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O regresso do “bolachão” Será que o vinil é uma tendência para ficar ou é apenas uma moda? Foi o que o Som à letra tentou descobrir através de uma visita ao mercado do vinil no Porto. p.2 ENTREVISTA “Gosto de música acima de tudo” p.8 PUB Livro Português sobre Doors premiado em Londres p.7 Rui Pedro Silva é jornalista e autor do livro ”Contigo torno-me real “ . O anúncio dos vencedores foi feito no passado dia 10, mas a entrega dos prémios ocorreu no dia 17 de Dezembro .A obra recebeu uma menção honrosa na área de não- ficção. António Lobo Antunes critica preços dos livros em Portugal p7 Motown celebra 50 anos p7 Música e bebés p14 PUB

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O primeiro jornal do projecto Som À Letra

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O regresso do “bolachão”

Será que o vinil é uma tendência para ficar ou é apenas uma moda? Foi o que o Som à letra tentou descobrir através de uma visita ao mercado do vinil no Porto. p.2

ENTREVISTA

“Gosto de música acima de tudo” p.8

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Livro Português sobre Doors premiado em Londres p.7

Rui Pedro Silva é jornalista e autor do livro ”Contigo torno-me real “ . O anúncio dos vencedores foi feito no passado dia 10, mas a entrega dos prémios ocorreu no dia 17 de Dezembro .A obra recebeu uma menção honrosa na área de não-ficção.

António Lobo Antunes critica preços dos livros em Portugal p7

Motown celebra 50 anos p7

Música e bebés p14

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O regresso dos “bolachões” Uma visita ao mercado do vinil no Porto

As lojas são significativas e as vendas evoluíram positivamente em Portugal. É saudosismo? A curiosidade dos mais jovens? A suposta qualidade? Ou simplesmente porque o “bolachão” é muito mais bonito? Foi o que o Som à Letra tentou descobrir, através de visitas a algumas lojas de música na cidade do Porto.

A moda apresenta tendências, verificáveis sobretudo no vestuário. De facto, uma moda conflui estilos de anos que marcaram uma época (nacional ou estrangeira). No

entanto, actualmente as tendências retrospectivas têm-se alargado a outros campos, sendo a música um deles. O comércio do Porto abarca na sua oferta estas duas tendências. Basta um olhar sobre a panóplia de lojas de roupa, mas também de lojas de música existentes, onde o vinil ocupa lugar de destaque. Não somente para a velha geração, mas também para os mais jovens. A Rua Miguel Bombarda é palco de vanguardismo artístico através das suas exposições, do centro comercial Miguel Bombarda, mas também através de um edifício subdividido em diferentes tipos de arte, onde o vinil também se integra: o espaço Artes em Partes. Por outro lado, a Rua do Almada abraça igualmente uma variedade de lojas que apostam bastante no mercado do vinil: Louie, Louie; Lost Underground; Retroparadise; Zona 6. Desde o início deste ano, a imprensa tem-se reportado ao recrudescimento de interesse pelo vinil. O jornal Correio da Manhã, por exemplo, noticiava a 28 de Agosto deste ano: “Vendas de discos em vinil disparam em Portugal”.” Os dados são da Associação Fonográfica Portuguesa: a venda de álbuns em formato de vinil aumentou 54.250%, enquanto o comércio de singles em vinil cresceu 1009%”.Além disso, a 15 de Setembro o Diário de Notícias noticiava que a “Música clássica já reage ao regresso dos discos de vinil”. Isto significa que existe uma preocupação em editar obras em vinil sob uma perspectiva comercial. “Ver álbuns de vinil no escaparate de uma loja de discos vai sendo, novamente, uma realidade cada vez mais frequente. O reencontro com o velho formato, que foi protagonista no mercado discográfico entre finais dos anos 40 e inícios de 90, deu-se com o pop/rock e, logo depois, com o jazz”, revela a notícia. Rui Quintela, que trabalha na loja de música Louie, Louie há quatro anos referiu que” metade das nossas

vendas é vinil”, apesar de apostar na venda de outros dispositivos. No site da loja evidencia-se um comércio que abrange dispositivos como o vinil, mas também CD's e DVD's.

U m mercado de nichos Apesar da tendência actual de recurso ao vinil, o nosso país não pode deixar de n egar a crise económica. Esta crise financeira repercute-se nos “bolsos dos consumidores”. Nestas alturas, a primeira coisa a cortar são os gastos de luxo, onde a cultura se insere. Idas a

teatros, compras em lojas culturais, são tidas como gastos superficiais numa época onde poupança deve ser a palavra de ordem.

Por outro lado, existe um determinado tipo de comércio que não se enquadra nas lojas “comerciais” e que se encontra dependente de gostos selectivos, heterogéneos. Por consequência, na actualidade, este tipo de lojas apresentam uma dupla dificuldade: alcançar o público selectivo e enfrentar a actual crise económica. Paulo Vinhas, funcionário de uma das duas lojas de vinil (vinil novo) do

edifício Artes em Partes reporta-se ao seu trabalho como “quase um negócio de risco, com alguma vanguarda”. Mas desdramatiza o actual contexto económico em paralelismo com a sua actividade:”Estamos em crise desde 1975. Nunca vivi noutro regime económico, e sempre para um nicho de mercado”.

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Ver reportagem áudio

somaletra.blogspot.com

Moda e tendência para ficar

A Rua Santa Catarina no Porto também proporciona um culto ao”bolachão”, de uma forma estilística. Lurdes Caldas vende acessórios nesta rua tradicional portuense. Um desses acessórios são as malas em vinil. As malas já estão à venda de acordo com a comerciante, desde o ano passado . E a adesão juvenil é significativa. No entanto , a comerciante refere que as malas em vinil “abraçam todos os estratos de idade”. Quanto à permanência do “bolachão” , não tem dúvidas :é para ficar. Até porque traduz muita história e por isso não pode ser esquecido. “Vai ficar para sempre como uma grande recordação” , acrescenta .

“ Metade das nossas vendas é vinil”

Rui Quintela ,da loja Louie,Louie

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“N ão é a FNAC que vai afectar o meu negócio:Não colidimos”

O contexto actual revela-se complexo não somente a nível económico, mas também a nível concorrencial. O concorrente mais directo é a FNAC, que absorve grande parte do mercado cultural. Esta constatação não é interpretada de forma igual pelos funcionários destas lojas. Paulo Vinhas refere que “é muito difícil as coisas sobreviverem. Mas não depende da FNAC, não depende de outros mega centros comerciais. Depende da estrutura cultural de um país apenas. Não é a FNAC que vai afectar o meu negócio: não colidimos”. Rui Quintela, apesar de integrar o vinil no seu negócio, não se considera de forma alguma ameaçado pela FNAC. Aliás, considera a sua loja equiparável ao nível da concorrência com a F, considerando o estabelecimento Louie, Louie uma “loja generalista e não de nichos”.

emos raridades, muitas, muitas mesmo. Só o tempo é que vai dar-lhes atenção”.

De facto, enquanto a FNAC exibe em vinil trabalhos como o single “Umbrella” da Rhianna em parceria com o rapper Jay Z, deste ano, a loja Retroparadise por exemplo, possui a primeira prensagem do yellow submarine dos Beatles, entre outras raridades. “A grande diferença da FNAC para estas lojas é que segunda mão é sempre segunda mão. No novo não há comparação possível. Estamos a falar de reedições que a FNAC tem, que não são más, mas que estão um bocadinho aquém dos orignais e eu em particular procuro ter originais”, refere Rosali Speda, funcionária da loja Retroparadise. Paulo Vinhas acentua igualmente o carácter singular dos produtos que oferece:” A loja é de largo espectro musical, desde as coisas experimentais

ma questão de qualidade A informação ocupa espaço. No caso da informação áudio ou vídeo o espaço é bastante alargado. Nos finais dos anos 70, os engenheiros da Phillips (holandesa) e da Sony (japonesa) tentavam desenvolver um sistema sonoro baseado num medium que fosse mais pequeno que o LP, que comportasse tantos ou mais minutos de música e cuja produção ficasse barata. Desenvolveram, mais ou menos em conjunto, o CD (compact-disc), um suporte que permitia conter até 74 minutos de música com qualidade. Assim, a partir da década de 80 e início da década de 1990, a invenção

dos compact discs (CDs) prometeu maior capacidade, durabilidade e clareza sonora, sem ruídos, tornando os discos de vinil obsoletos. No entanto, apesar do quase desaparecimento do vinil, este actualmente emerge pelas suas intrínsecas vantagens: qualidade sonora, beleza, objecto de colecção, identificadas tanto por jovens como pelos mais “experientes”. Manuel Silva, de 16 anos destaca a qualidade sonora:”é muito melhor mesmo”. “Eu em casa não consigo ouvir um CD, muito menos um mp3. Acho o mp3 muito bom para uma pessoa fazer pesquisa e ficar a conhecer muitas músicas. Há uma rapidez de circulação de informação. Mas para quem gosta de ouvir música, os chamados audiófilos, preferem_ eu prefiro _ o vinil”, revela Rosali Sepeda.

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Na loja retroparadise as raridades em vinil rodeiam a espaço inteiro

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Paulo Vinhas da loja de vinil novo do edifício Artes em Partes revela-se céptico quanto à continuidade deste mercado `, “é muito difícil as coisas sobreviverem”

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Já Paulo Vinhas acentua o carácter tangível do vinil em relação aos formatos actuais (digitais):”Tem a ver com o ser um objecto tangível ou não. O vinil é um objecto tridimensional, perdura no tempo, prolonga-se, enquanto os outros formatos são muito voláteis, não ocupam espaço, são muito portáteis, descartáveis “. Mariana Faria, funcionária da loja Zona 6, considera que o vinil possui todas as vantagens:” A nível do som, são duas coisas completamente diferentes. O CD é um som digital, mais frio. Não tem os mesmos baixos, graves, sub-graves. São completamente diferentes. O som do vinil é um som com muito mais corpo. É muito diferente ouvir um baixo num vinil e ouvir um baixo no CD. Quem passa música sabe desta realidade”.

O recrudescimento do interesse pelo vinil por parte dos jovens

“Num tempo em que a música, através dos leitores mp3, conhece desmaterialização, o prazer do vinil regressou aos hábitos dos melómanos. Curiosamente, é o público mais jovem quem está a aderir em força à "nova" tendência”, noticiava o DN a 15 de Setembro deste ano. Esta realidade sente-se nas lojas visitadas. Sabemos que os mais velhos (os contemporâneos do vinil) são a priori mais exigentes na compra deste dispositivo áudio. A exigência ao nível da qualidade é um requisito comum entre estes velhos consumidores. “Em geral os mais velhos têm mais preocupação de coleccionador, com edições especiais, estado dos discos. Os jovens interessam-se mais pela música do que o objecto em si para coleccionar”, explica Francisco Afonso. Estabelecer paralelismo entre estes diferentes tipos de consumidores revela-se uma tarefa complexa para alguns lojistas desta área. Como refere Paulo Vinhas, “são dois tipos de clientela, porque ofereço uma determinada estética para os novos e mantenho discos mais clássicos, mais contemporâneos para os mais velhos. Não há comparação possível: são dois mundos diferentes”. Óscar Pinho, funcionário da loja Lost Underground refere que, “Os gostos variam bastante ao nível de exigências de qualidade de material. Há pessoas exigentes, tanto numa camada como noutra. Não há propriamente uma demarcação”. Rosali Speda, por seu turno, apresenta uma perspectiva diferente acerca do aumento do padrão de exigência por parte dos jovens em relação ao vinil: “Alguns jovens começam também a ter essa preocupação, pelo simples facto de começarem a trabalhar na área. Há muitos DJs agora de vinil. Há poucos de CD, porque é obvio que o vinil tem muito mais margem de manobra que o CD“. No entanto, nem só os jovens DJs se interessam pelo ancestral “bolachão”. O jovem Luís Silva, por exemplo, há cerca de um ano decidiu explorar o vinil. “Não tanto pelo vinil em si, mas mais pelo lado

de colecção. Desde que apareceu o formato digital que o lado físico está em queda, e isso muito por culpa do CD. Agora como praticamente o formato digital deixou de ser físico, o vinil começou a ocupar esse espaço. Por isso, muitas pessoas,

mesmo que não tenham o vinil como eu, sentem a necessidade de comprar vinil só para terem em vez de um quadrado minúsculo, uma peça de colecção”. Rodrigo Vilela, outro jovem, visita a loja Lost Underground com o objectivo de encontrar”raridades em vinil, mas também pelos CD´s e DVD´s”. Refere, contudo que ainda não sabe se esta tendência do interesse dos jovens pelo vinil seja para ficar, uma vez que denota no seu meio ainda “muita dependência do mp3, CD e ipod”.

