12
anos Helena Cardinal critica a proibição de utilização de animais nos circos. Garante que os seus animais são bem tratados e não percebe por que razão a lei não se aplica a todos. p_3 Contestação jornal laboratório do curso de comunicação social | escola superior de tecnologia de abrantes | instituto politécnico de tomar Conselho Geral do IPT já tem presidente p_10 Mau tempo prejudica corridas de aventura p_8 Aldeia do Mato recebeu a penúltima etapa do Adventure Race World Championship (ARWC). Presidente de S. João concorda com a mudança da ESTA p_7 Alfredo Santos reconhece que Alferrarede tem mais condições mas espera que os alunos continuem no centro histórico. Amnistia quer voltar a ter núcleo em Abrantes p_4e5 Presidente da Amnistia Internacional Portugal, Lucília José Justino, em grande entrevista. www.nub.pt n.º 20 _ ano 8 Directora: Hália Costa Santos www.estajornal.com Janeiro 2010

ESTA jornal

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Projecto de re-design de jornal académico.

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anos

Helena Cardinal critica a proibição de utilização de animais nos circos. Garante que os seus animais são bem tratados e não percebe por que razão a lei não se aplica a todos. p_3

Contestação

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Conselho Geral do IPT já tem presidente p_10

Mau tempo prejudicacorridas de aventura p_8

Aldeia do Mato recebeu a penúltima etapa do Adventure Race World Championship (ARWC).

Presidente de S. João concordacom a mudança da ESTA p_7

Alfredo Santos reconhece que Alferrarede tem maiscondições mas espera que os alunos continuem nocentro histórico.

Amnistia quer voltar a ter núcleo em Abrantesp_4e5

Presidente da Amnistia Internacional Portugal, Lucília José Justino, em grande entrevista.

www.nub.pt

n.º 20 _ ano 8Directora: Hália Costa Santoswww.estajornal.com

Janeiro 2010

Page 2: ESTA jornal

2| janeiro 2010

opinião

editorialEsta é a vigésima vez que os alunos de Comunicação Social da ESTA fa-

zem uma edição do ESTAJornal. Como já aconteceu ao longo dos últimos anos, de vez em quando surgem novidades que resultam de novas opções, sempre tomadas com a intenção de melhorar ou de experimentar novas estratégias. Esta edição do ESTAJornal tem a par-ticularidade de espelhar uma nova aposta, com mais exemplares e mais distribuição a nível regional. Ao ser dis-tribuído com o Jornal de Abrantes, o ES-TAJornal pretende chegar a pessoas e lo-cais da região que, provavelmente, não sabiam que este projecto existe. Agora fi carão a saber.Em simultâneo, a equipa que faz este jornal decidiu desenvolver um projecto paralelo, para um outro tipo de públi-co, com conteúdos mais diversifi cados e, também, com a reprodução dos arti-gos que se publicam nesta versão em pa-pel: www.estajornal.com. Também por

isso, a versão em papel surge com me-nos páginas: muitos dos conteúdos pro-duzidos pelos alunos serão alojados no online.No ESTAJornal disponível na Internet, os alunos têm um novo campo de ex-perimentação. Com o passar do tempo, com o aprofundamento das práticas e com o desenvolvimento de parcerias com a comunidade empresarial, esta será uma plataforma multimédia, aco-lhendo conteúdos produzidos pelos alu-nos em diferentes formatos, nomeada-mente audiovisuais.Os dois suportes de comunicação do curso de Comunicação Social entram, pois, numa nova era, com os olhos pos-tos no futuro, mas também com especial atenção à comunidade onde a ESTA/IPT está inserida. Para além disso, em ambos os casos, os jornais serão, neces-sariamente, um espaço onde se dará destaque ao projecto educativo e pro-fi ssionalizante do IPT, em todos os seus contornos.

Em tempos de crise econômica, as esta-tísticas costumam corroborar a tensão geral que a população enfrenta. Quan-do se pensa nos índices de desemprego, então, a calamidade parece ainda maior. Agora, depois da tempestade, começa a se enxergar os primeiros sinais de tem-po ensolarado: o desemprego no Bra-sil está em queda contínua. Em núme-ros absolutos, são quase 15 milhões de brasileiros – praticamente como se todo Portugal e toda a Finlândia estivessem desocupados – mas em percentagem isso equivale a 7,5% da população.Talvez privilegiado por ser uma econo-mia em desenvolvimento, o Brasil certa-mente não possui uma força de trabalho ou uma demanda tão expressiva como a China, a fábrica do mundo, mas con-seguiu fazer uso de sua posição de eter-na “promessa para o futuro” para atrair

investimentos externos, mesmo após o estouro da crise há cerca de um ano. Por outro lado, o país não esteve completa-mente imune à ameaça. Estima-se que do fi m de 2008 até o começo deste ano cerca de 750 mil postos de trabalho te-nham sido eliminados; nos Estados Uni-dos, Europa e Japão, no entanto, as de-missões em massa de grandes empresas continuam, mesmo após o término do período mais crítico da economia.De repente, a exportação começou a per-der um pouco da importância no Brasil, já que o consumidor interno ignorou, em grande parte, toda essa situação. O mercado interno, antes posto em segun-do lugar por muitos, começou a ser mais valorizado pelas companhias e, por fi m, o brasileiro também começou a apren-der que não está, afi nal, sempre em se-gundo lugar em tudo.

Primeiro anunciado, agora confi rmado: a taxa de desemprego em Portugal su-perou os 10%. A Eusostat apontou, em Dezembro de 2009, para uma percenta-gem de desemprego de 10,2%, os maio-res números alguma vez registados des-de que o instituto começou a recolher os dados, em 1983. Na anterior publicação, o desemprego situava-se nos 9,2% em Setembro, registando-se, assim, um au-mento de um porcento. No passado dia 20 de Agosto, precisa-mente a um mês das eleições, o Governo apresentou a garantia formal que o défi -ce não ultrapassaria ao 5.9% Três meses depois – e após o fi m das eleições, su-blinhe-se – o Governo aponta, humilde-mente, para um défi ce de 8,4%. Um erro de 2,5% do PIB em apenas 3 meses. O Governo olvidou-se de mencionar que estava prevista uma margem de erro que entraria em vigor após as eleições.O anunciar das diversas estatísticas con-siste em novidade apenas para o leitor de imprensa. O Governo está – e este-ve, ao longo de toda a campanha – cien-te da crise orçamental e fi nanceira que o país atravessa. A urgência de adaptar a lei do subsídio de desemprego à ac-tual situação deverá estar em trânsito. Se estiver em auto-estrada, pior ainda: mais caro fi ca. A implementação de um pagamento efectivo do subsídio de desemprego, como referiu Franciso Louça após aná-lise dos dados apontados pela Eurostat,

custava menos que o desvio de preços das auto-estradas. Contudo, o menos caro também custa ao Governo, e fal-ta instalar wireless no TGV e construir uma pista de bowling em Alcochete. O problema reside na incompreensão dos portugueses face às soluções anun-ciadas por Sócrates durante a campa-nha. As medidas anunciadas para a redução do desemprego eram, na verda-de, as medidas estudadas para a vitória nas eleições. Culpa nossa, culpa nossa!Os ecos da crise estendem-se até ao oportunismo dos patrões, que vão apro-veitando para despedir funcionários, procurando a justifi cação da crise para rescindirem em mútuo acordo. Deveria ser concebido um incentivo às pequenas e médias empresas para que criem pos-tos permanentes de trabalhos nos seus diversos ramos, bem como a promoção de contratos efectivos. Ricardo Araújo Pereira, o mesmo que esmiuçou José Sócrates, em artigo de opinião: “Onde fi ca Portugal? Na cau-da da Europa. Não se sabe que bicho é a Europa, mas lá que tem uma cauda é garantida. E não há dúvidas nenhumas de que Portugal está nela sozinha.”Não há motivo para desespero. Estamos perante um novo mandato de José Só-crates e – agora sim! – vamos continu-ar na cauda da Europa. Votaram? Ago-ra está na altura de pagar as contas. Pois, com o desemprego, também não há como pagar.

Estatuto Editorial• O ESTA é um jornal de Escola, de pendor as-sumidamente regional, mas que nem por isso abdica da dimensão de um órgão de grande in-formação ou da ambição de conquistar o públi-co para além do meio universitário.

• O ESTA Jornal adopta como lema e norma critérios de rigor, de absoluta independência e de pluralismo dos pontos de vista a que dá ex-pressão.

• O ESTA Jornal aposta, por isso, numa informa-ção plural e diversifi cada, procurando abordar os mais diversos campos de actividade numa atitude de criatividade e de abertura perante a sociedade e o Mundo.

• O ESTA Jornal considera comoparte da sua missão contribuirpara a formação de uma opiniãopública informada, emancipada

e inter veniente - condição fundamental da de-mocracia e deuma sociedade aberta e tolerante.

• A democracia participativa eentendida para além da suadimensão meramente institucional, o pluralis-mo, a abertura e a tolerância são os valores pri-maciais em que se alicerça a atitude do ESTA Jornal perante o Mundo.

• O ESTA Jornal considera-seresponsável única e exclusivamente perante a ambição e a exigência dos seus redactores, alu-nos do Curso de Comunicação Social da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes e perante o público a que se dirige.

• O ESTA Jornal está por isso plenamente dispo-nível e empenhado com os leitores, comprome-tendo-se a manter canais de comunicação aber-tos com quantos connosco queriam partilhar as suas ideias e inquietações.

Uma nova eraHália Costa Santos

Nem sempre em segundo lugarHenrique Scherer

Votou?Agora pague as contasJoão Ruela

Ficha técnicaDirectora: Hália Costa Santos|Editora executiva: Sandra Barata|Redacção: Ana Isabel Silva|Cátia Romualdo Cláudia Ferreira|Daniela Santos|Gonçalo Reis Henrique Scherer|Joana Rato|Jorge CordeiroNuno Sotto-Mayor|Priscila Caniço|Sara Pereira|Tânia Machado|Projecto gráfi co e paginação: João PereiraTiragem: 15000 exemplares

Page 3: ESTA jornal

|3 janeiro 2010

destaque

Desde 12 de Janeiro que é proíbido com-prar e a reproduzir animais selvagens. Apenas os zoos, instituições científicas e entidades autorizadas para a reprodu-ção e conservação da Natureza o podem fazer. O Circo Jorge Cardinal, com ani-mais marinhos, esteve em Abrantes nos dias seguintes à publicação da Portaria que definiu estas novas regras. Helena Cardinal diz que sem animais o princi-pal público deste circo vai desaparecer. Se assim for, admite voltar para o es-trageiro, onde esteve durante 22 anos.

