14
MUNDO Geografia e Política Internacional ANO 3 N º 6 OUTUBRO 1995 Tiragem da 1 a edição: 37.000 exemplares geopolítica da escravidão trabalha, negro ! “Tinir de ferros... estalar de açoite... / Legiões de homens negros como a noite / Horrendos a dançar...” 50 anos da ONU, 50 anos da bomba Texto & Cultura (1636 - 95) Zumbi Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra atual tem sua raiz na deportação, como escravos, de pelo menos 11 milhões de pessoas para a América, entre os séculos XVI e XIX. O tráfico de negros, praticado principalmente por Portugal, causou a hecatombe demográfica e estimulou rivalidades étnicas que impedem a estabilização social, econômica e política do continente. Os que sobreviveram à dura travessia do Atlântico, nos porões fétidos dos navios negreiros, foram levados aos territórios que viriam a formar os Estados Unidos, o Brasil e os micro-países antilhanos. Ali, enfrentaram os mais diversos tipos de racismo -do apartheid consagrado em lei até os anos 60 nos EUA ao apartheid ‘‘cordial’’ praticado no Brasil. Em alguns momentos, os negros conseguiram se organizar contra o opressor: foi o caso do Quilombo dos Palmares, liderado por Zumbi no séc. XVII, ou o da revolução dos escravos do Haiti, liderada por Toussaint L’Ouverture, em 1801. Mas o racismo jamais permitiu sua plena integração ao ‘‘mundo dos brancos’’. Págs. 4-5 Há 300 anos, em 20 de novembro de 1695, a morte de Zumbi dos Palmares encerrou a mais importante revolta de escravos da história do Brasil. O legendário líder negro se transformou em símbolo da luta contra a opressão racial, que no Brasil assume uma forma disfarçada, sob o manto mitológico da ‘‘harmonia racial’’. Apesar de marginalizados, os negros exerceram uma enorme influência na cultura nacional. Introduziram as tradições africanas no idioma, na culi- nária, na vestimenta, na religião e na música, deram-nos o mais universal de nossos escritores (Machado de Assis), o mais intenso dos nossos poetas simbolistas (Cruz e Souza) e o mais famoso de nossos atletas (Pelé). V E S T I B U L A R Esta edição de Mundo é es- pecialmente dedicada ao Ves- tibular. Para facilitar ao leitor uma sistematização dos estu- dos, preparamos, nas páginas de 8 a 11, uma síntese de al- guns dos principais temas do ano, com perguntas e respos- tas. Também organizamos, à pág. 2, um índice geral de tudo o que foi publicado em Mun- do durante 1995, de tal forma que você poderá otimizar a sua leitura adotando uma região econômica e / ou geográfica. Mundo deseja a todos os can- didatos uma boa sorte! Óleo de Manoel Victor M.C. Escher

Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

1

M U N D OGeografia e Política Internacional

ANO 3 • Nº 6 • OUTUBRO 1995Tiragem da 1a edição: 37.000 exemplares

geopolítica da escravidão

trab

alha

, neg

ro !

“Tinir de ferros... estalar de açoite... / Legiões dehomens negros como a noite / Horrendos a dançar...”

50 anos da ONU, 50 anos da bomba

Texto & Cultura(1636 - 95)

Zumbi

Págs. 6 e 7

Navio negreiro, segundo Rugendas

A tragédia da África Negra atual tem sua raiz na deportação, como escravos, depelo menos 11 milhões de pessoas para a América, entre os séculos XVI e XIX. O tráficode negros, praticado principalmente por Portugal, causou a hecatombe demográfica eestimulou rivalidades étnicas que impedem a estabilização social, econômica e política docontinente.

Os que sobreviveram à dura travessia do Atlântico, nos porões fétidos dos naviosnegreiros, foram levados aos territórios que viriam a formar os Estados Unidos, o Brasile os micro-países antilhanos. Ali, enfrentaram os mais diversos tipos de racismo -doapartheid consagrado em lei até os anos 60 nos EUA ao apartheid ‘‘cordial’’ praticado noBrasil. Em alguns momentos, os negros conseguiram se organizar contra o opressor: foi ocaso do Quilombo dos Palmares, liderado por Zumbi no séc. XVII, ou o da revolução dosescravos do Haiti, liderada por Toussaint L’Ouverture, em 1801. Mas o racismo jamaispermitiu sua plena integração ao ‘‘mundo dos brancos’’.

Págs. 4-5

Há 300 anos, em 20 de novembro de 1695, a morte de Zumbi dos Palmaresencerrou a mais importante revolta de escravos da história do Brasil. O legendáriolíder negro se transformou em símbolo da luta contra a opressão racial, que noBrasil assume uma forma disfarçada, sob o manto mitológico da ‘‘harmoniaracial’’. Apesar de marginalizados, os negros exerceram uma enorme influênciana cultura nacional. Introduziram as tradições africanas no idioma, na culi-nária, na vestimenta, na religião e na música, deram-nos o mais universal denossos escritores (Machado de Assis), o mais intenso dos nossos poetas simbolistas(Cruz e Souza) e o mais famoso de nossos atletas (Pelé).

V E S T I B U L A REsta edição de Mundo é es-pecialmente dedicada ao Ves-tibular. Para facilitar ao leitoruma sistematização dos estu-dos, preparamos, nas páginasde 8 a 11, uma síntese de al-guns dos principais temas doano, com perguntas e respos-tas. Também organizamos, àpág. 2, um índice geral de tudoo que foi publicado em Mun-do durante 1995, de tal formaque você poderá otimizar a sualeitura adotando uma regiãoeconômica e / ou geográfica.Mundo deseja a todos os can-didatos uma boa sorte!

Óle

o de

Man

oel V

icto

r

M.C

. Esc

her

Page 2: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

2

Você encontra, abaixo, o índice geral de tudo o que foipublicado no boletim Mundo - Geografia e PolíticaInternacional em 1995. Na primeira parte do índice, osassuntos são listados segundo o número da edição doboletim em que aparecem. Na segunda parte, o índice éorganizado por região econômica e / ou geográfica. Osnúmeros em negrito (fora dos parêntesis) indicam o númeroda edição do boletim; dentro dos parêntesis, indicam aspáginas. Por exemplo: Oriente Médio - 2: (1-6-7) 5: (9-10)assinala que o assunto será encontrado em Mundo nº 2, àspáginas 1, 6 e 7 e também em Mundo nº 5, às páginas 9 e 10.

Número 1 - março 1995

• O colapso do México e a economia mundial• Crise mexicana ameaça futuro do Nafta• A Internet e a geopolítica da informação• Peru e Equador guerreiam na Amazônia• Milton Santos discute o Mercosul e a cultura• O Meio e o Homem: água e política no Oriente Médio• Diário de Viagem: as três Chinas

Número 2 - abril 1995

• Turquia atua como pilar do Ocidente no mundo islâmico• Balcãs e África do Norte: duas faces de uma crise• A Alemanha e a Europa, há 50 anos de 1945• A Perestroika e o mundo, 10 anos depois• A APEC, 20 anos depois da Guerra do Vietnã• J. B. Natali comenta as eleições francesas• O Meio e o Homem: Dien Bien Phu, guerra na selva• Diário de Viagem: México

Número 3 - maio 1995

• A China depois de Deng Xiaoping• Guerra balcânica ingressa em nova etapa• A Anistia Internacional diante de FHC• Argentina em crise reelege Carlos Menem• Ariovaldo de Oliveira escreve sobre a Amazônia e o Sivam• O Meio e o Homem: geopolítica dos estreitos marítimos• Diário de Viagem: Japão

Número 4 - agosto 1995

• Entrevista exclusiva: Luiz Felipe Lampreia• A política externa brasileira diante dos EUA• “Grande Sérvia” e “Grande Croácia” emergem nos Balcãs• Anistia Internacional divulga relatório anual• Wagner da Costa Ribeiro discute Convenção do Clima• O Meio e o Homem: A Chechênia e a guerra nas cidades• Diário de Viagem: Cuba

Número 5 - setembro 1995

• EUA-Japão: o eixo assimétrico do mundo• A Conferência da Mulher e os rumos do feminismo• O Quebec e a unidade do Canadá• As redes mafiosas internacionais• Newton Carlos analisa a autonomia palestina na Cisjordânia• Diário de Viagem: Israel e a Palestina

O MAPA DE Mundo

• Europa Ocidental - 2:(3-4)• Europa Oriental - 2:(8) 3:(3) 4:(4-5)• CEI - 2:(5) 5:(4)• Estados Unidos/Canadá - 1:(3-9) 5:(1-5-6-7)• América Latina - 1:(1-4-5-6-7-8) 2:(10) 3:(9) 4:(10) 5:(4)• Brasil - 3:(4-5) 4:(1-6-7-8)• Oriente Médio - 2:(1-6-7) 5:(9-10)• África do Norte - 2:(8)• Ásia Meridional - 2:(9)• Oriente e Pacífico - 1:(10) 3:(1-6-7-8-10) 5:(8)

Índice Geral de MUNDO - 95

MUNDO

OK, Karl! Você venceu!!!

“É preciso mudar o Mundo!”

Como o mundo, Mundo muda. Em1993, o boletim foi lançado com oito páginas,que virariam doze no ano seguinte. Em 1995,a novidade foi o caderno Texto & Cultura,quatro páginas que se somaram às doze do játradicional caderno de Geografia e PolíticaInternacional. Todas essas mudançastiveram um sentido: aprimorar a qualidadedo boletim, contribuir para a formação deseus leitores, investir na idéia de que épossível e desejável uma reflexão crítica esofisticada sofre os fatos da vidacontemporânea.

Acreditamos, com o poeta, quenavegar é preciso, e por isso rejeitamos atentação de repetir, a cada novo ano, receitasconsagradas no passado -por mais que elastenham se mostrado acertadas. Foi isso quenos levou, em primeiro lugar, a lançarMundo, e, numa segunda fase, a criar T&C.Assumimos o desafio de tratar os fenômenosda Geopolítica, da Gramática, da Literatura eda Cultura em geral como algo vivo, processoem permanente mutação, muitas vezescontraditório, mas sempre enriquecedor.

A avaliação que os nossos leitoresfazem de nosso desempenho pode serrigorosamente medida: o número deassinantes de Mundo pulou de 5 mil noinício de 1993 para 30 mil no final de 1995.Ficamos honrados, mas sentimos o peso daresponsabilidade. O que mais nos anima é aresposta positiva que recebemos de nossoscolegas professores e dos alunos que nos lêem,escrevem e participam dos debates. O quemais nos preocupa é estar à altura dasexpectativas.

Mas o importante, mesmo, é queMundo consiga contribuir, ainda queminimamente, para o processo de formação decidadãos brasileiros. A realização ou nãodessa imensa pretensão é que medirá, nolongo prazo, o valor de nossa empreitada.

Professores aprovamTexto & Cultura (*)

1) Com relação ao objetivo de ajudar o aluno aformar um repertório cultural, T&C é:a) ótimo 65% b) bom 35%

2) O índice de leitura de T&C entre os seus alunos é:a) alto 20% b) médio 80%

3) Na sua avaliação pessoal e profissional, T&C é:a) ótimo 55% b) bom 45%

4) Você utiliza T&C em sala de aula:a) sempre 40% b) às vezes 55% c) nunca 5%

5) T&C é utilizado como:a) estímulo para redação 55% b) material detrabalho 60% c) material de prova 45%

6) O nível de linguagem adotado por T&C é:a) difícil mas compreensível 35% b) adequado 65%

7) Os temas abordados por T&C são:a) oportunos e interessantes 80% b) interessantes, massem relação com as prioridades didáticas 20%

Dois momentos na vida deGeografia e Política Internacional

Com chuva e engarrafamento, 450 leitores de Mundolotaram o anfiteatro da Faculdade de Geografia da

USP, em 19 de setembro, para discutir PolíticaExterna Brasileira (foto superior). Mundo também

teve a honra de oferecer uma palestra aos professoresque participaram do encontro Fala Professor,

promovido pela Associação dos Geógrafos Brasileirosem Presidente Prudente (SP), em julho.Na mesa (foto inferior), os professores

Demétrio Magnoli (editor de GePI, à esq.)e Nelson Bacic (editor cartográfico)

(*) Os dados apresentados ao lado foramobtidos mediante consulta realizada em

agosto junto aos professores deComunicação e Expressão das escolas

conveniadas. Publicamos apenas partedos resultados, por uma questão de

espaço e porque outras questões tinhamnatureza mais técnica, de menor

interesse para o conjunto dos leitores.Pela mesma razão, só publicamos as

alternativas que tiveram índicesignificativo (igual ou superior a 5%).

Page 3: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

3E D I T O R I A L

E X P E D I E N T E

Seitas milenaristas

MUNDO - Geografia e Política Internacional é uma publicação de Pangea - Edição e Comercialização

de Material Didático LTDA.