Zo na 6-aposta na gravação e venda do vinil

No site desta loja evidencia-se uma tentativa de singularização da mesma, dentro do mercado musical: “A zona 6 é muito mais do que uma loja, é um projecto de cultura urbana”. Mariana Faria, funcionária da loja Zona 6, refere que “a nossa actividade principal, para além de ser uma loja de discos trabalha sobretudo com géneros urbanos. Estamos a falar de música electrónica de hip hop, reggae. Temos um serviço direccionado à produção. Hoje em dia quem usa vinil para gravar música são os DJs. Ora o conceito DJ está intimamente ligado ao de cultura urbana.” É uma loja, ainda bastante recente (surgiu em 2006) que representa uma aposta no vinil por

parte dos jovens. No site é verificável esta situação:”Todas as semanas produtoras e bandas editam e comercializam os seus trabalhos de suporte analógico/vinil. Apesar das novas conquistas digitais, o CDJ ou os emuladores de Vinil, o suporte analógico está em alta nos meandros da Cultura Urbana”. Não obstante, a forma de sobrevivência no mercado efectua-se através de duas lojas distintas: uma na internet, outra na Rua do Almada. A loja na internet “trabalha com pessoas de quase todo o mundo. Temos um serviço único em Portugal, não o único no mundo. Mas temos bons preços face a outros produtores de vinil à unidade. Então não nos podemos queixar. Isto não é como vender música comercial”, acrescenta.

P erspectivas futuras Uns lojistas são optimistas, outros mais cépticos e outros realistas. É o caso de Rui Quintela que ao ser questionado sobre as perspectivas futuras, referiu: “Quem é que tem boas perspectivas futuras hoje em dia?”. Ainda assim, não considera que este mercado esteja condenado ao desaparecimento, muito pelo contrário. Paulo Vinhas encontra-se mais céptico, uma vez que” este negócio pode sobreviver, mas é muito difícil. Aqui em Portugal é muito difícil. Somos um país pequeno, periférico, o que dificulta”. Rosali Speda, da loja Retro Paralise, refere que este tipo de mercado pode sobreviver, “ a nível mais internacional se calhar, e a internet, a esse nível, permite uma circulação mundial, refiro-me à venda e compra para fora. Não há-de ser só nacional este mercado. O interesse era que o fosse. “ “Não houve uma grande cultura aqui em Portugal a nível de música estrangeira. Há uma certa ignorância e desconhecimento de grandes nomes que nem chegaram à Europa, ficaram-se apenas pelos EUA”, acrescenta. Óscar Pinho considera que o mercado vai manter - se no futuro, tal como está:” “é uma coisa muito circunscrita: nichos, e acho que vai manter –se assim. Não vai morrer nem vai crescer. Há pessoas que se vão interessar, outras que se vão desinteressar. Não auguro nenhum mau futuro, nem grande “. Já Francisco Afonso refere que é possível este mercado “manter-se, mas com dificuldades. Crescer mais é difícil. Está no limite. Mas os que existem, conseguem sobreviver”. Sugestão: A Resistência do vinil Há-que retirar proveito das potencialidades da internet. O youtube, por exemplo exibe um documentário brasileiro “Resistência do Vinil”, cujos lojistas e respectivos estabelecimentos se

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até às

Luís Guerra colabora na revista musical Blitz. É um conhecedor de música em geral e de tudo o que a envolve. Quanto ao vinil, não tem um relacionamento directo. Os seus 31 anos não lhe permitem um background que acenda o saudosismo que envolve os contemporâneos do “bolachão”. Ainda assim, mostrou-se disponível para falar sobre esta actual “tendência” juvenil de adesão ao LP. Para o jornalista musical, o vinil não sai do mercado.

Luís, encontra diferenças na audição em vinil em comparação com o CD ou mp3? Quando ouvimos um som demasiado cristalino, pensamos imediatamente que foi obra de alguma cosmética de estúdio. Quando o som nos parece mais encorpado mais orgânico, temos a tendência para achar que era originalmente assim, e é isso que o vinil reproduz. Mas prefere o vinil em relação ao cd ou mp3? Como não sou um purista do som, no sentido enquanto aspecto técnico, cedo à facilidade de pegar no mp3 e ouvir a música que me interessa. Acho que o vinil tem um lado ritualístico que implica disponibilidade. Será óptimo no fim de um jantar pegar num disco de vinil com os amigos , perder três, quatro horas a ouvir música e a pegar nos vinis, etc. Mas, para mim não faz sentido, na minha profissão muito menos, onde tenho de ouvir discos com alguma regularidade. Não fará sentido todo esse protocolo. Em termos funcionais é contraproducente. Mas noto de facto um reavivamento . Há uma tendência muito engraçada que vamos falar na próxima revista que é o sleeveface, por exemplo vamos pegar na capa do Prince e tentar criar uma situação ambiente , vestuário adequado para aquela capa. Inclusive saiu agora um livro sobre sleeveface. Actualmente verifica-se um renovado interesse dos jovens pelo vinil. Considera que é uma tendência para ficar ou é simplesmente uma moda? Acho que não é uma coisa nem outra. Acho que não é uma moda. Não é algo que se sinta nas ruas, no dia-a-dia. Uma pessoa vai eventualmente a três, quatro blogues sobre música …eu pelo menos nunca verifiquei se aquela pessoa de 14, 15 anos tivesse comprado discos em vinil. As pessoas falam daquilo que vão tirando da internet, eventualmente dos cds que vão comprando. Mas não me parece que seja uma moda entendida como algo que se vê de forma imediata como tendência. Sei que há pessoas mais jovens que , eventualmente por terem acesso às tendências musicais, é natural que haja um certo afecto por objectos vintage. O mesmo acontece com a roupa, óculos. Vejo isso mais como uma procura de uma identidade. Dificilmente ouço hoje em dia alguém dizer que é melhor ouvir em vinil do que em cd. Mas como caracteriza este renovado interesse juvenil pelo LP? Tem passado por ser uma aposta estética , não tanto uma aposta ética, no sentido em que vamos lá julgar pela beleza do objecto , pela história que ele tem lá dentro, por um certo lado cool, retro, vintage, etc, do que propriamente pela sua qualidade. Não me parece que seja uma moda. Parece-me algo que existe em nichos, associado a uma banda, coleccionador, fetichista por objectos. Não me parece algo que seja do senso comum. Como qualquer objecto que passa de moda , volta depois a estar na “moda”. Então não prevê o fim do vinil? Não prevejo isso, porque haverá sempre gente interessada .A história da música pop rock não é tão longínqua quanto isso. Cada década que passa , introduz novidades , mas também apresenta revivals. Até porque o vinil já não se faz em grandes quantidades, eventualmente desde inícios dos anos 90. Já lá vão quase vinte anos. e se nesses vinte anos sobreviveu... Com todo este glamour do vinil acho difícil desaparecer.

A loja Retroparadise inicialmente vendia roupa de várias décadas marcantes na história (60,70). No entanto , as tendências retro actuais acabaram com esta vertente de negócio da loja de música portuense.

Acho que o vinil tem um lado ritualístico que implica

disponibilidade. Para mim não faz sentido, na minha profissão muito menos, onde tenho de ouvir discos com alguma regularidade. Não fará sentido todo esse protocolo. Em termos funcionais é contraproducente.

São várias as “raridades” que a loja Retroparadise disponibiliza, incompatíveis com a FNAC, como refere a funcionária da loja, Rosali Speda

“Os jovens interessam-se mais pela música do que o objecto em si para coleccionar”, explica Francisco Afonso.

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Lobo Antunes critica preço dos livros em Portugal Irene leite [email protected]

Na cerimónia de entrega do prémio Clube Literário do Porto, aproveitou para criticar os preços dos livros em Portugal Há países com maior poder de compra onde[os livros] são muito mais baratos” como Alemanha, Holanda e Noruega., refere o escritor português. Os portugueses vivem tão mal e os livros são “indecentemente

caros”,.Aproveitou ainda para denunciar que “quem lê não são os classes altas , mas a classe média baixa, como se pode observar nas feiras do livro”. Lobo Antunes não deixou de afirmar que em Portugal, os governos pouco têm feito pela cultura desde o 25 de Abril de 1974.:”Quem tem trabalhado com a cultura são as autarquias e são

fundações" como aquela a que está ligado o Clube Literário do Porto, a Fundação Dr. Luís de Araújo, defendeu. O premio clube literário do Porto António Lobo Antunes é o quarto autor distinguido pelo Clube Literário do Porto, depois de Mário Cláudio, Baptista Bastos e Miguel Sousa Tavares Pelo prémio, recebeu 25 mil euros que deu ás filhas. Lobo Antunes, de 68 anos, foi apresentado pelo jornalista, comentador e professor Carlos Magno como um autor que "escreve sobre a contemporaneidade como poucos o fazem neste país", fazendo uso de uma "ironia absolutamente a toda a prova". Ao receber das mãos do presidente da Fundação Dr. Luís de Araújo, Augusto Morais, um elefante prateado, Lobo Antunes não deixou de recordar que quando escreveu o livro "Memória de Elefante", que foi o primeiro de uma longa bibliografia, lançado em 1979, ninguém, na altura, queria publicar este livro, que acabou por ser um êxito editorial. A ligação ao Porto O escritor não esquece que tem, no seu entender, "uma dívida de gratidão muito grande para com a cidade", que vem do tempo em que esteve internado num hospital lisboeta, a lutar contra um cancro. "Quando há dois anos estive muito doente, recebi sete, oito mil cartas e a maior parte eram do Porto. Isso é uma coisa que nunca poderei pagar", explicou.

CULTURA

Livro português sobre Doors ganha menção honrosa no Festival do Livro de Londres Irene Leite [email protected] Rui Pedro Silva é jornalista e autor do livro ”Contigo torno-me real “ . O anúncio dos vencedores foi feito no passado dia 10, mas a entrega dos prémios ocorreu no dia 17 de Dezembro em Londres. A obra recebeu uma menção honrosa na área de não-ficção.

