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ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS FLEXÍVEIS COM UM NÍVEL DE ANCORAGEM José Wellington Santos de Vargas Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Engenharia Civil, COPPE, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Engenharia Civil. Orientador: Francisco de Rezende Lopes Rio de Janeiro Julho de 2016

ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

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Page 1: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS FLEXÍVEIS

COM UM NÍVEL DE ANCORAGEM

José Wellington Santos de Vargas

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-graduação em

Engenharia Civil, COPPE, da

Universidade Federal do Rio de Janeiro,

como parte dos requisitos necessários à

obtenção do título de Mestre em

Engenharia Civil.

Orientador: Francisco de Rezende Lopes

Rio de Janeiro

Julho de 2016

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ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS FLEXÍVEIS

COM UM NÍVEL DE ANCORAGEM

José Wellington Santos de Vargas

DISSERTAÇÃO SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DO INSTITUTO ALBERTO

LUIZ COIMBRA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA DE ENGENHARIA

(COPPE) DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE

DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE

EM CIÊNCIAS EM ENGENHARIA CIVIL.

Examinada por:

______________________________________________

Prof. Francisco de Rezende Lopes, Ph.D.

______________________________________________

Prof. Fernando Artur Brasil Danziger, D.Sc.

______________________________________________

Prof. Leonardo De Bona Becker, D.Sc.

RIO DE JANEIRO, RJ- BRASIL

JULHO DE 2016

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iii

Vargas, José Wellington Santos de

Estudo da Interação Solo-Estrutura em Cortinas

Flexíveis com um Nível de Ancoragem / José Wellington

Santos de Vargas. – Rio de Janeiro: UFRJ/COPPE, 2016.

XVIII, 122 p.: il.; 29,7 cm.

Orientador: Francisco de Rezende Lopes

Dissertação (mestrado) – UFRJ/ COPPE/ Programa de

Engenharia Civil, 2016.

Referências Bibliográficas: p. 116-119.

1. Interação Solo-Estrutura. 2. Cortinas Ancoradas. 3.

Análise Numérica. I. Lopes, Francisco de Rezende. II.

Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPE,

Programa de Engenharia Civil. III. Título.

Page 4: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

iv

Aos meus professores.

Page 5: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

v

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, ao Criador pelo dom da vida e por ter embelezado a minha

trajetória com pessoas, momentos e experiências que não podem ser descritos.

Aos meus pais, Valdir e Erica, pelo incentivo à descoberta e ao aprendizado desde

a tenra idade. Também às minhas irmãs, Itaibeli e Valérika, pelo apoio e pela

compreensão.

Aos meus inseparáveis colegas de mestrado Carla Fabris, Louis Magalhães e

Marcela Tortureli, por fazerem deste tempo uma experiência inesquecível, cheia de

diversão e sentimento. A todos os COPPEtentes e COPPErativos, pela interação

maravilhosa. Foi muito bom estarmos juntos.

Ao Nelson Santos, mentor e amigo, com quem sempre pude contar. Nossa

amizade permanecerá para sempre.

À Eliene Silva, pela amizade e companheirismo, pelos cafés e sorrisos, pelos

momentos de cobrança e de aconselhamento. Minha conquista muito se deve à sua

influência.

Ao meu orientador Francisco Lopes, pela prontidão em me conduzir durante esta

pesquisa e pela paciência.

Aos professores do PEC, especialmente ao professor Fernando Danziger pelo

cuidado para com este forasteiro. Também à Graziela Januzzi pela empatia e

urbanidade.

À CAPES, pelo auxílio financeiro durante os dois anos do meu mestrado.

Page 6: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

vi

Resumo da Dissertação apresentada à COPPE/UFRJ como parte dos requisitos

necessários para a obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.)

ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS FLEXÍVEIS

COM UM NÍVEL DE ANCORAGEM

José Wellington Santos de Vargas

Julho/2016

Orientador: Francisco de Rezende Lopes

Programa: Engenharia Civil

A interação solo-estrutura em cortinas flexíveis constitui-se num dos mais

desafiadores problemas de geotecnia. Projetar obras desse tipo com base nos métodos

clássicos pode ser antieconômico por um lado e não seguro por outro. Este trabalho

apresenta um resumo dos métodos clássicos empregados no projeto de cortinas e

também as principais contribuições sobre a interação solo-estrutura apresentadas na

literatura. Faz-se também um estudo numérico para comparação com os resultados

apresentados por ROWE (1952) em termos de distribuição de tensões, flexibilidade e

redução de momentos. Apresenta-se também um estudo de caso hipotético onde se

avalia numericamente a influência da deformabilidade do solo, flexibilidade da cortina,

deslocabilidade da ancoragem e extensão da ficha. Os resultados apontam para a

adequação do método empírico de redução de momentos proposto por ROWE (1952),

exceto em alguns casos especiais. Conclui-se também que a flexibilidade da estrutura é

o fator mais importante da interação solo-cortina, sendo a principal causa da

redistribuição de tensões na região da ancoragem e abaixo da cota de dragagem.

Page 7: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

vii

Abstract of Dissertation presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the

requirements for the degree of Master of Science (M.Sc.)

STUDY OF SOIL-STRUCTURE INTERACTION IN ANCHORED BULKHEADS

José Wellington Santos de Vargas

July/2016

Advisor: Francisco de Rezende Lopes

Department: Civil Engineering

The soil-structure interaction in sheet-pile walls is one of the most challenging

problems in geotechnical engineering. The design of this type of structure according to

classical methods may be at the same time anti-economical and unsafe. This work

presents a summary of classical methods of design as well as the main contributions on

the soil-structure issue. Numerical analyses were performed and their results were

compared with those presented by ROWE (1952) in terms of soil pressure distribution,

pile flexibility and moment reduction. A hypothetical case is studied where the

influence of soil compressibility, pile flexibility, anchor yield and embedment depth is

evaluated numerically. The results show that the empirical method of moment reduction

proposed by ROWE (1952) is adequate, except in some special cases. It is also

concluded that the pile flexibility is the main factor affecting the soil-wall interaction,

being the cause of pressure redistribution in the anchor zone and below the dredge line.

Page 8: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

viii

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 1

1.1 MOTIVAÇÃO E OBJETIVOS ................................................................................. 1

1.2 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO ........................................................................ 2

2 CORTINAS DE ESTACAS-PRANCHA – GENERALIDADES ........................ 3

2.1 MATERIAIS E SEÇÕES .......................................................................................... 6

2.2 FORMAS DE COLAPSO ......................................................................................... 8

2.3 PROJETO DE CORTINAS ..................................................................................... 11

2.4 SISTEMA DE ANCORAGEM ............................................................................... 11

3 REVISÃO DOS MÉTODOS DE ANÁLISE ....................................................... 14

3.1 MÉTODOS CLÁSSICOS ....................................................................................... 14

3.1.1 Fator de Segurança ........................................................................................ 15

3.1.2 Análise de Cortinas em Balanço ................................................................... 17

3.1.3 Método do Apoio Livre (Free Earth Support) ............................................. 19

3.1.3.1 Método do Apoio Livre – Variação 1 ...................................................... 21

3.1.3.2 Método do Apoio Livre – Variação 2 ...................................................... 22

3.1.3.3 Método do Apoio Livre – Variação 3 ...................................................... 23

3.1.3.4 Método do Apoio Livre – Variação 4 ...................................................... 24

3.1.4 Métodos de Apoio Fixo (Fixed Earth Support) ............................................ 25

3.1.4.1 Método da linha elástica .......................................................................... 25

3.1.4.2 Método da viga equivalente ..................................................................... 26

3.2 MÉTODOS EMPÍRICOS E CONTRIBUIÇÕES ACERCA DA INTERAÇÃO

SOLO-ESTRUTURA ...................................................................................................... 27

3.2.1 Caso de Aalborg (Dinamarca) ...................................................................... 28

3.2.2 Recomendações da Sociedade Dinamarquesa de Engenheiros Civis ........ 30

3.2.3 Tschebotarioff (1949) .................................................................................... 33

3.2.4 Rowe (1952) .................................................................................................... 34

3.2.5 Brinch-Hansen (1953) e Rowe (1956)........................................................... 37

3.2.6 Outras contribuições ..................................................................................... 38

3.3 MÉTODOS NUMÉRICOS ..................................................................................... 41

3.3.1 Solução em que o Solo é Representado por Molas ..................................... 42

3.3.2 Métodos de Meio Contínuo ........................................................................... 44

4 REVISITANDO O TRABALHO DE ROWE (1952) ......................................... 46

Page 9: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

ix

4.1 ENSAIOS EM MODELOS REDUZIDOS ............................................................. 47

4.1.1 Distribuição de tensões .................................................................................. 49

4.1.2 Flexibilidade ................................................................................................... 51

4.2 ENSAIOS NUMÉRICOS ........................................................................................ 52

4.2.1 Distribuição de tensões .................................................................................. 53

4.2.2 Flexibilidade ................................................................................................... 58

4.3 RESULTADOS DAS ANÁLISES NUMÉRICAS E COMPARAÇÕES ............... 63

4.3.1 Distribuição de tensões .................................................................................. 64

4.3.2 Flexibilidade ................................................................................................... 76

5 ESTUDO PARAMÉTRICO DE CASO HIPOTÉTICO .................................... 84

5.1 DESCRIÇÃO DO CASO ........................................................................................ 84

5.2 RESULTADOS DO ESTUDO DE FLEXIBILIDADE .......................................... 88

5.2.1 Influência da flexibilidade na distribuição das tensões .............................. 88

5.2.2 Influência da flexibilidade nos momentos fletores ..................................... 93

5.2.3 Influência da flexibilidade na solicitação da ancoragem ........................... 94

5.2.4 Influência da flexibilidade nas deformações da cortina ............................. 96

5.3 ESTUDOS DE DESLOCABILIDADE DA ANCORAGEM ............................... 101

5.3.1 Influência da ancoragem na distribuição de tensões ................................ 102

5.3.2 Influência da ancoragem nos momentos fletores ...................................... 103

5.3.3 Influência da ancoragem na sua própria solicitação ................................ 104

5.3.4 Influência da ancoragem nos deslocamentos ............................................ 105

5.4 ESTUDOS DO APOIO INFERIOR ...................................................................... 106

5.4.1 Influência da ficha na distribuição de tensões passivas ........................... 107

5.4.2 Influência da ficha nos momentos .............................................................. 108

5.4.3 Influência da ficha na solicitação das ancoragens .................................... 109

5.4.4 Influência da ficha nos deslocamentos da cortina .................................... 110

6 CONCLUSÕES E SUGESTÕES ....................................................................... 112

6.1 CONCLUSÕES ..................................................................................................... 112

6.1.1 Sobre o Capítulo 4 ....................................................................................... 112

6.1.2 Sobre o Capitulo 5 ....................................................................................... 113

6.2 SUGESTÕES PARA OUTRAS PESQUISAS ..................................................... 115

7 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 116

APÊNDICE 1 – DEDUÇÃO DA EQUAÇÃO DO FS PARA A VARIAÇÃO 2 DO

MÉTODO DO APOIO LIVRE .................................................................................. 120

Page 10: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

x

LISTA DE FIGURAS

Figura 2-1: Usos e tipos de cortinas de estacas-prancha (adaptado de CORNFIELD,

1975) ................................................................................................................................. 3

Figura 2-2: Estruturas típicas de estacas-prancha: a) cortina em balanço; b) cortina

ancorada; c) píer; d) dique seco; e) cortina ancorada com estaca de tração; f) cortina

ancorada com cavalete de estacas; g) cortina com plataforma de alívio e h) escavação

com escoramento (adaptado de BOWLES, 1977; DISMUKE, 1991) ............................. 5

Figura 2-3: Seções típicas de estacas-pranchas de madeira e concreto: a) pranchas de

madeira justapostas; b) pranchas de madeira unidas com grampos de aço; c) pranchas

sobrepostas de madeira com junção tipo macho e fêmea; d) visão geral de estaca-

prancha de concreto armado; e) seção em concreto com juntas vedadas em graute e f)

seção em concreto com juntas do tipo macho e fêmea (adaptado de CLAYTON et al.,

2013) ................................................................................................................................. 7

Figura 2-4: Seções comuns de estacas-pranchas metálicas: a) Perfil Z simples e

combinado; b) Perfil U simples e combinado; c) Perfis AS (seção plana) e d) Parede

combinada de perfis Z e I (soldier wall) (adaptado de ARCELOR MITTAL, 2010) ...... 8

Figura 2-5: Modos convencionais de ruptura das cortinas ancoradas – a) ruptura global,

b) ruptura passiva (toe kick-out), c) plastificação da seção, d), e) e f) ruptura do sistema

de ancoragem (adaptado de USACE, 1994) ..................................................................... 9

Figura 2-6: Posicionamento dos elementos de ancoragem: a) diagramas para a

estimativa da capacidade de carga e b) afastamento da região de instabilidade (adaptado

de CLAYTON et al., 2013) ............................................................................................ 12

Figura 2-7: Redução da capacidade da ancoragem sugerida por Terzaghi (adaptado de

CLAYTON et al., 2013) ................................................................................................. 13

Figura 3-1: Classificação dos Métodos Clássicos .......................................................... 14

Figura 3-2: a) Linha elástica assumida para o cálculo da cortina em balanço; b)

Diagrama de empuxo simplificado e c) Diagrama líquido de empuxo para cálculo

prático (adaptado de BOWLES, 1977) ........................................................................... 18

Figura 3-3: Linha elástica real e distribuição real de empuxo na cortina em balanço com

restrição completa do pé ................................................................................................. 19

Page 11: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xi

Figura 3-4: Análise de cortina ancorada pelo Método do Apoio Livre – a) estrutura e

linha elástica assumida, b) diagrama de empuxo lateral e c) diagrama de momentos

fletores ............................................................................................................................ 20

Figura 3-5: Variação mais conhecida do MAL ............................................................. 21

Figura 3-6: Variação 2 do MAL .................................................................................... 22

Figura 3-7: Método do apoio livre proposto por TERZAGHI (1943) ........................... 23

Figura 3-8: Método do apoio livre segundo ROWE (1952) .......................................... 24

Figura 3-9: Diagramas para o cálculo segundo o MAF (TSCHEBOTARIOFF, 1962) 26

Figura 3-10: Método simplificado da viga equivalente (TSCHEBOTARIOFF, 1962) 27

Figura 3-11: Detalhes do píer de Aalborg, Dinamarca (TSCHEBOTARIOFF, 1951) .. 29

Figura 3-12: Diagrama de tensões modificado segundo a Sociedade Dinamarquesa de

Engenheiros Civis (TSINKER, 1997) ............................................................................ 31

Figura 3-13: Distribuições de tensões alternativas segundo a) OHDE (1938) e b)

GONCHAROV (1962) (TSCHEBOTARIOFF, 1962; TSHINKER, 1997) .................. 32

Figura 3-14: Redistribuição da tensão normal à estrutura em função da deflexão da

cortina (TSCHEBOTARIOFF, 1973). ........................................................................... 33

Figura 3-15: Tipos de deformação associados às cortinas flexíveis (adaptado de

SIMPSON e POWRIE, 2001) ........................................................................................ 34

Figura 3-16: Analogia para o entendimento da redução do vão efetivo da cortina

(CORNFIELD, 1975) ..................................................................................................... 35

Figura 3-17: Curvas de redução de momentos (ROWE, 1952) ...................................... 36

Figura 3-18: Método de utilização da redução de momentos em projeto ...................... 36

Figura 3-19: Resumo dos experimentos de LAZEBNIK (1961) (adaptado de TSINKER,

1997) ............................................................................................................................... 38

Figura 3-20: Exemplo de aplicação dos coeficientes de empuxo alternativos (BILGIN,

2012) ............................................................................................................................... 41

Figura 3-21: Diagramas de empuxo em cortina segundo o método das tensões

dependentes a) no repouso e b) após o processo iterativo (FINE, 2016) ....................... 43

Page 12: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xii

Figura 4-1: Resultados da compressão edométrica dos solos utilizados nos experimentos

(adaptado de ROWE, 1952)............................................................................................ 49

Figura 4-2: Modelo utilizado nos experimentos de distribuição de tensões (ROWE,

1952) ............................................................................................................................... 50

Figura 4-3: Sequência executiva dos ensaios de distribuição de tensões (ROWE, 1952)

........................................................................................................................................ 51

Figura 4-4: Aparato para os experimentos de flexibilidade (ROWE, 1952) .................. 52

Figura 4-5: Dimensões e malha de elementos finitos dos modelos numéricos de

distribuição de tensões – a) DT1 e b) DT2 ..................................................................... 54

Figura 4-6: Módulo de deformabilidade variável adotado para as análises DT ............. 56

Figura 4-7: Aproximação da curva de compressão edométrica da areia fofa com a

utilização do modelo Hardening Soil ............................................................................. 56

Figura 4-8: Modelos numéricos para os ensaios de flexibilidade dos grupos a) 1 e b) 2 60

Figura 4-9: Modelos numéricos para os ensaios de flexibilidade dos grupos a) 3 e b) 4

........................................................................................................................................ 61

Figura 4-10: Módulos de deformabilidade variáveis usados nos modelos numéricos dos

grupos a) 1 e 2; b) 3 e 4 .................................................................................................. 62

Figura 4-11: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT1 com ancoragem indeslocável ....................... 65

Figura 4-12: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT2 com ancoragem indeslocável ....................... 66

Figura 4-13: Cruzes de tensões efetivas a) antes e b) depois da dragagem do solo ....... 67

Figura 4-14: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT1 com ancoragem deslocável .......................... 71

Figura 4-15: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT1 com ancoragem deslocável .......................... 72

Figura 4-16: Origens dos efeitos de segunda ordem ...................................................... 75

Figura 4-17: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e

flexibilidades (Log If) do grupo 1 ................................................................................... 77

Page 13: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xiii

Figura 4-18: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e

flexibilidades (Log If) do grupo 2 ................................................................................... 78

Figura 4-19: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e

flexibilidades (Log If) do grupo 3 ................................................................................... 79

Figura 4-20: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e

flexibilidades (Log If) do grupo 4 ................................................................................... 80

Figura 4-21: Comparação entre as curvas de redução de momentos propostas por Rowe

e os resultados numéricos dos grupos 1 e 2 .................................................................... 81

Figura 4-22: Comparação entre as curvas de redução de momentos propostas por Rowe

e os resultados numéricos dos grupos 3 e 4 .................................................................... 82

Figura 5-1: Geometria e módulos de deformação utilizados no caso hipotético............ 86

Figura 5-2: Modelo numérico do estudo paramétrico ................................................... 87

Figura 5-3: Distribuição de tensões com a flexibilidade da cortina em solo compacto . 89

Figura 5-4: Distribuição de tensões com a flexibilidade da cortina em solo

medianamente compacto ................................................................................................ 90

Figura 5-5: Distribuição de tensões com a flexibilidade da cortina em solo fofo .......... 91

Figura 5-6: Variação dos momentos fletores com a flexibilidade da cortina ................. 93

Figura 5-7: Variação de Fa com a flexibilidade da cortina ............................................. 94

Figura 5-8: Redução de Rowe para a força na ancoragem (adaptado de TERZAGHI,

1954) ............................................................................................................................... 96

Figura 5-9: Variação das deformações máximas na estrutura com a flexibilidade ........ 96

Figura 5-10: Perfis de deformações com a flexibilidade da cortina em solo compacto . 98

Figura 5-11: Perfis de deformações com a flexibilidade da cortina em solo

medianamente compacto ................................................................................................ 99

Figura 5-12: Perfis de deformações com a flexibilidade da cortina em solo fofo ........ 100

Figura 5-13: Variação do momento máximo com a deslocabilidade da ancoragem .... 103

Figura 5-14: Variação da solicitação da ancoragem com a sua deflexão ..................... 104

Page 14: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xiv

Figura 5-15: Variação dos deslocamentos máximos na cortina com a deslocabilidade da

ancoragem ..................................................................................................................... 105

Figura 5-16: Valores de FS vs. ficha segundo o MAL para diferentes teorias empuxo 106

Figura 5-17: Distribuições de tensões passivas para diferentes comprimentos de ficha

...................................................................................................................................... 107

Figura 5-18: Momentos fletores nos modelos com diferentes fichas ........................... 108

Figura 5-19: Variação do momento máximo com a extensão relativa da ficha ........... 109

Figura 5-20: Variação da solicitação da ancoragem com a extensão relativa da ficha 110

Figura 5-21: Perfil de deslocamentos horizontais em modelo com ficha variável ....... 111

Page 15: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xv

LISTA DE TABELAS

Tabela 4-1: Detalhes dos modelos de cortinas (adaptado de ROWE, 1952) .................. 47

Tabela 4-2: Propriedades dos solos (adaptado de ROWE, 1952)................................... 48

Tabela 4-3: Parâmetros de entrada do modelo hiperbólico no programa Plaxis ............ 57

Tabela 4-4: Resumo dos modelos numéricos para os ensaios de flexibilidade .............. 58

Tabela 4-5: Resultantes e esforços de flexão nos modelos físicos e experimental ........ 74

Tabela 5-1: Parâmetros de entrada para as análises numéricas ...................................... 85

Tabela 5-2: Valores calculados segundo o MAL ........................................................... 86

Page 16: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xvi

LISTA DE SÍMBOLOS E ABREVIATURAS

A - Área

C1, C2, C3, C4 – Coeficientes genéricos associados à geometria e aos parâmetros do

problema (dimensionais);

c – Intercepto de coesão do solo;

c’ – Intercepto efetivo de coesão do solo;

c’m – Intercepto efetivo de coesão mobilizado;

D – Ficha total da cortina;

d – Deslocamento;

E – Módulo de deformação;

EAanc – Rigidez da ancoragem;

E50ref

– Módulo elástico secante de referência;

Eoed – Módulo elástico edométrico;

Eoedref

– Módulo elástico edométrico de referência;

Eurref

– Módulo elástico de descarregamento e recarregamento de referência;

EI – Índice de rigidez da cortina;

Fa – Reação na ancoragem;

Fb – Reação no apoio adicional inferior;

FD – Fator de acréscimo da ficha;

FM, KM – Fator de redução do momento fletor;

FS – Fator de Segurança ou Fator de Segurança Global;

H – Altura total da cortina;

H’ – Altura de contenção da cortina;

If – Índice de flexibilidade (H4/EI), em unidades do SI ;

Im – Índice de momento (M/H3), em unidades do SI;

K – Módulo de compressibilidade volumétrica;

Page 17: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xvii

K0 – Coeficiente de empuxo no repouso;

K0na

– Coeficiente de empuxo no repouso para o modelo Hardening Soil;

Ka – Coeficiente de empuxo ativo;

Kp – Coeficiente de empuxo passivo;

Kp,m – Coeficiente de empuxo passivo mobilizado;

kh – Coeficiente de reação horizontal do solo;

MAF – Método do apoio fixo;

MAL – Método do apoio livre;

MEF – Método de Elementos Finitos;

Mmáx – Momento fletor máximo;

m – Potência associada à equação do módulo elástico no modelo hiperbólico;

Ra – Resultante ativa na cortina;

Rp – Resultante passiva na cortina;

R’p, RD – Resultante contra-passiva na cortina;

pref

– Tensão de referência;

Q – Sobrecarga; Reação vertical de ponta na cortina;

q – Sobrecarga relativa (Q/γH);

R – Resultante do empuxo passivo mais a força Ts;

Rint – Fator de resistência da interface solo-cortina;

Rf – Razão de ruptura do modelo hiperbólico;

Ta – Resultante de atrito solo-cortina na região ativa;

Tp – Resultante de atrito solo-cortina na região passiva;

Ts – Força cisalhante atuante no pé da cortina (toe shear);

t – Ficha mínima da cortina, correspondente a FS = 1;

W – Peso da cortina;

w – Deslocamento horizontal da cortina;

α – Profundidade relativa da cota de dragagem (H’/H);

Page 18: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

xviii

β – Profundidade relativa da ancoragem (zancoragem/H);

γ – Peso específico do solo;

ΔManc – Desequilíbrio de momento de corpo rígido em torno do ponto de ancoragem;

δ – Ângulo de atrito da interface solo-cortina;

δ’ – Ângulo de atrito efetivo da interface solo-cortina;

δa - Ângulo de atrito da interface solo-cortina no lado ativo;

δanc – Deslocamento relativo da ancoragem;

δ’m – Ângulo de atrito efetivo mobilizado na interface solo-cortina;

δp - Ângulo de atrito da interface solo-cortina no lado passivo;

ν – Coeficiente de Poisson;

νur – Coeficiente de Poisson no regime de descarregamento e recarregamento;

ρ – Número de flexibilidade (H4/EI), em unidades do Sistema Imperial;

ϕ – Ângulo de atrito do solo;

ϕ' – Ângulo de atrito efetivo do solo;

ϕ'm – Ângulo de atrito efetivo mobilizado;

ψ – Ângulo de dilatância do solo.

