ESTRATÉGIAS COMPETITIVAS E

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    ESTRATGIAS COMPETITIVAS ECOMPETNCIAS ESSENCIAIS:

    PERSPECTIVAS PARA AINTERNACIONALIZAO DA

    INDSTRIA NO BRASIL

    Afonso C. C. Fleury

    Departamento de Engenharia de Produoda Escola Politcnica da USP, av. Almeida Padro, 531,

    CEP 05508, So Paulo, e-mail: [email protected]

    Maria Tereza Leme Fleury

    Faculdade de Economia e Administrao da Universidade deSo Paulo, Av. Professor Luciano Gualberto, 908,CEP 05508, So Paulo, e-mail: [email protected]

    Recebido em 7/8/2002

    Aceito em 29/4/2003v.10, n.2, p.129-144, ago. 2003

    Resumo

    Uma das principais caractersticas da nova economia a transio da eficincia individual para a

    eficincia coletiva. A competitividade , e ser cada vez mais, relacionada ao desempenho de redes

    interorganizacionais e no de empresas isoladas. Ao mesmo tempo, a formao dessas redes tem forte

    dimenso locacional, associada ao movimento de internacionalizao das operaes das grandes

    corporaes transnacionais. Do ponto de vista de economias emergentes como a brasileira, importantes

    mudanas esto tendo lugar, como conseqncia do posicionamento de suas empresas nessas novas

    redes interorganizacionais internacionais. Este o foco deste estudo. Um modelo analtico foi desenvolvido

    para a avaliao de quais setores industriais apresentam potencial para se tornarem competitivos

    internacionalmente, por demonstrarem possuir as competncias organizacionais necessrias. O

    referencial conceitual foi construdo a partir da idia de que a participao numa rede interorganizacional

    depende das competncias organizacionais desenvolvidas pela empresa e que essa participao vai

    implicar mudanas na definio de sua estratgia competitiva. A aplicao do modelo foi operacionalizada

    em um amplo survey da indstria no pas. Os resultados permitem realizar uma primeira identificaodo posicionamento das empresas em redes internacionais assim como avaliar a competitividade em seus

    diferentes setores industriais.

    Palavras-chave: estratgias competitivas, gesto de competncias, manufatura internacional, cadeias

    de fornecimento, redes interorganizacionais, indstria brasileira.

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    1. Apresentao

    Oprocesso de globalizao dos negcios estacelerando o ritmo de mudanas em termosde como a produo de bens e servios est sendoprojetada e implementada. Aps a concepouniversalista e hegemnica de fbricas tayloristas-fordistas de grande escala, altamente integradas,observa-se a emergncia de um complexo sistemade novos conceitos e frmulas para a organizaodos negcios em geral e para a funo Produoou Operaes em particular. Empresas globaisesto no s se reestruturando segundo umaperspectiva de integrao internacional (Bartlett& Ghoshal, 1989; Prahalad & Lieberthal, 1998;

    entre outros), mas tambm esto redefinindo suasrelaes com as empresas em outros pases. Temascomo Global Operations Management (Flaherty,1996), International Manufacturing (Shi &Gregory, 1998) e International Supply ChainManagement (Akkermans et al., 1999; Motwaniet al., 1999) surgem como novas reas de pesquisa.

    O ponto que se pretende levantar neste artigodiz respeito ao posicionamento das empresas e dopas nesse novo contexto, caracterizado por redesinterorganizacionais internacionais. Para isso,

    partimos da idia de que o mais importante fatorna estruturao dessas redes so as competnciasorganizacionais: a participao e a posio de cadaempresa funo de suas competncias. A posiona rede e a forma pela qual as competncias soadministradas vo, por sua vez, influenciar asestratgias competitivas.

    Partimos das seguintes consideraes:

    l no intenso e profundo processo de reestru-turao das empresas e de seus negcios,

    a competitividade exige eficincia coletiva;empresas tero de focar suas competnciasessenciais (core competences) e procurarparcerias para complementar recursos erealizar seus objetivos;

    l diferentes tipos de redes interorganiza-cionais esto sendo observadas; essesarranjos so resultados de processoshistricos e decises empresariais atuais;

    l a participao de uma empresa em umarede interorganizacional requer mudanassignificativas no modo pelo qual a empresatoma decises e opera.

    Para responder questo principal: Em umnvel agregado (por exemplo, regional ounacional), como podemos analisar a dinmica deredes interorganizacionais internacionais e suasconseqncias, utilizando os conceitos de Gestode Produo e Operaes?, tivemos, primeiro,de trabalhar em dois outros nveis:

    l Para uma empresa, o que acontece quandoela se torna membro de um arranjo interor-ganizacional? Quais as conseqncias para

    a formulao de estratgias e para o desenvol-vimento de competncias?

    l Numa rede interorganizacional, como sepode compreender as questes de alinha-mento estratgico e de formao coletiva decompetncias?

    Visando responder a essas perguntas, elabo-ramos, de incio, um modelo relacionando estratgiae competncias no plano de empresa individual. Emseguida, fizemos um estudo das novas formas de

    arranjos interorganizacionais com o objetivo decaracterizar a lgica da formulao de estratgiase da formao de competncias, nas situaes emque a interdependncia organizacional caracterstica competitiva. Esse referencialconceitual serviu para a preparao de um surveysobre a indstria brasileira: enviamos cerca de 1.600questionrios e obtivemos 470 respostas emcondies de serem processadas.

    A aplicao dessa metodologia resultou emviso panormica da articulao da indstria local

    no contexto internacional e no delineamento de umanova arquitetura da indstria globalizada com focono Brasil. A partir da foram tratadas as conse-qncias do processo de internacionalizao, omodo adotado por empresas transnacionais e suassubsidirias para moldar suas redes, o novo espaoe escopo para a formulao de estratgias no casodas empresas brasileiras e o novo perfil dascompetncias requeridas.

