25
Pelo menos desde a década de 1930, perío- do em que se inicia a longa era de hegemonia do Partido Social-Democrata sobre o cenário políti- co sueco, elementos da chamada “engenharia so- cial” do país, destinada primordialmente a asse- gurar a redução das disparidades sociais, têm despertado a atenção internacional e gerado um fértil processo de difusão de inovações em polí- ticas públicas. O chamado “sistema sueco de se- guridade para os pais”, que é um conjunto de di- reitos e benefícios estruturados com o intuito de minimizar as incompatibilidades entre as exigên- cias do universo do trabalho remunerado e aque- las relacionadas à criação dos filhos, é dupla- mente ilustrativo neste sentido. Em 1974, a Suécia tornou-se o primeiro país do mundo a transformar a licença maternidade em um sistema de licença remunerada para ambos os pais, sistema esse que foi arquitetado para induzir os pais (homens) a assumirem um papel mais ati- vo na criação dos filhos e, também, para fomentar uma partilha mais igualitária das tarefas domésticas pelo casal. Com objetivos nem sempre idênticos, e muitas vezes com reformulações significativas, tais direitos e benefícios foram posteriormente adota- dos por muitos países do mundo dito desenvolvi- do. O sistema sueco de seguridade para os pais parece também marcar o início de uma época em que, paralelamente à ênfase dada à redução dos diferenciais econômicos e de bem-estar relativos às classes sociais, a questão de gênero passa a as- sumir um lugar cada vez mais destacado na agen- * Este artigo é uma versão do sétimo capítulo de mi- nha tese de doutorado, defendida no IUPERJ em de- zembro de 1997, cujo título é Regulating the family and domesticating the State. The Swedish family po- licy experience. Agradeço os comentários e suges- tões dos profs. Luiz Eduardo Soares, orientador do trabalho, e Stefan Svallfors, co-orientador, bem como o apoio do CNPq, do qual fui bolsista junto à Uni- versidade de Umeå, Suécia. RBCS Vol. 17 n o 48 fevereiro/2002 ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER: reconfigurando a divisão do trabalho doméstico na Suécia* Carlos Aurélio Pimenta de Faria

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER: ão … · da pública do país. O grande ingresso das mulhe-res no mercado de trabalho prenunciava a debili-tação do tradicional

  • Upload
    dinhthu

  • View
    213

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Pelo menos desde a década de 1930, perío-do em que se inicia a longa era de hegemonia doPartido Social-Democrata sobre o cenário políti-co sueco, elementos da chamada “engenharia so-cial” do país, destinada primordialmente a asse-gurar a redução das disparidades sociais, têmdespertado a atenção internacional e gerado umfértil processo de difusão de inovações em polí-ticas públicas. O chamado “sistema sueco de se-guridade para os pais”, que é um conjunto de di-reitos e benefícios estruturados com o intuito deminimizar as incompatibilidades entre as exigên-

cias do universo do trabalho remunerado e aque-las relacionadas à criação dos filhos, é dupla-mente ilustrativo neste sentido.

Em 1974, a Suécia tornou-se o primeiro paísdo mundo a transformar a licença maternidade emum sistema de licença remunerada para ambos ospais, sistema esse que foi arquitetado para induziros pais (homens) a assumirem um papel mais ati-vo na criação dos filhos e, também, para fomentaruma partilha mais igualitária das tarefas domésticaspelo casal. Com objetivos nem sempre idênticos, emuitas vezes com reformulações significativas, taisdireitos e benefícios foram posteriormente adota-dos por muitos países do mundo dito desenvolvi-do. O sistema sueco de seguridade para os paisparece também marcar o início de uma época emque, paralelamente à ênfase dada à redução dosdiferenciais econômicos e de bem-estar relativosàs classes sociais, a questão de gênero passa a as-sumir um lugar cada vez mais destacado na agen-

* Este artigo é uma versão do sétimo capítulo de mi-nha tese de doutorado, defendida no IUPERJ em de-zembro de 1997, cujo título é Regulating the familyand domesticating the State. The Swedish family po-licy experience. Agradeço os comentários e suges-tões dos profs. Luiz Eduardo Soares, orientador dotrabalho, e Stefan Svallfors, co-orientador, bem comoo apoio do CNPq, do qual fui bolsista junto à Uni-versidade de Umeå, Suécia.

RBCS Vol. 17 no 48 fevereiro/2002

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER: reconfigurando a divisão do trabalhodoméstico na Suécia*

Carlos Aurélio Pimenta de Faria

da pública do país. O grande ingresso das mulhe-res no mercado de trabalho prenunciava a debili-tação do tradicional modelo familiar do provedore da dona-de-casa, e o Estado sueco começa a im-plementar políticas formuladas não apenas com ointuito de reduzir as diferenças nas médias salariaise nas condições de trabalho entre homens e mu-lheres, mas também visando a tornar mais igualitá-ria a divisão de tarefas no âmbito doméstico.

O presente artigo tem por objetivo discutir oimpacto de algumas destas políticas implementa-das pela social-democracia sueca com o propósi-to de facilitar o ingresso e a permanência das mu-lheres no mercado de trabalho, além de fomentara igualdade de gênero no país. Primeiramente,discute-se o impacto da legislação de 1971, quebaniu a tributação conjunta dos casais, tornandocompulsórias as declarações de renda individuais,o que, dado o sistema tributário altamente pro-gressivo do país, implicou o estabelecimento declaros incentivos econômicos para que as mulhe-res participassem do mercado de trabalho. Alémdisso, o artigo enfoca o chamado “sistema suecode seguridade para os pais”. Serão discutidas commais detalhes as peculiaridades e as formas de uti-lização efetiva da licença remunerada para os paisquando do nascimento de uma criança.

Este trabalho pretende ser, assim, uma avalia-ção de alguns dos principais benefícios do welfarestate sueco contemporâneo. Nesta análise, contudo,importa não apenas desvendar a lógica a presidir aimplantação desses benefícios, mas também, e prin-cipalmente, discutir a sua tradução prática, ou seja,as formas de utilização efetiva dos benefícios, asquais demonstram claramente, pode-se concluir, osdistintos fatores socioeconômicos que têm condicio-nado (e mitigado) o impacto destas políticas. Aosestudiosos brasileiros das políticas sociais interessa-rá não apenas a apresentação e a análise desses im-portantes mecanismos destinados a fomentar umadivisão mais igualitária do trabalho doméstico (e agarantir o ingresso e a permanência da mulher nomercado de trabalho), mas também a percepção deque as políticas para a família, ainda que muitas ve-zes enfatizando distintas formas de pró-natalismo,podem também ser instrumentos para outros fins.

Na primeira seção, discutimos brevemente oimpacto da introdução da tributação individual na

Suécia, analisando seu significado para a concre-tização do novo paradigma familiar dos dois pro-vedores. Na segunda seção, apresentamos os be-nefícios e os direitos que compõem o sistema sue-co de seguridade para os pais, discutindo, emuma perspectiva internacional comparativa, o seuprincipal instrumento: a licença remunerada paraos pais quando do nascimento dos filhos. Na ter-ceira e última seção, discutimos, a partir de umaanálise do modo como, na Suécia, essa licençatem sido compartilhada entre os pais, a eficáciadesses benefícios na geração de uma esfera do-méstica em que o trabalho não remunerado sejadividido de uma maneira mais igualitária. Tantoessa análise quanto as pesquisas que têm sido de-senvolvidas no país acerca da forma como os sue-cos empregam o seu tempo mostram as dificulda-des vivenciadas na hora da tradução das inova-ções políticas em práticas sociais efetivas.

É necessário alertar, finalmente, que o títulodeste trabalho, “Entre marido e mulher, o Estadomete a colher”, deve ser interpretado de maneiracautelosa. Se ele parafraseia um dito popular bra-sileiro, parece-nos importante recordar que, a des-peito da acelerada americanização do mundo, achamada esfera privada não desfruta do status de“nicho inviolável” em todas as partes do Ocidente.A noção de limited government, tão caracteristica-mente norte-americana não tem, em definitivo, amesma penetração na Suécia. Na verdade, não temsido rara a acusação de que, pelo menos em suaépoca de maior “ousadia”, a “engenharia social”sueca, com seus esforços no sentido de “desmer-cantilizar” os assalariados e de garantir a qualida-de de vida dos cidadãos, muitas vezes normatizan-do o comportamento individual, teria promovidouma excessiva dependência do indivíduo em rela-ção ao Estado e/ou engendrado a “desprivatiza-ção” da família (Faria, 1997, 1998a e 1998b).

A tributação individual e o novoparadigma familiar na Suécia

Quando o incremento da participação dasmulheres suecas no mercado de trabalho é anali-sado de uma perspectiva histórica, a lei de 1939,

174 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 Nº. 48

que proibiu a demissão em casos de gravidez, ca-samento ou nascimento de uma criança, é normal-mente considerada um divisor de águas. Entretan-to, importantes medidas visando a garantir um es-paço para as mulheres no mercado de trabalho jáhaviam sido implementadas muito antes da ascen-são do Partido Social Democrata ao poder, no iní-cio da década de 1930. Em 1846, viúvas, divorcia-das e solteiras ganharam permissão formal paratrabalhar no comércio; em 1859, as mulheres ad-quiriram o direito de exercer algumas outras pro-fissões, como a de professoras; em 1870, foramadmitidas em ginásios privados e, três anos de-pois, foi-lhes franqueado o acesso a quase todosos cursos superiores; em 1874, as mulheres casa-das conquistaram o direito legal de controlar a suaprópria renda; em 1901, foi-lhes concedido o di-reito a uma licença maternidade, não remunerada,de quatro semanas; em 1925, passaram a ter osmesmos direitos que os homens de ingressar noserviço público (com algumas exceções); e em1927, as escolas públicas de segundo grau foramabertas às garotas. Antes que a lei de 1939, queassegurava o emprego das mulheres independen-temente de sua situação familiar e/ou marital, ti-vesse entrado em vigor, o direito a uma aposenta-doria mínima havia sido garantido tanto para ho-mens quanto para mulheres na Suécia, em 1935(Statistiska Centralbyrån, 1995).

Comparando a maneira como as mulherescasadas asseguraram o seu direito de ingresso epermanência no mercado de trabalho na Suécia enos Estados Unidos, Barbara Hobson (1993) mos-trou que, a despeito da similaridade dos debatestravados nos dois países, os resultados foram radi-calmente diferentes. Em ambos os países, o assun-to ganhou destaque na agenda política durante adepressão dos anos de 1930 e as propostas quevisavam a compelir as mulheres casadas a abando-nar o mercado de trabalho eram sustentadas porargumentos similares: o lar ficava fragilizado oudesmoralizado quando a mulher ingressava nomercado de trabalho; essas mulheres estavam ocu-pando os postos que deveriam ser reservados aosmaridos desempregados e às mulheres solteiras;aceitando salários mais baixos, estavam competin-do de maneira injusta com os homens.

Ao contrário do que aconteceu nos EstadosUnidos, entretanto, na Suécia as querelas acercado direito das mulheres casadas ao trabalho remu-nerado resultaram na proteção legal contra a dis-criminação e não em uma ampliação das restri-ções de seu acesso ao mercado de trabalho. A leide 1939, que protegia as mulheres contra a demis-são motivada pelo casamento ou pela gravidez,ilustra muito bem a opção sueca por garantir o di-reito das mulheres casadas ao trabalho remunera-do. O que é surpreendente na comparação, aindade acordo com Hobson, é que, “no início da de-pressão, no começo dos anos de 1930, as mulhe-res suecas não estavam nem tão bem organizadassocialmente nem tinham a influência sobre as po-líticas públicas que o movimento de mulheres daEra Progressiva norte-americana podia ostentar”(1993, p. 400). A chave para a compreensão da di-ferença nos resultados pode ser encontrada naspeculiaridades da conformação do Estado debem-estar social na Suécia, mais especificamentena grande relevância alcançada pela chamada“questão populacional”. O movimento generali-zado de mobilização política e social em torno dasmedidas que deveriam ser adotadas para conter odeclínio constante das taxas de natalidade foi ha-bilmente manipulado pela social-democracia sue-ca, a qual, alardeando a suposta ameaça do declí-nio populacional, conseguiu angariar apoio polí-tico para a implementação de reformas que seconstituiriam em importantes pilares do Estado debem-estar social do país (Faria, 1997).

As feministas suecas foram capazes de vincular odireito das mulheres casadas ao trabalho [remune-rado] às preocupações acerca do declínio das taxasde natalidade, do baixo número de casamentos eda qualidade de vida das famílias suecas. Conse-qüentemente, elas foram capazes de transferir aquestão das esferas política e econômica, ondeelas eram mais fracas, para a esfera doméstica doprocesso de elaboração de políticas, à qual elas ti-nham fácil acesso e onde poderiam usar os seusrecursos de poder (Hobson, 1993, pp. 401-402).