Page 19: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

1

1 INTRODUÇÃO

O problema da interação solo-estrutura em cortinas flexíveis é um dos mais

complexos da engenharia geotécnica. Felizmente, o problema tem sido mais de

ordem econômica do que de segurança, visto que as teorias clássicas sempre

produziam resultados conservadores. Com o progresso da compreensão do

problema na primeira metade do século passado, tornou-se inevitável que os

engenheiros levassem mais ousadia aos seus projetos.

Diversos autores investigaram o problema por meio da modelagem física.

Sem dúvidas, o mais célebre deles foi ROWE (1952), que apresentou pela primeira

vez argumento convincente para o projeto econômico de cortinas que não estivesse

fortemente baseado em julgamento e que concordava com as observações de

diversos outros autores.

Após a década de 1970, a análise numérica dos problemas de engenharia foi

paulatinamente ganhando espaço e o estudo dos problemas de interação solo-

estrutura acabou por se tornar, hoje, num recurso acessível e versátil para os

projetistas.

1.1 MOTIVAÇÃO E OBJETIVOS

O uso de métodos computacionais na análise geotécnica vai ao encontro da

necessidade de produzir projetos mais ajustados, em especial economicamente.

Frequentemente, os projetos geotécnicos são os que precisam ser executados

primeiramente, mas os últimos a serem desenvolvidos (por receberem influência de

todos os outros). Diante disso, propôs-se realizar um estudo numérico da interação

solo-estrutura em cortinas flexíveis com um nível de ancoragem em solos

granulares. Esse tipo de estrutura é muito utilizado em obras portuárias no Brasil e

tem sido favorecida pela disponibilidade de perfis metálicos que existe hoje.

O objetivo principal deste trabalho é contribuir para a otimização do projeto

de cortinas de cais. Como objetivos específicos, ele traz:

a) Descrever os métodos clássicos de projeto e as principais contribuições

para análise da interação solo-estrutura ao longo dos anos;

b) Comparar os resultados do trabalho experimental de ROWE (1952) com

resultados numéricos de modelos semelhantes e fazer críticas tanto

quanto ao uso de seu método e

Page 20: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

2

c) Estudar a influência de alguns parâmetros do projeto de cortinas e propor

critérios de projeto baseados nesse estudo.

Espera-se também contribuir para o melhor entendimento do problema da

interação solo-estrutura em cortinas.

1.2 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO

Esta dissertação está dividida em 7 capítulos. No primeiro deles, faz-se uma

introdução do tema tratado e apresentam-se os objetivos e a estrutura do texto.

O capítulo 2 trata de generalidades do projeto de cortinas flexíveis. São

discutidos os tipos de estruturas comuns e seus usos, os materiais empregados, as

formas típicas de colapso dessas estruturas, a sequência tradicional de projeto e

algumas considerações sobre o projeto do sistema de ancoragem.

No terceiro capítulo são revistos os métodos de análise das cortinas de cais,

incluindo os métodos clássicos, os métodos empíricos e o progresso do

entendimento da interação solo-estrutura e, por fim, os métodos numéricos, onde

também se apresenta em algum detalhe o método numérico usado neste trabalho.

Passa-se então ao quarto capítulo, onde são apresentadas análises numéricas

do trabalho de ROWE (1952). No início do capítulo é descrito em detalhe o

procedimento adotado pelo referido autor e, em sequência, a metodologia das

análises numéricas. Os resultados são discutidos na última parte do capítulo.

O estudo paramétrico de um caso hipotético é apresentado no capítulo 5.

Logo no início descreve-se o caso, sua geometria e os parâmetros a avaliar. Em

sequência, são apresentados e discutidos os resultados do estudo da influência da

flexibilidade da cortina, da deslocabilidade da ancoragem da estrutura e da extensão

do apoio inferior. No capítulo é levada em consideração a compressibi lidade do

solo e sua variação com a profundidade (se constante com a profundidade ou

crescente linearmente).

As conclusões do trabalho e algumas sugestões para outras pesquisas são

apresentadas no capítulo 6 da dissertação. O sétimo e último capítulo lista as

referências bibliográficas consultadas e citadas ao longo do texto.

Page 21: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

3

2 CORTINAS DE ESTACAS-PRANCHA – GENERALIDADES

Cortinas de estacas-prancha (sheet-pile walls) são largamente empregadas

em estruturas de contenção à beira-mar como píeres, atracadouros, diques secos,

quebra-mares, barramentos de cortinas celulares, paredes de eclusas etc. Obras em

terra também podem empregar esse tipo de estrutura, como é o caso das escavações

em meios urbanos, paredes e proteções de canais, cortinas de cut-off em barragens,

dentre outros. CORNFIELD (1975) apresenta um resumo dos usos de estruturas de

estacas-prancha associados ao seu tipo, conforme a Figura 2-1.

Figura 2-1: Usos e tipos de cortinas de estacas-prancha (adaptado de CORNFIELD,

1975)

Page 22: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

4

Geralmente associam-se as cortinas em balanço (cantilever walls) às

estruturas que se destinam à contenção de pouca altura de solo (Figura 2-2a), pelo

fato de o módulo resistente necessário para a seção da cortina aumentar

rapidamente com a altura da mesma, além das grandes deformações resultantes

(BOWLES, 1977). CORNFIELD (1975) assinala que o seu uso é apropriado para

obras temporárias.

No caso de estruturas projetadas para conter alturas maiores de solo (Figura

2-2b-g), é mais comum o uso de cortinas ancoradas (ou anchored sheet-pile walls,

ou ainda anchored bulkheads). A utilização da ancoragem possibilita a redução dos

esforços de flexão e da magnitude das deformações na cortina, se comparada à

estrutura em balanço, além da redução do comprimento de embutimento no solo

(ficha).

Se a retroárea da cortina for destinada a receber a ação de sobrecargas

significativas, como aquelas associadas à estocagem de granéis ou à atuação de

pontes rolantes e guindastes, TENG (1962) aponta para o uso vantajoso das cortinas

com plataforma de alívio (Figura 2-2g). Essas cortinas também utilizam as estacas-

prancha, entretanto reduzem o empuxo lateral ao transferir a sobrecarga de

retroárea para solo de fundação por meio de estacas. Vale ressaltar que

equipamentos como guindastes e pontes rolantes obrigam a restrição das

deformações na massa de solo a ser contida, motivo pelo qual deve-se considerar a

recomendação acima.

Tipicamente, cortinas em balanço não devem ser utilizadas para alturas

maiores que 4 metros, sendo que a partir de então e até alturas de cerca de 10 ou 12

metros, o uso de cortinas com um nível de ancoragem é mais econômico. Estruturas

mais altas ou sujeitas à ação de sobrecargas excessivas devem ser projetadas com

múltiplos níveis de ancoragem (Figura 2-2h) ou utilizando plataformas de alívio

(CORNFIELD, 1975; TENG, 1962).

No Brasil, além das estruturas à beira-mar, a utilização de estacas-prancha

em obras de contenção on-shore vem ganhando destaque no mercado, juntamente

com a crescente demanda de execução obras de subsolos e galerias nos centros

urbanos, que favorecem o emprego de paredes-diafragma. Isso faz com que projetos

de cortinas flexíveis sejam cada vez mais comuns e competitivos.

Page 23: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

5

(a) (b) (c)

(d) (e)

(f) (g)

(h)

Figura 2-2: Estruturas típicas de estacas-prancha: a) cortina em balanço; b) cortina

ancorada; c) píer; d) dique seco; e) cortina ancorada com estaca de tração; f) cortina

ancorada com cavalete de estacas; g) cortina com plataforma de alívio e h) escavação

com escoramento (adaptado de BOWLES, 1977; DISMUKE, 1991)

Page 24: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

6

2.1 MATERIAIS E SEÇÕES

Diferentemente das estruturas de contenção de gravidade, as cortinas de

estacas-prancha têm esbeltez marcante e são comumente referidas como cortinas

flexíveis. Sua seção, portanto, deve estar apta a resistir os esforços de flexão

oriundos do empuxo lateral de terra. Em ordem crescente de utilização, tem-se

como materiais para a execução dessas cortinas:

a) Madeira. A aplicação mais tradicional encontra-se nas escavações

escoradas e estruturas de contenção temporárias de pequeno porte.

Tem como principal desvantagem a deterioração por ação de

xilófagos, demandando tratamento preservativo (ainda assim com

vida-útil relativamente curta), e por isso utilizada em obras

temporárias. Outro aspecto desfavorável para a utilização de estacas-

prancha de madeira é a destruição dos elementos durante a sua

cravação, principalmente em solos granulares mais resistentes

(BOWLES, 1977);

b) Concreto Armado ou Protendido. Sua principal desvantagem

encontra-se no grande peso e volume das estacas-prancha, resultando

tanto em dificuldades de movimentação no canteiro de obras quanto

em alta resistência de cravação, exigindo, portanto, equipamentos

robustos para o seu manuseio. Por outro lado, se possível a execução

no canteiro ou nas suas proximidades, tem-se vantagem econômica

dos elementos da cortina, em comparação aos de aço, por exemplo.

TSCHEBOTARIOFF (1962) recomenda o uso de concreto protendido

em situações nas quais se comprometa a durabilidade da cortina em

função da fissuração do concreto, mas alerta para a sua reduzida

viabilidade econômica em função da inversão dos momentos fletores

acima e abaixo da cota de dragagem (caso em que a cortina trabalha

com apoio fixo);

Page 25: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

7

c) Aço. Sem dúvida é o material mais desejado para as cortinas de

estacas-prancha, dadas as suas vantagens de maior relação

resistência-peso, menor resistência de cravação, flexibilidade de

arranjo de seções, tratamentos anticorrosivos mais convencionais,

possibilidade de reutilização de perfis e facilidade de ajuste no

comprimento da estaca-prancha sem perda de material (BOWLES,

1977).

Seções típicas de estacas-prancha de madeira e de concreto armado são

mostradas na Figura 2-3.

Figura 2-3: Seções típicas de estacas-pranchas de madeira e concreto: a) pranchas de

madeira justapostas; b) pranchas de madeira unidas com grampos de aço; c) pranchas

sobrepostas de madeira com junção tipo macho e fêmea; d) visão geral de estaca-

prancha de concreto armado; e) seção em concreto com juntas vedadas em graute e f)

seção em concreto com juntas do tipo macho e fêmea (adaptado de CLAYTON et al.,

2013)

A Figura 2-4 apresenta algumas seções comuns de estacas-prancha de aço

disponibilizadas pela fabricante Arcelor Mittal (ARCELOR MITTAL, 2010).

Page 26: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

8

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 2-4: Seções comuns de estacas-pranchas metálicas: a) Perfil Z simples e

combinado; b) Perfil U simples e combinado; c) Perfis AS (seção plana) e d) Parede

combinada de perfis Z e I (soldier wall) (adaptado de ARCELOR MITTAL, 2010)

2.2 FORMAS DE COLAPSO

Os modos de ruptura, também denominados estados limites últimos,

convencionais para as cortinas flexíveis são (veja-se a Figura 2-5):

a) Ruptura profunda ou generalizada da massa de solo;

b) Ruptura rotacional por insuficiência de ficha da estaca;

c) Plastificação da seção da cortina por ação de momentos fletores e

d) Ruptura do sistema de ancoragem.

Page 27: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

9

Figura 2-5: Modos convencionais de ruptura das cortinas ancoradas – a) ruptura global,

b) ruptura passiva (toe kick-out), c) plastificação da seção, d), e) e f) ruptura do sistema

de ancoragem (adaptado de USACE, 1994)

Page 28: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

10

A ruptura generalizada é caracterizada por um movimento rotacional

englobando toda a massa de solo na qual está contida a estrutura (Figura 2-5a), não

sendo passível de ser remediada simplesmente pelo acréscimo de ficha ou pelo

reposicionamento das ancoragens e carecendo de análise de estabilidade via

métodos convencionais de estabilidade de taludes (USACE, 1994). Alguns

condicionantes geotécnicos podem favorecer a ocorrência desse tipo de colapso,

como é o caso da existência de camadas de solo mole abaixo da ficha.

Pressões laterais exercidas pelo solo e pela água podem provocar rotação de

corpo rígido da estrutura (em torno da região do pé, nas cortinas em balanço, ou do

nível da ancoragem, nas cortinas ancoradas – Figura 2-5b), sendo este modo

passível de prevenção por meio do dimensionamento adequado do comprimento da

ficha levando em conta a possiblidade de ocorrência de erosão (por efeito de

correntes ou de propulsores de embarcações) ou de dragagem excessiva na

execução da cortina.

Caso os momentos fletores atuantes na cortina excedam a capacidade

resistente da mesma, tem-se a formação de rótula plástica na seção (Figura 2-5c).

Este modo de ruptura está associado a uma grande deformação da cortina com

comprometimento da funcionalidade das instalações associadas à contenção

(retroárea), todavia não necessariamente com uma ruptura catastrófica.

Quanto à ruptura do sistema de ancoragem, esta pode se dar com a ruptura

do solo na região de ancoragem por insuficiência de resistência passiva (Figura 2-

5d) e pela falha estrutural dos componentes do sistema – tirantes ou ligações –

(Figura 2-5ef).

Autores como TSCHEBOTARIOFF (1962), TERZAGHI (1954),

CORNFIELD (1975) e TSINKER (1983) testemunham que a maioria das falhas

estruturais nas cortinas de estacas-prancha é dos tipos b e d.

CORNFIELD (1975) também inclui como modo de ruptura de cortinas

ancoradas o recalque excessivo do solo na região de retroárea, por adensamento do

aterro ou de camadas argilosas abaixo dele. Esse recalque pode acarretar na falha

do sistema de ancoragem e/ou atuação de empuxo vertical na cortina. Já TORRES

(2014), apresenta mais alguns modos de colapso geotécnico como o deslizamento

conjunto da estrutura (cortina mais ancoragem), a erosão interna do solo (piping) e

a insuficiência de capacidade de carga da estaca à compressão mediante a ação de

sobrecargas na retroárea (pontes rolantes ou guindastes, por exemplo).

Page 29: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

11

2.3 PROJETO DE CORTINAS

Segundo TENG (1962), o projeto de cortinas de estacas-prancha geralmente

é procedido na seguinte sequência:

a) Juntada de informações gerais, incluindo topografia, dimensões da

obra e informações sobre o regime de águas;

b) Análise das condições do subsolo, com investigação geotécnica,

estudo das características do solo de aterro e realização de ensaios

tantos quantos necessários;

c) Seleção do tipo de cortina, com base nos critérios de uso e nas

informações preliminares;

d) Cômputo dos empuxos de terra e das sobrecargas;

e) Determinação da penetração das estacas no solo;

f) Determinação das solicitações de flexão e dimensionamento da seção

da cortina;

g) Dimensionamento dos tirantes e

h) Dimensionamento das ancoragens.

Para uma leitura mais aprofundada a respeito do projeto de cortinas de

estacas-prancha, remete-se o leitor aos trabalhos de TSINKER (1997), CLAYTON

et al. (2013) e ARCELOR MITTAL (2016).

2.4 SISTEMA DE ANCORAGEM

Os sistemas tradicionais de ancoragem das cortinas flexíveis utilizam, como

elementos de transferência de esforço para o solo, blocos ou vigas moldados in loco

e embutidos no solo, estacas convencionais cravadas solicitadas à tração ou por

esforço lateral, ancoragem em estruturas existentes, lajes de atrito e linhas de

estacas-pranchas, sendo estas últimas bastante populares (veja-se as Figuras 2-2).

Alguns aspectos importantes do projeto do sistema de ancoragem são discutidos a

seguir.

O posicionamento dos elementos de ancoragem é de suma importância.

Esses elementos precisam ser alocados suficientemente afastados da cortina tanto

para a garantia da sua própria capacidade de carga, como para a manutenção da

estabilidade global da estrutura (Figuras 2-6).

Page 30: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

12

Figura 2-6: Posicionamento dos elementos de ancoragem: a) diagramas para a

estimativa da capacidade de carga e b) afastamento da região de instabilidade (adaptado

de CLAYTON et al., 2013)

Em caso de disponibilidade limitada de espaço, o projetista deve checar a

estabilidade da construção levando em conta as dimensões reduzidas do sistema,

bem como ponderar a resistência da ancoragem. TERZAGHI (1943) sugere que a

resistência da região sobreposta à cunha ativa (Figura 2-7) seja desconsiderada no

cômputo de Fa (Figura 2-6a). Nesse sentido, as ferramentas computacionais

fornecem hoje uma grande facilidade no estudo da estabilidade de contenções, pois

possibilitam a modelagem dos elementos de ancoragem e da sua interação com o

restante da estrutura.

Page 31: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

13

Figura 2-7: Redução da capacidade da ancoragem sugerida por Terzaghi (adaptado de

CLAYTON et al., 2013)

Dentre os aspectos construtivos, alguns deles são relevantes para a segurança

do sistema de ancoragem. Por exemplo, TSINKER (1983) sugere que os cabos de

ancoragem sejam instalados com uma contra-flecha e envolvidos por algum

dispositivo de proteção contra a movimentação vertical decorrente dos recalques do

solo contido. Além disso, o adequado tensionamento dos cabos após a execução da

estrutura assegura proteção contra as deformações decorrentes da acomodação do

sistema (TSINKER, 1997).

Além do dimensionamento adequado das ancoragens, é importante que o

projetista seja criterioso no cálculo das solicitações provenientes da cortina.

Primeiro porque a própria deslocabilidade do sistema de ancoragem é fator

determinante nos esforços, e as teorias clássicas de cálculo de cortinas não prevêem

essa interação. Em segundo lugar, como destacam CLAYTON et al. (2013), o

cálculo deve considerar a ocorrência de excepcionalidades, como a aplicação de

sobrecargas não previstas, a deformação desigual das ancoragens conduzindo à

redistribuição dos esforços para os elementos do entorno e as consequências

potencialmente catastróficas da ruptura de uma ancoragem.

Remete-se o leitor aos textos de CORNFIELD (1975) e US STEEL (1984)

para mais detalhes acerca do projeto dos sistemas de ancoragem.

Page 32: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

14

3 REVISÃO DOS MÉTODOS DE ANÁLISE

Os métodos de análise empregados no projeto de cortinas de estacas-prancha

são os Métodos Clássicos, os Métodos Empíricos e os Métodos Numéricos. Os

Métodos Empíricos precederam os Métodos Clássicos, mas estes acabaram por se

tornar mais populares pela sua maior racionalidade e pela credibilidade das teorias

de empuxo de terra clássicas. Os Métodos Numéricos são os mais recentes, mas

ganham cada vez mais popularidade pela facilidade de acesso às ferramentas

computacionais nos últimos anos.

