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GÊNEROS TEXTUA ALUNOS DE UMA UNIVERSIDADE FEDERAL DA B INSTITUTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇ EM LÍNGUA E CULTURA AIS-DISCURSIVOS NA PRODUÇÃ SALA DE APOIO: EM FOCO OS E INTERAÇÃO NEIVA GALLINA MAZZUCO SALVADOR 2014 0 BAHIA ÇÃO ÃO ESCRITA DE ELEMENTOS DE

GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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Page 1: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

GÊNEROS TEXTUAISALUNOS DE UMA SALA DE APOIO:

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAINSTITUTO DE LETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA

GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS NA PRODUÇÃO ESCRITA DE ALUNOS DE UMA SALA DE APOIO: EM FOCO OS ELEMENTOS DE

INTERAÇÃO

NEIVA GALLINA MAZZUCO

SALVADOR 2014

0

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

GRADUAÇÃO

DISCURSIVOS NA PRODUÇÃO ESCRITA DE EM FOCO OS ELEMENTOS DE

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NEIVA GALLINA MAZZUCO

GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS NA PRODUÇÃO ESCRITA DE ALUNOS DE UMA SALA DE APOIO: EM FOCO OS ELEMENTOS DE

INTERAÇÃO

Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura da Universidade Federal da Bahia – UFBA como requisito parcial para obtenção do grau de Doutora em Letras. Orientadora: Profª. Drª. Edleise Mendes

SALVADOR 2014

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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

M478g

Mazzuco, Neiva Gallina

Gêneros textuais-discursivos na produção escrita de alunos de uma sala de apoio: em foco os elementos de interação. / Neiva Gallina Mazzuco. — Salvador, 2014.

298p.

Orientador: Profª. Drª. Edleise Mendes Tese (Doutorado) – Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura. 1. Produção textual. 2. Gêneros textuais-discursivos. 3. Linguagem –

Concepção interacionista. I. Universidade Federal da Bahia. II. Título.

CDD 21.ed.469.07

Ficha catalográfica elaborada por Helena Soterio Bejio – CRB 9ª/965

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3

NEIVA GALLINA MAZZUCO

GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS NA PRODUÇÃO ESCRITA DE ALUNOS DE

UMA SALA DE APOIO: EM FOCO OS ELEMENTOS DE INTERAÇÃO

Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Língua e Cultura da Universidade Federal da Bahia – como requisito parcial à obtenção do título de Doutora.

COMISSÃO EXAMINADORA

_______________________________________________________________ Profª. Drª. Darcilia Marindir Pinto Simões

Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ

________________________________________________________________ Profª. Drª. Sanimar Busse

Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE/Cascavel-PR

_________________________________________________________________ Profª. Drª. Denise Scheyerl

Universidade Federal da Bahia - UFBA

_________________________________________________________________ Prof. Dr. Domingos Sávio Pimentel Siqueira

Universidade Federal da Bahia - UFBA

_________________________________________________________________ Profª. Drª. Edleise Mendes

Universidade Federal da Bahia – UFBA Orientadora

Bahia, 13 de novembro de 2014.

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4

A língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema

linguístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo individual dos falantes.

Bakhtin/Volochinov

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5

DEDICATÓRIA

Dedico o presente trabalho à minha família, especialmente à minha mãe, Anna Maria Gallina, que partiu na metade dessa minha trajetória, e ao meu pai, Anibeli J. Gallina, que há muito tempo já não está mais aqui, os quais me mostraram o caminho da persistência, da responsabilidade e do afeto; ao meu marido Tony e aos meus filhos Marcelo e Augusto, sinônimos de amor e lealdade.

Page 7: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Professora Doutora Edleise Mendes, que, com muito empenho, boa vontade, paciência e eficiência, proporcionou-me valiosíssimas contribuições, análises e reflexões, o que foi fundamental para a produção desta tese. Às Professoras Doutoras Darcilia Simões e Márcia Paraquett, componentes da banca para o Exame de Qualificação, por terem contribuído com significativas análises e sugestões. A todos os integrantes da Banca Examinadora da defesa final, pela atenção e gentil aceite do convite. À Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus de Cascavel, nas suas diferentes instâncias, por ter me oportunizado o afastamento para cursar o doutorado. À Universidade Federal da Bahia por ter me acolhido como aluna especial. Às Professoras Doutoras Célia Marques Telles e Aparecida Feola Sella, coordenadoras do Doutorado Interinstitucional firmado entre a UFBA e a UNIOESTE, realizado em Cascavel, por oportunizar-me o ingresso nesse curso como aluna especial. Ao Professor Dr. Sávio Siqueira, coordenador do curso, que, com muito zelo e dedicação, colaborou para a resolução de muitas questões relacionadas ao curso. Aos secretários Ricardo Luiz dos Santos Junior, da UFBA e Tatiana de Oliveira Borges, da UNIOESTE, por terem me “acolhido”, elegantemente, em infinitos telefonemas e realizado muitos encaminhamentos burocrático-administrativos. A todos os professores do curso, que, com atenção, competência e disponibilidade, muito contribuíram para a minha formação. À querida e dedicada professora da Sala de Apoio, envolvida na pesquisa, pelo caloroso acolhimento e apoio em todas as atividades desenvolvidas. Aos quatorze alunos da Sala de Apoio, alvos da pesquisa, pela abertura, participação e carinho. A todos os profissionais da escola campo de pesquisa pela receptividade e colaboração. Aos colegas do GPPS, principalmente Liliam Faria Porto Borges, Francis Mary Guimarães Nogueira e Maria Lúcia Frizon Rizzotto, pelo apoio recebido desde o início dessa minha longa jornada. Ao meu querido Tony, com quem eu posso contar, incondicionalmente, com sua extrema dedicação e atenção. Aos meus carinhosos e dedicados filhos Marcelo e Augusto, por sempre terem torcido por mim e entendido minhas ausências.

Page 8: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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Às minhas irmãs, irmãos, cunhadas, cunhados, sobrinhas e sobrinhos pelo incentivo e atenção. À atenciosa amiga e colega de trabalho, Professora Doutora Terezinha Costa-Hübes que, gentilmente, há muitos anos, tem sido o meu norte para repensar o ensino da Língua Portuguesa nas séries iniciais do Ensino Fundamental, o que foi decisivo para a direção desse trabalho. À minha grande e especial amiga e colega Eloá Soares Dutra Kastelic, que esteve efetivamente presente em todos os momentos desse curso, com seu apoio e dedicação. À minha querida e sempre disponível amiga e colega Jane Peruzo Iacono, que sempre me acolheu quando precisei. À atenciosa amiga e colega Margarete Aparecida Nath Braga, com quem dividi muitos e importantes momentos desse curso. À Rosana Becker, amiga e colega que, com muita atenção, há muitos anos tem me apoiado e aberto possibilidades para novas análises no ensino de Língua Portuguesa. Aos demais colegas do DINTER, pela convivência, carinho e aprendizado. A todos os amigos e amigas pelo incentivo e carinho de sempre. Ao Douglas Corrêa da Rosa, que, sempre atencioso, colaborou com informações técnicas e fez a revisão deste trabalho. À Maria Rosa da Silva Meireles, minha secretária, que, com sua dedicação, possibilitou que eu estivesse disponível para a realização deste desafio.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ASSOESTE Associação Educacional do Oeste do Paraná

CELEM Centro de Estudos de Línguas Estrangeiras Modernas

CIEP Centros Integrados de Educação Pública

CEMIC Centro de Estudos do Menor e Integração na Comunidade

CT Conselho Tutelar

DEB Departamento de Educação Básica

DCE Diretrizes Curriculares da Educação Básica

LA Linguística Aplicada

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LP Língua Portuguesa

NRE Núcleo Regional de Educação

PAC II Posto de Atendimento Continuado II

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

SAN Programa de Segurança Alimentar e Nutricional

SD Sequência didática

SEED Secretaria de Estado da Educação

SUED Superintendência da Educação

UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paraná

Page 10: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Texto aluno D ................................................................................................. 122

Figura 2 – Texto aluno N ............................................................................................... 123

Figura 3 – Texto aluno H ............................................................................................... 133

Figura 4 - Texto aluna J ................................................................................................ 134

Figura 5 – Texto aluna E ................................................................................................ 135

Figura 6 – Texto aluno B ............................................................................................... 136

Figura 7 – Texto aluna J ................................................................................................ 139

Figura 8 – Texto aluno B ............................................................................................... 140

Figura 9 – Texto aluno M............................................................................................... 141

Figura 10 – Texto aluno M............................................................................................. 142

Figura 11 – Texto aluno C ............................................................................................ 144

Figura 12 – Texto aluna F ............................................................................................. 145

Figura 13 – Texto aluna A ............................................................................................. 146

Figura 14 – Texto aluna A ............................................................................................. 147

Figura 15 – Texto aluno H ............................................................................................. 148

Figura 16 – Texto aluno M............................................................................................. 149

Figura 17 – Texto aluno D ............................................................................................. 151

Figura 18 – Texto aluna A ............................................................................................. 152

Figura 19 – Texto aluno C ............................................................................................. 153

Figura 20 – Texto auna E ............................................................................................... 154

Figura 21 – Atividade de ortografia ............................................................................... 156

Figura 22 – Atividade de cruzadinha de palavras .......................................................... 157

Figura 23 – Texto aluna E .............................................................................................. 159

Figura 24 – Texto aluna F .............................................................................................. 160

Figura 25 – Texto aluna F .............................................................................................. 161

Figura 27 – Texto aluno C ............................................................................................. 162

Figura 28 – Carta aluna F ............................................................................................... 172

Figura 29 – Convite aluna E........................................................................................... 175

Figura 30 – Convite aluno B .......................................................................................... 177

Figura 31 – Reportagem aluna K ................................................................................... 182

Figura 32 – Reportagem aluno J .................................................................................... 184

Figura 33 – Reportagem aluno D ................................................................................... 186

Page 11: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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Figura 34– Cartão de Felicitação aluna C ...................................................................... 188

Figura 35 – Cartão de Felicitação aluna F ..................................................................... 189

Figura 36 – Panfleto produzido pela aluna A................................................................. 190

Figura 37 – Orientações para a produção de um Pedido ................................................ 192

Figura 38 - Pedido elaborado pela aluna K ................................................................... 193

Figura 39 – Texto de divulgação científica produzido pela aluna E.............................. 196

Figura 40 – Texto de divulgação científica produzido pela aluna J .............................. 198

Figura 41 – Artigo de Opinião produzido pela aluna A ................................................. 200

Page 12: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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RESUMO Este trabalho, desenvolvido no campo da Linguística Aplicada, partiu da preocupação com a problemática de que muitos dos alunos que se encontram na faixa intermediária entre a primeira e a segunda fase do Ensino Fundamental podem ser considerados semialfabetizados, os quais, muitas vezes, são vítimas de um ensino de Língua Portuguesa que prioriza o treino ortográfico e normativo da linguagem, o que pouco contribui para que eles se apropriem da linguagem escrita para utilizá-la em diferentes situações de uso. A partir dessa inquietação, esta pesquisa, um estudo de caso de cunho qualitativo e enriquecido por procedimentos advindos da etnografia, tem por objetivo geral compreender como se desenvolve o processo de construção e a natureza dos textos produzidos por uma turma de alunos de uma Sala de Apoio de quinta série (hoje sexto ano), viabilizando um encaminhamento teórico-metodológico alternativo, que possa contribuir com o trabalho do professor nesse contexto de ensino, cujo tema pode ser sintetizado nos aspectos interacionais dos gêneros textuais-discursivos em uma Sala de Apoio de quinta série. Nesse horizonte, desenvolvi uma pesquisa de campo em duas etapas. Na primeira, observei/participei de 36 horas-aula de Língua Portuguesa nessa Sala de Apoio, bem como investiguei o contexto do campo de pesquisa, participando do cotidiano escolar para além dessa sala, bem como coletando materiais afins. Na segunda etapa, desenvolvi um trabalho de intervenção durante 60 horas-aula nessa mesma sala, tendo como norte duas unidades de trabalho que elaborei a partir de gêneros textuais-discursivos, na perspectiva bakhtiniana e bronckartiniana, entendendo que esses gêneros são viabilizados pela concepção interacionista de linguagem. As atividades, para isso, aproximaram-se das sequências didáticas, conforme metodologia proposta por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010). Essa intervenção culminou na produção de um jornal da escola, o que, de forma significativa, explicitou e destacou a função social da escrita para os alunos, haja vista que colocou muitos de seus textos referentes a diferentes gêneros textuais-discursivos em efetiva situação de interlocução, os quais foram amplamente analisados, com eles, sobretudo nos aspectos dialógicos. Destaco que, embora esses textos continuassem apresentando problemas em sua organização linguística, a partir da produção do referido jornal, os alunos passaram a elaborá-los para um ou mais interlocutor(es) previamente definido(s), tendo um motivo para fazê-lo, ou seja, escreviam porque, de fato, tinham algo a dizer a uma ou mais pessoa(s), portanto, seus textos apresentavam potencial sociodiscursivo e interacional. Também evidencio que a professora participante dessa pesquisa teve a oportunidade de refletir, teórico-metodologicamente, sobre diferentes concepções de linguagem, sobremaneira sobre a concepção interacionista viabilizada pelos gêneros textuais-discursivos, o que a levou a rever muitos de seus encaminhamentos metodológicos, passando, por exemplo, a preparar, intensamente, as produções escritas por meio da oralidade e a suavizar o processo de avaliação dessas produções, entendendo que o “erro” faz parte do processo normal de avanço na aprendizagem. Enfim, essas mudanças contribuíram para que ela se sentisse mais segura frente a um trabalho com a produção de textos com propósitos interacionais, e, consequentemente, para enriquecer nossa formação docente. PALAVRAS-CHAVE: Produção textual. Gêneros textuais-discursivos. Concepção interacionista de linguagem.

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ABSTRACT

This research work, conceived in the field of Applied Linguistics, started out from a concern about the fact that many students who are somewhere between first and second grades of Elementary School in Brazil can be taken as semi-illiterate, being constant victims of the teaching of Portuguese as a discipline that prioritizes orthographic and normative training of the language, which, in turn, is very poor to enhance students’ skills when it comes to using writing skills in different contexts of usage. From this urge to work on the problem, this work, a case study of qualitative nature enhanced by procedures brought from ethnography, has as its main objective to understand how the process of construction and the nature of texts produced by a “Remedial Class” for fifth graders (currently “sixth year” of Elementary School) unfold, making it possible for an alternative theoretical and methodological approach which may contribute to the teacher's job in such a context. The theme can be synthesized in the interactional aspects of textual and discursive genres in the aforementioned Remedial Class. Under such a horizon, I have developed the work in two phases. In the first one, there was participation and observation of 36 classes of Portuguese in this remedial class, while investigating the context of the research field, taking part in the everyday activities of the school even outside the classroom, collecting data and materials. In the second phase, I have conducted an intervention work for 60 class hours in the very same classroom, being guided by two instructional units I created based on the theory of textual and discursive genre under the views of two authors, Bakhtin and Bronckart, having in mind that these genres are viable through the interactionist concept of language. For that to take place, the activities were designed as close as possible to didactic sequences, following the methodology proposed by Dolz, Noverraz, and Schneuwly (2010). This intervention led to the production of a school newspaper in which, in a very meaningful way, demonstrated and highlighted to students the social function of writing, considering that it has placed many of their texts referring to different writing-speaking genres in effective internarrating situations, broadly analyzed with them, especially in the aspects of dialogue. It is relevant to emphasize that although these texts still depicted problems in terms of linguistic organization, after the development of the aforementioned newspaper, the students started to create them having in mind one or more interlocutors previously defined, having a reason to do so. In other words, they wrote because, in fact, they actually had something to say to someone. So, their texts held a socio-discursive and interactional potential. It is equally important to highlight that the host teacher in this research had the opportunity to reflect, both theoretically and methodologically, about different conceptions of language, especially the interactionist one, made viable by the textual-discursive genres. This has led her to review several of her methodological strategies, deciding, for instance, to intensely prepare the written works through orality and soften the evaluation process of such production, concluding the “the mistake” is part of the regular development in the learning process. In sum, these changes have contributed to make her feel more secure before the work with text production based on interactional purposes, and, consequently, to enrich our teaching formation. KEYWORDS: Text production. Written-spoken genres. Interacionist conception of language.

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SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 – SITUANDO A INVESTIGAÇÃO ............................................................. 16

1.1 O TEMA E A BASE TEÓRICA................................................................................................ 16

1.2 AS SALAS DE APOIO – O CONTEXTO DA PESQUISA ................................................. 18

1.3 ANTECEDENTES DA PESQUISA ......................................................................................... 20

1.4 PERGUNTAS DE PESQUISA .................................................................................................. 24

1.5 OBJETIVOS ................................................................................................................................. 25

1.5.1 Geral ............................................................................................................................... 25

1.5.2 Específicos ...................................................................................................................... 25

1.6 ORIENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA.................................................................... 25

1.7 CENÁRIO E SUJEITOS DA PESQUISA .............................................................................. 32

1.8 INSTRUMENTOS PARA A GERAÇÃO DE DADOS ......................................................... 38

1.8.1 Diário de campo ............................................................................................................. 38

1.8.2 Questionário à professora ............................................................................................ 39

1.8.3 Entrevistas ...................................................................................................................... 39

1.9 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................................ 40

1.9.1 Primeira etapa da pesquisa de campo: observação/participação de aulas e conhecimento do campo ......................................................................................................... 40

1.9.2 Segunda etapa da pesquisa de campo: desenvolvimento de uma proposta de trabalho/intervenção em uma Sala de Apoio ....................................................................... 44

1.9.3 Participações paralelas à intervenção ......................................................................... 45

1.10 ORGANIZAÇÃO DA TESE ................................................................................................... 48

CAPÍTULO 2 – CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: FOCO NA PRODUÇÃO TEXTUAL ..................................................... 50

2.1 O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA À LUZ DE CONCEPÇÕES TRADICIONAIS DE LINGUAGEM..... . ..................................................................................... 50

2.2 A CONCEPÇÃO INTERACIONISTA DE LINGUAGEM: OUTRO HORIZONTE PARA AS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA ...................................................................... 56

2.3 A PRODUÇÃO ESCRITA NA ESCOLA: “O QUE SE FAZ” E “O QUE SE QUER FAZER”? ............................................................................................................................................. 64

CAPÍTULO 3 – GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS, ENSINO E PRODUÇÃO ESCRITA ................................................................................................................................ 77

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3.1 GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS COMO VIABILIZADORES DE INTERAÇÃO: UM POSSÍVEL CAMINHO? ............................................................................... 77

3.2 TIPOS E GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS ............................................................... 87

3.3 GÊNEROS DA ESFERA JORNALÍSTICA: ALGUMAS REFLEXÕES ......................... 90

3.4 UMA PROPOSTA METODOLÓGICA DE TRABALHO COM OS GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS: SEQUÊNCIA DIDÁTICA ........................................................... 98

3.5 ATIVIDADES DE ESTRUTURAÇÃO DA LÍNGUA SUBJACENTES ÀS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS ......................................................................................................... 106

CAPÍTULO 4 – O COTIDIANO DA SALA DE APOIO, ANÁLISE DAS PRODUÇÕES ESCRITAS E INTERVENÇÃO ......................................................................................... 111

4.1 REFLEXÕES A PARTIR DA OBSERVAÇÃO/PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DA SALA DE APOIO ............................................................................................................................ 111

4.1.1 O dia a dia da Sala de Apoio observada .................................................................... 111

4.1.2 Relação dos alunos com a produção escrita .............................................................. 126

4.1.3 Um primeiro olhar para as produções escritas dos alunos/encaminhamentos metodológicos ........................................................................................................................ 130

4.2 REFLEXÕES A PARTIR DA INTERVENÇÃO REALIZADA NA SALA DE APOIO/PRODUÇÃO TEXTUAL ................................................................................................. 164

4.2.1 Encaminhamentos metodológicos que nortearam as produções textuais dos alunos ................................................................................................................................................ 165

4.2.2 Análise das produções textuais dos alunos ................................................................ 169

4.2.2.1 Carta de solicitação de patrocínio ............................................................................... 170

4.2.2.2 Convites ...................................................................................................................... 173

4.2.2.3 Roteiros de entrevista ................................................................................................. 178

4.2.2.4 Reportagens ................................................................................................................ 181

4.2.2.5 Cartões de felicitação.................................................................................................. 187

4.2.2.6 Panfleto ....................................................................................................................... 189

4.2.2.7 Pedido de doação ........................................................................................................ 191

4.2.2.8 Textos de divulgação científica .................................................................................. 193

4.2.2.9 Artigo de opinião ........................................................................................................ 199

4.2.3 Reflexões sobre as ações de intervenção nas atividades de produção escrita ........ 201

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 207

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 214

APÊNDICES ......................................................................................................................... 222

Page 16: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

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APÊNDICE A - INFORMAÇÕES/CARACTERÍSTICAS DOS ALUNOS DA SALA DE APOIO ............................................................................................................................................... 223

APÊNDICE B - QUESTIONÁRIO À PROFESSORA DA SALA DE APOIO ..................... 229

APÊNDICE C - ROTEIRO PARA A ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA/CONVERSA COM OS ALUNOS ....................................................................... ..................................................235

APÊNDICE D - ROTEIRO PARA A ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA COM A PROFESSORA ................................................................................................................................. 236

APÊNDICE E – PRIMEIRA UNIDADE PARA A INTEVENÇÃO ....................................... 238

APÊNDICE F – SEGUNDA UNIDADE PARA A INTERVENÇÃO ..................................... 255

ANEXOS ............................................................................................................................... 277

ANEXO A - JORNAL DA ESCOLA ............................................................................................ 278

ANEXO B - PANFLETO ELABORADO PELOS ALUNOS ................................................... 291

ANEXO C - CERTIFICADO DE CURSO REALIZADO ......................................................... 293

ANEXO D – TABELA DIAGNÓSTICA ..................................................................................... 295

ANEXO E - CERTIFICADO DE APRESENTAÇÃO DE TRABALHO ............................... 297

Page 17: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

16

CAPÍTULO 1 – SITUANDO A INVESTIGAÇÃO

1.1 O TEMA E A BASE TEÓRICA

Muitos professores de Língua Portuguesa, tanto do Ensino Fundamental quanto do

Ensino Médio, têm priorizado, em suas aulas, o desenvolvimento de atividades que objetivam

oportunizar ao aluno o domínio ortográfico e normativo da língua, em detrimento ao trabalho

com a produção de textos relacionada a situações de uso, o que leva ao entendimento, por

parte do aluno, de que escrever bem é escrever sem erros ortográficos e obedecer às regras da

gramática normativa. As poucas produções escritas, realizadas na escola, vêm sendo

exercitadas aleatoriamente, sem um objetivo para a sua realização, que não seja o exercício da

língua padrão. Para Antunes (2003, p. 50), normalmente tais produções correspondem a

[...] uma escrita uniforme, sem variações de superestrutura, de organização, de sequência de suas partes, [...] uma escrita sem função, artificial, mecânica, inexpressiva, descontextualizada, convertida em puro treino e exercício escolar, que não estimula nem fascina ninguém, pois se esgota nos reduzidos limites das próprias paredes escolares.

Nessas situações, a redação1 sobre temas aleatórios e pouco significativos tem sido,

praticamente, o único momento de produção escrita de texto na escola, a qual, normalmente, é

vazia, estéril, sem sentido e realizada esporadicamente. Em alguns contextos, limitando ainda

mais, tem sido praticada a escrita de frases soltas, artificiais, descontextualizadas, criadas,

sobretudo, para serem utilizadas, pelo aluno, para reconhecerem as unidades gramaticais, suas

nomenclaturas e classificações. Todavia, essa modalidade de escrita só existe na escola e,

conforme Antunes (2003), inibe a produção do aluno.

Esse encaminhamento aponta para a ausência do entendimento de que as línguas só

existem, segundo a autora, para viabilizarem a interação entre as pessoas, o que requer a

existência do outro para o exercício da linguagem2, não só a oral, mas também a escrita, pois

1 Para os meus destaques e para a fala de alunos e professores, utilizo, no presente trabalho de tese, o modo itálico. 2 A linguagem, neste trabalho, é compreendida como toda forma de manifestação humana que permite a interação entre os sujeitos. Exemplos: linguagem oral e escrita, não verbal (cores, gestos, movimentos, figuras etc). Por isso, ao referir-me à língua oral e/ou escrita, tratá-las-ei como linguagem.

Page 18: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

17

quem escreve o faz pensando em um destinatário, em um interlocutor. Conforme Antunes

(2003, p. 46), “[...] quem escreve, na verdade, escreve para alguém, ou seja, está em interação

com outra pessoa. Essa outra pessoa é a medida, é o parâmetro das decisões que devemos

tomar acerca do que dizer, do quanto dizer e de como fazê-lo.” Afinal, para escrever bem um

texto, é preciso saber qual o motivo para produzi-lo, qual o seu objetivo, cujo

encaminhamento coaduna-se com a concepção interacionista de linguagem, a qual é, ainda,

pouco empregada/assumida pelos professores de Língua Portuguesa.

Tomando essas reflexões como parâmetro, o tema dessa pesquisa se define como Os

aspectos interacionais dos gêneros textuais-discursivos em uma Sala de Apoio.

Nesse horizonte, entendo que uma das formas de concretizar a referida concepção é

pelos gêneros textuais-discursivos3, os quais compreendo numa perspectiva bakhtiniana e

bronckartiniana, como enunciados “relativamente estáveis” (BAKHTIN, 2011, p. 262), que

organizam nosso discurso em função de uma necessidade de interação. Na mesma direção, os

gêneros são, para Bronckart (1999), textos sociais. Nas palavras do autor (BRONCKART,

1999, p. 75):

Chamamos de texto toda unidade de produção de linguagem situada, acabada e auto-suficiente (do ponto de vista da ação ou da comunicação). Na medida em que todo texto se inscreve, necessariamente, em um conjunto de textos ou em um gênero, adotamos a expressão gênero de texto em vez de gênero de discurso. (Grifos do autor).

Compartilhando dessa compreensão de linguagem e reconhecendo os gêneros

textuais-discursivos como um importante instrumento para o ensino da língua, mais

especificamente da produção textual, efetivei uma intervenção, em uma Sala de Apoio à

Aprendizagem4 de quinta série (sexto ano)5, a partir da exploração de alguns desses gêneros

3 Embora reconheça que o termo “gênero do discurso/discursivo” relaciona-se à teoria bakhtiniana; logo, aos preceitos do interacionismo; e que o termo “gêneros de texto/textuais” foi cunhado por Bronckart (1999), amparado nos preceitos do interacionismo sociodiscursivo, os abordarei lado a lado, por reconhecer que há uma certa dialogicidade entre essas vertentes e seus seguidores. Além disso, texto e discurso são faces de um mesmo fenômeno, que é o do uso da linguagem situada em práticas de interação e de comunicação. Usar, portanto, a denominação gêneros textuais-discursivos marca o fato de que olhamos para o fenômeno da interação pela linguagem em seu aspecto mais amplo. 4 No presente trabalho, as Salas de Apoio à Aprendizagem são denominadas Salas de Apoio, tal como são chamadas no cotidiano das escolas estaduais do Paraná. 5 Embora a partir de 2012 já não exista mais quinta série, a qual corresponde ao atual sexto ano, neste trabalho assumo essa denominação, haja vista que o ano de 2011, no qual realizei a pesquisa de campo ora analisada, foi o último ano de sua existência e, portanto, era a procedência dos alunos da Sala de Apoio, alvo da pesquisa em questão.

Page 19: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

18

na produção de um jornal da escola (vide anexo A)6. Os alunos participaram em todos os

momentos para a sua viabilização, desde os primeiros contatos, por escrito, para a obtenção de

patrocínio para o referido jornal, até a divulgação de espaço para publicações nesse veículo,

via elaboração e distribuição de panfletos (anexo B), dentre muitas outras atividades descritas

na segunda parte do último capítulo.

Assim, a presente pesquisa, situada no âmbito da Linguística Aplicada (LA,

doravante), busca contribuir para a amenização da problemática exposta, indo ao encontro de

muitas pesquisas realizadas nesse campo, nos últimos vinte anos, na área de ensino e

aprendizagem de Língua Portuguesa, tanto com preocupações voltadas ao desenvolvimento da

escrita quanto ao trabalho com os gêneros textuais-discursivos.

Objetivando mostrar meu compromisso com esta pesquisa, explicito que compreendo

a LA conforme Cavalcanti (1990), reconhecendo-a como uma área de investigação de

domínio próprio, cujo escopo centra-se em identificar e em analisar questões de linguagem na

prática, dentro ou fora do contexto escolar, que sugere encaminhamentos. Essa compreensão

vai na direção da defesa de Moita Lopes (1996), ao considerar que a LA é uma área de

investigação aplicada, mediadora, interdisciplinar, centrada na resolução de problemas de uso

da linguagem, ou seja, que se volta para o estudo da língua em sua ação efetiva, reconhecendo

a linguagem como prática social.

1.2 AS SALAS DE APOIO – O CONTEXTO DA PESQUISA

As Salas de Apoio foram implantadas nas quintas séries das escolas estaduais do

Paraná no ano de 2004 e, no ano de 2011, também nas oitavas séries (nono ano)7, com o

objetivo de trabalhar, no contraturno, as dificuldades apresentadas pelos alunos referentes à

aquisição dos conteúdos de oralidade, leitura e escrita, bem como alguns conteúdos básicos da

Matemática não apropriados nas séries iniciais do Ensino Fundamental (PARANÁ, 2010a).

Nesse viés, a Resolução 371/2008 (PARANÁ, 2012a, p. 1) considera, entre outros aspectos:

6 Para preservar o nome dos alunos da Sala de Apoio investigada, bem como o da professora, o da escola e de outros profissionais que nela trabalhavam e que estiveram diretamente envolvidos com a pesquisa, mesmo prejudicando a estética, encobri tais dados nesse anexo. 7 “Poderão ser solicitadas autorizações para funcionamento de salas de apoio à aprendizagem para o 7º ano/6ª série e 8º ano/7ª série, mediante justificativa fundamentada da escola que, após parecer do NRE, será analisada pelo DEB/Coordenação de Educação Integral” (PARANÁ, 2012b, p. 2).

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19

[...] a necessidade de dar continuidade ao processo de democratização, de universalização do ensino e garantir o acesso, a permanência e a aprendizagem efetiva dos alunos; o princípio da flexibilização, disposto na LDBEN nº 9.394/96, segundo o qual cabe ao sistema de ensino criar condições possíveis para que o direito à aprendizagem seja garantido ao aluno.

Os coordenadores das Salas de Apoio, integrantes da Secretaria Estadual de

Educação do Paraná (PARANÁ, 2012b), entendem que os alunos beneficiados por essas salas

passarão a ter mais condições de acompanhar o trabalho desenvolvido por seus colegas no

turno regular de aulas, melhorando, assim, a qualidade da educação, de forma que o índice de

repetência seja reduzido. Para isso, as turmas não podem ultrapassar o número de vinte

alunos, as aulas devem ocorrer em espaço físico adequado, bem como serem coerentes com o

Projeto Político Pedagógico da escola. A carga horária de cada disciplina deve ser de quatro

aulas semanais, distribuída em dois dias, não consecutivos, e sendo elas geminadas.

Conforme afirmações desses coordenadores, a metodologia utilizada durante as aulas

deve considerar as necessidades do aluno, inclusive com atividades diferentes das que ele

realiza no período comum de aula. Para esse trabalho, os professores dessas turmas contam,

ou deveriam contar, com a assessoria da direção e da equipe pedagógica das escolas em que

são docentes, bem como são convidados a participar de encontros promovidos pelo Núcleo

Regional de Educação afeto para esclarecer os objetivos do programa e tirar dúvidas quanto

às especificidades dos encaminhamentos metodológicos.

A necessidade da existência das Salas de Apoio, inicialmente nas quintas séries, se

justifica, em parte, no fato de que muitos alunos chegam a essas séries apresentando muitas

dificuldades em relação à leitura e à escrita, inclusive, alguns são considerados

semialfabetizados, além de apresentarem dificuldades também sobre conceitos elementares de

Matemática. No entanto, a pesquisa aqui realizada limitou-se à disciplina de Língua

Portuguesa, com ênfase na produção escrita.

Muitas vezes, essa situação é decorrente de uma precária formação dos respectivos

professores, que acabam adotando, para o encaminhamento de suas aulas, uma concepção de

linguagem que pouco privilegia o contato do aluno com a efetiva utilização da língua,

limitando-se ao exercício de cópias e de atividades mecânicas e repetitivas de letras, sílabas e

palavras, bem como buscando a memorização de regras gramaticais ou escrevendo textos para

ninguém. Nessa direção, pode-se dizer que ainda há duas concepções de linguagem bastante

presentes no norte de muitas aulas de Língua Portuguesa: a linguagem como expressão do

pensamento e linguagem como instrumento de comunicação, conforme explanação no

capítulo 2 do presente trabalho de tese.

Page 21: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

20

1.3 ANTECEDENTES DA PESQUISA

Como pedagoga e supervisora de educação, lotada na Secretaria Municipal de

Educação de Cascavel durante seis anos, posteriormente como assessora pedagógica da

Associação Educacional do Oeste do Paraná - ASSOESTE, durante quatorze anos e como

professora do curso de Pedagogia, há treze anos, sobretudo como orientadora de Estágio

Supervisionado sob a forma de Prática de Ensino, tive a oportunidade de acompanhar diversos

problemas relacionados à produção escrita de alunos do Ensino Fundamental. Dentre eles,

destaco o ponto de estrangulamento que geralmente ocorre na quinta série/sexto ano,

momento em que o índice de reprovação e mesmo de evasão escolar é elevado, paralelamente

à constatação de que diversos alunos que estão nessa série/ano são, praticamente,

semialfabetizados e, por isso, muitos deles são encaminhados a uma Sala de Apoio.

Entendo que compreender essa problemática e pensar em avanços rumo à sua

solução é uma forma de contribuir, particularmente, para a docência de algumas disciplinas do

curso de Pedagogia, principalmente Estágio Supervisionado sob a forma de Prática de Ensino,

Teoria e Prática do Ensino de Língua Portuguesa, Alfabetização e Letramento, as quais,

inclusive, carecem, urgentemente, de um redimensionamento.

Observo que ver a concretização de um novo direcionamento teórico-metodológico

para essas disciplinas, na perspectiva de preparar melhor os pedagogos para introduzirem os

alunos da primeira fase do Ensino Fundamental no mundo da escrita, é um anseio de longa

data de todos os profissionais da educação comprometidos com a formação de um aluno que,

efetivamente, esteja preparado para utilizar a escrita em diferentes situações do cotidiano.

Essa proposta contribuiria para a superação da prática de o professor fazer de conta que ensina

o aluno a produzir textos e de este fazer de conta que aprende.

Também considero urgente a necessidade de repensar a articulação entre os cursos de

formação de professores na área de Letras e de Pedagogia, pois entendendo que tais cursos

devem ser planejados na direção de, efetivamente, contribuir para que os alunos do Ensino

Fundamental dominem o mundo da escrita, a fim de prepará-los para utilizar-se dela quando

necessário.

Vejo, ainda, a ausência de continuidade dos conteúdos de uma série para outra, de

uma etapa para outra, em relação ao domínio da escrita, bem distante de um processo sem

rupturas da primeira para a segunda fase do Ensino Fundamental. Esse encaminhamento

requer que os professores, formados por esses dois cursos, tenham muitos objetivos comuns e

que um entenda da especificidade do outro para conseguir contribuir com o avanço do aluno,

Page 22: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

21

independente de como ele esteja fazendo suas produções escritas ou de como seja o seu

aproveitamento nessa disciplina de um modo geral.

Essa constatação contempla a preocupação dos professores de Língua Portuguesa da

segunda fase do Ensino Fundamental, ao considerar que os professores da primeira fase,

geralmente pedagogos, são pouco preparados, em sua graduação, para a docência dessa

disciplina. Contudo, também evidencia, por sua vez, que muitos professores da segunda fase

apresentam dificuldades para recuperar as defasagens de conteúdos relacionadas às questões

iniciais da escrita.

Analisando a crítica aos professores da primeira fase, reconheço que, na verdade, em

muitos cursos de Pedagogia existem sérias lacunas na área das disciplinas mais diretamente

relacionadas ao preparo do futuro professor para a docência, a exemplo de Teoria e Prática do

Ensino de Língua Portuguesa e de Teoria e Prática do Ensino da Educação Matemática.

Contudo, mesmo que nesses cursos houvesse maior carga horária destinada a essas

disciplinas, a fim de aprofundar outros conteúdos, não possibilitaria que tais pedagogos se

tornassem especialistas em todas elas, aliás, esse não é o objetivo desse curso.

Comumente essa situação é tomada, pelos professores da segunda fase do Ensino

Fundamental, graduados em Letras, como a principal causa do fracasso do aluno na disciplina

de Língua Portuguesa, os quais utilizam frases como: “Os professores de primeira à quarta

série não dominam os conteúdos de Língua Portuguesa, portanto, não estão preparados para

ensinar tais conteúdos a seus alunos”; “Os alunos já chegam na 5ª série/6ºano assim,

fraquinhos de conteúdo, sem saber escrever, foram mal alfabetizados, vieram sem base

alguma, não posso fazer milagre etc.”8

De certa forma, os professores, ao fazerem tais observações, já estão anunciando que,

dificilmente, os alunos que apresentam dificuldades na escrita serão bem sucedidos na

respectiva disciplina e, com isso, alguns podem nem se comprometer efetivamente para que

eles avancem.

Não obstante, conforme relatos procedentes de coordenadores pedagógicos ou de

professores dos cursos de Letras e de Pedagogia, ouvidos, principalmente, durante os contatos

realizados quando do desenvolvimento da disciplina Prática de Ensino sob a forma de Estágio

Supervisionado, mesmo os professores que se empenham para que esse avanço ocorra, muitas

vezes organizam suas aulas com predomínio de encaminhamentos mecânicos, relacionados ao

8 Relatos informais realizados durante o recreio das duas manhãs em que eu permanecia na escola campo de pesquisa ou quando da realização dos respectivos Conselhos de Classe, bem como durante os intervalos de um curso que participei, destinado a professores da Sala de Apoio, em 2011.

Page 23: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

22

treino ortográfico e à exercitação da gramática normativa. De forma semelhante, a

compreensão de textos é conduzida por questões óbvias, cujas respostas são facilmente

localizadas nos respectivos textos, inclusive, muitas vezes, com a benevolência do professor

que até indica onde inicia e termina cada resposta. Assim, a leitura e a interpretação, exigindo

pouca reflexão, reduz-se ao que é exigido nas atividades mais simples como o jogo dos sete

erros ou caça-palavras.

A produção de textos, nessas aulas, ainda é uma atividade muito rara, ocorrendo mais

nos ínfimos momentos de avaliação e em parcas situações pouco relacionadas à utilização da

escrita com um propósito funcional. Dificilmente eles são reestruturados observando os

critérios de coesão, de estilo, de coerência ao propósito comunicacional etc. Aliás, o que os

professores chamam de reestruturação de texto, normalmente, são momentos em que o aluno

higieniza o seu texto, isto é, passa sua produção a limpo, corrigindo, sobretudo, os erros

ortográficos, de pontuação ou outros secundários a uma situação de interação, os quais são

assinalados pelo professor, geralmente com caneta vermelha, cuja utilização dessa cor ainda

representa uma atitude autoritária.

São esses professores, com essa prática, em sua maioria, e formados em Letras, que

assumem as Salas de Apoio, nas quais se encontram alunos com muitas dificuldades na

produção escrita e, entre eles, conforme já afirmei, muitos são até considerados

semialfabetizados. Se, por um lado, esses professores têm maior domínio da especificidade da

disciplina de Língua Portuguesa, por outro, praticamente não tiveram acesso, em sua

formação, aos pressupostos teóricos e metodológicos da alfabetização, necessários para

entender e reencaminhar muitos problemas desses alunos em relação ao domínio da produção

de textos. Essa situação levanta a polêmica sobre a formação do professor que deveria

assumir tais turmas: se o formado em Letras ou o formado em Pedagogia, considerando que o

principal objetivo da disciplina de Língua Portuguesa é oportunizar ao aluno um efetivo

contato com a linguagem em situações reais de uso.

Ressalto que esse profissional, além de precisar estar preparado para assumir

tamanho desafio em relação à defasagem ensino-aprendizagem de tais alunos, também deve

ser sensível para entendê-los e ajudá-los no processo de mudanças que enfrentam na

passagem da primeira para a segunda fase do Ensino Fundamental, haja vista que, na

primeira, eles contavam com um único professor que conhecia profundamente suas

dificuldades em relação ao domínio dos conteúdos escolares.

Lembro que, na primeira fase, os professores bem preparados e comprometidos com

os alunos encaminham as atividades a serem desenvolvidas na sala de aula num continum, na

Page 24: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

23

perspectiva da interdisciplinaridade, ao passo que, a partir da segunda fase, esses alunos

passam a ter vários professores, muitos dos quais têm pouco contato até com a escola, visto

que, para completar a sua carga horária, precisam assumir aulas em vários colégios, o que

dificulta a criação de um vínculo, tanto com a escola como um todo, quanto com os alunos,

em particular. Inclusive, essa situação dificulta que o professor se sinta um efetivo integrante

de cada instituição em que trabalha, bem como que se envolva nas atividades fora da sala de

aula, como reuniões pedagógicas, Conselhos de Classe, entrega de boletins, comemorações na

escola, ou que tenha outros contatos com pais e/ou responsáveis de alunos.

É importante retomar a informação de que, nas quintas séries/sextos anos, há um

grande índice de alunos mal sucedidos quanto ao aproveitamento dos conteúdos,

principalmente na disciplina de Língua Portuguesa, muitos dos quais chegam à reprovação.

Essa situação, além de evidenciar uma ruptura no processo de ensino aprendizagem,

desencadeia um sentimento de revolta e uma sensação de fracasso por parte dos alunos, que

passam a necessitar, ainda mais, de professores comprometidos com seu aprendizado e, ao

mesmo tempo, sensíveis a esse problema. Portanto, esses profissionais, além de serem

competentes no encaminhamento dos conteúdos que devem ser ministrados em suas aulas,

precisam ser capazes de elevar a autoestima desses alunos, pois, além de eles se

discriminarem, são discriminados por seus colegas, profissionais da escola e familiares.

Assim, com base em Vygotsky (1998), os professores deveriam levar os alunos a entenderem

que, todos, desde que gozem de saúde mental e que lhe sejam oferecidas efetivas

oportunidades, têm condições para aprender os conteúdos escolares, bem como outros

conteúdos.

Esse entendimento requer que o professor perceba que esse possível sucesso

depende, em grande parte, da postura teórica que ele adota para conduzir suas aulas e,

consequentemente, dos correspondentes encaminhamentos metodológicos que ele seleciona

para conduzi-las. A consciência dessa necessidade, por parte do professor, evidencia que, de

nada adianta o aluno frequentar uma Sala de Apoio somente para cumprir um trâmite

burocrático, pois, nas aulas de Língua Portuguesa, ele precisa ser levado, constantemente, a

utilizar a linguagem escrita em situações interativas.

Como formadora de pedagogos, entendo que, por mais que o aluno das séries/anos

iniciais do Ensino Fundamental usufrua de ricas experiências na área de alfabetização,

dificilmente será eximiamente preparado para a produção escrita, considerando que esse

processo é lento e cumulativo. Nesse sentido, Dutra (2012, p. 247) explica: “Ainda que

crianças tenham acesso à escola e consigam manter-se nela, por, pelo menos, os cinco anos do

Page 25: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

24

Fundamental, não se garante a elas o aprendizado efetivo da linguagem escrita – o mais

básico dos objetivos da escolarização.” Essa situação aponta para a necessidade de haver

continuidade no aprimoramento da produção escrita nas séries/anos finais do Ensino

Fundamental, o que exige que os respectivos professores estejam cientes dessa realidade, bem

como preparados, comprometidos e sensíveis para realizar esse continum.

1.4 PERGUNTAS DE PESQUISA

A partir dessas constatações iniciais, procuro responder, nesta pesquisa, aos seguintes

questionamentos:

• De que modo e com quais características os alunos de uma Sala de Apoio de quinta

série fazem suas produções textuais? Elas atendem a que propósitos?

• Em que condições de produção e de recepção os alunos produzem seus textos?

• Sob que perspectiva(s) teórico-metodológica(s) a professora dessa Sala de Apoio

orienta e desenvolve as produções textuais dos alunos?

• É possível viabilizar um encaminhamento teórico-metodológico alternativo que

facilite a esses alunos o uso da linguagem como prática situada de interação nos mais

variados contextos sociais?

Page 26: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

25

1.5 OBJETIVOS

1.5.1 Geral

• Compreender como se desenvolve o processo de construção e a natureza dos textos

produzidos por uma turma de alunos de uma Sala de Apoio de quinta série,

viabilizando um encaminhamento teórico-metodológico alternativo, que possa

contribuir com o trabalho do professor nesse contexto de ensino.

1.5.2 Específicos

• Analisar e descrever as características das produções escritas, em seus aspectos

contextuais, estruturais e funcionais;

• Analisar as representações dos alunos sobre as experiências de produção que

desenvolvem em Sala de Aula de Apoio;

• Analisar e refletir sobre os pressupostos teórico-metodológicos que norteiam o

encaminhamento das produções textuais dos alunos pela professora da Sala de Apoio;

• Propor perspectivas de produção textual para os alunos da Sala de Apoio que

incentivem e orientem o uso da linguagem como prática situada de interação.

1.6 ORIENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

A investigação sobre os aspectos interacionais dos gêneros textuais-discursivos de

alunos de uma Sala de Apoio de quinta série, analisada no presente trabalho de tese, é

decorrente de um estudo de caso desenvolvido na perspectiva da pesquisa

qualitativa/interpretativista, de cunho naturalista, enriquecido pela utilização de instrumentos

e procedimentos de cunho etnográfico.

Essa complementaridade no modo de encaminhar a pesquisa sustenta-se em Lüdke e

André (1986), as quais entendem que há superposição dos princípios ou das características

gerais do estudo de caso e da pesquisa etnográfica, cujas modalidades de pesquisa, por

exemplo, objetivam retratar a realidade de forma profunda e contextualizada, utilizando-se,

Page 27: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

26

para isso, de diversificadas fontes de informações. Tais modalidades também valorizam os

diferentes e/ou conflitantes pontos de vista existentes em uma determinada situação social a

fim de interpretar a realidade sob diversas perspectivas. Assim, pautada em Lüdke e André

(1986, p. 21), depreendo que o estudo de caso naturalístico, de cunho qualitativo, diverge da

etnografia apenas pelo recorte, pois,

A preocupação central ao desenvolver esse tipo de pesquisa é a compreensão de uma instância singular. Isso significa que o objeto estudado é tratado como único, uma representação singular da realidade que é multidimensional e historicamente situada.

No caso da presente pesquisa, analisei a singularidade de uma Sala de Apoio,

considerando o cotidiano da respectiva escola e o contexto sócio-cultural da comunidade em

que estava inserida, tanto o mais imediato quanto o mais amplo. Dessa forma, os aspectos

culturais ou comportamentais desse grupo foram analisados no conjunto dos elementos que

compõem essa realidade.

Considerando essa premissa, inicio a presente unidade trazendo algumas reflexões

sobre a pesquisa qualitativa e, na sequência, sobre o estudo de caso e a pesquisa do tipo

etnográfico.

Comungando com Mendes (2004, p. 22), compreendo que

[...] a pesquisa qualitativa atual é um “multimétodo” que utiliza a abordagem interpretativa sem privilegiar uma metodologia em detrimento de outra, que busca estudar o fenômeno no seu próprio ambiente, interpretando-o a partir dos significados que lhes são atribuídos pelas pessoas. (Aspas da autora).

Nessa direção, Bogdan e Biklen (1994) entendem que as descrições são muito

utilizadas nessa modalidade de pesquisa, as quais explicitam a valorização e a particularidade

dos dados, bem como a forma como são obtidos e registrados. Assim, as descrições

funcionam, principalmente, como uma maneira de recolher dados, haja vista que, conforme os

pressupostos desse tipo de pesquisa, tudo deve ser minuciosamente analisado, observado, pois

qualquer informação pode ser algo importante para entender o que é investigado. Portanto,

tudo é valorizado, a exemplo de transcrições de entrevistas, de anotações realizadas em diário

de campo, de documentos escolares, de produções escritas dos alunos, de atitudes rotineiras

de sala de aula, entre muitas outras ações ou fontes.

Tais autores destacam que, para essa pesquisa, o processo é mais importante que o

produto, pois ele possibilita compreender as intercorrências, as relações, as diferentes

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27

interferências, a contextualização, a relação parte-todo ou, como lembram Lüdke e André

(1986, p. 12), a “[...] complexidade do cotidiano escolar.”

Nessa perspectiva de pesquisa, os dados, após gerados e agrupados, são analisados de

forma indutiva, objetivando realizar abstrações, não havendo, portanto, a preocupação com

hipóteses prévias (BOGDAN; BIKLEN, 1994).

Sintetizando, a pesquisa qualitativa ou naturalística, conforme Lüdke e André (1986,

p. 13), “[...] envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador

com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar

a perspectiva dos participantes.”

Tal pesquisa, por ser realizada por um longo período em ambiente natural e de forma

contínua, possibilita a flexibilidade nas investigações, oportunizando a produção de intensas

descrições e o contato, como lembram Lüdke e André (1986, p. 18), com a “[...] realidade de

forma complexa e contextualizada.” Nesse caminho, os investigadores frequentam os locais

de estudo porque se preocupam com o contexto, entendendo que o comportamento humano é

muito influenciado por ele. Inclusive, Bogdan e Biklen (1994) alertam que as ações, quando

acompanhadas no local em que ocorrem, podem ser melhor entendidas, advertindo, porém,

que tais locais precisam ser compreendidos a partir da totalidade histórica em que estão

inseridos.

Nesse viés, convivi, intensamente, com o ambiente estudado, no qual, além de um

efetivo contato com os alunos da Sala de Apoio mencionada, também contava com um

significativo envolvimento da respectiva professora de Língua Portuguesa. De forma mais

indireta, também tive contato com vários profissionais da escola da qual essa turma era

integrante, sobretudo com o diretor, com a coordenadora pedagógica responsável por essa sala

e com a professora dessa disciplina das quintas séries frequentadas por tais alunos no turno

regular de aula, conforme detalhamento no próximo item intitulado Cenário e sujeitos da

pesquisa.

Além de explorar o contexto mais próximo, onde ocorria a interação entre alunos e

professora nas aulas de Língua Portuguesa, também investiguei contextos mais amplos, como

outras relações estabelecidas em sala de aula, observando as características da classe como

um todo, bem como da escola e da comunidade em que ela está inserida.

Portanto, para a efetivação de tais encaminhamentos, que buscavam melhor explorar

o objeto de estudo da presente pesquisa, foi necessário estabelecer diferentes interrelações, na

tentativa de melhor compreendê-lo, entendendo, conforme Denzin e Lincoln (2006, p. 19),

que cabe ao pesquisador reunir “[...] pedaços da realidade, um processo que gera e traz uma

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28

unidade psicológica e emocional para uma experiência interpretativa.” Inclusive, os autores

(2006, p. 19) advertem que “[...] o uso de múltiplos métodos, ou da triangulação, reflete uma

tentativa de assegurar uma compreensão em profundidade do fenômeno em questão”, embora

eles entendam que a “[...] realidade objetiva nunca pode ser captada.”

Articulando a possibilidade de interpretar a realidade por meio de diversas formas, o

pesquisador, no papel de viabilizador de uma bricolage9 interpretativa, pode possibilitar,

conforme Denzin e Lincoln (2006, p. 20), uma

[...] montagem reflexiva – um conjunto de imagens e de representações mutáveis, interligadas. Essa estrutura interpretativa é como uma colcha, um texto de performance, uma sequência de representações que ligam as partes ao todo.

Esses autores (2006, p. 20) também abordam o bricoleur político, articulando-o à

ideia de “[...] que a ciência significa poder, pois todas as descobertas da pesquisa têm

implicações políticas.” Nesse sentido, compreendo que a realização da pesquisa desenvolvida

para a produção do presente trabalho, sobretudo no momento da intervenção apresentada no

item 1.9.2, avançou nessa direção, afinal, comungando com Pennycook (1998), entendo que o

trabalho dos educadores e linguistas aplicados deve sempre, e simultaneamente, ser

pedagógico e político. Para o autor, também é preciso analisar como o poder e a ideologia

estão implícitos nos textos que o aluno lê, cujo encaminhamento pode ajudar a desenvolver

sua consciência crítica sobre como a linguagem reflete e reforça a desigualdade social.

Conforme Denzin e Lincoln (2006, p. 23), compreendo que as reflexões sobre a

pesquisa qualitativa aqui trazidas caminham na perspectiva de explicitar que a “[...] palavra

qualitativa implica uma ênfase sobre as qualidades das entidades e sobre os processos e os

significados [...].” (Grifo dos autores). Nessa direção, os autores (2006, p. 23) explicam:

Os pesquisadores qualitativos ressaltam a natureza socialmente construída da realidade, a íntima relação entre o pesquisador e o que é estudado, e as limitações situacionais que influenciam a investigação. Esses pesquisadores enfatizam a natureza repleta de valores da investigação. Buscam soluções para as questões que realçam o modo como a experiência social é criada e adquire significado. (Grifo dos autores).

Coerente com esse entendimento, Pádua (2000, p. 31) assim se manifesta: “[...] pode-

se dizer que as pesquisas qualitativas têm se preocupado com o significado dos fenômenos e

9 Para Denzin e Lincoln (2006, p. 20), “[...] o pesquisador no papel de teórico bricoleur trabalha dentro de perspectivas e paradigmas concorrentes e sobrepostos, e entre eles.”

Page 30: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

29

processos sociais, levando em consideração as motivações, crenças, valores, representações

sociais, que permeiam a rede de relações sociais.”

Por outro lado, a autora (2000, p. 31) adverte que, como tais “[...] aspectos não são

passíveis de mensuração e controle, nos mesmos moldes da ciência dominante, sua

cientificidade tem sido frequentemente questionada.” Cientes dessa interpretação, Denzin e

Lincoln (2006, p. 23), ao explicar os limites dos estudos quantitativos, afirmam que eles

“enfatizam o ato de medir e de analisar as relações causais entre variáveis, e não processos.”

Assim, os pesquisadores que priorizam a pesquisa quantitativa são, para os autores (2006, p.

25) “[...] deliberadamente indiferentes à riqueza das descrições, pois esse tipo de detalhe

interrompe o processo de desenvolvimento das generalizações.”

Considerando esse apontamento para a dicotomia qualidade x quantidade, Pádua

(2000) pondera que não se pode excluir, definitivamente, os dados quantitativos do horizonte

do pesquisador, visto que eles podem enriquecer algumas análises, principalmente se a

pesquisa envolver uma grande quantidade de sujeitos ou, como adverte Triviños (1990, p.

118), se os dados estatísticos forem utilizados como um “elemento auxiliar.”

Contudo, lembro, com base em Pennycook (1998), que ainda predominam as

pesquisas quantitativas e positivistas, inclusive em LA, as quais são realizadas, praticamente,

de forma experimental, situações em que, muitas vezes, os alunos são organizados em

pequenos grupos a fim de desenvolver atividades elaboradas por pesquisadores. Em outra

direção, o autor adverte para a necessidade de ampliação das possibilidades de investigação

das questões de linguagem e de educação.

Kumaravadivelu (2006) também enfatiza a necessidade de a pesquisa em LA, com

sua natureza intercultural, interdisciplinar e interlinguística, superar a abordagem positivista,

buscando novas alternativas.

A seguir serão trazidas algumas características do estudo de caso naturalístico, as

quais, como lembram Lüdke e André (1986, p. 21), são coerentes à caracterização da pesquisa

qualitativa recém-analisada.

Ao defender que o estudo de caso qualitativo é uma das formas de conhecer

profundamente os problemas do cotidiano escolar, as autoras explicam que esse tipo de

pesquisa, além de possibilitar um amplo entendimento das particularidades desse cotidiano

inerentes à própria instituição, cria oportunidades para também compreender melhor sua

relação com outras instituições.

Conforme Ventura (2007, p. 384), tais estudos devem ter seus dados amplamente

descritos “[...] com um plano aberto e flexível que focaliza a realidade de modo complexo e

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30

contextualizado”, compreendendo que é o contexto que situa o objeto investigado. Nas

palavras de Lüdke e André (1986, p. 18):

Assim, para compreender melhor a manifestação geral de um problema, as ações, as percepções, os comportamentos e as interações das pessoas devem ser relacionadas à situação específica onde ocorrem ou à problemática determinada a que estão ligadas.

É importante lembrar que o pesquisador deve ter por base os pressupostos teóricos

selecionados no início da investigação; contudo, poderá ampliá-los assim que surgir uma nova

situação relacionada ao estudo, quando outras particularidades forem manifestadas. Nesse

sentido, Lüdke e André (1986, p. 18) explicam:

Essa característica se fundamenta no pressuposto de que o conhecimento não é algo acabado, mas uma construção que se faz e refaz constantemente. Assim sendo, o pesquisador estará sempre buscando novas respostas e novas indagações no desenvolvimento do seu trabalho.

Articulada à necessidade de contextualizar a problemática investigada, as autoras

chamam a atenção para a importância de se observar as diversas perspectivas de um objeto de

estudo com a complexidade que o constitui, de modo a vê-lo atrelado à totalidade em que está

inserido, bem como para a necessidade de considerar os diferentes pontos de vista, inclusive o

do pesquisador.

A fim de enriquecer um estudo de caso, as autoras alertam para a necessidade de

utilizar várias fontes de informação para a geração de dados, os quais devem ser obtidos em

diferentes momentos e situações e serem provenientes de diferentes informantes. Conforme

foi afirmado anteriormente, ao tratar da pesquisa qualitativa, esses dados diversos devem ser

confrontados entre si, ou seja, precisam passar por uma triangulação, podendo gerar, assim,

novas informações, confirmar ou descartar outras.

Na mesma direção, a realização de uma pesquisa do tipo etnográfica, para Lüdke e

André (1986, p. 14), também exige a combinação de vários métodos, entre os quais elas

destacam os dois que consideram básicos: “A observação direta das atividades do grupo

estudado e entrevistas com os informantes para captar suas explicações e interpretações do

que ocorre nesse grupo.” Essas autoras (1986, p. 14) explicam, no entanto, que esses métodos

podem ser aplicados paralelamente a outros “[...] como levantamentos, histórias de vida,

análise de documentos, testes psicológicos, videoteipes, fotografias e outros, os quais podem

fornecer um quadro mais vivo e completo da situação estudada.”

Page 32: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

31

Considerando a forma de obtenção e de análise dos dados gerados, Cançado (1994,

p. 57) adverte sobre o risco da natureza subjetiva da análise do corpus e, como precaução,

também defende a necessidade do uso da triangulação,

[...] isto é, o uso de diferentes tipos de corpus, a partir da mesma situação-alvo de pesquisa, com diferentes métodos, e uma variedade de instrumentos de pesquisa. [...] Para concluir a respeito de triangulação, pode-se enfatizar que quanto mais abrangente for a triangulação, mais confiáveis serão os dados obtidos.

A autora entende que a pesquisa de base etnográfica pode possibilitar novas

descobertas em sala de aula, cujas situações, muitas vezes, não são identificadas nem mesmo

pelos respectivos professores. Porém, para que seja possível conhecer o que de fato ocorre

nesses locais, é preciso estudá-los, efetivamente, no seu contexto social, portanto, esse

encaminhamento difere, significativamente, dos espaços organizados especificamente para o

desenvolvimento de pesquisas experimentais. Nas palavras de Cançado (1994, p. 56), “Esse

tipo de pesquisa utiliza-se de corpus que ‘simulam’ situações de sala de aula, deixando de

lado a verdadeira interação do contexto social do ensino que é a ‘real’ sala de aula”

(Destaques da autora). Contudo, Lüdke e André (1986, p. 14) alertam que “[...] as pesquisas

sobre a escola não devem se restringir ao que se passa no âmbito da escola, mas sim,

relacionar o que é aprendido dentro e fora da escola.”

Visando ao bom desenvolvimento de uma pesquisa do tipo etnográfico, as autoras

alertam sobre a necessidade de o observador conquistar, desde os primeiros contatos, as

pessoas nela envolvida, demonstrando seriedade, responsabilidade, confiança, apresentando

seus objetivos com segurança, assegurando-lhes sigilo quanto ao que for investigado.

Cançado (1994, p. 57), por sua vez, ao abordar a polêmica questão da busca da

neutralidade do pesquisador, assevera que

[...] o pesquisador etnográfico, no momento da aplicação da pesquisa, deve ter um comportamento de não julgamento em relação ao seu foco de pesquisa, isto é, estudar a interação do jeito que ela ocorre no contexto, sob a perspectiva daqueles que estão sendo estudados.

No entanto, com base em André (1995), Thiollent (1987), Demo (1989), entre outros

autores, entendo que é praticamente impossível que o investigador seja absolutamente neutro,

uma vez que se insere, efetivamente, no contexto da pesquisa.

Page 33: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

32

1.7 CENÁRIO E SUJEITOS DA PESQUISA

A pesquisa para a geração de dados para a elaboração do presente trabalho de tese foi

realizada com uma turma de alunos de uma Sala de Apoio de quinta série de uma escola

estadual, localizada na periferia da cidade de Cascavel - PR, no ano letivo de 2011, sendo que,

no primeiro semestre, essa turma estava constituída por dez alunos e, no segundo, por

quatorze. Tais alunos frequentavam a quinta série do Ensino Fundamental no período

vespertino e, duas vezes por semana, no período matutino, essa Sala de Apoio, cursando

quatro aulas de Língua Portuguesa, sendo duas na segunda e duas na quarta-feira. Os alunos

foram encaminhados para essa Sala por seus professores dessa disciplina do período normal

de aula – quinta série, por apresentarem problemas quanto ao domínio dos respectivos

conteúdos.

Conforme informações da professora da Sala de Apoio que, no período vespertino,

também era docente desses alunos na disciplina de Língua Inglesa, e ainda segundo relatos

das coordenadoras pedagógicas da escola e de outros professores das duas quintas séries das

quais eles provinham, a maior parte deles começou a frequentar essa sala com pouco interesse

e apresentando, inclusive, sérios problemas de indisciplina, prejudicando o desenvolvimento

das aulas. Segundo tais profissionais, os que apresentavam problemas de indisciplina na Sala

de Apoio também os apresentavam durante as aulas que frequentavam no período regular.

Assim, alguns professores até levantavam a questão sobre o que é determinante na relação

“indisciplina/falta de domínio de conteúdo.”10

A professora da referida Sala de Apoio, graduada em Letras - Português/Inglês e pós-

graduanda em Língua Portuguesa e Literatura – lato sensu, com três anos de experiência no

magistério, também foi participante dessa pesquisa, na busca do entendimento da concepção

teórico-metodológica que norteava sua forma de explorar a produção textual junto aos seus

alunos. Destaco seu intenso e responsável envolvimento nas atividades de pesquisa de campo,

realizadas em 2011, bem como sua abertura para que eu atuasse como observadora

participante e, inclusive, que eu encaminhasse a intervenção nas aulas de Língua Portuguesa

durante o segundo semestre de 2011.

Esporadicamente, também colaboraram com a pesquisa: a professora de Língua

Portuguesa das duas quintas séries das quais os alunos da Sala de Apoio frequentavam no

período vespertino e uma coordenadora pedagógica (cuja função, conforme concurso, é

10 Relatos informais de professores da escola campo de pesquisa.

Page 34: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

33

denominada Professor Pedagogo) que tinha, como uma de suas atribuições, acompanhar o

andamento dessa sala.

Destaco, ainda, a significativa participação do diretor da escola, sobretudo na

negociação com a Gráfica que imprimiu, gratuitamente, todas as cópias do jornal produzido

durante a intervenção realizada na Sala de Apoio, bem como sua participação como

entrevistado pelos respectivos alunos, a fim de fornecer informações para a elaboração de

uma reportagem publicada em tal jornal, além de muitas outras situações em que

disponibilizou materiais e documentos da escola a fim de facilitar o desenvolvimento da

presente pesquisa.

Indiretamente, outros profissionais da escola também contribuíram com o

desenvolvimento dessa investigação, principalmente colaborando para que os alunos tivessem

à disposição as cópias das atividades planejadas, bem como disponibilizando materiais

arquivados referentes às Salas de Apoio ou fornecendo informações sobre a participação e/ou

dificuldades dos alunos alvos da pesquisa durante a realização das aulas no período regular.

Entre esses profissionais estão:

• outra coordenadora pedagógica, que, na parte da manhã, geralmente ficava à

disposição de alunos e professores no corredor do salão comunitário, no qual,

além da Sala de Apoio, funcionavam algumas salas de aula, conforme será

descrito ainda nesta unidade. Assim, essa coordenadora atuava, nesse período,

também como fiscal de corredor, sobretudo porque a construção desse salão

não era protegida por muro;

• os secretários da escola;

• os professores que trabalhavam às segundas e quartas-feiras no período

matutino, que era quando eu estava na escola, com os quais eu analisava várias

questões de seu cotidiano e, de forma particular, da Sala de Apoio investigada;

• os professores de quinta série do período vespertino, quando da realização dos

Conselhos ou Pré-conselhos de Classe e nas reuniões com os pais e/ou

responsáveis para a entrega de boletins, que levantavam informações sobre tais

alunos em diferentes disciplinas que cursavam no período regular de aula.

Em 2011, ano de realização da pesquisa de campo, a escola contava com,

aproximadamente, quatrocentos e quarenta alunos, dos quais pouco mais da metade eram de

quinta à oitava série do Ensino Fundamental e, os demais, do Ensino Médio. O colégio

Page 35: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

34

funcionava, basicamente, nos períodos matutino e vespertino; à noite só havia aula para duas

turmas que estudavam Língua Espanhola, num total de trinta e quatro alunos, cujo curso fazia

parte de uma programação do Centro de Estudos de Línguas Estrangeiras Modernas –

CELEM.

A realidade socioeconômica do bairro em que a escola campo desta pesquisa está

localizada era precária, marcada por muitas famílias carentes, as quais, conforme dados

contidos no Projeto Político Pedagógico da escola, referente ao ano de 2010 (PARANÁ,

2010b), recebiam, em média, de um salário mínimo e meio a três, por mês. Cabe destacar que,

aproximadamente, a quarta parte delas era beneficiada pelo Programa Bolsa Família.