Se a legislação sueca de 1939 é um marco –mesmo que a sua implementação não tenha sidoo resultado de uma aceitação consensual dos di-reitos econômicos das mulheres – quando é pre-

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 175

ciso explicar os índices atuais de participação damulher sueca no mercado de trabalho, que estãoentre os mais altos do mundo, duas outras polí-ticas, adotadas na década de 1970, são de crucialimportância: a eliminação da tributação conjuntados casais e a concessão de “generosos” e flexí-veis benefícios de licença remunerada para am-bos os pais quando do nascimento (ou adoção)de uma criança. Em 1971, entrou em vigor naSuécia uma lei que tornava compulsória a decla-ração individual da renda de cada um dos mem-bros do casal. Essa legislação, associada ao siste-ma de seguridade para os pais e à provisão ma-ciça de serviços públicos de creche (Faria,1998a), tem sido amplamente reconhecida comoum dos principais elementos indutores do in-gresso e da permanência das mulheres suecas nomercado de trabalho. Contudo, ainda que o focode nossa análise seja basicamente a influênciadas políticas na oferta de trabalho, é importantedestacar também alguns aspectos relativos à de-manda do mercado.

Durante todo o período do pós-guerra, a Sué-cia conseguiu manter baixos os níveis de desem-prego, sendo que a demanda por mão-de-obramanteve-se relativamente alta.1 Em vista da rápidaexpansão econômica do pós-guerra e do lentocrescimento populacional, que levaram, por vezes,a uma acentuada carência de mão-de-obra no país,os empregadores e os policy makers passaram a sedefrontar com duas opções possíveis: o incentivo àimigração ou a utilização da força de trabalho dasmulheres casadas.2 Sundström sintetizou com pre-cisão a busca por uma solução para a carência demão-de-obra na Suécia:

Como um resultado das mudanças demográficas,a alta demanda por trabalho não poderia ser aten-dida apenas pelas fontes tradicionais de recruta-mento: homens e mulheres solteiras. Conseqüen-temente, os empregadores voltaram-se para a for-ça de trabalho dos imigrantes; de 1960 até 1970,o saldo migratório subiu para 234.000. Entretanto,uma vez que as agências governamentais e o pú-blico de uma maneira geral se tornaram progres-sivamente ciosos dos custos sociais da imigração,ganharam apoio político as medidas destinadas afacilitar o engajamento das mulheres casadas nomercado de trabalho. (Sundström, 1991, p. 180).3

Entretanto, estaríamos traçando um esboçoequivocado dos esforços estatais para encaminharas mulheres para o mercado de trabalho na Sué-cia se a insuficiência de mão-de-obra for com-preendida como o único ou como o principal ele-mento a ser equacionado quando da formulaçãode políticas. As políticas que serão analisadas nes-te artigo, que podem ser caracterizadas tantocomo políticas de emprego quanto como de fo-mento à igualdade entre os sexos ou como políti-cas para a família, são altamente indicativas doengajamento do Estado sueco na questão daigualdade de gênero.4 Se a igualdade entre ho-mens e mulheres deve ser conquistada, o trabalhoremunerado deve ser atraente para as mulheres;nesse sentido, tornar possível a compatibilizaçãoentre a maternidade e a participação no mercadode trabalho é certamente uma estratégia políticaimportante.

As mulheres não foram atraídas para o mer-cado de trabalho apenas em função da carênciade mão-de-obra e dos esforços para se garantiruma remuneração idêntica para o mesmo tipo detrabalho, que fizeram o salário feminino médiodobrar entre 1963 e 1978, diminuindo, dessa for-ma, a discrepância salarial entre homens e mulhe-res de 28% para 10% no mesmo período (Sunds-tröm, 1991, p. 179). Várias outras razões ajudavama justificar as medidas destinadas a influenciar aoferta de trabalho feminino no país.5 O “incenti-vo” dado às mulheres para que ingressassem nomercado de trabalho significava, também, ofere-cer-lhes uma renda própria no presente, reduzin-do sua dependência em relação à renda do mari-do/companheiro.6 Deve-se recordar, ainda, que,por meio do trabalho remunerado, a mulher pas-sa a ter direito a uma aposentadoria própria, ca-paz de sustentá-la na velhice (Gustafsson, 1984).

Antes que a tributação individual compulsó-ria entrasse em vigor na Suécia, a combinação deum sistema tributário altamente progressivo com adeclaração conjunta dos casais punia rigorosa-mente as famílias em que o homem e a mulhertrabalhavam fora. Até 1970, tanto os casais legal-mente casados quanto aqueles que viviam emunião não formalizada tinham seus impostos na-cionais e locais calculados com base na adição

176 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

das rendas, o que significava ganhos líquidos bas-tante baixos para a segunda renda, usualmente aauferida pela mulher, especialmente para aquelacujo marido/companheiro tinha um salário maiselevado.7 “Essa tributação conjunta baseava-se napremissa de que um casamento é uma unidadeeconômica e que a capacidade de recolher impos-tos de um dos membros do casal não poderia serdeterminada independentemente da renda e dosrecursos do outro” (Baude, 1979, p. 155).

O impacto econômico da implementação datributação individual fica claro no seguinte exem-plo: se ambos os cônjuges tinham uma remunera-ção/hora equivalente àquela de um trabalhadormédio da indústria manufatureira, o homem traba-lhando em horário integral e a mulher trabalhan-do meio expediente, a taxa marginal que incidiasobre a remuneração da mulher, em 1970, quan-do da vigência da tributação conjunta, era de 55%.Após a reforma tributária, em 1971, essa taxa caiupara 32,5%. Note-se, entretanto, que esse exemplosuperestima a renda e os impostos das mulheres,uma vez que aquelas que trabalhavam no setormanufatureiro na Suécia recebiam, em 1970, emmédia 85% do salário horário médio (Sundström eStafford, 1992).8

É certo que o cálculo estritamente racional dasvantagens que uma dona-de-casa tem ao ingressarno mercado de trabalho deve também incluir, entreoutros elementos, a disponibilidade ou não de ser-viços públicos de creche e a possibilidade de que arenda adicional venha a elevar a renda familiar to-tal para patamares superiores àqueles que permi-tem à família pleitear o auxílio moradia (ou o direi-to a um aluguel subsidiado, benefício disponível emalguns casos, na Suécia). Pode-se também pergun-tar se a introdução da tributação individual serviucomo incentivo para que as mulheres passassem atrabalhar em tempo integral ou parcial.9 Está alémde nossas possibilidades, neste artigo, tentar mediro peso desses fatores na decisão das mulheres. Ade-mais, essa decisão dependerá, entre outros fatores,das políticas implementadas, das condições do mer-cado de trabalho, de padrões culturais, do grau deinstrução e da idade da mulher.10

Importa sublinhar aqui o fato de a tributaçãoindividual estar também calcada no princípio de

que cada indivíduo, independentemente do sexo,deve ser autônomo e capaz de sustentar a si mes-mo, o que contrasta com o sistema tributário an-terior, que se baseava e, em larga medida, susten-tava o modelo de família do provedor e da dona-de-casa (Liljeström, 1978). Além disso, quando háa possibilidade de escolha para a mulher, esta nãoenvolve apenas o trabalho remunerado e o nãoremunerado, mas, freqüentemente, a maternidadee a vida profissional. Na Suécia, um “generoso”sistema de seguridade familiar foi arquitetado eimplementado exatamente para evitar que a mu-lher passasse a ser apenas supostamente igual aohomem (trabalhando em tempo integral, por todaa vida) ou que ela ficasse eternamente restrita àsfunções domésticas tradicionais.

Se a tributação individual serviu de incenti-vo para que as mulheres ingressassem no merca-do de trabalho, como verificado em uma série deestudos, Juster e Stafford mostraram que a com-binação da tributação individual com um sistematributário altamente progressivo também parecefazer com que os casais passem a dividir o servi-ço doméstico de maneira mais igualitária (1991).Entretanto, é possível afirmar que uma divisãomais igualitária das tarefas domésticas é, em gran-de medida, um impacto não esperado, um “efei-to colateral” da introdução da tributação indivi-dual. O mesmo, contudo, não pode ser dito a res-peito do desenvolvimento do sistema sueco deseguridade familiar, o qual, além de tornar com-patíveis a maternidade e o trabalho remunerado,também foi inequivocamente desenhado para in-duzir os pais a assumirem um papel mais ativo nacriação dos filhos e no compartilhamento das ta-refas domésticas. Se, de acordo com Sandqvist, atributação individual “pode ser considerada a pri-meira manifestação legal do novo paradigma fa-miliar” (1987, p. 146), as políticas analisadas a se-guir constituem uma espécie de “manifesto ofi-cial” do novo paradigma familiar em que tanto ohomem quanto a mulher passam a ser provedo-res, paradigma esse sancionado pelo Estado econsagrado pela prática social.11 Os direitos e osbenefícios que compõem o sistema sueco de se-guridade para os pais serão apresentados na pró-xima seção, que também faz uma comparação

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 177

dos benefícios suecos com aqueles disponíveisem outros países industrializados.

O sistema sueco de seguridade para ospais em uma perspectiva internacional

Uma das mais importantes características domercado de trabalho sueco durante os anos de1970 foi o drástico aumento da proporção demães de crianças em idade pré-escolar que passa-ram a optar pelo trabalho remunerado (Sunds-tröm, 1991). Em 1960, 17% das mulheres casadasque tinham filhos nessa idade estavam emprega-das; a proporção aumentou para 64%, em 1975, epara 84%, em 1984 (Sandqvist, 1987, p. 147). Essamudança, a despeito de suas justificativas socio-culturais e de tendências similares detectadas emmuitos outros países industrializados, deve tam-bém ser interpretada como decorrência da imple-mentação de políticas desenhadas para facilitar acompatibilização da maternidade com o trabalhoremunerado. Nesse sentido, torna-se fundamentalum exame mais detido dos benefícios e da dinâ-mica do sistema sueco de seguridade para os pais.

Se os analistas tendem a concentrar sua aten-ção no programa de licença remunerada para ospais, é importante apresentar, ainda que de ma-neira sucinta, alguns dos outros benefícios com-plementares disponíveis no país, cujo propósitotambém é satisfazer as demandas dos pais traba-lhadores e as necessidades relativas a seu duplopapel, como provedores de assistência aos filhose como assalariados (ou provedores dos recursosmateriais). Os principais benefícios que consti-tuem o sistema sueco de seguridade para os pais(föräldraförsäkring) são os seguintes:

• Auxílio gravidez (Havandeskapspenning): se umamulher grávida tem um emprego que é fisicamen-te estressante, ela tem o direito de solicitar suatransferência para outra função. Se o empregadornão puder fazer a transferência ou se a capacida-de de trabalho da mulher estiver reduzida em umquarto ou mais, ela tem o direito a uma licença re-munerada (ou auxílio gravidez) de no máximocinqüenta dias.12 Auxílios proporcionais podemser concedidos no caso de redução das horas de

trabalho. O valor do benefício é calculado da se-guinte maneira: 65% do SGI diário da grávida du-rante os primeiros três dias de licença (SGI – Sjuk-penninggrudande inkomst = auxílio doença bási-co = renda pessoal anual antes do desconto dosimpostos) e 80% do SGI durante os outros 47 dias.

• Auxílios para os pais (Föräldrapenning): após onascimento do filho ou a adoção de uma criançaque ainda não tenha dez anos, os pais têm direi-to a uma licença remunerada de até um máximode 450 dias (quinze meses). A licença é sujeita àtributação, sendo considerada quando dos cálcu-los para a aposentadoria. Os pais podem esco-lher quando tirar a licença remunerada, mas obenefício não é mais concedido após a criançater terminado o primeiro ano da escola compul-sória, o que geralmente acontece aos onze anosde idade. Se ocorrerem nascimentos múltiplos,os pais têm direito a mais 180 dias de licença nocaso de gêmeos, a mais 360 dias no caso de tri-gêmeos e assim por diante. A forma de usufruira licença pode variar: por tempo integral, pormeio expediente ou apenas durante um quartoda jornada diária de trabalho. Quando os paistêm a custódia conjunta da criança, cada um temdireito à metade do total dos dias de licença re-munerada. Se um dos pais não tiver condiçõesde cuidar da criança, devido a doença, incapaci-dade física ou outras razões similares, o outrotem direito a todo o período de licença remune-rada. Também é possível transferir a licença re-munerada para o parceiro(a), garantindo-se, en-tretanto, trinta dias que são intransferíveis; essatransferência deve ser formalizada junto ao escri-tório do seguro social mais próximo. Pais soltei-ros têm direito a todos os 450 dias de licença.

• Esse auxílio para os pais pode ser concedido an-tes do nascimento da criança para compensar ofato de o auxílio gravidez não ser concedido du-rante os dez dias que precedem o parto e/oupara que os pais possam freqüentar cursos depuericultura e congêneres. Após o nascimento, oauxílio para os pais é pago para aquele que tomaconta da criança. Ambos os pais podem recebero auxílio simultaneamente, relativo a meio expe-diente de licença, se assim desejarem.

