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NS A ¶s11iIB ¶h,¶ Editorial Ano IX Fevereiro 96 O JORNALISMO DA COMUNICAÇÃO N° 101 R$ 4,0 0 A vitória contra a inflação e a imagem do president e desarmam as oposições . E até os donos d e jornais acham a imprensa complacente com o govern o Internaciona l REPÓRTERES SEM FRONTEIRA S A defesa dos jornalista s em países onde o crime é ser jornalista Entrevist a A NTONIO CALLAD O O autor de Quarup ataca: " Estamos vivendo um a situação social explosiva"

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Editorial Ano IX Fevereiro 96 O JORNALISMO DA COMUNICAÇÃO N° 101 R$ 4,0 0

A vitória contra a inflação e a imagem do president edesarmam as oposições . E até os donos de

jornais acham a imprensa complacente com o govern o

Internacional

REPÓRTERES SEM FRONTEIRASA defesa dos jornalista s

em países ondeo crime é ser jornalista

Entrevista

A NTONIO CALLAD OO autor de Quarup ataca:"Estamos vivendo uma

situação social explosiva"

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"A Imprensa convém aopoder, serve o

poder, faz parte do poder "MINO CARTA

imagem pessoal do presidente e avitória contra a inflação neutralizam as oposições .

E até donos de jornais reconhecem :a imprensa está muito complacente com o govern o

Por Deborah Breuer"Os meios de comunlcaçéo

são porta-vozesdo ideário dominante "

ROBERTO MANGABEIRA UNGE R

"Imprensa é oposição .0 resto é armazé m

de secos e molhados "MILLOR FERNANDES

"A atitude daImprensa é complacente "

OTAVIO FRIAS FILHO

"A Imprensa foi seduzida po rFernando Henrique Cardoso "

CARLOS HEITOR CON Y

"A Imprensa estácontaminada

pela versão oficial "JÚLIO CÉSAR FERREIRA DE MESQUITA

"A imprensa tem sidobastante dura com o governo "

AUGUSTO NUNES

N Ao há consenso quando o assun -to é a relação do jornalismo co mo poder. Bajulação não rima co m

imparcialidade, isenção, neutralidad enem com ética, pilastras que teoricamen -te sustentam a atividade jornalística. Ma sa história mostra que não raras vezes aimprensa tropeça nos seus próprio sdogmas . Hoje pode não ser regra, ma shouve tempo em que, necessariamente ,a imprensa ou estava com o governo o ucontra ele . Tomar partido era, em algun scasos, motivo de orgulho. Em outros ,questão de sobrevivência .

Havia trincheiras claras . Os que era mcontra ou a favor trocavam farpas na spáginas dos jornais, polemizavam, de-fendiam candidatos, caluniavam, xinga-vam a mãe, estapeavam-se com palavras .Faltava ética, sobrava clareza de posi-ção . Mesmo que essa posição, esse apoi odos jornais, durasse, às vezes, o temp osuficiente para conseguir alguns mil réi sdo escolhido .

Mário Rodrigues, por exemplo, paido também jornalista e teatrólogo Nel -

son Rodrigues, defendeu até o fim a pos-se do candidato paulista, Júlio Prestes, àsucessão de Washington Lufs . A vitóri ade Prestes garantiria a Mário mais algun sanos de bonança à frente da sua editora ,responsável pelo jornal Critica . Ele sónão contava com a revolução que alçouGetúlio Vargas ao poder. Resultado : o spartidários de Getúlio destruíram todo sos jornais contrários ao ideário da Alian -ça Liberal, levando à bancarrota a famí-lia Rodrigues . Enquanto isso, o governorecheava os cofres amigos, para alegri ade um tal Assis Chateaubriand, a essetempo dono de O Jornal e getulista roxo .

Virando casacaChatô, por sua vez, tinha uma form a

peculiar de lidar com o poder . A princi-pio apoiava o governo para, em seguida ,passar para o oposição . Com o própri oGetúlio foi assim . Chatô, que participouarmado da revolução de 30, dois ano smais tarde, na insurreição constituciona-lista liderada por São Paulo, foi pres otransportando armas para os revoltosos .

