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Oez dos maiores jornalistas do país tocam o dedo nessa feridaportalimprensa.com.br/imprensa30/imprensaeconomia/30capas/IMPRENSA... · 0 golpe que a imprensa apoiou ... timento público

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Oez dos maiores jornalistas do país tocam o dedo nessa ferida

PINGA-FOGOAmaral Netto

é contraa pena

de morte paracorruptos

ENTREVISTA: SÉRGIO BUARQUE DE GUSMÃO"A imprensa é prepotente e arrogante"

A Fórmula 1 prometemuita emoção para atorcida brasileira em 94 .

Ayrton Senna dispara rumoao tetracampeonato .Christian Fittipaldi e RubinhoBarrichello, revelações dasduas últimas temporadas,devem correr agora nopelotão da frente ,completando a festa brasileira .

É hora de pisar forteno acelerador eoferecer aos leitores doseu jornal a anális eprecisa de Reginaldo Leme ,único jornalista brasileiro quepresenciou os oito títulosconquistados por Emerson ,Piquet e Senna .

Se você não quer ficar na contramão,assine a coluna de Reginaldo Leme.

História

Dia 2 de abril de 1964 : militares vitoriosos guardam o Palácio da Guanabar a

G0

0 golpe quea imprensa apoiou

Como os donos de jornais embarcaram na aventura militar de 1964porAlessandra Vinhas

Neste dia 31 de março, faz trê sdécadas que a imprensa brasi-leira embarcou numa canoafurada, que a mergulhou n ofundo do pântano de uma di-

tadura . Uma viagem às manchetes dos gran -des diários brasileiros naqueles primeiro sdias de abril de 1964 traz à tona uma lem-brança constrangedora para os donos dejornais, repórteres e redatores da época :a imprensa, que viria a sofrer uma censu-ra feroz entre os anos de 1968 e 1976 eque hoje se apresenta como guardiã da de-mocracia, em 1964 apoiou e aplaudiu um aquartelada militar.

A deposição de João Goulart foi come -morada como uma final de Copa do mun-do na redação de O Estado de S. Paulo ,cujos donos, os Mesquita, assumiram opapel de líderes civis do golpe . Oficiai smilitares foram ao jornal confraternizar-se

com seu dono e, a 9 de abril, o Estadãopromoveu uma grande festa, com direito apapel picado jogado pela janela, em come-moração à "volta da normalidade democrá-tica" . Em editoriais mais ou meno sefusivos, jornais como O Globo, Folha deS. Paulo e Correio da Manhã, tambémaplaudiram a queda do presidente civil ,com a posse provisória do presidente d aCâmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli ,e a ascensão ao poder do general Humbertode Alencar Castello Branco, o primeiro d alinhagem verde-oliva que governaria o paí spor duas décadas .

Os donos de jornais mandaram às fa-vas os escrúpulos de consciência . mas étambém forçoso lembrar que não estive-ram sozinhos naquela aventura . Consta queaté o deputado Ulysses Guimarães, o futu-ro Senhor Diretas, não só apoiou a deposi -ção de Jango como ainda ajudou a fazer

uma minuta da primeiro Ato Institucional ,que saiu bem mais severa que o texto ado-tado pelos militares . Escreveu obrasilianista Thomas Skidmore, em seu li-vro De Castelo a Tancredo, sobre o apoioda sociedade civil ao golpe : "Os advoga -dos constituíram outra força ( . . .) através doseu órgão de classe, a Ordem dos Advoga-dos do Brasil, cujo Conselho Federal ba-teu palmas à deposição de João Goulart .Foi uma posição arriscada, dada a irregu-laridade da transição de Goulart par aMazzilli, mas no início de 1964 a classe s ealarmara tanto com a ameaça aoconstitucionalismo vinda da esquerda qu efaria vistas grossas para os defeitos legai sda sucessão" .