• O auxílio é concedido a todos os pais, quer elesestejam empregados ou não. Entretanto, os pais

178 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

que não estavam empregados antes do nascimen-to da criança têm direito apenas a um valor fixo(60 Coroas por dia, em 1995, o que equivalia aaproximadamente U$D 8,50), enquanto os outrostêm direito a benefícios proporcionais à renda.Em 1995, o auxílio concedido durante a licençapara os pais era calculado de acordo com as se-guintes regras: durante os primeiros 360 dias, amãe ou o pai recebia 80% de seus rendimentosbrutos anteriores até um teto de 7,5 basbelopp(que é o “Índice de Preços ao Consumidor Modi-ficado”, que serve como um valor de referênciano sistema de seguridade social sueco);13 os no-venta dias restantes eram remunerados com umvalor fixo (60 Coroas por dia). Somente aquelespais que houvessem trabalhado no mínimo oitomeses consecutivos antes do nascimento dacriança teriam direito a auxílios proporcionais àrenda. A remuneração durante os primeiros trintadias de licença gozados por cada um dos pais erade 90% da renda bruta (esses dias não são trans-feríveis). Pais solteiros tinham direito a sessentadias com benefício de 90% da renda.

• Resumindo, em 1995, os pais de uma criança re-cém-nascida na Suécia tinham direito a dez me-ses de licença com um benefício de 80% da ren-da bruta anterior e a um mês não transferívelpara cada pai, cujo benefício era de 90%, maistrês meses compensados com o valor fixo (60Coroas diárias) (Sundström, 1996, p. 77).

• Auxílios temporários para os pais (Tillfällig Föräl-drapenning): quando a criança ou a pessoa quegeralmente toma conta dela está doente, os paistêm direito a uma licença remunerada por ummáximo de sessenta dias anuais por criança, pe-ríodo esse que, excepcionalmente, pode ser pro-longado até 120 dias. O benefício está disponívelaté que a criança atinja os doze anos de idade. Sea criança tem necessidade de cuidados especiais,o auxílio temporário pode ser estendido até quea criança tenha dezesseis anos. Os benefícios au-feridos também são proporcionais à renda. Em1995, os primeiros catorze dias da “licença paracuidar de uma criança doente” eram compensa-dos com 80% dos rendimentos daquele que se li-cencia. Do 15º dia em diante, a compensação é de

90%. Também nesse caso, os pais podem esco-lher a forma de usufruir os benefícios: em tempointegral, por meio expediente ou apenas duranteum quarto da jornada diária de trabalho. É neces-sário apresentar um atestado se a criança perma-necer doente por mais de sete dias.

• Dias de contato” (Kontaktdagar): a fim de visitara creche ou a escola dos filhos, os pais suecostêm direito a dois dias anuais de licença remune-rada por criança, desde que a criança tenha dequatro a doze anos de idade. Ambos os pais po-dem usufruir o benefício simultaneamente.

• Licença paternidade: os pais suecos têm direito auma licença paternidade de dez dias após o nas-cimento ou adoção de uma criança. Esses dezdias de licença remunerada não podem ser con-cedidos depois de sessenta dias que a criança,saída da maternidade, estiver em casa.

A licença maternidade após o nascimento dacriança, com compensação monetária proporcionalaos rendimentos, é um benefício previsto em lei naSuécia desde 1955; essa licença maternidade origi-nal, de três meses, foi estendida para seis meses em1962. Em 1974, a Suécia tornou-se o primeiro paísdo mundo a transformar a licença maternidade emum sistema de licença remunerada para os pais, ca-paz de beneficiar tanto a mãe quanto o pai. Em paí-ses como a Áustria, Holanda, Japão e Austrália, porexemplo, legislações similares foram introduzidasapenas no início dos anos de 1990 (OECD, 1995).Nos países nórdicos, os pais passaram a ter direitoa compartilhar a licença remunerada após o nasci-mento da criança nos seguintes anos: Suécia (1974),Noruega e Finlândia (1978), Islândia (1980) e Dina-marca (1984). Na Escandinávia, somente na Suéciae na Noruega uma parte da licença é reservada ex-clusivamente para o pai (licença remunerada comoum direito individual, não apenas como um direi-to da família); e somente na Suécia (1979) e na Fin-lândia (1988) os pais de crianças pequenas têm odireito de optar por uma jornada de trabalho de seishoras (com redução proporcional dos salários)(Nordic Council of Ministers, 1994).

Uma avaliação do sistema sueco de licença re-munerada para os pais pode certamente se benefi-ciar com uma breve comparação internacional. A

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 179

Tabela 1 mostra que, no que concerne à duraçãodos benefícios e aos níveis de compensação, o sis-tema sueco é o mais “generoso” entre aqueles dis-poníveis nos países nórdicos.

No entanto, quando a licença sueca é compa-rada a benefícios similares disponíveis em outrospaíses da OCDE (Organização para a Cooperação eo Desenvolvimento Econômico), por exemplo, oresultado é mais ambíguo. A comparação não sis-temática feita a seguir pretende mostrar que, se oprograma sueco de licença remunerada para ospais não é, de uma perspectiva mais ampla eindependentemente dos critérios de avaliação, omais “generoso”, ele é, com certeza, um dos maisflexíveis e adequados quando se pensa nas neces-sidades das famílias em que tanto o pai quanto a

mãe estão engajados no mercado de trabalho.Apresentamos dados de um estudo da OCDE en-globando doze Estados-membros (Alemanha,Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Finlândia,França, Itália, Japão, Noruega, Reino Unido e Sué-cia) (OECD, 1995).

Com relação à duração máxima dos benefí-cios (em janeiro de 1995), os países que ofereciamlicenças remuneradas mais longas do que a sueca,de 64 semanas, eram: Áustria e Alemanha (104 se-manas); Finlândia (benefício básico durante 26 se-manas; benefício estendido até que a criança tenhatrês anos de idade); França (até que a criança te-nha três anos de idade); e Bélgica (260 semanas –não comparável diretamente. É importante obser-var que, dos doze países analisados, somente os

180 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

Tabela 1Programas de Licença Remunerada para os Pais nos Países Nórdicos

Dinamarca Finlândia Islândia Noruega Suécia(1994) (1993) (1994) (1993) (1993)

Período máximo de licença 28 44 26 42/52 (3) 64em semanas, das quais:

• Tempo reservado exclusivamente 18 18 4 9 – (4)

para a mãe

• Tempo reservado exclusivamente – – – 4 – (4)

para o pai

• Tempo que pode ser usado pelo 10 26 22 29/39 64 (4)

pai ou pela mãe

Porcentagem do salário recebida (1) 66 (2) 100/80 (3) 90 (5)

durante a licença

Notas:(1) Na Dinamarca, a licença é remunerada com um benefício fixo mínimo e/ou por meio de compensação salarialdefinida por acordo entre empregados e empregadores.(2) Na Islândia, a licença é remunerada com um benefício fixo mínimo e/ou por meio de compensação salarial de-finida por acordo entre empregados e empregadores. Os servidores públicos têm compensação de 100% do saláriodurante a licença.(3) Na Noruega, os pais podem escolher entre 42 semanas de licença com 100% de compensação pelas perdas sala-riais ou 52 semanas com 80% de compensação, até um teto máximo.(4) A partir de 1995, um mês da licença passou a ser reservado exclusivamente para a mãe e um mês para o pai.(5) Em 1993, o sistema sueco tinha as seguintes regras: 51 semanas com benefício de 90% do salário e treze sema-nas com benefício fixo. Em 1995, o nível de compensação financeira foi rebaixado para 80% do salário, mas os me-ses reservados exclusivamente para o pai e para a mãe continuaram a ser compensados com 90%. Em 1996, o nívelde compensação foi rebaixado ainda mais (para 75%) e os meses reservados passaram a ter benefício de 85%.

Fonte: Nordic Council of Ministers, 1994, p. 39.

programas da Alemanha, Finlândia e Suécia co-briam toda a população, não importando se ospais estavam no mercado de trabalho ou não. NaFrança, por exemplo, a licença não é remuneradaquando do nascimento do primeiro filho. Em mui-tos países, os autônomos, assim como os desem-pregados, não têm direito ao benefício. Na Áustria,Bélgica, Dinamarca e França, a licença para os paisé remunerada com um valor fixo, e na Alemanhaa concessão do benefício monetário, que tambémé fixo, depende de comprovação de carência.

Com relação aos benefícios monetários dosdiferentes programas, aqueles países investigadosque ofereciam benefícios proporcionais aos rendi-mentos anteriores à licença eram: Canadá (57%dos rendimentos semanais médios, até um deter-minado teto); Finlândia (o nível de compensaçãopelas perdas salariais do benefício básico é de 66%dos rendimentos anuais); Itália (30% dos rendi-mentos); Japão (25% dos rendimentos); Noruega(80% dos rendimentos quando da licença de 52 se-manas ou 100% quando da licença de 42 sema-nas); Suécia (80% dos rendimentos durante os pri-meiros dez meses, mais 90% por dois meses – umde usufruto exclusivo da mãe e outro do pai –,mais um valor fixo durante três meses); e ReinoUnido (sistema two-tier; 90% dos rendimentos du-rante as primeiras seis semanas, mais um benefíciode valor fixo durante as outras doze semanas).

Portanto, uma vez que os países que ofere-cem licenças remuneradas mais longas do que asueca têm níveis de compensação financeira maisbaixos – a maioria oferece somente benefícios devalor fixo: Alemanha, Áustria, Bélgica e França –,é possível deduzir que os benefícios suecos sejamdos mais atrativos para os pais trabalhadores.Sabe-se, entretanto, que a real utilização dos be-nefícios não é determinada apenas pela estruturado programa e pelo valor do auxílio ou compen-sação pelas perdas salariais, mas também pelascaracterísticas socioeconômicas dos pais (OECD,1995). Além disso, para que o trabalho remunera-do e as demandas/aspirações das famílias possamser combinados de maneira satisfatória, é necessá-rio adotar medidas destinadas a garantir a flexibi-lidade da jornada de trabalho e a existência deserviços para as famílias, tais como creches, finan-ciados e/ou normatizados pelo poder público.

Está além dos objetivos deste artigo comparar osíndices de utilização dos benefícios nos diferentespaíses; também não será possível fazer uma com-paração das legislações nacionais que introduzi-ram jornadas de trabalho flexíveis em conexãocom o nascimento dos filhos. Com relação à flexi-bilidade na utilização das licenças, todavia, algu-mas breves comparações em nível internacionalpodem ser traçadas a fim de ilustrar o quanto osistema sueco de seguridade para os pais estácomprometido com uma compatibilização efetivaentre a participação no mercado de trabalho e apaternidade/maternidade.

De acordo com o mencionado estudo daOCDE, na maioria dos países a flexibilização daforma com que se usufrui a licença deu-se parale-lamente à extensão progressiva da sua duraçãomáxima. Dois importantes aspectos dessa flexibi-lização devem ser ressaltados: as possibilidadesde se tirar uma licença por tempo parcial e de setransferir o direito à licença da mãe para o pai evice-versa. Um terceiro aspecto a ser destacado éa possibilidade de se interromper a licença e vol-tar a gozá-la após algum tempo.

Apesar de muitas regulamentações nacionais in-cluírem a possibilidade de se tirar a licença portempo parcial – na Holanda essa é a única possi-bilidade – isso geralmente depende da concor-dância do empregador. Somente na França, Fin-lândia, Noruega e Suécia existe o direito legal à li-cença parcial. Uma outra opção – disponível naÁustria, Espanha, Finlândia, Noruega e Suécia – éa possibilidade de os pais reduzirem suas horasde trabalho até que o filho inicie a escolarizaçãocompulsória (OECD, 1995, p. 179).

É importante lembrar que, na Suécia, o direitodos pais a uma licença parcial significa que eles po-dem escolher usufruir a licença em tempo integral,por meio expediente ou apenas durante um quartoda jornada diária de trabalho; eles contam tambémcom o direito de optar por uma jornada de trabalhode seis horas (com redução proporcional dos salá-rios). Além disso, têm a possibilidade do fraciona-mento da licença, caso não queiram ou não possamtirá-la de uma só vez. Essa opção também existe naAlemanha, Dinamarca, Finlândia e Grécia (nosEUA, ela está sujeita à anuência do empregador).

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 181

Ainda de acordo com a OCDE, os paísesnórdicos “têm os sistemas de licença para os paismais avançados e flexíveis” (OECD, 1995, p. 189),sendo que, como visto anteriormente, no queconcerne à duração dos benefícios e aos níveis decompensação pelas perdas salariais, o sistemasueco é o mais “generoso” deles. Quando a ques-tão é a flexibilidade, também é evidente que o sis-tema sueco desponta como um dos mais “vanta-josos” para famílias em que ambos os pais estãoinseridos no mercado de trabalho, dada a possibi-lidade de se tirar uma licença parcial e/ou fracio-nada, enquanto na Dinamarca, Finlândia e Norue-ga, há várias restrições instituídas (para maioresdetalhes, ver OECD, 1995, Tabela 5.1).