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Com o leitor? Ou com o poder?Preso, quase foi deportado para o Japão .Apesar disso, foi ele o grande responsá-vel pelo retorno de Getúlio em 1945 ,quando enviou Samuel Wainer para fa-zer uma entrevista exclusiva com o dita -dor. Instável, o tempo veria Cha-teaubriand abrir sua TV Tupi, nos ido sde 1952/53, pars Carlos Lacerd aespinafrar novamente o presidente .

Fustigado por todos os lados, Getú-lio, conta a história, financiou a instala-ção de Última Nora, o jornal de Samue lWainer criado para defender o presiden-te . Mas que, incoerentemente, não pou-pava críticas ao governo, Com o regim emilitar instalado em 1964 não foi dife-rente . Chato estava no centro da conspi-ração para derrubar Jango . Um ano de -pois, chamava em seus jornais o genera lCastello Branco de paquiderme .

"O tipo de imprensa movida por inte-resses impublicáveis, como a que existi ana época do Chato e do Samuel, mudoumuito", acredita Augusto Nunes, direto rde redação da Zero Hora, para quem nãohá mais um jornalismo militante, com

posições escancaradas a favor ou contra .Algo que a seu ver é salutar.

"Os atuais barbes da comunicação n oBrasil articulam nos bastidores", com -para Fernando Morais, jornalista e escri-tor. Morais lembra que os antigos dono sda mfdia, como Chata, exerciam o po-der pessoalmente, tinham outro estilo ."Mandavam capar", diz, lembrando u mepisódio ocorrido entre Assis Chateau-briand e um inimigo .

isençïõo duvidosaEm compensação, hoje há muita dis-

simulação . Ninguém apóia ostensiva -mente, mas também não dá para sabe rde que lado estão . Exceção feita aos epi-sódios com o governo Collor. A cober-tura das eleições presidenciais de 198 9já sepultou o mito da isenção . Interna-mente, os veículos eram obrigados a con -viver com a coexistência de jornalista spró-Lula e patrões pró-Collor. Essas po-sições divergentes contaminaram a pau -ta, a apuração e a edição do noticiári oconsumido por milhões de leitores-elei-

tores, Inesquecível também a edição d odebate final entre os dois candidatos fei-ta pelo Jornal Nacional, levando ao ho-rário nobre um compacto acusado de tec-nicamente incorreto e editorialment edesequilibrado .

Collor ainda viveria para ser execra-do publicamente . No processo de im-peachement é inegável a participação d aimprensa, que notoriamente mudou d elado na guerra, armou trincheiras e sol-tou torpedos como as entrevistas d ePedro Collor e Eriberto França, que pu-seram a pique a trupe de marinheiros d eprimeira viagem do governo .

Há quem não acredite em imprens adissociada do poder. É o caso de MinoCarta que, do alto da experiência d equem criou algumas das principais pu-blicações brasileiras nos últimos trint aanos (Quatro Rodas, Jornal da Tarde ,Veja, IstoE/Senhor e, mais recentemen-te, Carta Capital), afirma : "Há veículo sque dependem financeiramente do po-der, outros politicamente . E há os qu esão o próprio poder. A imprensa é o po-

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der" . Carta sinaliza que nós não temo suma sociedade homogênea, mas a im-prensa quer fazer crer que é uniforme ,desapaixonada . "Na Europa, apesar dequatro ou cinco holdings controlarem aimprensa, os compromissos são claros .Os jornais tomam posição, brigam po relas, babam na gravata, divergem no seditoriais . Aqui a imprensa gosta do con -senso absoluto, quer mostrar que somostodos felizes, temos um presidente ma-ravilhoso", espeta .

Santo d• casaOs governantes, em qualquer tempo

e parte do planeta, sempre vão preferi ruma imprensa com adesão plena, se mressalvas . Nunca estarão satisfeitos . OBrasil, ao que parece, ainda está engati-nhando nas relações modernas e demo-cráticas com o poder .