"Nova ordem" - Uma parcela expres-siva da opinião pública estava saturada dasoscilações do presidente João Goulart, vice

IMPRENSA - MARÇO 1994 51

: ir'

tel

inábil e despreparado para o poder, queassumiu a presidência da República nu mmomento dramático, a renúncia de Jâni oQuadros em 1961 . João Goulart, herdeiropolítico do getulismo, acenava ao país comreformas de base que amedrontavam a di -reita, e como jamais se concretizassem, ir -ritavam também seus amigos da esquerda ,Leonel Brizola à frente . O presidente foiincapaz de costurar uma política de alian -ças que o sustentasse no poder e, às véspe -ras de sua queda, ensaiou um confronto ,aliando-se aos radicais de esquerda . En -quanto isso, a inflação subia e a class emédia arrancava os cabelos . Os jornais ,como tinha de ser, disparavam farpas con-tra o governo . "Ninguém queria uma dita -dura . O problema era Jango", lembra o jor -nalista Fernando Pedreira, que à época d ogolpe chefiava a sucursal de O Estado deS. Paulo em Brasília .

Já os barões da imprensa conspirava mpela queda de Jango, apostando na solu-ção militar. O empresário Julio de Mesquit aFilho, do grupo Estado, em parceria co moutros homens de negócio, organizava a sações do Instituto de Pesquisas e EstudosSociais, o Ipes . A entidade foi criada e m1961 com o objetivo de "mobilizar o sen -timento público democrático contra os es -querdistas", que rodeavam João Goulart ."O Ipes fazia propaganda contra o gover-no na tentativa de mobilizar a populaçãocontra Jango", afirma Maria Aparecid aAquino, professora de História Contempo -rânea da USP, que fez seu mestrado sobr e"censura na imprensa" e agora conclui odoutorado sobre "o comportamento da im -prensa em relação ao Estado totalitário" .

Julio de Mesquita Filho não era o úni-co homem da imprensa nessa pregação .Entre os nomes que aparecem nas listas de

associados do Ipes, a historiadora MariaAparecida cita Edmundo Monteiro, dire -tor geral dos Diários Associados, OtávioFrias, da Folha de S . Paulo, Paulo Barbo -sa Lessa, da TV Record, José Carlos Bar-bosa Moreira e Wilson Figueiredo, do Jor-nal do Brasil, e Hélio Fernandes, daTribuna da Imprensa . Os interesses do Ipe snão se limitavam a derrubar o presidente .Queriam uma "nova ordem" . "Esse grup ocriou um `governo marginal', com plano spara a reforma do ensino, os investimen -

O editorial de O Globofestejou o "heroísmo das

Forças Armadas, quelivrou o Brasil de um

governo irresponsável". Aedição circulou com quas e

um dia de atraso, poissofreu embargo demilitares anti-golpe

tos estrangeiros e a classe trabalhadora" ,escreveu o brasilianista Thomas Skidmore .

"Sorbonne" - O jornalista Cláudi oAbramo, morto em 1987, lembra em se ulivro A regra do jogo o ambiente deradicalização que dominava a redação deO Estado de S. Paulo nos anos do gover -no Goulart :

"Todo o noticiário do Estado passou aser controlado e revisto, refeito e arranja -do, embora conservasse basicamente o spadrões gerais de equanimidade . A partirdesse ponto, a equipe do jornal se dividiuentre esquerdistas e direitistas ; a crise qu eo país atravessava se instalou na redação .(. . .) De um lado a direita, alguns subal-ternos, uma gente muito secundária, mui -to sem importância, mas com uma gran -de capacidade de intriga; de outro opessoal da esquerda, contra os quais ha -via uma pressão muito grande . E a es-querda facilitava muito, provocava ( . . . )Também havia uma pressão muito fort econtra mim por parte dos oficiais doExército que estavam conspirando co mos Mesquita " . O trotskista Abramo dei-xou a direção do Estado em 1962 .

É importante lembrar que, no Brasil d adécada de 60, amplos setores da política eda opinião pública viam com certa natura-lidade a intervenção militar no processopolítico . Os militares depuseram Vargas em1945 e teriam-no deposto novamente e m1954 se o presidente não tivesse se suici -dado. Garantiram a posse de Juscelino e m1956 (depois do contragolpe preventivo do

A Folha, no dia 1 ° de abril,não emitiu opiniões, apenasrelatou os acontecimentos epublicou manifesto militar:"Nosso objetivo será rompe ro cerco do comunismo que

ora dissolve a autoridade dogoverno da República".

agUrAlrQMAZZ¶WNA PRESIDENCIAr :` : zz2'

NameMs•0a 71 . .