Porém, quando a análise é deslocada da pro-visão de benefícios (ou da legislação) para o grauefetivo de sua utilização, torna-se rapidamenteevidente que o uso que os pais fazem dos bene-fícios disponíveis é inferior ao que talvez fossepossível esperar. Já dissemos que não será feitaaqui qualquer análise microsociológica comparati-va do impacto e da utilização efetiva dos diferen-tes programas de licença para os pais em vigor; taltentativa certamente nos afastaria muito dos obje-tivos deste artigo. Assim, a análise subseqüenteconcentra-se na maneira como as mães e os paissuecos têm usufruído o sistema de seguridade,discutindo a medida em que essas políticas têmconseguido, efetivamente, reconfigurar as tradi-cionais atribuições domésticas e profissionais dehomens e mulheres.

O sistema sueco de licença remuneradapara os pais: moldando o comportamen-to dos pais?

A estrutura do sistema sueco de licença re-munerada apresenta uma solução bastante atrativapara o dilema “maternidade versus trabalho remu-nerado”. Na Suécia, dada a conformação desse sis-tema, são oferecidos à mulher muitos incentivospara que planeje sua vida de modo a adiar o nas-cimento (ou adoção) do primeiro filho até que elatenha atingido uma posição relativamente estávelno mercado de trabalho, de tal forma que possausufruir benefícios mais altos quando da licença.

Contudo, antes que possamos dar início ànossa avaliação do grau de utilização da licençapara os pais na Suécia, cuja estruturação tem porobjetivo não apenas salvaguardar o direito da mu-lher ao trabalho remunerado, mas também “defi-nir” (ou “endossar”) a configuração de um tipoparticular de família, parecem importantes algu-mas considerações sobre os anos de retração doEstado de bem-estar no país, em meados da déca-da de 1990, que implicaram a redução circunstan-cial de benefícios tais como aqueles auferidos pormeio do sistema sueco de seguridade para os pais.

A recessão do início dos anos de 1990 não le-vou somente à interrupção do padrão incrementa-lista de melhoria paulatina dos benefícios sociaissuecos, mas também a um declínio dos índices defertilidade e de participação da mulher no mercadode trabalho. Até 1994, o nível sueco de compensa-ção pelas perdas salariais quando do usufruto da li-cença para os pais era de 90% do salário anterior(na verdade, 90% do SGI – Sjukpenninggrudandeinkomst = auxílio doença básico = renda pessoalanual antes do desconto dos impostos, muito pró-xima ao salário bruto); em 1995, o nível de com-pensação foi reduzido para 80%, mas, durante osrecém-introduzidos meses de uso exclusivo (umpara a mãe e outro para o pai), foi mantido o be-nefício de 90%. Em 1996, o nível de compensaçãofoi reduzido ainda mais (para 75%), e o nível decompensação durante os meses de uso exclusivocaiu para 85%. Além disso, o valor fixo recebidonos últimos noventa dias da licença permaneceucongelado em sessenta coroas desde 1987, o quesignificou, é claro, uma desvalorização real dos be-nefícios, ainda que a inflação do período não tenhasido especialmente elevada.

Ainda não estão claras todas as implicaçõesconcretas de tal política de retração, conduzidapela “mesma” social-democracia que erigiu o mo-delo sueco de estatização da provisão de bem-es-tar social, mesmo que o declínio das taxas defertilidade e a diminuição da participação das mu-lheres no mercado de trabalho já tenham sido re-gistrados. O governo social-democrata do períodode retração enfatizava que, a despeito da necessi-dade de se reduzir o gasto público, seriam preser-vados os serviços sociais disponibilizados pelo

182 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

Estado. Assim, talvez fosse possível dizer, porexemplo, que parte significativa dos empregos nosetor público, para onde as mulheres acorreramem grande número, seria preservada. Talvez tam-bém fosse possível alegar que alguns valores es-tão enraizados tão profundamente na sociedadesueca que a retração dos benefícios provavelmen-te não influenciaria muito as taxas de fertilidade.Uma pesquisa, por exemplo, mostrou 47,9% dosentrevistados “concordando firmemente” e outros38,1% “concordando” com a afirmação de que“ver os filhos crescerem é a maior alegria da vida”(Edlund, Sundström e Svallfors, 1994). Contudo, aavaliação do impacto das políticas públicas sobreo comportamento individual é sabidamente pro-blemática, especialmente daquelas que acabampor envolver uma gama tão ampla e diversificadade variáveis; assim, associar de forma acrítica osfenômenos descritos acima pode ser uma reduçãosociológica temerária.

Considerando o impacto do sistema suecode seguridade para os pais sobre as taxas de fer-tilidade, o demógrafo Jan Hoem, ao analisar umaregra do sistema de licença para os pais que ain-da não mencionamos (o chamado “intervalo deelegibilidade”, isto é, o número máximo de mesesentre nascimentos consecutivos que torna possí-vel para as mães reter o nível da compensaçãofinanceira da licença anterior), chegou a uma de-monstração rara de um efeito causal direto da re-forma de uma política sobre o comportamento de-mográfico (Jan Hoem, 1993). A legislação sobre o“intervalo de elegibilidade” (ou o “prêmio pela ra-pidez” do nascimento subseqüente – speed pre-mium, como Hoem o denominou) foi alterada daseguinte maneira: quando a licença remuneradafoi estabelecida na Suécia, era vantajoso adiar onascimento de outra criança até que a elegibilida-de para a compensação pelas perdas salariais ti-vesse sido alcançada novamente, por meio daacumulação adicional de renda auferida no mer-cado de trabalho.

Durante os anos de 1970, um tipo de prêmio pelarapidez (speed premium) foi estabelecido para onascimento subseqüente. Tornou-se legalmentereconhecido o direito da mãe ou do pai de reter,durante a licença referente a um segundo nasci-

mento, o nível de compensação financeira auferi-do quando da licença anterior, desde que o inter-valo entre os dois nascimentos não excedesse operíodo legalmente garantido da licença mais seismeses. Nesse ínterim, o beneficiário não precisa-ria ter tido qualquer renda proveniente de sua in-serção no mercado de trabalho. Em 1974, o inter-valo entre os nascimentos passou a não mais po-der exceder os doze meses, mas, na prática, elepodia ser estendido por intermédio de vários me-canismos, tais como a contagem do tempo emque a pessoa tivesse se licenciado por motivosmédicos ou que tivesse gozado de férias acumu-ladas, extensão essa que podia atingir três meses.Nos anos subseqüentes, o intervalo de elegibilida-de foi expandido em sintonia com a progressivaextensão da licença para os pais prevista em lei,até atingir um máximo de quinze meses em 1979(acrescidos de quaisquer férias acumuladas e doeventual período de licença por motivos médicos[...]). Essa extensão do benefício foi transformadaem lei e estendida para vinte e quatro meses em1980; o intervalo de elegibilidade foi ampliadopara trinta meses em 1986. (As extensões por in-corporação de férias e de licença médica forameliminadas em 1980.) (Jan Hoem, 1993, p. 27).

Como é comum na Suécia que algumas mãesescolham trabalhar durante meio expediente apóso término da licença remunerada, o nascimentode outra criança após o fim do período de elegi-bilidade pode reduzir drasticamente a compensaçãofinanceira da mãe durante a licença remuneradasubseqüente. Portanto, os casais têm um incenti-vo econômico bastante significativo para planejara chegada de seus filhos de acordo com o inter-valo de elegibilidade. A tradução prática dessecálculo foi mostrada por Hoem em sua análise da“incidência de um segundo nascimento, tomadapor base a idade do primeiro filho” e da “incidên-cia de um terceiro nascimento, tomada por base aidade do segundo filho”. Os dados de Hoem mos-tram como os pais suecos responderam pronta-mente à legislação relacionada com os níveis decompensação pelas perdas salariais durante a li-cença, diminuindo o intervalo entre os nascimen-tos. O fato de a incidência do segundo e do ter-ceiro nascimentos ser mais alta logo após o fim dointervalo de elegibilidade também é significativo:se muitos casais reagiram à regulamentação sobrea elegibilidade diminuindo o intervalo entre os

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 183

nascimentos e garantindo o usufruto de benefíciosmais altos, muitos outros falharam, devido às in-certezas da concepção e da gravidez. Não obs-tante, parece claro que aqueles que “falharam”também estavam tentando se beneficiar da legis-lação vigente.

Portanto, é possível dizer que o sistema sue-co de seguridade para os pais é estruturado de talmodo que os casais tenham incentivos para adiar onascimento do primeiro filho (até que a mulher es-teja bem estabelecida no mercado de trabalho) epara programar o nascimento dos filhos subse-qüentes de modo a aproveitar o speed premium.

Também parece-nos importante analisar, ain-da que brevemente, outras implicações da provi-são dos benefícios que compõem o sistema suecosobre o planejamento da vida profissional das mu-lheres e a maneira como os pais suecos reagiramà transformação da licença maternidade em licen-ça para os pais.

É interessante recordar que, quando a Suéciase tornou o primeiro país a implementar um siste-ma de licença remunerada para os pais, em 1974,não existiam os meses de usufruto exclusivo; ospais podiam decidir eles próprios como comparti-lhar toda a licença. Os meses de uso exclusivo fo-ram introduzidos em 1995.14 Um dos objetivos ofi-ciais do sistema sueco sempre foi fomentar a igual-dade entre os sexos; todo indivíduo deveria ter osmesmos direitos à independência econômica atra-vés do engajamento no mercado de trabalho, à par-ticipação e influência na sociedade e nos assuntospúblicos e à oportunidade de cuidar de seus pró-prios filhos. Em busca da igualdade entre homense mulheres, a Suécia, sem negligenciar as questõesrelativas ao mercado de trabalho e à participaçãopolítica, parece ter devotado especial atenção à fa-mília. Hwang sumarizou da seguinte maneira aperspectiva adotada pelos policy makers:

Esperava-se que as mulheres fossem economica-mente independentes de seus parceiros e tão res-ponsáveis quanto eles pelo suporte econômicodos filhos. Os homens deveriam ser igualmenteresponsáveis pelo trabalho doméstico e pelos cui-dados com as crianças. A divisão de tarefas na fa-mília era vista como um pré-requisito para a ple-na participação das mulheres na economia, napolítica e nos sindicatos e como um modo de au-

mentar as oportunidades de auto-realização doshomens como pais e como pessoas que têm inte-resses outros além daqueles relacionados ao mer-cado de trabalho (Hwang, 1987, p. 120).

Com relação à licença remunerada para ospais quando do nascimento de uma criança, pro-jetada para ser um mecanismo de ponta naquela“revolução silenciosa”, deve-se notar que, se qua-se todas as mães suecas têm se beneficiado da li-cença, os índices de utilização dos benefícios pe-los pais têm sido consistentemente baixos.15 Fre-qüentes campanhas publicitárias, financiadas pelasagências públicas que gerenciam os benefícios so-ciais, foram lançadas no país, mostrando homensengajados em atividades tipicamente masculinas,como lutadores e jogadores de futebol, cuidandoe alimentando seus filhos. Apesar desses esforços,no início dos anos de 1980 apenas cerca de 10%dos pais faziam uso de uma parte da licença du-rante os primeiros 180 dias, e somente 2% dos diasde licença eram tirados pelos pais. Tal distribuiçãotalvez possa ser justificada pelo fato de a maioriadas mães amamentarem seus bebês durante os pri-meiros seis meses. No entanto, quando se conside-ra o resto do período de licença remunerado combenefícios proporcionais à renda, percebe-se queapenas 28% dos pais haviam usufruído a licença.A porcentagem dos dias de licença usufruídos pe-los homens era somente 9% do total no início dosanos de 1980; os últimos noventa dias da licença,que são remunerados com um valor fixo, quasenunca eram usados. Quando o primeiro ano apóso nascimento é considerado como um todo, nota-se que quatro de cada cinco pais não tiraram a li-cença nem por um único dia. Em tal período, ospais usaram somente 4% do total dos dias de licen-ça remunerada, enquanto 96% do tempo era usa-do pelas mães (Hwang, 1987, pp. 127-128).

Os índices de utilização da licença pelos ho-mens, entretanto, aumentaram ao longo da décadade 1980. O National Social Insurance Board (Riks-försäkringsverket) investigou como os pais suecosde crianças nascidas em 1989 usaram a licença nosanos de 1989 e 1990 (Riksförsäkringsverket, 1993).Verificou-se que 44% deles tinham recorrido aos be-nefícios durante o período. A investigação é particu-larmente interessante por mostrar como o grau de

184 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

utilização dos benefícios varia significativamente en-tre segmentos sociais distintos. As constatações des-sa pesquisa podem ser resumidas da seguinte forma:

• Há uma diferença entre os índices de utilizaçãoda licença por pais casados e por aqueles quevivem em união não chancelada oficialmente.45% dos homens casados e 49% daqueles dosegundo grupo usufruíram a licença remunera-da no período. Note, entretanto, que os pais ca-sados tiraram um número médio de dias de li-cença mais alto (cinqüenta dias, enquanto amédia do segundo grupo foi de 44 dias).

