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Doença de Crohn A doença de Crohn é um processo inflamatório crônico de etiologia ainda desconhecida, não curável por tratamento clínico ou cirúrgico e que acomete o trato gastrointestinal de forma uni ou multifocal, de intensidade variável e transmural. Os locais de acometimento mais frequentes são o intestino delgado e o grosso. Manifestações perianais podem ocorrer em mais de 50% dos pacientes1. Manifestações extra intestinais associadas ou isoladas podem ocorrer e atingem mais frequentemente pele, articulações, olhos, fígado e trato urinário. A doença afeta indivíduos de qualquer idade, mas o diagnóstico é mais frequentemente realizado na segunda ou terceira décadas. Diagnóstico O diagnóstico da doença de Crohn resulta da análise de dados clínicos (da anamnese, exame físico e proctológico completo), endoscópicos, radiológicos, laboratoriais e histológicos2 . As manifestações clínicas são mais frequentemente de natureza inflamatória, obstrutiva e/ou fistulizante, as quais têm maior ou menor valor prognóstico. Sintomas de diarreia crônica, dor abdominal, perda ponderal e sangramento retal direcionam a anamnese. Os sinais clínicos incluem desnutrição, palidez cutâneo- mucosa, dor, massa abdominal, distensão ou fistulização na

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Doenças de Chron e outras

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Page 1: Doenças

Doença de Crohn

A doença de Crohn é um processo inflamatório crônico de etiologia ainda

desconhecida, não curável por tratamento clínico ou cirúrgico e que acomete o

trato gastrointestinal de forma uni ou multifocal, de intensidade variável e

transmural.

Os locais de acometimento mais frequentes são o intestino delgado e o grosso.

Manifestações perianais podem ocorrer em mais de 50% dos pacientes1.

Manifestações extra intestinais associadas ou isoladas podem ocorrer e

atingem mais frequentemente pele, articulações, olhos, fígado e trato urinário.

A doença afeta indivíduos de qualquer idade, mas o diagnóstico é mais

frequentemente realizado na segunda ou terceira décadas.

Diagnóstico

O diagnóstico da doença de Crohn resulta da análise de dados clínicos (da

anamnese, exame físico e proctológico completo), endoscópicos, radiológicos,

laboratoriais e histológicos2 . As manifestações clínicas são mais

frequentemente de natureza inflamatória, obstrutiva e/ou fistulizante, as quais

têm maior ou menor valor prognóstico. Sintomas de diarreia crônica, dor

abdominal, perda ponderal e sangramento retal direcionam a anamnese. Os

sinais clínicos incluem desnutrição, palidez cutâneo-mucosa, dor, massa

abdominal, distensão ou fistulização na parede abdominal. O exame

proctológico quando positivo é diagnóstico de uma ou mais fissuras anais,

plicomas anais edemaciados, fístulas e celulite ou abscesso e podem ocorrer

inicialmente de forma isolada, assim como as manifestações extraintestinais1 .

A dilatação aguda e tóxica do cólon (megacólon tóxico) pode representar uma

apresentação incomum, porém aguda e de elevada gravidade. A apresentação

na forma de diarreia requer diagnóstico diferencial com colites infecciosas

(virais ou bacterianas) e com parasitoses intestinais. A apresentação de ileíte

aguda requer diagnóstico diferencial com a apendicite aguda. A colite de Crohn

requer diagnóstico diferencial com a retocolite ulcerativa. Em até 20% dos

casos, esgotados os atualmente disponíveis recursos de investigação, não é

possível realizar diagnóstico, classificando-se a doença como colite

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indeterminada10. O diagnóstico da doença de Crohn intestinal também requer

diferenciação com outras formas de enterocolites (isquêmica, actínica ou

induzida por antibióticos) e com a síndrome do intestino irritável6 . As

manifestações extraintestinais mais frequentes correlacionam-se de forma

direta com a intensidade do processo inflamatório intestinal e podem ser

cutâneas (eritema nodoso e pioderma gangrenoso), articulares periféricas

(artrites) ou axiais (espondilite anquilosante e sacroileíte), oculares (conjuntivite

