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AVM FACULDADE INTEGRADA A Uniformização de Jurisprudência no Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região Maritza Tovar Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · 2DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho, 6 ed. São Paulo: LTr, 2007, p.169. 13 Esta vertente, com amparo nos

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AVM FACULDADE INTEGRADA

A Uniformização de Jurisprudência no Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região

Maritza Tovar

Rio de Janeiro 2015

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EITO AUTORAL

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Maritza Tovar

A Uniformização de Jurisprudência no Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região

Monografia apresentada como exigência de conclusão de Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Processo Civil e Processo do Trabalho. Professora Orientadora: Cláudia Pisco

Rio de Janeiro 2015

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Maritza Tovar

A Uniformização de Jurisprudência no Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região

Monografia apresentada como exigência de conclusão de Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Processo Civil e Processo do Trabalho.

Aprovada em______ de ________________de 201__

BANCA EXAMINADORA:

____________________________________ Professora Cláudia Pisco

_____________________________________ Professor Nelson Tavares

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A meu pai, Rodrigo Alberto Neves Tovar, eterno ídolo e exemplo. A minha irmã, Maria Esther, sempre. A meus filhos, André e Pedro, Minha alegria, orgulho, amor extremo e permanente gratidão.

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AGRADECIMENTOS Agradeço, em primeiro lugar, ao Desembargador José da Fonseca Martins Junior, pela oportunidade de participar de um projeto do qual hoje tanto me orgulho. Agradeço aos Desembargadores Jorge Gonçalves da Fonte e Marcelo Augusto Souto de Oliveira, que mesmo sem saber, muito colaboraram com este trabalho. À amiga Ruth Maués, pelo incentivo diário e inabalável senso de justiça. Agradeço à amiga Luiza Carvalho, organizadora impecável e colega exemplar. Agradeço à professora Cláudia Pisco, que me fez gostar ainda mais do Direito Processual. Agradeço ao professor Nelson Tavares que me ensinou a dar forma às ideias deste trabalho. A todos os bons amigos do TRT-RJ.

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“O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida. ” JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO.

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A Uniformização de Jurisprudência no TRT da Primeira Região

Maritza Tovar

Graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Analista Judiciária do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região.

Resumo: Diante da multiplicidade de casos semelhantes submetidos à apreciação do Poder Judiciário e da pluralidade de órgãos no exercício da função jurisdicional, surgiu a necessidade de criar, regular e ampliar os mecanismos legais destinados a evitar soluções desiguais para as mesmas questões de direito. Este trabalho procura demonstrar a importância dos mecanismos de uniformização de jurisprudência nos tribunais regionais do trabalho, defendendo a tese de que representam verdadeiros instrumentos de concretização dos princípios da isonomia, celeridade processual e segurança jurídica assegurados na Constituição da República. Busca realizar uma análise crítica e comparativa dos modelos tradicionais de uniformização, bem como de sua evolução, em especial, no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região. Avalia o impacto das alterações implementadas pela publicação da Lei 13.015/2014 sobre o processamento do incidente de uniformização de jurisprudência nos tribunais regionais do trabalho e aponta a urgência de ajustes imprescindíveis para a adequação do Regimento Interno do TRT-RJ à nova dinâmica daquele instituto. Confronta os posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais acerca da homogeneização dos julgados e indica alternativas possíveis aos métodos tradicionais de solução de divergências.

Palavras-chaves: Uniformização de jurisprudência. Mecanismos. Isonomia. Celeridade.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 8 2. JURISPRUDÊNCIA. NOÇÕES GERAIS. ................................................................... 10 2.1. Esboço histórico. Conceito. ........................................................................................... 10 2.2. Discussões doutrinárias. ................................................................................................ 12 2.3. Importância da uniformização de jurisprudência. ......................................................... 14 3. A UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA NO TRT-RJ .................................. 17 3.1. Evolução. ....................................................................................................................... 17 3.2. Mecanismos previstos no Regimento Interno ............................................................... 19 3.2.1. Súmulas regionais. .......................................................................................................... 19 3.2.2. Incidente de Uniformização de Jurisprudência...............................................................20 4. A LEI 13.015/2014. .......................................................................................................... 26 4.1. Repercussões. ................................................................................................................ 26 4.2. Indagações e perspectivas no TRT-RJ. ......................................................................... 31 5. MÉTODOS DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA ................................ 37 5.1. Críticas. Interesses em confronto. Ponderação de princípios. ....................................... 37 5.2. Alternativa aos modelos tradicionais. ............................................................................ 40 6. CONCLUSÃO ................................................................................................................. 42 7. REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 44

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1. INTRODUÇÃO

Embora eventuais divergências na interpretação de preceitos legais não caracterizem

vícios formais suficientes para comprometer a validade e a qualidade da prestação

jurisdicional, o princípio da isonomia não deve ficar restrito à igualdade teórica perante a lei,

prevista no art. 5º, caput, da Constituição da República.

Nesse panorama, uma concepção mais ampla do conceito de igualdade abrange

estender o ideal isonômico não apenas aos momentos de interpretação da lei, como àqueles de

sua aplicação aos casos concretos.

Dessa forma, torna-se fundamental que à isonomia como princípio constitucional se

aglutine a isonomia prática, destinada a evitar discrepâncias excessivas entre decisões

judiciais prolatadas sobre casos idênticos.

Com vistas a corrigir essa indesejável dissonância de tratamento a casos análogos, o

direito processual pátrio, ao longo do tempo, vem desenvolvendo e ampliando uma série de

instrumentos e técnicas voltados para prevenir contradições excessivas entre julgados que

versem sobre o mesmo tema e comportem soluções conflitantes.

Este trabalho se propõe a ressaltar a necessidade de homogeneização de julgados,

uma vez que a multiplicidade de órgãos no exercício da função jurisdicional do Estado

implica, não raro, decisões antagônicas acerca de questões de direito semelhantes, ou até

mesmo iguais, o que gera entre os jurisdicionados, fim precípuo de toda a atividade do

Estado, um indesejado, porém evitável, sentimento de injustiça, enfatizando a importância da

uniformização de jurisprudência para a concretização dos princípios da isonomia, da

segurança jurídica e da razoável duração do processo.

Busca-se fazer uma abordagem crítica da evolução da aplicação dos métodos de

uniformização de jurisprudência previstos no Regimento Interno do Tribunal Regional do

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Trabalho da Primeira Região, expondo-se as principais diferenças entre a edição de súmulas

regionais e o processamento do incidente de uniformização de jurisprudência.

Pretende-se, ainda, cuidar das incertezas e indagações resultantes das inovações

implementadas pela Lei n. 13.015, de 21 jul. 2014, que alterou substancialmente a redação do

art. 896 da CLT, e passou a exigir a uniformização de jurisprudência como requisito de

admissibilidade para o conhecimento do recurso de revista, por divergência, quando

constatada a existência de decisões atuais e conflitantes no âmbito do mesmo regional, sobre o

tema objeto do recurso.

Objetiva-se, outrossim, diagnosticar eventuais incompatibilidades entre o

processamento atual do incidente de uniformização de jurisprudência no Tribunal Regional do

Trabalho da Primeira Região e a nova dinâmica do instituto, em face das inovações trazidas

pela Lei 13.015/2014 e pelo Ato n.491/SEGJUD.GP., de 23 set. 2014, da Presidência do

Tribunal Superior do Trabalho.

Almeja-se, por fim, analisar as críticas mais frequentes que incorrem sobre os

modelos de homogeneização dos julgados, e apontar possíveis alternativas aos métodos já

existentes, ponderando os princípios e interesses em conflito.

Com vistas a facilitar a compreensão das questões que se pretende desenvolver, este

estudo será dividido em quatro capítulos, dispostos da seguinte forma:

O primeiro trará uma breve explanação acerca do conceito de jurisprudência e das

controvérsias doutrinárias sobre o termo, ressaltando, em seguida, a importância de sua

uniformização.

O segundo capítulo tratará da evolução da uniformização da jurisprudência no

Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região e fará uma avaliação dos instrumentos

atualmente disponíveis em seu Regimento Interno: as súmulas regionais e o incidente de

uniformização de jurisprudência.

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No terceiro capítulo, serão analisadas as repercussões da Lei 13.015, de 21 jul. 2014

e do Ato n. 491/SEGJUD.GP, de 23 set. 2014, da Presidência do Tribunal Superior do

Trabalho, na regulação do incidente de uniformização de jurisprudência, e abordados os

ajustes que se farão necessários para adequar o Regimento Interno do Tribunal Regional do

Trabalho da Primeira Região à realidade imposta pela nova lei.

Ao longo do quarto capítulo, far-se-á uma avaliação dos mecanismos de

uniformização de jurisprudência atualmente utilizados, destacando as críticas apontadas pela

doutrina e pelos magistrados aos modelos previstos na legislação em vigor e sugerida

alternativa aos modelos tradicionais de uniformização.