Afora o desemprego que as rondava, também é relevante registrar que muitos pais ou

responsáveis trabalhavam, com muita dificuldade e pouco retorno, na informalidade; outros

saíam, ao amanhecer, para o trabalho pouco valorizado em termos de remuneração e de

prestígio social, e só retornavam à noite, sem condições de acompanhar seus filhos durante o

dia, o mesmo fato ocorrendo com quem trabalhava à noite.

Conforme informações constantes no referido documento da escola, as profissões

mais comuns dos pais eram: pedreiro, motorista, pintor, vendedor e auxiliar de serviços

gerais; das mães eram: diarista, empregada doméstica, zeladora, manicure, pedicure e

vendedora.11

De um modo geral, as famílias eram jovens, compostas, em média, por quatro a seis

pessoas, cujos filhos se encontravam em idade escolar. Havia uma grande diversidade em

relação à sua estrutura, pouco se aproximando da considerada família tradicional: muitos

alunos moravam com os avós, outros somente com a mãe e/ou padrasto ou com o pai e/ou

madrasta, com tios ou outros parentes.

Nas reuniões para entrega de boletins, a participação dos pais e/ou responsáveis era

pequena. Inclusive, em muitas ocorrências de indisciplina, na escola, poucos deles se

empenhavam em contribuir para que a situação melhorasse, entendendo que o que acontecia

na escola competia somente a ela resolver. Nessa perspectiva, conforme informações da

direção e da coordenação da escola, era nas turmas mais indisciplinadas, nas quais já haviam

sido tomadas várias medidas para amenizar os respectivos problemas, que os pais e/ou

responsáveis eram mais ausentes.

Na mesma estrutura física do colégio funcionava uma escola municipal que atendia a

alunos de pré à 4ª série. Assim, para comportar todos os discentes, também era utilizado um

11 Essas informações, contidas nesse projeto, foram coletadas por profissionais da escola por meio de questionário.

Page 36: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

35

salão comunitário localizado ao lado da escola, no qual eram realizadas as atividades da Sala

de Apoio e onde outras cinco turmas de 5ª à 8ª série tinham aula.

Nesse salão foram improvisadas seis salas, separadas com paredes de madeira fina,

cuja altura estava distante de aproximar-se do teto, portanto, a estrutura favorecia a passagem

do barulho de uma sala para outra, tornando um ambiente extremamente cansativo, com o

complicador de existir uma iluminação precária e pouca ventilação. Essas condições eram

ainda piores no espaço destinado à Sala de Apoio, visto que ela ficava nos fundos e seu

tamanho era bem menor. Essa sala também recebia menos claridade e a iluminação, por meio

de energia elétrica, não compensava, suficientemente, essa deficiência. Portanto, tais

condições estavam distantes do que é preconizado na Instrução nº 007/2011 – SUED/SEED

(PARANÁ, 2012b, p. 2) quanto ao espaço físico: “O funcionamento das Salas de Apoio à

Aprendizagem está condicionado à [...] existência de espaço físico adequado [...].”

Uma das situações mais sérias era o fato de não haver muro para proteger esse salão

comunitário. Como segurança, próximo da entrada dessa construção, normalmente, ficava um

dos profissionais da escola. Para que os alunos que lá estudavam pudessem dirigir-se ao corpo

central da instituição, como, por exemplo, à secretaria, à sala da direção, à sala dos

professores, à quadra de esportes ou ao saguão para lanchar, até chegar ao portão do colégio,

eles ficavam em espaço aberto, sujeitos, portanto, a muitos perigos. Aliás, seguidamente,

haviam pessoas alheias à escola que ficavam aos seus arredores sem um afazer definido. Não

distante dali, também existiam bares funcionando em diversos horários.

Na verdade, o espaço físico da escola como um todo era muito precário. Além das

salas de aula, quadra esportiva descoberta, saguão, cozinha e banheiros, só existiam três

pequeninas salas para comportar a direção da escola, o espaço para os professores

pedagogos/coordenadores pedagógicos, a secretaria e a sala dos professores, além do pequeno

espaço para as dependências administrativas da escola municipal mencionada. Tais espaços

constituíam-se, também, em almoxarifado. Assim, era muito difícil atender a qualquer pessoa,

orientar qualquer professor ou aluno, guardar ou organizar materiais ou realizar qualquer

outra tarefa.

O colégio funcionava nessas condições desde o início de suas atividades, no ano de

1997. Contudo, a construção de um novo prédio para o colégio, dispondo de uma ampla

estrutura moderna, foi inaugurada no início do mês de maio de 2012, ano que sucedeu a

realização da pesquisa de campo.

Retomo a questão da diversidade na composição das famílias, lembrando que,

embora essa realidade já seja bastante aceita na sociedade, na Sala de Apoio alvo da presente

Page 37: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

36

pesquisa, muitas vezes, as particularidades dos alunos em relação a essa composição,

associadas aos respectivos causadores dessas particularidades, foram tomadas, por eles

próprios, ou por seus colegas, como pretextos ou justificativas para o não cumprimento das

exigências feitas pela professora, durante as aulas, o que, muitas vezes, deixava um ambiente

constrangedor, principalmente para quem viveu ou vive uma situação pouco agradável e/ou

discriminada. Considerando, também, que a realidade familiar de várias dessas crianças da

Sala de Apoio foi lembrada nos Conselhos de Classe, por muitos professores, por entenderem

que elas interferiam no rendimento escolar e/ou na disciplina dos alunos durante as aulas,

trago, na sequência, algumas informações sobre a vida de alguns integrantes da Sala de

Apoio. No apêndice A encontram-se outras informações/características sobre eles.

Antes, porém, informo que, a fim de não expor os alunos envolvidos nessa

investigação, no processo de geração e análise dos dados, eles foram identificados por uma

letra diferente da inicial de seu respectivo nome. Os demais sujeitos que colaboraram com a

pesquisa também não foram nominados. Ao mencioná-los, especifiquei sua função, conforme

exemplos que seguem: professora de Língua Portuguesa da Sala de Apoio; diretor da escola

campo de pesquisa etc. O nome da escola e do bairro também foram preservados. Aliás,

esclareço que o projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em

Pesquisa da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste, na qual sou docente.

Inicio trazendo a informação de que o aluno “H” seguidamente lembrava, ou era

lembrado pelo irmão que também frequentava a Sala de Apoio, ou mesmo por outros colegas,

que havia visto seu pai ser assassinado. Dificilmente ele se concentrava para realizar as

atividades escritas. No segundo semestre de 2011, passou a tomar um medicamento

controlado que o deixava muito sonolento.

A aluna “F” não conhecia sua mãe por ter sido abandonada por ela quando ainda era

pequenina. Tinha sérios problemas com sua madrasta, tendo sido necessária, inclusive, a

intervenção do Conselho Tutelar. Assim como o aluno “H”, apresentava sérios problemas de

relacionamento com os colegas durante as aulas de Língua Portuguesa que frequentava na

Sala de Apoio.

Também caracterizando-se como uma situação constrangedora, a aluna “A” teve sua

paternidade reconhecida no segundo semestre de 2011. Era muito fechada em si mesma e, no

início de minha observação/participação, também era muito apática.

O aluno “M” era superprotegido pelo pai que tudo fazia para agradá-lo e defendê-lo.

Chegava à escola quando as aulas estavam praticamente sendo encerradas; esporadicamente,

quando chegava um pouco antes, normalmente recusava-se a participar das atividades.

Page 38: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

37

Esses quatro alunos, que representam 28% dos integrantes da Sala de Apoio no

segundo semestre de 2011, foram indicados para passarem por uma avaliação, a fim de

verificar se deveriam frequentar uma Sala de Recurso12, o que forçou um novo olhar para eles,

tanto de minha parte quanto por parte da respectiva professora, já que essa situação levantava

a possibilidade de eles não apresentarem somente defasagem na aprendizagem de alguns

conteúdos, mas de terem dificuldades para aprender como decorrência de algum distúrbio

mental. Nesse caso, tais alunos não estariam frequentando a Sala mais condizente com seus

respectivos problemas.

Triste, indelicado e agressivo, o aluno “N” sofria com a depressão de sua mãe, a

prisão de um irmão e a educação intimidadora advinda de seu pai. Por outro lado, o aluno “D”

era vítima da forma diferenciada e extremista de tratamento que recebia dos pais que eram

separados, o que o deixava muito confuso. Passava os dias úteis com o pai e a madrasta e os

fins de semana com a mãe e o padrasto.

A partir das três horas da madrugada, o aluno “C” ficava em casa só com uma irmã

mais nova, pois sua mãe saía para o trabalho. Sentindo-se livre, a partir desse horário, ele

acordava para ver televisão até ao amanhecer, quando voltava a dormir, consequentemente,

atrasava-se para as aulas e ficava muito sonolento.

Conforme já afirmei, as particularidades dos alunos aqui trazidas foram algumas das

mais citadas por alunos e professores, seja para servirem de justificativa de alguma situação

complexa nas quais os alunos estiveram envolvidos, seja para serem utilizadas, por eles, como

um pedido de atenção.

Nesse sentido, entendo que esse relato sobre os alunos é fundamental para

compreender os contextos sociais em que eles viviam no período da investigação. Afinal, essa

realidade ajudava a constituir o cotidiano da escola, sendo impossível ignorá-la quando do

desenvolvimento das aulas ou quando da realização de qualquer outra atividade nessa

instituição, até porque, muitas vezes, ela forçava para direções complexas. Em suma, tais

informações explicam, em grande parte, o quanto é delicado recuperar e promover o

conhecimento nessas circunstâncias.

12 Essas salas objetivam atender a alunos que apresentam certos distúrbios, os quais provocam alguns problemas na aprendizagem.

Page 39: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

38

1.8 INSTRUMENTOS PARA A GERAÇÃO DE DADOS

Na busca de organizar e gerar dados, utilizei diário de campo, questionário e

entrevistas, conforme apresentação que segue.

1.8.1 Diário de campo

Utilizei o diário de campo para registrar uma grande diversidade de situações

observadas e/ou vivenciadas durante o desenvolvimento de toda a pesquisa de campo, tais

como:

- Relação professor/aluno durante as aulas de Língua Portuguesa da Sala de Apoio, campo de

pesquisa;

- Preparação dos alunos para a produção de textos;

- Reação dos alunos ao serem convidados a produzir textos e a realizar outras atividades de

Língua Portuguesa;

- Tempo gasto, em média, para tais produções e para as respectivas correções;

- Descrição dos aspectos priorizados nessas correções e o correspondente envolvimento dos

alunos;

- Satisfação ou insatisfação dos alunos após suas produções/correções;

- Percepção dos alunos dos aspectos relacionados à organização textual;

- Compreensão da função social, por parte dos alunos, dos textos produzidos;

- Domínio teórico do professor para o encaminhamento de produção e reestruturação de textos

e para a realização de atividades gerais de Língua Portuguesa, sobretudo em relação aos

problemas mais recorrentes relacionados aos gêneros textuais-discursivos;

- Destino de tais produções;

- Relação entre os profissionais da escola, entre eles e os alunos, entre eles e a comunidade;

- Análise da programação/eventos desenvolvidos pela escola, como Conselhos e Pré-

conselhos de Classe, reunião com os pais e/ou responsáveis, momentos para recados/reuniões

improvisadas, processo eleitoral para a escolha do novo diretor para a escola etc.;

- Análise de um curso que participei junto aos professores de Salas de Apoio promovido pelo

Núcleo Regional de Educação e Unioeste, entre outras situações que vivenciei.

Page 40: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

39

1.8.2 Questionário à professora

No fim do mês de maio apliquei um questionário (vide apêndice B) com trinta e

duas questões, em grande parte abertas, à professora de Língua Portuguesa, envolvida

diretamente com a pesquisa ora analisada.

Esse instrumento objetivou obter informações sobre a sua formação, seu histórico

profissional, suas possibilidades de realizar estudos continuados, sua maneira de encaminhar,

corrigir e reestruturar a produção textual dos alunos, bem como sobre seu entendimento de

gêneros textuais-discursivos e a forma como os explorava, além de conhecer as dificuldades

dos alunos em relação à produção escrita, entre outras questões.

1.8.3 Entrevistas

Realizei uma entrevista semiestruturada com os alunos bem como com a respectiva

professora, conforme detalhamento que segue.

a) Entrevista semiestruturada/conversa com os alunos da Sala de Apoio (vide apêndice C)

Durante as aulas do mês de junho de 2011, quando oportuno, conversei,

individualmente, com os alunos investigados, sobre como eles se sentiam ao produzir

atividades de escrita em sala de aula.

Em meados do mês de novembro do mesmo ano, entrevistei, informalmente, esses

alunos, cujas conversas foram gravadas, em áudio, na busca de investigar outras impressões e

entendimentos deles em relação à produção de textos além das que havia observado durante

as aulas que acompanhei, conforme o roteiro semiestruturado e flexível constante no apêndice

C. (Obs.: As questões foram devidamente detalhadas, conforme a necessidade de cada aluno).

Nessa entrevista busquei, ainda, investigar mais sobre a relação deles com a

produção textual e as aulas que os orientam para isso, bem como a relação dos textos que

produzem na escola e os textos que existem fora dela ou em outras áreas do conhecimento.

b) Entrevista semiestruturada com a professora da Sala de Apoio (apêndice D)

Nesse período também realizei uma entrevista semiestruturada com a professora da

Sala de Apoio, a qual foi gravada em áudio. Essa entrevista objetivou complementar os dados

Page 41: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

40

coletados quando da aplicação do questionário, no primeiro semestre, bem como as

observações realizadas durante o desenvolvimento das aulas que ministrava ou de outros

momentos dessa professora, na escola, cujo alvo foi seu entendimento sobre gêneros textuais-

discursivos e seu caráter interacional.

Procurei investigar, ainda, se ela percebia mudanças no envolvimento dos alunos

quanto à produção de textos, comparando o trabalho que ela realizou no primeiro semestre

com o que foi encaminhado via intervenção, no segundo, sobretudo em relação ao objetivo de

eles serem produzidos e, consequentemente, ao entendimento quanto ao destino dado a eles.

1.9 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa de campo foi desenvolvida em duas etapas, sendo uma em cada semestre

do ano letivo de 2011. A principal atividade da primeira etapa foi o conhecimento desse

campo, sobretudo por meio da observação participante de trinta e seis horas-aula de Língua

Portuguesa na Sala de Apoio já caracterizada. Na segunda, foi desenvolvida uma proposta de

trabalho/intervenção, nessa sala, durante sessenta horas, na mesma disciplina. Segue o

detalhamento das atividades desenvolvidas em cada um desses dois momentos.

1.9.1 Primeira etapa da pesquisa de campo: observação/participação de aulas e conhecimento do campo

Nos meses de maio, junho e julho de 2011, com exceção dos quinze dias de recesso

no mês de julho, passei duas manhãs por semana na escola campo de pesquisa, além de outros

momentos, em diferentes horários, para participar de algumas atividades integrantes de sua

rotina, ou, quando da necessidade, em função do que era desenvolvido junto aos alunos.

Nos dois primeiros meses, acompanhei, na Sala de Apoio, as duas aulas de Língua

Portuguesa ministradas nessas manhãs e, o restante do tempo, dedicava para conversar com a

respectiva professora a fim de obter informações sobre os alunos dessa sala, conhecer seus

materiais para o planejamento das aulas, além de conversar com outros profissionais da

escola, objetivando gerar os dados para entender o contexto investigado, bem como

coletava/analisava materiais afins, como: as fichas dos alunos utilizadas para o

encaminhamento e controle deles nessa sala, as quais também funcionavam como

planejamento; o material utilizado para o desenvolvimento das aulas; o planejamento de

Língua Portuguesa da quinta série; o Caderno Orientações Pedagógicas: Língua Portuguesa,

Page 42: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

41

Sala de Apoio à Aprendizagem (PARANÁ, 2005a); o Caderno Coletânea de textos: Língua

Portuguesa, Sala de Apoio à Aprendizagem (PARANÁ, 2005b); o Projeto Político

Pedagógico da escola (PARANÁ, 2010b), entre outros materiais secundários como o livro

didático dessa disciplina e série (TERRA; CAVALLETE, 2009) e os relatórios da Sala de

Apoio referentes ao ano letivo de 2010.

Nesse semestre, observei trinta e seis aulas dessa turma, ao mesmo tempo em que

participava delas, sobretudo nos momentos de acompanhamento e ajuda quando da realização

das atividades desenvolvidas pelos alunos. Destaco que esse envolvimento foi muito

valorizado pela professora da referida sala e também pelos alunos, visto que, conforme já

mencionei, eles apresentavam muitas dificuldades na produção escrita, inclusive, muitos

deles, eram considerados semialfabetizados. Esse estreito contato com os alunos facilitou a

geração e a análise de suas produções escritas, o que constitui minhas principais fontes de

investigação.

Durante a realização dessa observação participativa, de modo informal, também

entrevistei/conversei com os alunos, na busca de saber como eles se sentiam quando eram

convidados a produzir um texto, bem como para conhecer os temas que preferiam contemplar

nessas produções, sobre suas facilidades e dificuldades para isso, cujas análises constam no

item Relação dos alunos com a produção escrita, no capítulo 4.

Registrei, minuciosamente, as análises advindas dessa participação em diário de

campo, no mesmo dia em que eram realizadas, a fim de garantir maior fidedignidade dos

dados.

Nesse semestre, também conversei muito com vários profissionais da escola,

sobretudo com o diretor e a coordenadora pedagógica (professor pedagogo) responsável por

essa sala, bem como acompanhei um pouco de suas rotinas, na busca de compreender melhor,

conforme preconizam Lüdke e André (1986, p. 12), a “[...] complexidade do cotidiano

escolar”: atividades, prioridades, dificuldades, eventos, contatos, relação entre os

profissionais, entre os profissionais e alunos, entre os alunos e entre a escola e a comunidade.

Nas duas manhãs semanais em que eu ficava na escola, participei, inclusive, na sala

dos professores/almoxarifado, de todos os recreios entre os dois blocos de aulas, junto aos

professores, coordenadores, secretários e, em parte do tempo, também com o diretor. Ele

participava apenas parcialmente desse momento de encontro porque acompanhava os alunos

no pátio da escola, temendo situações complicadas como brigas, saídas de alunos,

principalmente porque o muro era baixo e porque, conforme já explanei, o salão comunitário,

localizado ao lado da escola, onde também estudavam algumas turmas de alunos, não era

Page 43: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

42

protegido por muros. Embora o portão ficasse chaveado durante o recreio, havia o receio de

que não cumprissem as respectivas normas.

Na primeira parte do recreio, os profissionais da escola lanchavam, cujo lanche era

providenciado por eles, seguindo uma escala mensal, inclusive eu estava incluída nela. Era

um momento de conversas informais, de descontração, de risadas e também de desabafos e

reclamações, principalmente sobre os alunos e sobre as políticas de educação advindas da

Secretaria de Educação do Estado do Paraná, as quais caminhavam na direção de uma maior

centralização e autoritarismo.

Nesses momentos, tive a oportunidade de perceber a postura de muitos professores

em relação aos problemas de indisciplina dos alunos, aos procedimentos que utilizavam para

tentar evitar essa situação que consideravam extremamente prejudicial ao desenvolvimento

das aulas, ao pouco domínio de conteúdo por parte dos alunos, ao processo de avaliação do

aproveitamento escolar etc.

Esse clima de companheirismo e de cooperação entre esses profissionais foi

prejudicado, no segundo semestre, em função das eleições para diretor da escola, realizadas

em novembro, para as quais concorreram duas chapas: uma encabeçada pelo então diretor e

outra por sua vice-diretora, cuja explicação consta no próximo item do presente trabalho de

tese.

Geralmente, na segunda parte do recreio, o diretor e a coordenadora pedagógica

(professor pedagogo), responsável pelo período matutino, passavam os informes advindos de

várias fontes, sobretudo do Núcleo Regional de Educação de Cascavel, ao mesmo tempo em

que oportunizavam a realização de alguns questionamentos ou análises por parte dos

presentes. Esses momentos eram considerados pequenas reuniões técnico-administrativas,

visto que muitos encaminhamentos importantes para a escola em questão eram decididos

nessas ocasiões. E, considerando que, no calendário escolar, praticamente não há espaço para

essas reuniões, essas oportunidades eram muito úteis e valorizadas por muitos profissionais

que delas participavam.

Os Pré-conselhos de Classe, tanto da Sala de Apoio quanto das quintas séries, bem

como os Conselhos de Classe dessas séries, também me oportunizaram importantes contatos

com vários integrantes da escola que, em ambiente natural, favoreceram a coleta de muitas

informações, as quais foram registradas em meu diário de campo.

Para melhor conhecer o campo de pesquisa, participei, ainda, de momentos festivos

na escola, a exemplo da festa para comemorar o dia das mães, cujo momento mostrou, de

Page 44: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

43

certa forma, a boa relação entre diversos profissionais dessa instituição de ensino, bem como

desses em relação aos alunos e à comunidade.

Com a finalidade de conhecer ainda mais essa relação, assisti a uma palestra, na

escola, proferida por uma psicóloga envolvida com o Projeto Criança Feliz (PROJETO

CRIANÇA FELIZ, 2011, p. 1), o qual é advindo de uma empresa privada, tendo, como um

dos objetivos “Orientar e apresentar algumas alternativas corretas, como os brinquedos

pedagógicos e didáticos, em substituição aos brinquedos que incentivam a violência [...].

Inicialmente, essa profissional abordou muitos problemas familiares decorrentes de

uma relação pouco saudável, quando os pais/ou responsáveis pouco se dedicam a seus filhos.

A palestra foi finalizada com a divulgação de um conjunto de seis jogos de brinquedos

pedagógicos para crianças de várias idades, como forma de mantê-las envolvidas com

brinquedos educativos e preocupadas em contribuir para a preservação do meio ambiente.

Vários professores fizeram o pedido desse kit, que custava R$180,00 (cento e oitenta reais),

cujo encaminhamento justificou a gratuidade para participar desse evento. Ressalto que essa

psicóloga entende que a culpa da indisciplina e violência na sociedade é decorrente do

descaso dos pais em relação a seus filhos, principalmente porque não dedicam tempo a eles e

lhes faltam alternativas de brinquedos que os ajudem a educá-los. Esse entendimento pareceu

ir ao encontro do posicionamento da maior parte dos professores presentes, que, por sua vez,

norteava alguns encaminhamentos para problemas ocorridos na escola, entre eles, os

indisciplinares, que eram frequentes na Sala de Apoio. Assim, a palestra foi muito valorizada

pelos participantes, os quais, com exceção de uma coordenadora, não demonstraram ter

percebido que o objetivo de sua realização foi a venda de materiais didáticos em benefício de

uma empresa privada. Como agravante, não houve observação em relação ao posicionamento

dessa profissional quanto à culpa da indisciplina e da violência ser meramente atribuída aos

pais.

Entendo que esse posicionamento desconsiderou as relações socioeconômicas da

organização capitalista existente no Brasil que, praticamente, não abrem possibilidades para

que os pais, pertencentes à classe explorada, tenham condições de estarem preparados para

educar seus filhos nos padrões de uma classe social que tem acesso a boas leituras, a uma

ampla escolaridade, a excelentes brinquedos pedagógicos e que tenham tempo para estarem

com seus filhos. Lembro que esses pais, muitas vezes, precisam sair para o trabalho antes de

seus filhos acordarem e só conseguem retornar quando eles já estão praticamente dormindo

novamente, lembrando que, quando chegam, precisam dar conta dos afazeres domésticos,

incluindo a preparação das refeições para o dia seguinte.

Page 45: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

44

Também me envolvi na organização da festa de encerramento das aulas da Sala de

Apoio realizada no início do mês de julho, na qual, além de dispor de “comes e bebes” e de

assistirmos ao filme Pequeno Milagre, presenteei cada aluno com uma obra de literatura

infantil. O referido filme foi escolhido pela professora de Matemática dessa turma, a qual foi

uma das organizadoras do evento. Aliás, sua participação contribuiu para que eu percebesse

uma outra forma de relacionamento com os mesmos alunos, o que enriqueceu meu

diagnóstico sobre o cotidiano investigado, cujas constatações, como as demais referentes a

outras atividades, foram registradas e pré-analisadas em meu diário de campo. Estavam

presentes a essa festa, também, alguns alunos que só participavam das aulas de Matemática.

1.9.2 Segunda etapa da pesquisa de campo: desenvolvimento de uma proposta de trabalho/intervenção em uma Sala de Apoio

Em meados do mês de julho de 2011, após uma pré-análise das atividades realizadas

na primeira etapa da pesquisa de campo recém-explanada no item anterior, elaborei uma

proposta de trabalho pedagógico/intervenção, constante nos apêndices E e F, a qual, após ser

analisada com a respectiva professora e com a coordenadora pedagógica, foi desenvolvida nas

aulas em questão, durante todo o segundo semestre do referido ano. Essa proposta objetivou

levar os alunos da Sala de Apoio a utilizarem, ainda que minimamente, a linguagem como

prática situada de interação, ao mesmo tempo em que visou contribuir, teórico-

metodologicamente, com o trabalho da professora, culminando na produção de um jornal da

escola. Para isso, preparei, conforme constam nos apêndices citados, duas unidades de

trabalho intituladas, respectivamente: Ampliando o conhecimento sobre o funcionamento da

escola e Estudando o funcionamento de alguns serviços existentes na comunidade. Em cada

unidade, explicitei os encaminhamentos metodológicos, bem como as próprias atividades para

os alunos.

Entendo que a exploração de tais temáticas ajudou o aluno a conhecer melhor a

realidade que o cerca, via estudo e produção de textos sociodiscursivos, na tentativa de fugir

das produções escritas sobre assuntos insignificantes e sem uma função social. No item 4.2.1

encontram-se os encaminhamentos metodológicos que nortearam as atividades de produção

escrita durante o processo de intervenção.

Além de elaborar as duas unidades de trabalho mencionadas, para a intervenção, eu

coordenei a sua aplicação durante as aulas e participei do seu desenvolvimento, inclusive

Page 46: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

45

auxiliando os alunos na realização das atividades, mas quem exerceu, predominantemente, a

docência, foi a professora da turma.

É importante retomar que, de certa forma, o processo eleitoral para a escolha do novo

diretor da escola, vivenciado durante a realização da intervenção citada, interferiu,

negativamente, principalmente em alguns encaminhamentos realizados extrassala de aula

durante a intervenção, pois o clima era de muita disputa, desconfiança e tensão. Ocorreu que a

professora da Sala de Apoio, que participava da pesquisa, havia se posicionado,

explicitamente, a favor de uma chapa de candidatos, inclusive, ajudando-a na campanha.

Embora eu tenha permanecido neutra durante todo esse processo, percebi, por parte de alguns

profissionais da escola, um ar de desconfiança e de melindre também em relação a mim.

Provavelmente essa modificação na relação foi decorrente do fato de eu precisar estar muito

com essa professora.

Nesse clima de mudanças, observei, também, que os momentos de descontração na

hora do recreio, praticamente, deram lugar a conversas discretas entre poucas pessoas. De

qualquer forma, essa experiência foi muito importante por possibilitar-me o entendimento

daquele cotidiano escolar em diferentes situações e por ter me oportunizado vivenciar o

quanto a realização de uma eleição democrática para diretor de uma escola estadual altera o

seu cotidiano. Esse processo instigou-me a trazer uma reflexão sobre a manipulação da

palavra, com destaque à palavra democracia, entendendo que, uma vez fundamentada pela

teoria liberal, ela faz com que as pessoas se sintam igualmente livres, o que, para Breton

(1999), é o primeiro momento de toda a manipulação.

Venceu a chapa conduzida pelo então diretor. Logo após a realização desse pleito,

seus principais opositores anunciaram que solicitariam mudança de setor e, alguns, até mesmo

de escola.

1.9.3 Participações paralelas à intervenção

Na busca de maior compreensão dos pressupostos que norteiam os trabalhos nas

Salas de Apoio, participei, no segundo semestre de 2011, de um curso intitulado: Reflexões

sobre o ensino de Língua Portuguesa na perspectiva da mediação dialética, com duração de

quarenta horas-aula, direcionado a professores dessa disciplina que ministravam aulas em

Salas de Apoio, oriundos de municípios de abrangência do Núcleo Regional de Educação de

Cascavel. Essa participação, além de oportunizar-me um maior conhecimento dos

pressupostos teóricos e metodológicos que orientam a prática pedagógica da disciplina de

Page 47: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

46

Língua Portuguesa, nessas salas, também possibilitou que eu conhecesse, ainda que

brevemente, a postura dos respectivos professores em relação a tais pressupostos. O

certificado desse curso consta no anexo C.

Nesse semestre, além de participar nos Conselhos e Pré-conselhos de Classe, nas

reuniões com os pais para a entrega de boletins e nas rápidas reuniões realizadas nos fins dos

recreios das duas manhãs em que eu ficava na escola, tal como ocorreu no primeiro semestre,

também participei, como jurada, do Concurso de Oratória, realizado na primeira quinzena do

mês de dezembro de 2011, envolvendo um total de treze alunos candidatos, entre os do

Ensino Fundamental e os do Ensino Médio.

No início de dezembro, também acompanhei a preparação de uma exposição sobre a

cultura afro-brasileira e apreciei a sua realização, na qual foi colocada à mostra grande

quantidade de trabalhos, produzidos, principalmente, nas disciplinas de Arte, História e

Geografia.

No início desse mês foi realizada, ainda, a festa de encerramento do ano letivo junto

aos alunos da Sala de Apoio. Novamente, como no primeiro semestre, a professora de

Matemática dessa sala também participou, bem como um aluno que só cursava essa

disciplina. Esteve presente, ainda, uma irmã da aluna “J” que, no primeiro semestre, também

era aluna dessa turma, com essa professora.

Inicialmente, assistimos ao filme O Rio, seguido de poucos comentários. Na

sequência, entregamos kits de material didático a todos os alunos13, dos quais gostaram muito,

principalmente do conjunto de apontador e borracha que continham os símbolos dos

respectivos times de futebol. Para os poucos alunos que não encontramos material com tais

ilustrações, compramos outros, ilustrados por alguns personagens de desenhos animados.

Também improvisamos tais agrados para a aluna de matemática e para a irmã da aluna “J”.

O kit foi constituído por esse conjuntinho de apontador e borracha recém-

mencionado, um gibi, uma pequena coletânea de minilivros de literatura infantil, um lápis

13 Como a Gráfica da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE fez a diagramação do jornal, gratuitamente, e uma gráfica de iniciativa privada imprimiu, também gratuitamente, os quinhentos e cinquenta exemplares desse veículo de comunicação, os R$ 140,00 (cento e quarenta reais) arrecadados dos patrocinadores foram gastos na compra de kits de material didático para os alunos da Sala de Apoio, os quais foram entregues na festa de encerramento do ano letivo. É importante destacar que esse encaminhamento teve o acompanhamento e aprovação da direção da escola. Antes de comprar esses kits, fiz um levantamento, na sala, para saber a que time de futebol cada aluno torcia, a fim de comprar alguns materiais que contivessem os símbolos correspondentes. Para adquiri-los, fui acompanhada da professora de Língua Portuguesa da turma da sala em questão e de uma das secretárias da escola, a qual tinha autorização para comprar por atacado, para a instituição.

Page 48: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

47

“bom”, uma caixa de lápis de cor com doze cores, uma caneta, um caderno com capa dura e

um tubo de cola.

Após, sorteamos alguns materiais restantes, pois precisamos comprá-los em

pequenos pacotes fechados, os quais continham vários exemplares. Assim, foram sorteados

alguns tubos de cola, vários lápis, algumas canetas e, além disso, um conjunto com uma

lapiseira e um lápis- borracha, o qual foi bastante desejado por eles. A maioria dos alunos

valorizou muito esses materiais, haja vista que poucos os possuíam, devido às precárias

condições socioeconômicas a que estão submetidos.

Em seguida, a aluna “E” leu uma homenagem emocionante dirigida a mim, escrita

pela professora da turma, que, também, entregou-me um presente. O aluno “H” leu outra

mensagem, a qual foi produzida pelos alunos para a respectiva professora. Também entreguei-

lhe um presente. Por último, partimos para os “comes e bebes”. Foi um momento muito

agradável e descontraído, inclusive alguns já diziam que sentiriam muita saudade.

Os alunos “M” e “F” não compareceram a esse encerramento. Entretanto, é

pertinente trazer algumas informações relacionadas a esse não comparecimento, conforme

explicações a seguir.

No fim da festinha, o aluno “M” apareceu no pátio da escola, cuja presença foi

“descoberta” pelo aluno “H”, que participava do referido evento. Ao vê-lo, este pegou, de

cima da mesa da professora o kit destinado ao colega que estava no pátio, e, sem nos avisar,

saiu correndo para entregar-lhe. Dois alunos que o seguiram viram que o aluno “M” guardou

para si os lápis de cor e o conjunto de apontador e borracha, mas, com descaso, distribuiu os

outros materiais a alguns colegas que estavam por perto. As atitudes desses dois alunos

podem ser mais bem entendidas a partir da apresentação de algumas de suas características

descritas no apêndice A, o qual contempla algumas particularidades dos discentes.

Quanto à aluna “F”, parecendo querer chamar a atenção, o que era próprio de seu

comportamento, na aula que antecedeu à festinha, sem apresentar justificativa, avisou que não

compareceria a esse encerramento. Ela manteve sua posição mesmo após a insistência de

minha parte e da professora para que comparecesse. No entanto, no dia posterior ao evento,

quando ela me viu conversando com alguns profissionais da escola, dirigiu-se a mim para

cumprimentar-me, carinhosamente, o que era raro acontecer. Disse que não tinha ido à

festinha porque teve um problema. Lembro que durante o ano todo ela foi uma aluna difícil,

caracterizada, por muitos professores, como “dengosa, teimosa, gritona, briguenta.” Porém,

quando se dispunha a produzir, embora muito lentamente, o fazia com certa coerência, tendo

demonstrado, inclusive, um grande avanço durante o ano letivo.

Page 49: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

48

Essas diversificadas experiências de vivência e de interação envolvendo,

principalmente, a pesquisadora, os alunos e a professora da Sala de Apoio em questão, com

destaque aos significativos momentos da longa intervenção nessa sala, criou um ambiente

culturalmente sensível aos sujeitos em interação, o que favoreceu a aprendizagem.

Uma vez situada a pesquisa em questão, inicio, no capítulo que se segue, a

explanação dos pressupostos teóricos que a fundamentam.

1.10 ORGANIZAÇÃO DA TESE

O presente trabalho de tese está constituído por quatro capítulos, conforme

especificação a seguir:

a) No capítulo introdutório, sob o título Situando a investigação, trago um panorama

de todo o desenvolvimento da pesquisa, contemplando, além da exposição do tema e de seus

antecedentes, os objetivos, as perguntas, os procedimentos, os encaminhamentos, a

perspectiva teórico-metodológica, a descrição do cenário e dos sujeitos envolvidos, bem como

o detalhamento da pesquisa de campo, tanto da parte de observação e geração de dados,

quanto da intervenção realizada na Sala de Apoio mencionada.

b) No segundo capítulo, intitulado Concepções de linguagem e ensino de língua

materna: foco na produção textual, inicio a explicitação dos fundamentos da pesquisa. A

primeira parte contribui para o entendimento das concepções de linguagem que fundamentam

as práticas tradicionais das aulas de Língua Portuguesa e, a segunda, aponta uma possibilidade

para a efetivação de um ensino dessa disciplina na direção de preparar o aluno para a

realização de práticas discursivas via produção escrita. Para finalizar esse capítulo, trago

elementos para analisar o que ainda se faz nas aulas de Língua Portuguesa e o que se quer

fazer.

c) O terceiro capítulo, também na direção de fundamentar teoricamente esse trabalho

de tese, tem por título: Gêneros textuais-discursivos, ensino e produção escrita. Procuro,

nessa parte, analisar esses gêneros vendo-os como um possível caminho para viabilizar a

interação. Abordo, na sequência, a tipologia textual e trago algumas reflexões sobre alguns

gêneros textuais-discursivos da esfera jornalística, contemplados na fase da intervenção da

pesquisa de campo. Logo após, sintetizo uma proposta metodológica para explorar os

gêneros: sequência didática. Finalizo esse capítulo abordando o item Atividades de

estruturação da língua subjacentes às sequências didáticas.

Page 50: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

49

d) Em O cotidiano da Sala de Apoio, análise das produções escritas e intervenção,

que constitui o quarto e último capítulo, apresento um primeiro olhar para a parte inicial da

pesquisa de campo, contemplando o cotidiano da Sala de Apoio observada, a relação desses

alunos com a produção escrita, bem como faço uma análise de algumas dessas produções

realizadas na fase em que observei/participei das aulas, observando, sobretudo, os aspectos

estruturais dos textos como coerência, coesão, progressão, pontuação, paragrafação, conforme

o segundo item da tabela diagnóstica, que contém critérios de análise linguístico-discursiva,

de autoria de Costa-Hübes (2008), que constitui o anexo D do presente trabalho.

Na segunda parte desse capítulo explicito os encaminhamentos metodológicos que

nortearam a intervenção que realizei na Sala de Apoio no segundo semestre de 2011, bem

como analiso algumas produções textuais dos alunos realizadas durante esse período, com

ênfase nos aspectos interacionais, contemplados na primeira parte da tabela mencionada. Para

encerrar esse capítulo, trago algumas reflexões sobre as ações de intervenção relacionadas a

essas produções escritas.

Finalizando esse trabalho de tese, apresento as considerações finais, as referências,

os apêndices e os anexos.

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CAPÍTULO 2 – CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: FOCO NA PRODUÇÃO TEXTUAL

Inicio o presente capítulo refletindo sobre duas concepções de linguagem: como

expressão do pensamento e como instrumento de comunicação. Na sequência,

fundamentando a perspectiva que embasou a intervenção que realizei na Sala de Apoio, trago

algumas reflexões sobre a concepção interacionista de linguagem. Para finalizar esse capítulo,

procuro apontar para o que ainda é feito na escola em relação à produção escrita e para o que

se pretende fazer, tendo como norte as concepções de linguagem mencionadas.

2.1 O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA À LUZ DE CONCEPÇÕES TRADICIONAIS14 DE LINGUAGEM

O ensino da Língua Portuguesa, ao longo das décadas, tem passado por sérias

transformações, influenciadas, sobretudo, pela maneira de se conceber a linguagem, o que é

decorrente das mudanças no âmbito da ciência da linguagem bem como nas ciências humanas

de forma mais ampla.

Em um primeiro momento, ela foi concebida como expressão do pensamento,

portanto, foi tratada pelo viés subjetivo; em um segundo momento, contrapondo a essa

compreensão, a linguagem foi concebida como código, estrutura, logo, como um instrumento

a serviço da comunicação, a partir de um olhar objetivo; e, num terceiro momento, na

perspectiva de avançar em relação às concepções anteriores, a linguagem passa a ser

compreendida como forma de interação entre os interlocutores.

A concepção de linguagem como expressão do pensamento orienta para

encaminhamentos metodológicos que vão à direção de entender a linguagem como um dom

individual, produzida internamente nas pessoas, a qual, segundo Geraldi (1997a, p. 41) “[...]

ilumina, basicamente, os estudos tradicionais. Se concebermos a linguagem como tal, somos

levados a afirmações – correntes – de que pessoas que não conseguem se expressar não

pensam.”

14 As concepções tradicionais da linguagem são compreendidas como aquelas que priorizam a exercitação da gramática normativa com base em atividades mecânicas em detrimento da priorização do contato do aluno com a escrita com fins interacionais, considerando a linguagem em uso e não uma forma engessada de língua, que não reflete o mundo real.

Page 52: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

51

Nessa perspectiva, para Travaglia (1996, p. 21), a enunciação advém tão somente da

mente, sem interferência de outras pessoas ou do meio social, é “[...] um ato monológico

individual.” Considerando esse viés, Travaglia (1996, p. 21) explica que, para essa concepção,

As leis da criação linguística são essencialmente as leis da psicologia individual, e da capacidade de o homem organizar de maneira lógica seu pensamento dependerá a exteriorização desse pensamento por meio de uma linguagem articulada e organizada. Presume-se que há regras a serem seguidas para a organização lógica do pensamento e, consequentemente, da linguagem. São elas que se constituem nas normas gramaticais do falar e escrever “bem” que, em geral, aparecem consubstanciadas nos chamados estudos linguísticos tradicionais que resultam no que se tem chamado de gramática normativa ou tradicional [...]. (Aspas do autor).

Logo, a capacidade de dominar a linguagem é medida pelo modo de falar e de

escrever “bem”. Sendo assim, ela corresponde à capacidade de organização lógica do

pensamento, revelada na maneira de falar e de escrever. Desse modo, ensinar a linguagem, de

acordo com essa concepção, significa, conforme Costa-Hübes (2008, p. 131), ensinar a

[...] gramática teórico-normativa por meio de atividades que exijam, do aluno, o ato de conceituar, classificar, para, sobretudo, entender e seguir as prescrições – em relação à concordância, à regência, à acentuação, à pontuação, ao uso ortográfico. Acredita-se, dessa forma, que pensar bem, de acordo com os princípios gramaticais, significa falar bem a fim de transpor tais construções verbais para a produção escrita.

Nesse viés, valorizam-se os modelos bem construídos, acreditando-se que estes irão

ensinar a fala e a escrita corretas.

Em se tratando da leitura, Orlandi (1993) aponta que o exercício da interpretação,

conforme essa concepção de linguagem, praticamente tem um modelo a seguir, o qual é

apresentado pelo professor, ou explicitado pelos autores nas respectivas orientações de

utilização dos livros didáticos. Nesse horizonte, Costa-Hübes (2009, p. 132) explica: “O que

ocorre, na verdade, é o silenciamento dos sentidos possíveis revelados em um texto.” Para a

autora, assumir essa concepção de linguagem

[...] significa adotar uma metodologia de ensino que tenha o professor como a autoridade do saber, a quem compete ensinar os alunos a ler, a escrever e, principalmente, a dominar uma fala ideal, pois esse é o principal enfoque do ensino. Para isso, tomará como base palavras, frases e/ou textos-modelos (literários), os quais serão ouvidos (pois primeiramente o professor lê), repetidos conforme orientações (o professor lê e os alunos repetem em seguida, exercitando, assim, a fala correta), decodificados (por meio de uma leitura oral que reconheça letras, sílabas, palavras, frases e textos) e, por fim, copiados (como forma de fixação da estrutura bem construída).

Page 53: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

52

Tais procedimentos, decorrentes da concepção de linguagem como expressão do

pensamento, considerados tradicionais, ainda permeiam muitas aulas de Língua Portuguesa,

seja no encaminhamento da leitura, da oralidade, seja no da escrita. Conforme essa

concepção, o aluno, também ao produzir um texto, tenderá a guiar sua escrita pelo rigor das

regras gramaticais, as quais o levariam a ter um bom desempenho tanto na fala quanto na

escrita.

Esses encaminhamentos revelam, como lembra Maciel (2001, p. 22), que o aluno é

reconhecido e “[...] tratado como um ser passivo, a quem cabe ouvir, ler e copiar, com o

objetivo de assimilar regras (espécies de leis de uso da língua).” Assim, no ensino da Língua

Portuguesa, a principal meta é o trabalho com os conteúdos gramaticais, cabendo ao

professor, conforme a autora, o envolvimento para que os alunos construam frases corretas

gramaticalmente como forma de garantir que se expressem bem. Nesse sentido, Maciel (2001,

p. 22) observa que “[...] havia uma excessiva valorização da forma, e uma quase inexistente

preocupação com o sentido.”

Tais análises levam à conclusão de que o método de ensino que corresponde à

concepção de linguagem como expressão do pensamento é a memorização e que as principais

estratégias para o ensino são a cópia e a repetição. Matencio (1994) lembra que essa

concepção tem por base a gramática tradicional.

Contrapondo-se a essa vertente teórica, destaca-se a concepção denominada

linguagem como estrutura ou instrumento de comunicação. A ideia de estrutura parte do

pressuposto de que os objetivos da linguagem são pragmáticos e utilitários. Assim, a

linguagem vista desta forma orienta o aluno para dominar o código escrito e, a partir dele,

emitir e receber mensagens tanto verbais quanto não verbais.

Com base nesses pressupostos, entende-se que a linguagem é representada por um

sistema de signos e que uma forma de operar com tais signos é por meio da leitura e da

escrita. No entanto, mesmo que a linguagem seja reconhecida como social, adquirida numa

determinada sociedade, em determinado momento, ela é tratada como um sistema, sem

aproximar-se das relações de uso. Nessa direção, Travaglia (1996, p. 23) afirma que essa

concepção

[...] levou ao estudo da língua enquanto código virtual, isolado de sua utilização – na fala (cf. Saussure) ou no desempenho (cf. Chomsky). Isso fez com que a Linguística não considerasse os interlocutores e a situação de uso como determinantes das unidades e regras que constituem a língua, isto é, afastou o indivíduo falante do processo de produção, do que é social e histórico na língua.

Page 54: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

53

O autor explica que essa é uma visão monológica e imanente da língua que a estuda

segundo uma perspectiva formalista – que limita esse estudo ao seu funcionamento interno – e

que a separa do homem no seu contexto social. Nessa perspectiva, Perfeito (2005, p. 33)

explica que, nessa concepção estruturalista, “[...] a língua é vista, a-historicamente, como um

código, capaz de transmitir uma mensagem de um emissor a um receptor, isolada de sua

utilização.”

Conforme critica Bakhtin (2011), o mais importante para essa concepção, é assimilar

o sistema linguístico, ou seja, o sistema das formas fonéticas, gramaticais e lexicais da língua,

pois o que interessa é ensinar o código. Esclarecendo, Costa-Hübes (2009) adverte que, sob

essa égide, para o aluno aprender a ler e a escrever corretamente, é suficiente ensinar-lhe as

estruturas constituintes da língua, ou seja, codificar e decodificar fonemas, morfemas,

palavras e frases. Dessa forma, prioriza-se, no ensino da Língua Portuguesa, atividades

direcionadas a explorar a arquitetura das palavras e frases, classificando seus elementos

constituintes. Ganham ênfase as nomenclaturas e as categorizações.

Esses estudos, voltados ao sistema linguístico, amparam-se, principalmente, nos

estudos saussurianos para quem a língua, embora social, deveria ser apreendida a partir de

seus componentes estáveis e sistemáticos, uma vez que permitiriam traçar certas

regularidades. Para isso o foco deveria recair sobre a escrita (e não à fala), já que esta

garantiria maior estabilidade.

Paralelamente a essas reflexões estruturalistas, e atendo-se mais ao viés social da

linguagem, destaca-se outra corrente cujo principal precursor é Jakobson (2010). Esse

estudioso da linguagem, que também reconhece, assim como Saussure (1974), a linguagem

como código, estende essa discussão para o âmbito da comunicação, pois, se ela é social, ela

deve servir para estabelecer relação entre um emissor e seu(s) receptor(es). Todavia, para isso,

é preciso que ele domine o código, visto que esse domínio lhe garantirá melhor performance

na comunicação. Nesse sentido, o ensino de Língua Portuguesa deve ser pragmático e

utilitário.

Conforme essa concepção, o falante objetiva enviar uma mensagem a um receptor,

que, para isso, a coloca em códigos (codificação). Nesse horizonte Travaglia (1996, p. 22-23)

explica: “O outro recebe os sinais codificados e os transforma de novo em mensagem

(informações). É a decodificação.”

Foi essa vertente que subsidiou a Teoria da Comunicação, tão propalada no ensino

da Língua Portuguesa na década de 1970, o que, de certa forma, reformulou o ensino dessa

disciplina. Se o foco é a comunicação, importa que o aluno leia mais (para melhor

Page 55: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

54

decodificar) e escreva mais (para treinar e demonstrar o domínio do código). Assim, reforça-

se o ensino da leitura e da escrita, porém com ênfase na forma, na estrutura da língua,

tomando como parâmetro a gramática normativa.

Nesse período, um dos encaminhamentos mais explorados nas aulas de Língua

Portuguesa era o modelo de aparelho da comunicação, com todos os seus elementos muito

bem marcados, com reflexos, conforme Jakobson (2010), nas funções da linguagem. Para o

autor, os fatores que constituem o ato de comunicação verbal são: o remetente

(emissor/codificador), a mensagem a ser transmitida pelo emissor, o destinatário

(decodificador), o referente (assunto tratado na mensagem), um contato (canal entre emissor e

receptor) e o código (linguagem que organiza a mensagem), os quais determinam as funções

da linguagem. Geralmente uma mensagem é constituída por mais de uma dessas funções,

sendo que uma é predominante. A seguir, analiso brevemente algumas delas.

A função emotiva expressa uma atitude do emissor relacionada ao que estiver

falando, explicitando uma emoção, cuja situação é facilitada pelo uso de interjeições.

Jakobson (2010, p. 157-158) fala que essa função “[...] colore, em certa medida, todas as

nossas manifestações verbais, ao nível fônico, gramatical e lexical.” Já a função conativa é

centrada no destinatário, a qual é expressa mais no vocativo e por meio do imperativo,

entendendo que sentenças imperativas são significativamente diferentes das sentenças

declarativas e que estas, conforme o autor, podem ser submetidas à prova de verdade. A

função fática, por sua vez, objetiva prolongar a comunicação. Nas palavras de Jakobson

(2010, p. 161):

Há mensagens que servem fundamentalmente para prolongar ou interromper a comunicação, para verificar se o canal funciona (“Alô, está me ouvindo?”), para atrair a atenção do interlocutor ou confirmar sua atenção continuada (“Está ouvindo?” ou, [...] “Prestai-me ouvidos!” – e no outro extremo do fio, “Hum-hum!”. (Destaques do autor).

Em outra situação em que o remetente e/ou o receptor precisam verificar se estão

usando o mesmo código, há a existência da função metalinguística. Nessa função, o enfoque

é, pois, o código.

Costa-Hübes (2009, p. 134) observa que os textos, conforme a concepção de

linguagem enquanto estrutura ou instrumento de comunicação,

[...] reduzem-se a modelos narrativos, descritivos e dissertativos, apresentados, pelo professor, antes do exercício de redação, sem qualquer relação com o contexto de produção. Assim, eles são categorizados conforme a sua tipologia, para as quais se

Page 56: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

55

apresentam técnicas que orientarão na produção de ‘bons’ textos, pois o que importa é o reconhecimento da estrutura tipológica. (Destaque da autora).

Esse encaminhamento de adoção indiscriminada de modelos apresentados pelo

professor é entendido, por Marina Célia Mendonça15 (2001), como uma forma de ignorar a

palavra do aluno, cabendo a ele o preenchimento de estruturas modelares. Tal

encaminhamento, de acordo com Kato (1987), é conduzido partindo das unidades menores, de

forma linear e indutiva, para obter o significado com base na análise e síntese das partes do

texto, o que caracteriza a leitura como decodificação.

Pautada nessas reflexões, Costa-Hübes (2009, p. 134) sintetiza:

[...] o agir metodológico do professor, quando orientado por tal concepção, limita-se a ensinar gramática por meio de exercícios estruturais (siga o modelo, complete as lacunas, marque X etc.), a ler decodificando as informações que se encontram no texto (exploradas por questionários com perguntas e respostas, por resumos e fichamentos de obras) e a escrever textos, conforme as estruturas tipológicas (narrativos, descritivos ou dissertativos).

A autora compreende que, dessa forma, o professor é considerado o detentor do

saber, cabendo ao aluno apenas receber os conhecimentos que ele repassa.

Perfeito (2005) entende que, tanto o estruturalismo quanto a teoria da comunicação e

o estudo das funções da linguagem contribuíram para uma nova proposta de ensino de Língua

Portuguesa que, no Brasil, ganhou força com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional nº 5.692, de 1971.

Para a autora (PERFEITO, 2005, p. 34), a partir dessa Lei, “[...] a Língua Portuguesa,

no ensino de 1o grau, passou a integrar, como carro-chefe, a área de Comunicação e

Expressão, aí incluídas as disciplinas de Educação Física, Educação Artística e Língua

Estrangeira, cuja integração era quase inexistente na prática.” No entanto, Perfeito (2005)

lembra que, mesmo com as novas formas de conceber a linguagem e, com ela, um novo

espaço dado à leitura e à produção textual, bem como a incorporação de aspectos da teoria da

comunicação, o ensino da linguagem continuou priorizando a gramática.

Nessa perspectiva, Baumgärtner (2009) explica que a linguagem é vista como

código: ela não é só um sistema de regras a serem adquiridas, mas um sistema que os falantes

precisam dominar para transmitir mensagens com eficácia. Destarte, no período da Ditadura

Militar foi atribuída uma grande atenção ao ensino de Língua Portuguesa, ocasião em que ela

15 Como contemplo duas autoras com o sobrenome Mendonça (Marina Célia e Márcia), para identificá-las, no texto, escrevo seus nomes completos.

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56

passou a ser vista como uma forma de fortalecimento do Estado nacionalista brasileiro. A

autora (BAUMGÄRTNER, 2009, p. 109) lembra que esse ensino, em conformidade com a

LDB nº 5692/71, visava à “[...] defesa do idioma nacional, bem como sua expansão e seu

prestígio.”

Conforme essa concepção, Costa-Hübes (2009, p. 133) adverte que o ensino de

Língua Portuguesa também é conduzido de forma a propiciar “[...] o ensino prescritivo da

gramática normativa, explorada sob o método da memorização, estrategicamente organizado

por atividades de cópia e repetição.” Nessa direção, Perfeito (2005) lembra que os fatos

linguísticos são enfatizados, sobretudo, por exercícios morfossintáticos, na expectativa de que

os hábitos linguísticos da norma culta sejam apropriados. Para isso, são utilizados exercícios

que objetivam levar o aluno a decorar as estruturas bem construídas para, após, utilizá-las em

suas produções escritas. Dentre tais exercícios destaca-se o tipo siga o modelo.

Costa-Hübes (2009) observa que, embora os professores já tenham à disposição

documentos pedagógicos como as Diretrizes Curriculares da Educação Básica – Língua

Portuguesa (PARANÁ, 2008), os Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa

(BRASIL, 1998), pautados por outra perspectiva metodológica, com base na concepção

interacionista de linguagem, as duas concepções recém-expostas ainda estão muito presentes

nas aulas dessa disciplina.

2.2 A CONCEPÇÃO INTERACIONISTA DE LINGUAGEM: OUTRO HORIZONTE

PARA AS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Na metade do século passado, época em que a concepção de linguagem como

comunicação teve predominância nos cursos de Letras e, por decorrência, nas aulas de língua

materna, também teve início, conforme Mendes (2012, p. 671), outra forma de entender a

linguagem com base nas

[...] tendências sociointeracionistas e enunciativas de estudo da linguagem. Os desenvolvimentos de áreas como a sociolinguística, a pragmática, a linguística da enunciação, a análise do discurso, a linguística textual, a linguística aplicada, para citar as mais influentes, provocaram um deslocamento das visões sistêmicas de língua, já naturalizadas, para trazer para o foco a língua como lugar de interação, como dimensão através da qual os indivíduos atuam no mundo e se constituem como sujeitos – a língua é, mais do que tudo, ação entre sujeitos situados social, histórica e culturalmente.

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57

Essa concepção passou a ser mais reconhecida na área da Linguística a partir dos

estudos das produções de Mikhail Bakhtin (1895-1975) e de seu Círculo, a qual foi

denominada por Geraldi (1997a) e Travaglia (1996) como Linguística da Enunciação e, por

Morato (2004), como Linguística Interacional.

Como decorrência desse movimento, os pontos de vista sobre os objetos estudados

na área de linguística foram sendo alterados, ao mesmo tempo em que, para Matencio (1994,

p. 75), “[...] o desenvolvimento das áreas interdisciplinares refletiu em novas propostas para a

análise dos dados linguísticos.” Assim, diversas revoluções no campo da ciência e da

linguagem e nas ciências humanas de modo geral, contribuíram para essas mudanças, a

exemplo da Pragmática, cuja tendência muda radicalmente a forma de conceber a linguagem

e a linguística. Para Pinto (2001, p. 47-48), ela representa a “[...] ciência do uso linguístico.

[...] A pragmática aposta nos estudos da linguagem, levando em conta também a fala, e nunca

nos estudos da língua isolada de sua produção social.” (Destaque da autora).

Outra característica dessa área, apontada pela autora (PINTO, 2001, p. 48), é o

reconhecimento de que “[...] os fenômenos linguísticos não são puramente convencionais,

mas sim compostos também por elementos criativos, inovadores, que se alteram e interagem

durante o processo de uso da linguagem.” Essa criatividade pode provocar mudanças,

acordos, rejeições, o que tende a levar a situações imprevisíveis, pois, conforme a referida

teórica (PINTO, 2001, p. 66), “[...] é impossível descrever e/ou prever todas as estruturas e

combinações existentes numa língua.” Em síntese, Pinto (2001, p. 65) entende que com o

auge dos estudos da pragmática nas últimas décadas do século XX,

A atividade linguística ganha um espaço cada vez mais frequente na Linguística. Trabalhos discutem a relação dos signos com a prática da linguagem para evidenciar o processo inovador da conversação humana. Aspectos linguísticos são sistematicamente submetidos a exames para valorizar sua condição de constituinte social. As variações sintáticas e fonológicas são estudadas pela sua significação social para os/as falantes. O bilinguismo é analisado como construtor e mantenedor das hierarquias sociais em países colonizados. Os relatos de mulheres são interpretados no que transmitem de suas auto-imagens que o universo masculino tem delas.

Assim, conforme a autora, a Pragmática prioriza em suas pesquisas os sujeitos

sociais, sendo que as que utilizam dados empíricos contemplam questões como racismo,

sexismo, relações de poder, diferenças socioeconômicas, ética entre outras.

Referente à Linguística da Enunciação ou Linguística Interacional, alvo do presente

tópico, Costa-Hübes (2009, p. 135), compreendendo que a linguagem é dialógica e

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58

estreitamente articulada ao conhecimento humano, observa que ao invés de limitar-se à forma

e à estrutura, ela

[...] é interpretada como ação humana mediadora entre o homem e a sociedade, por ajudá-lo a entender, interpretar, representar, influenciar, modificar, transformar a realidade. Assim, no contexto da interação entre o homem e o meio, as relações de mediação ocorrem na e pela linguagem.

Desse modo, divergindo das concepções tradicionais, a linguagem passa a ser

entendida como um símbolo criado historicamente pelo homem, ao interagir com seus

semelhantes, na busca da satisfação de suas necessidades. Nesse sentido, Bronckart (1999, p.

34), compreendendo que a cooperação dos indivíduos, em suas atividades, é mediada por

interações verbais, afirma que a linguagem é “[...] primariamente, uma característica da

atividade social humana, cuja função maior é de ordem comunicativa ou pragmática.” E,

como todas as produções humanas, ela apresenta um caráter histórico, cuja produção é

interativa e, portanto, articulada às atividades sociais que se organiza em discursos ou textos.

Na mesma direção, Geraldi16 (2009, p. 25) compreende que “[...] o fenômeno social

da interação verbal é o espaço próprio da realidade da língua, pois é nele que se dão as

enunciações enquanto trabalho dos sujeitos envolvidos nos processos de comunicação social.”

Na perspectiva desse entendimento, o autor (GERALDI, 1997a, p. 41) assim sistematizou

ainda na década de 1980:

A linguagem é uma forma de interação: mais do que possibilitar uma transmissão de informações de um emissor a um receptor, a linguagem é vista como um lugar de interação humana. Por meio dela, o sujeito que fala pratica ações que não conseguiria levar a cabo, a não ser falando; com ela o falante age sobre o ouvinte, constituindo compromissos e vínculos que não preexistiam à fala. (Grifos do autor).

16 Sem desmerecer outros autores, entendo que cabe a João Wanderley Geraldi o mérito por grandes inovações no ensino de Língua Portuguesa no Brasil, sobretudo na região Oeste do Paraná, por ter sido o mentor de uma proposta nessa área, na perspectiva interacionista, como lembra Costa-Hübes (2008), cuja proposta, em síntese, propunha práticas de linguagem em efetivo uso, pautada na leitura e produção de textos e na análise linguística (GERALDI, 1997b). Tal proposta foi sendo propagada, sobretudo, por meio de cursos de especialização e muitos outros de formação continuada, principalmente aos professores de 5ª a 8ª séries, inicialmente desenvolvidos na região mencionada. Para a realização de alguns cursos a esses professores, Geraldi selecionou onze textos, os quais compuseram, em 1984, o livro O texto em sala de aula, organizado por ele. Destaco que ele é autor de quatro desses textos e coautor de outro. Esse livro foi editado nove vezes, com altas tiragens (aproximadamente vinte e cinco mil exemplares), pela Associação Educacional do Oeste do Paraná - ASSOESTE, Cascavel, Paraná, cuja instituição foi a principal organizadora de tais eventos. A partir de 1996, esse livro passou a ser publicado pela Editora Ática, que editou, praticamente, o mesmo número de exemplares. Destaco que eu e uma então colega da Secretaria Municipal de Educação de Cascavel, Marilei Lourdes dos Santos Teixeira, fomos as primeiras professoras desse município a adequar a mesma proposta para o ensino de Língua Portuguesa para as séries iniciais do Ensino Fundamental e a socializá-la, para os professores da rede, por meio de cursos.

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Travaglia (1996, p. 69), também na perspectiva de explicar que ao utilizarmos a

linguagem realizamos ações bilaterais e agimos sobre o outro, o faz explicitando que essa

ação não é unilateral, pois “[...] o que acontece é uma interação, uma ação entre o produtor e o

receptor do texto.” No entanto, o autor adverte que a efetivação do sentido em uma situação

interativa depende também do tipo de ação.

Bronckart (1999, p. 42), por sua vez, fala da linguagem articulada à ação ao

explicitar que: “A tese central do interacionismo sócio-discursivo é que a ação constitui o

resultado da apropriação, pelo organismo humano, das propriedades da atividade social

mediada pela linguagem.” (Destaque do autor). Para o autor (1999, p. 48), “[...] a ação da

linguagem é uma unidade mais abstrata e o texto um objeto mais concreto.” Nesse sentido,

para Bronckart (1999, p. 72), os textos são oriundos da atividade humana e “[...] estão

articulados às necessidades, aos interesses e às condições de funcionamento das formações

sociais no seio das quais são produzidos.” Assim, dependendo das necessidades sociais ou de

diferentes circunstâncias de comunicação, novos textos/gêneros textuais podem emergir.

Nesse horizonte, Geraldi (1997c) entende que a linguagem pode ser compreendida

como o princípio regulador do desenvolvimento humano, pois possibilita ao sujeito entender

o mundo e nele agir, inclusive adverte que é ela quem propicia os encontros, desencontros e

confrontos de posições. Partindo desse pressuposto, o autor atribui à interlocução um lugar

privilegiado, pois considera que é no ato de interagir com o outro que produzimos linguagem

e somos constituídos por ela. Em suas palavras (GERALDI, 2009, p. 63): “No próprio ato de

falarmos, de nos comunicarmos com os outros, pela forma como o fazemos, estamos

participando, queiramos ou não, do processo de constituição da língua.” Assim, para o autor

(GERALDI, 2009, p. 63), a linguagem é entendida

[...] como uma atividade constitutiva, cujo lócus de realização é a interação verbal. Nesta relacionam-se um eu e um tu e na relação constroem os próprios instrumentos (a língua) que lhes permitem a intercompreensão. [...] é pelo processo de internalização do que nos era exterior que nos constituímos como sujeitos que somos, e, com as palavras de que dispomos, trabalhamos na construção de novas palavras. (Grifos do autor).

Assim, a linguagem incide sobre o outro, pois através dela representamos e

apresentamos a realidade, agindo de forma que nossas motivações resultem em outras

motivações para o interlocutor. Logo, é nessas interações que os sujeitos vão se constituindo e

modificando o mundo em que vivem.

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Conforme Geraldi (2009), tanto as ações que fazemos sobre a linguagem quanto

aquelas que fazemos com a linguagem são consideradas trabalho, entendendo que, ao

produzir um discurso, recorre-se aos recursos linguísticos e procura-se organizá-los para

produzir o sentido desejado. A busca dessa organização se dá em função do interlocutor,

objetivando clarear, o máximo possível, cada ato praticado com a linguagem. Sob essa

perspectiva, cabe lembrar que, para o autor (GERALDI, 1997c), o nosso dizer é cerceado por

fatores estruturais e históricos que interferem decisivamente no que dizer e em como dizer,

limitando ou estabilizando formas de raciocínio e formas de compreensão do mundo. Assim,

as ações que desenvolvemos com a linguagem são afetadas tanto pelo contexto mais amplo

quanto pelo contexto imediato, ou seja, por mecanismos de controle externos, internos e dos

próprios sujeitos. Um dos exemplos mais evidentes dos mecanismos de controle externos é a

proibição ou autorização que indica o que se pode ou não dizer, podendo estar relacionada

tanto ao assunto, quanto às circunstâncias da fala ou aos sujeitos envolvidos na interação.

Quanto aos mecanismos internos de controle, estão relacionados ao que está contido

nos próprios discursos, destacando-se o comentário, a autoria e a disciplina, lembrando que o

comentário é controlado pelo outro texto a que se refere; a autoria é um procedimento que

exige do autor coerência com seu próprio discurso, enquanto que a disciplina estabelece

regras para ele. Os mecanismos de controle dos sujeitos, por sua vez, dizem respeito à

apropriação que os indivíduos fazem dos saberes que dominam. É por essa apropriação que a

sociedade define os sujeitos competentes ou não para falar sobre determinados temas.

Assim, de uma forma ou de outra, nossos discursos passam por controles externos ou

internos, haja vista que, como sujeitos socialmente constituídos, os produzimos dentro de

determinado contexto sócio-histórico definido, o qual regula o que podemos ou não dizer em

cada situação. Portanto, para organizar o nosso dizer, selecionamos os recursos linguísticos.

Destaco que, grande parte das reflexões que foram realizadas, no Brasil, pelos

autores que eu cito, tem por base os pressupostos teóricos levantados por Bakhtin e seu

Círculo, a exemplo da afirmação de Bakhtin/Volochinov (2009, p. 95-96) ao defender que o

[...] locutor serve-se da língua para suas necessidades enunciativas concretas (para o locutor, a construção da língua está orientada no sentido da enunciação da fala). Trata-se, para ele, de utilizar as formas normativas [...] num dado contexto concreto. [...] Mas o locutor também deve levar em consideração o ponto de vista do receptor.