Redação: José Arbex Jr. (Editor Geral), Demétrio Magnoli (Geografia e Política Internacional), Nelson Bacic Olic (Cartografia), Paulo César de Carvalho (Texto & Cultura)Jornalista Responsável: José Arbex Jr. (MT 14.779)Diretor Comercial: Arquilau Moreira RomãoProjeto e editoração eletrônica: Wladimir SeniseEndereços: São Paulo: Rua Romeu Ferro, 501. CEP 05591-000 - Fone e Fax: (011) 211-9640Ribeirão Preto: Espaço Cultural Tantas Palavras - Rua Floriano Peixoto, 989 CEP 14.025-010 - Fone: (016) 634-8320 Fax: 623-5480.Belém: J.M.C. Morais, Av. Augusto Montenegro, conj. Morada do Sol, pr. Sol Nascente, aptº 403 - Belém (PA) CEP 66000-000 Fone: (091) 216-8018Colaboradores: Newton Carlos, J.B. Natali, Nicolau Sevcenko, Rabino Henry I. Sobel, Carlos A. Idoeta (Anistia

Internacional), Guilherme Fiuza (Greenpeace), Hassan El Emleh (Federação Palestina do Brasil).A Redação não se responsabiliza pela opinião ou informação veiculadas em matérias assinadas.

Assinaturas: Por razões técnicas, só oferecemos assinaturas coletivas para escolas conveniais. Pedidosdevem ser encaminhados aos endereços acima. Exemplares individuais podem ser obtidos nos seguintesendereços, em SP:• Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), na Faculdade de Geografia da Universidade de SP (USP).• Banca de jornais Paulista 900, à Av. Paulista, 900.• Em Ribeirão Preto: na Sucursal (v. endereço acima)

Apocalypse nowbem. Cada um tem o direito de acreditar na-quilo que quiser. Os problemas começamquando as seitas tentam provar a verdade desuas profecias, como fez Asahara, e se trans-formam em grupos de fanáticos terroristas oude adeptos da ‘‘solução final’’, o que inclui aprática de suicídio coletivo.

Há vários exemplos recentes: o suicí-dio em massa promovido pelo Templo Solar,na Suíça, em 1994, e a imolação dos seguido-res de David Koresh, cuja sede, em Waco(Texas), foi incendiada durante um cerco pro-movido pelo FBI (polícia federal dos EstadosUnidos), em 1993. Mas o número recorde desuicídio de adeptos foi estabelecido em 1978,quando o ‘‘reverendo’’ americano Jim Jones,criador e chefe de uma comunidade naGuiana, levou mais de 900 seguidores à auto-aniquilação.

O que leva alguém a se associar a essetipo de grupo? Não há uma resposta única,mas certamente a angústia em relação ao fu-turo, a ansiedade causada pela crise econômi-ca, a sensação de falência moral e cultural quemarca a sociedade contemporânea -tudo issocontribui para fazer com que uma pessoa abra-ce um ideal que, aparentemente, lhe dá res-postas e, melhor ainda, lhe salvará doapocalipse. É um princípio semelhante ao quefaz com que as pessoas acreditem nas seitasevangélicas televisivas. A proximidade do fimdo milênio apenas oferece maiores oportuni-dades para que ‘‘pastores’’ impressionem eengabelem suas ‘‘ovelhas’’.

Nesse sentido, o homem contempo-râneo não é muito diferente daquele que pre-senciou a passagem do ano 1000. À época,profetas buscavam nos céus -no deslocamen-to das estrelas e dos planetas, na passagem decometas, na forma das nuvens, na luz dos rai-os e no som do trovão- os augúrios que con-firmariam a proximidade do fim. Na noite deentrada do ano 1000, crentes enlouquecidosse arrastavam em procissões à luz de tochas,seguindo os messias que indicavam o cami-nho da salvação. Mil anos depois, mudaramos meios e as técnicas, mas não o conteúdo.

Mas nem só de suicidas potenciais vi-vem as seitas milenaristas. Ao contrário, mul-tiplicam-se grupos fortemente armados, comono caso do iluminado Asahara. Os fanáticosreligiosos -não importa se católicos, protes-tantes, muçulmanos, judeus, budistas,hinduístas ou de crenças mais exóticas- têmtudo para ser os primeiros entre os diversosgrupos terroristas a utilizar armas de destrui-ção em massa. Quando a tecnologia da mortese une ao delírio sagrado, qualquer demênciaé possível.

Assim caminha a humanidade.

A Escola de Comunicações e Artes da USP decidiu apli-

car, este ano, o exame de Geografia para os candidatos a Jor-

nalismo na 2ª fase do vestibular da Fuvest. Esta medida, que

revoga uma decisão adotada em 1994 (a qual abolia a Geogra-

fia na segunda fase), deve ser saudada como um grande avan-

ço. Espera-se que o eventual futuro jornalista seja capaz de

desenvolver reflexões sobre os fenômenos que marcam o mun-

do contemporâneo: conflitos étnicos e movimentos migratóri-

os (Geografia Humana), alterações de fronteira (Cartografia e

Geografia Política), guerras nas quais as condições do relevo e

clima têm importância crucial (Geografia da Natureza), o ad-

vento dos megablocos e os novos cenários em que se desen-

volvem os vínculos entre os Estados (Geopolítica). A Redação

de Mundo aplaude, hoje, a decisão da ECA, com a mesma in-

tensidade com que a criticou em maio de 1994 (à pág. 3, no

Editorial).

A nova postura da ECA não é, felizmente, um fenômeno

isolado. Ao contrário, reflete uma preocupação central daque-

les que elaboram o vestibular. É exemplar, nesse sentido, uma

entrevista concedida ao jornal OESP (21.ago.95, p. A11) por

Atílio Vanin, vice-diretor da Fundação Fuvest. “O vestibular da

Fuvest -diz Vanin- contempla o cotidiano, o dia-a-dia. Este ano,

por exemplo, temos o aniversário da bomba de Hiroshima e

Nagasaki. Certamente poderá suscitar questões em Geografia,

Física, Química, Matemática, História e até em Português. É

muito importante que o aluno esteja ‘ligadão’, não deixe de

assistir aos filmes do momento, ler jornais e revistas.” Para

enfatizar sua preocupação, Vanin afirmou, também, que “a

maior média em Geografia foi obtida por alunos de Medicina.

Com certeza, não vamos ter, a partir deste vestibular, médicos

que não saibam identificar a Bósnia, ou que não consigam lo-

calizar os Alpes suíços. O vestibular começa a atender requisi-

tos pedagógicos e sociais como nunca atendeu antes.”

Nem todos os departamentos da USP adotaram essa

perspectiva. Por exemplo, a FAU persiste na prática de ignorar

a Geografia na 2ª fase -como se fosse possível formar arquite-

tos competentes embora impermeáveis às oscilações do mun-

do. Aparentemente, se dependesse só da FAU, arquitetos po-

deriam continuar ignorando a Bósnia. Mas a tendência aponta-

da por Vanin é irreversível. A excessiva especialização na for-

mação do estudante, resultado de um corporativismo rude, é

incompatível com o tipo de profissional de que o mercado ne-

cessita hoje. Se isso é verdade em geral no mundo, mais ainda

no Brasil -onde todo e qualquer problema ‘‘técnico’’ esbarra

imediatamente na ‘‘questão social’’.

observador distraído pode até acharque o ‘‘venerável mestre’’ Shoko Asahara é umcidadão comum. Pura ingenuidade! Na ver-dade, ele é um sábio, um sujeito misteriosoque em vidas passadas reinou na região celestialde onde vêm os discos voadores. Ele pode le-vitar, curar e enxergar coisas invisíveis ao co-mum dos mortais. Seu cacife no além é tãoalto, que no dia do Juízo Final ele vai interce-der junto a Deus em defesa dos integrantes desua seita, Aum Shinrikyo (Verdade Suprema).Os demais, infiéis, arderão no inferno. E ofim está próximo. A ‘‘guerra mundial defini-tiva’’ -diz Asahara- começará em 1997. A prin-cipal arma será o letal gás sarin, que ataca osistema nervoso.

Fiel e piedoso, Asahara quis dar uma‘‘mãozinha’’ a Deus na tarefa de aniquilar ahumanidade. No final de março, armou umatentado no metrô de Tóquio com o sarin,que matou dez pessoas e afetou 5 mil. Emabril, o profeta foi preso. A polícia encontrou,nos depósitos da seita, ingredientes em quan-tidade suficiente para produzir 50 toneladasde sarin (uma gota pura mata um ser huma-no). O dinheiro para comprar esse material -e, obviamente, para assegurar uma vida con-fortável a Asahara- foi doado por cerca de 30mil asaharistas, espalhados, principalmente,por Tóquio, Moscou e Nova Iorque.

Terminava, assim, mais um capítulode uma longa novela envolvendo seitasmilenaristas -para quem o fim do mundo seaproxima junto com o ano 2000. O númerode seitas apocalípticas se multiplica mundoafora. Brasília, for exemplo, é tida por nume-rosos ‘‘esotéricos’’ como ponto de convergên-cia de ‘‘energias cósmicas’’ e escapará aoArmagedon de que fala a Bíblia. Até aí, tudo

O

Shoko Asahara, o ‘‘venerável mestre’’ da seitaVerdade Suprema, levita e se comunica com

ETs; você emprestaria seu dinheiro a essesujeito?

Page 4: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

4

Tráfico de negrosconstruiu ariqueza daspotências e atragédia daÁfrica

Berlim (1885), no qual as potências euro-péias partilharam o território africano eproibiram o tráfico de escravos no conti-nente. Ainda assim, persistiram os ódiosétnicos fundados na existência de etniasescravocratas e escravizadas. As fronteirascoloniais surgidas no Congresso de Berlim-traçadas de acordo com o poderio de cadauma das potências (França, Grã-Bretanha,Alemanha, Portugal) e não de acordo comas realidades etnoculturais da África- sepa-raram, muitas vezes, a mesma etnia em doisou três territórios controlados por potên-cias diferentes, ou unificaram em uma mes-ma região inimigos históricos.

Mais tarde, com a descolonização,as antigas possessões européias se transfor-maram em Estados independentes marca-dos por violentos conflitos interétnicos. Afalta de coesão nacional atua como um dosprincipais entraves ao desenvolvimento eco-nômico, e constitui um dos fatores estru-turais da disseminação da miséria na Áfri-ca. A rivalidade étnica também repercutena vida política de grande parte dos atuaispaíses da África negra. Os diferentes parti-dos políticos não se agrupam em torno deidéias, mas correspondem a grupos étnicosque disputam o controle do Estado. Mes-mo na jovem democracia sulafricana, ondea luta contra o apartheid poderia ter funci-onado como fator de união dos negros -considerados não-cidadãos até as eleiçõesde 1994-, os conflitos interétnicos amea-çam a estabilidade econômica e política.

Assim, o tráfico negreiro e as

Regina AraujoEspecial para Mundo

geopolítica da escravidão

Estima-se que a deportação para aAmérica tenha atingido 11 milhões de ne-gros entre os séculos XVI e XIX, e que sóas possessões portuguesas tenham recebi-do entre 3 e 5 milhões de cativos nesse in-tervalo. Ao contrário dos mercadores ára-bes, que preferiam as mulheres destinadasaos haréns, o tráfico europeu valorizavamais os homens, devido à sua força para otrabalho na terra. O despovoamento e odesequilíbrio sexual implicaram uma pro-longada estabilidade demográfica no con-tinente africano, só rompida no século XX(v. o gráfico, no box abaixo).

Mesmo no auge do tráfico negrei-ro, poucos comerciantes europeus se aven-turaram a penetrar no território da Áfricapara capturar escravos. Na maior parte doscasos, como já havia acontecido durante otráfico árabe, o trabalho de caça e de cap-tura era realizado pelos próprios negros, quevendiam os escravos para os europeus nasfeitorias costeiras. As etnias negras maispoderosas chegaram a organizar aparelhosnegreiros, que atacavam as tribos onde vi-viam etnias menores ou desorganizadas.Aparelhos negreiros rivais não raro se en-volviam em guerras pelo controle do tráfi-co intra-africano.

O tráfico de escravos para a Améri-ca declinou após o Congresso de Viena(1815), graças à ação do governo britâni-co. Mas, os aparelhos negreiros continua-ram em funcionamento, comercializandoescravos dentro do território africano. Essaprática só acabou após o Congresso de

A deportação de milhões de negrosoriundos de incontáveis comunidadesetnoculturais africanas para as plantationsamericanas assinalou, de maneira trágica,o início da modernidade. Os negros africa-nos foram os primeiros viajantes em mas-sa, prenunciando os grandes movimentospopulacionais e a mistura de culturas, ra-ças e religiões que caracteriza o mundomoderno.

Mas eles não foram os primeirosescravos. O mundo greco-romano da An-tigüidade Clássica, por exemplo, foi movi-do pela energia dos escravos. Em algumasregiões do Império Romano, a produçãoagrícola em larga escala, realizada com tra-balho escravo, prenunciou a forma de ex-ploração da terra que viria a se tornar do-minante em grande parte do território co-lonial americano. Mas o abastecimento dascivilizações escravocratas da AntigüidadeClássica acontecia dentro -ou, no máximo,muito próximo- do limite de suas própriasfronteiras. Tampouco foram as potênciascoloniais européias que inventaram a escra-vidão na África. O tráfico de cativos africa-nos era praticado muito antes das GrandesNavegações e da conquista da América. Aescravização de tribos inimigas ou de der-rotados nas guerras sempre existiu no con-tinente. Nos séculos VIII e XIX, as popu-lações negras das fronteiras meridionais doSaara e das costas do oceano Índico foramobjeto de comercialização em larga escalapelos mercadores árabes, que abasteciam osregiões islamizadas do Mediterrâneo e Ori-ente Médio.