• Quanto mais velho o pai, maior o número mé-dio de dias de licença tirados. O oposto acon-tecia com as mães: quanto mais jovens, maislonga a licença. Surpreendentemente, foram oscasais jovens (ambos entre vinte e vinte e qua-tro anos de idade) aqueles que dividiram a li-cença de forma mais desigual.

• Quando a criança tinha atingido um ano deidade, 38% dos pais (homens) casados e 44%daqueles que viviam em uniões não chancela-das oficialmente tinham recebido auxílios mo-netários referentes à licença.

• Quanto maior o nível educacional do pai e desua esposa/companheira, mais comum era queo pai tirasse a licença. 51% dos homens haviamtirado licença quando ambos os pais freqüenta-ram escola de nível superior, enquanto somen-te 34% dos homens o fizeram quando ambos ospais tinham apenas a educação compulsória. Aporcentagem de mães que tiraram a licença nãofoi influenciada por seu próprio nível educacio-nal, nem, tampouco, pelo nível educacional deseus maridos/companheiros. O mesmo aconte-ce quando o número de dias de licença remu-nerada é considerado. É importante observar,ainda, que o grupo que compartilhou a licençade maneira mais igualitária (aquele em que am-bos os pais freqüentaram o ensino superior) di-vidiu o período de licença da seguinte manei-ra: os pais tiraram uma média de 58 dias e asmães uma média de 335 dias.

• O grau de utilização da licença pelos homensvaria de acordo com as áreas de atuação pro-

fissional. Mais de 50% dos pais que estudarampedagogia ou enfermagem fizeram uso dos be-nefícios, enquanto um pouco mais de um terçodos pais que estudaram engenharia florestal ouagronomia o fizeram.

• A licença foi utilizada por uma porcentagemmaior de pais que trabalhavam no setor público(57%), quando comparados àqueles do setor pri-vado (48%). Além disso, o fato de a mãe ser fun-cionária pública ou estar engajada no setor pri-vado parece também ter influenciado os índicesde utilização dos benefícios pelos pais. 52% dospais cujas esposas/companheiras eram funcioná-rias públicas fizeram uso do benefício, contra-pondo-se a 47% daqueles cujas esposas/compa-nheiras eram empregadas do setor privado (essepadrão foi percebido desde o início dos anos de1980). A porcentagem de mães que utilizou osbenefícios não foi influenciada pela distinçãoentre pertencimento ao setor público ou ao pri-vado. No entanto, as mães empregadas no setorprivado tiraram licenças mais longas.

• Ainda não foi mencionado neste trabalho o fatode que, a despeito de todos os esforços gover-namentais e do relativo sucesso das políticasdesenhadas para fomentar a igualdade de gê-nero em várias áreas, a Suécia continua tendo,entre os países desenvolvidos, um dos merca-dos de trabalho mais segregados segundo osexo (veja, por exemplo, Jonung, 1984). Noque concerne à licença para os pais, o merca-do de trabalho sueco, fortemente segregado,parece influenciar os índices de utilização dosbenefícios. Entre as quinze ocupações/profis-sões em que é mais comum que os pais (ho-mens) tirem licença, não se encontra nenhumadas trinta ocupações que são mais claramente“dominadas” pelos homens. É muito mais co-mum que os pais que exercem funções usual-mente “dominadas” pelas mulheres (por exem-plo, homens que trabalham como professoresda pré-escola, enfermeiros etc.) tirem a licença.

• Percebeu-se, também, uma relação entre a faixade renda dos pais e os índices de utilização dalicença. O padrão descoberto é, porém, contra-ditório em relação à correlação existente entre

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 185

os índices de utilização e o grau de instrução.Os pais (homens) que têm renda mais baixa sãoaqueles que tiram as licenças mais longas (umamédia de 58 dias), enquanto pais de renda mé-dia tiram uma média de 44 dias da licença.Aqueles que têm renda alta tiram licenças umpouco mais longas que esse último grupo. Asmães, entretanto, não seguem esse padrão.Mães que têm renda alta tiram uma média de284 dias de licença, enquanto aquelas com umarenda média tiram 326 dias, em média, e aque-las que têm renda baixa tiram aproximadamen-te esse mesmo número médio de dias.

• A pesquisa conduzida pelo National Social In-surance Board mostrou, também, que 48% dospais (homens) suecos fizeram uso da licença,enquanto somente 30% dos imigrantes oriun-dos de países outros que não os nórdicos o fi-zeram. Até mesmo a origem das mães pareceinfluenciar os índices de utilização da licençapelos pais. 48% dos pais casados ou vivendocom mulheres suecas gozaram da licença remu-nerada, enquanto apenas 33% daqueles casa-dos ou vivendo com mulheres de países nãonórdicos o fizeram. No entanto, quando foianalisada a extensão da licença gozada, verifi-cou-se que os pais iranianos, por exemplo, ti-raram uma média de oitenta dias, enquanto ossuecos tiraram 48.

Essas constatações evidenciam a influênciatanto do mercado de trabalho quanto de fatoressocioculturais nos índices de utilização da licença.Tendo por base os dados mencionados acima, épossível sugerir algumas explicações importantes.É possível deduzir, por exemplo, parte das razõesque fazem com que pais mais velhos tirem licen-ças remuneradas mais longas do que os mais jo-vens. Em um contexto de crescimento econômicocontinuado e de baixo índice de desemprego, pa-rece razoável supor que os trabalhadores mais ex-perientes tenham uma posição mais consolidadano mercado de trabalho. Assim, talvez seja factívelimaginar que pais mais velhos tenham maiores in-centivos para tirar licenças mais longas, uma vezque a maior parte dos benefícios auferidos duran-te a licença é proporcional à renda. O fato demães mais jovens tenderem a tirar licenças mais

longas talvez possa ser explicado não tanto pelonível de compensação pelas perdas salariais du-rante o período de afastamento, mas pela possibi-lidade de que seu padrão de utilização possa serinfluenciado por uma lógica distinta: mães maisjovens podem estar seguindo um tipo peculiar de“estratégia de adiamento”, qual seja: se o filhochega antes de elas terem atingido uma posiçãomais favorável no mercado de trabalho, pode seruma estratégia racional o adiamento, por um pe-ríodo maior de tempo, da luta por uma melhorposição no mercado de trabalho.16 A surpreenden-te constatação de que os casais mais jovens (20-24 anos) formam o grupo que compartilha a licen-ça para os pais de maneira mais desigual pode serexplicada de forma similar: os pais jovens (ho-mens) podem estar por demais preocupados emmelhorar sua posição no mercado de trabalhopara se “dar o luxo” de gozar licenças mais lon-gas. Note, entretanto, o fato óbvio de a adoção detal cálculo implicar a reprodução da tradicional di-visão de tarefas entre o casal.

No que tange à correlação entre o grau deinstrução, a renda e os índices de utilização da li-cença pelos pais, padrões interessantes podem serpercebidos. Se quanto mais alto o grau de instru-ção do casal, mais freqüente é que o pai tire a li-cença,17 a porcentagem de mães que tiram a licen-ça não é influenciada nem pelo seu próprio níveleducacional nem pelo de seus maridos/compa-nheiros. O mesmo é válido no que concerne à du-ração da licença gozada pelas mães.18 Quando sepresta atenção à duração média da licença tiradapelo grupo menos desigual (composto por famíliasem que ambos os pais freqüentaram escola de ní-vel superior), torna-se evidente que atingir umcompartilhamento mais equilibrado das funçõesdomésticas entre homem e mulher ainda pareceuma utopia distante na Suécia: nesse grupo, ospais (homens) tiraram uma média de 58 dias de li-cença remunerada, enquanto as mães tiraram umamédia de 335 dias. Do ponto de vista da igualda-de de gênero, a assimetria na utilização dos diasde licença parece indicar não apenas as dificulda-des no compartilhamento mais igualitário da tare-fa de provisão doméstica de atenção à criança.Quando se observa o grau de engajamento dos ca-sais suecos no trabalho remunerado e no não re-munerado – o que será discutido mais adiante –,

186 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

fica claro que a tradicional divisão de tarefas ain-da prevalece, a despeito de todos os esforços go-vernamentais e dos elevadíssimos índices de parti-cipação da mulher sueca no mercado de trabalho.

A interpretação que estamos desenvolvendopode ser brevemente interrompida neste ponto,para uma curta digressão a respeito dos padrõesde utilização da “licença temporária” e dos “diasde contato”, padrões esses que não são dissonan-tes do modo como homens e mulheres têm com-partilhado a licença para os pais quando do nas-cimento de um filho. Durante a década de 1980, aporcentagem de homens que usufruíram a licençatemporária variou entre 42,8% (1980) e 39,7%(1984), o que mostra que, na Suécia, é muito maisfreqüente as mulheres permanecerem em casaquando os filhos adoecem. Quando se examina aduração média da licença temporária, essa divisãodesigual torna-se ainda mais evidente.19 No quediz respeito à utilização dos “dias de contato”(para que os pais visitem a creche ou escola dosfilhos – dois dias por ano para cada filho entrequatro e doze anos de idade), o mesmo padrãoassimétrico é encontrado. Em 1987, 34% daquelesque utilizaram os “dias de contato” eram homens.Em 1986, essa modalidade de licença foi tiradaapenas para menos de 12% das crianças, sendoque a maior parte delas iniciava a sua vida esco-lar (Näsman, 1992, p. 12).

Retomando a discussão sobre o compartilha-mento da licença, é importante destacar que ainvestigação conduzida pelo National Social Insu-rance Board também mostrou que os pais (ho-mens) que tinham renda mais baixa tiraram licen-ças mais longas, enquanto aqueles que tinhamrenda média ou alta tiraram licenças menores. Opadrão de utilização dos benefícios pelas mães éum pouco diferente: aquelas que tinham rendaalta tiraram licenças mais curtas, enquanto as quetinham renda média ou baixa tiraram licençasmaiores, sendo muito pequena a diferença en-tre esses dois últimos grupos. A lógica do merca-do de trabalho talvez possa explicar as diferenças:aqueles empregados em setores competitivose/ou cujos empregos envolvem um grau mais ele-vado de responsabilidade – sendo o absenteísmo,conseqüentemente, mais complicado – parecemtirar licenças mais curtas.20 Isso significa que, a

despeito da compensação proporcional pelas per-das salariais, o vínculo com o mercado de traba-lho tem um papel importante no que diz respeitoà decisão de se tirar licenças maiores ou menores.O impacto da vinculação ao setor público ou aoprivado na utilização diferenciada da licença paraos pais parece indicar uma lógica similar.

Vimos que uma maior proporção de pais(homens) empregados no setor público (57%) ti-rou licença, enquanto apenas 48% daquelesempregados no setor privado o fizeram. Os paisempregados no setor público também tiraram li-cenças mais longas (uma média de 57 dias, com-parada com uma média de 43 dias tirados por paisempregados no setor privado). Mesmo o fato de amãe estar empregada no setor público ou no pri-vado influenciou os índices de utilização da licen-ça pelos pais (homens). A seguinte lógica podeser sugerida para explicar esses padrões: sabendoque o setor público é usualmente mais “protegi-do” da pesada competição que normalmente ca-racteriza o setor privado, e que os servidorespúblicos podem ser mais conscientes de seus di-reitos, pode-se sugerir que eles são mais propen-sos a tirar a licença, tendência essa reforçada pelofato de que parecem ser maiores as garantias deque eles consigam reassumir o seu trabalho, apósa licença, exatamente nas mesmas condições.21

Além disso, deve-se também recordar o fato de osetor público sueco não ser estritamente “domina-do” pelos homens. Nesse ponto, é importantelembrar que, segundo a pesquisa conduzida peloNational Social Insurance Board, é mais comumque os pais (homens) que trabalham em ocupa-ções tipicamente femininas tirem licença.

A pesquisa em questão mostrou que o perten-cimento ao setor público ou ao privado não in-fluencia a porcentagem de mães que usufruem a li-cença para os pais. Entretanto, por que as mãesque trabalham no setor privado tiram licenças maislongas? Se é verdade que a força de trabalho femi-nina de baixa qualificação é empregada mais fre-qüentemente no setor privado, pode ser razoávelsupor que essas mães, cientes da precariedade desuas perspectivas de ascensão profissional, esco-lham permanecer com seus filhos por um períodode tempo mais longo. De fato, em um estudo quecompara os padrões de utilização da licença para

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 187

os pais nos países nórdicos, Kaul, não encontran-do explicação para as diferenças na utilização da li-cença na “orientação familiar” da mãe, sugeriu que

[...] as mulheres cujos empregos oferecem condi-ções de trabalho mais precárias desenvolvempoucos vínculos positivos com seu trabalho; suaidentidade com o trabalho, assim, torna-se fraca.Vincular sua identidade à importante função de pro-vedora de atenção aos filhos parece oferecer umaestratégia alternativa razoável (Kaul, 1991, p. 121).