Em conclusão, será feito um balanço dos aspectos positivos e negativos dos métodos

de solução de divergência, sopesada a ponderação dos princípios em confronto.

A pesquisa a ser desenvolvida será pautada pelo método bibliográfico – qualitativo e

parcialmente exploratório e comparativo.

2. JURISPRUDÊNCIA. NOÇÕES GERAIS.

2.1. Esboço histórico. Conceito.

Conquanto a origem do conceito remonte à antiguidade, a palavra jurisprudência

remete à tradição de Roma, onde era essencialmente relacionada ao direito positivo –

secundum legem– apresentando alterações graduais à medida que o direito escrito foi sofrendo

modificações.

Em razão das inúmeras influências que o Império foi incorporando, quer em

consequência de guerras, quer em virtude de migrações que, por motivos diversos, ocorreram

no continente, o direito romano foi se difundindo por toda a Europa, dando origem à chamada

jurisprudência ocidental.

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Conforme as características e tradições de cada povo, o direito foi se solidificando de

maneira distinta no continente europeu: de um lado o direito anglo-saxão, no qual prepondera

a aplicação do precedente judiciário, de outro os chamados “direitos codicísticos”, nos quais

predomina a norma escrita.

Assim, nos países de origem anglo-saxã, as decisões judiciais não se propõem

unicamente a dirimir conflitos de interesses, mas igualmente a firmar precedentes judiciários

que têm força vinculante e são determinantes para o julgamento de casos análogos futuros.

Já entre os povos que se filiaram ao sistema jurídico romano-germânico, o direito se

alicerça sobre a norma escrita, a chamada civil law, tendo as decisões judiciais, em regra,

força prevalentemente norteadora.

Dentro dessa perspectiva histórica, o conceito e a importância da jurisprudência em

cada sistema jurídico vêm oscilando, dependendo dos valores envolvidos e observadas as

condicionantes de tempo e espaço.

No Brasil, onde o Direito se estrutura sobre a norma escrita, codificada, o termo

jurisprudência apresenta múltiplos significados, podendo ser compreendido com as seguintes

acepções: a) em sentido amplo, diz respeito à própria “ciência do direito”, ou seja, o estudo

das regras de conduta social; b) etimologicamente, seria o Direito aplicado aos casos

concretos por seus operadores; c) sob o ângulo da hermenêutica, relaciona-se à interpretação

das normas, no plano teórico, dada pelos juristas; d) do ponto de vista da distribuição da

justiça, representaria o total das decisões dos Tribunais, independentemente de serem ou não

harmônicos; e) em sentido estrito, seria o conjunto de decisões congruentes e reiteradas, sobre

determinado tema, provenientes de um mesmo Tribunal; f) em sentido ideal, potencializado,

seria a projeção da tese fixada num caso concreto, em outras demandas, pendentes ou futuras.

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Para Carlos Henrique Bezerra Leite1, o termo jurisprudência apresenta inúmeros

sentidos, podendo significar tanto a ciência do direito, como a ciência da lei ou a dogmática

jurídica.

Assinala o consagrado autor que a palavra jurisprudência pode também ser

empregada como o conjunto de decisões uniformes dos tribunais.

Nessa linha, Maurício Godinho Delgado2, conceitua jurisprudência como “a reiterada

interpretação conferida pelos tribunais às normas jurídicas, a partir dos casos concretos

colocados a seu exame jurisdicional. Trata-se da conduta normativa uniforme adotada pelos

tribunais em face de semelhantes situações fáticas trazidas a seu exame”.

2.2. Discussões doutrinárias.

Dependendo do sistema jurídico adotado por cada país e, em consequência, do

parâmetro adotado no pacto fundamental, a jurisprudência pode vir ou não classificada entre

as fontes do direito.

Enquanto nos países de língua inglesa, o precedente judiciário do qual o julgador

extrai a razão de decidir para resolver caso análogo, pendente ou futuro, constitui a fonte

principal do Direito, nos países que, como o Brasil, filiam-se ao sistema jurídico romano-

germânico, duas correntes doutrinárias se antagonizam no que diz respeito à inclusão da

jurisprudência entre as fontes do Direito.

Para a primeira delas, mais tradicional e ainda majoritária, a jurisprudência não deve

ser considerada como fonte do Direito.

1BEZERRA LEITE, Carlos Henrique, Curso de Direito Processual do Trabalho, 10 ed. São Paulo: LTr, 2015, p.

964.

2DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho, 6 ed. São Paulo: LTr, 2007, p.169.

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Esta vertente, com amparo nos civilistas clássicos, defende que, em razão de a

jurisprudência não poder ser caracterizada como abstrata, impessoal e genérica, traduzindo

forma pela qual os órgãos jurisdicionais interpretam a lei, aplicando a norma positivada aos

casos concretos, não há que ser admitida entre as fontes do Direito.

Todavia, para a corrente mais contemporânea, a jurisprudência desempenha uma

função jurígena, criadora.

Nessa linha, as decisões reiteradas de um tribunal, em igual sentido, sobre o mesmo

tema, ganhariam status de fonte normativa típica, abstrata, impessoal e válida como parâmetro

para casos semelhantes que no futuro acaso viessem a julgamento.

Diversamente do Direito Comum, onde é maior a resistência à adoção da

jurisprudência como fonte, no âmbito laboral as súmulas, orientações jurisprudenciais,

enunciados normativos, precedentes e teses prevalecentes vêm se firmando, já há muito e cada

vez com maior intensidade, como fontes normativas supletivas e complementares às

tradicionalmente aceitas pela doutrina.

Convém destacar que os sistemas jurídicos do common law e do civil law, o primeiro

tendo como referência o precedente judiciário e o segundo a norma positivada, tendem a uma

aproximação, uma vez que, enquanto países como Inglaterra, Estados Unidos e Canadá

começam, progressivamente, a valorizar a norma escrita, naqueles de tradição romano-

germânica, o chamado direito sumular vem encontrando receptividade crescente, lembrando

que, no Brasil, a Emenda Constitucional n.45, de 8 de jan. de 2004, ao conceber a Súmula

Vinculante, com todas as características e consequências que lhe foram atribuídas, conferiu,

de forma definitiva e inegável à criação jurisprudencial status de fonte formal do Direito.

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2.3. Importância da uniformização de jurisprudência.

É inquestionável a importância da uniformização da jurisprudência como mecanismo

de concretização dos princípios da isonomia, da segurança jurídica, da razoável duração do

processo e da celeridade, essenciais à consolidação de um Estado Democrático de Direito.

O princípio da isonomia, consagrado no caput do art. 5º da Constituição da

República, se compreendido em toda a sua magnitude, não deve, evidentemente, ficar restrito

ao mero conceito, abstrato e impessoal contido na norma.

Sua materialização plena somente ocorre quando da efetiva aplicação da regra geral

aos casos concretos. O que significa dizer: a igualdade real somente se dá quando casos

análogos, pendentes e futuros têm, na medida do razoável, idêntica solução.

A discrepância exacerbada nas decisões judiciais acerca de conflitos semelhantes, ou

mesmo iguais, acaba por atingir frontalmente o princípio constitucional da isonomia, afasta a

solução dada pelos tribunais do ideal de “melhor justiça”, e conduz a um nocivo e crescente

descrédito em relação à atuação do Poder Judiciário como um todo.

Teresa Arruda Alvim Wambier3 observa que o princípio da isonomia, previsto no

caput do art. 5º da Constituição da República de 1988, consagra ideia de que todos devem ser

tratados de forma equânime perante a lei, o que implica concluir que os tribunais não podem

aplicar a mesma norma de forma diferente a casos absolutamente idênticos, dentro de um

mesmo contexto histórico.

Ao tratar do tema, José Carlos Barbosa Moreira4 pondera que a conveniência de se

adotar medidas com o intuito de homogeneizar os pronunciamentos judiciais deve-se “ao fato

da existência, no aparelho estatal, de uma pluralidade de órgãos judicantes que podem (e com

3 WAMBIER apud MANCUSO, p.34.

4 MOREIRA, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, 5 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:

Forense, 1985, p. 4.

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frequência têm) de enfrentar iguais questões de direito e, portanto, de enunciar teses jurídicas

em idêntica matéria. ”

De fato, essa possibilidade de, em um mesmo momento histórico e sob idênticas

condições, a mesma norma ser interpretada e aplicada de forma diametralmente oposta

culmina por gerar, entre os jurisdicionados e a comunidade em geral, um sentimento de

absoluto descrédito e insegurança em relação à atuação do poder judiciário.

Salienta, ainda, o eminente jurista que, apenas dentro desses limites, situa-se a

questão da uniformização de jurisprudência, ressaltando que seria intolerável submeter os

órgãos judicantes a uma camisa-de-força que lhes engessasse o convencimento e amputasse

novas interpretações das regras de direito quando as anteriormente adotadas não mais

correspondessem às permanentes mudanças nas relações sociais.

