decisões dos gestores da política econômica e da administração da
dívida pública.
Para exemplificar, imaginemos um governo que possui um fundo público
cujo objetivo é única e tão somente o pagamento de auxílio-desemprego.
Admitamos que a carteira desse fundo seja composta por títulos privados
remunerados pela variação cambial. Por outro lado, admitamos que esse governo
possua uma dívida pública em montante equivalente, sob a forma de títulos
remunerados por variação cambial.
Caso ocorra, por exemplo, uma desvalorização cambial que afete a
18
remuneração tanto do fundo (ativo para o governo e passivo para a sociedade)
quanto da dívida (passivo para o governo e ativo para a sociedade), o impacto dessa
desvalorização sobre o comportamento dos agentes econômicos privados será
reflexo do efeito riqueza líquido gerado pelo evento, que, neste exemplo, seria nulo.
Isto ocorre porque, enquanto os passivos públicos geram efeito riqueza positivo para
aqueles que detém os títulos, os ativos públicos geram efeito riqueza negativo, no
mesmo montante, para aqueles que emitiram os títulos privados que lastreiam o
fundo.
Por outro lado, considerando que os ganhos auferidos pelo fundo público
em função da variação cambial não podem ser transferidos para pagamento da
dívida, tendo em vista que os recursos têm finalidade específica, definida em
legislação, o governo necessitará ir a mercado buscar recursos adicionais para
pagamento da dívida a vencer, agora maior em função da variação cambial.
Ou seja, do ponto de vista de impacto sobre os demais agregados
econômicos, fundamental para decisões de política fiscal, há sustentação teórica em
calcular um indicador que considere, de forma agregada, todos os ativos e passivos
governamentais contra o restante da sociedade, independente da existência de
relação entre eles. Entretanto, para mensurar a NFSP, o referido fundo não poderia
ser considerado, por não gerar receitas que possam ser direcionadas para reduzir a
pressão sobre a dívida. Tal exemplo, acreditamos, é ilustrativo para demonstrar que
o fato de utilizarmos um indicador para atender a dois objetivos muitas vezes pode
levar a conclusões incorretas, fazendo com que os gestores das políticas
19
públicas tomem decisões que não conduzem aos objetivos pretendidos.
Ao longo deste capítulo, iremos analisar separadamente as características
de um indicador que pretenda mensurar os impactos da política fiscal sobre a
demanda agregada e, de outro, que pretenda mensurar esses mesmos impactos
sobre a percepção de solvência do setor público. Assim, buscaremos diferenciar as
variáveis relevantes para cada caso, fundamental para a construção de indicadores
adequados.
2.1 Indicadores de Demanda Agregada
Assim como os gastos públicos e a tributação, a dívida pública pode ser
utilizada como importante instrumento de política fiscal. Mais especificamente, pode
gerar dois efeitos econômicos importantes: redução da magnitude das flutuações
econômicas (função estabilizadora ou contra-cíclica) e redução da distorção
tributária, ao distribuir igualmente os impostos ao longo do tempo. Entretanto, a
capacidade da dívida pública afetar os indicadores econômicos não é consensual.
Ao contrário, é possível delinear duas linhas teóricas bem definidas que apresentam
conclusões opostas sobre esta questão. Seus argumentos estão centrados na
discussão de quão longe e com que intensidade os agentes econômicos analisam
os efeitos econômicos das políticas governamentais.
20
Segundo a visão considerada convencional14, a emissão de títulos
públicos pelo governo estimula a demanda agregada e o crescimento econômico no
curto prazo. Para exemplificar, suponhamos que o governo crie um déficit
orçamentário ao manter os impostos constantes e aumentar os gastos
governamentais. Esta política aumenta a renda disponível dos consumidores e,
conseqüentemente, seus gastos, elevando a demanda agregada por bens e
serviços. Nesse sentido, déficits fiscais geram deslocamentos na demanda agregada
e afetam a utilização dos fatores de produção da economia. A economia seria
keynesiana no curto prazo por causa dos salários e preços rígidos ou da temporária
ausência de percepção dos agentes.
A esse respeito, é importante ressaltar, até para fazer contraponto com a
teoria que será apresentada a seguir, que esta análise convencional está ligada a
um específico modelo de comportamento individual. Em particular, assume que os
agentes econômicos têm restrição de liquidez ou miopia, de modo que seu
comportamento e bem-estar podem ser mais sensíveis aos impostos correntes do
que ao valor presente dos futuros impostos que eles esperam pagar.
A visão considerada não-convencional sobre a capacidade da dívida
pública gerar riqueza, visão essa basicamente restrita ao ambiente acadêmico,
recebeu a denominação de Princípio da Equivalência Ricardiana (Blinder e Solow,
1973, e Barro, 1974). O argumento ricardiano é baseado no pressuposto de que
carga tributária e déficit fiscal menores hoje requerem (na ausência de qualquer
14 Chamamos esta visão “convencional” porque ela é seguida pela maioria dos economistas (ver Walsh, 1998, e Lucas e Stokey, 1983) e por quase todos os policymakers.
21
mudança nos gastos governamentais) maiores impostos no futuro. Então, a emissão
de títulos do governo para financiar uma redução nos impostos representa não uma
redução na carga tributária, mas meramente sua postergação. Se os agentes
econômicos possuírem suficiente visão de futuro (forward looking), eles serão
capazes de perceber os impostos futuros requeridos para pagar a dívida pública
criada hoje.
Compreendendo que o valor presente de sua riqueza, líquida dos
impostos, não mudou, os agentes não responderão à política fiscal expansionista
com aumento do consumo. De fato, com ampla visão de futuro eles irão poupar a
totalidade do aumento no déficit governamental (gerado por redução dos impostos
ou aumento dos gastos ou ambos) para compensar o passivo tributário que virá.
Como resultado, a redução da poupança pública (o déficit fiscal) coincidirá
precisamente com um aumento da poupança privada, de modo que a poupança
nacional irá permanecer inalterada, bem como as outras variáveis econômicas.
Não obstante a atração que a visão ricardiana exerce, principalmente por
causa de suas poderosas implicações teóricas, ela claramente assume elevado grau
de racionalidade dos agentes e uma série de outras hipóteses que são muito
improváveis de ocorrer na prática15. A evidência sugere que o grau de visão futura
dos agentes econômicos exigido pela Teoria da Equivalência Ricardiana, com
15 As principais hipóteses que sustentam a Teoria da Equivalência Ricardiana são: (i) os agentes privados são racionais; (ii) a geração corrente é ligada a futuras gerações por meio de transferências motivadas por princípios altruístas (iii) os impostos não distorcem incentivos, ou seja, são tipo lump-sum; (iv) o mercado de ativos privados é completo ou, se é incompleto, nenhum novo título é introduzido que não já exista no equilíbrio original; (v) o mercado de capitais é perfeito, isto é, não existem restrições nas vendas de títulos públicos ou existem substitutos privados para eles; (vi) a geração corrente tem total conhecimento de qualquer futura mudança nos impostos em função das operações financeiras do governo ou a parcela dos futuros impostos a qual cada indivíduo é chamado a contribuir é independente do estado da natureza (não contingente).
22
consumidores planejando por toda sua vida e tendo cuidadoso controle sobre todas
contingências, de longe excede o que encontramos na realidade.
Entretanto, embora não haja evidência de que os consumidores possuam
horizonte de planejamento muito longo, principalmente em relação aos impactos de
decisões de política fiscal sobre seus rendimentos, é de se esperar que, em relação
a suas aposentadorias, haja certo grau de planejamento de longo prazo. Isto sugere
que seguridade social e outros programas semelhantes de transferência de renda
são mais prováveis de afetar a poupança.
Nesse sentido, qual seria o indicador de impacto fiscal mais eficiente?
Uma das conclusões de Auerbach e Kotlikoff (1987) foi que nenhum simples
indexador provavelmente capturaria os complexos efeitos da política fiscal sobre a
demanda agregada. Entretanto, Blanchard (1990) sugere um indicador que
considera os dois tratamentos possíveis, permitindo considerações sobre diferentes
horizontes de planejamento. Para derivar tal indicador, estrutura analítica útil foi
sugerida pelo referido autor, que deriva uma função de consumo agregado baseada
na maximização da função de utilidade individual definida sobre ambos, o consumo
atual e o esperado:
C = a (B+K) + b [ σ ∫ (Y-T) e –σs ds ]
Assume-se, neste caso, que o consumo depende da riqueza financeira,
que é igual à soma da dívida do governo (B), com outras formas de riqueza
23
financeira (K) e com o valor presente da renda do trabalho, liquida de impostos (Y-
T), descontado a uma taxa que leve em consideração o possível grau de visão de
futuro dos consumidores (que Blanchard chama de índice de miopia, σ). O
parâmetro s representa o período no qual os agentes econômicos possuem
percepção quanto aos impactos de eventos, estando normalizado para valores entre
0 (t0) e 1 (tn). Ao incorporar um parâmetro para o grau de visão de futuro dos
consumidores, este modelo considera a Equivalência Ricardiana como um caso
especial.
Proposta de Índice de Impacto Fiscal
Utilizando argumentação semelhante à adotada por Blanchard, propomos
um Índice de Impacto Fiscal – IIF, com o objetivo de capturar o impacto das ações
do governo sobre a demanda agregada, o qual considera na função de demanda
agregada os termos relacionados à política fiscal (isto é, os gastos governamentais,
os impostos e a dívida). Assim, tal índice seria escrito como:
IIF = α rb + (r+p) [β ∫ g e –(r+p)s ds] – (r+p) [β ∫ t e –(r+p)s ds]
onde b é o estoque da dívida pública, g é o gasto público em bens
(inclusive investimentos) e serviços e t representa os tributos, os três expressos em
relação ao produto. O segundo e terceiro termos representam, respectivamente, o
valor das anuidades dos futuros gastos governamentais e impostos, r é a taxa real
de juros e β representa a propensão marginal a consumir.
24
Em relação ao grau de miopia, adicionalmente ao parâmetro s, já
considerado em Blanchard, incluímos p, que representa a capacidade de estimação,
pelos agentes, dos impactos das ações de política fiscal sobre a sua renda
disponível. Nesse sentido, quando os impostos ou gastos governamentais são vistos
pelos consumidores como não propriamente refletindo seus níveis permanentes (0 ≤
p < 1 e 0 < s ≤ 1), os impactos das atuais políticas orçamentárias sobre a demanda
agregada serão menores do que quando expectativas dos consumidores forem de
curtíssimo prazo (p=1 e s=0). Nesse último caso, impostos e gastos futuros são
percebidos como prováveis de serem iguais a impostos correntes e o índice de
impacto fiscal se torna:
IIF ’ = α rb + β (g – t)
Esta medida, em suas duas versões, explicita a importância potencial do
grau de visão de futuro do consumidor (s) por um lado e de expectativas quanto a
futuras políticas governamentais (p), por outro. Na ausência de plena miopia (0 ≤ p <
1 e 0 < s ≤ 1) ou de outros fatores que dificultam ou até impossibilitam a distribuição
intertemporal do consumo, o impacto inicial de mudanças na política fiscal irá variar
de acordo com expectativas em relação à duração da mudança. Por exemplo, se o
governo cria um imposto temporário, uma reversão é esperada e, nesse sentido,
consumidores podem responder amortecendo os impactos desse imposto ao longo
do tempo. Por outro lado, se consumidores são de fato míopes (p=1 e s=0), o
segundo indicador representará com eficiência o impacto de curto prazo da
25
política fiscal.
2.2 Indicadores de Sustentabilidade da Política Fiscal
Indicadores de sustentabilidade da política fiscal deveriam ser derivados
da restrição orçamentária intertemporal do governo, de acordo com a qual o valor
presente dos impostos deve ser igual ao valor presente dos gastos, incluindo os
juros da dívida pública e o pagamento da própria dívida. Isto ocorre por duas razões.
Primeiro, tal restrição foca explicitamente na relação entre o custo do serviço de um
existente estoque de dívida pública, devido à acumulação de déficits orçamentários
anteriores, e o tamanho dos futuros superávits primários necessários para financiar
esta despesa com encargos e principal. Segundo, a restrição orçamentária
intertemporal também enfatiza a importância relativa dos desequilíbrios de curto
versus longo prazo nas finanças públicas.