De maneira similar, o fato de ser mais fre-qüente que os pais suecos usufruam a licença doque aqueles nascidos em países não escandinavospode ser explicado tanto por fatores relacionadosao mercado de trabalho quanto por fatores cultu-rais. Pais iranianos, por exemplo, que não são tãopropensos a gozar da licença quanto os suecos,usufruem, no entanto, licenças mais longas. O pa-drão talvez possa ser explicado pela mesma lógicaque utilizamos para tentar decifrar as razões quelevam as mães empregadas no setor privado a ti-rar licenças maiores.

As diferentes taxas de utilização da licençapor pais casados e por aqueles que vivem emuniões não chanceladas formalmente ainda preci-sam de explicação. Por que pais casados tiram li-cenças mais longas, mas uma proporção maior depais do segundo grupo tira licença? Não dispomosde dados capazes de sustentar uma explicaçãoconvincente. Seria razoável sugerir que os pais ca-sados tiram licenças mais longas porque são maisvelhos (e lembre-se que quanto mais velho o paimaior a licença)?

Os dados apresentados e discutidos mostramque os benefícios relacionados à licença para ospais não conseguem fazer com que os homenspassem a assumir um papel mais significativo noâmbito doméstico da criação dos filhos, isto é,que os esforços do governo sueco no sentido depromover um compartilhamento mais igualitáriodas tarefas ainda não tiveram o sucesso espera-do.22 As persistentes discrepâncias de gênero têmsido também, de maneira similar, detectadas porpesquisas que desvendam o modo como os sue-cos empregam o seu tempo. Assim, os dadosapresentados a seguir, referentes à maneira como

os casais suecos dividem, na prática, as suas tare-fas cotidianas, parecem reiterar algumas das prin-cipais questões que acabamos de discutir. A Tabe-la 2 mostra como, na Suécia, diferentes grupos, di-vididos por sexo e de acordo com sua faixa etáriae situação familiar, empregam o seu tempo.

Se a carga de trabalho total (remunerado +não remunerado) dos homens e das mulheres ébastante similar na Suécia (ver também Tabela 3),é evidente que as mulheres (em todas as faixasetárias e situações familiares) ainda devotam umaparte significativamente maior de seu tempo aotrabalho não remunerado, enquanto os homens(em todas as faixas etárias e situações familiares)passam a maior parte do seu tempo exercendo ati-vidades relacionadas ao trabalho remunerado.Também fica claro que os homens parecem usu-fruir um pouco mais de “tempo livre” (com exce-ção dos homens de meia idade sem filhos). Poroutro lado, as mulheres “gastam” mais tempo com“necessidades pessoais”. Note que as maiores dis-crepâncias entre o envolvimento de mulheres ehomens com o trabalho não remunerado são en-contradas nas categorias “pais com filhos”, o que,de certo modo, reflete também o uso diferenciadoque pais e mães fazem da licença na Suécia. Tam-bém é evidente que os pais trabalham mais do queos outros homens, o que é verdade tanto no queconcerne ao trabalho remunerado como no que serefere ao trabalho não remunerado (e os pais decrianças pequenas também estão mais envolvidoscom o trabalho não remunerado do que qualqueroutro grupo de homens). As mães devotam muitomais tempo ao trabalho não remunerado do queas mulheres jovens ou as mulheres sem filhos. Atabela acima retrata com clareza a persistência deuma divisão tradicional das tarefas entre homens emulheres, ainda que sejam muito elevadas as taxasde participação da mulher sueca no mercado detrabalho; quando os filhos são mais jovens, a dis-crepância entre as tarefas exercidas pelos homense aquelas exercidas pelas mulheres aparece comuma nitidez ainda maior.

Quando se analisa o tipo de atividade que asmulheres e os homens suecos exercem como “tra-balho não remunerado”, o quadro resultante ape-nas confirma a persistência de uma divisão de tare-

188 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 189

Tabela 2Uso do Tempo Segundo a Idade, o Sexo e a Situação Familiar – Suécia 1990/1991

Distribuição percentual para um dia normal (computado o final de semana), calculada para todos os in-divíduos em cada grupo

M H M H M H M H M H M H

Jovens: 20-24 anos 15 22 11 7 6 5 44 41 23 24 100 100

Adultos (25-44 anos) sem filhos 20 24 14 10 2 2 43 41 21 23 100 100

Adultos (45-64 anos) sem filhos 16 22 18 12 0 0 43 42 23 22 100 100

Pais com filhos entre 0 e 6 anos 12 27 28 15 2 1 42 40 16 17 100 100

Pais com filhos entre 7 e 17 anos 20 28 19 12 1 1 42 40 17 19 100 100

Média de todos os grupos 16 25 20 12 1 1 43 41 20 21 100 100

M = Mulheres; H = Homens. “Trabalho Remunerado” inclui o tempo de almoço durante os dias úteis e o tempo des-pendido no trajeto casa-trabalho. “Necessidades Pessoais” incluem o tempo de sono, de descanso, das refeições, den-tre outros itens similares.

Fonte: Adaptado de Nordic Council of Ministers, 1994, p. 31.

Tabela 3Tempo Dedicado ao Trabalho por Pessoas entre 20 e 64 anos de Idade – Suécia 1990/1991

Distribuição percentual por tipo de atividade em um dia normal

Tipo de Atividade Mulheres (%) Homens (%)

Trabalho Remunerado 45 67 Trabalho Não-Remunerado 55 33

Discriminação: Trabalho doméstico 29 11 Atenção aos filhos 8 3 Aquisição de bens e serviços 6 4 Reparos e manutenção 4 7 Atenção dispensada a outros 2 2 Outros tipos de trabalho no lar 1 1 Deslocamento relacionado ao trabalho não remunerado 5 5

Volume Total de Trabalho 100 100

Horas e Minutos 8:40 8:45

Fonte: Adaptado de Nordic Council of Ministers, 1994, p. 32.

Trabalho

Remune-

rado

Trabalhonão Re-mune-rado

Educa-ção

Necessi-dades

Pessoais

TempoLivre

Total(%)

fas desigual e determinada pelo gênero (e lembre-se que, no que diz respeito ao trabalho remunera-do, o sexo também parece determinar as “chances”de uma pessoa trabalhar durante tempo integral ouparcial. Além disso, como mencionado anterior-mente, é importante não esquecermos que, entreos países industrializados, o mercado de trabalhosueco é, talvez, surpreendentemente, um dos maissegregados por gênero). A Tabela 3 mostra como acarga de trabalho dos homens e das mulheres é di-vidida na Suécia, discriminando algumas das prin-cipais formas de trabalho não remunerado.

A Tabela 3 evidencia que o trabalho não re-munerado é ainda dividido na Suécia de acordocom a tradicional alocação de tarefas entre ho-mens e mulheres. Enquanto as mulheres fazem amaior parte do trabalho doméstico e passam mui-to mais tempo cuidando dos filhos, fazendo com-pras e contratando serviços, os “reparos e manu-tenção” são atividades masculinas de relativo des-taque sob a rubrica “trabalho não remunerado”.Fica claro que, se o modelo familiar dos dois pro-vedores é hoje preponderante na Suécia,23 a dese-jada transição do modelo familiar do “ho-mem/provedor e da mulher/dona de casa” paraum tipo de família capaz de dividir igualmente to-das as tarefas permanece como uma utopia. Entre-tanto, como foi sugerido por Karin Sandqvist, a“distinção sueca entre masculinidade e feminili-dade pertence mais ao campo [da distribuição]das tarefas, dos interesses e das áreas de especia-lização do que ao campo dos valores e da estru-tura das personalidades” (1992, p. 91). Contudo, adespeito da persistência de um certo tradicionalis-mo na divisão das tarefas entre homens e mulhe-res, não se deve desconsiderar as mudanças so-ciais em curso no país.

A diferença entre o tempo que mulheres ehomens despendem no “trabalho remunerado”,retratada na Tabela 3, reflete tanto a maior por-centagem de homens engajados no mercado detrabalho como a maior porcentagem de mulherestrabalhando em tempo parcial. Sabe-se que a en-trada das mulheres suecas no mercado de traba-lho se deu, em grande medida, pelo regime detempo parcial. A tendência atual, entretanto, é deque as mães aumentem o número de horas dedi-

cadas ao trabalho remunerado e que os pais si-gam o caminho inverso (ver, por exemplo, Näs-man, 1992). A opção por trabalhar em tempoparcial, como modo de combinar a responsabili-dade tradicional das mulheres pela casa e pelascrianças com o novo papel compartilhado deprovedoras, foi denominada pela demógrafa EvaBernhardt de “estratégia de combinação” dasmulheres suecas (apud Näsman, 1992). Talvezpossa ser sugerido, entretanto, que os pais (ho-mens) suecos, em vez de adotar qualquer tipoparticular de “estratégia de combinação”, ainda“ajudam com os pratos” ou “passam um tempocom as crianças”. No entanto, uma vez mais éaconselhável examinar a questão de uma pers-pectiva de longo prazo.

Os dados apresentados nas Tabelas 2 e 3podem certamente ser interpretados como umaindicação bastante concreta da persistência deuma tradicional divisão de tarefas entre homens emulheres na Suécia. Na verdade, os debates tra-vados no país, toda vez que se evidencia a dis-crepância entre o objetivo oficial de fomentar aigualdade de gênero e a relativa falta de elastici-dade do comportamento social, tendem a enfati-zar as desigualdades atuais mais do que o pro-gresso alcançado. O comportamento dos pais(homens) suecos de duas gerações distintas deveser comparado para que possamos perceber quenão é de todo infundada a sugestão de que aigualdade de gênero na esfera privada talvez jáesteja sendo gestada no país, ainda que os resul-tados não sejam tão tangíveis quanto aqueles re-gistrados em outras esferas.24

Duas pesquisas, que se valeram de amostrasnacionais abrangentes, mostraram que, em 1957,14% dos pais (homens) “ajudavam” a lavar os pra-tos e 4% ajudavam a cozinhar; em 1982, 40% dospais afirmaram que eles no mínimo dividiamigualmente a tarefa de lavar as louças, enquanto14% cozinhavam (apud Sandqvist, 1987, p. 153).Além disso, vários estudos qualitativos têm mos-trado que, atualmente, os pais (homens) estãomuito mais envolvidos no trabalho doméstico,sentindo-se muito mais responsáveis pela criaçãodos filhos do que os pais entrevistados em estu-dos anteriores (ver Sandqvist, 1992).

190 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

Considerações Finais

Confirmando que, quando a questão é a di-visão do trabalho doméstico, a prática social ficamuito distante da ideologia na Suécia, a sociólogaLinda Haas mostrou que os casais suecos, no en-tanto, realmente dividem o trabalho doméstico deforma mais igualitária do que os casais norte-ame-ricanos (Haas, 1981). Na verdade, vários outros es-tudos comparativos têm sugerido que os papéisatribuídos a homens e mulheres na Suécia sãomuito menos diferenciados do que em outros paí-ses, pelo menos quando o mercado de trabalhonão é levado em consideração (Sandqvist, 1992).Além disso, foi demonstrado por Moen que a pro-babilidade de sofrer estresse psicológico e fadigase tornou também mais equivalente entre mães epais suecos entre os anos de 1968 e 1981, na es-teira do grande aumento, no período, da participa-ção das mães suecas no mercado de trabalho. Issopode indicar também uma divisão mais igualitáriadas tarefas domésticas entre os membros do casal,o que pode ter sido influenciado pelo sistema sue-co de seguridade para os pais (Moen, 1989).

Portanto, se a carga de trabalho dos homense das mulheres ainda é relativamente mal distri-buída na Suécia, vários fatores sugerem uma pos-sível redução tendencial dessas assimetrias: au-mento da participação das mulheres/mães nomercado de trabalho (uma tendência que foi inter-rompida pela recessão do início dos anos de1990); maior porcentagem de mulheres trabalhan-do em tempo integral; crescente número de pais(homens) que usufruem a licença quando do nas-cimento dos filhos, participando, assim, mais ati-vamente na sua criação; aparente surgimento deum padrão mais igualitário, ainda que longe deser simétrico, de divisão do trabalho não remune-rado entre os membros do casal.