Rui Pedro Silva, 32 anos, considerou esta menção honrosa uma "agradável surpresa", até porque o livro foi apresentado a concurso em edição portuguesa. "Contigo torno-me real" foi editado em Portugal em 2003 pela editora Afrontamento como uma obra sobre o culto a Jim Morrison, vocalista do grupo norte-americano Doors, falecido em 1971 aos 27 anos. Em Março deste ano, Rui Pedro Silva reeditou uma segunda versão desta obra. Aí para além de contar a história de Jim Morrison foca também a dos Doors, através de testemunhos e documentos . A obra ultrapassa as 500 páginas. "Deste ponto de vista acho que o livro é único no mundo, porque reúne depoimentos inéditos", sublinhou Rui Pedro Silva. Entre eles contam-se, por exemplo, os de Bill Siddons, agente dos Doors entre 1968 e 1972, e de Jac Holzman, fundador da Elektra Records, que lançou o grupo, e que assina o prefácio do livro. Há ainda

participações de músicos portugueses, que falam da importância dos Doors na sua formação musical, como Zé Pedro, Pedro Abrunhosa, Jorge Palma, Rui Reininho, Tiago Bettencourt e a fadista Mariza. O autor, com formação em jornalismo e eleito em 2003 o maior fã português dos Doors, dedicou seis anos de trabalho ao grupo norte-americano, focando as diferentes facetas da banda e reunindo vários testemunhos.

Apesar de ser admirador dos Doors - "já faz parte do meu ADN" -, Rui Pedro Silva disse que este livro não foi feito na perspectiva de um fã, mas com um sentido factual, "com um forte sentido de jornalismo de investigação". "Os Doors foram uma banda muito completa. Não era só a música, havia também o cinema, a forte influência literária, de Rimbaud, de William Blake, da Beat Generation, e pouca gente sabe disso. A morte prematura de Jim Morrison fez com que se falasse apenas dos

Motown celebra 50 anos Irene Leie [email protected]

A editora reveladora de talentos da soul criada por Berry Gordy está prestes a cumprir meio século em Janeiro O legado construído pela Motown Motown moldou a música americana da década de 1960, definiu o presente e traçou o futuro da soul, a casa de Marvin Gaye, Stevie Wonder, Temptations, Smokey Robinson & The Miracles, Supremes, Jackson 5 ou Martha & The Vandellas. O seu slogan, "The sound of young America" (o som da América jovem), apontava a uma geração para quem a segregação racial era violência sem sentido. “A raça nunca importou. Éramos como uma família :tocávamos juntos, saíamos juntos, partilhávamos experiências juntos. A Motown era daltónica “, refere Dennis Coffey , guitarrista dos Funk Brothers. É classificada como a editora que levou a música negra ao público branco, mas essa é apenas parte de uma história iniciada em Janeiro de 1959, quando Berry Gordy contrai junto de familiares um empréstimo de 800 dólares. Entre 1961 e 1981 a Motown produziu 110 êxitos de top 10_quase um por mês, o que ia ao encontro de fábrica imparável de sucessos. Actualmente, a Motown pertence à Universal Music e tem no seu catálogo nomes como Erykah Badhu ou Q-Tip. Amy Whinehouse tirou inspiração para o álbum Back to Black nos melhores singles desta editora.

om à letra NOTÍCIAS

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“Dedos na ficha” foi a frase que Isidro Lisboa, locutor na Rádio Nova, do Porto, escolheu para caracterizar a sua vida. O Som à letra foi tentar descobrir o outro lado deste profissional, durante a sua emissão da tarde nesta rádio da invicta. Será que existem dois Isidros completamente diferentes (um pessoal e outro profissional) ou, pelo contrário completam-se?

“Gosto de música acima de tudo”

Entrevista de Irene Leite

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stava um dia chuvoso, para uma caminhada na rua João de Barros. Ainda assim, correu-se o risco. Valia a pena.

Três da tarde. Chegada ao edifício da Rádio Nova. Só se ouvia o telefone a tocar. Mas, no meio de toda aquela azáfama diária, característica de qualquer rádio, estava o locutor Isidro Lisboa, completamente disposto a demonstrar um lado que os ouvintes raramente têm acesso: o seu lado pessoal. O desafio foi aceite. Com o olhar dividido entre os ouvintes e o gravador, Isidro Lisboa, respondeu a TUDO que lhe foi questionado.

Deixando de parte o Isidro profissional, como se define como pessoa?

[hesitação] É um tipo dinâmico, pelo menos ele gosta de o ser. Não se sente bem estagnado, parado, impávido e sereno. Não…gosto de estar em plena actividade.

Profissionalmente sempre foi assim. Enquanto estudava, meti-me na rádio. Ou seja, tenho que arranjar sempre algo mais àquilo que faço. Sinto-me bem quando consigo uma fasquia bem elevada de actividade. Profissionalmente acho que sou também um bocado esquizofrénico. Gosto de estar aqui, mas daqui um bocado gosto de estar ali [aponta para outro ponto da sala], a fazer outra coisa dentro do mesmo ambiente, mas às tantas completamente diferente.

O Isidro profissional é completamente diferente do Isidro social? Ou existe paralelismo?

Existe algum paralelismo. [pausa] Sou um pouco eléctrico. E quando estou em contacto com as pessoas, há sempre aquela ideia de falar muitas coisas, muito rápido, de falar isto e aquilo e ramificar para todos os lados. É um pouco isso. Não há uma grande diferença. Eu costumo dizer que sou uma pessoa extremamente honesta. Às vezes tramo-me por isso. Mas vem de família. Somos muito frontais, muito lúcidos, muito transparentes, mas muito honestos também. E naquilo que faço, seja na televisão, na rádio, seja a escrever, seja em público, isto é, no meu âmbito profissional, não vejo grande alteração.

Quando estou em contacto com as pessoas ou com a família, não me apercebo de grandes alterações.

Existe por vezes, enquanto profissional, da rádio, da televisão, uma postura que se eleva, um nariz que se levanta, um umbigo que cresce. [com ar pensativo] Acho que já não existem pessoas como eu …(risos) …Estou a brincar (risos), mas é um pouco isso. Eu há pouco quando dizia que às vezes me tramo por ser honesto, passa um pouco por isso… Não consigo pôr uma máscara e fazer agora de o senhor profissional da rádio, técnico da comunicação, e manter uma postura mais formal e séria. Nem vou falar em estrelato, não tem nada a ver com isso. Mas não, acho que a minha simplicidade e a minha forma de estar enquanto pessoa, acho que está também presente quando

abro o microfone e quando digo alguma coisa às pessoas.

Desde quando a música está presente na sua vida, de uma forma mais séria, diria até mesmo apaixonada? Houve influência de alguém em especial?

A paixão surgiu por volta dos oito, nove anos.

Houve uma influência do meu tio-padrinho. Era baixista numa banda de uma espécie de rock progressivo, uma coisa estranha para a altura. Ele pôs-me lá em casa um gira-discos portátil, algo que não devia ter feito. Devia-me ter oferecido às tantas uma bola, ou uma bicicleta.

Começou, sobretudo a partir daí. Já havia uma ligação. Lembro-me que já ouvia muito rádio. Não sei explicar porquê. Mas lembro-me de ouvir muito rádio .

Mas acho que o meu tio-padrinho é um dos principais culpados. Ele tinha uma série de profissões, entre elas era cabeleireiro. Lembro-me de estar na barbearia, ele tocava para lá umas músicas e pedia-me para cantar. Eram aquelas músicas infantis, tipo “atirei o pau ao gato”. (risos)

Depois, há desde logo uma ligação precoce com os discos, e a possibilidade de me deixarem mexer neles, riscá-los e partir agulhas.

Acho que sempre me senti muito tocado pela música, e nem tanto pelos livros.

Na adolescência verifica-se um verdadeiro culto à música e a um estilo em específico. Sentiu essa realidade actual, na sua adolescência?

[hesitação] Essa paixão pela música levou-me a um desejo de conquista, de querer saber mais, de me aproximar de diferentes estilos e não um em particular.

Acho que nunca consegui fazer uma triagem dos diferentes estilos, nem de ter a minha “prateleira”. Eu consigo ouvir de tudo. Posso dizer, por exemplo, que no último fim-de-semana ouvi uma colecção das primeiras ramificações jazzísticas à base do Jean "DJango" Reinhardt, que é um dos nomes que eu gosto imenso, pelo ritmo e pela execução da guitarra. Se eu comentar com os meus amigos mais próximos (que sabem que eu ando sempre à procura das músicas novas, para onde a música electrónica vai, quais são as novas

tendências/estilos) que andei a ouvir num dia inteiro “DJango” Reinhardt , eles começam a olhar para mim de lado como a dizer :”Este tipo não é normal” (risos). Mas tão depressa posso estar ouvir Reinhardt como o novo álbum, por exemplo do Camané que acho que é um disco tremendo, fantástico, ou como também posso estar a ouvir a coisa mais ruidosa como o último disco dos AC-DC.

Não posso dizer um estilo em concreto [breve hesitação]

Mas… existem alguns estilos que não gosto tanto, como um rock mais duro, um heavy metal, mais aquelas variantes.

Em resumo, tenho uns “filtros“ muito largos (risos).

Tem algum hobbie que queira destacar em particular? Passo discos em bares e em discotecas. É um gozo tremendo fazer com que as pessoas se agitem um bocadinho. Pegando na resposta anterior, a forma como eu organizo as músicas abrange vários estilos diferentes entre si. Eu tento manter um ambiente de festa. Mas, tanto posso passar uma música da década de setenta, como posso estar a passar algo perfeitamente actual. E gosto de fazer essa oscilação. Pegar quem sabe, numa peça pequena de dois, três minutos dos anos trinta, quarenta, festiva, e encaixar com alguma sanidade ali. Não sou rocker, louco por pop ou por heavy metal. Gosto de música acima de tudo.

Não teve nenhum CD que o tenha incitado cada vez mais à investigação musical, ou que o tenha marcado de alguma forma? [breve hesitação] Essa é complicada... é a velha história. Para quem gosta tanto de música, devora tantos discos… Eu vou dar um exemplo: eu tenho em casa uns largos milhares de títulos em vinil e em CD. Se há discos marcantes …há. Posso dizer que na altura dos oito, nove anos, quando apareceu o gira-discos, que havia um vizinho meu mais velho que me ofereceu L.A Woman dos Doors. Posso dizer que foi um disco marcante, porque foi algo estranho. Imagine-se um catraio a ouvir este disco, difícil,

Outros exemplos…talvez os Pixies. Inglaterra, América… Dos Pixies é difícil dizer um disco marcante. A banda em si marcou-me muito, e continua a ser das minhas favoritas.

“Acho que já não existem pessoas como eu”

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E quando sentiu que a sua vida profissional estaria ligada à música?

[pausa] Naquela fase da pirataria, ilegalidade dos alvarás em que me contratam para passar discos, e para ser o “DJ”de uma discoteca pequena no concelho de Castelo de Paiva. Nessa altura estava também com remuneração, e já com um estatuto profissional enquanto radialista. Com uma remuneração muito mais interessante. Era como hoje em dia se pode chamar um “Super Star DJ”, num circuito muito pequeno. Percebi que gostava imenso do que estava a fazer. Estava a fazer rádio. Gostava daquela sensação de ser ouvido por muitas pessoas. E depois com esse lado profissional de perceber que , quer numa actividade quer noutra, era bem remunerado. Principalmente nas discotecas. Lembro-me da minha mãe estranhar pagarem-me tanto nas discotecas, numa altura em que eu só tinha dezasseis anos. Eles vinham-me buscar, arranjavam-me apartamento, uma série de regalias. Eu comecei a pensar: eu gosto de fazer isto, estamos a divertir-nos e ainda por cima estes tipos pagam-me. É esta parte. É o objectivo de qualquer pessoa. Estar a fazer o que gosta e a ser bem remunerado por isso. Mas a verdade é que as pessoas olham para nós e acham: é pá… estes tipos têm uma profissão fantástica, estão ali a passar uns discos e pagam-lhes bem. (risos) Bem, foi mesmo por esta altura, dos meus dezasseis anos que senti realmente que me ia baldar aos estudos. Queria mesmo estar horas a fio a fazer rádio.