A restrição orçamentária intertemporal é derivada da restrição
orçamentária dinâmica do governo que diz que em cada ponto do tempo, a mudança
no estoque da dívida líquida do setor público é igual aos gastos (exceto juros),
menos receitas, mais a carga de juros sobre a dívida. Tal restrição pode ser
formulada como se segue:
1−
••
+−=+ tttttt BiRGBM , (1)
onde M é o estoque nominal da base monetária, B é o estoque da
26
dívida pública interna e externa, G e R representam os gastos e as receitas do
governo e i a taxa de juros nominal.
Para o longo prazo, derivamos, a partir da equação (1), uma identidade
que estabelece que o governo, como todos os demais agentes econômicos, possui
uma restrição orçamentária intertemporal. Nesse sentido, devemos iterar a relação
em (1) nos períodos subseqüentes. Ao final, e considerando as variáveis em termos
reais, chegarmos a:
( )( )
( ) itiititi
t bdsb i
j jtri
j jtr+∞→++
∞
= ∏= ++∏
= +++−= ∑
01
01
1lim11
, (2)
onde bt representa a dívida pública líquida, ( )∏= ++i
j jtr01 é o fator real de
desconto aplicado entre os períodos t e t+i, tt
tt PY
Ms•
= corresponde às receitas de
senhoriagem e tt
ttt PY
RGd −= ao déficit primário do governo ( tP é o nível de preços e
tY é o nível do produto). As três variáveis (bt , st e dt) estão, portanto, expressas em
termos reais como proporção do PIB.
A restrição de solvência apresentada pela equação (2) implica em afirmar
que a dívida existente é financiada por superávits primários e/ou senhoriagem
(entendida como aumento real do estoque de base monetária). Como afirmado em
Ourives (2002), a restrição de solvência implica ainda que não há Ponzi game,
27
uma vez que os agentes privados não irão manter uma posição de endividamento
indefinido com o governo16.
Considerando a condição de transversalidade, a equação (2) reduz-se
para:
( )( )itit
it dsb i
j jtr++
∞
=
−= ∑∏= ++1
01
1 (3)
A equação acima afirma que um governo que possua estoque de dívida
positivo deve, a partir de algum momento no tempo, incorrer em superávits
primários. Além disso, esses superávits devem ser tais que, em termos de valor
presente, sejam iguais ao valor do estoque inicial da dívida.
Cabe salientar que a política fiscal intertemporal é considerada
sustentável se esta restrição pode ser satisfeita sem mudanças nas políticas
monetária e fiscal, ou seja, a continuidade da política fiscal no futuro deve ocorrer
sem mudanças relevantes no ambiente macroeconômico em questão, tais como a
monetização, a reestruturação (alteração nas condições inicialmente pactuadas) ou
até o não pagamento da dívida.
16 A afirmação é sustentada pela condição de transversalidade da restrição de solvência onde
( )01lim
01
=+∞→∏= ++
itibi
j jtr, ou seja, o valor presente da dívida pública não pode ser positivo no limite.
28
É importante comentar que, no curto prazo, a política fiscal adotada pelo
governo não precisaria necessariamente atingir um certo nível de dívida que
demonstrasse compromisso com a estabilidade, como será abordado no quarto
capítulo. Entretanto, não obstante possam ser observados, no curto prazo,
desequilíbrios fiscais, um governo deve demonstrar permanentemente seu
compromisso com a restrição orçamentária intertemporal, fundamental para
manutenção da credibilidade perante seus credores.
Considerando as equações (1) e (3) e seguindo os passos de Giambiagi e
Além (1999), chegamos ao superávit primário requerido para estabilizar a relação
dívida/PIB, que, como já explicitado na restrição de solvência, é função direta da
taxa de juros real incidente sobre o estoque da dívida pública (r) e da própria relação
dívida/PIB (b) e inversa da taxa de crescimento real da economia (y) e da
senhoriagem (s), conforme apresentado na equação, a seguir:
( )( ) tt
t
ttt sb
yyr
d −+−
=1
(4)
Como comentado em Ourives (2002), é importante destacar que o
superávit necessário para manter a sustentabilidade fiscal deve ser visto como um
conceito ex ante, considerando que a restrição orçamentária dada pela expressão
(3) será sempre atendida ex post, a partir do pressuposto de que o mercado de
crédito não aceitará financiar um governo cujas despesas superam suas receitas em
termos de valor presente, o que exigiria, desta forma, ajustamento nas despesas,
nas receitas, ou algum tipo de repúdio da dívida.
29
Nesse sentido, uma outra análise que podemos auferir a partir da
equação (4) refere-se à magnitude do ajuste necessário, caso o governo incorra em
uma situação de insustentabilidade fiscal ex ante. A diferença entre o superávit
corrente do governo e o superávit necessário possui, neste caso, uma interpretação
direta e clara: refere-se à magnitude do ajuste fiscal necessário no período “t” para
tornar tal política sustentável.
2.3 Análise comparativa dos Indicadores
Considerando os dois principais indicadores apresentados ao longo deste
capítulo, ambos medidos como proporção do produto, podemos observar que os
conceitos, as hipóteses e as variáveis utilizadas para suas construções são bastante
distintos. Assim, não é teoricamente correto considerar que a variável “b” que
aparece em ambos os indicadores possui o mesmo sentido e o mesmo tratamento
estatístico nas duas equações, conforme apresentado a seguir:
iif ’ = α rb + β (g – t )
( )( )itit
it dsb i
j jtr++
∞
=
−=∑∏=
++10
1
1
A variável “b” do Índice de Impacto Fiscal sobre a Demanda Agregada –
IIF seria mais bem expressa se separada entre duas novas variáveis, representando
o estoque dos ativos (a) e passivos (p) do setor público junto ao setor privado.
30
Do mesmo modo, podemos expressar a variável “b” do indicador de sustentabilidade
fiscal a partir dos ativos e passivos do setor público junto ao setor privado. Neste
caso, e considerando, por simplificação, que as taxas de rentabilidade dos ativos e
passivos governamentais junto ao setor privado são equivalentes, temos a seguinte
equação:
iif ’ = α (rpp – raa) + β (g – t )
( )( )itit
itt dsap i
j jtr++
∞
=
−=− ∑∏= ++1
01
1
Entretanto, e como buscamos esclarecer ao longo desse capítulo, há
diferenças básicas em ambas as equações entre os ativos e passivos públicos que
devam ser considerados, reflexo dos impactos distintos de cada item sobre a
demanda agregada e a percepção de sustentabilidade fiscal.
No caso do indicador de impacto fiscal sobre a demanda agregada,
devemos considerar todos os ativos e passivos em poder do público, desde que e no
montante em que sejam percebidos como riqueza por parte dos agentes
econômicos. Ou seja, devem ser considerados os rendimentos dos ativos e
passivos, assim como as receitas e despesas, que afetam a percepção de renda
disponível pelo setor privado, de modo a impactar suas decisões de consumo e
poupança e, conseqüentemente, a demanda agregada.
Já no caso do indicador de sustentabilidade fiscal, devemos
31
considerar todos os passivos em poder do setor privado que representem
exigibilidade junto ao setor público e todos os ativos que possam ser transformados,
em algum momento do tempo, em receita para pagamento da dívida pública. Como
concluímos da restrição orçamentária intertemporal, a diferença entre o valor
presente dos fluxos reais das receitas e despesas públicas tem que igualar o valor
presente da dívida pública.
Para que não se perca a consistência teórica, a diferença entre essas
receitas e despesas tem que ser utilizada para pagamento da referida dívida. A
percepção de solvência não será aumentada se o governo reduzir a dívida líquida do
setor público ao contabilizar itens no ativo que não possam ser utilizados para
pagamento da dívida bruta. Ao final, o setor privado terá que gerar espaço adicional
em seu portfólio para absorver essa dívida, não reduzindo a necessidade de
financiamento do governo a partir dessa “contabilidade criativa”. É com base nesse
princípio que será proposto, no capítulo seguinte, alterações no tradicional indicador
de sustentabilidade fiscal utilizado pelo Governo Brasileiro, a DLSP, para que esta
se aproxime de um indicador eficiente para mensuração da condição de solvência
do setor público.
32
Cap. 3. Análise da Dívida Líquida do Setor Público
3.1 O Caso Brasileiro
A DLSP brasileira corresponde ao total das obrigações do setor público17,
deduzido do total de seus haveres financeiros junto aos agentes econômicos
privados. A DLSP busca, ao mesmo tempo, dois objetivos: refletir a capacidade de
solvência do estado e o efeito das políticas públicas sobre a demanda agregada.
É importante ressaltar que, recentemente, o Banco Central passou a
divulgar, concomitantemente à dívida líquida, estatísticas relacionadas à Dívida
Bruta do Governo Central, como parte do processo de maior transparência das
contas públicas, possibilitando ampliar a comparação internacional. Não obstante,
para fins de análise da capacidade de solvência do Estado, tanto o governo quanto
os analistas permanecem utilizando DLSP, estatística esta que será, por todos os
argumentos apresentados ao longo dos dois primeiros capítulos, utilizada como
ponto de partida para proposta de um indicador de sustentabilidade fiscal.
3.2 Ajuste na metodologia
Antes de iniciarmos discussão sobre o ajuste na metodologia atualmente
utilizada pelo Banco Central para calcular a DLSP, apresentaremos quadro resumo
com os seus principais componentes, conforme hoje divulgado:
17 Governo Central – Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social – Governos Estaduais e Municipais e Empresas Estatais.
33
Tabela 1: Dívida Líquida do Setor Público posição em junho de 2003
Fontes: Banco Central (Notas para a Imprensa - Política Fiscal e Setor Externo) e Secretaria do Tesouro Nacional (Resultado do Tesouro Nacional)
1 Créditos originários de dívidas de outros entes da federação (principalmente estados) assumidas pelo Governo Federal, Banco Central e empresas estatais federais 2 Inclui Royalties de petróleo, créditos originários da renegociação da dívida agrícola, recebíveis e arrecadação a recolher, dentre outros créditos 3 Considera basicamente o valor dos títulos do Tesouro Nacional na carteira do Banco Central (ativo), descontado dos recursos da Conta Única do Governo Federal (passivo) 4 Inclui depósitos a vista, títulos da dívida mobiliária do Governo Federal, aplicações financeiras, dentre outros créditos 5 Em poder do público (inclui dívida securitizada e TDA) 6 Considera basicamente o valor dos títulos do Tesouro Nacional na carteira do Banco Central (passivo), descontado dos recursos da Conta Única do Governo Federal (ativo) 7 Dívida Bancária Federal 8 Em poder do público 9 Dívidas com o Governo Federal, Banco Central e empresas estatais federais 10 Inclui dívida mobiliária em poder do público, dívida bancária, royalties de petróleo, Fundef, dentre outras dívidas 11 Inclui dívida mobiliária em poder do público, dívidas reestruturadas e dívida bancária 12 Inclui dívida externa, dívidas reestruturadas (MF30, BIB, Clube de Paris e DMLP), dívida bancária, debentures, dívidas renegociadas (Lei nº 8.727/93), dentre outras 13 Díferença entre os passivos e os ativos do setor público (o valor final corresponde à DLSP)
ATIVOS % do PIB PASSIVOS % do PIB DIFERENÇA 13
1. GOVERNO CENTRAL 50,92% 1. GOVERNO CENTRAL 85,02% 34,10% 1.1 Governo Federal 29,90% 1.1 Governo Federal 65,50% 35,60% Renegociação (Lei nº 9.496/97 e PROES) 1 15,20% Dívida Mobiliária Interna do Tesouro Nacional 5 40,90% Renegociação (Lei nº 8.727/93) 1 1,30% Dívida Externa 13,60% Dívidas Reestruturadas 1 1,90% Relacionamento com o Banco Central 6 10,90% Recursos do FAT 5,30% Outras Dívidas 7 0,10% Outros Créditos 2 6,10% Previdência Social 0,10%
1.2 Banco Central 21,02% 1.2 Banco Central 19,52% -1,50% Reservas Internacionais 8,82% Dívida Mobiliária Interna do Banco Central 8 2,40% Relacionamento com o Governo Federal 3 10,90% Dívida Externa 5,62% Créditos às Instituições Financeiras 1,30% Base Monetária 4,10%
Operações Compromissadas 3,90% Outros Depósitos no Banco Central 3,50%
2. GOVERNOS ESTADUAIS 4 1,50% 2. GOVERNOS ESTADUAIS 18,80% 17,30% Dívida Externa 1,00% Renegociação (Lei nº 9.496/97 e PROES) 9 13,30% Renegociação (Lei nº 8.727/93) 9 1,80% Dívidas Reestruturadas 9 0,90% Outras Dívidas 10 1,80%
3. GOVERNOS MUNICIPAIS 4 0,10% 3. GOVERNOS MUNICIPAIS 2,50% 2,40% Dívida Externa 0,20% Renegociação (MP 2.118/2000) 9 1,90% Renegociação (Lei nº 8.727/93) 9 0,20% Outras Dívidas 11 0,20%
4. EMPRESAS ESTATAIS 3,30% 4. EMPRESAS ESTATAIS 4,90% 1,60% 4.1 Federais 4 3,30% 4.1 Federais 12 2,50% 4.2 Estaduais 0,00% 4.2 Estaduais 12 2,20% 4.3 Municipais 0,00% 4.3 Municipais 12 0,20%
TOTAL DOS ATIVOS 55,82% TOTAL DOS PASSIVOS 111,22% 55,40%
34
Com o objetivo de fornecer argumentos para reestruturação metodológica
da DLSP, ajustando seus ativos e passivos de modo que busquem melhor refletir a
real capacidade de pagamento da dívida pública, descreveremos a seguir os
principais ativos e passivos que deveriam ser objeto de análise, além de
aperfeiçoamento dos cálculos dos itens remanescentes.