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    2. O que torna uma empresa

    competitiva?

    Os debates sobre os fatores que determinam

    a competitividade das empresas tm sido enrique-cidos nos ltimos anos com novas abordagens.A abordagem clssica a anlise da inds-

    tria ou do posicionamento estratgico, quetem em Michael Porter seu maior protagonista.Esta abordagem prioriza a anlise dos mercadose da competio e o entendimento da posiorelativa de cada empresa em sua indstria ousegmento produtivo como elementos primordiaisno processo de formulao da estratgia (Porter,1980, 1996). Os principais focos de anlise so

    produtos, consumidores e competidores, e aestratgia da empresa deve ser resultante daidentificao de tendncias e de oportunidades.Nesse sentido, considerada uma abordagem defora para dentro.

    Os instrumentos bsicos para o posicio-namento estratgico incluem uma estruturaanaltica relativamente simples mas extre-mamente poderosa baseada em cinco foras euma matriz dois por dois, em funo da qual secaracterizam as estratgias competitivas genri-

    cas. Essa abordagem, proposta por MichaelPorter em 1980, em Vantagem Competitiva, foiposteriormente aperfeioada. O prprio Porter,em 1985, j ampliava seu foco com o conceitode cadeia de valor e sistema de valor,reconhecendo as atividades da empresa comobase da vantagem competitiva: Os drivers paraa reduo de custos ou para a diferenciao seroidentificados a partir das atividades e das ligaesentre elas (Proena, 1999). Como coloca oprprio Porter, as escolhas de posicionamentodeterminam no somente quais atividades aempresa desempenhar e como essas atividadessero configuradas, mas tambm como essasatividades estaro relacionadas entre si (Porter,1996). Em outras palavras, ao incorporarquestes ligadas organizao interna daempresa, a abordagem do posicionamento

    competitivo mantm e refora a perspectiva defora para dentro.

    Com o tempo, as crticas anlise do posicio-namento estratgico vm se avolumando. A

    maior delas diz respeito a sua naturezaestritamente esttica. Para Proena (1999), osframeworks no do resposta s questes maiscruciais para o tomador de deciso: por que certasfirmas foram capazes de construir posies devantagem e sustent-las ou falharam na tentativa?O autor comenta que, na viso jocosa dosprofissionais da rea, trata-se de um excelentemtodo para saber por que os outros esto, nestemomento, se dando bem e voc no. Tambmno plano acadmico as crticas so severas. Por

    exemplo, DAveni (1995), assim como Day &Reibstein (1998), da Wharton Business School,argumentam que (...) estratgia crescentementedinmica e complexa. Usando as metforas daimitao e da eroso das vantagens competitivasno tempo, os autores advertem que no maispossvel esperar pelo competidor para agir oureagir.

    Uma abordagem alternativa est sendoconstruda a partir da viso da empresa baseadaem recursos (Resources Based View of the Firm).

    Essa abordagem procura ampliar e refinar o quadrode referncia dos tomadores de deciso. Consideraque toda empresa possui umportfolio de recursos:fsicos, financeiros, intangveis (marca, imagem),organizacionais (cultura organizacional, sistemasadministrativos) e recursos humanos. a partirdesseportfolio que a empresa pode criar vantagenscompetitivas. Para os defensores dessa abordagem(Prahalad & Hamel, 1990; Krogh & Ross, 1995),a definio das estratgias competitivas deve partirde uma perfeita compreenso das possibilidadesestratgicas passveis de serem operacionalizadase sustentadas por tais recursos. Isto caracteriza essaabordagem como primordialmente de dentro parafora.

    A VBR postula que as empresas com pessoas,estruturas e sistemas superiores so mais lucrativas,no porque invistam em barreiras de entrada para

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    outras empresas ou porque ofeream produtosdiferenciados, mas sim porque elas se apropriamdas rendas de recursos especficos da firma. (...)Como j afirmava Teece, em 1982, a diversifi-

    cao menos uma resposta s imperfeiesestruturais dos mercados e mais um mecanismoorganizacional para capturar rendimentos que sotornados viveis pelos ativos especficos daempresa (Proena, 1999). Em outras palavras,diferenciao uma viso e uma deciso dedentro para fora mais do que uma informao defora para dentro; so os recursos da empresa,consubstanciados em competncias e capacita-es que criam e exploram lucrativamente umpotencial de diferenciao latente nos mercados.

    Outra premissa bsica da VBR de que asfirmas diferem de forma fundamental em seusmodos de operar porque cada uma delas possuirum agrupamento singular de recursos seusativos, competncias e capacitaes especficas.Dosi & Coriat (2002) observam que (...) firmastm formas diferentes de fazer as coisas: se elasso heterogneas at no modo de realizar tarefassimilares, o que no dizer das distines degrande escala que separam as empresas qumicasdas automobilsticas, das empresas varejistas, dos

    hospitais.Tidd et al. (1998) classificam a abordagem da

    anlise da indstria como racionalista e a VisoBaseada em Recursos como incrementalista: aprimeira seria fortemente influenciada pelaexperincia militar e inadequada para ambientescomplexos e de mudanas rpidas. Eles recomen-dam a adoo da segunda, a qual deve serencarada como uma forma de aprendizagem eexperincia corporativa em termos de combinarmaior eficincia com complexidade e mudan-as. Dosi & Coriat (2002) assumem que o queest ocorrendo o tradicional movimento pendu-lar: o foco sobre as competncias e os recursos

    segue o perodo no qual as pesquisas sobreestratgia empresarial foi reenergizada porconceitos econmicos retirados da EconomiaIndustrial e que focalizava primordialmente a

    relao da empresa com o seu ambientecompetitivo: esta [nova] perspectiva sobreorganizaes e aprendizagem organizacional,claramente, retira o foco da anlise tanto doposicionamento competitivo do produto quantoda estratgia esperta e o recoloca sobre (...)estratgias de aprimoramento das competncias.