Em que sentido esta nova lei a afecta?Esta lei é horrível, só em Portugal é que existe. Estive ausente durante 22 anos deste país, na Dinamarca, França, Ale-manha, entre outros, a fazer espectácu-los, e nunca aconteceu nada de anormal

como agora. Há vários anos, nos Cam-pos Elísios, toda a comunidade circense espalhada pela Europa fez uma grande manifestação, para continuar com os es-pectáculos de animais selvagens. Devi-do a essa posição, nós conseguimos que isso não fosse avante. Aqui, em Portu-gal, somos muito inferiores. Existe também outro assunto relaciona-do: as corridas de Toiros. Aí é que mo-lestam os animais em praça pública em frente de todos, mas quando existem po-deres de pessoas influentes no país, a evolução das tomadas de posição toma outro rumo. Apesar de eu ser a favor das corridas, é algo com tradição que se deve preservar. Continuo sem entender por que é só nós fomos afectados. Sem animais o nosso público principal vai deixar de vir; as crianças adoravam ver

os animais: as focas, leões, papagaios, elefantes, etc… Os Zoomarines tam-bém são circos, mas nesses casos não proibiram os animais selvagens como os golfinhos ou as focas! Fazem espec-táculos com crianças a participar com os animais, mas não se preocupam com a possibilidade de serem mordidas. A lei, quanto a mim, devia ser para todos. A propósito da aplicação da Portaria, Mi-guel Chen fez a seguinte afirmação: “Es-queceram-se de fazer preservativos para os animais que estão em cativeiro”. Como é que comenta? (Risos) Não sei como vamos conseguir controlar essa situação, mas sei que no caso dos humanos existem fármacos que não o permitem. Os animais estão juntos nas jaulas e estão habituados a estar jun-tos, a fazer os espectáculos em conjunto. As minhas focas, Cris e Nick, apesar de serem machos, já os tentei separar, cada um no seu compartimento, mas eles não deixaram. É muito complicado quando já estão juntos há 22 anos.Alguma vez teve o show interrompido por alguma organização defensora dos animais em cativeiro?Nunca aconteceu tal incidente. Havia, sim, manifestações a 20 metros de dis-tância do local onde eu estava com o todo o staff. Levavam os seus cartazes, com as suas opiniões e todas as pessoas se respeitavam: eu a eles e eles a nós. O povo era diferente, tem uma mente mais aberta. No estrangeiro não havia asfixia.E em Portugal?Nestes oito meses ainda não fui confron-tada com essa situação.Nos vossos espectáculos, os animais já fo-

ram sedados para o palco?Jamais isso se passaria, os meus animais só fazem o show quando eles querem. Passei dois anos a dar-lhes peixe, para educá-los para estas práticas. Em Torres Novas não trabalharam, tiveram proble-mas gastrointestinais, mas para o pú-blico acreditar na nossa palavra fomos buscá-los e mostrámos que não estavam bem. Não podemos obrigá-los a traba-lhar, eles fazem o que querem.O veterinário visita regularmente o seu circo?Em cada cidade que nós estamos vem um veterinário dessa autarquia anali-sar o estado de saúde de cada um de-les. Apenas as focas são vistas por um veterinário de Inglaterra, especializado nesta espécie. O seu período médio de vida nos zoos é de 18 anos, eu já as te-nho há 22 anos.Onde e como comprou os animais?Comprei as minhas foquinhas em Itá-lia, que vieram da África do Sul, a uma empresa de importação e exportação de animais. Como eu sabia que andavam a matá-las para tirar a pele, fiquei com elas. Já o caso dos tubarões é diferente, o meu filho esteve na América para apren-der a fazer o espectáculo, saber qual o momento certo para entrar na água. Sem a sua ida para um país estrangeiro seria impossível de realizar este show. Não tínhamos nem animais nem sabedoria e inovação.Que projecções tem quanto ao futuro do seu circo?Se ficar sem os animais tenho de me ir embora para os antigos países onde an-teriormente já trabalhei.

A sua descoberta não é fácil. Situado na zona industrial de Abrantes, foi ne-cessário recorrer à conhecida técnica do “pára e pergunta” para encontrar o ca-nil/gatil intermunicipal, que acolhe ani-mais do concelho de Abrantes, Sardoal e Constância. Primeira impressão: liberdade! Os três cachorros bebés e sua mãe vieram ao portão dar as boas-vindas. Encontra-vam-se soltos e, entre saltos e lambide-las, limitados pelas grades, grande foi a agitação quando Ana Moreira, a respon-sável pelo canil, chegou e abriu o portão. Ana Moreira deixa transparecer o pro-fundo amor que nutre por aqueles ani-mais que diz serem “sua parte integran-te”. É precisamente esse sentimento de entrega que torna este canil/gatil espe-cial. A entrega de Ana já vai para mais de dois anos e a palavra ‘abate’ é proibi-da. Com o apoio da ADACA, associação de defesa dos animais que faz a gestão do canil, foi possível chegar a um acor-do com as câmaras de Abrantes, Sardo-al e Constância, através de um protoco-

lo, no qual o principal objectivo é evitar o abate. Ana Moreira lamenta a situação em que está: “Só tenho pena de me sentir sozi-nha, de não ter apoio e de não poder fazer mais coisas por estes animais”. Com ela estão apenas mais três ou qua-tro pessoas que a ajudam no seu tra-balho diário. Vê no voluntariado uma ajuda fundamental, mas diz que é pre-ciso “sobretudo gostar de animais”. Mas com responsabilidade e método, pois “o voluntário tem que vir com espíri-to e dedicação para conseguir formar uma equipa”.Com capacidade para alojar 75 animais, actualmente são 70 os que lá vivem. São cerca de 18 celas, para seis animais, qua-tro, dois e um. A alimentação é feita em média duas vezes por dia, “numa rela-ção entre qualidade e preço muito boa, o que permite ter os animais bem alimen-tados e saudáveis”. A limpeza é obri-gatoriamente diária, mas muitas vezes chega a ser feita duas vezes por dia: “Primeiro limpa-se dentro do edifício

pois há animais que ficam no corredor. As celas são limpas uma a uma e duran-te a limpeza o cão sai à rua. Ao acabar-mos de lavar, o cão volta para dentro, e assim sucessivamente”.Numa tentativa de recordar aqueles que por ali passaram e de valorizar a presença dos que lá vivem, as voluntá-rias enfeitam as paredes dos corredo-res com fotografias e textos. O mesmo acontece na cozinha, onde numa das pa-redes se encontra um conjunto de estre-las desenhadas a papel, cada uma com um nome, simbolizando aqueles que já partiram. No canil todos os animais são apelidados e a cada compartimento

foi dado um nome que não é nada mais que o reflexo da sua personalidade. Por exemplo, os Fronhas foram assim bapti-zados porque “que passam a vida a dor-mir” e na cela dos Lusíadas vive o Ca-mões, que é cego de um olho.Actualmente, a maior preocupação de Ana Moreira prende-se na necessida-de de desparasitar os animais. Processo que é feito de três em três meses e que é fundamental para a sua saúde e bem-estar. Com poucos apoios, as manobras de angariação de dinheiro vão desde as quotas dos sócios, a rifas ou apenas à boa vontade daqueles que gostam de animais e querem ajudar.

“Andavam a matá-las para tirar a pele”Priscila Caniço

Um canil muito especialJoana Rato

Animais. “Não podemos obrigá-los a trabalhar, eles fazem o que querem”.

Helena Cardinal, em entrevista, sobre a proibição de animais nos circos

Canil. O principal objectivo é evitar o abate.

Page 4: ESTA jornal

4| janeiro 2010

grande reportagem

Amnistia quer voltar a ter núcleo em Abrantes Nuno Sotto Mayor

Lucília José Justino, Presidente da Amnistia Internacional Portugal. Garante que “a violação de Direitos Humanos em Portugal não se compara com o que se passa noutros países”. A mais recente campanha consiste em fazer pressão junto das autoridades mundiais para que se acabe com as causas da pobreza.

Qual a importância da Amnistia Interna-cional em Portugal?A Amnistia tem a mesma importância que tem nos outros países. É reconheci-da pelas instituições portuguesas e ou-vida pelo Estado. É sempre solicitada para apoiar desenvolvimentos em ma-térias de direitos humanos. Em Portugal também é percepcionada como sendo um contributo para defender as vítimas em todo o mundo, não só as portugue-sas. É uma grande organização credível, independente e muito séria. As pessoas em Portugal não confundem a Amnis-tia com outras Organizações Não Go-vernamentais. Como é que é o relacionamento com o Es-tado?Colaboramos com o Estado seja qual for o Governo. Pedem-nos muitas ve-zes apoio para alguma legislação. Por exemplo, a legislação sobre o asilo teve parecer nosso. Para isso temos juristas que nos apoiam. Temos pessoas de vá-rios sectores e somos solicitados para outras áreas, como a educação. O que nos importa é fazer lobby junto de qual-quer Governo, seja ele qual for, porque somos independentes. Temos essas co-laborações com o Estado, por exemplo com o Ministério da Administração In-terna, sobre as questões das prisões, e com o Ministério da Justiça falamos so-bre o estado das prisões. Quando temos denúncias, contactamos, somos recebi-dos, somos ouvidos, escrevemos e eles respondem-nos. A nossa grande arma e a nossa maior capacidade é o lobby e isso nós fazemos bem. Quais as actividades que a Amnistia pro-move?A Amnistia tem actividades permanen-tes como a investigação, o lobby, o tra-balho contra a pena de morte e outras campanhas mais específicas, como a violência contra as mulheres. Estas cam-panhas duram dois ou três anos. Faze-mos esse trabalho e, apesar do esforço, pretendemos salvaguardar a indepen-dência. Fazemos muitas sessões e temos feito parcerias com outras organizações, principalmente com uma instância go-vernamental que é a Comissão para a Igualdade de Género, que tem feito um trabalho muito bom no que respeita à violência no namoro. As pessoas con-fundem amor com amor assertivo. É preciso prevenir e falar sobre isso para que os jovens percebam que a agressi-vidade no namoro não é amor coisa ne-nhuma mas antes uma coisa horrorosa. Quando temos uma campanha especí-fi ca em que sabemos que podemos ter parceiros noutras instâncias, nós traba-lhamos com eles. Não reivindicamos para nós grandes feitos. Queremos jun-tamente com outras organizações fazer com que a violência contra as mulhe-