É importante esclarecer que, com os argumentos a seguir apresentados,
não estamos sugerindo que a DLSP tenha sua metodologia alterada. Como este
indicador se presta a duas finalidades, a atual metodologia permite que ele continue
a ser instrumento de mensuração dos efeitos das políticas públicas sobre as
variáveis macroeconômicas.
Já a DLSP ajustada (vamos a partir deste ponto chamá-la assim), ao
considerar apenas os ativos que efetivamente gerariam receita para pagamento da
dívida pública, além, é claro, de todos os passivos que a compõem, passaria a
melhor refletir a evolução da dívida pública e, principalmente, auxiliar na definição do
resultado primário requerido para manter essa dívida sob controle, conforme
demonstrado no segundo capítulo.
Ou seja, a avaliação dos ativos e passivos que compõe a DLSP ajustada
teria por finalidade, em última análise, aperfeiçoar o indicador para que este permita
conferir maior transparência ao quadro fiscal do país, refletindo corretamente a
Necessidade de Financiamento do Setor Público - NFSP e o risco país
35
percebido pelos seus credores.
3.3 Critérios para Escolha dos Componentes da DLSP
Se formos rigorosos na análise dos ativos e passivos que comporiam a
DLSP ajustada, deveríamos considerar, para os ativos: (i) o valor econômico dos
bens privatizáveis18; (ii) o valor de presente dos haveres financeiros cujos fluxos
podem ser direcionados para pagamento do serviço da dívida19; e (iii) o valor
presente do fluxo futuro dos superávits primários.
Para os passivos, deveríamos considerar: (i) o valor de mercado das
dívidas interna e externa (ambas, mobiliária e contratual); (ii) o valor estimado dos
passivos contingentes líquidos e certos (explícitos), embora ainda não
contabilizados; e (iii) as garantias20, ponderadas pelos seus riscos (neles incluídos
as possíveis contra-garantias existentes).
A atual metodologia da DLSP não considera o valor dos bens
privatizáveis, o valor presente do fluxo futuro dos superávits primários e o valor
estimado dos passivos contingentes. Dessa forma, a situação fiscal brasileira atual é
apenas parcialmente conhecida, o que compromete a análise realista da capacidade
fiscal do Estado.
18 Poderia ser considerado o valor da empresa em bolsa de valores ou, na sua ausência, o valor apurado com base nos retornos esperados, a partir de análise econômico-financeira. 19 Descontado por taxa de juros que reflita as características do ativo, inclusive o risco do credor. 20 É importante ressaltar que, tecnicamente, garantias devem ser consideradas como passivos contingentes ao não pagamento da dívida pelo devedor original, o que faz com que o item iii esteja contido em ii.
36
Especificamente em relação aos passivos contingentes, analistas21
tendem a acrescentar valores arbitrários ao estoque da DLSP, valores estes que são
geralmente superestimados, tendo em vista o desconhecimento quanto à
probabilidade de seu reconhecimento e contabilização, às características financeiras
básicas dos passivos a serem assumidos e ao montante correspondente a cada
item. Como os investidores em títulos públicos utilizam os relatórios desses analistas
para tomar suas decisões sobre continuar financiando o governo, as informações
diversas e conflitantes causam volatilidade desnecessária às estimativas quanto ao
verdadeiro montante da dívida.
Adicionalmente, a DLSP emprega metodologia padrão de contabilidade
no registro dos valores de seus ativos e passivos. O registro das transações
financeiras que a compõem é orientado no sentido de retratar o valor nominal das
operações ocorridas em um determinado período, considerando o arcabouço
normativo, não sendo os valores ajustados, no momento seguinte, pelos seus
valores de mercado ou uma aproximação desses, conforme procedimentos
contábeis de aceitação universal (IMF, 2000).
Nesse sentido, a técnica não tem compromisso estrito com a análise
qualitativa das informações, tornando os dados não completamente preparados para
análise econômica. Para exemplificar, ativos recebidos pelo Tesouro Nacional no
âmbito da renegociação das dívidas dos Estados, que possuem fator de
remuneração abaixo daquele que seria exigido pelo mercado para adquiri-los, são
21 Ver, por exemplo, Fitch (2001a).
37
registrados pelo valor de aquisição, quando deveriam sê-lo pelo valor de mercado ou
uma proxy desse. Do mesmo modo, títulos emitidos no âmbito de processo de
renegociação da dívida, os quais, como regra, possuem custo de financiamento
menor que o exigido pelo mercado para adquirir passivos públicos com
características semelhantes, são registrados pelo valor renegociado.
3.4 Dívida Líquida do Setor Público Ajustada: Hipóteses de Trabalho
Considerando a linha de raciocínio anteriormente descrita, teríamos dois
tipos genéricos de crítica dos dados. Em primeiro lugar, caberia análise
pormenorizada dos ativos e passivos que realmente devam ser considerados, de
modo a se chegar a grandezas com sentido econômico. Em segundo lugar,
deveríamos proceder à avaliação financeira dos ativos e passivos que foram
considerados, para estimar os seus valores efetivos, ou de mercado, pelos quais
deveriam ser considerados para cálculo da DLSP.
Quanto à análise dos ativos e passivos que deveriam ser considerados, a
questão conceitual pauta-se pelo enquadramento institucional em que os itens das
contas estão inseridos. São dois os cenários institucionais possíveis, desde que
consideremos afastadas as hipóteses extremas, segundo as quais seriam revogadas
cláusulas pétreas dos direitos fundamentais à propriedade e princípios do próprio
estado de direito.
O primeiro cenário é o que admite a manutenção da atual estrutura
38
institucional e jurídica do País, perpetuando-se os arranjos legais e operacionais
hoje prevalecentes na política econômica, ou seja, um cenário sem reformas. O
segundo cenário é caracterizado por circunstâncias em que as atuais restrições
legais, organizacionais e políticas pudessem ser revogadas, na forma de uma
solução em favor da supressão das limitações, ou seja, um cenário sem restrições
institucionais.
A análise que se seguirá nesta monografia considerará um cenário
institucional sem reformas, o que conduz à desqualificação de alguns ativos, por
serem institucional ou legalmente vinculados a despesas específicas, ou seja,
irreversíveis para o pagamento da dívida. Do mesmo modo, haverá necessidade de
desqualificar alguns passivos, tendo em vista não serem exigíveis por princípio ou
por considerações quanto aos credores.
3.5 Reavaliação dos Ativos
Dentre os ativos que atualmente compõe a DLSP e que, tendo em vista
os argumentos anteriormente apresentados, deveriam ser desconsiderados,
destacam-se os recursos líquidos Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT e as
reservas internacionais.
O FAT é constituído por contribuições fiscais e possui destinação,
especificada em lei, para o pagamento de abono salarial e seguro desemprego, não
sendo possível a sua reversão para pagamento da dívida pública, dentro do
39
arcabouço legal atual. A esse respeito, cremos que os argumentos de que parte dos
recursos do FAT são aplicados em títulos públicos, enquanto não direcionados a
outras destinações definidas em lei, ou que o Tesouro Nacional será chamado a
aportar recursos no fundo, caso este não possa arcar com o pagamento das
despesas para as quais foi criado, não devam ser considerados como suficientes
para considerá-lo na DLSP.
Quanto ao primeiro argumento, o fato de recursos de um fundo serem
aplicados em títulos públicos não significa que ele esteja contribuindo para reduzir o
impacto da dívida pública sobre o crédito disponível, pois o principal e os
rendimentos da aplicação permanecem com o fundo, sendo posteriormente
aplicados nos fins a que se destina. Nesse sentido, a carteira desse fundo deve ter
tratamento semelhante àquele dispensado à carteira de qualquer empresa ou fundo
privado22.
Quanto ao segundo argumento, embora o arcabouço legal atual não
preveja tal hipótese, acreditamos ser correto considerar a probabilidade de o
Tesouro Nacional ser chamado a aportar recursos no FAT, caso este demonstre
incapacidade de arcar com suas funções. Nesse sentido, não são os ativos do fundo
que devem ser considerados na DLSP, mas o potencial de aporte a ser exigido da
União. Ou seja, além de ser retirado do ativo, deveria aparecer uma rubrica no
passivo com o nome de, por exemplo, “FAT potencial”, onde seria registrado o valor
22 Não obstante, é importante ressaltar que a existência de um fundo com patrimônio relativamente estável, que aplique regularmente em títulos públicos e não se desfaça dos títulos em sua carteira sempre que surgir volatilidade no mercado financeiro é relevante para auxiliar na redução do risco de refinanciamento da dívida pública.
40
provável de cobertura pelo Tesouro. É importante ressaltar que tal valor é
provavelmente nulo, considerando as recentes estatísticas do referido fundo.
O segundo ativo relevante a ser desconsiderado são as reservas
internacionais. Os recursos nela registrados são o reflexo dos resultados
acumulados do balanço de pagamentos ao longo dos anos, acrescidos dos
rendimentos sobre sua aplicação em títulos públicos de curto prazo ditos triple A
(designação que significa investimento com risco mínimo), dentre outros
investimentos líquidos e seguros.
Atualmente, pode-se argumentar que a mudança de uma política de
câmbio fixo para flutuante tenha reduzido a relevância do nível de reservas como
instrumento de política monetária, sendo os desequilíbrios ex ante no balanço de
pagamentos eliminados por meio de ajustes na taxa de câmbio e não de controle da
taxa de juros ou compras e vendas de dólar pelo Banco Central para manter a
cotação dentro de estreitas bandas de flutuação.
Tal argumento, entretanto, não altera o fato de que as reservas não
podem ser negociadas com o objetivo exclusivo de pagamento da dívida pública.
Não pode o governo, hoje, simplesmente utilizar recursos em moeda estrangeira
registrados no Banco Central para pagamento da dívida externa sem que o Tesouro
Nacional, antecipadamente, os tenha adquirido com recursos oriundos de receita
fiscal ou de endividamento interno23.
23 Não obstante, a existência de um nível confortável de reservas internacionais reduz o risco de default da dívida externa do país (pública e privada) por motivo de liquidez, criando condições macroeconômicas mais estáveis para uma eficiente administração da dívida pública.