Valorizando o papel do interlocutor em uma relação dialógica, os autores

(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 117) entendem que toda palavra possui duas faces,

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61

considerando que alguém lhe dá origem e que outro alguém é o destinatário, pois “[...] ela

constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. [...] A palavra é uma

espécie de ponte lançada entre mim e os outros. [...] é o território comum do locutor e do

interlocutor.” (Grifos dos autores).

Assim, Bakhtin/Volochinov (2009) compreendem que a utilização da língua

transcende o sistema abstrato de formas normativas, considerando que o locutor e o receptor

utilizam a linguagem conforme as particularidades surgidas em cada situação de interação.

Nesse sentido, a palavra é, pois, uma enunciação. Nesse viés, os autores

(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 127) esclarecem:

A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua. (Grifos dos autores).

Na defesa de que a enunciação é social por realizar-se entre falantes,

Bakhtin/Volochinov (2009, p. 132) afirmam: “A estrutura da enunciação é uma estrutura

puramente social. A enunciação como tal só se torna efetiva entre falantes.” (Grifos dos

autores). Portanto, para eles, a organização de cada enunciação ocorre conforme o meio social

em que o indivíduo está inserido, como resultado da interação social, rejeitando, assim, o

subjetivismo individualista. Nesse sentido, os autores (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p.

125) explicam: “Só o grito inarticulado de um animal procede do interior, do aparelho

fisiológico do indivíduo isolado. É uma reação fisiológica pura e não ideologicamente

marcada.” Compreendo, pois, como Leontiev (1959, p. 379) “[...] que o homem é um ser de

natureza social, que tudo o que tem de humano nele provém da sua vida em sociedade, no

seio da cultura criada pela humanidade.” (Grifos do autor). Ele (LEONTIEV, 1959, p. 284)

defende, inclusive, “[...] que se as crianças se desenvolverem desde a mais tenra idade, fora da

sociedade dos fenômenos por ela criados, o seu nível é o dos animais.” O que significa que as

crianças criadas fora do convívio dos humanos, além de seus movimentos não se

assemelharem aos deles, não possuiriam nem linguagem. Portanto, Leontiev (1959) corrobora

com as ideias de Vygotsky (1998) no sentido de entender que as características

humanas/sociais não são passadas por hereditariedade biológica. Assim, conforme a

psicologia social, todo o conhecimento é resultado das relações histórico-culturais

determinantes do meio.

Page 63: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

62

Essa forma de compreender o movimento sócio-histórico articula-se aos pressupostos

teóricos do materialismo histórico dialético, pautado em Marx (1975), cujo entendimento do

método está implícito no respectivo nome. Conforme essa concepção, quem faz a história são

os homens, considerando que a matéria é anterior ao pensamento, portanto, é idealista a

tentativa de explicar o homem deslocado da história. Cabe destacar que esse método só lida

com a abstração, com a ideia, mas o pressuposto dela está no real. Enfim, conforme o autor, o

ser social é histórico e tem características próprias da sociedade onde vive. Em cada época, as

ideias, crenças, conhecimentos e instituições jurídicas e políticas relacionam-se

reciprocamente com a base econômica, que inclui as relações de produção e de troca. Assim,

o cerne de todo entendimento sobre a realidade está na concretude das relações sociais, na

matéria. Nas palavras de Marx (1983, p. 218-219):

O concreto é concreto por ser a síntese de múltiplas determinações, logo, unidade da diversidade. É por isso que ele é para o pensamento um processo de síntese, um resultado, e não um ponto de partida, apesar de ser o verdadeiro ponto de partida e portanto igualmente o ponto de partida da observação imediata e da representação.

Nesse viés, todas as coisas se constituem num movimento especial de unidade de

opostos, que possuem uma conexão interna. Nessa perspectiva, como lembra Costa-Hübes

(2008), também as desigualdades no aprendizado passaram a ser entendidas, sobretudo como

decorrentes das relações sociais, marcadas pelas condições socioeconômicas desiguais, as

quais podem facilitar ou dificultar o acesso ao saber elaborado pela humanidade ao longo da

história, o que alterou a compreensão que se tinha sobre o desenvolvimento da aprendizagem.

Na direção de reforçar a ideia de que a linguagem se efetiva nas interações sociais,

dialeticamente, Geraldi (1997c, p. 51) afirma: “[...] não só a linguagem se constitui pelo

trabalho dos sujeitos; também estes se constituem pelo trabalho linguístico, participando de

processos interacionais.” E, como todas as atividades humanas estão articuladas ao uso da

linguagem, esse movimento é contínuo, pois, conforme Bakhtin/Volochivov (2009), a língua

é viva, dinâmica e histórica.

Corroborando com essa asserção, Simioni e Costa-Hübes (2010, p. 3-4) entendem

que, por meio da linguagem, “[...] o homem estabelece relações com seus semelhantes e com

o mundo que o cerca, atribui conceitos e deixa transparecer sua visão de mundo.” Assim,

conforme vários autores trazidos nessa unidade, entendo que a natureza da fala é social,

estando relacionada a situações interacionais vividas na sociedade.

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63

Nessa esfera, para Bakhtin/Volochinov (2009) também é fundamental considerar o

caráter ideológico da enunciação, visto que ele conduz a entendimentos que não se limitam à

decifração de palavras, as quais são permeadas de intenções que variam conforme o contexto

de cada situação em que são proferidas. No entendimento dos autores

(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 99): “A língua, no seu uso prático, é inseparável de

seu conteúdo ideológico ou relativo à vida.”

Diante dessa perspectiva, entendo, como Costa-Hübes (2009), que o

encaminhamento metodológico para o desenvolvimento das aulas de Língua Portuguesa não

pode limitar-se ao ensino da fala e da escrita correta, com base em exercícios que priorizam os

aspectos normativos da língua ou ao estudo isolado de sílabas, palavras e frases, nem à

exercitação fragmentada de aspectos gramaticais. Em outra direção, é preciso ensiná-la,

considerando a sua aplicabilidade no dia a dia, assumindo-a como uma efetiva atividade de

interação, no horizonte de um ensino reflexivo, pois, como defendem Simioni e Costa-Hübes

(2010, p. 4), “[...] as atividades com a língua devem promover a capacidade de interação.”

Para isso, é preciso compreendê-la como articuladora de nossas relações com outras pessoas,

nas mais diferentes circunstâncias de nosso cotidiano. Nessa perspectiva, para as autoras

(SIMIONI; COSTA-HÜBES, 2010, p. 5) “[...], o enfoque dado ao ensino deve propiciar aos

alunos situações de interação por meio de práticas que os conduzam ao uso real, portanto

social, da linguagem.”

Essa relação de contato com a linguagem em efetivo uso oportuniza ao aluno a

reflexão sobre sua própria fala e escrita, bem como sobre quaisquer outras formas de

interlocução que utiliza em seu cotidiano, entendendo, como Luiz Antônio Marcuschi17

(2007), que nos comunicamos por meio de gêneros textuais18. Nesse sentido, para Dutra

(2012, p. 248), a produção de textos “[...] é uma prática de linguagem, uma atividade que se

dá com base no princípio da interação.” Logo, para ela, essa atividade escrita envolve, além

do autor, que tem intenções definidas, um interlocutor e uma mensagem que deve ser

entendida, cujo processo gerará impacto sobre quem a receberá. Essa perspectiva, para a

autora, é fundamental para o aluno ser reconhecido, na escola, como sujeito ativo e atuante, o

que vai ao encontro do entendimento de Rei (2012, p. 68), sobre texto, no sentido de

compreendê-lo como “[...] uma manifestação produzida por alguém em situação concreta,

com determinada intenção, e o que dará sentido a ele é, portanto, a combinação de três

17 Como contemplo dois autores com o sobrenome Marcuschi (Luiz Antônio e Beth), no texto, para identificá-los, escrevo também seus nomes. 18 Esses gêneros são o alvo das reflexões no próximo capítulo.

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64

fatores: o linguístico, o contextual e o intencional.” O autor também destaca a importância de

haver um interlocutor para cada produção textual, que, no caso do aluno, esse papel tem sido

restrito ao professor. Enfim, Rei (2012, p. 68) afirma que produzir textos: “[...] é, antes de

tudo, agir, atuar socialmente.”

2.3 A PRODUÇÃO ESCRITA NA ESCOLA: “O QUE SE FAZ” E “O QUE SE QUER

FAZER”?

A presente unidade foi elaborada na busca de explicitar que muitos professores

parecem perceber a necessidade de oportunizar, ao aluno, a produção de muitos textos como

uma forma de superar o ensino mecânico na disciplina de Língua Portuguesa. No entanto,

conforme Geraldi (1997c), essa tentativa, muitas vezes, tem ficado restrita a produções

escritas aleatórias, realizadas para a escola, em detrimento da viabilização da concepção de

linguagem recém-mencionada, cujas produções têm uma função social a cumprir. Outras

vezes, o professor limita suas aulas de Língua Portuguesa ao que é preconizado nas

concepções tradicionais da linguagem – expressão do pensamento e instrumento de

comunicação, inclusive, como explica Antunes (2003, p. 25-26), ainda se pode constatar

[...] a prática de uma escrita mecânica e periférica, centrada, inicialmente, nas habilidades motoras de produzir sinais gráficos e, mais adiante, na memorização pura e simples de regras ortográficas: para muita gente, não saber escrever ainda equivale a escrever com erros de ortografia.

Instigada por essas questões enrijecedoras da escrita, trago as reflexões a seguir, que

objetivam elucidar alguns vieses entre o que ainda é feito nas aulas de Língua Portuguesa e o

que se quer fazer, com a clareza de que o rumo dado a essas aulas depende da concepção de

linguagem assumida, efetivamente, pelos professores que as conduzem.

Na perspectiva interacionista, Geraldi (1997c, p. 135), sugerindo uma linha de

encaminhamento metodológico coerente com essa concepção, defende que a produção de

textos, tanto orais quanto escritos, deve ser o ponto de partida e também o de chegada de todo

o processo de ensino/aprendizagem da linguagem, por compreender que é no texto que ela

“[...] se revela em sua totalidade quer enquanto conjunto de formas e de seu reaparecimento,

quer enquanto discurso que remete a uma relação intersubjetiva constituída no próprio

processo de enunciação marcada pela temporalidade e suas dimensões.” Na direção de

justificar essa defesa, e apontando que uma formação discursiva não é fruto de uma relação

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65

mecânica e reprodutiva de modelos, o autor (GERALDI, 1997c, p. 136) diferencia produção

de textos e redação, explicando: “Nesta, produzem-se textos para a escola; naquela produzem-

se textos na escola” (Grifos do autor).

A caminho de explicitar mais essa distinção, Geraldi (1997c. p. 137) elenca as

seguintes condições, as quais considera necessárias para a produção de um texto que viabiliza

o processo de interlocução, portanto, que não se limita a uma tarefa mecânica para a escola:

a) se tenha o que dizer; b) se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer; c) se tenha para quem dizer o que se tem a dizer; d) o locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que diz para quem diz [...]; e) se escolham as estratégias para realizar (a), (b), (c) e (d).

Nesse sentido, produzir textos significa dar ao aluno a oportunidade de falar, de fazer

uso das palavras, de expor suas ideias, enfim, de dialogar com o outro. Portanto, conforme

lembram Santos, Riche e Teixeira (2012), o professor precisa repensar o conceito de texto

para tomá-lo como unidade de ensino.

Ao explicar o caso de quando o aluno escreve para a escola, Geraldi (1997c, p. 137)

pondera que “[...] há muita escrita e pouco texto (ou discurso).” Ele (GERALDI, 1997c, p.

137) entende que as produções que se enquadram nessa caracterização vão a outra perspectiva

“[...] daquelas que se constroem quando a fala (e o discurso) é para valer.” Essa asserção é

ilustrada por Geraldi (1997c, p. 138) com a produção escrita de um aluno de primeira série,

trazida a seguir, elaborada a partir da observação de uma gravura.

O macaco e vovó vovó é o macaco de boneca. A boneca menina: - Vovó, menina a boneca. O macaco vovó a boneca. menina dá boneca a vovó.

O autor observa que, nessa situação de produção, o aluno não teria algo de seu

cotidiano que, no seu entendimento, merecesse ou precisasse ser contado a alguém,

provavelmente diferente da expectativa de seu professor. Ele foi convidado a produzir uma

história relacionada a uma gravura e o fez com base no que observava nas cartilhas que tinha

contato, nas quais a escrita de palavras é utilizada como ilustração de gravuras, assim

explicado por Geraldi (1997c, p. 138): “[...] o convívio da criança com a escrita em cartilhas

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66

mostra-lhe gravuras e, sob elas, designações: desenhos de um balão, embaixo escrito

BALÃO; desenho de um bolo, embaixo escrito BOLO.” (Destaques do autor). Dessa forma,

nessa produção, que imita, formalmente, um texto, o aluno mostrou que sabe escrever

mecanicamente, sem a preocupação com um motivo para fazê-lo nem com o que dizer, na

direção do que o autor indicou serem textos produzidos para a escola (redação),

desconsiderando o processo de interlocução. Sintetizando, essa produção é constituída por

frases desarticuladas, incoerentes e incompletas, não possibilitando, portanto, a construção de

sentido.

Na direção dessa explicação, Santos, Riche e Teixeira (2012, p. 25) afirmam: “[...]

precisamos compreender que a junção de palavras e frases, apenas, não constitui um texto: ele

precisa ser aceito como tal; o sentido precisa ser construído. E isso só fazemos quando

ultrapassamos a superfície linguística e entramos numa análise textual e discursiva.” Nesse

viés, para as autoras (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2012, p. 17), o texto viabiliza a

interação, “[...] marcado pela coesão entre seus elementos e pela sua coerência.” Dessa forma,

a produção de textos, na escola, deve ser realizada considerando os aspectos interacionais da

linguagem em situação de uso, bem como as condições de produção e recepção. Assim, o

texto pode ser entendido como um efetivo momento de interlocução em determinado contexto

histórico-social, o que vai muito além de um amontoado de frases ou de alguns enunciados

interligados. As autoras (SANTOS; RICHE; TEIXEIRA, 2012, p. 100) concluem: “Por isso, a

sequência de enunciados num texto não pode ser aleatória [...].” Nessa perspectiva, o

entendimento de texto, para Koch (2000, p. 25), contribui para compreendê-lo como uma

unidade de sentido:

Um texto se constitui enquanto tal no momento em que os parceiros de uma atividade comunicativa global, diante de uma manifestação linguística, pela atuação conjunta de uma complexa rede de fatores de ordem situacional, cognitiva, sociocultural e interacional, são capazes de construir, para ela, determinado sentido.

Assim, Koch e Elias (2006, p. 214) explicam que “[...] o texto não é resultado da

‘soma’ de palavras, frases ou de outros textos, mas de um projeto de dizer constituído em uma

dada situação comunicativa, para alguém, com certa finalidade e de determinado modo, dentre

tantos outros possíveis.” (Destaque das autoras).

Com essa compreensão, é oportuno lembrar, conforme Koch (2000), que a coerência

ajuda a veicular o sentido do texto, portanto, ela não é uma simples propriedade dele. Assim,

entendo, como Koch e Travaglia (2003, p. 21), que a coerência “[...] é um princípio de

Page 68: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

67

interpretabilidade, ligada à inteligibilidade do texto numa situação de comunicação e à

capacidade que o receptor tem para calcular o sentido deste texto.” Dessa forma, a coerência é

subjacente ao texto, ao passo que, conforme os autores (KOCK; TRAVAGLIA, 2003, p. 47),

a coesão “[...] é explicitamente revelada através de marcas linguísticas, índices formais na

estrutura da sequência linguística e superficial do texto, o que lhe dá um caráter linear, uma

vez que se manifesta na organização sequencial do texto.” (Grifo dos autores).

Voltando aos aspectos interacionais da linguagem, lembro que Dutra (2012, p. 263),

entendendo que compete à escola ensinar o que constitui a Língua Portuguesa, aponta que ela

deve assumir sua função de “[...] ensinar as práticas de linguagem mais comuns em nossa

sociedade. Isso significa dizer que a língua a ser estudada é a língua em uso [...].” Nessa

perspectiva, Geraldi (1997c) defende que é preciso dar a palavra ao aluno, para que ele se

assuma como sujeito nas ações que faz com e sobre a linguagem, de modo a oportunizar-lhe

que se coloque como locutor de seu próprio discurso, a fim de ampliar sua capacidade

discursiva. Todavia, para que isso realmente ocorra, as propostas de produção de texto, na

escola, devem estabelecer interlocutores reais que possam dialogar com os textos lidos, o que

exige a superação da prática do professor ser o único leitor das produções dos alunos com o

objetivo de corrigi-las, que é o que ainda ocorre, de forma predominante, inclusive, em

práticas conduzidas por docentes que até defendem, teoricamente, a concepção interacionista

de linguagem.

Assim, para além do plano teórico, é preciso ampliar o universo discursivo dos

alunos, oportunizando que escrevam e falem com outros interlocutores, em outros contextos,

em diferentes situações, sobretudo a partir do acesso a práticas de letramento, conforme

reflexões constantes no fim do presente capítulo, bem como de gêneros textuais-discursivos,

os quais são o alvo das reflexões no próximo capítulo. É nessas condições que eles terão razão

para escrever. Inclusive, para Matencio (2001, p. 59), “[...] o processo de legitimação

discursiva ocorre em situações concretas de interação – eventos de interação -, que

concretizam discursos através de textos (orais e escritos).” A autora indica diferentes leitores

para os textos que os alunos escrevem, como colegas, outros docentes, pessoas da

comunidade em que a escola está inserida entre outros. Isso possibilitaria, segundo Matencio

(1994, p. 104), a troca de informações entre leitores com diferentes experiências, entendendo

que o sistema linguístico “[...] se atualiza no uso, nas ações com e sobre a linguagem.” (Grifos

da autora).

A caminho de também contribuir para a superação das dificuldades encontradas no

ensino da linguagem, Geraldi (1997c) destaca a leitura de textos, entendendo-a como uma

Page 69: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

68

oportunidade de o aluno ampliar sua capacidade linguística e cultural de forma que, lendo,

terá muito mais o que dizer em uma situação discursiva. O texto é, pois, o encontro do autor

com o leitor, por meio do qual é (são) tecido(s) o(s) sentido(s). Contudo, o autor (GERALDI,

1997c, p. 168) fala que é preciso estarmos atentos para os textos levados para a sala de aula

nos questionando “[...] para que se lê o que se lê?” (Grifos do autor). Geralmente os textos

são impostos aos alunos com a exigência de que, após a realização da respectiva leitura,

respondam aos questionamentos que também já estão prontos. Assim, não há perguntas

prévias que o leitor faz para ler, mas há perguntas que se fazem porque se leu. Nessa

perspectiva, a leitura se torna mecânica, restringindo-se às respostas das questões previamente

formuladas.

Com base nessa crítica, Geraldi (1997c) defende um trabalho em que a leitura integre

o processo de produção, de forma que, ao ler a palavra do outro, o aluno possa descobrir nela

formas diferentes de pensar. Nesse sentido, ele aponta diferentes motivos para que o leitor

procure um texto: a) para buscar informações a fim de obter respostas a alguma dúvida; b)

para escutá-lo, no sentido de verificar o que ele pode oferecer que, nesse caso, trata-se de uma

“leitura-estudo-do-texto”; c) para usá-lo na produção de outros textos, constituindo-se, então,

numa “leitura-pretexto”; sem nenhuma necessidade, fará uma “leitura-fruição”, marcada pelo

prazer de ler.

Conforme o autor, entendo que a leitura é um movimento que pode contribuir para a

produção de texto, bem como para ir ao encontro de uma necessidade de interlocução, por

meio da qual o leitor poderá ampliar seu conhecimento de mundo e, consequentemente, sua

capacidade de produção de discursos. Nessa direção, Simões (2006) observa que o domínio

das formas escritas é decorrente da prática da língua, tanto com a realização de muitas leituras

quanto de muitas escritas. Indo além, a autora (SIMÕES, 2006, p. 15) também aponta que

[...] há estruturas básicas da fonologia da língua que podem e devem ser assentadas desde as primeiras séries do ensino fundamental, para que o estudante obtenha pontos de partida para seu aperfeiçoamento, fundamentando sua prática de usuário da língua com uma boa dose de raciocínio linguístico.

Nessa linha de pensamento, Simões (2006, p. 15) entende que estar-se-ia na direção

de um processo de ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa “[...] mais racional e menos

memorizante, através do qual o aluno possa apropriar-se das estruturas da língua com mais

facilidade, já que poderá compreendê-las melhor.”

Page 70: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

69

Para Geraldi (1997c), focalizar o ensino a partir do ato interlocutivo, significa

reconhecer os alunos como sujeitos em contínua constituição, o que implica no entendimento

de que a linguagem não é um sistema pronto, acabado, mas é dinâmica, instável e socialmente

reconstruída. Os sujeitos, por sua vez, se constituem à medida que interagem uns com os

outros, o que evidencia seu caráter social e histórico. Assim, é fundamental que se proponha,

em sala de aula, práticas efetivas de uso da oralidade, da leitura e da escrita, lembrando que

selecionamos as palavras, que organizamos um texto, em função de nosso interlocutor, ou

seja, organizamos nosso discurso com o objetivo de nos fazer entender, de atingir o objetivo

da interação. Para isso, dependendo de cada situação interlocutiva, selecionamos os recursos

linguísticos coerentes com os aspectos interacionais de cada momento específico. Dessa

forma, usufruindo da historicidade da linguagem, recorremos a um repertório significativo de

signos para organizar nossos textos.

Ao produzi-los, conforme já mencionei, espera-se que eles sejam lidos por alguém e,

dependendo a quem tais textos se destinam, muitos autores são mais rigorosos ao elaborá-los.

Nesse sentido, de acordo com o que já afirmei e como lembra Simões (2006, p. 59), em se

tratando de textos produzidos na escola, praticamente o único destinatário é o professor, o

qual, por tradição, muitas vezes, exige textos “[...] certinhos [...]. Contudo, nem sempre essa

exigência coincide com o grau de informatividade do texto em apreciação. Daí resultarem

controvérsias no que concerne à definição de texto bom e texto ruim no contexto escolar.”

Entendo que a expectativa da produção de textos “certinhos”, por parte do professor,

vai ao encontro do que é preconizado pela concepção de linguagem como expressão do

pensamento, que, conforme já afirmei, ainda está subjacente à prática pedagógica de muitos

professores de Língua Portuguesa. Perfeito (2005, p. 32) ajuda a entender essa relação ao

mostrar que, conforme essa concepção, uma boa escrita depende de uma boa fala: “Se pensar

bem, de acordo com normas e princípios gramaticais, permite ao indivíduo falar bem, pela

mesma razão o sujeito irá transpor tais regras e princípios adequadamente para o papel na

produção escrita.” (Grifo da autora).

O aluno, sabendo que, provavelmente, o único leitor de seu texto seja o professor, e

também, conforme Simões (2006), por ter um restrito domínio da língua padrão e talvez por

não querer correr o risco de cometer muitos erros, poderá tentar escrever textos com base

naqueles que observa nas cartilhas ou livros didáticos, ou, em outra direção, optar, como

lembra a autora (SIMÕES, 2006, p. 59), por “[...] arriscar tudo, produzindo texto que registre

sua experiência de usuário da língua, sem preocupar-se com o poder avaliatório do leitor-

professor.”

Page 71: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

70

Registro, a seguir, a produção de um aluno de um CIEP - RJ, que ilustra a tentativa da

escrita de um texto “certinho”, trazido por Simões (2006, p. 60), o qual, sem demonstrar

criatividade, assemelha-se a textos de muitas cartilhas, “[...] portanto, sem riscos de uso

impróprio de formas da língua.”

A bola é da Lalá. ║ A bola é bonita. ║ Lalá pega a bola. ║ A bola é bela. ║ (Símbolos de Simões).

Em outra perspectiva, o texto registrado na sequência, evidencia, conforme Simões

(2006, p. 60) que o autor “[...] afrouxa o compromisso com a apresentação de formas

autorizadas e passa a escrever seu mundo e registrar sua experiência.” Essa produção ilustra o

caso de alunos que não demonstram muita preocupação com a avaliação do que escrevem.

Segue o texto criativo anunciado, produzido por um aluno de um CIEP - RJ, trazido por

Simões (2006, p. 50):

O sapo voador O sapo vai a o ispaso ║ lá ele vê o sol e posa ni um praneta chamado marte ║ ele vê um mostro ║ ele fala socoro ║ o vucao começo a sai lava ║ o mostro soo too o sapo ║ o sapo foi para o fogete ║ quado ele chegou na terra ele foi ce um soldado. (Símbolos e destaques de Simões).

Corroborando com a autora, entendo que, nos seus limites bem distintos, as duas

produções indicam que, com diferentes especificidades, ainda há muito a ser feito em relação

aos respectivos desempenhos linguísticos. Quanto ao maior problema apresentado em cada

um dos casos, a autora chama a atenção para a necessidade de os alunos não ficarem

demasiadamente presos às normas cultas da escrita, como ocorreu na primeira produção, ao

mesmo tempo em que alerta para que, tais produções, não sejam realizadas com total

liberdade. Em suas palavras (SIMÕES, 2006, p. 60), postula que: “Cabe ao professor buscar o

equilíbrio para suas ações: nem confinamento nem liberdade desmedida.”

Instigada por essa importante ponderação, trago a seguinte explicação de Ruiz (2013,

p. 174) sobre a correção/revisão de textos: “[...] dependendo da maneira como se realiza a

correção, a revisão pode ou não se mostrar como um passo produtivo em direção ao efetivo

domínio da escrita pelo aluno.” É preciso, pois, que o discente tenha a oportunidade de rever

seus textos, assumindo-se como autor, o que ainda é pouco comum, visto que, de uma forma

ou de outra, geralmente, o professor é o primeiro a interferir em suas produções, lembra a

autora, seja indicando, resolvendo ou diagnosticando os possíveis erros, estando mais

Page 72: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

71

preocupado com a materialidade linguística, com base na aferição do domínio de regras, do

que com o sentido do que o aluno escreve, e se atende a uma função social.

Com a intenção de mostrar outra perspectiva para a correção, Ruiz (2013, p. 181)

explica que essa prática deveria partir de: “[...] um encontro entre sujeitos (aluno, professor e

outros) em processos linguísticos que se prestam para produzir significação em episódios de

interação pessoal e dialógica. E tal prática só é possível dentro de uma postura teórica

específica: a textual, a discursiva.”

No que se refere ao acesso do aluno à escrita, Matencio (1994, p. 43) entende que

“[...] é cultural e dependente do valor associado às práticas de leitura e escrita ao longo da

sociabilização dos falantes.” Para a autora (1994), esse ensino, na escola, é mais de cunho

avaliativo, enquanto que, fora dela, predomina o caráter comunicativo, sobretudo aos que não

usufruem da cultura dominante, prevalecendo os aspectos utilitários/dialógicos da linguagem.

Assim, Matencio (1994, p. 44) explica:

Se a atribuição de funções à palavra escrita se diferencia na escola e fora dela, mesmo em se tratando de interações ocorridas também em outras instituições, como a igreja, por exemplo, é de se esperar que as expectativas de aprendizes que vêm de comunidades distintas, bem como os resultados de seu processo de escolarização, sejam grandemente diferenciados.

Assim, a autora entende que a escrita desenvolvida na escola, na perspectiva de um

ensino tradicional, marcada pelo treino de habilidades perceptivo-motoras, difere da escrita

utilizada no cotidiano, cuja situação aponta para a necessidade de levar o aluno a refletir sobre

a palavra escrita, reforçando que essa reflexão é significativa para a elaboração de textos. Ela

lembra que eles devem estar articulados aos usos e funções sociais da escrita, focalizando-a

como processo e não como produto, o que implica em considerar, conforme Matencio (1994,

p. 103), “[...] as diferentes etapas da produção: plano de organização, rascunho, reestruturação

e revisão [...]”, o que vai ao encontro da defesa de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010),

conforme explanação realizada no terceiro capítulo desse trabalho de tese. Observo que essa

proposta já está presente no discurso de muitos professores de Língua Portuguesa, mas,

contraditoriamente, ela pouco tem sido efetivada em suas aulas.

Vale lembrar que, para Rojo (2009, p. 118), trabalhar com a leitura e a escrita na

escola, na atualidade, é ir além do trabalho com a alfabetização ou os alfabetismos19 como

19 Para Rojo (2009, p. 98) “[...] o termo alfabetismo tem um foco individual, bastante ditado pelas capacidades e competências (cognitivas e linguísticas) escolares e valorizadas de leitura e escrita (letramentos escolares e acadêmicos), numa perspectiva psicológica, enquanto o termo letramento busca recobrir os usos e práticas sociais de linguagem que envolvem a escrita de uma ou de outra maneira, sejam eles valorizados ou não

Page 73: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

72

tem ocorrido: “[...] é trabalhar com os letramentos múltiplos, com as leituras múltiplas – a

leitura na vida e a leitura na escola e que os conceitos de gêneros discursivos e suas esferas de

circulação podem nos ajudar a organizar esses textos, eventos e práticas de letramento.” Esse

entendimento aponta para a utilização das diversas práticas de linguagem vivenciadas em

diferentes situações, considerando a perspectiva multicultural. Nesse sentido ela (ROJO,

2009, p. 115) explica:

Cabe, portanto, também à escola potencializar o diálogo multicultural, trazendo para dentro de seus muros não somente a cultura valorizada, dominante, canônica, mas também as culturas locais e populares e a cultura de massa, para torná-las vozes de um diálogo, objetos de estudo e de crítica. Para tal, é preciso que a escola se interesse por e admita as culturas locais de alunos e professores.

Dessa forma, ela entende que os textos, na escola, precisam passar a considerar as

ideologias, as significações e a abrangência dos discursos. A autora (ROJO, 2009, p. 119)

explica: “Trata-se, então, de garantir que o ensino desenvolva as diferentes formas de uso das

linguagens (verbal, corporal, plástica, musical, gráfica etc.) e das línguas (falar em diversas

variedades e línguas, ouvir, ler, escrever).” (Grifos da autora). Para isso, segundo ela, é

necessário um trabalho interdisciplinar, haja vista que cada professor tem uma formação

específica, não estando preparado, portanto, para transitar em diversas áreas. Ela destaca,

também, a importância de explorar a diversidade de mídias e suportes que viabilizam a

circulação dos textos, o que significa ir além do trabalho com textos impressos, chegando nas

mídias analógicas como vídeos, TV, cinema e outros, mas, principalmente, as digitais, lembra

a autora (ROJO, 2009, p. 119) “[...] já que a digitalização é o futuro da informação e da

comunicação.” Esse encaminhamento implica na abordagem dos produtos culturais existentes

nos diferentes meios em que alunos e professores estão envolvidos. Rojo (2009, p. 120)

destaca, ainda, que os textos e produtos das diferentes culturas e mídias devem ser abordados

criticamente - letramento crítico -, com o objetivo de

[...] desvelar suas finalidades, intenções e ideologias. Nesse sentido, é importante a presença na escola de uma abordagem não meramente formal ou conteudista dos textos, mas discursiva, localizando o texto em seu espaço histórico e ideológico e desvelando seus efeitos de sentido, replicando a ele e com ele dialogando.

valorizados, locais ou globais, recobrindo contextos sociais diversos (família, igreja, trabalho, mídias, escola etc.), numa perspectiva sociológica, antropológica e sociocultural.” (Grifos da autora).

Page 74: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

73

Em relação ao letramento, Kleiman (2005, p. 19), na mesma perspectiva de Rojo

(2009), adverte que ele é complexo e “[...] está relacionado com os usos da escrita em

sociedade e com o impacto da língua escrita na vida moderna.” Para a autora (KLEIMAN,

2005, p. 18), a escola pode viabilizar encaminhamentos para facilitar a aproximação do aluno

desse processo, como:

►ensinar as habilidades e competências necessárias para participar de eventos de letramento relevantes para a inserção e participação social; ►ensinar como se age nos eventos de instituições cujas práticas de letramento vale a pena conhecer; ►criar e recriar situações que permitam aos alunos participar efetivamente de práticas letradas.

Tais encaminhamentos são necessários, de acordo com Kleiman (2005, p. 20),

porque os usos da língua escrita foram passando por transformações nas diferentes instâncias

da sociedade o que provocou, inclusive, mudanças na própria concepção “[...] do que seria

‘ser alfabetizado’ e do que é necessário saber para poder usar a escrita ao longo da vida.”

(Destaque da autora). Assim, conforme a autora, espera-se que o aluno vá além do domínio do

código alfabético, estando preparado para utilizar a escrita em diversas situações de seu dia a

dia. Na direção de contemplar essa mudança, a autora (KLEIMAN, 2005, p. 21-22) lembra

que,

Emergiu, então, na literatura especializada, o termo letramento, para se referir a um conjunto de práticas de uso da escrita que vinham modificando profundamente a sociedade, mais amplo do que as práticas escolares de uso da escrita, incluindo-as, porém. [...] as práticas sociais de uso da escrita (o letramento) – refletia as transformações nas práticas letradas tanto dentro como fora da escola, lembrando que aí estão incluídas as tecnologias da escrita. (Grifos da autora).

De acordo com Kleiman (2005), à medida que escola se aproxima das práticas

sociais de diferentes instituições, o aluno passa a ter maior possibilidade para ampliar o

conhecimento que já domina e, assim, de utilizá-lo em outras situações de seu cotidiano,

inclusive ela reconhece que muitas práticas de letramento que ocorrem fora da escola já estão

influenciando a direção da prática pedagógica. No âmbito desse enriquecimento didático,

Soares (2004, p. 14) entende que é um equívoco dissociar alfabetização e letramento,

considerando que o domínio da escrita é decorrente desses dois processos simultâneos: “[...]

pela aquisição do sistema convencional da escrita – a alfabetização – e pelo desenvolvimento

de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que

Page 75: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

74

envolvem a língua escrita – o letramento.” (Grifos da autora). Assim, a autora (SOARES,

2004, p. 14) considera esses processos interdependentes e indissociáveis, visto que:

[...] a alfabetização desenvolve-se no contexto de e por meio de práticas sociais de leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da aprendizagem das relações fonema-grafema, isto é, em dependência da alfabetização. (Grifos da autora).

Para Soares (2004, p. 14-15), conforme a concepção “tradicional” da alfabetização,

encaminhada pelos métodos analíticos ou sintéticos, esses dois processos são independentes

sendo que a alfabetização, nesse caso, é considerada uma fase anterior ao letramento, ou seja,

inicialmente o aluno aprende a ler como “[...] decodificação e a escrever como codificação –

precedendo o letramento – o desenvolvimento de habilidades textuais de leitura e de escrita, o

convívio com tipos e gêneros variados de textos e de portadores de textos, a compreensão das

funções da escrita.” Esse encaminhamento, conforme Albuquerque (2007, p. 17-18),

“dificilmente formará leitores ou escritores, os quais serão [...] incapazes de ler e escrever

funcionalmente textos variados em diferentes situações.”

Soares (2004, p. 15), embora considere a interdependência, a indissociabilidade e a

simultaneidade entre a alfabetização e o letramento, acha conveniente manter os dois termos

haja vista que sua natureza é diferente “[...] envolvendo conhecimentos, habilidades e

competências específicos, que implicam formas de aprendizagem diferenciadas e,

consequentemente, procedimentos diferenciados de ensino.” À guisa desses pressupostos, a

autora (SOARES, 2004, p. 16) propõe quatro encaminhamentos:

[...] em primeiro lugar, a necessidade de reconhecimento da especificidade da alfabetização, entendida como processo de aquisição e apropriação do sistema da escrita, alfabético e ortográfico; em segundo lugar, e como decorrência, a importância de que a alfabetização se desenvolva num contexto de letramento – entendido este, no que se refere à etapa inicial da aprendizagem da escrita, como a participação em eventos variados de leitura e de escrita, e o consequente desenvolvimento de habilidades de uso da leitura e da escrita nas práticas sociais que envolvem a língua escrita, e de atitudes positivas em relação a essas práticas; em terceiro lugar, o reconhecimento de que tanto a alfabetização quanto o letramento têm diferentes dimensões, ou facetas, a natureza de cada uma delas demanda uma metodologia diferente [...]; em quarto lugar, a necessidade de rever e reformular a formação dos professores das séries iniciais do ensino fundamental, de modo a torná-los capazes de enfrentar o grave e reiterado fracasso escolar na aprendizagem inicial da língua escrita nas escolas brasileiras.

Esse entendimento, que dá sentido e contextualiza a escrita, e que, ainda, aponta que

é possível alfabetizar letrando, vai ao encontro da defesa de Brito (2007, p. 2) de que a escola

deve conceber a alfabetização

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75

[...] como um processo dinâmico, como construção social, fundada nos diferentes modos de participação das crianças nas práticas culturais de uso da escrita, transcendendo a visão linear, fragmentada e descontextualizante presente nas salas de aula onde se ensina/aprende a ler e a escrever.

Nesse horizonte, e considerando o contato que a criança já tem com o mundo letrado,

é importante que o processo de alfabetização, na escola, seja conduzido por meio de situações

interacionais, alerta a autora (2007), cuja prática distancia-se dos exercícios mecânicos e

repetitivos utilizados durante muito tempo para aproximar o aluno da linguagem escrita e, de

certa forma, ainda bastante presente nas salas de aula. Nesse sentido, na direção de Soares

(2004), Brito (2007, p. 3) assegura que “[...] o desenvolvimento da escrita na criança está

relacionado às práticas cotidianas (socioculturais) de participação em eventos de leitura e

escrita.” A autora (BRITO, 2007, p. 3) explica mais:

Os atos cotidianos, corriqueiros, de ler um jornal, redigir um bilhete, ler um livro, fazer anotações, ou seja, usar textos escritos como fonte, seja de informação, seja de entretenimento, contribuem para que as crianças percebam as diferentes formas de apresentação do texto escrito, bem como que identifiquem seus diferentes sentidos e funções.

No entanto, Brito (2007) levanta a dificuldade de letrar a criança considerando que,

em grande parte, a escrita escolar ainda está distante das marcas socioculturais, lembrando

que a apropriação da língua escrita deve ocorrer por meio de seu contato social e interativo

com o mundo letrado. A partir dessa constatação, ela chama a atenção para que os cursos de

formação de professores para os primeiros anos do Ensino Fundamental considerem que, no

início da escolaridade da criança, a prioridade é o ensino da língua escrita e, portanto, é nessa

direção que o professor precisa ser preparado. Nesse processo de formação, conforme a

autora, é necessário considerar que a leitura e a escrita, na escola, devem ser úteis,

informativas, além de transmitir conhecimentos e entreter, tal como elas existem no meio

sociocultural. Para além desse aspecto, é necessário que o professor conheça como a escrita

funciona, superando a prática do treino de habilidades perceptivo-motoras, como ainda ocorre

em muitas salas de aula.

Enfim, como lembra Brito (2007), a relação entre o sujeito, que escreve, e a

linguagem deve ser dinâmica, considerando, conforme Rojo (2009, p. 108), que a

complexidade do mundo contemporâneo passa a exigir da escola uma vasta diversidade

crescente de “[...] práticas e textos que nela devem circular e ser abordados. [...] Será

necessário ampliar e democratizar tanto as práticas e eventos de letramentos que têm lugar na

Page 77: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

76

escola como o universo e a natureza dos textos que nela circulam.” O entendimento da

circulação dos textos vai ao encontro da dinamicidade dos gêneros do discurso, como

resultado de atividade humana, anunciado por Bakhtin (2011), conforme reflexões levantadas

no terceiro capítulo.

Márcia Mendonça (2007, p. 49) lembra que a escola é uma das principais instituições

responsáveis para ampliar o universo de letramento dos alunos, esperando que no fim da

escolarização, eles “[...] tenham condições de se inserir com autonomia e segurança nas

diversas práticas de letramento, inclusive e principalmente aquelas mais valorizadas por uma

sociedade, compreendendo (criticamente) e produzindo os gêneros relativos a tais práticas.”

Para isso é preciso considerar, em cada discurso, quem está falando, para quem, com que

objetivo comunicativo, em que circunstâncias etc. É nesse viés que, para a autora

(MENDONÇA, M. 2007, p. 46-47),

Um dos princípios que norteiam a perspectiva do letramento é que a aquisição da escrita não se dá desvinculada das práticas sociais em que se inscreve: ninguém lê ou escreve no vazio, sem propósitos comunicativos, sem interlocutores, descolado de uma situação de interação; as pessoas escrevem, lêem e/ou interagem por meio da escrita, guiadas por propósitos interacionais, desejando alcançar algum objetivo, inseridas em situação de comunicação.

Nesse sentido, concordo com a autora de que o letramento está entrelaçado com os

gêneros textuais nas práticas de leitura e escrita contextualizadas, interativas e, portanto, como

prática social. Márcia Mendonça (2007, p. 55) explica: “[...] não se pode falar em gêneros sem

considerar os processos de letramento; não se pode falar em letramento sem considerar os

gêneros.” Para isso, conforme essa teórica (MENDONÇA. M. 2007. p. 55), é necessário que

as aulas de Língua Portuguesa sejam encaminhadas por meio de práticas de letramento,

[...] em que a língua(gem) desempenha papel central, por meio dos gêneros. O sabor do trabalho com os gêneros está justamente nas suas particularidades, no seu papel nas práticas de letramento relevantes para as diversas comunidades, na sua variedade, que, em suma, reflete a própria multiplicidade da experiência humana.

Entendo que o trabalho com as produções textuais, enriquecidas pela prática do

letramento e articuladas aos gêneros textuais-discursivos, que concretiza o uso social da

linguagem, é uma forma de avançar quanto à abordagem formal ou conteudista dos textos que

têm predominado nas aulas de Língua Portuguesa. Esses gêneros são o alvo do próximo

capítulo.

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77

CAPÍTULO 3 – GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS, ENSINO E PRODUÇÃO

ESCRITA

Teço, no início do presente capítulo, algumas reflexões sobre os gêneros textuais-

discursivos, vendo-os como um possível caminho para viabilizar o trabalho do professor em

uma perspectiva interacionista de linguagem. Abordo, a seguir, a tipologia textual e

contemplo alguns gêneros da esfera jornalística explorados com os alunos da Sala de Apoio

na fase da intervenção da pesquisa de campo. Logo após, sintetizo uma proposta

metodológica para o trabalho com os gêneros textuais-discursivos20: sequência didática (SD,

doravante). Finalizo este capítulo abordando o item Atividades de estruturação da língua

subjacentes às SD.

3.1 GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS COMO VIABILIZADORES DE

INTERAÇÃO: UM POSSÍVEL CAMINHO?

Parto do pressuposto defendido por Bakhtin (2011, p. 261) de que o uso da

linguagem possibilita a articulação dos “[...] diversos campos da atividade humana.” Esse uso

varia conforme a necessidade de interação em cada situação, cuja utilização da língua ocorre,

segundo o autor (BAKHTIN, 2011, p. 261), “[...] em forma de enunciados (orais e escritos)

concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade

humana”, os quais ele denomina de gêneros do discurso, reconfigurado, mais tarde, por

Bronckart (1999), como gêneros textuais.

Bakhtin (2011, p. 261-262) assim explica tais enunciados e os relaciona e/ou os

equipara aos gêneros do discurso:

Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional. [...] Evidentemente, cada enunciado

20 Os gêneros textuais-discursivos são aqui compreendidos na dialogicidade entre os preceitos do interacionismo da teoria bakhtiniana e do interacionismo sociodiscursivo da teoria bronckartiniana. Quando um texto cumpre o papel de viabilizar uma interação/ação, Bakhtin (2011) o denomina de gênero do discurso/discursivo e, Bronckart (1999), de gênero de texto.

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78

particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso. (Grifos do autor).

Desse modo, os enunciados, que constituem os gêneros textuais-discursivos, podem

ser entendidos como os momentos de utilização da linguagem, tanto oral quanto escrita,

fundada na palavra ou, como afirma Machado (2007, p. 203) “[...] os gêneros certamente são

as correias que mobilizam o fluxo das relações dialógicas.” Nesse horizonte, a autora

(MACHADO, 2008, p. 155) assevera: “Exatamente porque surgem na esfera prosaica da

linguagem, os gêneros discursivos incluem toda sorte de diálogos cotidianos bem como

enunciações da vida pública, institucional, artística, científica e filosófica.”

Nessa direção, Araujo (2012, p. 167) entende que tomar “[...] o enunciado como

unidade de comunicação está em consonância com o trabalho com os gêneros do discurso, já

que esses nada mais são do que as formas cotidianas pelas quais organizamos nossos

enunciados.” Para a autora (ARAUJO, 2012, p. 167), são os enunciados que possibilitam a

compreensão de textos, “[...] pois não se tem compreensão responsiva sobre orações [...].” Ela

adverte, ainda, que são eles que viabilizam a interlocução entre aluno e texto, lembrando que

frases soltas não têm por objetivo o estabelecimento de uma relação dialógica. Assim, o aluno

tem a oportunidade de ficar frente a situações de uso da linguagem, as quais devem ser cada

vez mais dominadas por ele.

Com essa compreensão, depreendo que os diferentes momentos de utilização da

linguagem não se constituem em noções abstratas; ao contrário, são construções de

enunciados explicitados nos discursos, aliás, conforme Machado (2007, p. 204), “[...] os

enunciados se definem pelos gêneros discursivos em uso na língua nas mais variadas esferas

da comunicação social [...].” Sendo assim, conforme Brait e Melo (2008, p. 71), eles devem

ser compreendidos “[...] na sua historicidade, na sua concretude [...]” a fim de ver além de sua

dimensão linguística, já que eles se dirigem a um destinatário. Nesse sentido, Bakhtin (2011,

p. 305) adverte que “[...] o direcionamento, o endereçamento do enunciado é sua

peculiaridade constitutiva sem a qual não há nem pode haver enunciado.” No entanto, é

preciso lembrar que o autor entende que todo gênero do discurso tem sua própria concepção

de destinatário. Um artigo de opinião, por exemplo, pode chegar a muitas pessoas e provocar

posicionamentos ou ações, mas não de forma tão direta e objetiva como alguém que recebe

uma carta de solicitação, como foi o caso vivido na intervenção realizada na escola campo de

pesquisa, quando da elaboração de um jornal produzido pela Sala de Apoio, alvo dessa

investigação. Provavelmente, muitos interlocutores do referido jornal devem ter lido e/ou

Page 80: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

79

entendido o artigo de opinião nele publicado, o qual, conforme suas características, não

solicitava nenhum retorno para seu autor ou para os responsáveis pela produção do jornal; já

alguns comerciantes do bairro, receptores de uma carta de solicitação de patrocínio para a

produção desse jornal, receberam, diretamente, esse pedido por parte dos alunos da Sala de

Apoio, autores da referida carta, bem como foram convidados a dar uma resposta. Assim,

além de a concepção de destinatário, nesses dois exemplos, ter sido bem diferente, a relação

dialógica estabelecida a partir deles também o foi. Isso ficou mais entendido, pelos alunos,

quando a professora dessa sala recebeu uma pequena quantia, em dinheiro, de alguns

comerciantes, como resultado da solicitação mencionada e quando entregaram o jornal à

comunidade escolar, cujo retorno de sua leitura provavelmente não tenha sido percebido.

Nessa perspectiva, Machado (2008, p. 156) explica: “A vinculação dos gêneros

discursivos aos enunciados concretos introduz uma abordagem linguística centrada na função

comunicativa [...].” Dessa forma, ela (MACHADO, 2008, p. 157) entende que, “[...]

‘enunciado’ e ‘discurso’ pressupõem a dinâmica dialógica da troca entre sujeitos discursivos

no processo da comunicação, seja num diálogo cotidiano, seja num gênero secundário.”

(Destaques da autora). Nesse sentido, cabe afirmar que a diferença entre os gêneros

discursivos primários e os secundários não é de ordem funcional, pois, conforme explicação

de Bakhtin (2011, p. 263)

Os gêneros discursivos secundários (complexos – romances, dramas, pesquisas científicas de toda espécie, os grandes gêneros publicísticos, etc.) surgem nas condições de um convívio cultural mais complexo e relativamente muito desenvolvido e organizado (predominantemente o escrito) – artístico, científico, sociopolítico, etc. No processo de sua formação eles incorporam e reelaboram diversos gêneros primários (simples), que se formaram nas condições da comunicação discursiva imediata.

Sintetizando, entendo que os gêneros discursivos secundários, geralmente

fortalecidos pela linguagem escrita, absorvem os gêneros primários, bem como compreendo

que é estabelecida certa dialogicidade entre eles.

Ainda defendendo que os gêneros viabilizam a interlocução, Machado (2008, p. 158)

afirma: “Os gêneros são elos de uma cadeia que não apenas une como também dinamiza as

relações entre pessoas ou sistemas de linguagens [...].” Afinal, eles medeiam o contato entre

os seres humanos, facilitam suas relações, encaminham a realização de suas ações etc.

Seguindo o mesmo raciocínio, Luiz Antônio Marcuschi (2008, p. 150) advoga:

Page 81: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

80

[...] cada gênero textual tem um propósito bastante claro que o determina e lhe dá uma esfera de circulação. Aliás, esse será um aspecto bastante interessante, pois todos os gêneros têm uma forma e uma função, bem como um estilo e um conteúdo, mas sua determinação se dá basicamente pela função e não pela forma.

Assim, cada situação de interlocução é viabilizada por um gênero que corresponde ao

objetivo de cada uma delas, relacionado, principalmente à sua função, à sua finalidade.

Colaborando com essa reflexão, Brait (2000, p 20) esclarece: “[...] não se pode falar de

gêneros sem pensar na esfera de atividades em que eles se constituem e atuam, aí implicadas

as condições de produção, de circulação e de recepção.” Dessa maneira, entendo que a

utilização de um gênero está relacionada a determinadas especificidades dialógicas,

considerando a finalidade com que é produzido, bem como a forma em que é colocado na

esfera social e as condições em que o destinatário o recebe. Nesse sentido, comungo com

Rojo (2011, p. 2) ao afirmar que

[...] os discursos em circulação e apropriados pelo indivíduo humano são eminentemente dialógicos e polifônicos: estão em permanente diálogo com outros discursos e vozes presentes, passados e futuros. Desta maneira, cada enunciado toma de outros enunciados suas formas e significações e dirige-se a outros (possíveis) enunciados, dentro de situações sociais de enunciação. (Grifos da autora).

Com esse entendimento, a autora (ROJO, 2011, p. 2), considerando a ampla

diversidade material e social das práticas de enunciação, a exemplo do tempo e lugar em que

se realizam, assevera: “[...] o enunciado é uma realidade concreta do discurso irrepetível.”

(Grifo da autora). Porém, logo após, considerando o movimento histórico/dialético das

circunstâncias da enunciação, Rojo (2011, p. 2) explicita que os gêneros do discurso

estabilizam e cristalizam os enunciados, assim explicando esse movimento: “Embora os

próprios gêneros do discurso sejam eles também flexíveis e estejam em permanente mudança

no espaço histórico-social, sua realidade material permanece, se presentes as condições

sociais de produção de discurso que a engendraram.” Nesse horizonte, Baltar (2004, p. 72)

lembra que, a utilização de um gênero, numa prática interacional, poderá abrir caminhos para

“[...] mudanças nas formações sociodiscursivas já estabelecidas na sociedade”, o que

evidencia que os gêneros textuais-discursivos passam por constantes adaptações a fim de

atender às necessidades surgidas em cada grupo social, os quais utilizam diferentes formas

comunicativas, marcadas por princípios socioideológicos.

Como os campos da atividade humana são infindáveis, sobretudo considerando o

movimento sócio-histórico que os articula e os multiplica incessantemente, Bakhtin (2011)

entende que também a diversidade de gêneros do discurso é ilimitada, já que eles são

Page 82: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

81

mediadores da interação entre as pessoas nas mais diferentes circunstâncias. Isso implica em

admitir que há, praticamente, um número infinito de gêneros textuais-discursivos, haja vista

que são infinitas as diferentes situações dialógicas vividas pelo homem.

Nessa perspectiva, Luiz Antônio Marcuschi (2007) lembra que, na atualidade, a

tecnologia avançada disponível ao ser humano, sobretudo na área de comunicação, tem

viabilizado novas maneiras de interagir e, consequentemente, induzido à emergência de novos

gêneros textuais-discursivos, ou à readequação de outros já existentes. As cartas eletrônicas

(e-mails), por exemplo, ou as conversas por meio de redes sociais, são gêneros que têm sido

muito utilizados e têm facilitado a interlocução entre muitas pessoas. Por outro lado, a

utilização desses meios tem contribuído para que o contato pessoal e direto entre elas seja

cada vez mais raro e, consequentemente, menos caloroso.

Bhatia (2009) também destaca que a dinamicidade do mundo moderno exige novas

formas de interação, seja como decorrência de diferentes recursos multimídia cada vez mais

presentes no dia a dia das pessoas, relacionadas à expansão da tecnologia informacional, seja

pelas novas exigências advindas das mudanças nas relações de trabalho, marcadas por

crescente competitividade. Para Luiz Antônio Marcuschi (2007, p. 20), tais modificações

revelam o

[...] fato de que os gêneros textuais surgem, situam-se e integram-se funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem. Caracterizam-se muito mais por suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais do que por suas peculiaridades linguísticas e estruturais.

Entre as novas formas discursivas, o autor (MARCUSCHI, L. A., 2007, p. 20) cita os

“[...] editoriais, artigos de fundo, notícias, telefonemas, telegramas, telemensagens,

teleconferências, videoconferências, reportagens ao vivo, cartas eletrônicas (e-mails), bate-

papos virtuais (chats), aulas virtuais (aulas chats) [...].” Com algumas limitações estruturais,

mesmo na escola de periferia que desenvolvi a pesquisa de campo, em 2011, constatei a

presença de várias dessas formas de interação entre os professores, ou mesmo entre

professores e alunos ou entre os próprios alunos, como notícias a partir de jornais que a escola

recebia e/ou de outros informativos advindos de diferentes instituições, bem como de

videoconferências, teleconferências, cartas eletrônicas, mensagens via celular e outros. Para

as teleconferências era utilizada a aparelhagem da escola municipal que funcionava no mesmo

prédio, portanto, só era possível utilizar esse recurso esporadicamente.

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82

Esse emaranhado de mudanças, sobretudo no campo de atividades promocionais e

publicitárias, inclusive conduz, conforme Bhatia (2009), para a criação de gêneros mais

híbridos. Dessa forma, as práticas discursivas relacionadas ao marketing, por exemplo, estão

ganhando mais espaço em diferentes meios de comunicação, o que evidencia que os gêneros

textuais-discursivos são construídos socialmente e controlados pelas práticas sociais.

Podemos também imaginar a grande quantidade de gêneros que se constituíram pelo

uso das tecnologias, sobretudo pelos mais jovens, com a manipulação de artefatos

tecnológicos como smartphones, tablets, computadores de última geração etc., cuja

aparelhagem impulsiona, a saltos largos, o letramento digital, embora, na sociedade capitalista

brasileira, a classe explorada pouco usufrua desses avanços. Mesmo assim, reconheço que

essa aparelhagem está provocando, inclusive, mudanças na forma de os jovens utilizarem a

linguagem escrita, fazendo-o de maneira abreviada e até por símbolos, o que não pode ser

ignorado pela escola.

Bronckart (1999), ao falar da transitoriedade e da adaptabilidade dos gêneros,

observa que alguns tendem a desaparecer, outros a reaparecer ou readaptar-se, o que pode,

inclusive, dificultar o estabelecimento de fronteiras entre eles, até porque nem sempre alguns

textos novos são nominados em termos de gênero assim que passam a ser utilizados. Portanto,

apesar de eles serem típicos e relativamente estáveis, Antunes (2009) lembra que também são

flexíveis porque variam com o decorrer do tempo ou conforme as diferentes culturas ou

situações. Nesse aspecto, Bezerra e Reinaldo (2012) explicam que, embora num primeiro

olhar as características de flexibilidade e estabilidade dos gêneros pareçam contraditórias, elas

contribuem para que compreendamos que eles têm por base as práticas sociais que mudam e

avançam, o que faz com que os gêneros também passem por esse movimento conforme as

necessidades de quem os utiliza, e, dialeticamente, cria outras necessidades sociais. Nessa

perspectiva, as autoras (BEZERRA e REINALDO, 2012, p. 80) advertem que o ponto de

partida para a compreensão de gênero, “[...] é não eliminar a conexão que há entre forma e

contexto, de modo que não se estude gênero desligado de seus ambientes sociais.” Assim, elas

alertam que é preciso compreender que os gêneros textuais-discursivos são respostas a

situações sociais recorrentes. Sobre essa questão Bazerman (2006, p. 31) afirmou: “Gêneros

emergem nos processos sociais em que pessoas tentam compreender umas às outras

suficientemente bem para coordenar atividades e compartilhar significados com vistas a seus

propósitos práticos.” Isso implica na compreensão de que os gêneros textuais-discursivos,

muitas vezes com base em outros gêneros, estão sempre se renovando porque as pessoas

Page 84: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

83

vivem, constantemente, novas situações, as quais, por sua vez, demandam soluções ou

encaminhamentos conforme suas especificidades e, portanto, são diferenciados.

Bezerra e Reinaldo (2012, p. 86) salientam, ainda, o ensino para a consciência crítica

de gênero, o que, além de contribuir para o domínio da leitura e da escrita, também amplia o

letramento dos alunos “[...] de modo a dar-lhes condições de solucionar problemas, de se

posicionar e propor alternativas diante de situações que envolvam atividades de linguagem

[...].” Entendo que esse encaminhamento também ajuda a desvelar os aspectos ideológicos

subjacentes aos respectivos gêneros textuais-discursivos. Para isso, os gêneros não podem

simplesmente ser ensinados a partir de modelos, seguindo uma estrutura rígida, mas a partir

de diferentes análises, observando as intenções, a dinamicidade e/ou as contradições que

envolvem os temas abordados por eles e as circunstâncias em que são produzidos.

Encaminhamentos como esse são fundamentais para ajudar o aluno a ter condições de

superar, muitas vezes, sua visão ingênua sobre situações que vivencia e, portanto, a passar a

atuar de forma mais ativa, consciente, crítica e preparada no meio em que vive.

Em síntese, comungando com esses autores, compreendo que a utilização da

linguagem, por meio dos gêneros, viabiliza a comunicação, a interação entre as pessoas, bem

como encaminha a realização de muitas outras ações sociais. Nas palavras de Antunes (2009,

p. 56): “Com a linguagem as pessoas atuam, intervêm na sociedade, e, em contrapartida, as

atuações que elas empreendem na sociedade repercutem em sua linguagem.”

Depreendo, assim, que nossas constantes interações com outros sujeitos são

mediadas por gêneros textuais-discursivos, os quais são organizados e utilizados conforme as

circunstâncias surgidas em diferentes momentos de nosso cotidiano, seja em um simples

preenchimento de um formulário de matrícula, na escola, seja numa conversa aligeirada por

meio do WhatsApp ou na elaboração de um contrato para a compra de uma casa própria, por

exemplo.

Com esse entendimento, comungo com Costa-Hübes (2009) ao defender que é

preciso que o professor, em sala de aula, oportunize a aprendizagem dos diversos enunciados

utilizados em cada setor da sociedade, o que vai muito além do trabalho com frases soltas.

Nessa perspectiva, Luiz Antônio Marcuschi (2008) compreende que o estudo dos gêneros

textuais é um eficiente recurso interdisciplinar, com ênfase na linguagem em efetivo uso nas

atividades culturais e sociais.

Apontando certa relação entre o objetivo de um gênero e o seu próprio nome,

Antunes (2009, p. 57) afirma que o nome do gênero já aponta para o seu propósito

comunicativo: “[...] um convite, um aviso, um atestado, um anúncio, uma exposição oral [...]”

Page 85: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

84

(grifos da autora), o que justifica a necessidade de nomear, com os alunos, os textos que

escrevemos ou analisamos. Bazerman (2006) também aponta que muitos gêneros apresentam

algumas características que facilitam a sua identificação, as quais, geralmente, estão

relacionadas às respectivas funções, todavia, ele considera que existem limitações quanto ao

que é aparente, o que exige uma aferição mais apurada.

Considerando, pois, que a produção escrita é uma prática social expressa sob a forma

de gêneros textuais-discursivos, são conteúdos relacionados a essa prática que a escola deve

priorizar. Nesse horizonte, para Motta-Roth (2006), é necessário que essa instituição

oportunize conhecimentos ao aluno na direção de prepará-lo para utilizar a linguagem em

atividades sociais, cuja defesa vai ao encontro do entendimento de que é preciso que o aluno

tenha contato, via escola, a diferentes práticas letradas, as quais são viabilizadas pela

concepção interacionista de linguagem. Para isso, a alfabetização deve ser conduzida em um

contexto de letramento, o que requer a interrelação com os gêneros textuais-discursivos.

Assim, corroboro com Dutra (2012, p. 264), ao afirmar: “É preciso desenvolver nos alunos o

chamado comportamento escritor – ao lado do comportamento leitor -, algo que se conquista

por meio da familiarização com os textos e com a prática da escrita de diferentes gêneros.”

(Grifos da autora). Nesse sentido, conforme a autora, a escola precisa levar o aluno a planejar

o que pretende dizer e a ter clareza do objetivo dessa ação, bem como a revisar sua escrita

mais de uma vez.

Para Lopes-Rossi (2011), uma forma de conduzir esse trabalho é por meio de

projetos pedagógicos, os quais entendo que se aproximam aos encaminhamentos sugeridos

por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), a partir de sequências didáticas, analisadas em um

dos próximos itens do presente capítulo. Tais projetos, conforme a autora (LOPES-ROSSI,

2011, p. 71), devem buscar o conhecimento, a leitura, a reflexão sobre a utilização dos

gêneros trabalhados com os alunos e, “[...] quando pertinente, a sua produção escrita e

circulação social.”

No tocante às condições de produção e de circulação de um gênero, fundamentais

para a respectiva compreensão das características discursivas, Lopes-Rossi (2011, p. 74)

alerta que é preciso levar o aluno a buscar respostas para algumas perguntas, tais como:

[...] quem escreve (em geral) esse gênero discursivo? Com que propósito? Onde? Quando? Como? Com base em que informações? Como o redator obtém as informações? Quem escreveu esse texto que estou lendo? Quem lê esse gênero? Por que o faz? Onde o encontra? Que tipo de resposta pode dar ao texto? Que influência pode sofrer devido a essa leitura? Em que condições esse gênero pode ser produzido e pode circular na nossa sociedade?

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85

Os textos produzidos pelos alunos da Sala de Apoio no período da intervenção que

realizei no segundo semestre de 2011, que constituíam diferentes gêneros textuais-

discursivos, foram encaminhados à luz dos questionamentos registrados recentemente. Alguns

deles foram analisados na segunda parte do último capítulo. Assim, nessa intervenção, o foco

da educação linguística recaiu, conforme Motta-Roth (2006, p. 501) sobre o “[...] ensino da

interlocução.” (Destaque da autora). Isso ficou evidente, por exemplo, quando esses alunos

convidaram, por escrito, o diretor e uma coordenadora pedagógica da escola para serem

entrevistados por eles e quando analisaram as respectivas respostas, também enviadas por

escrito por esses profissionais e, na sequência, com a realização dessas entrevistas, cujo

detalhamento consta no último capítulo.

Apontando certo limite sobre o ensino de gêneros textuais-discursivos na escola e, ao

mesmo tempo, reconhecendo o quanto ele contribui para o letramento dos alunos, Bezerra e

Reinaldo (2012, p. 94) advertem que, se por um lado, há o risco de cristalizar o gênero quando

ele é ensinado explicitamente “[...] eliminando sua dinamicidade”, por outro, é um conteúdo

relevante para o caminho de letramento dos alunos, bem como para subsidiá-los no

desenvolvimento da consciência crítica e para que percebam a funcionalidade interativa

desses gêneros nas diversas esferas sociais.

Esse ensino, portanto, ajuda os discentes a não perceberem apenas os aspectos

linguísticos textuais dos textos, observam as autoras (BEZERRA e REINALDO, 2012, p. 94),

entendendo que ele também possibilita a percepção dos aspectos sociais e ideológicos

subjacentes aos gêneros e, “[...] em última instância, a organização dos grupos sociais que

constroem a própria sociedade.”

Enriquecendo essa reflexão, trago a ponderação da Professora Rosangela Hammes

Rodrigues, da Universidade Federal de Santa Catarina, feita em uma mesa redonda no X

Círculo de Estudos Linguísticos do Sul do Brasil - CELSUL, realizado em Cascavel - PR, em

outubro de 2012, ao explicitar que é preciso ter o cuidado para que o ensino de gêneros não

siga o caminho das rígidas normas estruturalistas da gramática, ou seja, não podemos

simplesmente substituir o ensino da estrutura da língua pelo ensino da estrutura dos gêneros.

Dessa forma, não podemos achar que ensinar gêneros é ensinar modelos de organização e

estruturação textual ou, ainda, ensinar estratégias de reprodução de estruturas que se repetem

em contextos mais ou menos similares. Nesse viés, Rodrigues (2014, p. 41) assim observou

em um artigo recém-publicado:

Page 87: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

86

[...] a noção de gêneros muitas vezes se limita (ou quase se limita) à estrutura dos textos ou, então, a dimensão estrutural se sobrepõe aos elementos da interação [...]. Com isso não quero dizer que, nessa minha análise, há a denegação da dimensão textual dos gêneros, que essa dimensão em muitos gêneros não possa ter uma relativa organização típica e que não se deva levar em consideração esse aspecto no processo de ensino e aprendizagem da produção escrita. A preocupação reside no rareamento ou no apagamento da dimensão social e interativa dos gêneros, elementos constitutivos da noção de gêneros, uma vez que só faz sentido falar em gênero se falarmos em esfera da atividade humana, interação, autoria, projeto de dizer, interlocutor. (Destaque da autora).

Ainda preocupada com a restrita contemplação dos aspectos interacionais dos

gêneros textuais-discursivos nas aulas de Língua Portuguesa, a autora observa que, muitas

vezes, no trabalho com esses gêneros, predomina o ensino conceitual. Em suas palavras

(RODRIGUES, 2014, p. 43): “Não são poucas as atividades na disciplina de LP em que os

alunos são levados a definir gênero, classificar textos em gêneros, achar tipos/sequências

textuais diferentes nos textos, dizer a diferença entre gêneros e tipos/sequências textuais etc.”