Na prática, geralmente lança-se mão de um ou mais Métodos Clássicos na

fase preliminar de projeto e depois se faz extensa utilização de algum Método

Numérico.

3.1 MÉTODOS CLÁSSICOS

Denominam-se Métodos Clássicos de análise de cortinas aqueles que fazem

uso das teorias clássicas da Mecânica dos Solos para a determinação do empuxo de

terras (e.g. Rankine e Coulomb) e das solicitações na estrutura. Segundo

DANZIGER (2014), esses métodos são aplicáveis às cortinas em balanço e às

cortinas com um nível de ancoragem, sendo que, para estruturas com mais níveis de

ancoragem, deve-se recorrer aos métodos baseados em instrumentação. Os Métodos

Clássicos podem ser divididos como mostrado na Figura 3-1.

Figura 3-1: Classificação dos Métodos Clássicos

Alguns exemplos de métodos empíricos para o cálculo de cortinas multi-

apoiadas citados na literatura são os de PECK (1943), TSCHEBOTARIOFF (1951)

e PECK (1969). Não sendo eles objetos desta pesquisa, remete-se o leitor às

referências indicadas para estudo aprofundado.

Page 33: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

15

3.1.1 Fator de Segurança

O emprego do Fator de Segurança Global (FS) no cálculo das estruturas de

contenção tem sofrido consideráveis mudanças nas últimas décadas, especialmente

na Europa, onde há uma ascensão da preferência pelos Fatores de Segurança

Parciais desde a sua adoção pelo Eurocode 7, em 2004. Vale lembrar que, apesar

dessa abordagem ter sido adotada mais rapidamente pela engenharia estrutural, foi

na verdade um engenheiro geotécnico quem a desenvolveu: BRINCH-HANSEN

(1965). Entretanto, continua sendo largamente praticado o uso de fator de segurança

único, especialmente no Brasil. Apresenta-se a seguir um resumo das definições

tradicionais de Fator de Segurança utilizadas no cálculo clássico de cortinas

flexíveis, a maioria das quais comentada mais profundamente por CLAYTON e

MILITITSKY (1986) e também CLAYTON et al. (2013):

a) Fator de segurança sobre os coeficientes de empuxo passivo. Consiste

simplesmente em reduzir os coeficientes de empuxo passivo via um fator

de segurança arbitrário:

FS

KK

p

mp , (3-1)

Em geral, os autores recomendam uma faixa de 1,2 - 2,0 para o valor de

FS, além disso, geralmente associa-se um fator de segurança a um

acréscimo da ficha da cortina (e.g. FS = 2 com um acréscimo de 40% na

ficha), entretanto essa correlação deve ser verificada a partir do método

utilizado no cálculo;

b) Fator de segurança sobre os parâmetros efetivos de resistência da

região passiva. De acordo com esta definição, o empuxo passivo é

calculado a partir de uma redução nos parâmetros de resistência dessa

zona:

FS

tgtg m

''

(3-2)

FS

tgtg m

''

(3-3)

FS

cc m

''

(3-4)

Page 34: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

16

Os valores indicados aqui são da mesma ordem de grandeza anterior (1,2

– 2,0), mas não refletem a mesma proporção;

c) Fator de segurança sobre o valor bruto do empuxo em termos de tensões

totais. Apesar de não recomendado, os autores relatam que o seu uso já

foi muito extenso no Reino Unido sem aparente prejuízo;

d) Fator de segurança sobre todos os parâmetros efetivos de resistência.

Fazendo-se uso das Equações 3-2 a 3-4, determinam-se todos os

empuxos incidentes sobre a estrutura. Esta definição, no entanto, não é

usual porque não se costuma aplicar o fator de segurança na região ativa,

em virtude da diferença entre os níveis de deformação necessários para

se atingir os estados limites passivo e ativo;

e) Margem de segurança em forma de aumento na ficha. Este é um método

bastante simples, que consiste na multiplicação da ficha calculada por

um fator FD. Esse fator não é o fator de segurança em si, mas pode ser

relacionado com o mesmo a depender do método de cálculo adotado

(seção 3.1.3). Por exemplo, alguns autores recomendam que se utilize FD

= 1,2 – 1,4, correspondendo a um fator FS de 1,5 a 2,0 (TENG, 1962;

CORNFIELD, 1975). Entretanto essa relação está mais próxima de FS =

1,3 a 1,7 considerando-se a definição da alínea a (TSCHEBOTARIOFF,

1973; BOWLES, 1977).

f) Fator de segurança sobre a área do diagrama bruto de empuxo passivo

em termos de tensões efetivas. Este conceito recai na definição da alínea

a se o método em questão estiver utilizando um diagrama de empuxo

triangular na região passiva. Entretanto, quando o caso envolve outro

tipo de distribuição, usa-se considerar o FS como a relação entre a área

mobilizada do diagrama, geralmente trapezoidal, e a área máxima

possível – definida pelo coeficiente de empuxo Kp – que é triangular.

Page 35: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

17

g) Fatores de segurança parciais. Esses fatores são utilizados para ponderar

concomitantemente as solicitações e as resistências a partir de valores

característicos. As solicitações são majoradas com base na sua natureza

(se permanente, variável, de vento etc.), na sua probabilidade de

ocorrência simultaneamente a outros carregamentos numa combinação e

no seu efeito (se adverso ou favorável). Já as resistências são minoradas

em função da sua variabilidade e incerteza de determinação, e também

em função do estado limite em questão (se último ou de serviço).

Um aspecto interessante a respeito dos Coeficientes de Segurança Parciais

(como são chamados frequentemente no Brasil), é que, apesar de serem derivados

de estudos probabilísticos e estarem associados a probabilidades de ocorrência, não

permitem, em geral, determinar a probabilidade de ruína de uma estrutura. Daí

denomina-se esse método de inserção da segurança como semi-probabilista.

A grande questão é se definir o fator de segurança da estrutura em termos de

empuxo passivo reflete as condições reais de segurança da estrutura. BOWLES

(1977) argumenta que outras definições poderiam ser consideradas, como o

acréscimo do carregamento da estrutura (por meio de um acréscimo no peso

específico do solo) ou a perda no embutimento da cortina (por erosão ou excesso de

dragagem). No entanto, os métodos acima citados já são consagrados na engenharia

e, em geral, produzem resultados satisfatórios.

3.1.2 Análise de Cortinas em Balanço

Cortinas em balanço são calculadas baseando-se na consideração de uma

distribuição de tensões simplificada, a partir da linha elástica assumida, conforme

mostra a Figura 3-2a, para o caso de solo granular homogêneo. Este método é

atribuído a BLUM (1931), no mesmo trabalho em que apresenta o Método do Apoio

Fixo, que será comentado adiante. Blum também apresenta, ainda nesse mesmo

trabalho, uma simplificação na distribuição de tensões laterais na cortina em

balanço que equivale ao método apresentado por CORNFIELD (1975).

A estabilidade da estrutura depende inteiramente da resistência passiva do

solo na região da ficha, sendo exigido, portanto, um comprimento considerável para

a mesma, e tanto maior quanto menos resistente for o solo. Vale ressaltar que o

diagrama de empuxo da Figura 3-2c é um diagrama líquido, isto é, representando o

somatório dos empuxos ativo e passivo atuantes na cortina.

Page 36: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

18

(a) (b) (c)

Figura 3-2: a) Linha elástica assumida para o cálculo da cortina em balanço; b)

Diagrama de empuxo simplificado e c) Diagrama líquido de empuxo para cálculo

prático (adaptado de BOWLES, 1977)

Analisando-se o equilíbrio de forças e momentos na cortina, chega-se a uma

equação, para a ficha D, do tipo:

043

2

2

3

1

4 CDCDCDCD (3-5)

onde os coeficientes Ci são derivados da geometria do problema e das propriedades

do solo. A Equação 3-5 é resolvida por tentativa e erro, geralmente. BOWLES

(1977) recomenda que se inicie o processo de solução com 0,75H’ (75% da altura

acima da cota de dragagem), já que a ficha requerida geralmente se situa entre este

valor e o valor de H’.

Note-se que, para o equilíbrio de momentos, faz-se necessária a mobilização

do contra-passivo (R’p), decorrente da hipótese de que a estrutura se movimenta

como um corpo rígido, girando em torno do ponto b. No caso das estruturas reais, a

depender da flexibilidade, o contra-passivo pode sequer ser mobilizado, o que pode

ser explicado por meio da subida da resultante passiva e, ao mesmo tempo, a

descida da resultante ativa, conforme demonstra a Figura 3-3. O equilíbrio de

momentos, entretanto, deve ser preservado por meio da coincidência das resultantes

de empuxo ativo e passivo.

Page 37: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

19

Figura 3-3: Linha elástica real e distribuição real de empuxo na cortina em balanço com

restrição completa do pé

Apesar de as cortinas em balanço não serem objeto deste trabalho, o

entendimento da sua estabilidade é útil na compreensão dos demais Métodos

Clássicos. Sugere-se, para mais detalhes, que o leitor recorra aos textos de

BOWLES (1977), TENG (1962) ou, para um método mais expedito, CORNFIELD

(1975).

3.1.3 Método do Apoio Livre (Free Earth Support)

O método clássico do Apoio Livre admite não haver uma restrição à rotação

da cortina em seu pé, isto é, a profundidade da ficha não é suficiente para restringir

efetivamente a cortina a ponto de produzir momentos fletores negativos na mesma

(TSCHEBOTARIOFF, 1962). A sua estabilidade é derivada da resistência passiva

do solo à frente da cortina e da resultante da ancoragem, funcionando como uma

viga bi-apoiada e sendo, portanto, uma estrutura isostática. De maneira geral, as

cortinas calculadas pelo MAL estão sujeitas a momentos fletores maiores e

necessitam de fichas menores que aquelas calculadas pelo MAL.

Atribui-se ao alemão Hanz Detlef Krey a primeira aplicação das teorias

clássicas de empuxo de terra à análise das cortinas ancoradas, dando origem ao

Método do Apoio Livre. SEED e MITCHELL (1968) datam a sua publicação do

ano de 1906. TERZAGHI (1954) e ONER (1997), entretanto, apontam o ano de

1910.

TENG (1962) aponta as seguintes hipóteses assumidas no MAL:

a) A cortina é perfeitamente rígida se comparada ao solo;

b) O empuxo lateral atuante pode ser computado pelas teorias de

Rankine ou Coulomb e

Page 38: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

20

c) A cortina é livre para girar, mas não pode se deslocar no nível da

ancoragem, sendo que a ruptura se dá por rotação em torno desse

ponto.

A Figura 3-4 apresenta uma cortina ancorada de dimensões genéricas

inserida em um solo granular, bem como o diagrama de momentos fletores na

mesma.

(a) (b) (c)

Figura 3-4: Análise de cortina ancorada pelo Método do Apoio Livre – a) estrutura e

linha elástica assumida, b) diagrama de empuxo lateral e c) diagrama de momentos

fletores

O cálculo do embutimento no solo (ficha) é feito meio da solução de uma

equação de terceiro grau para a ficha D:

032

2

1

3 CDCDCD (3-6)

Note-se que a distribuição de empuxo lateral mostrada na Figura 3-4b

corresponde aos estados ativo e passivo do solo. Entretanto, sabe-se que esses

estados são atingidos com níveis de deformações diferentes do solo, sendo o estado

passivo atingido com deformações muito maiores que aquelas necessárias para se

atingir o estado ativo. Adicione-se a isso a introdução de um FS à estrutura, nos

termos das definições apresentadas na seção 3.1.1. Assim, existem algumas

variações dento do Método do Apoio Livre que, apesar de terem em comum as

hipóteses de cálculo, diferem no diagrama de empuxo e na definição de FS

adotados. Apresentam-se algumas dessas variações a seguir.

Page 39: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

21

3.1.3.1 Método do Apoio Livre – Variação 1

Esta variação do MAL é a mais comum em utilização e apresenta a maior

praticidade de cálculo. Ela consiste na adoção da distribuição triangular de tensões

e na definição do fator de segurança como a relação entre a área do diagrama

passivo disponível e a área mobilizada para o equilíbrio da cortina (Figura 3-5):

acd

abd

A

AFS

(3-7)

Como os diagramas passivos (disponível e mobilizado) são semelhantes,

temos que a relação dada pela Equação 3-7 recai na relação apresentada na alínea a

do item 3.1.1, isto é, o FS é numericamente igual à razão entre o coeficiente de

empuxo passivo disponível e o coeficiente de empuxo passivo mobilizado para o

equilíbrio da estrutura.

Figura 3-5: Variação mais conhecida do MAL

Apesar da preferência que se dá a esta variação do MAL, sabe-se que o

diagrama de empuxo passivo de uma estrutura projetada para atuar com margem

usual de segurança está mais próximo da forma trapezoidal. A maioria da literatura,

entretanto, indica esta variação pela simplicidade dos cálculos, e ela será utilizada

neste trabalho, exceto quando for indicado o contrário.

Page 40: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

22

3.1.3.2 Método do Apoio Livre – Variação 2

Esta variação é muito parecida com a anterior e também é bastante adotada

na prática, mas carece de esclarecimentos a respeito do FS. Adota-se também um

diagrama triangular de tensões, mas neste caso a segurança da estrutura é dada por

um acréscimo na ficha t (Figura 3-6).

Figura 3-6: Variação 2 do MAL

Neste caso, a ficha é inicialmente calculada com Kp sem redução e depois

multiplica-se a mesma por um valor (geralmente 1,4). Se igualarmos as áreas abc e

aef,

aefabc AA

mpp KDKt ,

22

2

1

2

1

mpp KDKt ,

22

e considerarmos que o FS é igual à relação entre os coeficientes de empuxo, então

2

2

, t

D

K

KFS

mp

p (3-8)

e para um FS de 2, obtém-se D 1,4t como se faz costumeiramente.

Page 41: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

23

No entanto o acréscimo de ficha acompanha um acréscimo da área cdgf na

região ativa da cortina, assim, o fator de segurança é, na verdade, menor que o dado

pela Equação 3-8, e pode ser melhor expresso pela seguinte equação (ver dedução

no Anexo 1):

)'2)((2

2

tDHtDKKt

DKFS

ap

p

(3-9)

A Equação 3-9 apresenta resultados condizentes com a observação de

TSCHEBOTARIOFF (1973).

3.1.3.3 Método do Apoio Livre – Variação 3

Esta variação foi proposta por TERZAGHI (1943) e tem como principal

característica a utilização de um diagrama trapezoidal na região passiva da cortina

(Figura 3-7). É verdade que essa distribuição de empuxo passivo é muito mais

próxima da realidade que a distribuição triangular, especialmente em regime de

trabalho da estrutura. Por outro lado, os cálculos tornam-se mais complicados e

trabalhosos.

Figura 3-7: Método do apoio livre proposto por TERZAGHI (1943)

Page 42: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

24

Deve-se satisfazer, neste caso, tanto o equilíbrio de forças horizontais,

quanto o equilíbrio de forças verticais (incluindo-se o peso da cortina e eventuais

carregamentos axiais) e de momentos. O fato de se incluir as resultantes de forças

de atrito Ta e Tp, implica no uso necessário da teoria clássica de Coulomb.

Note-se que, nesta variação, o FS já não é mais dado como a relação entre o

coeficiente de empuxo passivo limite e o coeficiente de empuxo passivo

mobilizado, mas sim a relação entre as áreas ace e abde, que é a definição dada pela

alínea f do item 3.1.1. Pode-se deduzir do equilíbrio de forças horizontais e

momentos que

FSDt

111'

(3-10)

Esta variação do MAL não é tão popular, e apresenta uma dificuldade maior

na hora de se equacionar a ficha D na forma da Equação 3-6, daí a sua pouca

utilização na prática.

3.1.3.4 Método do Apoio Livre – Variação 4

Proposta por ROWE (1952), esta variação é ainda menos difundida e tem a

única importância no fato de que os ensaios realizados pelo referido autor serão

estudados numericamente neste trabalho (Figura 3-8).

Figura 3-8: Método do apoio livre segundo ROWE (1952)

Page 43: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

25

A diferença fundamental desta variação para a proposta de TERZAGHI

(1943) consiste na hipótese de que há uma força horizontal atuante no pé da cortina ,

Ts (toe shear), advinda da reação do solo ao deslocamento do pé da cortina. Ts é

dada pela seguinte equação:

FS

WPPT pas

tantan (3-11)

Onde δ é o ângulo de atrito solo-cortina, adotado frequentemente como 2ϕ/3

e W é o peso da cortina.

Além disso, a resultante R é igual à soma da resultante de empuxo passivo,

Pp, e da força Ts, agindo a hipoteticamente a D/3 acima do pé da cortina. ROWE

(1952) recomenda que se utilize um FS = 1,5, isto é, que a área do diagrama

disponível ace seja 1,5 vezes maior que a área do diagrama mobilizado abde.

GIBBONS e JASPER (1954) atribuem a existência da força Ts identificada

por Rowe nos seus modelos ao pequeno espaçamento entre o pé da cortina e o

fundo da caixa de areia (3 polegadas). É mais provável que as cortinas reais não

desenvolvam esse tipo de apoio adicional, justificando a não adoção do sistema de

forças indicado pelo método.

3.1.4 Métodos de Apoio Fixo (Fixed Earth Support)

Os métodos de apoio fixo (MAL) diferem dos MAL porque baseiam-se na

hipótese da completa fixação da cortina na sua extremidade inferior. Isto implica,

necessariamente na inversão dos momentos fletores em certo ponto da estrutura,

resultando na escolha de uma seção mais econômica. CORNFIELD (1975)

recomenda o uso do MAL em detrimento do MAL, com exceção de casos

particulares em que o subsolo provoque a existência de uma condição de apoio

livre. Na sequência, algumas variações do MAL são apresentadas.

3.1.4.1 Método da linha elástica

BLUM (1931) propôs um método de cálculo de cortinas ancoradas que

introduziu as hipóteses básicas do MAL. Porém o processo de cálculo pioneiro é

muito laborioso e não costuma ser utilizado na prática. A Figura 3-9a apresenta

uma cortina ancorada e a sua linha elástica assumida, que intercepta o eixo vertical

no ponto de ancoragem e o tangencia no ponto t. Outra hipótese introduzida pelo

autor do método consiste na atuação de um contra-passivo RD que atua também no

ponto t.

Page 44: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

26

O cálculo pelo método da linha elástica consiste em partir de um

comprimento de ficha arbitrário e utilizar o diagrama líquido de empuxo para obter,

por sucessivas modificações desse comprimento, uma linha elástica que atenda às

três condições de contorno, isto é, rotação e deslocamento nulos no ponto t e

deslocamento nulo no ponto de ancoragem. Para uma descrição em detalhe desse

método, remete-se o leitor para o texto clássico de TERZAGHI (1943).

Figura 3-9: Diagramas para o cálculo segundo o MAF (TSCHEBOTARIOFF, 1962)

Apesar das dificuldades com esse método, BLUM (1931) propôs uma

simplificação que tornou o MAL muito mais atrativo, que é a idealização da cortina

como uma viga equivalente simplesmente apoiada no ponto de ancoragem e no

ponto de inflexão c.

3.1.4.2 Método da viga equivalente

Por meio de cálculos manuais, BLUM (1931) determinou uma relação

(Figura 3-9e) entre a profundidade do ponto de inflexão c e o ângulo de atrito do

solo (representado pelo coeficiente de empuxo Ka). Dessa forma, o cálculo pode ser

simplificado ao se considerar a estrutura como sendo uma viga rotulada no ponto c

(Figuras 3-9c e d).

Page 45: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

27

GIBBONS e JASPER (1954), no entanto, advertem que a relação

apresentada pelo autor do método baseou-se na utilização de Kp = 2/Ka, com base

nos resultados de observações de outro autor. TSCHEBOTARIOFF (1962) afirma

que a relação proposta não pode ser sempre verificada e propõe um método ainda

mais simplificado, baseado nas suas observações em 1949, no qual se assume que a

rótula da viga equivalente encontra-se na linha de dragagem (Figura 3-10).

Figura 3-10: Método simplificado da viga equivalente (TSCHEBOTARIOFF, 1962)

Apesar da aparente superioridade do MAL sobre o MAL, desde o trabalho de

ROWE (1952) não se vê mais tanta vantagem em se utilizar o primeiro, por ter sido

demonstrada possível a obtenção de momentos fletores menores que os

determinados segundo as teorias clássicas, bem como de margem de segurança

satisfatória contra a ruptura passiva (TERZAGHI, 1954).

3.2 MÉTODOS EMPÍRICOS E CONTRIBUIÇÕES ACERCA DA INTERAÇÃO

SOLO-ESTRUTURA

Ao longo do século XX, diversos autores contribuíram significativamente

para a compreensão da interação solo-estrutura nas cortinas flexíveis. A grande

maioria das contribuições até a década de 70 era baseada em experimentos com

modelos reduzidos e em observações de estruturas reais. Depois do advento da

tecnologia da computação e com a introdução de métodos numéricos como o

Método de Elementos Finitos, ainda outro grande número de autores se propôs a

investigar o problema, porém por meio de simulações.

Page 46: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

28

Nos próximos itens serão discutidas algumas das principais contribuições

para o entendimento do comportamento das cortinas flexíveis, sendo elas propostas

por meio de observações experimentais ou simuladas.

3.2.1 Caso de Aalborg (Dinamarca)

Até meados da primeira década do século XX, os projetistas de cortinas de

cais calculavam as suas estruturas a partir de regras com base puramente empírica.

A seguinte frase, proferida por um professor dinamarquês em 1898, ilustra bem essa

prática: “[...] cortinas de cais nunca são calculadas na prática, mas são projetadas

de acordo com regras estabelecidas” (TSCHEBOTARIOFF, 1951, P. 500). Até

então as teorias clássicas de empuxo de terra não haviam sido aplicadas neste tipo

de problema, panorama que mudaria rapidamente logo a seguir.