41
Adicionalmente, existe um piso para as reservas internacionais
estabelecido pela Resolução do Senado Federal n° 82, de 1990, piso este
equivalente a quatro meses de importações, computadas pela média dos doze
meses anteriores. Assim, acreditamos que deveriam ser as reservas internacionais
retiradas da contabilidade da DLSP, por estarem institucional ou legalmente
vinculadas a finalidades específicas, não podendo ser revertidas, sem contrapartida
financeira, para o pagamento da dívida.
3.6 Reavaliação dos Passivos
Dentre os passivos que atualmente compõe a DLSP e que deveriam ser
desconsiderados, destacam-se a dívida originária do empréstimo compulsório sobre
combustíveis e aquisição de automóveis (Decreto-lei n° 2.288, de 1986) e a base
monetária ou, mais precisamente, o papel moeda em circulação.
Quanto à dívida originária do empréstimo compulsório, sua devolução foi
prometida para ser realizada a partir de 1989, fato que não ocorreu. Considerando
que se passaram mais de 15 anos desde os fatos geradores do empréstimo, é
quase nula a probabilidade de que os “credores” do Estado ainda possuam
comprovante de abastecimento de combustível ou aquisição de veículo24,
documentos essenciais para que fosse exigido judicialmente o ressarcimento.
24 O único projeto de lei sobre o tema (PL nº 4.382), que tramita no Congresso Nacional desde 1994, exige cópia do certificado de Registro e de Licenciamento do Veículo para que o credor possa reaver sua parcela do empréstimo compulsório.
42
Nesse sentido, excluindo a hipótese de aprovação de projeto de lei que
proponha a devolução dos recursos, e considerando que aqueles que tinham algum
interesse em reaver os seus direitos já o conseguiram por via judicial, acreditamos
que o valor atualmente registrado na DLSP poderia ser retirado por não ser mais, de
fato, exigível, embora o seja por direito.
Quanto à base monetária, a sua suposta característica de não
exigibilidade é motivo de grande debate na literatura (Meyer, 1997). Existem poucos
países que mantém a conversibilidade irrestrita de suas moedas por ativos que
tenham por principal característica a manutenção histórica de reserva de valor
(moedas fortes e ouro, principalmente). Estes seriam casos típicos onde a moeda
local pode ser considerada exigível, pois a população, ao não mais confiar nela
como reserva de valor, iniciaria processo de devolução para o governo, recebendo
em troca outro ativo que garantiria tal característica.
Mesmo em países que não oferecem tal conversão, como é o caso do
Brasil, poder-se-ia alegar que o fato de suas moedas possuírem poder liberatório
para pagamento de tributos, pelo valor de face, daria a seus governos o argumento
para registrarem tais passivos em suas dívidas líquidas (Freitas, 1999). Ocorre que,
assim como o poder liberatório, a moeda possui por característica o curso forçado,
sendo obrigatória a sua aceitação como meio de pagamento por qualquer despesa.
Nesse sentido, o governo não pode se negar a aceitar sua moeda nos pagamentos
de tributos e a sociedade não pode se negar a aceitá-la de volta pelo
43
pagamento de despesas governamentais.
Claro que, no extremo, em um processo de hiperinflação, os recursos dos
depósitos à vista tendem a ser direcionados para outras formas de aplicação com o
objetivo de manter, ao menos parcialmente, o valor da moeda. À medida que os
depósitos à vista vão reduzindo, o compulsório depositado no Banco Central sobre
estes recursos começa a ser devolvido. Assim, pode-se alegar, com propriedade,
que parte da base monetária pode ser reduzida pela devolução dos compulsórios
sobre depósitos a vista. Ainda no âmbito desse processo, o sistema bancário,
refletindo a menor demanda por moeda pela população, começaria a devolvê-la ao
Banco Central, por meio de operações compromissadas ou definitivas de compra de
títulos públicos.
A base monetária é composta pelos depósitos dos bancos (voluntários e
compulsórios) no Banco Central e pelo meio circulante. Embora o primeiro item
possa refletir fortemente um processo de rejeição da moeda de um país, o segundo
tende a se manter constante, tendo em vista a necessidade de certo volume de
recursos no sistema, sem o qual o custo de transação, que é inversamente
correlacionado ao volume de recursos monetários em espécie em poder do público,
se elevaria demasiadamente.
Por fim, devemos lembrar que o processo de rejeição de uma moeda não
ocorre no curtíssimo prazo, sendo diretamente relacionado ao aumento da
velocidade da perda de sua função de reserva de valor. Assim, a dita
44
“devolução” é muito mais a rejeição crescente das novas emissões monetárias que
propriamente dos valores em poder da sociedade. Considerando os argumentos
acima expostos, acreditamos que a base monetária (ou, se quisermos ser mais
conservadores, o meio circulante) não deveria ser considerada como item da DLSP.
Pelos mesmos princípios que utilizamos para argumentar quanto à
retirada de ativos e passivos, deveríamos incluir entre os passivos aqueles que são
legal ou contratualmente líquidos e certos, e que não foram ainda contabilizados por
questões relacionadas aos procedimentos de assunção e renegociação de dívidas.
A literatura geralmente utiliza o termo passivos contingentes25 para classificá-los,
embora a definição não seja consensual.
É importante esclarecer que, dentre esses, existe um grupo de passivos
dos quais já sabemos o fator de remuneração, o montante aproximado e, em muitos
casos, como o FCVS, a data de assunção, que neste caso retroage, com todos os
seus efeitos, a 1997. O fato de não haver plena certeza quanto aos seus valores,
motivo pelo qual são inclusive chamados de contingentes, não deveria ser
argumento para sua exclusão, mas apenas para considerá-los com ressalvas.
Por outro lado, existem alguns passivos contingentes implícitos, como
ações judiciais em primeira ou segunda instâncias e riscos associados a setores
específicos da economia, como o financeiro, que não são nem líquidos, nem certos e
cuja tentativa de prever suas características nos levaria a assumir tantas hipóteses
25 O termo vem do fato de serem esses passivos contingentes a eventos futuros incertos. Os passivos contingentes podem ser classificados em explícitos (cuja responsabilização é reconhecida por lei ou contrato,
45
que seu resultado se resumiria a frágil exercício de futurologia. Estes, sim, não têm
sentido serem considerados para o cálculo da DLSP ajustada enquanto não
puderem ser calculados com um mínimo de precisão. Não obstante, por motivo de
transparência, tais passivos deveriam compor nota explicativa em anexo, onde
estariam explicitados os possíveis impactos sobre a DLSP de sua ocorrência,
considerando cenários mais prováveis.
3.7 Ajuste dos Ativos e Passivos para Valores de Mercado
Considerando a segunda ressalva quanto à metodologia atual da DLSP, o
princípio fundamental para a valoração de ativos deveria ser o que considera como
valor efetivo aquele que poderia ser obtido em uma hipotética alienação para o setor
privado, com a utilização do produto da venda na quitação da dívida pública. Do
mesmo modo, o princípio para avaliação dos passivos tomaria por base o valor que
seria exigido pelo setor privado, caso o governo decidisse antecipar o pagamento
daquela dívida. Assim, deveríamos considerar a melhor forma de apurar o valor dos
itens, para que reflitam suas taxas internas de retorno, no caso dos ativos, e seus
custos de financiamento, no caso dos passivos26.
A maioria dos ativos públicos possui valor de mercado abaixo do valor
registrado pela contabilidade, seja por terem sido aceitos com taxas abaixo das
negociadas em mercado para ativos semelhantes, no âmbito de processos de
como as garantias) e implícitos (não reconhecidos, porém considerados uma “obrigação moral” do governo). Os passivos contingentes dos quais nos referimos pertencem ao primeiro grupo. 26 O preço de mercado de cada ativo e passivo, embora seja a melhor aproximação de seu real valor, reflete, na verdade, o seu valor marginal, pois a medida que iniciamos a venda do bem em mercado, seu preço se altera, tanto mais quanto menor a sua liquidez e maior o volume total a venda.
46
subsídio implícito e explícito a outros entes públicos (contrato de refinanciamento de
dívidas dos estados e municípios) e privados (créditos junto ao setor agrícola), seja
pelo desconto associado ao risco de crédito dos referidos entes.
Somente para exemplificar, o valor contábil referente aos créditos do
Tesouro Nacional contra os estados27 por ocasião do último e mais relevante
programa de refinanciamento de suas dívidas (Lei n° 9.496, de 1997) é de
aproximadamente R$ 153 bilhões. Entretanto, se fizermos um cálculo do valor
presente, descontando as prestações mensais remuneradas a 6% a.a., pelos
próximos trinta anos, pela taxa de juros atualmente paga por títulos do Tesouro
Nacional com características semelhantes (10,5% a.a.), chegaremos a um valor de
mercado próximo a 60% do valor contábil. Isto sem considerarmos o risco de crédito
de cada estado, que deve ser mínimo, se considerarmos que não há dúvidas quanto
à qualidade e certeza das garantias (Rech, 2002), não obstante haver estudos
teóricos que questionam o retorno desses ativos (Bevilaqua e Werneck, 1998).
O mesmo critério deveria ser utilizado para ajustar o valor dos passivos.
Diversas dívidas (bônus emitidos no âmbito do Plano Brady, dívida reestruturada
referente ao reconhecimento e renegociação dos passivos de empresas públicas
que foram privatizadas ou extintas, dentre outras) foram emitidas a taxas menores
que aquelas atualmente pagas por títulos do Tesouro Nacional ofertados em leilão
com características semelhantes.
27 Estes créditos não serão analisados no âmbito da nova estatística proposta, por serem créditos entre entes governamentais. Nesse sentido, qualquer proposta de alteração em sua forma de contabilização, afetaria o ativo do governo central no mesmo montante que o passivo dos estados, gerando efeito nulo para fins de DLSP. .
47
É verdade que, como bem argumentou Freitas (1999), caso haja um
aumento nas taxas de juros de mercado em função de uma piora na percepção dos
investidores quanto ao risco dos títulos do governo, o valor da dívida pública será
reduzido por causa do aumento em seu fator de desconto, passando a impressão
que houve uma melhora na capacidade de solvência do governo, quando na
verdade ocorreu justamente o inverso. Entretanto, após a redução do valor dos
passivos, seu novo “custo de financiamento” será refletido na estatística da NFSP,
base para projeções da evolução da DLSP, quando da apropriação deste novo
custo, entre dois períodos quaisquer, pelo critério de competência. Tal custo maior
irá exigir aumento do resultado primário requerido para manter a restrição
orçamentária intertemporal do governo, seja pelo aumento do custo de
financiamento da dívida, seja pela maior taxa de desconto dos fluxos futuros de
superávit primário.
A redução do valor presente dos superávits futuros reflete justamente o
desequilíbrio patrimonial do governo, compensando os ganhos com a redução inicial
da dívida e explicitando a necessidade de aumentar o valor do resultado primário
para retornar a percepção anterior dos agentes quanto à capacidade de solvência do
setor público. Na verdade, o ajuste dos ativos e passivos a valor de mercado estaria
nada mais que explicitando os ganhos da renegociação das dívidas a taxas mais
baixas, no caso dos passivos, e os subsídios implícitos na aceitação de ativos a
taxas de juros inferiores àquelas que refletiriam a equivalência econômica da
operação. Assim, estaríamos trazendo a valor presente os impactos de tais
48
operações sobre a NFSP e, principalmente, ampliando a transparência em relação
ao custo real das operações fiscais e quase-fiscais do governo.
Tal procedimento, ao mesmo tempo em que reduz o valor dos ativos e
passivos, altera o custo de financiamento da DLSP, pois, a partir de então, todos os
itens que compõe a DLSP ajustada passariam a ser corrigidos, pelo critério de
competência, a taxas de mercado. Ao final, se as taxas de juros utilizadas para
ajuste dos ativos e passivos refletirem corretamente seus riscos, os agentes não
deveriam alterar sua percepção sobre a capacidade de solvência do estado por
causa dessa alteração metodológica, pois a redução (aumento) da DLSP será
compensada pelo aumento (redução) do seu custo de financiamento.