A título de exemplo vale destacar uma das questões mais corriqueiras e atuais que

prosperam nas cortes trabalhistas e que diz respeito à controvérsia sobre a incidência ou não

da multa prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho.

Enquanto parte dos desembargadores que compõem as Turmas do TRT-RJ sustenta

que a penalidade imposta no diploma processual civil é inaplicável em sede trabalhista, por

não haver omissão na CLT que em seu artigo 880 determina a execução em 48horas, sob pena

de penhora, razão pela qual não há falar em aplicação subsidiária do diploma processual civil,

parcela igualmente significativa dos magistrados que integram o Tribunal Regional do

Trabalho da Primeira Região defende fervorosamente a tese de que a multa prevista no art.

475-J do CPC goza de aplicação imediata no processo do trabalho, porquanto existe lacuna no

texto consolidado sobre prazo e condições para o cumprimento da sentença, sendo ademais

compatível com os princípios que informam o processo laboral.

Diante de divergências dessa monta, torna-se difícil explicar a empregados da mesma

empresa que, em situações quase idênticas, ajuízam demanda trabalhista, a razão pela qual

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alguns são agraciados com o montante correspondente à multa do artigo 475-J e outros não, se

as demandas são submetidas à apreciação pelo mesmo Regional, e por vezes, até pela mesma

Turma.

Confiram-se, a seguir, as ementas de dois acórdãos proferidos pela mesma turma do

TRT-RJ que sinalizam interpretação inteiramente oposta quanto à aplicação da penalidade

imposta no art. 475-J do Código de Processo Civil às lides trabalhistas:

“MULTA DO ARTIGO 475-J do CPC. CABIMENTO. Incabível a aplicação da

multa do art. 475-J do CPC ante o regramento próprio previsto no art. 880 da CLT, uma vez

que a aplicação subsidiária das normas processuais civis só tem lugar na hipótese de omissão

da CLT. Agravo de petição a que se dá provimento no particular. ” (Processo n. 0000665-

82.2012.5.01.0053 – RTOrd, 4ª Turma, julgado por maioria, em 20.05.2014).5

“AGRAVO DE PETIÇÃO DAEXECUTADA. MULTA PREVISTA NO

ARTIGO475-J DO CPC. A aplicação subsidiária da multa prevista no artigo 475-J do CPC, é

compatível com os princípios que informam o processo do trabalho na medida que se coaduna

com as garantias constitucionais da razoável duração do processo, efetividade e celeridade.

Recurso de agravo de petição não provido. ” (Processo n. 0152200-27.2003.5.01.0036 –AP,

4ª Turma, julgado por maioria, em 07.05.2014).6

5 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região. Biblioteca Digital. RO n. 0000665-

82.2012.5.01.0053. Disponível em: < http://bd1.trt1.jus.br/xmlui/handle/1001/2026>. Acesso em: 15 de out.

2014.

6 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região. Biblioteca Digital. Agravo de Petição n.

0152200-27.2003.5.01.0036. Disponível em: <http://bd1.trt1.jus.br/xmlui/handle/1001/2026/advanced-search.>

Acesso em: 16 de out. 2014.

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Tendo em vista que o sentimento de justiça, ou injustiça, é, antes de tudo,

comparativo, em face de situações como a acima descrita, a avaliação do jurisdicionado, cujo

pedido teve solução desfavorável, acerca da atuação do juiz, será de que foi injusta, parcial ou

mesmo tendenciosa.

No que diz respeito à celeridade e à razoável duração do processo, asseguradas no

art. 5º, inciso LXXVIII, da Carta Constitucional, é inegável que a morosidade da justiça é um

dos maiores entraves à efetividade desses direitos fundamentais.

Por outro lado, não restam dúvidas de que a edição de súmulas norteadoras, ou

persuasivas, que apontem o entendimento predominante em determinado tribunal, representa

um fator que contribui sobremaneira para a tempestividade na entrega da prestação

jurisdicional.

Isto porque, a par de auxiliar na formação do convencimento do magistrado e

facilitar seu esforço argumentativo, as súmulas de jurisprudência dominante, em um ou outro

sentido, agilizam a elaboração de acordos que versem sobre a matéria cujo entendimento se

encontra uniformizado.

3. A UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA NO TRT-RJ

3.1. Evolução.

Até meados de 2009, a edição de súmulas regionais não compunha a realidade do

Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região.

De fato, a essa época, o TRT-RJ era o único regional que não tinha, ao menos, uma

única súmula de jurisprudência.

Por esta razão, o Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região foi alvo de duras

críticas durante a correição realizada no período compreendido entre os dias vinte e quatro e

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vinte e oito do mês de novembro de dois mil e oito, realizada pelo Exmo. Ministro João

Oreste Dalazen, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho, conforme registro em ata, a folhas

59, com o seguinte teor: “2.16. UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA DO

TRIBUNAL E APROVAÇÃO DA RESPECTIVA SÚMULA. Na ata da correição anterior

(2007) constou recomendação para que o Tribunal uniformizasse a própria jurisprudência e,

se fosse o caso, aprovasse a respectiva súmula. (...) Constatou-se, contudo, durante a presente

correição, que o TRT do Rio não logrou, até a presente data, a recomendada uniformização da

jurisprudência, permanecendo como um dos poucos Tribunais do País que não editou até hoje

uma súmula sequer. Considerando que tal postura contribui, em alguma medida, para a

excessiva taxa de recorribilidade dos acórdãos que profere, o Ministro Corregedor-Geral

reitera tal recomendação, ao final, pois julga fundamental, em cumprimento à lei, a

uniformização da jurisprudência local. ”

Em 21 de maio de 2009, foram publicadas as primeiras súmulas do TRT-RJ, com

vistas a uniformizar a jurisprudência regional, respectivamente, em relação aos seguintes

temas: Súmula n. 1. Cooperativa. Fraude. Vínculo de emprego. Responsabilidade subsidiária

da administração pública e Súmula n. 2. Corretor de seguros. Vínculo de emprego.

Vencidas as dificuldades iniciais, o processo de edição de súmulas na Primeira

Região ganhou impulso significativo, graças ao empenho do Desembargador José da Fonseca

Martins Junior que, como Presidente da Comissão de Jurisprudência, e com a colaboração dos

demais membros da Comissão, não mediu esforços para tornar as ações objetivando a

homogeneização de julgados, cada vez mais eficientes e reconhecidas.

Assim é que, na correição realizada no período compreendido entre os dias

18(dezoito) de outubro a 22 (vinte e dois) de outubro de 2010, o Excelentíssimo Ministro

Carlos Alberto Reis de Paula, à época Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho, reconheceu a

iniciativa e encorajou a continuidade da atividade de uniformização de jurisprudência no

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TRT-RJ, em observância ao disposto no artigo 896, §3º, da CLT, conforme destacado na ata

publicada no DEJT, em 7 dez. 2010.

3.2. Mecanismos previstos no Regimento Interno

3.2.1. Súmulas regionais.

As súmulas de jurisprudência uniforme no direito brasileiro têm sua origem nos

“assentos da Casa de Suplicação”, da tradição luso-brasileira.

Na seara trabalhista, a edição de súmulas remete aos antigos “prejulgados” do

Tribunal Superior do Trabalho, por autorização do art. 902 da Consolidação das Leis do

Trabalho, revogado pela Lei n. 7.033, de 5 out. 1982.

No que concerne à edição de súmulas regionais nas cortes trabalhistas, estas

encontram previsão no art. 896, § 3º, da CLT, com redação determinada pela Lei n. 9.756, de

17 de dez. de 1998, que dispõe acerca da obrigatoriedade de uniformização de jurisprudência

nos Tribunais Regionais do Trabalho.

Wagner Giglio7 destaca a tendência sumular no direito do trabalho e conclui: “As

súmulas são, hoje, imprescindíveis para a simplificação do procedimento recursal, e o Direito

Processual do Trabalho delas não poderia abrir mão. A perspectiva é de que aumentem em

número, ampliem sua função e restrinjam, ainda mais, o acesso ao TST. ”

No Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, a edição de súmulas está

regulamentada nos art. 120-129 do Regimento Interno e segue, em síntese, o seguinte trâmite:

1. A Comissão de Jurisprudência, composta por cinco desembargadores, mediante

iniciativa sua ou de qualquer desembargador, propõe projeto de edição, alteração ou

cancelamento de súmula, que deverá ser instruído com a demonstração de um dos requisitos a

7 GIGLIO, Wagner, Direito Processual do Trabalho, 6.ed. São Paulo: LTr, 1986, p.466-468.

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seguir transcritos: a) três acórdãos da Seção Especializada em Dissídios Individuais; ou b)

cinco acórdãos da Seção Especializada em Dissídios Individuais, prolatados por maioria

simples; ou c) vinte e um acórdãos de sete Turmas do Tribunal, sendo três de cada uma,

prolatados por unanimidade; ou d) dois acórdãos de cada uma das Turmas do Tribunal,

prolatados por maioria simples; ou e) dois acórdãos do Órgão Especial, prolatados por

maioria absoluta, relativos a incidentes de uniformização de jurisprudência.