res seja sobretudo sabida. O papel da Amnistia e de outras organizações é dar voz às pessoas que sofrem, seja no nos-so país seja fora. Qual o objectivo da mais recente campa-nha “Exija à dignidade” que foi lançada pela Amnistia?A campanha “Exija à dignidade” foi a última campanha que lançámos, em Maio. É uma campanha diferente das outras. A Amnistia não estava tão habi-tuada a ter uma amplitude desta quan-do falávamos de Direitos Humanos. O enfoque principal desta campanha, a ní-vel mundial, é irradicar a pobreza. A po-breza é a violação de um Direito Huma-no. As pessoas não têm direito a várias coisas como casa, educação, alimenta-ção. Neste caso, a Amnistia abriu o seu leque de acção assumindo um concei-to mais amplo de Direitos Humanos. O que nós queremos é fazer pressão jun-to das autoridades mundiais para que se acabe com as causas da pobreza. Por que é que o ciclo da pobreza não é que-brado? Quais são as decisões dos vários governos do mundo que fazem com que alguns países continuem pobres? Quais as maiores difi culdades que a Am-nistia sente actualmente?Depende das situações onde opera mas há zonas do mundo que têm falta de ac-tivistas porque as pessoas tem pouco tempo. Temos difi culdades como a ca-rência de meios fi nanceiros, de recursos técnicos e temos carência a nível de pes-soas com saberes específi cos. Outra difi -culdade é o risco e objectivos de alguns activistas serem visados por poderes re-pressivos dentro do seu país. As pessoas tem medo de serem activistas.A Amnistia visita os presos para dar o seu apoio?Visitamos, às vezes, alguns presos e apoiamos, embora não seja muito a nos-sa área. Existe uma pessoa que trabalha para a Amnistia e que tem essa função. Normalmente é mais trabalho por car-

ta e por e-mail. Fazemos sobretudo lo-bby. A violação de Direitos Humanos em Portugal não se compara com o que se passa noutros países. Somos mais ci-vilizados. Existe alguma superioridade civilizacional porque não temos pena de morte, mas temos que estar atentos aos casos de violação de Direitos Humanos em Portugal, nomeadamente aos níveis laboral e prisional. Qual o caso mais grave com que a Amnis-tia já se defrontou, em Portugal?A Amnistia não faz ranking de casos. Todos eles são graves. Desde que haja violação de Direitos Humanos, ou por carga policial, ou nas prisões, ou por-que os voos da CIA passaram por Por-tugal. Tudo o que seja violações dos Di-reitos Humanos é importante para nós porque se trata de um atentado à dig-nidade humana. Sente que as pessoas, em geral, sabem qual é a importância da Amnistia?A nossa informação não chega a todos. Nem todas as pessoas estão sensibiliza-das para as nossas preocupações. Ten-tamos chegar a todos os públicos con-soante o tipo de acção. Há pessoas que dizem que a Amnistia se deveria pre-ocupar com outras questões, como a segurança. Nós preocupamo-nos com tudo isso, simplesmente temos a noção que temos áreas específi cas que não po-demos abandonar porque são história, tradição, cultura da Amnistia. O mun-do mudou, globalizou-se e temos que ir também a outras áreas. Quando se fala de Amnistia Internacio-nal as pessoas pensam que nós quere-mos perdoar todos e daí que, às vezes, nos sintamos injustiçados. A percepção das pessoas mais mal informadas é esta, mas as outras sabem qual é a importân-cia e sabem que os governos têm medo do Relatório da Amnistia. Se um Gover-no tem medo é porque sabe que tem al-guma coisa a esconder. A impunidade é detestável. Quem cometeu um crime

“A Amnistia Internacional surgiu em 1971, em Inglaterra, com o advogado Peter Bensen, exactamente com o mito fundador de dois estudantes portugueses que estavam a brindar à liberdade e foram reprimidos por agentes de autoridade. Peter Bensen disse que esse acto não poderia ser esquecido. O movimento pela Amnistia é o movimento pelo não esquecimento. A raiz da palavra Amnistia é amnésia. Não esqueçam dois estudantes portugueses. Vamos escrever às autoridades e a escrita começou o movimento de pedir amnistia para não esquecer aqueles dois estudantes. Depois houve uma evolução semântica no termo e a Amnistia passou também a querer dizer perdão. Mas nós, organização, amnistia não quer dizer que queiramos perdão para todos. A Amnistia tem essa palavra porque surgiu da não amnésia, para com dois estudantes portugueses. Em 1981 surge um grupo de fundadores que decidiram criar um movimento pro-amnistia. Os fundadores foram importantes porque tiveram essa visão, mas depois, no trabalho da Amnistia, que já vai com trinta e poucos anos, os fundadores têm desaparecido. São as pessoas que estão todos os dias a trabalhar no terreno que dão corpo à Amnistia. O trabalho da Amnistia em Portugal assenta em trabalho profi ssional central e no trabalho de voluntariado.”

Lucília José Justino - Presidente da Amnistia Portugal

Lucília José Justino, presidente da Amnistia Internacional Portugal

Lucília José Justino, presidente da Amnistia Internacional Portugal, em entrevista ao esta.jornal

Page 5: ESTA jornal

|5 janeiro 2010

grande reportagem

“O discurso genuíno dos Direitos Humanos será o discurso salvador no mundo global”

“Era bom que o grupo de Tomar e Abrantes retomasse a sua actividade”

Considera que a Carta Universal dos Di-reitos Humanos está a ser cumprida? A Declaração Universal tem hoje mais importância e reconhecimento do que há uns anos atrás. Fala-se muito mais naquele documento, mas da teoria à prática vai uma grande distância. É um documento orientador, inovador e fe-cundo. Fecundo porque ele próprio deu origem a ideias para Constituições na-cionais. Há vários países que se inspi-

raram na Declaração Universal dos Di-reitos Humanos para as suas próprias Constituições e a nossa é um exemplo. Mas sendo um documento que não era vinculativo na altura, foi um documen-to romântico, poético. Queríamos todos um mundo melhor, mas nem todos as-sinaram. Hoje em dia, os jovens falam muito na Declaração Universal. Existe uma parte que é muito pouco estuda-da que é o preâmbulo da Declaração.

As pessoas sabem os trinta artigos, mas não reparam como é um texto de uma solidariedade mundial fantástico. Ela começa de uma maneira e acaba de ou-tra. É um documento base e a partir des-ta Declaração surjam outros pactos que se tornem obrigatórios. Qual a importância de falar sobre os Di-reitos Humanos?Eu penso que o discurso genuíno dos Direitos Humanos será o discurso sal-vador no mundo global. A globalização do discurso dos Direitos Humanos é que seria a grande globalização. Falar de Di-reitos Humanos é desejar que a globa-lização seja uma globalização de Direi-tos Humanos e não só uma globalização

em termos económicos ou outro tipo de globalização. Considera que as questões da discrimina-ção e do respeito pelos Direitos Humanos vão ter avanços signifi cativos com as novas gerações?Eu acho que os jovens têm uma sensibi-lidade muito maior para certas formas de discriminação, como a discrimina-ção de género, étnica ou de orientação sexual. Há uns anos não se falava nisso, nem no nosso país nem outros países. Os jovens começaram a chamar a aten-ção da organização para novas formas de discriminação. A Amnistia é contra todas as formas de discriminação e as-sina todo o tipo de petições.

Quantos colaboradores têm a actualmen-te a Amnistia?É difícil de saber, mas envolve, no total, cerca de dois milhões de pessoas: acti-vistas e centenas de profi ssionais. A nos-sa secção tem 12 mil membros e apoian-tes e activistas. É uma média secção. As secções grandes têm centenas de volun-tários permanentes que cumprem horá-rio como profi ssionais. Envolve todo o tipo de pessoas?Têm é que concordar com a visão e mis-são da Amnistia, a visão de que todos os seres são iguais e que todas as pes-soas devem usufruir dos mesmos direi-

tos. Não pode pertencer à Amnistia uma pessoa que seja totalmente a favor da pena de morte porque isso não esta na nossa visão. Não precisamos de pesso-as com nomes sonantes, precisamos de gente que trabalhe pelos Direitos Hu-manos. Mas precisamos de nomes que credibilizem e temos alguns, nomeada-mente o Vítor Nogueira e o José Manuel Cabral. Precisamos de alguns nomes de pessoas, mas que tenham esse nome pelo trabalho que fi zeram. As pessoas são todo o tipo de gente em termos etá-rios, de género, de condição sócio-eco-nómico, de cultura, profi ssionalmente.

Todos respeitam as regras da Amnistia, que são o respeito pelo rigor e pela ver-dade, a objectividade e a independência. Como é que um cidadão comum pode co-laborar com a Amnistia?Quem quiser colaborar pode visitar o nosso site e tem lá toda a informação. Contactem-nos pois temos uma equi-pa muito boa, que responde quase na hora. Existem várias formas de as pesso-as participarem. Podem colaborar com donativos, mas isso é o menos impor-tante, dado que, o que é mais importan-te é escrever cartas, assinar petições. Ou-

tra coisa muito importante é fazer parte de grupos. Em Tomar existe algum grupo?Em Tomar existe o grupo oeste, que abrange Tomar, Abrantes e toda esta zona. O grupo oeste está quase extin-to e era bom que retomasse as activida-des ou, então, que formassem um grupo de estudantes, do Politécnico, ou não, e que formassem vários grupos. Esta zona tem muito pouco e eu não acredito que Abrantes e Tomar tenham tanta falta de sensibilidade aos valores e à defesa dos Direitos Humanos. Eu acho que é mais por desconhecimento.

tem que ser castigado, mas tem que ser castigado com justiça. Nós somos uma organização que as pessoas sabem que tem um poder muito grande. Qual a reacção das pessoas quando se de-param com alguma manifestação ou algu-ma actividade promovida pela Amnistia?Depende do tipo de acção e do tema. As vezes passam e fi cam a olhar. Pre-domina a simpatia, compreensão e so-lidariedade. As pessoas querem saber o que é que se passa. Às vezes é necessá-rio chocar. Muitas vezes não se conse-gue chamar a atenção sem chocar. Nós tentamos chamar a atenção para a cau-sa dos Direitos Humanos e nunca per-sonalizamos as coisas. Já ajudaram quantas pessoas a nível na-cional?Impossível saber. Muitas, mas a Amnis-tia nunca reivindica como sua a liberta-ção de ninguém, quer a nível nacional quer a nível internacional. Se o Governo

não tiver boa vontade, não é a Amnis-tia nem a comunidade internacional que consegue. Tem que haver muita gente que escreva a falar da importância do nosso trabalho. Em Portugal não temos grandes casos a não ser casos de violên-cia doméstica ou de pessoas que foram maltratadas nas prisões.