Esse entendimento, conforme Rodrigues (2014, p. 43) revela a crença de que se o aluno

souber explicar o que são os gêneros e classificá-los, ele conseguirá “[...] ler e escrever textos

em gêneros diversos, ou seja, interagir com proficiência em diferentes esferas da atividade

humana.”

Beth Marcuschi (2007, p. 67), por sua vez, adverte que, muitas vezes, o trabalho com

os gêneros textuais-discursivos é muito rigoroso que eles acabam, praticamente, sendo

encaixados “[...] em um ‘modelo’, que não admite alterações. Esquece-se, assim, que os

gêneros não são fixos, mas objetos de discurso de significativa plasticidade.” (Destaque da

autora).

Observando como tais gêneros são, muitas vezes, explorados e, defendendo a sua

importância, Rodrigues (2014, p. 46) alerta que é necessário repensar a forma de trabalhá-los

nas aulas de Língua Portuguesa, lembrando que: “[...] a noção de gêneros que se articula ao

conceito de interação tem no seu horizonte a questão do projeto de dizer do aluno, em que o

enunciado justamente resulta da relação entre projeto de dizer e gênero do discurso [...].”

Após essas breves reflexões, considero importante que os gêneros textuais-

discursivos sejam levados para a sala de aula não como uma fórmula a ser seguida na

expectativa de resolver todos os problemas da disciplina de Língua Portuguesa, mas como

algo que deve ser dominado até para transcendê-lo. Assim, não se trata de dominar um

modelo, mas de compreender modos de geração, de construção desses gêneros e fazer uso

dessas práticas inclusive para subvertê-las, ou seja, eles precisam ser explorados, em sala de

aula, com finalidade interativa e, portanto, libertadora e não como um caminho rígido a ser

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87

seguido, cujo encaminhamento vai em direção do que Rojo (2009) chama de letramentos

múltiplos, potencializando, na escola, o diálogo multicultural com a utilização de práticas

multiletradas. Para isso, é preciso desvelar os objetivos, as ideologias e as intenções do

discurso que está relacionado com a utilização da escrita em sociedade e com sua influência

no mundo moderno. Nesse sentido, o aluno deve ser preparado para questionar o que lê,

entendendo que nada é neutro, mas permeado de ideologias, de intenções, o que constitui o

letramento crítico. Ele também precisa entender que, na sociedade, há uma ampla diversidade

de culturas e de linguagens, as quais devem ser valorizadas e respeitadas.

3.2 TIPOS E GÊNEROS TEXTUAIS-DISCURSIVOS

Mesmo que haja, atualmente, um estudo exaustivo sobre gêneros textuais-discursivos

e uma ampla divulgação nesse sentido; mesmo que os documentos pedagógicos: Parâmetros

Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa - PCN (BRASIL, 1998) e Diretrizes Curriculares

da Educação Básica – Língua Portuguesa - DCE (PARANÁ, 2008) abordem e se organizem

nessa direção, ainda há, como lembra Mendes (2008b), na sala de aula, por parte de muitos

professores, algumas incompreensões e uma delas reside na diferenciação entre gêneros

textuais-discursivos e tipologia. A fim de tentar elucidar essa questão, registro, a seguir,

algumas reflexões. Inicialmente, retomando a definição de gêneros textuais, trago a síntese

elaborada por Costa-Hübes et al. (2007, p. 13-14):

[...] podemos dizer que os gêneros textuais são os textos que circulam em nossa sociedade, presentes no nosso dia a dia, seja em casa, no trabalho, na rua, na igreja, no mercado, enfim, espalhados por todos os lugares. Por onde formos, encontraremos um texto de um determinado gênero nos informando, instruindo, persuadindo, ensinando, entre tantas outras funções sociais que exercem.

Na direção dessa ideia, Luiz Antônio Marcuschi (2007, p. 23) explica que tais

gêneros “[...] apresentam características sociocomunicativas definidas por conteúdos,

propriedades funcionais, estilo e composição característica.” (Grifos do autor). Já em relação

aos tipos de textos o autor (MARCUSCHI, L. A., 2007, p. 22) afirma:

Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição {aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas}. Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção. (Grifos do autor).

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Portanto, enquanto os gêneros são infinitos e, consequentemente, suas designações

também o são, os tipos limitam-se a poucas designações teóricas como narração,

argumentação, descrição, injunção e exposição e se presentificam na arquitetura interna dos

textos. Por isso, cada gênero textual-discursivo, tendo em vista os diferentes textos nos quais

se materializa, é constituído por um ou mais tipos textuais. Nesse sentido Luiz Antônio

Marcuschi (2007, p. 25) explica:

Assim, um texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo). Veja-se o caso da carta pessoal, que pode conter uma sequência narrativa (conta uma historinha), uma argumentação (argumenta em função de algo), uma descrição (descreve uma situação) e assim por diante.

Em outras palavras, para o autor, os diferentes gêneros são compostos por diversas

bases tipológicas. Nesse sentido, esse teórico (MARCUSCHI, L. A., 2007, p. 27) assevera

que:

[...] um tipo textual é dado por um conjunto de traços que formam uma sequência e não um texto. A rigor, pode-se dizer que o segredo da coesão textual está precisamente na habilidade demonstrada em fazer essa “costura” ou tessitura das sequências tipológicas como uma armação de base, ou seja, uma malha infraestrutural do texto. Como tais, os gêneros são uma espécie de armadura comunicativa geral preenchida por sequências tipológicas de base que podem ser bastante heterogêneas mas relacionadas entre si. (Aspas do autor).

Com essa compreensão, Luiz Antônio Marcuschi (2007, p. 27) reforça que, quando

um texto é caracterizado “[...] como ‘narrativo’, ‘descritivo’ ou ‘argumentativo’, não se está

nomeando o gênero e sim o predomínio de um tipo de sequência de base.” (Grifos do autor).

Esse entendimento, como explica Mendes (2008b, p. 177),

[...] auxilia-nos a desfazer a confusão terminológica e conceitual que cerca essas definições, e, em certa medida, as incoerências teóricas presentes nos materiais didáticos destinados ao ensino de Língua Portuguesa e nos manuais de redação, os quais insistem em desenvolver práticas de leitura e escrita baseadas na classificação tipológica tradicional, largamente difundida, representada pela narração, descrição e dissertação, sem incorporar a noção de gênero textual como instrumento de análise e valorização da capacidade humana de interagir através da linguagem. (Grifos da autora).

Nesse sentido, a autora (MENDES, 2008b, p. 177) afirma que “[...] textos e discursos

circulam manifestados por gêneros textuais, e estes, por sua vez, incorporam marcas

tipológicas que se organizam de modo heterogêneo.” Assim, ela lembra que os alunos

precisam produzir textos e não enunciados soltos.

Page 90: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

89

Com a contribuição de Costa-Hübes et al. (2007), Dolz e Schneuwly (2010) e Luiz

Antônio Marcuschi (2007), explicitarei algumas características dos tipos textuais,

paralelamente à apresentação de alguns exemplos de gêneros textuais-discursivos. Antes,

porém, lembro que para Dolz e Schneuwly (2010), as tipologias organizam-se a partir das

capacidades de linguagem dominantes e são definidas em: narrativas, argumentativas,

expositivas e injuntivas. A estas, Luiz Antônio Marcuschi (2007) acrescenta, ainda, a

tipologia descritiva. A seguir estão as cinco tipologias anunciadas por esse autor, as quais são

seguidas pela maioria dos pesquisadores do Brasil.

a) Narrativa:

Por meio de textos organizados com essa tipologia, o autor, ao adentrar no campo da

ficção, cria um contexto narrativo no qual inclui intrigas que geram expectativas no leitor, a

partir da resolução do(s) problema(s) instaurado(s). Logo, essa tipologia está presente em

textos dos gêneros que representam a cultura literária ficcional, sobretudo expressando ações

por meio da criação de intrigas. Exemplos: conto maravilhoso, conto de fadas, fábula, lenda,

adivinha, piada etc. Além disso, as sequências narrativas organizam relatos do dia a dia, com

o objetivo de narrar um acontecimento real. Ex.: notícias, reportagens, ata de reunião,

relatório, relato de experiências etc.

b) Argumentativa:

Os textos organizados com essa tipologia buscam defender, contestar ou mediar

tomadas de posição, investindo na discussão de problemas sociais controversos. Para isso,

organizam-se, predominantemente, com sequências argumentativas, as quais são encontradas

em gêneros como: artigos de opinião, carta de leitor, discurso de defesa ou de acusação

(advocacia), carta de solicitação e outros.

c) Expositiva:

A partir dessa tipologia desenvolvem-se textos cujo objetivo é a transmissão e a

construção de saberes por meio da explicação. Predomina em sequências analíticas ou

explicitamente explicativas. Portanto, essas sequências estão presentes em gêneros como:

Page 91: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

90

texto didático-científico (em livro didático), exposição oral, reportagem científica, entrevista

de especialista, resenha, relatório, entre outros.

d) Descritiva:

Para Luiz Antônio Marcuschi (2007), nessa tipologia prevalecem sequências de

localização, cujo local pode ser indicado circunstancialmente. É o tipo de sequência que

apresenta caracterização e adjetivação, com uma grande incidência de advérbios de modo, de

forma a ajudar o leitor a criar uma imagem da(s) situação(ões) ou do(s) objeto(s) descrito(s).

Essa tipologia está presente em romances, novelas, contos e outros. Ex.: Detalhamento do

local em que uma ação é realizada; indicação do lugar em que estão os objetos mencionados

em um texto; descrição de como são os personagens de um romance, tanto física quanto

psicologicamente etc.

e) Injuntiva:

Nessa tipologia prevalece a regulação mútua de comportamentos por meio de

instruções e proposição de ações. Ela está presente em gêneros como: instruções de

montagem, receitas, regulamentos, regras de jogo, instruções de uso, entre outros, nos quais

predominam as sequências injuntivas.

Com o objetivo de orientar o interlocutor, normalmente uma injunção é elaborada

contendo um verbo no imperativo para indicar uma instrução, porém, muitas vezes, esse

imperativo, conforme Luiz Antônio Marcuschi (2007, p. 28), pode ser representado por um

“[...] ‘deve’. Por exemplo: ‘Todos os brasileiros na idade de 18 anos do sexo masculino

devem comparecer ao exército para alistarem-se’”. (Destaques do autor).

Observo que tais explicações e exemplos são apenas sugestões, entendendo que os

tipos textuais articulam-se a muitas outras situações.

3.3 GÊNEROS DA ESFERA JORNALÍSTICA: ALGUMAS REFLEXÕES

Na intervenção realizada junto aos alunos da Sala de Apoio, o trabalho com gêneros

textuais-discursivos, sobretudo da esfera jornalística, deu o norte às atividades didáticas

Page 92: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

91

desenvolvidas durante o segundo semestre de 2011, as quais culminaram na produção de um

jornal, reconhecendo-o como suporte de circulação social de tais gêneros.

Compreendo, como Luiz Antônio Marcuschi (2008, p. 174), “[...] que o suporte não

é neutro e o gênero não fica indiferente a ele.” Nessa perspectiva, Silva (2009, p. 42) lembra

que o jornalismo não pode ser entendido simplesmente como um espaço noticioso, “[...] mas

é, antes de tudo, uma esfera sociodiscursiva e ideológica [...].” Assim, não existem

enunciados neutros, o que vai ao encontro da defesa de Bakhtin/Volochinov (2009) ao

entenderem que o uso da língua é inseparável do seu conteúdo ideológico e que, conforme

Fiorin (2005, p. 34), “[...] as formações ideológicas só ganham existência nas formações

discursivas.” Nesse sentido, Guimarães (2012, p. 103) explica:

A ideologia se instaura na sociedade principalmente pela língua, da qual o sujeito se apropria para comunicar-se, fazer-se entender – fato que justifica a definição de discurso como ponto de articulação dos processos ideológicos e dos fenômenos linguísticos.

A ideologia é, pois, produzida historicamente no meio social, viabilizada, de forma

predominante, pela linguagem, pois é pelo discurso que são veiculados os valores, as ideias,

os conceitos, que, por sua vez, estão relacionados aos interesses políticos e socioeconômicos

dos diferentes grupos sociais.

Com esse entendimento, trago, nessa unidade, reflexões sobre alguns dos gêneros

textuais-discursivos trabalhados com os alunos da sala mencionada, compreendendo que eles

viabilizam a vivência dos aspectos interacionais da escrita, na direção da defesa de Bonini

(2011, p. 66) ao afirmar que “[...] certos gêneros do jornal são mais relevantes em termos das

práticas sociais correntes na sociedade.” Reforçando essa ideia, Baltar (2004, p. 109) explicita

que o jornal de sala de aula é uma “[...] ferramenta metodológica a serviço da nossa proposta

de criar situações legítimas de escrita para desenvolver a competência discursiva através dos

gêneros textuais [...]”, portanto, a produção de um jornal é uma atividade de linguagem que

visa ampliar a competência sociodiscursiva dos alunos, contribuindo para que eles percebam a

função social de alguns gêneros jornalísticos, bem como a ideologia por eles perpassada em

diferentes situações. Nas palavras de Bueno (2011, p. 88): “[...] cada jornal apresentará a sua

versão do fato dando mais ou menos detalhes, usando um vocabulário diferenciado e

organizando a sequência dos fatos, conforme seja a sua visão do que possa interessar ao seu

público-leitor.” No entanto, a autora alerta que os responsáveis pela produção de um jornal

procuram passar, por meio dele, uma imagem de neutralidade e de imparcialidade como

Page 93: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

92

tentativa de amenizar sua direção ideológica. Entendo, porém, que a palavra não é neutra,

pois, como defendem Bakhtin/Volochinov (2009), ela é impregnada de intenções.

a) Propaganda ou texto publicitário

O gênero textual-discursivo propaganda, conforme Urnau (2009, p. 9), “[...] se faz

presente no dia a dia de toda a sociedade, cumprindo o papel de persuadir com o seu jogo de

imagens verbais e não verbais, manipulando com sua força o modo de querer, pensar e agir

daquele que a recebe.” Com essa compreensão, corroboro com Orlandi (1987) ao defender

que a propaganda é um discurso autoritário haja vista que, nela, são utilizados diversos

recursos, como os retóricos e os argumentativos na tentativa de convencer o interlocutor a

mudar de atitudes ou comportamentos, a fim de induzi-lo a interessar-se sobre o que é

divulgado, o que chega a criar, inclusive, falsas necessidades. Assim, entendo que toda forma

de publicidade tem caráter persuasivo no sentido de tentar convencer o consumidor a preferir

determinadas marcas, produtos ou serviços em detrimento de outros. Para isso, as

propagandas ou textos publicitários caminham na direção de chamar a atenção dos

consumidores sobre o que é divulgado, criando uma preferência, motivando-os, despertando

seu interesse para a compra e o consumo de algo.

Reconheço, conforme Sandmann (1997), que o conteúdo da maior parte das

propagandas reflete a ideologia da classe dominante, subjacente ao jogo da linguagem e/ou

das imagens utilizadas, que, na sociedade capitalista, é a ideologia burguesa. Para o

desvendamento da opacidade implícita nessa ideologia, considero necessário que seja feita,

constantemente, a análise do discurso.

Palavras, músicas, sons, movimentos, ilustrações, cores, signos não verbais, entre

outros meios, são criativamente utilizados com maior ou menor intensidade, a depender da

forma como a propaganda é realizada: se apenas na oralidade, se por audiovisual ou se

impressa. Essa diversidade de recursos utilizados aponta para a necessidade de que o aluno

seja levado também a fazer, segundo Joly (1996), leituras semióticas sobre as imagens,

considerando que os símbolos icônicos são bons meios para atrair a atenção, despertar o

desejo pelo que estiver sendo divulgado, reforçar outras mensagens ou facilitar a compreensão

do texto. Defendendo essa leitura, Simões assevera (2008, p. 102): “[...] a escola precisa ser

instrumentalizada semioticamente para que suas práticas leitoras se tornem cada vez mais

eficientes.”

Page 94: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

93

Cabe destacar que as propagandas são elaboradas, cuidadosamente, para atingir um

determinado público o que exige, segundo Jakobson (2010), conhecimento das necessidades e

expectativas do grupo que pretende atingir, que, por sua vez, geralmente tem grande

familiaridade sobre o que é de seu interesse. Assim, esse gênero textual-discursivo deve

conter informações coerentes, atrativas e que demonstrem credibilidade, explicitando, ao

possível cliente, o que ele precisa e almeja saber sobre o que estiver sendo divulgado.

b) Entrevista

Parto da ideia defendida por Hoffnagel (2007, p. 182) de que “[...] a entrevista é um

gênero primordialmente oral.” Essa modalidade é comum em contextos interacionistas entre

profissionais da saúde e seus pacientes, em seleções de funcionários, em entrevistas coletivas

entre outras situações similares, como a utilização desse gênero na esfera jornalística, a

exemplo de entrevistas em rádio e televisão. A autora (HOFFNAGEL, 2007, p. 182) lembra

que, quando esse gênero é publicado em jornais ou revistas, geralmente também é realizado

oralmente para depois ser transcrito para publicação, cuja escrita “[...] é apresentada na forma

de um diálogo, ou seja, é marcada a troca de turnos entre os participantes [...]”, sendo um

entrevistador e um, ou mais, entrevistado(s).

Conforme a autora, uma entrevista sempre objetiva buscar informações, as quais são

utilizadas de acordo com as especificidades de cada situação, algumas servindo para fins

particulares, como uma anamnese conduzida por um psicólogo a um paciente; outras, de

cunho mais público, objetivam levar informações a muitas pessoas, a exemplo de uma

entrevista realizada com uma autoridade a respeito de uma questão polêmica da esfera da

saúde. Cabe lembrar, ainda, que muitas reportagens têm por base uma ou mais entrevistas

realizadas ou são acompanhadas de partes delas.

É pertinente trazer o entendimento de Silva (2009) sobre o gênero textual-discursivo

entrevista, denominado por ela de pingue-pongue, a qual é muito publicada, principalmente

no jornalismo de revista. Para a autora (SILVA, 2009, p. 16), esse termo

[...] faz referência à organização textual do gênero, o qual se caracteriza por apresentar, no corpo do texto, uma sequência de perguntas e de respostas, diferenciando-se da entrevista face a face e do discurso citado do entrevistado inserido em outros gêneros (por exemplo, reportagem, notícia).

Page 95: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

94

Com essa compreensão, Silva (2009, p. 67-68) explica que uma entrevista pingue-

pongue é um discurso representado da entrevista face a face e que nessa ação já há julgamento

de valor,

[...] pois o jornalista, ao reenunciar a entrevista face a face, cita e realiza um enquadramento da sua ‘fala’ e da do entrevistado. Como a interlocução entre jornalista e entrevistado, na entrevista pingue-pongue, é uma reenunciação da entrevista face a face já ocorrida, já não se trata mais da mesma interação, pois [...] o enunciado é irrepetível, podendo somente ser citado ou mencionado [...]. (Grifos da autora).

Enriquecendo essa reflexão, trago situações que evidenciam algumas oportunidades

de o jornalista, responsável por determinada entrevista face a face, interferir nas afirmações

do entrevistado. Isso pode ocorrer, conforme a autora (SILVA, 2009, p. 78) desde os

primeiros momentos da respectiva edição, pois “[...] o jornalista tem autonomia para alterar

trechos confusos na fala do entrevistado, substituir termos muito técnicos por expressões

adequadas aos leitores de sua revista e, principalmente, resumir grandes discussões [...].”

Assim, o jornalista seleciona o que quer que seja, ou não, publicado. Após essa etapa, o editor

ainda fará uma análise e uma nova seleção do que considera que deve ser divulgado, bem

como observará se as ideias estão claras, se foi utilizada a linguagem padrão e se ela está de

acordo com os interesses/ideologia dos leitores da revista, entre outras situações. Bueno

(2011) lembra, inclusive, que as marcas da oralidade também são retiradas de entrevistas

registradas em certas revistas.

Hoffnagel (2007) alerta que em relação às entrevistas realizadas para serem

divulgadas e/ou apresentadas na mídia, além do entrevistado e do entrevistador, que são

diretamente envolvidos nessa relação dialógica, indiretamente as perguntas e as respostas são

elaboradas considerando os respectivos ouvintes, espectadores ou leitores. Em suas palavras,

(HOFFNAGEL, 2007, p. 183): “Neste sentido, tanto as perguntas como as respostas são

formuladas com uma audiência específica em mente.” Assim, as entrevistas publicadas são

planejadas conforme os propósitos que pretende atingir, os quais estão relacionados a

determinado público alvo, seja por campo profissional ou área de interesse, como saúde,

esporte, política entre outras, seja por sexo ou idade. Essa ideia remete à ressalva de Bakhtin

(2011) quanto ao entendimento do discurso por parte do destinatário, o que implica no seu

conhecimento em relação ao tema abordado no discurso/entrevista. Dessa forma, como afirma

Silva (2009, p. 69), “[...] o autor do enunciado se orienta pela visão que projeta do

Page 96: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

95

destinatário”, a qual tem por base pesquisas midiáticas realizadas por empresas

especializadas.

c) Reportagem

O gênero textual-discursivo reportagem, segundo Faria e Zanchetta (2002), objetiva

retomar e aprofundar informações surgidas no dia a dia, buscando suas origens e o seu

desenrolar, a fim de levar o leitor a entender, com detalhes, o respectivo conteúdo.

Nessa direção, Baltar (2004, p. 132) considera que esse gênero é o “[...] mais

complexo e mais elaborado do jornalismo [...]”, haja vista que ele envolve a explicitação, por

meio de palavras ou imagens, de tudo o que se passou em determinado local, a ponto de levar

os leitores a imaginar-se vendo o que ocorreu. Esse procedimento exige um exaustivo

detalhamento dos dados gerados por meio de entrevista ou de recursos de outras fontes como

rádio, televisão, internet entre outras. Para o autor (BALTAR, 2004, p. 132), nesse gênero

“[...] predominam os tipos de discurso do mundo do narrar: narração e o relato interativo, com

sequências narrativas, descritivas e dialogais.”

A abordagem de uma reportagem, conforme Bueno (2011), é coerente com a

perspectiva de seu autor, que, normalmente, vai à direção da perspectiva ideológica do

suporte em que é divulgada, como um jornal, uma revista ou outros, com o intuito de

corresponder aos interesses dos respectivos interlocutores. Nesse sentido, a autora (BUENO,

2011, p. 94) explica:

Assim, os temas veiculados em uma revista como Veja não serão tratados da mesma forma em uma revista como Caros Amigos, cujos temas serão muito diferentes de uma revista como ELLE, uma vez que os destinatários, apesar de pertencerem aos mesmos grupos socioeconômicos, têm interesses também diferentes. (Grifos da autora).

Entendo que a diferença de interesses ou de preferências por determinada revista,

geralmente, tem por base a concepção de sociedade de cada leitor. Assim, um adepto do

materialismo histórico dialético, provavelmente, considere mais coerente com o que ele

defende o que é publicado nas revistas Caros Amigos ou Carta Capital, por exemplo, ao

passo que um defensor das teorias liberais, por entender os temas tratados a partir de outras

perspectivas, provavelmente considere mais coerente o que é publicado em revistas de outras

vertentes, a exemplo da Veja ou Isto É. Contudo, como os meios de comunicação brasileiros

pertencem, predominantemente, à elite capitalista, eles são mantidos, sobremaneira, para

Page 97: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

96

divulgar e defender os pontos de vista que reforçam essa organização e, portanto, que estejam

a seu favor. Lembro, porém, que muitos políticos e intelectuais, por exemplo, procuram ler

publicações para além de suas preferências, como forma de acompanhar e de conhecer melhor

o que está sendo publicado sob outras concepções de sociedade, o que os prepara melhor para

contra-argumentar sobre seus posicionamentos.

É oportuno advertir que a mídia é um dos instrumentos mais persuasivos na direção

de manter a ordem vigente e, num país como o Brasil, que é democrático apenas

juridicamente, as pessoas de pouco, ou nenhum, prestígio social, além de não disporem de

recursos para serem proprietárias dos meios de comunicação, dificilmente terão espaços

nesses meios para defenderem seus posicionamentos ou denunciarem as situações de que são

vítimas, justamente porque tais denúncias, provavelmente, atingiriam os princípios

ideológicos dos donos desses meios e/ou dos responsáveis pelo que deve ser divulgado neles.

A linguagem de uma reportagem também deve considerar o público alvo, bem como

o assunto e o suporte em que circulará. É preciso lembrar, ainda, que um texto desse gênero

textual-discursivo deve apresentar maior aprofundamento dos dados do que uma notícia, o

que exige mais investigação por parte de seu autor.

Bueno (2011, p. 110) lembra que tanto a reportagem quanto a notícia trazem, no lide,

uma breve apresentação do assunto ou o que é essencial, cuja parte “[...] deve conter as

respostas às perguntas ‘quem, o que, quando, onde, como, por que’, fornecendo ao leitor uma

visão mais clara e completa do que vai ser noticiado.” (Destaque da autora). Conforme a

autora, a ordem das respostas a essas perguntas é definida pelo respectivo redator, o qual tem

a incumbência de despertar, no leitor, o interesse por ler todo o texto.

d) Texto de divulgação científica

Os textos do gênero textual-discursivo divulgação científica objetivam socializar os

conhecimentos produzidos com certo rigor metodológico para as diferentes instâncias da

sociedade. Normalmente são divulgados na mídia impressa, como jornais e revistas, e, nos

últimos tempos, também na mídia eletrônica.

Becker e Giering (2009, p. 3) consideram que tais textos são fundamentais para a

alfabetização científica, visto que objetivam disponibilizar “[...] a compreensão mínima em

ciência e em tecnologia ao cidadão.” Portanto, segundo Nath (2007), esses textos não visam à

distração ou à diversão, embora até possam fazê-lo.

Page 98: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

97

Normalmente, os autores de textos de divulgação científica publicados em jornal, por

exemplo, utilizam uma linguagem formal, porém, acessível a diferentes classes sociais,

portanto, mais simples que a dos cientistas. Em relação à linguagem, a autora (NATH, 2007,

p. 134) também adverte que é utilizada a denotativa na busca de evitar dupla interpretação.

Em suas palavras: “Evita-se o uso de metáforas ou de frases que possam ter dupla

significação. O correto é que todas as pessoas que lêem o texto o compreendam [...], ao

contrário da literatura, que usa a linguagem conotativa (figurada).”

É comum que os autores desses textos recorram a alguns pesquisadores para dar

maior credibilidade ao que estão afirmando. Assim, essas produções oportunizam que se

tenha uma noção do que está sendo investigado, ou seja, que se tenha acesso a algumas

descobertas científicas.

Textos desse gênero estão disponíveis, aos alunos, sobretudo nos livros didáticos de

Ciências, História, Geografia entre outros, mas, como lembra Nath (2007), talvez sem a

orientação para analisar sua estrutura, sua organização ou como eles são produzidos.

e) Artigo de opinião

O artigo de opinião é um gênero textual-discursivo opinativo que, segundo Bräkling

(2000, p. 227), visa convencer o interlocutor “[...] de uma determinada ideia, influenciá-lo,

transformar os seus valores por meio de um processo de argumentação a favor de uma

determinada posição assumida pelo produtor e de refutação de possíveis opiniões

divergentes.” Nesse sentido, na tentativa de convencer o outro para que mude sua opinião, é

preciso apresentar sucessivos argumentos consistentes, afinal, como asseveram Costa-Hübes

et al. (2007, p. 133) “[...] os artigos de opinião têm, como fim discursivo, o fazer-crer” ou,

conforme Dóris da Cunha21 (2007), fazer aderir ao ponto de vista do autor e criticar os outros

com os quais mantém uma relação conflituosa. Para isso, é preciso supor posicionamentos

divergentes para poder atacá-los. Assim, conforme lembram Simioni e Costa-Hübes (2010), a

sequência discursiva predominante para persuadir o leitor é a argumentativa, enriquecida

pelas escolhas lexicais, as quais ajudam a delinear o estilo desse gênero.

Bräkling (2000) observa que a produção de um artigo de opinião exige uma situação

contestável a ser analisada, referente a algum tema polêmico de um determinado grupo social,

sendo que o autor apresenta argumentos favoráveis à tese que defende. Nesse sentido, para

21 Como contemplo duas autoras com o sobrenome Cunha (Dóris e Myriam Crestian), no texto, para identificá-las, escrevo também seus nomes.

Page 99: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

98

Baltar (2004), um artigo dessa ordem expressa o posicionamento de um autor, que o assinará,

sem, necessariamente, representar a opinião do jornal em que será publicado. Contudo,

convém retomar o que já afirmei, com base em Luiz Antônio Marcuschi (2008), em relação a

não neutralidade do suporte, nesse caso, o jornal, e que os textos nele publicados não são

indiferentes a ele. Enriquecendo essa questão, Baltar (2004, p. 131) lembra que, normalmente,

um artigo de opinião “[...] é escrito por colaboradores do jornal, com notório saber sobre o

tema que escrevem.” Assim, entendo que sendo escrito por colaboradores, dificilmente tal

artigo terá uma linha ideológica divergente dos proprietários do meio de comunicação que o

publicará.

O autor compreende, ainda, que como em um artigo desse gênero o que importa é a

visão de quem o produz, ou seja, o seu posicionamento em relação a algum assunto, não há

necessidade de fonte de referência. Afirma, também, que é um gênero que admite linguagem

mais sofisticada ou gírias, e que são poucos os jornalistas que chegam a escrever um artigo

dessa modalidade. Adverte que, embora não sendo obrigatório, é um gênero que enriquece o

jornal.

3.4 UMA PROPOSTA METODOLÓGICA DE TRABALHO COM OS GÊNEROS

TEXTUAIS-DISCURSIVOS: SEQUÊNCIA DIDÁTICA

Parto do entendimento de que a prática pedagógica de todo professor de Língua

Portuguesa é conduzida à luz de uma concepção de linguagem, a qual envolve desde o

planejamento de suas aulas até sua forma de avaliar seus alunos, abarcando, assim, todas as

atividades que são realizadas em sua docência, sobretudo a seleção dos encaminhamentos

metodológicos, por mais simples e comuns que possam ser.

Nessa escolha, corroboro com Antunes (2003, p. 41) quando defende que a prática

pedagógica precisa ser conduzida na direção do entendimento de linguagem “[...] enquanto

atuação social, enquanto atividade de interação verbal de dois ou mais interlocutores [...]”,

cuja concepção interacionista foi explicitada no item 2.2, a qual norteou a intervenção

realizada na segunda etapa da pesquisa de campo realizada para a produção do presente

trabalho de tese.

Objetivando refletir sobre os pressupostos teórico-metodológicos utilizados na

referida intervenção, trarei alguns apontamentos sobre sequências didáticas, entendendo que

elas contribuem para conduzir as aulas de Língua Portuguesa na perspectiva da concepção

Page 100: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

99

interacionista de linguagem, via gêneros textuais-discursivos. Esse encaminhamento vai ao

encontro do que defendem Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), quando indicam que é

necessário criar diferentes situações de produção aos alunos. É o que explicito a seguir.

Inicio trazendo a seguinte definição de sequência didática, elaborada por esses

autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 82): “[...] é um conjunto de

atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral

ou escrito.” Para eles, uma SD objetiva levar o aluno a um maior domínio dos gêneros

textuais, no sentido de ajudá-lo a utilizar a forma mais coerente de comunicação em cada

momento interacional surgido. Destaco que esse momento será mais produtivo quanto mais

ele representar uma situação real ocorrida nas aulas de Língua Portuguesa que, aliás, é pouco

comum acontecer, pois nelas ainda predomina, como lembra Rosenblat (2000), situações

artificiais de interação.

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010) advertem que nos adaptamos às diferentes

situações de comunicação, conforme as necessidades que temos, ou seja, conforme as

especificidades do gênero textual-discursivo em exercício. Assim, para eles (DOLZ;

NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 83) “[...] não escrevemos da mesma maneira quando

redigimos uma carta de solicitação ou um conto; não falamos da mesma maneira quando

fazemos uma exposição diante de uma classe ou quando conversamos à mesa com amigos.”

Nesse sentido, Luiz Antônio Marcuschi (2008, p. 214) adverte: “Os gêneros são tidos como

instrumentos comunicativos que servem para realizar essas atividades formais e informais de

maneira adequada.” No entanto, conforme lembram Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p.

83), alguns gêneros são detentores de maior interesse da escola “[...] como as narrativas de

aventuras, as reportagens esportivas, [...] as notícias do dia, as receitas de cozinha, para citar

apenas alguns.”

Para Luiz Antônio Marcuschi (2008), o trabalho com gêneros textuais por meio de

SD é uma forma de ordenar as atividades, de organizá-las. O autor (MARCUSCHI, L. A.,

2008, p. 213) explica: “Os procedimentos têm um caráter modular e levam em conta tanto a

oralidade como a escrita. O trabalho distribui-se ao longo de todas as séries do ensino

fundamental.”

As SD devem favorecer a criação de situações, de atividades que, de fato,

oportunizem a vivência de momentos de interlocução, desde o entendimento e produção de

um gênero textual-discursivo até o seu encaminhamento para circulação, a fim de que cumpra

sua respectiva função social. Nas palavras de Luiz Antônio Marcuschi (2008, p. 214): “A

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100

finalidade de trabalhar com sequências didáticas é proporcionar ao aluno um procedimento de

realizar todas as tarefas e etapas para a produção de um gênero.”

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 83) sugerem a seguinte ordem para o

desenvolvimento de uma sequência didática:

Esquema da Sequência Didática

FONTE: Dolz e Schneuwly (2010, p. 83)

Analiso, a seguir, cada uma dessas etapas.

a) A apresentação da situação:

É o momento de definição, de exploração de uma efetiva situação interacional a ser

concretizada na produção final. Essa situação também objetiva preparar os alunos para uma

produção inicial, considerada um dos primeiros momentos de contato com um gênero textual

que, posteriormente, também será explorado nos módulos de atividades. Nessa apresentação,

é explicitada a necessidade de uma produção, o motivo de fazê-la, devendo ficar evidente qual

é o problema de comunicação que se objetiva resolver a partir dela. Assim, deve ser decidido

qual o gênero mais coerente para encaminhar tal situação, bem como a quem a produção

deverá ser dirigida e a forma como ela será produzida e encaminhada ao destinatário.

Paralelamente ao entendimento do gênero a ser produzido e o exercício para

aprender a fazê-lo, o aluno também deve ser levado a dominar os conteúdos subjacentes ao

gênero explorado. No caso de um artigo de opinião, por exemplo, além de saber como ele é

constituído, sobretudo sobre a importância de saber argumentar, o aluno precisa entender o

conteúdo a ser abordado em tal artigo, o que, muitas vezes, exige um amplo encaminhamento

interdisciplinar.

Em síntese, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010. p. 85) explicam: “A fase inicial de

apresentação da situação permite, portanto, fornecer aos alunos todas as informações

necessárias para que conheçam o projeto comunicativo visado e a aprendizagem de linguagem

a que está relacionado.” Eles sugerem que nessa fase de apresentação da situação seja

Módulo

1

Módulo

2

Módulo

n

Apresentação da situação

Produção inicial

Produção final

Page 102: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

101

elaborado um projeto a ser desenvolvido a partir dela, o que poderá contribuir para que as

atividades sejam coerentes entre si e desafiadoras ao aluno. Nesse sentido, os autores (DOLZ;

NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010. p. 85) indicam a criação de

[...] uma coletânea de enigmas policiais, participar de um debate organizado por uma revista, ou, mais modestamente, redigir um texto explicativo para uma outra turma num projeto interclasses: são projetos realizáveis, que permitem ao aluno compreender melhor a tarefa que lhe é proposta e que facilitam a apresentação da situação.

Entendo que essas situações de produção, com base no desenvolvimento de projetos,

contribuem, significativamente, para que o aluno compreenda a função social da escrita bem

como que elas abrem possibilidades para outras produções.

b) A primeira produção

Quanto melhor for explorada a apresentação da situação inicial com os alunos,

melhor preparados eles estarão para as primeiras tentativas de produção, seja na oralidade,

seja na escrita. Essa constatação evidencia a importância de eles dominarem o tema que estão

tentando sistematizar, bem como saber do objetivo de fazê-lo, afinal, só tomamos a iniciativa

para produzir um texto quando temos um motivo, o que será feito via um gênero textual-

discursivo oportuno para cada situação.

Essas produções iniciais, além de revelar aos próprios alunos os seus avanços,

representam um significativo diagnóstico das condições de suas produções, contribuindo para

a decisão do que o professor deve priorizar em suas aulas, pois elas, conforme Dolz, Noverraz

e Schneuwly (2010, p. 87),

[...] constituem momentos privilegiados de observação, que permitem refinar a sequência, modulá-la e adaptá-la de maneira mais precisa às capacidades reais dos alunos de cada turma. Em outros termos, de pôr em prática um processo de avaliação formativa. A análise das produções orais ou escritas dos alunos, guiada por critérios bem definidos, permite avaliar de maneira bastante precisa em que ponto está a classe e quais são as dificuldades encontradas pelos alunos.

Conforme Luiz Antônio Marcuschi (2008), essa produção inicial pode ser individual

ou coletiva e ser organizada em forma de esboço. Pode ser realizada como uma maneira de

exercitar o gênero em questão, sem necessariamente encaminhá-la aos possíveis destinatários.

Aliás, para o autor (MARCUSCHI, L. A., 2008, p. 215),

Page 103: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

102

[...] esse esboço deve ser tido como o primeiro contato com o gênero. Essa etapa é crucial, pois representa a primeira atividade de produção em que o texto vai ser avaliado e revisto tantas vezes quantas necessárias e sucessivamente passando por módulos nos passos seguintes até chegar ao estágio final de elaboração.

Esse primeiro encontro com o gênero é uma forma de viabilizar o entendimento ou

mesmo o encaminhamento da situação inicial de uma sequência didática, o que pode ser algo

simples, lembram Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), como uma entrevista realizada entre

os colegas da sala de aula ou a um destinatário fictício.

c) Módulos de atividades

Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 87), “[...] nos módulos trata-se de

trabalhar os problemas que aparecem na primeira produção e de dar aos alunos os

instrumentos necessários para superá-los.” (Grifo dos autores). Para isso, o encaminhamento

para a produção oral ou escrita de um texto deve ser segmentado, a fim de que cada

particularidade seja trabalhada separadamente, entendendo que, dessa forma, estar-se-ia

preparando o aluno para dominar o gênero textual enfatizado na SD em que está inserido, cujo

entendimento deve culminar numa produção final. Também para Luiz Antônio Marcuschi

(2008), as primeiras atividades dos módulos têm por base as dificuldades apresentadas pelos

alunos na produção inicial, com a finalidade de ajudá-los a superá-las, principalmente no

sentido de verificar se o texto do gênero selecionado foi produzido de forma coerente,

podendo-se fazer uma análise coletiva.

Conforme esses autores, a partir da SD, o aluno é levado a aproximar-se de uma

efetiva situação de comunicação, o que requer que ele tenha clareza dos objetivos do texto a

ser produzido, bem como que conheça o perfil do destinatário e a sua função nessa

elaboração, se narrador, se está representando a sua classe ou, ainda, se cada aluno produzirá

seu texto.

As atividades da SD devem facilitar a elaboração de conteúdos pelo aluno, buscando

novas informações em outras disciplinas ou outros meios, como anotações, participação em

eventos etc. Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 89) advertem que elas devem ser

diversificadas, pois

[...] o princípio essencial de elaboração de um módulo que trate de um problema de produção textual é o de variar os modos de trabalho. Para fazê-lo, existe um arsenal bastante diversificado de atividades e de exercícios que relacionam intimamente

Page 104: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

103

leitura e escrita, oral e escrita, e que enriquecem consideravelmente o trabalho em sala de aula. Em cada módulo, é muito importante propor atividades as mais diversificadas possível, dando, assim, a cada aluno a possibilidade de ter acesso, por diferentes vias, às noções e aos instrumentos, aumentando, desse modo, suas chances de sucesso.

Esses autores também falam da imprescindibilidade de planejar os textos antes de

produzi-los efetivamente, entendendo que o aluno deve, inicialmente, organizar um roteiro

para tal produção, considerando a sua finalidade, a quem ela se dirige e a forma que deve dar

a ela.

Em relação à produção do texto propriamente dita, é importante, conforme Dolz,

Noverraz e Schneuwly (2010, p. 88), que o aluno escolha uma linguagem coerente com a

situação, considerando, principalmente, quem serão seus interlocutores, bem como que esteja

atento aos “[...] tempos verbais em função do tipo e do plano do texto, servir-se de

organizadores textuais para estruturar o texto ou introduzir argumentos.”

Os mesmos autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 89) destacam a

importância de levar o aluno a observar e a analisar as produções escritas, inclusive as que ele

próprio elabora, na busca de clarear “[...] certos aspectos do funcionamento textual [...]. Essas

atividades podem ser realizadas a partir de um texto completo ou de uma parte de um texto;

elas podem comparar vários textos de um mesmo gênero ou de gêneros diferentes etc.”

Dentre as tarefas mais simples desse tipo de produção, Dolz, Noverraz e Schneuwly,

(2010, p. 89) indicam: “[...] reorganizar o conteúdo de uma descrição narrativa para um texto

explicativo, inserir uma parte que falta [...], revisar um texto em função de critérios bem

definidos, [...] encadear com uma questão etc.”

O desenvolvimento dos módulos de atividades, além de favorecer que o aluno

entenda e elabore mais produções escritas com efetivos fins interacionais, também pode

oportunizar que ele conheça melhor os gêneros abordados referentes ao estilo, à composição

ou, como lembram os autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 89), às

particularidades da “linguagem técnica”, ao vocabulário, afinal, paulatinamente, eles vão se

apropriando de novos conhecimentos sobre os respectivos gêneros e os associam a outros.

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 90) exemplificam:

[...] quando aprendemos, por meio de diferentes exercícios, quais são as partes de uma instrução de montagem, ou quais são as técnicas para transformar as respostas do outro em perguntas, numa entrevista, esses conhecimentos trabalhados, discutidos, explicitados numa linguagem técnica – que pode ser simples – permitem a revisão do próprio texto ou uma melhor antecipação do que se deve fazer numa produção oral.

Page 105: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

104

Ao finalizar cada SD, devem ser registrados muitos dos avanços obtidos pelo aluno,

seja em relação ao vocabulário técnico referente a um determinado gênero textual-discursivo,

seja a outros conhecimentos adquiridos no seu percurso, em forma de lista, lembrete ou

glossário.

Na busca de facilitar o atendimento da heterogeneidade que constitui as turmas de

alunos, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010) defendem a ideia de organizar os módulos com

atividades diversificadas. Tais atividades podem ser modificadas em função das respectivas

necessidades, as quais poderão evidenciar-se após uma rigorosa análise da produção inicial.

A fim de garantir que os alunos avancem em relação ao domínio dos conteúdos

trabalhados nas SD, os autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 94) indicam

alguns procedimentos, como:

● analisar as produções dos alunos em função dos objetivos da sequência e das características do gênero; ● escolher as atividades indispensáveis para a realização da continuidade da sequência; ● prever e elaborar, para os casos de insucesso, um trabalho mais profundo e intervenções diferenciadas no que diz respeito às dimensões mais problemáticas.

De um modo geral, os encaminhamentos para as SD recém-registrados, aplicam-se

tanto para os gêneros orais quanto para os escritos, contudo, há diferenças, dentre as quais

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 94-95) destacam em relação aos escritos:

a) Possibilidade de revisão. [...] o aluno aprende que escrever é (também) reescrever. [...] A escrita deve ser corrigida no final; o texto, durante muito tempo provisório, é o instrumento de elaboração do texto definitivo.

b) Observação do próprio comportamento. O texto escrito pode ser considerado como uma forma permanente, exteriorizada, do próprio comportamento de linguagem. [...] o texto oral, desaparece imediatamente e não se presta a uma análise posterior para se compreender e observar seu modo próprio de funcionamento. Para tornar o comportamento observável, existe um só procedimento: a gravação [...].

c) Observação de textos de referência. [...] Trata-se de um objeto estável.

Sintetizando, compreendo que tanto a intensa exploração da oralidade, com o aluno,

quanto da produção escrita utilizada em situações de interação reais são fundamentais para o

entendimento da linguagem com propósito funcional.

d) Produção final

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 90) lembram que a SD é concluída por “[...]

uma produção final que dá ao aluno a possibilidade de pôr em prática as noções e os

Page 106: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

105

instrumentos elaborados separadamente nos módulos. Essa produção permite, também, ao

professor realizar uma avaliação somativa.”

Dessa forma, a produção final serve de parâmetro para o aluno perceber o que

aprendeu e o que ainda precisa ser retomado, portanto, oferece-lhe informações sobre seus

avanços em relação à produção de textos durante a sua revisão ou a sua reescrita. Assim, tais

constatações, como asseveram os autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p.

91) “[...] devem servir como critérios de avaliação. [...] Não só para avaliar num sentido mais

estrito, mas também para observar as aprendizagens efetuadas e planejar a continuação do

trabalho, permitindo eventuais retornos a pontos mal assimilados.” Nesse sentido, as

produções finais podem ser consideradas uma significativa referência para o planejamento das

aulas vindouras, pois o professor poderá ter, a partir delas, um panorama das maiores

dificuldades apresentadas pelos alunos, tanto em relação aos aspectos mais abrangentes

relacionados ao sentido do texto quanto em relação aos aspectos que ainda são mais

trabalhados em sala de aula, a exemplo da pontuação e da paragrafação.

É fundamental que a produção final seja, efetivamente, colocada em circulação, a fim

de que cumpra sua função social, cujo encaminhamento também poderá possibilitar que o

aluno perceba que é possível haver muitos leitores de suas produções e não mais apenas seu

professor, ou seja, ele produzirá para situações de uso.

A tomada de consciência, pelo discente, de que o seu texto tem um objetivo a

cumprir junto a uma ou mais pessoas e que viabiliza o desenvolvimento de ações, poderá

contribuir, também, para que ele reconheça a necessidade de que ele seja muito bem

produzido, que tenha coerência e coesão, na busca de garantir o respectivo entendimento,

afinal, ele visa comunicar algo a alguém. Isso ajudará o aluno a entender, ainda, porque

precisou refazê-lo várias vezes antes de chegar a esse momento de término.

Também é importante destacar que a produção final, além de evidenciar os possíveis

avanços e limites do aluno em relação à escrita, exigirá e explicitará seu conhecimento

referente às temáticas exploradas em cada produção, o que poderá demandar, muitas vezes,

um trabalho interdisciplinar e intercultural. Aliás, tais encaminhamentos, se fundamentados

por uma pedagogia histórico-crítica, conforme Duarte (2014), poderão oportunizar, ao

discente, mais conhecimento sobre temas variados, o que contribui para prepará-lo para atuar

na injusta e excludente sociedade de classes em que vivemos.

Page 107: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

106

3.5 ATIVIDADES DE ESTRUTURAÇÃO DA LÍNGUA SUBJACENTES ÀS

SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS

Conforme Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), há a necessidade de que a proposta

de trabalho por meio de sequências didáticas, que visa, sobretudo, à produção textual do

aluno, seja interrelacionada com outros campos do ensino de linguagem, como forma de

complementaridade. Nas palavras dos autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010,

p. 96):

É no nível da textualização, mais particularmente, que o trabalho conduzido nas sequências torna-se complementar a outras abordagens. Nesse nível, as sequências didáticas propõem numerosas atividades de observação, de manipulação e de análise de unidades linguísticas.

O respectivo encaminhamento é semelhante ao que é realizado nas atividades de

estruturação textual, direcionando-se a particularidades, cujo funcionamento só tem sentido

no plano textual. Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 96) explicam que esse trabalho terá

como foco, por exemplo, as

[...] marcas de organização características de um gênero, nas unidades que permitem designar uma mesma realidade ao longo de um texto, nos elementos de responsabilidade enunciativa e de mobilização de enunciados, no emprego de tempos verbais, na maneira como são utilizados e inseridos os discursos indiretos.

Nesse sentido, o desenvolvimento de atividades de análise linguística, sobretudo a

partir dos problemas apresentados nas produções escritas do próprio aluno, pode ajudá-lo a

compreender como elas devem ser estruturadas. Porém, existem outras particularidades no

ensino de alguns conteúdos de Língua Portuguesa que objetivam aprofundar aspectos da

gramática ou da sintaxe, por exemplo, que estão subjacentes à construção de um texto,

conforme lembram Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), mas não estão diretamente

articuladas às atividades de uma SD.

Preocupados com essa cisão, os autores levantam a dúvida sobre como alguns

conteúdos, que também precisam ser trabalhados em outros níveis de estruturação da língua,

poderiam ser articulados às SD. Nesse sentido eles (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY,

2010, p. 97) explicitam:

Alguns elos parecem bastante evidentes. Assim, a recorrência de formas verbais ligadas a um gênero de texto (por exemplo, o presente, nos textos que visam à

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107

transmissão de saberes, ou os pretéritos perfeito e imperfeito nos textos narrativos) cria a ocasião para abordar ou retomar essas formas de um ponto de vista morfológico, de maneira paralela ao trabalho realizado na sequência.

Embora as questões relacionadas à sintaxe da frase, sobremaneira uma sintaxe mais

elaborada, não estejam diretamente relacionadas a um trabalho de encaminhamento de um

determinado gênero, os autores indicam que casos de frases incompletas nas produções dos

alunos ou falta de variedade dessas construções ou problemas de pontuação podem ser

trabalhados nos momentos de reestruturação das respectivas produções. Mas os autores

(DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 97-98) também entendem que

[...] é essencial reservar tempo para um ensino específico de gramática, no qual o objeto principal das tarefas de observação e de manipulação é o funcionamento da língua. A bagagem que os alunos terão acumulado ao longo desses momentos de reflexão específica poderá ser reinvestida, com proveito, nas tarefas de escrita e de revisão previstas nas sequências. Em contrapartida, as sequências permitirão contextualizar certos objetivos de aprendizagem e dar-lhes mais sentido.

O tratamento dos problemas ortográficos, nas produções dos alunos, aproxima-se dos

encaminhamentos dados aos problemas relacionados à sintaxe, lembrando que é importante

que o aluno tenha um bom domínio ortográfico, mas que é fundamental que o trabalho

pedagógico priorize outras dimensões da produção textual. Nesse sentido, Dolz, Noverraz e

Schneuwly (2010, p. 99) advogam que se o aluno estiver muito preocupado com a correção

ortográfica “[...] perderá de vista o sentido do trabalho que está realizando, isto é, a redação de

um texto que responde a uma tarefa de linguagem.”

Nessa perspectiva, segundo os autores (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010,

p. 99), também o professor, se estiver priorizando seu olhar para os problemas ortográficos,

[...] não se deterá nem na qualidade do texto, nem em outros erros mais fundamentais do ponto de vista da escrita: incoerência de conteúdo, organização geral deficiente, falta de coesão entre as frases, inadaptação à situação de comunicação etc.

Os problemas ortográficos mais frequentes, ocorridos durante o desenvolvimento das

SD, podem ajudar o professor a planejar os momentos específicos para um trabalho sobre a

ortografia, lembrando que não é aconselhável abordar todos os problemas detectados em um

determinado texto, mas escolher um que seja oportuno diante das respectivas dificuldades

constatadas. No entanto, para além desse entendimento, os autores defendem que, quanto

mais o aluno produzir textos, mais ele vai superando seus problemas ortográficos, pois, pela

Page 109: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

108

prática da escrita, ele aprende as grafias, o que vai ao encontro dos encaminhamentos

propostos pelas SD que exigem que o aluno os produza frequentemente.

Na mesma perspectiva, Geraldi (1997b) entende que o ensino gramatical deve partir

do texto do aluno, tendo em vista que ele somente se justifica se for para auxiliá-lo em suas

produções. Para isso, o autor cunhou o termo “análise lingüística”. E, objetivando explicitar

que a análise linguística deve ir muito além do trabalho com a ortografia e a gramática

isoladas, ele (GERALDI, 1997b, p. 74) asseverou:

Essencialmente, a prática da análise linguística não poderá limitar-se à higienização do texto do aluno em seus aspectos gramaticais e ortográficos, limitando-se a “correções”. Trata-se de trabalhar com o aluno o seu texto para que ele atinja seus objetivos junto aos leitores a que se destina. (Aspas do autor).

Assim, para o autor, é importante que a preparação das atividades de análise

linguística seja realizada por meio da leitura das produções textuais dos alunos, cujo principal

objetivo é auxiliá-los na reescrita dessas produções.

Na mesma linha de pensamento, Suassuna (2012, p. 12) entende que a análise

linguística é abrangente, no sentido de ser uma prática que dá “[...] conta de processos e

fenômenos enunciativos, e não apenas de ordem estrutural [...]”, portanto, supera o estudo

isolado da gramática. Nesse sentido, a autora (SUASSUNA, 2012, p. 13-14) destaca que

[...] a análise linguística se constitui, desde a sua concepção, como alternativa à prática tradicional de conteúdos gramaticais isolados, uma vez que se baseia em textos concretos e com ela se procura descrever as diferentes operações de construção textual, tanto num nível mais amplo (discursivo) quanto num nível menor (quando se toma como objeto de estudo, por exemplo, uma questão ortográfica ou mórfica).

No terreno limitado do que ainda predomina nas práticas escolares, Suassuna (2012,

p. 19) adverte que “[...] em geral os alunos são obrigados a dominar a metalinguagem de

análise de uma variedade da língua que ainda não dominam.” Em direção oposta, entendendo

que a nomenclatura é secundária, ela (SUASSUNA, 2012, p. 19) indica que o aluno poderia

obter maior proveito se a escola partisse

[...] do conhecimento que o aluno já tem da língua, de sua capacidade epilinguística, de sua gramática internalizada, para, em seguida, chegar à situação de explicitar o conhecimento linguístico e gramatical, descrevendo e nomeando os fenômenos; e só depois, numa etapa final, concentrar os esforços no domínio da variedade padrão e de seus mecanismos, regras e esferas de circulação.

Page 110: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

109

Nessa perspectiva, em relação à questão de a escola ensinar ou não a gramática, a

autora (SUASSUNA, 2012, p. 20) afirma que

[...] devemos, sim, ensinar gramática na escola, desde que procedamos [...] a uma revisão do conceito de gramática. Não se trata de normas de bem falar e escrever, de regras absolutas de um sistema imutável, mas de uma lógica que toda língua histórica segue, de um conjunto de fenômenos produtivos da linguagem, os quais são passíveis de descrição, reflexão e uso por parte dos usuários. (Destaques da autora).

No tocante à metodologia para as aulas de Língua Portuguesa, Suassuna (2012)

entende que elas devem ter o texto como eixo norteador, visando formar alunos leitores e

produtores de textos. Contudo, a autora (SUASSUNA, 2012, p. 21) recomenda que

[...] isso não será conseguido apenas com as práticas do ler e do escrever por si mesmas, mas com uma reflexão sistemática sobre essas práticas, reflexão que seja capaz de gerar teorias e explicações sobre o funcionamento dos textos e discursos e aplicações desses conhecimentos em situações novas. Por isso, defende-se que o ensino de língua portuguesa gire em torno de três práticas linguísticas fundamentais e articuladas: a leitura, a escrita e a análise linguística.

No âmbito dessas práticas, a nomenclatura em si é algo secundário, embora ela

caracterize mais diretamente o pensamento científico. Na articulação com as análises, ela vai,

paulatinamente, tornando-se familiar ao aluno, pois, como diz Suassuna (2012, p. 22):

“Precisamos nomear os fenômenos para que possamos nos referir a eles. Assim, não é a

aprendizagem da nomenclatura que nos faz aprender a língua; pensar sobre ela é que exige de

nós que tenhamos uma linguagem científica própria.”

A autora (SUASSUNA, 2012, p. 23) nos alerta que a leitura e a escrita devem ser

acompanhadas, constantemente, de respectivas análises linguísticas e discursivas, explicando:

[...] a análise linguística se dá tanto no momento em que lemos (porque extraímos sentidos do texto, comparamos, notamos alguma inovação, percebemos marcas ideológicas no dizer do outro etc.) quanto no momento em que escrevemos (porque temos que buscar a melhor forma de dizer o que queremos, pensar sobre a escrita das palavras, decidir por uma forma singular ou plural etc.).

Nessa seara, a autora esclarece que as produções escritas dos alunos podem ser

significativamente exploradas para a reflexão sobre a linguagem, no sentido de proceder à

análise linguística, o que vai muito além de apenas corrigi-las.

Myriam C. Cunha (2012, p. 126), por sua vez, ao mesmo tempo em que reconhece

que “[...] a SD possibilita uma real articulação entre a proposta didática e a experiência

Page 111: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

110

interacional dos aprendentes quando se inscreve em um projeto comunicativo [...]” (grifo da

autora), aponta para a possibilidade de resultados pouco produtivos quando decorrentes de

encaminhamentos, no plano didático, que limitam ou interferem no que se espera quando do

desenvolvimento de uma SD. Ela (CUNHA, M. C., 2012, p. 134) alerta, por exemplo, para a

necessidade de haver articulação entre as dimensões de interação e as de aprendizagem

organizadas em forma de projeto, ainda que fictícios, caso contrário, “[...] por mais bem

organizada que seja uma SD, é provável que os aprendentes a vivenciem simplesmente como

mais uma proposta de sala de aula sem relação com as atividades do cotidiano e não assumam

como seus os objetivos de aprendizagem ali visados.”

A autora aborda, também, o caso de um projeto de comunicação ser desenvolvido

meramente como um pretexto para o desenvolvimento de um projeto de ensino/aprendizagem,

cujo texto a ser produzido contextualizaria vagamente as atividades de ensino, situação que

não privilegia a dimensão discursiva, haja vista que ela é vivenciada na interação. Nessa

perspectiva, para Myriam C. Cunha (2012, p. 134) “[...] o projeto de comunicação fica

relegado a um horizonte mais distante que pouco influencia na elaboração textual e, por

conseguinte, pouco favorece o desenvolvimento das competências discursivas.” Para a autora,

uma SD, mais que explorar determinado gênero ou de restringir-se à aquisição ou

manipulação de conceitos, deve cumprir uma função social, portanto, os objetivos de ensino

devem visar uma aprendizagem a serviço da interação.

Myriam C. Cunha (2012, p. 142) também alerta que a produção final, última fase da

SD, quando não é procedente de várias reescritas, como ocorreu em muitos casos que ela

acompanhou, “[...] continua a desempenhar a mesma função da redação escolar, como

momento de aplicação dos conhecimentos adquiridos e não como produto construído ao cabo

de um processo não linear de elaboração, avaliação e regulação.” Portanto, qualquer proposta

didático-pedagógica, como a SD, por si só, não é suficiente para transformar as práticas de

ensino/aprendizagem de uma língua, observa a autora (CUNHA, M. C., 2012, p. 145), pois

“[...] uma nova estrutura de intervenção pode muito bem abrigar concepções equivocadas

sobre a constituição dos objetos didáticos e sobre o papel dos sujeitos do ensino e da

aprendizagem.” Assim, corroboro com a autora no sentido de entender que, muitas vezes,

ainda existe uma distância entre o que preconizam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010) sobre

SD e a forma como ela vem sendo encaminhada por muitos professores.

As reflexões recém-levantadas estão subjacentes às análises tecidas no último

capítulo que segue, o qual enfatiza as produções textuais dos alunos e os respectivos

encaminhamentos metodológicos.

Page 112: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

111

CAPÍTULO 4 – O COTIDIANO DA SALA DE APOIO, ANÁLISE DAS PRODUÇÕES

ESCRITAS E INTERVENÇÃO

4.1 REFLEXÕES A PARTIR DA OBSERVAÇÃO/PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DA

SALA DE APOIO

Este capítulo está constituído de duas partes, sendo que, na primeira, tomo por

referência o cotidiano da Sala de Apoio de quinta série investigada e as respectivas produções

do período em que observei/participei das aulas. Na segunda parte, o alvo das análises é o

trabalho que desenvolvi durante a intervenção nessa sala. Cada uma delas está subdividida em

três unidades.

No presente tópico apresento, inicialmente, um olhar para a primeira parte da

pesquisa de campo, contemplando o cotidiano da Sala de Apoio observada, bem como a

relação desses alunos com a produção escrita e faço uma análise de algumas dessas produções

realizadas na fase em que observei/participei das aulas, com ênfase nos aspectos estruturais

dos textos, conforme o segundo item da tabela diagnóstica que constitui o anexo D desta tese.

Esclareço que o foco dessas análises não prioriza os aspectos interacionais, por considerar que

eles foram pouco contemplados em tais aulas.

Em síntese, trago reflexões que vão ao encontro de possíveis respostas para as três

primeiras perguntas que procurei responder com esta pesquisa: De que modo e com quais

características os alunos de uma Sala de Apoio de quinta série fazem suas produções

textuais? Elas atendem a que propósitos? Em que condições de produção e de recepção os

alunos produzem seus textos? Sob que perspectiva(s) teórico-metodológica(s) a professora

dessa Sala de Apoio orienta e desenvolve as produções textuais dos alunos?

4.1.1 O dia a dia da Sala de Apoio observada

No começo de maio de 2011, ao iniciar minha observação/participação na Sala de

Apoio já mencionada, as aulas, para essa turma, haviam se iniciado há apenas um mês, tendo

em vista que a sua constituição demandou certo tempo.

Desde meu primeiro contato com a turma, confirmei o que a respectiva professora de

Língua Portuguesa já havia falado em relação à dificuldade de desenvolver seu trabalho

Page 113: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

112

pedagógico, sobretudo, como consequência de problemas de indisciplina. Aliás, esse foi um

dos temas bastante presentes também na sala dos professores durante muitos recreios das

manhãs em que permaneci nessa instituição de ensino para realizar minha

observação/participação, conforme já abordei no primeiro capítulo. Esse problema é retomado

agora porque entendo que, efetivamente, ele prejudicou a concentração e a dedicação dos

alunos às aulas e, como decorrência, a sua aprendizagem, sobretudo no tocante à produção de

textos. Inclusive alguns professores da escola sugeriram que pesquisadores da Universidade

Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste -, na qual trabalho, dediquem-se a investigar esse

problema e, se possível, que contribuam com encaminhamentos na direção de amenizá-lo.

Destaco que uma das ponderações da professora da turma, desde esses contatos

iniciais, foi a de que “parece” que os alunos são encaminhados para a Sala de Apoio mais por

problemas de indisciplina do que de aprendizagem, cuja afirmação nos fez relacionar essas

duas situações, no sentido de reconhecer que sérios problemas indisciplinares podem

prejudicar a aprendizagem, assim como alguns encaminhamentos utilizados durante as aulas

podem causar indisciplina.

No campo das circunstâncias que interferem na relação ensino-aprendizagem,

também foi significativo o fato de quatro dos quatorze alunos que frequentavam a Sala de

Apoio terem sido indicados, por vários professores do turno regular de aula e, inclusive, pelos

coordenadores pedagógicos (professores pedagogos), para uma avaliação, a fim de verificar se

deveriam ser encaminhados para a Sala de Recurso que funcionava na mesma escola, a qual

objetiva atender a alunos com alguma necessidade especial. Todavia, o ano letivo de 2011

acabou sem que essa avaliação fosse realizada. Nessas salas, as atividades são direcionadas

aos alunos considerando tais necessidades, as quais, segundo entendimento da professora da

Sala de Apoio, poderiam, talvez, ter atraído mais a atenção deles, gerado maior participação

nas aulas e, consequentemente, poderia ter havido menos momentos de indisciplina na turma

investigada.

Assim, nas aulas da Sala de Apoio que acompanhei/participei, predominaram

momentos agitados e pouco controlados. Nelas, a maior parte dos alunos apresentava pouca

concentração para realizar as atividades pedagógicas propostas pela professora, além de

manifestar um ínfimo interesse para desenvolvê-las, sobremaneira quando se tratava de

produção textual.

Essa situação, de certa forma, era somada a outra, que levava a crer que muitos

alunos nem tentavam resolver tais atividades porque não entendiam o que deveria ser feito,

principalmente por apresentarem muita dificuldade na leitura e compreensão do que liam e/ou

Page 114: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

113

do que deveriam produzir, bem como na escrita. Contemplando parte desses aspectos e

apresentando outros que também revelam a situação dos alunos em relação ao precário

domínio da leitura e da escrita, a professora respondeu, por escrito, à décima primeira questão

do questionário que apliquei a ela, em maio de 2011. Vejamos a pergunta e a respectiva

resposta:

11. Quais são as maiores dificuldades que eles apresentam em relação ao domínio dos conteúdos de Língua Portuguesa? Resposta: Eles apresentam bastante dificuldade na leitura e principalmente na escrita, além de muitas vezes, se recusar a escrever. Trocam bastante as palavras, esquecem pontos, vírgulas, parágrafos... Escrevem muitas vezes de forma ilegível, que nem mesmo eles conseguem entender.

Na verdade, alguns liam praticamente soletrando as palavras, mas outros até o faziam

com uma relativa fluência que, a princípio, passava a impressão de que tal leitura possibilitava

o respectivo entendimento; porém, ao término da leitura, quando questionados sobre o enredo,

alguns praticamente não tinham ideia do que o texto tratava. Portanto, esses até conseguiam

fazer a decifração dos códigos da escrita, mas, praticamente, sem compreensão. Eram os que

produziam os textos mais incoerentes e, geralmente, sem coesão.

Como agravante, os alunos observados eram muito impacientes quanto à realização

da leitura dos textos. Poucos aceitavam o desafio de fazer uma primeira leitura deles de forma

silenciosa, aliás, esse procedimento dificilmente era solicitado pela professora. Por esse

motivo, e também por apresentarem muita dificuldade na leitura, para facilitar o primeiro

contato com os textos e a respectiva compreensão, era a docente quem, geralmente, os lia pela

primeira vez, em voz alta, com boa entonação e expressividade. Enquanto ela lia, os alunos

eram orientados a acompanhá-la; contudo, poucos o faziam e, praticamente, não eram

cobrados para isso. Após, seguindo a ordem das filas das carteiras, os alunos iniciavam outra

leitura, sendo que, na maior parte das vezes, cada um lia um parágrafo ou até o primeiro ponto

final que aparecesse, o que dificultava a compreensão do texto como um todo, sobretudo

porque a maior parte dos alunos também não acompanhava a leitura dos colegas.

Como havia disputa, entre eles, sobre a fileira que deveria iniciar a leitura, às vezes,

os que não eram contemplados com o prêmio de serem os primeiros recusavam-se a participar

da atividade. Mesmo sem motivo, seguidamente, essa recusa ocorria em outros momentos e

isso já era praticamente visto como uma atitude comum, tanto por parte da professora quanto

dos discentes.