Investiu na formação profissional como radialista, DJ? Não. Eu vou dizer aqui umas coisas que as pessoas quando lerem, vão ficar a chamar-me nomes… Por exemplo, aqui na Rádio Nova, apareceram muitos estagiários. Eu sei que os estágios servem para as pessoas tomarem contacto com a actividade, com as máquinas. Mas achava estranhíssimo aparecer aqui uma estagiária de Jornalismo ou Ciências da Comunicação …eu não queria dizer isto, mas é quase como ensinar-lhe o “a. e , i, o,

o ,u”. Como fazer um REC num leitor de gravação. Eu sempre duvidei muito das nossas instituições, e de quem está à frente deste sector.

Mas acha que para ser locutor de rádio é necessário ter qualidades inatas, ou é algo moldável com o tempo?

Não acredito na velha história da vocação. Acho que naturalmente as coisas cultivam-se. Gostava que existissem uns centros de formação para as pessoas virem para o mercado ou, pelo menos para o estágio, já com umas bases bem estruturadas. E o que me parece é que não. Bem, eu vou admitir aqui uma coisa, que para quem já está no meio jornalístico, não deve ser novidade nenhuma. Percebi a determinada altura quando estava em Paredes, que me fizeram alguma pressão para obter a carteira profissional de jornalista. Porque já tinha alguns anos de redacção, experiência. Eles disseram: isto é simples, passamos aqui dois requisitos a confirmar que existem anos de experiência com as assinaturas dos directores, e para a semana tens aqui a tua carteira de jornalista. Eu disse que não, lá está, a velha questão da honestidade. Eu não sei se realmente sou bom ou mau jornalista, se tive formação suficiente. Não frequentei nenhum curso superior de Jornalismo. Comecei a fazer rádio muito cedo. Mas o facto de andar só a frequentar rádio, não será o suficiente, confesso isso. Suguei muito dos bons profissionais com quem trabalhei. Andava sempre atrás deles, de forma a saber a melhor maneira de elaborar uma notícia, de fazer um lançamento, ou seja todas estas partes técnicas. Não tenho nenhuma formação jornalística. Mas sinto-me um bocado triste quando vejo pessoas que têm carteira de jornalista e quando na realidade às tantas… pronto é mau o que vou dizer a seguir… de pessoas que para escrever um parágrafo cometiam três, quatro erros ortográficos e, no entanto, eram jornalistas licenciados.

Agora também colaboro na área da

publicidade. Nós temos que ganhar a vida (risos). Já agora (risos) não é compatível com a profissão de jornalista gravar campanhas de publicidade.

Qual é a importância da rádio na sua vida? Não queria dizer coisas más, coisas estranhas agora (risos). Porque eu entretanto casei, tenho as duas maiores empresas lá em casa que são os meus filhos, com quem eu me divirto imenso. Ganhei outro interesse pela vida, altera muito. Mas a rádio, a música... Todo este universo, todo este contacto com as pessoas, os discos, os músicos, os concertos. Toda esta loucura…Eu acho que ainda não sou o zombie, porque existem uns que se dizem melómanos, que querem saber todas as informações dos músicos. Acho que ainda não sou maradinho . Gosto de saber as novidades, de estar informado. Por outro lado, uma boa percentagem das pessoas com quem convivo, também estão ligadas ao meio, seja na vertente jornajornalística, sejam profissionais ligados ao som [pausa]. A rádio tem um peso muito forte na minha vida. Ocupa uma

Gostava que existissem uns

centros de formação para as

pessoas virem para o mercado

ou, pelo menos para o

estágio , já com bases bem

Domina ainda a rádio, ou já consegue estabelecer algum equilíbrio com a vida familiar? Acho que fui conseguindo. Mas é complicado quando há rádio, os bares, as discotecas e noitadas. Mas de uma forma consciente ou inconsciente, não sei, fui tentando manter algum equilíbrio. Mas, se estou a passar discos até às tantas da manhã, tenho que me deitar cedo e adiar por exemplo um jogo de futebol com o meu filho. Hoje em dia a situação é diferente porque tento marcar menos datas nas discotecas. Assim, consigo ter tempo para dormir umas horas e sair com o meu filho.

No que diz respeito à rádio, houve uma fase complicada. Andei cerca de dois, três anos a fazer o chamado a fazer o chamado “morning schow”, a manhã um, e a ter de acordar às cinco da manhã para estar na rádio às sete. O objectivo central consiste em fazer três horas de velocidade total, pelo menos é esse o meu conceito de rádio matinal. É necessário alguém que esteja muito bem acordado. Aqui corta muito o social. A pessoa às tantas quer ir ao cinema ou a um jantar, e depois pensa que no dia seguinte tem de acordar mais cedo. Talvez nessa altura andasse um pouco

om à letra ENTREVISTA

“ A rádio tem um peso muito forte na minha vida. Ocupa uma posição tremenda...

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Page 10: Edição 0 Som  à Letra

Aqui corta muito o social. A pessoa às tantas quer ir ao cinema ou a um jantar, e depois pensa que no dia seguinte tem de acordar mais cedo. Talvez nessa altura andasse um pouco em desequilíbrio. Mas este horário não representa grande problema. Repare-se que é um horário das 14.00h às 18.00h. De manhã deixo o rapaz na escola e a mais pequena na avó. Ou seja, consigo conciliar as coisas mais ou menos. O caso de ontem é um exemplo. O meu puto anda a dar uns pontapés na bola e ontem ainda tive tempo para assistir ao resto do jogo, ir buscá-lo, levá-lo para casa… dá para conciliar. Nós, às vezes é que perdemo-nos um bocadinho… No caso dos festivais de verão por exemplo, quer-se ver os dias todos, mas é difícil.

Consegue imaginar-se noutra profissão? Não me consigo imaginar à frente da caixa de um banco, de uma secretária, ou de uma caixa registadora de um supermercado. Estar sem música para mim… eu explico. Quando acordo às sete, a primeira coisa que faço é ligar um dos trinta, quarenta rádios que existem em casa, para saber o que tem acontecido enquanto estive a dormir. Se não sou eu, agora são os miúdos. Chego ao carro. Hoje obrigam-me a conhecer músicas infantis, como a galinha patareca do Serafim e Companhia, o hit que roda lá no carro (risos). De uma forma ou de outra está sempre presente a música. O leitor de mp3 tornou-se moda na nossa sociedade. Eu sou do tempo das cassetes. Eu passava vinil para cassete, e andava com o walkman. Quando faço uma viagem de autocarro, o mp3 serve. Sempre que é necessário ouvir música nova, adianta serviço. Não dá para fugir. Há sempre a música presente. Eu por exemplo, acabei de sair de uma consulta de otorrinolaringologia, e o meu médico cravou-me para dar uma ajuda numa festa das comemorações do centenário do sector, com voz off e até trabalhar o som ambiente. Portanto, há sempre uma ligação. Eu também não a quero evitar. (risos)

Recorda-se da primeira emissora de rádio onde trabalhou? Sim, ao todo foram sete já. Lembro-me que comecei a dizer as minhas primeiras asneiras, os meus primeiros erros ortográficos, os meus pontapés na gramática na rádio Independente de Castelo de Paiva, muito cedo, talvez pelos meus 16 anos, um pouco antes das autorizações das rádios por volta de 1986,1987. Passei também pela rádio Penafiel, uma contratação milionária (risos) já depois das autorizações. Estive também numa rádio em Cinfães. Depois precisava de mais agitação, actividade, e estive em Paredes na rádio Terra Verde cerca de 7 anos. Depois a Rádio Nova Era comprou a estação onde estive. Trabalhei lá cerca de um ano. Depois envolvi-me num projecto brasileiro em Vila nova de Gaia, onde estive também cerca de um ano. Uma rádio com um formato meio brasileiro, mas dinâmica. Nessa altura foram os euros que falaram mais alto. Depois essa rádio foi comprada por uma seita qualquer e eu vim parar aqui à Rádio Nova.

Quais são para si as vantagens da rádio relativamente a outros media? A rapidez… continua a ser por muito que não se queira admitir. Se estiver-se na Avenida dos Aliados e rebentar uma conduta, num espaço de segundos consegue-se transmitir a informação para os ouvintes. A televisão não consegue fazer isso, pelo menos não com imagem. Depois, o facto de a rádio ser só com som…acho que dá mais trabalho, mas é um desafio simultaneamente. Claro que mudaram-se os tempos, mudaram-se os hábitos de ouvir, informar... Eu discordo muito da rádio que agora temos aqui em Portugal.

Porquê? Ensinaram-me desde muito novo que a rádio deveria formar, informar e vice-versa. Informar para formar sociedades…. Tal não se efectua hoje em dia. Acho que actualmente estamos a atrofiar cada vez mais as rádios. Existe cada vez mais censura, em todos os aspectos. Há tanta música para as pessoas conhecerem, e nós estamos a passar sempre as mesmas. E não muda. É algo complicadíssimo. As rádios tornaram-se empresas. Está presente a lei do menor esforço e o “não vamos ser ousados”. É como se a base de dados estivesse atrofiada (risos). Ainda assim, a Rádio Nova, no meio de toda esta postura comercial, consegue dar uma lufada de ar fresco com a transmissão por exemplo, da nova música do Beck. De qualquer das formas, o português comum não tem a noção dos discos que saem.

Qual seria para si o uso ideal deste veículo?

O investimento na palavra. Uma rádio que tivesse muita gente, que pudesse lançar novos discos, que permitisse a novas bandas cantarem ao vivo para os ouvintes, mostrar

o seu talento.

Actualmente verificou-se um recrudescimento de interesse pelo vinil por parte dos jovens. Acha que é apenas uma moda, ou veio para ficar? Acho que não...É óptimo em termos profissionais trabalhar-se com música em formato mp3, fantástico. Chega-se a qualquer lado. Por exemplo, aqui, antes era uma confusão de máquinas, cheio de CD´s, vinil. Entretanto desapareceu tudo. Tem-se aqui uma mesa de mistura, o monitor, microfone e uns auscultadores. É fantástico, de uma eficácia tremenda. Facilitou imenso a vida. Causou muito desemprego, é claro para os técnicos. Por exemplo, aqui na Rádio Nova já não estão nem metade dos funcionários que estavam há dez anos. Agora, há o lado mau de tudo isto. Acredito que tem-se actualmente muitos animadores de rádio que às tantas anunciam um single sem visualizar a capa do disco. Para quem gosta realmente da música, aprecia ter o lado físico. Uma das coisas que me tem desesperado hoje em dia, é o facto das editoras, com esta queda da indústria discográfica, deixarem de mandar os

promocionais. Mandam apenas um link para se descarregar a música em formato mp3. Muitas vezes tem-se uma capa do CD-R, uma cópia, quando se abre um envelope promocional de uma editora. Para mim é uma coisa estranha… (risos) Não vou descansar enquanto não substituir esse CD-R, essa coisa estranha, pelo CD original, com as fotografias, as letras, todo aquele trabalho que está ligado à edição de um disco.

É contra a pirataria? Não completamente. Acho que os preços dos discos são uma tristeza. Acho que uma larga parte dos portugueses não tem possibilidade para gastar cerca de 15 euros por mês num disco. Por isso, façam downloads, ao menos têm acesso às músicas que não passam nas rádios. Agora, sou fã de objectos físicos, dos originais, sejam em vinil ou CD.