Este novo indicador de sustentabilidade da política fiscal iria requerer
revisões periódicas mais constantes que o anterior, tendo em vista diversos fatores,
dentre eles: (i) inclusão e exclusão de ativos e passivos em função de alterações nas
legislações a eles referentes; e (ii) variações no valor corrente dos ativos e passivos,
em função de mudanças tanto da taxa básica de juros, que afeta a todos,
indistintamente, quanto da taxa de desconto de um item em particular, por mudanças
na percepção quanto ao seu risco de crédito.
Embora o fato de requerer revisões periódicas mais constantes aumente a
probabilidade de que o Governo sinta-se tentado a “ajustá-lo” sem qualquer respaldo
teórico, de modo a reduzir o valor da dívida líquida, isto não torna o indicador mais
frágil. As revisões são fundamentais para que todos os ativos e passivos
49
relevantes estejam considerados e seus registros espelhem seus valores
econômicos. Além disso, tais revisões deveriam estar sempre justificadas
pormenorizadamente em notas explicativas, sob pena de o governo perder
credibilidade junto aos investidores por causa de sua “contabilidade criativa”. Só
assim, o valor da DLSP ajustada será crível e sua estatística atenderá ao objetivo de
sua criação.
3.8 Impacto do Novo Indicador sobre a Percepção de Solvência
Qual o impacto dessas alterações propostas sobre o resultado primário
requerido para estabilizar a dívida pública ? Para responder a essa pergunta iremos
primeiramente avaliar os impactos de cada um dos ajustes sobre o seu valor
contabilizado atualmente na DLSP, conforme divulgado pelo Banco Central. Na
tabela a seguir podemos observar o efeito de cada item em termos nominais e em
relação ao PIB:
Tabela 2: Impacto do novo indicador na DLSP (em % do PIB)
posição em junho de 2003
Fontes: Banco Central (Notas para a Imprensa - Política Fiscal e Setor Externo) e Secretaria do Tesouro Nacional (Resultado do Tesouro Nacional e Nota para a Imprensa - DPMFi)
Itens a serem ajustados DLSP Alteração Proposta DLSP Diferença(A) Ajustada (B) (A) - (B)
Ativos 14,12% 0,00% 14,12%
Recursos do FAT 5,30% Não considerar 0,00% 5,30%Reservas Internacionais 8,82% Não considerar 0,00% 8,82%
Passivos 16,40% 9,55% 6,85%
Base Monetária 4,10% Não considerar 0,00% 4,10%Empréstimos compulsórios 1 0,99% Não considerar 0,00% 0,99%Dívida Interna 2 3,02% Preço de mercado 1,92% 1,10%Dívida Externa 3 8,29% Preço de mercado 6,29% 2,01%Passivos Contingentes 4 0,00% Considerar a mercado 1,35% -1,35%
Diferença (Ativos - Passivos) -2,28% -9,55% 7,27%
50
1 Empréstimo compulsório sobre combustíveis e aquisição de automóveis (Decreto-Lei nº 2.288/86) 2 Apenas os títulos da dívida interna federal que foram emitidos a taxas inferiores às de mercado 3 Apenas os títulos e contratos da dívida externa que foram negociados a taxas inferiores às de mercado 4 Dívida em processo de reconhecimento, conforme apresentada no anexo de riscos fiscais à LDO 2004, a valores de mercado
Note que o índice ajustado reduz tanto o valor dos ativos quanto o dos
passivos, mesmo que esses últimos tenham considerado a incorporação dos
passivos contingentes. A diferença entre as duas reduções, 7,27% representa o
aumento líquido esperado para o novo indicador. Considerando o impacto agregado
da alteração no indicador DLSP, adotaremos parâmetros para definição do
comportamento da trajetória da dívida pública, considerando um cenário
determinístico básico. São analisadas as relações existentes na restrição de
solvência, função da taxa de juros real incidente sobre o estoque da dívida pública,
da taxa de crescimento real da economia e do estoque da dívida.
Primeiramente, avaliaremos qual o resultado primário necessário para
estabilizar em dezembro de 2003 as relações DLSP/PIB e DLSP ajustada/PIB
observadas ao final de 2002. Posteriormente, mantendo constante o superávit
primário previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2004, avaliaremos a
trajetória da DLSP/PIB e da DLSP ajustada/PIB ao longo dos próximos dez anos,
com o objetivo de analisar se, mantidas as condições econômicas previstas para o
período, a dívida assume uma trajetória considerada sustentável.
É importante ressaltar que a equação que permite calcular a evolução da
dívida, conforme apresentada no segundo capítulo, assume forma distinta caso
considere ou não a base monetária como parte da dívida pública. Caso, como
51
ocorre com a DLSP, a base monetária seja considerada como passivo do governo,
sua variação não é vista como meio de financiamento da dívida pública (equação 5),
mas simplesmente uma mudança na composição desta. Entretanto, se a base
monetária não é considerada como dívida pública, como é o caso da DLSP ajustada,
alterações dessa base ao longo do tempo (senhoriagem) afetam diretamente a
necessidade de financiamento dos títulos públicos (equação 6).
( )( ) tt
t
ttt db
yyr
b −+−
=∆1
(5)
( )( ) ttt
t
ttt sdb
yyr
b −−+−
=∆1
(6)
Considerando taxa real de juros esperada para este ano de 13% a.a.,
crescimento econômico de 1,0% e passivos contingentes contabilizados de 0,8% do
PIB, o superávit primário necessário para que seja observada, ao final de 2003, a
mesma relação DLSP/PIB observada em dezembro de 2002 (56,5%), seria de
5,25%. Considerando estes mesmos parâmetros e senhoriagem de 0,48%, o
resultado primário necessário para estabilizar em 64,8% (posição em dezembro de
2002) a relação DLSP ajustada/PIB seria de 4,30%, menor que o anterior
principalmente em função do impacto negativo advindo da assunção de passivos
contingentes sobre o primeiro indicador e do efeito positivo da receita de
senhoriagem sobre o segundo indicador.
Entretanto, o superávit primário necessário não pode ser visto como
aquele que estabiliza a relação DLSP/PIB no curto prazo, mas que garante
52
estabilidade desta no longo prazo. Nesse sentido, e considerando que os números
de alguns parâmetros para 2003, especificamente juros reais e crescimento
econômico, tendem a não representar suas tendências de longo prazo, o ideal é que
estimemos as variáveis sob análise por um período de, digamos, dez anos, o que
permitiria responder mais corretamente sobre o comportamento da razão dívida/PIB
ao longo do tempo. Considerando para o decêndio o superávit primário previsto para
os próximos três anos, segundo a LDO 2004, a evolução dos parâmetros e das
relações DLSP/PIB e DLSP ajustada/PIB são apresentadas no quadro a seguir:
Tabela 3: Cenário Macroeconômico Básico28 e seu
Impacto na evolução da DLSP (2003-2012)
Parâmetro e Resultados 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Esperados Taxa real de juros (r) 13,00% 10,00% 9,00% 8,00% 7,00% 7,00% 7,00% 7,00% 7,00% 7,00%Crescimento real PIB (y) 1,50% 3,50% 3,50% 3,50% 3,50% 3,50% 3,50% 3,50% 3,50% 3,50%Resultado primário/PIB (d) 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25%Taxa de inflação 10,00% 7,00% 5,00% 4,00% 4,00% 4,00% 4,00% 4,00% 4,00% 4,00%Senhoriagem/PIB (s) 1 0,27% 0,45% 0,36% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32%Passivos Contingentes/PIB 2 0,80% 0,80% 0,80% 0,80% 0,80% 0,80% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% DLSP/PIB 3 57,21% 57,36% 56,95% 55,98% 54,42% 52,81% 50,35% 47,80% 45,17% 42,45%DLSP ajustada/PIB 3 64,08% 63,46% 62,28% 60,46% 57,97% 55,39% 52,73% 49,97% 47,13% 44,19%Fonte: Banco Central (Relatório Focus) para 2003 e 2004 e estimativa do autor a partir de 2005. 1 A hipótese de crescimento nominal da base monetária considera o crescimento nominal do PIB 2 Passivos contingentes contabilizados na DLSP a cada ano 3 Referente à posição de dezembro de cada ano
É importante observar que, apesar de no primeiro ano, fundamentalmente
em função da elevada taxa de juros e do reduzido crescimento econômico29, tanto a
DLSP quanto a DLSP ajustada aumentarem em relação a dezembro do ano anterior
28 Para estimar as variáveis macroeconômicas relevantes, o autor considerou, além do cenário médio das instituições financeiras para 2003 e 2004 (conforme relatório Focus, do Banco Central), cenários específicos de médio e longo prazo de alguns autores (ver, em particular, Giambiagi, 2003, e Goldfajn, 2002). 29 Principalmente se comparado ao esperado para esses parâmetros no médio e longo prazos.
53
(respectivamente, 56,5% e 63,8%), a partir de 2004, ambas assumem trajetória
declinante, atingindo valores próximos a 40% do PIB ao final do décimo ano. Outro
ponto relevante refere-se ao fato de que, apesar de em um primeiro momento a
DLSP ajustada/PIB apresentar-se 7% acima da DLSP, ao longo do decêndio, a
contabilização de 4,8% do PIB em passivos contingentes, no caso da DLSP, e a
redução da necessidade de financiamento da DLSP ajustada, por causa da receita
de senhoriagem, fazem com que esses dois indicadores se aproximem, reduzindo
consideravelmente a distância inicial que os separa para 2%.
Devemos considerar, entretanto, que as características da dívida pública
federal brasileira (com elevado percentual vencendo nos próximos dois anos e
concentrada em títulos sensíveis à variação cambial) fazem com que ela seja muito
sensível à volatilidade das variáveis econômico-financeiras. Caso, por fatores
domésticos ou internacionais, convivamos com um período relativamente longo de
instabilidade, tais características podem conduzir a dívida de uma situação até então
sustentável para outra que ponha em dúvida a capacidade do governo em retomar o
controle da situação.
Esta situação ocorreu recentemente com o Brasil, que manteve o real
valorizado em relação ao dólar por um período longo, ao mesmo tempo em que
acumulava elevadas dívidas interna (referenciada) e externa (denominada) em
moeda estrangeira. A seqüência de eventos de desvalorização cambial em 1999,
2001 e 2002 foi responsável por grande parte do aumento de 15% na DLSP
observada entre janeiro de 1999 e dezembro de 2002.
54
Em termos econômicos, o mercado internacional de capitais faz com que
a relação direta entre risco de insolvência por causa dos déficits fiscais e por causa
dos déficits em transações correntes gere reflexos muito mais rápidos e
comprometedores, criando um circulo vicioso muitas vezes impossível de ser
controlado a tempo por mudanças nas políticas monetária e fiscal. Nesse sentido,
um aumento da percepção de insolvência fiscal reduz rapidamente a demanda por
títulos de risco soberano e por todos os seus substitutos no mercado financeiro
internacional emitidos pelo setor privado do país.
Tal movimento conduz à depreciação da taxa cambial. Com a inflação sob
controle por meio de uma política de metas, a depreciação do câmbio nominal
conduz fundamentalmente à depreciação do câmbio real e, se a proporção de títulos
indexados ao câmbio for muito elevada na dívida pública, esta cresce em relação ao
PIB. Na medida em que os prêmios de risco sobre a dívida pública se elevarem com
o crescimento da relação dívida/PIB, ocorre uma nova rodada de desvalorização
cambial, que conduz a uma nova elevação da relação dívida/PIB.
Para um país ainda fortemente dependente dos fluxos internacionais de
capitais30 e necessitando sinalizar seu comprometimento com a estabilidade fiscal,
os movimentos comentados no parágrafo anterior devem ser considerados com
atenção, para que o país não seja obrigado a alterar as políticas monetária e fiscal
30 Ainda que possamos argumentar que as desvalorizações recentes do real frente às demais moedas fizeram com que a estrutura do balanço de pagamentos pendesse em direção a uma menor necessidade de recursos externos, reduzindo a probabilidade de novas desvalorizações e, conseqüentemente, de impactos indesejados na DLSP.
55
para reafirmar seus compromissos. Se isto ocorrer e o país falhar em aumentar
suficientemente o superávit primário, a percepção de que a dívida pública não é
sustentável irá resultar em maiores taxas de juros, o que pode fazer com que o
governo entre em um círculo vicioso, originado, não pela ausência de superávits
primários ex ante, mas pela necessidade de aumento ex post destes para equilibrar
a equação de solvência intertemporal.