    Como seria esperado, os defensores doPosicionamento Estratgico reagem: Emempresas competitivas pode ser enganosoexplicar o sucesso a partir da identificao de

    seus especficos pontos fortes, competnciasessenciais ou recursos crticos (Porter, 1996).No obstante, o mesmo autor, ao criticar a buscadesenfreada por crescimento, pede serenidadenessa deciso e d um conselho que parecederivar da VBR: Uma alternativa buscarextenses da estratgia que alavanquem o sistemade atividades existentes de maneira a criarservios ou especificaes que os rivais consi-derem ser impossvel combater em basesindividiais (Porter, 1996).

    Em sntese, a nosso ver, est havendoconvergncia entre as abordagens, no obstanteuma distino entre pressupostos (de fora paradentro versus de dentro para fora) ainda marqueo campo de disputa entre autores.1

    Entre as duas, optamos pela abordagem apartir da Viso Baseada em Recursos. A maiorcrtica a essa abordagem est na dificuldade paraa criao do framework analtico (Gilgeous &Parveen, 2001). Para enfrentar esse problema,criamos uma abordagem que procura combinarestratgia competitiva, aprendizagem e formaode competncias num modelo dinmico, comoo apresentado na Figura 1.

    1. Parece-nos relevante observar que nessa disputa esto envolvidos grandes interesses econmicos; no apenasuma discusso acadmica. Para outros detalhes veja Cole (1989) e Miyake (1995).

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    A formulao da estratgia competitiva devebuscar potencializar a competncia na qual aempresa mais forte. A constante evoluo dascompetncias da empresa permite o sistemticorefinamento e reformulao da estratgia compe-titiva e, a partir desta, so identificadas novasorientaes para a formao de competncias. A

    manuteno da relao dinmica entre estratgiae competncia o principal objetivo dos pro-cessos de aprendizagem.

    2.1 Construindo uma tipologia de

    competncias organizacionais

    O termo competncia essencial (corecompetence) ganhou importncia no cenrioadministrativo a partir do artigo The core compe-tence of the corporation, de Prahalad & Hamel,

    em 1990. De acordo com os autores, competnciasessenciais so recursos intangveis que (a) emrelao aos concorrentes so difceis de serimitados, (b) em relao a mercados e clientes soos recursos essenciais para que a empresa possaprover produtos/servios diferenciados e (c) emrelao ao processo de mudana e evoluo daprpria empresa so o fator fundamental da maior

    flexibilidade que permite a explorao dediferentes mercados. As competncias essenciaisno esto estritamente relacionadas tecnologia:elas podem estar localizadas em qualquer funoadministrativa. Alm disso, para desenvolvercompetncia essencial a longo prazo, a companhianecessita de um processo sistemtico de

    aprendizagem e inovao organizacional.Procurando avanar nessa discusso e cons-

    truir uma tipologia que d sustentao aomodelo de estratgia e formao de com-petncias, remetemos inicialmente ao trabalhode Woodward (1965). Seguindo a abordagemutilizada por essa autora em seu estudo clssico,

    Industrial Organisation: theory and practice ,consideramos que toda empresa possui, em dife-rentes propores, competncias relacionadas atrs diferentes funes: Operaes (Produo e

    Logstica), Desenvolvimento de Produto eComercializao (Vendas & Marketing).

    Em sua extensa pesquisa em empresas brit-nicas, Woodward constatou que, dependendo dotipo de produto/mercado, uma das funes vai sermais importante e ter mais poder do que asoutras, na medida em que exercer um papel decoordenao geral entre as funes.

    Figura 1 O ciclo de estratgia: competncia.

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    Para a construo de nossa abordagem issosignifica que, para a realizao da estratgia daempresa, as competncias acumuladas nessa funocrtica constituem a competncia essencial da em-

    presa; ela a mais importante para a realizaoda estratgia competitiva da empresa. As outrasduas funes so funes de apoio. O mesmodizemos para essas competncias.

    No queremos com isso afirmar que a em-presa deve se concentrar em apenas uma das trscompetncias e abandonar as outras duas. Oponto que queremos destacar que no interessante para qualquer empresa assumir que, ou deveria ser, igualmente competente emtodas as funes. Para o desempenho competitivo

    da empresa, uma das competncias vai ser maisrelevante que as outras. A competitividade sermaximizada quando houver alinhamento corretoentre competncia essencial e estratgiacompetitiva. As demais competncias devemsempre ser desenvolvidas tendo em vista reforara competncia essencial. Tudo questo depriorizao e equilbrio entre as trs compe-tncias. Este ponto ser mais detalhado a seguir.

    2.2 Estratgias competitivas ecompetncias organizacionais

    Consideraremos que qualquer estratgia com-petitiva, independentemente de suas caractersticasmais especficas, pode ser classificada em uma detrs categorias: Excelncia Operacional, Inovaoem Produto e Relao com o Cliente. Essatipologia, fortemente baseada em Treacy &Wiersema (1995) e em Porter (1996), elaboradaa seguir.

    2.2.1 Excelncia Operacional

    A estratgia de Excelncia Operacional aplicada pelas empresas que competem emmercados nos quais a relao qualidade/preo amaior determinante da competitividade de produtosou servios.

    nesses casos que encontramos as estratgiasbaseadas em operaes, como descritas por

    Hayes & Upton (1998): Eficincia operacionalsuperior fortalece a posio competitiva daempresa e, quando baseada nas capacidades dosseus recursos humanos e nos seus processos

    operacionais, dificulta a imitao pelos con-correntes. Por essa razo, pode prover a base parauma vantagem competitiva sustentvel, mesmoque a companhia adote a mesma posio compe-titiva de uma ou mais concorrentes.