Quando surgiram os primeiros métodos clássicos, os engenheiros que faziam

uso das regras empíricas verificaram, por meio de cálculos com base nesses novos

métodos, que as cortinas existentes deveriam estar submetidas a tensões 3 a 4 vezes

maiores que as tensões admissíveis para as quais haviam sido projetadas. A redução

dos momentos fletores nessas estruturas foi explicada em termos de desvio da

distribuição teórica de empuxo de terra.

TSCHEBOTARIOFF (1951) assinala que a ocorrência de fatores de

segurança menores que os usuais, ainda assim com garantia de estabilidade da

estrutura, aparentou não ter sido cogitada como possível explicação para a

observação de tensões menores que as esperadas nas cortinas. Segundo ele, esta

possibilidade não poderia ser completamente descartada, visto que altos fatores de

segurança eram utilizados para a determinação das tensões admissíveis nas

estruturas de madeira da época, tanto que essa diferença encontrada nas medições

realizadas ainda significaria uma pequena margem real de segurança, suficiente

para a garantia da estabilidade da estrutura.

Page 47: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

29

Em 1906, engenheiros dinamarqueses da empresa Christiani & Nielsen, com

o objetivo de verificar o fenômeno de desvio dos valores esperados de empuxo

lateral, construíram um píer em concreto armado na cidade de Aalborg. Eles

utilizaram, para esse material, a mesma relação entre tensões calculadas e tensões

medidas nas cortinas executadas em madeira, isto é, entre 3 e 4. O ousado

experimento foi levado a cabo e, curiosamente, o píer em Aalborg permaneceu por

mais de meio século (BRINCH-HANSEN, 1953; TSCHEBOTARIOFF, 1951) em

condições satisfatórias de serviço. Detalhes do referido píer são mostrados na

Figura 3-11:

Figura 3-11: Detalhes do píer de Aalborg, Dinamarca (TSCHEBOTARIOFF, 1951)

Esse experimento possibilitou a entrada do concreto armado e do aço na

prática usual de projetos de cortinas de cais. A própria Christiani & Nielsen

desenvolveu um tipo de cortina a partir do protótipo de Aalborg, denominado C&N-

wharf, mais competitivo que o correspondente em madeira (BRINCH-HANSEN,

1953).

Page 48: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

30

Posteriormente ao experimento de Christiani e Nielsen, outros engenheiros

dinamarqueses sugeriram o tratamento do problema por meio da adoção de uma

distribuição alternativa de empuxo de terra, mais tarde publicada nas chamadas

Regras Dinamarquesas.

É interessante notar que um estudo semelhante foi realizado na Alemanha

por EHLERS (1910 apud TSCHEBOTARIOFF, 1951) que, ao verificar alguns

píeres na cidade de Hamburgo, sugeriu que o alívio de empuxo de terra fosse

oriundo do efeito de arqueamento do solo, explicação que foi adotada

indiscriminadamente nas Regras Dinamarquesas, conforme demonstraram os

trabalhos posteriores de ROWE (1952) e TSCHEBOTARIOFF (1949).

YAROPOLSKI (1935 apud TSINKER, 1997) também realizou um

experimento semelhante ao de Aalborg, construindo uma cortina ancorada, em

madeira, com 14 m de extensão e 4,59 m de altura, de acordo com a teoria clássica

de Coulomb. Sua intenção era levar a estrutura à ruptura por meio da aplicação de

uma sobrecarga de 400 kN/m². No entanto a mesma suportou ao carregamento

aplicado sem aparente dano. O pesquisador concluiu que o atrito entre a cortina e

solo de aterro era o principal responsável pela redução da solicitação esperada na

cortina.

3.2.2 Recomendações da Sociedade Dinamarquesa de Engenheiros Civis

Mais tarde, com base nas observações de Christiani e Nielsen e também no

trabalho de STROYER (1935) que explicava a redução de momentos em função do

arqueamento vertical do solo, a Sociedade Dinamarquesa de Engenheiros Civis

propôs uma distribuição de tensões modificada para o cálculo das cortinas,

conforme a Figura 3-12.

Page 49: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

31

Figura 3-12: Diagrama de tensões modificado segundo a Sociedade Dinamarquesa de

Engenheiros Civis (TSINKER, 1997)

Na Figura 3-12, q é dado pelo seguinte expressão:

mpLL

LLkq

)/'10(5

)/'10(4

(3-12)

onde L’ e L são definidos na figura, pm é o valor médio do empuxo ativo ao longo

do vão L e k é dado por:

9,08,0),,,,( WEMfk (3-13)

sendo M o momento fletor na cortina, E o módulo de deformação do solo, ϕ o

ângulo de atrito no repouso, W o módulo elástico da seção e σ a tensão admissível

para o material da cortina.

O procedimento de cálculo segundo esta proposta é o seguinte. Calcula-se o

comprimento da ficha utilizando-se os diagramas de empuxo convencionais. Então

aplica-se uma margem de segurança para a ficha por meio de um fator (tipicamente

√2) e calcula-se o momento fletor máximo por meio do diagrama modificado

(Figura 3-12). Vale ressaltar que este método, por meio do fator k (Equação 3-13),

foi o primeiro a introduzir na análise de cortinas a consideração da flexibilidade da

mesma.

Page 50: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

32

Além da proposta da Sociedade Dinamarquesa, outros autores propuseram

métodos empíricos que levavam em conta a redistribuição das tensões nas cort inas

flexíveis. OHDE (1938 apud TSCHEBOTARIOFF, 1962), por exemplo, concluiu

que essa redistribuição ocorria por efeito de arqueamento vertical do solo entre a

cota de dragagem e a ancoragem. Ele também propôs um método que fornecia

redução nos momentos fletores e aumento de até 60% na força de ancoragem

(Figura 3-13a). Já GONCHAROV (1962 apud TSINKER, 1997), também propôs

recomendações similares com base em estudos de modelos de grande escala (Figura

3-13b).

(a) (b)

Figura 3-13: Distribuições de tensões alternativas segundo a) OHDE (1938) e b)

GONCHAROV (1962) (TSCHEBOTARIOFF, 1962; TSHINKER, 1997)

Dois trabalhos por volta de 1950, no entanto, apresentaram os maiores

avanços para a discussão da interação solo-cortina até então: TSCHEBOTARIOFF

(1949) e ROWE (1952). Esses trabalhos serão discutidos separadamente a seguir .

Page 51: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

33

3.2.3 Tschebotarioff (1949)

TSCHEBOTARIOFF (1949) realizou ensaios de grande escala e observou

que a distribuição de tensões dependia inteiramente do método construtivo da

estrutura. Nas cortinas em que a retroárea era aterrada, não havia arqueamento do

solo e, portanto, as tensões observadas eram semelhantes às previstas de acordo

com a teoria clássica. Por outro lado, evidência definitiva de arqueamento foi

encontrada em cortinas executadas por dragagem. Ele também defendeu a

distribuição proposta por OHDE (1938) em detrimento da distribuição proposta

pela Sociedade Dinamarquesa.

O autor também verificou que a redução de momentos nas cortinas era

oriunda não do efeito de arqueamento do solo, mas sim da redistribuição de tensões

passivas. Essas tensões se concentravam muito mais na proximidade da cota de

dragagem, reduzindo assim o vão efetivo estrutura. A Figura 3-14 apresenta um

esquema da redistribuição de tensões passivas de acordo com TSCHEBOTARIOFF

(1973).

Figura 3-14: Redistribuição da tensão normal à estrutura em função da deflexão da

cortina (TSCHEBOTARIOFF, 1973).

Segundo TSINKER (1997), diversos autores confirmaram os resultados

apresentados por TSCHEBOTARIOFF (1949) em pesquisas subsequentes em todo

o mundo. Dentre esses autores, destacou-se ROWE (1952), que forneceu um

método de previsão para a redução de momentos advinda da flexão da cortina.

Page 52: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

34

3.2.4 Rowe (1952)

Diversos trabalhos até então haviam contribuído na compreensão do

comportamento das cortinas, mas foi ROWE (1952) quem, de fato, dirimiu os

maiores questionamentos que envolviam o problema das cortinas ancoradas. Rowe

conduziu testes em cortinas ancoradas de escala reduzida e explorou as variáveis

envolvidas na análise. A partir da teoria da semelhança, o autor determinou um

parâmetro comum ao modelo e à estrutura em escala real, ao qual denominou

número de flexibilidade, ρ:

EI

H 4

(3-14)

Tendo demonstrado que o efeito de arqueamento é inexistente para o nível

de deformação usual dos sistemas de ancoragem na prática, ele verificou que a

redução do momento fletor é oriunda da subida da resultante passiva na ficha. Essa

subida diminui o vão livre da cortina e decorre das deformações de flexão da

estrutura (Figura 3-15).

Figura 3-15: Tipos de deformação associados às cortinas flexíveis (adaptado de

SIMPSON e POWRIE, 2001)

O efeito de redução do vão efetivo da cortina em função da sua flexibilidade

pode ser simplificado pela analogia da Figura 3-16.

Page 53: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

35

(a) (b)

Figura 3-16: Analogia para o entendimento da redução do vão efetivo da cortina

(CORNFIELD, 1975)

Em condições de trabalho, uma cortina muito flexível (Figura 3-16a) está

sujeita a deformações muito maiores no vão CA que uma cortina muito rígida

(Figura 3-16b). Essas deformações fazem com que o ponto de aplicação da

resultante da reação no apoio inferior seja mais elevado para o primeiro caso. Isso é

possível porque o apoio inferior tem extensão (o apoio superior teoricamente é

pontual) e a tensão de contato dependente das deformações. Além disso, como o

momento na cortina varia com o cubo do vão, uma diferença pequena entre os vãos

CA e DA representa uma redução significativa no momento máximo.

Outras descobertas feitas por ROWE (1952) são listadas a seguir:

a) Para cada solo há um valor crítico de rigidez da estrutura a partir do

qual o momento fletor máximo atuante será aquele dado pelo Método

do Apoio Livre;

b) A resultante do empuxo ativo tem sempre a mesma magnitude, cujo

valor pode ser obtido pela teoria de Coulomb, considerando um atrito

solo-cortina igual a 2/3 ϕ;

c) As condições de apoio fixo ou livre são, na verdade, extremos do

problema, sendo que, para um dado solo, uma estrutura muito flexível

estará submetida ao momento calculado pelo MAL, e uma estrutura

com flexibilidade menor que a crítica, estará submetida ao momento

dado pelo MAL e

Page 54: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

36

d) O arqueamento das tensões é rapidamente destruído com deformações

da ordem de H/1000 e, portanto, não deve ser considerado no cálculo.

A partir de ensaios em modelos com ancoragens deslocáveis, Rowe

relacionou um fator de redução, aplicado ao momento calculado segundo o MAL, à

flexibilidade da cortina e à deformabilidade do solo. A Figura 3-17 apresenta essa

relação.

Figura 3-17: Curvas de redução de momentos (ROWE, 1952)

Figura 3-18: Método de utilização da redução de momentos em projeto

Page 55: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

37

A utilização dos diagramas de redução de momentos no projeto de cortinas é

bem simples. No mesmo gráfico da curva de redução, traça-se a curva de resistência

de determinado tipo de seção (Figura 3-18). Escolhe-se a seção comercial que mais

se aproxima da interseção entre as curvas pela parte superior da curva de redução.

Alguns autores apresentam restrições a respeito da utilização da redução de

momentos acima descrita. TERZAGHI (1954) argumenta que solos muito

compressíveis não devem produzir redução de momentos independente da

flexibilidade da cortina. Ele também aponta para o fato de que as argilas, mesmo

oferecendo restrição da ficha em curto prazo, podem produzir na estrutura

momentos maiores à medida que se deformam por adensamento.

SKEMPTON (1953) recomenda que as curvas de redução sejam utilizadas

sem modificação para areias puras. Já para areias siltosas compactas e

medianamente compactas, deve-se utilizar uma redução mais criteriosa. No caso de

areias siltosas fofas e argilas, o autor recomenda que não se reduza o momento

fletor. Esta última recomendação também é reforçada por BOWLES (1977).

3.2.5 Brinch-Hansen (1953) e Rowe (1956)

O método empírico proposto por ROWE (1952) leva em consideração o

regime de trabalho da estrutura. Nessas condições, como foi demonstrado, a

flexibilidade tem influência fundamental nas solicitações da cortina. BRINCH-

HANSEN (1953), no entanto, propôs um novo método de cálculo de empuxo de

terra em estruturas que atingem a plastificação.

ROWE (1956) investigou alguns modelos reduzidos de cortinas que

possibilitavam a formação de rótulas plásticas e chegou à conclusão de que tanto o

método empírico apresentado na seção 3.2.4 como o cálculo segundo as teorias

plásticas forneciam resultados semelhantes e, portanto, poderiam ser considerados

equivalentes. Ele observou, no entanto, que a teoria plástica deveria considerar a

ocorrência de não mais que uma rótula plástica na cortina.

Page 56: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

38

3.2.6 Outras contribuições

LAZEBNIK (1961 apud LAZEBNIK, 1998) conduziu cerca de 500

experimentos em modelos de grande escala e apresentou aspectos importantes da

interação solo-estrutura. Ele observou que o empuxo ativo total numa cortina

flexível é de 25-30% menor que o empuxo atuante numa cortina rígida e que a

solicitação das ancoragens nestas últimas pode exceder em 30-40% o valor obtido

com o uso da teoria de Coulomb. Além disso, suas observações do diagrama

passivo foram similares às observadas por TSCHEBOTARIOFF (1949) e ROWE

(1952).

Também observou que a diferença entre o momento numa cortina aterrada

pode diferir de 25-30% do momento numa cortina dragada. Já a força na ancoragem

das estruturas dragadas foi de 10-20% maior que no outro tipo. O ângulo de atrito

solo-cortina variou em função da flexibilidade da estrutura, da deslocabilidade do

sistema de ancoragem e da compacidade do solo de fundação (TSINKER, 1997).

A Figura 3-19 apresenta 24 esquemas sugeridos por LAZEBNIK (1961) para

o cálculo de cortinas.

Figura 3-19: Resumo dos experimentos de LAZEBNIK (1961) (adaptado de TSINKER,

1997)

Page 57: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

39

Segundo TSINKER (1983), o procedimento para a utilização do método de

Lazebnik é o seguinte:

a) Calcula-se a estrutura por meio da teoria clássica, utilizando-se δa = 0 e

δp = 3/4 ϕ, selecionando-se uma seção para a cortina com base no cálculo

preliminar;

b) Identifica-se a estrutura dentre os 24 esquemas da Figura 3-19, a partir

dos resultados calculados anteriormente;

c) Efetua-se então cálculo final considerando-se os valores de δa e δp e os

diagramas indicados, sendo que a área do diagrama passivo deve ser

sempre calculada da forma convencional, utilizando-se Kp de acordo com

a fórmula:

sen

sen

senarcsensen

K

p

p

p

1

cos1

(3-15)

d) Em seguida, modifica-se o momento fletor calculado em c multiplicando-

o pelo fator KM.

BJERRUM et al (1972) apresentaram um estado-da-arte sobre cortinas

ancoradas e escavações escoradas. Durante a discussão da apresentação, emergiu-se

um debate a respeito do arqueamento das tensões nas cortinas flexíveis. Os autores

classificaram como arqueamento do solo todas as redistribuições de tensões que

aconteciam nas cortinas, mas ROWE (1972), em contraponto, afirmou que o alívio

das tensões entre a ancoragem e a cota de dragagem era deveras instável para que

fosse considerado no cálculo dessas estruturas. Além disso, como já se sabia, era o

fator de menor relevância para a redução de momentos.

De acordo com SIMPSON e POURIE (2001) a questão continuou sem

encerramento, pois os efeitos de arqueamento são claramente considerados em

projetos de escavações.

Page 58: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

40

Alguns autores apresentaram medidas de empuxo crescentes ao longo do

tempo em algumas estruturas. Esse acréscimo de empuxo foi entendido por muitos

como evidência para a destruição do arqueamento no solo. No entanto, parte desse

fenômeno pode ser explicada pelo chamado efeito hereditário. Este efeito está

associado à atuação de cargas úteis (live loads) nas estruturas, que produzem

tensões residuais na cortina e em seus componentes. Ao atuar sobre a estrutura,

determinado carregamento variável produz um estado de tensões muito menor que o

necessário para reverter as deformações por ele causadas (TSINKER, 1997).

A avaliação adequada de K0 na análise de cortinas é fundamental para a

obtenção de momentos fletores de projeto compatíveis. Como demonstraram

POTTS e FOURIE (1985), os momentos fletores nas cortinas rígidas instaladas em

solos com altos valores de empuxo no repouso podem exceder, em muito, os

momentos calculados segundo a teoria clássica. Cortinas flexíveis, em geral,

apresentaram resultados bastante similares aos valores calculados segundo a

redução de ROWE (1952).

DAY e POTTS (1993) apresentaram resultados de análises numéricas de

cortinas ancoradas em que se comparam resultados de análises com utilização de

elementos bidimensionais e unidimensionais para a modelagem da cortina. Segundo

eles, os elementos de viga são mais adequados para a modelagem de cortinas

delgadas, como as estacas-pranchas de aço. A modelagem com elementos

bidimensionais pode conduzir a estimativas equivocadas de deslocamentos e

tensões, e deve ser utilizada apenas em casos que envolvam estruturas de espessura

compatível (paredes diafragma, estacas secantes etc.).

Coeficientes de empuxo alternativos foram propostos por BILGIN (2012)

com base em resultados numéricos de cortinas de alturas, fichas e seções variadas

(Figura 3-20). Os modelos eram ancorados na profundidade de 25%H, ideal para a

minimização das deformações da cortina (BILGIN e ERTEN, 2009). Os momentos

fletores observados nas análises foram até 35% menores que aqueles dados pelo

cálculo segundo o método empírico de redução. Já as forças na ancoragem, foram

40% maiores que aquelas determinadas segundo o cálculo convencional.

Page 59: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

41

Figura 3-20: Exemplo de aplicação dos coeficientes de empuxo alternativos (BILGIN,

2012)

O uso de diagramas de empuxo alternativos tem a vantagem de oferecer uma

descrição muito mais acurada da interação solo-estrutura em cortinas. No entanto,

como diversos autores apontaram ao longo dos anos, a simplificação do

procedimento de cálculo deve ser prioritária, visto que nunca deixarão de existir

incertezas de cálculo, por melhor que seja o modelo. Além disso, a disponibilidade

das ferramentas computacionais é de grande utilidade para a análise de cortinas, não

necessitando o projetista complicar demasiadamente a fase preliminar de cálculo.

3.3 MÉTODOS NUMÉRICOS

Dentre os métodos computacionais, ou numéricos, para a análise de cortinas

são relevantes aqueles que fazem uso do modelo de molas, também denominado

modelo de Winkler, e os de meio contínuo, sendo o Método de Elementos Finitos o

mais empregado para este último.

A primeira tentativa de se aplicar a teoria dos coeficientes de reação

horizontal à análise de cortinas de estacas-prancha se deve a Paul Baumann, no ano

de 1934, trabalho publicado por BAUMANN (1935), tendo BLUM (1951) também

contribuído nessa área. Entretanto, as grandes dificuldades encontradas à época

diziam respeito ao processo laborioso de cálculo e à incerteza na determinação dos

coeficientes de reação (TERZAGHI, 1954).

Page 60: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

42

Na atualidade, dado o grande avanço dos recursos computacionais e a sua

difusão no meio técnico, a análise de problemas que envolvem interação solo-

estrutura não apresenta mais o primeiro obstáculo mencionado por Terzaghi, apesar

de que a determinação dos coeficientes de reação horizontal para o modelo de

molas, bem como as propriedades de resistência e deformabilidade do solo nos

modelos de meio contínuo, ainda permanece como um grande desafio aos

projetistas.

Há que se ressaltar, entretanto, que grande avanço foi obtido na área da

investigação geotécnica desde aquela época, sendo que o próprio Terzaghi

apresentou uma contribuição relevante na teoria dos coeficientes de reação do solo

em seu trabalho publicado no ano de 1955.

TORRES (2014) apresentou uma comparação de resultados do cálculo de

esforços em cortinas ancoradas utilizando métodos de meio contínuo e de molas,

inclusive mostrando as diferenças entre os resultados obtidos por meio da utilização

de diversos programas disponíveis no mercado.

3.3.1 Solução em que o Solo é Representado por Molas

A conhecida hipótese de Winkler, consiste em modelar o comportamento do

solo por meio de molas. Essa simplificação pode fornecer valores com aproximação

suficiente para a solução de problemas de engenharia, porém os valores dos

coeficientes de reação adotados devem ser compatíveis tanto com as propriedades

elásticas do solo quanto com as propriedades geométricas da estrutura

(TERZAGHI, 1955).

No caso especial da análise de cortinas flexíveis, alguns autores ofereceram

contribuições significativas para o tratamento do problema. TERZAGHI (1955), ao

apresentar a sua teoria a respeito dos coeficientes de reação do solo, propôs

tratamentos diferenciados para o problema em função das condições de restrição da

ficha. Coeficientes de reação horizontal (kh) podem ser determinados de acordo com

as propostas de CHADEISSON (1961), MENARD (1975), SCHMITT (1995) ou

CUR (2012).

Uma proposta interessante da utilização do modelo de molas é o chamado

método das tensões dependentes. O método consiste na variação iterativa dos

deslocamentos da cortina, atendendo às condições de equilíbrio da cortina por meio

do cálculo do empuxo segundo a fórmula (VANECKOVA et al., 2011):

Page 61: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

43

wkhr (3-16)

Onde σ é a tensão normal média atuante na cortina num determinado ponto,

σr é a tensão normal no repouso e w é o deslocamento do ponto em questão. Quando

o valor da tensão normal segundo a Equação 3-16 atinge o limite ativo ou passivo,

σa ou σp, a tensão naquele ponto passa a ser independente do deslocamento e

permanece constante durante o restante do processo ou até que as deformações se

revertam. A Figura 3-21 apresenta um esquema do cálculo das tensões segundo o

método.