"A imprensa americanatrata os fatos com mai snaturalidade. Aqui ain-da temos um entulhoautoritário nas costas" ,compara Augusto Nu-nes . Ele acredita quehá um patrulhamento ."Se a imprensa afirmarque a inflação está bai-xa, vão dizer que est áapoiando o governo .Nos Estados Unidos, s eo Clinton está mal, di-zem que está mal, s esubiu nas pesquisas, di-zem que subiu . S6 isso .Os fatos . "

E os fatos, no Brasilde 1996, mostram umpresidente que chego uao final do primeiro an ode governo com 43% d eaprovação popular . Com seu plano de es-tabilização econômica não foi diferen-te : 72% da população consideram o Rea lbom ou ótimo. Há tempos não se via u mgovernante fluente como o ingles, o fran-c@s e o espanhol que fala, elegante comoos ternos bem cortados que traja, ínte-gro como faz crer seu passado de olhei-ras, pastas de couro e aulas na USP, jus -to como a causa que defendia nos ano sduros da ditadura e, ainda por cima, aces-sível aos jornalistas .

E como a imprensa tem se portadodiante desse modelo de poder? Muito sjornalistas sugerem intimidade, ao tra-tar o presidente apenas por "Fernando" .

Para vários coleguinhas, principalment ede Brasilia, até bem pouco tempo, o pre-sidente ainda era o senador Fernand oHenrique, sempre fonte da melhor espé-cie, daquelas que se dispõem a fornecerinformações exclusivas .

Muitos jornalistas, aliás, foram seu salunos, como lembra Her6doto Barbei-ro, Ancora do jornal da CBN . Isso fez del eum personagem simpático à imprensa ,do qual não se deve falar mal .

O resultado da sedução que Fernand oHenrique exerce sobre a mfdia foi u mempréstimo inevitável da sua image mpessoal para o governo do qual é líder. Apolítica de estabilização da economia, arapidez com que o governo corta cabe-ças, mesmo coroadas, para poupar-se d e

criticas mais ferozes (vide caso Grazian oe embaixador Júlio César), e o discurs opró-reformas concorrem para lustrar apérola. Soma-se a isso a falta de bandei-ras da oposição .

Sustentam alguns que a oposição nã oaparece na imprensa por não ter espaço .Nos jornais, é voz corrente que ela nã oaparece porque não existe . Quando sur-gem dados relevantes, que poderiam serencampados pelas forças adversárias d ogoverno como capazes de provocar um areação, o próprio governo trata de abra-çar a causa, minimizar os números e pro -meter soluções, como aconteceu com odesemprego.

Inicialmente o governo tentou nega ros fatos (" . . . a taxa global de desempre-go se manteve a mesma . . .", declarou opresidente em entrevista à revista Veja ,de 17 de janeiro último) . Diante das pres-sões, mudou de tática e rendeu manche-tes como a do caderno de "Economia "do Estadão de 5 de fevereiro : GOVERN O

ESTUDA MEDIDAS PARA ALIVIAR DESEMPREGO .

Un*nlmidads mundia l"Os jornalistas do mundo inteiro

vêem o governo de Fernando Henriqu ena mesma linha, tem o mesmo posicio-namento favorável . E seria absolutamen-te impossível comprar a imprensa muni-cipal, estadual, nacional e internacional" ,opina Joseph Couri, presidente do Sin-dicato da Micro e Pequena Indústria, re-sumindo uma opinião predominante en-tre empresários .

De fato, ninguém acre-dita que o tratamento dis-

pensado pela imprensaao presidente tenhavínculos com o caixado governo, tipo de re-lação promiscua que

já foi praxe em outro stempos, quando edito -riais favoráveis tinhamseu preço . Mas mesm ovozes insuspeitas iden-tificam a benevolênci ados veículos de comu-nicação com o poder .

"A atitude da im-prensa frente ao gover-no é complacente", ad -mite, por exemplo ,Otávio Frias Filho, di-retor de redação da Fo-lha de S. Paulo e her-deiro do jornal . Frias

lembra que as pesquisas atestam um ín -dice de aprovação satisfatório e avaliaque talvez isso tenha inibido o espiritocritico da imprensa . Segundo ele, é comose o jornalismo não se visse no direitode discordar do povo .