    Exemplo tpico de Excelncia Operacional o das empresas automobilsticas, com destaquepara a Ford no passado e a Toyota atualmente.No mercado de computadores, Compaq e Dellso os maiores exemplos. No setor de servios,McDonalds e WalMart, entre outras, so casos

    de renome internacional.A estratgia de Excelncia Operacional implica

    desenvolver e colocar no mercado produtos/servios que otimizem a relao qualidade/preo.A lucratividade da empresa funo direta damargem por produto e da escala de produo.

    A funo crtica para o sucesso da companhia Operaes, incluindo todo o ciclo logstico:suprimento, produo e distribuio. nessa funoque reside a competncia essencial, aquela que deveser priorizada para que a empresa seja competitiva.

    Na indstria, o modelo da lean production tem sidoconsiderado como o ideal a ser alcanado.

    Como mencionado anteriormente, a construode competncias nas duas outras reas, Desen-volvimento de Produto/Servios e Vendas/Marketing (S&M), deve visar ao aumento decompetitividade da empresa, por intermdio deOperaes.

    Na rea de desenvolvimento, a empresa busca,prioritariamente, inovaes incrementais emprodutos e servios. Do ponto de vista dacompetitividade da empresa, mudanas em pro-cessos podem ter impacto to grande ou maiorque inovaes em produto/servio. Exemplo inte-ressante dado pelo recente desenvolvimento,pela Honda, de um novo tipo nico de plataformaque permite a montagem de veculos de diferentesmodelos e tamanhos, evitando a necessidade deum tipo especfico de plataforma para cadatamanho de veculo. Isso tem profundo impacto

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    nos custos de manufatura. Outro exemplo notvel o da Dell, que revolucionou a indstria decomputadores com um novo conceito deadministrao da cadeia de fornecimento.

    Na relao com os mercados, dado o grandevolume de consumidores, por mais que as empresastentem identificar seus traos e segment-los, arelao altamente impessoal. Alm disso, essasempresas tm conhecimento de que a diversidadeprecisa ser controlada para no prejudicar aeficincia. Assim, a famosa frase de Ford (Ocliente pode ter um carro de qualquer cor, desde queseja preta) continua tendo certo sentido. Portanto,o papel das Vendas e Marketing convencer osclientes e adapt-los ao modo operacionalmente

    excelente de a empresa fazer negcios (Treacy &Wieserma, 1995).

    2.2.2 Inovao em Produto

    As companhias que competem com umaestratgia de Inovao em Produto estocontinuamente investindo para criar conceitos deproduto radicalmente novos para clientes esegmentos de mercado definidos. A funocrtica Pesquisa & Desenvolvimento &Engenharia (P&D&E).

    Exemplos de indstrias nas quais a compe-titividade regulada pela Inovao em Produto soas indstrias de Tecnologia da Informao (TI),Telecomunicaes, Computao e Internet. Omesmo padro encontrado na indstria Biomdica(Cincias da Vida). Porm, h inovadores nomercado de consumo, como a Sony e a 3M.

    Tais empresas garantem seu sucesso econ-mico com a alta lucratividade que alcanam no

    perodo em que usufruem a posio de monop-lio de mercado. O que crtico para esse tipo decompanhia a rpida concepo de novosprodutos e de seus respectivos processos deproduo, que evoluem de escala laboratorialpara escala industrial.

    A funo Vendas/Marketing apresentacaractersticas diferentes em relao ao casoanterior, uma vez que, em geral, a empresaprecisa negociar o lanamento de novos

    produtos no mercado com clientes potenciaisantes que investimentos mais substanciais sejamfeitos. Isto implica identificar os clientes maispropensos inovao e discutir com eles as

    vantagens da adoo de produtos inovadores.

    2.2.3 Orientada para Cliente

    As empresas que adotam a estratgia Orientadapara Cliente so voltadas para as necessidades declientes especficos e procuram se especializar nodesenvolvimento de produtos, sistemas e soluesque atendam a suas demandas atuais e futuras.Para isso, tais companhias priorizam o desenvol-vimento do conhecimento sobre cada cliente e seu

    negcio: Vendas & Marketing torna-se a funocrtica, impulsionando os esforos de Pesquisa,Desenvolvimento e Engenharia, e tambm deOperaes.

    A IBM era considerada o exemplo dessa estra-tgia (Wheelwright & Hayes, 1985). A Caterpillar considerada como um caso de intimidade como cliente (Treacy & Wieserma, 1995).

    A indstria de embalagens representa um casointeressante. Apesar de as embalagens ganharemcada vez mais importncia no sucesso de umproduto, os produtores finais, em geral, no estointeressados em montar infra-estrutura prpria oudesenvolver competncias dentro da prpriaempresa para a produo de embalagens. Portanto,o relacionamento com uma empresa deembalagens envolve mais que a entrega de umproduto. A orientao estratgica das empresas deembalagem implica a identificao e o desen-volvimento de solues especficas e sistemas deembalagem que maximizem o valor do produto

    final, alavancando a competitividade da empresacliente em funo das expectativas de mercado.O forte relacionamento com os clientes

    (Intimidade com o Cliente, segundo Treacy &Wiersema, 1995), sobre os quais a funo Vendas responsvel, orienta Pesquisa & Desen-volvimento & Engenharia e Operaes nodesenvolvimento de solues especficas em ummodo pr-ativo. Em casos como esses,Operaes precisa dar respostas e ser flexvel s

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    necessidades dos clientes, e no necessariamenteatender a padres de classe mundial. Precisa serflexvel para atender s demandas dos clientesda melhor maneira possvel. por esta razo que

    empresas que adotam a estratgia Orientada paraCliente estabelecem in-houseplants ou assumematividades relativas ao estoque dos clientes. Osistema de Operaes tem de ser gil, nonecessariamente enxuto.