Entretanto, o tráfico de negros paraas plantations americanas, realizado princi-palmente pelos portugueses, mas tambémpor ingleses, holandeses e franceses, teve umsignificado muito mais profundo na histó-ria do continente africano. A África Negrajamais se recuperou da hecatombedemográfica e rivalidades étnicas fomenta-das pelos quatro séculos de tráfico de suapopulação para as colônias da América.

Zumbi dos Palmares EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO AFRICANA

Fonte: ONU

400

300

100

700

500

200

1650

600

800

milhões

1700

1750

1800

1850

1900

1950

2000

1970 (a)

(a) Previsão do Banco Mundial.

100

103

100

100

100 120

198

763

352

Ilust

raçã

o O

hi

á 300 anos, em 20 de novembro de 1695, a morte de Zumbi dos Palmares encerrava a mais importante revolta de escravos dahistória do Brasil. O legendário líder se transformou em símbolo da luta contra a opressão racial. O Quilombo de Palmares começou anascer numa revolta ocorrida em um grande engenho da Capitania de Pernambuco, provavelmente no fim do séc. XVI. Armados defoices e paus, os negros atacaram e dominaram feitores e senhores de engenho, fugindo para a inóspita região de Palmares, na Serra daBarriga (atual Estado de Alagoas). Nos decênios seguintes, Palmares receberia negros foragidos de outras revoltas. Estima-se que asaldeias que compunham o Quilombo em seu apogeu abrigaram até 30 mil pessoas, incluindo negros, mestiços pobres e índios.

A comunidade iria resistir durante um século a uma das maiores e mais cruéis campanhas bélicas da história colonial do Brasil:pelo menos 30 expedições organizadas pelos mais experientes militares. Mas sucumbiu ao bandeirante paulista Domingos Jorge Velho,especialista no massacre de índios. A cabeça de Zumbi, morto no último assalto da luta, foi espetada em um poste no centro de Recife.

H

Page 5: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

5geopolítica da escravidão

plantations, ao desorganizarem a economiatribal de subsistência, escreveram os capí-tulos da iniciais da atual tragédia africana.Para os milhões de negros que sobrevive-ram à travessia do Atlântico e foram leva-dos aos territórios que viriam a formar osEstados Unidos, o Brasil e os micro-paísesantilhanos, porém, uma outra história es-tava apenas começando. Parte dessa histó-ria se reflete no mapa ao lado.

As várias faces do racismoO general Collin Powell é um dos

principais personagens do cenário políticodos Estados Unidos. Sua recém-lançadaautobiografia, Uma Jornada Americana,transformou-se em best-seller. Pesquisas pré-eleitorais o apontam como sério candidatoà sucessão de Bill Clinton. Powell é negro.Mas é pouco provável que ele fosse consi-derado negro se vivesse no Brasil. Aqui, nomáximo, seria mulato. Caso tivesse sidorecenseado pelo IBGE, seria enquadrado nagenérica categoria dos “pardos”, um espé-cie de “outros” dos censo brasileiro, queengloba a população mestiça.

Como explicar, então, essa diferen-ça na forma de encarar a cor do general?Como vimos, o tráfico de escravos despe-jou milhões de seres humanos na entradade serviço do continente americano. Mes-mo se oriundos de distintos grupos étnicose lingüísticos, foram igualados pela cor dapele e pela escravidão. Entretanto, aintegração dos negros nos diversas socie-dades nacionais que viriam a se formar naAmérica trilhou caminhos muitos diferen-tes. Nosso espanto em reconhecer um ne-gro em um mulato reside nessa diferença.

Os negros são 12,1% da populaçãodos EUA, isto é, cerca de 30 milhões depessoas. Não há estatísticas para “mulatos”.O que conta não é o fenótipo mas ogenótipo: se a pessoa tiver sangue negro elaserá negra, mesmo se tiver a pele mais cla-ra. No Brasil, os negros são pouco menosde 5% da população, enquanto os “pardos”são mais de 40%. Nesse caso, o que contaé a autoidentificação: são negros aqueles quese identificam como tal durante o recense-amento. Assim, as clivagens e choques en-tre os grupos étnicos são muito mais visí-veis nos EUA.

Até meados do século XX, a segre-gação impregnava a legislação de muitosEstados do Sul, que ainda concentravam amaior parte da população negra dosEUA.Os negros eram obrigados a ocupar os últi-mos lugares dos ônibus, e, caso este esti-vesse cheio, a ceder seu assento aos bran-cos. Nas escolas, bibliotecas, parques e hos-pitais públicos os negros não podiam semisturar aos brancos. O protesto dos ne-gros contra a discriminação não raro pro-

vocava batalhas travadas com milícias bran-cas fortemente armadas. Durante a Segun-da Guerra, paradoxalmente, o país que lu-tou na Europa contra os horrores do nazis-mo mantinha, oficialmente, a discrimina-ção em seu próprio território.

A luta pela fim da segregação nosEUA ganhou fôlego a partir da década de50, com o crescimento do ativismo negro.A dispersão espacial dos negros pelo terri-tório norte-americano e a formação de mi-norias negras significativas nas principaismetrópoles imprimiram uma dimensãonacional à “questão negra”, e ajudaram aampliar a mobilização em favor da igual-dade perante a lei. Em 1963, 260.000 pes-soas (negros e brancos) participaram da fa-mosa marcha sobre Washington lideradapelo pastor Marthin Luther King, exigin-do providências do governo federal. No anoseguinte, o Congresso iria aprovar uma le-gislação de direitos civis (Civil Rights Acts),conferindo aos negros e brancos igualdadejurídica. King seria assassinado em 1968.

O Brasil dos ‘‘pardos’’No Brasil, a “questão negra” jamais

mobilizou a sociedade. O “racismo cordi-al” brasileiro nunca se explicitou em leis desegregação: a evidente marginalização eco-nômica, política e cultural dos negros nãoprecisou delas. A elevada mestiçagem dapopulação é freqüentemente associada auma suposta harmonia racial, quedistingüiria o Brasil dos EUA (v. Texto &Cultura). Na realidade, a mestiçagem éapenas um reflexo da forma como se deu acolonização do país. A maioria dos portu-gueses que aqui desembarcaram não trou-xe família, pois esperava enriquecer e vol-tar para casa. Como vieram muito maishomens que mulheres, é fácil entender aintensa miscigenação entre brancos e ne-gras.

É muito difícil aferir dados reaissobre a cor da população brasileira. Noscensos do IBGE, por exemplo, milhões denegros e mulatos ao serem inquiridos so-bre sua cor optam por um “tom” o maisperto possível do modelo tido como supe-rior (branco). Em um dos últimos censos,o IBGE listou uma lista de mais de 120“cores” utilizadas por negros e mulatos parase autoidentificar, tais como acastanhada,agalegada, alva-escura e alva-rosada. Todosforam recenseados como “pardos”. A iden-tificação da população negra com a sua pró-pria cor é uma das principais bandeiras dosmovimentos negros do país.

“Nèg rich sé mulat’’Se ao invés de ter nascido nos Esta-

dos Unidos ou no Brasil, Collin Powell ti-vesse nascido no Haiti, ele seria negro oumulato conforme sua posição na estrutura

ditaduras (1957-86) destruíram a econo-mia do país, hoje o mais pobre da Améri-ca. A Revolução do Haiti foi inspirada nosideais da Revolução Francesa, mas gerouapenas o despotismo da nova elite, negra emulata, que assumiu o poder. A nova clas-se dominante - assentada na propriedadeda terra e no controle do aparelho de Esta-do- vive na capital, cultiva o francês e a re-ligião católica. Os negros miseráveis, imensamaioria da população, sobrevivem da agri-cultura familiar em posses minúsculas, fa-lam o créole e praticam os ritos do vodu.

de classes. Um ditado popular haitiano dizque “nèg rich sé mulat, mulat póv sé nèg”(negro rico é mulato, mulato pobre é ne-gro). O Haiti, nascido na colonização fran-cesa na porção ocidental da ilha Hispaniola,protagonizou a primeira revolução de es-cravos do mundo. Em 1801, o negroToussaint L’Ouverture derrotou os france-ses e declarou extinta a escravidão. Foi cap-turado por um Exército enviado porNapoleão, mas logo depois uma segundaonda de revoltas expulsou definitivamenteos franceses.

A revolução dos escravos pareciaindicar um caminho novo na história daopressão racial na América. Mas, as dispu-tas territoriais com a RepúblicaDominicana (1820-44), o domínio norteamericano (1905-34) e um longo ciclo de

Texto no Vestibular1) (Unicamp 95 -2ª Fase / História - adpatada) Durante o processo de Independência da AméricaLatina, diferentes significados foram atribuídos à idéia de liberdade. Explique o significado daliberdade para:a) Simón Bolívar, um dos líderes da Independência da América espanhola b) Toussaint Louverturee Dessalines, líderes da independência do Haitic) Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares e Pedro I, imperador do Brasil

2) (Unicamp 95 -2ª Fase / História) Ao exaltar o imperialismo inglês, Rudyard Kipling escreveuem um de seus poemas:“Aceitai o fardo do homem branco, / Enviai os melhores dos vossos filhos, / Condenai vossos filhos aoexílio, / Para que sejam os servidores de seus cativos.”a) Como esses versos de Kipling explicam o imperialismo inglês? b) Quais as áreas mais cobiçadaspelo imperialismo inglês e por quê?

Brancos

Negros

Mestiços e outros

Composição étnica

66,0%

12,1%

CUBA

21,9%

0,1%

95,0%

HAITI

4,9%

15,0%

15,0%

R. DOMINICANA

70,0%

80,3%

12,1%

EUA

55,0%

5,0%

BRASIL

40,0%

7,6%

Distribuição étnica em alguns países das Américas

Regina Araujo é professora, doutorandaem Geografia na USP e co-autora, com

Demétrio Magnoli, de vários títulosdidáticos

Page 6: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

OUTUBRO95

OUTUBRO95

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO

Dossiê especial: o mundo entre a diplomacia e a bomba6 7

ONU chega aos 50 anos dividida entre os ideais e a Razão de EstadoO chanceler brasileiro, Luiz Felipe Lampreia, de acor-

do com a tradição, pronunciou, a 25 de setembro, o discur-so de abertura da 50ª Assembléia-Geral da ONU. Ele de-fendeu uma ampla reforma no Conselho de Segurança (CS),através da inclusão, como membros permanentes, “de no-vas potências econômicas” -leia-se: Alemanha e Japão- e “depaíses em desenvolvimento com projeção global” -leia-se,sobretudo, o Brasil. Segundo Lampreia, a reorganização doCS nessas bases asseguraria a sua “legitimidade” e“representatividade”, refletindo “a diversidade de visões demundo”.

Em seguida, falou o secretário de Estado americano.Warren Cristopher mencionou de passagem a necessidadede que “todas as regiões” do mundo tenham representantesno CS, mas reafirmou a conhecida posição de Washingtonsegundo a qual apenas Alemanha e Japão devem se qualifi-car como novos membros permanentes. A reforma conser-vadora proposta pelos Estados Unidos -que já foi alcunha-da de “quick fix”, algo como “remendo rápido”, no jargãodiplomático- congela o Conselho na sua velha condição declube das grandes potências.

Lampreia e Cristopher personificam, casualmente,os pólos entre os quais oscila o pêndulo da ONU, desde asua fundação, no encer-ramento da SegundaGuerra (1939-45). Nodiscurso do chanceler doBrasil, ouvem-se os ecosdos ideais de igualdadeentre os Estados que te-ceram uma declaração seminal: a Carta das Nações Unidas,aprovada pela Conferência de São Francisco a 26 de junhode 1945. No discurso do secretário americano, encontram-se articulados os conceitos da política de poder: as relaçõesinternacionais dependem da força e dos recursos que dis-tinguem as potências dos demais Estados.

A idéia de limitar a soberania dos Estados pelaedificação de uma sociedade internacional só deixou a teo-ria para ingressar no mundo real em função do trauma daPrimeira Guerra (1914-18). A Liga das Nações, efêmeraantecessora da ONU criada em 1920, foi desde o inícioaprisionada pela contradição entre o idealismo retórico e apolítica prática de poder. O Pacto da Liga, seu documentode fundação, estabelecia a obrigação dos Estados de renun-ciar ao uso da força e estabelecer relações baseadas “na justi-ça e na honra”. Porém, a própria Liga ergueu-se sobre oTratado de Versalhes, de 1919, que sintetizava o direito daforça das potências européias vencedoras da guerra, humi-lhava a Alemanha e rejeitava a “paz sem vencedores” pro-posta pelo presidente Wilson, dos Estados Unidos, nos seuscélebres 14 Pontos.

Colocar a guerra fora da lei -essa foi uma noção muitorepetida pelo pacifismo idealista do entre-guerras. No finalda década de 20, o pacto Briand-Kellog, inspirado pelosEstados Unidos e reverberando ainda os 14 Pontos de Wil-son, proclamava, solenemente, a ilegalidade da guerra. Taisiniciativas buscavam limitar a soberania dos Estados naqui-lo que ela tem de mais essencial e definitivo: o recurso à

força para impor uma vontade geopolítica. O fracasso daLiga das Nações derivou precisamente da reafirmação dasoberania do Estado na esfera do direito de fazer a guerra.Em 1933, a Alemanha de Hitler e o Japão imperial retira-vam-se da Liga, em 1937 era a vez da Itália de Mussolini,em 1940 a União Soviética era expulsa. Assim, a Liga redu-ziu-se formalmente ao que sempre foi, realmente: um con-domínio franco-britânico.