FOLHA DE S. PAULO n +++nr o- .+ . .wU. r .-r

II /rl +:A

ADEMAR: i ESTADOS

SUBLEVAM-SE PARA

DERRUBAR GOULART

0 rosto civilCarlos Lacerda, governado rda Guanabara, congratula -se com o novo presidente

Castello Branco, em abril de1964: líder civil do golpe ,Lacerda foi jogado paraescanteio pela linha dura

militar, rompeu com ogoverno, tentou articula rsua candidatura civil àsucessão de 1967, fez as

pazes com os rivaisJuscelino e Jânio, e acabou

cassado pelo 1 5

0 que disseram os jornais nos . . ,

52 IMPRENSA - MARÇO 1994

marechal Lott) e tentaram, em 1961, evi-tar a posse de Jango . Só a aceitaram de-pois que o Congresso esvaziou os podere sdo presidente e adotou o parlamentarismo .Para muitas cabeças coroadas da imprens ae do empresariado, e para a sociedade ci-vil em geral, o golpe de 1964 seria apena soutra dessas contingências . Dessa vez ,contudo, havia uma novidade . A frente dogolpe estava o general Castello Branco ,cujo grupo, conhecido como "Sorbonne "pretendia apenas uma rápida intervençãomilitar, devolvendo logo o país à democra-cia, ainda que depois do expurgo de radi-cais de esquerda e sindicalistas . A"Sorbonne" levava este nome porque reu-nia os cérebros da Escola Superior de Guer-ra, entre os quais os generais Golbery doCouto e Silva e Ernesto Geisel . MasCastello não estava sozinho. Na sua reta -guarda havia outro grupo, a linha dura mi -litar, capitaneada pelo general Arthur daCosta e Silva, ministro do Exército donovo governo . Do embate entre as duaslinhas se definiria a sorte do novo regi -me . A divisão era evidente e alarmante .Quem apoiou o golpe, sabia que a apost aera no escuro .

Considerados todos os atenuantes e cir -cunstâncias, a postura dos donos de jornalnaquela época mantém um rançoliberticida, que se choca frontalmente co mo discurso democrata que todos, sem ex-ceção, desfiam hoje . Na opinião do vete-rano jornalista carioca Carlos Heitor Cony,alguns jornais como O Globo e O Estadode S . Paulo não se importavam se a dita-

Na época, as primeiraspáginas do Estadoeram reservadas a

notícias internacionais .Só nas páginas

internas do dia 1° deabril é que o jornal

publicou sua coberturasobre o golpe.

Outra razão de vive r

Ojornalista SamuelWainer parte para o exílio,depois do golpe: diretorda Ultima Hora, único

diário a defender ogoverno Jango, Wainerasilou-se na Embaixada

do Chile, no Rio ,enquanto a redação de

seu jornal era invadida edepredada po r

simpatizantes do golpe.Dias depois, consegui u

deixar o Brasil.

dura viesse, ainda que tenham sofrido coma censura. "Se não houvesse pressão dasociedade pela queda do regime, eles es-tariam apoiando os militares até hoje" ,acredita .

"Brasil dos Estados Unidos" -Conyé uma figura insuspeitada para falar sobreo comportamento da imprensa à época d ogolpe . Em março de 1964, ele er aeditorialista do jornal Correio da Manhã ,um dos que faziam coro pela deposição d e

Tribuna da Imprensa, emeditorial no dia 2 de abril ,

fez duras críticas aogoverno deposto . Jango e

seus aliados seria m"canalhas e covardes qu efingiram-se de machões,mas saíram correndo aos

primeiros tiros".