Considera que os Media são parceiros na divulgação das questões que preocupam a amnistia ou que, nesse aspecto, há mui-to a fazer?Os Media apoiam-nos muito. A Amnis-tia tem que passar as suas preocupações para o exterior e para isso tem que usar os vários órgãos de comunicação que tem ao seu dispor. Eles são importantes para chegar a todos os estratos sociais. O problema é o modo como isso se faz porque existe alguma pressão por parte dos profi ssionais que querem as notícias em primeira mão. Nós, por vezes, não falamos porque não temos a total confi r-mação. Isso é muito pouco compreendi-do pelos profi ssionais da comunicação. Nós sabemos que o tempo é fundamen-tal, mas a pressa faz com que, às vezes, a comunicação social divulgue alguns dados errados. Depois temos que corri-gir esses mesmos dados e, quando toca a números, a comunicação social erra bastante. Mandamos comunicados de imprensa para a Lusa e depois ela faz a distribuição. Temos que pedir aos jor-nalistas um pouco de calma e que nos dêem algum tempo. O sim e o não em matérias destas é muito complicado. Há muito a fazer nesta área, principalmente no que respeita as novas gerações. Que importância é que a Internet e as re-des sociais têm tido para a Amnistia?As redes sociais são muitíssimo impor-tantes para a Amnistia. Procuramos responder no seu tempo e procuramos responder com os recursos mais avan-çados. Procuramos sensibilizar e orga-nizar as pessoas através dos processos mais sugestivos e efi cazes, especialmen-te aqueles que possam produzir melho-res resultados no espaço de tempo mais

curto. Queremos usar esses processos sugestivos e efi cazes, mas com seguran-ça, com verdade, com certeza. Se nós duvidamos, não a transmitimos. Temos que ter em conta a pressa com que as re-des sociais querem trabalhar e operar. Muitas vezes precisamos que a comuni-cação também nos dê algum tempo para confi rmamos antes de respondermos. Como é que a Amnistia portuguesa tem acompanhado casos como os presos de Guantánamo? Temos acompanhado a insistência para o encerramento de Guantánamo. Esta-mos, aliás, um pouco preocupados por-que Obama falava em dois anos e agora parece que já não é bem assim. Continu-amos a insistir para o encerramento da prisão, a insistir para a responsabiliza-ção de todos aqueles que, na luta contra o terrorismo, tenham violado o direito internacional. Apoiamos a luta contra o terrorismo, mas com justiça. Não é lu-tar contra o terrorismo de uma manei-ra terrorista, querendo que todos sejam condenados à pena de morte. Insistimos para que Portugal receba os oito prisioneiros que prometeu. O Mi-nistério dos Negócios Estrangeiros já recebeu dois, mas desconhece-se o seu paradeiro. E predispôs-se a receber o terceiro. Estamos a acompanhar a inte-gração destes dois sírios, de modo a as-segurar que ocorra essa integração no respeito pelos direitos enquanto pesso-as livres e inocentes. Não está prova-do que estes senhores, que vieram para Portugal, tenham cometido algum cri-me. Os outros, que cometeram crimes, estão lá. Guantánamo, naquelas condi-ções, nunca.

É uma grande organização credível, independente e muito séria.

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6| janeiro 2010

media

A importância da infografi aTânia Machado

Explicar como aconteceu um acidente ou mostrar um monumento em todas as suas dimensões, de forma clara e apelativa, é a principal missão da infografi a. Mário Carvalho é um dos profi ssionais que a desenvolve. Para além de vários trabalhos no campo do jornalismo, Mário Carvalho, formado no IPT e já a leccionar na área, tem como trabalho recente uma infografi a que explica o Convento de Cristo, em Tomar.

Fascinado pelo mundo das infografi as desde sempre, Mário Carvalho desco-briu o seu encanto em pequeno, atra-vés da “leitura de banda desenhada que, não sendo considerada infografi a, não deixa de ser um parente próximo”. Apesar disso, outros produtos gráfi cos deram o seu contributo para este pro-fi ssional desenvolver o seu gosto. Por exemplo, “as revistas de automóveis com ilustrações esquemáticas a mos-trar a constituição das diferentes par-tes destes e as enciclopédias ilustradas”. Embora nessa altura não soubesse como se designavam tais representações grá-fi cas, o gosto pela infografi a cresceu, o que o leva a desenvolver actualmente a sua função em campos bastante distin-tos, como na área da saúde, da ciência, da cultura, dasociedade, do desporto, dos monumentos e não só.Para a realização de um bom trabalho, no que diz respeito, especifi camente aos monumentos, a escolha dos elementos a abordar “obedece a vários factores.” No caso dos “Tesouros de Portugal”, para a revista Volta ao Mundo, a selec-

ção de Mário Carvalho baseou-se “no nível de interesse e da riqueza histórica do monumento, não esquecendo o local onde foi consolidado”. Para além disto, a importância de “levar ao leitor, locais e monumentos desconhecidos de to-dos nós” não é esquecida. Esta é acom-panhada por um texto, onde estão pre-sentes conhecimentos da História e da gastronomia local, recolhidos pelo jor-nalista responsável pelo mesmo.Mário Carvalho normalmente traba-lha “em equipa com outros infografi s-tas, tendo como suporte informativo um jornalista que faz uma primeira pesqui-sa, obtendo o levantamento histórico”. Depois, esse levantamento é comunica-do à equipa de infografi stas que, por sua vez, realiza uma nova pesquisa na pro-cura de imagens, mapas e plantas, ou seja, “tudo o que possa ajudar na cons-trução do espaço”. Na fase seguinte é realizado o levantamento fotográfi co do monumento no local e também a recolha de documentação (plantas, alçados, ma-pas, etc...), cedidos pelas entidades con-servadoras dos espaços seleccionados.

O tempo de duração de um trabalho desta envergadura depende de vários factores. O número de pessoas envolvi-das, a complexidade do trabalho, a área ocupada pela infografi a, assim como a sua execução em 3D, que quase sempre é um requisito obrigatório, são aspectos a ter em conta. Pode oscilar entre três se-manas, três meses ou até mais.Para Mário Carvalho, a infograifa já é vista, “sem qualquer dúvida, como um género jornalístico”, pois tem “o propó-sito de informar, com toda a veracidade, rigor e clareza”. A informação é fruto da convergência de várias soluções resul-tando, assim, “numa mensagem repleta de informação clara, rápida, objectiva e exacta, de grande efi cácia”.Apesar de toda a informação que for-necem, as infografi as tanto podem ser criadas para “funcionar isoladas com identidade própria”, ou servir de com-plemento a um artigo “em que a com-plexidade da informação exposta não é

clara, havendo a necessidade de recorrer para, esse efeito, a uma representação gráfi ca mais clara e efi caz”. As infograi-fas “têm título, texto, corpo, fonte e cré-ditos que lhe conferem a veracidade”.Actualmente, mais do que uma opção para atrair leitores para os jornais, as in-fografi as são uma “necessidade”. Mário Carvalho explica a principal razão que justifi ca a necessidade de contar histó-rias e explicar determinadas realidades através de infografi as: “O nosso dia--a-dia é vivido a grande velocidade.” “Os leitores tornaram-se mais exigen-tes, cansados de uma leitura demora-da e extensa. Cada vez mais procuram uma informação directa, clara, rápida e efi caz”. Tendo por base estes argumen-tos, “podemos afi rmar que a infografi a assume um papel de grande importân-cia nos jornais actuais”. “Além da men-sagem gráfi ca transmitida, a infografi a também tem um carácter apelativo”.

Infografi a do Convento de Cristo em Tomar

Page 7: ESTA jornal

|7 janeiro 2010

esta

Quais os problemas da freguesia de São João?Tem vários problemas, como todas as outras. Neste momento, os problemas mais deprimentes são com a parte so-cial, pois existem ainda zonas, de bair-ros sociais, onde vivem famílias com fracos recursos, que vivem essencial-mente do rendimento de inserção so-cial, com todos os problemas que advêm daí, como a baixa formação escolar e o abandono escolar. Todos esses proble-mas são graves. Colaboramos com as instituições para tentar reduzir os pro-blemas. O objectivo era acabar com eles, mas seria muito utópico. Temos tam-bém as habitações degradadas em três ou quatro bairros que são de institui-ções de solidariedade social. Aí a gran-de aposta da freguesia é apoiar essen-cialmente essas pessoas, recuperando as habitações. Depois temos as obras normais, como melhorar a limpeza urbana, algo que se tem distinguido pela positiva. Tam-bém pretendemos melhorar o fl uxo de trânsito, mas isto tem de ser em conjun-to com a Câmara Municipal, porque a Junta tem receitas próprias muito baixas e nem sempre chegam para as despesas correntes. Uma das grandes obras é li-gar a cidade ao Aquapolis, ao rio, que está com um bom índice de renovação. Tem-se falado muito, mas ainda não se fez nada. Esta ligação irá ser feita pela rua da Barca, que é a rua mais antiga da cidade, com um passeio pedonal. E, por fi m, a recuperação do mercado diário e a construção de rotundas para que o trân-sito não vá novamente para dentro da cidade. Estas são obras da Câmara, mas temos todo o gosto em ajudar.Quais os principais projectos?Apoiar as instituições sociais e ser par-ceiro nos projectos da Câmara, que tam-bém são da Junta, como as repavimen-tações, a recuperação dos passeios e a construção de rotundas que faltam e que são necessárias à cidade. Também que-remos pintar os muros públicos, para dar um ar mais alegre e limpo à cida-de, e plantar umas fl ores para a cida-de continuar a ser a cidade fl orida que sempre foi. A Câmara tem apoiado a Junta de Fregue-sia de São João?Nós todos queremos sempre mais, mas há coisas que não basta o querer-se mais, tem de haver também alguma ajuda por parte da Câmara. Estamos todos a rei-niciar um novo mandato e acredito que este novo que veio vai mudar. Mas os números falam por si. Nos últimos man-datos, e especialmente neste último, a Câmara doou muito pouco à freguesia de São João. Não sei porquê, nem nun-ca percebi. E bom que a Câmara faça essa análise para que no futuro isso não aconteça. Na realidade, penso que não fi zemos nenhum protocolo e não foi por