Mas apresenta alguma predilecção pelo CD em relação ao vinil, ou vice-versa? [pausa] Depois também… é o lado prático das coisas. Por exemplo, para se deslocar para longe, de forma a passar músicas, torna-se complicado levar tudo. Se reunir as músicas em compilações legais … num pequeno saco, leva-se tudo. Mas, havendo capacidade financeira para se ter bons equipamentos de som e tirar partido da envolvência que é ouvir um disco em vinil… se houver essa possibilidade é óptimo. O prazer é diferente. O perito refere que se o CD tiver a masterização quase não se nota a diferença… Não sou tão tradicionalista quanto isso. Mas, há ali mais qualquer coisa. Tirar o plástico, tirar o vinil dentro da sua capa, tirar a agulha, são mecânicas que me acompanharam desde sempre.

Mas como DJ, prefere o vinil em relação ao CD? Lá está, é a questão prática de novo. Hoje em dia há leitores de CD que permitem grande velocidade. Gosto de levar tudo alinhado e consegue-se tirar um CD e pôr outro. Mas se estiver numa postura mais descontraída, venha o vinil. Como DJ, em 2006 foi um dos responsáveis pelo bar disco volante. Qual é o balanço deste projecto que entretanto terminou? Foi uma aventura assim um pouco estranha, mas que ia de encontro a uma série de sonhos. Lançaram-me o desafio de assumirmos [juntamente com Joaquim Horta] os bares do cinema batalha. Tínhamos o lado da música enquanto ambiente sonoro, o lado do DJ, festas, lançamento de bandas. E com uma agravante, ter uma sala de espectáculos logo ao nosso lado. Foi durante algum tempo interessante, mas não atingiu sequer os mínimos do que nos tinham dito que iria ser. Em termos financeiros preferimos afastarmo-nos deste projecto. Mas, de qualquer das formas, permitiu-me estar perto dos músicos. Constituiu mais uma ligação nocturna.

Consegue estabelecer comparações entre a profissão de DJ e a de radialista? A atitude por exemplo, ao nível da interacção com o público difere? Na rádio mudou tudo. Na altura em que havia programas de autor, podíamos partilhar. Agora não, é locução de continuidade. Antes tínhamos a sensação de que estávamos a contribuir para algo.

“ Acho que uma larga parte dos

portugueses não tem

possibilidade para gastar cerca

de 15 euros por mês num disco. POR

om à letra ENTREVISTA

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Apresenta maior feedback como DJ… É verdade. Tem que se levantar a pestana. Ver que tipo de pessoas tem-se à frente e adaptar. Às vezes o feedback até é exagerado (risos) Mas gosto de explicar tudo, tenho o maior prazer.

No âmbito do seu percurso profissional, referiu a passagem pela televisão. Como foi essa experiência? Fiz, por exemplo, voz off durante dois anos no …(risos). Bem, vou admitir isto (risos), ainda na época do “reinado matinal “ do Manuel Luís Goucha. Introduzia o arranque da emissão. Referia os slides da programação das sete à uma da tarde.

Considera que a rádio vai acabar? Para já não vejo tal como um dado adquirido. As novas tecnologias como o mp3, permitem sempre

ouvir rádio. Por outro lado, o grosso dos estudos revelam que a rádio está ligada às quatro rodas.

A questão da rádio companhia… Sim.

Houve algum músico/banda que o desiludiram em particular? O Lenny Kravitz e o Ben Harper. O Lenny kravitz está mais formatado, “mais MTV” (risos). Inicialmente apresentava um lado mais noisy. Por isso gostei do primeiro e segundo discos deste cantor. Recordo-me da sua presença em Lisboa no estádio do Restelo por volta de 2002, 2003, numa conferência de imprensa onde eu estava presente, mais um conjunto de jornalistas, mulheres (risos). Quando concedeu

esta conferência de imprensa estava precisamente na sua fase “MTV”. Lembro-me de estar a um canto a observar as perguntas pertinentes das jornalistas, que não se relacionavam com a sua música, mas em outros aspectos (risos) e que correspondiam a um simples “OK” por parte do cantor. Recordo-me que na altura decidi intervir também com uma questão: se ele ultimamente estava em contacto com a alma de Jimmi Hendrix. Ele não me respondeu (risos). Já o Ben Harper, apanhei-o numa fase mais tardia. Assisti a um concerto dele e fiquei desapontado. Passou para o lado das bandazinhas e dos surfistas.

O Isidro apoia bastante as bandas de garagem. Considera que as suas hipóteses de divulgação têm evoluído ou estagnado?

NSINARAM-ME DESDE MUITO NOVO QUE A RÁDIO

DEVERIA FORMAR, INFORMAR E VICE-VERSA.

INFORMAR PARA FORMAR SOCIEDADES…. Tal não se efectua

om à letra ENTREVISTA

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PERFIL

“ E ntre a esquizofrenia e os dedos na ficha ” Isidro Lisboa tem 36 anos e é natural de Penafiel. Apresenta uma estatura média, e ostenta na sua face uma barba cerrada e escura. A sua robustez física denota que tem “sobrevivido” à ditadura das noites, nos bares e discotecas. Não se pode negar o desgaste físico e psicológico que implica ser DJ e um habitué das noites no Porto. À primeira vista, ninguém diria que este homem fosse tão comunicativo. Regra-chave: para o ver na sua plenitude, basta incluir numa frase uma única palavra: música. Não lê muitos livros, prefere revistas internacionais por exemplo. Leu uma vez Miguel Torga porque o obrigaram. A paixão pela música surgiu ainda na infância por influência do seu tio- padrinho. Pedia dinheiro aos pais para comprar os LPS (que também eram mais baratos), o seu “vício” na altura. A sua primeira actividade profissional ligada à música foi como DJ ainda com treze, catorze anos. No exercício da sua profissão considera-se um pouco esquizofrénico, embora procure evitar mencionar esta palavra:” Enquanto falo em esquizofrenia… as pessoas até podem pensar que sofro de alguma patologia. Acho que sou uma pessoa até com uma certa sanidade”, menciona o animador, revelando talento na ironia.

É casado e tem dois filhos, o Rafael e a Maria, que lhe permitiram perspectivar a vida de outra forma. Ainda assim, a música não perde a importância que havia conquistado até agora. No entanto, a grande mudança reside numa espécie de equilíbrio entre partes. Considera que herdou da sua família a honestidade. É uma pessoa bastante activa e eléctrica, parecendo que tem sempre os “ dedos numa ficha de electricidade ” . Bastante divertido, extrovertido, seus olhos pretos brilham quando fala dos filhos e dos hits infantis que tem de ouvir por força das crianças. Não consegue encontrar um estilo musical dominante, mas aponta bandas e cantores que aprecia em especial. É o caso dos Pixies, Happy Mondays, David Mathews, Bob Dylan ou Leonard Cohen. Gosta de “ um pop bem feito, isto é, aprecio uma canção pop, mas com uma boa pincelada” . Para o locutor, a ” rádio não tem que ser só música. Tem que ter palavra. Pareço um cuco que aparece de vez em quando para introduzir músicas” .

Temos agora, por exemplo, o programa Quilometro zero no canal dois. Finalmente um programa de divulgação. Pelo país também se vão fazendo pequenos espectáculos. A internet também ajuda com o myspace, por exemplo, apesar do problema da dispersão, porque são muitas bandas a mostrar os seus talentos.

O que acha da iniciativa Rock Rendez worten? É assim, eu apoio todas as iniciativas que divulguem as bandas, desde que haja sempre respeito pela sua dignidade. Nos festivais de Verão, por exemplo, nem sempre isso acontece. Actuam a horas pouco acessíveis a um canto normalmente, só com conhecidos ou familiares a vê-los. Se pudesse resumir a sua vida numa palavra, qual escolhia? [hesitação] … Eu acho que vou para a esquizofrenia (risos).

Pode ser uma frase… (risos) …Talvez “dedos na ficha”. É preciso explicar? (risos).

Sim…

Parece que ando na vida com as mãos sempre na electricidade. A minha vida foi sempre a bulir. Às vezes os meus amigos perguntam-me: Isidro estás bem, parece que colocaste as mãos nalguma fica de electricidade… (risos).

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Música e bebés são dois conceitos perfeitamente conciliáveis. O senso comum normalmente associa aos recém-nascidos as famosas ” caixinhas de música “. Apesar desta ideia estar correcta , as pessoas não devem ter, contudo, a consciência que a explicação do recurso às caixinhas de música apresenta uma base científica. E que a música é um importante meio de relacionamento entre mãe e filho no período pré-natal

Texto de Irene Leite

Música e Bebés

om à letra MÚSICA E BEBÉS

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A relação precoce mãe-bebe Desenvolvimento e socialização são processos simultâneos e interdependentes. Nos primeiros tempos de vida, o universo social da criança centra-se na figura da mãe. Conceito tradicional de “cuidados maternos”

Durante séculos, o papel de uma mãe restringia-se à ocupação de tarefas caseiras e cuidados dos filhos. Quando dava à luz, a mulher sabia, com bastante clareza, como lidar com o recém-nascido: alimentar, lavar, agasalhar bem o bebé, manter o berço em local quente e com pouca luz, para que pudesse dormir o maior número de horas possível. Acreditava-se que o bebé apenas tinha estas necessidades, assemelhando-se a um tubo digestivo desprovido de quaisquer capacidades que fossem para além da sucção, do choro e pouco mais. O contributo da psicologia do desenvolvimento

Com o advento da psicologia do desenvolvimento, alterou-se a concepção do que era um “recém-nascido, que deixa de ser encarado como um “insuficiente” e passivo, a viver durante meses na mais completa indiferença a tudo o que o rodeia, para passar a ser considerado como um ser dotado de natureza activa, desperto para o mundo envolvente. Considera-se que é portador de necessidades específicas que exigem ser satisfeitas e de capacidades à espera de serem desenvolvidas. A”nova”infância

Piaget, Freud e Erikson , cada um na sua perspectiva chamaram à atenção para uma “nova” infância em que a criança, desde o momento do nascimento inicia e prossegue uma caminhada nas vias intelectual, afectiva e social. Piaget apresenta o período sensorial motor como a base de todo o desenvolvimento intelectual futuro. De acordo com o psicólogo a criança nasce com esquemas de acção que , desenvolvidos e interiorizados , se transformam ,mais tarde, em esquemas de pensamento. Freud explora a capacidade da criança sentir prazer e desprazer praticamente desde o momento do nascimento. Centradas na amamentação, as primeiras vivências afectivas contribuem, de acordo com o psicólogo para o lastro estruturador da personalidade, determinando o ulterior relacionamento emocional com as outras pessoas. Erikson defende que a confiança ou desconfiança que norteiam o relacionamento social radicam nas experiências vividas durante os primeiros meses de vida. O modo como o bebé resolve o primeiro conflito existencial influencia o grau de esperança num futuro relacionamento social gratificante.

Todos os autores constatam que o desenvolvimento é dinâmico e que envolve inexoravelmente uma relação com outrem. Deste modo, a mãe surge, necessariamente como o primeiro agente através do qual a criança

intercambia com o meio, desenvolvendo com ele as primeiras relações afectivas e iniciando o seu processo de relacionamento com o mundo físico e social. Estas concepções contemporâneas acerca do que é a criança nos primeiros tempos acabaram por se reflectir no modo como a mãe tem de assumir os cuidados maternais, que ultrapassavam, de longe, o papel que tradicionalmente desempenhava: a criança apresenta necessidades que não se confinam ao comer, dormir, estar limpa e agasalhada. Às necessidades fisiológicas juntam-se outras que, se não forem satisfeitas , comprometerão o desenvolvimento harmonioso da personalidade individual. Numa contexto de redefinição da relação mãe-filho, vários estudos têm-se efectuado sobre este vínculo afectivo existente entre mãe e bebé, mesmo antes do nascimento e as repercussões que podem vir a ter na vida futura destes seres em crescimento. Um desses meios de aproximação é a música .