2. Os acórdãos catalogados para fins de edição de súmula deverão ser provenientes

de Turmas e sessões de julgamento distintas.

3. Após parecer do Ministério Público do Trabalho, que deverá opinar sobre o

preenchimento dos requisitos objetivos previstos no Regimento Interno, o projeto é

encaminhado aos desembargadores que compõem o Tribunal Pleno para, no prazo de quinze

dias que antecede sua apreciação, oferecerem as objeções e sugestões que julgarem

pertinentes às quais serão submetidas à análise, juntamente com o projeto de súmula.

4. Uma vez aprovada a proposta de Súmula, o respectivo verbete deverá adotar sua

denominação, com numeração própria, e ser publicado por três vezes consecutivas no Diário

Oficial, observado o mesmo procedimento nas hipóteses de alteração ou cancelamento.

Convém destacar que, atualmente, o TRT-RJ possui cinquenta súmulas aprovadas,

destacando-se entre os Tribunais Regionais do Trabalho como um dos que demonstrou maior

empenho na persecução da almejada homogeneização de julgados e do ideal isonômico.

3.2.2. Incidente de Uniformização de Jurisprudência.

Embora alguns autores atribuam ao incidente de uniformização de jurisprudência

natureza jurídica recursal, tal não é o entendimento que prepondera entre a maioria dos

doutrinadores.

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Prevalece a vertente que classifica o instituto regulado pelos art. 476-479 do Código

de Processo Civil como incidente procedimental que confere ao tribunal competência

funcional para a fixação de tese jurídica, quando a seu respeito ocorrer divergência ou no

julgamento recorrido a interpretação for diversa da que lhe haja dado outra turma, câmara,

grupo de câmaras ou câmaras cíveis reunidas, mantida a competência da câmara, turma ou

grupo de câmaras para a aplicação da norma ao caso concreto.

Segundo Alexandre Câmara8 a uniformização de jurisprudência consiste “num

incidente processual, através do qual suspende-se um julgamento no tribunal, a fim de que

seja apreciado, em tese, o direito aplicável à hipótese concreta, determinando-se a correta

interpretação da norma jurídica que incide, ficando assim aquele julgamento vinculado a esta

determinação. ”

Vicente Greco Filho9 define o instituto como um incidente procedimental que, assim

como a declaração de inconstitucionalidade, atribui ao tribunal pleno competência funcional

para fixação de tese jurídica, mantida a competência da Câmara, Grupo de Câmara ou Turma

para a aplicação da lei ao caso concreto.

Na mesma linha, Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery10 compartilham a

tese da natureza incidental do instituto.

Em sentido oposto, Pontes de Miranda11 defende a natureza recursal do incidente de

uniformização de jurisprudência.

8 CÂMARA, Alexandre Freitas, Lições de Direito Processual Civil, 2 v., 13 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,

2006, p.49.

9 GRECO FILHO, Vicente, Direito Processual Civil Brasileiro, 2 v., 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 362.

10 NERY JUNIOR, Nelson, ANDRADE NERY, Rosa Maria, Código de Processo Civil Comentado, 4 ed. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 934.

11 PONTES DE MIRANDA, apud GRECO FILHO, op. cit. p. 362.

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De toda a sorte, é inegável que há uma repartição de competências cabendo ao Pleno

(ou ao Órgão Especial) a fixação da tese jurídica e ao órgão fracionado a aplicação da tese

prevalecente à demanda sob exame.

Assim, deflagrado o incidente de uniformização de jurisprudência há uma cisão na

competência para o julgamento, cabendo ao Tribunal Pleno ou Órgão Especial de

determinado tribunal a competência para decidir a questão de direito, fixando a tese a ser

adotada, e ao órgão fracionário em que teve origem o incidente julgar a causa.

Profere-se, no caso, uma decisão subjetivamente complexa.

O Código de Processo Civil trata do incidente de uniformização de jurisprudência em

seus artigos 476-479, podendo ter seus efeitos limitados ao caso concreto em que foi

suscitado (quando a tese vencedora ficar definida por maioria simples) ou projetar-se para

outras demandas, se convertido em súmula (caso a tese prevalecente venha a ser fixada por

maioria absoluta).

A instauração do incidente de uniformização de jurisprudência, na forma em que este

vem disciplinado no Código de Processo Civil, ocorrerá a requerimento da parte, até o início

do julgamento, em petição avulsa, nas razoes recursais, ou em sustentação oral, e ainda por

solicitação do juiz votante.

Uma vez suscitado o incidente, caberá ao órgão fracionário decidir acerca da

existência ou não de controvérsia jurisprudencial.

Se for afastada a divergência, o processo seguirá seu curso normal.

Uma vez que seja reconhecida a divergência jurisprudencial, deverá ser lavrado o

respectivo acórdão, o julgamento no órgão fracionário será suspenso e os autos serão

remetidos ao presidente do tribunal a quem caberá designar a sessão de julgamento.

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Em todos os casos será ouvido o Ministério Público, uma vez que a tese fixada no

incidente deverá ser aplicada a casos futuros, o que, por si só, justifica a manifestação do

parquet.

O tribunal, na sessão de julgamento do incidente, deverá se manifestar sobre a

divergência e, caso a reconheça, fixará a interpretação do direito a ser observada.

Cada magistrado deverá proclamar seu voto em exposição fundamentada.

A tese jurídica que prevalecer no julgamento do incidente terá força vinculativa em

relação ao processo originário, devendo ser necessariamente observada pelo órgão

fracionário.

De outra parte, se a tese jurídica vitoriosa obtiver o voto da maioria absoluta dos

participantes do julgamento, nos termos do art. 479 do CPC, deverá ser incluída na súmula da

jurisprudência dominante do respectivo tribunal e irá constituir precedente na sua

uniformização de jurisprudência.

Todavia, convém notar que as súmulas dos tribunais, à exceção da hipótese

consagrada no art. 103-A da Constituição da República, provenientes ou não de incidente de

uniformização de jurisprudência, não são dotadas de eficácia vinculante, servindo

exclusivamente como bússola orientadora para os operadores do direito, produzindo efeitos

unicamente persuasivos.

O Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por sua

vez, disciplina o incidente de uniformização de jurisprudência em seu artigo 119 o qual

imprime ao seu processamento a seguinte sequência:

Nas Turmas ou Sessão Especializada:

1. O Incidente de Uniformização de Jurisprudência poderá ser suscitado, mediante

requerimento das partes, ou de ofício, por qualquer magistrado ao proferir seu voto na Turma

ou Sessão Especializada, quando configurada qualquer divergência interpretativa do direito

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invocado no julgamento, seja no âmbito do próprio órgão colegiado, entre este e outros

colegiados, ou mesmo entre a sentença recorrida e o órgão colegiado revisor.

2. No processo em que for suscitado o incidente, o julgamento terá por objeto,

preliminarmente, o reconhecimento ou não da divergência acerca da interpretação do direito,

o que determinará ou não seu processamento, sendo a decisão tomada pelo voto da maioria

simples dos membros do colegiado que estejam presentes na sessão.

3. Deliberando o órgão fracionário pelo não processamento do incidente, a decisão,

sucintamente fundamentada, constará da certidão e o julgamento terá prosseguimento na

mesma sessão em que for rejeitado o incidente.

4. Caso o Órgão Especial se manifeste favoravelmente ao processamento do

incidente, o julgamento será suspenso até que decida qual a tese jurídica deve prevalecer.

5. A decisão acerca do incidente e consequente sobrestamento do feito deverá ser

registrada na certidão de julgamento. O relator lavrará o acórdão relativo ao incidente,

devendo constar, expressamente, as teses interpretativas que lhe deram origem, a suspensão

do julgamento no órgão fracionário e a determinação de remessa dos autos à Presidência do

Tribunal para processamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência. A decisão

pelo seguimento do incidente é irrecorrível.

6. O Incidente será processado nos autos principais e será apreciado pelo Órgão

Especial, após manifestações da Comissão de Jurisprudência e Ministério Público.

7. Após o julgamento do incidente, o órgão fracionário suscitante, quando da

sequência do julgamento, deverá, obrigatoriamente, aplicar ao caso concreto a tese fixada pelo

Órgão Especial.

No Órgão Especial:

1. Admitido o incidente, o Presidente do Tribunal terá 48 horas para determinar sua

autuação e livre distribuição a um dos membros do Órgão Especial. O relator, também em 48

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horas, determinará a remessa dos autos à Comissão de Jurisprudência e Ministério Público,

para suas manifestações em 15 dias sucessivos.