"Não concordo com essa postura, tan -to que procuro incentivar a atitude criti-ca dentro da Folha . No conjunto d amídia, creio que o veiculo de maior isen-ção tem sido a Folha", afirma . 0 riscoda unanimidade, lembra Frias, é a even-tualidade de que se repita o que ocorre uno governo Collor. "No primeiro ano ,com a popularidade alta, a imprensa eras6 entusiasmo. Depois das denúncias d e

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tas vezes a distância entre o primeiro es -calão e as bases resulta em desgoverno .Ordens são dadas e não são cumpridas .Para revelar os desmandos, os jornalis-tas deveriam, na sua opinião, fuçar o sbastidores . "Infelizmente a imprensa ,sobretudo em Brasília, está contamina-da pela mentalidade do oficialismo . Nã oculpo os repórteres . Eles nasceram so besse tipo de procedimento . Para fazercom que deixem de lado as coletivas do sministros e desvendem os bastidores dosministérios é preciso uma mudança cul-tural", diz, acrescentando que incentivaressa atitude "é uma luta insana, diária "dentro do seu jornal .

Bastidores parece ser também o foc ode interesse de Roberto Civita, presidente

Cadê aoposição?

Enquanto o PlanoReal estiver dando cer-to, a oposição não ecoa .A opinião, externada porLuís Antônio Medeiros,presidente da Força Sin-dical, é regra geral, ma snão escapa da indigna-ção . "Num governo se m

Otavinho: "Confundem

oposição, a taxa de bec-o chefe do governo

teira é muito grande" ,com o próprio governo"

avalia Medeiros, par aquem a imprensa est ábenevolente demai s

com o governo e resiste em amplificar a sdiscussões em torno de determinados te-mas, principalmente falhas na área social .

"A mídia foi ganha pelo FernandoHenrique e acho isso errado . Os jornai snão podem ser tão opinativos, a pontode omitir outras posições", reclam aVicente Paulo da Silva, o Vicentinho ,presidente da CUT. Vicentinho foi a bol ada vez da imprensa em virtude do deba-te para a condução das votações para re -forma da Previdência Social, mas diz qu eesse destaque foi uma exceção .

Para Ricardo Noblat, diretor de re -dação do Correio Braziliense, o proble-ma não está em ecoar ou não opiniõe s

Oficialismocômodo

Quem também de -fende uma mudança deatitude da imprens adiante do governo é Jú -lio César Ferreira deMesquita, diretor res-ponsável do Estadão .Para ele, o noticiário d aimprensa deve apena sretratar os fatos, se mopinar se são bons o uruins . "Isso é para o scolunistas, não para a smatérias factuais", diz.No entanto, Mesquita

Joseph Couri: "Seriase ressente da falta de

impossívelmatérias investigativas .

comprar a imprensa inteira ""A imprensa se acomo-dou no oficialismo da sinformações . E preciso ir atrás do quenão vem a público", sugere . Diante deFernando Henrique, considerado porMesquita como um "homem natural ,uma pessoa tranqüila, sem rompantes" ,as pessoas também ficam "anestesiadas" ."Ele é um intelectual, um acadêmico ,tem esse tom professoral, e a mídia sedeixa levar por essa aura . Não o vê com ouma pessoa para se cutucar", diz .

Mesquita ressalta que o jornalism odeve tomar cuidado para não se deixarusar pelo poder. "Fernando Henrique éuma pessoa dentro da máquina, e é evi-dente que não se trata de um governo desantinhos", afirma, advertindo que mui -

corrupção, passou a crucificar o gover-no ." Era como um mea culpa, o jorna-lismo pedindo perdão por ter se deixad oenvolver e indo então à forra, com o sen -timento de quem viu primeiro, desmas-carou, alertou . O ideal, diz Frias, é queos veículos pudessem evitar essa oscila-ção e ser mais constantes, mais isentos .

O fato de Fernando Henrique se rFernando Henrique é só mais u mcomplicador. "Não nego que ele, comopessoa física, tenha predicados que agra-dam, e infelizmente há confusão entreas características do chefe do govern ocomo próprio governo, fazendo com qu ea imprensa fique reticente", analisa Frias .Mudanças nesse quadro, segundo ele, de -penderão do desgaste natural que todogoverno sofre, e a conseqüência talve zseja uma imprensa menos subserviente ,de olhos mais abertos para o que aconte-ce na administração federal .

da Editora Abril . "A meu ver, precisamosde mais informações e avaliações referen -tes às idéias, propostas, programas, proje -tos e realizações do presidente, e menosatenção às questiúnculas tipo quantas via -gens fez, seus pendores intelectuais e co mquem está irritado hoje", diz Civita.