    2.3 Alinhando a estratgia competitiva

    gesto de competncias

    Consideramos assim que no processo decriao de vantagens competitivas necessrio

    alinhar a estratgia competitiva e a competnciaessencial. escolha de uma estratgia se associa uma

    competncia na qual a empresa precisa ser maisexcelente que seus competidores; as outras duascompetncias devem sustentar a primeira. ATabela 1 sintetiza esta tipologia de estratgias ecompetncias.

    Em suma, uma empresa, para ser competitiva,precisa realmente compreender como se articulamcompetncia essencial e estratgia empresarial.

    3. As redes interorganizacionais

    O modelo CompetnciasAprendizagemEstratgia, apresentado anteriormente para o casode empresas consideradas isoladamente, sofremudanas quando se trata de redes interor-ganizacionais. Ou seja, na medida em que hbusca de eficincia coletiva por intermdio desistemas de empresas, a questo da formao decompetncias e da escolha de estratgias assumecaractersticas especficas.

    Embora seja fenmeno recente, as redesinterempresariais j dispem de considervelcorpo de conhecimento. Diversos aspectosmereceram discusso, como, por exemplo, os

    determinantes para uma organizao vir aestabelecer uma rede (Oliver, 1990), o impactoda estrutura de uma rede na capacidade deinovao de uma firma (Ahuja, 2000), ainfluncia das relaes de uma organizao emsua capacidade de formar novas alianas (Gulati,1999), as peculiaridades de redes de PMEs(Human & Provan, 1997) e a centralidade dacolaborao entre empresas para a inovao emsetores de rpido desenvolvimento tecnolgico(Powell et al., 1996).

    FunoEstratgia

    competitiva OperaesDesenvolvimento de

    produtoVendas/Marketing

    ExcelnciaOperacional

    Manufatura classemundial/produo

    enxutaInovaes incrementais

    Convencer o mercado de que a relaoqualidade/preo dos produtos/servios

    oferecidos tima

    Inovao emProduto Scale up eproduo primria Inovaes radicais(breakthrough) Preparar o mercado e educar os clientespotenciais para a adoo da inovao

    Orientada paraCliente

    Manufatura gil

    Desenvolvimento desistemas

    (produtos/servios)especficos

    Desenvolver relaes com clientesespecficos para compreender

    necessidades e vender solues

    Observao: foram sublinhadas as competncias essenciais para cada estratgia.

    Tabela 1 Tipos de estratgia e competncias essenciais.

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    Esses estudos, assim como outros sobre oassunto, discutem principalmente aspectos deredes interempresariais, nas quais h relaeshorizontais. Porm, no que diz respeito espe-

    cificamente a redes (ou cadeias) de suprimentos,em que a relao essencialmente vertical, osestudos so principalmente descritivos efocalizados nas grandes corporaes (Harland etal., 2001).

    No caso de relaes horizontais, as empresastm relaes simtricas, recprocas; duascompanhias formam uma aliana de negcios(business alliance), ou mesmo criam uma alianaestratgica, porque tm recursos, especialmentecompetncias, complementares e a associao

    visa a criar sinergias que alavanquem o potencialcompetitivo de ambas.

    Para o estudo de redes de relaes verticaish diferentes enfoques. No campo da Gesto deOperaes, a abordagem do tipo Gesto daCadeia de Suprimentos, inspirado inicialmentepelo modelo japons de gesto e na estrutura dokeiretsu desenvolvido na indstria japonesa(Fruin, 1993). Seguindo essa tendncia, (...) aliteratura de Gesto de Operaes tem seconcentrado principalmente nas relaes

    genricas de cooperao entre cliente efornecedor em duas reas especficas: cooperaoem Operaes (logstica, planejamento daproduo, controle e qualidade) e co-design(Spina & Zotteri, 2001).

    O segundo enfoque (...) foi construdo apartir da Teoria da Organizao Industrial e daNova Economia Institucional, na vertenterepresentada pela Teoria dos Custos deTransao (Farina, 1999). Segundo essa autora,o conceito nuclear se deve a Coase, queintroduziu a idia da firma como um nexo decontratos. Assim, a microteoria das institui-es, que trata das estruturas de governana e daanatomia das organizaes, foi desenvolvida paracompreender a firma e contratos especficos,enquanto a macroteoria lida com o ambienteinstitucional geral (...). Governar a transaosignifica incentivar o comportamento desejado

    e, ao mesmo tempo, monitor-lo. Essagovernana pode ser obtida por meio de sistemade preos [ou] pode exigir a elaborao decontratos em que sejam predefinidos instru-

    mentos de incentivo e controle, tais como multas,auditorias ou prmios por resultados (Farina,1999). Portanto, a formao das cadeias desuprimentos seria uma escolha racional e objetivados vrios participantes do processo de produo. importante para tal escolha uma anlise dosdiferentes aspectos do relacionamento e os trade-offs entre eles (Spina & Zotteri, 2001).

    Um terceiro enfoque joga luz sobre asrelaes de comando e poder na cadeia. Essadimenso particularmente elaborada pelos

    estudos desenvolvidos por Gereffi (1994) arespeito da formao de cadeias de commoditiesglobais. Por exemplo, em seus estudos nasindstrias de vesturio e calados, mostrou comoo comando da cadeia concentra-se nas grandesempresas de distribuio e naquelas que detmasgriffes. Essa questo torna-se crucial para com-preender quais empresas podem governar acadeia, estabelecer as regras e procedimentospara a sua operao conjunta, e assumir ocomando das atividades mais lucrativas.