Jango . No dia 1° de abril, João Goulart fo iacordado no Palácio das Laranjeiras co mo editorial do Correio da Manhã, escritoporCony e intitulado Basta . "Até que pon-to o presidente da República abusará da pa-ciência da nação?", indagava o editorial .Consta que Jango , depois de lê-lo, ligoupara seu amigo Samuel Wainer, jornalistae diretor do jornal Ultima Hora: "O queestá acontecendo com o Correio, Samuel?Procura ver qual é a profundidade desteeditorial" . Era tarde demais . Unidades re -voltadas do Exército estavam marchandorumo ao Rio de Janeiro, para depô-lo . Diasdepois, Wainer pediu asilo na Embaixadado Chile e Jango fugiu para o Uruguai .

Mas voltemos ao jornalista Carlos Hei -tor Cony . Ele estava entre os que apoia-vam a queda de Goulart . Pois mudou radi-calmente de idéia - e seus editoriais, de tom- quando percebeu que, daquela vez, o mo-vimento militar tinha intenções diferente sdas de outras intervenções . "Pouco depoi sdo golpe, ficou claro que aquilo foi um aquartelada", lembra Cony, referindo-se aoAto Institucional decretado a 9 de abril, qu eestabeleceu a eleição direta do president eda República e deu-lhe poderes para de-cretar o estado de sítio e suspender as ga-rantias constitucionais .

E curioso : depois do golpe, houve cen-sura direta ao rádio e à televisão, mas não àimprensa escrita. Não precisava . A maiori ados jornais colaborava e uma minoria . . . bem ,era uma minoria . O único grande jornaljanguista, a Ultima Hora, do Rio, foi invadi -do e depredado. O Correio da Manhã foi oprimeiro a levantar a voz contra o novo regi -me, denunciando a violência e a tortura no squartéis do Nordeste e nos porões do DOPSe do Centro de Informação da Marinha ,Cenimar, no Rio de Janeiro, nos primeiros

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Principais chefes estao nomeadosCostas Silva

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Regi°o Milita r

DEMOCRATAS ASSOME M

,COMANDOS MILITARES

. . . dias que se seguiram ao golp e

IMPRENSA - MARÇO 1994 53

dias que se seguiram ao golpe . A postura dojornal tornou-o alvo de pressões . Cony de-mitiu-se depois da publicação de uma crôni-ca em que criticava o Ato Institucional n° 2 ,a 27 de outubro de 1965 . Cony mencionavaquem em seu artigo I, o Ato deveria determi -nar: "A partir da publicação deste Ato, os Es-tados Unidos do Brasil passam a denominar -se Brasil dos Estados Unidos" . O Correio daManhã não durou muito depois disso . Co-meçou a perder anunciantes e, embora esgo-tasse edições nas bancas, debilitou-se finan-ceiramente . Foi compelido a aceitar aintervenção dos credores na redação, qu ealiviaram a linha editorial do jornal . Deixoude circular no início dos anos 70 .

Inflação em baixa - Cony e o Correioda Manhã foram exceções, é verdade, masaté hoje são apontados como uma referênci aética naqueles tempos difíceis . A maioria dosjornais - entre eles a hoje combativa Folhade S. Paulo - tiveram uma reação tímida di -ante da escalada da intervenção militar . AFolha, em 1964, comemorava um avanço d esua posição no mercado, quando se tornou ojornal mais vendido na cidade de São Paulo .

Festa na redaçãoJulio de Mesquita Filhocomemorou o golpe com

militares, na redação de OEstado de S . Paulo (esq), efez uma festa pública pela

vitória do movimento no dia9 de abril (abaixo) :

resultado de dois anos deconspiração pela deposição

do presidente

Não queria confusão com os militares . A pri -meira vez que criticou os novos donos dopoder foi quando teve início a cassação deprofessores da Universidade de São Paulo .A caça às bruxas na academia irritou profun -damente o jornalista José Reis, então direto rde redação da Folha e tido como o patronodo jornalismo científico no Brasil . Daí, o seditoriais críticos. Mas quando o regime mos-trou definitivamente seus propósitos e lan-çou o AI 2, a Folha calou-se . Um trecho dolivro História da Folha de S. Paulo, escritopelos historiadores Carlos Guilherme Motae Maria Helena Capelato, lembra o que acon -teceu nessa fase do jornal :