Entretanto, se o sistema de seguridade paraos pais implementado na Suécia é bastante “gene-roso” quando comparado a benefícios similaresdisponíveis em outras nações industrializadas,propiciando licenças longas, flexíveis e destinadasa suprir necessidades diversas, oferecendo com-pensações pelas perdas salariais relativamente al-tas, parece plausível afirmar que a ênfase do sis-

tema recai mais sobre a possibilidade de se com-patibilizar a maternidade com o trabalho remune-rado do que sobre o declarado objetivo de indu-zir a criação de uma perfeita simetria entre os pa-péis assignados aos pais e às mães. Argumenta-se,freqüentemente, na Suécia, que uma boa partedos empecilhos a uma distribuição mais igualitá-ria do trabalho remunerado e do não remuneradodesapareceria se a jornada de trabalho de seis ho-ras fosse implementada no país. No entanto, umavez que tal redução ainda não parece factível,uma política que havia sido orientada inicialmen-te pela oferta aos pais de incentivos econômicos,seguida de campanhas de “esclarecimento” (istoé, que enfatizava a indução racional e moral da al-teração do comportamento individual), começoua mudar em 1995, quando os meses de uso exclu-sivo foram introduzidos na regulamentação da li-cença e os níveis de compensação pelas perdassalariais foram reduzidos pela primeira vez. Certa-mente, “reservar” um mês de licença para o usu-fruto exclusivo das mães e outro para o usufrutodos pais teria sido uma mudança muito mais retó-rica se o nível dos benefícios auferidos duranteesses meses não tivesse sido preservado.

A resposta do governo social-democrata daSuécia à recessão econômica, materializada na re-forma da licença para os pais, foi ambivalente. Seo governo tivesse seguido a opinião pública, osmeses de uso exclusivo não teriam sido introduzi-dos, uma vez que a maioria dos suecos era contraa proposta (ver nota 13). Entretanto, como nãohavia uma oposição organizada com vistas ao re-chaçamento da reforma, e como o Partido SocialDemocrata (entre outros partidos suecos) estavainteressado em cultivar a imagem de um partidosensível às demandas e necessidades da mulher,talvez seja plausível interpretar a reforma tantocomo uma mera redução no nível dos benefícios,quanto como uma mudança que significou a ado-ção de uma posição mais afirmativa em favor daigualdade entre os sexos.

Porém, independentemente dos claros obs-táculos à efetivação dos objetivos da “engenhariasocial” sueca, interpostos pelo mercado de traba-lho, pela persistência de práticas sociais que ain-da preservam um certo tradicionalismo e pela pró-

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 191

pria perda de capacidade fiscal e regulatória doEstado, as políticas aqui discutidas parecem evi-denciar o fato de que, se é verdade que a “longamarcha” pela redução das disparidades salariais epela implantação da democracia econômica vemsendo relegada a um segundo plano pela social-democracia sueca, pelo menos desde a década de1980, o front de batalha pela igualdade de gêne-ro, aberto na década de 1960, parece hoje concen-trar os esforços e a capacidade de inovação quetêm tornado plausíveis, no caso dos países escan-dinavos em geral e no caso da Suécia em especial,denominações como “Estado amigo das mulhe-res” e caracterizações de um suposto “feminismode Estado”.

NOTAS

1 É importante ressaltar, ainda, que o pleno emprego

foi, ao menos até a década de 1980, uma priorida-

de na agenda da social-democracia sueca, que tem

sido o partido mais votado no país desde as elei-

ções de 1917, a despeito de seu domínio parlamen-

tar só ter se consolidado a partir das eleições de

1932 (Faria, 1996).

2 A limitação propositada da atividade econômica pa-

rece uma “opção” que até mesmo o Partido Am-

bientalista Sueco – Miljöpartiet, fundado em 1981,

cogitou apenas cautelosamente em seu período de

maior radicalização.

3 Além disso, a carência de mão-de-obra na Suécia foi

acentuada pela redução legal da jornada de traba-

lho. Em 1972, o número de horas semanais dedica-

das ao trabalho foi reduzido de 42,5 para 40 horas;

em 1976, a idade mínima para a aposentadoria foi

rebaixada de 67 para 65 anos; o tempo de férias

passou para cinco semanas em 1978, e para 5,5 se-

manas em 1990 (Sundström, 1991, p. 180).

4 De acordo com Nils Elvander, o debate acerca da

tributação individual não foi originalmente conduzi-

do segundo clivagens político-partidárias, mas leva-

do adiante por militantes do movimento feminista.

Segundo o argumento, levaria algum tempo até que

o Partido Social-Democrata resolvesse dar à questão

a importância devida. Gunnar Sträng, o Ministro so-

cial-democrata das Finanças, por exemplo, seria

convencido da relevância da tributação individual

apenas em meados da década de 1960, após repeti-

das previsões do aumento da carência de força de

trabalho no país (apud Gustafsson, 1990). Gustaf

Lindencrona, por sua vez, assevera que a necessida-

de de igualização entre os sexos tornou-se um dos

principais argumentos empregados em favor da tri-

butação individual na Suécia (Lindencrona, 1989).

5 Löfström e Gustafsson, em uma avaliação do impac-to de algumas inovações das políticas salariais sobrea remuneração das mulheres na Suécia, chegaram àseguinte conclusão: “os salários relativos das mulhe-res que eram operárias na manufatura cresceram,em média, de 70% a 90% entre 1960 e 1985. A pre-sente análise empírica indica que por volta de 50%desse aumento foi devido a diversas mudanças ins-titucionais. O acordo sobre remunerações idênticaspara o mesmo tipo de trabalho (1960) e o direitofranqueado às mulheres de trabalhar à noite nas in-dústrias (1962) parecem ter gerado os maiores efei-tos. Ainda resta, entretanto, alguma incerteza quan-to aos efeitos do acordo sobre oportunidades iguaispara mulheres e homens (1977). Esse estudo indica,assim, que leis e acordos que contribuem para mu-danças quantitativas e qualitativas podem ser usa-dos com sucesso para igualizar as condições em ge-ral e os salários de homens e mulheres no mercadode trabalho” (Löfström e Gustafsson, 1990, p. 15).

6 Em um estudo de 1992, que comparava a oferta detrabalho feminino na Suécia e na Holanda, Anders-son et al. mostraram que as mulheres suecas erammais “emancipadas” que as holandesas, uma vez queseu nível de engajamento no mercado de trabalhonão era influenciado pela renda do marido (1992).

7 É importante destacar, porém, que a tributação indi-vidual havia se tornado opcional já em 1967. A refor-ma de 1971 a fez compulsória (Moen, 1989, p. 25).

8 Nos Estados Unidos ou na Inglaterra, por exemplo,onde a tributação individual foi introduzida apenasno final dos anos de 1980, o efeito da tributaçãoconjunta sobre o salário das mulheres não era tãoperverso, uma vez que os sistemas tributários des-ses países não eram tão progressivos (Lewis e Ås-tröm, 1992, p. 67).

9 Ao longo dos anos de 1970, as taxas marginais so-bre a remuneração daqueles empregados em horá-rio integral cresceram acentuadamente, enquantoas taxas daqueles que trabalhavam meio expedien-te permaneceram relativamente constantes. Assim,

192 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

não deve ser surpreendente o fato de, duranteaquela década, a maioria das mulheres ter ingressa-do no mercado de trabalho assumindo empregosde jornada reduzida. A proporção de mulheres tra-balhando em tempo parcial, que era de 38% em1970, atingiu um pico de 47% em 1982. Com a re-forma tributária de 1982, que limitou as taxas mar-ginais a um máximo de 50% para a maioria dos as-salariados, o número médio de horas trabalhadasaumentou para os homens e, particularmente, paraas mulheres. Uma outra reforma tributária entrouem vigor em 1990, reduzindo ainda mais as taxasmarginais (a um máximo de 33%). De uma manei-ra geral, pode-se dizer que a oferta de trabalho fe-minino foi muito mais afetada pelas alterações nosalário líquido do que a oferta de trabalho dos ho-mens (Sundström e Stafford, 1992, pp. 204-205). So-bre a popularização entre as mulheres suecas dotrabalho em tempo integral durante a década de1980, ver Sundström, 1993.

10 Note-se que a participação da mulher sueca no mer-cado de trabalho declina com o aumento da idade(Andersson et al., 1992).

11 Um survey conduzido em 1992 na Suécia mostrouque o modelo familiar dos dois provedores se tor-nou amplamente reconhecido como um valor tantopor homens como por mulheres, especialmente pe-las últimas. Ficou também evidente que o estilo devida da dona-de-casa não parece mais ser atraentepara as suecas (Björnberg, 1993).

12 Consideramos, neste artigo, regras, regulamentos eníveis de compensação salarial vigentes em 1995. Afonte é o livro Vår Trygghet 1995 (Folksam, 1995),que procura esclarecer aos suecos seus direitos so-ciais, apresentando em detalhes os benefícios dispo-níveis e as regras de elegibilidade. Até a trigésimaedição, de 1995, quase 2,6 milhões de cópias ha-viam sido vendidas.

13 Em 1985, menos de 1% das mulheres e menos de10% dos homens na Suécia tinham rendimentosmaiores do que as 7,5 “basbelopp” (Sundström e Staf-ford, 1992, p. 213).

14 Note que uma pesquisa conduzida pelo BureauCentral de Estatísticas da Suécia em 1992/1993 mos-trou que 55% das entrevistadas e 60% dos homensnão consideravam positiva a introdução de períodosde uso exclusivo no sistema de licença remunerada(Statistiska Centralbyrån, 1994, tabela 6.3).

15 Quando se trata de compreender a “relutância” dospais suecos em tirar a licença, é essencial recordar-mos que os homens geralmente ganham mais doque as mulheres na Suécia, o que, como será visto,não é a única razão para esse comportamento.

16 Note, entretanto, que outra “estratégia de adiamen-to” tem sido amplamente reconhecida: adiar o nas-cimento do primeiro filho para uma idade maisavançada. De acordo com Jan Hoem, “uma fertilida-de relativamente alta e em crescimento no grupo demulheres na faixa dos trinta anos é uma caracterís-tica proeminente do comportamento recente da fa-mília sueca” (1993, p. 22). De fato, no início dos nosde 1990, as mulheres suecas na faixa dos trinta anosde idade apresentavam uma taxa de fertilidade maisalta do que a daquelas na faixa de vinte e poucosanos. Essa tendência significou uma inversão mar-cante do padrão prevalecente em meados dos anosde 1970, quando o grupo mais jovem apresentavauma taxa de fertilidade duas vezes maior do que ado grupo mais velho (Jan Hoem, 1990). É importanteressaltar que, se essa inversão foi, provavelmente,encorajada pelas campanhas publicitárias lançadascom o intuito de sensibilizar os grupos mais jovensquanto à importância da paternidade responsável epelo enraizamento de valores como a “auto-realiza-ção”, ela também parece refletir a estrutura dos be-nefícios oferecidos pelo sistema sueco de segurida-de para os pais.

17 Como salientado por Kaul (1991), mulheres que têm

uma posição de maior prestígio no mercado de tra-

balho podem também usufruir uma situação mais

cômoda quando da negociação com seus parceiros

sobre a divisão do trabalho familiar. Não se deve

negligenciar, ainda, o fato de que, nesses casos,

seus recursos de barganha também são, provavel-

mente, mais desenvolvidos.

18 No que tange à correlação entre o grau de instrução

e as taxas de fertilidade, um padrão notável foi de-

tectado na Suécia: mães com alto grau de instrução

que têm dois filhos partem para uma terceira gravi-

dez com mais freqüência do que aquelas que têm o

mesmo número de filhos mas um menor grau de es-

colaridade (Britta Hoem, 1993).

19 Note que, durante a década de 1980, a duração mé-

dia da licença temporária por filho foi bastante es-

tável, sendo de pouco mais de seis dias por ano

(Näsman, 1992, p. 12).

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER 193

20 Outra pesquisa mostrou que pais (homens) “que

ocupavam postos de gerência ou supervisão tinham

optado pela licença em tempo integral com menor

freqüência do que outros pais” (apud Sundström e

Stafford, 1992, p. 209). De acordo com um estudo

da OCDE, o “seguinte padrão foi observado nos

países nórdicos: a mais alta incidência de retorno ao

trabalho após a licença para os pais é encontrada

entre mães que tinham empregos que ofereciam

boas condições de trabalho e entre aquelas que re-

latam que seu emprego é importante para elas. Esse

último grupo inclui, principal, mas não exclusiva-

mente, mulheres que exercem funções altamente

qualificadas. Contrariamente, mulheres que exer-

cem funções subordinadas, particularmente aquelas

funções que são tipicamente femininas, retornam

menos freqüentemente a seus empregos” (OECD,

1995, p. 188). Note, entretanto, que tem se tornado

cada vez mais raro as mulheres suecas abandona-

rem o mercado de trabalho após o nascimento dos

filhos (Näsman, 1992).