(a) (b)

Figura 3-21: Diagramas de empuxo em cortina segundo o método das tensões

dependentes a) no repouso e b) após o processo iterativo (FINE, 2016)

Os programas de cálculo atualmente disponíveis que dispõem do modelo de

molas também já oferecem a facilidade do cálculo evolutivo. No entanto, algumas

limitações ainda diferenciam significativamente a solução pelo método das molas

da solução de meio contínuo. Talvez a maior delas seja a ausência de qualquer

informação a respeito do estado de tensões e deformações do maciço em que se

instala a cortina. Do ponto de vista estrutural, no entanto, a ferramenta é bastante

satisfatória, desde que corretamente utilizada pelo projetista.

Remete-se o leitor ao trabalho de TORRES (2014) para um apanhado geral

sobre a utilização de diferentes programas de cálculo que fazem uso do coeficiente

de reação horizontal no cálculo de cortinas ancoradas.

Page 62: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

44

3.3.2 Métodos de Meio Contínuo

A análise em que o solo é tratado como meio contínuo é geralmente feita

pelo Método dos Elementos Finitos (MEF). Nesse tipo de análise já há, se as

condições de flexibilidade forem favoráveis, a redução de momentos durante o

cálculo. Obtém-se, além de esforços na estrutura, deslocamentos e a distribuição de

tensões no solo. As tensões podem ser comparadas com as resistências, para uma

avaliação da segurança à ruptura. Outra vantagem é a de facilitar o tratamento de

solos do tipo c-ϕ, difíceis de trabalhar com os métodos clássicos

Com a evolução do uso das análises de meio contínuo em Geotecnia, a

disponibilidade de modelos de comportamento do solo tem aumentado. Hoje,

mesmo os modelos mais simples incorporam a teoria da plasticidade na análise, o

que é de grande importância para o problema das estruturas flexíveis. Os modelos

mais difundidos para a análise tensão deformação em meio contínuo são o modelo

elasto-plástico perfeito (também conhecido como modelo Mohr-Coulomb) e o

modelo hiperbólico.

Os parâmetros de entrada para o cálculo pelo modelo Mohr-Coulomb são os

seguintes:

a) Parâmetros de resistência – ângulo de atrito (ϕ), intercepto de coesão (c)

e ângulo de dilatância (ψ);

b) Parâmetros de deformação – Módulo elástico (E) e coeficiente de

Poisson (ν).

A maior limitação desse modelo constitui-se também na sua grande

vantagem. Sua simplicidade permite a fácil implementação e o rápido

processamento de dados. Além disso, os parâmetros de entrada são bastante

conhecidos pelos usuários e de fácil determinação por meio de ensaios também

acessíveis. Por isso, recomenda-se o seu uso sempre que se queira obter uma rápida

primeira impressão dos resultados (BRINKGREVE, 2002).

Por sua vez, o modelo hiperbólico, proposto por DUNCAN e CHANG

(1970), traz a vantagem de incorporar, nos parâmetros de deformação do solo, o

efeito do nível de tensões. O programa Plaxis 2D, utilizado neste trabalho, faz uso

de uma variante do modelo hiperbólico. Essa variante, conhecida como Hardening

Soil Model (SCHANZ, 1998) supera o modelo básico por incluir a teoria da

plasticidade, a dilatância do solo e uma superfície de escoamento cap.

Page 63: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

45

No programa Plaxis, os parâmetros de entrada para o modelo Hardening Soil

são os seguintes:

a) Parâmetros de resistência segundo o modelo Mohr-Coulomb - ϕ, c e ψ;

b) Rigidez dependente do nível de tensões segundo uma potência – m;

c) Parâmetro de deformação associado à tensão desviadora – E50ref

;

d) Parâmetro de deformação associado à compressão primária – Eoedref

;

e) Parâmetros elásticos para descarregamento e recarregamento - Eurref

e νur.

É importante lembrar que os parâmetros de entrada para os modelos com

dependência do nível de tensões incluem a tensão de referência. Usualmente,

utiliza-se o valor de 100 kPa (1 atm) como padrão. Os programas, no entanto,

aceitam a modificação do usuário para esse tipo de entrada.

Como lembram POTTS e FOURIE (1985), o valor de K0 é de suma

importância na análise de cortinas, pois determina a condição inicial de tensões.

BRINKGREVE (2002) esclarece que o modelo Mohr-Coulomb é especialmente

sensível a esse parâmetro e deve ser criteriosamente adotado. No caso das areias

limpas, como é de praxe, a relação de JÁKI (1948):

senK 10 (3-17)

A análise de meio contínuo deve ter sempre em vista a qualidade dos

parâmetros do problema. Tanto mais simples deve ser o modelo quanto menor for a

disponibilidade de parâmetros conhecidos. Por outro lado, a versatilidade desses

modelos possibilita a realização de análises paramétricas, que fornece importantes

informações para as fases subsequentes de projeto.

Para uma investigação detalhada da aplicação dos métodos de meio contínuo

aos problemas geotécnicos, refere-se o leitor aos textos de DESAI e ABEL (1972),

BOWLES (1974) e POTTS e ZDRAVKOVIC (1999, 2001).

Page 64: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

46

4 REVISITANDO O TRABALHO DE ROWE (1952)

Em seu trabalho publicado em 1952, Peter Walter Rowe — então professor

assistente na Universidade de St. Andrews, Escócia, e mais tarde professor emérito

da Universidade de Manchester até o seu falecimento em 1997 — estudou dois

importantes aspectos da interação solo-estrutura em cortinas de estacas-pranchas: a

distribuição de tensões e os momentos fletores (comparados aos fornecidos pelos

métodos clássicos). Apesar de já terem sido objeto de estudos de outros autores

como STROYER (1935) e TSCHEBOTARIOFF (1949), Rowe aperfeiçoou o

entendimento desses aspectos e contribuiu significativamente com a prática de

engenharia ao propor um método empírico de dimensionamento de cortinas que se

tornou popular.

Na primeira parte do seu trabalho, Rowe se propôs a verificar a

confiabilidade dos métodos de previsão das tensões laterais aplicadas às cortinas,

bem como o desenvolvimento de arqueamento vertical do solo, que até então era

tido pelos métodos empíricos como a causa da redução de momentos fletores nessas

estruturas. Já na segunda seção, o autor investigou a magnitude do fator de redução

dos momentos nas cortinas em função da rigidez das mesmas e da compacidade

relativa do solo. Esta parte, em particular, deu origem ao método de cálculo

proposto por ele.

Este capítulo tem por finalidade reproduzir numericamente os ensaios

realizados por ROWE (1952) em modelos reduzidos, tanto para a distribuição de

tensões quanto para o efeito de redução de momentos fletores nas cortinas. O

objetivo de comparar os resultados experimentais e numéricos é de interesse dos

projetistas que se valem das ferramentas computacionais para a análise de

estruturas, uma vez que podem ser investigados alguns aspectos-chave do problema

da interação solo-cortina.

A seguir, será apresentada descrição dos ensaios realizados por ROWE

(1952) e dos modelos numéricos analisados, bem como os resultados obtidos nos

modelos numéricos, as suas comparações como as observações do trabalho de

referência e as conclusões decorrentes.

Page 65: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

47

4.1 ENSAIOS EM MODELOS REDUZIDOS

Nos seus ensaios, ROWE (1952) utilizou 15 modelos reduzidos, um dos

quais foi utilizado no estudo da distribuição de tensões, sendo os 14 restantes

utilizados nos estudos de redução de momentos (flexibilidade). Adicionalmente

foram utilizados dois outros modelos na determinação preliminar da forma da caixa

de concreto construída para os demais ensaios. Apresentam-se na Tabela 4-1 as

informações básicas sobre os modelos utilizados pelo autor e que serviram também

de base para os estudos numéricos desenvolvidos neste capítulo. Os tipos de solo

utilizados e as suas propriedades são apresentados na Tabela 4-2.

Tabela 4-1: Detalhes dos modelos de cortinas (adaptado de ROWE, 1952)

Material Chapa

1

# (mm) Altura

pol. (m) Log ρ

2 Log If

3 Ensaio

Aço

10 (3,251) 30 (0,76) -3,22 -0,26 Ensaios preliminares para

determinação da forma da

caixa 18 (1,219) 20 (0,51) -2,72 0,24

Chapa

dupla

8 (4,064)

42 (1,07) -3,32 -0,36 Distribuição de tensões

8 (4,064)

36 (0,91) -3,18 -0,22

Flexibilidade

32 (0,81) -3,38 -0,42

30 (0,76) -3,49 -0,53

28 (0,71) -3,61 -0,65

26 (0,66) -3,74 -0,78

12 (2,642)

36 (0,91) -2,52 0,44

31,5 (0,80) -2,74 0,22

27,5 (0,70) -2,98 -0,02

24 (0,61) -3,22 -0,26

21 (0,53) -3,45 -0,49

Duralumínio 14 (2,032)

29 (0,74) -2,07 0,89

26 (0,66) -2,26 0,70

23 (0,58) -2,48 0,48

20 (0,51) -2,72 0,24 1 Espessuras do padrão Imperial Standard Wire Gauge (SWG).

2 Número de Flexibilidade de Rowe (1952), ρ = H4

/(EI), com H em polegadas e EI em lb.pol²/ft. 3 Índice de Flexibilidade, If = H

4/(EI), com unidades do SI (kN e m).

Page 66: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

48

Neste trabalho, com o objetivo de simplificar a referência à flexibilidade das

cortinas e evitar confusão com o símbolo tradicional para a massa específica de um

material (letra grega ρ), preferiu-se adotar o Índice de Flexibilidade, If (Equação 4-

1), ao invés do número de flexibilidade proposto por Rowe, ρ. Esse índice tem

unidades SI, diferentemente do número de flexibilidade que possui unidades do

Sistema Imperial. Para obter If a partir de ρ basta multiplicá-lo por 919,33.

33,919/²

44

mkNm

m

EI

HI f (4-1)

Tabela 4-2: Propriedades dos solos (adaptado de ROWE, 1952)

Solo γ

(kN/m³) φ (°)

Índice de

Vazios

Módulo de

Compressibilidade

Volumétrica, K

(10-4

m²/kN)

Compacidade

Relativa

Areia 14,1 30 0,78

4,35 0,0 Seixo Dorset 15,4 30 0,74

Brita Whinstone 12,9 39 1,06

Cinzas 6,3 40 1,76 21,75

Areia 15,7 41 0,53

0,87 1,0

Seixo Dorset 17,3 37 0,49

Brita Whinstone 15,1 50 0,74

Cinzas 8,8 50 0,95 –

No que se refere às propriedades de deformação dos solos, ROWE (1952)

apresenta ensaios de compressão edométrica (Figura 4-1) cujas tensões verticais

máximas são em torno de 70 kPa, exceto para as cinzas em estado fofo que, em

razão da alta compressibilidade, não foram submetidas a tensões verticais de ordem

superior a 40 kPa.

Chama-se a atenção para o módulo de compressibilidade (K) constante

indicado na Figura 4-1, que é um módulo secante obtido a cerca de 50% da

deformação vertical máxima do ensaio e fornece os valores indicados na Tabela 4-

2.

Page 67: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

49

Figura 4-1: Resultados da compressão edométrica dos solos utilizados nos experimentos

(adaptado de ROWE, 1952)

4.1.1 Distribuição de tensões

A primeira seção do trabalho de ROWE (1952) apresenta um estudo da

distribuição das tensões horizontais num modelo reduzido de cortina ancorada. O

principal objetivo do autor era verificar se o arqueamento vertical do solo poderia

ser considerado na prática comum da engenharia de cortinas, especialmente ao se

considerar a deslocabilidade do sistema de ancoragem. Para tanto, dispôs-se de um

modelo com forma e dimensões apresentados na Figura 4-2. Apesar de o modelo ser

único, alguns parâmetros geométricos variaram para os diversos ensaios, incluindo

a cota de final de escavação, a sobrecarga e o nível de ancoragem.

A aferição do empuxo na cortina foi feita por meio direto e indireto. Foram

instaladas 47 células de pressão na cortina, 28 delas no lado ativo e 19 no lado

passivo, e divididas em três seções distintas. A aferição indireta das tensões foi

feita por meio de strain gauges, 104 deles, instalados em duas seções em toda a

altura da cortina. Segundo o autor, a acurácia dos resultados foi considerada

satisfatória se obedecida a tolerância de 10% entre os resultados obtidos de forma

direta e indireta.

Page 68: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

50

Figura 4-2: Modelo utilizado nos experimentos de distribuição de tensões (ROWE,

1952)

Nos ensaios de distribuição de tensões, apenas uma seção de cortina foi

utilizada (conforme indicado na Tabela 4-1), bem como apenas um tipo de solo,

areia fofa, cujos parâmetros foram apresentados na Tabela 4-2. A sequência

executiva dos experimentos pode ser observada na Figura 4-3. As medições foram

realizadas nas cotas relativas de dragagem de 0,6, 0,7 e 0,8 e a escavação era

conduzida até a ruptura do solo ou era interrompida para o estudo dos efeitos da

sobrecarga e do deslocamento da ancoragem. Este último foi obtido por meio do

afrouxamento manual dos cabos de ancoragem na cortina.

Page 69: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

51

Figura 4-3: Sequência executiva dos ensaios de distribuição de tensões (ROWE, 1952)

4.1.2 Flexibilidade

Após concluir, na primeira parte do seu trabalho, que a redução de momento

nas cortinas com ancoragens deformáveis era oriunda da redistribuição do diagrama

de empuxo na região passiva, ROWE (1952) também realizou uma série de

experimentos visando a medir os máximos momentos fletores nos modelos e

correlacioná-los com a rigidez relativa dos mesmos.

Os testes envolveram dez valores de flexibilidade de cortina, quatro níveis

de ancoragem, três valores de sobrecarga, sendo que os mesmos foram repetidos

para quatro tipos de solo (Figura 4-1) nos estados fofo e compacto.

Para os ensaios de Flexibilidade, Rowe utilizou um modelo diferente daquele

que foi usado na seção anterior. Suas dimensões e características são apresentadas

na Figura 4-4, a seguir.

Page 70: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

52

Figura 4-4: Aparato para os experimentos de flexibilidade (ROWE, 1952)

A sequência de execução dos ensaios de flexibilidade foi a seguinte. Após a

instalação da cortina, a caixa era cheia de solo de ambos os lados até que 3/4 do

modelo estivesse aterrado. Nesse ponto, as primeiras medições eram aferidas e,

após a instalação da ancoragem, prosseguia-se o aterro apenas na parte de trás da

cortina e a aplicação da sobrecarga. O próximo estágio era a escavação em frente à

cortina até 60% da profundidade total, quando as ancoragens eram afrouxadas até

que se medisse o máximo momento fletor. Em sequência, repetia-se a escavação e o

afrouxamento para 70% e 80% da profundidade total do modelo. Ao final de cada

ensaio, a deflexão total da ancoragem era da ordem de H/800.

4.2 ENSAIOS NUMÉRICOS

Para reproduzir os experimentos de ROWE (1952) descritos acima, utilizou-

se a ferramenta numérica Plaxis2D, que dispõe da análise de problemas tensão-

deformação evolutivos em meios contínuos por intermédio do Método de

Elementos Finitos. A ferramenta em questão também efetua análises de percolação,

de estabilidade (por meio da redução c-ϕ) e de problemas envolvendo adensamento

de solos.

Page 71: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

53

Os parâmetros de entrada relevantes para a análise tensão-deformação são os

parâmetros de resistência e de deformação do solo (c, ϕ, E e ν), no entanto, alguns

parâmetros adicionais podem ser utilizados, como é o caso do módulo de

deformação (E) e resistência não drenada (su) variáveis com a profundidade, ângulo

de dilatância (ψ) e ângulos de atrito diferenciados para a interface solo-cortina. A

ferramenta também possibilita a utilização de diversos modelos de comportamento

do solo, como o modelo elasto-plástico perfeito (Mohr-Coulomb), Hardening soil,

Cam-Clay, dentre outros.

São descritos a seguir os modelos numéricos e suas características, bem

como os procedimentos de análise para ambos os tipos de ensaio realizados, de

distribuição de tensões e de flexibilidade.

4.2.1 Distribuição de tensões

Os modelos numéricos utilizados para a reprodução dos experimentos de

distribuição de tensões realizados por ROWE (1952) são apresentados na Figura

4-5. Para a comparação direta com os resultados do trabalho de referência, dois

modelos foram analisados (DT1 e DT2). Apesar de possuírem as mesmas

dimensões, eles diferem entre si em termos de nível do posicionamento da

ancoragem e de sobrecarga aplicada.

Apesar de a forma do contorno inferior do modelo não ser exatamente aquela

dos experimentos descritos no item 4.1.1, este fator não tem influência nas análises

numéricas, já que claramente o objetivo da forma adotada por Rowe era reduzir a

quantidade de trabalho manual na preparação dos ensaios.

A malha de elementos finitos utilizada não foi extremamente refinada

porque optou-se por utilizar elementos triangulares isoparamétricos de 15 nós (com

12 pontos de integração). Além disso, o refinamento excessivo do modelo

impossibilitava a análise do problema sem que manualmente fossem aumentados o

overshooting e o erro admissível do cálculo durante as operações.

Page 72: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

54

(a)

(b)

Figura 4-5: Dimensões e malha de elementos finitos dos modelos numéricos de

distribuição de tensões – a) DT1 e b) DT2

Optou-se por utilizar o modelo Mohr-Coulomb (elasto-plástico perfeito),

entretanto foi também feita uma tentativa de utilização do modelo hiperbólico

(Hardening Soil) a partir da retroanálise do ensaio de compressão edométrica da

areia fofa. Os resultados dessa análise serão discutidos também neste capítulo.

Page 73: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

55

Dentre os parâmetros do solo utilizados nas análises numéricas, o módulo de

deformabilidade foi o de mais complicada obtenção. Em primeira mão, partiu-se de

um módulo constante para toda a massa de solo, sendo esse módulo obtido a partir

da transformação do módulo de compressibilidade volumétrica – apresentado na

Tabela 4-2 – no módulo elástico triaxial por meio da relação dada pelas Equações

4-2 e 4-3.

KEoed

1 (4-2)

)1(

)21)(1(

oedE

E (4-3)

Para a areia fofa em questão, obtém-se, utilizando ν = 0,3, o módulo elástico

de aproximadamente 1700 kPa. É evidente que este valor está bem abaixo da faixa

de valores de E para areias fofas na prática, tipicamente na faixa de 10-30 Mpa. No

entanto, essa diferença pode ser atenuada pelo efeito de escala do modelo.

Outro ponto importante da questão é o fato de que, pela forma como foi

depositado o solo para a realização dos ensaios, espera-se uma variação de E com a

profundidade, tal qual haveria de ser num depósito normalmente consolidado. Esse

efeito foi considerado por meio da variação linear do módulo E com a profundidade

do modelo, começando por um valor muito baixo (mas não nulo por restrição da

ferramenta utilizada) e alcançando determinado valor numa cota conhecida.

Para tanto escolheu-se o nível final de dragagem (70%H) como referência. A

partir da curva de compressão edométrica para a areia fofa (Figura 4-1),

determinou-se Eoed para o nível de tensão vertical equivalente ao nível de

referência. Esse valor foi transformado por meio da Equação 4-3 e a lei de variação

de E com a profundidade no modelo numérico foi obtida por simples substituição

dos valores na equação de uma reta. A Figura 4-6 apresenta a variação de E com a

profundidade adotada para as análises numéricas que fizeram uso do modelo Mohr-

Coulomb.

Page 74: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

56

Figura 4-6: Módulo de deformabilidade variável adotado para as análises DT

A utilização do modelo Hardening Soil demandou uma retroanálise da

compressão edométrica realizada por Rowe. O objetivo era aproximar uma curva

numérica de compressão o tanto quanto possível da curva experimental por meio da

variação dos parâmetros de entrada do programa Plaxis. Apresenta-se na Figura 4-7

a comparação das curvas experimental (ROWE, 1952) e numérica. Na mesma

figura, o módulo constante representa o valor de referência para o modelo Mohr-

Coulomb comentado anteriormente.

Figura 4-7: Aproximação da curva de compressão edométrica da areia fofa com a

utilização do modelo Hardening Soil

Page 75: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

57

Os parâmetros correspondentes à curva numérica da Figura 4-7 são os

constantes na Tabela 4-3. Pede-se ao leitor que recorra à seção 3.3.2 deste trabalho

para um resumo do modelo Hardening Soil no programa Plaxis e dos parâmetros

abaixo relacionados.

Tabela 4-3: Parâmetros de entrada do modelo hiperbólico no programa Plaxis

Parâmetro Valor

Eoedref

6250 kPa

E50ref

7500 kPa

Eurref

= 3 E50ref

22500 kPa

pref

45 kPa

Potência (m) 0,58

νur 0,2

K0na

0,5

Rf 0,9

ϕ 30°

Além dos parâmetros do solo, outro elemento importante na análise

numérica de interação solo-estrutura é a interface. Ela se constitui de elementos de

dimensão virtual (submetidos a tensões, porém sem deformações) que facilitam a

medição das tensões normais e cisalhantes que ocorrem numa interface entre o solo

e a estrutura. O atrito solo-cortina pode ser simulado por meio da inferência de um

parâmetro de resistência a esses elementos (R int = tan δ/tan ϕ). Nas análises de

distribuição de tensões, atribuiu-se, por meio de tentativas, o valor de 0,5 para Rint.