2. Retornando os autos do Ministério Público, o relator terá 15 dias para a elaboração

de seu voto e aposição do “vistos”, encaminhando os autos à Presidência do Tribunal para

designação de pauta.

3. Como matéria preliminar, o Órgão Especial decidirá sobre a configuração ou não

de dissenso jurisprudencial, passando, caso admitido o incidente, à deliberação sobre as teses

em conflito. Não admitido o incidente, a decisão constará de simples certidão, e o processo

retorna ao órgão suscitante para regular prosseguimento, sem que seja fixada qualquer tese

jurídica sobre o direito supostamente controvertido.

4. O julgamento do incidente poderá ser decidido pela maioria simples dos

desembargadores presentes na sessão, hipótese em que a solução repercutirá apenas no

processo que lhe deu origem.

5. Caso a tese vencedora no Órgão Especial alcance a votação da maioria absoluta

dos membros (metade mais um da composição plena), constituirá precedente para a

uniformização de jurisprudência e será objeto de súmula (CPC, art. 479), em proposta a ser

formulada pela Comissão de Jurisprudência, exigindo-se, todavia, o mínimo de dois acórdãos

no mesmo sentido para a elaboração do respectivo projeto de súmula. (RI, art. 121, I, “e”).

6. O julgamento do incidente de uniformização de jurisprudência somente

comportará vista na própria sessão.

7. A decisão do Órgão especial sobre o tema, objeto de uniformização, constará de

acórdão e será irrecorrível de plano, salvo impugnação por embargos declaratórios, por tratar-

se de decisão interlocutória.

8. Somente após o julgamento do processo ou do recurso no órgão colegiado

suscitante, poderão as partes recorrer da decisão do incidente.

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O Regimento Interno do TRT-RJ prevê, ainda, a edição de Precedentes Normativos

que têm por finalidade uniformizar a jurisprudência em matéria de direito coletivo.

O projeto de edição, alteração ou cancelamento de Precedentes Normativos deve ser

instruído com a demonstração do atendimento a um dos seguintes requisitos: a) três acórdãos

da Seção Especializada em Dissídios Coletivos, decididos por unanimidade; ou b) cinco

acórdãos da Seção Especializada em Dissídios Coletivos, prolatados por maioria.

4. A LEI 13.015/2014.

4.1. Repercussões.

Embora se trate de valioso instrumento na busca pela “justiça ideal” ou “melhor

justiça”, o incidente de uniformização de jurisprudência não vem tendo a esperada aceitação

entre os magistrados que compõem o Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro.

Assim é que, apesar da determinação expressa no art. 896 da CLT e das vantagens

que oferece, verifica-se registro recente de apenas dois incidentes de uniformização de

jurisprudência, deflagrados no TRT da Primeira Região: o IUJ n. 0000263-34.2010.5.01.0

000 e o IUJ n. 00073000-69.2009.5.01.0000, ambos suscitados pela egrégia 9ª Turma, ao

constatar a ocorrência de divergência jurisprudencial quanto ao reconhecimento de diferenças

pecuniárias favoráveis aos empregados da CSN, decorrentes das rubricas denominadas

participação nos lucros dos exercícios de 1997,1998 e 1999.

De fato, a experiência vem demonstrando que o modelo de uniformização proposto

nos art. 476-479 do CPC e disciplinado nos art. 119 do Regimento Interno do TRT-RJ não

logrou obter a efetividade esperada.

Parte deste insucesso pode ser atribuído ao fato de que o instituto não teve, desde o

início, seus contornos bem definidos pelo legislador.

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Como destaca José Carlos Barbosa Moreira12, o Anteprojeto do Código de Processo

Civil de 1973, ao tratar do incidente de uniformização de jurisprudência, pretendeu adotar

solução inspirada nos assentos vinculativos do direito português. De tal forma, a tese jurídica

consagrada pelo voto da maioria absoluta dos membros efetivos do tribunal __ Supremo

Tribunal Federal ou Tribunal de Justiça__ seria obrigatória.

Todavia, esse tratamento dado ao instituto sofreu, à época, inúmeras críticas e foi

posteriormente abandonado, chegando-se, por fim, à redação atual dos artigos 476-479 do

CPC.

Assim é que, do modo como se encontra atualmente disciplinado no diploma

processual civil, o incidente de uniformização de jurisprudência apresenta um resultado

negativo quando examinado sob o prisma da relação custo/benefício.

Isto porque o Tribunal não fica obrigado a acatar o pedido de uniformização, como se

depreende do art. 477 do CPC, podendo ou não, reconhecer a divergência, o que imprime,

desde o início, à atividade do órgão suscitado um certo grau de discricionariedade.

Em outros termos: da paralisação do processo, por força do incidente, pode não

decorrer qualquer ganho à solução da lide.

Uma vez admitida a divergência, a tese vencedora que resultar do julgamento perante

o Tribunal Pleno ou Órgão Especial somente dará origem à edição de súmula caso tomada por

maioria absoluta.

Ainda assim, a súmula nascida a partir do incidente não tem força vinculante em

relação a julgamentos pendentes ou futuros sobre o tema objeto de seu enunciado.

Desta forma, considerados os escassos benefícios decorrentes da instauração do

incidente de uniformização, se comparados ao enorme custo representado pela suspensão do

processo, não é de se estranhar a baixa receptividade do instituto.

12 MOREIRA, José Carlos Barbosa, op. cit. p.7

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Nesse sentido, sustentou José de Albuquerque Rocha13, três anos após a entrada em

vigor do Código de Processo Civil:

A não visualização da tese jurídica, como norma de observância obrigatória pelo órgão uniformizador, transforma o instituto em um estorvo à administração da justiça, pois teremos mais um órgão a interpretar a lei, o que aumenta a possibilidade de interpretações divergentes, tornando, portanto, cada vez mais incerto o entendimento do Direito dentro de um mesmo Tribunal. Então, estaremos assistindo a um triste contrassenso: o instituto passa a ser o maior obstáculo à realização dos seus próprios objetivos.

Diante desse quadro, e da premente necessidade de, entre outros fins, reduzir a

quantidade alarmante de recursos de revista interpostos perante o Tribunal Superior do

Trabalho, foi levado à apreciação pelo Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 2214 de 2011,

de autoria do Deputado Valtenir Pereira.

Tal projeto foi concebido a partir de uma Resolução do TST de 2011, cujo objetivo

era imprimir maior celeridade ao processamento de recursos trabalhistas e culminou por dar

origem à Lei 13.015/2014.

Justifica-se no art. 5º, inciso LXXVIII da Constituição da República que assegura, no

âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a

celeridade de sua tramitação, aduzindo que tais direitos fundamentais merecem suporte

redobrado quando conciliados aos postulados da certeza e da segurança jurídica.

Sancionada em 21 de julho de 2014, a Lei n. 13.015/2014 entrou em vigor 60

(sessenta) dias após sua publicação, destacando-se como seu objetivo primordial acelerar a

solução dos processos que tramitam no judiciário trabalhista e, via de consequência, a entrega

da prestação jurisdicional.

Uma das modificações mais relevantes trazidas pela Lei 13.015/2014, diz respeito ao

novo tratamento conferido à obrigatoriedade de os Tribunais Regionais do Trabalho

13 ROCHA, José Roberto apud MANCUSO, p.289

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uniformizarem sua própria jurisprudência, exigência já prevista na redação anterior do art.

896, § 3º da CLT.

Assim é que, a teor do disposto no parágrafo 4º do artigo 896 da norma consolidada,

após a vigência da Lei 13.015/2014, constatada, de ofício ou mediante provocação de

qualquer das partes, ou do Ministério Público, a existência de decisões atuais e conflitantes no

âmbito do mesmo Tribunal Regional do Trabalho, sobre tema objeto de recurso de revista, o

TST determinará o retorno dos autos à corte de origem, de modo a que se proceda à

uniformização de jurisprudência.

Ressalta, ainda, o parágrafo 5º do mesmo dispositivo de lei, que a providência de que

trata o parágrafo 4º deverá ser determinada pelo Presidente do Tribunal Regional do Trabalho,

ao emitir juízo de admissibilidade sobre o recurso de revista, ou pelo Ministro Relator,

mediante decisões irrecorríveis.

Nesse sentido, em entrevista veiculada no site Consultor Jurídico14, o Ministro

Barros Levenhagen destacou que a alteração mais significativa determinada pela nova lei

ocorre nos critérios de admissibilidade dos recursos de revista, que são recursos ao Tribunal

Superior do Trabalho contra decisões proferidas nos Regionais. Na mesma ocasião, salientou

ainda que, pela regra antiga, bastaria que houvesse decisões conflitantes entre turmas de

diferentes Regionais para que o recurso subisse e fosse apreciado pelo TST.