O quarto e último capítulo trata justamente desse tema: a possibilidade de
uso da política fiscal como função de sinalização de política governamental.
Considerando que existe um nível de endividamento a partir do qual os investidores
não se sentem confortáveis em financiar um governo, analisaremos a importância da
função de sinalização para que o governo brasileiro mantenha o interesse dos
investidores em refinanciar a dívida pública, evitando que uma seqüência de eventos
econômicos negativos conduza à percepção de insolvência por parte desses
investidores.
56
Cap. 4. Regime Fiscal como Instrumento de Sinalização
O fenômeno mundial da elevação das dívidas soberanas ao longo das
décadas de 80 e 90 conduziu ao surgimento de teorias que buscam explicar os
determinantes dos elevados endividamentos públicos e porque estabilizações fiscais
são freqüentemente postergadas, gerando desvios da política fiscal
economicamente ótima, segundo a ótica de tax smoothing (Barro, 1979).
As primeiras teorias concentraram-se no uso político da dívida pública,
com resultados instigantes sobre como um partido político poderia utilizar a dívida
pública como instrumento para permanecer no poder ou dificultar e até impossibilitar
a realização de políticas fiscais pelo partido de oposição, caso esse vencesse as
eleições. Outras teorias, que a partir desse ponto analisaremos, referem-se ao uso
da dívida pública como instrumento de sinalização, em um mundo de informação
assimétrica quanto às características do devedor. Na seqüência, realizaremos
estudo para o caso brasileiro recente.
4.1 Equilíbrio Agregador e Equilíbrio Separador
Qual o nível ou a trajetória de endividamento público que sinaliza aos
investidores que o país está caminhando para um situação de insustentabilidade
fiscal ? Este não é um tema que possui características de ciência exata, como
gostaríamos. Adicionalmente à tradicional análise da evolução das variáveis
econômicas constantes da equação de sustentabilidade fiscal intertemporal,
57
conforme apresentado no segundo capítulo, a resposta envolve peculiaridades
intrínsecas a cada devedor, tais como histórico de respeito a contratos, arcabouço
legal e estrutura das instituições diretamente relacionados à questão da estabilidade
fiscal 31 e riscos financeiros referentes às características particulares de cada dívida.
O interessante elemento da discussão sobre limite de endividamento é
que estudos32 têm avançado no sentido de demonstrar o tratamento gerado a partir
da existência de informação assimétrica no jogo entre governo e o setor privado, o
que leva à percepção da ocorrência de múltiplos equilíbrios e de que algumas
decisões de administração de dívida podem conduzir a maus equilíbrios que
implicam em repúdio, reestruturação ou monetização.
Estudo de Drudi e Prati (2000) pressupõe tratamento assimétrico pelos
credores a um devedor. Argumentam os autores que, abaixo de um determinado
nível de endividamento, todos os devedores são tratados indistintamente, pagando
taxas de juros reais equivalentes para refinanciar suas dívidas. Espera-se, nessa
situação, que os devedores ajam eficientemente ao não realizar qualquer esforço
para se diferenciarem, pois os ganhos são irrelevantes. Caso um governo ultrapasse
o referido nível, os credores iniciam processo de cobrança de taxas diferenciadas
para refinanciamento de sua dívida, levando este governo, caso esteja
comprometido com o seu pagamento, a gerar um esforço fiscal suficiente para
sinalizar diferença em relação aos demais que estejam em situação semelhante e
não possuam o mesmo comprometimento.
31 Leis de responsabilidade fiscal e monetária, restrições à existência de déficits por parte das entidades subnacionais e proibição de um ente ser financiado por outros, por exemplo. 32 Ver, por exemplo, Giavazzi e Pagano (1990).
58
Ou seja, governos comprometidos – mas não totalmente críveis – teriam,
segundo o modelo, incentivo para executar política fiscal mais restritiva quando os
efeitos da sinalização sobre a percepção de risco de crédito são maiores, isto é,
quando um estoque de dívida suficientemente grande foi acumulado. Neste
momento, tais governos podem desviar de uma política ótima de tax smoothing para
não serem tratados como governos não comprometidos.
A parte teórica do estudo consiste de modelo de sinalização de política
fiscal, enquanto a parte empírica foca na experiência de alguns países europeus
entre final da década de 70 e a década de 90. Tal período foi relativamente frutífero
para essa análise, pois acompanha processo de crescimento exponencial do
endividamento desses países ao longo da década de 80 e a geração de superávits
dele advinda33.
Analisando o modelo propriamente dito, os autores propõem função onde
classificações de risco de crédito, superávits primários e estoques de dívida são
conjuntamente determinados. Dois tipos de equilíbrio podem prevalecer: equilíbrio
separador (separating equilibria) ou equilíbrio agregador (pooling equilibria). Na
ausência de incerteza, o tipo não comprometido seria incapaz de emitir qualquer
dívida no momento zero porque os investidores iriam antecipar seu incentivo ao
repúdio da dívida no momento seguinte. Por contraste, no jogo de informação
incompleta (considerado no modelo), a incerteza sobre o governo no poder permite
33 Um fator adicional que incentivou a geração de esforço fiscal por parte dos países pesquisados foi a necessidade de sua adequação às regras do Tratado de Maastricht (limites de 60% do PIB para a dívida e 3% para o déficit nominal).
59
ao tipo não comprometido emitir dívida até que sua preferência seja revelada. Esse
governo irá revelar seu tipo no período um (equilíbrio separador), se o custo de
imitar um governo comprometido é maior que o benefício de emitir dívida entre o
período um e dois, ou apenas no período dois (equilíbrio agregador) quando o
contrário for verdade.
O modelo permite demonstrar que esse trade-off é crucialmente afetado
pelo(a) : (i) benefício marginal do dispêndio público (quanto maior este, maior o
gasto que o tipo não comprometido gostaria de financiar no período um e maiores
são os benefícios de emitir dívida entre os períodos um e dois), (ii) custo marginal da
tributação (quanto maior este, menores são os impostos que o tipo não
comprometido desejará cobrar no período um e maior o custo de imitar o tipo
comprometido), (iii) estoque inicial de dívida (quanto maior este, maior são os
impostos que o tipo comprometido irá cobrar no período um e maior o custo de imitar
sua política) e (iv) reputação inicial do devedor (quanto maior esta, menor o prêmio
de risco e maiores são os incentivos para imitar as políticas do tipo comprometido).
Uma previsão testável do modelo seria que resultados primários e
estoque de dívida são insumos complementares para a função de risco de crédito.
Mais especificamente, indicadores de risco de crédito (rate) são negativamente
correlacionados com a razão divida/produto (DY) e positivamente correlacionados
com o resultado primário/produto (PY), gerando a seguinte função:
Rate = f (DY, PY)
60
com fDY < 0 e fPY > 0, onde fi indica a primeira derivada em relação ao i-ésimo
argumento. Nesse sentido, uma particular predição desse modelo é que PY e DY
são complementares na função de risco de crédito f (PY,DY), ou seja, fpy, dy > 0.
Existem vários modos nos quais a complementariedade prevista entre PY
e DY pode se manifestar nos dados. Uma interpretação literal do modelo sugeriria
uma sinalização instantânea, com fPY aumentando apenas temporariamente quando
o estoque da dívida atinge o ponto crítico que divide as áreas dos equilíbrios
agregador e separador. Na prática, entretanto, medidas fiscais muitas vezes não são
um evento único e definitivo (once-and-for-all), de modo que a sinalização pode
gerar efeito ao longo de vários períodos. No limite, sinalização pode nunca ser um
evento único e a complementariedade entre PY e DY seria observável muitos anos
após o início da estabilização fiscal.
Para permitir essas diferentes análises empíricas do modelo teórico, os
autores estimam duas especificações para a função de risco de crédito. A primeira é
associada com a idéia de que sinalização é gradual, mas ainda confinada a um
específico intervalo de tempo, com fPY retornando ao seu nível normal (antes da
sinalização) uma vez que a sinalização esteja completa, não importando se a
relação dívida/produto é ainda relativamente alta. A segunda especificação é
associada com a idéia que sinalização não é um negócio once-and-for-all e que fPY é
uma função positiva da relação dívida/produto. Testes relacionados à segunda
especificação foram realizados com sucesso utilizando dados referentes a
61
Itália, Irlanda, Bélgica e Dinamarca.
4.2 Aplicação do Modelo ao Caso Brasileiro Recente
Baseados no modelo descrito acima, verificaremos se ele pode auxiliar na
descrição da experiência brasileira de julho de 1994 a junho de 2003, caracterizando
este como um governo comprometido34. Ou seja, buscaremos a existência de efeito
sinalizador no caso brasileiro recente, avaliando se o crescimento da dívida pública
que se seguiu ao período de estabilização econômica foi, a partir de um certo
momento, acompanhado de aumento do superávit primário suficiente para sinalizar
que o governo estaria comprometido com o pagamento dessa dívida.
Nesse sentido, verificaremos econometricamente três implicações
testáveis do modelo de Drudi e Prati:
i. a razão dívida/produto e os resultados primários são complementares
na função de spread;
ii. a função de sinalização dos resultados primários faz com que esses
aumentem com a razão dívida/PIB; e
iii. se o governo é comprometido, então o resultado primário irá aumentar
quando a razão dívida/PIB aumentar.
Para o resultado primário/PIB e razão dívida/PIB, usamos os dados
34 Conforme terminologia apresentada por Drudi e Prati.
62
mensais calculados pelo do Banco Central. Poderia ser questionado se os
investidores alteram sua percepção de risco quando o governo divulga a intenção de
perseguir determinada meta fiscal ou quando os primeiros resultados dessa
mudança começam a se refletir nos números. Nesse sentido, quanto mais crível o
governo, maior valor seria dado para a divulgação da mudança, sendo que os
resultados apenas ajustariam as expectativas. Entretanto, seja pelo elevado grau de
discricionariedade da escolha do momento exato da divulgação, seja pela incerteza
quanto à credibilidade do governo, principalmente se considerarmos um período
longo, preferimos trabalhar com o momento da divulgação dos resultados fiscais. Ou
seja, para testar o modelo, consideramos que o resultado primário e a dívida líquida
referentes ao período t, ao serem divulgados ao final do período seguinte, afetarão o
indicador de risco em t+1.
Ainda em relação ao resultado primário, decidimos utilizar o valor
acumulado nos últimos doze meses, expresso em percentual do PIB. Embora o
impacto das decisões de política fiscal sobre os resultados seja capturado com maior
atraso, evitamos, dessa forma, o efeito distorcivo da sazonalidade existente nos
dados mensais do resultado primário. Um argumento adicional em favor de utilizar
os dados anuais seria que o investidor, para o caso de um governo não crível,
aguardaria mais tempo para alterar sua percepção de risco de crédito, não o
fazendo senão quando certo de que o novo compromisso fiscal é consistente, o que
só pode ser comprovado depois de alguns períodos.
Elegemos o mês de janeiro de 1999 como o ponto a partir do qual o
63
governo passou a utilizar o resultado primário como instrumento de sinalização de
política fiscal. Nessa data, por causa da elevada desvalorização cambial, a
DLSP/PIB passou de 41,7% para 50,5%, um aumento de quase 10% em um mês.
Também a partir de janeiro, surgiram os primeiros resultados primários positivos,
frutos de decisões de política fiscal tomadas ao longo do segundo semestre de
1998. Tais resultados, que há muito não eram vistos de forma consistente, passaram
a atingir sistematicamente níveis mais elevados. A partir da escolha do ponto de
inflexão, geramos duas dummys, de modo a qualificar corretamente a reação do
primário a diferentes níveis de risco de crédito e DLSP e capturar seu efeito
sinalizador.
Drudi e Prati usaram, como indicador de risco de crédito para os países
europeus analisados, o Institutional Investor Ratings - IIR. Tal indicador encontra-se
disponível apenas para um grupo restrito de países, dos quais o Brasil não faz parte.