A ONU já tem duas vezes e meia a idade da Liga e,apesar das crises trágicas ou patéticas que a acometem, nãoparece próxima da morte. Quais as causas da “durabilida-de” excepcional das Nações Unidas, se comparada à sua in-feliz antecessora?

O motivo não pode ser buscado na coerência de prin-cípios, já que a Carta da ONU repete, com algumas nuancese maiores cuidados, as ilusões pacifistas e legalistas do Pactoda Liga. A duplicidade entre a palavra e o gesto exprime-sena própria estrutura orgânica das Nações Unidas, que fixa oprincípio da igualdade dos Estados na Assembléia-Geral -onde cada membro possui um voto- e o renega na composi-ção e direito de veto do Conselho de Segurança. O alicerceda sobrevivência da ONU não se encontra nela, mas noambiente exterior: a situação de “equilíbrio do terror” vi-

gente desde o fim da Segunda Guer-ra. A dissuasão mútua dos arsenaisnucleares das superpotências daGuerra Fria evitou a guerra total,revelando eficácia muito maior queas iniciativas idealistas que tentarampôr a guerra fora da lei. Nesse ambi-

ente tenso -no qual evitar a guerra devastadora tornou-seprioridade da política externa das potências- a ONU funci-onou como moldura para um diálogo entre inimigos.

Durante a Guerra Fria, as esferas de influência dassuperpotências definiram os direitos e limites para o uso daforça: a ONU nada fazia de prático contra as invasões sovi-éticas na Europa Oriental (como na Tchecoslováquia, em1968) ou as invasões americanas no Caribe (como naGuatemala, em 1954). O fim da Guerra Fria conferiu aWashington um novo poder sobre a ONU, mas esse podernão é tão absoluto como pareceu há poucos anos. Na Guer-ra do Golfo (1990-91), enquanto a URSS se esfacelava, osEstados Unidos cobriram-se com a bandeira da ONU paraformar a coalizão contra Sadam Hussein. Já na Guerra daBósnia (1991-95), a Rússia tem se revelado capaz de imporlimites mais ou menos rígidos ao envolvimento da ONU eda Otan no combate direto aos sérvios.

No pós-Guerra Fria, por duas vezes, a ONU foi àguerra. Essa novidade, contudo, não expressa um maiorpoder das Nações Unidas, mas uma distribuição diferentedo poder no ambiente exterior. De novo, e mais uma vez, opoder soberano dos Estados: é ele que se reflete no espelhoda ONU. A proposta americana do “quick fix” quer refor-mar o espelho, a fim de que possa reproduzir com fidelida-de a estrutura do poder mundial depois da Guerra Fria. Aproposta brasileira quer quebrar o espelho, instaurar a igual-dade e colocar a guerra fora da lei. Todos sabem o fim dahistória.

Da mesma forma como entre os homens o eu pressupõe a existência do não-eu, entre osEstados é igual. O Estado só é potência para se manter ao lado de outras potências

igualmente independentes (...). A soberania, no sentido jurídico - a completa independênciado Estado com relação a qualquer outra potência existente no mundo - pertence de tal formaà essência do Estado que constitui o critério da sua natureza (...). A soberania não pode serpartilhada, nem pode haver graus de soberania. É ridículo falar de um Estado superior ouinferior. Gustavo Adolfo dizia: “Não reconheço ninguém acima de mim, a não ser Deus e aespada do vencedor.” Uma vez mais, o futuro da humanidade não pode estar na união sob aautoridade de um único Estado; o ideal será instituir uma sociedade de povos que, por meio

de tratados concluídos livremente, limite a soberania sem a suprimir.(Heinrich von Treitschke, Politik, 1897)

o equilíbrio do terror revelou eficácia muitomaior do que as iniciativas idealistas que

tentaram pôr a guerra fora da lei

Mururoa agita fantasma da “eurobomba”

tou pela primeira vez um foguete de longo alcance. As in-cursões no mar da China, rico em petróleo, fortalecem fal-cões de direita, que querem “independência” nuclear para oseu país. Pouco se fala do avanço japonês em tecnologia desatélite. Em março foi lançado, com êxito, o míssil 112, depotência equivalente à do Titan 3-D, um dos interconti-nentais mais eficazes dos EUA. Pode transportar carga útilde quatro toneladas -e as implicações bélicas são óbvias-,enquanto o programa civil atômico japonês enfrenta con-trovérsias. Adquiriu quantidade “notáveis’’ de material físsil,que pode ser usado com objetivo militar, segundo SeligHarrincon, do Carnegie Endowment for International Peace,de Washington.

Juntem-se as incertezas nucleares criadas pelo fimda URSS, cujo espaço geográfico foi tomado por repúblicasem conflito, algumas herdeiras de formidável arsenal atô-mico. Não só questão de segurança, também de descontro-les, envolvendo contrabando de materiais físseis. Calcula-seque em 40 anos a ex-União Soviética produziu 170 tonela-das de plutônio de uso bélico e mil toneladas de urânioenriquecido. Filme recente, tendo como estrela submarinoamericano de última geração, substitui os choques da fale-cida Guerra Fria pela guerra na Chechênia e a ação de dissi-dentes russos, que tomam uma base com engenhos de des-truição maciça e ameaçam dispará-los contra os EUA, senão forem atendidas exigências suas. Situação possível, di-zem especialistas.

Quanto à proliferação “horizontal”, dois sustos, osresultantes de programas secretos do Iraque e Coréia doNorte. O problema não se encerra, no entanto, com o Iraquesob supervisão da ONU e a assinatura de acordo entre Coréiado Norte e Estados Unidos aposentando reatores de ativi-dades duvidosas. A partir de Reza Pahlavi, o monarca que oOcidente quis transformar em chefe fiel da maior potênciado Golfo, o Irã pensa em armas nucleares. Desde 1988, osdirigentes do Irã fundamentalista defendem abertamente odesenvolvimento da bomba islâmica. “Os muçulmanos pre-cisam de armas nucleares como contrapeso a Israel”, decla-rou um alto funcionário iraniano ao The New York Times.O Paquistão já teria condições de fabricar a bomba, de olhotanto em Israel como em seu vizinho e inimigo, a Índia,também na corrida.

Israel, que continua se recusando a assinar o TNP,juntamente com Paquistão, Índia, Irã e também Brasil, é afalsa grande incógnita e elemento perturbador para potên-cias, como os Estado Unidos, que lhes dão cobertura e com-batem a proliferação “horizontal”. Com a ajuda da França,começou em programa nos anos 50. Em 1974, a própriaCIA manifestou suspeitas de que ele já produzisse a bomba.Em 1986 um técnico israelense, Mordechal Vanunu, cum-prindo pena de prisão perpétua depois de raptado na Itáliae condenado como traidor, revelou ao Sunday Times, deLondres, que seu país tinha plutônio suficiente para fabri-car 100 ou mesmo 200 bombas. “Israel pode ser considera-da a sexta potência nuclear”, garantiu em seu livro Dangerand Survival, McGeorge Rundy, ex-assessor de segurançanacional dos EUA.

Newton CarlosDa Equipe de Colaboradores

Estaria a caminho uma eurobomba? O deputado tra-balhista David Clark, ministro da Defesa do “shadowcabinet’’ -o governo paralelo do principal partido de oposi-ção inglês-, garante que seus país e os EUA estão envolvi-dos, por meio de acordo secreto, com os testes nuclearesfranceses. A denúncia foi publicada no Guardian, o jornalliberal de Londres. O ministério do Exterior inglês negou,como era previsível, mas admitindo ser “crescente” a coope-ração com a França, “em questões atômicas” -o que se ajus-ta às informações recolhidas por Clark em Genebra, ondefunciona a comissão da ONU encarregada de preparar acor-do de proibição total dos testes.

Londres comprometeu-se a cobrir parte das despe-sas do programa “relançado” por Paris, em troca do acessoaos dados levantados no atol de Mururoa. Segundo oGuardian, os laboratórios inglês de Aldermaston e ameri-canos de Los Alamos e Livermore já começaram a estudar oque ensinam as explosões no Pacífico sul, condenadas mun-dialmente, inclusive por Washington. Oficialmente, elas sãofeitas para tornar a bomba mais segura. Na realidade“redefinem” modelos de armas de destruição maciça. Aspotências atômicas ocidentais incrementam seus arsenaisantes que os testes sejam proscritos.

Com medo de proliferação “horizontal” -países doTerceiro Mundo com armas atômicas e foguetes-, as potên-cias querem colocar um ponto final nas explosões, sobretu-do depois de terem condições de desenvolver e velar pelaeficiência de seus engenhos por meio de demonstrações emlaboratórios. Falando na ONU, o presidente Bill Clintondisse que “a prioridade mais urgente é atacar a dissemina-ção das armas de destruição maciça, sejam nucleares, quí-micas ou biológicas”. Sem isso, advertiu, “nenhuma demo-cracia estará segura”. O secretário de Defesa americano,William Perry, calcula que vinte países, no mínimo, já têmou procuram ter meios de desenvolver e de também dispa-rar estas armas.

Especialistas concordam. Acrescentam, no entanto,que é igualmente perigosa a proliferação “vertical” -a multi-plicação e modernização dos arsenais nucleares das potênci-as, em violação ao Tratado de Não Proliferação (TNP) as-sinado em 1970 e prorrogado indefinidamente em 1995.Para que a prorrogação fosse aprovada, os cinco membrospermanentes do Conselho de Segurança da ONU prome-teram livrar-se gradativamente de suas bombas e foguetes eassinar a proibição total dentro de um ano. Mas não se tra-tou de “permissão temporária” para que novos testes fossemrealizados e sim de prazo necessário às negociações, sem maisavanços.

A França, já se sabe, está montando um novo siste-ma de armas e partindo para mudanças estratégicas. Adissuasão “absoluta”, baseada em represálias nucleares ma-ciças contra centros urbanos, perdeu sentido diante do co-lapso da União Soviética e criação da União Européia. Ago-ra é preciso preparar-se para intervenções militares, “se ne-cessário com armas nucleares”, em qualquer ponto da Terraonde estejam em jogo interesses franceses. Entram em açãoem novo submarino, o Trionphant, um novo foguete, o M45, e uma nova ogiva, a Tn-75. Os estrategistas francesessimplesmente acompanham “atualizações” no restante daspotências. O Japão, porta-voz natural da oposição às bom-bas, como primeira vitima, fala de “traição à confiança dospaíses não nucleares que aprovaram, sob condições, a pror-rogação do TNP”.

Há ainda, em cima do Japão, a agressividade daChina, palco de duas explosões este ano. Em maio, ela tes-

Matérias de Mundo sobre a 2ª Guerra e a ONU -nº 2, pág. 4 - Vontade de potência,

50 anos depois de Hitlernº 4, págs. 6-7 - Entrevista: L.F. Lampreia

SERVIÇO ESPECIAL:

MUNDO no Vestibular

Texto no Vestibular

Considere, atentamente, todos os elementos iconográficos, estéticos e as informações históricas contidos acima.Faça, em seguida, um texto que discuta as mais importantes implicações geopolíticas, culturais e éticas do lançamento dabomba atômica sobre Hiroxima (em 06 de agosto de 1945) e Nagasáki (em 09 de agosto de 1945) .

‘‘O Japão já estava derrotado em 1945. As bombas que láexplodiram tinham como endereço a União Soviética.’’

(Joseph Roblat, físico inglês, 83 anos, integrante, até 1944, do ProjetoManhattan -que idealizou, projetou e detonou a primeira bomba

atômica, em julho de 1945, em teste realizado no deserto deAlamogordo, EUA - Estado de S. Paulo, 03.out.95, pág. A-10)

A bomba que foijogada sobre

Hiroxima

Criança deHiroxima afetadapela radiação

‘‘Pensem nas crianças / mudastelepáticas / pensem nas

meninas / cegas inexatas /pensem nas mulheres / rotas

alteradasPensem nas feridas / como

rosas cálidas / mas oh, não seesqueçam / da rosa da rosa /da rosa de Hiroxima / a rosahereditária / a rosa radiativa/ estúpida e inválida / a rosa

com cirrose / anti-rosaatômica / sem cor sem

perfume / sem rosa sem nada’’

(‘‘A Rosa de Hiroxima’’ -Vinicius de Moraes)

China, Brasil, EUA e França c) EUA, Brasil, África do Sul,Índia e Alemanha d) EUA, França, Grã Bretanha, Rússia eChina e) EUA, Alemanha, Japão, Grã Bretanha e França.

2) As bombas atômicas lançadas pelos Estados Unidos emHiroxima e Nagasáki, representaram para o Japão o fim deum projeto e o ponto de partida de outro. Explique o signi-ficado dessa frase.

3) Qual a postura do Brasil em relação a atual estrutura doConselho de Segurança da ONU?