No que se refere à sequência executiva das análises numéricas, ela

permaneceu inalterada em relação à sequência realizada por ROWE (1952),

ilustrada na Figura 4-3. Vale ressaltar, no entanto, que arbitrariamente adotou-se

aqui a escavação do solo em frente à cortina em etapas de 10% da altura total do

modelo (Figura 4-5).

Quanto à simulação do afrouxamento do cabo de ancoragem, a única

maneira conveniente de realizar este procedimento no programa é alterar a rigidez

da ancoragem. Dessa forma a mesma foi reduzida manualmente até um valor

coerente com as deformações observadas no trabalho de referência, da ordem de

H/1000.

Page 76: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

58

Deve-se notar também que ROWE (1952) utilizou um apoio adicional no pé

do seu modelo (conforme se verifica nas Figura 4-2 e Figura 4-3). A princípio esse

dispositivo não deveria ter sido usado, visto que ele é inexistente nas estruturas

reais. Análises numéricas foram feitas com e sem esse apoio com o objetivo de

verificar a sua influência nos resultados.

4.2.2 Flexibilidade

Os ensaios numéricos para o estudo da influência da flexibilidade da cortina

procuraram reproduzir os experimentos realizados por ROWE (1952) na segunda

seção do seu trabalho clássico, conforme descrição no item 4.1.2. Apesar de em

menor número que os experimentos do trabalho de referência, as análises numéricas

apresentadas nesta seção envolveram variações de geometria e solos numa faixa

semelhante. Foram realizadas 18 análises numéricas, divididas em 4 grupos,

conforme as propriedades do solo e a geometria do problema. A Tabela 4-4

apresenta um resumo das análises numéricas realizadas nesta seção.

Tabela 4-4: Resumo dos modelos numéricos para os ensaios de flexibilidade

Grupo de análise Parâmetro do

problema

Valor do

parâmetro

Seções utilizadas

(Log If) / Altura da

cortina (m)

1 – Areia Fofa

α = zdragagem/H 0,6 – 0,8 0,770 / 0,74

0,347 / 0,58

-0,127 / 0,70

-0,232 / 0,91

-0,664 / 0,71

-0,790 / 0,66

β = zancoragem/H 0

q = Q/(γH) 0

2 – Areia Compacta abaixo

da profundidade 60%H

α 0,6 – 0,8 0,770 / 0,74

-0,232 / 0,91

-0,790 / 0,91

β 0

q 0

3 – Brita Whinstone Fofa

α 0,6 – 0,8 0,770 / 0,74

0,105 / 0,80

-0,232 / 0,91

-0,545 / 0,76

-0,790 / 0,66

β 0,2

q 0,1

4 – Seixo Dorset Compacto

abaixo da profundidade

60%H

α 0,6 – 0,8 0,770 / 0,74

0,105 / 0,80

-0,545 / 0,76

-0,790 / 0,66

β 0,2

q 0,1

Page 77: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

59

Se for tomado um grupo em particular, será notado na última coluna do

Quadro 4-2 que a flexibilidade dos modelos numéricos nesse grupo varia não

somente em função do índice de rigidez da cortina (EI), mas também em função da

altura da mesma. Dessa forma, a comparação direta de momentos não pode ser

efetuada, senão pela normalização do esforço.

À semelhança do trabalho de referência, será utilizada como normalização

do momento fletor o índice de momento, Im, conforme definido na Equação 4-4

(Rowe, na realidade, usou a denominação τ, com unidades no Sistema Imperial, que

foi preterida em função da confusão com o símbolo da tensão de cisalhamento).

]/[ 4

3mkNm

H

MIm (4-4)

São apresentados nas Figura 4-8 e Figura 4-9 os modelos numéricos para os

ensaios de flexibilidade, juntamente com as suas dimensões e solos utilizados.

Adotou-se, de maneira análoga às análises de distribuição de tensões, uma

variação linear dos módulos de deformação dos solos, sendo estes obtidos da

mesma maneira descrita na seção 4.2.1, isto é, pela equação de uma reta cujo

coeficiente linear é muito baixo e cujo coeficiente angular é calculado a partir de

uma profundidade de referência e das curvas de compressão edométrica.

Page 78: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

60

(a)

(b)

Figura 4-8: Modelos numéricos para os ensaios de flexibilidade dos grupos a) 1 e b) 2

Page 79: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

61

(a)

(b)

Figura 4-9: Modelos numéricos para os ensaios de flexibilidade dos grupos a) 3 e b) 4

Page 80: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

62

Para cada um dos quatro grupos de análise, foram utilizados os módulos

conforme constam na Figura 4-10, a seguir.

(a)

(b)

Figura 4-10: Módulos de deformabilidade variáveis usados nos modelos numéricos dos

grupos a) 1 e 2; b) 3 e 4

Page 81: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

63

Os elementos de interface utilizados nas análises de flexibilidade tiveram

Rint igual a 2/3. Apesar de este valor ser um pouco maior que o utilizado nas

análises de distribuição de tensões, ele é costumeiramente adotado na literatura .

Além disso, ROWE (1952) calculou o momento máximo de apoio livre sem

redução utilizando um ângulo de atrito solo-cortina igual a 2/3 ϕ.

Para simular o afrouxamento do cabo (e consequentemente a destruição do

arqueamento vertical do solo), optou-se por utilizar duas ancoragens. Uma delas,

fictícia e rígida, que atuava na cortina até a chegada ao primeiro estágio

determinado para a aferição dos momentos fletores. Nesse momento, a ancoragem

rígida era substituída por uma flexível (uma mola de rigidez compatível com o nível

de deformações obtido por Rowe). Esta última ancoragem era então mantida em

todos os estágios subsequentes.

No caso da ancoragem rígida, adotou-se rigidez com valor de 104 kN/m, e

para a flexível, valor 20 vezes menor (500 kN/m). Este último foi obtido por meio

de relação com a ordem de grandeza da deflexão das cortinas no trabalho de

referência que, ao final de cada experimento, era de H/800.

A sequência executiva das análises foi a seguinte:

a) Enchimento da caixa de areia de ambos os lados até que 75% da cortina

estivesse aterrada (cálculo das tensões iniciais);

b) Amarração da ancoragem rígida;

c) Finalização do aterro na parte de trás da cortina;

d) Aplicação da sobrecarga;

e) Escavação do solo em frente à cortina até a profundidade de 0,6H;

f) Substituição da ancoragem rígida por uma deformável (equivalente ao

afrouxamento do cabo);

g) Aferição dos momentos fletores nas etapas de escavação de 0,6, 0,7 e

0,8H.

4.3 RESULTADOS DAS ANÁLISES NUMÉRICAS E COMPARAÇÕES

Nesta seção serão apresentados e discutidos os resultados numéricos das

análises comparativas com o trabalho de ROWE (1952) e outros constantes na

literatura.

Page 82: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

64

4.3.1 Distribuição de tensões

Os resultados apresentados a seguir fazem distinção a respeito da

deslocabilidade do sistema de ancoragem. Para um mesmo modelo, estudou-se a

utilização de ancoragens indeslocáveis e deslocáveis. Entenda-se que toda estrutura

se deforma, no entanto, o termo indeslocável quer aqui significar que as

deformações elásticas do cabo são preponderantes na deflexão total da estrutura ,

que acaba sendo pequena. Esse tipo de situação está relacionado com a utilização

de tirantes pré-tensionados, cabos ancorados em estruturas rígidas, cortinas

ancoradas por estacas etc. Quando da utilização de blocos de ancoragem, vigas de

ancoragem e ou mesmo estacas-pranchas (mortos de amarração), a deflexão total da

cortina é preponderantemente determinada pelas deformações de mobilização

passiva do solo pelos elementos de ancoragem. Dessa forma, a verificação de

ambos os casos fornece informações de como as tensões no solo se comportam em

função deste parâmetro.

Apresentam-se, nas Figura 4-11 e Figura 4-12 os resultados da distribuição

de tensões nos modelos numéricos (DT1 e DT2) com deslocamento mínimo da

ancoragem – aos quais ROWE (1952) denomina No Yield. Juntamente com os

resultados numéricos, são também apresentados os resultados experimentais e

teóricos.

Esses resultados apresentam consistência com os resultados apresentados em

outros trabalhos envolvendo estudos numéricos de cortinas flexíveis, como

BJERRUM et al. (1972), DAY e POTTS (1993) e BILGIN (2012).

Page 83: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

65

(a)

(b)

Figura 4-11: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT1 com ancoragem indeslocável

Page 84: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

66

(a)

(b)

Figura 4-12: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT2 com ancoragem indeslocável

Page 85: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

67

São aspectos relevantes dos resultados anteriormente apresentados:

a) A redução das tensões horizontais na região ativa da cortina ao longo

do vão livre da mesma (entre o apoio superior e o centro de gravidade do diagrama

passivo). Esse efeito está relacionado com o giro das tensões efetivas principais no

solo. Em decorrência da mobilização de tensões cisalhantes ao longo dos planos

que antes eram principais (horizontal e vertical), as tensões normais sofrem

decréscimo ao longo do vão e acréscimo nos apoios. Note-se, na Figura 4-13, o giro

nas tensões principais efetivas decorrente da dragagem do solo.

(a)

(b)

Figura 4-13: Cruzes de tensões efetivas a) antes e b) depois da dragagem do solo

Page 86: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

68

BJERRUM et al. (1972) denominaram arqueamento do solo o giro das

tensões tanto na região da ancoragem como na região da ficha. Na discussão desse

mesmo trabalho, Rowe afirmou que havia distinção entre arqueamento e

redistribuição de tensões por flexão da cortina, não sendo correto chamar de

arqueamento a modificação no estado de tensões na região passiva.

No entanto, ao se observar o perfil de deslocamentos da cortina na Figura 4-

12b e as cruzes de tensões efetivas na Figura 4-13b, nota-se que o que acontece

com o solo acima da ancoragem é semelhante ao que acontece na região da ficha.

Isto é, em decorrência do movimento da cortina contra o solo, desenvolve-se um

empuxo passivo que vai perdendo preponderância no estado de tensões à medida

que a tensão vertical aumenta.

É evidente que, para o caso do apoio no nível do terreno, não será atingido o

valor passivo de empuxo do solo, senão, no máximo, o valor de empuxo no

repouso. Este, no entanto, é consideravelmente maior que o valor de empuxo ativo,

que se desenvolveria caso o apoio fosse totalmente deslocável e, portanto, não

deixa de ser o mesmo efeito explicado anteriormente, mas apenas em magnitude

reduzida.

Dessa forma, apesar de arqueamento e redistribuição por flexão não serem

necessariamente sinônimos, eles estão intimamente relacionados, e devem ser

considerados como o mecanismo responsável pela redistribuição de tensões nas

cortinas ancoradas.

b) A concentração de tensões na região da ancoragem, muito mais

pronunciada com a utilização do modelo hiperbólico. Este efeito decorre do anterior

e resulta na necessidade de consideração de um acréscimo na resultante das

ancoragens no projeto, caso a estrutura tenha sido calculada por meio de teoria

clássica.

Pode-se explicar a diferença entre as tensões do modelo elasto-plástico e do

modelo hiperbólico pelo fato de que neste último o módulo de deformação (e

consequentemente as tensões para certo carregamento) é dependente do nível de

confinamento do solo. Num processo interativo, a indeslocabilidade do apoio faz

com que as tensões confinantes naquela região aumentem com o carregamento (ou

no mínimo não sejam reduzidas), o que garante um acréscimo no carregamento

localizado, mesmo em relação à concentração de tensões decorrente dos

deslocamentos da estrutura.

Page 87: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

69

É possível questionar a validade do resultado do modelo hiperbólico com

base na comparação com os valores experimentais, que são muito mais próximos

dos resultados obtidos por meio do modelo elasto-plástico em se tratando das

tensões na região da ancoragem. No entanto, deve-se levar em consideração que os

parâmetros de entrada foram obtidos do único ensaio disponível pelo autor, o de

compressão edométrica. Ainda assim, com exceção para a força na ancoragem, os

demais resultados se aproximaram razoavelmente dos resultados experimentais.

c) O acréscimo gradual das tensões na região ativa abaixo da cota de

dragagem, cujo limite é o valor correspondente a K0. Este efeito decorre da

limitação das deformações próximas do pé da cortina, mas não foi observado nos

resultados experimentais de ROWE (1952).

d) A pequena diferença entre os resultados da análise da cortina com e

sem o apoio no pé. Não há como afirmar, no entanto, se essa diferença se manteria

pequena no modelo físico. Além disso, o autor dos experimentos não forneceu

detalhes suficientes para a comparação.

e) A disparidade significativa entre os diagramas de empuxo passivo

obtidos nas análises numéricas e nos experimentos. Certamente este é o ponto que

exige maior atenção na discussão, visto que ROWE (1952) obteve diagramas muito

próximos de uma distribuição trapezoidal. É provável outros fatores possam ter se

associado para influenciar nesse diagrama de tensões, como instrumentação

deficiente, aumento de rigidez da cortina em função da sua montagem em chapa

dupla (funcionando numa rigidez intermediária entre o valor da soma das rigidezes

das duas chapas e o valor da rigidez de uma seção solidarizada) e restrição lateral

da estrutura.

Ao integrarmos as curvas apresentadas por Rowe, no entanto, nota-se que

não se pode atender ao equilíbrio de momentos na cortina sem a hipótese de uma

força atuante no pé da cortina. Além disso, os diagramas passivos obtidos

numericamente estão de acordo com outros resultados numéricos apresentados na

literatura recente. A força Ts, no entanto, não pode ser aferida no modelo numérico

pelo fato de a cortina ser modelada por meio de elementos finitos unidimensionais

(elementos de barra ou viga).

Page 88: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

70

f) A ocorrência de momentos fletores negativos na região da ficha. Isso

ocorre porque em determinada profundidade, o diagrama líquido de empuxo retorna

para o lado ativo da estrutura. Esse comportamento foi observado por

TSCHEBOTARIOFF (1949) e também no estudo de flexibilidade de ROWE (1952)

e tem que ver com a subida da resultante passiva. Além disso, como será visto na

seção posterior, seções ainda mais rígidas que a utilizada aqui apresentaram

momento negativo.

São apresentados nas Figura 4-14 e Figura 4-15 os resultados numéricos

(DT1 e DT2) considerando-se o deslocamento “livre” das ancoragens (Yield).

Page 89: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

71

(a)

(b)

Figura 4-14: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT1 com ancoragem deslocável

Page 90: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

72

(a)

(b)

Figura 4-15: Diagramas de a) distribuição de tensões e b) momento fletor e

deslocamentos do modelo numérico DT1 com ancoragem deslocável

Page 91: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

73

Os modelos com ancoragem deslocável têm como principal diferença em

relação aos modelos com ancoragem indeslocável o perfil de deslocamentos da

cortina. Estes tiveram um acréscimo nos seus valores máximos da ordem de 100%.

Apesar de os deslocamentos no topo da cortina serem grandes e apontarem para um

estado ativo de tensões ao longo de toda a região da ancoragem, não se observou a

quebra total da concentração de tensões nessa região. Apesar de em menor

proporção que no caso com ancoragem indeslocável, ainda há giro da cortina acima

da ancoragem deslocável, ensejando a mobilização de tensões pouco acima da

condição ativa.

Os momentos fletores máximos foram levemente menores que os obtidos por

ROWE (1952), ao passo que as tensões na região passiva do solo mantiveram a

mesma aparência que nos casos sem deflexão da ancoragem, ou seja, com

mobilização elevada de tensões e subida de resultante passiva.

Resume-se na Tabela 4-5 os valores das forças e momentos envolvidos nas

análises de distribuição de tensões sem e com deflexão total da ancoragem. Em

geral, os resultados numéricos a partir do modelo elasto-plástico se aproximaram

mais dos resultados experimentais. Isto pode ser decorrente da insuficiência de

parâmetros conhecidos para a entrada de dados do modelo Hardening Soil no

programa utilizados para as análises.

Também é interessante notar que, apesar de ter incluído um apoio adicional

no pé da cortina nos seus ensaios, ROWE (1952) não apresenta valores das reações

nesse apoio nem informa se o mesmo foi liberado durante a realização dos ensaios

(aqui considerou-se que não). Além disso, os diagramas de empuxo aferidos nos

experimentos não permitem o equilíbrio da cortina. Para tanto, são apresentados

valores para o efeito combinado de Ts e Fb (reação no apoio inferior), necessário

para esse equilíbrio.

Page 92: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

74

Tabela 4-5: Resultantes e esforços de flexão nos modelos físicos e experimental

Modelo Força/Esforço

Sem

deflexão

Com

deflexão

DT1 DT2 DT1 DT2

Experimental – Rowe (1952)

Ra (kN/m) 1,99 3,52 2,08 3,10

Rp (kN/m) 1,12 1,27 1,12 1,27

Fa (kN/m) 0,64 1,99 0,57 1,38

Ts + Fb (kN/m)* 0,24 0,26 0,39 0,46

Mmáx (kNm/m) 0,15 0,14 0,19 0,18

Numérico – Modelo Elasto-

Plástico

Ra (kN/m) 2,71 4,25 2,64 4,08

Rp (kN/m) 2,02 2,01 2,17 2,35

Fa (kN/m) 0,72 1,94 0,64 1,62

Fb (kN/m) 0,11 0,36 0,05 0,28

Mmáx (kNm/m) 0,16 0,15 0,16 0,18

ΔManc/((1-β)H)

(kN/m)** -0,14 -0,25 -0,21 -0,3

Numérico – Modelo

Hiperbólico

Ra (kN/m) 2,77 4,76 2,60 3,95

Rp (kN/m) 2,26 2,24 2,40 2,48

Fa (kN/m) 0,84 2,43 0,72 1,67

Fb (kN/m) 0,02 0,17 0,06 0,11

Mmáx (kNm/m) 0,15 0,12 0,14 0,15

ΔManc/((1-β)H)

(kN/m)** -0,34 -0,28 -0,46 -0,38

* Valores positivos para o sentido definido na Figura 3-8.

** Valores positivos para o mesmo sentido de Ts.

Por outro lado, tampouco o equilíbrio de momentos no modelo numérico

pode ser garantido simplesmente pelo cálculo dos produtos das resultantes com seus

respectivos braços de alavanca na configuração indeformada. Nota-se na Tabela 4-5

que ΔManc (diferença do momento em torno do ponto de ancoragem calculado com

a configuração indeformada da cortina e o valor esperado para o equilíbrio, ou seja,

0) tem ordem de grandeza igual ou superior ao momento fletor máximo. Além

disso, a força aplicada no pé necessária para o equilíbrio (ΔManc/((1-β)H)) tem

sentido contrário a Ts, isto é, atuaria empurrando a cortina no sentido da ruptura.

Page 93: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

75

Visto que a força Ts é inexistente nas análises numéricas, o desequilíbrio de

momento de corpo rígido observado só pode ser explicado pela ocorrência de

efeitos de segunda ordem. Esses efeitos podem ter pelo menos três origens. O

carregamento vertical, incluindo o peso da cortina (Figura 4-16a), que, para

deslocamentos e carregamentos pequenos, é desprezível. Em segundo lugar, o

próprio empuxo lateral (Figura 4-16b), que produziria uma redução no momento

pelo fato não atuar mais perpendicular ao braço de alavanca c. Por fim, o atrito

desenvolvido ao longo da cortina (Figura 4-16c). Os braços de alavanca c e d

podem ser da ordem de grandeza da altura da cortina e, por isso, podem produzir

efeitos relevantes.

(a) (b) (c)

Figura 4-16: Origens dos efeitos de segunda ordem

Page 94: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

76

ROWE (1952) também propõe um fator de introdução de momentos na

cortina que é de segunda ordem, mas decorre da tendência de retificação da cortina

gerada pela interação entre os empuxos no pé da estrutura e ao longo do cabo de

ancoragem, não se aplicando para determinados casos de geometria e carregamento.

Esse efeito pode ser computado indiretamente por meio da combinação dos efeitos

de segunda ordem apresentados na Figura 4-16.

A Tabela 4-5 também mostra que, com exceção do momento fletor, as

análises numéricas forneceram resultados numericamente superiores aos observados

no trabalho de referência.

4.3.2 Flexibilidade

As análises numéricas de flexibilidade contemplaram, a exemplo de ROWE

(1952), apenas os casos com deflexão livre da ancoragem. São apresentados nas

Figuras Figura 4-17 a Figura 4-20 os gráficos normalizados de momento para cada

um dos grupos de análise indicados na Tabela 4-4, juntamente com os resultados

experimentais, que foram indicados pela letra R. Nos gráficos a seguir, a hierarquia

de traços indica a flexibilidade da cortina (a linha mais espessa corresponde à seção

mais rígida e a linha menos espessa à seção mais flexível).

Page 95: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

77

Figura 4-17: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e flexibilidades (Log If) do grupo 1

Page 96: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

78

Figura 4-18: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e flexibilidades (Log If) do grupo 2

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79

Figura 4-19: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e flexibilidades (Log If) do grupo 3

Page 98: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

80

Figura 4-20: Momentos fletores normalizados para diferentes cotas de dragagem e flexibilidades (Log If) do grupo 4

Page 99: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

81

Note-se que, em geral, os valores numéricos apresentam consistência entre

si, mas não se aproximam dos resultados experimentais, com poucas exceções. A

dispersão dos resultados numéricos em relação aos resultados experimentais pode

ser verificada nas curvas de redução de momento mostradas nas Figuras Figura

4-21 e Figura 4-22, onde:

refmáx

máxM

M

MF

,

(4-5)

O momento fletor máximo tomado como referência foi o momento máximo

calculado segundo o MAL utilizando-se a teoria clássica de Coulomb, com δ =

2ϕ/3.