"A independência relativa, a postura li-beral e democrática da Folha sofrerá perdade ímpeto neste período, apesar do brilho d ejornalistas como Hermano Alves eDallembert Jacoud ( . . .) No geral, entretan-to, seja pelos editoriais, pelos comentaris-tas, pelo tipo de reportagem ou pela sinciativas culturais, a empresa não arrisca -rá além dos marcos de um tímido reformismoliberal,( . . .) adotando a sobriedade ou o si-lêncio tático quanto aos destemperos da nov aordem militar. ( . . .) Neste período, entretando,

apesar das adversidades políticas ( . . .) e eco-nômicas ( . . .), e apesar da disputa de merca -do com outros periódicos (como o nascentee ágil Jornal da Tarde, de 1966), a empres aFolha da Manhã avançara substancialmen-te ".

A ascensão da Folha e a queda do Cor-reio da Manhã mostram que, do ponto devista empresarial, foi uma saíd acompensadora apoiar o regime, ainda qu eveladamente, nos primeiros anos que suce-deram o golpe . Sem falar que o govern oCastello Branco trouxe certa estabilidade n aeconomia . A política monetária arquitetad apelos ministros Octávio Gouvêia de Bulhõe se Roberto Campos baixou a inflação no paí sde 86% em 1964, para 30% em 1965, e 15 %em 1966 . Foi nessa época, também, que aRede Globo pavimentou seu caminho par atornar-se o portento empresarial que é hoje .As memórias do ex-diretor da Globo, Walte rClark, reservam um bom espaço sobre o re-lacionamento entre a Globo e os militares,que renderam frutos como o programa pro -regime Amaral Netto, o Repórter .

"Deserto do Saara" - Em dezembro de1968, veio o AI 5 - sinônimo, na imprensa,de censura . Claro que os donos de jornai snão gostaram do cerceamento à liberdade .Muitos protestaram contra isso e entraram e matrito com os quartéis, o que não revogou aaliança estratégica entre empresários da co-municação e os militares, forjada 4 anos an -tes . O Al 5 resultou na prisão de jornalistasde prestígio, como o colunista Carlo sCastello Branco, do Jornal do Brasil. Pouc otempo depois, os linha-dura mandariam pren -der Alberto Dines, então editor do JB.

Não serve como exemplo, mas há pel omenos o caso de um dono de jornal que em-barcou na aventura golpista - e se deu muit omal . E o jornalista Carlos Lacerda, dono daTribuna da Imprensa, e governador daGuanabara no início dos anos 60 . Lacerdafoi um dos líderes civis do golpe e queri acandidatar-se a presidente da república naseleições de 1965 (que acabaram não haven -do), com apoio, é claro, dos militares . Fo ijogado para escanteio pela linha dura militare terminou cassado pelo AI 5 em 1968, de -pois de ensaiar uma fracassada aliança co mseus arquiinimigos Juscelino e Jango, e mnome da redemocratização do país . Carlo sLacerda vingou-se do ex-aliado genera lCastello Branco, ao mandar publicar um ran -coroso necrológio do já ex-presidente, qu emorreu num acidente de avião em julho d e1967 : "A humanidade pouco perdeu, ou me-lhor, nada perdeu com a morte de Castell oBranco ( . . .) um homem frio, insensível, vin-gativo, implacável, desumano, calculista, cru -el, frustrado ( . . .) de coração semelhante aodeserto do Saara" . O insulto resultou na pri-são do diretor do jornal, Hélio Fernandes .Carlos Lacerda morreu em 1977, afastado d apolítica e do jornalismo .

zó<

X54 IMPRENSA - MARÇO 1994

Ao jornalista que, com a busc ada verdade, contribui para o

aprimoramento da informação -essencial ao desenvolvimento d e

uma sociedade livre e aberta -nossa homenagem pelo dia d e

hoje e por todos os dias .