4) A criação da ONU foi resultado de uma conferência in-ternacional, logo após o término da Segunda Guerra Mun-dial. Essa conferência foi a de:a) São Francisco b) Yalta c) Potsdam d) Nova Iorquee) Berlim

1) Em outubro de 1995, a ONU completou 50 anos deexistência. Quando de sua fundação, a organização contavacom 51 países membros. Hoje, este número ultrapassa os180. Vários organismos compõem o “setor político” daONU. Entre eles, destaca-se o Conselho de Segurança (CS)integrado por delegados de 15 países. Cinco desses repre-sentantes são permanentes; os outros dez são eleitos a cadadois anos. Os cinco permanentes têm poder de voto e deveto; os demais só participam das discussões. Os cinco mem-bros permanentes do CS são:a) Japão, EUA, Rússia, Canadá e Grã-Bretanha b) Índia, Resposta:

1) d

2) O projeto que se findava com a derrota japonesa teve seu início na segunda metade do século XIX, quando da Restau-ração Meiji, que estabeleceu um governo central único para o país. Desde essa época, até 1945, o Japão desenvolveu umprojeto de modernização econômica que resultou, do ponto de vista geopolítico, num expansionismo territorial sobreamplas áreas do Extremo Oriente e Sudeste Asiático. Com a derrota do país na Segunda Guerra Mundial, criou-se, inicial-mente, uma total dependência econômico-militar do Japão para com os EUA. A dependência econômica tornu-se cada vezmais tênue, à medida que o tempo passava; hoje, o Japão é um dos maiores concorrentes dos EUA no contexto econômicointernacional. Do ponto de vista militar, o país ainda hoje tem sua integridade territorial garantida pelos EUA.

3) O Brasil considera que o CS da ONU está ultrapassado, e gostaria que ele fosse mais representativo. Isso aconteceria, naperspectiva do Itamaraty, se novos membros permanentes fizessem parte do CS, e se países do Terceiro Mundo estivessemlá presentes (é claro que o Brasil se considera um sério candidato a uma das possíveis vagas).

4) a

Page 7: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

8

Incerteza e tensão convivem com crescimentona Ásia do Pacífico

A macrozona da Bacia do Pacífico temcomo vértices o Japão -a segunda potência eco-nômica global- e a China -a maior potênciademográfica do planeta. No ano que se en-cerra, a incerteza minou os dois principaisEstados do Pacífico.

No Japão, a fonte da incerteza é eco-nômica. O cinqüentenário das bombas deHiroxima e Nagasáki assinalou o encerramen-to dos tempos de crescimento e euforia: o ar-quipélago conhece o mais longo período deestagnação desde a Segunda Guerra. A valori-zação do iene frente ao dólar e a profunda cri-se do sistema bancário dissolvem a crença nasvirtudes do modelo exportador nipônico. Si-multaneamente, as pressões comerciais dosEstados Unidos anunciam profundas revira-voltas, com a abertura do mercado interno e aredução do papel do Estado no planejamentoeconômico (v. Mundo nº 3, pág. 10 e Mundonº 5, págs. 6 a 8).

Na China, a fonte da incerteza é polí-tica. O debilitamento terminal da saúde dolíder Deng Xiaoping inaugura um período detransição, que pode mergulhar o país em ter-ríveis convulsões e no desgoverno, enquantoa elite comunista se digladia pela sucessão. Aintrodução da chamada “economia socialistade mercado” aprofunda o fosso entre as regi-ões comerciais e industriais litorâneas, que seabrem para o mundo exterior, e o interior cam-ponês e miserável. A reativação das tensõescom o governo nacionalista chinês de Formo-sa e a aproximação da reincorporação da co-lônia britânica de Hong Kong (em 1997) am-plificam os focos de instabilidade (v. Mundonº 1, pág. 10 e Mundo nº 3, págs. 6 a 8).

Nada disso impede a continuidade domovimento de modernização das economiasdo leste e sudeste asiático, que se integram cadavez mais intensamente ao mercado mundial.As reformas econômicas liberalizantes noVietnã -inspiradas no modelo da China, umtradicional inimigo geopolítico- apontam paraa emergência de um novo “tigre asiático”, cujaeconomia registrou crescimento de mais de8% no ano, atrás apenas da China e deCingapura. Japão e Estados Unidos abrem adisputa pelos investimentos no recém-chega-do. Em agosto, o reatamento de relações di-plomáticas americano-vietnamitas, duas dé-cadas depois do fim da guerra, foi saudadopelo secretário de Estado Warren Cristopher:“Nós vemos o Vietnã como um país, não umaguerra”.

Bacia do Pacífico

MUNDO no Vestibular

4) Leia o seguinte texto:Nos últimos dias do mês de abril de 1975, terminava um dos confli-tos mais dramáticos e sangrentos do século XX. Esse confronto bélico,que envolveu diretamente uma superpotência e teve um saldo trági-co de pelo menos 2 milhões de mortos. Depois de 20 anos de embargoeconômico por parte da superpotência, enfim, as relações econômicase diplomáticas entre o país em questão e o seu adversário de duasdécadas atrás foram retomadas.O país em questão a que texto se refere é:a) o Afeganistão b) Cuba c) a Coréia d) a Nicarágua e) o Vietnã

1) Leia com atenção o seguinte texto:“Na mesma medida em que tamanho e grandeza de um país de-sempenham um papel crítico na significação desse país no contextomundial, as diferenças internas são essenciais ao equilíbrio e à pró-pria viabilidade do país. Contudo, formas exageradas de concen-tração, tanto no que se refere à concentração de riqueza ao longo dehierarquia de pessoas, como nas unidades regionais do país, sãofóco de instabilidade social e, por via de consequência, de instabi-lidade política. Isso quer dizer que um objetivo nacional funda-mental e permanente, que é o de assegurar a estabilidade socialinterna, para garantir o progresso geral do país, é afetado, em suaspróprias bases, por ventuais excessos de concentração.”

A parte do texto que fala das desigualdades regionais poderiaser aplicado atualmente para a China?

2) Pode-se afirmar que a República Popular da China vem pas-sando por importantes reformas liberalizantes tanto na econo-mia como na política? Justifique sua resposta.

3) Leia o seguinte texto:“O desafio deste país insular em nível regional consiste em, talvez,liderar politicamente a zona econômica do Pacífico. Para que issoefetivamente venha ocorrer, o país em questão precisa superar asdesconfianças de países vizinhos que, num passado não muito re-moto foram por ele ocupados.”O país a que se refere o texto é:a) a China b) o Japão c) a Coréia do Sul d) a Rússia e) oVietnã

Respostas

1) Sim. A China apresenta grandes desigualdades regionaisentre a porção leste (litorânea) e o oeste. Essa desigualdade ébastante antiga, mas se acentuou com a criação das ZonasEconômica Especiais, as ZEEs junto à fachada litorânea dopaís.

2) Do ponto de vista econômico sim, e isso pode-se notar nocrescimento econômico que vem ocorrendo nas ZEEs. Doponto de vista político não acontece nenhuma abertura. Issopode ser comprovado pela forma como o Partido ComunistaChinês dirige o país. Em suma, se quisermos fazer uma analo-gia com as reformas impulsionadas nos anos 80 na UniãoSoviética a China fez sua perestroika mas não a sua glasnost.

Ilust

raçã

o La

ís G

uara

ldo

Page 8: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

9

Potências recriam esferas de influência nopós-Guerra Fria

Há seis anos, a queda do Muro deBerlim e a desagregação do bloco soviético naEuropa Oriental desestruturaram o equilíbriogeopolítico europeu da Guerra Fria. Há qua-tro anos, a implosão da União Soviética e daIugoslávia redesenhou as fronteiras no lesteeuropeu e nos Bálcãs, introduzindo novosenigmas sobre o futuro do continente. Em1995, sob o fogo da Guerra na Bósnia, come-çaram a se delinear as opções estratégicas daspotências européias no complexo cenário dopós-Guerra Fria.

A guerra balcânica dissolveu as lumi-nosas esperanças depositadas no futuro das re-lações entre a Rússia e o Ocidente. O governode Boris Yeltsin -que encara a perspectiva daseleições parlamentares de dezembro e das pre-sidenciais de junho de 1996- reafirmou a ali-ança tradicional com a Sérvia, depois de es-magar a revolta separatista na Chechênia. Ogoverno de Bill Clinton -fragilizado pela vitó-ria esmagadora dos republicanos nas eleiçõesparlamentares de 1994 e confrontado com oisolacionismo da nova maioria - procurou re-tomar a iniciativa diplomática, combinandobombardeios e negociações de paz. A guerrabalcânica parece aproximar-se do encerramen-to com a bipartição, na prática, da Bósniamultiétnica: a Grande Sérvia e a GrandeCroácia emergem como peões regionais darivalidade entre as potências (v. Mundo nº 3,pág. 3 e nº 4, págs. 4 e 5).

Ao mesmo tempo, a evolução do pro-jeto de expansão da Otan (Organização doTratado do Atlântico Norte) rumo ao lesteeuropeu -com a anunciada integração, nospróximos anos, pelo menos da Polônia,Hungria e República Tcheca- crispa os âni-mos russos. No lugar da antiga “cortina deferro”, um novo front geopolítico parece estarsendo erguido, separando a CEI (Comunida-de de Estados Independentes) do restante daEuropa. Uma “paz fria” contamina a Europae se insinua no espaço vazio deixado pelo fimda Guerra Fria. Nessa moldura, as explosõesnucleares francesas no atol de Mururoa,mantidas mesmo diante da onda mundial deprotestos contra Jacques Chirac, ganham todoo seu significado. A França do pós-Guerra Fria,inferiorizada economicamente face ao parcei-ro alemão, busca os meios de conservar a con-dição de vértice estratégico da UE (UniãoEuropéia). Não é outro o sentido da propostafrancesa de extensão do seu “guarda-chuvanuclear” para a defesa da Alemanha.

Europa

MUNDO no Vestibular

1) Ao longo do ano de 1995, ocorreram algumas mudançasterritoriais, tanto na Bósnia quanto na Croácia. Sendo assim,responda:a) Como era a situação territorial da Croácia no final de 1994e aquela dos dias atuais? b) Como era a situação territorial daBósnia no final de 1994 e na atualidade?

2) Em que consistia a proposta internacional da partilha daBósnia divulgada ao final de 1994?

3) Durante o ano de 1995, a França sofreu alguns atentadosterroristas. Além disso, seu governo foi objeto de intensas pres-sões internacionais em função de certas experiências que o paíslevou a cabo no Pacífico Sul. Com base nesses fatos e em seusconhecimentos sobre o assunto, responda:a) Qual a origem e a causa dos atentados terroristas em solofrancês? b) Em que consistem essas experiências francesas noPacífico Sul?

4) Leia atentamente o seguinte texto:“No atual panorama do continente, o país pode ser caracterizadocomo uma nação muito próspera, democrática e que tem uma sé-rie de responsabilidades: com a própria sociedade, até há poucodividida, com os demais países que fazem de uma comunidadeeconômica comum e, é claro com o sistema global. O “anão políti-co” da Guerra Fria é hoje a maior potência econômica do conti-nente e os novos tempos exigem que ela represente um novo papelno contexto mundial.’’.O país descrito pelo texto é:a) o Japão b) a China c) a Alemanha d) a Grã Bretanhae) a Irlanda.

Respostas

1a) No final de 1994, cerca de 30% do território da Croáciaestava em mãos da minoria sérvia que habita o país. Eles eramcerca de 11% da população e se concentravam especialmentejunto às fronteiras da Sérvia e Croácia (região da EslavôniaOriental) e junto às fronteiras da Croácia com a Bósnia(Eslavônia Ocidental e Krajina). Em maio e agosto de 1995,essas duas últimas regiões foram ocupadas por forças croatas.Restaram, sob o controle sérvio, cerca de 10% do territóriooriginal.1b) No final de 1994, cerca de 70% do território da Bósniaestava em mãos da minoria sérvia da Bósnia e, o restante do-minado por forças da federação muçulmano-croata. Ao lon-go do segundo semestre de 1995, tropas muçulmano-croatasrecuperaram parcelas importantes de territórios em poder dossérvios.

2) A proposta internacional consistia em se criar dois Estadosna Bósnia. A federação muçulmano-croata, que ficaria com51% do território, e um Estado sérvio, com 49%. A capitalda Bósnia, Sarajevo, devido à sua grande importância para astrês comunidades étnicas que habitam o país, seria adminis-trada pela ONU.

3a) A origem desses atentados está ligada a grupos defundamentalistas islâmicos de origem argelina. As ações des-ses grupos pretendem mostrar o seu desacordo com o auxílioquase incondicional dado pelo governo francês ao regime ar-gelino que esses fundamentalistas tanto combatem.3b) As ações da França no Pacífico Sul dizem respeito às expe-riências nucleares no atol de Mururoa.

4) c

Ilust

raçã

o La

ís G

uara

ldo

Page 9: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

1 0

Foram poucas as boas notícias da África em1995. Na porção norte do continente, área integran-te do chamado mundo árabe-muçulmano, os princi-pais problemas estiveram ligados ao crescimento dofundamentalismo religioso, especialmente em doispaíses: Egito e Argélia. No primeiro, a ação dos Ir-mãos Muçulmanos é bastante antiga, sendo essa or-ganização a responsável, neste ano, pelo fracassadoatentado contra a vida do presidente Hosni Mubarak.

Na Argélia, os fundamentalistas travam, des-de 1992, uma verdadeira guerra civil contra o gover-no do país, acusado de impedir que os partidosislâmicos tomassem o poder, por eles conquistadoatravés do voto. A Frente Islâmica de Salvação (FIS) eo Grupo Armado Islâmico (GIA), escolheram comométodo de luta o assassinato de estrangeiros, especi-almente os de origem francesa (a França é o país quemais decisivamente tem apoiado o atual regime arge-lino).