Page 115: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

114

Nessas circunstâncias, a desconcentração era quase generalizada. Enquanto

aguardavam a leitura dos colegas, mesmo sem acompanhar, alguns até se concentravam para

ouvi-los, mas a maioria perturbava com conversas paralelas ou com momentos de agitação

maior, como exposição de algo diferente que alguém levava para a sala ou com implicâncias

com os colegas por qualquer motivo. Eles achavam muito chato terem de ouvir a leitura do

mesmo texto mais de uma vez, inclusive consideravam desnecessário. Consequentemente, no

momento da respectiva compreensão, apresentavam dificuldades, principalmente para

extrapolá-lo e, finalmente, chegar a uma correspondente produção textual, como geralmente

era feito, haja vista que, muitas vezes, os textos lidos eram tomados, sobretudo, como

pretextos para as produções dos alunos. Essa situação de pouco envolvimento com a aula

reforçava os momentos de pouca concentração e, paralelamente, de indisciplina. Entendo que,

em grande parte, essas reações dos alunos ocorriam porque faziam uma leitura decodificação

dos textos, o que não lhes possibilitava compreendê-los, logo, essa atividade não passava a ser

interessante a eles e, por consequência, era um dos motivos do pouco envolvimento nas aulas

e de geração de indisciplina.

Nas atividades escritas de compreensão de textos, a situação piorava, pois, mesmo

que a professora tivesse explorado, oralmente, suas principais noções, e até mesmo as

próprias questões que deveriam ser respondidas, chegava o momento de os alunos precisarem

ler e entender, individualmente, cada enunciado registrado. Nessas situações, principalmente

quando as respostas eram menos óbvias, era comum ouvir, da parte deles, observações ou

questionamentos, como: “O que devo fazer?”; “Eu não sei fazer”; “Eu não estou entendendo

nada”; “Me mostre, no texto, onde está a resposta”; “Me mostre de onde até onde devo

copiar”22 etc. Enfim, tais observações eram coerentes com o ínfimo envolvimento dos alunos

nas aulas. Nesse horizonte, dificilmente eles se dispunham a procurar, sozinhos, algumas

respostas nos textos em estudo, inclusive era frequente o pedido de ajuda para localizá-las.

Quando as respostas eram um pouco extensas, muitos se recusavam a escrevê-las. Destarte,

segundo a professora da turma, também parecia haver muita “preguiça” para a escrita.

Entendo, porém, que isso refletia o conjunto das situações que pouco propiciava momentos de

concentração e dedicação, entre elas, o distanciamento da escrita produzida na escola de

efetivas situações de uso, o que acenava para a necessidade de redimensionar essa prática

22 Exemplos de observações feitas pelos alunos da Sala de Apoio durante as aulas no primeiro semestre de 2011.

Page 116: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

115

pedagógica junto à professora. Tais constatações foram o ponto de partida para o

planejamento da intervenção que realizei no segundo semestre de 2011.

Nessa rotina de comportamentos e atitudes, tornava-se difícil para a professora

ajudar os alunos para que fossem mais bem sucedidos em seus acentuados problemas de

leitura e escrita, até mesmo porque, praticamente, todos precisavam de seu atendimento

individual, em especial para auxiliá-los em suas dificuldades na escrita, bem como para

apontar-lhes as modificações que deviam ser feitas em suas produções após as correções

indicadas por ela. Assim, dificilmente a docente conseguia explorar os frequentes problemas

de estrutura textual, de falta de contextualização, de coesão ou de coerência em tais

produções. Na verdade, ela corrigia, sobremaneira, as inadequações de escrita mais visíveis,

mormente as relacionadas à ortografia, à pontuação, às ideias incompletas e à concordância.

Inclusive, na entrevista semiestruturada realizada em dezembro de 2011, ao comentar sobre as

inadequações que os alunos apresentavam em seus textos, a docente observou que antes de se

preocupar em verificar se os parágrafos que os alunos produziam estavam articulados “[...]

primeiro preciso ter os parágrafos, os alunos precisam conseguir produzi-los.”

Por outro lado, analisando os encaminhamentos das atividades que eram realizadas,

tudo parecia acontecer muito rapidamente, com pouca utilização da oralidade, tanto por parte

da professora quanto dos alunos. Desse modo, os textos eram pouco explorados antes de eles

serem interpretados por escrito ou de serem utilizados para uma nova produção. Nesses

momentos, eu procurava colaborar, alongando mais os questionamentos, provocando outros,

ou apresentando outras situações afins. Todavia, ao refletir com a respectiva professora sobre

esse procedimento, ela analisava que, em função da indisciplina, era difícil realizar aulas mais

dialogadas, mais participativas, apesar de ela reconhecer a importância desse

encaminhamento, conforme aferido na entrevista. Assim, ela acabava, muitas vezes, partindo

logo para a realização das atividades escritas, a exemplo da compreensão e produção de textos

ou da exercitação da leitura.

Esse encaminhamento demonstra que a professora acreditava que se os alunos

estivessem ocupados realizando atividades escritas, conseguiria maior disciplina. No entanto,

essa rotina acabava gerando desinteresse e, consequentemente, momentos de agitação.

Portanto, essas atividades realizadas pouco contribuíam para que o aluno compreendesse

melhor os textos, bem como que eles fossem amplamente explorados, o que pode ter

contribuído para o seu desinteresse e distração e, por consequência, gerado indisciplina.

Destarte, às vezes, uma tentativa de solução de alguns problemas acabava causando outros,

como se não tivesse saída, o que gerava uma sensação de impotência por parte da professora

Page 117: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

116

que, em última instância, não media esforços para dar boas aulas a fim de que seus alunos

passassem a ler e a escrever com menos dificuldades. Porém, ela não percebia que boa parte

dos encaminhamentos de suas aulas não correspondia à concepção sociointeracionista23 de

linguagem, da qual, segundo o questionário que respondeu por escrito em maio de 2011,

considerava-se adepta, como é possível constatar na sua resposta à trigésima questão desse

instrumento de geração de dados, registrada a seguir, lembrando que essa concepção também

ajudava a fundamentar a proposta curricular de Língua Portuguesa constante no Projeto

Político Pedagógico (PARANÁ, 2010b) de sua escola. Essa situação apontava para a

necessidade de maiores análises sobre essa concepção, incluindo os encaminhamentos

metodológicos que lhe corresponde, o que, aliás, foi um de meus compromissos junto a ela,

principalmente na fase da intervenção.

Questão 30: Escreva, em poucas palavras, qual a “Concepção de Linguagem” que embasa o seu trabalho com a língua. (Use o verso da folha, se for necessário). Resposta: A Concepção Sociointeracionista porque a linguagem é entendida como uma produção social realizada por sujeitos sociais, por esta razão ela nunca está pronta e acabada.

Na direção de não medir esforços, no final de algumas aulas, a professora até

distribuía balas ou pirulitos aos alunos, principalmente como forma de cativá-los para que

comparecessem às próximas, cuja atitude é muito questionável, principalmente porque

transmitia a ideia de que os discentes deveriam comparecer às aulas da Sala de Apoio por esse

motivo e não como uma nova oportunidade de aprimorar sua leitura e escrita, ao mesmo

tempo em que também ficava subentendido, na perspectiva behaviorista da aprendizagem, de

que os doces que recebiam eram um prêmio, um reforço pelo comparecimento às aulas.

Vale destacar que os discentes preferiam atividades como caça-palavras ou palavras

cruzadas, de preferência que fossem ilustradas com os respectivos desenhos para colori-los e

que não contivessem muita orientação escrita. No entanto, mesmo parecendo gostar do

desafio de encontrar palavras, eles queriam que os ajudássemos a ler e a compreender cada

orientação, cada dica e, se não bastasse, que os ajudássemos a chegar até às respectivas

respostas. Assim, percebi que, mesmo em suas atividades preferidas, na maioria das vezes,

havia muita impaciência para desenvolvê-las; queriam ver logo tudo pronto, independente se

eram eles os autores das respostas ou não.

Quando recebiam tais atividades fotocopiadas, normalmente após terem feito as

principais, viam-nas como um prêmio e quem ainda não havia terminado as primeiras tarefas

23 Ressalto que o termo sociointeracionista foi utilizado pela professora.

Page 118: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

117

ficava incomodado, alguns até desistindo de concluí-las. Poucos faziam o contrário:

apressavam-se para terminar logo o que estavam fazendo para poder recebê-las.

Destaco que, muitas vezes, para os alunos que apresentavam mais dificuldades na

escrita, para ajudá-los a registrar alguns vocábulos, respostas ou pequenos textos,

praticamente eu e a professora da turma éramos convidadas, por eles, a indicar-lhes as letras

que compunham os respectivos vocábulos, momento em que retomávamos alguns aspectos do

processo de alfabetização.

Quando eles escreviam alguma palavra de forma incompleta e/ou com letras

trocadas, se só informássemos, superficialmente, que havia alguma ausência ou troca de letras

na composição delas, eles tinham muita dificuldade para perceber o que deveria ser corrigido,

a exemplo do aluno “M”, quando quis escrever a palavra “tinha” e escreveu “tiha”. Ao tentar

corrigi-la, no lugar do “h” ele escreveu outro “a”, ficando “tiaa”.

Nesse horizonte, era comum a troca do “r” pelo “s”, como, por exemplo, na palavra

“jardim”, assim como era frequente as trocas do “m” pelo “n”, do “t” pelo “d”, do “b” pelo

“p” etc., além dos casos em que um som pode ser representado por várias letras, como o “s” e

o “z”, o “s” e o “c”, o “x” e o “ch” etc. Também havia o caso de esquecerem o traçado de

algumas letras, o que exigia que as escrevêssemos ao lado para que pudessem copiá-las.

Ainda no campo dos desvios do padrão da escrita que considero menos graves para o

aprendizado da escrita em situações de uso, a maioria dos alunos, por exemplo, não iniciava

as respostas das perguntas referentes à compreensão de textos com letra maiúscula e não

colocava o ponto no fim das frases. As poucas vezes em que eram orientados quanto a tais

encaminhamentos, muitos diziam que isso não fazia nenhuma diferença. O mais preocupante

eram as inúmeras incidências relacionadas à coerência, à progressão textual, à ausência ou à

troca de articuladores em suas produções textuais, o que impedia que, de certa forma, até seus

autores conseguissem ler e/ou entender o que escreviam, atingindo, consequentemente, a

qualidade sociodiscursiva dos textos, embora os produzissem sem o objetivo de estabelecer

interlocução com outras pessoas além da própria professora.

Em meio à agitação, com vários alunos aguardando para serem atendidos pela

docente, geralmente, ao invés de eles serem orientados para identificar as inadequações

relacionadas à escrita em seus próprios textos, era ela quem o fazia, não possibilitando que

eles pudessem lançar uma apreciação no que escreviam, percebendo, de forma autônoma, o

que poderiam melhorar. Destaco, inclusive, que também a correção das produções textuais era

feita por ela, com os respectivos alunos ao seu lado a fim de poder fazer observações

paralelas, explicando as alterações que realizava, embora pouco conseguia se fazer ouvir por

Page 119: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

118

eles. Assim, os discentes pouco tinham a oportunidade de refletir sobre suas produções, sobre

como elas poderiam ser aprimoradas, afinal, a professora fazia essa tarefa por eles, na direção

do que Ruiz (2013) denomina de correção resolutiva. É preciso, pois, que tanto a docente

quanto os alunos compreendam que as inadequações da escrita são importantes etapas da

aprendizagem, entendendo que aquilo que muitas vezes é tachado de erro não passa de um

processo normal de avanço na aprendizagem.

Quando não dava tempo para a docente fazer todas as correções em sala de aula junto

aos alunos, o fazia sozinha, em horários diferentes das aulas, situação que dificultava ainda

mais o entendimento dos discentes sobre o que deveriam fazer posteriormente, haja vista que

os textos retornavam com muitas e diversificadas correções realizadas por ela. Após receber

os textos de volta, eles os passavam a limpo e, diferente das orientações de autores como

Costa-Hübes et al. (2007), Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), Luiz Antônio Marcuschi

(2008), entre outros, não eram encaminhados para a refacção textual. Assim, toda a reflexão

sobre a linguagem exigida em uma reestruturação de texto era substituída por um exercício de

cópia de sua produção modificada e, muitas vezes, até acrescida pela docente. Conforme esses

autores, entendo que se o aluno não passa pelo processo de reescrita, não aprende.

A professora, porém, ao falar sobre a correção das inadequações na escrita dos

alunos, em entrevista semiestruturada, limitou-se a comentar sobre o comportamento dos

discentes em relação a essas inadequações, sem refletir sobre possíveis motivos que os

levavam a pensar dessa forma:

[...] eles não querem parar e corrigir o erro, eles não têm essa dedicação. [...] parece que eles não têm aquele interesse de aprender, de melhorar. [...] eles não querem reler; tudo acham mais fácil deixar como está. [...] não gostam de ser corrigidos. [...] é cômodo para eles deixar quieto, sem corrigir. [...] alguns que têm mais paciência voltam, apagam, arrumam.

Assim, tanto a necessidade de refacção dos textos quanto o entendimento das

inadequações nas produções escritas dos alunos, foram importantes pontos de diálogo entre

mim e a professora, o que foi determinante para que, no período da intervenção, nos

aproximássemos de outros caminhos para explorar essas questões.

No conjunto das situações que entendo que também contribuíram para um ambiente

mais agitado, destaco a rotina do início das aulas. Geralmente eram gastos vinte minutos ou

mais para a entrega dos materiais escolares: caderno, lápis, borracha, sendo que a maioria dos

alunos ainda precisava apontar o lápis que, para isso, existiam raros apontadores na sala,

Page 120: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

119

normalmente providenciados pela professora ou por mim, pois a escola tinha poucos recursos

e, dificilmente, eles os levavam de casa; era algo que extraviavam constantemente.

Como a qualidade dos lápis era precária, gastavam mais tempo ainda para apontá-los.

Depois de prontos, eram raros os discentes que tomavam o cuidado para não derrubá-los ao

colocarem-nos em suas carteiras. Enquanto aguardavam essa rotina acontecer, poucos

permaneciam em seus lugares com seus materiais organizados. E, a cada ida ao lixeiro ou à

carteira de um colega, era uma oportunidade para implicâncias ou correria. Assim, nesses

momentos de espera pelo início da aula, ficavam dispersos, soltos, sem objetivo. Alguns

aproveitavam para falar comigo ou com a professora sobre o seu cotidiano que, se por um

lado era interessante, por outro, retardava o contato com a turma toda e, por consequência, o

começo das atividades planejadas para o dia. Esse cenário provocava muita agitação e dava o

tom para o andamento da aula que estava por iniciar.

Voltando à baixa qualidade dos lápis e também falando das borrachas que ganhavam

na escola, lembro que as condições de tais materiais dificultavam a realização das atividades,

pois as borrachas apagavam muito mal o que era escrito com um forte grafite. Assim, o local

apagado, na maioria das vezes, ficava borrado e, em outras, o papel ficava até desgastado.

Isso os deixava impacientes que até levava alguns a nem tentarem apagar, mas a sobreporem

uma escrita à outra, o que, por sua vez, além de prejudicar a estética de suas produções,

dificultava o respectivo entendimento, como é possível observar em algumas delas trazidas no

item 4.1.3.

Agravando essa situação inicial da aula, lembro que esse também era o momento de

disputa de carteiras, piorando quando os titulares dos melhores lugares faltavam ou quando

chegavam atrasados, afora a disputa por elas em uma nova fileira que geralmente os alunos

organizam defronte à mesa da professora, num pequeno espaço que conseguiam, ao arredarem

algumas delas. Quando a docente, por necessidade, tomava a decisão de trocar o lugar de

alguns, os que se consideravam prejudicados, demonstravam revolta com a situação, muitas

vezes passando a recusar-se a participar das atividades.

Quanto à precariedade e à falta de material dos alunos que interferia no andamento

das aulas, de um modo geral, entendo que essa situação revelava as condições

socioeconômicas de suas famílias e as próprias condições da escola. Por outro lado, a agitação

ocorrida desde o início das aulas, também explicita, de certa forma, o que ocorre na maior

parte das salas de aula, nas quais, têm-se, além do reflexo da falta de limites e de uma

orientação da própria família, vítima de uma sociedade capitalista, a falta de domínio de

classe por parte dos professores que, no conturbado ritmo das aulas, têm dificuldades para

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120

fazer cumprir as normas elementares para o seu bom funcionamento. Mas, para além disso,

nas aulas de Língua Portuguesa também se revela a concepção de linguagem subjacente a tais

aulas, com encaminhamentos que, na maior parte das vezes, pouco aproximam a escrita da

escola a situações reais de uso, o que, por decorrência, pouco desperta o interesse dos alunos,

visto que os textos que escrevem na escola parece pouco ajudá-los a entender e a produzir a

escrita necessária em seu cotidiano. Essa prática pedagógica reflete, em grande parte, a

orientação teórico-metodológica dos cursos de formação de professores. Nesse sentido,

Mendes (2008a, p. 59) observa:

[...] as políticas que têm sido implementadas para a formação de professores, advindas tanto da iniciativa pública quanto privada, caracterizam-se pela valorização do conhecimento teórico estanque, descontextualizado, que não dialoga com as práticas efetivas que os professores realizam em seus ambientes de atuação e vivência. Valoriza-se a teoria, legitimada pelas instâncias acadêmicas de pesquisa, e despreza-se a experiência do professor, aquilo que muitas vezes ele faz sem ter consciência do porque faz. Desse modo, a maior parte dos cursos de professores tem sido inócua, pois apresenta em seus princípios e objetivos a ideia de que, sabendo-se as teorias e as tendências contemporâneas para o ensino de língua portuguesa, aprende-se a ensinar.

A autora (MENDES, 2008a) entende que, decorrente desse encaminhamento, o

ensino da língua materna pouco tem preparado os discentes para produzirem textos em sua

própria língua.

Sobre a dificuldade de fazer maiores exigências aos alunos, havia a preocupação, por

parte da docente participante da pesquisa, de que se eles fossem muito cobrados no

cumprimento de suas responsabilidades, corria-se o risco de desistirem das aulas da Sala de

Apoio. Assim, entre a falta de limites e o protecionismo, os alunos cumpriam poucas normas.

Inclusive, depois de algumas semanas de observação, eu sugeri que a professora organizasse,

com a turma, os principais limites e deveres e os registrassem em um cartaz, o qual, uma vez

produzido, foi afixado na sala de aula para que fosse relembrado quando necessário. No

entanto, embora a professora retomasse essas normas de vez em quando, no início, elas foram

praticamente desconsideradas pelos alunos. Com o passar do tempo, principalmente durante a

intervenção, alguns discentes ajudavam a professora a retomá-las diante de algumas

necessidades surgidas.

Enquanto as regras para uma boa aula eram escritas, coletivamente, no quadro-de-

giz, e inclusive copiadas por muitos alunos, alguns deles reclamavam que estavam perdendo

tempo com tal atividade, afirmando que, para isso, estavam deixando de ter aula. Diante dessa

situação, aproveitei para explicar-lhes que não estávamos produzindo um texto aleatório, mas

um texto que tinha uma significativa função social, aproximando-se do teor de um contrato,

Page 122: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

121

de um acordo. Lembrei que, no cotidiano, escrevemos quando temos uma necessidade e essa

era uma delas.

Também vale trazer a informação de que os primeiros alunos a terminarem as

atividades eram encaminhados para ler um gibi, um livro de literatura infantil ou infanto-

juvenil, uma revista ou textos de alguns livros didáticos que eu e a professora da turma

conseguimos coletar para essas ocasiões. Advirto que os alunos do colégio estadual no qual

fiz a pesquisa de campo, praticamente não tinham acesso à pequena biblioteca que estava

situada no respectivo prédio, tendo em vista que ela era destinada, prioritariamente, aos

alunos da escola municipal que funcionava nas mesmas dependências.

Os poucos gibis que adquirimos eram os seus materiais preferidos para leitura, mas,

mesmo assim, alguns apenas os folheavam. Porém, lembro do quanto o aluno “B” gostava de

lê-los. Logo no início das aulas, ele dava um jeito de aproximar-se da mesa da professora para

pegar um exemplar. Assim que conseguia, o deixava entre suas pernas e a parte baixa de sua

carteira para, seguidamente, poder ler. Raramente esse aluno fazia todas as atividades

propostas, mas adorava ler essas revistinhas. Como era difícil convencê-lo a fazer a maior

parte das atividades, porque era muito impaciente e porque tinha muita dificuldade para

escrever, geralmente a professora fingia nem ver o que ele estava fazendo, entendendo que

isso também o ajudava a avançar em suas dificuldades de aprendizagem, afinal ele lia e

buscava a respectiva compreensão, cuja satisfação ficava estampada em seu semblante.

Contudo, como vários colegas começaram a querer fazer dessa prática uma rotina e

também porque a maioria dos alunos já havia lido praticamente todos os gibis, após dois

meses de sua utilização, a professora decidiu não levá-los mais para as aulas, entendendo que

os discentes deviam fazer também as atividades escritas e ler outros materiais, a exemplo da

coletânea de textos para os alunos das Salas de Apoio, elaborada pela Secretaria Estadual de

Educação do Paraná (PARANÁ, 2005b).

Logo após a retirada dos gibis, folhear revistas para procurar boas manchetes e/ou

famosos ganhou muita importância por parte dos alunos, principalmente ao término das

atividades desenvolvidas em sala de aula. Todavia, alguns se recusavam a escrever e queriam

folhear revistas o tempo todo. Inclusive em uma atividade em que eles deveriam selecionar

uma reportagem para, após, expô-la aos colegas e, finalmente, registrar sua respectiva síntese,

muitos gastaram mais da metade do tempo das aulas daquele dia e não se decidiam sobre o

que iriam ler. Eles liam muitos títulos, mas pareciam não ter paciência para ler os textos

correspondentes. Diziam que a letra era pequena, que os textos eram extensos demais, que só

tinha notícia chata.

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122

Nesse dia, eu e a professora precisamos ajudar os alunos a fazer tal escolha para que

lessem, no mínimo, uma parte de uma reportagem. Essa aula terminou sem que tivesse dado

tempo para eles socializarem o que leram. Assim, na aula seguinte, foi feita a retomada dessa

atividade, dando origem, inclusive, a um pequeno texto em que cada aluno sintetizou sua

reportagem.

A fim de oportunizar maior contato dos discentes com material escrito, providenciei

alguns exemplares de revistas e livros didáticos também para eles levarem para suas casas,

mas, em conversas informais com eles, eu e a professora percebemos que, raramente, esses

materiais eram utilizados. Inclusive, a aluna “A” tinha orgulho de carregá-los todas as vezes

em que ia para as aulas da Sala de Apoio, entretanto, constatamos que, praticamente, ela não

os lia.

Na verdade, no que tange à produção de qualquer atividade na sala de aula era

preciso lançar mão de muita insistência e de muito convencimento, dando a impressão de que,

caso o fizessem, estariam fazendo um favor à professora.

Também é pertinente trazer o problema da falta de atenção ao fazerem qualquer

cópia, desde uma simples frase, por exemplo, e, ao mesmo tempo, da falta de domínio da

escrita, como é possível perceber na cópia incompleta da letra de uma música feita pelo aluno

“D”, registrada na sequência:

Figura 1- Texto aluno D

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

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123

Destaco, também, que, além dos desvios do padrão relacionados à ortografia, aos

recursos coesivos, à progressão ou à coerência nos textos que os alunos produziam, a

caligrafia de muitos deles dificultava a compreensão do que escreviam, conforme questão

copiada e respondida pelo aluno “N”, registrada a seguir, cuja resposta apresenta, inclusive,

falta de coesão para que seja possível entender a respectiva mensagem. No entanto, além de

essa inadequação, que compromete a textualidade, não ter sido explorada junto a esse aluno,

ele recebeu o conceito “Bom” e o adesivo “Gostei”.

Figura 2 – Texto aluno N

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Transcrição dessa pergunta e da respectiva resposta:

6) “Por que o hospital se emocionou com o encontro entre Coiote e Orlã?”

Resposta: “Porque o cachorro foi até o hospital para ver o menino foi um encontro

muito lindo.” Anotei essa transcrição assim que o respectivo autor leu essa resposta.

Enfim, a convivência com a professora e com os alunos dessa Sala de Apoio

levaram-me a inferir que, em grande parte, a falta de limites e a pouca aceitação do aluno em

relação ao que deveria fazer em diferentes momentos das aulas, fator este que prejudicava o

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124

ensino-aprendizagem, refletia a ampla conjuntura da educação, que pouco oportuniza, ao

professor, uma formação de qualidade, no sentido de ajudá-lo a buscar, por exemplo, os

encaminhamentos metodológicos que correspondem à concepção de linguagem que defende,

que, no caso da professora dessa turma, conforme já anunciei, era a “sociointeracionista.”

Contudo, destaco, novamente, o empenho dessa docente para que seus alunos avançassem

quanto ao domínio da leitura e da produção escrita. Inclusive, em uma entrevista

semiestruturada, realizada em dezembro de 2011, ela afirmou que não considerava que os

problemas de aprendizagem, nessa disciplina, fossem decorrentes da falta de envolvimento do

professor às aulas.

Nesse sentido, de um modo geral, ela entendia que o docente se esforça para

encaminhar os conteúdos de maneira criativa, mas que é difícil desenvolver um trabalho

pedagógico diferenciado, considerando os limites socioeconômicos da comunidade como um

todo, incluindo a falta de materiais elementares, a exemplo de papel sulfite para imprimir

textos diferentes e outras atividades. Destacou, ainda, que o elevado número de alunos por

sala de aula dificulta um trabalho sério, de acompanhamento individual, portanto, esse

problema faz com que eles não tenham condições de analisar e de refletir sobre os textos que

produzem, inclusive, a professora afirmou, na referida entrevista, que: “[...] nessas condições,

o professor faz de conta que ensina e o aluno faz de conta que aprende.” A docente também

lembrou, de forma particular, dos problemas comportamentais e emocionais dos alunos da

Sala de Apoio anunciados no primeiro capítulo desse trabalho de tese, que, somados aos

demais, ela entendia que interferiam na relação ensino/aprendizagem.

Diante de tantos obstáculos, a professora falou que é preciso trabalhar as aulas de

maneira dinâmica, buscando formas de cativar o aluno, de modo a integrá-lo em sala de aula.

Todavia, ao fazer tais ponderações, demonstrando falta de articulação entre sua atuação e o

seu discurso, ela não relacionava o que sugeriu para o encaminhamento das aulas ao trabalho

com os gêneros textuais-discursivos e ao seu teor interacional, contemplados em algumas

questões da referida entrevista, bem como no questionário que respondeu, por escrito, em

maio de 2011.

Em relação a esses gêneros, ela dizia que eles fazem parte do conteúdo, que eles

estão inseridos no dia a dia do aluno. Ela ilustrou esse entendimento falando: “[...] desde uma

receita é o dia a dia deles, faz parte do cotidiano deles [...]. É na cozinha do dia a dia. Posso

pedir para eles inventarem uma receita, trazerem uma de casa.” Na mesma direção desse

entendimento de gêneros textuais-discursivos e avançando um pouco na referida

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125

compreensão, ela respondeu a três questões, por escrito, no questionário mencionado,

conforme destaques a seguir:

20. Explique, em poucas palavras, o que você entende por gêneros textuais. Resposta: São as diferentes formas de expressão textual. Podem ser gêneros textuais os convites, os cartazes, a notícia, a carta, a bula de remédio etc. 21. Você trabalha esse conteúdo com seus alunos? Como? Resposta: Sim. Realizando produções de cartazes, leitura de reportagem, um relato de sua vida, um conto, a produção de uma carta, um bilhete para o colega. Os gêneros estão presentes em nosso dia a dia e não tem como ignorá-los. 32. Qual a relevância do entendimento de gêneros textuais e sua carga interacional para o ensino de Língua Portuguesa? Resposta: Entender o gênero textual é fundamental para compreender o uso da linguagem nas práticas sociais.

No mesmo horizonte, ao ser indagada, na entrevista, pelo seguinte questionamento:

“Como você entende o caráter interacional dos gêneros textuais?”, ela respondeu: “No dia a

dia. Uma notícia que alguém vai trazer para a sala de aula pode ser compartilhada com o

restante da sala.” Em outro momento, para falar sobre o destino dado aos textos, explicitou

que é adepta a exposições, murais, telejornais, que, inclusive, já optou por algumas iniciativas

nessa direção em anos anteriores.

Porém, logo retomou as condições de trabalho na escola, bem como as dificuldades e

carências emocionais dos alunos, considerando que elas dificultam a viabilização desses

encaminhamentos, deixando subentendido que é muito difícil exercitar a escrita, na sala de

aula, em situações dialógicas.

Ela entende, também, que os textos que os professores de Língua Portuguesa levam

para serem trabalhados em sala de aula não se limitam mais às ficções de antigamente, mas

contemplam as notícias do mundo atual. Inclusive, demonstrando um conhecimento

interdisciplinar, ela compreende que outras disciplinas, tais como História e Geografia,

também estão abordando conteúdos da atualidade. Nesse sentido, destacou, ainda, a qualidade

dos textos presentes em muitos livros didáticos de Língua Portuguesa, informando, até, que

eles já trazem uma sequência de gêneros textuais para serem trabalhados.

As respostas da professora em relação aos gêneros textuais-discursivos e aos seus

aspectos interacionais apontam que ela os compreendia. Isso pode ser observado, por

exemplo, quando ela afirmou, na resposta à trigésima segunda questão, recém-exposta, que os

gêneros textuais ajudam a compreender a linguagem nas práticas sociais. Porém,

contraditoriamente, a maior parte dos encaminhamentos metodológicos que adotou em suas

aulas, na Sala de Apoio, durante o período em que eu as observava e delas participava, pouco

Page 127: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

126

contemplaram essa direção, uma vez que os alunos raramente eram levados a encaminhar a

escrita em situações de natureza discursiva, conforme alguns aspectos elencados por Beth

Marcuschi (2007, p. 66-67), quais sejam “[...] a respeito do destinatário, do espaço de

circulação e dos objetivos da produção.” A partir dessa constatação, unida à docente,

passamos a vislumbrar outras possibilidades para a prática pedagógica de Língua Portuguesa,

sobretudo com a intervenção que realizei no segundo semestre daquele ano, afinal, minha

investigação também buscou ajudá-la a compreender essas questões, na direção do terceiro

objetivo específico dessa pesquisa: Analisar e refletir sobre os pressupostos teórico-metodológicos

que norteiam o encaminhamento das produções textuais dos alunos pela professora da Sala de Apoio.

Na perspectiva de não priorizar a teoria, ou a articulação teoria/prática, no

questionário que a docente respondeu, quando solicitada para ordenar dez encaminhamentos

para os momentos de formação continuada, ela, assim, iniciou: em primeiro lugar, achava que

deveria haver a elaboração de propostas de atividades; em segundo, que deveria haver

sugestão de atividades e, só em terceiro lugar, que deveria haver a apresentação de teoria e de

encaminhamento prático. Assim, essa escolha vai ao encontro da expectativa de muitos

professores, no sentido de manifestarem maior interesse para buscar sugestões de atividades

em detrimento do aprofundamento da relação teoria/prática. O exercício dessa preferência,

muitas vezes, pode levar o professor a utilizar algum encaminhamento metodológico

aleatoriamente, sem perceber que, muitos deles, podem não ser coerentes à concepção de

linguagem que acredita defender.

4.1.2 Relação dos alunos com a produção escrita

As informações a seguir, frutos de conversas informais e/ou entrevista

semiestruturada com os alunos, explicitam como eles se sentiam ao fazer uma produção

textual. Elas foram trazidas neste trabalho porque compreendo que enriquecem o

entendimento de algumas particularidades de suas produções contidas no próximo item, bem

como porque revelam que muitas de suas atitudes em relação à escrita são decorrentes dos

encaminhamentos metodológicos utilizados nas aulas de Língua Portuguesa. Optei por trazê-

las separadamente por aluno, para traçar um perfil mais objetivo de cada um e, inclusive, para

complementar o que escrevi sobre eles no item Cenário e sujeitos da pesquisa e no apêndice

A.

Page 128: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

127

Observo que nesse e no próximo item serão contemplados apenas os alunos que

participavam da Sala de Apoio no primeiro semestre de 2011, período este em que

observei/participei das aulas dessa turma de alunos.

Aluna “A”: Em um momento afirmou que não gostava de produzir textos por ser

cansativo e pelo fato de que ela tinha preguiça; em outro, reportando-se ao que escreveu a

partir de uma aventura com sua bicicleta, afirmou ter gostado porque estava envolvida com o

assunto e sabia o que escrever sobre ele. Entendo que essa última afirmação aponta para uma

observação de ordem teórico-metodológica, evidenciando a necessidade de os alunos serem

preparados antes de realizar qualquer produção de texto, afinal, conforme Geraldi (1997c),

eles precisam ter o que dizer e um motivo para fazê-lo.

Aluno “B”: Ele disse que se cansava ao escrever, principalmente porque doía a mão,

pois precisava escrever muito e “o pior é que ainda precisa passar a limpo” (depoimento de

aluno, 15/06/2011). Mesmo assim, esse aluno admitiu que achava importante escrever porque

considerava que essa atividade desenvolve a imaginação, além do fato de que o preparava

para, mais tarde, escrever um livro ou escrever relatórios a depender de onde for trabalhar.

Lembro que esse era o discente que adorava ler gibis. Ele considerava importante que nos

momentos de produção houvesse silêncio a fim de que ele pudesse soltar sua imaginação.

Afirmou que não gostava de produzir sobre temas muito difíceis, conforme já tivera que

escrever muitas vezes.

Aluno “C”: Disse sentir-se ótimo ao escrever, que gostava de fazê-lo, inclusive sobre

qualquer assunto, assim como afirmou que gostava de responder a questões referentes à

compreensão de textos. Ele achava importante produzir textos porque entendia que isso

poderia ajudá-lo no futuro, principalmente no que diz respeito ao fato de ter um bom trabalho.

Na verdade, percebia-se um prazer, em seu semblante, após cada produção que realizava. Ele

conseguia ser um autor efetivo, só mostrando o que escrevia ou buscando tirar alguma dúvida

após a conclusão de seus textos. Reportando-se ao seu prazer de estar na escola, o aluno falou:

“Eu me sinto ótimo, é como estar brincando, correndo, andando de bicicleta, é a melhor

coisa do mundo!” (anotações de aula, 20/06/2011).

Aluno “D”: Afirmou que “até gostaria” (anotações de aula, 20/06/ 2011) de produzir

textos se não “errasse” tanto. Esse era um dos alunos que escrevia de forma inadequada até

quando copiava. Olhava para seus textos depois de corrigidos pela professora com certo

desânimo, os quais, segundo ele, lhes passavam a impressão de que sabia pouco. No entanto,

ele era muito criativo, não só na oralidade, mas também no registro de suas ideias.

Page 129: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

128

Aluna “E”: Falou que gostava de escrever textos, desde que fosse sobre algo que ela

soubesse, o que me faz retomar a preocupação quanto à necessidade de haver uma intensa

exploração dos temas a partir dos quais os alunos devem fazer suas produções escritas. Essa

aluna também disse que achava importante saber escrever porque no futuro será necessário.

Aluna “F”: Ao explicitar como se sentia ao fazer uma produção escrita, respondeu:

“depende”. Quando investiguei essa condição, ela disse que dependia do dia, do tema/assunto

e do motivo para a realização de tal escrita. Assim, ela informou que pode ou não gostar de

escrever, que pode ou não sentir-se capaz de fazê-lo. Conforme explicação registrada no

próximo item, foi ela quem se recusou a escrever sobre algo imaginário no dia em que a

professora explorou a poesia no Reino do Aqui-Pode, dizendo que ela não era criança. Na

verdade, ela não via a necessidade de escrever sobre tal tema. Ela deixava transparecer que,

de certa forma, estava sendo convidada a fazer uma produção escrita sem uma função social.

Essa aluna também informou que não gostava da disciplina de Língua Portuguesa, mas que

gostava muito da professora dessa disciplina da Sala de Apoio, o que contribuía para que

participasse um pouco dessas aulas. Aliás, cabe destacar que essa professora era muito

querida pela grande maioria dos alunos. Na verdade, na perspectiva de Freire (1996), ela

valorizava muito a afetividade em sua relação com os discentes e respeitava as diferenças

individuais. Aliás, para o autor (1996, p. 89), “[...] a afetividade não se acha excluída da

cognoscibilidade.” No entanto, ele (1996, p. 89) pondera: “O que não posso obviamente

permitir é que minha afetividade interfira no cumprimento ético de meu dever de professor no

exercício de minha autoridade.” Nesse sentido, o autor ressalta a importância da formação

científica e da clareza política dos professores.

Aluno “G”: Achava cansativo ler ou escrever textos longos, “com muitas palavras”.

(anotações de aula, 20/06/2011). Afirmou ter preguiça para escrever sobre algo que não sabe.

Portanto, ele também deixou subentendido que é preciso explorar bastante os temas alvos de

produção, na direção do que Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010) orientam para o

desenvolvimento das sequências didáticas. Embora esse aluno tivesse começado a frequentar

a Sala de Apoio havia pouco tempo, disse que valorizava muito o atendimento individual

prestado a ele, entendendo que isso agilizava sua produção. No entanto, se por um lado se

sentia mais seguro para escrever tendo alguém para lhe ajudar, por outro, corria-se o risco de

não deixar suas ideias fluírem com espontaneidade, sobretudo porque ele pedia ajuda

constantemente.

Aluno “H”: Considerava importante escrever textos para aprender, mas lamentava

que fosse muito demorado. Dizia que gostava mais das balas ou pirulitos que recebia no final

Page 130: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

129

da aula. Assim, ficava claro que, para ele, a gratificação, por meio do recebimento de doces

era muito importante, aliás, esse aluno levava muitas guloseimas para a sala de aula e,

seguidamente, ficava comendo, inclusive oferecendo-as aos colegas, o que tumultuava o

ambiente. Lembro que esse era um dos alunos que dificilmente se concentrava e que não

aceitava fazer todas as tarefas propostas. Nesse período, ele ainda não tomava medicamentos

controlados.

Aluna “J”: Dizia sentir-se bem ao produzir porque sabia que era uma forma de

aprender mais, inclusive afirmou gostar de escrever sobre qualquer assunto. Antes de pedir

ajuda, ela tentava registrar o que entendia sobre o tema proposto, deixando, inicialmente, a

sua produção por conta de seu conhecimento e de sua imaginação.

Aluno “M”: Disse não gostar de escrever, principalmente porque demorava muito e a

“preguiça não deixa.” (anotações de aula, 20/06/2011). Contudo, também afirmou que é

importante escrever para aprender mais e poder passar de ano.

Aluno “N”: Inicialmente, informou que se sentia péssimo ao escrever, apresentando a

seguinte justificativa: “Porque não sei produzir nada.” (anotações de aula, 15/06/2011).

Todavia, após refletir um pouco, afirmou gostar de escrever sobre sua vida. Achava

importante produzir textos nas aulas para passar de ano, para melhorar a letra e completou:

“Vai que eu trabalhe numa empresa que precisa escrever e eu não sei.” (anotações de aula,

15/06/2011).

É importante destacar que nenhum aluno relacionou a produção escrita com a

necessidade de utilizá-la, constantemente, em nosso cotidiano, o que reflete que a escola não

está priorizando essa compreensão, na direção do que Geraldi (1997a) defende em relação à

concepção interacionista de linguagem. Os que mais se aproximaram dessa ideia foram os que

falaram que poderão precisar utilizá-la no futuro, em seus trabalhos.

O fato de vários alunos afirmarem que até gostariam de escrever, desde que fosse

sobre algo que dominavam, revela, de certa forma, que também foram e/ou estavam sendo

vítimas dos encaminhamentos dados para a produção das tradicionais redações, quando

simplesmente era anunciado que deveriam produzi-las e os respectivos temas. Assim, o

resultado dessa atividade dependia apenas da sua imaginação e do seu conhecimento sobre

tais temas, o que os fazia com que se sentissem incompetentes para escrever e, por

consequência, passavam a não gostar de fazê-lo. Tal procedimento os levava a produzir

lentamente e com muita dificuldade alguns textos artificiais, sem função de uso, na direção

das concepções tradicionais da linguagem, explanadas no início do segundo capítulo desse

trabalho de tese. Em outra direção, Geraldi (1997c) entende que, para o aluno realizar uma

Page 131: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

130

produção escrita, ele precisa ter algo que precisa ser dito a alguém, ou seja, ele precisa ter um

objetivo para realizar essa ação que exige um interlocutor.

4.1.3 Um primeiro olhar para as produções escritas dos alunos/encaminhamentos

metodológicos

Apresento, nesta seção, alguns textos elaborados pelos alunos durante o período em

que observei/participei das aulas, sobre os quais teço algumas análises, principalmente sobre

alguns aspectos relacionados à estrutura textual, como coerência, coesão, pontuação e

paragrafação que constituem o segundo item da tabela diagnóstica constante no anexo D.

Após a minha chegada para realizar a observação/participação nessa sala, a

professora trabalhou, de forma breve, alguns gêneros textuais-discursivos como forma de

exercitar a leitura, muitas vezes também para fazer a respectiva “interpretação” por escrito;

outras para explorar questões ortográficas ou para servir de pretexto para uma produção

escrita.

Assim, como a maior parte das produções realizadas pelos alunos no período em que

observei/participei das aulas não eram do mesmo gênero textual-discursivo do texto que havia

sido estudado para introduzi-las, a ênfase não era dada às respectivas características e aos seus

aspectos interacionais. Inclusive o motivo para a realização da maior parte das produções

textuais iam, prioritariamente, na direção de meramente exercitar a escrita, pouco

aproximando-se da possibilidade de promoverem interações. A fim de exemplificar simples

situações de exercitação da escrita, Costa-Hübes (2012, p. 10) cita alguns encaminhamentos:

[...] introduzir ou concluir um texto, a partir de um fragmento dado; recontar uma história narrada oralmente ou lida pelo professor, avaliando-se, assim, sua capacidade de memorização e/ou reprodução dos fatos narrados; escrever um texto a partir de uma sequência de figuras, verificando a capacidade de o aluno ordenar sequencialmente as ideias, marcar os parágrafos, apresentar a ordem cronológica dos fatos; reproduzir diálogos, para avaliar o discurso direto [...].

Essas atividades, conforme a autora, limitam-se em si mesmas, pois o aluno, após

fazer o que é solicitado, entrega sua produção ao professor para ser corrigida, cuja ação

finaliza o exercício da escrita. Assim, esses encaminhamentos não oportunizam a vivência de

práticas cotidianas de uso da escrita. Nesse aspecto Beth Marcuschi (2007, p. 65-66) explica:

[...] o texto tem como leitor privilegiado o professor, circula apenas no espaço escolar; tem por objetivo demonstrar ao leitor (o professor), que seu autor (o aluno)

Page 132: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

131

realizou a aprendizagem requerida (na maioria das vezes, o domínio das normas gramaticais, das regras de pontuação e de acentuação, e da capacidade de agrupar, com alguma coerência, um conjunto de frases) e, portanto, merece ser bem avaliado. Esse formato das tarefas leva o aluno a elaborar um ‘texto escolarizado’, ou seja, uma redação que se configura pela precariedade de suas condições interativas e dialógicas, pois a escrita é feita da e para a própria escola. (Destaques da autora).

Para ilustrar, inicio explicitando o trabalho que a professora da Sala de Apoio

realizou com os alunos a partir da poesia O reino do Aqui-Pode, de autoria de Alexandre

Azevedo, a qual, uma vez entregue a eles de forma digitalizada, foi lida pelos discentes, sendo

uma estrofe por cada um. Após essa leitura, eles não consideraram necessário que a

professora também a lesse em voz alta. Assim, ela fez uma breve retomada do conteúdo da

referida poesia, mas não explorou as características desse gênero textual.

Logo em seguida ela passou, no quadro-de-giz, as seguintes orientações para que, a

partir delas, os alunos produzissem um texto, porém, sem falar sobre a finalidade dessa

produção e sem apresentar possíveis interlocutores:

Imagine que você foi convidado para passar um dia no reino do “Aqui-Pode”, um lugar incrível onde tudo-pode. Conte, em seu caderno, como foi este passeio. Se quiser pode seguir o seguinte roteiro:

- O que você sentiu no momento que chegou ao reino? - Como era o reino? - O que você fez durante o dia? - O que comeu? - De que brincou? - Não esqueça do título.

Assim que a aluna “E” terminou de copiar tal roteiro, disse não ter entendido nada.

Em seguida outros alunos reforçaram essa observação. Eles pareciam recusar-se a fazer a

leitura das questões que orientavam tal produção e reler a poesia. Demoraram muito para

começar a escrever, principalmente porque diziam não ter ideia do que poderia ser afirmado.

Entendo que tais atitudes refletem a ínfima exploração da poesia, o que vai na contramão da

defesa de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010) quanto à importância do desenvolvimento de

ricas sequências didáticas para a exploração dos gêneros textuais, além de não apresentar uma

proposta de interação, o que ilustra a produção de texto como um mero exercício de escrita.

Sintetizando, houve pouca discussão da poesia e do respectivo assunto, sendo que os alunos

pouco falaram sobre ele antes de escrever.

A aluna “F”, por sua vez, recusava-se a escrever sobre algo que considerava muito

infantil, não vendo motivo para tal produção. No final, ela aceitou escrever um texto sobre sua

Page 133: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

132

vida real, mas como só começou a fazê-lo próximo ao término da aula, não conseguiu

concluí-lo e recusou-se a retomá-lo na aula seguinte e a entregá-lo.

Na direção dos pressupostos discursivos defendidos por Bakhtin (2011), Geraldi

(1997c) e outros autores, a fala dessa aluna acenava para a necessidade de haver um motivo

para o que escrevemos. Afinal, dizia ela: “Por que eu devo escrever sobre isso? Não vejo uma

razão.” (anotações de aula, maio de 2011). Em suma, ela dizia que na vida ela não precisava

escrever sobre questões tão infantis e também que escrevemos quando temos um objetivo a

cumprir. Esses questionamentos indicam que ela não sabia a finalidade da produção que

deveria realizar e que, portanto, não havia um destinatário. Essa reclamação também aponta

para a inadequação do tema, principalmente considerando a idade dos respectivos alunos da

Sala de Apoio, os quais encontravam-se na pré-adolescência.

No fim dessa aula, após a professora ter falado aos próprios discentes que não

conseguia orientá-los para a produção de textos sem dar-lhes ideias do que escrever,

aproveitei a oportunidade para dizer-lhe, particularmente que, de fato, eles praticamente não

sabiam o que escrever porque foram pouco preparados para isso e logo a ajudei a levantar

outras possibilidades de encaminhamento, com destaque para a necessidade de utilizar mais a

oralidade.

Retomando: o conteúdo da poesia que os alunos leram no início da aula serviu de

pretexto para uma produção textual, cujo destino foi sua respectiva correção com base nos

apontamentos feitos pela professora e, após, passada a limpo em seus cadernos, portanto, não

chegou à esfera de circulação.

A seguir trago quatro dessas produções a fim de possibilitar uma amostragem

diversificada. A professora ainda não as havia corrigido, afora algumas informações

repassadas aos respectivos autores quanto à escrita de algumas palavras, à medida que

solicitavam enquanto as registravam. Observo que, de um modo geral, tanto esses textos

quanto os trazidos na sequência, apesar de terem sido produzidos por alunos de quinta série,

explicitam que o processo de alfabetização de seus autores ainda não havia sido consolidado,

ou seja, que estavam em fase de apropriação da linguagem escrita.

O aluno “H”, autor do texto que segue, era considerado um dos que apresentavam as

maiores dificuldades em relação à escrita, desde questões ortográficas até as de textualidade,

conforme é possível verificar em seus registros. Ao fazer tal produção, fez muito suspense em

função de um dos lugares que ele imaginou que poderia frequentar no Reino do Aqui-Pode

(sexta linha), cujo interesse gera preocupação por tratar-se de um pré-adolescente de onze

anos de idade. Paralelamente, ele pedia ajuda para escrever a maior parte das palavras.

Page 134: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

133

Figura 3 – Texto aluno H

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Em seu texto, é notória a falta de articulação entre as ideias, bem como a

precariedade na progressão e na utilização de recursos coesivos, comprometendo, portanto, o

respectivo sentido. Como agravante, ele não contextualizou sua produção e não a pontuou,

além de ter apresentado outras limitações com o código escrito, tornando seu texto mais

frágil. Contudo, mesmo em meio a tantos problemas, é possível ter uma noção de algumas

atitudes que ele tomaria se morasse no reino mencionado. E, como era um aluno que

dificilmente escrevia algum texto, essa produção animou sua professora, a qual valorizou

muito o que ele escreveu.

A aluna “J”, embora sem contextualizar o reino referido na poesia trabalhada em sala

de aula e sem articular as ideias no texto que produziu, além de repeti-las e apresentar

problemas de sequenciação, afora outras inadequações, conseguiu introduzir o que fez ao

chegar naquele local fantasioso, bem como apresentou um final, o que foi considerado um

grande avanço no seu processo de busca do domínio da escrita, inclusive ela utilizou a

pontuação e fez parágrafos. Cabe destacar que ao finalizar o texto, fica claro o aspecto

interacional: obedecer à sua mãe está em oposição ao “aqui-pode”. Vejamos sua produção:

Page 135: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

134

Figura 4 - Texto aluna J

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Quanto à repetição do verbo comer, tanto nesta quanto em outras produções textuais,

pode indicar dificuldades alimentares vividas pelos alunos e talvez ansiedade, expectativa,

desejo.

A aluna “E”, apesar de apresentar problemas de falta de coesão, de fazer afirmações

incompletas, entre outros afins na organização de seu texto a seguir, era considerada uma das

que apresentavam menos dificuldades para organizar uma produção escrita com relativa

coerência. Ela era apressada, querendo terminar logo tudo o que lhe era proposto, sem ter

paciência para reler o que escrevia, nem para tentar repensar sobre suas próprias inadequações

da escrita. Preferia que a professora analisasse logo seus textos a fim de que ela só tivesse o

trabalho de passá-los a limpo. Olhemos sua produção:

Page 136: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

135

Figura 5 – Texto aluna E

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

A finalização dessa produção também explicita a falta de desejo de a aluna voltar

para a sua casa, possivelmente para a realidade.

Para o aluno “B” produzir as poucas linhas a seguir, precisei ficar ao seu lado para

ajudá-lo. Inclusive, atendendo às suas solicitações, registrei algumas palavras que estão

escritas corretamente, em um rascunho, para que ele pudesse copiá-las.

Page 137: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

136

Figura 6 – Texto aluno B

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Observa-se que seu texto, além de não conter um título, não está contextualizado e

não há um continum em suas ideias, não contendo, adequadamente, mecanismos de coesão.

Contudo, esse aluno não trouxe ideias contraditórias e utilizou o mesmo tempo verbal para

registrar o que imaginou ter realizado. Esse era um dos estudantes que não tinham paciência

para fazer as atividades propostas em aula; queria ficar lendo gibi o tempo todo. Portanto, esse

texto foi considerado um avanço, afinal, ele parou um pouco para escrever.

Trago, nas próximas páginas, dois desses textos recém-apresentados, mais o do aluno

“M”, contendo uma grande quantidade de correções feitas pela professora. Diferente do que

Geraldi (1997b) defende, percebe-se que ela corrigia diversos desvios do padrão da escrita,

sem eleger alguns para serem os alvos do dia. Esse procedimento justifica o grande número de

ocorrências em cada produção, as quais, de certa forma, deixavam seus autores intimidados

com tantos desvios assinalados, inclusive alguns tentavam evitar que seus colegas os vissem.

Sobre essa questão, é pertinente trazer a seguinte reflexão de Possenti (1997, p. 36):

Análises um pouco cuidadosas mostram que alunos acertam mais do que erram, que os erros são em geral hipóteses significativas (se a comunidade de falantes não as abona, elas são abandonadas), que o número de erros é bem maior do que os tipos de erros, o que significa que a substituição de uma hipótese por outra elimina muito mais erros do que regras erradas.

A grande quantidade de correções indicada em cada texto também deixava os

respectivos autores confusos sobre o que deveria ser feito a partir delas. Assim, na hora de

passá-lo a limpo, muitos ficavam em dúvida diante de tantas modificações que deveriam

realizar.

Page 138: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

137

Os textos produzidos a partir da poesia anunciada contemplaram, principalmente, as

sugestões dadas pela professora referentes ao que eles podiam comer naquele reino e, alguns,

do que brincavam. Assim, eles pouco abordaram os demais itens indicados além de,

praticamente, não levantarem outras ideias, contribuindo para que tais textos ficassem, de

certa forma, pouco criativos e diversificados.

Também chama a atenção o fato de a professora escrever um pequeno final na maior

parte dos textos quando os achava incompletos, ao invés de solicitar que os alunos o fizessem.

Porém, acompanhando o ritmo tumultuado de trabalho dessa turma, conforme informações já

apontadas, entendo que essa forma de correção era a que a professora, com muito esforço,

conseguia fazer, pouco contemplando os problemas de coesão e de coerência anunciados por

ela, junto aos aspectos gramaticais, na resposta à vigésima segunda questão do questionário

que respondeu por escrito, em maio de 2011, registrada a seguir.

22. Que conteúdos de Língua Portuguesa você prioriza nas reestruturações textuais de seus alunos? Por quê? Resposta: A coesão, coerência do texto e também os aspectos gramaticais. Tudo isso é muito importante para dar vida a um texto. Principalmente a coesão e a coerência são essenciais em um texto.

O restrito acompanhamento da professora, a cada aluno, no conturbado

desenvolvimento das aulas, evidencia a dificuldade de ela realizar o acompanhamento

individual conforme um dos objetivos da Sala de Apoio, na busca de contribuir para a

superação de suas dificuldades.

Nesse sentido, o meu papel de não apenas observar, mas também de participar,

possibilitava certa ajuda a alguns alunos enquanto produziam seus textos, levando-os, no

mínimo, a perceberem a necessidade de refacção de algumas de suas partes. Assim, tanto a

professora quanto os alunos valorizavam minha presença, pois passamos a ser duas atuando

ao lado deles. Contudo, observo que a correção que a docente realizava ia, geralmente, na

perspectiva da correção resolutiva, assim explicada por Ruiz (2013, p. 41): “[...] é uma

tentativa de o professor assumir, pelo aluno, a reformulação de seu texto [...].” Conforme a

autora, essa correção pode ser realizada por meio das estratégias de adição, de substituição, de

deslocamento ou de supressão de palavras ou partes de seus textos, o que vai em direção

contrária ao que já explicitei quanto à necessidade de o aluno refazê-los, várias vezes, se

necessário, na busca de dar sentido, coesão e coerência a essas produções, como preconizam

Costa-Hübes et al. (2007), Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), Luiz Antônio Marcuschi

(2008), entre outros autores. Em síntese, a correção resolutiva, não oportuniza ao aluno que

Page 139: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

138

corrija os seus próprios desvios do padrão da escrita, reduzindo-se, conforme afirma Ruiz

(2013, p. 61):

[...] à simples tarefa de copiar o texto com as soluções já apontadas pelo professor. E não é preciso ter sido professor de Língua Portuguesa para saber que, nesse exercício de cópia, muito pouco (ou quase nada) será aproveitado pelo aluno no que se refere à tarefa de reescrita. O trabalho que, na verdade, deveria ser o de refletir sobre o texto passa a ser o de mecanicamente reproduzi-lo – o que é bem diferente. Enquanto copia, o aluno não se concentrará necessariamente nos seus “erros” ou na natureza linguística desses erros, e isso provavelmente não o levará a refletir sobre como evitá-los numa próxima produção. (Aspas da autora).

Também é importante lembrar, conforme a autora, que esse procedimento indica que

a revisão dos textos que o aluno produz não é de sua responsabilidade, mas de seu professor.

Dessa forma, Ruiz (2013, p. 62) alerta que ele não vê a necessidade de relê-los na busca de

localizar possíveis problemas e de analisar “[...] a natureza linguística de tais problemas, nem

para comparar a versão do professor com a sua, a fim de descobrir o porquê das alterações e,

assim aprender o mecanismo da reescrita.” Vítima desse encaminhamento, provavelmente o

aluno sairá da escola com dificuldades para proceder a análise e a autocorreção de suas

escritas.

A seguir estão os textos anunciados anteriormente com as devidas correções.

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139

Figura 7 – Texto aluna J

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Na quinta e sexta linha desse texto, equivocadamente, a professora não entendeu que

a aluna “J” informou que havia comido mel e também melancia, riscando a palavra mel e,

inclusive, acentuando a palavra melancia. Essa ocorrência revela que houve pouco

envolvimento da aluna na correção, o que é preocupante, pois, após esse momento, ela apenas

passou seu texto a limpo no caderno, portanto, ela não teve a oportunidade de fazer a sua

refacção, aliás, esse era o procedimento que predominava na correção dos textos de todos os

alunos. Também chama a atenção o fato de a professora não ter corrigido a palavra

brigadeiro, já que corrigiu outros problemas ortográficos. Embora interferindo na autoria do

texto, destaco o acréscimo que ela fez no início da segunda linha, objetivando dar mais

coerência à respectiva introdução, situação que, conforme já afirmei, era pouco priorizada por

ela.

Na quarta linha do texto do aluno “B”, a seguir, a professora não reconheceu a escrita

da palavra “cinema” e riscou-a.

Page 141: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

140

Figura 8 – Texto aluno B

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Retomo minha preocupação quanto a situações como essa, as quais evidenciam que,

mesmo que a maior parte das correções tenham sido realizadas ao lado dos respectivos

autores, sendo o momento em que a docente explicava as correções que realizava, havia

pouca interação entre eles e a professora. Essa situação revela o quanto o aluno “B”, autor

desse texto, estava distraído enquanto ela o corrigia e o comentava. Como na produção

anterior, o acréscimo feito por ela, principalmente na conclusão, interferiu na sua autoria.

Seguidamente o aluno “M” utilizava letra em caixa alta de forma indevida, como na

palavra Bonito em seu texto que segue. No entanto, a professora, ao corrigi-lo, fez o mesmo

ato ao escrever as palavras Comprar e Campeão, reforçando esse equívoco, o que é

inadequado principalmente por tratar-se de um aluno de quinta série. Essa produção apresenta

uma relativa progressão. É preciso, porém, orientar-lhe o aperfeiçoamento.

Page 142: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

141

Figura 9 – Texto aluno M

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Para facilitar a compreensão desse texto, registro na sequência a sua transcrição, a

qual foi organizada com base na leitura do respectivo autor.

O reino que tudo pode

Eu fui num castelo muito rico. Eu era muito bonito e muito guloso e casei com a princesa e roubei o ouro e comprei um caminhão monstro e fui campeão de rali.

Vale lembrar que muitos alunos, ao passarem seus textos a limpo, não faziam todas

as correções indicadas pela professora. Muitas vezes isso ocorria porque nem sempre as

alterações feitas por ela correspondiam ao que escreviam. Essa situação pode ser constatada

na produção do aluno “M”, recém-registrada, comparando com a versão após ter sido passada

a limpo, trazida a seguir.

Page 143: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

142

Figura 10 – Texto aluno M

ALUNO M

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Observa-se que ele manteve a palavra cantinho mesmo após a professora tê-la

riscado e escrito abaixo dela a palavra campeão. Em sua variedade linguística, cantinho era o

jeito de ele escrever cantion, que correspondia a campeão. No entanto, ele manteve a palavra

Campeão sugerida pela professora24, mas escreveu-a assim: Campião.

Se, por um lado, esse aluno manteve o que considerava correto quanto à escrita dessa

palavra, por outro, lembro que poucas eram as vezes que os discentes liam o que escreviam ou

mesmo que analisavam o que a professora modificava, inclusive, muitos deles aceitavam,

tranquilamente, as novas ideias acrescentadas por ela, talvez até por se sentirem ignorantes.

Conforme já afirmei, isso é preocupante, pois esse era o único momento de reestruturação de

tais textos, cujo encaminhamento está muito distante da realização das diversas refacções

sugeridas por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010).

Nesse contexto, enquanto a professora fazia as devidas correções das produções

textuais junto a seus respectivos autores, eu procurava orientá-los, individualmente, no

sentido de ajudá-los a perceber as incoerências e/ou lacunas que deixavam, principalmente em

relação à textualidade, mesmo após terem sido passadas a limpo. Inclusive alguns dos que

não aceitavam voltar a elas para fazer outras modificações, analisavam, por alguns instantes,

as reflexões linguísticas que eu apontava ou provocava para que as percebessem.

24 Essa análise foi construída com base em explicações da Profª Drª Darcilia Simões durante o Exame de Qualificação.

Page 144: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

143

Após o trabalho com a poesia O reino do Aqui-Pode, a professora entregou,

fotocopiado, o poema denominado A chácara do Chico Bolacha, de autoria de Cecília

Meireles, o qual foi lido pelos alunos, sendo que cada um leu um pequeno trecho. Em

seguida, a professora leu o texto. Nesse momento, os alunos voltaram a fazer a observação de

que não havia a necessidade de que ela o fizesse também.

O conteúdo desse poema foi pouco explorado e, novamente, a aluna “F”, a menos

jovem da turma, achou o tema infantil e fez questão de dizer que eles não eram mais crianças,

o que explicita a ocorrência de uma inadequação temática.

Esse texto foi utilizado, principalmente, para destacar as muitas palavras cuja grafia

continha o “ch” ou o “x”, bem como diferentes casos de emprego de letra maiúscula e de

utilização do “r”, além do emprego do “m” ou do “n” antes de consoantes, portanto, o

principal objetivo não foi estudar o que caracteriza o gênero textual-discursivo poema, nem a

produção de outro do mesmo gênero. A exploração desse texto restringiu-se, assim, a ser

utilizado como pretexto para a exercitação de aspectos ortográficos e outros afins.

Os alunos não tiveram dificuldades para localizar as palavras que continham o “ch”

ou o “x”, no entanto, mesmo copiando, escreviam várias de forma inadequada. Por um lado,

essas inadequações pareciam demonstrar falta de atenção dos alunos; por outro, pareciam

apontar para a falta de entendimento da importância de tal domínio ou do objetivo da

atividade.

Partindo para o gênero textual-discursivo reportagem, após explicitar rapidamente o

que o constitui, a professora desenvolveu a atividade já descrita no item 4.1.1, a partir da qual

cada aluno precisava escolher uma, em uma revista, apresentá-la aos colegas e, após,

sintetizá-la por escrito, algumas das quais estão copiadas a seguir. Vejamos a do aluno “C”:

Page 145: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

144

Figura 11 – Texto aluno C

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Esse aluno é o que diz sentir-se ótimo quando escreve. Mesmo de forma pouco

coesa, com algumas repetições e outros problemas estruturais, ele conseguiu organizar sua

síntese com relativa contextualização, progressão e coerência.25 Os dois acréscimos feitos pela

professora foram significativos para o sentido de seu texto, contudo, como nos casos

anteriores, interferiram na autoria e tolheram a oportunidade de o aluno fazê-lo.

A aluna “F”, autora da produção escrita a seguir, é a que fez as críticas aos temas

considerados infantis, o que justifica, de imediato, sua escolha por essa reportagem.

25

Observo que o aluno se equivocou ao escrever o ano do ocorrido. Na verdade a situação apresentada, na reportagem, ocorreu em dois de setembro de 2010 e sua síntese foi elaborada, por ele, em maio de 2011.

Page 146: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

145

Figura 12 – Texto aluna F

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Essa aluna considerou o tema da sua reportagem, que versava sobre drogas e aborto,

próprio para a adolescência, despertando muito sua atenção. Inclusive, fez questão de

comentá-la tanto comigo quanto com a respectiva professora, bem como apresentou-a aos

colegas.

Embora seu texto apresente progressão e relativa coerência, a aluna não

contextualizou a temática e também não foi orientada para isso no momento da correção feita

pela professora. Contudo, na oralidade, percebi que ela compreendeu a situação exposta como

um todo, a qual, segundo ela, estava articulada ao título de sua síntese/texto. Talvez ela

tivesse preferido não explicitar, como lembra Koch (2002), as informações consideradas

redundantes.

Vale observar que a forma como a professora entendeu a parte final do texto é

incoerente: “nós vai ficar no cérebro e no coração.” Na verdade, conversando, posteriormente,

Page 147: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

146

com a aluna, entendi que ela quis dizer, “mas vai ficar no cérebro e no coração”, porém, ao

passar sua síntese a limpo, ela manteve a versão da professora, sem se dar conta dessa

incoerência, o que revela, de certa forma, o quanto essa aluna fez tais correções

mecanicamente, como ocorria com muitos outros alunos. Na verdade, poucos tinham a

preocupação de analisar o sentido do texto no momento de passá-lo a limpo.

Embora a autora do texto a seguir tenha lido a reportagem que escolheu, em voz alta,

para mim, e feito alguns comentários a respeito dela, além de expô-la aos colegas, teve

dificuldades para manter as ideias principais ao registrá-las, mesclando-as, inclusive, com

uma situação familiar, portanto, não entendeu o gênero textual-discursivo reportagem.

Vejamos seu texto:

Figura 13 – Texto aluna A

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

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147

Pelo fato de sua produção ter ficado muito rasurada após a correção feita pela

professora, dificultando seu entendimento, registro, a seguir, na íntegra, sua escrita original:

Alunos talentosos:

É que as pessoas não pódem falar que é enspertos mais sim demostra é isso que tem que fazer. que nem a minha prima, ela não fala que é esperta mas ela também não demostra mas não precisa demostras e não fica falendo que é talentosos.

Essa aluna não introduziu nem contextualizou a respectiva temática, além de não

apresentar progressão e coerência, o que, para fins interacionais, é bastante comprometedor.

O texto dessa aluna, mesmo após ter sido passado a limpo com base nas correções

feitas pela professora, foi finalizado de forma confusa, comprometendo sua coerência,

conforme é possível perceber na versão final, que segue. A grande quantidade de correções

indicadas, sobrepostas aos seus registros, observadas na versão anterior, deve ter contribuído

para confundir a autora.

Figura 14 – Texto aluna A

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

O aluno “H”, com muito esforço e com a ajuda da professora, elaborou o parágrafo

que segue, com base na reportagem que leu, contudo, não conseguiu apresentá-lo aos colegas

Page 149: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

148

como muitos o fizeram. Com muitas limitações, de certa forma ele trouxe uma informação.

Lembro que este era um dos alunos que dificilmente se concentravam para realizar qualquer

atividade.