falta de coisas para fazer. A colabora-ção sempre foi boa, mas as transferên-cias para a freguesia de São João não acompanharam os desejos, quer da Jun-ta quer dos cidadãos.Espera que a nova presidência da Câmara Municipal de Abrantes não esqueça a Fre-guesia de São João?A Junta não foi esquecida, mas isso faz parte dos números. Se formos ver Jun-tas que têm receitas próprias na ordem da grandeza da freguesia de São João, fi zeram protocolos em alguns casos cem vezes mais do que o valor das receitas próprias. E São João tem zero. Isto não é justo! Não é justo porque em termos de capacidade as freguesias são todas iguais. Esta é uma crítica que faço e que sempre fi z e, por isso, estou à vontade. Penso que é um assunto que esta nova presidência vai seguramente alterar e, sinceramente, para o bem da Junta, pen-so que esta política venha a ser infl ec-tida e que as coisas sejam mais justas.Os jovens fazem parte também dos seus projectos?Sim. Nós apoiamos associações, como a associação de estudantes da ESTA. As escolas são uma das nossas preocupa-ções. Queremos que os jovens saibam que a Junta os apoia e queremos que sintam que nós estamos com eles e que apoiamos os seus projectos, desde que sejam viáveis.Acredita que a deslocação da ESTA para Alferrarede vai afectar a freguesia de São João?Estou convencido de que os jovens irão fi car na cidade se esta lhes der condi-

ções. Temos de recuperar as habitações para que os estudantes fi quem na ci-dade. A Escola, no edifício onde está a funcionar, não tinha hipótese de se ex-pandir e de criar novas valências. Se queremos uma Escola moderna e atrac-tiva para os estudantes, temos de dar condições quer aos docentes, aos alu-nos e funcionários. A nova ESTA irá ser uma escola modelo com outras condi-ções. Obviamente que gostava que a Es-cola fi casse em São João, mas não con-seguimos dar as mesmas condições. Por isso, basta-nos tentar manter os jovens na cidade. De uma forma geral, concor-do com a sua mudança para Alferrare-de, pois vai valorizar a escola e o ensi-no e o mais importante é isso.Qual a sua opinião em relação ao projecto de construção do futuro Museu Ibérico?Em relação ao Museu, as pessoas ago-ra dizem que não houve discussão, mas não vale a pena irmos por aí. Eu acho que o Museu, independente de ter uma torre grande ou uma torre pequena, já foi referendado e a sua construção foi aceite. Aliás, foi uma das propostas do Partido Socialista. A população de Abrantes já validou o Museu Ibérico e de forma clara. Acho que temos de ana-lisar as mais-valias que o Museu vai tra-zer ao concelho. Penso que todos somos unânimes em reconhecer que o Museu traz muitas mais-valias, mas é óbvio que não podemos descurar as questões am-bientais. A nova ESTA irá ser uma esco-la modelo com outras condições. Obvia-mente que gostava que a Escola fi casse em São João.

Presidente de S. João concorda com a mudança da ESTACátia Romualdo

Alfredo Santos, presidente da Junta Freguesia de São João, a maior em termos de densidade populacional

Alfredo Santos, presidente reeleito da Junta de Freguesia de São João, em Abrantes, diz claramente que em termos de transferências de verbas a sua Junta tem sido prejudicada. Mas acredita que a nova presidência da autarquia vai mudar a situação. Concorda com a mudança da ESTA para Alferrarede, reconhecendo que S. João não oferece as mesmas condições para a prática de um ensino de qualidade, e espera que os jovens permaneçam no centro histórico.

Sexta-feira, 10h30, o mercado está pra-ticamente vazio, conta apenas com os habituais comerciantes e alguns fregue-ses. A tristeza está estampada nas pare-des brancas bastante degradadas e num quase silêncio que incomoda. “A crise afecta a todos”, comenta uma comer-ciante de 32 anos, que pede anonimato.O que mais os angustia é não saberem quando é que lhes vão oferecer melho-res condições para trabalhar. Conceição Mendonça, 54 anos, fl orista e talhante, conta que o problema já não é novo: “Já estou cá há 20 anos e já desde dessa al-tura que as condições não são as melho-res”. José de Oliveira, de 70 anos, limi-ta-se a pedir o mínimo: “Como limpeza está muito mal, se fi zessem, pelo menos, uma pintura, já era bastante bom”. São muitas as expectativas de que um novo mercado surja em Abrantes, mas os co-merciantes ainda não receberam quais-quer certezas por parte da Câmara.Ao ESTAJornal o Gabinete de Comu-nicaçao da autarquia explicou o que se pretende fazer com o mercado: “A Câ-mara de Abrantes está a desenvolver um processo para reformulação total do espaço do mercado diário. O projecto in-dica a construção de dois edifícios que ocuparão uma área de 1.700m2, liga-dos entre si, com áreas funcionais para comércio, serviços, habitação e estacio-namento, circundados por uma grande zona de circulação.” O objectivo da Câ-mara é “a requalifi cação do espaço onde funciona o mercado diário, actualmente com uma função residual, e a qualifi ca-ção do espaço envolvente, esperando--se que possa vir enriquecer o conteúdo funcional do local e do actual edifício”.Devido ao estado actual de degrada-ção do mercado e principalmente à fal-ta de condições de higiene para os co-merciantes, estes já foram advertidos pela ASAE. Mas nem todos os comer-ciantes estão de acordo em que a Câma-ra invista num novo mercado.Uma vez que o acesso aos dois edifícios a cons-truir será feito pela Avenida 25 de Abril e pelo Vale da Fontinha, aí será constru-ída uma praça envolvente ao edifi cado, com funcionalidade de convivência. A autarquia explica ainda que este novo projecto pretende também contribuir para um melhor ordenamento da fren-te urbana do Vale da Fontinha e para atenuar os problemas de trânsito que se verifi cam nesta zona da cidade.A falta de condições que neste momento o mercado apresenta provoca um afas-tamento de fregueses, o que prejudica muito os comerciantes, que muitas ve-zes num dia, sobretudo durante a sema-na, não conseguem vender nada. “Tem dias que não desempata aqui nada”, conta José de Oliveira. O movimento que se pode notar é apenas ao Sábado e ao Domingo.

“Não há condições de higiene”

Autarquia explica o projecto de requalifi cação do mercado muni-cipal.

Ana Isabel Silva

Alferedo Santos - Presidente da Junta de Freguesia de São João.

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8| janeiro 2010

A importação de jovens estrangeiros para as camadas jovens do futebol por-tuguês tem vindo a crescer ao longo da última década, o que rouba espaço aos jogadores internos. Cada vez mais os jo-vens talentos lusitanos acabam por de-sistir do seu sonho ou tentam a sua sor-te no estrangeiro, em clubes de menor nomeada, após atingida a idade sénior. Apesar das difi culdades, o talento de al-guns jovens fala mais alto e conseguem aquilo que separa uma carreira de uma desistência: uma oportunidade.Há dois anos atrás, Carlos Almeida (Carlitos) era um nome desconhecido no futebol nacional. Formado nas ca-madas jovens da União Desportiva de Oliveirense, era apenas mais um entre os milhares de jovens praticantes da mo-dalidade, sonhando como tantos outros em vir a ser, um dia, jogador profi ssio-nal. Hoje, Carlitos, além de jogador pro-fi ssional de futebol, é internacional pela selecção portuguesa de sub-21 e perten-ce aos quadros do Paços de Ferreira, ten-do sido contratado no mercado de ve-rão. Em entrevista ao ESTA Jornal, o jovem atacante falou sobre as difi cul-

dades que enfrentou, as ambições futu-ras e a alegria de já ter defrontado, entre outros, Porto, Benfi ca e Sporting. Há um ano atrás, o internacional sub-21 não se imaginava a viver tal momento: “no início da época não sonhava com isso. Mas, depois quando ganhei a ti-tularidade e com o decorrer no tempo, fui acreditando no meu valor.” No que toca a adaptação ao futebol profi ssional, o jovem recorda que “no início foi com-plicado. Mas, com a ajuda dos colegas mais velhos que já estavam conhecedo-res da realidade futebolística tornou-se mais fácil.”O jogador do Paços de Ferreira conse-guiu chegar este ano à selecção nacio-nal de sub-21, classifi cando o momento como “único”. Os objectivos para esta época estão defi nidos: “para esta época luto para me afi rmar no Paços de Ferrei-ra para poder ambicionar chegar mais longe”; e para Carlitos chegar mais lon-ge seria “chegar ao Futebol Clube do Porto e representar a selecção do meu país. Até porque todos os dias traba-lho para ser o melhor e poder um dia lá estar.” Sempre inspirado no seu ídolo,

Marco Van Basten, mítico jogador ho-landês e considerado um dos melhores de sempre.Conhecido nas ruas da capital do mó-vel, Carlitos lida naturalmente com o carinho dos fãs: “as pessoas cumpri-mentam-me, fazem algumas pergun-tas e ficam por aí.” Fora das quatro linhas, assume-se como um jovem nor-mal, que aproveita “para descansar, es-tar com a família, namorada, amigos e jogar playstation” Apesar disso, o fute-bol está sempre presente: “sempre que

posso ver um jogo, fi co no sofá a assis-tir, seja de que equipa for.”“Ainda assim, deixa o conselho: “Acre-ditem sempre no seu valor mesmo quando as coisas não estão a correr como querem, isto, porque nem sem-pre as coisas vão correr como os jovens desejam. Quando se tem qualidade e acreditamos sempre em nós consegui-mos atingir os nossos objectivos. E por experiência própria nunca deixem de estudar.

abrantes

Mau tempo prejudica corridas de aventura Daniela Santos

“Acreditem sempre no seu valor!”