    Harland et al. (2001), comentando textoanterior de Grandori & Soda, assumem a distinoentre redes entre pares (parity based) e redescentralizadas, destacando que isso tem clararelevncia em termos do modo pelo qual ascompanhias focais podem gerenciar suas redes defornecimento dependendo de seu poder relativo.No modelo por eles proposto, o conceito de poder operacionalizado por intermdio de uma variveldenominada influncia.

    Para se tornarem membros de arranjos interor-ganizacionais, as firmas devem negociar seusrecursos: infra-estrutura, bens intangveis ecompetncias organizacionais. A questo bsicade pesquisa seria, ento: a posio relativa dedeterminada empresa na rede interorganizacional lder ou seguidora, relaes de paridade ou desubordinao ; seria uma funo da importnciarelativa de sua competncia distintiva para o

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    desempenho de toda a rede. Isso implicaria adistribuio e complementaridade de competn-cias entre as empresas participantes de deter-minado arranjo interorganizacional. Evidente-

    mente, haveria tambm impactos em termos dasescolhas estratgicas das empresas.

    4. Pesquisa de campo: aspectos

    metodolgicos

    Na construo de nosso modelo, primeira-mente consideramos que, quando uma empresadecide autonomamente sobre sua estratgiacompetitiva, h trs escolhas timas: ExcelnciaOperacional, Inovao em Produto e Orientada

    para Cliente. A hierarquizaodas competnciase sua gesto deveria, ento, seguir o que foiproposto na Tabela 1.

    Depois, vimos que a insero em uma redeinterorganizacional influencia a escolha daestratgia e a formao de competncias. Emoutras palavras, a escolha da estratgia condicionada pela posio da empresa na rede; aomesmo tempo, esse posicionamento funo daimportncia relativa das competncias que aempresa aporta para o desempenho competitivode toda a rede.

    Esse modelo foi ento aplicado para a realizaode diagnstico abrangente da indstria brasileira,vivendo intenso processo de internacionalizao.Isso condicionou as opes metodolgicas emtermos de definio do universo e da amostra.

    O universo escolhido para a aplicao domodelo foi aquele das empresas certificadas pelafamlia de normas NBR ISO 9000. Essasempresas, motivadas em atender aos padres de

    qualidade estabelecidos internacionalmente,realizaram as mudanas necessrias paraestabelecer procedimentos de gesto queatendessem aos quesitos para certificao.Partimos assim da hiptese de que o universo decompanhias com certificado ISO 9000 umgrupo de elite que j realizou as mudanas mais

    imediatas para atender s presses pelacompetitividade internacional.

    No Brasil, o universo das companhias indus-triais que possuem certificao de acordo com

    as normas ISO 9001 e 9002 constitudo deaproximadamente 1.600 empresas. Em 1999,foram enviados 1.516 questionrios para diretoresindustriais dessas companhias. Foram respon-didos 490, e destes 470 foram consideradosvlidos para os fins deste estudo.

    Os principais tpicos do questionrio foram:

    a) Caractersticas gerais da empresa.

    b) Fatores determinantes de mercado paraa formulao estratgica.

    c) Funo crtica de sucesso.d) Posio da empresa no ciclo de vida do

    produto.

    e) Relacionamentos a montante, a jusante elateralmente.

    f) As competncias desenvolvidas pela empre-sa tendo em vista as diferentes fases do ciclode vida do produto.

    g) Investimentos em treinamentos e educaode Recursos Humanos.

    A Tabela 2 demonstra que a amostra razoa-velmente representativa do segmento de empresasindustriais brasileiras que est se integrando aodesafio de uma economia globalizada, pois:

    l inclui no s o grupo das maiores empresasbrasileiras (nacionais e subsidirias), mastambm parcela significativa de pequenase mdias empresas;

    l apresenta distribuio em termos de origeme controle do capital que reflete a realidade

    brasileira no momento em que foi realizadaa pesquisa.

    As empresas selecionadas para o estudooperavam nos seguintes mercados: Automotivo,Qumico, Eletrnico, Mquinas e Equipamentos,Borrachas e Plsticos, Siderurgia e Metalurgia.

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    5. Anlise de dados e resultados

    O primeiro aspecto abordado no questionrioprocurava identificar a estratgia competitiva daempresa pesquisada. Para isso foi adotado oesquema proposto por Bolwijn & Kumpe (1990),perguntando: Quais seriam as caractersticas demercado mais importantes a serem consideradasna definio da estratgia competitiva? As respos-tas coletadas so apresentadas na Tabela 3.

    A anlise da tabela revela que os trs fatoresmais importantes para essas empresas compe-tirem nos mercados so: preo, qualidade eentrega, configurando a estratgia de ExcelnciaOperacional.

    Por outro lado, tambm foi solicitado que asempresas classificassem quais seriam as funesorganizacionais mais importantes para o alcancede seus objetivos. Cinco funes foram apre-

    sentadas: Manufatura, Logstica, Pesquisa & Desen-volvimento & Engenharia e Vendas/Marketing. Asrespostas so apresentadas na Tabela 4.

    importante mencionar que essa foi a nicaunanimidade encontrada no processamento dosdados: para as companhias da amostra, indepen-dente de tamanho ou origem, a funo Vendas/Marketing sempre foi considerada a mais impor-tante para o cumprimento da estratgiacompetitiva. A segunda funo mais importantefoi Produo.

    Preo Qualidade Entrega Inovao Diversidade

    Indicadores de Excelncia Operacional Produto Relao com o cliente

    Mdia amostral 4,69 4,68 4,41 3,77 3,52

    *As respostas foram dadas em uma escala de 1 a 5.

    Manufatura Logstica P&D&EVendas e

    Marketing

    Competncia

    essencialOperaes Desenvolvimento de produto

    Vendas e

    Marketing

    Mdia

    amostral4,41 4,12 4,14 4,63

    Tabela 3 Fator mais importante para a empresa competir no mercado.*

    Tabela 4 Funes crticas para realizao dos objetivos estratgicos.