Quando até os donos da mídia brasi-leira vêem com ressalvas a atitude d aimprensa diante do governo, é porque d efato vivemos uma situação peculiar. Háquem explique . Luis Fernando Veríssimodiz que a boa vontade da imprensa como governo se justifica não só pela sim-patia e pedigree intelectual do presiden-te, que representa uma geração e uma

mentalidade que também são as do se-gundo escalão da nossa imprensa (edito-res, colunistas etc .) na sua maioria, ma stambém porque a grande imprensa, e mnível empresarial, concorda com o pro-jeto neoliberal, ou neo-social-liberal-de-mocrata do governo .

"E preciso lembrar que o segundocandidato mais votado nas duas última seleições presidenciais no Brasil foi umesquerdista que tinha, bem ou mal, u mprojeto radicalmente oposto. Acho queo patriciado brasileiro se deu conta deque precisava fechar com os seus princí -pios e interesses para evitar outros sus-tos, e a grande imprensa reflete essa de -cisão, que pode até ser inconsciente" ,opina Veríssimo . Ele não acredita que ojornalismo tenha renunciado à indepen -dência e à crítica, mas está claro que fe zuma opção pela sua classe . "A esperan-

ça do patriciado brasileiro éque, de tanto ler sobre se u

óbito nos jornais, a es-querda se convença d eque morreu e pare d eincomodar", conclui .

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divergentes . "As demais forças política sestão sem alternativas, não há outras pro -postas . O espaço está aí, aberto, mas nãohá proposta capaz de encantar uma fati apreponderante da população para quemereça eco", analisa .

Entretanto, Noblat acha que o perío-do de lua-de-mel da imprensa com o go-verno - "que acontece com qualquer go-verno" - acabou com episódios com oos casos Sivam e pasta rosa . "Ninguémescondeu nada, os fatos foram denuncia -dos . Não se pode negar que a estabilida-de da moeda e a manutenção da inflaçãolá em baixo geram uma simpatia geral esão um bom argumento para manter amídia em equilíbrio . Mas o governo nãotem nenhuma obra a mostrar, o desem-prego está aí, o aumento nos saques doFGTS comprovam isso, e as criticas au-mentarão ou não de acordo com o de-sempenho", alerta.

co do Última Hora de Samuel Wainer,que fazia apologia de Getúlio mas cutu-cava o governo . "Com o tempo", acre -dita Tão, "a imagem de ineficiência einsegurança do governo não vai poupa rnem o presidente ." Nesse processo, acondução das reformas será crucial .

"O poder por si desgasta", lembr aBoris Casoy, editor-chefe, diretor-geral eâncora do TJ Brasil, do SBT, onde a o-rientação é "criticar o que parece criticá-vel ; elogiar o que parece elogiável" . Bori snão faz parte da turma dos deslumbrado scom o charme de FHC. "Houve outro sque falavam tão bem quanto ele, foramtão brilhantes e se comunicavam ma-gnificamente. Os mais jovens, que nãoviram, é que estão encantados", ressalva .

Ele diz que há motivos para o quechama de "impressão de aparente apoi oda mídia ao governo" : o sucesso do Pla-no Real, "que fala por si e deixou a opo-sição sem bandeiras", e a própria ban-deira das reformas, que faz com que aspessoas se engajem e acabem sendo com -placentes .

Para Boris, se o Plano Real for umsucesso até o final do governo, será mei ocaminho andado para manter uma bo aimagem. Mas há um fator social concre-to no horizonte, que é o desemprego, ex -tremamente desgastante para o governo ."O grande desafio agora é fazer com queas pessoas amem a estabilidade que as

desemprega" Até o momento, a tátic ado governo foi assumir para si até ban-deiras como essa.