Figura 15 – Texto aluno H

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

O aluno “M”, autor da próxima síntese, era quem participava apenas de pequenas

partes das aulas, pois não conseguia acordar cedo. E, quando chegava à sala de aula, dizia

estar sempre com muito sono. Era considerado, pela professora, o aluno mais “fraco” da

turma. Já que ele não se concentrava para ler uma reportagem para, após, sintetizá-la, no

pouco tempo que lhe restava, a professora leu uma a ele e procuraram compreendê-la juntos.

Em seguida, praticamente ela lhe ditou o parágrafo a seguir, bem como escreveu algumas

palavras, em um rascunho, que ele não se arriscava a escrever sozinho, para que as copiasse.

Porém, ele sabia explicar, superficialmente, o que era uma reportagem.

Page 150: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

149

Figura 16 – Texto aluno M

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Dando continuidade ao estudo do gênero textual-discursivo reportagem, na aula

seguinte foi explorada uma intitulada Vira-lata saiu de São José dos Pinhais para visitar

garoto no HC, contida na Coletânea de Textos organizada pela Secretaria Estadual de

Educação do Paraná, destinada às Salas de Apoio (PARANÁ, 2005b). Para ajudar os alunos a

entender o que constitui tal gênero, a professora registrou as seguintes questões no quadro-de-

giz para que eles as copiassem e respondessem.

Como se chama o jornal em que foi publicada a reportagem? Em que cidade foi publicada a reportagem? Em que data foi publicada? Você costuma ler jornal? Quais os jornais que você conhece? Por que o “hospital” se emocionou com o encontro entre Coiote e Orlã? (Anotações de aula, junho de 2011).

Ocorre que os alunos demoravam muito para fazer qualquer cópia e, portanto,

sobrava pouco tempo para refletir, para produzir. Alguns, como sempre, nem liam as questões

e já pediam ajuda, aliás, muitos deles afirmavam que gostavam quando apresentavam

dificuldades em alguma atividade, pois era uma forma de ter nosso atendimento

individualizado.

Antes de iniciar a aula seguinte, sabendo que a professora retomaria tal reportagem,

para, posteriormente, os alunos produzirem um texto a partir dela, sugeri que ela o fizesse de

forma intensa, registrando, inclusive, as principais ideias no quadro, enriquecendo-as com

Page 151: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

150

esquemas. Embora eles não tivessem recebido bem a informação de que deveriam produzir

um texto, houve uma relativa participação nessa retomada.

A orientação para a produção não consistia em resumir a reportagem, mas em

imaginar o caminho que o cachorro percorreu para chegar ao hospital onde o menino, seu

amigo, estava internado. No entanto, esse trajeto foi pouco contemplado nos textos,

predominando a organização de uma síntese. Porém, comparando com as produções

anteriores, fizeram-no com mais tranquilidade, sem sofrer tanto, porque, na verdade, estavam

com a história bem presente em função da respectiva retomada realizada logo antes, cujo

encaminhamento foi bem diferente da produção anterior para a qual os alunos pareciam não

ter ideias para registrar.

No final da produção, mesmo com a turma bastante agitada, a professora estava

satisfeita, pois esses alunos, praticamente, não produziam durante as aulas do turno regular,

no período vespertino e, também, porque, comparando com as aulas na Sala de Apoio dos

dias anteriores, essa foi uma das mais produtivas. Observo que ela não havia constatado que o

que fez a diferença foi a intensa preparação para essa atividade de escrita, a qual, inclusive,

contribuiu para que o fizessem de forma mais tranquila e espontânea. Alguns até ilustraram-

na com desenhos, orgulhando-se deles. O resultado dessa produção, conduzida de forma

diferente daquelas em que havia pouca orientação prévia, reforça a ideia de que a constante

utilização da oralidade para viabilizar a compreensão de um texto ou de um conteúdo é um

excelente caminho para a efetivação de uma boa aprendizagem.

Na sequência estão três desses textos, nos quais estão facilmente visíveis problemas

de falta de contextualização, de referenciação e de coesão, mas que, mesmo assim, de certa

forma, explicitam momentos de coerência e de criatividade em suas produções.

O texto do aluno “D”, a seguir, além de apresentar tais problemas, entre outros, como

seguidas repetições e falta de pontuação, conseguiu apresentar algumas ideias da reportagem

mencionada, bem como descreveu um pouco o que ocorreu no trajeto percorrido pelo cão até

chegar ao hospital.

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151

Figura 17 – Texto aluno D

ALUNO D

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

No texto a seguir, de autoria da aluna “A”, principalmente a falta de uma introdução

e de uma sequência lógica prejudica o entendimento de sua reportagem.

Page 153: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

152

Figura 18 – Texto aluna A

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Nesse texto, inicialmente, a aluna informou que o cão foi até ao hospital para ver o

menino, afirmando, inclusive, que o cachorro foi ouvido por ele. Em seguida, sem situar, ela

descreveu algumas passagens ocorridas no trajeto percorrido pelo animal antes de chegar à

referida casa de saúde. Por último, falou, de forma confusa, sobre o encontro dos dois. No

entanto, tal situação não foi apontada, pela professora, no momento da correção.

A seguir está registrado o texto do aluno “C”:

Page 154: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

153

Figura 19 – Texto aluno C

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Na sétima linha de seu texto, talvez o aluno tenha achado redundante dizer onde o

cão foi, porém, como a pontuação está inadequada, o entendimento ficou comprometido: “[...]

depois de dois dias ele foi no meio do caminho começou uma tempestade [...].” Na verdade, o

Page 155: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

154

aluno quis dizer que depois de dois dias o cão também foi ao hospital e, na sequência, ele

começou a descrever o que ocorreu no caminho.

A ordem do ocorrido na última parte de seu texto também dificulta a compreensão,

pois ele inicia dizendo que o coiote foi direto ao hospital, porém, em seguida ele voltou a

descrever algumas situações que ocorreram antes de sua chegada a essa casa de saúde.

Inclusive a professora, de forma inadequada, entendeu que ele parou em frente à porta de uma

casa, quando na verdade ele quis dizer em frente à porta do hospital.

Na sequência está o texto da aluna “E”:

Figura 20 – Texto aluna E

Page 156: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

155

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Esse texto, mesmo após ter sido corrigido pela professora e passado a limpo pela

autora, está com a segunda parte do primeiro parágrafo incoerente, comprometendo, portanto,

a textualidade: “[...] mas ele estava com muita saudade de seu cão Coiote e então um dia ele

nunca mais iria ver seu cão achando que apareceria seu cão no hospital das clínicas.”

Contudo, escrever uma frase hipotética como “[...] então um dia ele nunca mais iria ver seu

cão [...]” demonstra de certa forma, muita criatividade.

Na produção dessa aluna também há uma lacuna de ocorrências entre o primeiro e o

segundo parágrafos. É preciso, pois, esclarecer-lhe sobre a necessidade de continuidade das

ideias de um texto, mostrando-lhe que ela é condição para que seus interlocutores o entendam,

o que vai na direção da defesa de Koch (2002) quando fala da interdependência que deve

haver entre as partes de um texto.

Animada, na aula seguinte, a professora chegou anunciando que naquele dia iriam ler

bastante e sobre algo que lhes interessava. Tratava-se de dois textos contidos na Coletânea

para os alunos das Salas de Apoio já citada, intitulados, respectivamente: Artigo 58 do Código

de Trânsito Brasileiro e História da bicicleta. O primeiro, um texto curto, trazendo breves

orientações sobre o trânsito de bicicletas, foi lido e explorado, oralmente e, como sempre,

com pouca participação. Em relação ao segundo, além de ler e refletir rapidamente sobre ele,

os alunos também precisaram responder a algumas questões por escrito, que, aliás,

demoraram muito para copiá-las, sobrando pouco tempo para o entendimento do texto e para

a elaboração das respostas correspondentes. Foi um ambiente tenso.

Na aula seguinte, sem dar continuidade à anterior, a professora comunicou que

fariam atividades diferentes e gostosas. A primeira delas consistia em completar várias

Page 157: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

palavras com um ou com dois “r”, as quais já estavam distribuídas entre uma taça e três bolas

de sorvete, conforme cópia a seguir. Três conjuntos de palavras formavam as bolas do sorvete

e um formava a taça.

Após, deveriam pintar, da mesma cor, os espaços das palavras cujos

mesma função: “r” inicial, “r” brando, “r” seguido de consoante e dois “r”. Assim, coloriram,

de forma coerente, a taça e as três bolas de sorvete. Mesmo sendo uma atividade considerada

prazerosa por eles, muitos ficaram impacientes quando tin

utilização de tal letra e, consequentemente, temiam que o colorido do sorvete não

correspondesse às indicações.

palavras com um ou com dois “r”, as quais já estavam distribuídas entre uma taça e três bolas

rvete, conforme cópia a seguir. Três conjuntos de palavras formavam as bolas do sorvete

Figura 21 – Atividade de ortografia

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Após, deveriam pintar, da mesma cor, os espaços das palavras cujos

mesma função: “r” inicial, “r” brando, “r” seguido de consoante e dois “r”. Assim, coloriram,

de forma coerente, a taça e as três bolas de sorvete. Mesmo sendo uma atividade considerada

prazerosa por eles, muitos ficaram impacientes quando tinham dúvidas em alguns casos de

utilização de tal letra e, consequentemente, temiam que o colorido do sorvete não

correspondesse às indicações.

156

palavras com um ou com dois “r”, as quais já estavam distribuídas entre uma taça e três bolas

rvete, conforme cópia a seguir. Três conjuntos de palavras formavam as bolas do sorvete

Após, deveriam pintar, da mesma cor, os espaços das palavras cujos “r” tinham a

mesma função: “r” inicial, “r” brando, “r” seguido de consoante e dois “r”. Assim, coloriram,

de forma coerente, a taça e as três bolas de sorvete. Mesmo sendo uma atividade considerada

ham dúvidas em alguns casos de

utilização de tal letra e, consequentemente, temiam que o colorido do sorvete não

Page 158: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

157

No conjunto das atividades consideradas gostosas, também fizeram palavras

cruzadas, cujas pistas eram desenhos e, em alguns casos, estavam escritas algumas sílabas,

como é possível verificar na cópia que segue.

Figura 22 – Atividade de cruzadinha de palavras

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Segundo a professora, havia a orientação, por parte da coordenação das Salas de

Apoio do Núcleo Regional de Educação de Cascavel, para que fosse desenvolvido, também,

esse tipo de atividade, objetivando ajudar os discentes a ter maior domínio ortográfico.

Inclusive, no curso de que participei junto a professores de Salas de Apoio, no ano em que

realizei a pesquisa de campo em questão, também foi sugerida a pesquisa de palavras em

textos impressos, bem como em dicionários, glossários e outros materiais. Contudo, o

Page 159: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

158

discurso inicial da docente ao falar que, naquele dia, fariam “atividades diferentes e gostosas”,

de certa forma reforçou a ideia que eles já têm de que as outras atividades, como a produção

ou a compreensão de textos, não são agradáveis nem diversificadas. Esse entendimento foi

analisado por mim, junto à respectiva professora, servindo de indicativo de uma das questões

a serem enfatizadas na intervenção, na expectativa de que a vivência de situações

interlocutivas, viabilizadas pela linguagem, motivassem mais os alunos para as atividades de

produção textual.

Posteriormente, em outra aula, retomando o ritmo das atividades consideradas mais

sérias, a professora, com base nos textos sobre as bicicletas, explorados dias anteriores,

solicitou que os alunos produzissem um texto sobre uma aventura que cada um teve com sua

bicicleta, escrevendo o seguinte enunciado no quadro-de-giz, seguido de alguns comentários

orais: “Relate onde você vai com a sua bike, o que você apronta com ela.”

A professora, ao fazer a correção do primeiro texto sobre esse tema, por estar sem

caneta vermelha, o fez a lápis. Logo em seguida escutei o comentário de satisfação da

respectiva aluna ao ver que seu texto não estava com correções marcantes. Os textos dos

demais alunos foram corrigidos com caneta azul, o que também aliviou o peso da cor

vermelha. Tal situação evidencia a necessidade de trabalhar os mitos das cores, tanto com a

professora quanto com os alunos, bem como aponta que é preciso superar a prática mecânica

de correção dos textos produzidos pelos discentes, partindo para uma prática que oriente a sua

reestruturação, conforme recomendam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010).

A seguir estão alguns desses textos já com as correções feitas pela professora, cuja

ação autoriza que se afirme que os alunos não são mais autores exclusivos dessas produções.

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159

Figura 23 – Texto aluna E

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

O último parágrafo desse texto está deslocado da parte que o precede, portanto, está

sem sentido, o que, a meu ver, é um dos fatores que mais comprometem a textualidade. No

entanto, essa questão nem foi apontada no momento da correção, o que demonstrou ser um

aspecto que devia ser trabalhado junto à respectiva docente.

Retomo seu texto para melhor entendê-lo. A aluna “E” iniciou essa produção

explicitando que estava andando de bicicleta, mas ao tentar arrumar sua calça acabou caindo

e, logo após, foi ajudada por um senhor. Na sequência desse episódio, ela escreveu o seguinte

parágrafo: “Então por isso que é importante saber andar de bicicleta a gente perde carboidrato,

mas ajuda a fortalecer os ossos.” Quando a questionei sobre essa falta de continuidade em seu

texto, ela relacionou essa informação ao respectivo título Andar de bicicleta é importante,

sem reconhecer a necessidade de articular as ideias nele contidas, aliás, os alunos pouco eram

orientados para isso.

A seguir está registrado o texto da aluna “F”:

Page 161: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

160

Figura 24 – Texto aluna F

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

De forma equivocada, ao fazer a correção desse texto, a professora entendeu que as

duas meninas tiveram um pé quebrado ao caírem da bicicleta, quando, na verdade, foi só a

caroneira, que é irmã da autora dessa produção, quem teve essa complicação, cuja

interpretação modificou o respectivo sentido. Assim, provavelmente por engano quanto ao

entendimento desse texto, foi a docente que produziu essa incoerência. A autora havia escrito,

na íntegra, a seguinte ideia: “[...] e então nós caímos e quebrou o pé dela eu então depois eu

levei ela até a casa de minha tia [...].” A referida parte, após ser corrigida, ficou assim

estruturada: “nós caímos quebramos o pé eu, então [...].”

A “Irmã” a que a aluna “F” se referiu no final desse texto é uma das freiras

responsáveis pela instituição para onde ela estava levando sua irmã, portanto, o final do texto

está vago, comprometendo o sentido dessa produção, pois dificilmente o leitor saberia que

quem tomava conta do Cemic eram freiras.

Ao passar esse texto a limpo, vitoriosamente, a aluna “F” percebeu a incoerência do

verbo quebrar no plural e o escreveu no singular, referindo-se apenas ao pé de sua irmã, como

é possível perceber na quarta linha da versão que segue.

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161

Figura 25 – Texto aluna F

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Sem interferência da professora, ela também reorganizou algumas ideias, deixando

seu texto mais coerente, sendo uma das raras vezes em que isso aconteceu. Porém, não ficou

claro onde ela deixou sua irmã com o pé quebrado. Dá a impressão que foi no Cemic, que era

a instituição que atendia a crianças. No caso, a deixaria lá com o pé quebrado sem ter avisado

ninguém da família. Na primeira escrita ela afirmou que havia levado sua irmã até à casa de

sua tia e esta comunicou à freira da instituição para onde elas se dirigiam.

O aluno “C” soltou sua imaginação ao falar do que aprontou com sua bike,

produzindo um texto rico em detalhes, inclusive, além de utilizar uma interessante seleção

vocabular como: “pulguento, tentei freiar, faleceu, imprensou, intestinos, cerebro, saltou,

enterrar, pobre falecido” também fez uso de uma metáfora “que nem um furacão.” Porém,

praticamente ele não usou nenhuma pontuação, dificultando o entendimento do que escreveu.

Segue seu texto:

Page 163: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

162

Figura 27 – Texto aluno C

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

O fato de esse aluno informar que o cachorro morreu antes mesmo de encostar na

roda é no mínimo curioso, se bem que ele falou que parecia um furacão. De forma dúbia, na

décima quarta linha tem-se a impressão de que ele não se ralou todo porque, além de o

cachorro ficar imprensado na roda, apareceram seus intestinos.

Na aula seguinte, com a intenção de explorar o gênero textual-discursivo biografia,

os alunos leram a do Ronaldo Fenômeno, a qual estava ilustrada com uma foto desse jogador

e, após, interpretaram-na por escrito.

Na sequência, os alunos escreveram sua autobiografia. Para essa produção seguiram

algumas indicações registradas no quadro-de-giz, pela professora, tais como:

Page 164: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

163

Nome: Idade: Signo: Do que mais gosta: Manias e costumes: Jeito de ser: O que o deixa triste: Conte um fato sobre sua vida:

Também nessa produção alguns alunos continuaram pouco motivados para escrever.

Com muita insistência, inicialmente copiaram tais itens e escreveram, ao lado deles, o que

correspondia à sua vida. Após, alguns organizaram tais informações em forma de texto.

Entendo que trabalhar biografia num contexto como o desses alunos implica num

grande trabalho prévio para amadurecimento da crítica e da autocrítica, inclusive a aluna “A”

explicitou que, de certa forma, registrar tais informações seria “complicado para ela.” Mesmo

com esse entendimento, ela fez observações preocupantes sobre sua vida. Assim, para

preservá-los, preferi não trazer nenhum desses textos aqui, principalmente porque, de fato,

explicitaram algumas de suas particularidades bem como de seus familiares.

Além das produções escritas dos alunos, leituras e outras atividades citadas,

realizadas nos quase dois meses e meio de observação/participação, os discentes também

leram três poemas, sobre um dos quais, a primeira pergunta da interpretação, por escrito,

consistia em ajudá-los a entender o que é um poema. No entanto, estavam muito inseguros

para responder tal questão, pois nunca haviam falado sobre esse gênero textual-discursivo,

apenas leram alguns, interpretaram-nos e/ou utilizaram-nos como pretexto para outras

produções. Para ajudá-los a responder essa questão, em poucas palavras e com ênfase na

forma, a professora explicou-lhes que “o poema é composto por versos, estrofes e contém

rimas” (anotações de aula, junho de 2011). No entanto, tais informações estruturais não foram

suficientes para um efetivo entendimento da questão.

Nas aulas posteriores realizaram, também, outras atividades “diferentes” como caça-

palavras e palavras cruzadas. Também destacaram algumas rimas em um poema e tempos

verbais em duas piadas. Assim, o gênero textual-discursivo piadas foi utilizado como pretexto

para o desenvolvimento de algumas atividades gramaticais, portanto, não foi explorado em

sua constituição ou função social.

A partir dessas análises, constatei que quando os alunos eram preparados para a

produção escrita que deveriam realizar, sobretudo por meio de intensa utilização da oralidade,

e quando tinham um objetivo para escrever, envolviam-se muito mais às aulas e,

consequentemente, a disciplina e participação eram maiores, o que repercutia na qualidade

Page 165: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

164

dos textos que produziam. Inclusive, em conversas informais, alguns afirmavam que era

importante exercitar a escrita porque poderiam precisar dela em suas futuras profissões,

associando-a, assim, à sua função social, porém, não demonstraram entender que a escrita

também é utilizada em seu atual dia a dia. Essa falta de compreensão revela que a escola

pouco estava exercitando a escrita em situações interlocutivas, talvez até por ser mais fácil,

mais simples seguir outros encaminhamentos.

É importante destacar que os discentes passaram a ficar mais tranquilos para escrever

quando começaram a entender que o “erro”, tantas vezes assinalados em seus textos, era um

processo normal para o avanço na aprendizagem.

As reflexões trazidas até então, no presente capítulo, são referentes ao período em

que observei/acompanhei as aulas da Sala de Apoio nos meses de maio, junho e início de

julho de 2011, cujas análises foram ao encontro dos primeiros objetivos específicos dessa

pesquisa26. Doravante terão por base o trabalho desenvolvido durante a intervenção realizada

no segundo semestre de 2011.

4.2 REFLEXÕES A PARTIR DA INTERVENÇÃO REALIZADA NA SALA DE

APOIO/PRODUÇÃO TEXTUAL

No primeiro tópico deste item abordo, em linhas gerais, a forma como as produções

textuais dos alunos da Sala de Apoio foram conduzidas na intervenção realizada no segundo

semestre de 2011, que constitui a segunda etapa da pesquisa de campo. Logo após, analiso

algumas dessas produções, referentes a diferentes gêneros textuais-discursivos, sobretudo no

tocante aos aspectos interacionais desses gêneros, as quais são antecedidas pela explicitação

dos respectivos encaminhamentos metodológicos. Os critérios de análise dos textos estão

contemplados na primeira parte da tabela diagnóstica que constitui o anexo D. Para finalizar,

teço algumas reflexões a partir do trabalho realizado nesse processo de intervenção.

Entendo que as análises advindas desse processo ajudam a responder a quarta

pergunta de pesquisa: É possível viabilizar um encaminhamento teórico-metodológico

26 Analisar e descrever as características das produções escritas, em seus aspectos contextuais, estruturais e funcionais. Analisar as representações dos alunos sobre as experiências de produção que desenvolvem em Sala de Aula de Apoio. Analisar e refletir sobre os pressupostos teórico-metodológicos que norteiam o encaminhamento das produções textuais dos alunos pela professora da Sala de Apoio.

Page 166: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

165

alternativo que facilite a esses alunos o uso da linguagem como prática situada de interação

nos mais variados contextos sociais?

4.2.1 Encaminhamentos metodológicos que nortearam as produções textuais dos alunos

Conforme já explanei no primeiro capítulo, para dar a direção às atividades

desenvolvidas durante a intervenção, elaborei duas unidades de trabalho, as quais são

intituladas como: Ampliando o conhecimento sobre o funcionamento da escola e Estudando o

funcionamento de alguns serviços existentes na comunidade, as quais constituem,

respectivamente, os apêndices E e F. Lembro que nelas estão registrados os encaminhamentos

metodológicos para dar o norte às aulas, bem como as correspondentes atividades para os

alunos.

De certa forma, metodologicamente, a condução das atividades decorrentes dessas

unidades de trabalho aproximou-se das sequências didáticas, conforme proposto por Dolz,

Noverraz e Schneuwly (2010). Assim, para iniciar o estudo de cada gênero textual-discursivo

que buscava a compreensão das temáticas dessas unidades, os alunos eram levados a perceber

a necessidade de explorá-los a partir de uma situação de interação relacionada ao que se

objetivava realizar em determinado momento da aula, que, em última instância, visava à

produção de um jornal da escola (anexo A).

Na sequência, geralmente, mantinha-se contato com textos do gênero textual-

discursivo a ser estudado, sobretudo observando o seu teor interacional, bem como era

realizada a leitura e a compreensão de um texto relacionado ao gênero enfatizado. Em

seguida, eram desenvolvidas as respectivas atividades de compreensão, bem como era

utilizado o dicionário e realizadas análises linguísticas, quando necessárias, para entender

melhor os textos. Como exemplo, cito a exploração da pontuação quando do estudo e

planejamento do gênero textual-discursivo entrevista, por considerar uma necessidade diante

de muitas interrogações utilizadas.

Advirto que, durante as aulas, a análise linguística era realizada, principalmente, de

forma oral nos momentos de entendimento e de reestruturação das produções dos alunos,

tanto individual quanto coletiva, bem como para compreender os textos de divulgação

científica27 utilizados para explorar os diversos gêneros textuais-discursivos.

27 Durante o desenvolvimento da pesquisa de campo tais textos foram entendidos como pertencentes ao gênero textual-discursivo texto informativo, inclusive essa foi a nomenclatura utilizada nos apêndices E e F, bem como no próprio jornal da escola (anexo A).

Page 167: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

166

Assim, essa análise vai ao encontro da defesa de Geraldi (1997b), no sentido de

entender que ela deve contribuir para que o texto seja melhor compreendido e não

simplesmente para higienizá-lo no tocante aos aspectos gramaticais e ortográficos. Destarte,

entendo que é necessário que o professor de Língua Portuguesa adote uma metodologia na

perspectiva de viabilizar que a essência de suas aulas seja a linguagem em efetivo uso. Nas

palavras de Mendes (2012, p. 12): “Busca-se, desse modo, o desenvolvimento da competência

linguístico-comunicativa do aprendiz, da qual a competência gramatical é apenas uma parte.”

Nessa perspectiva, a análise linguística é uma importante etapa do desenvolvimento dessa

competência, entendendo que ela deve ser consequência da reflexão sobre a linguagem em

uso e, portanto, fazer sentido para os alunos.

Dessa forma, destaco que o ápice do estudo de cada gênero textual-discursivo foi a

devida produção textual do aluno que, conforme a concepção interacionista de linguagem,

tinha um alvo sociodiscursivo definido previamente, a partir de uma necessidade surgida

quando do desenvolvimento das atividades que constituíam as aulas, cujas atividades

focalizavam a produção do jornal mencionado.

O entendimento dessas produções articulava-se à defesa de Luiz Antônio Marcuschi

(2007, p. 22), em relação à sua visão interativa da linguagem, ao explicar: “[...] os gêneros

textuais se constituem como ações sociodiscursivas para agir sobre o mundo e dizer o mundo,

constituindo-o de algum modo”, o que significa, para o autor (MARCUSCHI, L. A., 2007, p.

22),

[...] que a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual. [...] Esta visão segue uma noção de língua como atividade social, histórica e cognitiva. Privilegia a natureza funcional e interativa e não o aspecto formal e estrutural da língua.

Nesse viés, o desenvolvimento dessa intervenção, que viabilizou a elaboração do

suporte jornal, teve, como principais objetivos:

• Compreender as temáticas que constituem as duas unidades de trabalho: Ampliando o

conhecimento sobre o funcionamento da escola e Estudando o funcionamento de alguns

serviços existentes na comunidade.

• Oportunizar, ao aluno, o entendimento do suporte jornal como um veículo de

circulação de diversos gêneros textuais, no qual a linguagem escrita viabiliza, efetivamente,

práticas discursivas.

Page 168: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

167

• Compreender o propósito comunicacional/interacional de alguns gêneros textuais:

propaganda, carta de solicitação ou pedido, entrevista, convite, cartão de felicitação, panfleto,

biografia, reportagem, artigo de opinião e textos de divulgação científica.

• Colocar essas produções escritas em efetiva situação de uso, cujo alvo foi a

confecção de um jornal da escola.

Para o desenvolvimento das duas unidades de trabalho mencionadas, os alunos

estudaram e produziram textos de vários gêneros textuais-discursivos, sendo que alguns foram

enviados aos respectivos destinatários a fim de cumprir seu objetivo interacional, estando

entre eles: uma carta de solicitação de patrocínio a alguns proprietários de estabelecimentos

comerciais, um convite ao diretor e à uma coordenadora pedagógica da escola visando

entrevistá-los, um panfleto para anunciar espaço no jornal para divulgação de recados ou de

textos. Outros textos, como reportagem, pedido de donativos, artigo de opinião e cartões de

felicitação foram divulgados no referido jornal. Assim, entendo, conforme Bronckart (1999),

que as ações de linguagem são gêneros textuais-discursivos que resultam em textos. É nessa

direção que Machado (2008, p. 157) assegura que “[...] os gêneros discursivos são formas

comunicativas que não são adquiridas em manuais, mas sim nos processos interativos.”

Essa experiência de produção de textos com fins interacionais evidenciou, conforme

defende Geraldi (1997c), a existência de um interlocutor para tudo o que foi escrito e

publicizado. A análise de alguns exemplares dessas produções consta no próximo item do

presente capítulo.

Ao finalizar a execução da primeira unidade de trabalho elaborada para a

intervenção, eu e a professora da turma decidimos redimensionar a segunda unidade, a qual já

estava organizada, considerando que o ritmo dos alunos para desenvolver as atividades foi

mais lento do que eu havia suposto ao planejar esse trabalho. Nesse sentido, lembro que a

maior parte desses alunos apresentava muitos problemas em relação à compreensão e à

produção de textos, fator este que exigiu intenso acompanhamento individual, tornando,

assim, o desenvolvimento das atividades mais moroso do que o previsto. Outras vezes, o

interesse do aluno por alguns temas, ou atividades, também requereu uma disponibilidade de

tempo maior do que o planejado para realizá-las. Lembro, também, de alguns imprevistos que

exigiram a dispensa de aulas, a exemplo de pequenas paralisações dos profissionais da escola

como forma de alerta ao governo do Estado a respeito de algumas medidas autoritárias

tomadas por ele, ou mesmo para fazer alguma reivindicação.

É preciso dizer, ainda, que os problemas disciplinares, em parte já comentados no

item Sujeitos e cenário da pesquisa, mas principalmente no apêndice A, atrapalharam o

Page 169: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

168

rendimento das aulas, embora essa questão já estivesse bem melhor no segundo semestre,

tendo em vista que os alunos passaram a envolver-se mais nas aulas que se pautavam,

sobretudo, em atividades sociodiscursivas que visavam a produção do jornal da escola.

Assim, optamos por não desenvolver os dois primeiros itens da segunda unidade de

trabalho que constam no apêndice F, os quais propunham conhecer uma unidade de saúde

localizada próxima à escola, bem como os principais problemas do bairro, cujos

encaminhamentos planejados assemelhavam-se a alguns desenvolvidos na primeira unidade

de trabalho, como elaboração de convites, entrevistas, reportagens etc.

Entendo que teria sido importante voltar a explorar tais gêneros textuais-discursivos

como forma de aprofundamento, porém, optei por oportunizar, aos respectivos alunos, outras

experiências sociodiscursivas e, ao mesmo tempo, diversificar as produções para o jornal que

estava sendo elaborado. Lembro, inclusive, que dependendo do andamento de cada aula, eu e

a professora tomamos a decisão de desenvolver, apenas na oralidade, algumas das atividades

planejadas para serem realizadas por escrito, sobremaneira as relacionadas à análise

linguística, aliás, essa análise sempre foi secundarizada.

Na segunda unidade de trabalho, a ênfase foi dada para textos dos gêneros textuais-

discursivos divulgação científica e artigo de opinião, relacionados a temas do cotidiano do

aluno, os quais contribuem para a formação de um aluno crítico e conhecedor de seus direitos,

a exemplo do Programa Bolsa Família, da segurança alimentar e nutricional, da pirâmide

alimentar e da importância de atividade física.

Para estudar algumas particularidades referentes ao Programa Bolsa Família e à

pirâmide alimentar foi necessário, de forma interdisciplinar, refletir, também,

matematicamente, considerando-se as diversas variáveis que interferem para a definição de

valores que uma família pode receber do Programa citado, bem como as diferentes

possibilidades existentes para montar uma dieta saudável, seguindo a pirâmide alimentar. Ao

falar dessa dieta, foram mencionadas, ainda, as contradições existentes entre a necessidade de

termos uma alimentação saudável e a precária situação econômica de grande parte da

população brasileira.

Os textos de divulgação científica, utilizados para esse trabalho, foram publicados no

jornal da escola. Decorrentes da exploração dessas temáticas foram publicados outros dois

textos dessa modalidade, sendo um de autoria da aluna “A” e outro produzido coletivamente

pelos alunos da Sala de Apoio. Além desses, houve outras publicações: a professora dessa

sala publicou, no referido jornal, um sobre a violência escolar; uma aluna de oitava série

divulgou outro sobre a necessidade de respeitar o professor; uma professora de Arte publicou

Page 170: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

169

um texto sobre a arte africana, enriquecido por fotos de trabalhos de alunos; uma professora

de Língua Inglesa divulgou seu projeto de pesquisa que estava sendo desenvolvido durante

sua participação no Programa de Desenvolvimento Educacional, promovido pela Secretaria

de Educação do Estado do Paraná, intitulado Ludicidade e avaliação, entre outras

publicações.

Com base nesses encaminhamentos, a intervenção realizada na Sala de Apoio em

questão, pautou-se nos pressupostos teóricos da concepção interacionista de linguagem, cujo

encaminhamento foi viabilizado pela exploração de gêneros textuais-discursivos. Assim, para

a concretização do suporte jornal, que foi o alvo dessa intervenção, foram estudados,

produzidos e encaminhados textos de vários gêneros, respeitando suas respectivas formas e

funções. Nesse contexto, ressalto, conforme já afirmei, que muitas ações demandaram a

utilização da escrita, tais como: contato com autoridades da escola, com alunos de outras

turmas e com pessoas da comunidade.

Particularmente, os contatos com o diretor e com uma coordenadora pedagógica da

escola campo de pesquisa, na busca de informações para serem divulgadas no jornal em

questão, possibilitou o estudo de vários gêneros textuais-discursivos, entre eles o convite, a

resposta do convite, a entrevista, a síntese e a reportagem. Dessa forma, as atividades escritas

não constituíam-se em simples exercícios vazios de significado, mas faziam sentido para os

alunos e estavam inter-relacionadas.

Observo que, em cada produção, na maior parte das vezes, sorteava-se apenas um

exemplar para ser encaminhado ao destinatário ou para ser publicado no jornal, o qual era

reestruturado coletivamente no quadro-de-giz.

4.2.2 Análise das produções textuais dos alunos

No presente tópico, analiso algumas produções textuais dos alunos elaboradas no

período de intervenção realizada durante a pesquisa de campo, sobretudo no tocante à função

social da escrita: gênero/situação social, correspondente à primeira parte da tabela

diagnóstica constante no anexo D, de autoria de Terezinha Costa-Hübes (2008), intitulada

como Critérios de análise linguístico-discursiva.

Nesse sentido, procuro verificar, prioritariamente, se tais produções, que

correspondem a um gênero textual-discursivo, atendem à necessidade de interação

estabelecida, bem como se estão adequadas à esfera de circulação, se são coerentes ao

formato do gênero, se abrangem, satisfatoriamente o tema, se o domínio da capacidade de

Page 171: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

170

linguagem que o gênero requer é satisfatório, entre outras questões, porém, sempre

relativizando, por considerar que seus autores eram alunos de quinta série que frequentavam

uma Sala de Apoio.

Secundariamente, contemplo alguns aspectos estruturais desses textos, que

constituem a segunda parte da referida tabela diagnóstica, sobremaneira os que estão

relacionados à coerência textual, a exemplo da utilização de ideias não contraditórias e sua

respectiva progressão, compreendendo que elas podem comprometer a textualidade e,

consequentemente, a viabilização da interação a ser estabelecida a partir dos respectivos

textos.

Conforme já afirmei, essas produções visavam à construção de um jornal da escola.

Nessa unidade, elas estão precedidas dos respectivos encaminhamentos metodológicos que as

geraram.

Antes mesmo de iniciar essa análise, ressalto que, para além dos limites que aponto

nos textos que seguem, eles atendem, em grande parte, aos propósitos interacionais, ou seja,

essas produções textuais podem apresentar problemas em sua organização linguística, mas

possuem potencial sociodiscursivo e interacional, o que deve ser muito valorizado,

considerando o nível de ensino desses alunos. Também destaco que eles se engajaram para

produzi-las.

4.2.2.1 Carta de solicitação de patrocínio

Na primeira aula, a partir da intervenção na Sala de Apoio, foi explorado, com os

alunos, o suporte jornal. Para isso, cada discente analisou um exemplar observando a

estrutura, as diferentes modalidades de texto que o constituía, a abrangência dos diferentes

jornais e a necessidade de eles serem patrocinados, bem como foi feito um levantamento dos

jornais que existiam na cidade.

Posteriormente, foi estudado, com os alunos, o gênero textual-discursivo

propaganda, de forma articulada à ideia de patrocínio de um jornal. Na sequência, assistimos

ao filme Central do Brasil na busca de uma melhor compreensão da função social do gênero

textual-discursivo carta, objetivando prepará-los para a produção de uma carta de solicitação

ou pedido a um gerente de um estabelecimento comercial, localizado próximo à escola, a fim

de conseguir colaboração para o patrocínio do respectivo jornal que acabava de ser planejado.

Para isso, foram explorados, com os alunos, os itens fundamentais que precisam constar em

uma dessas cartas/pedidos, na direção do que Geraldi (1997c) defende para a realização de

Page 172: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

171

qualquer escrita: que se tenha um motivo para escrever, no caso, para fazer uma solicitação,

que se tenha um destinatário e que se pense numa forma de encaminhamento. Também foi

orientado sobre a necessidade do remetente ser identificado e indicada a sua procedência,

sobretudo porque foi combinado que aguardávamos uma resposta por escrito, portanto, esses

dados do remetente são fundamentais para a viabilização da interlocução entre as partes

envolvidas. Foi analisada, ainda, a importância de agradecer a atenção e combinado que o

valor a ser solicitado seria entre dez e quinze reais28.

Além de explorar, intensamente, essas questões na oralidade, foi estudado um

pequeno texto de divulgação científica sobre carta de solicitação ou pedido e utilizado o

dicionário para melhor compreender algumas palavras que ele continha, inclusive fazendo

registros nos dicionários particulares, recém-confeccionados pelos alunos.

Também com o objetivo de buscar a compreensão do texto, foram desenvolvidas

duas atividades de análise linguística. Destaco, aqui, uma delas, extraída do apêndice E:

Leia o último parágrafo copiado a seguir: “Para finalizar o pedido é oportuno que seu emissor agradeça, que registre o local e a data, bem como que o assine.” Que palavra a parte destacada está substituindo?

Essa intensa exploração do gênero em questão, contribuiu para que os alunos

compreendessem o objetivo da carta de solicitação que escreveram e, consequentemente, o

seu teor interacional. Assim, percebi que essa produção não foi tão penosa para eles quanto

foram as que produziram no primeiro semestre e o fizeram até com satisfação. No entanto,

cabe destacar que, na oralidade, alguns alunos elaboraram essa carta de forma espontânea e

rápida, mas, para registrá-la, estavam inseguros, parecendo temer esse momento, pois

consideravam esse registro algo muito complexo.

Antes de encaminhar a carta reestruturada coletivamente, no quadro-de-giz, para os

destinatários, os alunos a analisaram, também, quando já estava digitalizada e a dobraram em

três partes para colocar em um envelope, o qual eles mesmos o preencheram, seguindo uma

listagem de destinatários organizada previamente, onde continha os dados das possíveis

empresas patrocinadoras, na direção da seguinte defesa de Bakhtin (2011, p. 301): “Um traço

essencial (constitutivo) do enunciado é o seu direcionamento a alguém, o seu

endereçamento.” (Grifos do autor). Aliás, era fácil perceber a satisfação deles por verem que a

28 A direção da escola orientou que as cartas de solicitação deveriam ser encaminhadas via instituição e que, deveria ser fornecido um recibo, emitido por ela, para cada valor recebido. Assim, essas cartas foram entregues pela professora e pesquisadora, acompanhadas por um grupo de alunos.

Page 173: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

172

carta que produziram estava cumprindo seu objetivo, ou seja, que a partir dela, estavam

interagindo com alguém.

Os administradores de algumas empresas contatadas anunciaram a colaboração

quando da primeira visita a eles, não se propondo a organizar a resposta por escrito, conforme

solicitado; em outras, que demoraram a enviar as respectivas respostas, fizemos nova visita,

momento em que também aproveitamos para coletar os cartões desses estabelecimentos para,

após, serem divulgados no jornal.

A aluna “F”, ao escrever sua carta, contemplou vários aspectos do formato desse

gênero textual-discursivo, tendo conseguido, de certa forma, realizar esse pedido por escrito,

apresentando, ainda que superficialmente, o respectivo motivo, além de agradecer, solicitar

uma resposta e assiná-lo. Portanto, seu texto, mesmo com alguns limites apontados na análise

que segue, contempla aspectos interacionais, conforme é possível perceber em sua cópia

trazida a seguir29.

Figura 28 – Carta aluna F

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

29 Informo que, nos textos produzidos pelos alunos, para garantir que tanto eles quanto os profissionais da escola, bem como a própria instituição não fosse divulgada, seus nomes foram retirados e, no lugar deles, foi indicado, entre parênteses, o que o aluno havia escrito; outras vezes foram deixados alguns pontilhados. Alerto que nessa unidade isso ocorreu várias vezes, pois a maior parte dos textos tinha um destinatário efetivo e um remetente situado na referida escola.

Page 174: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

173

No entanto, se essa carta tivesse sido enviada da forma como foi produzida, o

desejado recebimento da resposta do gerente da empresa a quem a aluna se dirigiu ficaria

comprometido, pois ela não informou o nome e o endereço da escola a que pertencia.

Objetivando ajudá-la, mas interferindo em sua autoria e tolhendo a oportunidade de a aluna

aprimorar sua produção, foi sua professora quem informou que esse pedido partia da Sala de

Apoio do Colégio X. Contudo, mesmo assim ficariam dúvidas quanto ao remetente, uma vez

que, nesse estabelecimento de ensino, havia mais uma dessas salas de quinta série no período

matutino e outras duas no vespertino, bem como duas de oitava série. Assim, o fato de a

autora ter registrado seu nome no final do pedido (assinado), caso ele tivesse sido enviado ao

destinatário, em quase nada contribuiria para que esse descobrisse a que instituição de ensino

ela pertencia, afinal, ela era uma aluna em meio a centenas de estudantes. Posteriormente, ela

falou que acreditava que sua assinatura viabilizaria a interlocução. A discente também não

explicitou o nome da empresa a que estava direcionando sua carta, nem mesmo o nome do

gerente. Nesse sentido vale lembrar, conforme Bakhtin (2011), que todo enunciado tem autor

e destinatário.

Cabe ressaltar ainda, que por tratar-se de uma solicitação, há a necessidade de

argumentá-la e de contextualizá-la na tentativa de convencer o gerente da empresa a atendê-

la. Assim, como a capacidade de linguagem do argumentar e do expor foram pouco utilizadas

pela maior parte dos alunos, indicando ser algo que deveria ser trabalhado com eles, optamos

por explorá-las no momento da reestruturação coletiva de uma dessas cartas.

No tocante à falta de coerência, destaco que seu texto, embora tenha sido assinado,

ficou relativamente confuso em relação a quem estaria fazendo o pedido, uma vez que a aluna

o iniciou utilizando a primeira pessoa do singular, contudo, ao agradecer e pedir retorno, ela o

fez no plural. Afinal, quem estava fazendo tal pedido? No entanto, ressalto que esse tipo de

problema é rotineiro até em produções de alunos universitários, portanto, para uma aluna de

quinta série que frequentava uma Sala de Apoio e que ainda estava a caminho do processo de

apropriação da escrita, essa situação, embora prejudique parcialmente a interlocução, não

pode ser considerada grave.

4.2.2.2 Convites

Os alunos foram orientados a elaborar um convite ao diretor da escola e outro para a

coordenadora pedagógica responsável pela Sala de Apoio em questão, a fim de que fossem

entrevistados para fornecerem informações sobre o andamento da construção do novo prédio

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174

para o colégio campo de pesquisa, bem como sobre algumas questões relacionadas ao

funcionamento e organização dessa instituição, consideradas importantes e úteis à

comunidade escolar.

Inicialmente os discentes foram levados a refletir sobre a função social do gênero

textual-discursivo convite, o que foi enriquecido pela análise de diversos exemplos que eu

havia levado para essa sala de aula, observando as respectivas especificidades: casamento,

formatura, aniversário, chá de bebê, chá de panela etc. A partir de cada convite, os alunos

localizaram alguns dados que continham: motivo de sua realização, quem estava convidando,

quem estava sendo convidado, data e local do evento, se havia o pedido de confirmação de

presença, se estavam ilustrados coerentemente etc., o que os levou a perceberem as diversas

informações que um texto desse gênero textual-discursivo deve conter, bem como a sua

forma.

a) Análise de um convite ao diretor da escola

O convite a seguir, embora pouco contextualizado e com algumas lacunas, atende à

importante necessidade de interação estabelecida entre o diretor da escola e os alunos da Sala

de Apoio em questão, haja vista que está claro quem foi convidado, ainda que sem saber, com

precisão, se o entrevistado seria ele. Também foi informado onde seria o evento e quem

participaria dele, além da data e de um possível local para a sua realização. Portanto, essa

produção foi muito valorizada junto à aluna.

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175

Figura 29 – Convite aluna E

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Embora a autora desse convite não o tenha assinado, no primeiro parágrafo fica

implícito que se tratava de um aluno ou de uma aluna de uma Sala de Apoio. Contudo, como

no texto anterior, a dúvida ainda se fez presente quanto à identificação dessa sala. A

informação mais precisa quanto a isso foi a de que seria no período matutino, o que induz

para que se pense que seria em uma das Salas de Apoio que funcionavam nesse período.

Vale observar que, em um momento, a discente informou que a presença do diretor

seria importante para toda a turma, porém, na sequência, afirmou que ela ficaria feliz se ele

comparecesse. Houve, portanto, mais de uma vez, uma mescla de singularidade e de

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176

representação de um coletivo, o que pode deixar o referido diretor confuso sobre a autoria de

tal correspondência.

Esse convite também aponta para a necessidade de realizar novos estudos em relação

à adequação do texto à esfera de circulação, haja vista que sua autora usou um caráter bastante

informal para dirigir-se ao diretor de sua escola, por escrito. Porém, conhecendo a relação

entre ambos, entendo que o clima cordial e de amizade que existia entre eles não a fez

perceber que, formalmente, a relação deveria ser diferente, embora tenha sido chamada a

atenção para esse fato antes da realização dessa produção, inclusive com exemplos. Nesse

sentido, a referida aluna, no início do convite, usou o pronome de tratamento você e, em outro

momento, ela mudou tal pronome por senhor.

A informalidade manifestou-se, ainda, quando ela afirmou que ficaria “alegre” com

seu aceite. Ela também não lembrou de qualificá-lo, nem mesmo no vocativo, chamando-o

simplesmente pelo nome precedido da palavra diretor.

A discente em questão, ao escrever “Pedir que confirme por escrito”, apenas copiou

essa orientação registrada no quadro-de-giz, pela professora, ao invés de interpretá-la para,

após, adaptá-la ao texto, o que pode prejudicar a compreensão, por parte do diretor, sobre o

que deveria fazer.

b) Análise de um convite a uma coordenadora pedagógica da escola

O convite elaborado para uma coordenadora pedagógica da escola, a fim de que ela

concedesse uma entrevista aos alunos da Sala de Apoio de quinta série, do período matutino,

teve por base uma produção textual-discursiva do mesmo gênero, recém-abordada, a qual

havia, inclusive, sido analisada por eles também após sua digitalização, favorecendo a

observação de sua estrutura. No entanto, mesmo com esse exemplar para apoiar-se, alguns

alunos tendiam a não observar o espaçamento entre as partes que compõe um texto desse

gênero, inclusive sem fazer parágrafos quando era necessário, situação esta que não ocorreu

com o aluno B, conforme é possível verificar em sua produção copiada a seguir.

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177

Figura 30 – Convite aluno B

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Assim que os alunos foram convidados a produzir esse convite, logo passaram a

folhear seus cadernos para procurar o que já haviam elaborado, inclusive, aquele que havia

sido reestruturado, coletivamente, para ser enviado ao diretor da escola. Dessa forma,

mantendo os principais itens estruturais do convite já pronto, a maior parte dos alunos apenas

atualizou os dados, o que facilitou a relação dialógica com a coordenadora pedagógica

mencionada.

Page 179: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

178

Essa atividade, além de viabilizar outro importante momento de interlocução com

uma autoridade da escola, conforme a concepção interacionista de linguagem, contribuiu para

uma retomada desse gênero textual-discursivo. Isso foi significativo para o aprendizado dos

alunos porque, embora estivessem motivados com a produção do jornal da escola, a qual

passou a dar um outro destino aos textos que escreviam, dificilmente aceitavam refazer suas

produções para aprimorá-las, pois estavam acostumados apenas a passá-las a limpo após uma

correção feita pela professora que, na maior parte das vezes, era realizada junto a eles,

seguidas de breves explicações.

Nesse convite elaborado pelo aluno “B”, como no anterior, também ficou a dúvida

quanto ao papel da coordenadora pedagógica na entrevista anunciada, comprometendo

parcialmente a interlocução. Afinal, ela seria uma espectadora ou a pessoa a ser entrevistada?

Também faltou informar o tema e o objetivo de tal entrevista, o que evidencia que as

capacidades de linguagem do expor e do argumentar precisam ser mais exploradas em sala de

aula.

No presente texto, o referido aluno, além de anunciar a realização da entrevista,

informou a data, o local, o horário, bem como quem eram os autores do convite, no caso, toda

a turma da Sala de Apoio, embora sem especificar qual seria a sala dessa modalidade e o

nome do colégio a que essa sala pertencia. Tais dados são necessários para a realização da

respectiva ação, pois constituem aspectos estruturais e funcionais do gênero textual-discursivo

convite. Cabe mencionar, também, que a forma utilizada pelo discente para iniciar essa

correspondência foi pouco apropriada para a esfera de circulação, sendo muito informal, além

de pouco elegante, ao usar a expressão “Queremos que você compareça [...].” Essa situação,

posteriormente, foi analisada com os alunos.

Destaco que, tanto o diretor quanto a coordenadora pedagógica responderam aos

respectivos convites por escrito. Tais respostas foram amplamente analisadas com os

discentes, sobretudo em relação ao propósito comunicacional interacional.

4.2.2.3 Roteiros de entrevista

O gênero textual-discursivo entrevista foi explorado a partir da constatação de que

era necessário buscar informações, junto ao diretor e a uma coordenadora pedagógica da

escola, sobre algumas particularidades dessa instituição e sobre o andamento da construção de

um novo prédio para o seu funcionamento, a fim de subsidiar a produção de duas reportagens

atualizadas e úteis à comunidade escolar, cuja produção está contemplada no próximo item.

Page 180: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

179

Inicialmente, os alunos expuseram o que entendiam por entrevista. Na sequência,

estudaram um texto de divulgação científica sobre esse gênero textual-discursivo, o qual foi

explorado, junto a eles, com base em alguns pressupostos defendidos por Hoffnagel (2007) e

Silva (2009), os quais foram apresentados no terceiro capítulo. Após, analisaram uma

entrevista que já havia sido realizada, bem como elencaram, coletivamente, vários itens para

serem indagados aos dois profissionais da educação mencionados. Para essa atividade, o

quadro-de-giz foi dividido ao meio para registrar, separadamente, o que deveria ser

questionado a cada um dos entrevistados. Posteriormente, elaboraram as respectivas

perguntas, selecionaram-nas, organizaram-nas sequencialmente e distribuíram-nas entre si,

considerando que cada aluno faria uma, de preferência a que havia elaborado.

Os discentes foram orientados a fazer pequenos registros com base nas respostas às

perguntas feitas aos entrevistados, sobretudo referente à questão que coube a cada um realizar.

De um modo geral, envolveram-se com essa atividade com atenção e curiosidade, inclusive os

menos participativos, pois percebiam, claramente, que as questões que elaboraram para essa

entrevista, uma vez proferidas para um interlocutor, produziam um efeito, uma resposta.

Assim, os aspectos interacionais dessa ação foram amplamente vivenciados. E, para além

disso, também sabiam que tais respostas seriam utilizadas para a produção de duas

reportagens.

Compreendo que os dois roteiros30 de entrevista, trazidos a seguir (a e b), elaborados

por vários alunos da Sala de Apoio em questão, são coerentes à situação interacional

planejada e abrangem satisfatoriamente os temas planejados. O primeiro dirigiu-se ao

respectivo diretor, com o objetivo de obter informações sobre o andamento da construção da

nova sede do colégio, inaugurada no ano seguinte à realização dessa entrevista. Esse roteiro

também objetivou buscar dados sobre as diferentes dependências que esse colégio passaria a

oferecer e, como decorrência, a explicitação de possíveis mudanças na sua organização e no

atendimento aos alunos, a exemplo de novas oportunidades viabilizadas a eles, comparando

com a precária estrutura e organização dessa instituição em 2011, além de outras informações.

a) Roteiro da entrevista realizada com o diretor da escola

- O que está faltando para o novo colégio ficar pronto? (Aluna “L”)

30 Optei por deixar esses roteiros no corpo deste trabalho para seguir o padrão dos demais textos dos alunos e por considerar que, nesse local, eles facilitam o entendimento das reportagens produzidas a partir da realização dessas entrevistas.

Page 181: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

180

- No novo colégio vai ter uma sala para a biblioteca? (Aluna “K”) - Prezado diretor: na nova escola terá laboratórios? O que mais vai ter? (Aluna “A”) - Vai aumentar o número de alunos? (Aluna “L”) - No novo colégio haverá vagas para quantos alunos em cada período? (Aluno “N”) - Haverá aula também à noite? Para que turmas? (Aluno “M”) - Os alunos de pré à quarta séries também irão estudar no novo colégio? (Aluno “H”) - Depois da inauguração será preciso contratar mais funcionários? Para que setor? (Aluno “G”) - (Nome do diretor) os adolescentes que já estudam na escola terão suas vagas garantidas? Explique para nós. (Aluna “F”) - Vai continuar o mesmo diretor? (Aluno “B”) - E a vice-diretora vai ser a mesma? (Aluna “A”) - Na nova escola os professores serão os mesmos ou serão trocados? (Aluno “D”) - Terá portão eletrônico e guardas? (Aluno “I”) - Quando vai ser a inauguração da escola (nome da escola)? (Aluna “J”) - Prezado diretor (nome do diretor), como vai ser a inauguração do novo colégio? (Aluno “C”)

O segundo roteiro, registrado na sequência, foi direcionado à coordenadora

pedagógica responsável pela Sala de Apoio investigada, o qual visou buscar informações

relacionadas a algumas situações de funcionamento da escola, necessárias para que os alunos

conhecessem mais o ambiente que frequentavam e as normas que precisavam seguir.

b) Roteiro da entrevista realizada com uma coordenadora pedagógica da escola

- Se um aluno que estuda na quinta série reprovar, qual será o seu destino já que no próximo ano (2012) não haverá mais quinta série? Explica para nós. (Aluna “E”) - Quando nós podemos levar o livro didático para casa? (Aluno “I”) - Quando um aluno precisa sair mais cedo da aula por não estar se sentindo bem, quem pode autorizar? É preciso avisar seus pais ou responsáveis antes? (Aluna “J”) - Se um aluno não conseguir média seis, no fim do ano, existe recuperação para ele tentar ser aprovado? (Aluno “M”) - Nós gostaríamos de saber qual é o número de faltas que pode causar a reprovação em uma disciplina. (Aluna “F”) - A partir de quantos minutos de atraso o aluno não pode assistir às aulas sem antes falar com uma coordenadora pedagógica? (Aluno “H”) - Depois de quantos atrasos de um aluno, à aula, seus pais devem ser avisados? (Aluno “G”) - Em que situações um aluno deve assinar o caderno de advertência? (Aluna “L”) - Qual é a data prevista para o encerramento das aulas desse ano (2011)? (Aluno “D”) - Prezada pedagoga (nome da pedagoga), por que só tem quinze dias de férias na metade do ano? (Aluno “C”)

Considero que os dois roteiros abordam, satisfatoriamente, os temas propostos, bem

como atendem, coerentemente, ao formato do gênero entrevista, o que facilitou a interação

estabelecida entre as partes envolvidas. A ordem das respectivas perguntas foi organizada

coletivamente, a qual favoreceu a articulação entre as ideias e sua posterior sistematização em

forma de reportagem.

Page 182: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

181

Cabe destacar que houve muito envolvimento dos discentes durante a realização das

entrevistas, inclusive vários deles fizeram outras perguntas além daquelas que haviam sido

planejadas anteriormente, o que até exigiu, por parte da professora, uma retomada do roteiro

para garanti-lo como prioridade, considerando o fato de que o tempo era limitado. De um

modo geral, eles tiveram muito interesse pelos assuntos abordados, a exemplo da situação dos

alunos de quinta série que reprovassem naquele ano (2011), já que, a partir de 2012, não

haveria mais essa série. Assim, eles foram informados que esses alunos ficariam retidos no

sexto ano e quem fosse aprovado seria promovido para o sétimo ano. Estavam confusos

porque em termos de número, parecia que haveria promoção mesmo para os que passassem a

frequentar o sexto ano.

Também houve muito interesse pela questão de que era necessário setenta e cinco

por cento de presença em cada disciplina para ser aprovado para a série seguinte. Nesse

sentido, eles buscaram maiores explicações sobre faltas à escola por motivo de doenças. Os

próprios alunos associaram o excesso de faltas ao Programa Bolsa Família. Ficou claro que

para poder ser beneficiado por esse programa é necessário cumprir uma frequência mínima na

escola. Assim, se uma criança ou um adolescente que usufrui desse programa for reprovado

por nota não perde a bolsa, mas se tiver muitas faltas sim.

4.2.2.4 Reportagens

Antes de os alunos produzirem as reportagens com base nas duas entrevistas

realizadas com autoridades da escola, apresentadas no item anterior, e nos correspondentes

breves registros, relembramos com eles que, no primeiro semestre daquele ano (2011),

quando eu observava/participava das aulas, eles localizaram um texto desse gênero textual-

discursivo em uma revista e o sintetizaram. Também retomamos o trabalho que fizeram, nesse

mesmo semestre, a partir da reportagem Vira-lata saiu de São José dos Pinhais para visitar

garoto no HC, explicitado na primeira metade do presente capítulo. Paralelamente a essas

retomadas, enfatizamos o que é uma reportagem, qual é o objetivo de textos desse gênero

jornalístico, na direção do que registrei no item 3.3 do terceiro capítulo, pautada em Baltar

(2004), Bueno (2011) e Faria e Zanchetta (2002).

Na sequência, em momentos diferentes, cada aluno elaborou duas reportagens, sendo

que a primeira teve como referência as informações obtidas por meio da entrevista com o

diretor da escola e, a segunda, com uma coordenadora pedagógica da mesma instituição. Ao

produzir tais textos, a maior parte dos discentes procurava conferir os dados fornecidos pelos

Page 183: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

182

dois entrevistados. Após a elaboração dessas reportagens, sorteamos uma de cada para ser

reestruturada coletivamente, as quais foram publicadas no jornal produzido pela Sala de

Apoio. Essas produções e os respectivos encaminhamentos contribuíram muito para que os

alunos percebessem o seu caráter dialógico, coerente com a concepção interacionista de

linguagem.

a) Reportagem sobre a nova construção do Colégio X

A aluna “K”, autora da reportagem a seguir, a qual foi elaborada com base nas

respostas da entrevista realizada com o diretor da escola, embora com problemas de contexto,

de estrutura, de progressão e de coesão, conseguiu registrar algumas importantes informações

com relativa clareza, atendendo, parcialmente, às condições de interação, situando, inclusive,

quem emitiu as informações que registrou e o número de alunos que haverá a mais, na escola,

nos períodos matutino e vespertino. Entendo, também, que sua produção, de certa forma,

abrange o tema e, com pequenas adaptações, pode ser colocada em circulação.

Figura 31 – Reportagem aluna K

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Page 184: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

183

Cabe observar que houve uma breve contextualização do texto no respectivo título.

Em relação aos problemas de progressão, os quais prejudicaram a textualidade, na sétima

linha, por exemplo, a aluna registrou que “não terá perigo”, no entanto, não explicou o

porquê. Fez tal afirmação logo após ter informado que haverá muitos professores, passando a

impressão de que o motivo para não haver perigo seria esse. Em conversa posterior, ela

informou que quis associar essa ideia à primeira que registrou em seu texto: “O Diretor nos

esclareceu que terá guarda.” Situações como essa me reportam a Bakhtin (2011, p. 302), ao

lembrar que o destinatário pode não estar a par de determinada situação, inclusive não

dispondo “[...] de conhecimentos especiais de um dado campo cultural da comunicação.”

Portanto, para que um texto seja entendido, é preciso que haja articulação entre as ideias que o

constituem, bem como que essas ideias não deixem dúvidas quanto ao que está sendo exposto.

Contudo, é preciso lembrar que os alunos, sujeitos da pesquisa, frequentavam uma Sala de

Apoio principalmente para buscar mais aprimoramento na leitura e na escrita.

b) Análise de duas reportagens sobre o funcionamento do Colégio X

O aluno “I”, autor da reportagem que segue, elaborada com base na entrevista

realizada com uma coordenadora pedagógica da escola, demonstrou não entender que, caso

um discente de quinta série fosse reprovado no ano de 2011 (ano da realização da pesquisa de

campo), passaria a frequentar o sexto ano, pelo fato de corresponder àquela série. Assim, os

que fossem aprovados iriam, portanto, para o sétimo ano. Lembro que essa mudança foi

decorrente das adaptações necessárias para a normatização do Ensino Fundamental de nove

anos. Esse discente informou, na sétima linha, que se um aluno dessa série fosse reprovado,

este deveria cursar “de novo” o sexto ano.

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184

Figura 32 – Reportagem aluno J

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Também demonstrando não entender outra informação advinda da pedagoga, ele

registrou, na quinta linha, que se um aluno chegar três ou mais vezes atrasado seria reprovado,

ao invés de informar que, se esses atrasos ocorressem recorrentemente, seus pais deveriam ser

comunicados. No entanto, ele completou com uma informação coerente, afirmando que, no

caso de atraso, é preciso uma autorização, embora não tenha registrado a quem competiria

essa ação.

Além dessas questões de distorção de ideias, as quais prejudicam a compreensão do

conteúdo de tal reportagem, destaco a falta de contextualização das informações e, de forma

Page 186: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

185

especial, chamo a atenção para o penúltimo parágrafo, quando é afirmado que “É proibido

comer, brincar, atender o celular e não respeitar os professores etc.” Um leitor desse texto,

que não tenha acompanhado os trâmites de sua procedência (entrevista), dificilmente iria

entender onde e em que circunstâncias haveria tais proibições. Essa situação também vai ao

encontro da defesa de Bakhtin (2011), quanto à ponderação de que o leitor pode não ter os

dados necessários para entender determinadas afirmações, o que exige muita precaução no

momento de registrá-las.

Ao analisar esse texto junto ao seu autor, expliquei-lhe sobre essas questões

mencionadas, cujo novo entendimento contribuiu muito para a refacção coletiva da

reportagem de um colega, que fora sorteada para ser publicada no jornal da escola, sob o

título: Em entrevista, a Pedagoga Y nos informou sobre algumas normas do funcionamento

do Colégio X.

É preciso reconhecer que, mesmo sozinho, em meio a alguns problemas, esse aluno

conseguiu organizar, sem o auxílio de ninguém, algumas informações, entre elas a que não

haverá recuperação no fim do ano. Considero, assim, que ele está a caminho do processo de

desenvolvimento da escrita, paralelamente ao entendimento do gênero textual-discursivo

reportagem. E, como ele percebeu que os textos que ele escrevia, visando à produção do

jornal, tinha um objetivo social a cumprir, esse aluno passou a ficar cada vez mais motivado e,

portanto, avançou no que diz respeito ao domínio da escrita. Isso é relevante, tendo em vista

que vai ao encontro de um dos principais propósitos da intervenção.

Já a reportagem do aluno “D”, registrada na sequência, elaborada a partir das

mesmas informações do texto anterior, embora ainda apresente problemas, a exemplo da

descontextualização e da falta de progressão, traz algumas informações mais fidedignas

quanto ao destino dos alunos de quinta série que reprovassem em 2011, abrangendo,

satisfatoriamente, o tema. Essa produção já havia sido avaliada pela professora e passada a

limpo pelo aluno.

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186

Figura 33 – Reportagem aluno D

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Quanto à última informação da reportagem “não pode trazer brinquedos e celular

com o perigo dos professores pegar e só devolver para os pais das crianças”, esta não está

totalmente deslocada porque, no primeiro parágrafo, o autor afirmou que a pedagoga “veio na

Sala de Apoio”, o que pode ajudar o leitor a associar que era nas aulas dessa sala que não

havia permissão para levar tais objetos.

Embora com limites, entendo que essa produção atende a uma situação de interação,

haja vista que o respectivo autor, sabendo que o seu destino era o jornal, procurou sistematizar

algumas informações necessárias para o entendimento de algumas normas da escola,

pensando nos possíveis leitores desse veículo de comunicação, estando, assim, parcialmente

adequada à esfera de circulação. Compreendo que seu texto abrange o tema e expressa, de

forma fragmentada, o domínio da capacidade de linguagem do expor que o gênero requer.

Page 188: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

187

4.2.2.5 Cartões de felicitação

Como foi planejado com os alunos, no jornal da escola também foi organizada uma

seção de felicitações visando fazer algumas homenagens, entre elas: aos aniversariantes do

segundo semestre, aos pais, aos estudantes, às crianças, aos professores e aos demais

funcionários públicos pela passagem do seu dia31. Para isso, cada discente produziu um cartão

referente a um desses motivos, sendo que, teve, em média, duas produções de cada um deles.

Depois de produzidos, sorteamos um de cada motivo para compor a seção mencionada.

Para preparar os alunos para essa produção, foi conversado, com eles, sobre a

importância de felicitar as pessoas em momentos especiais e sobre as formas que isso pode ser

realizado. Na sequência, partimos para a análise de cartões com os diferentes motivos que eu

havia levado para essa aula, observando tanto as mensagens escritas quanto as ilustrações,

chamando sempre a atenção para os dados que um cartão dessa modalidade deve conter.

O cartão de felicitação que segue, direcionado aos estudantes pela passagem de seu

dia, comemorado em onze de agosto, atende, relativamente, ao caráter interacional do gênero

textual-discursivo cartão de felicitação, ficando claro, portanto, quem foram os

homenageados, bem como foi informado que quem homenageou foram os alunos da Sala de

Apoio, no entanto, ainda com dificuldade de expressar a relação dialógica coerente com a

concepção interacionista de linguagem, a exemplo do que já ocorreu em outras produções,

não foi especificada qual das Salas de Apoio da escola estava tomando tal iniciativa, além de

não ter sido informado o nome da escola.

31Dia dos pais: segundo domingo de agosto; dia do estudante: 11 de agosto; dia das crianças: 12 de outubro; dia dos professores: 15 de outubro; dia do funcionário público: 28 de outubro; dia de Natal: 25 de dezembro.

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188

Figura 34– Cartão de Felicitação aluna C

Fonte: Banco de dados da pesquisadora

É importante dizer que, embora a mensagem registrada nesse cartão e o desenho que

ilustra o verso de sua capa sejam mais utilizados em cartões de aniversário, essa produção

cumpre a função de lembrar e de parabenizar os estudantes pela passagem de seu dia. Assim,

e também por atender ao formato do gênero textual-discursivo, considero que tal cartão está

adequado à esfera de circulação.