    Pequenas

    (n < 99)

    Mdias

    (100 < n < 499)

    Grandes

    (500 < n < 999)

    Muito grandes

    (n > 1000)Total

    Empresanacional*

    23,8% 30,2% 6,4% 9,8% 70,2%

    Empresasubsidiria

    2,5% 14,0% 6,4% 6,8%29,8%

    n = nmero de empregados.

    *Empresa nacional: empresa com capital majoritariamente brasileiro.

    Tabela 2 Distribuio da amostra em termos de tamanho e origem do capital.

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    Com isto, se considerarmos a relao entreestratgia e competncia essencial, como apre-sentado na Tabela 1, notaremos certo desa-linhamento: apesar de a maioria das empresas

    declarar estar competindo com estratgia deExcelncia Operacional, a funo (e acompetncia) mais importante seria Vendas/Marketing. Uma possvel explicao para essaresposta seria o efeito da participao em redesinterorganizacionais sobre a formao decompetncias e sobre o campo de escolhasestratgicas das empresas.

    No questionrio solicitamos aos respondentesque considerassem duas fases no Ciclo de Vidado Produto: a fase de inovao e desen-

    volvimento e a fase de manufatura e operaes.Na primeira fase solicitamos que considerassemtrs atividades: A. P&D escaling up (P&D&E);B. Projeto de Processo e Produto; e C. Adaptaode Processo e Produto. Na segunda pedimos queconsiderassem: D. Gesto da Qualidade; E.Gesto da Cadeia de Fornecimento; e F. Logstica(gesto dos fluxos fsicos e de informaes).

    Solicitou-se, ento, que se identificassem osresponsveis pela execuo de tais atividades.Foram apresentadas as seguintes alternativas:

    somente a empresa (auto-suficincia), a empresae o(s) cliente(s) (casos de co-design ou cooperao

    em Operaes), a empresa e a matriz ou somentea matriz (no caso das subsidirias), a firma e olicenciador (casos de transferncia de tecnologia)ou ainda apenas os clientes (casos de subcon-

    tratao pura). Mesmo nas atividades no desen-volvidas pela prpria empresa, os respondentesmarcaram quem estaria com a responsabilidade.

    Na anlise, consideramos primeiramente secada uma das empresas declarava manter ou noalguma relao com outras empresas para odesempenho de pelo menos uma dessasatividades. Com isso, foi possvel classificar asempresas que operavam em total isolamento eaquelas que estavam de alguma forma conectadasa outras. Cerca de 30% das empresas brasileiras

    declararam atuar de forma isolada. Somente umadas subsidirias declarou que operavaindependentemente da matriz e que no estavaligada a nenhuma empresa local.

    Para as empresas que participavam de algumtipo de rede, analisamos as respostas de acordocom o perfil de suas atividades e assumimos quea empresa possua as competncias na rea emque ela declarava exercer alguma atividade.Dependendo do conjunto de competncias quecada empresa podia desenvolver, criamos catego-

    rias para caracterizar sua posio relativa na redeinterempresarial, como mostra a Tabela 5.

    Atividades desenvolvidas na

    empresa como indicadores de

    competncias organizacionais

    Empresas participantes de redes Empresas isoladas

    P&D&E Sim No No

    Desenvolvimento de produto-processo

    Sim Sim No

    Adaptao de produto-processo Sim Sim Sim

    Operaes Sim Sim Sim

    Estes casos no foramanalisados

    Posio mais provvelna rede

    Lder oualiana denegcios

    Primeironvel

    Segundonvel

    Empresas isoladas

    Tabela 5 Categorizao das empresas de acordo com as competncias informadas.

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    Finalmente, analisamos os dados em termosdos setores industriais nos quais operam asempresas. Os resultados so apresentados naTabela 6.

    O primeiro resultado uma viso panormicados tipos de redes interorganizacionais que estosendo estabelecidos. De certa maneira, pode-seconsiderar um retrato grosseiro da novaarquitetura da indstria no Brasil.

    O segundo ponto se refere posio relativadas empresas nessas redes. De acordo com oapresentado na Tabela 7, h certa desproporoem termos de quem est no comando?:claramente, h muito mais empresas estrangeirasem posies de liderana do que nacionais. Mas,

    para chegar a concluses mais esclarecedoras a

    esse respeito, as informaes dessa tabela devemser combinadas com as da Tabela 6.

    A Tabela 6 apresenta o tipo de arranjo que predominante em distintos tipos de indstrias.

    Inicialmente, constatamos que a grande maioriadas empresas nacionais ou faz parte de redes defornecimento nas quais o relacionamento vertical, assimtrico e hierrquico, ou ento soempresas isoladas, competindo apenas com seusrecursos prprios. Ou seja, a maior parte dasempresas nacionais ocupa posies de menorimportncia ou influncia na estratgia e nodesempenho da rede a que pertence. Istosinalizaria que provavelmente essas empresas nochegaram a acumular competncias que permi-

    tissem negociar melhor colocao nas redes.

    Tipo de rede Proporo Setor industrial Caractersticas das empresas

    Aliana4,8%

    QumicoMquinas

    Eletrnicos

    Principalmente empresas muito grandesNacionais > Subsidirias

    LderGrandes e muito grandes

    Subsidirias > Nacionais

    1o nvelMdias e grandes

    Subsidirias = NacionaisRede defornecimento

    73,4%Automotivo

    Borracha e plsticoMetais e ao

    2o nvelPequenas e mdias

    Nacionais >> Subsidirias

    Indstriano Brasil

    Isoladas21,8%

    TodasMaior participao:

    mquinasMenor: automotivo

    Todos os tamanhosSubsidirias = Nacionais

    Tabela 6 Posicionamento das empresas pesquisadas em diferentes arranjos empresariais.