Mas não é só: este conflito, que nos últimostrês anos já vitimou mais de 40 mil pessoas, respin-gou sobre a Europa. Os recentes atentados terroristasem Paris foram reinvindicados por fundamentalistasargelinos. O fundamentalismo que cresce na região,e em outras áreas do mundo muçulmano, é uma res-posta à falência de modelos estranhos ao Islã em pro-mover o fim da miséria.

Na África Ocidental, Central e Oriental, afome, a miséria os conflitos tribais e as epidemias con-tinuam compondo o quadro desolador desta parteinfeliz do planeta, onde a presença do colonialismo,até há bem pouco tempo, mostrou sua face mais cru-el. Não se repetiram, em 1995, os massacres comoaqueles que se verificaram em Ruanda durante 1994.Contudo, em países como a Libéria, Somália, Sudão,Burundi e ainda em Ruanda, “mini-massacres” vezpor outra voltaram a acontecer.

Na África Austral, pelo menos o cenário é umpouco mais otimista. O governo de Nelson Mandela,na África do Sul, vem conseguindo, com muita difi-culdade, equacionar de forma razoável o complexoproblema social do país. Em Angola, após 20 anos deguerra civil, a guerrilha que combate o governo resol-veu se sentar à mesa de negociações.

A distensão na política regional permitiu areativação da Comunidade para o Desenvolvimentoda África Austral, organização composta por 12 paí-ses da região (v. o mapa), que pretende, até o ano2000, criar uma Zona de Livre Comércio. Não hádúvida de que esse mercado comum tem na Repúbli-ca Sul Africana seu foco principal, já que a sua econo-mia é três vezes maior que todos os demais paísesjuntos.Talvez, o eventual sucesso dessa iniciativa po-derá abrir novos horizontes para o sofrido continenteafricano.

África

MUNDO no Vestibular

1) O letal vírus EBOLA assim foi batizado porque as primeiraspessoas que mostravam sintomas da doença por ele causadamoravam junto às margens do rio que deu o nome ao vírus.Esse rio está localizado na porção central da África. Sendo as-sim, provavelmente esse curso fluvial faz parte da baciahidrográfica:a) do rio Nilo b) do rio Congo ou Zaire c) do rio Nigerd) do rio Orange e) do rio Volga

2) Além de enormes dificuldades de ordem sócio-econômica(pobreza, desemprego, queda nos preços das principais expor-tações), os países da Africa do Norte vêm passando por umoutro desafio. No Egito e na Argélia, esse problema atingiugraves dimensões. Esse grave problema que afeta os dois paísesrefere-se:a) à ameaça de se esgotarem rapidamente as reservas petrolífe-ras b) à possibilidade de eles serem recolonizados pelos paíseseuropeus c) à ameaça deles serem invadidos pelos países daLiga Árabe d) ao crescimento da oposição religiosa armadaque pretende tranformar os países em repúblicas islâmicas e) àameaça do aumento da desertificação, por conseqüência da máutilização do solo

3) (FGV-95) Para responder a esta questão considere otexto e os ítens apresentados abaixo.“Durante os anos 60, as secas afetaram 18,5 milhões de pes-soas a cada ano; durante os anos 80, 24,4 milhões. E apenasno ano de 1985, no mínimo 30 milhões de pessoas sofreramcom as secas só na África.”O problema apresentado no texto pode ser explicado,entre outros motivos, da seguinte forma:I- Pelo uso indevido dos solos em países tropicais do Ter-ceiro Mundo II- Pelo processo de desertificação, quedepende da forma de como a terra é tratada antes da secaIII- Pela desertificação, que está em processo em todas asáreas temperadas e tropicais do mundo IV - Pela nãoutilização do uso intensivo da irrigação, que é uma dasmaneiras de reduzir os efeitos da seca em áreas com ten-dência à desertificação V - Pela desertificação, que é umfenômeno natural que independe de ação humana.Estão corretos apenas:a) I e II b) I e III c) I, IV e V d) II, III e IVe) II, IV e V

REPÚBLICA SUL AFRICANA

BOTSUANA

NAMÍBIAZIMBABUE

LESOTO

SUAZILÂNDIA

MOÇAMBIQUEZÂMBIA

REPÚ

BLIC

A M

ALGA

XE

ILHASMAURÍCIO

IS. COMORES

MALAUÍ

TANZÂNIA

ANGOLA

ZAIRE

QUÊNIARUANDA

BURUNDI

GABÃO

OCEANO ÍNDICO

OCEANO ATLÂNTICO

CANAL DEMOÇAMBIQUE

Componentes do C.D.A.A.(Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral)

Países que tiveram até recentemente conflitos internos

POLÍTICA E ECONOMIA NA ÁFRICA AUSTRAL

Respostas:1) b 2) d 3) a

Produto Interno Bruto (PIB) ePopulação dos Países componentesdo C.D.A.A.

País PIB População(bil. US$) (milhões)

África do Sul 118,1 40,8Angola 6,0 10,3Botsuana 3,6 1,4Ilhas Maurício 2,6 1,0Lesoto 1,3 1,9Malauí 2,0 10,7Moçambique 1,4 15,3Namíbia 2,6 1,5Suazilândia 0,9 0,8Tanzânia 2,5 28,8Zâmbia 3,2 8,9Zimbabue 5,8 10,9Fonte: Economist e Almanaque Abril

Radicalismos, fome e miséria persistemno “continente esquecido”

Page 10: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

1 1

Catástrofe social ameaça planos de“reajuste” da economia

Desde o seu início, 1995 anunciou grandessobressaltos na América Latina. Começou com a cri-se mexicana, que ameaçou lançar à bancarrota não sóo México mas todas as chamadas ‘‘economias emer-gentes’’ -países que desde o início dos anos 90 vi-nham sustentando o “boom” das exportações dospaíses ricos (v. Mundo nº 1, págs. 6 e 7). Além disso,a revolta no Estado mexicano de Chiapas dava mos-tras de estar fora de controle, a situação econômico-social de Cuba continuava se deteriorando (v. Mun-do nº 4, pág.10), e, finalmente, eclodiu o patéticoconflito fronteiriço entre Peru e Equador (v. Mundonº 1, pág. 5).

A crise econômica mexicana -sem dúvida ofato mais importante do ano na América Latina- sónão se transformou numa catástrofe completa emvirtude de um ‘‘pacote’’ financeiro de emergênciaaprovado pelo presidente Bill Clinton. Washingtoncedeu ao México novos empréstimos (em troca, é cla-ro, de duras condições) para evitar o colapso do siste-ma financeiro mundial. Para muitos, essa crise inevi-tavelmente se irradiaria para a Argentina e Brasil. Ochamado “efeito tequila” acabou não se verificando,mas revelou que a estabilidade econômica obtida nosúltimos anos através da aplicação dos chamados ajus-tes estruturais, é ainda extremamente frágil.

Paradoxalmente, os resultados das eleiçõesrealizadas nos últimos dois anos em vários países lati-no-americanos mostraram que estabilidade econômi-ca -em outras palavras, baixos índices de inflação- temum grande poder de sedução sobre o eleitorado. Se-não, como compreender a vitória de FHC no Brasil,a nova vitória eleitoral do Partido RevolucionárioInstitucional no México (v. Mundo nº 2, pág.10), ade Menen na Argentina (v. Mundo nº 3, pág.9) e ade Fujimori no Peru?

Todavia, a cada dia que passa fica mais evi-denciado que os ajustes estruturais não têm conse-guido dar respostas mínimamente satisfatórias às gra-ves disparidades sociais em todos os países da Améri-ca Latina. Mesmo no Chile, onde os ajustes estrutu-rais foram aplicados há mais tempo, e a estabilidadeeconômica parece mais sólida, o número de excluí-dos no conjunto da população é cada vez maior. Ocientista político argentino Guilhermo O’Donnel, emrecente reunião sobre problemas latino americanosafirmou: ‘‘A situação social na América Latina é umescândalo. Hoje há mais pobres do que em 1970.” Ojornalista Robert Samuelson, num artigo da revistaNewsweek, completou: “A guerra contra a pobrezaacabou, e os pobres perderam.”

Se, para muitos a catástrofe econômica dadécada perdida já é coisa do passado, os anos 90 es-tão cada vez mais perdidos do ponto de vista da mai-or igualdade social.

América Latina

MUNDO no Vestibular

1) Nos últimos tempos, o noticiário econômico passou ausar o temo GLOBAL TRADER, para designar paísesque mantêm um leque bastante variado de parcerias co-merciais. Partindo-se dessa definição, responda:a) O Brasil pode ser considerado um global trader? Justi-fique. b) Esse termo poderia também ser aplicado parao México? Justifique.

2) Dentre os vários fatores que contribuiram para a re-cente crise mexicana, alguns dizem respeito a instabilida-de da política interna do país. Aponte e comente doisapectos dessa instabilidade.

3) A selva amazônica foi palco de uma confrontação bé-lica entre dois países latino americanos no início de 1995.Os países que se envolveram nesse conflito foram:a) EUA e México b) Peru e Equador c) Argentina eChile d) Venezuela e Colômbia e) EUA e Cuba

4) Pode-se afirmar que os ajustes estruturais aplicadospelos países latino americanos resolveram todos os seusintrincados problemas? Justifique sua resposta.

Respostas

1a) Sim, o Brasil poderia ser considerado um global trader jáque mantém relações comerciais razoavelmente equilibradascom vários países e blocos econômicos do mundo. A UniãoEuropéia, os EUA, os países da América Latina, especialmen-te a Argentina e o Japão, por exemplo, são importantes par-ceiros comerciais do Brasil.

1b) O México não poderia ser considerado um global traderporque grande parte de seu comércio exterior (cerca de 75%)é feito exclusivamente com os EUA.

2) Um dos aspectos dessa instabilidade é a crise que vem severificando na região de Chiapas desde o início de 1994 e queaté agora não encontrou solução. A outra é a divisão que vemocorrendo no PRI, partido que há mais de 60 anos exerce opoder no país. Esse “racha” no PRI pode ser evidenciado pelacrise que envolveu o ex-presidente Carlos Salinas de Gortari eo atual, Ernesto Zedillo.

3) b

4) Não. Os ajustes estruturais conseguiram dar uma certa es-tabilidade à economia mas, não conseguiram tocar num pro-blema grave e fundamental: as grandes disparidades sociais,que já eram enormes e se ampliaram ainda mais na última

Ilust

raçã

o La

ís G

uara

ldo

Page 11: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

Texto & Cultura

Encarte do Boletim Mundo Geografia e Política Internacional. Não pode ser vendido separadamente.

Roy

Lich

tenst

ein

ANO 3 • Nº 6 • OUTUBRO 1995Tiragem da 1a edição: 37.000 exemplares

M U N D O300 anos de Zumbi

a gestação de uma etnia nova, unificaram-se, na língua e nos costumes, osíndios desengajados de seu viver gentílico, os negros trazidos da África e os europeus aquiquerenciados: era o brasileiro que surgia, construído com os tijolos dessas matrizes. Para oantropólogo Darcy Ribeiro, somos a promessa de uma civilização repleta de singularida-des -a tropicalidade índia somada à branquitude lusitana e ao tempero africano-, que nosfazem parecer exóticos diante dos olhos europeus. O processo de formação do povo bra-sileiro é tão atípico quanto a feijoada, prato típico tupiniquim: índio mais português maisnegro -combinação insólita de couve, laranja, farofa, feijão e partes de porco. Na prepara-ção deste quitute, o primeiro a entrar no caldeirão foi o índio (com rigor, sendo autócto-ne, já estava no caldeirão) e, em seguida, o lusitano. De acordo com Ribeiro, resulta desteexperimento uma “protocélula luso-tupi”, que recebeu depois a especiaria “africanidade”.Mexendo sem parar por vários anos, o resultado, enfim, é o nosso povo, a nossa cara,reflexo curioso que o espelho acusa. Somos fruto de um estilo de colonização batizado de“barroco”, já que marcado pela fusão das diferenças (para Darcy, “caldeamento”), peloassimilacionismo de culturas distintas, por uma “pororoca” étnica.

De um lado cana-de-açúcar,/ do outro lado cafezal,/ ao centro senhores sentados,/vendo a colheita do algodão branco,/ sendo colhido por mãos negras.../ Eu quero verquando Zumbi chegar : lembrando com este trecho do negro Jorge Ben os 300 anos demorte do negro Zumbi, destacamos alguns aspectos da presença negra na cultura nacio-nal. Amontoados em fétidos porões de navio, os negros trazidos ao Brasil eram, sobretu-do, da costa ocidental africana. Pertenciam a três grupos culturais: sudaneses, principal-mente os Yoruba (nagô); africanos islamizados, como os Mandinga; e os congo-angoleses,das tribos Bantu. Sofriam já aqui com a diversidade lingüística e cultural de origem (aÁfrica é uma “torre de Babel”), o que dispersava, de certa forma, o legado africano -haviauma política para evitar a concentração de escravos da mesma etnia na mesma proprieda-

de. Foram desalojados de seus lares, privados do direito sobre o próprio corpo, transfor-mados em mercadoria -mas resistiram bravamente. Foram despojados do amor, da famí-lia, do sexo -mas resistiram bravamente. Tinham os dedos mutilados, os dentes quebra-dos, os seios furados, a pele queimada, o lombo açoitado -mas resistiram bravamente.Trabalhavam 18 horas por dia, durante os 365 dias do ano -mas resistiram bravamente.