Segundo o Ministro Barros Levenhagen, o Tribunal Superior não estava

uniformizando a jurisprudência nacional, mas sim a dos próprios Regionais.

Nos termos da nova lei, o recurso de revista somente chegará ao TST caso Tribunais

Regionais distintos editem súmulas ou fixem teses prevalecentes que sejam antagônicas,

cabendo ao Tribunal Superior, nesses casos, optar por uma das delas.

14CONSULTOR jurídico. Disponível em: <http://consultor-juridico.jusbrasil.com.br/noticias/129487474/com-

nova-lei-tst-unificara-jurisprudencia-do-pais-e-nao-de-turmas-diz-levenhagen>. Acesso em: 31 jul. 2014.

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Em crítica à sistemática anterior, o Ministro Barros Levenhagen destacou que era

extremamente trabalhoso, para o Tribunal Superior do Trabalho, admitir recursos de revista

por divergência entre turmas de Regionais diversos e que o novo modelo irá criar um filtro

eficaz, de modo a restringir consideravelmente a possibilidade de recurso ao TST: "Havia

turmas de tribunais que insistiam em firmar seu posicionamento, mesmo contrário à tese

predominante. Os próprios Regionais já podiam consolidar sua jurisprudência, mas não o

faziam. Dessa forma, é fácil entender o elevado número de processos que sobe ao TST, tendo

em vista que são 24 TRTs onde cada turma julga de forma diversa".

Com a entrada em vigor da Lei 13.015/2014, o Tribunal Superior, ao constatar, de

ofício, ou mediante provocação de qualquer das partes ou do Ministério Público do Trabalho,

a existência de teses conflitantes no âmbito de um mesmo Regional sobre o tema objeto do

recurso de revista, determinará o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que proceda à

uniformização de jurisprudência.

Desse modo, o recurso de revista somente será conhecido caso permaneça a

divergência entre a tese jurídica prevalecente no julgamento do incidente de uniformização

suscitado no âmbito de um determinado Regional, desde que não seja conflitante com súmula

ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho, e o posicionamento adotado

por outro Tribunal Regional do Trabalho.

Como observou o Ministro Levenhagen, após a vigência da nova regra, os Tribunais

Regionais deverão fazer o dever de casa.

Nesses termos, embora as súmulas editadas pelo TST não tenham caráter vinculante,

a Corte Superior somente conhecerá recursos de revista em que as súmulas, ou teses

prevalecentes dos Regionais em confronto sejam antagônicas quanto ao tema objeto do

recurso, o que leva à conclusão de que o incidente de uniformização de jurisprudência, antes

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mera faculdade, assumiu contornos de absoluta obrigatoriedade no âmbito dos Tribunais

Regionais do Trabalho, após a entrada em vigor da Lei n. 13.015/2014.

4.2. Indagações e perspectivas no TRT-RJ.

As modificações promovidas pelas novas regras suscitam uma série de dúvidas que

deverão ser enfrentadas pelos operadores do direito.

A primeira dessas indagações, e talvez uma das mais inquietantes, é a que decorre da

norma expressa no art. 3º do Ato n. 491/SEGJUD.GP, da Presidência do TST, segundo a qual,

para fins de aplicação dos §§ 4º e 5º do art. 896 da CLT (que tratam da determinação para que

se proceda à uniformização de jurisprudência quando constatadas decisões atuais e

conflitantes no âmbito de um mesmo Regional), no caso de persistir decisão conflitante com a

jurisprudência já uniformizada do Tribunal de origem, os autos deverão retornar à instância a

quo para sua adequação à súmula regional ou à tese jurídica prevalecente.

Convém ressaltar que, neste ponto, vislumbra-se, desde já, um provável

questionamento acerca da constitucionalidade/legalidade do dispositivo que determina essa

“adequação” do julgado à tese jurídica prevalecente, em razão de possível afronta à liberdade

de convencimento dos magistrados e ao devido processo legal, mas esta arguição diz respeito

aos órgãos judicantes e não se inclui no objeto deste estudo.

Embora questionável a legalidade da determinação que se extrai do dispositivo em

comento, na verdade, uma interpretação teleológica do novo parágrafo 6º do art. 896 da CLT

conduz a idêntica conclusão, isto é, a necessidade de adequação da decisão conflitante com a

súmula ou tese prevalecente consagrada no julgamento do incidente de uniformização de

jurisprudência.

Diante dessa e de outras alterações implementadas pela Lei n. 13.015/2014 no art.

896 da CLT, e pelo Ato n.491/SEGJUD.GP, emerge a necessidade de adequar o Regimento

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Interno do TRT-RJ à nova dinâmica conferida ao incidente processual que tem por finalidade

tornar homogêneas as decisões relativas a temas idênticos.

O primeiro ajuste que se faz necessário decorre diretamente dos parágrafos 4º e 5º do

artigo 896 da CLT que, com a redação que passou a vigorar a partir da vigência da Lei n.

13.015/2014, tornam obrigatória a uniformização de jurisprudência nos Tribunais Regionais

do Trabalho, quando constatadas decisões conflitantes sobre o mesmo tema objeto do recurso

de revista.

Deflagrado o incidente de uniformização de jurisprudência a decisão que resultar de

seu julgamento, seja por maioria absoluta, seja por maioria simples, deve refletir o

posicionamento da Corte, porquanto irá servir de paradigma para confrontar teses de outros

Regionais.

Observe-se que o art. 121, letra “e”, do Regimento Interno do TRT-RJ exige, para a

edição, alteração ou cancelamento de súmula, a partir de incidente de uniformização de

jurisprudência dois acórdãos do Órgão Especial, prolatados por maioria absoluta.

A ser mantida essa redação que impõe a necessidade de duas decisões por maioria

absoluta, ficará quase inviabilizada a elaboração de projeto de súmula a partir de um incidente

de uniformização de jurisprudência.

Isto porque, a teor da nova redação do parágrafo 3º do art. 896, constatada a

existência de duas decisões atuais e conflitantes no âmbito do mesmo Regional sobre o tema

objeto do recurso de revista, o TST determinará o retorno dos autos à Corte de origem, a fim

de que proceda à uniformização de jurisprudência.

Caso uma das teses seja vencedora por maioria absoluta, aquela Corte não mais

precisará enviar aquele tema para uniformização, uma vez que já constituirá “tese

prevalecente”, suficiente para a admissibilidade ou não do recurso de revista, o que tornará

inviável uma segunda decisão sobre a matéria controvertida e, em consequência, a proposta de

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súmula a partir daquele incidente de uniformização, se mantida a atual redação do art. 121,

letra “e”, do Regimento Interno.

De outra parte, se a tese vencedora resultar de maioria simples, será também

considerada “tese prevalecente” no TRT-RJ, pelo Tribunal Superior do Trabalho para fins de

admissibilidade do RR e, da mesma forma, não poderá servir de sustentação para projeto de

súmula, de acordo, tanto com o Regimento Interno da Corte Trabalhista da Primeira Região,

como com o que vem disposto no art. 479 do Código de Processo Civil.

De tal sorte, seria indicado repensar a exigência de duas decisões em incidente de

uniformização de jurisprudência como requisito para a elaboração de súmula regional.

A segunda alteração que se impõe decorre, igualmente, da obrigatoriedade da

uniformização de jurisprudência imposta pela Lei n. 13.015/2014.

Isto porque, nos termos da atual redação do art. 119, inciso V, do Regimento Interno

do TRT/RJ, é do Órgão Especial do Tribunal a competência para decidir pelo processamento,

ou não, do incidente de uniformização de jurisprudência.

Por sua vez, a nova redação do § 4º do art. 896 da CLT dispõe que o TST, de ofício

ou mediante provocação das partes ou do Ministério Público do Trabalho, constatando a

existência de decisões atuais e conflitantes no âmbito do mesmo TRT, determinará o retorno

dos autos à Corte de origem, a fim de que proceda à uniformização da jurisprudência.

A inovação promovida pela Lei n. 13.015/2014, em relação à sistemática anterior faz

com que passem a coexistir dois modelos de incidente de uniformização: um que é suscitado

pela Turma, na forma do art. 119, III, do Regimento Interno, e outro que é determinado pelo

TST.

Deste modo, enquanto no primeiro, o Órgão Especial, preliminarmente, reconhece ou

não a divergência acerca da interpretação do direito, no segundo, nos termos do art. 896, § 4º

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da CLT, o reconhecimento da divergência é feito pelo próprio TST que determina o retorno

dos autos ao Tribunal de origem para que já se proceda à uniformização.

Por esta razão acreditamos que venha a ser conveniente uma alteração no Regimento

Interno do TRT-RJ, de modo a normatizar, em separado, o processamento do incidente de

uniformização nos moldes da nova lei.