Mantém, assim, a oposição de crist abaixa . "As pessoas ficam constrangida sde ir contra o governo", diz Carlos Hei -tor Cony, um dos poucos que se posta mcriticamente contra o governo FHC . "Aimprensa trata Fernando Henrique comofilho pródigo . Lembremos a campanh apresidencial, a denúncia de subfaturamen -to da fazenda de FHC, que foi pouco ex -plorada pela imprensa . Veja-se o caso doembaixador, do chefe do cerimonial . Co-locaram uma pedra em cima. Se fosse oLula ou o Brizola, iriam investigar até ofim." Para Cony, ninguém fala do fracas-so do programa social (aquele que foi cha -mado de "masturbação sociológica") . "OProjeto Solidariedade de Dona Ruth émais indecente que o da Rosane Collor.

Rosane pelo menos envio ucomida lá para sua terra. O

da D . Ruth é um sim -pósio. Aliás, Fernand oHenrique é um sim -pósio, ele não é umgovernante", apedreja .

Devendo alição

Quem também nãose conforma com a ar-gumentação triunfalis-ta da imprensa brasilei-ra a favor do governo éo cientista políticoRoberto Mangabeir aUnger, professor titularde Direito da Universi-dade de Harvard . Paraele, "o jornalismo ob-viamente tem disposi-ção para essa doença ,

caso contrário não estaria doente" . O pro -blema, diz Unger, está na concepção d atarefa que a imprensa deve desempenhar .Unger diz que quem está no poder, ouanseia pelo poder, tem uma concepçãorestrita do real e do possível, cabendopor isso ao jornalista ampliar a realida-de para o público. Por essa razão, ele te ma obrigação de ter uma concepção isentae não participativa, longe do engajamentointeressado que se verifica hoje na mídi abrasileira de forma generalizada . "Seri ainjusto singularizar", acrescenta .

A nascente do problema, diz Unger,está na incapacidade de o jornalismonacional distinguir informação de opi -

Na corda bamba"O governo está se

apoiando demais n oque é instável, que é aestabilidade da moe-da", concorda Tão Go-mes Pinto, diretor de re -dação da revista IstoE,que tem se destacad opor denunciar escânda-los na área governa -mental . "A estabilidadeeconômica tem umefeito eleitoral fantásti-co, mas é muito arris-cado para o governo te rs6 um gancho no qual

Moreira Ferreira : "Asse segurar. Ainda que

responsabilidadesesteja demonstrando

devem ser divididas "disposição para o diálo -go, para fazer projetos ,não tem nada de concreto", avalia .

A IstoE fez matérias apontando mo-mentos complicados do governo pois, d eacordo com Tão, "é dever da imprens acontar o que sabe". E segundo ele issofoi possível porque "esse é um govern oatrapalhado, desorganizado, que permi-te acontecerem coisas como a pasta ro-sas e o grampo do caso Sivam" . Mas nogeral, Tão acha que a imprensa é gene -rosa com o governo por conta do des-lumbramento causado por FernandoHenrique. "Todo o governo tem sido pre-servado", avalia, embora lembrando ca-sos nos quais o presidente foi poupadoe o governo não . Cita o exemplo clássi -

Julinho Mesquita:"Não se trata de

um governo de santinhos"

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nião, e no vício recorrente de se trans -formar sempre em porta-voz dos grupo sdominantes . "A parte a questão moral epolítica, essa postura da imprensa não éboa porque deixa os jornalistas faltoso sde uma visão critica", lamenta .

"Quem diz que a imprensa é benevo-lente com o governo acredita que eladeveria empunhar bandeiras vermelha se liderar uma revolução . Quem deve em-punhar bandeiras é a oposição", polemizaMarco Antonio Rezende, diretor de Re-dação da revista Exame Vip .

Rezende alerta para o fato de que no spaíses onde a oposição política não cum-priu seu papel instauraram-se regimeshegemônicos e corruptos que duraram dé -cadas . "Basta pensar no México, no Ja-pão, na Itália", exemplifica . Ele acreditaque não é papel da imprensa ser ou nã oser benevolente com o governo . Diz queninguém gosta de imprens aa favor : "O Le Monde, queera feroz crítico do regi -me gaullista e pró -Mitterrand, perdeu 1/4da tiragem e quase fe-chou depois da eleiçã ode Mitterrand em 1981",lembra . E completa : "Aimprensa é um espelhodo país, ela não te mvoto, tem leitores, todo svoluntários e pagantes .Quem é benevo{ent ecom o governo no Bra-sil é, em primeiro lugar,o povo. O povo do Rea lquer tudo, menos um go -verno diferente dess eque aí está". Para o dire -tor de %'p, quem está d efato benevolente com ogoverno é a oposição (ouo que deveria ser chamado de oposiçã oneste país) . "O governo faz o que quer n oCongresso, com a alegre aprovação do PT ,do PDT e de outros menos votados . A im -prensa, com as exceções de praxe, vemdenunciando a vocação turística de FHC ,o fisiologismo do regime tucano, a ma-landragem do Sivam, o falso discurso so -cial do governo e a farsa das privatiza-ções", avalia.