É isso o que mais impressiona: como resistiram à selvageria da mais cruenta vio-lência da empresa escravista? Como conseguiram preservar ecos da rica cultura africana?As cores mais marcantes do “amálgama cultural brasileiro” atestam o seu poder de resis-tência, assim como os cabelos duros, lábios volumosos e narizes grossos que transitamprincipalmente pelas áreas que foram o nordeste açucareiro e as zonas de mineração docentro do país. Apesar dos pesares, resistiram bravamente: é por isso que hoje usamostererês e tranças, vestimos cores fortes, comemos feijoada, ouvimos samba, blues, funk erap... E -ironia das ironias!- os sinais que os negros, apesar de tudo, deixaram na culturasão interpretados pela elite branca brasileira como a ‘‘prova’’ de que no país há democraciaracial -como mostra, à pág. 2, o historiador Nelson Schapochnik.

Prende-os a mesma corrente/ -Férrea, lúgubre serpente-/ Nas roscas da escravi-dão... Finalmente, uma estranha coincidência poderia servir de emblema à colonização“barroca”: o poeta branco e preconceituoso Gregório de Matos nasceu junto com o negrorevolucionário Zumbi -1636-, e morreu no ano em que este foi assassinado -1695. Àpág. 3, o professor de literatura José de Paula Ramos Jr. destaca o negro como autor etema em nossa literatura. Em Texto no Vestibular, questões envolvendo o poeta simbolis-ta Cruz e Sousa, autor negro que desejou a elevação espiritual do branco (já no nome, éCruz -nome escravo herdado dos pais- buscando ser Sousa -nome emprestado dos bran-cos pais adotivos), e o poeta romântico Castro Alves, autor branco que lutou pela eman-cipação do negro.

“existe um povoque a bandeira empresta...”

Ilust

raçã

o La

ís G

uara

ldo

N(Carlos Drummond de Andrade, Hino Nacional)

“O Brasil não nos quer! Está farto de nós! /Nosso Brasil é no outro mundo.Este não é o Brasil. / Nenhum Brasil existe.E acaso existirão os brasileiros?”

Page 12: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

O mito da democracia racialNelson Schapochnik

Especial para T&C

e.2 Casa Grande & Senzala

MR. VESTIBA

‘‘Ai meu Deus, que bom seria / Se voltasse a escravidão / Eu comprava essa mulata / E botava nomeu coração / E depois o delegado é quem resolvia a questão’’

(Ataulfo Alves)

‘‘Na verdade a mão escrava passava a vida limpando / o que o branco sujava / mesmo depois deabolida a escravidão / negra é a mão de quem faz a limpeza / lavando a roupa encardida, esfragandoo chão / negra é a mão da limpeza

(Gilberto Gil)

‘‘Sara cura / dessa doença de branco / de querer cabelo liso / já tendo cabelo louro / cabelo duro épreciso / que é prá ser você crioulo’’

(Gilberto Gil)Nos trechos acima, dois compositores negros cantam de forma distinta as relações entre ne-gros e brancos. Faça um texto para discutir a perspectiva explorada por cada um dos trechos,à luz do mito da ‘‘harmonia racial’’ brasileira.

neste caso, o ‘‘fato’’ oculta uma realidadesocial cruel. Fomos o último país do glo-bo a abolir o comércio de seres humanos.Além disso, a suposta igualdade civil de-corrente da Abolição nunca existiu.Emancipados da terra em que haviam tra-balhado por quase quatro séculos, os ne-gros viram-se condenados a errar peloscampos e cidades, bestializados pelo pre-conceito, pela falta de oportunidades einstrução, e recebendo menos do que obranco pelo mesmo trabalho -coisa que,obviamente, tem significado econômico.

Dado esse quadro, a questão seimpõe: de onde, então, surgiu o mito dademocracia racial? Sua origem deve serprocurada no processo de construção deuma interpretação racial sobre o Brasil, aqual serviria para compor a imagem deum Estado nacional moderno. Na pers-pectiva romântica do século XIX, ela apa-receu sob a forma do elogio de uma su-posta alma nacional que seria fruto damiscigenação de brancos, negros e índi-os, conforme o ensaio de Von Martius(1839) escrito para o Instituto Históricoe Geográfico Brasileiro. É o Brasil de Joséde Alencar, em que o índio -na figura dePeri- mais parece um herói do romancede cavalaria, e a índia Iracema (anagramade América) é uma ‘‘virgem dos lábios demel’’ ... que só poderia existir na imagi-nação cristã.

Retemperado por uma nova ma-triz teórica, - o darwinismo social, segun-do o qual numa democracia governa a raçamais capaz-, o mito da ‘‘alma nacional bra-sileira’’ reaparece na obra de SílvioRomero no final do século XIX, atingin-do sua plenitude com a obra Casa Gran-de & Senzala (1933), de Gilberto Freyre.Casa Grande pretende provar ‘‘cientifi-camente’’ que no Brasil há democraciaracial. Funciona como uma espécie deemblema da ideologia senhorial das eli-tes, segundo a qual o Estado brasileiro é aexpressão institucional harmônica -acimadas fissuras, conflitos e contradições deraça e de classe- de uma naçãomiscigenada.

Apesar de tudo, e até como umadessas peças que a história resolve pregar,este país, que persegue avidamente a sor-te grande, só acertou duas vezes na lote-ria. Foi com dois negros: Machado deAssis e Pelé. A ararinha azul pode se con-siderar extinta, o mico leão dourado idem.Negros, mestiços e brancos continuarão.Quem viver, verá.

Morar no patropi tem suas vanta-gens. Apesar do desemprego, do analfabe-tismo e da alta taxa de mortalidade infan-til, os brasileiros não se ressentem de al-guns males que afligem outros povos. Nãotemos terremotos nem vulcões, a terra éfértil e em se plantando tudo dá. Não exis-te preconceito racial, e em fevereiro temcarnaval. O povo brasileiro é feliz.

Leitor hipócrita, meu irmão, vocênão levou a sério estas palavras. Calma lá,isto é apenas uma estratégia para provocá-lo e persuadi-lo a continuar a leitura desteensaio.

Se hoje em dia é raro encontrar al-guém que ainda acredita no mito da ‘‘feli-cidade dos brasileiros”, muitos dizem queno país do carnaval e do futebol há ‘‘irman-dade’’ racial. Mas o preconceito existe e re-vela-se em metáforas de uso cotidiano. Ex-pressões como “preto de alma branca”, res-postas do tipo “eu não tenho preconceito,até tenho amigos negros”, ou anedotascretinas como a que diz “preto, quando nãofaz na entrada...” revelam, todas, o racis-mo que impregna a vida e distorce a noçãode democracia na esfera da cultura.

Vamos ilustrar um pouco mais essaquestão. Alguém já pensou, seriamente, nahipótese de que Cristo era preto (os judeus,ao menos, admitem que Salomão era ne-gro...)? Ou por quê nunca existiu umafadinha negra? A imagem oficial do Brasilda classe média -o Brasil branco, no me-lhor estilo de Hollywood-, prevalece nas“paquitas” loirinhas (nada contra, aliás, abeleza branca) e nas donas-de-casa da pro-paganda de TV. Hoje em dia, ‘‘pega bem’’,é ‘‘politicamente correto’’ ter algum atornegro nas telenovelas. Ou, no caso de umaatriz ou top model negra, como NaomiCampbell, ela é ‘‘vendida’’ como ‘‘exótica’’,e os traços mais valorizados são aqueles queas tornam mais assimiláveis a um padrãobranco de beleza.

Mas é no carnaval do Rio contem-porâneo -apoteose da demagogia sobre a“alegria racial”- que o preconceito apareceem sua forma mais cínica. Supostamente,o carnaval deveria ser um momento de re-conhecimento da contribuição do negropara a cultura. Mas, na avenida, o negro étransformado em mero figurante, pretextopara a exibição de atrizes e atores globais,que fazem prevalecer espacialmente suasuperioridade hierárquica: estão sempre no

topo da pirâmide, ou, neste caso, sobre oscarros alegóricos, enquanto lá em baixo ficaa “massa” com o samba no pé (tal e qual navida real, aliás). A exceção é a alta visibili-dade do mestre-sala e da porta-bandeira -‘‘vitrine’’ legitimadora da farsa.

Mesmo nas estatísticas oficiais, osnegros têm participação quase “clandesti-na” na população. Há uma tremenda con-fusão quando se trata de caracterizar a cordo recenseado pelo Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística (v. GePI, págs. 4 e5). Em muitos casos, o cidadão, com com-plexo de inferioridade, não se reconhececomo negro, preferindo “amenizar” sua cordizendo-se “mulato”, “marrom”, ‘‘pardo’’,“moreno”, “escurinho”, “sarará”. O Brasilnão sabe quantos são os seus negros. Se-

gundo o IBGE, o Brasil é constituído pormaioria branca (54%), ao passo que para oDatafolha (junho de 1995) os negros são58%. A confusão poderia sugerir que a de-mocracia é tanta que as cores se confun-dem. Mas, ao contrário, a confusão serve àidelologia da elite branca, que não reconhe-ce a existência de uma questão racial.

Isso pode ser claramente percebidopelas festas e datas cívicas -isto é, pela for-ma através da qual a elite conta e comemo-ra a história e as tradições do Brasil. O quese festeja, por exemplo, no 13 de maio? Aabolição da escravidão. Isto é fato. Mas,

Baile funk no Rio: expressão cultural legítima do modo de vida do negro pobre brasileiro, ousimples cópia do ‘‘modelo americano’’?

Racistas otários, nos deixem em paz / pois as famílias pobres nãoagüentam mais / (...) / e de repente o nosso espaço

se transformou num verdadeiro inferno / reclamar nosso direito,de que forma / se somos meros cidadãos

e eles o sistema? / A desinformação é o maior problema(Rap Racista Otário, do Racionais MC’s)

And

ré A

rrud

a/AJB

Page 13: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

O negro na literatura brasileira“pérola negra, te amo, te amo” e.3

José de Paula Ramos Jr.Especial para T&C

or prosador do período e de toda a Litera-tura Brasileira, Machado de Assis (1839-1908), que era mulato, praticamente ex-cluiu o motivo negro de seus romances. Noentanto, o capítulo “O vergalho”, das Me-mórias póstumas de Brás Cubas, contém umacena de agudíssima observação humana,que demonstra como o racismo se podeeclipsar perante a distinção de classe. BrásCubas andava pelo Valongo, quando viuum negro chicotear outro, brutalmente. Oalgoz era Prudêncio, escravo alforriado deBrás Cubas, que, livre, tornara-se proprie-tário de uma quitanda e daquele negrosupliciado. As reflexões de Brás Cubas so-bre o episódio sugerem como numa socie-dade escravista não é suficiente ser livre, énecessário ser senhor. Prudêncio, para sedesbancar da antiga condição, compraraum escravo, negro como ele, e lhe dava omesmo tratamento aviltante que havia re-cebido dos brancos.

Na poesia parnasiana, não há o quedestacar. Mas, no Simbolismo, surge amaior personalidade da literatura negrabrasileira: Cruz e Sousa (1861-98). Háquem veja na obsessão do cromatismo bran-co, presente em sua poesia, sinais de rejei-ção da própria condição racial. Nada maisequivocado. Não há, na literatura brasilei-ra, obra mais “negra” do que a dele. Poucospoemas registram o engajamento do autorna causa abolicionista, mas o soneto“Escravocratas” elimina qualquer dúvida.Em Cruz e Sousa, a negritude não se revelana epiderme temática; ela vive no âmagodo sentimento estético, consubstanciado nador que perpassa toda a sua obra, e quedesvela a grandeza da alma negra, na cor-rente sanguínea dos versos.

Lima Barreto (1881-1922) é a vozque se destaca no pré-Modernismo. Mula-to pobre, transfigurou literariamente suaprópria experiência de vítima do precon-ceito. Desde seu romance de estréia, Re-cordações do escrivão Isaías Caminha, suaobra denuncia as barreiras que se erguemcontra negros e mestiços.

Na primeira geração modernista,Mário de Andrade (1893-1945) desenhouo perfil da brasilidade, na simbiose racial ecultural de Macunaíma; Manuel Bandeira(1886-1968), em poemas como “Irene nocéu”, “Cantiga” e “D. Janaína” incorporouorganicamente a negritude, para construirmonumentos literários. Na prosa da segun-da geração, destaca-se Jorge Amado (1912);na poesia, Vinicius de Moraes (1913-80),que se autodenominou “o branco mais ne-gro do Brasil”, merece ser lembrado pelasua tragédia em versos Orfeu da Conceição.Mas, entre os modernistas, destaca-se Jor-ge de Lima (1893-1953) como o grandepoeta da negritude. Esse alagoano branco,filho e neto de senhores de engenho, noslivros Novos poemas e Poemas negros, porexemplo, ultrapassa o registro pitoresco efolclórico, assimila o cerne da cultura afro-nordestina e demonstra que a barreira raci-al é nada perante a universalidade da poe-sia.