METAL LEV ET E C N O L O G I A E Q U A L I D A D E

Um dia decão no jorna l

"A apuração estava ótima, masa edição de O Globo foi embargada"

Em março de1964, o clim aera daquele sde vaca nã oconhecer be-

zerro . Porque, de um lado,as esquerdas celebravamnão apenas a tomada d opoder, onde já estavam comJoão Goulart, mas a mudan -ça completa das estruturasinstitucionais, que previampara o dia seguinte . Estávamos, para as es-querdas, a um passo da implantação de re -formas de base profundas que marcari-am o estabelecimento do socialismo n oBrasil . Um socialismo sindicalista, dife -rente de quantos se conheciam no plane -ta . A revolta dos Marinheiros, na Sexta -feira Santa, dia 21, parecia a comprovaçã ode tudo .

Como editor-político de O Globo, n oRio, cabia-me também fazer reportagens .Aquela eletrizou . Impedidos de se reu-nir nos espaços do Arsenal da Marinha ,marinheiros e fuzileiros navais lideradospelo cabo Anselmo refugiaram-se no pa -lácio dos Metalúrgicos, em São Cristó-vão, declarando-se rebelados até que oministro da Marinha reconhecesse a as-sociação deles . Um menino de 23 anosde idade, dos mais primorosos oradoresde massa da época . Fascinante, enquan-to ninguém sabia, ainda, que era u magente provocador, pago pela CIA e pel ogeneral Golbery de Couto e Silva par aprecipitar a crise .

O ministro mandou um contingent ede fuzileiros navais para invadir a sede

do sindicato, retirar osrebelados e levá-Ios pre-sos para as dependênciasnavais . A tropa cercou oedifício, de três andares ,enquanto nas janelas o srebelados entoavam ohino nacional e fazia mapelos aos companheiro spara que não os atacas -sem. Um suspense dosdiabos quando os ofici -

ais deram ordem de avançar . Só que nin -guém avançou. Tenentes exasperado scom a quebra da autoridade empunhava mpistolas e ameaçavam atirar nos própri-os fuzileiros . Foi quando o primeiro, u mcrioulo alto e forte, deu um passo à fren -te, arremessando capacete, fuzil ,alabartes e demais acessórios no chão .Em seguida, avançou, mas para aderir ao scompanheiros sitiados . O povo postad oem volta aplaudiu delirantemente . Amarinheirada, lá de cima, mais ainda . De-pois, o segundo, o terceiro e o quarto .Dez, vinte, trinta ou mais . Para a repú-blica socialista ou sindicalista, era u mnovo Kronstad . O restante da tropa reti -rou-se, sob a humilhação dos oficiais eas vaias dos populares .

O segundo episódio tinha acontecid odias antes, com o comício da Central d oBrasil . Lá, sob organização do Comand oGeral dos Trabalhadores, a 13 de março,o presidente Goulart, ministros, parla-mentares e líderes de esquerda haviamencenado o comício das reformas, sob aproteção da Polícia do Exército . Cadaorador que subia ao palanque obrigava -

se a ser mais radical do que o anterior.Assim falaram Dante Pelacani ,Clodismith Rianni, Hercules Correia ,pelos sindicalistas, Miguel Arraes, Seixa sDória e Badger Silveira, pelos governa-dores, Leonel Brizola, pelos deputados ,entre outros . Pregou-se abertamente ofechamento do Congresso, a superaçã odo Legislativo em favor da imediata ado -ção de reformas . Jango foi o último a dis -cursar, é claro . Levou a mulher, Mari aTeresa, que a todos encantou pela bele-za. Foi o mais emocionado e contunden-te pronunciamento do presidente . Nopróprio palanque ele assinou decretos es -tatizando as refinarias particulares de pe-tróleo e desapropriando, para fins d ereforma agrária, terras localizadas na smargens de rodovias e ferrovias federais .Ia ser "na marra" a redenção nacional ,como ele dizia .