Guarda-costas aplicadosComo Rezende, há outros defenso-

res do comportamento da imprensa. Oempresariado é um bom exemplo . Re-presentantes do comércio ou da indús -

tria acham que a imprensa não está sen-do nem complacente, nem benevolente ,muito pelo contrário . Tem desempenha-do seu papel, com isenção, levando a oleitor informações que o leitor procura .

"A imprensa tem tratado esse gover-no igual a qualquer outro, mostrando ocomportamento dos governantes, trazen -do informações de maneira aberta, trans -parente, revelando em que sentido todasas viagens do presidente trazem vanta-gens ao país . E uma imprensa moderna ,que apresenta o que o leitor quer ler" ,declara Abraham Szajman, presidente daFederação do Comércio do Estado de Sã oPaulo . Szajman acredita, inclusive, quea imprensa chega a ser dura com algun spersonagens e setores .

O presidente da Fiesp - Federaçãodas Indústrias do Estado de São Paulo ,Carlos Eduardo Moreira Ferreira, tam-bém não acredita que a imprensa sej abenevolente com Fernando Henrique ."O contrário seria admitir a fragilizaçãodos meios de comunicação diante do po -der. O que me parece ocorrer é que vi -vemos em pleno processo de consoli-dação da democracia em que se reco-nhece a importância de todas as sua sinstituições e a influência, cada vez mai -or, da sociedade organizada nos proces-sos decisórios", diz .

O discurso de Ferreira conclui que ,diante desse quadro, "a mídia tem em

muito colaborado para difundir a noçãocorreta de que todas as responsabilida-des não recaem - e nem devem recai r- sobre os ombros de um só home miluminado e salvador da pátria" . Emvista disso, ele admite que "pode pare-cer, eventualmente, que o presidente d aRepública, a quem se reconhece estarchefiando a nação com habilidade e qu egoza de grande credibilidade junto àopinião pública (interna e externa), es-teja sendo por vezes poupado das críti-cas mais contundentes e exacerbadas d eque foram alvo alguns dos seus ante-cessores" .

Não é o que acha Merval Pereira,diretor de Redação do jornal O Globo ."O governo é criticado de todas as ma-neiras . Quando há problemas, eles sã odenunciados . Não acho que esteja sen-do poupado", diz, mas frisa que

Fernando Henrique "é u mbom presidente", e lida

com as críticas com amesma habilidad ecom que trata d equestões políticas :negociando .

Na TV Globo tam-bém não se fala emfavorecimento ou be-nevolência . "No JornalNacional ou em qual -quer outro dos seu stelejornais, a Rede Glo-bo tem se empenhad oem tratar o governo fe-deral e, nele, o presi-dente Fernando Henri -que Cardoso, com amais rigorosa isenção .Todos os fatos relevan-tes, positivos ou nega-tivos, originários do

governo ou que o envolvam, têm sidodivulgados em nossos telejornais ,balizados apenas pelo interesse pre-sumível dos telespectadores", anunci aEvandro Carlos de Andrade, diretor d eJornalismo da emissora .

Seja como for, há, como sinalizouElio Gaspari em sua coluna no Estadão ,de 7 de fevereiro, algo novo no ar. "Já sepassaram 38 dias deste ano de 1996 e ,salvo o cachê do Paulinho da Viola, nãohá no Brasil um escândalo disponível .Desde 1992, quando apareceram as pri-meiras denúncias contra o presidenteCollor, isso só aconteceu uma vez" O umudou o país, ou a imprensa .

Merval : "O governo® criticado d e

todas as maneiras"

Vicentinho: "A mídiafoi ganha pelo

Fernando Henrique"

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