Outra questão que vem à tona, e merece ser discutida, diz respeito à previsão

expressa no art. 3º do Ato n. 491/SEGJUD.GP, da Presidência do TST, e à competência para

o julgamento do incidente de uniformização de jurisprudência no Tribunal Regional do

Trabalho da Primeira Região.

Dispõe o mencionado dispositivo, in verbis:

Para efeito de aplicação dos §§ 4º e 5º do artigo 896 da CLT, persistindo decisão conflitante com a jurisprudência já uniformizada do Tribunal Regional do Trabalho de origem, deverão os autos retornar à instância a quo para sua adequação à súmula regional ou à tese jurídica prevalecente no Tribunal Regional do Trabalho e não conflitante com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho. 15

Ao que nos parece, ao impor o retorno dos autos à instância a quo para que a decisão

conflitante se ajuste à súmula regional ou à tese prevalecente, a nova regra confere à tese

vitoriosa no julgamento do incidente de uniformização de jurisprudência um “efeito

vinculativo”.

De outra parte, o art. 119, inciso III do Regimento Interno do TRT-RJ atribui ao

Órgão Especial competência para a interpretação do direito controvertido quando suscitado

incidente de uniformização de jurisprudência.

Embora o art. 93, XI, da Constituição da República permita a delegação de

competência pelo Tribunal Pleno ao Órgão Especial nos tribunais com número superior a

15 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Biblioteca Digital. Disponível em:

<http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/advanced-search>. Acesso em: 03 mar. 2015.

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vinte e cinco julgadores, a ser mantido o julgamento do IUJ pelo Órgão Especial, poderá

acontecer de o entendimento esposado por apenas nove desembargadores __ maioria absoluta

no Órgão Especial __ser tomado pelo Tribunal Superior do Trabalho como o prevalecente no

TRT-RJ e paradigma a ser observado quando da apreciação da admissibilidade dos recursos

de revista.

E mais, tendo em vista que o quórum exigido para o funcionamento do Órgão

Especial do TRT-RJ, nos termos do art. 164 de seu Regimento Interno, é a maioria absoluta

de seus membros, o que corresponde a nove desembargadores, chegar-se-á a um resultado

inaceitável em que a tese adotada por apenas cinco desembargadores, no julgamento do

incidente de uniformização de jurisprudência, será considerada a tese prevalecente no

Tribunal, para os fins estabelecidos na Lei 13.015/2014.

Desta forma, à luz do que vem disciplinado no art. 3º do Ato n. 491/SEGJUD.GP,

deverá tal posicionamento ser seguido por todos os desembargadores que compõem a Corte

Regional, sob pena de uma decisão divergente ter os autos baixados ao TRT para adequação à

tese jurídica tida como prevalecente.

Observados os requisitos exigidos para a aprovação de projeto de súmula regional, o

Regimento Interno do TRT-RJ irá comportar uma situação inquietante: para a aprovação de

projeto de súmula, seguindo os trâmites atuais, exige-se o voto da maioria absoluta dos

membros que compõem a Corte, isto é, em torno de vinte e seis a vinte e oito

desembargadores.

Contudo, a tese jurídica prevalecente ou a súmula decorrente do julgamento de

incidente de uniformização de jurisprudência, nos moldes da Lei n. 13.015/2014, que irão

servir de paradigma para fins de admissibilidade do recurso de revista, nos termos da nova

redação conferida ao § 6º do art. 896 da CLT, e terão “efeito vinculativo”, caso mantida a

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votação no Órgão Especial, poderão ter suporte na deliberação de apenas nove

desembargadores.

Tendo em vista as alterações introduzidas pela Lei n. 13.015/2014, condicionando a

admissibilidade do recurso de revista à inexistência de decisões atuais e conflitantes, no

âmbito do mesmo Regional, sobre o tema objeto do recurso, e os parâmetros fixados pelo Ato

n. 491, a nosso ver, para que tais modificações surtam os efeitos prático/jurídicos pretendidos

__ estabelecer a tese jurídica prevalecente em um Tribunal Regional, acerca de um

determinado tema, para que sirva como paradigma de modo a viabilizar o conhecimento de

recurso de revista __ a uniformização de jurisprudência deve retratar, necessariamente, o

entendimento da maioria absoluta dos membros que compõem o Tribunal.

Tal posicionamento se coaduna com a regra expressa no art. 479 do Código de

Processo Civil, segundo a qual o julgamento, resultante do voto da maioria absoluta dos

membros que integram o tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente na

uniformização de jurisprudência.

Em síntese, consideramos prudente uma revisão do Regimento Interno do TRT-RJ,

de maneira que a competência para o julgamento do incidente de uniformização de

jurisprudência venha a ser atribuída ao Tribunal Pleno.

Além das alterações aqui sugeridas, o novo modelo de uniformização de

jurisprudência implementado pela Lei 13.015/2014 exige regulamentação própria, tendo em

vista suas especificidades, em confronto com o procedimento disciplinado no art. 119 do

Regimento Interno, que ainda permanece em vigor.

Por outro lado, convém ressaltar que a Lei 13.015/2014 não se propõe unicamente a

impor novos requisitos de admissibilidade ao recurso de revista.

Muito mais do que isso, ela traduz a expressão da vontade do legislador e do próprio

Tribunal Superior do Trabalho no sentido de que as Cortes Regionais coloquem

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definitivamente em prática a determinação contida no § 3º do art. 896 da CLT de que deverão

proceder obrigatoriamente à uniformização de sua jurisprudência.

Por fim, vale recordar que, em respeito à regra do art. 1.214 do CPC, os

procedimentos relativos à elaboração de súmulas e ao funcionamento dos mecanismos de

uniformização de jurisprudência previstos nos regimentos internos dos Tribunais Regionais

do Trabalho devem se harmonizar à sistemática do Código de Processo Civil.

5. MÉTODOS DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA

5.1. Críticas. Interesses em confronto. Ponderação de princípios.

Conquanto a homogeneização dos provimentos judiciais seja desejável e necessária

para a concretização dos princípios constitucionais da isonomia e da razoável duração do

processo, mostrando-se igualmente essencial, para fins de segurança jurídica e credibilidade

do Poder Judiciário, algumas ponderações devem ser levadas em conta no estudo dos métodos

de uniformização de jurisprudência.

Por esta razão, tanto a doutrina, quanto os magistrados, de um modo geral, têm

demonstrado cautela e até certa desconfiança quando se manifestam acerca do tema ora em

discussão.

De fato, não traria benefícios, muito pelo contrário, seria de extrema nocividade a

imposição de uma camisa de força que restringisse a atuação dos juízes de modo a impedir o

desenvolvimento de novas teses acerca de temas já pacificados pelas instâncias superiores.

Sob esse prisma, algumas observações merecem registro.

A primeira delas concerne ao perigo da generalização, porquanto a tese prevalecente

ou sumulada se afasta do caso concreto e sua redação irá atingir um universo de demandas

que, nem sempre, encontrarão similaridade com os processos originais.

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Outra crítica sempre presente quando se trata de homogeneização de julgados é a

estandardização da Justiça, o chamado engessamento dos órgãos judicantes, que se

transformariam em meros “carimbadores” de decisões previamente fixadas, com o

esvaziamento da aplicação da justiça ao caso concreto.

Por esta razão, observa-se entre os magistrados um justificado temor em relação a

essa possível estagnação do judiciário, amparados na constatação de que tanto o direito

quanto a sociedade se encontram em processo de permanente e célere evolução, o que impõe

a necessidade de revisar com maior frequência e agilidade questões que, em tempos passados,

eram dotadas de relativa estabilidade.

Quanto ao receio de generalização, incumbe aos órgãos sobre os quais recai a

responsabilidade de pacificar controvérsias jurisprudenciais o dever de zelar pela propriedade

da redação dos enunciados de súmula ou teses prevalecentes, de modo a que se ajustem

apenas a situações restritas que se amoldem perfeitamente ao paradigma fixado.

No que concerne ao risco de tolher a atividade jurisdicional, inviabilizando novas

formas de interpretar as regras jurídicas, quando as anteriormente estabelecidas já não

correspondam às mutações constantes nas relações sociais, torna-se claro que os mecanismos

de uniformização devem ser aparelhados com ferramentas que possibilitem a permanente

revisão e atualização das súmulas e teses prevalecentes no Regional, com vistas a acompanhar

a evolução social, observada, sempre, a necessidade de fundamentação adequada e específica,

de modo a respeitar o imperativo da estabilidade e segurança das relações jurídicas.

No mais, conquanto pertinentes, essas e outras ressalvas encontram resposta na

ponderação de interesses.

De certo que seria absurdo e intolerável querer que a jurisprudência, por natureza

dinâmica, ficasse imobilizada, tolhida de sua natural vocação evolutiva.