Figura 4-21: Comparação entre as curvas de redução de momentos propostas por Rowe

e os resultados numéricos dos grupos 1 e 2

Page 100: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

82

Figura 4-22: Comparação entre as curvas de redução de momentos propostas por Rowe

e os resultados numéricos dos grupos 3 e 4

As Figuras Figura 4-21 e Figura 4-22 mostram que os momentos fletores

obtidos por meio das análises numéricas foram mais sensíveis ao parâmetro α (cota

relativa de dragagem) que os resultados experimentais. Essa tendência difere

bastante dos resultados apresentados por ROWE (1952), visto que ele observou

uma variação da ordem de 10%Mmáx entre experimentos com α variando de 0,6 a

0,8, o que justificava a adoção de curvas médias de redução de momento,

equivalentes a α = 0,7.

Nota-se também que as análises numéricas dos grupos 3 e 4 apresentaram

momentos fletores bem mais reduzidos se comparados às análises dos grupos 1 e 2.

A diferença predominante entre esses grupos foi o nível de ancoragem, que se

situava a uma profundidade de 20%H para os grupos 3 e 4, contra ancoragens

posicionadas no topo da cortina para os outros casos.

Além disso, enquanto os resultados dos grupos 3 e 4 situaram-se

predominantemente abaixo das curvas de redução propostas por Rowe, os

resultados dos grupos 1 e 2 situaram-se predominantemente acima delas, inclusive

excedendo os próprios valores oriundos do cálculo clássico para cotas de dragagem

máximas.

Page 101: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

83

Esses momentos acima do cálculo clássico podem ser explicados por meio

da não mobilização do atrito total disponível (2ϕ/3), bem como da atuação de

momentos de segunda ordem. No entanto, valores de α = 0,8 não refletem

condições reais de projeto. Desta forma, a massa de pontos úteis apresentados na

Figura 4-21 já se aproxima bem das curvas de redução de momento.

Os casos envolvendo solos fofos, diferentemente do observado

experimentalmente, apresentaram momentos pouco menores que os casos com solos

compactos. Todos os resultados, no entanto, situaram-se acima dos valores

correspondentes ao cálculo segundo o método dinamarquês, descrito na seção 3.2.2.

Parece, no entanto, razoável adotar-se maior cautela na utilização dos fatores

empíricos de redução no caso com vãos efetivos maiores. Por outro lado, diversos

autores que realizaram estudos experimentais em cortinas flexíveis comprovaram a

relevância da rigidez do solo neste tipo de problema, exigindo cuidados redobrados

na introdução de parâmetros de deformação nos programas de cálculo.

Page 102: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

84

5 ESTUDO PARAMÉTRICO DE CASO HIPOTÉTICO

Foi desenvolvido um estudo paramétrico para uma cortina ancorada

hipotética, embora com dimensões e carregamento realistas. O objetivo foi

investigar os efeitos dos principais parâmetros da modelagem, comparando seus

resultados com aqueles apresentados no capítulo anterior.

Os parâmetros envolvidos no estudo são:

a) Módulo de deformação do solo, sendo tanto constante como variável com

a profundidade;

b) Rigidez da estrutura, determinada por escolha de seções comerciais de

estacas-pranchas de aço;

c) Deslocabilidade da ancoragem e

d) Ficha, que tem influência direta sobre o fator de segurança da obra

(ruptura passiva do solo à sua frente) e sobre a movimentação da cortina

(apoio livre ou fixo).

5.1 DESCRIÇÃO DO CASO

Escolheu-se para o estudo paramétrico uma geometria semelhante a um dos

casos apresentados por TORRES (2014). A estrutura analisada tem altura de

contenção de 10 m, com uma linha de ancoragens situada à profundidade de 1,5 m e

o nível d’água na profundidade de 3 m em ambos os lados da cortina. Adotou-se

como sobrecarga de retroárea o carregamento de 30 kN/m², indicado pela NBR

9782:1987 (cancelada no ano de 2015, porém sem substituição até a data desta

pesquisa).

As análises numéricas simularam seis solos granulares, três deles com

módulos de deformação constantes e outros três com módulos variáveis ao longo da

profundidade. Apesar de esses solos possuírem parâmetros de resistência similares,

eles diferem na compressibilidade, que é o objeto do estudo em questão. O modelo

de comportamento do solo escolhido foi o Mohr-Coulomb (elasto-plástico perfeito).

Resumem-se na Tabela 5-1 os parâmetros do solo, da cortina, da ancoragem

e da ficha utilizados nas análises. Já Figura 5-1 apresenta a geometria do problema

e os módulos de deformação utilizados para cada um dos solos e a sua variação com

a profundidade. Os parâmetros de resistência apresentados na Tabela 5-1 foram

escolhidos arbitrariamente, guardando apenas semelhança com o caso estudado por

TORRES (2014).

Page 103: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

85

Tabela 5-1: Parâmetros de entrada para as análises numéricas

Parâmetros do solo

Solo/Parâmetro Módulo, E γsat = γnat

(kN/m³) ν ϕ ψ δ

Compacto Econst.comp.

18,0 0,3 35°

0,7 ϕ

Evar.comp.

Medianamente

compacto

Econst.med.

- Evar.med.

Fofo Econst.fofo

Evar.fofo

Parâmetros da cortina (Estudo de flexibilidade)

Seção* I

(m4/m)

EI

(kNm²/m)

If

[m4/(kNm

2/m)]

A

(m²/m)

EA

(kN/m)

w

(kN/m/m)

1 - Eq. Perfil

CAZ 38-700N /

AZ 18-700

2,57E-03 5,40E+05 0,121 4,28E-

02 8,99E+06 3,36E+00

2 - Eq. Perfil

AZ-50 1,21E-03 2,54E+05 0,258 0,0322 6,76E+06 2,53E+00

3 - Eq. Perfil

PU-22 4,95E-04 1,04E+05 0,630 0,0183 3,84E+06 1,44E+00

4 - Eq. Perfil

GU-13N 2,66E-04 5,58E+04 1,174 0,0127 2,67E+06 9,97E-01

5 - Eq. Perfil

GU-8N 1,28E-04 2,69E+04 2,436 0,0103 2,16E+06 8,09E-01

Parâmetros da ancoragem (Estudo da ancoragem)

Ancoragem EA (kN/m) A (cm²/m) L (m)

Aflex. 1,00E+05 4,76

20,0

Asemi-flex. 2,50E+05 11,90

Ainter. 5,00E+05 23,81

Asemi-rígid. 7,50E+05 35,71

Arígid. 1,00E+06 47,62

Parâmetros da cortina (Estudo da ficha)

Ficha D (m) If [m4/(kNm²/m)] EI (kNm²/m)

F1 4,3

0,630

6,64E+04

F2 5 8,04E+04

F3 6 1,04E+05

F4 7 1,33E+05

F5 8 1,67E+05

*Perfis disponíveis no catálogo Arcelor Mittal

Por meio do cálculo preliminar segundo o MAL, determinou-se a ficha da

cortina, bem como o momento fletor máximo e a força na ancoragem. Os valores de

cálculo são apresentados na Tabela 5-2

.

Page 104: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

86

Tabela 5-2: Valores calculados segundo o MAL

Método Ficha, D (m) FS Mmáx (kNm/m) Fa (kN/m)

MALRankine 6,0

1,57 590,4 186,2

MALCoulomb 4,69 532,4 167,9

As seções 1 a 3 foram escolhidas da seguinte maneira. Dimensionou-se a

seção de aço segundo o momento de 540 kNm/m (sem majoração), obtendo-se o

perfil 3 (PU-22). Depois foram obtidos os demais perfis considerando faixas de

acréscimo ou decréscimo de inércia em relação ao perfil inicial, para levar em conta

a flexibilidade da estrutura no estudo.

Figura 5-1: Geometria e módulos de deformação utilizados no caso hipotético

Quanto às ancoragens, escolheu-se uma faixa de variação de rigidez de

maneira que as deformações nesses elementos apresentassem faixa de variação com

ordens de grandeza de H/500 a H/5000. A modelagem dos elementos de ancoragem

foi feita por meio de apoio do tipo extremidade fixa, cujo comportamento é o de

uma mola, introduzindo na cortina apenas uma força dependente do deslocamento

naquele ponto.

Page 105: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

87

No estudo da influência do apoio inferior, escolheu-se um valor de If

intermediário. A partir deste valor, foram calculados valores de EI fictícios com o

objetivo de fazer com que, independente do comprimento da ficha, o índice de

flexibilidade da estrutura permanecesse invariável. Assim, pôde-se avaliar a

influência pura da extensão do apoio sem que a flexibilidade da cortina

apresentasse um efeito acoplado.

Apresenta-se na Figura 5-2 um esquema do modelo numérico adotado para o

estudo paramétrico. Foram utilizados elementos isoparamétricos triangulares de 15

nós, sendo que a malha foi refinada nas proximidades da cortina.

A sequência evolutiva das análises envolveu quatro estágios sucessivos de

dragagem, sendo cada um deles de 2,5 m de altura de solo em frente à cortina e, por

fim, a aplicação da sobrecarga na retroárea.

Figura 5-2: Modelo numérico do estudo paramétrico

São apresentados a seguir os resultados do estudo paramétrico, sendo que

eles foram agrupados em três tópicos: estudo da flexibilidade da cortina, estudo da

deslocabilidade da ancoragem e estudo do apoio inferior.

Page 106: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

88

5.2 RESULTADOS DO ESTUDO DE FLEXIBILIDADE

O estudo de flexibilidade para o caso hipotético proposto envolveu a

utilização de cinco seções comerciais de aço (de acordo com o especificado no

Quadro 5-1) e buscou avaliar a resposta da estrutura em termos de empuxo lateral,

momentos fletores, forças de ancoragem e deslocamentos frente à variação da

rigidez à flexão da cortina. Vale ressaltar que neste estudo utilizou-se apenas um

valor de rigidez da ancoragem que é o valor intermediário da faixa mostrada no

Quadro 5-1, ou seja, a ancoragem Ainter, correspondente a um nível de deflexão da

ordem de H/2000.

Juntamente com a flexibilidade, a influência da lei de variação do módulo de

deformação do solo (Figura 5-1) também será estudada. Isto porque utilização do

parâmetro constante por vezes é uma simplificação desnecessária, e carece de

investigação.

5.2.1 Influência da flexibilidade na distribuição das tensões

São apresentados nas Figuras Figura 5-3 a Figura 5-5 os diagramas de

empuxo de terra na cortina do caso hipotético. As figuras são agrupadas em duplas

de solo com mesma compacidade, mas cujos módulos tem distribuições diferentes

ao longo da profundidade. O dégradé das curvas representa a flexibilidade variável

da cortina, sendo a cor mais escura correspondente à seção mais rígida (S1) e a cor

mais clara à seção mais flexível (S5).

Page 107: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

89

Figura 5-3: Distribuição de tensões com a flexibilidade da cortina em solo compacto

Page 108: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

90

Figura 5-4: Distribuição de tensões com a flexibilidade da cortina em solo medianamente compacto

Page 109: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

91

Figura 5-5: Distribuição de tensões com a flexibilidade da cortina em solo fofo

Page 110: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

92

A concentração de tensões na região da ancoragem é tanto maior quanto

mais flexível é a estrutura. Isto significa que o apoio superior da cortina é mais

solicitado que o esperado pela teoria clássica à medida que se reduz a rigidez da

estrutura. Note-se também que os modelos com módulo de deformação variável

com a profundidade apresentam curvas de distribuição mais suaves na região ativa,

bem como concentrações de tensões menores que para os casos com módulo

constante ao longo da profundidade.

Por outro lado, o diagrama de tensões na região passiva da cortina é

ligeiramente mais suave para as seções mais rígidas. O formato geral dos diagramas

é semelhante, mas a resultante passiva para as seções mais flexíveis é localizada

ligeiramente acima para as seções mais flexíveis em função da maior concentração

de tensões na parte superior do diagrama. Observe-se também que a mobilização do

solo em frente à cortina é muito próxima da condição limite no terço superior da

ficha, quando então as tensões reduzem-se para valores próximos dos valores dados

por K0.

Já na região do vão central da cortina as tensões são correspondentes à

condição ativa no caso das seções mais rígidas. No caso das seções mais flexíveis,

todavia, as tensões são menores que os valores dados por Ka. Essa redução chega à

ordem de 50% no caso da seção mais flexível. A partir da cota de dragagem, no

entanto, as tensões voltam a aumentar, eventualmente se aproximando da condição

de repouso no pé da cortina.

Portanto, três efeitos caracterizam a distribuição das tensões em função da

flexibilidade da cortina. O primeiro deles é a concentração de tensões na região do

apoio superior, que faz aumentar a solicitação da ancoragem. Em segundo lugar,

tem-se a distribuição não-triangular de tensões à frente da ficha, causando a subida

da resultante passiva e reduzindo os momentos. Por fim, tem-se o alívio das tensões

no vão da estrutura em decorrência da flexão da mesma, o que também contribui

para a redução do momento fletor no vão.

Page 111: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

93

No que se refere à variação do módulo de deformação do solo com a

profundidade, esta atenua a primeira e a última características mencionadas acima.

Não produz, todavia, significativa diferença no diagrama passivo em comparação

com os casos que envolvem módulo constante. Vale ressaltar, entretanto, que a

adoção de um módulo crescente com a profundidade com o intuito de simular o

efeito do nível de tensões não leva em consideração o alívio das tensões com a

dragagem da cortina, visto que o módulo permanece inalterado durante todo o

cálculo evolutivo.

5.2.2 Influência da flexibilidade nos momentos fletores

Conforme discutido na seção anterior, o aspecto dos diagramas de empuxo

na estrutura depende da sua própria flexibilidade e, portanto, tem influência sobre

os momentos fletores, como demonstraram vários autores em outras pesquisas,

especialmente ROWE (1952). Apresenta-se na Figura 5-6 a variação dos momentos

fletores nos modelos numéricos deste estudo em função da flexibilidade da

estrutura e também da deformabilidade do solo.

Figura 5-6: Variação dos momentos fletores com a flexibilidade da cortina

Page 112: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

94

Nota-se que, à semelhança dos resultados apresentados na seção 4.3.2

(Figura 4-22) os momentos fletores na estrutura situaram-se muito abaixo dos

valores oriundos da redução proposta por ROWE (1952). Desta forma, mesmo o

dimensionamento da estrutura, mesmo por meio do método empírico, demonstra-se

conservador. Note-se também que a utilização de módulos de deformação variáveis

aproxima os momentos da curva de Rowe para solo compacto.

Os resultados aqui apresentados são ainda mais otimistas que aqueles

apresentados por BILGIN (2012), que obteve momentos fletores da ordem de 35%

menores que os obtidos segundo a redução de Rowe. Além disso, apesar de as

curvas de redução terem sido obtidas com a utilização de ancoragem deslocáveis,

será visto a seguir que esse fator não tem influência muito significativa no

momento fletor máximo. Esse aspecto também foi demonstrado nas análises de

distribuição de tensões na seção 4.3.1, onde os momentos obtidos numericamente

quase não se alteraram entre os casos com e sem deflexão da ancoragem.

5.2.3 Influência da flexibilidade na solicitação da ancoragem

São apresentadas na Figura 5-7 as curvas de variação de Fa com a rigidez da

cortina para o caso hipotético.

Figura 5-7: Variação de Fa com a flexibilidade da cortina

Page 113: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

95

Os resultados demonstram como a solicitação da ancoragem cresce à medida

que se reduz a rigidez da seção empregada. O acréscimo sobre a solicitação

calculada chega a ser da ordem de 35% para os solos mais compactos e seções mais

flexíveis. Além disso, o cálculo de Fa segundo a teoria clássica só é satisfatório

para as cortinas de rigidez muito alta.

A majoração de carga na ancoragem sugerida na literatura varia entre 30% a

70%, no entanto este acréscimo também inclui a redistribuição de carga entre

ancoragens por condições excepcionais de funcionamento da mesma ou de resposta

do solo (TSCHEBOTARIOFF, 1962; TENG, 1962; TSINKER, 1983; US STEEL,

1984).

Curiosamente, Fa demonstrou ser mais sensível à forma de variação de E no

solo que à magnitude de E. Este fato está relacionado com a suavização da

distribuição de tensões ativas observada nas Figuras Figura 5-3 a Figura 5-5. No

caso das seções mais rígidas, valores de Fa menores que os calculados pela teoria

clássica podem ser explicados pela mobilização do diagrama passivo diferenciado

(não-triangular), que absorve parte da solcitação.

ROWE (1952) apresentou diagramas de cômputo de Fa em função da

flexibilidade nos quais a solicitação decresce com a flexibilidade da cortina (Figura

5-8). A adoção dessa redução não é recomendável diante dos resultados mostrados

na Figura 5-7, que sugerem o oposto. A crítica à proposta daquele autor resulta no

fato de que a deflexão das ancoragens durante a realização dos seus ensaios foi feita

manualmente, visando à obtenção do momento fletor máximo. Na prática, as

deformações podem não alcançar níveis tão altos, como também aponta BILGIN

(2012).

Page 114: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

96

Figura 5-8: Redução de Rowe para a força na ancoragem (adaptado de TERZAGHI,

1954)

5.2.4 Influência da flexibilidade nas deformações da cortina

A influência da flexibilidade nas deformações máximas da cortina pode ser

verificada na Figura 5-9.

Figura 5-9: Variação das deformações máximas na estrutura com a flexibilidade

Page 115: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

97

Note-se que a variação de dmáx com a flexibilidade é significativa, da ordem

de 400% para todos os casos. Além disso, a tendência é que a deformação cresça

rapidamente a partir de If = 1. Os resultados foram também mais sensíveis à

compacidade do solo que à sua lei de variação com a profundidade, variando, para

aquele parâmetro, em torno de 100% do solo mais compacto para o solo mais fofo.

Os perfis de deformação para todos os solos e todas as seções estudadas são

apresentados nas Figuras Figura 5-10 a Figura 5-12, sendo que eles foram

agrupados e representados de maneira semelhante à da distribuição das tensões

(seção 5.2.1).

Page 116: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

98

Figura 5-10: Perfis de deformações com a flexibilidade da cortina em solo compacto

Page 117: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

99

Figura 5-11: Perfis de deformações com a flexibilidade da cortina em solo medianamente compacto

Page 118: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

100

Figura 5-12: Perfis de deformações com a flexibilidade da cortina em solo fofo

Page 119: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

101

É interessante notar, por meio dos perfis de deslocamentos acima, as origens

dos dois tipos distintos de deformações que ocorrem nesse tipo de estrutura (Figura

3-15). As cortinas mais rígidas estão predominantemente sujeitas às deformações

decorrentes da rotação da estrutura em torno da ancoragem. À medida que se

aumenta a flexibilidade da seção, passam a exercer maior importância as

deformações oriundas da flexão. No entanto, mesmo as cortinas mais flexíveis

apresentam a mesma componente rotacional de deformação.

No que se refere aos deslocamentos acima do nível de ancoragem, verifica-

se que, em função da flexão no vão central, a região do balanço superior é

empurrada contra o solo, dando ensejo à concentração de tensões observada nos

diagramas da seção 5.2.1. Conclui-se que a mobilização passiva do solo acima da

ancoragem advém do efeito de flexão, e não de giro da cortina. Isso pode ser

verificado pelo fato de as cortinas mais rígidas apresentarem deslocamentos no

balanço sempre positivos, gerando, portanto, tensões nessa região próximas da

condição ativa.

Outro aspecto interessante é que os deslocamentos rotacionais da cortina são

mais sensíveis ao emprego do módulo constante com a profundidade. Por outro

lado, os deslocamentos de flexão são mais sensíveis ao emprego do módulo

variável.

5.3 ESTUDOS DE DESLOCABILIDADE DA ANCORAGEM

Conforme discutido na seção 4.3.1, a deslocabilidade do sistema de

ancoragem tem influência importante sobre a distribuição de empuxo lateral na

região ativa da cortina, e os efeitos decorrentes dessa interação resultam tanto na

redução dos momentos fletores por alívio das tensões no vão central como no

acréscimo da solicitação da ancoragem por concentração de tensões nas

proximidades do ponto de aplicação da força. Também foi verificado na seção 5.2

que a flexibilidade da estrutura exerce grande influência sobre as solicitações da

estrutura.

Page 120: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

102

O estudo da deformabilidade da ancoragem objetiva esclarecer um pouco

mais a respeito dessa interação. Para tanto, foram analisadas numericamente

estruturas com vários graus de deslocabilidade do apoio superior, traduzido pela sua

rigidez (Tabela 4-1), bem como três das seções estudadas na seção 5.2, isto é, a

mais rígida, a mais flexível e a intermediária. Quanto ao módulo de deformação,

foram utilizados apenas os módulos constante e variável do solo medianamente

compacto.

5.3.1 Influência da ancoragem na distribuição de tensões

Esta influência já foi estudada na seção 4.3.1 deste trabalho. Em resumo, a

deslocabilidade do sistema de ancoragem limita ou não as deformações na região

desse apoio e pode causar solicitação no solo acima da condição Ka, ou mesmo

acima de K0. No entanto, concluiu-se também, por meio dos resultados

apresentados na seção 5.2 que, para determinado grau de deslocabilidade da

ancoragem, os efeitos na distribuição de tensões são mais atenuados ou mais

acentuados, dependendo da rigidez da cortina.

Por exemplo, tomemos a ancoragem utilizada na seção 5.2, correspondente a

níveis de deslocamento duas vezes maiores que os necessários para destruir os

efeitos de concentração de tensões e arqueamento nos experimentos de ROWE

(1952). À medida que diminui a rigidez do solo e se aumenta a da cortina,

especialmente nos casos com módulo variável, a estrutura se aproxima dos

diagramas obtidos pela teoria clássica. Por outro lado, à medida que se aumenta a

flexibilidade e a rigidez do solo, a estrutura tende a desenvolver concentrações e

alívios de tensões decorrentes da flexão.

Resta-nos avaliar, então, a importância relativa da deslocabilidade da

ancoragem frente aos efeitos da flexibilidade da cortina. Essa importância será

avaliada segundo os resultados apresentados a seguir.