    Posio provvel noarranjo

    Lder de rede oualiana

    Primeironvel

    Segundonvel

    Empresasisoladas

    Subsidirias 60,0% 33,0% 6,0% 1,0%

    Empresas nacionais 4,5% 20,5% 45,7% 29,3%

    Tabela 7 Posio mais provvel das empresas de acordo com sua origem.

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    Observamos tambm que as empresasnacionais que criaram relaes horizontais porintermdio de alianas estratgicas esto concen-tradas em trs reas: Qumica, Equipamentos/

    Mquinas e Eletrnica. Este resultado seriaindicativo de que, mesmo em campos de maiorintensidade tecnolgica, se o pas tem empresascom competncias internacionalmente reconhe-cidas, h a possibilidade de buscar relaes nasquais haja intercmbio com ganhos para ambasas partes.

    A amostra inclua grandes empresas nacionaispertencentes s indstrias siderrgica e me-talrgica. Entretanto, as informaes obtidascaracterizam suas posies como de fornecedoras

    em cadeias de suprimento. Podemos aventar aidia de que, pelo fato de ocuparem posies amontante nas cadeias produtivas, elas enfrentamdificuldades para exercer influncia sobre asdemais participantes das redes.

    J a maioria das empresas de Borracha,Plstico e de Metalurgia participantes da amostraso parte das cadeias de suprimento dos setoresQumico, Eletrnico e Automotivo. Esse tipo deempresa geralmente concentra suas competnciasna rea de Operaes e opera de acordo com

    padres locais baixo custo , o que nonecessariamente sinal de Excelncia Opera-cional (Fleury, 1995). O fato de que a maioriadessas empresas identificou Vendas/Marketingcomo funo mais importante pode ser umindicador de que a empresa ocupa posio devenda de servios de manufatura: para produzirprecisa vender as competncias e os recursosrelativos a Operaes para os demais partici-pantes da rede.

    interessante observar que a presenainesperada, porm significativa, de pequenas emdias subsidirias mais uma indicao dedeslocamento de empresas nacionais que nooferecem as competncias requeridas pelas lderes.

    Finalmente, temos as empresas isoladas queno so capazes de participar das redes. Elas seconcentram em produo de maquinaria,

    suprindo provavelmente mercados locais commodelos especficos.

    Em sntese, parece lcito concluir que onmero de empresas nacionais capazes de ocupar

    posies de liderana em redes interorgani-zacionais internacionais limitado e concentradoem alguns nichos. A admisso de tal situao crucial para, entre outros fins, compreendermelhor a competitividade do pas e para a criaode subsdios para eventual proposio de polticaindustrial.

    6. Comentrios finais

    O objetivo deste estudo foi analisar as conse-

    quncias da formao de redes interorganiza-cionais internacionais, que so pr-requisito paraa consecuo de metas de eficincia coletiva.Para isso, criamos um referencial conceitual noqual questes que so tradicionalmenteanalisadas a partir de abordagens de OrganizaoIndustrial poderiam ser tratadas pelo uso deconceitos e modelos de Gesto de Operaes.

    Utilizando esse referencial, as questes depesquisa podem ser respondidas como se segue.Na formao de redes interorganizacionais, aposio a que uma empresa pode aspirar dependedas competncias que ela acumulou e daimportncia relativa dessas competncias para odesempenho da rede como um todo.

    Num nvel mais agregado, a aplicao domodelo traz evidncias que auxiliam na avaliaodo potencial do pas para se tornar membro ativode redes internacionais. Assim, podemosidentificar as questes de governance e asconseqncias, em termos de tomada de deciso,

    nos planos da empresa, das regies e do pas.Dependendo da posio relativa que as empresasde determinado pas ocupam nas redes, podehaver questes de vulnerabilidade a seremconsideradas e possveis investimentos paraincrementar a competitividade podem serdesprovidos de sustentao a mdio e longoprazos.

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    Por ltimo, importante salientar que nocenrio atual de economia globalizada, dereconfigurao das empresas globais na busca daeficincia coletiva, procurar compreender a

    dinmica do processo de reestruturao do tecidoindustrial de um pas como o Brasil como tentar

    montar um quebra-cabea caleidoscpico: cadavez que uma figura se forma, uma das peas semexe, alterando a figura desenhada. Acontribuio deste texto tentar fornecer alguns

    conceitos tericos e evidncias empricas queajudem a melhor compreender esse caleidoscpio.

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    COMPETITIVE STRATEGIES AND CORE COMPETENCIES:

    PERSPECTIVES FOR THE INTERNATIONALIZATION OFINDUSTRY IN BRAZIL

    Abstract

    One of the key features of the new economy is the change from individual to collective efficiency. The

    main determinant of the successful delivery of the goods and services demanded by global or regional

    markets is the joint performance of firms networked as strategic alliances, production or value chains or

    industrial clusters. The starting point for the development of this study was the idea that participation in

    an entrepreneurial network influences the conditions for the establishment of the firms strategies and

    the formation of competencies. Searching for empirical evidences for that argument, we developed asurvey (490 respondents) about the recent evolution of industry in Brazil to see how local firms are

    redefining their strategies, organization and building relationships to survive and compete in a globalised

    and networked economy. The outcomes of the research reinforce the importance of networks as a basic

    concept for the analysis of competitiveness at firm and aggregate levels. Regarding the new organizational

    architecture of the Brazilian industry, what was observed was the widespread alignment of local firms

    into value chains led by TNCs and their subsidiaries, a limited number of strategic alliances, and a

    significant number of isolated firms, unable to respond to the demands of the new competition.

    Key words: international manufacturing, supply chains, interorganizational networks, brazilian

    industry.