Foi na manhã fria e lamacenta do dia 13 de Novembro que o Parque Náutico da Aldeia do Mato recebeu atletas de vários pontos do mundo para a penúl-tima etapa do Adventure Race World Championship (ARWC) 2009. A prova que teve início no Estoril no dia 5 de Novembro e terminou no Baleal no dia 15 do mesmo mês pode contar com 59 equipas das quais 6 eram portuguesas.Ao chegar ao local deparei-me com uma grande confusão, um frenesim que nun-ca foi esperado pelos habitantes da Al-deia do Mato. E foi assim, num clima bastante agitado que se iniciou mais uma das etapas deste campeonato de corridas de aventura. Todas as equipas que chegavam ao local trocavam de rou-pas, tomavam um pequeno-almoço re-forçado e depois partiam para mais uma fase da prova, desta vez uma prova de BTT que vai desde a Aldeia do Mato até à localidade de Bairro, um percurso de 44 km que nesta altura já se torna muito puxado para todas as equipas.Eram muito poucas as pessoas que se encontravam no local para assistirem à prova e ao falar com elas foi fácil per-ceber que se sentiam desiludidas com o facto de este evento não ter sido mais di-vulgado. João Gaspar, um jovem afi cio-nado por corridas de aventura e espec-tador naquele lugar, disse que quando “estava a passear pela internet reparou que, fi nalmente, o ARWC se ia concreti-zar em Portugal ainda neste ano”. Ten-tou saber um pouco mais acerca disso mas a informação era muito escassa, mesmo assim e “com muita sorte” des-cobriu que uma das etapas deste cam-peonato iria começar “bem perto” da sua casa. E foi assim, levantou-se cedo e por volta das 7 horas da manhã estava

no Parque Náutico da Aldeia do Mato e assistiu à chegada da grande maioria das equipas, incluindo a sua equipa pre-ferida, uma equipa francesa.Luís Borges, membro da organização do evento esclareceu algumas dúvidas acerca do que se tinha passado até ao momento. Das 59 equipas apenas 51 “continuavam a progredir no terreno” isto porque a meio do percurso 8 das equipas desistiram. Luís Borges, ansio-so pelo fi m da prova, disse ainda que a grande causa destas desistências foi o clima pois estava à espera de poder con-tar com o Verão de S. Martinho e cedo apercebeu-se que isso não ia ser possí-vel. Este membro da organização dis-se ainda que a prova não tem sido fácil e que, ao contrário do que se pensava, Portugal é um país cheio de obstáculos o que não tem facilitado a participação dos concorrentes.Enquanto se esperava por mais desen-volvimentos na prova, ao fundo do rio

avistavam-se duas canoas. Uma equipa francesa chegava a mais um destino. Foi impossível falar com o chefe da equi-pa mas fi cámos a saber que embora te-nha sido uma das últimas equipas a che-gar ao Parque Náutico, aquela equipa era uma das que tinha alcançado mais postos de controlo, ou seja, era uma das equipas com mais pontos. Mais uma vez os últimos são sempre os primei-ros. Para conseguirem alcançar todos esses postos de controlo, a equipa fran-cesa acabou por chegar ali muito cansa-ço e os gritos de dor faziam-se ouvir em qualquer parte do parque.Às voltas de bicicleta no parque esta-va um senhor, provavelmente mais um participante no campeonato. De repen-te ouvi chamarem um nome português e qual não foi o meu espanto que ao olhar para trás vi que a pessoa que cha-mavam era o tal senhor que estava às voltas no parque. Pedro era o nome do senhor que tinham chamado na altura, mais concretamente Pedro Roque chefe da equipa portuguesa Team GreenLand / ATV. Esta equipa era composta por quatro elementos, três homens, Pedro Roque, Hugo Velez e Artur Baptista, e uma aventureira e corajosa mulher, Filo-mena Silva Gomes. Ao reparar bem nos Team GreenLand / ATV reparei que to-dos eles usavam um narizinho vermelho como aqueles que vemos normalmente nos palhaços e ao perguntar o porque de o usarem, descobri mais um aspecto curioso, é que para além de serem por-tugueses e de estarem com um espírito muito alegre, esta equipa apoiava uma causa, o Projecto dos Doutores Palhaços, Operação Nariz Vermelho. Em relação à prova, o chefe da equipa disse que “está a correr bem, mas coleccionamos algu-

mas mazelas, o que é bastante normal”. Para além disto, Pedro Roque acrescen-tou que “o grande objectivo da equipa era chegar ao fi m, mas nesta já começa-mos a pensar em tentar melhores resul-tados para fi car pelo menos no meio da tabela”. Há cerca de quatro anos que a equipa participa neste tipo de provas grandes e até já fi zeram parte de algu-mas organizações.A maioria das equipas já tinha partido quando os Team GreenLand / ATV ar-rancaram para a fase de BTT, mas par-tiram com um sorriso na cara deixan-do para trás dois amigos que ao longo da prova lhes deram assistência e Pedro Roque disse ainda que muitas vezes se não fossem eles os dois a arranjarem--lhes as “coisinhas boas”, quer para co-mer, quer para vestir a equipa não tinha a força que tem no início de cada fase.

Carlitos jogador do Paços de Ferreira

Preparação para a descida do rio em kayak.

Preparação para a descida do rio em kayak.

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|9 janeiro 2010

Uma viagem ao mundo do documentárioCurso de Vídeo e Cinema Documental da ESTA proporciona diferentes experiências aos alunos.

Cláudia Ferreira

cinema

O curso de Vídeo e Cinema Documental (VCD) é, actualmente, uma das grandes apostas da Escola Superior de Tecnolo-gia de Abrantes. Trata-se da primeira licenciatura, a nível nacional, dedicada especificamente ao estudo e prática da expressão cinematográfica. Uma verda-deira aposta no cinema documental fei-to no nosso país.Para Ana Margarida Gil, professora dos alunos de VCD, é facto que “não exis-te uma tradição muito longa de reali-zação de documentários em Portugal”, mas este é o curso certo para começar a criar um futuro mais risonho na área. Aqui são dadas “as bases, tenta-se criar balizas, passar as regras, depois eles fa-zem o que querem”. História e experi-mentação são o suporte de uma licen-ciatura, que acaba por contar com muito

mais do que isso. As actividades que o complementam são evidentemente uma mais-valia. Em Novembro, numa verdadeira corri-da contra o tempo, uma equipa de alu-nos do curso de VCD conseguiu conce-ber e produzir uma curta-metragem , ‘Contratempo’, que acabou por vencer o Concurso de Curtas-Metragens Canon integrado no Estoril Film Festival 2009. Todo o trabalho de realização e produ-ção, incluindo a banda sonora, foi efec-tuado pelos alunos . O Júri realçou a di-ficuldade de realizar um filme em penas

uma semana e ficou surpreendido com a elevada qualidade alcançada pelos fil-mes em competição. O prémio foi uma câmara HD da Canon.Já em Outubro os alunos de VCD ti-nham tido a oportunidade de assistir ao DocLisboa, na companhia de docen-tes da ESTA. Aliás, esta oportunidade de participar na maior mostra de docu-mentários em Portugal também já tinha surgido no ano passado. Trata-se de um festival com “grande qualidade e com um óptimo nível”, que obviamente não deixa estes aprendizes desinteressados. Para Carlos, aluno do 2º ano do curso, não se trata só de um “excelente fomen-to à cultura”, mas é, também, “muito bom enquanto oportunidade de estu-dar” não só os realizadores, mas tam-bém as suas obras. De acordo com Ana Margarida Gil, esta é a oportunidade d serve não só para mostrar aos alunos os bons trabalhos, “os grandes pilares das obras documen-tais”, mas também o “que está a ser fei-to de novo”. Para além de tudo isto, “há um lado cinéfilo, de aficionado, que se começa a cultivar ali”. É importante criar “hábitos” nos estudantes, uma vez que, para eles “não é muito normal ter este tipo de oportunidades. “A lingua-gem e o ritmo são muitas vezes diferen-tes” daquilo a que estão acostumados.Rita Sousa entrou naquelas salas de cinema de Lisboa pela primeira vez. Aluna do 1º ano do curso, vê o festival como uma “óptima oportunidade”, es-pecialmente para se “integrar” no mun-do em que pretende trabalhar. Frisa a “óptima organização” do próprio Do-cLisboa, contudo demonstra claro de-sagrado pelo trabalho do realizador ho-menageado este ano, Jonas Mekas, que,

segundo ela “não respeita as regras”. Também para Carlos, “Jonas Mekas faz um tipo de cinema experimental”. Este ano o cineasta homenageado “é alguém que quebra as regras que nos ensinam regularmente, que usa aquilo que cha-mamos de “erros” propositadamente nos seus filmes”. Rui Mendes confessa que “todo o tipo de filme (documentário ou não) tem um enorme papel” na sua formação. O es-pectáculo já não se vê de olhos tão fe-chados. O segundo ano de curso dá ou-tra escola. O DocLisboa é, para ele, “um festival que tem ganho reconhecimento internacional ao longo do tempo devi-do à sua excelente qualidade”. É nes-te tipo de eventos que os alunos conse-guem “conhecer os realizadores e falar com eles”, aprender verdadeiramente. Poder fazer, no final de cada documen-

tário, perguntas ao realizador, esclarecer aquilo que ficou no ar. “São coisas que se lembram para o resto da vida”, afirma Ana Margarida Gil. Para ela, o facto de os estudantes “poderem contactar com grandes nomes do cinema documental e aprender directamente com eles” é, sem dúvida, uma das mais-valias da visita. Os cerca de 30 alunos da ESTA, o Do-cLisboa é uma forma distinta de apren-der. Uma aprendizagem cara a cara, acesso directo a realizadores, a obras, a um mundo que mais tarde ou mais cedo lhes vai pertencer. Alexandre Carranço, aluno do 1º ano, reconhece que são “ as actividades extra curriculares que dina-mizam o curso”. Essas actividades “es-tão, basicamente, ligadas ao Espalhafi-tas e à tentativa de criar um cineclube” e, mesmo estas, passam pelas mãos e iniciativa dos alunos.

DocLisboa. Uma aprendizagem cara a cara, acesso directo a realizadores e a obras cinematográficas.