Page 121: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

103

5.3.2 Influência da ancoragem nos momentos fletores

Apresenta-se na Figura 5-13 a variação dos momentos fletores com a

deslocabilidade da ancoragem.

Figura 5-13: Variação do momento máximo com a deslocabilidade da ancoragem

Os resultados demonstram que o esforço máximo de flexão é mais sensível à

flexibilidade da seção que ao deslocamento da ancoragem. Além disso, a

importância da ancoragem tende a se anular com o aumento da flexibilidade da

estrutura. Assim, apesar de as curvas de redução propostas por ROWE (1952)

haverem sido obtidas com ancoragens muito deslocáveis, verifica-se que as mesmas

podem ser utilizadas para o projeto de cortinas com ancoragens de deslocabilidade

variada, desde que a seção obtida no cálculo não seja muito rígida.

Se, no entanto, a distribuição de E com a profundidade aproximar-se do

modelo variável aqui estudado, pode-se afirmar que a deflexão da ancoragem não

tem influência significativa no cálculo dos momentos e, portanto, pode ser

desprezada. E pelo fato de as curvas Log If vs. FM (Figura 5-6) situarem-se sempre

abaixo da proposta de Rowe, pode-se garantir que, mesmo com momentos

reduzidos, a estrutura está segura para qualquer flexibilidade adotada. É por este

motivo que as rupturas documentadas de cortinas de cais quase nunca envolvem

casos de colapso por incapacidade à flexão.

Page 122: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

104

5.3.3 Influência da ancoragem na sua própria solicitação

A variação de Fa com a deflexão da ancoragem é apresentada na Figura 5-14,

incluindo valores para diferentes seções de rígida a flexível.

Figura 5-14: Variação da solicitação da ancoragem com a sua deflexão

Como se observa, o aumento da deslocabilidade da ancoragem está

associado à redução da sua solicitação. No entanto, a diferença entra as curvas S1,

S3 e S5 aponta para uma ligeira maior importância da flexibilidade da estrutura.

Para exemplificar, a variação máxima observada de Fa com δanc é da ordem de 30%

de Fa,MAL, que é a ordem de grandeza da mínima variação de Fa com a flexibilidade

da seção. Além disso, a suavização da distribuição de tensões na região ativa pela

utilização do módulo variável reduz ainda mais a importância da deflexão da

ancoragem na solicitação Fa.

Vale lembrar que o apoio superior foi modelado como uma mola, portanto a

relação entre δanc e 1/EAanc é linear. No entanto a solicitação Fa é não-linear, por

causa da mobilização do solo. Isso explica a forma não retilínea das curvas da

Figura 5-14, que só é aproximadamente alcançada nos casos extremos de rigidez da

cortina (rigidez máxima com E constante ou rigidez mínima com E variável).

Page 123: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

105

5.3.4 Influência da ancoragem nos deslocamentos

A influência qualitativa da deslocabilidade do sistema de ancoragem pode

ser observada por meio da comparação dos perfis de deslocamentos apresentados na

seção 4.3.1. Como efeito do deslocamento do apoio, a cortina é livre para girar em

torno do apoio inferior. Desta forma, os deslocamentos máximos que eram

determinados pela flexão da cortina, também passam ser grandemente influenciados

pela rotação da mesma.

Já a influência quantitativa da deslocabilidade da ancoragem sobre os

deslocamentos máximos é apresentada na Figura 5-15.

Figura 5-15: Variação dos deslocamentos máximos na cortina com a deslocabilidade da

ancoragem

Observa-se que os deslocamentos máximos dependem significativamente da

deslocabilidade da ancoragem, no entanto o fator de maior importância permanece a

flexibilidade da estrutura. A variação de dmáx ao longo da faixa de variação de δanc é

da ordem de 100%, ao passo que dmáx varia de 3 a quatro vezes mais a depender da

flexibilidade da estrutura.

Por outro lado, a utilização de módulo de deformação variável ou constante

não tem influência significativa nos deslocamentos, como se observou também no

estudo de flexibilidade (seção 5.2.4).

Page 124: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

106

5.4 ESTUDOS DO APOIO INFERIOR

Com o intuito de estudar um pouco mais a respeito da influência do apoio

inferior da cortina (ficha), realizou-se um estudo do mesmo por meio da análise do

caso hipotético descrito na seção 5.1 com embutimentos de tamanhos crescentes

(Tabela 5-1). A ficha mínima utilizada nas análises foi de 4,3 m, que corresponde

ao valor mínimo necessário para a garantia do equilíbrio da cortina segundo o MAL

com o uso da teoria de Rankine. Já a maior ficha analisada teve 8 m de

comprimento.

A Figura 5-16 apresenta a variação de FS com a ficha da estrutura do caso

hipotético. Considerou-se, nos cálculos segundo a teoria de Coulomb e de Caquot &

Kérisel, ângulo de atrito solo-cortina igual a 2/3 ϕ.

Figura 5-16: Valores de FS vs. ficha segundo o MAL para diferentes teorias empuxo

Note-se que, para a faixa em estudo, o fator de segurança da estrutura cresce

linearmente com a ficha utilizada. Além disso, o FS calculado por meio da análise

segundo a teoria de Coulomb é três vezes superior ao FS calculado segundo a teoria

de Rankine. Sabe-se, por outro lado, que a teoria de Coulomb superestima os

valores de empuxo passivo. O cálculo segundo a teoria de Caquot & Kérisel

aproxima-se mais da realidade por considerar uma superfície de ruptura es espiral

logarítmica.

Page 125: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

107

A influência da mobilização de atrito nos valores de FS mostra importância

da sua consideração no cálculo de estruturas flexíveis como as cortinas de cais.

BOWLES (1977) argumenta que, dadas as deformações típicas deste tipo de

estrutura, o cálculo segundo a teoria de Rankine passa a ser muito antieconômico.

Por outro lado, este pode ser um dos principais motivos pelos quais estruturas como

o píer de Aalborg subsistem, mesmo sendo consideradas subdimensionadas.

5.4.1 Influência da ficha na distribuição de tensões passivas

A Figura 5-17 apresenta distribuições de tensões passivas para as diferentes

fichas estudadas, considerando-se apenas o caso de solo medianamente compacto

com módulo constante.

Figura 5-17: Distribuições de tensões passivas para diferentes comprimentos de ficha

Page 126: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

108

Note-se na figura anterior que o formato dos diagramas permaneceu bastante

semelhante aos apresentados na seção 5.2.1. Ou seja, permanece a tendência de

concentração de tensões próximas da linha do passivo no terço superior da ficha,

com subsequente redução em direção ao valor correspondente a K0. Além disso,

apesar de a ficha do modelo F1 ter sido projetada com FS = 1, o diagrama passivo

mobilizado foi menor que o esperado. Isso porque o empuxo passivo mobilizado

pode ser aliviado por meio da subida da sua resultante – que se reflete no equilíbrio

de momentos – e da concentração de força na ancoragem – que se reflete no

equilíbrio de forças.

5.4.2 Influência da ficha nos momentos

A extensão do apoio inferior não está apenas relacionada com a segurança da

estrutura, mas também com o tipo de restrição que resulta da interação com o solo.

Como hipótese básica do MAL tem-se que a extensão da ficha é tal que fornece

restrição completa aos deslocamentos do pé. Essa restrição gera inversão dos

momentos fletores, reduzindo assim o momento máximo positivo no vão central.

Na Figura 5-18 são apresentados os diagramas de momento fletor dos

modelos com diferentes fichas, somente para o caso de solo medianamente

compacto com módulo constante.

Figura 5-18: Momentos fletores nos modelos com diferentes fichas

Page 127: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

109

Pelo fato de o momento máximo positivo não apresentar variação

significativa para os cinco casos, conclui-se que o seu valor praticamente independe

da extensão da ficha. Note-se também que os momentos fletores negativos máximos

aumentaram com os embutimentos. No caso da flexibilidade, os momentos

positivos e negativos variam mais sensivelmente, mas a tendência de restrição não

passa a existir a partir de determinada rigidez.

Apresenta-se na Figura 5-19 a variação do momento máximo com a razão

D/H, para o caso de solo medianamente compacto.

Figura 5-19: Variação do momento máximo com a extensão relativa da ficha

Como se observa, com o aumento da ficha em cerca de 90%, o momento

máximo central reduziu-se não mais que 10% em relação ao valor teórico dado pelo

MAL. Já a diferença entre os modelos com módulo constante e variável foi da

ordem de 5% de Mmáx. Diante disso, o projeto segundo o MAL é

desnecessariamente conservador para os solos de média a baixa compressibilidade,

em virtude do efeito de redução oriundo da flexão da cortina (TERZAGHI, 1954).

5.4.3 Influência da ficha na solicitação das ancoragens

A Figura 5-20 apresenta a variação de Fa com o acréscimo de ficha da

cortina para o caso de solo medianamente compacto.

Page 128: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

110

Figura 5-20: Variação da solicitação da ancoragem com a extensão relativa da ficha

Observa-se que a solicitação da ancoragem diminui com o acréscimo da

ficha. A variação total de Fa para um acréscimo de 86% de D foi da ordem de 40%,

variação semelhante à encontrada no estudo de flexibilidade. Essa redução também

está de acordo com a previsão dos métodos clássicos, já que o MAL fornece

menores valores de Fa que o MAL.

Outro aspecto importante do projeto é que o acréscimo de ficha que se inclui

no projeto para levar em conta efeitos de dragagem excessiva, erosão por correntes

e propulsores etc. favorece o desempenho das ancoragens. Por outro lado, a perda

acidental de ficha pode levar a rupturas do sistema de ancoragem, mesmo que a

resistência passiva seja garantida.

5.4.4 Influência da ficha nos deslocamentos da cortina

O perfil de deslocamentos horizontais da cortina com ficha variável é

apresentado na Figura 5-21, somente para solo medianamente compacto.

Page 129: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

111

Figura 5-21: Perfil de deslocamentos horizontais em modelo com ficha variável

Verifica-se que a deformação máxima no vão central da cortina corresponde

à ficha mais curta, bem como a maior mobilização passiva do solo acima da

ancoragem. Este último explica porque os três menores valores de D/H ofereceram

solicitações na ancoragem maiores que os determinados pela teoria clássica.

Além disso, o modelo com maior ficha, mesmo tendo apresentado dupla

inversão de momento e tensões da ordem de K0 na região do pé, não tangenciou a

linha vertical da estrutura indeformada. Esta última é parte das hipóteses do MAL

(seção 3.1.4). No entanto, se considerarmos a componente de deformação devido à

rotação de corpo rígido, definida pela linha tracejada, notamos que a cortina tem a

tendência de tangenciar essa linha. A hipótese referida, então, pode não ser

verificável na análise tensão-deformação por causa dos deslocamentos globais do

modelo.

Apesar de os modelos F1 a F5 terem If iguais, a deformação oriunda da

flexão foi da ordem de 2 vezes maior para o modelo F1 em comparação ao modelo

F5. Essa diferença está associada com a maior restrição à rotação oferecida pela

ficha mais extensa. Já a diferença entre os modelos com módulo constante e

variável foi desprezível.

Page 130: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

112

6 CONCLUSÕES E SUGESTÕES

6.1 CONCLUSÕES

6.1.1 Sobre o Capítulo 4

Nesse capítulo foram analisados numericamente os ensaios em modelo

reduzido de ROWE (1952). Dois modelos numéricos foram utilizados na análise da

distribuição de tensões na cortina e 18 nas análises de flexibilidade. Os modelos

constitutivos Mohr-Coulomb e Hardening Soil foram usados na modelagem

numérica do solo para as análises de distribuição de tensões, enquanto apenas o

modelo Mohr-Coulomb foi usado nas análises de flexibilidade.

Conclui-se que a redistribuição das tensões nas cortinas ocorre devido ao

giro das tensões principais atuantes no solo. Esse giro de tensões é possibilitado

pela mobilização de atrito entre o solo e a cortina e é responsável tanto pelo

acréscimo de empuxo acima da ancoragem e abaixo da cota de dragagem, como

pela redução de empuxo no vão central da cortina.

As analises numéricas forneceram maiores empuxos laterais e maiores

cargas na ancoragem, porém menores momentos fletores que os observados por

Rowe. Esses empuxos e cargas apresentaram, no entanto, desequilíbrio de

momentos de corpo rígido calculados segundo a configuração indeformada, que

pode ser oriundo dos efeitos de segunda ordem. Esses efeitos não devem ser

menosprezados porque a rotação da cortina pode produzir braços de alavanca de

magnitude apreciável.

Houve pouca diferença entre os resultados das análises com modelos

constitutivos diferentes (Mohr-Coulomb e Hardening Soil), com exceção para as

tensões na região das ancoragens. Nessa região, o modelo Hardening Soil produz

tensões maiores que as tensões obtidas por meio do modelo Mohr-Coulomb,

resultando em cargas superiores nas ancoragens. No entanto, o diagrama de empuxo

ativo de tensões obtido com o modelo Mohr-Coulomb aproximou-se mais do

diagrama obtido por Rowe.

Page 131: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

113

Comparando os diagramas de empuxo passivo, a maior discrepância é notada

no diagrama trapezoidal medido por Rowe. As análises numéricas mostraram

consistentemente diagramas com área maior e de centroide mais elevado. Nessas

análises, o apoio adicional inferior que existe no modelo não pareceu influenciar

nesse aspecto. Outros fatores, não levados em consideração nas análises numéricas,

podem ter se associado para produzir o diagrama passivo observado por Rowe. Por

outro lado, dificuldades na atribuição dos parâmetros de deformação podem ter

influência significativa no formato dos diagramas passivos obtidos numericamente.

Aparentemente, a redução empírica de momentos fletores de ROWE (1952)

pode ser utilizada em projetos correntes, visando à economia no dimensionamento

da seção da cortina. Deve-se, no entanto, ter cautela nos casos de cortinas com vãos

muito grandes e fichas curtas. Pode ser vantajoso utilizar teorias de ruptura (e.g.

BRINCH-HANSEN, 1953) no cálculo de cortinas, visto que essas teorias fornecem

valores da ordem ou menores que os momentos com redução empírica e

permanecem com segurança acima de certos limites inferiores (e.g. Sociedade

Dinamarquesa).

6.1.2 Sobre o Capitulo 5

Esse capítulo apresenta estudo paramétrico de um caso hipotético de cortina

ancorada onde foram avaliados os efeitos da deformabilidade do solo, a

flexibilidade da cortina, a rigidez da ancoragem e a extensão do apoio inferior. As

análises envolveram 6 módulos de deformação do solo, 5 seções comerciais de

cortinas de aço, 5 rigidezes de ancoragem e 5 comprimentos de ficha.

Pode-se concluir que os diagramas de empuxo apresentam concentração de

tensões na região da ancoragem, alívio de tensões no vão da cortina e concentração

de tensões passivas nas proximidades da cota de dragagem, evoluindo em direção à

linha K0 no pé da cortina. Essa distribuição pode ser adequadamente descrita pelos

coeficientes de empuxo propostos por BILGIN (2012).

A redistribuição das tensões no vão da cortina e principalmente na região da

ancoragem é dependente da flexibilidade da estrutura. Ao ser fletida, a cortina

comprime o solo acima da ancoragem, gerando um empuxo com coeficiente

consideravelmente maior que Ka nessa zona. O acréscimo de carga na ancoragem,

devido à concentração de tensões gerada pela flexão da cortina, pode achegar a 35%

em relação àquela calculada pelo Método do Apoio Livre (MAL).

Page 132: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

114

A indeslocabilidade da ancoragem também produz acréscimos significativos

na carga, da ordem de 20-30% do valor calculado segundo o MAL. Por sua vez, o

acréscimo de ficha alivia a solicitação do apoio superior; no entanto, esse alívio não

deve ser levado em conta em projetos cujas premissas incluam a perda acidental de

embutimento da cortina.

Não se recomenda a utilização das curvas de redução da carga da ancoragem

com a flexibilidade propostas por ROWE (1952), já que elas estão condicionadas a

uma deslocabilidade excessiva da ancoragem, realizada manualmente durante os

experimentos.

Os momentos fletores obtidos numericamente estiveram abaixo dos valores

dados pelas curvas de redução de ROWE (1952), concordando com as conclusões

apresentadas na seção 4.4.2, e também com resultados numéricos de outros autores.

Não parece necessário caracterizar a rigidez da ancoragem para a utilização da

redução de momento, já que a mesma se mostrou sem influência significativa. Além

disso, as curvas de redução foram obtidas para a condição mais desfavorável de

momento, que é aquela com maior deslocabilidade da ancoragem.

Na distribuição de momentos, o apoio inferior apenas exerce influência na

magnitude dos momentos negativos, não produzindo diferença nos momentos

positivos. Concorda-se assim com TERZAGHI (1954) que afirmou não ser

vantajoso aplicar-se o Método do Apoio Fixo (MAF) no projeto de cortinas, visto

que a redução do momento devido à flexibilidade da cortina fornece resultados

satisfatórios.

No que se refere aos deslocamentos da estrutura, sua parcela devida à flexão

é preponderantemente determinada pela flexibilidade da estrutura, enquanto a

parcela devida à rotação é determinada pela compressibilidade do solo. A utilização

de módulos variáveis produz maior diferença nesta segunda parcela das

deformações. As ancoragens exercem papel secundário nesse aspecto, cooperando

com a parcela de rotação da cortina em torno do pé (deslocamento do topo). Já a

ficha (apoio inferior) restringe parte das deformações de flexão à medida que

aumenta, pois limita severamente as rotações da seção. Porém, não apresenta

tendência de aumentar a restrição aos deslocamentos do pé como postulado nas

hipóteses básicas do MAF. Acredita-se, no entanto, que isso seja causado pelos

deslocamentos globais do modelo.

Page 133: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

115

6.2 SUGESTÕES PARA OUTRAS PESQUISAS

Sugere-se uma extensão da investigação numérica e/ou experimentalmente

da influência dos efeitos de segunda ordem na interação solo-estrutura de cortinas

flexíveis. Essa investigação pode diferenciar as três origens apresentadas na Figura

4-16, ou estudá-las em conjunto.

Sugere-se também uma investigação de campo, com instrumentação de uma

ou mais cortinas de cais, com o objetivo de colher mais informações sobre:

a) Níveis de deformação típicos dos sistemas de ancoragens utilizados no

Brasil, com o objetivo de aperfeiçoar a modelagem numérica de cortinas

ancoradas;

b) Nível de solicitação das seções em aço das cortinas para verificar se, de

fato, as previsões de momentos mais baixos, dadas pelas análises

numéricas, são realistas;

c) Características dos parâmetros de deformação e resistência dos solos em

obras de portos.

Page 134: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

116

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Page 138: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

120

APÊNDICE 1 – DEDUÇÃO DA EQUAÇÃO DO FS PARA A VARIAÇÃO 2

DO MÉTODO DO APOIO LIVRE

Seja a cortina de geometria indicada abaixo, executada num solo granular

homogêneo seco de peso específico γ, ângulo de atrito ϕ e coeficientes de empuxo

ativo Ka e passivo Kp.

Diagramas de empuxo do problema

Conforme argumentado no item 3.1.3.2, quando obtém-se uma ficha t por

meio da solução da Equação 3-6 e multiplica-se a mesma por um fator Fd com o

objetivo de prover à estrutura uma margem de segurança contra a ruptura do solo na

região passiva, a simples relação

2

2

, t

D

K

KFS

mp

p

(3-8)

não corresponde à realidade, visto que há também um acréscimo de empuxo ativo

(área cdgf).

Page 139: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

121

Hipótese: Todo o acréscimo de empuxo ativo é equilibrado pela resultante

passiva real. Assim, para garantir a estabilidade da estrutura, basta que o diagrama

real mobilizado de empuxo passivo seja igual ao diagrama de empuxo passivo de

cálculo (triângulo abc) mais o diagrama adicional de empuxo ativo (trapézio cdgf).

Segue a dedução do FS real.

cdgfabcaef AAA

Mas,

mpaef KDA ,

2

2

1

pabc KtA 2

2

1

aacdgf KtDtDHKtHDHA 2222'2

2

1''

2

1

Assim,

apmp KtDtDHKtKD 222

,

2 '22

1

2

1

2

1

Resolvendo para Kp,m,

2

222

2

222

,

'2

2

1

'22

1

2

1

D

KtDtDHKt

D

KtDtDHKt

Kap

ap

mp

Agora, com o FS definido de acordo com a relação entre os coeficientes de

empuxo passivo limite e mobilizado, temos:

tDHtDKKt

DK

K

KFS

ap

p

mp

p

'22

2

, (3-9)

Page 140: ESTUDO DA INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA EM CORTINAS …

122

Apresenta-se a seguir uma comparação entre os fatores de segurança real, o

FS calculado pela Equação 3-8 e o FS calculado pela Equação 3-9 (aqui deduzida)

com o uso da teoria de Rankine. Entenda-se por FS real a relação entre os

coeficientes de empuxo limite e mobilizado, calculado a partir do equilíbrio da

cortina. O caso hipotético para comparação é o caso estudado no Capítulo 5, isto é,

uma cortina com altura livre de 10 m, nível d’água a 3 m de profundidade e

sobrecarga de retroárea de 30 kN/m².

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4 4,5 5 5,5 6 6,5 7 7,5 8 8,5

FS

Ficha, D (m)

FS real

FS tradicional (Eq. 3-8)

FS deduzido (Eq. 3-9)

Comparação entre FS calculado e estimado

Note-se que a Equação 3-9, mesmo deduzida para o caso sem sobrecarga e

sem lençol freático, se aproxima muito do FS real, oferecendo uma estimativa

muito mais satisfatória que a relação tradicional (Eq. 3-8). A solução exata da

equação pode ser deduzida para o caso mais genérico, mas a equação aqui obtida

parece ser satisfatória na prática, como demonstrado na comparação.