A aluna “F”, por sua vez, ao escrever a mensagem para um cartão em comemoração

ao dia do estudante, copiada a seguir, preocupou-se em valorizar o que ele representa, ficando

implícita a ideia bastante difundida de que o estudo contribui para o desenvolvimento do país,

abrangendo, assim, satisfatoriamente o tema. Embora sem ilustração e, principalmente, sem a

informação quanto à autoria da homenagem, prejudicando o aspecto interacional, sua

produção aproxima-se ao formato do gênero textual-discursivo cartão de felicitação.

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189

Figura 35 – Cartão de Felicitação aluna F

Fonte: Banco de dados da pesquisadora

4.2.2.6 Panfleto

A exploração do gênero textual-discursivo panfleto ou folheto teve início a partir da

constatação de que era preciso divulgar, na comunidade escolar, a seção de recados ou o

espaço para outras publicações no jornal da escola que os alunos da Sala de Apoio em questão

estavam organizando, como, por exemplo, outros textos ou mensagens.

Em um primeiro momento, esses alunos analisaram vários desses exemplares

distribuídos na cidade, observando o que estava sendo divulgado por meio deles, ou seja, eles

foram levados a entender as situações de interação estabelecidas em cada panfleto, buscando

resposta a algumas questões, estando entre elas: Quem eram os responsáveis por tais

panfletos? A quem se dirigiam? Qual a mensagem que objetivavam passar? Quando? Onde?

Assim, nesse instrumento de interação, via linguagem escrita, estavam presentes um eu e um

tu e outros elementos, na direção da defesa de Geraldi (2009), no sentido de permitir a

intercompreensão.

A seguir, os alunos estudaram um texto informativo referente a esse gênero, seguido

de atividades orais e escritas que visavam à respectiva compreensão e, após, criaram,

individualmente, um panfleto, com o objetivo de divulgar, conforme já anunciei, a seção de

recados do jornal.

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190

Foram sorteadas duas dessas produções para compor o panfleto que foi distribuído a

toda a comunidade escolar, numa espécie de montagem (anexo B)32. Com esse material em

mãos, os próprios alunos, acompanhados de sua professora de Língua Portuguesa e por mim,

o distribuíram aos discentes em todas as salas de aula do período matutino do colégio campo

de pesquisa, bem como aos diferentes profissionais da escola, ao mesmo tempo em que

explicavam seu objetivo. Assim, a divulgação desse panfleto foi enriquecida pela oralidade.

À medida que eu e a professora da turma recebíamos as produções decorrentes da

distribuição desse panfleto, os alunos eram informados e partiam, com nossa ajuda, para o

levantamento do material que já estava disponível para a elaboração do referido jornal.

Na sequência, está copiado o panfleto produzido pela aluna “A”.

Figura 36 – Panfleto produzido pela aluna A

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

32A primeira produção desse anexo é de autoria da aluna “E” e, a segunda, do aluno “C”.

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191

Embora essa aluna não tenha especificado, por escrito, quem o panfleto pleiteava

atingir, nem informado quem eram seus autores e onde o material produzido para esse fim

deveria ser entregue, fatores que prejudicam a realização da interlocução, de certa forma,

distribuindo-o, ela viabilizaria, parcialmente, o caráter dialógico desse texto, haja vista que

informou o meu nome e o da professora da Sala de Apoio, a qual era muito conhecida na

escola, para sermos as receptoras de tal material.

No vocativo, a aluna apenas utilizou a palavra “Atenção”, sem especificar que esse

chamativo referia-se à comunidade escolar, o que abria a possibilidade para que os familiares

dos alunos, por exemplo, ao lerem o panfleto distribuído, também se sentissem convidados a

publicar algo no jornal.

O trecho desse texto, registrado a seguir, evidencia o caráter de anonimato desse

panfleto: “[...] queremos que você mande seus textos ou comunicados para nós colocarmos no

jornal.” Observo que, em nenhum momento, ela mencionou que tal texto partiu da Sala de

Apoio da quinta série do período matutino do referido colégio; só anunciou o nome do

colégio e o nome das pessoas que receberiam as respectivas produções.

No entanto, é oportuno destacar a clareza das ideias manifestadas ao registrar os dois

parágrafos que compõem seu panfleto, bem como a capacidade de síntese, necessária para

esse gênero textual-discursivo. Assim, abrangendo satisfatoriamente o tema, bem como

atendendo parcialmente ao formato do gênero e expressando certo domínio da capacidade de

linguagem do expor que o gênero requer, entendo que essa produção está, praticamente,

adequada à esfera de circulação.

4.2.2.7 Pedido de doação

Foi muito produtiva a retomada do gênero textual-discursivo carta de solicitação ou

pedido quando da elaboração do texto para solicitar doações de livros, revistas, jornais e papel

sulfite para a escola, a fim de contribuir para o desenvolvimento do trabalho pedagógico na

sala de aula, bem como doações de roupas e calçados usados para as famílias carentes da

comunidade em que a escola estava inserida.

Como planejamento para a produção desses pedidos, foi decidido, previamente, em

sala de aula, a quem eles seriam feitos, como nos apresentaríamos aos destinatários e que

justificativa daríamos para efetuarmos essas solicitações, na tentativa de convencê-los, via

linguagem escrita, sobre a importância dessas doações. Esse encaminhamento, considerando

as condições de produção e de circulação textual, foi em direção aos aspectos que Beth

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192

Marcuschi (2007, p. 63) lembra que devem ser contemplados quando o aluno vai escrever:

“[...] para quem, quando, sobre o que, com que objetivo escreve.” Paralelamente a essas

explicações, foi lembrado que, muitas vezes, nos jornais, é divulgado o pedido de doação de

sangue ou o pedido de ajuda para alguma instituição filantrópica. Na sequência, os alunos

preencheram uma tabela, respondendo às questões que nela constavam, a exemplo dos

registros do aluno “I”, que seguem.

Figura 37 – Orientações para a produção de um Pedido

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Após o preenchimento dessa tabela, a metade da turma elaborou o pedido com base

no primeiro motivo e, a outra metade, com base no segundo. Apenas um exemplar de cada foi

sorteado para ser reestruturado coletivamente a fim de ser publicado no jornal em questão.

Considero que, mesmo deixando pequenas dúvidas como as que são analisadas após

o texto a seguir, a aluna conseguiu fazer o pedido de roupas e calçados e, assim, instigou

possíveis leitores a praticarem a respectiva ação solicitada, utilizando, inclusive, argumentos

convincentes. Em síntese, ela demonstrou ter compreendido a função social da linguagem

escrita ao colocá-la em uso.

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193

Figura 38 - Pedido elaborado pela aluna K

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Para facilitar o entendimento desse texto, com base em diálogo com a respectiva

autora, transcrevo seu primeiro parágrafo: “Nós alunos da sala de apoio precisamos da ajuda

de vocês para dar um futuro para crianças etc.”

A partir do que está registrado na segunda linha do texto, é possível inferir que tais

doações seriam destinadas a crianças, no entanto, na penúltima linha, quando a aluna alertou

que “[...] pessoas lá fora também precisam ter um futuro [...]”, dá a impressão de que o

destino de tais doações não seria só para crianças. Também observo que, nesse pedido, a

autora não explicitou que esses produtos poderiam ser usados, ou seja, não precisariam ser

novos.

Entendo que essas dubiedades prejudicam, parcialmente, a compreensão por parte do

interlocutor, contribuindo, talvez, para que ele nem faça essas doações se entender que as

roupas e os calçados não podem ser usados. Ele também pode deixar de doar, se compreender

que esses produtos devem ser só para crianças, caso ele só tenha, à disposição, roupas e

calçados para adultos. Outro fator que poderia prejudicar a coleta desses donativos foi o fato

de que a respectiva autora não informou para qual das Salas de Apoio eles deveriam ser

encaminhados. Observa-se que para ajudar na interlocução, a professora acrescentou o

vocativo junto ao nome do bairro a que a escola pertence.

4.2.2.8 Textos de divulgação científica

Para explorar a segunda parte da segunda unidade de trabalho que elaborei para a

intervenção na Sala de Apoio, que visava entender algumas políticas sociais e questões afins,

os alunos, sobretudo, estudaram e produziram textos do gênero textual-discursivo divulgação

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194

científica, com o entendimento, conforme Becker e Giering (2009) de que textos desse gênero

visam socializar conhecimentos da ciência e da tecnologia.

Inicialmente foi conversado com os discentes sobre o Programa Bolsa Família: se

conheciam alguém que se beneficiava dele; se sabiam das condições para que uma família

pudesse recebê-lo; se conheciam os valores pagos por esse programa etc.

Para fundamentar essa conversação, a professora tomou por base os seguintes textos

de divulgação científica constantes na unidade de trabalho mencionada: O Programa Bolsa

Família; Valores dos benefícios pagos pelo Bolsa Família; As condicionalidades para usufruir

do Bolsa Família; O que é segurança alimentar e nutricional? A pirâmide alimentar e nossa

saúde; Importância da atividade física.

Esses textos foram amplamente explorados com respectivas leituras e realização de

atividades de compreensão, bem como foi utilizado o dicionário e desenvolvidas algumas

atividades de análise linguística, além da produção de textos relacionados a essas temáticas,

na perspectiva do que Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010) denominam de sequência didática.

O Programa Bolsa Família foi articulado ao Programa Fome Zero, no conjunto das

contradições das políticas sociais em uma sociedade capitalista como a brasileira, ou seja,

essas políticas, ao mesmo tempo em que são reconhecidas como necessárias, também

contribuem para a manutenção dessa organização social. Assim, paralelamente à busca de

entendimento desses programas, foi discutido sobre: as condições de vida de grande parte da

população brasileira e as prováveis causas; o valor do salário mínimo nacional; o Programa de

Segurança Alimentar e Nutricional – SAN; a necessidade de orientar nossa alimentação pela

pirâmide alimentar; o grande número de famílias brasileiras sem casa própria, acentuando a

dificuldade para viver dignamente; a precária formação do trabalhador; a falta de emprego; a

necessidade de formar um homem culturalmente sensível e crítico; a necessidade de

caminharmos em direção de maior justiça social etc.

Vale destacar que, em relação à alimentação, foram analisados outros fatores que

interferem na precária alimentação da atualidade, sem restringir-se à falta de condições

econômicas para poder usufruir de uma boa alimentação, mas que, de qualquer forma,

também são coerentes com interesses do capitalismo, haja vista que contribuem,

significativamente, para que as grandes empresas aumentem seus lucros. Dentre tais fatores

destaco a constante utilização de produtos industrializados em detrimento dos naturais, cujos

componentes, quando utilizados com frequência, como corantes, conservantes, aromatizantes,

gorduras saturadas etc., são prejudiciais à nossa saúde. Também é preciso considerar o quanto

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195

a troca de refeições saudáveis por sanduíches e pizzas, por exemplo, contribuem para a

obesidade e para a causa de diversas doenças.

Analiso, a seguir, dois textos do gênero textual-discursivo divulgação científica

produzidos por dois alunos, cujos títulos são: “Programa Bolsa Família” e “Como termos uma

boa alimentação.”

a) Texto: Programa Bolsa Família

A aluna “E”, ao produzir um texto do gênero divulgação científica sobre o Programa

Bolsa Família, copiado a seguir, em seu primeiro parágrafo, demonstrou sensibilidade ao

preocupar-se com as pessoas que não dispõem, constantemente, de recursos para alimentar-se,

o que indica, de certa forma, conforme a concepção interacionista, o entendimento de que a

escrita pode ser usada para registrar críticas, apontar caminhos, fazer solicitações, entre outras

ações.

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196

Figura 39 – Texto de divulgação científica produzido pela aluna E

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Após a reestruturação do segundo parágrafo, essa produção aborda,

satisfatoriamente, o tema, bem como atende, parcialmente, ao formato do gênero em questão.

No entanto, o agradecimento a Deus, feito pela aluna, demonstra um desconhecimento do que

é próprio ao gênero, da inadequação de uso decorrente do efeito do discurso religioso,

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197

extremamente condicionador, sobretudo nesses contextos de vivência. Lembro que ela

demonstrava, constantemente, sua fidelidade e gratidão a Deus, inclusive, seguidamente,

cantarolava músicas advindas dos cultos religiosos dos quais participava. É importante dizer

que, embora a escola deva ser laica, ela precisa estar aberta para os interesses e manifestações

dos alunos e respeitá-los, inclusive ser receptiva para outras diversidades. Contudo, isso não

significa deixar de explicar aos alunos a propriedade dos discursos, suas funções, espaços

discursivos onde os discursos religiosos devem circular etc.

Essa aluna, ao escrever o segundo parágrafo, o qual está assinalado, inicialmente o

fez apressadamente e, ao tentar registrar várias informações a respeito dos valores a que

crianças e adolescentes beneficiados por esse Programa tinham direito, não conseguiu fazê-lo

com coerência e coesão, o que, praticamente, não possibilitou a compreensão de suas ideias.

Porém, no momento em que a professora avaliou essa parte junto à essa discente,

ajudou-a a perceber tais inadequações textuais e, retomando os textos de divulgação científica

estudados previamente, utilizados como uma das formas de fundamentar esse tema, contribuiu

para que ela reconhecesse as limitações de seu parágrafo confuso, o que resultou na produção

de um novo, o qual pode ser considerado muito esclarecedor para os leitores do jornal a que o

texto se destinava, sendo que muitos deles até eram beneficiados pelo referido programa.

Portanto, a compreensão desse tema e seus desdobramentos são fundamentais para a formação

de alunos mais críticos, esclarecidos e preparados para acompanhar o cotidiano do qual fazem

parte.

Após a refacção do segundo parágrafo, entendo que a aluna usou, satisfatoriamente, a

capacidade de linguagem do expor. Inclusive, depois de concluído, ela considerava que seu

texto era esclarecedor e, assim, ele poderia fornecer boas informações às pessoas que o

lessem.

b) Texto: Como termos uma boa alimentação

O texto de divulgação científica a seguir, aborda, superficialmente, algumas questões

referentes a uma alimentação saudável, associando-a a temas como obesidade e exercícios

físicos.

Page 199: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

198

Figura 40 – Texto de divulgação científica produzido pela aluna J

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Sem basear-se no estudo sobre a pirâmide alimentar e no respectivo balanceamento

dos alimentos realizados antes da produção desse texto, essa autora citou alguns que devemos

ingerir e afirmou que não podemos comer muito a fim de evitar a obesidade ou para

emagrecer. Embora tenha sido a professora quem acrescentou o adjetivo “errada”, na primeira

linha do último parágrafo, a aluna lembrou de algumas doenças que uma alimentação com

essa adjetivação pode provocar.

Esse texto de divulgação científica poderia ser enriquecido junto à aluna, sobretudo

recuperando alguns aspectos relacionados à variação dos alimentos necessários a uma

ingestão saudável, associando-a, de preferência, aos estudos realizados a partir da pirâmide

alimentar, os quais contemplaram, inclusive, os aspectos relacionados à quantidade dos

diferentes alimentos que precisamos ingerir. No entanto, sua produção pode ser considerada

um primeiro momento de um texto de divulgação científica e muito valorizada, lembrando a

série que essa aluna frequentava e que estava buscando, na Sala de Apoio, uma forma de

avançar.

Page 200: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

199

4.2.2.9 Artigo de opinião

Dos gêneros textuais-discursivos trabalhados durante a intervenção na Sala de Apoio

em questão, o artigo de opinião foi o que os alunos encontraram mais dificuldades. Para

ilustrar, comento sobre uma atividade que consistia em levá-los a entender e a posicionar-se

frente a dois desses artigos que tratavam do mesmo tema, mas abordados com enfoques

diferentes. Confusos e sem perceber as contradições, mesmo após a leitura e a intensa

exploração desses artigos de opinião, alguns alunos afirmavam que concordavam com os dois

autores. No entanto, vale ressaltar que esse gênero é considerado difícil até por alunos

universitários, portanto, essa falta de compreensão mencionada deve ser entendida no

contexto dos alunos de uma Sala de Apoio. Assim, não considero que essa falta de

compreensão seja uma dificuldade, ela indica o início de uma caminhada a ser conquistada.

Após o trabalho com os dois exemplares mencionados, foi explorado, com os

discentes, um texto de divulgação científica intitulado Artigo de opinião, cujo estudo

contribuiu para que eles percebessem, ainda que superficialmente, a diferença entre um texto

desse gênero textual-discursivo e uma notícia, o que considero um grande avanço.

Evidenciando a dificuldade mencionada inerente a esse gênero, também é pertinente

lembrar que, ao produzir um artigo de opinião sobre as condicionalidades para as pessoas

participarem do Programa Bolsa Família, referentes às áreas da educação, da saúde e da

assistência social, a maior parte dos discentes, praticamente, só descrevia algumas exigências,

tal como estava no texto que estudaram, sem posicionar-se frente a elas, valendo destacar que,

antes dessa produção, houve intensa retomada de tais condicionalidades. Enfim, eles pouco

usaram a capacidade de linguagem do argumentar, a qual, conforme defendem Bräkling

(2000), Costa-Hübes et al. (2007) e Dóris da Cunha (2007), é uma das principais

características desse gênero, necessária para persuadir os leitores, no sentido de fazê-los crer

no ponto de vista do autor e criticar o dos outros. Reforço, no entanto, que essa constatação

deve ir ao encontro da ponderação recém-levantada a respeito da natureza complexa desse

gênero e do nível de aprendizagem da escrita dos alunos envolvidos.

A aluna “A”, autora de um texto desse gênero registrado a seguir, conseguiu utilizar,

ainda que superficialmente, mas significando um grande avanço, alguns breves argumentos,

conforme comentários que teci logo após sua produção.

Page 201: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

200

Figura 41 – Artigo de Opinião produzido pela aluna A

Fonte: Banco de dados da pesquisadora.

Page 202: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

201

Quanto à exigência das crianças beneficiadas por tal programa frequentarem a

escola, a aluna “A” argumentou que é uma forma de elas não fazerem coisas erradas, o que

revela as cobranças que vivencia em seu dia a dia.

Associado à assistência social, disse que há a preocupação para que as crianças não

fiquem em situação de risco e que não tenham doenças, principalmente as graves.

Em relação à saúde, argumentando sobre a exigência de estar com a vacinação

atualizada, ela registrou que isso é necessário “[...] para que não fiquem com uma doença

grave, pois o governo não quer isso.”

Para finalizar, com a ajuda da professora, ela defendeu que para ter uma adolescência

saudável e sem risco é necessário que o governo ajude e que as famílias colaborem.

Embora esse texto só tenha sido contextualizado pelo título, além de faltar uma

introdução e apresentar outros problemas estruturais, os quais considero normais para uma

aluna desse contexto, entendo que sua produção é um ensaio de um artigo de opinião,

apresentando, parcialmente, condições para ser entendido por seus interlocutores, pois, de

certa forma, abrange o tema e atende ao formato desse gênero. Aliás, após passar por algumas

refacções por parte da autora e enriquecido por uma reestruturação coletiva, esse artigo de

opinião foi publicado no jornal da escola.

Finalizando este tópico, reafirmo que as produções dos alunos recém-analisadas,

trazem o que é fundamental na linguagem escrita: potencial sociodiscursivo e interacional,

portanto, as ponderações que teci em cada uma dessas produções são indicativos de reflexão

junto à respectiva professora.

4.2.3 Reflexões sobre as ações de intervenção nas atividades de produção escrita

A realização da intervenção teve por meta levar os alunos a perceberem que as suas

produções escritas eram colocadas em situações de uso e, portanto, promoviam ações, as

quais, conforme já afirmei, visaram à produção do jornal da escola já mencionado. Nesse

sentido, pautada em Antunes (2009), Bakhtin (2011), Geraldi (1997c), Mendes (2008b),

Simioni e Costa-Hübes (2010) entre outros autores, procurei levar os alunos a entender o

objetivo interativo subjacente a cada uma de suas produções escritas ao serem postas em

circulação. Nessa perspectiva, reitero que os textos elaborados nesse período, ou foram

enviados imediatamente para os respectivos destinatários visando à realização de algum

encaminhamento para a produção do suporte jornal, ou foram nele publicados. Assim,

conforme Dutra (2012), os alunos foram entendendo que um texto, que constitui um gênero

Page 203: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

202

textual-discursivo, viabiliza uma prática de linguagem, uma atividade que se realiza com base

no princípio da interação. Nas palavras da autora (DUTRA, 2012, p. 248): “[...] entendemos

que a atividade de escrita envolve não só o próprio autor, mas um interlocutor e um conteúdo

(mensagem) que precisa ser compreendido.”

Nessa direção, muitos dos discentes da Sala de Apoio, sabendo que suas produções

escritas tinham um objetivo social a cumprir, passaram a realizá-las com mais seriedade,

inclusive fazendo um breve planejamento para isso. Aliás, a proposta da produção do jornal

foi cativante e desafiadora para eles, o que os envolveu nesse processo e, consequentemente,

as situações de indisciplina durante as aulas foram sendo, parcialmente, abrandadas. Contudo,

a realização desse trabalho demandou mais tempo do que o previsto por mim e pela respectiva

professora, logo, as duas aulas geminadas de Língua Portuguesa, em cada uma das duas

manhãs da semana, não possibilitava o desenvolvimento de muitas atividades com base em

sequências didáticas, nem chegar ao alvo principal que eram as atividades escritas com fins

interacionais. O que ficava para ser concluído na aula seguinte não era realizado com a

qualidade desejada, sobretudo porque os alunos eram muito faltosos, então, muitas vezes,

alguns não participavam da introdução de uma SD e outros de sua continuidade e/ou de sua

conclusão.

Essa morosidade, embora entendida como inerente a um trabalho dessa natureza,

nos deixava ansiosas (pesquisadora e professora), haja vista que se tinha por meta a produção

do jornal, a qual demandava um grande volume de atividades, tanto por parte dos alunos

quanto por parte da professora e pesquisadora. Essa produção dependia do desenvolvimento

de duas unidades de trabalho já mencionadas nesse e em outro capítulo, as quais precisavam

ser concluídas até o fim do ano letivo de 2011, principalmente porque no ano seguinte, muitos

alunos, por serem aprovados ou até por serem transferidos de escola ou de turno, poderiam

não frequentar mais aquela Sala de Apoio.

A intensa exploração oral dos textos de divulgação científica, e das demais atividades

realizadas durante a intervenção, facilitou a respectiva compreensão e, assim, os alunos

passaram a ter mais facilidade para entender o que era proposto e a responder o que era

solicitado, tanto de forma oral quanto de forma escrita e, consequentemente, ficavam mais

preparados para, posteriormente, realizarem as suas escritas. Dessa forma, posso afirmar que

as produções dos textos relativos a diferentes gêneros textuais-discursivos que os alunos

produziram foram amplamente debatidas, não apenas em relação ao tema e às respectivas

características, mas, mormente, quanto à sua funcionalidade. Porém, havia a preocupação, por

parte da professora, para que os alunos escrevessem mais e para que ficássemos menos tempo

Page 204: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

203

na oralidade. Contudo, os pequenos avanços que os alunos conseguiam, principalmente em

relação à compreensão dos aspectos dialógicos dos textos que produziam, contribuíram para

que ela fosse reconhecendo o quanto a intensa utilização da oralidade, tanto por parte dos

alunos quanto dos professores, é relevante para o desenvolvimento de qualquer atividade e, de

forma especial, para uma produção textual. Aliás, vale lembrar que um de meus objetivos

consistia em contribuir com o trabalho da professora.

Quanto às correções dos textos produzidos pelos alunos, a professora continuou

fazendo do tipo que Ruiz (2013) denomina de resolutiva, mas de forma menos intensa

comparando com as correções que realizou no semestre anterior. Nesse sentido, os textos

passaram a ficar mais limpos quando devolvidos aos alunos, tendo em vista que ela passou a

fazer tais correções a lápis e algumas na oralidade. Enfim, eles passaram a envolver-se mais

nesse processo de correção e, com isso, a professora passou a rasurar e a interferir menos em

seus textos, inclusive chamando mais a atenção para os aspectos de coesão e de coerência.

Mesmo assim, o estigma do erro continuou muito forte, tanto que muitos alunos tentavam

apagar ou disfarçar as correções feitas por ela. Porém, como eu conseguia acompanhar o

desenvolvimento de muitas produções, procurava, na oralidade, analisar, com eles, alguns

aspectos que comprometiam a interlocução e/ou a textualidade. Dessa forma, quando muitos

alunos dirigiam-se à professora com seus textos para serem avaliados, já haviam passado por

uma orientação prévia comigo e apresentavam, portanto, menos problemas para serem

revistos. Assim, meu trabalho junto aos alunos somou-se ao da professora, passando a sermos

duas atuando em auxílio de suas escritas, o que repercutia positivamente em suas produções.

A reestruturação de texto propriamente dita foi conduzida, coletivamente, a partir dos

que eram sorteados para encaminhar alguma ação para a organização do jornal ou para ser

nele publicado. Para isso, o texto era escrito em uma das partes do quadro-de-giz, já sem os

problemas ortográficos, considerados secundários e, na outra parte, ele ia sendo reelaborado

após ampla análise junto aos alunos, momento em que se procurava, por um lado, verificar se

atendia à necessidade de interação, ou seja, se estava explícito a quem o texto se dirigia, se

estava claro o que se pretendia dizer e se o tema estava contemplado. Por outro lado, também

verificavam-se as questões de organização textual, principalmente em relação à coesão e à

coerência das ideias, bem como se a variante linguística estava adequada para cada situação,

além da pontuação e da paragrafação.

Destaco, porém, que os alunos apresentavam certa resistência quanto à reestruturação

de seus textos, até por acharem que era muito trabalhoso. Eles preferiam que suas produções

escritas permanecessem intactas. Quando a reestruturação de um texto sorteado era feita de

Page 205: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

204

forma coletiva, eles se sentiam mais invadidos ainda. A maioria entendia que não deveríamos

alterar suas produções, aliás, a luta por essa aceitação foi um grande desafio. Porém,

lentamente, percebiam que o que era reescrito ficava cada vez mais articulado, com mais

sentido, o que os levava, por fim, a se sentirem orgulhosos de suas produções. Aliás, a partir

do segundo mês da intervenção, já era possível perceber um maior envolvimento dos alunos

nos momentos de reestruturação coletiva dos textos, realizada no quadro-de-giz, inclusive,

antes de concluir essa atividade, observavam se, em seus textos particulares, haviam

registrado outras informações relevantes que deveriam ser contempladas naquele momento

coletivo, principalmente porque sabiam que, de certa forma, cada texto reestruturado

coletivamente era encaminhado para cumprir uma função social e, geralmente, em nome da

turma toda. Inclusive, a constatação de que suas produções escritas seriam colocadas em uso

e que, para isso, elas precisavam, de fato, expressar o que queriam transmitir, é que

considero o grande ganho dessa intervenção. Assim, devagar, muitos alunos começavam a

perceber o propósito comunicacional interacional dos diferentes gêneros textuais-discursivos

e, com limitações justificáveis, considerando a sala que frequentavam, também começavam a

ficar mais à vontade para produzi-los. No entanto, alguns continuaram tendo dificuldades até

para entender as diferentes propostas de produção, a exemplo de dois alunos que, ao invés de

produzir o panfleto para divulgar o espaço para publicações no jornal da escola,

aleatoriamente, o fizeram como propaganda de uma loja.

A professora participante da pesquisa, ao ser questionada, em entrevista

semiestruturada, realizada em dezembro de 2011, sobre como ela via o rendimento dos alunos

após a intervenção, assim se manifestou:

[...] alguns alunos tiveram um bom avanço. [...] na leitura e interpretação melhoram bastante. [...] em um ano os problemas de escrita não são superados, deve ser uma atividade constante. Mas alguns alunos tiveram alguns avanços também na escrita. [...] eles passaram a gostar de leitura, sendo que no começo eles não queriam ler. [...] achei interessante o trabalho que você planejou com os gêneros textuais para a produção do jornal. [...] agora eles conseguem diferenciar uma carta, uma reportagem, uma notícia etc. [...] eles podem até não saber explicar, mas conseguem desenvolver, escrever.

Concordando com essas ponderações da professora, destaco que ela valorizou o

trabalho com os gêneros textuais visando à produção do jornal, mostrando, inclusive, alguns

avanços dos alunos a partir dele.

Cabe ressaltar que, alguns discentes, ao mesmo tempo em que achavam muito

trabalhoso e até desagradável produzir um texto, ficavam satisfeitos após produzi-los e,

Page 206: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

205

paulatinamente, passaram a sentir a necessidade de revisá-los. Entendo que isso deveu-se,

sobretudo, porque começaram a perceber que o que escreviam tinha um caráter dialógico. No

entanto, preciso reafirmar que, mesmo no fim desse processo de intervenção, suas produções,

embora possuíssem potencial sociodiscursivo e interacional, que é o alvo da concepção

interacionista de linguagem, continuaram apresentando muitos problemas, sobretudo

relacionados a aspectos de coesão, de coerência de paragrafação, de pontuação, de

sequência lógica etc., comuns a alunos de quinta série que frequentavam uma Sala de Apoio.

Afinal, conforme já afirmei, o processo de domínio da escrita é lento e cumulativo.

Assim, ao mesmo tempo em que admito o quanto foi proveitoso explorar os aspectos

interacionais dos gêneros textuais-discursivos, junto aos alunos, a fim de que exercitassem e

percebessem a linguagem escrita em situações de uso e que, portanto, o que escreviam

produzia uma ação, evidencio que não vejo esse encaminhamento como algo que possa

resolver todos os problemas de não domínio da escrita, mas reafirmo que considero um bom

recurso para contribuir para que o aluno avance nesse domínio.

Com a realização de muitas atividades para preparar a produção dos textos por parte

dos alunos, somada à morosidade com que eles as realizavam, o processo de produção do

jornal tornou-se lento. Isso os deixava angustiados e impacientes, pois queriam ver logo o

produto final concluído e posto em circulação, inclusive alguns chegavam a temer que o

jornal não ficasse pronto até o fim daquele ano letivo.

Porém, no penúltimo dia de aula, quando chegamos à Sala de Apoio com o jornal

impresso, foi um enorme misto de prazer e de sensação de dever cumprido, tanto de minha

parte quanto da parte da professora e dos alunos. Eles logo quiseram tocá-lo, folheá-lo. Em

seguida, tentavam localizar algumas particularidades do que haviam ajudado a planejar e a

produzir. Os que apresentavam dificuldade na leitura chegaram a ficar nervosos porque

demoravam a localizar o que procuravam, a exemplo da aluna “F” que desejava encontrar

uma poesia providenciada por ela.

Quando apresentamos a ideia de cada aluno da Sala de Apoio ficar com três

exemplares desse jornal, a aluna “A”, sentindo-se uma verdadeira autora empoderada,

afirmou e questionou: “Fomos nós que fizemos e vamos ficar só com três?”33 Essa observação

reflete a grande importância que a aluna atribuiu à essa produção, para a qual envolveu-se,

efetivamente. Percebia-se, inclusive, que ela se reconhecia, por meio desse jornal, como

33 Fala informal da aluna “A” durante uma aula, em novembro de 2011.

Page 207: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

206

interlocutora de muitos leitores. Essa compreensão, com certeza, contribuiu muito para que

ela reconhecesse, ainda mais, a função social da escrita.

Após esse primeiro contato, analisamos as partes que constituíam esse jornal, lemos

a parte introdutória e, a pedido deles, também lemos o texto sobre violência escolar de autoria

da professora de Língua Portuguesa da Sala de Apoio e um sobre drogas, escrito por uma

aluna de sexta série para o concurso de oratória, cujas escolhas revelam os temas preferidos

por aquele grupo de alunos pré-adolescentes.

Antes do término da aula, os discentes da Sala de Apoio, acompanhados por mim e

pela respectiva professora, entregaram o jornal aos alunos de todas as salas de aula do período

matutino, bem como aos professores e demais profissionais da escola. Alguns exemplares

foram reservados para a respectiva biblioteca.

Entendo que essa distribuição contribuiu para que eles percebessem que o que

produziram, ainda que de forma precária antes das reestruturações realizadas em sala de aula,

estava atingindo seu objetivo comunicacional interacional, estava chegando às mãos de outros

leitores, estava produzindo ações, como diz Geraldi (1997a).

Durante o recreio, após essa distribuição, alguns alunos produtores do jornal ficaram

indignados ao ver alguns exemplares jogados no lixeiro. Assim, recolhiam esse material e iam

nos procurar na sala dos professores para entregá-lo. Com esse descaso por parte de alguns

colegas, eles demonstravam sentir que o seu trabalho havia sido desrespeitado.

Esse amplo envolvimento com os gêneros textuais-discursivos para a produção desse

veículo de comunicação é um convite para a apreciação da seguinte afirmação de Antunes

(2009, p. 57): “Vale tomar os gêneros como referência para o estudo da língua e,

consequentemente, para o desenvolvimento de competências em fala, em escuta, em leitura e

em escrita dos fatos verbais com que interagimos socialmente.” No entanto, eles devem ser

vistos no movimento histórico que os constituem e, portanto, é importante que o aluno

domine tais gêneros até como uma forma de transcendê-los.

Os textos de diferentes gêneros textuais-discursivos, elaborados para viabilizar a

produção do jornal e, mesmo, para constituí-lo, embora não tenham apresentado muitos

avanços na qualidade estrutural desses textos, exalaram compreensão dos aspectos

sociodiscursivos e interacionais, que foi o que a intervenção objetivou.

Enfim, entendo que essas análises explicitam a contemplação do último objetivo da

pesquisa que gerou essa tese: Propor perspectivas de produção textual para os alunos da Sala

de Apoio que incentivem e orientem o uso da linguagem como prática situada de interação.

Page 208: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

207

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho partiu da preocupação com muitos alunos que chegam à fase

intermediária do Ensino Fundamental semialfabetizados, vítimas de um ensino mecanicista de

Língua Portuguesa, pautado nas concepções tradicionais da linguagem. Nesse contexto, meu

alvo de investigação foi uma Sala de Apoio de quinta série (sexto ano).

Diante dessa situação, na busca de colaborar para a amenização desse problema, após

investigar e conhecer a realidade de aprendizagem dos discentes dessa sala, desenvolvi, nela,

um trabalho de intervenção pautado nos gêneros textuais-discursivos, sobretudo a partir de

seus aspectos interacionais, objetivando oportunizar a esses discentes a exercitação da

linguagem escrita em situações de uso, convicta de que esse é o objeto de ensino da disciplina

de Língua Portuguesa. Paralelamente, procurei contribuir, teórico-metodologicamente, com o

trabalho pedagógico da respectiva docente.

A fim de tecer algumas reflexões finais sobre este trabalho realizado, retomo alguns

elementos das respostas às três primeiras perguntas de pesquisa34. Assim, situando as

características e mesmo os propósitos das produções dos alunos, posso inferir, com base em

Geraldi (1997c), e conforme descrevi na primeira parte do quarto capítulo, que nas aulas da

Sala de Apoio que observei e delas participei em maio e junho de 2011, os alunos, na maior

parte das vezes, produziam redações para a escola e não textos na escola. Afirmo isso,

sobretudo, porque suas produções não priorizavam a interlocução com outras pessoas além da

respectiva professora de Língua Portuguesa, a fim de que ela as corrigisse e as devolvesse

para que fossem passadas a limpo, sem haver um momento para a sua reestruturação.

Contudo, indo ao encontro da concepção teórico-metodológica dessa professora, é

importante destacar que, embora com algumas limitações já explanadas no capítulo

supracitado, ela priorizou, em suas aulas, o trabalho com textos, acreditando que quanto mais

os alunos liam e escreviam, mais desenvolviam sua capacidade para isso, o que revela uma

postura diferenciada, no sentido de estar comprometida com uma mudança no ensino de

Língua Portuguesa, na direção de superar as concepções tradicionais de linguagem. No

entanto, geralmente os textos eram mais utilizados como pretexto para que os alunos

34 De que modo e com quais características os alunos de uma Sala de Apoio de quinta série fazem suas produções textuais? Elas atendem a que propósitos? Em que condições de produção e de recepção os alunos produzem seus textos? Sob que perspectiva(s) teórico-metodológica(s) a professora dessa Sala de Apoio orienta e desenvolve as produções textuais dos alunos?

Page 209: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

208

produzissem outros sobre algo relacionado aos temas apresentados e alguns até para serem

utilizados para explorar a ortografia. Assim, suas produções restringiam-se, muitas vezes, a

exercícios de escrita em detrimento de atividades de interação, ou seja, pouco aproximavam-

se ao uso da língua escrita em situações discursivas. Dessa forma, considero que houve

insuficiente exploração do propósito comunicacional/interacional da maior parte dos gêneros

textuais-discursivos trabalhados durante o período em que observei/participei das aulas.

No mesmo viés, as condições em que os alunos produziam seus textos, indicam que

eles eram pouco preparados, no sentido de muni-los de conteúdos, de ideias, para então

registrá-las, sendo que, sobretudo, a oralidade era pouco utilizada para isso. Como

decorrência desses encaminhamentos, vários alunos, em conversas informais, apontaram que

não gostavam de escrever sobre algo que não entendiam, que não conheciam, que não

estavam preparados ou que achavam muito difícil. Essa situação, que pouco subsidiava os

alunos para a elaboração de textos, somada às dificuldades que apresentavam na leitura e na

escrita, pouco contribuía para que suas produções escritas fossem coerentes e coesas e que os

respectivos temas fossem devidamente abordados e contextualizados.

Esses diversos aspectos da prática pedagógica, que refletia, em parte, o que é

priorizado nos cursos de formação dos professores de Língua Portuguesa, foram os primeiros

alvos dos meus debates com a respectiva docente, os quais eram embasados, mormente, pelos

pressupostos teóricos e metodológicos da concepção interacionista de linguagem.

Quanto à leitura dos alunos, embora com pouco respeito à pontuação, apresentava

uma relativa fluência, mas, normalmente, ela se limitava à mera decodificação, sendo que a

maior parte deles não conseguia entender o que lia. Assim, quando esses discentes eram

questionados sobre as particularidades de um texto, visando a sua compreensão, muitas vezes

proferiam as respostas aleatoriamente, sem reflexão.

Era com essas limitações quanto ao entendimento dos textos estudados, os quais, na

maior parte das vezes, eram tomados como ponto de partida para a produção de outros, que os

alunos escreviam, o que revela, em parte, as condições em que produziam.

Percebendo a necessidade de mudanças quanto ao encaminhamento das aulas, a

própria professora, após um mês de minha observação/participação, ao devolver-me o

questionário respondido, anunciou que pretendia trabalhar com temas que fossem do interesse

dos alunos. No entanto, não levantou o debate sobre a concepção interacionista de linguagem

também apontada por ela nesse instrumento de geração de dados, entendendo que era essa

concepção que embasava o encaminhamento das aulas de Língua Portuguesa que ministrava.

Assim, não abordou a importância de levar o aluno a utilizar a linguagem escrita em situações

Page 210: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

209

de uso. Essa circunstância revelava, de certa forma, uma contradição entre a teoria anunciada

no referido questionário e a sua prática pedagógica junto aos alunos da Sala de Apoio em que

atuava, cuja situação continuava apontando para a necessidade de amplos debates entre mim e

ela, o que foi contemplado com a intervenção desenvolvida no segundo semestre de 2011.

Após a devolução desse questionário, também percebi, da parte dela, algumas

mudanças na correção dos textos produzidos pelos alunos, sendo que, a partir daquele

momento, buscando mais o sentido de suas produções, ela passou a dar mais atenção aos

problemas ligados à coesão e à coerência bem como a justificar mais para os alunos as

correções que fazia. Também destaco que, lentamente, a caneta vermelha utilizada para as

correções passou a ser substituída por uma caneta azul, o que seria irrelevante se essas cores

representassem apenas uma organização técnica.

Essas atitudes, por parte da professora, revelavam o seu interesse de mudança em sua

prática pedagógica, o que abriu ainda mais o caminho para a realização da intervenção

mencionada. Por outro lado, antes de iniciar esse processo, minha preocupação era intensa em

relação à expectativa de obter melhores resultados na produção escrita de tais alunos,

instigando-me a trazer, aqui, a última pergunta de pesquisa: É possível viabilizar um

encaminhamento teórico-metodológico alternativo que facilite, a esses alunos, o uso da

linguagem como prática situada de interação nos mais variados contextos sociais?

Assim, a intervenção junto aos alunos da Sala de Apoio foi realizada, sobretudo,

visando contemplar a essa pergunta, no sentido de buscar algumas alternativas para um

encaminhamento diferenciado para o ensino de Língua Portuguesa, na direção da concepção

interacionista de linguagem, via gêneros textuais-discursivos e, ao mesmo tempo, contribuir

teórico-metodologicamente com o trabalho pedagógico da professora, levantando caminhos

alternativos, mais produtivos e engajados à vida real dos alunos, para que eles pudessem,

junto com ela, avançar em sua competência de escrita, na perspectiva do que apontei ainda no

objetivo geral desse trabalho.

Esse encaminhamento foi ao encontro da defesa de Costa-Hübes (2009) ao lembrar

que uma forma coerente para assumir essa concepção de linguagem, em sala de aula, é o

trabalho com textos, compreendendo que eles constituem os diferentes gêneros textuais-

discursivos e que, conforme Bakhtin (2011), toda interação é social e situada em um

determinado momento histórico de uso da linguagem. Assim, a língua é efetivada na interação

quando o homem tem necessidade de se expressar, de se objetivar. Dessa forma, segundo o

autor, os discursos são produzidos conforme cada situação de interlocução surgida. Foi com

esse entendimento que, a partir da intervenção, a ênfase foi dada à produção de textos que

Page 211: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

210

efetivamente colocassem a linguagem escrita em situações discursivas, viabilizadas por um

conjunto de atividades que se aproximavam às sequências didáticas, conforme metodologia

proposta por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010), cujo alvo foi a produção de um jornal.

Portanto, embora os alunos tenham continuado a produzir, de forma predominante, textos

pouco articulados, compostos de frases incompletas e/ou incoerentes e com informações

repetidas, foram avançando na compreensão dos aspectos dialógicos de suas produções

escritas, bem como passaram a colocá-las, efetivamente, em circulação, o que lhes facilitou a

compreensão de sua função social.

Cabe destacar ainda, que mesmo após o término da intervenção, a maior parte dos

discentes continuou insegura para produzir textos. Mesmo assim, ainda que de forma precária,

tentavam fazê-lo, principalmente por saber que o que escreviam tinha um objetivo social a

cumprir. Alguns, inclusive, ao reler, para nós (professora e pesquisadora) o que produziam,

passavam a identificar, por exemplo, a falta de conexão entre algumas ideias de seus textos e,

por vezes, até tentavam reorganizá-los, tendo em mente que seu(s) interlocutor(es) deveria(m)

entendê-los.

Quanto aos problemas ortográficos ou de estrutura textual que os alunos continuaram

apresentando, é oportuno alertar que eles não podem ocultar a capacidade de síntese de muitos

discentes, expressa, de certa forma, nos textos com fins utilitários que passaram a produzir

durante a intervenção, o que contribuía para que suas produções escritas abrangessem o tema

proposto, e atendessem a uma necessidade de interação, como foi constatado em alguns de

seus textos analisados na segunda parte do quarto capítulo.

É importante lembrar que, durante a intervenção, a intensa exploração, por meio da

oralidade, dos textos de divulgação científica constantes nos Apêndices E e F, bem como as

demais atividades introdutórias para o desenvolvimento do trabalho com cada gênero textual-

discursivo, facilitou a compreensão dos temas abordados, o que preparava os alunos para,

posteriormente, elaborarem suas produções escritas e, consequentemente, a se sentirem mais

seguros para isso. Aliás, eles se sentiam importantes ao verem-se como organizadores de um

jornal e, ao mesmo tempo, autores ou colaboradores de algumas de suas produções. Assim, os

alunos foram entendendo que, além de estudar e produzir sobre temas importantes de seu

cotidiano, o faziam dirigido a um ou mais interlocutores, conforme planejamento prévio.

É oportuno retomar, no entanto que, de um modo geral, no tocante à qualidade

estrutural, os textos que os discentes produziam, mesmo no fim do ano letivo de 2011, eram

bem elementares sendo que, raramente, utilizavam conectivos e contextualizavam o tema, por

exemplo. Contudo, faço o importante destaque de que o trabalho desenvolvido nesse período

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211

contribuiu para que os alunos compreendessem a função social da escrita e ficassem mais

encorajados a utilizar-se dela em situações de interlocução, bem como que percebessem que é

possível utilizá-la de forma crítica. Essa constatação vai ao encontro do seguinte objetivo

dessa pesquisa: Propor perspectivas de produção textual para os alunos da Sala de Apoio que

incentivem e orientem o uso da linguagem como prática situada de interação.

Enriquecendo essa constatação, cabe ressaltar que a produção e circulação de textos

de diferentes gêneros textuais-discursivos realizadas pelos alunos para a produção do jornal

da escola, reitera seus avanços em relação à utilização da escrita em situações sociais, o que

vai ao encontro da seguinte afirmação de Luiz Antônio Marcuschi (2007, p. 35) sobre gêneros

textuais-discursivos: “[...] é uma extraordinária oportunidade de se lidar com a língua em

seus mais diversos usos autênticos no dia a dia.”

Nesse sentido, e explicitando o progresso dos alunos na mesma direção do que venho

apontando, a professora da Sala de Apoio investigada reconheceu que, no semestre em que a

intervenção foi realizada, eles se envolveram muito mais às aulas e, consequentemente,

avançaram em relação à leitura e compreensão de textos. Destacou, sobretudo, que eles

tiveram a oportunidade de colocar suas produções em circulação e que o que escreviam foi

reconhecido, por eles, como útil e importante. Portanto, além de ampliar, efetivamente, suas

possibilidades de interlocução por meio da linguagem escrita, a intervenção contribuiu para

eles se envolverem mais nas aulas, o que, por sua vez, também foi importante para amenizar

as situações de indisciplina.

A fim de mostrar uma certa coerência entre o que afirmei sobre os avanços dos

alunos em relação à sua capacidade de utilização da linguagem escrita em situações sociais e

a sua situação burocrática em termos de resultados que constituem seu histórico escolar, trago

a informação de que, dos quatorze alunos da Sala de Apoio, quatro foram aprovados por

média em todas as disciplinas, três foram diretamente reprovados, inclusive em Língua

Portuguesa, e sete foram aprovados por Conselho de Classe, sendo que apenas dois desses

nessa disciplina. Portanto, nove alunos foram aprovados em Língua Portuguesa sem a

interferência do Conselho de Classe, o que demonstra que 64% deles apresentaram algum

progresso em relação ao domínio da leitura e da escrita, cujo resultado pode ter sido

influenciado pela intervenção realizada nessa Sala de Apoio, a partir da qual vivenciaram,

efetivamente, várias situações de interlocução por meio da utilização da linguagem escrita.

Também no campo dos resultados, entendo que a professora envolvida com a

pesquisa teve a oportunidade de repensar sua prática pedagógica, haja vista que, além de

conduzir um trabalho diferenciado durante o período da intervenção, foi minha interlocutora

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212

desde o respectivo planejamento e, de forma mais restrita, também no período em que

acompanhei suas aulas. Assim, juntas, refletimos muito sobre os gêneros textuais-discursivos

e a concepção interacionista de linguagem a eles subjacente, bem como analisamos muitos

encaminhamentos metodológicos correspondentes, o que, em última instância, contribuiu para

enriquecer nossa formação como docentes.

É importante dizer, ainda, que como professora do Curso de Pedagogia da

Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE, atuando na área de Fundamentos

Metodológicos da Educação, estou mais preparada para ministrar e/ou colaborar com as

seguintes disciplinas: Teoria e Prática do Ensino de Língua Portuguesa, Alfabetização e

Letramento e Estágio Supervisionado sob a forma de Prática de Ensino35. Faço essa afirmação

com convicção, pois, ao produzir este trabalho, tive a oportunidade de estudar produções

significativas de muitos autores conceituados na área que pesquisei e, paralelamente, de

analisar, com base nelas, a prática pedagógica de uma professora de Língua Portuguesa e

muitas produções escritas de seus alunos. Também destaco que as oito disciplinas que cursei,

durante o Doutorado, oportunizaram-me amplas e valiosas reflexões nessa área.

Nessa direção, também reconheço que posso trilhar o caminho da busca de uma

maior articulação entre os cursos de Pedagogia e de Letras dessa instituição, visando à

construção de um processo sem rupturas quando da passagem do aluno da primeira para a

segunda fase do Ensino Fundamental, lembrando que na primeira fase é um pedagogo quem

ministra todas as disciplinas, entre elas Língua Portuguesa, sem no entanto, ser especialista

em nenhuma delas. Por outro lado, é o professor formado em Letras quem assume essa

disciplina a partir da segunda fase do Ensino Fundamental e, nesse conjunto, também as Salas

de Apoio. Contudo, na UNIOESTE, o professor formado nessa área, não tem acesso à

disciplina Alfabetização e Letramento em seu curso, o que é um grande complicador quando

se trata de ajudar um aluno semialfabetizado que está na segunda fase desse nível de ensino.

Nesse sentido, considero urgente que os docentes dos dois cursos se unam na direção de

viabilizar uma complementaridade, ou seja, um continum no aprendizado do aluno, tendo

como objetivo comum a preparação do aluno leitor e produtor de textos em situações reais de

uso da linguagem. Enfim, entendo que o estreitamento da articulação dos dois cursos

mencionados é fundamental para a formação docente e, que essa tese pode reforçar essa

aproximação.

35 Inclusive, em dezembro de 2012, apresentei um trabalho no VI Encontro Internacional de Letras (e o publiquei nos respectivos anais), promovido pelo Curso de Letras da UNIOESTE, Campus de Foz do Iguaçu, referente às concepções de linguagem, cujo certificado constitui o anexo E.

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Esse trabalho de interface entre os cursos de Pedagogia e de Letras, poderá, a partir

dos resultados da minha investigação/reflexão, promover meu retorno para o contexto

investigado por meio de um dos pilares da Universidade, a extensão. Para isso, vale retomar

que, a intervenção que realizei na escola campo de pesquisa foi desenvolvida com o olhar

voltado para o contexto mais amplo da formação de professores, na perspectiva da totalidade.

Nesse âmbito, acredito que essa intervenção contribuiu para que a professora envolvida na

pesquisa repensasse sua forma de conceber o trabalho com a língua materna. Assim, esse

estreito contato abriu caminhos para que eu possa retornar à referida escola, com o intuito de

contribuir para a formação continuada dos professores de Língua Portuguesa, por meio da

realização de grupos de estudo sob minha coordenação.

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222

APÊNDICES

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223

APÊNDICE A - INFORMAÇÕES/CARACTERÍSTICAS DOS ALUNOS DA SALA DE APOIO

O presente apêndice complementa o item Cenário e sujeitos da pesquisa.

O aluno “H” viu seu pai ser assassinado quando tinha seis anos de idade. Morava com

sua mãe, seu padrasto, um irmão e uma irmã, sendo que esta última era filha do seu padrasto

com sua mãe. Praticamente esse aluno não fazia as atividades escritas. As raras vezes em que

se propunha a desenvolver alguma delas, só a realizava se pudesse sentar-se ao lado da

professora, de preferência na mesa dela, absorvendo todo o seu tempo. Ele era extremamente

distraído em quase todos os momentos, tentando acompanhar e/ou participar de todas as

conversas paralelas que ocorriam durante as aulas ou intervir nas orientações feitas aos

colegas, pela professora ou por mim, o que gerava muito transtorno, inclusive, sérios

momentos de indisciplina. Este aluno também implicava, constantemente, com seus colegas,

irritando-se com as respectivas respostas ou “ações”, cujas atitudes o mantinham pouco tempo

em seu lugar. Foi um dos alunos que mais disputou os melhores lugares da sala durante a

realização de toda a pesquisa de campo. Na oralidade, esporadicamente ele surpreendia com

algumas participações coerentes, inclusive em momentos que ele parecia estar muito

distraído, alheio às reflexões realizadas durante as aulas.

Na primeira reunião com os pais ou responsáveis, em que um dos pontos da pauta foi

apresentar os objetivos da Sala de Apoio, bem como pedir a colaboração dos pais em relação

à necessidade de os alunos serem assíduos e obedientes quanto ao desenvolvimento dessas

aulas, a mãe desse aluno (“H”) expôs um sério problema desse seu filho para todos os

presentes, entre os quais estava seu filho “I”, um ano mais novo, que recém havia ingressado à

mesma Sala de Apoio.

Ela informou que, conforme o diagnóstico de um psiquiatra, seu filho “H” era vítima

de certo distúrbio mental que afetava sua concentração e que também o deixava nervoso. Em

razão disso, ele havia começado a tomar um forte medicamento controlado, o qual parecia

deixá-lo um pouco mais calmo, contudo, o deixava sonolento. Na fala dessa mãe, ficou

notório que ela entendia que seu filho tinha certo direito de não participar muito das aulas, e

que ele merecia, inclusive, a compreensão por seus infinitos momentos de indisciplina.

Na primeira aula de Língua Portuguesa, na Sala de Apoio, após essa reunião, esse

aluno, já informado do que ocorrera na ocasião citada, além de estar sonolento, acomodou-se

muito mais. E, em todas as situações em que foi solicitado seu envolvimento na aula, ele

Page 225: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

224

justificava, imediatamente, lembrando que estava utilizando medicamento “forte” porque ele

era doente.

No entanto, nas duas últimas vezes em que a mãe desse aluno foi chamada ao colégio

para conversar sobre sérias ocorrências de indisciplina, na sala de aula, não o defendeu como

de costume, mas ameaçou-o dizendo que, a partir de então, não seria mais ela a tentar resolver

esse tipo de problema, mas seu pai, que, na verdade, era seu padrasto. No viés da educação

pela intimidação, essa mãe, dirigindo-se aos seus dois filhos, na frente dos seus colegas,

chegou à porta da sala falando, assim, se pronunciou: “A partir de agora é com o pai de vocês,

aí vocês vão ver”36, deixando transparecer que eles temem o padrasto.

Esse aluno já havia sido indicado, nos Conselhos de Classe, por alguns professores

para ser encaminhado a uma avaliação com uma equipe de Educação Especial do Núcleo

Regional de Educação de Cascavel – PR, a fim de verificar se ele apresentava alguns

distúrbios de aprendizagem. Caso apresentasse alguma espécie desses distúrbios, ele deveria

passar a frequentar uma Sala de Recurso37, porém, o aluno não chegou a ser chamado para

essa avaliação durante todo o ano em questão. Assim, no início do segundo semestre de 2011,

sua mãe o levou a um psiquiatra da rede pública de saúde que, com base apenas em um eletro

encefalograma e em um exame clínico, passou-lhe a medicação mencionada, a qual,

geralmente, é utilizada para esquizofrenia.

Esse encaminhamento, que considero aligeirado, é preocupante e revela, de certa

forma, como a saúde da maior parte dos brasileiros é tratada. Entendo que a constatação de

uma doença tão séria, concomitante ao uso de um medicamento tão comprometedor, exige, no

mínimo, um diagnóstico e um acompanhamento mais minucioso. No fim do ano, o aluno em

questão foi reprovado em várias disciplinas com notas muito baixas.

A aluna “F” morava com seu pai, sua madrasta e duas irmãs, sendo que a última era

filha da madrasta com seu pai. Ela foi abandonada pela mãe quando era muito pequena,

portanto, não a conheceu. Apresentava sérios problemas de relacionamento com sua madrasta,

tendo sido necessária, inclusive, a intervenção do Conselho Tutelar. Seu humor durante as

aulas oscilava constantemente, sendo, na maior parte do tempo, extremamente implicante e

agressiva com os colegas e indelicada com a professora. Mesmo nos dias em que parecia estar

bem, o que raramente acontecia, ela precisava ser muito bajulada pela docente para que

pudesse realizar alguma tarefa.

36 Fala informal da mãe dos alunos “H” e “I”, outubro de 2011. 37 Essas salas objetivam atender a alunos que apresentam certos distúrbios, os quais provocam alguns problemas na aprendizagem.

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225

Essa aluna completou treze anos no início de 2011, portanto, estava com defasagem

em relação à idade/série. Quando ela gerava problemas durante as aulas era comum ouvir os

comentários, por parte dos colegas, acerca de seu abandono. A professora, muitas vezes,

preferia não enfrentá-la quando era necessário, porque, se o fizesse, sabia que ela se revoltaria

ainda mais. Essa aluna também foi indicada para ser avaliada para frequentar a Sala de

Recurso, no entanto, o ano acabou sem que isso fosse realizado.

A aluna “A” morava só com a mãe; teve sua paternidade reconhecida no segundo

semestre de 2011, tendo, inclusive, o sobrenome de seu pai acrescido ao dela, o que a deixou

muito satisfeita.

No primeiro semestre desse ano, seguidamente essa aluna recusava-se a fazer as

atividades propostas, inclusive a fazer pequenas leituras. Ela ficava praticamente o tempo

todo, acompanhando o que os colegas falavam e faziam. Era uma aluna apática. No Conselho

de Classe realizado no mês de julho, ela também foi indicada para ser avaliada pelos

responsáveis pelas Salas de Recurso do Núcleo Regional de Educação de Cascavel, o que não

aconteceu até o término desse ano letivo.

No segundo semestre, ela passou a se envolver mais nas aulas e a desenvolver as

atividades e, com isso, teve avanços significativos. Contudo, esse avanço demorou para ser

reconhecido por alguns de seus professores da quinta série que, no Pré-conselho de Classe do

terceiro bimestre, a apontavam como candidata à reprovação. Porém, embora eu procurasse

não intervir em grandes decisões tomadas pelo Conselho de Classe, ao ver tamanha

precipitação, fiz um histórico sobre o aproveitamento escolar dessa aluna, tentando mostrar

que, naquele momento, a realidade sobre o seu rendimento, na Sala de Apoio, era outra.

Nos dias subsequentes, conversei muito com a professora dessa sala e com a

coordenadora pedagógica responsável por essa turma sobre a importância de não decidir, no

final do terceiro bimestre, se essa aluna deveria ou não ser reprovada, acreditando que ela

poderia continuar apresentando avanços em relação à sua aprendizagem.

A seguir, esses profissionais reuniram-se comigo e com a professora de Língua

Portuguesa da quinta série que essa aluna frequentava, a qual levou, inclusive, suas avaliações

referentes ao terceiro bimestre, incluindo a produção de um texto. Após a análise positiva

dessas avaliações e conversa com essa professora, foi decidido insistir, no Conselho de

Classe, para que essa aluna não ficasse com notas muito baixas nesse bimestre, a fim de não

comprometer a decisão do final do ano sobre sua aprovação ou não, cuja indicação foi aceita

pelo referido Conselho.

Page 227: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

226

Destaco que essa aluna se envolveu muito na elaboração do jornal da escola, no

segundo semestre, tendo, inclusive, um de seus textos publicado nesse veículo de

comunicação, o que a deixou muito motivada. Quando houve a distribuição dos referidos

jornais na escola, ela manifestou o interesse em ficar com mais de três exemplares,

justificando com uma pergunta: “Fomos nós que fizemos e vamos ficar só com três?”38 Nessa

conversa ela demonstrou sentir-se uma verdadeira autora. No fim do ano, essa aluna foi

aprovada por Conselho de Classe, faltando-lhe apenas três décimos na disciplina de História.

O aluno “M” era filho único e morava com seus pais. Sua mãe saía cedo para o

trabalho e seu pai, por trabalhar à noite, dormia durante o dia, o qual parecia dar sempre razão

ao filho, independente do que ocorresse na escola. Esse aluno faltava muito às aulas e, quando

ia, chegava quase ao seu término. A mãe tentava acordá-lo por telefone, mas poucas vezes era

bem sucedida.

Ele instigava os colegas durante as aulas e, constantemente, brigava com eles.

Também respondia mal à professora e resmungava quando eu ficava junto dele para auxiliá-lo

no desenvolvimento das atividades. Eram raras as vezes em que ele conseguia se concentrar

para realizar as tarefas e, normalmente, recusava-se a participar das aulas. Também foi um

dos alunos indicados para a avaliação citada nos três casos anteriores e, como os demais, não

foi chamado para esse fim. Ele reprovou em várias disciplinas.

O fato de esses quatro alunos, que representam 28% dos integrantes da Sala de Apoio,

serem indicados para passarem por uma avaliação, a fim de verificar se deveriam frequentar

uma Sala de Recurso, forçou um novo olhar para eles, tanto de minha parte quanto por parte

da respectiva professora, já que essa situação levantava a possibilidade de eles não

apresentarem somente defasagem na aprendizagem de alguns conteúdos, mas de terem

dificuldades para aprender como decorrência de algum distúrbio mental. Nesse caso, tais

alunos não estariam frequentando a Sala mais condizente com seus respectivos problemas.

O aluno “N” tinha a mãe doente, depressiva, e um irmão que já havia sido preso. Em

uma das vezes que seus pais compareceram ao colégio para conversar sobre sua indisciplina e

falta de respeito para com os colegas e professores, na linha da educação por intimidação, o

pai, na frente de outras pessoas, assim o questionou: “Você quer ficar como seu irmão? Não

vê o que está acontecendo com ele?”39

38Fala informal da aluna “A”, durante uma aula, em novembro de 2011. 39Fala informal do pai do aluno “N” em agosto de 2011.

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227

Esse aluno era indelicado com os colegas e também com a professora. Falava muitos e

variados palavrões, ao mesmo tempo em que deixava transparecer muita carência e tristeza.

Com esse comportamento contraditório, respondia mal aos professores e, inclusive, uma vez

ao diretor, na frente de todos os colegas. De vez em quando, dispunha-se a realizar as

atividades propostas em sala de aula, mas apenas o fazia se tivesse exclusividade no

atendimento, o que nem sempre era possível, considerando que a turma como um todo

apresentava problemas semelhantes. Foi aprovado por Conselho de Classe, precisando de

muita pontuação em quatro disciplinas.

O aluno “D”, no primeiro semestre, durante a semana morava com seu pai e sua

madrasta e, nos fins de semana, ia para a casa de sua mãe, que residia em outro bairro.

Percebia-se que os valores das duas famílias com quem ele convivia eram muito diferentes e o

deixavam muito confuso. Às segundas-feiras, por exemplo, ele chegava mais impaciente, com

dificuldade para concentrar-se, além de, muitas vezes, recusar-se a participar das aulas. Sua

madrasta, que trabalhava na escola que ele frequentava, seguidamente perguntava a mim ou à

professora da turma sobre o seu rendimento na sala de aula e sobre seu comportamento. Ela

informava que o relacionamento com esse enteado era difícil, principalmente porque ele

incomodava uma filha sua, de trinta anos de idade, que era deficiente. Em meados do segundo

semestre, seu pai passou a não conviver mais com a madrasta, razão que o levou a morar só

com a mãe. Percebeu-se que tais mudanças interferiram negativamente em seu

comportamento, em seu equilíbrio emocional e, consequentemente, em seu envolvimento com

as aulas.

O aluno “C” morava só com sua mãe e uma irmã de cinco anos. A partir das três horas

da madrugada ele ficava só com a irmãzinha porque sua mãe saía para o trabalho. Assim que

isso ocorria, esse aluno levantava para assistir a filmes na televisão, só voltando a dormir ao

amanhecer, o que, muitas vezes, o fazia perder o horário da aula da Sala de Apoio ou a ficar

extremamente sonolento, com poucas condições para se concentrar.

O padrasto desse aluno provocou sérios problemas para a sua família, inclusive, para

não ser localizada por ele, seguidamente essa família mudava de bairro e até de cidade. Esse

aluno demonstrava ter muita carência afetiva, o qual aproximava-se das professoras para

conseguir atenção e para ser visto.

A aluna “K” era depressiva, não se conformava em ter de participar da Sala de Apoio

duas manhãs por semana. Ficava extremamente incomodada com a indisciplina dos colegas.

Faltou praticamente o último mês de aula inteiro, tanto na Sala de Apoio quanto no período

regular em que frequentava a 5ª série, porque não aguentava ficar na sala de aula. Era

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228

extremamente mimada e protegida pela mãe, como se fosse uma criança com idade bem

menor.

A aluna “E”, de certa forma, achava que não precisava frequentar a Sala de Apoio,

entendendo que ela praticamente não tinha dificuldades. Ela morava com sua avó materna e,

em raros fins de semana, ficava com sua mãe, que morava na mesma cidade. Quando isso

acontecia, chegava à escola radiante de felicidade.

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229

APÊNDICE B - QUESTIONÁRIO À PROFESSORA DA SALA DE APOIO Prezado (a) Professor (a): O presente questionário objetiva levantar dados para o desenvolvimento do Projeto de Pesquisa intitulado “Gêneros textuais-discursivos na produção escrita de alunos de uma Sala de Apoio: em foco os elementos de interação” o qual busca investigar como estes estudantes compreendem e fazem uso dos elementos que caracterizam os gêneros textuais-discursivos. Esclarecemos que os dados coletados serão utilizados exclusivamente para fins científicos, prezando pela ética e zelando tanto pela moral da instituição de ensino quanto dos sujeitos envolvidos na pesquisa, lembrando que a referida pesquisa busca colaborar com o desenvolvimento do processo de ensino/aprendizagem. Assim, contamos com a sua colaboração para o fornecimento dos dados solicitados por meio deste instrumento. 1- Sexo: (a) Masculino (b) Feminino 2. Idade: (a) Até 24 anos (b) De 25 a 29 anos (c) De 30 a 39 anos (d) De 40 a 49 anos (e) De 50 a 54 anos (f) 55 anos ou mais 3. Formação no Ensino Médio: (a) Magistério (b) Educação Geral (c) Curso Técnico (d) Outro. Qual? _____________________________________________________________ 4. Formação acadêmica (Curso Superior): (a) Não possuo. (b) Estou cursando. Qual curso? _________________________________________________ (c) Já concluí. Qual curso? _____________________________________________________ 5. Se você fez Curso Superior, de que forma ele foi realizado? (a) Presencial. (b) Semipresencial. (c) À distância 6. Em relação à sua formação em Pós-graduação: (a) Não fiz ainda e não pretendo fazer. (b) Não fiz ainda, mas pretendo fazer. (c) Estou fazendo. Qual curso?__________________________________________________ (d) Já concluí. Qual curso? _____________________________________________________

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230

7. Há quanto tempo você está lecionando? (a) Há menos de 1 ano. (b) De 1 a 2 anos. (c) De 3 a 5 anos. (d) De 6 a 9 anos. (e) De 10 a 15 anos. (f) De 16 a 20 anos. (g) Há mais de 20 anos. 8. Especifique esse tempo de acordo com a distribuição abaixo: a) Educação Infantil:__________________________________________________________ b) Primeira à quarta séries:_____________________________________________________ c) Quinta à oitava séries:_______________________________________________________ d) Ensino Médio:_____________________________________________________________ e) Outros:___________________________________________________________________ 9. Além da Sala de Apoio, com qual(is) outra(s) turmas você trabalha atualmente e com qual(is) disciplina(s)? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 10.Quantos alunos você atende em sua Sala de Apoio? ___________________________________________________________________________ 11. Quais são as maiores dificuldades que eles apresentam em relação ao domínio dos conteúdos de Língua Portuguesa? _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12. Como você vem trabalhando com tais dificuldades? _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13. Em quantas escolas você trabalha? (a) Apenas nesta escola. (b) Em 2 escolas. (c) Em 3 escolas. (d) Em 4 ou mais escolas.