Dentre os que poderiam substituí-lo na função, dois pareceram ser os que mais
eficientemente se aproximavam de um substituto eficiente: ratings atribuídos por
agências ou EMBI Brasil.
Nos últimos tempos muito se tem questionado acerca da eficiência das
agências classificadoras de risco. A principal crítica que se tem feito é a de falta de
agilidade e tempestividade dessas empresas na reclassificação do risco de crédito
de seus clientes. Um instrumento que acreditamos refletir de forma mais eficiente as
mudanças macroeconômicas observadas em um país é o Emerging Market Bond
Index - EMBI, índice de medição do retorno dos títulos, criado pelo banco de
64
investimentos JP Morgan. Considerando a necessidade de capturar de forma mais
correta e tempestiva as alterações no humor dos credores a mudanças efetivas no
cenário macroeconômico, bem como o impacto sobre a percepção de risco de
crédito de uma sinalização qualquer do governo, decidimos por escolher este último
instrumento para substituir o IIR do modelo original. Naturalmente que os dois são
inversamente correlacionados, motivo pelo qual esperaremos que os resultados
apresentem sinais invertidos.
Para isolar o risco de crédito exclusivamente associado ao País, incluímos
na regressão o indicador “EMBI sem Brasil”35. Desse modo, eventos que tenham
ocorrido em outros países, tais como as crises no México (1994/1995), na Ásia
(1997), na Rússia (1998) e na Argentina (2001/2002) teriam seus efeitos
expurgados, eliminando seus efeitos nas variáveis relevantes. Também geramos
variável dummy específica para o período eleitoral brasileiro, mais especificamente
entre junho e dezembro de 2002, tendo em vista seus reflexos sobre o câmbio, a
DLSP e o EMBI Brasil.
Para verificarmos econometricamente as três implicações testáveis do
modelo, anteriormente descritas, estruturamos as regressões da seguinte forma:
EmbiBrasilt = δ1 + δ2 DLSP/PIBt-1 + δ3 Prim/PIB(1994)t-1 + δ4
Prim/PIB(1999)t-1 + δ5 Embi sem Brasilt + δ6 DummyEleições + εt
35 O EMBI sem Brasil foi calculado por regra de três simples, considerando-se o EMBI, o EMBI Brasil e o percentual de participação do Brasil no índice EMBI, informações estas coletadas diretamente do banco de dados disponibilizado pelo JPMorgan (ver anexo II).
65
Prim/PIB(1994)t = δ1 + δ2 DLSP/PIB(1994)t-1 + εt
Prim/PIB(1999)t = δ1 + δ2 DLSP/PIB(1999)t-1 + δ3 DummyEleições + εt
Os resultados das regressões foram os seguintes:
Tabela 5: Resultados das Regressões
Regressões 1 Parâmetros Estimados (estatística t entre parênteses)(período em δ1 δ2 δ3 δ4 δ5 δ6 Embi Brasil 2 -670,95 25,23 32,54 -82,61 0,70 946,75(1994:06-2003:06) (-5,49) (6,16) (3,81) (-4,74) (11,82) (5,88) Prim/PIB(1994) 3 -0,40 -0,002 (1994:06-1998:12) (-0,91) (-0,79) Prim/PIB(1999) 4 -0,02 0,065 0,27 (1999:01-2003:06) (-1,74) (27,25) (1,66)
1 A primeira e terceira regressões se apresentaram robustas à estatística Durbin-Watson (rejeitam a hipótese de autocorrelação dos resíduos). A segunda apresentou autocorrelação, que foi corrigida utilizando o método de Cochrane-Orcutt. 2 Todos os parâmetros da regressão foram significantes com probabilidade de 1%. 3 Todos os parâmetros da regressão foram não significantes com probabilidade de 10%. 4 Os parâmetros δ1 e δ3 da regressão foram significantes com probabilidade de 10% e o parâmetro δ2 foi significante com probabilidade de 1%
Os resultados demonstram que, efetivamente, a DLSP/PIB é significante
na função EMBI Brasil. Em especial, demonstram que o índice de risco de crédito foi
indiferente aos resultados primários durante o período em que a dívida não era
elevada e passou a ser influenciado por decisões de política fiscal a partir de 1999.
De acordo com a segunda e terceira regressões, o tamanho da dívida não era
variável significante para explicar o resultado primário até 1999, passando a sê-lo a
partir daquela data, sendo o coeficiente estimado positivo e
66
consideravelmente maior do que o estimado para o período anterior. Nesse sentido,
podemos afirmar que o esforço fiscal recente foi suficiente para sinalizar ao mercado
que o governo está comprometido com o equilíbrio das contas públicas.
Adicionalmente, os resultados das regressões demonstraram que, para o caso
brasileiro, a sinalização ocorre ao longo do tempo e não é um evento once-and-for-
all.
A maior importância do resultado primário a partir de certo limite de dívida
pode explicar tanto a repentina deterioração da classificação de risco no início de
uma fase de sinalização, quando ainda existem déficits primários, quanto o seu
retorno para níveis que sinalizam maior credibilidade após o atingimento de
determinando superávit, não importando o elevado estoque de dívida. Ambos
movimentos podem ser observados no caso brasileiro, principalmente se
desconsiderarmos os impactos gerados pelas eleições sobre os indicadores no
segundo semestre de 2002.
Esta evidência não somente confirma a não-monotônica relação entre
classificações de risco e resultados primários, mas também sugere que superávits
primários podem ser, no caso brasileiro atual, relevantes para a função de
sinalização. Drudi e Prati descreverem um fenômeno similar para os países
europeus. A julgar pela resistência à queda da razão dívida/PIB, os casos da Itália e
Bélgica aparentam ter maior similaridade com o caso brasileiro.
Como base de comparação, é importante notar o tamanho do
67
superávit primário gerado por estes países antes que seus ratings de crédito
melhorassem. O superávit primário da Itália ultrapassou 6% do PIB enquanto o da
Bélgica oscilou entre 4% e 6% do PIB antes que os indicadores de risco retornassem
a patamares que demonstravam maior confiança do investidor. O valor do
coeficiente da DLSP/PIB na regressão Primário/PIB para o período a partir de 1999
foi 0,065, menor que qualquer um daqueles reportados por Drudi e Prati para seu
grupo de países europeus, embora muito superior ao encontrado para o caso
recente da Argentina (Herrera, 2002).
Considerando o exercício realizado no terceiro capítulo, onde
observamos, a partir de algumas variáveis estimadas, a evolução da DLSP e da
DLSP ajustada ao longo da próxima década, e com base nos resultados da
regressão entre EMBI, razão dívida/PIB e resultado primário, podemos estimar,
ceteris paribus, o resultado primário necessário para atingir metas de risco de
crédito.
Caso, por exemplo, o Brasil desejasse atingir ao final de dez anos a
classificação de investment grade, definida para países com reduzido risco de
crédito, o governo deveria tomar decisões de política fiscal que conduzissem o EMBI
Brasil para valores entre 400 e 30036. Para tal, precisaria manter o resultado primário
atual de 4,25% por todo o período, como podemos observar na tabela abaixo.
36 Significa que os bônus soberanos do Brasil seriam negociados, em média, por uma taxa de juros entre 4% a.a. e 3% a.a. acima daquela observada nos títulos do Tesouro dos EUA. Os valores de EMBI citados têm sido observados para países recém classificados em investment grade, como o México, no período imediatamente anterior ao recebimento da classificação.
68
Tabela 6: Evolução da Dívida Líquida do Setor Público e EMBI Brasil Estimado
Variáveis explicativas e 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 resultados esperados 1 Superavit primário 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25% 4,25%Senhoriagem 2 0,27% 0,45% 0,36% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32% 0,32%DLSP 57,21% 57,36% 56,95% 55,98% 54,42% 52,81% 50,35% 47,80% 45,17% 42,45%DLSP ajustada 64,08% 63,46% 62,28% 60,46% 57,97% 55,39% 52,73% 49,97% 47,13% 44,19%
Embi sem Brasil 450,00 425,00 400,00 400,00 400,00 400,00 400,00 400,00 400,00 400,00
Embi Brasil DLSP + 1 dp 3 866,71 853,03 809,99 784,06 758,23 706,87 674,66 600,34 525,33 475,83
Embi Brasil DLSP 701,19 687,07 644,42 619,19 593,96 543,49 512,03 437,99 362,29 311,83
Embi Brasil DLSP - 1 dp 3 535,66 521,11 478,85 454,32 429,69 380,12 349,41 275,63 199,26 147,83
Embi Brasil ajustado + 1 dp 3 1.031,19 1.007,72 974,15 921,07 868,36 789,99 757,32 681,81 605,56 530,23
Embi Brasil ajustada 857,81 843,69 801,04 750,58 700,12 624,42 592,96 518,91 443,22 367,52
Embi Brasil ajustada - 1 dp 3 684,43 669,66 627,94 580,09 531,88 458,85 428,60 356,02 280,88 204,82 Fontes: Superávit primário, senhoriagem, DLSP e DLSP ajustada – tabela 3; Embi Brasil DLSP e Embi Brasil ajustada – regressão tabela 5. 1 Referente à posição de dezembro de cada ano. 2 Crescimento nominal da base monetária, considerando o crescimento nominal do PIB 3 Embi estimado, acrescido (+) ou reduzido (-) do valor equivalente a um desvio padrão da regressão
É importante observarmos que a dispersão da regressão, representada na
tabela por um desvio padrão em torno da média, é elevada (entre 160 e 175 pontos
de EMBI), levando-nos a consideram que outros fatores, notadamente os
institucionais e os relacionados à vulnerabilidade externa (elevada dívida externa
púbica e privada e baixa abertura comercial, por exemplo) poderiam conduzir a uma
percepção maior de solvência ou insolvência para o longo prazo, apresentando
resultados bastante diversos da média estimada pela regressão.
69
Conclusão
A Dívida Líquida do Setor Público, principal indicador da dívida pública
brasileira, tem dois objetivos principais: fornecer informações para a tomada de
decisão sobre as políticas monetária e fiscal e analisar a capacidade de solvência
intertemporal do setor público. Essa dupla atribuição faz com que a definição dos
ativos e passivos que a integram crie distorções que afetam a qualidade das
informações geradas, levando a conclusões errôneas para tomada de decisões
pelos gestores da política econômica e de administração da dívida pública.
Essa monografia apresentou argumentos em favor da reavaliação dos
itens que compõe a Dívida Líquida do Setor Público brasileira, ajustando-a para que
reflita de forma mais realista a pressão do setor público por financiamento. Não
objetivamos, contudo, propor alteração da metodologia da DLSP atualmente
calculada pelo Banco Central. Como este indicador se presta às duas finalidades
anteriormente descritas, a atual metodologia poderia perfeitamente continuar a ser
instrumento de mensuração dos efeitos das políticas públicas sobre as variáveis
macroeconômicas.
Já a “DLSP ajustada”, ao considerar apenas os ativos que gerariam
receita para pagamento da dívida pública e todos os passivos que pressionam a
necessidade de financiamento do governo, passaria a melhor refletir a evolução da
dívida pública e, principalmente, auxiliaria na definição do primário requerido para
mantê-la sob controle, constituindo em um indicador da sustentabilidade
70
intertemporal da dívida pública mais eficiente, ao conferir-lhe um significado
verdadeiramente econômico, em contraposição àquele estritamente contábil.
A reavaliação da DLSP iria conferir maior transparência à realidade fiscal
do País, explicitando a importância e a inevitabilidade de um eventual esforço fiscal
maior sobre as contas primárias do governo. Obstruir as informações sobre a
qualidade dos haveres e sobre o tamanho das obrigações representa tentativa de
ganhar um tempo político, cujo custo social futuro há de ser substancialmente maior
que os eventuais bônus gerados no presente.
Em relação à utilização da dívida como instrumento de sinalização de
política governamental, tema abordado no último capítulo, concluímos que
indicadores de sustentabilidade deveriam ser interpretados com precaução. Por um
lado, à medida que a dívida de um país é relativamente pequena, uma evolução
explosiva da razão dívida/PIB gerada a partir de persistentes déficits primários deve
ser monitorada com atenção porque ambos governos, comprometido e não
comprometido com a sustentabilidade fiscal, conduziriam à mesma política fiscal
insustentável. Por outro lado, quando o estoque da dívida é elevado, evolução
explosiva da dívida com persistente déficit primário é muito mais preocupante porque
sinaliza que o governo no poder não é comprometido e provavelmente irá entrar em
default.