Música e bebés

Sabia que a música tem

um grande poder sobre nós? E que já o exerce mesmo antes de nascermos?

De acordo com Inês de Barros Baptista, ex-colaboradora na revista Pais e Filhos, vários estudos e várias experiências levadas a cabo neste campo permitiram chegar à conclusão de que os fetos precisam acima de tudo de harmonia e equílibrio emocional . Sabe-se, assim, que as composições de Mozart e Vivaldi os acalmam, que Brahms e Beethoven aumentam os seus movimentos e que a batida do rock acelera notavelmente o pulsar dos seus corações. É claro que isto não significa que, mais tarde, já crianças ou jovens, não venham também a gostar de músicas batidas, músicas mais mexidas e mais divertidas, que os façam saltar e dançar... Dentro da barriga da mãe, no entanto, as preferências vão para os sons suaves e harmoniosos. Não apenas porque os fetos são pequenos ouvintes, mais frágeis e mais sensíveis, mas também porque a música serve como elo de ligação entre o mundo uterino e o mundo exterior. E se, ao princípio, as melodias se resumem a composições mais ou menos simples, executadas pelos próprios órgãos maternos - o bater ritmado do coração, o sangue que flui pelo cordão umbilical, a entrada e a saída de ar nos pulmões - rapidamente entram em cena outros sons mais elaborados. Sons que ultrapassam a barreira de líquido amniótico e se juntam para formar uma espécie de orquestra. À voz da mãe (o elemento mais importante da «banda») juntam-se, a pouco e pouco, outras vozes. E às outras vozes juntam-se outros ruídos. A água a correr, a buzina de um carro, a batedeira da sopa, um passarinho a cantar, a música, propriamente dita, um pouco por todo o lado. Um vínculo “musical” entre mãe e filho

Através da música, mãe e filho podem criar desde muito cedo uma relação profunda e os sons podem ser uma das formas de a mãe (e o pai, porque não?) transmitirem ao filho emoções e sentimentos. Acredita-se que escutar um tema

especial ao longo da gravidez traz algumas vantagens, já que, para além de conseguir ouvi-lo, o feto consegue, a partir da trigésima segunda semana de gestação, memorizá-lo. Assim, a mesma música não só o acalma ao longo da sua vida uterina, como vai ter o poder de continuar a acalmá-lo quando sair cá para fora e a tornar a ouvir, desta vez sem a barriga da mãe pelo meio. Se o efeito calmante da música nos fetos está comprovado através de várias experiências, o mesmo se poderá dizer em relação ao seu poder na estimulação da inteligência. Vários estudos iniciados na década de trinta vieram mostrar que composições como as de Mozart e de Vivaldi, por terem um andamento semelhante ao das batidas do coração materno, facilitavam a ligação das células nervosas umas às outras. Provavelmente, não terá sido apenas este o factor que tornou mais inteligentes os bebés que ouviram os dois compositores, mas não parecem existir dúvidas quanto ao poder da música em termos do desenvolvimento do cérebro. Mais calmos, mais sensíveis, mais inteligentes... Serão provavelmente assim os bebés que, desde cedo, se familiarizarem com a música.

? O que é a psicologia do desenvolvimento

Ramo da psicologia que se dedica ao estudo da sequência do crescimento fisiológico , psicológico e social desde o nascimento até a velhice .Uma das tarefas fundamentais é a de caracterizar os diferentes estádios de desenvolvimento.

om à letra MÚSICA E BEBÉS

Mais calmos, mais sensíveis, mais inteligentes... Serão provavelmente assim os bebés que, desde cedo, se familiarizarem com a música.

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Os sons na vida intra-uterina De acordo com Maria Lúcia Bicudo, o meio ambiente do feto é rico em estimulação acústica proveniente do interior do corpo da mãe através do seu comer, beber, respirar, dos batimentos cardíacos, de suas vocalizações e dos ruídos ambientais atenuados. Porém, o som mais frequente que o feto ouve é o da pulsação da principal artéria abdominal e o segundo mais frequente é o da voz da mãe.

Estudos efectuados sobre audição intra-uterina Maria Lúcia Bicudo , no âmbito do estudo desta temática encontrou

sustentação teórica. A relevância da experiência auditiva pré-natal tem sido demonstrada pelos estudos conhecidos de De Casper e seus colaboradores que provaram a preferência do bebé pela voz familiar da mãe, o efeito tranquilizador da exposição ao som dos batimentos cardíacos da mesma após o nascimento e a preferência revelada pelo bebé para ouvir o som de histórias familiares que haviam sido lidas pela mãe antes do nascimento. Feijo observou as consequências da associação de um trecho musical apresentado durante doze minutos com relaxamento materno profundo. Esse mesmo trecho foi tocado em intervalos diferentes durante a gravidez. Feijo constatou que o feto respondia muito mais cedo a esta estimulação familiar e interpretou essa reacção como uma antecipação do estado de conforto induzido pela estimulação materna. A vibração é o estímulo mais potente e é capaz de induzir mudanças na motilidade fetal, bem como na frequência dos batimentos cardíacos do feto, além de produzir reacções aversivas. Estudos recentes mostram o quanto os pensamentos, as palavras, as

emoções positivas ou negativas, a música relaxante ou o rock pesado podem modificar os cristais de água. investigadores (Masaru Emoto, pesquisador japonês – o seu trabalho está centra-se na

investigação das energias subtis da natureza e do homem em

sua relação com a consciência humana – até o momento não há publicações em português, apenas publicações secundárias) envolveram as amostras de água com papéis, nos quais escreveram a palavra “obrigado” em inglês e em japonês, os cristais resultantes foram perfeitos, belos e luminosos. Já com a palavra “estúpido”, a água não conseguiu formar cristais regulares. Quando a amostra de água ficou exposta à “Sinfonia Pastoral”, de Beethoven ou a uma canção da compositora Enya, os cristais resultantes também foram belos, perfeitos e luminosos, apesar de diferentes. Mas, quando as amostras de água ficaram expostas ao rock pesado ou ao heavy metal, as mesmas apresentaram uma “desustruturação” de seus cristais,

um “turbilhão confuso” – imagens de águas poluídas, como diz um investigador japonês.

Apesar desse estudo se limitar a fotografar os efeitos das palavras, dos sons, dos pensamentos, da música nos cristais de água, se o transportarmos para o líquido amniótico, quais seriam os resultados?, questiona Maria Lúcia Bicudo Fica claro, até este momento da pesquisa, que o bom e o belo centra e organiza, enquanto o contrário, desestrutura e desorganiza. Os sons são importantes na vida intra-uterina, assim como a comunicação das vibrações emocionais e os pensamentos da mãe para o bebé. No feto, o coração começa a pulsar antes do cérebro se formar. Os cientistas ainda não sabem o que exactamente o faz começar a pulsar. Portanto, há no feto um cérebro emocional bem antes de haver um cérebro racional.

Assim, comunicar carinho, cuidado e amor faz com que o pequeno ser se sinta mais sereno e equilibrado. Segundo Verney: “ É importante mostrar que os acontecimentos têm sobre nós uma repercussão diferente nos primeiros estágios de vida. Um adulto, e num grau menor uma criança, tem sempre tempo de elaborar defesas e reacções. Ele pode amenizar os efeitos do que ele experimenta, coisa de que o feto é incapaz. Nada vem atenuar ou desviar o impacto da experiência.

Essa é a razão pela qual as emoções da mãe gravam-se tão profundamente na sua mente e seus efeitos continuam a se fazer sentir com tanta força ao longo da vida.” Portugal e a musicoterapia De acordo com Cláudia Madeira , psicóloga com formação em musicoterapia (e também membro da direcção psyhealthylife) “A Música reúne o encontro com a harmonia, exercendo efeitos terapêuticos. É um meio de expressão, de comunicação, de estruturação e de análise da relação. Os seus efeitos crescem na relação entre o utente, a música e o terapeuta. Promove o bem estar físico, emocional, cognitivo e social.”A sociedade reprime a expressão de afectos, tornando o indivíduo cada vez mais inibido ou até ausente de afectos. É desde a vida intra-uterina que estes nascem e devem ser desenvolvidos e acompanhados ao longo da vida sem os colocar de parte ou mesmo esquecidos… Assim, através do som, o ser humano poderá alcançar um auto-conhecimento que permite dar e receber. Através da expressão corporal, o indivíduo facilita a expressão de emoções e dá a conhecê-las sem linguagem verbal A psyhealthy life É uma empresa especializada na prestação de serviços de saúde e bem estar desde a vida in útero até ao idoso.

“ ...o meio ambiente do feto é rico em

estimulação acústica proveniente do interior do corpo da mãe através do seu comer , beber, respirar , dos batimentos cardíacos , da suas vocalizações e dos ruídos ambientais atenuados,

Porém, o som mais frequente que o feto ouve é o da pulsação da principal artéria abdominal

e o segundo mais frequente é o som da mae..

Mária Lúcia Bicudo

outros objectivos: compreender as próprias emoções e do outro; desenvolvimento da criatividade; melhorar a auto-estima; aprender a comunicar. O projecto entrelaços Entrelaços é um projecto desenvolvido com o objectivo de proporcionar aos interessados de todas as idades, um conjunto de actividades e eventos enquadrados no vasto universo musicológico – Científico, Pedagógico, Terapêutico, Lúdico, Artístico, Cultural e Social. Entrelaços contempla as vertentes clínica e de divulgação das potencialidades da Musicoterapia, de forma a proporcionar à população um conjunto de iniciativas e programas planeados tendo em consideração as características e necessidades específicas da população. Nas instalações do projecto entrelaços com sede no Porto realiza-se: -Atendimento Clínico em Musicoterapia e Psicopedagogia. - Organização de Congressos, Seminários e Encontros no âmbito da Musicoterapia - Orientação Metodológica e Tratamento Estatístico (Psicologia, Psicopedagogia, Enfermagem, entre outras áreas) desenvolvem também programas específicos a serem realizados externamente (Infantários, Escolas, ATL, Centros de Reabilitação Psicossocial, Lares, Centros de Dia), desde que se verifiquem as condições necessárias para . A musicoterapia De acordo com a definição da Federação Mundial de Musicoterapia (WFMT), a Musicoterapia é a utilização da música e/ou de seus elementos (som, ritmo, melodia e harmonia), por um musicoterapeuta qualificado, num processo sistematizado de forma a facilitar e promover a comunicação, o relacionamento, a aprendizagem, a mobilização, a expressão, e organização de processos psíquicos de um ou mais indivíduos para que ele(s) recupere as suas funções, desenvolva(m) o seu potencial e adquira(m) melhor qualidade de vida. A intervenção da musicoterapia , de acordo com o site deste projecto:”pode ser feita individualmente ou em grupo e envolve actividades musicais (escuta musical, canto, improvisação vocal e instrumental, expressão corporal e outras que envolvam música som e movimento), num processo planificado e continuado no tempo, tendo em conta as necessidades especificas de cada pessoa, levado a cabo por um profissional com formação específica. Um conjunto de actividades musicais, por si só, não poderão ser consideradas musicoterapia porque a musicoterapia existe somente como resultado de um processo, ou seja, de uma interacção entre musicoterapeuta e paciente. Dentro da musicoterapia são várias as aplicações clínicas, nomeadamente: Hiperactividade,

om à letra MÚSICA E BEBÉS

“ A Música reúne o encontro com a harmonia, exercendo efeitos terapêuticos.