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Todavia, uma ponderação na avaliação do que ocorre na experiência judiciária

brasileira conduz à conclusão de que o problema não reside na divergência jurisprudencial

natural, mas na dispersão jurisprudencial excessiva, descontrolada e sem justificativas. Uma

discrepância tal, que não encontra suporte quer nas alterações legislativas, quer na

modificação de valores e quer nos interesses relevantes da sociedade. Essa pulverização desordenada de decisões judiciais expressando entendimentos

muitas vezes antagônicos ao julgar casos semelhantes de forma absolutamente diversa,

conduz o corpo social a tamanha perplexidade que culmina com o crescente e pernicioso

descrédito do Poder Judiciário.

Destarte, aquele que teria como função precípua dirimir conflitos de interesses, acaba

por se tornar o berço de novos atritos sociais, isto porque, ao solucionar de forma diversa dois

casos idênticos a conclusão imediata e inevitável é a de que uma das duas sentenças foi

injusta e o princípio constitucional da isonomia foi negligenciado.

De outra parte, vivemos um momento histórico no qual a segurança jurídica não se

restringe meramente a aspectos relacionados a valores internos da sociedade, mas repercute

também na esfera econômica do país, tornando-se pressuposto indispensável para a captação

de investimentos externos, catalisadores do processo de desenvolvimento socioeconômico da

população.

Nesse sentido, ressalta Donaldo Armelin16: “A imprevisibilidade das decisões

judiciais, que deveria manter-se em um mínimo razoável concernente a um fator aleatória,

provoca, de um lado, a insegurança dos litigantes e, de outro, o que é mais grave, o

esgarçamento do prestígio do Judiciário, perante os usuários dos serviços jurisdicionais”.

Assim, sopesados os interesses e valores em colisão, certo é que os mecanismos de

homogeneização dos provimentos judiciais constituem não apenas instrumentos valiosos no

16 ARMELIN, Donaldo, apud MANCUSO, op. cit. p. 304.

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combate à injustiça do tratamento desigual, como também contribuem, significativamente,

para a concreção da celeridade processual e consequente eficácia do provimento jurisdicional

e para a indispensável segurança jurídica, desejo e expectativa de toda a sociedade.

Da mesma forma, é certo que as teses jurisprudenciais prevalecentes, convertidas ou

não em súmulas de um determinado tribunal, não podem e não devem se tornar imutáveis.

Ao invés de eternizados, os entendimentos pacificados, súmulas ou teses jurídicas

prevalecentes, frutos da elaboração jurisprudencial em um determinado momento histórico e

sob circunstâncias específicas, devem ser dotados de mecanismos para sua constante

avaliação e revogação, o que, de modo algum, implicaria enfraquecê-los ou volatilizá-los.

Para tal fim, além dos critérios óbvios de renovação: edição de leis; súmula

vinculante do Supremo Tribunal Federal; julgamento pelo STF, com repercussão geral; edição

de súmula do STF ou de súmula ou orientação jurisprudencial do TST, em sentido oposto ao

da jurisprudência uniformizada do Regional, poderia ser estabelecido um critério temporal de

vigência, de modo a permitir a oxigenação da jurisprudência, ao mesmo tempo em que se

atenderia aos anseios de isonomia, segurança jurídica, celeridade processual e estabilidade

almejados pela nova lei.

5.2. Alternativa aos modelos tradicionais.

O § 1º do art. 555 do Código de Processo Civil, introduzido pela Lei n. 10.352/2001,

veio criar um novo mecanismo de uniformização de jurisprudência no direito positivo

brasileiro, destinado a homogeneizar a jurisprudência no âmbito de um mesmo tribunal.

O método da assunção de competência permite a remessa de recurso a um colegiado

maior, de modo a compor ou prevenir controvérsias entre Turmas ou Câmaras, quando a

matéria incidir sobre relevante questão de direito.

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Tal mecanismo visa a compor conflitos jurisprudenciais internos de determinado

tribunal, com função semelhante ao incidente de uniformização.

Para Alexandre Câmara17, essa técnica é mais vantajosa e eficiente do que o

incidente de uniformização quando se trata de prevenir e compor dissídios, uma vez que, no

caso, não há uma cisão da competência, mas a sua assunção.

Assim, o colegiado maior irá assumir inteiramente a competência para o julgamento,

não ficando seu pronunciamento restrito a fixar a tese jurídica prevalecente, como acontece no

incidente de uniformização, onde, depois de firmada pelo tribunal a interpretação que deve ser

adotada acerca da matéria objeto do incidente, os autos retornam ao órgão fracionário para

que prossiga no julgamento.

Dessa forma, o juiz relator, constatando a existência de relevante questão de direito,

entendendo conveniente prevenir ou compor eventuais divergências acerca da matéria, entre

câmaras ou turmas do tribunal, propõe seja o recurso julgado pelo Eg. Tribunal Pleno.

A vantagem desse procedimento seria a agilidade, que, como assinala Cândido

Rangel Dinamarco18, é o traço marcante do novo instituto: “O novo sistema evita os males da

duplicidade de pronunciamentos do tribunal, um pelo órgão competente para uniformizar e

outro por aquele que decide sobre o recurso – agilizando os serviços jurisprudenciais ao

mandar que em uma só sessão e mediante um só acórdão o recurso já fique julgado. ”.

Esse novo instrumento de uniformização de jurisprudência, por suas características,

caso venha a ser aceito e posto em prática nos tribunais, poderá trazer enorme proveito para o

superior interesse dos jurisdicionados em razão da segurança jurídica proporcionada pela

estabilização dos julgados aliada à celeridade que imprime à solução dos litígios.

17CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit, p.54.

18 DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.26.

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Vale registrar que o mecanismo em comento é perfeitamente compatível com o

direito processual do trabalho, haja vista que o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região,

em inovação promovida pela Emenda Regimental n. 1/2002, incorporou a medida no art. 55,

inciso X, de seu Regimento Interno, que passou a atribuir ao relator do processo competência

para, ocorrendo relevante questão de direito, que faça conveniente prevenir ou compor

divergência entre turmas do Tribunal, propor seja o recurso julgado pelo Egrégio Tribunal

Pleno, que, reconhecendo o interesse público na assunção de competência, poderá fazê-lo nos

termos do art. 555, § 1º do Código de Processo Civil.

6. CONCLUSÃO

No Brasil, onde as fontes tradicionalmente aceitas das obrigações repousam, em

última análise, na lei, algumas deficiências ficam claras ao observador aguçado que se depara

com três tipos de situação relativamente comuns: leis que não são aceitas pelo grupo social e,

portanto, não atingem seu objetivo, excesso de legislação e normas com redação deficiente

que culminam por gerar um exagerado conflito de interpretações e assoberbar o poder

judiciário.

Consequência imediata deste desajuste é a ausência de uma previsibilidade e de uma

segurança minimamente aceitáveis nas relações sociais.

Entendemos que compete à jurisprudência a função de zelar pelos valores esperados

de justiça, certeza, segurança, igualdade e estabilidade, fim que, para ser atingido, exige uma

atuação coerente e uniforme dos tribunais.

Por esta razão, embora o ordenamento jurídico pátrio ainda tenha assento sobre a

norma escrita, codificada, cresce, cada vez mais entre nós, a importância da jurisprudência

que deve atender não apenas à função de sinalizar ao legislador a necessidade de alterar a

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normatização de determinadas matérias, como também à de servir de parâmetro para o

julgamento de casos semelhantes.

Ao se analisar a questão das divergências jurisprudenciais e da necessidade de

uniformização, o que se observa é que o problema real não é a divergência em si, mas a

dispersão excessiva de julgados acerca de tema idêntico que culmina por impelir o

jurisdicionado a participar de verdadeira loteria judiciária, na qual, dependendo da sorte, terá

ou não seus pedidos atendidos.

O que deve, portanto, nortear os preceitos que regulam a harmonização de julgados é,

antes de tudo, o equilíbrio, uma vez que seria de todo desarrazoado e inviável engessar de

forma rígida e indefinidamente o processo intelectivo dos magistrados diante das incessantes

alterações com as quais se depara na realidade fática.

Todavia, a constatação de que a variação de posicionamentos é geralmente necessária

e até benvinda, não importa em aceitação da anarquia que caracteriza a excessiva dispersão

jurisprudencial acerca de temas idênticos.

O saudoso Ministro Victor Nunes Leal19 já ensinava:

Firmar a jurisprudência, de modo rígido, não seria um bem, nem seria viável. A vida não para, nem cessa a criação legislativa e doutrinária do direito. Mas vai uma enorme diferença entre a mudança, que é frequentemente necessária, e a anarquia jurisprudencial, que é descalabro e tormento. Razoável e possível é o meio-termo.

Assim, como todas as outras questões, da vida e do direito, a uniformização de

jurisprudência deve ser enfrentada com prudência, ponderação, equilíbrio e razoabilidade.

19 LEAL, Victor Nunes, apud CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit. p. 51.

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