As primeiras manifestações propri-amente literárias do Brasil datam do séculoXVII. Nelas, o negro já comparece, comotema. Padre Antônio Vieira (1608-97) de-plorou, várias vezes, a escravidão nos enge-nhos de açúcar. Vieira se mostra indignadocom o tratamento desumano a que eramsubmetidos os africanos. No entanto, pa-dre Vieira, por mais que lhe repugnasse abrutalidade do cativeiro, procurava conso-lar os escravos, dizendo-lhes que os sofri-mentos seriam passaporte para a alforria, navida eterna; aconselhava-lhes paciência eobediência aos senhores; argumentava queeram escravos no corpo, mas não nas almas.

O grande poeta barroco Gregóriode Matos e Guerra (1636-95) não tinha acompaixão de seu amigo Vieira, mostran-do-se preconceituoso. Mulheres negras emulatas aparecem em sua poesia como ob-jetos sexuais, enquanto os homens são abor-dados de forma degradante. No entanto,Gregório deve muito de sua originalidadeà cultura negra, quer pela incorporação devocabulário afro-brasileiro à sua poesia, queenriqueceu a língua portuguesa, quer peloregistro de elementos pitorescos, como aculinária, que contribuem para a constitui-ção de uma crônica poética vívida da Bahiaseiscentista.

Como autor, o negro começou a semanifestar no século XVIII. O mulato ca-rioca Domingos Caldas Barbosa (1740?-1800), conhecido como Lereno, foi um dosprimeiros. Sua poesia singela, geralmenteassociada à música, gozou de imensa po-pularidade em Portugal e no Brasil. Viveuna metrópole dos 23 anos até a morte. Foiprotegido dos aristocratas conservadores,que aplaudiam suas modinhas e lundus.Estes últimos se valem da fortuna culturalafro-brasileira. A negritude, na obra deLereno, é domesticada, apresentada comoelemento exótico, para deleite da cortesaniabranca; aliás, a maior parte das produçõesde Lereno é constituída de lugares-comunsdo arcadismo mais amaneirado, com suaspastorinhas de tranças loiras e faces cor derosas e jasmins. Na melhor poesia brasilei-ra do século XVIII, o negro é, praticamen-te, um mero elemento cenográfico.

Com o Romantismo, a literaturabrasileira inicia nova etapa de sua evolu-ção, dita nacional. A poesia da primeirageração romântica encontra seu expoenteem Gonçalves Dias (1823-64). Mestiço de

I - ‘‘E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo / diante da chacina / 111 presosindefesos, mas presos são quase todos pretos / ou quase pretos, quase brancos quase pretosde tão pobres / e pobres são como podres / e todos sabem como se trata os pretos’’

(Caetano Veloso, na música Haiti)

II - ‘‘As reflexões de Brás Cubas sobre o episódio sugerem como numa sociedade escravistanão é suficiente ser livre, é necessário ser senhor’’

(José de Paula, nesta página)

III - ‘‘Toda alma livre é imperatriz’’(Machado de Assis, em Esaú e Jacó)

Nos trechos acima, os autores discutem a questão da liberdade. Faça um texto comparandoas análises, levando em conta, e relacionando os distintos contextos históricos

MR. VESTIBA

José de Paula Ramos Jr. é poeta e professorde Literatura, autor de A ilustre casa deRamires - roteiro de leitura (Ática, SP)

branco, negro e índio, o autor dos Cantosidealizou o ameríndio como emblema denacionalidade, omitindo quase completa-mente os motivos afro-brasileiros. Na lite-ratura da época, essa omissão era generali-zada. Sílvio Romero assim a assinalou:

“Era uma coisa a ser observada enotada por toda a gente: na literatura bra-sileira a raça negra, apesar de ter contribu-ído com um grande número de habitantesdeste país, de ser o principal fator de nossariqueza, de se ter entrelaçado imensamen-te na vida familiar pátria, de estar por todaa parte em suma, nunca foi assunto predi-leto de nossos poetas, romancistas e dra-maturgos”.

Ainda segundo Sílvio Romero, cou-be a Trajano Galvão (1830-1864), poetamedíocre, o mérito de ser o primeiro a in-troduzir o negro em nossa poesia. Mas, ain-da em tempos do Romantismo, a negritudee o tema da escravidão passaram a ser maisfreqüentes e significativos, em obras comoDemônio familiar e Mãe, dramas de José deAlencar (1829-77), e Escrava Isaura, roman-ce de Bernardo Guimarães (1825-84). Este,talvez involuntariamente, apesar da inten-ção abolicionista, deixa transparecer umasérie de lugares-comuns racistas, insultos àetnia. Coube a Castro Alves (1847-71) oprivilégio de dar maior ressonância àtemática abolicionista. Poemas como “Vo-zes d’ África” e “Navio Negreiro” impressi-onam pela vibração indignada e fúria justi-ceira, no estilo grandiloqüente docondoreirismo hugoano.

A obra de estréia do romance rea-lista-naturalista, O mulato, de Aluísio Aze-vedo (1857-1913), é uma vigorosa denún-cia do preconceito racial. Ao lado desse,outros romances do período registraram apresença negra, como O bom crioulo, deAdolfo Caminha (1867-97) e Rei negro, deCoelho Neto (1864-1934). Porém, o mai-

Machado de Assis

Page 14: Geografia e Política Internacional - Clube Mundo · 2012-07-31 · “Tinir de ferros ... estalar de ... Págs. 6 e 7 Navio negreiro, segundo Rugendas A tragédia da África Negra

MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDO • PANGEA • MUNDOOUTUBRO

95

Texto no Vestibular • Texto no Vestibular • Texto no Vestibular •Texto no Vestibular • Texto no Vestibular • Texto no Vestibular •Texto no Vestibular • Texto no Vestibular • Texto no Vestibular •Texto no Vestibular • Texto no Vestibular • Texto no Vestibular •

Paulo César de Carvalho

“... o céu é do condor”

e.4

Leia com atenção os seguintes trechos e responda as questões de 1 a 3:

I“Ó Formas alvas, brancas, Formas claras / de luares, de neves, de neblinas!... /Ó formas vagas, fluidas, cristalinas... / Incensos de turíbulos das aras...

Flores negras do tédio e flores vagas / de amores vãos, tantálicos, doentios... /Fundas vermelhidões de velhas chagas / em sangue, abertas, escorrendo em rios...”II“Negro Sublime! Glória de uma Raça! / Peregrino rapsodo dos Faróis! /Pelo teu verso cintilante, passa / Uma esquisita luz de estranhos sóis!

Sacerdote genial da Liturgia / Do grande Sonho, límpido e legítimo! /Rouxinol dos países da harmonia! / Feiticeiro do Som! Mago do Ritmo!

(Alcêu Wamosy)III“A afinidade de Wamosy com (...) estava apenas no plano metafísico do espírito. A mesma novidadevocabular, a mesma fuga do trivial, a mesma vigorosa imaginação. Mas Wamosy nunca chegaria àque-les transbordamentos de volúpia do Divino Negro, que trazia diluídos no sangue todos os sóis da velhaÁfrica.”

(Manoelito de Ornellas)IV“Não deixa de haver muito mistério no fenômeno de serem negros, oriundos da raça mão-de-obra, omaior prosador da literatura brasileira, Machado de Assis, e, sob certos aspectos, nosso mais fundo eintenso poeta. (...) Anomalia sociocultural no Brasil do Segundo Império, exceção, desvio, (.....) superouo dilaceramento entre os antagonismos de ser negro no Brasil (mão-de-obra) e dispor do mais sofisticadorepertório branco de sua época (o “Espírito”).”

(Paulo Leminski)Questão 1- O autor de I, homenageado em II, é alvo de menção e comentário, respectivamente,em III e IV. Responda: a) De que poeta se trata? b) A que escola literária pertence? c) Quais suasprincipais características estéticas?

Questão 2- De acordo com o depoimento do poeta e crítico Paulo Leminski, como podem serrelacionados os trechos destacados em I?

Questão 3 (PUC-SP/ adaptada)- O adjetivo “cristalinas”, em I, é uma forma derivada de umsubstantivo.a) Diga qual é o substantivo de que ele deriva e qual o processo de derivação. b) Pelo mesmoprocesso de derivação ocorrido em “cristalinas” derive, agora, um substantivo de cada um dosadjetivos seguintes: “alvas”, “brancas”,“claras”.

■ ■ ■

“Era um sonho dantesco... O tombadilho,/ Que das luzernas avermelha o brilho,/ Em sangue a se banhar. / Tinir deferros... estalar de açoite... / Legiões dehomens negros como a noite / Horren-dos a dançar...

Negras mulheres suspendendo às tetas /Magras crianças, cujas bocas pretas /Rega o sangue das mães. / Outras, mo-ças... mas nuas, espantadas, / No turbi-lhão de espectros arrastadas / Em ânsiade mágoas vãs.”

Questão 4- Em que medida os frag-mentos acima, de um importante au-tor brasileiro do século XIX, podem serevocados para lembrar os 300 anos deZumbi? 1a) O poeta é Cruz e Sousa, o “Cisne Negro” ou “Dante Negro” (note-se, em II e IV, outras

perífrases: “Negro Sublime” e “Divino Negro”). Escreveu obras importantes como Broquéis (opoema destacado, Antífona, é a abertura deste livro), Faróis (citado no poema de Alcêu Wamosy,conterrâneo sulista) e Missal.b) A escola literária a que o autor pertence é o Simbolismo. Criado na França, em fins doséculo 19, reuniu autores da envergadura de Rimbaud, Verlaine e Mallarmé. No Brasil, alémde Cruz e Sousa, há o nome de Alphonsus de Guimaraens.c) Tematicamente, trata da loucura, dos desejos da carne que dificultam a sublimação espiritu-al, da busca de uma integração cósmica, do sonho (o poeta simbolista é um “nefelibata”, al-guém que caminha sobre as nuvens). Nenhum tema, porém, tem um sentido facilmenteidentificável. Verlaine, em Arte Poética, ao defender a liberação dos sentimentos mais profun-dos do inconsciente, contra a ordem, diz: “Toma a eloqüência e torce-lhe o pescoço!”. Para Mallarmé,outro inimigo da objetividade das definições, “nomear um objeto significa suprimir três quartosdo prazer da descoberta gradual de sua verdadeira natureza. Sugerir, eis o sonho.”. A atmosferamística e vaga é criada mediante o uso de sinestesias (mistura de percepções sensoriais: visuais,olfativas, gustativas) e de figuras de linguagem portadoras de musicalidade, como aliterações eassonâncias.

2) Os dois fragmentos são do poema Antífona, nome litúrgico que se refere ao versículo queantecede um salmo: o título indicia a atmosfera mística desta poética. O problema colocadopor Leminski (mestiço de negro e polonês) exige mais do que uma leitura racional, sociológica,da complexa obra deste artista, que conjugou questões expressivas (subjetividade típica doRomantismo) com preocupações construtivistas (objetividade emprestada do Classicismo).“Brancas” e “negras” podem sugerir muito mais que o comentário de Leminski: a atmosfera,no contexto, é vaga, fluida (“incensos” em “aras” -altares- de templos). Assim, a oposiçãoentre as cores pode sugerir a adversidade entre dois pólos: o céu e o inferno. “Brancas” -o céu,as nuvens- pode sugerir a busca da elevação espiritual, de Deus, da cultura “civilizada”: Deusé “branco”. “Negras”-o inferno, as fumaças-, pode sugerir a baixeza material, o “demônio”, abrutalidade do homem “negro”, a cultura “primitiva”. O passaporte social para o negro é aaquisição da “alma branca”.

3a) O adjetivo “cristalinas” é derivado, por sufixação (derivação sufixal), do substantivo “cris-tal”. b) Também por meio do processo de derivação sufixal, podem ser criados os substanti-vos abstratos (neste caso, nomeando qualidades) “alvura”, “brancura” e “claridade”.

4) Os fragmentos são do poema Navio Negreiro, de Castro Alves, principal expoente da tercei-ra geração do Romantismo no Brasil. Representam as preocupações sociais da época, centradasneste autor republicano e abolicionista. O eixo temático é o tráfico de escravos (a obra é poste-rior às leis que extinguiram este comércio, de 1850 e 1854). O drama do negro é indiciadocomo “sonho dantesco”, ou seja, as imagens da realidade parecem pesadelos do “Inferno”deDante Alighieri. Interpelando a Deus (“Senhor Deus dos desgraçados!/ Dizei-me vós”) e olhandopara os miseráveis nos porões infectos, o poeta denuncia a queda vertiginosa do ser humano(do céu para o inferno, da sociedade para seus subterrâneos). Inquieto, polêmico, apaixonado,converteu-se em uma espécie de mentor político do povo, de condutor dos anseios da coletivi-dade. Fez do “condor” (nasce daí o termo “Poesia Condoreira”) o símbolo de sua luta pelaabolição da escravatura, como Picasso fez da pomba o símbolo da paz no século XX. Revoluci-onário, transformou sua pena em ágil baioneta (como o poeta russo Maiakóvski). Castro Alvese Zumbi constituem forças contra o jugo selvagem do homem branco: “a praça é do povo comoo céu é do condor” e o Quilombo de Zumbi -resistência em nome da Liberdade!

O poeta Cruz e Souza, em charge da época

Seção Papo CabeçaSe ao te conhecer / dei pra sonhar, fiz tanto

desvarios / rompi com o mundo, queimei

meus navios / me diz pra onde

é que ainda posso ir(Chico Buarque, 1944)