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Semiologia Frequência Cardíaca

Ebook - Frequencia Cardiaca · Semiologia Frequência Cardíaca . Caso Clínico: Paciente feminina, 44 anos, diagnosticada há 5 meses com granulomatose com poliangiíte em terapia

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Page 1: Ebook - Frequencia Cardiaca · Semiologia Frequência Cardíaca . Caso Clínico: Paciente feminina, 44 anos, diagnosticada há 5 meses com granulomatose com poliangiíte em terapia

Semiologia

Frequência Cardíaca

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Caso Clínico:

Paciente feminina, 44 anos, diagnosticada há 5 meses com granulomatose com poliangiíte em terapia imunossupressora com ciclofosfamida e metilpredniso-lona. Foi admitida no hospital em mau estado geral, desidratada, sonolenta e apática. Ao exame não apresentava alterações respiratórias ou cardíacas. A te-rapêutica foi considerada falha e foi iniciada terapia imunobiológica com rituxi-mabe. No primeiro dia de internação, após convulsão tônico-clônica com cerca de 1 minuto de duração, a paciente apresentou os seguintes achados: FC: 32bpm; PA: 84 x 48 mmHg. O ECG revelou um BAV completo.

Qual a relação do achado do ECG e a FC?

Introdução:

Em condições fisiológicas, o ritmo sinusal da frequência cardíaca é estabelecido pela ação do sistema de condução elétrica do coração. Inicialmente o nodo si-nusal, localizado no átrio direito, dispara uma descarga elétrica que é distribu-ída entre os átrios através das fibras das vias internodais, despolarizando as células musculares e gerando, assim, a contração atrial. Antes do impulso elé-trico chegar aos ventrículos, o estímulo é retardado pelo nodo átrio-ventricular, permitindo o enchimento dos ventrículos. A partir do nodo AV, o impulso chega aos ventrículos seguindo o feixe de hiss, que se divide em ramos esquerdo e di-reito, que por sua vez ramificam-se nas fibras de purkinge, ocorre assim a des-

polarização das fibras musculares de VE e VD, gerando a contração ventricular.

Esse processo ocorre em intervalos regulares e entre 60 a 100 vezes por mi-nuto em situações de repouso em média na população em geral. Esses valores não devem ser seguidos com muito rigor, é preciso analisar o contexto clínico e as características de cada paciente, tais como idade, prática de atividade física, comorbidades e uso recente de substâncias cronotrópicas (positivo ou nega-tivo).

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Além do mecanismo auto excitatório do nodo sinusal, as fibras cardíacas so-frem influência do sistema nervoso autônomo simpático e parassimpático e do sistema endócrino.

O SNA simpático atua principalmente através da liberação de noradrenalina, neurotransmissor que terá efeito cronotrópico e inotrópico positivos, ou seja, aumenta a frequência cardíaca e a força de contração da musculatura do cora-ção. Já o SNA parassimpático tem como principal atuante a acetilcolina, neuro-transmissor que tem ação cronotrópica e inotrópica negativas, sendo assim, di-minui a frequência dos batimentos e a contratilidade das fibras cardíacas.

Acerca da modulação pelo sistema endócrino, as principais glândulas envolvi-das são as adrenais e a tireoide, ambas moduladas por ação da hipófise e hipo-tálamo, portanto, esses compartimentos também são fundamentais nessa re-gulação. Tanto os hormônios tireoidianos quanto a adrenalina, a aldosterona e o cortisol possuem um efeito cronotrópico positivo, seja por atuação direta nos

receptores cardíacos ou ação indireta no SNA.

• Semiotécnica:

A forma mais fidedigna de se verificar a frequência cardíaca é através da aus-culta cardíaca. A contagem de batimentos reflete quantos ciclos cardíacos com-

pletos em um determinado intervalo de tempo, no nosso caso, um minuto.

Para uma ausculta bem executada, o ideal é um ambiente silencioso e privativo, com o tórax do(a) paciente despido. Posicionamos o diafragma do estetoscópio sobre um dos focos de ausculta – no caso da frequência cardíaca, não haverá diferença entre os focos –, então atentamos aos sons cardíacos, mais especifi-camente às bulhas. Cada bulha se repete uma vez por ciclo, podemos escolher B1 ou B2 e contarmos quantas vezes se repetem num intervalo de um minuto, marcado no relógio. Cada “TUM-TA” é um batimento apenas, não dois.

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Caso estejamos diante de um paciente que possui bulhas acessórias, a conta-gem não será feita de forma diferente, seja ritmo em 2, 3 ou 4 tempos, cada bu-lha seguirá se repetindo apenas uma vez por ciclo.