21 A fim de minimizar qualquer possibilidade de rea-

ção negativa ou punitiva do empregador quando os

pais tiram a licença, os “auxílios para os pais”, os

“auxílios temporários para os pais”, os “dias de con-

tato” e a “licença paternidade” são financiadas com

recursos provenientes de impostos gerais, sem ne-

nhum custo direto para o empregador do beneficiá-

rio. No entanto, uma pesquisa conduzida por Näs-

man mostrou que 25% dos pais (homens) entrevis-

tados relataram que tinham encontrado dificuldades

no local de trabalho relacionadas ao gozo da licen-

ça para os pais. Isso ocorreu muito mais freqüente-

mente com pais empregados no setor privado, com

trabalhadores de colarinho branco em setores ge-

renciais, com aqueles que exerciam as suas funções

em um local de trabalho onde havia poucos funcio-

nários e com aqueles que possuíam um tipo dife-

renciado de especialização (1992, p. 14). A despei-

to das garantias legais, entretanto, outra pesquisa

mostrou que o gozo da licença tem outros custos

tanto para os homens como para as mulheres, sen-

do os custos para os homens, medidos na forma de

aumentos salariais, bem maiores (Sundström e Staf-

ford, 1994).

22 Para uma crítica feminista ao sistema sueco de licen-ça para os pais, ver Kaul, 1991 e Widerberg, 1991.

23 Note, entretanto, que, se a participação das mães no

mercado de trabalho se tornou corriqueira, paramuitas famílias o fator determinante é menos a“ideologia” do que a economia familiar. “Duas ren-das são necessárias para se permanecer acima da li-nha de pobreza [...] para a maioria das famílias sue-cas” (Sandqvist, 1992, p. 83).

24 Tem tido grande visibilidade internacional o impac-to da intervenção governamental e do ativismo dedistintos grupos na redução das disparidades sala-riais e no incremento da participação feminina nouniverso político e sindical.

BIBLIOGRAFIA

ANDERSSON, A-K et al. (1992), “Taxes and laborsupply: Dutch and Swedish women”. Me-morandum, 164, Department of Econo-mics, Gothenburg University.

BAUDE, Annika. (1979), “Public policy and chan-ging family patterns in Sweden, 1930-1977”, in J. Lipman-Blumen & J. Bernard(eds.), Sex roles and social policy: a com-plex social science equation, Londres,Sage.

BJÖRNBERG, Ulla. (1993), “Political parenthoodamong women and men in Sweden”, in“Politics: a power base for women?”, Öre-bro Women’s Studies, 3, Örebro Univer-sity, pp. 5-30.

EDLUND, J.; SUNDSTRÖM, E. & SVALLFORS, S.(1994), Attitudes towards family and gen-der roles: a Swedish survey. Umeå, UmeåUniversity, Department of Sociology.

FARIA, Carlos Aurélio P. (1998a), “A criança entreo Estado, o mercado e a família: o siste-ma sueco de creches em uma perspecti-va comparada”. Dados, 41 (2): 283-335.

________. (1998b), “Uma genealogia das teoriase modelos do Estado de bem-estar so-cial”. BIB – Revista Brasileira de Infor-mação Bibliográfica em Ciências So-ciais, 46: 38-71.

194 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 No 48

________. (1997), “A questão populacional e aconformação do Estado de bem-estar naSuécia”. Revista Brasileira de Estudos Po-pulacionais – IPEA/IBGE, 14 (1/2): 73-95.

________. (1996), “Crise na social-democracia sue-ca: a dissolução de velhas lealdades”.Dados, 39 (2): 279-314.

FOLKSAM. (1995), Vår Trygghet, 1995. Stoc-kholm, Folksam Förlagsservice.

GUSTAFSSON, Siv. (1990), “Separate taxation andmarried women’s labor supply: a compa-rison of West Germany and Sweden”. Re-search Memorandum, 9016, Departmentof Economics, University of Amsterdam.

________. (1984), “Equal opportunity policies inSweden”, in Günter Schmid & RenateWeitzel (eds.). (1984), Sex discriminationand equal opportunity: the labor marketand employment policy, Nova York, St.Martin’s Press.

HAAS, Linda. (1981), “Domestic role sharing inSweden”. Journal of Marriage and theFamily, 43 (4): 957-967.

HOBSON, Barbara. (1993), “Feminist strategies andgendered discourses in welfare States: mar-ried women’s right to work in The UnitedStates and Sweden”, in S. Koven & S. Mi-chel (eds.), Mothers of a new world: mater-nalist politics and the origins of the WelfareState, Nova York, Routledge.

HOEM, Britta. (1993), “The compatibility of em-ployment and childbearing in contempo-rary Sweden”. Acta Sociologica, 36 (2):101-120.

HOEM, Jan M. (1993), “Public policy as the fuel offertility: effectts of a policy reform on thepace of childbearing in Sweden in the1980s”. Acta Sociologica, 36 (1): 19-31.

_________. (1990), “Social policy and recent fa-mily change in Sweden”. Population andDevelopment Review, 16 (4): 735-748.

HWANG, Carl P. (1987), “The changing role ofSwedish fathers”, in Michael E. Lamb

(ed.), The father’s role: cross-culturalperspectives. Hillsdale, New Jersey, La-wrence Erlbaum Associates.

JONUNG, Christina. (1984), “Patterns of occupa-tional segregation by sex in the labormarket”, in G. Schmid & R. Weitzel (eds.),Sex discrimination and equal opportu-nity: the labor market and employmentpolicy. Nova York, St. Martin’s Press.

JUSTER, F. T. & STAFFORD, F. (1991), “The alloca-tion of time: empirical findings, behavio-ral models, and problems of measure-ment”. Journal of Economic Literature,29: 471-521.

KAUL, HjØrdis. (1991), “Who cares? Gender ine-quality and care leave in the Nordic Coun-tries”. Acta Sociologica, 34 (2): 115-125.

LEWIS, J. & ÅSTRÖM, G. (1992), “Equality, diffe-rence, and the State Welfare: labor marketand family policies in Sweden”. FeministStudies, 18 (1): 59-87.

LILJESTRÖM, Rita. (1978), “Sweden”, in S. B. Ka-merman & A. J. Kahn (eds.), Family po-licy: government and families in FourteenCountries, Nova York, Columbia Univer-sity Press.

LINDENCRONA, Gustaf. (1989), “Från Sam-till Sär-beskattning. En Studie i Skatterätt ochJämställdhet”, in Öpnna Föreläsningar iJuridik. Höstterminen 1988-1989. Stoc-kholm, Juridiska Fakulteten i Stockholm,Skriftserien, 22: 19-37.

LIPMAN-BLUMEN, Jean & BERNARD, Jessie.(eds.)(1979), Sex roles and social policy: acomplex social science equation. Londres,Sage.

LÖFSTRÖM, Åsa & GUSTAFSSON, Siv. (1990), “Po-licy changes and women’s wages in Swe-den”. Umeå Economic Studies, 232, Univer-sity of Umeå.

MOEN, Phyllis. (1989), Working parents: transfor-mations in gender roles and public policiesin Sweden. Londres, Adamantine Press.

ENTRE MARIDO E MULHER, O ESTADO METE A COLHER: 195

NORDIC COUNCIL of MINISTERS. (1994), Womenand men in the Nordic Countries. Cope-nhagen.

NÄSMAN, Elisabet. (1992), “Parental leave in Swe-den: a workplace issue?”. Stockholm Re-search Reports in Demography, 73, Stoc-kholm University, Demography Unit.

OECD. (1995), “Long-term leave for parents inOECD countries”, in OECD, EmploymentOutlook. Paris, pp. 171-200.

RIKSFÖRSÄKRINGSVERKET (1993), Vilka PapporKom Hem?. Statistisk Rapport Is-R, 3.Stockholm, RFV.

SANDQVIST, Karin. (1987), “Swedish family po-licy and the attempt to change paternalroles”, in C. Lewis & M. O’Brien (eds.),Reassessing fatherhood: new observationson fathers and the modern family. Lon-dres, Sage.

_________. (1992), “Sweden’s sex-role schemeand commitment to gender equality”, inS. Lewis et al. (eds.), Dual-earner fami-lies: international perspectives, Londres,Sage.

SCHMID, Günter & WEITZEL, Renate (eds.).(1984), Sex discrimination and equal op-portunity: the labor market and employ-ment policy. Nova York, St. Martin’s Press.

STATISTISKA CENTRALBYRÅN. (1994), Att Klaraav. Arbete, Barn, Familj. Stockholm, SCB.

________. (1995), Women and men in Sweden:facts and figures, 1995. Örebro, SCB.

SUNDSTRÖM, Marianne. (1991), “Sweden: sup-porting work, family and gender equa-lity”, in S. B. Kamerman & A. J. Kahn(eds.), Family policy: government and fa-milies in Fourteen Countries, Nova York,Columbia University Press.

________. (1993), “The growth in full-time workamong Swedish women in the 1980s”.Acta Sociologica, 36 (2): 139-150.

________. (1996), “Determinants of the use of pa-rental leave benefits by women in Swe-den in the 1980s”. Scandinavian Journalof Social Welfare, 5 (2): 76-82.

SUNDSTROM, M. & STAFFORD, F. P. (1992), “Fe-male labour force participation, fertilityand public policy in Sweden”. EuropeanJournal of Population, 8: 199-215.

________. (1994), “Time out for childcare and ca-reer wages of men and women”. Stoc-kholm Research Reports in Demography,85, Stockholm University.

WIDERBERG, Karin. (1991), “Reforms for women– on male terms – the example of theSwedish legislation on parental leave”.International Journal of the Sociology ofLaw, 19: 27-44.

196 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 Nº. 48

ENTRE MARIDO E MULHER,O ESTADO METE A COLHER:RECONFIGURANDO ADIVISÃO DO TRABALHODOMÉSTICO NA SUÉCIA

Carlos Aurélio Pimenta de Faria

Palavras-chaveIgualdade de gênero; Licença mater-nidade; Trabalho não remunerado;Suécia.

O artigo tem por objetivo discutir oimpacto de algumas políticas imple-mentadas pela social-democraciasueca, ao longo das últimas décadas,com o propósito de facilitar o ingres-so e a permanência das mulheres nomercado de trabalho além defomentar a igualdade de gênero nopaís. Primeiramente, discute-se oimpacto da legislação de 1971, quebaniu a tributação conjunta doscasais, tornando compulsórias asdeclarações de renda individuais, oque, dado o sistema tributário alta-mente progressivo do país, impli-cou o estabelecimento de clarosincentivos econômicos para que asmulheres participassem do mercadode trabalho. Além disso o artigoenfoca o chamado “sistema suecode seguridade para os pais”, umconjunto de direitos e benefíciosestruturados com o intuito de mini-mizar as incompatibilidades entre asexigências do universo do trabalhoremunerado e aquelas relacionadas àcriação dos filhos. São discutidas commaior ênfase as peculiaridades e asformas de utilização efetiva da licençaremunerada para os pais quando donascimento de uma criança.

BETWEEN HUSBAND ANDWIFE THE STATE INTER-VENES: REDRAWING THEDIVISION OF DOMESTICWORK IN SWEDEN

Carlos Aurélio Pimenta de Faria

KeywordsGender equality; maternity leave;unpaid work; Sweden.

The article aims to discuss theimpact of some policies implement-ed by the Swedish social-democrat-ic state in the the last decades withthe purpose of facilitating theentrance and permanence ofwomen in the labor market besidesfomenting gender equality in thecountry. Firstly, it is discussed theimpact of the 1971 legislation thatbanned taxation for couples, turn-ing compulsory individual declara-tions of income, which, given thehighly progressive tributary systemof the country, implied the estab-lishment of clear economic incen-tives for the participation of womenin the labor market. Besides, thearticle focuses the so called“Swedish system for parents securi-ty”, a set of structured rights andbenefits aimed at minimizing theincompatibilities between thedemands of the paid work universeand those related to a child'supbringing. The emphasis is on thepeculiarities and effective formsused by parents concerning thispaid license after the child's birth.

L’INTERVENTION DE l’ÉTATAU SEIN DU COUPLE:RESTRUCTURATION DE LADIVISION DU TRAVAILDOMESTIQUE EN SUÈDE

Carlos Aurélio Pimenta de Faria

Mots-clésÉgalité de genres; Arrêt maternité;Travail non rémunéré; Suède.

Le but de cet article est de discuterl’impact de certaines politiquesmises en place par les sociauxdémocrates suédois au long desdernières décennies, afin de faciliterl’accès et la permanence desfemmes dans le marché du travail etpromouvoir l’égalité des sexes dansles pays. Dans un premier temps,nous abordons l’impact de la légis-lation de 1971, qui a banni l’imposi-tion conjointe des couples et arendu obligatoire les déclarationsd’impôts individuelles. Cela implica,à cause du système tributaire haute-ment progressif du pays, dansl’établissement de subventionséconomiques pour que les femmesparticipent au marché du travail. Parailleurs, l’article aborde la questiondu «système suédois de sécuritésociale pour le pays », relatif à unensemble de droits et de bénéficesstructurés dans le but de minimiserles incompatibilités entre les exi-gences de l’univers du travailrémunéré et celles relatives à l’édu-cation des enfants. Les particularitéset les formes d’utilisation effectivede l’arrêt rémunéré pour les parentslors de la naissance d’un enfant sontégalement abordées.

RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS 231