Cláudia Madeira

15

Maria Lúcia Bicudo é enferneira, fonoaudióloga e socióloga. A sua dissertação de mestrado defendida em 2005, “A importância do som na harmonização do ser e sua religação com o sagrado”

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PRESTES A SAIR DA GARAGEM 16

The Happy Mothers

A origem dos Happy Mothers remonta a 1999 como InsideSuicide. Inside Suicide referia-se a uma mensagem que a banda, num plano inicial pretendia divulgar.” Era tentar personificar algo que nunca é personificado. Nós já vimos filmes em que a morte é personificada, mas não com o suicídio e a nós isso interessou-nos”. Fizeram a primeira demo em 2000 (um pequeno registo homónimo com apenas 5 músicas. Em 2004, após vários concertos ao vivo em diversos pontos do país, lançaram o seu segundo registo, um EP conceptual com 6 músicas designado Six steps to Insanity.

Porquê Happy Mothers?

"É uma crítica aquilo que mais move as pessoas: as mães. Mãe aqui num sentido metafórico. Aquelas mães que se fazem felizes naquilo que fazem, mas que na realidade não o são, refere Miguel Martins, guitarrista na banda. Constituiu uma viragem não só a nível musical como também ao nível da atitude da banda para com o seu trabalho. Ao longo de quase dez anos as influências são múltiplas :Nirvana, Metalica, Pearl Jeam, Pink Floyd, entre outros. As oportunidades de divulgação do trabalho Gravaram a maquete em 2000 com quatro músicas, ainda em analógico. Foi num estúdio muito amador, onde um indivíduo gravava para bandas de garagem. "Pagamos um preço bastante alto para uma qualidade bastante medíocre. Fomos um bocado enganados pela nossa juventude, e pela vontade de gravarmos qualquer coisa. Mas conta sempre como experiência. Para além disso, ainda nos serviu para marcar alguns concertos", refere o guitarrista. Seguiram-se concertos, concursos como o Rockastrus , Guitarmageddom ou o mais recente Festival do Avante onde a banda venceu a finalíssima Norte do Concurso de bandas deste Festival . De destacar a participação no concurso

Rock Rendez Worten. A participação neste concurso , de acordo com Pedro Adriano Carlos, o vocalista , não foi das mais positivas . Ao nível dos media actuaram no Porto Canal.

Aguardam actualmente uma chamada para a segunda fase do programa da 2 Quilómetro zero.

A internet como meio de difusão Actualmente existe uma utilização crescente deste novo medium. Para as bandas revela-se o

meio central para a divulgação do seu trabalho. Os Happy mothers não fogem à regra. O myspace pode ser prejudicial. Entre tanta oferta, dificulta-se a descoberta dos grandes talentos. Mas, Miguel desdramatiza a situação: “aproveitamos mais as vantagens que as desvantagens, desta nova forma de fazer e distribuir música. Por agora, restam os ensaios para um grupo de amigos que pretende viver unicamente da música. A situação actual Como Happy Mothers participaram no Rock rendez worten .Arrependem-se da experiência porque consideraram que não avaliavam correctamente as bandas..”centrava-se apenas em angariar o mais votos possíveis, e quem tinha mais ganhava”, revela Pedro Adriano Carlos, vocalista. Actualmente não têm baterista. A banda é composta por Miguel Martins na guitarra e voz , Pedro Adriano Carlos como vocalista e . Carlos Aráujo baixista e voz . São quase dez anos a tocar para o público jovem, a participar em concursos Obtiveram confirmação para constarem num DVD (não quiseram adiantar mais) que vai sair no mercado internacional .

Como projecto de mestrado estão a elaborar um novo álbum. Restam por enquanto ensaios .

A fixar:

Os happy mothers como forma de divulgação do seu trabalho recorrem também ao popular youtube.

www.mysapce.com/insidesuicide

www.myspace.com/happymothers

Slideshow evolutivo da banda

somaletra.blogspot.com

1999

Começaram como Inside Suicide, influenciados por ideias mais negras . O tema da morte

2004 Participação no art arena. A euforia era notória.

2006 Participação no evento Guitarmaggedom organizado pela FEUP .É um espectáculo que divulga bandas de garagem

2007 Rockastrus

Um dos últimos eventos como Inside Suicide

2008 Participação no Rock Rendez Worten, Maio de 2008 , Grandes

mudanças :OS Inside Suicide passam a The Happy Mothers

om à letra

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Carpe Diem

I nauguro este meu espaço neste jornal com

um tema : a existência humana e a música . Que bela forma de inaugurar este meu espaço neste jornal (não fosse esta uma publicação periódica ligada à música). Tal escolha não se deveu (ao contrário do que vocês possam pensar, por se tratar de um jornal musical … mas depois de ter lido uma obra tocante , inquietante e penetrante não só nas nossas mentes mas também nos nossos ouvidos, não podia de deixar de colocar aqui a minha reflexão. Agora imagino a cara dos leitores de surpresa a pensarem: Como é que é possível , só se comprou um livro com versão em áudio…. Não, isto neste contexto soaria ilógico... digo penetrante porque a meu ver , a grande leitura é aquela que nos ascende a uma apoteose de tal magnitude que nos extasia e transporta para mundos à parte , recriando a história ao seu ínfimo pormenor. A história de Muoth (do livro Gertrud , de Hermann Hesse) um estudante que no auge da sua juventude e de uma paixão avassaladora tem um grande acidente na neve ficando manco para sempre. tal “marca” levou-o a grandes melancolias relacionadas com a perda da rapidez e vivacidade juvenil. No entanto , com o passar do tempo, tal acidente permitiu conduzi-lo para uma nova filosofia de vida centrada num único conceito: a música. A ideia de criação musical levou

este músico novamente a uma felicidade que julgava esquecida. Aqui está um efeito da música que em tempos de crise deve ser especialmente tido em conta. De facto, numa época de informação monocromática (peço o termo emprestado a Alexandre Pais) um pouco de cor musical vem a calhar. A febre renovada pelos

AC-DC é agora explicada: libertação de tensão, traduzida numa forma de estar(diria melhor , dançar) efémera , afastada do que é socialmente aceitável. No caso de Muoth, a personagem encontrava na música um espelho dos seus sentimentos...melancólicos, algo , portanto, clássico. De qualquer das formas, a música apresentava uma finalidade : o factor terapêutico.

P or isso, seja rock , seja heavy metal, seja fado , seja

pop, o importante é que surja uma abstracção e em tempos de crise como rir

não é o melhor remédio (é chorar), escolhe-se antes uma abstracção musical .

T endo em conta a filosofia de

Ricardo Reis , em vez de pensarmos nas contas do próximo mês, na falência estranha de um novo banco , nos aumentos inconcebíveis no combustível que podem aparecer a qualquer momento , nos encargos financeiros da mais

recente paixão do

primeiro ministro (o Magalhães) , debruçarmo-nos antes no dia actual, no “hoje”. É a filosofia do Carpe Diem, que aconselho vivamente a ser adoptada. Eu, como não sou música nem cantora (nem me aventuro por tais caminhos , não se preocupem…) cinjo-me a uma audição mais apreciativa, reflexiva e calma da música. Por enquanto não cedo aos excessos do puro rock ´n roll. No entanto , como estamos em crise…

Irene Leite

Crónica Vintage e Vanguardismo

“A venda de álbuns em formato de vinil aumentou 54.250%, enquanto o comércio de singles em vinil cresceu 1009%, noticiava o Correio da Manha em Agosto deste ano , citando dados da Associação Fonográfica Portuguesa. São dados animadores ,mas , sobretudo surpreendentes. De facto , numa época em que a música ganha progressivamente cada vez mais desmaterialização (atente-se na elevada quantidade de downloads efectuadas na internet) é praticamente impensável recorrer a um suporte “enorme” como é o vinil. Mas de acordo com estes dados da associação fonográfica portuguesa ele está muito bem e, aliás, recomenda-se .

O que podemos apreender destes dados? Que há muito tema a explorar no «âmbito musical e que a imprensa portuguesa especializada pouco ou nada concede atenção. Estes dados vieram de alguma forma reavivar a memória dos portugueses e a imprensa portuguesa despertou (finalmente) e já começa a explorar outros conteúdos que não somente os ditos “comerciais”(bandas famosíssimas , escândalos dos famosos (número um: Amy Whinehouse) , os discos que mais venderam , etc. O jornalismo musical em Portugal é uma área muito frágil (constitui um mercado de nichos), mas ao mesmo tempo tem muitas potencialidades.

O vinil também é um mercado de nichos e ao que parece as suas vendas não vão nada mal... Se não arriscarmos em algo , nunca poderemos saber as suas consequências. E é neste contexto que surge o jornal Som à Letra. No entanto , estamos convictos que o Som à Letra não é uma moda mas sim uma tendência para ficar.

Esta primeira edição surge precisamente do objectivo de fundir o novo com o velho (o vintage), isto é , compromete-se a focar o passado tendo em conta as repercussões futuras. Daí o investimento em matérias científicas onde a música se insere , os objectos que marcaram uma época (o “bolachão” por exemplo) e as novas bandas que vão permitir uma continuidade de todo o legado deixado pelos grandes nomes nacionais e internacionais. Com uma aposta no fotojornalismo e nas tendências gráficas do jornalismo actual (em contínua mutação) o Som à Letra nasce com um compromisso (que infelizmente a imprensa especializada não cumpre da melhor forma) que se resume em dois conceitos:

Editorial

Irene Leite

“ Se não arriscarmos em algo , nunca poderemos saber as

suas consequências. E é neste contexto que surge o jornal Som à

OPINIÃO om à letra 17

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Ac-DC Rui Ricardo

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Foi um dos ábuns mais esperados do ano. Atente-se que no dia de lançamento, só no Reino Unido foram vendidos 125000 de discos. Portugal não foi excepção.

No entanto, é de referir que esta foi uma aposta, ou melhor um salto no desconhecido efectuado pela banda.

O disco apresenta de facto, diferenças relativamente ao anterior X &Y lançado em Junho de 2005. Para o demonstrar, basta reportarmo-nos aos grandes investimentos ao nível sonoro que se efectuou. “Viollet Hill” (single de avanço), demonstra precisamente essa vontade em mudar a sonoridade (torná-la mais irreverente, forte, frenética, emotiva). Mas as inovações não param por aqui, uma vez que o CD apresenta uma faixa que se subdivide em duas categorias: “Lovers in Japan” - “Reign for love”. que de acordo com a crítica realizada pela revista

Rolling Stone , existem muitas influências dos U2. Na minha opinião, a música Starwberry swing também apresenta influências da banda irlandesa dos anos 80. Basta estarmos atentos ao som da guitarra. A mim parecia-me o edge (U2) a tocar …

Apesar deste CD ser diferente relativamente aos quatro anteriores, continuo a identificar a técnica de refrões melódicos que penetram no nosso ouvido. “Lost” é um claro exemplo desta situação.