e uveíte) e hepáticas (colangite esclerosante primária). Colecistolitíase e

nefrolitíase podem resultar de mal absorção. A realização de exames

contrastados (trânsito intestinal e enema opaco e com duplo contraste) é

necessária para confirmação da localização e extensão, bem como para o

diagnóstico de complicações. Exames contrastados com a utilização de

contraste baritado não devem ser realizados em pacientes agudamente

doentes ou que necessitem de internação hospitalar. O emprego da

ultrassonografia de abdome e da tomografia computadorizada (TC) deve ser

realizado preferencialmente durante as crises ou exacerbações, na presença

de massa abdominal ou suspeita de abscesso. Além disso, esses exames são

de utilidade na avaliação de complicações abdominais e pélvicas. Servem ao

planejamento pré-operatório e também podem ser utilizados para direcionar

punções. A ressonância magnética (RM) pode ser empregada em pacientes

alérgicos a contraste iodado e em mulheres grávidas e parece fazer diferença

na avaliação de doença anorretal em algumas casuísticas. A RM de alta

resolução tem boa acurácia para detectar fístulas anais da doença de Crohn e

fornece importantes informações no planejamento pré-operatório das fístulas

recorrentes. Radiografias abdominais simples devem ser realizadas para a

avaliação de pacientes com quadro de abdome agudo ou com suspeita de

megacólon tóxico. A colonoscopia é utilizada para confirmar a suspeita clínica

de doença de Crohn e para a obtenção de biopsias. A endoscopia é mais

sensível do que os exames contrastados no que se refere à extensão da

doença. Quando há forte suspeita de colite e os achados à sigmoidoscopia ou

ao enema opaco são negativos, a colonoscopia com múltiplas biopsias pode

determinar presença e intensidade da inflamação no cólon, bem como

possibilita a visualização da mucosa do íleo terminal. Associadamente, a

colonoscopia com biopsias é eficaz à realização do diagnóstico diferencial

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entre colite de Crohn e retocolite ulcerativa, bem como na avaliação de outras

formas de colite (actínica, isquêmica e microscópica). Ainda que a avaliação

endoscópica não esteja correlacionada com a atividade da doença, a avaliação

colonoscópica de anastomoses intestinais pode estar relacionada à

possibilidade de recidiva da doença após tratamento cirúrgico. O estudo

histológico das biopsias obtidas por colonoscopia possibilita a comprovação

diagnóstica, o diagnóstico diferencial entre colite de Crohn e retocolite

ulcerativa, bem como diagnosticar displasia e câncer nos casos de colite de

longa evolução.

Tratamento

Para pacientes assintomáticos ou em remissão e que nunca foram submetidos

a tratamento cirúrgico, não há indicação para qualquer tratamento. As

recomendações para intervenção medicamentosa ou cirúrgica resultam da

localização da doença, intensidade da apresentação, resposta à terapia

medicamentosa pregressa e do diagnóstico de complicações. O objetivo inicial

do tratamento clínico é produzir remissão da atividade da doença. Pacientes

para os quais foi obtida remissão devem ser considerados para tratamento de

manutenção. Pacientes sintomáticos e em corticoterapia ou com febre,

vômitos, dor abdominal ou com suspeita de obstrução intestinal ou em

desnutrição evidente devem ser internados.

O tratamento cirúrgico da doença de Crohn por meio de ressecção ou

enteroplastia está indicado para as complicações e quando caracterizada

intratabilidade clínica ou doença refratária. Para os pacientes com doença

perianal, a drenagem de abscessos está sempre indicada, bem como as

operações de fistulotomia ou drenagem por seton, nos casos mais

sintomáticos. A proctectomia está indicada para os casos de supuração

importante associados à retite grave e incontinência anal.

Doença de Whipple

A doença de Whipple é uma doença bacteriana, multissistémica e rara. O

agente etiológico é a bactéria Tropheryma whipplei, um bacilo gram-positivo da

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família das Actinobacterias e do grupo Actinomycetes. Por ser uma doença

sistémica, a doença de Whipple tem manifestações clínicas muito variadas com

particular envolvimento do intestino delgado, do sistema nervoso central, das

articulações e do coração. A forma mais comum de apresentação inicial é na

forma de uma doença gastrointestinal manifestando-se como uma síndrome de

má absorção com dor abdominal, diarreia e perda ponderal. A obtenção de

biópsias do intestino delgado e de outros órgãos acometidos, com base nos

sintomas do paciente, constitui a abordagem primária e mais usada de

diagnóstico da doença. O tratamento é à base de antibioterapia prolongada,

porém o melhor esquema terapêutico ainda não está completamente definido.

Para além disso, mesmo quando detectada e adequadamente tratada, a sua

evolução clínica tem de ser monitorizada durante a terapêutica, bem como por

vários anos após o término desta, de modo a evitar recidivas tardias.