A Associação Palha de Abrantes tem várias secções que organizam e dina-mizam culturalmente a cidade florida. Uma delas é a secção de cinema, Espa-lhafitas. Este cineclube é responsável, entre outras iniciativas, por trazer à ci-dade, à quarta-feira, os filmes que nor-malmente não fazem parte dos circui-tos comerciais. E, recentemente, esteve envolvido na vinda da Federação Por-tuguesa de Cineclubes para Abrantes.Os projectos da Palha de Abrantes com mais reconhecimento são o «Animaio», que dura há cinco anos, e o «Há cinema na aldeia» que conta com dois anos, mas os festivais também são parte integran-te dos seus projectos.Participaram no Festival de Animação «Cinanima», de Espinho, e no Festival de Arouca, onde ganharam uma men-ção honrosa com o filme «Os Transfor-madores».Maria de Lurdes Martins, membro dos Espalhafitas, afirma que o trabalho do cineclube ao longo dos anos tem vin-do a ser cada vez melhor, pois “a conti-

nuidade é que traz qualidade”. E como “não desistir e insistir é fundamental”, Maria de Lurdes Martins, em nome do cineclube, convidou a Federação Portu-guesa de Cineclube a mudar a sua sede para Abrantes. Já há muitos anos existia a discussão de que era necessária a mu-dança da Federação pois a sua localiza-ção não era a melhor e os custos do local da sede eram muito elevados.Abrantes apresentou-se como a me-lhor opção para ser a nova sede da Fe-deração, visto que a cidade se situa no centro do país e tem um cineclube acti-vo. O processo de mudança teve tam-

bém de passar pela Câmara Municipal de Abrantes pois era necessário um es-paço. Assim, Maria de Lurdes Martins contactou a vereadora da Cultura que estava no cargo na altura do convite. A autarquia acabou por ceder um espaço para a instalação da Federação Portu-guesa de Cineclubes.Depois de conseguidas as condições ne-cessárias para a mudança, os cineclubes de Portugal foram contactados para dar a informação acerca da deslocalizaçãoda sede e estes concordaram.Maria de Lurdes Martins diz que “eranecessária a mudança” e da necessidade

surgiu o convite. O facto de a FederaçãoPortuguesa de Cineclubes passar a estarem Abrantes vem ajudar a uma maior dinamização da cidade e região.A ligação do Espalhafitas com a Fede-ração é notória em vários aspectos, pois a presidente da Federação é estagiária do cineclube e as duas associações têm no momento uma exposição na Biblio-teca Municipal António Botto, «Home-nagem a Vasco Granja». Com a vinda da Federação já foi realizado, em Abran-tes, o Encontro Nacional de Cineclubes (Portugal tem 36 cineclubes federados).Com o dinamismo dos Espalhafitas e a vontade de Maria de Lurdes Martins, Abrantes tem agora um papel impor-tante no cinema português.Maria de Lurdes Martins diz que a vin-da da Federação para a cidade é bas-tante importante também para a ESTA, nomeadamente para o curso de Vídeo e Cinema Documental. A Federação “tem um espólio de cinema muito importan-te”, que poderá vir a ser disponibiliza-do aos alunos. C.R.

Federação Portuguesa de Cineclubes em Abrantes

Este é o curso certo paracomeçar a criar um futuro mais risonho na área.

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10| janeiro 2010

ipt

António Pires da Silva, presidente do IPT

A ESTA está a comemorar 10 anos. Acom-panhou o seu início como docente do cur-so de Engenharia Mecânica. Quais são as memórias que guarda dessa altura, desse primeiro ano lectivo?São as melhores. Na altura, em Abran-tes, tudo era uma novidade e tive uma boa relação com os alunos e com os professores. Apesar de a minha disci-plina, a Física, ser considerada como o ‘papão’ do curso, e apesar de os alunos não terem o aproveitamento mínimo que eu exigia, tive um bom relaciona-mento com eles. Tive sempre um rela-cionamento óptimo com a cidade em si. Gostei muito. Tanto gostei que, depois de já estar na presidência do IPT, ainda fui a ESTA dar umas aulas.Desde de que se tornou presidente do IPT como é que tem visto a evolução da ESTA?De uma forma muito boa, muito posi-tiva. Devido a dois ou três factores es-senciais. Primeiro, porque houve ali um trabalho muito profícuo por parte do primeiro director, Eugénio de Almei-da, com sangue na guelra, novo, que fez um óptimo trabalho. Simultaneamente, houve um apoio bastante grande e sig-nifi cativo por parte da autarquia local e conseguiu-se ali criar uma empatia entre

todos. Não só aqueles que trabalhavam em Abrantes, mas também com aqueles que estavam na sede do IPT. Penso que foi pela conjugação destes factores que se conseguiu que a ESTA tenha o êxito que teve até agora.Durante estes quatro anos no comando do IPT, vê atingidos os objectivos a que se propôs para a ESTA? Como, por exemplo, a nomeação do novo director?Vejo. Como é como é evidente, se não se tivesse dado continuidade ao trabalho que tinha sido executado e feito , não te-ríamos hoje a escola que temos. Naque-la altura, há quatro anos atrás, Miguel Pinto dos Santos era a pessoa indicada para suceder ao actual vice-presidente do IPT, Eugénio de Almeida. Estávamos noutra fase, porque na altura tinha de trazer o meu antigo aluno para perto de mim. Precisava dele.Não vou dizer que os objectivos foram totalmente alcançados; penso que se conseguiu de uma maneira geral conso-lidar a escola. Estamos a caminhar para outra fase, que está a ser preparada com os pés no chão, que é a mudança de ins-talações e depois a possibilidade de ca-minhar até outras vertentes.As novas instalações são o que falta à ESTA?

Sim, faltam as novas instalações. Embo-ra não sejam muito visíveis, os labora-tórios de mecânica já estão praticamen-te construídos, falta só acabar as obras e começar a colocar os equipamentos nos laboratórios, que vão ser os melho-res do país.Para além disso, temos de reconhecer que as instalações que a ESTA tem, actu-almente, não correspondem a boas con-dições para se trabalhar e para se fazer uma escola melhor.Com as novas instalações, com o novo tipo de fi nanciamento (que espero que esteja a chegar), penso que a ESTA terá todas as condições para vir a ser uma fu-tura escola superior de nível muito alto.Foi esta falta de fi nanciamento o impas-se para a mudança para as novas instala-ções?A passagem para Alferrarede só acon-tece porque a Câmara Municipal preci-sa das instalações onde a ESTA se situa.

Só a partir daí é que se viu que havia absoluta necessidade de mudar de ins-talações. Porque antes disso não havia uma decisão defi nitiva. Sabia-se que a escola tinha de ter melhores instalações, tinha de aumentar essas instalações, e foram equacionadas várias possibilida-des. Mas só se decidiu passar para Al-ferrarede a partir do momento em que a Câmara Municipal, dada a necessida-de que teve daquelas instalações, se em-penhou em contribuir ao máximo para que a escola tivesse novas infra-estru-turas. Vai ceder o terreno, vai cumprir com a sua parte nacional de candidatu-ra ao QREN para ter novas instalações. Sem a participação da Câmara era com-pletamente impossível.Prevê-se um futuro promissor para a ESTA com as novas instalações?Eu prevejo que sim. Mas as pessoas não podem ‘embandeirar em arco’. Temos que dar passos certos em terra fi rme.

Eugénio Pina de Almeida é o actual vi-ce-presidente do Instituto Politécnico de Tomar. No entanto, por detrás deste car-go na presidência do IPT, Eugénio de Almeida desempenhou um papel fun-damental na implementação da Esco-la Superior de Tecnologia de Abrantes. Licenciado e Mestre em Ciências Ge-ofísicas foi durante seis anos um pilar na ESTA ocupando o cargo de director. Agora que a instituição celebra 10 anos de existência o primeiro director garan-te que a escola tem pernas para andar e subir a patamares superiores. A ESTA celebra 10 anos. Como os classifi -ca o criador da instituição?Não fui propriamente o criador da esco-la. Eu fui a pessoa encarregue de mon-tar o projecto. Os principais criadores, impulsionadores foram o Professor Pa-checo Amorim, na altura Presidente do Instituto Politécnico de Tomar (IPT), e Nélson de Carvalho, também na altu-ra Presidente da Câmara Municipal de

Abrantes. Foram estes os grandes im-pulsionadores, os grandes promotores da ESTA. A mim coube-me o papel de pôr em prática, dar corpo a um projec-to que estava estruturado, que estava pensado.Quando olha para trás, o que vê de dife-rente na ESTA?Agora vejo a escola de um ângulo dife-rente. Anteriormente acompanhei todos os processos inerentes à própria escola, agora vejo a ESTA como uma unidade.

O novo regime de funcionamento das instituições de Ensino Superior trouxe a abertura a diversas alterações, que o IPT está a implementar e que vão no senti-do do que a Presidência actual começou a fazer. Mas os tempos próximos serão difíceis e exigirão grande rigor, coesão, sentido crítico e solidário. Competirá aos candidatos à Presidência apresentar programas dettalhados que partam das dinãmicas e problemas actuais e propo-nham caminhos efi cazes. O debate a que antes aludi levantou algumas vias, os estatutos são um excelente instrumen-to, o plano estratégico é de grande qua-lidade, mas agora é preciso aprofundar e implementar. Estamos numa econo-mia crescentemente global, que impõe a globalização das instituições (a União Europeia é eexpressão disso) e exige um ensino superior novo, humilde mas ar-rojado, capaz de agir como “cabeça pen-sante” da sociedade (não apenas com ela mas como parte dela). Um ensino

superior que sópode ser internacional, e que intervenha em todos os níveis: for-mação profi ssional avançada, estudos graduados, pós-graduações.Olhando para trás, temos um IPT que foi desenhado na origem, pelo Prof. Pa-checo de Amorim e seus coolaborado-res, de forma brilhante. Lembro-me de como se duvidava da oportunidade de ter ensino de Arte e Arqueologia na an-tiga ESTT: hoje todos os Politécnicos têm artes e humanidades, e essa é uma área das mais fortes.

Conselho Geral do IPTjá tem presidenteAntónio Pires da Silva viu a ESTA crescer ao longo destes 10 anos. Acredita num bom futuro para a ESTA: “Se continuarmos a dar estes passos certos, com os pés bem assentes na terra, tenho a certeza que a escola de Abrantes vai ser uma escola muito boa no ensino superior em Portugal.”