Em suma, é preciso contar os ciclos cardíacos, como dica para não confundir, escolher uma bulha e contar quantas vezes ela se repete no intervalo de um mi-nuto, medido no relógio.

Outra forma de se verificar a FC é através da palpação de pulsos periféricos, sendo o mais utilizado o radial. Nesse caso, o exame adequado demanda a mão do paciente em repouso e completa supinação. Apoia-se o polegar no dorso da mão do paciente e utiliza-se as polpas dos dedos indicador e médio, contro-lando a força de compressão sobre a artéria radial (costuma localizar-se entre o tendão dos flexores e o processo estiloide do rádio. Para a palpação do pulso da mão direita do paciente, o examinador usa sua mão esquerda e vice-versa. A quantidade de pulsações verificadas dentro de um intervalo de um minuto, contado com auxílio de um relógio, será a frequência do pulso, que em condi-ções fisiológicas é equivalente à frequência cardíaca.

Esse método não é o ideal porque em algumas situações patológicas, a fre-quência cardíaca se encontra maior que a frequência do pulso, tendo um resul-tado enganoso.

Em ambos os métodos, deve-se evitar atalhos. É importante contar os batimen-tos durante todo o minuto, contar 15 ou 30s e depois multiplicar o resultado por quatro ou por dois pode acarretar em erros, já que o ritmo pode estar irre-gular.

• Achados e correlações clínicas:

Na verificação da FC, o paciente pode estar normocárdio, (60-100bpm); bradi-cárdico (<60bpm); ou taquicardico (>100bpm). O contexto clínico de cada paci-ente deve ser analisado para avaliar a significância dos valores encontrados.

Tanto a bradicardia quanto a taquicardia são achados inespecíficos que podem estar presentes em diversas condições, tanto fisiológicas quanto anômalas, po-dendo essas serem cardíacas ou extra cardíacas.

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As principais situações em que a bradicardia e a taquicardia podem estar pre-sentes estão relacionadas à sua regulação. Portanto, causas de distúrbios na condução do potencial elétrico produzido no nodo sinusal; na gênese do poten-cial de ação no nodo sinusal; na atividade simpática e parassimpática; na secre-ção de hormônios que atuem nos receptores das fibras cardíacas ou no centro regulador no hipotálamo.

Como exemplos de condições clínicas que podem cursar com bradicardia, te-mos:

• Hipotireoidismo; • Hipoptuitarismo; • Intoxicação por nicotina; • Uso excessivo de beta bloqueadores; • Bloqueio átrio ventricular.

No caso de identificar uma taquicardia, podemos pensar, entre outras, nos se-guintes exemplos:

• Hipertireoidismo; • Feocromocitoma (tumor de adrenais com hipersecreção de catecolami-

nas); • Insuficiência cardíaca congestiva; • Intoxicação por cocaína; • Acidose metabólica; • Pericardite aguda; • Sepse; • Choque hemorrágico;

• Anemia.

OBS: Existe uma condição chamada síndrome da taquicardia postural ortostá-tica (POTS) na qual a frequência cardíaca aumenta em pelo menos 30bpm em indivíduos de até 19 anos e ao menos 40bpm em pessoas com mais de 19 anos assim que assumem a posição ereta. Pode cursar associada a sintomas de intolerância ortostática, como vertigem, fadiga, palpitação, síncope entre outros, com exceção da hipotensão postural.

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• Desfecho do caso clínico:

Em condições específicas, como em um bloqueio átrio ventricular completo, é possível que tenhamos um marca-passo ectópico, ou seja, o ritmo não é mais sinusal, não está sendo controlado pelo nodo sinusal, mas sim por outro local

do coração, sendo o mais comum o nodo átrio-ventricular.

No caso apresentado, a paciente apresenta uma bradicardia (FC = 32bpm) e o ECG identificou um bloqueio átrio ventricular completo, que provavelmente é o que causou a bradicardia, já que nessa situação o nodo átrio ventricular se torna o marcapasso para a contração ventricular, contudo a geração do impulso elétrico nesse nodo é mais lenta, tornando as contrações ventriculares menos frequentes e a frequência cardíaca diminuída.

A causa do bloqueio foi uma complicação incomum da doença de base autoi-mune que a paciente tem (granulomatose com poliangiíte). O tratamento do bloqueio foi feito com marcapasso permanente, que pôde ser retirado depois que foi atingida a remissão com a terepêutica com rituximabe (medicamento imunobiológico que consiste em anticorpos cujo efeito esperado é a depleção de linfócitos B), já que nesse ponto os sinais e os sintomas cardíacos foram

cessados.