A doença de Whipple é muito rara, com fatores genéticos e imunológicos do

hospedeiro a poderem influenciar o curso da doença. Dado que as

características clínicas da doença de Whipple clássica são muito inespecíficas,

o diagnóstico é frequentemente um desafio. Para além disso, pode manifestar-

se de forma localizada ou sob a forma de uma infeção aguda auto-limitada,

formas que não se enquadram no conceito clássico da doença. Por estas

razões, a doença de Whipple nem sempre é diagnosticada, com significativo

prejuízo para a sobrevivência dos doentes, sendo na maioria dos casos

descritos identificada tardiamente. Como tal, leva à necessidade de um

estabelecimento rápido de um diagnóstico e de uma ampla exploração clínica

em cada caso.

Doença Celíaca

A doença celíaca (DC) é uma intolerância à ingestão de glúten, contido em

cereais como cevada, centeio, trigo e malte, em indivíduos geneticamente

predispostos, caracterizada por um processo inflamatório que envolve a

mucosa do intestino delgado, levando a atrofia das vilosidades intestinais, má

absorção e uma variedade de manifestações clínicas. As proteínas do glúten

são relativamente resistentes às enzimas digestivas, resultando em derivados

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peptídeos que podem levar à resposta imunogênica em pacientes com DC. As

manifestações clínicas da DC podem envolver o trato gastrointestinal, assim

como pele, fígado, sistema nervoso, sistema reprodutivo, ossos e sistema

endócrino. A dermatite herpetiforme ocorre em 10% a 20% dos pacientes e é

uma manifestação patognomônica. Até recentemente, o diagnóstico de DC era

reconhecido apenas em pacientes com manifestações clínicas típicas ou com

elevado grau de suspeita. O diagnóstico geralmente é realizado em crianças

com a síndrome má absortiva. Após o surgimento de testes sorológicos de alta

acurácia e maior atenção dos médicos para manifestações atípicas, tem

aumentado a prevalência de DC e seu diagnóstico fora da faixa pediátrica. A

prevalência é estimada em torno de 1:100 na população em geral. As

manifestações clínicas da DC podem variar. Há importante predisposição

genética nos pacientes com DC, caracterizada pelos marcadores de superfície

HLA-DQ2 e HLA-DQ8. O glúten interage com os marcadores HLA, causando

uma resposta imune anormal da mucosa e lesão tecidual. Uma revisão

demonstrou que a relação de pacientes com DC diagnosticada e não

diagnosticada pode ser de 1:7. Um estudo indica que mais de 36% dos

pacientes com DC, haviam recebido diagnóstico de SII (síndrome do intestino

irritável) previamente. Doença celíaca não tratada tem alta morbimortalidade.

Anemia, infertilidade, osteoporose, e câncer, principalmente, linfoma intestinal,

estão entre os riscos de complicação em pacientes sem tratamento. A

investigação diagnóstica de DC deve ser realizada antes da introdução do

tratamento que é a dieta isenta de glúten, pois a dieta pode alterar

negativamente os resultados dos testes sorológicos e melhorar a histologia. O

diagnóstico de DC nem sempre é fácil de ser realizado. Em torno de 10% dos

casos, há dificuldade de diagnóstico por achados discordantes entre sorologia,

clínica e histologia. O diagnóstico de DC deve ser cogitado em todo paciente

com diarreia crônica, distensão abdominal, flatulência, anemia ferropriva,

osteoporose de início precoce, elevação de transaminases, familiares de

primeiro e segundo graus de pacientes com DC, SII, hipocalcemia, assim como

na deficiência de ácido fólico e vitaminas lipossolúveis. Além disso, DC está

associada a diversas doenças como diabetes melito tipo I , hipo e

hipertireodismo, síndrome de Sjogren, cirrose biliar primária, hepatite

autoimune, autismo, depressão, epilepsia, ataxia cerebelar, infertilidade,

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puberdade tardia, deficiência de IgA seletiva, Síndrome de Turner, Síndrome

de Down e neuropatia periférica.

O principal tratamento é a dieta com total ausência de glúten; quando a

proteína é excluída da alimentação os sintomas desaparecem. A maior

dificuldade para os pacientes é conviver com as restrições impostas pelos

novos hábitos alimentares. A doença celíaca não tem cura, por isso, a dieta

deve ser seguida rigorosamente pele resto da vida. É importante que os

celíacos fiquem atentos à possibilidade de desenvolver câncer de intestino e a

ter problemas de infertilidade.

Referências

http://www.scielo.br/pdf/ramb/v56n1/27.pdf

Doença de Whipple, Um diagnóstico difícil, Marta Andrade Fevereiro.Dissertação para

obtenção do Grau de Mestre em Medicina, Covilhã, maio de 2013.

http://www.projetodiretrizes.org.br/8_volume/28-Doenca.pdf