Marisa Rodrigues

“Uma escola com uma estrutura sólida”

“Pensem menos nos direitos e mais nos deveres”

António Pires da Silva, presidente do IPT

Eugénio Pina de Almeida, primeiro director da ESTARepresentante dos docentes no Conselho Geral do IPT

Luiz Oosterbeek

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|11 janeiro 2010

Procuro um banco para sentar-me, es-tão todos ocupados. É de admirar pois o local deveria espantar as pessoas, está imundo, mal aproveitado, ou melhor, é aproveitado para tudo e mais alguma coisa: mesas desordenadas e dispersas justificam a esplanada de um restauran-te e, mesmo ao lado, um monturo reve-la uma lixeira descoberta, improvisada e sebenta. Entre a esplanada e a lixei-ra encontra-se um pequeno bloco de ci-mento corroído, com paredes carboniza-das e rabiscadas com graffiti, da autoria de alguém consciente de que mais risco menos risco não faria qualquer diferen-ça, não tornaria o cenário mais pesado do que já está.Claro que há uma razão de ser, mesmo que seja só uma, para as pessoas estabe-lecerem-se temporariamente neste espa-ço pouco preservado. O mesmo motivo para onde me trouxe a minha intuição: o panorama único, o pôr-do-sol formoso, a paisagem esplêndida que um final de tarde em Istambul pode proporcionar, seja a um turista de passagem ou a um istambulense que desconhece qualquer outra cidade para além da sua.Não interessa o piso enlameado, os inú-meros gatos vadios a brigar por uma espinha ou o menosprezo entre gansos e cães que se cruzam com frequência, aqui mesmo ao lado. No horizonte, por de trás do Bairro do Bazar, do Serralho e de Sultanahmet o Sol desce abrupto e consagra a oportunidade de sentir--se a pulsação arcaica do emaranho de habitações, edifícios comerciais, hotéis, mesquitas e palácios, que ganham uma silhueta amena e um contorno amare-lo-torrado que deixa qualquer espírito submisso e nostálgico. Ou iludido, no meu caso, pois morar a cinco minutos desta galeria de arte, desta tela gigante e autêntica é ilusão pura. Para mim, que sem dar conta estou a pouco tempo de regressar à galeria chamada Portugal.Um senhor que está sentado acena-me, percebe que insisto em arranjar um can-tinho. Chega-se um pouco para a direita

e oferece-me o espaço que sobra do seu banco, como quem procura companhia em troca. Sento-me. A pouco mais de um metro encontra-se a orla que sepa-ra o fim do planalto e o início do Corno de Ouro, a peça que completa o boni-to puzzle paisagístico que tenho diante dos olhos, a foz que desagua no famo-so Estreito de Bósforo.O senhor diz qualquer coisa, eu respon-do-lhe em inglês, que não compreen-do turco, mas ele insiste em colocar-me questões no seu idioma, o único que co-nhece. Passamos o tempo nisto. Atra-vés de alguma linguagem gestual pelo meio percebo que se chama Tŭkce e que trabalha na foz, é «capitão» de um dos pequenos e seculares barcos estaciona-dos no porto à nossa frente, um trima-rã do tempo do meu bisavô que leva ro-mânticos a atravessar o Corno de Ouro por dez euros, negociáveis, como quase tudo em Istambul. Mas este comandante tem uma particularidade: pode ser ile-trado, não ter quaisquer conhecimentos linguísticos mas é (muito) competente a secar garrafas de vinho Dimitrakupulo Sarabi, as mais acessíveis do mercado. Besh lira é quanto custam, diz-me, com os olhos semicerrados, tronco flectido e gestos trémulos e descoordenados. Dois euros e meio para trocar sobriedade por um bilhete no melhor lugar da plateia. Não está nada caro. A Ponte Gálata, que passa sobre o Cor-no de Ouro encontra-se perpetuamente agitada por automóveis, motas, autocar-ros, eléctricos, turistas, vendedores, co-merciantes, polícias e indigentes. Aper-cebo-me do movimento mas não oiço o ruído; os navios que circulam com assi-duidade abafam-no com buzinões apra-zíveis, com o simples trabalhar do mo-tor ou com a ondulação que provocam na água e que vem crepitar aos meus pés. Os pescadores também serpenteiam por toda a ponte, são incansáveis, sa-bem que pesca mais desportiva e efi-caz é na foz e desde cedo que a maioria

se estabelece por ali, reconfortando-se com o calor das fogueiras acesas e com os petiscos e chás que os vendedores ambulantes vão despachando a preços irrisórios. Estabelecerem-se cedo significa ainda com o Sol a dar a primeira espreitadela no Afeganistão, a cerca de três mil qui-lómetros de Istambul. Outros nem che-gam a desfazer a cama, a amarrotar os lençóis, a amassar a almofada; passam a madrugada inteira a assistir à magia que só o engodo sabe fazer. E, frequen-temente, lá está um ou outro pescador a recolher dois ou três peixes que se sa-racoteiam com ímpeto no fio de pesca, destinados a juntar-se às centenas que repousam no interior dos garrafões de cinco litros ou nas caixas de esferovite.O amigo Tŭkce ausentou-se, fez-me si-nal que vem já, para eu esperar. Não lhe bastou o litro e meio de vinho que fez desaparecer em menos de meia hora ou a quantidade de cigarros que extraiu do maço, uns atrás dos outros, até mandar a embalagem vazia para o chão. Regres-sará? Ou dá três passos e esquece-se do que ia fazer nos seguintes? Abstraio-me. Fecho os olhos por uns segundos, limi-to-me a ouvir, cheirar e sentir. Percebo como os invisuais conseguem ver me-lhor certas coisas – sabem usufruir do que têm no peito, o coração. Abro-os no-vamente.As gaivotas sobrevoam a foz e emitem um chilrear hipnotizante, de manhã à noite. O Sol desaparece por traz da ci-vilização deixando uma luminosidade suave e anestesiante.

Quero parar o tempo mas não consigo. Ainda bem. É da maneira que amanhã posso despertar com a mesquita a eco-ar a primeira chamada do dia à oração, melódica e arrepiante para qualquer Ocidental como eu; deliciar-me com um kebab döner ou um peixe assado junto ao porto; escutar a musicalidade turca através dos instrumentos saz, ney, ud, kaval, darbuka e davul provinda de ac-tuações em restaurantes ou na própria rua; fumar nargilé e jogar o típico tavla ou gamão no dicionário português; ab-sorver o que a cidade tem de invulgar, de Oriental, de Médio Oriente… A noite cai, os assentos ficam novamen-te disponíveis, a cidade torna-se parda. Ganha uma beleza diferente, mais den-sa, mais sombria e menos concorrida. As luzes nocturnas vão salpicando os poros de Istambul, o frio assenta com hostili-dade. Alguns dos pescadores recolhem, outros vêm substituí-los; outros ainda aproveitam para dormitar um pouco – têm uma longa madrugada pela frente. As gaivotas, essas, permanecem no al-voroço de sempre. Ainda bem.Aproveito para ficar mais um pouco, não sei quando voltarei a ter uma opor-tunidade como esta. De qualquer forma, o Tŭkce pediu-me para aguardar a sua chegada e ainda não regressou, espero mais um bocado. Na verdade, aproveito esse mesmo pre-texto para não me ir embora daqui tão cedo. Fecho os olhos uma vez mais, no melhor lugar da plateia, e olho como só os invisuais sabem fazer. Com o coração.

O melhor lugar da PlateiaJorge Cordeiro

criatividade

Vista de Istambul, Turquia

Desde que poisei o auscultador do te-lefone que antecipava este momento.Será que estavas muito diferente?Usarias o cabelo comprido como quan-do te vi pela última vez ou cortado ren-te com o qual eu te conhecera?Terias seguido o teu caminho, como eu procurei seguir o meu?Vinte anos depois. Voltada a página com o teu nome escrito, dediquei-me à única coisa que pode ser certa na minha vida:

Eu mesma. Tinha a profissão que sem-pre quis, realizei o meu sonho de vero mundo, mas haveria sempre aquele vácuo no lugar que tinhas ocupado.Será que eras o mesmo que eu tinha co-nhecido? Será que no teu sangue ainda fervia a vontade de encontrar a tua paz de espírito?Será que tinhas encontrado alguém, ou a tua visão redutora do amor não to te-ria permitido?Lembro-me de dizeres que o amor era apenas uma invenção dos poetas para esconder o animal que existe em cada um.Não concordo, disse-te, e tu perguntaste se eu não gostaria demasiado.

Será que terias gostado demasiadode alguém?No dia combinado, pouco antes da hora combinada, calcei as botas, vesti o ca-saco e peguei no livro embrulhado que serviria de presente.Espero que gostes do que vais reencon-trar, espero gostar de te reencontrar em quem és agora. Recordei tudo o que vivi contigo. A noite naquela esplanada emque te conheci e que deixaste marca por estares a beber chá quando todos be-biam cerveja. As tardes de estudo pon-tuadas por risadas. A amizade pura quenos ligava. Fui andando. Estava a che-gar ao local combinado. Lisboa, a Bai-xa, a Brasileira, debaixo dos olhares do

Pessoa, que permanecia mudo e quedo à passagem do tempo. A noite em que dis-seste que não podíamos ser mais do queamigos. A manhã em que me tiraste a ferros da tua vida e que mudou dras-ticamente a minha. Estava a chegar. Já via ao fundo a estátua que iria servir deponto de encontro.Já via ao fundo o gingado do teu andar e tudo o que me permitia distinguir-te de todos os outros que passavam, ata-refados.Será que me reconheceste, vinte anos depois?Passei por ti e continuei a subir a Baixa. Já via ao fundo o gingado do teu andar e tudo o que me permitia.

ReencontroSara Pereira

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12| janeiro 2010

última

Marcas que ficampara a vidaIstambul é uma das cidades para onde têm ido os alunos da ESTA, concretizando uma das melhores experiências que os jovens do ensino superior têm ao seu alcance. Candidatam-se, são seleccionados mediante o seu desempenho escolar e ganham uma bolsa, que lhes permite fazer um semestre lectivo noutra Universidade do espaço europeu. Mais do que uma experiência académica, esta é também uma experiência de vida, que dá lições de multiculturalidade, que desenvolve o espírito de independência, que abre horizontes. Independentemente das notas que trazem pelo seu desempenho escolar, os jovens estudantes que vão fazer uma parte do seu curso numa Universidade estrangeira trazem, sobretudo, um conjunto de marcas que ficam para a vida. Há muitas formas de as expressar. Jorge Cordeiro, para além de uma crónica (ver página 11), partilha o que sentiu, num dos momentos que viveu em Istambul, através de fotografias.