A alternância de melodias na mesma música (atente-se na música death and all his friends) confere um ecletismo ao CD que o torna capaz de despoletar no ouvinte diferentes emoções, ora profundamente melancólicas, ora frenéticas, efusivas. É de facto um corte relativamente ao já tão longínquo “in my place”, ou “clocks” e até mesmo “speed of sound”.mas aconselhável até aos mais

REPESCAGEM DO MÊS

Nesta sua primeira edição, o Som à letra foi recuperar um CD da banda australiana INXS (ver brinde). Data de 1993 e constituiu na altura uma grande mudança relativamente ao que a banda produzia . Full moon dirty years reflecte uma tentativa por parte do grupo, bem sucedida apenas a nível sonoro ,( não comercialmente) , de entrada no grunge que invadiu os anos 90. Nova década, novas sonoridades . Ainda assim , nas músicas presentes neste CD , ainda é possível verificar a sonoridade típica a INXS. Basta referir o tom provocatório de “I´m only looking “e comparar a Strange Desire” do anterior “welcome to wherever you are” ou “Taste it “(do álbum X)

The gift não se afasta a nível ideológico (contestação políticas) do que a banda divulgava inicialmente. Basta reportarmo-nos a canções como “original sin” ou “dancing on the jetty”. As músicas deste CD apresentam , contudo, a força do movimento grunge . De facto , uma das particularidades desta nova sonoridade era a revolta contra a situação política do país. Era uma música pesada que marcou uma década. Apesar de já ter 16 anos , não deixa de ser um CD actual , mas não aconselhável , porém, para os que querem conhecer a essência musical da banda.. Full moon dirty years corresponde a uma fase que deve ser ouvida , depois de toda uma contextualização (ainda que breve ). IL

DESTAQUE DO ANO

CRÍTICA MUSICAL

JUKEBOX-A SUGESTÃO DO

SOM À LETRA

Numa época de culto aos anos 80 faz sentido revisitar alguns dos êxitos nacionais e estrangeiros da época doirada da pop. Os anos 80 corresponderam a uma libertação enérgica da pop. Muitas bandas e cantores lançaram mas do que um sucesso.

Só gosto de ti-Heróis do Mar Erasure-Sometimes Under pressure-Fred Mercury e DavId Bowie Anzol-Radio Macau China Girl-David Bowie Modern love-David Bowie Sinal de ti-Sétima legião Michael Jackson-Thriller Losing my religion-REM Don´T Stand-The Police Africa-Toto Kiss the dirt-falling down to the mountain Bily Idol-eyes without a face It´s Kind of Magic-Queen True- Strangelove-Depeche mode Pride-U2 Wonderful life-Black Cavalos de Corrida-UHF Sweet dreams-Eurythmics Whai I´m looking for-U2

Estou além-António Variações Chiclet-Taxi Red red wine-UB40

2008

Capitol

1993

Mercury Records

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CRÍTICA CINEMA/LITERÁRIA

Musical Mammma Mia!

Ver Meryl streep , Piers Brosnan a cantarem ABBA é um acto no mínimo caricato (no máximo

surreal) mas bem conseguido. É um filme bem-disposto que põe à prova , em particular a ainda excelente performance de Meryl Streep , que demonstrou de facto ser uma artista versátilL. Ela canta, dança e a s s u m e u m a p o s t u r a

descontraída e “colorida” bem ao retrato dos ABBA.

No que concerne a organização do filme , denota-

se uma preocupação em criar-se um fio condutor em toda a história , tendo com pano de fundo músicas dos ABBA .Cda fase distinta da história é narrada por uma música dos ABBA. A meu ver, foi uma boa conjugação.

Torna-se portanto , um filme interessante para visionar, não só pelo leque de actores presentes mas também pela ideia de revisitar na contemporaneidade uma banda que marcou os anos 70, com um pop descomprometida.

Quanto ao desempenho geral dos actores , o balanço é positivo. De facto , a versatilidade dos actores evidencia-se na capacidade de oscilarem entre a atitude mais desproporcional e a mais séria. E , com todo o respeito a Pires Brosnan (que não tinha uma voz muito afinada…) ou Colin

Conversas Sobre Bom Jornalismo_ Os cínicos não servem para este ofício-é um livro da autoria de Ryszard Kapuscinski, jornalista e escritor , falecido no inicio de Janeiro de 2007.

Para quem quer ser jornalista é um manual indispensável. A nota introdutória apresentada por Maria Nodoti funciona como cartão de visita à viagem a um jornalismo longínquo(ancestral) na forma de fazer mas não na forma de pensar. Descreve

sucintamente a “personagem” central: Kapuscinski e a sua forma de fazer jornalismo:”a regra número um parece ser saber camuflar-se , renunciar aos discutíveis e narcisistas da hipervisibilidade a favor das vantagens bastante mais úteis do anonimato”;”A história de Kapuscinski é construída a partir de baixo . Uma história atenta às pequenas coisas , aos pormenores , aos humores. […]História /relato centrada nos conteúdos , mas também na técnica da narrativa , no acto da própria escrita.” Através de um estilo informal (uma simples conversa) Kapuscinski dá uma lição sobre jornalismo . No que concerne à organização dos conteúdos do livro , optou-se (correctamente a meu ver) por uma segmentação de conteúdos em três partes , correspondentes a situações distintas. Tal de facto facilita a leitura , tornando-a ,mais segmentada e por conseguinte mais clara. Na primeira parte efectua-se uma reflexão importante sobre a profissão jornalística , as capacidades a desenvolver (destaco a empatia) e os problemas a enfrentar:”A nossa profissão é uma luta constante entre o nosso sonho, a nossa vontade de sermos completamente independentes e as circunstâncias reais em que nos encontramos , que nos obrigam a ser , ao invés ,dependentes dos interesses dos pontos de

vista e expectativas dos nosso editores”, alerta Kapuscinski. Na segunda parte Kapuscinski estabelece uma contextualização sobre África , o contexto político, económico que encontrou aquando do seu trabalho jornalístico que não era fácil:”Eu era um escravo, do meu trabalho obsessivo. Era o correspondente de uma agência noticiosa e tinha de fazer a cobertura de todo o continente”. Aí está uma diferença em relação ao jornalismo actual , que apresenta também graves problemas. Kapuscinski é directo:”A imprensa internacional é manipulada”. O exemplo do repórter polaco conduz a uma reflexão aos aspirantes a jornalistas sobre a evolução desta profissão, as suas dificuldades , as suas desilusões (salário baixo, pressões dos chefes), mas também sobre a sua importância num contexto cada vez mais tecnológico. Na terceira parte entre um elogio mútuo (entre Kapuscinski e Berger) evidencia-se uma reflexão sobre o modo de contar estórias . De destcar também a problematização referente às vantagens e desvantagens da tecnologia.”Assistimos a enormes mudanças no campo tecnológico e ,, na esfera da política, as mudanças são muito dramatizadas. A informação passou a ser um bombardeamento contínuo.[…]Omundo tornou-se imenso”, continua Berger. Só há um aspecto que pretendo destacar. :concordo com a forma de fazer jornalismo de Kapuscinski , a questão da empatia , de viver a situação das pessoas alvos de notícia , o anonimato (dentro de algumas ressalvas , a questão do abuso da boa fé das pessoas)e reportagem , sempre, contudo, com a ressalva da objectividade. Objectividade a 100% é impossível, no entanto , há -que estabelecer sempre um esforço para tal. Também na forma de escrita (noticiosa) ter sempre cuidado para não se cair num discurso valorativo decorrente de uma aproximação , uma promiscuidade( muitas vezes difícil de controlar) entre fontes e jornalistas. Através da leitura deste livro tais

CURIOSIDADE DO MÊS

? SOMOS O QUE OUVIMOS

A música exerce grande influência sobre nós enquanto seres humanos. Vários investigadores

já têm sistematizado sobre esta realidade. Um exemplo desta situação é o teste S T O M P , s o b r e preferências musicais. De acordo com os ps icólogos, Peter J.Rentfrow e Samuel G o s l i n g … d a universidade do Texas (autores do teste STOMP), é possível definir a personalidade

de um indivíduo em função do estilo de música que prefere.

Um outro investigador, Adrian North, da Universidade de Leicester realizou uma sondagem pormenorizada em 2006 junto de mais de 2500 indivíduos escolhidos ao acaso em meios universitários, centros comerciais e estações ferroviárias do Reino Unido. No questionário, incluíam-se perguntas sobre os gostos musicais, mas também sobre as habilitações literárias, situação laboral, relações pessoais, rendimentos anuais, crenças e hábitos de consumo.

Os resultados foram curiosos:

♦ Os que mais viajam são fãs de dance e house

♦ Os amantes de rock e da música pop dos anos 60 são mais atingidos pelo desemprego que os restantes, mas isso poderá estar relacionado com a sua faixa etária

♦ Os apreciadores de ópera são os que lavam o cabelo com menos frequência

♦ Os consumidores de música electrónica são os que mais exercício praticam , seguidos dos adeptos do rap e da música indie

♦ Quem menos bebe são os fãs de filmes musicais que juntamente com os apreciades de ópera , costuma preferir o vinho à cerveja e fumam pouco

♦ Os maiores índices de criminalidade foram encontrados entre os que ouvem

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JOGOS/DICAS

Sopa de letras

Soluções

“ Dá que pensar…

“Jesus era fixe, mas os descípulos eramm mesquinhos”

Jonh Lennon em 1966

“Aviso-vos , com paz e amor :tenho mais que fazer, acabou-se o correio de fãs”

Ringo Starr num vídeo publicado no site oficial

“Nas nossas cabeças somos punk”

Michael Stpe sobre os REM, em 1994

Ficha técnica:

Directora: Irene Leite Editora: Irene Leite Fotografia :Irene

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Os INXS são uma banda dos anos 80. Surgiram em 1977 com o nome “The “Farriss Brothers”. Tocavam inicialmente em pubs e bares. Contudo, logo após o lançamento do primeiro CD homónimo em 1980, alteram para INXS (abreviatura de in excess), nome que se mantém até à actualidade.

Adoptaram ao longo dos anos um estilo eclético ao nível das produções e estilos musicais. Efectivamente, na sua música evidencia-se uma panóplia de estilos musicais como o new wave, rock (atente-se, na sua acepção mais pura), até às baladas melancólicas (onde a influência do rock não é abandonada). Never tear us apart enquadra-se na última categoria.

Apesar da banda ter surgido em finais dos anos 70, só em meados dos anos 80 alcançou a notoriedade e visibilidade tão ambicionadas (nomeadamente a nível internacional) junto do público. Desta época constam sucessos como, Suicide Blonde, Disapear, New sensation, By My side, e como não, poderia deixar de ser: Never tear us apart. O álbum mais bem sucedido da banda foi KIck em 1987 com sucessos como new sensation, need you tonight e curiosamente Never tear us apart. Todos estes sucessos deram origem, no inicio dos anos 90, ao espectáculo Live Baby Live, até hoje relembrado pela sua magnitude.

De acordo com o site “ O Portal do Rock”, os INXS venderam mais de 25 milhões de discos em todo o mundo, inúmeros prémios, discos de platina e apresentam por conseguinte uma carreira cheia de realizações.

São vários os discos gravados : INXS" (1980), "Underneath The Colours" (1981), "INXSive 1980-1982" (1982), "Shabooh Shoobah" (1982), "The Swing" (1984), "Listen Like Thieves" (1985), "Kick" (1987), "X" (1990), "Live Baby Live" (1991), "Welcome To Wherever You Are" (1992), "Full Moon Dirty Hearts" - o presente poster data pre-cisamente desta fase da banda com um ar mais “grunge”-(1993), "Greatest Hits" (1994) e "Elegantly Wasted" (1997).

A banda, contudo, em 1997, atravessou uma fase complicada com a morte do vocalista Michael Hutchense que suicidou-se . O regresso aos palcos só deu-se em 2000: com Jimmy Barnes e Terence Trent D'Arby como vocalistas temporários.

Jon Stevens começou a cantar com os INXS em 2000, e foi nomeado integrante ofi-cial em 2002. Todavia, deixou a banda em 2003 após gravar somente uma canção: I get up. Os INXS voltaram a ser notícia em 2004 quando foi anunciado que um novo reality show chamado "Rock Star" apresentaria um concurso para encontrar um novo vo-calista para a banda. E, foi a vez de J.D Fortune , que até aos dias de hoje acom-panha a banda (sem o sucesso que apresentava com Michael Hutchense). Chegaram a lançar um cd: ”Switch” com pequenos êxitos como “afterglow”.

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