O histórico de cada país tem grande relevância para avaliação sobre o
que seria um nível de dívida sustentável. Considerando que, com base em
71
série histórica desde 1950, reestruturações de dívida têm sido mais freqüentes nos
países da América Latina que em outros países em desenvolvimento (IMF, 2002c), é
compreensível que investidores sintam-se menos confortáveis com uma elevada
razão dívida/PIB no primeiro grupo de países em comparação com outros. Embora
dívidas que cheguem a 60% do PIB sejam toleráveis em economias maduras, como
nos países europeus, elas são grandes para economias emergentes,
particularmente quando dependem fortemente dos fluxos internacionais de capitais.
Nesse sentido, quanto menores as dúvidas sobre a política fiscal, menor
será a vulnerabilidade da economia brasileira. Se voltarmos os nossos olhos para as
economias latino-americanas que têm tido sucesso maior do que o Brasil, em
crescer com estabilidade, como o Chile e o México, veremos que relações dívida/PIB
da ordem de 40% ou menos são muito mais recomendáveis. O Brasil, em particular,
deveria ter preocupação especial com esse tema, pois ao longo dos últimos anos
tem pagado taxas elevadas para financiamento de sua dívida, mesmo se comparado
com países em desenvolvimento com situação fiscal pior, como foi o caso da
Argentina pré-crise, ou que tenham reestruturado suas dívidas recentemente, como
é o caso da Rússia.
Como demonstrado no terceiro capítulo, a partir de um cenário básico
factível e considerando a manutenção do atual superávit primário por todo o
decêndio, os comportamentos tanto da DLSP quanto da DLSP ajustada sinalizam
claro direcionamento para uma dívida/PIB inferior a 40% ao final do período sob
análise. Adicionalmente, a função de sinalização gerada no quarto capítulo
72
permitiu-nos concluir que o governo brasileiro tem demonstrado comprometimento
com a estabilidade fiscal intertemporal, sinalizando claramente esse
comprometimento a partir de 1999, quando a dívida pública atingiu patamar a partir
do qual os credores passaram a exigir mudança no comportamento do governo.
Concluímos também que, mantendo-se o atual superávit primário e considerando
seus efeitos sobre a relação dívida/PIB, o Brasil conseguiria sinalizar claramente que
estaria apto a entrar no grupo restrito dos países classificados como de reduzido
risco de crédito (investment grade).
Finalmente, é importante ressaltar que os governos não deveriam
desconsiderar o relevante papel da sinalização, que se apresenta tanto por meio dos
indicadores tradicionais - como o esforço fiscal necessário para inequivocamente
demonstrar a sustentabilidade intertemporal da dívida pública – quanto por meio do
aperfeiçoamento das estruturas institucional e legal diretamente relacionadas à
política fiscal, de modo que seja inequívoco para os credores do governo o seu
comprometimento com a estabilidade macroeconômica. Tal atitude tem, a nosso ver,
permeado a política fiscal no Brasil ao longo dos últimos cinco anos, não sofrendo
qualquer reestruturação com a recente mudança de governo, o que nos faz acreditar
que poderemos brevemente, e por um motivo salutar, retirar esse tema da pauta dos
grandes debates nacionais.
73
Anexo I EmbiBrasilt = δ1 + δ2 DLSP/PIBt-1 + δ3 Prim/PIB(1994)t-1 + δ4 Prim/PIB(1999)t-1 + δ5 Embi sem Brasilt + δ6 DummyEleições + εt Dependent Variable: EMBIBRASIL Method: Least Squares Date: 07/19/03 Time: 11:28 Sample(adjusted): 1994:08 2003:05 Included observations: 106 after adjusting endpoints White Heteroskedasticity-Consistent Standard Errors & Covariance
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. C -670.9490 122.1364 -5.493440 0.0000
DLSPPIB(-1) 25.23166 4.096707 6.159010 0.0000 DUMMYPRIM1994(-1) 32.54048 8.533958 3.813059 0.0002 DUMMYPRIM1999(-1) -82.60808 17.43161 -4.738981 0.0000
EMBISEMBRA 0.696783 0.058946 11.82069 0.0000 DUMMYELEICOES 946.7587 161.0056 5.880285 0.0000
R-squared 0.829659 Mean dependent var 914.2642 Adjusted R-squared 0.821142 S.D. dependent var 372.0024 S.E. of regression 157.3259 Akaike info criterion 13.00945 Sum squared resid 2475143. Schwarz criterion 13.16021 Log likelihood -683.5011 F-statistic 97.41143 Durbin-Watson stat 1.828047 Prob(F-statistic) 0.000000 Prim/PIB(1994)t = δ1 + δ2 DLSP/PIB(1994)t-1 + εt Dependent Variable: DUMMYPRIM1994 Method: Least Squares Date: 07/16/03 Time: 08:48 Sample(adjusted): 1994:09 2003:05 Included observations: 105 after adjusting endpoints Convergence achieved after 5 iterations White Heteroskedasticity-Consistent Standard Errors & Covariance
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. C -0.399035 0.440560 -0.905746 0.3672
DUMMYDLSP1994(-1) -0.001947 0.002464 -0.790091 0.4313 AR(1) 0.942965 0.029960 31.47454 0.0000
R-squared 0.970009 Mean dependent var 0.433114 Adjusted R-squared 0.969421 S.D. dependent var 1.609145 S.E. of regression 0.281388 Akaike info criterion 0.329989 Sum squared resid 8.076262 Schwarz criterion 0.405816 Log likelihood -14.32440 F-statistic 1649.526 Durbin-Watson stat 1.649309 Prob(F-statistic) 0.000000 Inverted AR Roots
.94
74
Prim/PIB(1999)t = δ1 + δ2 DLSP/PIB(1999)t-1 + δ3 DummyEleições + εt Dependent Variable: DUMMYPRIM1999 Method: Least Squares Date: 07/19/03 Time: 10:57 Sample(adjusted): 1994:08 2003:05 Included observations: 106 after adjusting endpoints White Heteroskedasticity-Consistent Standard Errors & Covariance
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob. C -0.019625 0.011255 -1.743689 0.0842
DUMMYDLSP1999(-1) 0.064597 0.002371 27.24907 0.0000 DUMMYELEICOES02 0.269215 0.162120 1.660594 0.0998
R-squared 0.874589 Mean dependent var 1.659466 Adjusted R-squared 0.872154 S.D. dependent var 1.816648 S.E. of regression 0.649553 Akaike info criterion 2.002830 Sum squared resid 43.45773 Schwarz criterion 2.078211 Log likelihood -103.1500 F-statistic 359.1492 Durbin-Watson stat 1.649903 Prob(F-statistic) 0.000000
75
Anexo II
Dados 1 Utilizados para Estimação da Regressão e Geração dos Gráficos
Fontes: EMBI (JP Morgan), EMBI Brasil (JP Morgan e cálculos do autor), Primário/PIB e DLSP/PIB (Banco Central - Nota para a Imprensa: Política Fiscal, diversas séries) 1 Posição final de período 2 Calculado a partir do percentual de participação do Brasil no EMBI (que variou entre 20% e 30% no período) 3 Fluxos acumulados nos últimos doze meses
Mês EMBI EMBI Superavit DLSP/PIB Mês EMBI EMBI Superavit DLSP/PIBsem Brasil 2 Primário/PIB 3 sem Brasil 2 Primário/PIB 3
jul-94 939 894 4,69 32,82 jan-99 1319 1243 0,31 50,49ago-94 780 764 5,43 31,61 fev-99 1240 1181 0,50 50,69set-94 752 752 5,75 30,63 mar-99 1030 1013 0,74 47,09out-94 837 832 6,33 29,90 abr-99 894 889 0,74 46,94nov-94 844 854 5,62 29,91 mai-99 1091 1082 0,89 48,41dez-94 1039 1087 5,21 30,01 jun-99 1051 1051 1,63 48,57jan-95 1174 1222 5,30 29,35 jul-99 1137 1140 2,08 49,10fev-95 1391 1464 4,13 29,43 ago-99 1194 1187 2,18 50,28
mar-95 1555 1601 4,30 28,92 set-99 1086 1094 2,98 49,84abr-95 1296 1322 4,44 28,67 out-99 988 1009 3,19 49,94mai-95 1179 1217 4,48 28,11 nov-99 927 945 3,40 49,17jun-95 1168 1191 3,61 28,58 dez-99 803 838 3,23 48,68jul-95 1173 1194 3,15 28,74 jan-00 902 928 3,30 49,21
ago-95 1173 1205 2,58 29,06 fev-00 817 843 3,44 49,69set-95 1130 1190 2,01 29,75 mar-00 814 844 3,52 49,50out-95 1222 1296 1,43 30,07 abr-00 791 793 3,75 50,36nov-95 1175 1232 0,97 30,28 mai-00 873 882 4,09 50,53dez-95 1044 1082 0,27 30,56 jun-00 797 808 3,85 49,99jan-96 852 882 -0,42 30,62 jul-00 761 764 3,43 49,22fev-96 986 1030 0,12 30,75 ago-00 712 725 3,55 48,40
mar-96 912 942 0,19 30,67 set-00 761 780 3,39 48,29abr-96 800 815 -0,49 31,15 out-00 829 848 3,29 48,76mai-96 792 810 -0,80 31,78 nov-00 903 925 3,68 48,35jun-96 756 784 -0,84 32,36 dez-00 864 894 3,51 48,78jul-96 760 791 -0,83 32,51 jan-01 765 791 3,62 48,63
ago-96 690 722 -0,86 32,67 fev-01 844 871 3,54 49,27set-96 594 617 -0,80 32,91 mar-01 887 909 3,55 49,77out-96 635 649 -0,81 33,05 abr-01 890 908 3,92 49,91nov-96 562 567 -0,48 33,17 mai-01 862 859 3,80 51,24dez-96 537 542 -0,09 33,28 jun-01 814 800 3,92 50,96jan-97 461 469 -0,01 33,32 jul-01 934 918 4,03 52,30fev-97 436 441 0,07 33,24 ago-01 891 866 3,77 53,49
mar-97 507 520 -0,24 33,29 set-01 1005 953 3,78 54,20abr-97 475 481 0,11 33,45 out-01 1026 980 3,95 53,95mai-97 417 420 0,17 33,17 nov-01 904 871 3,67 52,57jun-97 400 401 0,67 32,38 dez-01 802 775 3,70 52,57jul-97 372 370 0,57 32,79 jan-02 775 735 3,64 54,50
ago-97 375 369 0,84 32,61 fev-02 711 684 3,61 54,17set-97 350 345 0,66 33,11 mar-02 659 634 3,33 54,26out-97 606 579 0,11 33,29 abr-02 682 624 3,37 54,19nov-97 537 520 -0,17 33,29 mai-02 710 629 3,29 55,37dez-97 503 495 -0,87 34,35 jun-02 872 717 3,43 57,30jan-98 529 521 -0,75 35,03 jul-02 833 524 3,51 61,15fev-98 486 481 -0,89 35,51 ago-02 769 554 3,55 57,16
mar-98 448 448 -0,74 35,71 set-02 858 536 3,99 62,52abr-98 461 458 -0,68 35,95 out-02 764 535 4,12 58,47mai-98 549 538 -0,82 36,38 nov-02 688 475 4,14 56,68jun-98 644 633 -1,37 37,55 dez-02 702 523 3,96 56,53jul-98 621 620 -1,17 37,85 jan-03 668 502 4,14 56,19
ago-98 1482 1493 -1,01 38,08 fev-03 656 514 4,43 56,43set-98 1291 1271 -1,11 38,86 mar-03 642 537 4,65 54,90out-98 1149 1122 -0,72 40,04 abr-03 554 479 4,64 53,40nov-98 1014 1015 -0,66 41,17 mai-03 541 472 4,65 55,20dez-98 1122 1075 0,01 41,71 jun/03 535 464 4,40 55,40
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