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14. Em quanto(s) turno(s) você trabalha? (a) Um turno. (b) Dois turnos. (c) Três turnos. 15. Sobre os cursos de Língua Portuguesa que você participou nos últimos anos indique: ANO CARGA

HORÁRIA CONTEÚDO DOCENTE

2011

2010

2009

2008

2007

2006

16. Além de Cursos de Formação Docente, de que outra forma de capacitação você mais participou nos últimos anos (depois de 2006)? (Assinale apenas uma alternativa). (a) Grupo de Estudos. (b) Teleconferências. (c) Seminários. (d) Outro(s). Qual(is)? _________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 17. Qual modalidade de formação você considera que contribui mais significativamente para o seu conhecimento e seu trabalho na sala de aula? (Assinale apenas uma alternativa). (a) Grupo de Estudos. (b) Teleconferências. (c) Seminários. (d) Cursos de Formação. (e) Outro(s). Qual(is)? _________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 18. Você participa de um grupo de estudos? Com que frequência? Quem coordena? Tem certificação? Quantos são os integrantes desse grupo? Que conteúdos esse grupo tem estudado? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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______________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 19. Em relação aos Programas de Formação Continuada de Professores dos quais você já participou ou pretende participar, como você acha que deveria ser encaminhado – para que houvesse maior aproveitamento? (Numa escala de 01 a 10, numere as alternativas que seguem, sendo que 01 é para o encaminhamento mais importante e 10 para o encaminhamento que você considera menos importante). (a) – ( ) Leitura de textos teóricos. (b) – ( ) Discussões teóricas individuais. (c) – ( ) Troca de experiências entre colegas. (d) – ( ) Sugestão de atividades. (e) – ( ) Elaboração de propostas de atividades. (f) – ( ) Análise de livros didáticos. (g) – ( ) Apresentação de teoria e encaminhamento prático. (h) – ( ) Discussões teóricas em grupo e apresentação em forma de Seminários. (i) – ( ) Só atividades práticas como modelos para trabalhar com os alunos. (j) – ( ) Outra. Qual? _________________________________________________________ 20. Explique, em poucas palavras, o que você entende por “gêneros textuais”. _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 21. Você trabalha esse conteúdo com seus alunos? Como? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 22. Que conteúdos de Língua Portuguesa você prioriza nas reestruturações textuais de seus alunos? Por quê? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 23. Como você realiza as correções/intervenções nos textos produzidos pelos alunos?

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__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 24. Ainda em relação aos aspectos interacionais dos gêneros textuais-discursivos, você considera o trabalho com esses conteúdos difícil? Justifique sua resposta. __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 25. Como você avalia o enfoque que o livro didático tem dado aos “gêneros textuais e ao seu teor interacional”? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 26. Além dos textos que você tem levado para a sala de aula, você tem lido outros textos teóricos (livros, artigos científicos...) que discutem sobre a importância do aluno compreender os aspectos interacionais dos gêneros textuais para poder produzir melhor seus textos? Dê exemplos. _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 27. Como você tem acesso às leituras sobre gêneros textuais e aos seus aspectos interacionais? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 28. Você considera difícil esse acesso? Se a resposta for sim, a que você atribui tal dificuldade? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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29. Você sente necessidade de ter mais material de apoio para consulta ao trabalhar com gêneros textuais? Que tipo de material? Dê sugestões. _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 30. Escreva, em poucas palavras, qual a “Concepção de Linguagem” que embasa o seu trabalho com a língua. (Use o verso da folha, se for necessário). ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 31. Você considera importante trabalhar “gêneros textuais e seus aspectos interacionais” com os alunos da Sala de Apoio? Por quê? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 32. Qual a relevância do entendimento de gêneros textuais e sua carga interacional para o ensino da Língua Portuguesa? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Muito Obrigada pela sua Colaboração com o Ensino e a Pesquisa

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APÊNDICE C - ROTEIRO PARA A ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA/CONVERSA COM OS ALUNOS

1. Você gosta de produzir textos? Por quê? 2. Sobre o que você prefere escrever? 3. Você acha que o professor deve explorar mais o assunto antes de propor a vocês uma produção textual? De que forma? 4. O que você acha que falta para você conseguir escrever textos com mais facilidade? 5. O que você acha da forma como os textos estão sendo corrigidos na Sala de Apoio? Qual seria a melhor maneira de corrigi-los? Por quê? 6. Que tipo de erro você considera mais grave numa produção textual? 7. Os textos que você lê ou produz, na escola, tem o mesmo objetivo que os textos utilizados no dia a dia? 8. Todos os textos devem ter o mesmo formato e estilo? Por quê? 9. Para você, o que é um bom texto? Por que é importante aprender a produzir bons textos? 10. Qual é o destino dos textos que você produz na sala de aula - turno regular? E na Sala de Apoio? O que você acha disso? Que outros destinos poderíamos dar a eles? 11. Você acha possível produzir textos sobre alguns temas de outras áreas do conhecimento além de Língua Portuguesa? Já produziu algum texto em outra área? Exemplifique. 12. Você considera que um problema matemático é um texto. Por quê? Obs.: As questões foram adaptadas conforme a necessidade de maiores explicações para cada aluno.

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APÊNDICE D - ROTEIRO PARA A ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA COM A PROFESSORA

1. Por que é importante trabalhar com gêneros textuais-discursivos nas aulas de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental? Como “ensiná-los”? 2. Como você entende o caráter interacional dos gêneros textuais? 3. Os cursos de Língua Portuguesa dos quais você participou trouxeram contribuições para suas atividades na sala de aula, principalmente sobre como trabalhar o caráter interacional dos gêneros textuais? Comente sua resposta. Exemplifique. 4. O que é necessário para que os alunos consigam produzir textos de diferentes gêneros textuais-discursivos? Você acha que a escola, de um modo geral, vem fazendo isso? Por quê? 5. Os alunos produzem textos também em outras disciplinas? Com que objetivo o fazem? 6. Como você acha que deve ser feita a preparação para a produção de um texto? O que dificulta essa preparação? 7. As produções de textos dos alunos seguem o formato coerente do gênero a que pertencem? 8. Os textos produzidos por seus alunos têm os mesmos objetivos que os textos utilizados no cotidiano? Exemplifique. 9. Que temas você acha que interessam mais aos alunos para a produção de textos? Por quê? 10. Você acha que os alunos da Sala de Apoio tiveram mais interesse para produzir textos no segundo semestre de 2011 do que no primeiro? Justifique sua resposta. 11. No questionário que você respondeu no primeiro semestre de 2011, em relação às maiores dificuldades de domínio de conteúdo apresentadas pelos alunos, você afirmou que a leitura e a escrita deles são deficitárias; afirmou também que trocam bastante as palavras, esquecem de pontos, vírgulas, não fazem parágrafos bem como que, muitas vezes, escrevem de forma ilegível, que nem mesmo eles conseguem entender. Você acha que essa situação continua a mesma? Explique sua resposta. 12. Você acha que a forma como a correção das produções escritas dos alunos vem sendo realizada os ajudam a repensar seus textos? A partir delas eles conseguem refletir linguisticamente, ou seja, conseguem refletir sobre a organização da escrita? 13. Que erros você considera mais sérios nos textos que os alunos produzem? Por quê? 14. Você acha que os alunos já estão entendendo a função social da escrita, ou seja, os aspectos interacionais dos textos que produzem? Justifique/exemplifique sua resposta. 15. Por que você acha que os alunos reclamam tanto para refazer “partes” dos textos que produzem? E mais, por que você acha que eles não gostam que seus textos sejam reestruturados coletivamente? Por que preferem deixar seus textos intactos?

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16. Você percebeu avanços na produção textual dos alunos no segundo semestre em relação ao primeiro? Justifique sua resposta. 17. Você acha que o destino que temos dado aos textos que os alunos produzem contribuiu para que se interessassem mais por escrever?

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APÊNDICE E – PRIMEIRA UNIDADE PARA A INTEVENÇÃO

PRIMEIRA UNIDADE PARA A INTERVENÇÃO

AMPLIANDO O CONHECIMENTO SOBRE O FUNCIONAMENTO DA ESCOLA

Orientações para a professora da Sala de Apoio investigada e atividades para os respectivos alunos. Elaboração: Neiva Gallina Mazzuco

CASCAVEL/PR JULHO/2011

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SUMÁRIO

AMPLIANDO O CONHECIMENTO SOBRE O FUNCIONAMENTO DA ESCOLA240

OBJETIVOS ......................................................................................................................... 240

1 BREVE ESTUDO DO SUPORTE JORNAL ................................................................ 241

2 ESTUDO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO PROPAGANDA ....................... 242

3 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO CARTA DE SOLICITAÇÃO OU PEDIDO ......................................................................... 244

4 ESTUDO, PRODUÇÃO E REALIZAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO ENTREVISTA ....................................................................................................................... 246

5 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO CONVITE .............................................................................................................................. 249

6 REALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS ........................................................................... 250

7 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO CARTÃO DE FELICITAÇÃO .............................................................................................. 251

8 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO PANFLETO ........................................................................................................................... 252

9 RETOMADA DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO CARTA DE SOLICITAÇÃO OU PEDIDO .......................................................................................................................... 253

10 PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO BIOGRAFIA .......................................................................................................................... 254

Page 241: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

240

UNIDADE 01

AMPLIANDO O CONHECIMENTO SOBRE O

FUNCIONAMENTO DA ESCOLA

OBJETIVOS

• Entender o suporte jornal como um veículo de circulação de diversos gêneros textuais-

discursivos no qual a linguagem viabiliza, efetivamente, práticas discursivas;

• Compreender o propósito comunicacional/interacional e as características composicionais de

alguns gêneros textuais-discursivos: propaganda, carta de solicitação ou pedido, entrevista,

convite, cartão de felicitação, panfleto e biografia;

• Ler e interpretar textos informativos sobre tais gêneros, bem como alguns exemplares

correspondentes;

• Interpretar a resposta de dois convites e de uma carta de solicitação;

• Registrar algumas informações obtidas durante a realização de duas entrevistas e organizá-

las em forma de breves textos para a montagem de um jornal da escola;

• Fazer breves análises linguísticas a partir de algumas particularidades na escrita das

produções apresentadas aos alunos bem como em suas próprias produções;

• Orientar a produção e a reestruturação de uma propaganda, duas cartas de solicitação ou um

pedido, dois roteiros de entrevista, um convite, um cartão de felicitação, um panfleto e uma

biografia do patrono na escola;

• Evidenciar que a propaganda, a carta de solicitação ou o pedido, a entrevista, o convite, o

cartão de felicitação, o panfleto e a biografia serão colocados em situações de uso.

Recursos:

- Jornais;

- Convites de casamento, aniversário, formatura, chá de bebê, chá de panela etc.;

- Cartões de aniversário, casamento, bodas de prata, bodas de ouro etc.;

- Envelopes;

- Panfletos diversos;

Page 242: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

241

- Atividades e textos xerocopiados;

- Marcador de texto;

- Quadro-de-giz e giz;

- Caderno;

- Lápis, borracha e caneta.

1 BREVE ESTUDO DO SUPORTE JORNAL

Conversar com os alunos sobre a necessidade de conhecer melhor o funcionamento da escola

e de socializar tais informações, o que demandará investigação sobre muitas questões

relacionadas ao cotidiano escolar. Para divulgá-las, eles serão desafiados a confeccionar um

pequeno jornal, orientados pela pesquisadora e pela respectiva professora. Será comunicado

que, nas próximas unidades, haverá o enfoque em questões externas à escola, as quais serão

enriquecedoras para a prática pedagógica e para a formação de um aluno consciente, sensível

e crítico.

1.1 Exploração, por meio da oralidade, da função social do suporte jornal.

1.2 A seguir, os alunos analisarão, superficialmente, um jornal e, logo após, deverão falar

sobre sua estrutura; as diferentes modalidades de texto que abriga; sua abrangência; a

necessidade de patrocinadores etc.

1.3 Coletivamente será feito um roteiro/planejamento das primeiras ações necessárias para a

montagem de um jornal da escola, bem como definido o respectivo título.

Page 243: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

242

2 ESTUDO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO PROPAGANDA

O estudo desse gênero parte da constatação da necessidade de conseguir patrocinadores para a

produção de um jornal da escola.

2.1 Os alunos deverão analisar algumas propagandas constantes nos jornais recém-folheados

e, logo após, também algumas presentes em revistas nas quais o colorido é utilizado como um

recurso atrativo. Refletir-se-á, ainda, sobre algumas propagandas atuais transmitidas pela

televisão e ouvidas pelo rádio.

2.2 O professor conduzirá as reflexões para o entendimento da função social do gênero

propaganda, estabelecendo um paralelo com a função dos patrocinadores de um jornal, de

uma revista, de um programa televisivo etc.

2.3 Texto

A propaganda

A propaganda objetiva convencer o leitor, o telespectador ou o ouvinte de que um

determinado produto merece ser experimentado, ser comprado. Na maioria das vezes, a

propaganda tem por base a novidade ou a qualidade do que está sendo oferecido.

Na publicidade, de um modo geral, é utilizada uma linguagem e imagens apelativas,

criativas, enriquecidas por muita repetição ou por cores convidativas, uma vez que tais

recursos têm grande poder de atração, de convencimento, cativando e estimulando o

consumidor a comprar um produto. Assim, a propaganda até cria necessidades, funcionando

como um estímulo motivador para sensibilizar os desejos das pessoas no sentido de levá-las a

querer consumir, cada vez mais, coisas novas e de boa qualidade, iludindo-as, levando-as,

muitas vezes, a comprar desnecessariamente.

Para que o dono de uma empresa possa divulgar uma propaganda, ele deve contribuir

para o patrocínio dos meios de comunicação nos quais ela será viabilizada, como, por

Page 244: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

243

exemplo, ajudar no custeio de um jornal, de um panfleto, de uma revista ou de um programa

de rádio ou de televisão40.

2.3.1 O alunos deverão procurar, no dicionário, o significado das seguintes palavras:

publicidade, apelativa, patrocínio.

2.3.2 Após, serão orientados a organizar um dicionário individual, começando pelo registro

das palavras destacadas na questão anterior. Para isso, inicialmente, eles colocarão as letras

em ordem alfabética em uma caderneta, utilizando marcador de texto e deixando duas folhas

para cada letra.

2.3.3 Atividades para o aluno:

Leia, com atenção, o final do segundo parágrafo transcrito a seguir:

“Assim, a propaganda até cria necessidades, funcionando como um estímulo motivador para

sensibilizar os desejos das pessoas no sentido de levá-las a querer consumir, cada vez mais,

coisas novas e de boa qualidade, iludindo-as, levando-as, muitas vezes, a comprar

desnecessariamente.”

a) As partes sublinhadas estão representando palavras diferentes?

( ) Sim

( ) Não

b) Que palavra ou que palavras as partes destacadas estão substituindo?

2.3.4 Questões para compreensão do texto:

a) Para que as propagandas são utilizadas?

b) Que recursos são utilizados nas propagandas para torná-las atraentes?

c) O que significa ser patrocinador de um jornal?

2.4 Os alunos deverão organizar uma propaganda de sua escola.

40 As primeiras informações do texto tiveram por base o artigo “O gênero textual anúncio publicitário: análise de sua implantação em sala de aula”, de autoria de Rosângela Aparecida Alves e Luciana Cabrini Simões Calvo, disponível no site: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/333-4.pdf, acessado em 26/07/2011.

Page 245: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

244

3 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO

CARTA DE SOLICITAÇÃO OU PEDIDO

O aluno será orientado a procurar patrocinadores para o jornal da escola. Para isso, será

preciso escrever uma carta de solicitação ou pedido, o que demanda o estudo do respectivo

gênero textual-discursivo.

3.1 Texto:

A carta de solicitação ou o pedido

Uma carta de solicitação ou um pedido é produzido quando se deseja realizar algo ou

se está em busca de algo. Significa requerer, solicitar.

Nesse gênero, inicialmente, deve constar um vocativo a fim de evidenciar a quem ele

está sendo feito, ou seja, a quem ele está sendo destinado. Também deve ser informado quem

está realizando tal solicitação e apresentada uma explicação do motivo de fazê-la.

Para finalizar o pedido é importante que seu emissor agradeça, registre o local e a data,

bem como o assine.

3.1.1 O aluno deverá procurar, no dicionário, o significado das seguintes palavras e, após,

registrá-las em seu dicionário particular:

a) Vocativo

b) Emissor

3.1.2 Com base nas reflexões sobre o texto acima, o aluno deverá:

a) Citar uma situação que exige a elaboração de um pedido.

b) Explicar o que um pedido deve conter.

3.1.3 Questões para análise linguística:

a) Leia a última frase do segundo parágrafo, copiada a seguir:

“Também deve ser informado quem está realizando tal solicitação e apresentada uma

explicação do motivo de fazê-la.”

Que palavra a parte sublinhada está substituindo?

Page 246: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

245

b) Leia o último parágrafo copiado a seguir:

“Para finalizar o pedido é oportuno que seu emissor agradeça, que registre o local e a data,

bem como que o assine.”

Que palavra a parte destacada está substituindo?

3.2 Cada aluno deverá produzir uma carta de solicitação de patrocínio para o jornal da escola

destinada a um empresário do bairro em que mora. Nela, deverá constar que se aguarda uma

resposta por escrito da referida solicitação.

3.2.1 Será sorteada uma carta para ser reestruturada coletivamente e utilizada para ser

entregue aos empresários convidados para o patrocínio.

3.2.2 Os alunos deverão procurar o significado das palavras “destinatário” e “remetente” no

dicionário e, após, registrá-las em seu dicionário particular.

3.2.3 Eles serão orientados a preencher um envelope para encaminhar a carta reestruturada.

Todos os envelopes contendo a devida correspondência serão utilizados, pois todos os alunos

serão desafiados a entregar uma carta a um possível candidato a patrocinador.

Obs.: Conforme orientações do diretor da escola, para os alunos realizarem essas entregas

deverão ser acompanhados pela respectiva professora e pela pesquisadora.

3.3 Os alunos analisarão as respostas dos empresários. Nos casos de aceite, eles programarão

como deverão organizar as respectivas propagandas no jornal, inicialmente verificando se há a

necessidade de novo contato com tais patrocinadores para conseguir os dados de sua empresa.

É importante que seja analisado se a(s) propaganda(s) será(ão) produzida(s) pelos alunos a

partir dos dados coletados ou se o(s) dono(s) da(s) empresa(s) prefere(m) publicar uma

propaganda própria da empresa, contendo, inclusive o respectivo logotipo.

Page 247: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

246

4 ESTUDO, PRODUÇÃO E REALIZAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO

ENTREVISTA

Os alunos serão levados a perceber que é preciso entrevistar o diretor e uma coordenadora

pedagógica da escola a fim de obter algumas informações pouco conhecidas referentes à

instituição, entre as quais: destino dos alunos de quinta série que reprovarem, considerando

que a partir do próximo ano (2012), não haverá mais essa série, haja vista as mudanças na

nomenclatura das séries/anos do Ensino Fundamental a partir da implantação do ensino de

nove anos; datas de recessos escolares; quantidade de presenças necessária para a aprovação

para a série/ano seguinte; informações sobre o cálculo da média exigida para essa aprovação;

limite para a tolerância de atrasos no início das aulas diárias; condições para poder sair da

escola antes do horário; orientações para a utilização do livro didático não descartável;

previsão de reunião com os pais e entrega de boletins para o segundo semestre letivo; notícias

sobre o andamento da construção do novo prédio para a escola e previsão de inauguração,

bem como apresentação de sua estrutura e do que a escola passará a dispor nesse novo prédio.

4.1 Reflexão, com os alunos, sobre o que é uma entrevista, sobre quando ela é utilizada, e se é

preciso planejá-la, mesmo sendo realizada na oralidade.

Será informado, aos alunos, que existem vários tipos de entrevista e serão exploradas, na

oralidade, as respectivas especificidades: jornalística, médica, científica, para emprego, entre

outras.

Obs.: É fundamental o entendimento de que a entrevista viabiliza uma troca dialógica.

4.2 Texto

A entrevista

A entrevista é muito utilizada como forma de fazer investigação jornalística na busca

de coletar e transmitir informações aos leitores, ouvintes ou telespectadores dentre outros fins.

Sua estrutura é marcada por perguntas e respostas e envolve, no mínimo, duas pessoas.

Page 248: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

247

A Professora Jociane Araújo Peres da Luz (2011) entende que a entrevista se

assemelha a uma conversa, a qual é conduzida pelo entrevistador que a abre e a fecha, que faz

as devidas perguntas, que incita a transmissão de informações, que introduz novos assuntos,

que orienta e reorienta a interação. Ao entrevistado compete responder às perguntas e fornecer

as informações solicitadas.

A Professora Jociane alerta que, durante a realização da entrevista, o entrevistador

deve ser educado e usar formas adequadas de tratamento para com o entrevistado, não

esquecendo de agradecê-lo no final41.

4.2.1 Questões para compreensão do texto:

a) Como a entrevista é estruturada?

b) Em uma entrevista, o que compete ao entrevistador?

c) E ao entrevistado?

d) Para que serve uma entrevista?

4.2.2 Atividades de análise linguística:

a) No início do segundo parágrafo está escrito: “A Professora Jociane Araújo Peres da Luz

(2011) entende que a entrevista se assemelha a uma conversa, a qual é conduzida pelo

entrevistador que a abre e a fecha.”

A que palavra as partes sublinhadas se referem?

b) Na última parte do último parágrafo está escrito: “não esquecendo de agradecê-lo, no

final.”

A quem a parte sublinhada está se referindo?

4.3 O aluno será orientado a analisar as questões abaixo, as quais são integrantes de um

roteiro de entrevista elaborado por Emerson Luiz Peres (2011) para o desenvolvimento de

uma pesquisa intitulada Concepções e Práticas dos Conselheiros Tutelares Acerca da

Violência Doméstica contra crianças e adolescentes.

- Quais são/foram os casos/problemas de violência que você tem/teve que lidar/trabalhar no CT ? Como são estes casos/problemas? Descreva-os. - Na sua opinião, por que eles acontecem? Como poderiam ser explicados? - Quem são os responsáveis por tais situações de violência ? - Como poderiam ser solucionados? E como poderiam ser evitados?

41 Informações constantes no site: http://www.slideshare.net/jociluz/slide-gnero-textual-entrevista, acessado em 18/07/2011.

Page 249: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

248

- Qual (ou como) deve ser a atuação do Conselheiro Tutelar em tais situações? Por quê? - No seu entender, quando se pode dizer que está havendo violência? - Na sua opinião, há diferenças entre violência e violência doméstica contra crianças e adolescentes? Quais ? Por quê? - Se fosse para você avaliar, como avaliaria o trabalho dos CTs em relação a esse tema? Por quê ? Que contribuições trazem? 42

4.3.1 Com base nesse roteiro o aluno deverá responder às seguintes questões:

a) As perguntas anteriores foram elaboradas para serem feitas a quem?

b) Que assunto o autor da entrevista pretende investigar?

4.4 Cada aluno deverá elaborar uma pergunta a ser feita para o diretor e uma para a

coordenadora pedagógica da escola, responsável pela Sala de Apoio, a fim de ajudar a

esclarecer alguma questão pouco conhecida referente à instituição na qual estuda, lembrando

que as principais informações coletadas nessas entrevistas deverão ser organizadas em forma

de reportagem, sendo que, uma destas, reestruturada coletivamente, será divulgada no jornal

da escola.

Obs.: Alguns dos temas que deverão ser abordados nas respectivas entrevistas estão no início

do item 4.

4.4.1 As diversas questões elaboradas pelos alunos deverão ser apresentadas à classe, as quais,

após analisadas coletivamente, deverão compor os roteiros das referidas entrevistas.

4.4.2 O professor deverá orientar a ordenação das perguntas que compõem tais roteiros,

observando uma sequência coerente.

4.4.3 Será decidido, com a turma, se todos os alunos, ou apenas alguns, serão entrevistadores.

4.4.4 Deverá ser planejado, com os alunos, como será feito o registro das respostas obtidas

durante a realização das entrevistas, sendo que cada aluno deverá ficar responsável por

sistematizar, no mínimo, uma delas.

42 Disponível: em: http://dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/handle/1884/900/roteiroentrevistas.pdf;jsessionid=E7B4833A9814760168EAECA48E4C9982?sequence=1. Acessado em 18/07/2011.

Page 250: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

249

4.4.5 Todos os alunos deverão copiar as questões das duas entrevistas.

4.4.6 Nova atividade de análise linguística para o aluno:

a) Troque o ponto de interrogação pelo ponto final em todas as perguntas das entrevistas

recém elaboradas e faça a leitura delas conforme a nova pontuação.

b) Essa nova leitura possibilitaria ao entrevistado a compreensão dessas “questões”? Por quê?

c) Quando é necessário usar o ponto final?

d) Quando é necessário usar o ponto de interrogação?

5 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO

CONVITE

Os alunos deverão ser conduzidos a perceber que é preciso fazer o convite formal ao diretor e

a uma coordenadora pedagógica da escola a fim de que eles compareçam à sua sala de aula

nos dias e horários definidos para a realização de uma entrevista.

5.1 Eles serão orientados a refletir sobre a função social do convite.

5.2 Os alunos deverão analisar diferentes convites: casamento, formatura, aniversário, chá de

bebê, chá de panela etc.

5.2.1 Com base nos convites analisados, deverão informar os dados solicitados na tabela a

seguir:

CONVITES Quem está convidando?

Quem está sendo convidado?

Data e local do evento

É solicitado para confirmar presença?

Casamento Formatura Aniversário Chá de bebê Chá de panela

5.3 Os alunos deverão elencar as diversas informações que um convite deve conter.

Page 251: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

250

5.4 A metade dos alunos produzirá um convite ao diretor e a outra metade à coordenadora

pedagógica, objetivando que eles compareçam à Sala de Apoio para serem entrevistados. O

convite deverá conter, também, o pedido de que se aguarda uma resposta por escrito.

5.4.1 Será sorteado um convite de cada modalidade para serem escritos no quadro-de-giz e,

após, reestruturados coletivamente para serem enviados ao diretor e à coordenadora

pedagógica, respectivamente. As entrevistas serão realizadas em datas diferentes.

5.4.2 Individualmente, os alunos deverão preencher um envelope para encaminhar os

convites. No final, será sorteado um de cada modalidade para ser utilizado, efetivamente, para

tal fim.

5.5 Serão lidas e interpretadas as respostas dos convites advindas do diretor e da

coordenadora pedagógica para os discentes.

6 REALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS

6.1 Realização da entrevista com o diretor da escola

6.1.1 As perguntas serão feitas pelos alunos, conforme acordo já realizado com a turma. É

importante que todos prestem muita atenção nas informações apresentadas pelo diretor.

Assim, para facilitar a visualização de todas as pessoas na sala, elas serão organizadas em

círculo.

6.1.2 Ao término da entrevista, os alunos farão o registro das informações obtidas, conforme

distribuição das questões feita previamente. Todos os registros serão reestruturados e

aprimorados em forma de texto para serem publicados no jornal. Será sorteado um texto para

tal publicação.

6.1.3 Atividade de análise linguística para os alunos:

a) Comparar a pontuação da entrevista com a pontuação predominante nos registros das

respostas da entrevista.

Page 252: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

251

c) Justificar a não predominância de frases interrogativas no registro das respostas do diretor.

6.2 Realização da entrevista com a pedagoga

Obs.: Repetir os itens 6.1.1 a 6.1.3.

7 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO

CARTÃO DE FELICITAÇÃO

Montagem da seção de felicitações do jornal da escola

Conversar com os alunos sobre a importância de felicitar: os aniversariantes do mês, os pais,

os estudantes, as crianças, os professores e os demais funcionários públicos pela passagem do

seu dia etc.

7.1 Os alunos analisarão tanto a mensagem escrita quanto as ilustrações em vários cartões de

felicitação: de aniversário, de casamento, de Natal etc.

7.1.1 Questionamentos a serem feitos aos alunos:

a) Em que situações felicitamos alguém?

b) Quais as diferentes formas de fazermos uma felicitação?

c) Que dados um cartão de felicitação deve conter?

7.2 Cada aluno produzirá um cartão para uma das felicitações indicadas abaixo, sendo que

deverá haver, aproximadamente, a mesma quantidade de cartões para cada especificidade:

a) Parabenizar os pais pela passagem do seu dia: segundo domingo de agosto.

b) Parabenizar os aniversariantes do segundo semestre.

c) Parabenizar os estudantes pela passagem de seu dia: 11 de agosto.

d) Parabenizar as crianças pela passagem do seu dia: 12 de outubro.

d) Parabenizar os professores da escola pela passagem de seu dia: 15 de outubro.

e) Parabenizar todos os profissionais da escola pela passagem do dia do funcionário público:

28 de outubro.

Page 253: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

252

Obs.: Os cartões que os alunos confeccionarão não terão dobras, visto que eles serão copiados

para serem publicados no jornal da escola. Deverão medir 12 cm por 8 cm.

7.2.1 Os cartões, depois de revistos, serão trocados entre os colegas para serem analisados e,

se houver indicação, deverão retornar ao respectivo autor para serem aprimorados.

8 ESTUDO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO

PANFLETO

Divulgação de um espaço, no jornal da escola, para publicações de recados, mensagens ou

textos.

8.1 Texto:

O panfleto ou o folheto

O panfleto, também chamado de folheto, é um texto que visa convencer o leitor sobre

algo. Pode ser utilizado para divulgar um evento, uma ideia, uma informação, um produto etc.

Sua feitura de papel, normalmente por uma única folha, facilita seu manuseio e sua

distribuição, além de ser produzido por um custo baixo. Assim, é muito utilizado para atingir

grandes públicos43.

8.1.1 Procurar, no dicionário, o significado das palavras “algo” e “feitura” e registrar no

dicionário particular.

8.1.2 Questões de interpretação para o aluno:

a) Para que serve um panfleto?

b) Por que ele é utilizado para atingir um grande público?

8.2 Os alunos deverão analisar vários panfletos e identificar o que está sendo divulgado em

cada um deles, bem como quem divulga e quem são os destinatários.

43 Informações: http://pt.wikipedia.org/wiki/Panfleto. Acessado: 19/07/2011.

Page 254: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

253

8.3 Cada aluno deverá montar um panfleto com o objetivo de divulgar o espaço, no jornal da

escola, para a publicação de recados, mensagens ou textos.

8.3.1 Os panfletos deverão ser relidos e reestruturados com a orientação da professora.

8.3.2 Será sorteado um panfleto para ser reestruturado coletivamente, o qual será distribuído a

todos os alunos da escola que estudam no período matutino, bem como a todos os

profissionais da educação que nela trabalham nesse período.

9 RETOMADA DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO CARTA DE SOLICITAÇÃO

OU PEDIDO

Montagem da seção de pedidos do jornal. Essa seção visará conseguir livros, jornais, revistas

e papel sulfite para a escola, bem como roupas e calçados usados para as famílias carentes do

bairro. Para a realização do pedido para conseguir tais donativos, será necessário produzir

uma carta de solicitação ou pedido.

9.1 O aluno deverá preencher a seguinte tabela, individualmente, informando os dados

solicitados:

PEDIDOS de: A quem pedir? Como nos apresentaremos aos destinatários?

Que motivo daremos para fazer essa solicitação?

Doação de livros, revistas, jornais e papel sulfite

Doação de roupas e calçados usados

9.1.1 Com base nos dados registrados na tabela, cada aluno deverá escrever um dos pedidos,

sendo que a metade da turma contemplará o primeiro pedido e a outra, o segundo.

Page 255: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

254

9.1.2 Após ajudar cada aluno a reestruturar tais pedidos, será sorteado um de cada uma das

duas particularidades para serem revistos coletivamente e, posteriormente, publicados no

jornal.

10 PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO

BIOGRAFIA

Como esse gênero textual já foi estudado e produzido com a turma no primeiro semestre,

serão retomadas, na oralidade, sua função e principais características.

10.1 Os alunos serão orientados a buscar informações sobre o patrono da escola “X”.

10.2 Texto – biografia do patrono da escola e respectiva foto.

Obs.: Para preservar a escola, tais itens não serão trazidos aqui.

10.3 O aluno deverá procurar, no dicionário, o significado das palavras abaixo e escrevê-las

em seu dicionário particular:

a) Empreendedorismo;

b) Esmerar;

c) Proporcionar;

d) Obstáculos;

e) Ampla.

Page 256: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

255

APÊNDICE F – SEGUNDA UNIDADE PARA A INTERVENÇÃO

SEGUNDA UNIDADE PARA A INTERVENÇÃO

ESTUDANDO O FUNCIONAMENTO DE ALGUNS SERVIÇOS EXISTENTES NA

COMUNIDADE

Orientações para a professora da Sala de Apoio investigada e atividades para os respectivos alunos. Elaboração: Neiva Gallina Mazzuco

CASCAVEL/PR JULHO/2011

Page 257: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

256

SUMÁRIO

TEMA: ESTUDANDO O FUNCIONAMENTO DE ALGUNS SERVIÇOS EXISTENTES NA COMUNIDADE ................................................................................... 257

1 CONHECENDO O POSTO DE ATENDIMENTO CONTINUADO Y ...................... 258

RETOMADA, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE UM CONVITE................. ................... 259

RETOMADA, PRODUÇÃO E REALIZAÇÃO DE UMA ENTREVISTA........ .................... 259

PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE REPORTAGENS .............................................................. 261

2 CONHECENDO OS PROBLEMAS DO BAIRRO ...................................................... 261

RETOMADA, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE UMA CARTA ....................................... 262

RETOMADA, PRODUÇÃO E REALIZAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO ENTREVISTA............................................. ......................................................................... ...262

RETOMADA, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE UMA REPORTAGEM ......................... 262

3 ENTENDENDO ALGUMAS POLÍTICAS SOCIAIS E QUESTÕES AFINS A PARTIR DE TEXTOS INFORMATIVOS .......................................................................... 263

TEXTO INFORMATIVO 01 ......................................................................................................... 264

TEXTO INFORMATIVO 02 ......................................................................................................... 266

TEXTO INFORMATIVO 03 ......................................................................................................... 267

TEXTO INFORMATIVO 04 ................................................................................................. 269

TEXTO INFORMATIVO 05 ......................................................................................................... 272

TEXTO INFORMATIVO 06 ......................................................................................................... 273

TEXTO INFORMATIVO 07 ......................................................................................................... 275

Page 258: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

257

UNIDADE 02

TEMA: ESTUDANDO O FUNCIONAMENTO DE ALGUNS SERVIÇOS

EXISTENTES NA COMUNIDADE

OBJETIVOS

• Compreender o propósito comunicacional/interacional e as características composicionais de

alguns gêneros textuais-discursivos: convite, entrevista, carta, reportagem, artigo de opinião e

texto informativo;

• Ler e compreender textos informativos sobre tais gêneros, bem como alguns exemplares

correspondentes;

• Analisar e compreender a resposta de um convite e de uma carta;

• Registrar algumas informações obtidas durante a realização de duas entrevistas e organizá-

las em forma de reportagens, visando à montagem de um jornal da escola;

• Fazer breves oficinas de análise linguística, sobretudo a partir das produções dos alunos;

• Identificar o tema de alguns textos e relacioná-los entre si;

• Identificar e caracterizar a estrutura de diferentes textos informativos;

• Orientar a produção e a reestruturação de: um convite, alguns roteiros de entrevista, uma

carta, duas reportagens, um artigo de opinião e alguns textos informativos;

• Colocar essas produções escritas em efetiva situação de uso, cujo alvo é a confecção de um

jornal da escola.

Recursos:

- Atividades e textos xerocopiados;

- Quadro-de-giz e giz;

- Caderno;

- Lápis, borracha e caneta;

- Dicionário;

- Dicionário produzido pelo aluno.

Page 259: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

258

1 CONHECENDO O POSTO DE ATENDIMENTO CONTINUADO Y

Conversar com os alunos sobre a necessidade de conhecer melhor os serviços existentes na

comunidade, como o funcionamento do Posto de Atendimento Continuado Y – PAC Y, a

Farmácia Básica e a Farmácia Popular, bem como as iniciativas da Associação de Moradores

do Bairro, além da importância de outras iniciativas relacionadas à assistência social, a

exemplo dos Programas Bolsa Família e Segurança Alimentar.

1.1 Após essa conversa mais ampla, os alunos serão questionados sobre o funcionamento do

PAC Y: se é semelhante ao de qualquer Posto de Saúde; se lá existem vários médicos

especialistas que fazem atendimento ao público; sobre o que é preciso fazer para que uma

pessoa seja atendida por um especialista na saúde pública; se lá são fornecidos os

medicamentos necessários para o tratamento de diferentes doenças; sobre os

encaminhamentos necessários para a retirada de medicamentos; sobre a diferença entre a

farmácia básica acoplada a essa unidade de saúde e a farmácia popular existente em vários

locais da cidade; sobre a necessidade de atualização de vacinas não apenas para crianças;

saber quais vacinas estão disponíveis nos Postos de Saúde etc.

Essa conversa, provavelmente, levará os discentes a perceber que conhecem pouco dos

serviços oferecidos pelo PAC Y, tão próximo a eles e, com certeza, muito necessário, pois sua

realidade socioeconômica não possibilita que usufruam de um plano de saúde privado.

Portanto, é necessário ajudá-los a conhecer melhor essa unidade de saúde. Para isso, será

programada uma visita a esse Posto de Atendimento, a fim de realizar uma entrevista com a

respectiva Assistente Social, na busca de tais informações.

Os alunos serão questionados sobre a forma de fazer esse agendamento, a fim de que

percebam que um encaminhamento viável de fazê-lo seria por meio de um convite formal, já

utilizado na unidade anterior.

Page 260: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

259

1.2 RETOMADA, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE UM CONVITE

1.2.1 Na busca de informações sobre o PAC Y, os alunos, individualmente, deverão escrever

um convite à Assistente Social dessa unidade de saúde para que ela compareça à Sala de

Apoio a fim de ser entrevistada por eles, os quais serão orientados a solicitar uma resposta por

escrito.

1.2.2 Todos os convites deverão ser relidos e reelaborados pelo aluno, com orientação da

professora. Após, um será sorteado para ser analisado coletivamente e, se necessário,

aprimorado para que seja enviado à referida Assistente Social.

Observações:

a) Todas as produções dos alunos serão revisadas várias vezes por eles e, posteriormente e/ou

paralelamente, também pela professora, que devolverá aos respectivos autores para mais

ajustes e reestruturação final.

b) Nessa unidade, a análise linguística será realizada, prioritariamente, a partir das produções

escritas pelos alunos.

1.3 RETOMADA, PRODUÇÃO E REALIZAÇÃO DE UMA ENTREVISTA

1.3.1 Coletivamente, os alunos deverão levantar os principais aspectos que devem ser

investigados quando da entrevista com a Assistente Social do PAC Y.

1.3.2 Após, eles deverão elaborar, individualmente, algumas questões para essa entrevista a

partir dos itens recém-elencados, sendo que uma parte dos alunos poderá elaborar sobre o que

concerne aos atendimentos realizados pelo PAC, outra sobre o funcionamento da Farmácia

Básica e outra sobre o Funcionamento da Farmácia Popular. Portanto, posteriormente,

deverão ser organizados/ordenados os três roteiros de entrevista.

Page 261: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

260

1.3.3 Todos os alunos deverão ficar com uma cópia de todas as questões das entrevistas e

analisá-las.

1.3.4 Combinar, com a turma de alunos, quem serão os entrevistadores e quem ficará

responsável pela sistematização de cada resposta.

1.3.5 Antes de os alunos sistematizarem as respostas obtidas durante a entrevista em forma de

reportagem, eles deverão ler e compreender o texto informativo a seguir, que trata do gênero

textual reportagem.

1.4 Texto

A reportagem

A reportagem é um gênero de texto jornalístico que transmite informações que podem

veicular na TV, no rádio, em revistas ou jornais. Seu objetivo é divulgar os fatos para o leitor

ou telespectador de maneira clara e abrangente, o que requer que o jornalista fale e escreva

bem.

Esse tipo de texto se diferencia da notícia, pois aprofunda mais os assuntos abordados,

faz investigações, tece comentários, levanta questões, discute, argumenta, enquanto a notícia é

mais restrita: informa os fatos de maneira mais objetiva e aponta as respectivas razões e

efeitos.

A reportagem escrita é dividida em três partes: manchete, lead e corpo:

� A manchete compreende o título da reportagem que tem como objetivo resumir o que

será dito que, por sua vez, deve despertar o interesse do leitor.

� O leadé composto por um pequeno resumo que aparece depois do título, a fim de

chamar mais ainda a atenção do leitor.

� O corpo constitui o desenvolvimento do assunto abordado devendo ser organizado

com linguagem direcionada ao público-alvo44.

44 Disponível em: http://divulgueservicos.com/generostextuais.html. Acessado em 09/08/2011.

Page 262: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

261

1.4.1 Realização de leitura silenciosa do texto acima, bem como de leitura, em voz alta, feita

pelo professor e pelos alunos.

1.4.2 Compreensão oral do texto pelos alunos conduzida pela professora.

1.5 PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE REPORTAGENS

Com base na sistematização das respostas obtidas durante a realização da entrevista com a

Assistente Social do PAC Y, uma parte dos alunos produzirá uma reportagem sobre o

funcionamento dessa unidade, outra sobre o funcionamento da Farmácia Básica e a outra

sobre o funcionamento da Farmácia Popular. Cada aluno revisará seu texto várias vezes e, ao

final, essa revisão será feita com a orientação da respectiva professora.

1.5.1 Reestruturação coletiva de textos

Será sorteada uma reportagem de cada modalidade para ser escrita no quadro e reestruturada

coletivamente.

2 CONHECENDO OS PROBLEMAS DO BAIRRO

Conversar com os alunos sobre alguns problemas existentes no bairro em que sua escola está

localizada, bem como sobre as medidas já tomadas para solucioná-los. Entre os problemas

deverão estar: a proliferação do mosquito da dengue, a falta de policiamento, a precariedade

da iluminação pública, a pavimentação danificada das ruas, a violência nas ruas, a existência

de pessoas que não estudam na escola estarem, frequentemente, em seus arredores, a grande

incidência de famílias muito pobres que residem próximo à escola e que necessitam de ajuda,

etc. Para melhor entender tais problemas e encaminhamentos, os alunos serão desafiados a

convidarem o Presidente da Associação de Moradores do respectivo bairro para uma

entrevista. Para isso, deverão elaborar uma carta.

Page 263: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

262

2.1 RETOMADA, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE UMA CARTA

2.1.1 Cada aluno deverá elaborar uma carta ao Presidente do Bairro, a fim de que ele

compareça à Sala de Apoio de sua escola para que seja entrevistado. Antes, porém, eles

deverão definir o dia e o horário para a realização dessa entrevista. Serão orientados para

solicitar uma resposta por escrito.

2.1.2 Após a revisão das produções e reestruturações individuais, será sorteada uma carta

para ser escrita no quadro-de-giz e reestruturada coletivamente, a qual deverá ser

encaminhada ao respectivo Presidente.

2.2 RETOMADA, PRODUÇÃO E REALIZAÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL-DISCURSIVO ENTREVISTA

2.2.1 Individualmente, os alunos deverão elaborar algumas questões para a entrevista que será

feita com o Presidente do Bairro.

2.2.2 Após, tais questões serão apresentadas à turma que, na sequência, deverão ser

selecionadas e ordenadas de forma coerente.

2.2.3 Os alunos determinarão quem serão os entrevistadores e quem ficará responsável para a

sistematização das informações obtidas nas respectivas questões.

2.3 RETOMADA, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE UMA REPORTAGEM

2.3.1. A partir das respostas obtidas na entrevista com o Presidente do Bairro, os alunos

elaborarão uma reportagem contendo os principais problemas por ele abordados, bem como as

medidas que já foram tomadas para solucioná-los, seguidas de respectivas análises.

Page 264: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

263

2.3.2 Como em todas as produções dos alunos, os textos que compõem as reportagens serão

revisados por eles mesmos quantas vezes forem necessárias, paralelamente à orientação da

Professora.

2.3.3 Após, será sorteada uma dessas reportagens para ser reestruturada, coletivamente, e

separada para publicação no jornal da escola.

Obs.: Se houver necessidade de enfatizar, separadamente, alguns dos problemas

detectados/encaminhados, os alunos poderão ser subdivididos em grupos para poderem

contemplar as diferentes especificidades. Neste caso será publicado mais que uma

reportagem.

3 ENTENDENDO ALGUMAS POLÍTICAS SOCIAIS E QUESTÕES AFINS A

PARTIR DE TEXTOS INFORMATIVOS

3.1 Conversar com os alunos sobre o Programa Bolsa Família: se conhecem alguma família

que o recebe, em que situação uma família pode recebê-lo, se conhecem os valores pagos por

esse programa etc. Para essa introdução, a Professora deverá ter por base os textos

informativos 01 a 03 e 05 a 07, a seguir.

É fundamental que o Programa Bolsa Família seja articulado ao Programa Fome Zero e

explorado de forma paralela:

- às condições de vida de grande parte da população brasileira;

- ao valor do salário mínimo nacional;

- ao Programa de Segurança Alimentar e Nutricional – SAN;

- à necessidade de orientar nossa alimentação pela pirâmide alimentar;

- ao grande número de famílias sem casa própria, acentuando a dificuldade para viver

dignamente;

- à precária formação do trabalhador;

- à falta de emprego;

- à necessidade de formar um homem culturalmente sensível;

Page 265: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

264

- à necessidade de caminharmos em direção à maior justiça social etc.

3.2 TEXTO INFORMATIVO 01

O Programa Bolsa Família

O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda com

condicionalidades, que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza. O

Programa integra o Fome Zero, que tem como objetivo assegurar o direito humano à

alimentação adequada, promovendo a segurança alimentar e nutricional e contribuindo para a

conquista da cidadania pela população mais vulnerável à fome.

O Bolsa Família atende mais de 12 milhões de famílias em todo território nacional. A

depender da renda familiar por pessoa (limitada a R$ 140), do número e da idade dos filhos, o

valor do benefício recebido pela família pode variar entre R$ 32 a R$ 242. Esses valores são o

resultado do reajuste anunciado em 1º de março e vigoram a partir dos benefícios pagos em

abril de 2011.

Diversos estudos apontam para a contribuição do Programa na redução das

desigualdades sociais e da pobreza. O 4° Relatório Nacional de Acompanhamento dos

Objetivos de Desenvolvimento do Milênio aponta queda da pobreza extrema de 12% em 2003

para 4,8% em 200845.

Atividades para o aluno

3.2.1 Procure o significado das palavras abaixo e escreva-as em seu dicionário particular:

a) Condicionalidade:

b) Vulnerável:

c) Redução:

d) Vigorar:

3.2.2 Compreensão do texto:

45 Disponível em: http://www.mds.gov.br/bolsafamilia. Acessado em 30/06/2011.

Page 266: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

265

a) Explique o que é o Programa Bolsa Família:

b) Explique o que é o Programa Fome Zero:

c) Todas as famílias beneficiadas pelo Bolsa Família recebem o mesmo valor? Explique sua

resposta.

d) Qual é sua opinião sobre o Bolsa Família?

e) Caso você fosse governante, que outras ações realizaria para beneficiar as famílias

carentes?

f) Você acha que o Bolsa Família ajuda a movimentar o comércio? Por quê?

3.2.3 Atividades de análise linguística

As palavras destacadas no texto acima são verbos. Eles estão indicando informações do

passado, do presente ou do futuro?

É possível entender por que seus autores escolheram esse tempo verbal? Por quê?

3.2.4 Reescreva o parágrafo abaixo, extraído do texto, como se o Bolsa Família só passasse a

existir no próximo ano (2012).

“O Bolsa Família atende mais de 12 milhões de famílias em todo território nacional. A

depender da renda familiar por pessoa (limitada a R$ 140), do número e da idade dos filhos, o

valor do benefício recebido pela família pode variar entre R$ 32 a R$ 242. Esses valores são o

resultado do reajuste anunciado em 1º de março e vigoram a partir dos benefícios pagos em

abril de 2011.”

Page 267: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

266

3.3 TEXTO INFORMATIVO 02

Valores dos Benefícios pagos pelo Bolsa Família

Os valores dos benefícios pagos pelo Bolsa Família variam de R$ 32 a R$ 242, de

acordo com a renda mensal da família, por pessoa, e com o número de crianças e adolescentes

de até 17 anos. O Programa tem quatro tipos de benefícios: o Básico, o Variável, o Variável

Vinculado ao Adolescente e o Variável de Caráter Extraordinário.

O Benefício Básico, de R$ 70, é pago às famílias consideradas extremamente pobres,

com renda mensal de até R$ 70 por pessoa, mesmo que elas não tenham crianças,

adolescentes ou jovens.

O Benefício Variável, de R$ 32, é pago às famílias pobres, com renda mensal de até

R$ 140 por pessoa, desde que tenham crianças e adolescentes de até 15 anos. Cada família

pode receber até três Benefícios Variáveis, ou seja, até R$ 96.

O Benefício Variável Vinculado ao Adolescente (BVJ), de R$ 38, é pago a todas as

famílias do Programa que tenham adolescentes de 16 e 17 anos frequentando a escola. Cada

família pode receber até dois benefícios variáveis vinculados ao adolescente, ou seja, até R$

76.

O Benefício Variável de Caráter Extraordinário (BVCE) é pago às famílias nos casos

em que a migração dos Programas Auxílio-Gás, Bolsa Escola, Bolsa Alimentação e Cartão

Alimentação para o Bolsa Família cause perdas financeiras. O valor do benefício varia de

caso a caso46.

Atividades para o aluno

3.3.1 Procure, no dicionário, o significado das palavras abaixo e, a seguir, registre-as em seu

dicionário particular:

a) Variável:

b) Vinculado:

c) Migração:

3.3.2 Complete a tabela abaixo indicando o valor de cada benefício do Bolsa Família, bem

como explicando em que situação cada um é pago.

46 Disponível: http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/valores-dos-beneficios. Acessado: 30/06/2011

Page 268: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

267

TIPOS DE BENEFÍCIO Valor pago Situação em que é pago

Benefício Básico

Benefício Variável

Benefício Variável

Vinculado ao Adolescente

Benefício Variável de

Caráter Extraordinário

3.3.3 Responda:

a) Até quantos Benefícios Variáveis uma família pode receber?

b) Até quantos Benefícios Variáveis Vinculados ao Adolescente uma família pode receber?

c) Quanto você acha que uma família deveria receber do Bolsa Família? Por quê?

3.3.4 Produção de texto

Com base nas reflexões sobre o Bolsa Família, o aluno deverá produzir um texto

apresentando as principais informações sobre esse Programa aos leitores do jornal da escola.

3.4 TEXTO INFORMATIVO 03

As condicionalidades para usufruir do Bolsa Família

As condicionalidades são os compromissos nas áreas da Educação, da Saúde e da

Assistência Social assumidos pelas famílias e que precisam ser cumpridos para que elas

continuem a receber o benefício do Bolsa Família.

Educação: frequência escolar mínima de 85% para crianças e adolescentes entre 06 e

15 anos e mínima de 75% para adolescentes entre 16 e 17 anos.

Page 269: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

268

Saúde: acompanhamento do calendário vacinal e do crescimento e desenvolvimento

para crianças menores de 07 anos; pré-natal das gestantes e acompanhamento das nutrizes na

faixa etária de 14 a 44 anos.

Assistência Social: frequência mínima de 85% da carga horária relativa aos serviços

socioeducativos para crianças e adolescentes de até 15 anos em risco ou retiradas do trabalho

infantil47.

3.4.1 Deverão ser realizadas as seguintes leituras do texto acima:

a) silenciosa;

b) pelo professor, observando rigorosamente a entonação;

c) pelos alunos.

3.4.2. Compreensão do texto:

Com base no texto acima, o aluno deverá explicar as três condicionalidades para que uma

família possa usufruir do Programa Bolsa Família.

Obs.: Os alunos deverão produzir um artigo de opinião sobre as condicionalidades, antes,

porém, será necessário estudar, com eles, o que é um artigo de dessa modalidade.

3.5 Para ajudar o aluno a entender o que é um artigo de opinião, tomar-se-á, por base, as

orientações de Costa-Hübes et al (2007, p. 133)48 ao defenderem que é necessário conversar,

com os alunos “[...]sobre a importância de saber discutir, opinar e argumentar sobre

determinado assunto. Em nossa sociedade atual, o indivíduo que sabe posicionar-se perante

um determinado tema, emitindo sua opinião e apresentando argumentos para sustentá-la,

certamente será mais respeitado. Por exemplo: se numa roda de amigos surgir uma discussão

sobre a doação de esmolas, com certeza serão emitidas opiniões a favor e outras contra porque

há quem acredite que, dando esmolas, contribuímos para que aqueles que se encontram numa

situação desfavorável, continuem na rua dependendo desta doação, e há outros que não

pensam assim. Mas, como apresentar nossas ideias, sustentar nossos argumentos, em se

tratando de um texto escrito?”

47 Disponível: http://www.webartigos.com/articles/56646/1/CONDICIONALIDADES-DO-PROGRAMA-BOLSA-FAMILIA/pagina1.html. Acessado: 03/08/2011 48COSTA-HÜBES, T. C. (coord.). Seqüência didática: Uma proposta para o ensino da língua portuguesa nas séries iniciais. Caderno Pedagógico 01. Cascavel: Assoeste, 2007.

Page 270: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

269

3.5.1 TEXTO INFORMATIVO 04

Artigo de opinião

O artigo de opinião é um gênero jornalístico que se caracteriza por expressar o ponto

de vista de quem o produz, ao contrário das notícias, que devem ser isentas do julgamento

daqueles que as escrevem.

Os autores de tais artigos tentam convencer o leitor a acreditar em suas ideias, na

tentativa de conquistá-lo como aliado e, consequentemente, a não apresentar ideias diferentes.

O ponto de vista desses autores é apresentado como sendo “a verdade” com o objetivo de

levar os leitores a também acreditarem em tal “verdade.”

Em síntese, o artigo de opinião envolve discussões de temas polêmicos, controvérsias,

diante das quais o autor assume uma posição e a defende, apresentando fortes argumentos

introduzidos por palavras explicativas como: “porque”, “pois”. Também são utilizadas marcas

linguísticas como: “penso que”, “do nosso ponto de vista”. A conclusão é introduzida por

palavras como: “portanto”, “logo”49.

3.5.2 Leituras:

a) silenciosa;

b) pelo professor observando rigorosamente a entonação;

c) pelo aluno.

3.5.3 Compreensão oral do texto.

3.5.4 Leitura, análise e comparação de dois artigos de opinião sobre o mesmo assunto,

porém, com enfoques diferentes.

49 Disponível: http://www.webartigos.com/articles/56646/1/CONDICIONALIDADES-DO-PROGRAMA-BOLSA-FAMILIA/pagina1.html. Acessado: 03/08/2011.

Page 271: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

270

ESTUDO COMPARATIVO DE DOIS ARTIGOS DE OPINIÃO

Artigo de opinião 01

A redução da água em nosso planeta

Os noticiários e a observação da realidade nos mostram que, progressivamente, a água

está cada vez mais escassa em todo o planeta. Essa situação causa desespero porque sem ela

não é possível sobreviver. Porém, parece que ainda não nos demos conta dessa realidade.

Como prova disso temos a informação da Organização Mundial da Saúde de que cada pessoa

gasta, em média, 200 litros de água por dia, sendo que o indicado é de apenas 40 litros.

No meu entender, todos devem fazer a sua parte para contribuir com a resolução desse

sério problema. Assim, é urgente que mudemos nossos hábitos em situações simples como

não deixar a torneira aberta enquanto escovamos os dentes ou durante todo o tempo do nosso

banho. Também é preciso que repensemos a forma de lavar a louça e a roupa, bem como que

saibamos reaproveitar a água já utilizada, seja para lavar calçadas, ou molhar as plantas.

Tenho certeza de que atitudes como essas contribuem muito para a economia desse

líquido precioso. No entanto, reconheço que também é preciso que o governo invista na

fiscalização da quantidade de água gasta pelas grandes empresas e pela agricultura, sobretudo

dos instrumentos de vazão de água utilizados por esses setores. Defendo, inclusive, que,

mesmo nós, ao percebermos tais irregularidades, tenhamos coragem para denunciá-las às

autoridades competentes.

Abelardo Zeico

(Autor fictício)

Artigo de opinião 02

A redução da água em nosso planeta

A imprensa de todo o planeta vem divulgando que a água corre sério risco de entrar

em extinção e tenta mostrar que uma das principais saídas para esse problema é que todos

devem contribuir gastando menos água. No entanto, do meu ponto de vista, pouco é

divulgado, por exemplo, que a agricultura consome mais da metade da água doce para irrigar

as plantações.

Page 272: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

271

Essa situação me leva a defender a ideia de que antes de atribuir a culpa de tal

extinção a todos os indivíduos e pedir que todos gastem menor quantidade de água, é mais

importante resolver os grandes problemas relacionados a esse consumo, até porque o consumo

de cada pessoa é muito pequeno comparado ao das grandes empresas.

Assim, penso que o governo, ao invés de investir tanto na conscientização das pessoas,

deveria investir mais na fiscalização da quantidade de água que é gasta na agricultura, nas

indústrias têxteis que colorem tecidos, bem como nos grandes mercados, frigoríficos, postos

de gasolina, dentre outros estabelecimentos.

Defendo que essa fiscalização inclua os instrumentos de vazão de água que são

utilizados nesses setores, no sentido de verificar se há controle para que a saída desse líquido

precioso não seja abundante.

Acredito que após essas iniciativas cada pessoa estará mais disposta a também

contribuir para a redução do consumo de água.

Afrânio Zum

(Autor fictício)

3.5.5 Compreensão dos artigos de opinião:

a) Qual é a principal ideia defendida no primeiro artigo de opinião?

b) Que argumentos o autor utiliza para isso?

c) Qual é a principal ideia defendida no segundo artigo de opinião?

d) Que argumentos o autor utiliza para isso?

e) Qual é o seu posicionamento frente às ideias desses artigos?

3.5.6 Produção de texto:

Cada aluno deverá produzir um artigo de opinião sobre as condicionalidades referentes ao

benefício Bolsa Família.

3.5.7 Será sorteado um artigo de opinião para ser analisado e reestruturado coletivamente e,

posteriormente, publicado no jornal da escola.

Obs.: Os dois textos informativos a seguir (05 e 06), além de serem relacionados às questões

indicadas na introdução da seção Entendendo algumas políticas sociais e questões afins a

partir de textos informativos também devem ser analisados de forma articulada a outros

fatores que interferem na precária alimentação da atualidade, sem restringir-se à falta de

Page 273: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

272

condições econômicas para poder “usufruir” de uma boa alimentação. Dentre tais fatores

destaca-se a constante utilização de produtos industrializados em detrimento dos naturais,

cujos componentes, quando utilizados com frequência, como corantes, conservantes,

aromatizantes, gorduras etc., são prejudiciais à nossa saúde. Também é preciso considerar o

quanto a troca de refeições saudáveis por sanduíches e pizzas, por exemplo, contribuem para a

obesidade e para a causa de diversas doenças. Para complementar, os referidos textos (05 e

06) devem ser articulados com o texto 07 que trata da importância da atividade física para a

saúde.

3.6 TEXTO INFORMATIVO 05

O que é Segurança Alimentar e Nutricional?

Segurança Alimentar e Nutricional - SAN – significa, em resumo: acesso permanente

a alimento suficiente e de qualidade adequada. Geralmente associa-se a SAN à fome, mas

existem outros problemas que também se encontram nessa área:

► Doenças causadas por alimentos: diarreia, contaminação por agrotóxicos, presença de

hormônios, composição inadequada etc.

►Doenças associadas a hábitos alimentares inadequados: obesidade, sobrepeso, diabetes,

pressão alta, doenças cardíacas, câncer.

Conceito a partir da I Conferência Nacional de Segurança Alimentar adotado para a Cúpula

Mundial (1996): “SAN consiste em garantir a todos condições de acesso a alimentos de

qualidade em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a

outras necessidades essenciais, com base em práticas alimentares saudáveis, contribuindo

assim para uma existência digna”50.

3.6.1 Atividades:

a) Leitura do texto.

Compreendendo a temática:

50 Disponível: http://www.bvsde.ops-oms.org/texcom/nutricion/seguranca_an.pdf; acessado: 03/08/2011.

Page 274: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

273

a) Por que os produtos naturais são mais saudáveis que os industrializados?

b) Em que situações os alimentos podem causar doenças?

3.7 TEXTO INFORMATIVO 06

A pirâmide alimentar e nossa saúde

As principais metas da pirâmide alimentar são: orientar o consumo variado de

alimentos, ingestão menor de gorduras saturadas e colesterol, maior consumo de frutas,

verduras, legumes e grãos, além da ingestão moderada de açúcar, sal e bebidas alcoólicas.

A prática de exercícios físicos é recomendada visando a perda ou manutenção do peso

adequado como também a prevenção de doenças, entre elas, as cardiovasculares, diabetes,

hipertensão e osteoporose.

A adoção da pirâmide alimentar se propõe a mostrar, de forma prática e flexível,

como uma pessoa pode suprir suas necessidades de calorias e nutrientes a partir dos alimentos

que consome.

Na base da pirâmide encontram-se os alimentos que devem estar presentes na

alimentação em maior quantidade. Assim, à medida que os níveis da pirâmide forem subindo,

a frequência ou quantidade dos alimentos devem ser restringidas nas refeições51.

51 Disponível: http://cyberdiet.terra.com.br/piramide-alimentar-2-1-1-100.html. Acessado 11/07/2011.

Page 275: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

274

Disponível:http://academiahappyday.com.br/nutri2.html; acessado: 03/08/2011.

Atividades para o aluno:

3.7.1 Leitura do texto e da pirâmide acima e respectiva compreensão oral.

3.7.2 O aluno deverá procurar, no dicionário, o significado das seguintes palavras e, após,

registrá-las em seus dicionários particulares:

a) Cereais

b) Tubérculos

c) Hortaliças

d) Leguminosas

3.7.3 Para refletir:

a) Por que é mais difícil para as pessoas de baixa renda seguirem, rigorosamente, as

orientações da pirâmide alimentar?

b) Que alternativas podemos indicar-lhes para que tenham acesso a mais verduras, legumes e

frutas?

Page 276: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

275

3.7.4 Com base nos dois textos acima (05 e 06), o aluno deverá produzir um texto informativo

referente à necessária alimentação saudável, o qual deverá ser ilustrado com desenhos

correspondentes.

Obs.: Será sorteado um texto para ser reestruturado coletivamente e publicado no jornal da

escola.

3.8 TEXTO INFORMATIVO 07

Importância da atividade física

Para prevenir o sobrepeso e a obesidade é muito importante a prática de exercícios

físicos regularmente, aliada a uma alimentação saudável, o que traz, também, importantes

benefícios para a saúde mental e emocional. É importante lembrar, ainda, que as pessoas

fisicamente ativas são, de um modo geral, mais dispostas, e desenvolvem maior resistência a

doenças.

Para ter uma vida saudável é preciso associar sempre uma alimentação equilibrada

com o consumo de água e a prática de atividades físicas regularmente. Esse conjunto de

práticas é fundamental para o aumento da imunidade, a manutenção do peso ideal e a

prevenção de doenças52.

3.8.1 Compreendendo o texto e outras questões afins

a) Além de usufruir de uma alimentação equilibrada, que outros cuidados são necessários para

que uma pessoa possa ter uma vida saudável?

b) Que benefícios esses cuidados podem oferecer a uma pessoa?

c) Na sua opinião, por que o controle do sobrepeso e da obesidade são importantes para a

saúde emocional das pessoas?

d) Como uma pessoa que não tem condições financeiras de pagar uma academia pode praticar

atividades físicas?

52 Disponível: http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?650.

Page 277: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

276

e) Em seu entender, por que, atualmente, são poucas as famílias que cultivam uma horta

próximo às suas casas?

3.8.2 Os alunos deverão elaborar um texto informativo falando da importância de praticar,

regularmente, uma atividade física. A seguir, deverão ilustrá-lo com desenhos, de forma

coerente.

3.8.3 Após cada aluno ler, reler e reorganizar seu texto, será sorteado um para ser

reestruturado coletivamente, a fim de que seja publicado no jornal.

Page 278: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

277

ANEXOS

Page 279: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

278

ANEXO A - JORNAL DA ESCOLA

Page 280: GÊNEROS TEXTUAIS ALUNOS DE UMA SALA DE A

279

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280

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ANEXO B - PANFLETO ELABORADO PELOS ALUNOS

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ANEXO C - CERTIFICADO DE CURSO REALIZADO

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ANEXO D

TABELA DIAGNÓSTICA

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CRITÉRIOS DE ANÁLISE LINGUÍSTICO-DISCURSIVA

TABELA DIAGNÓSTICA

Aspectos não Dominados – ND/ Marcar X

Nome dos Alunos

1. GÊNERO/ SITUAÇÃO SOCIAL

1.1. Atende à necessidade de interação

estabelecida (Quem? P/ quem? O quê?

Quando? Onde? – contexto de produção)?

1.2 Está adequado à esfera de circulação?

1.3 Abrange satisfatoriamente o tema?

1.4 Atende ao formato do gênero?

1.5 Expressa o domínio da capacidade de

linguagem que o gênero requer (narrar,

argumentar, expor ou descrever ações)?

2. TEXTO

2.1 Apresenta clareza / coerência:

2.1.1 Tem progressão?

2.1.2 Apresenta ideias não contraditórias?

2.2 Usa adequadamente os mecanismos

de coesão?

2.3 A variante linguística selecionada é

adequada à situação?

2.4 Pontuação adequada?

2.5 Paragrafação adequada?

(COSTA-HÜBES, 2008)

Obs.: A tabela original é mais completa.

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ANEXO E

CERTIFICADO DE APRESENTAÇÃO DE TRABALHO

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