O diabo (para os socialistas) é que d ooutro lado tanto do local do comício, n aCentral do Brasil, quanto do processo po -lítico-institucional, estavam militares ,empresários e profissionais liberais, j áem completo e definitivo estágio de cons-piração. Faltava a gota d'água, acon-tecida na noite de 31 de março, quand omais uma vez o presidente discursou ,agora na sede do Automóvel Clube, n arua do Passeio, para uma platéia de sar-gentos e suboficiais do Exército . Foraaconselhado a não ir até por Tancred o

por Carlos Chagas

56 IMPRENSA - MARÇO 1994

!:7.,wf ,

O presidente João Goulart (esq .)e a Marcha da Família, com Deus ,pela Liberdade (dir. ), em 25 de mar-ço, que pedia sua deposição: o gol-pe foi deflagrado quando o presiden-te fez um discurso, no dia 31, parauma platéia de sargentos esuboficiais do Exército . Fora acon-selhado a não ir por Tancredo Ne-ves. Estaria deposto caso quebras -se o último elo na hierarquia militar.Marinha e Aeronáutica, pela quasetotalidade dos almirantes e brigadei-ros, encontravam-se rebelados. Seperdesse o Exército, seria o fim . MasJango seguiu o seu destino . Foi, fa-lou e atropelou a hierarquia.

pr A gota d'água

Neves, seu líder na Câmara . Estaria de-posto caso quebrasse o último elo na hie -rarquia militar. Marinha e Aeronáutica ,pela quase totalidade dos almirantes ebrigadeiros, encontravam-se rebelado sem assembléias permanentes nos Clube sNaval e da Aeronáutica . Se perdesse oexército, seria o fim, mas o Jango segui uo seu destino . Foi, falou e atropelou ahierarquia. "Suboficiais, sargentos, cabose praças também eram povo e não deve -riam submeter-se à pressão das elites . Ti -nham o direito de lutar por melhore scondições de vida, até de candidatar-se apostos eletivos segundo as normas qu ebeneficiavam oficiais-candidatos . "

O resto resumiu-se à seqüência d ogolpe . Naquela noite o general Mourã oFilho coloca suas tropas em ordem-de-marcha, em Juiz de Fora, descendo a ser -ra de Petrópolis para atacar o Rio deJaneiro, onde se encontrava o presiden-te . Mesmo tendo se precipitado e atémandado retornar pelos conspiradores ,Mourão foi em frente . O resto caiu com oum castelo de cartas . Os comandos iamaderindo e Jango, sozinho, buscou refú-gio em Brasília, primeiro, e no Rio Gran -de, depois, sem sucesso . Partiu para oexílio .

Na redação do Globo, na manhã de1° de abril, preparávamos com antecedên -cia a edição do dia seguinte, que seri adaquelas terríveis . Ignorava-se ainda a

"Na hora do golpe,tudo eram dúvidas,

apreensões e vibração "

sorte das armas . Tropas legalistas havi-am subido a serra para enfrentar Mourã oFilho na divisa dos Estados de Minas edo Rio de Janeiro . Goulart recusara-se adeixar que aviões da Aeronáutica bom-bardeassem os revoltosos . Não queri aresponsabilizar-se pelo derramamento d esangue de civis . O general Kruel, em Sã oPaulo, ainda não se decidira de que lad oficar : com a oficialidade que o pressio-nava para aderir à revolta ou com o com -padre presidente, padrinho de Joã oVicente Goulart .

Tudo eram dúvidas, apreensões e vi-bração jornalísticas, sem juízos de valo rsobre o que acontecia . Para a minha ge -ração, era o primeiro golpe armado qu ecobríamos . Foi quando chegou um con-tingente de fuzileiros navais, chefiado spelo comandante da corporação, o almi -rante Aragão . Naqueles dias, a maior au -toridade presente no jornal era osecretário de redação, Lucílio de Castro ,reconhecidamente um homem de esquer-da, jornalista de excepcional valor. Quan -

do Aragão determinou que O Globo nãosairia no dia seguinte, pois era simpátic oao golpe, Lucílio calou . No íntimo, esta-va gostando, mas jamais lhe caberia ade-rir. Aceitou a ordem, e um pelotão d efuzileiros permaneceu nas oficinas, paraimpedir tentativas de botar o jornal n arua . Pouco depois o que comandava otenente pediu para falar com um diretoradministrativo. Disse não ter nada comaquilo, não concordar com a proibição ,mas com a revolta . Se quisessem, jorna -listas gráficos poderiam rodar a edição .Por cautela, e consultado Roberto Mari-nho, decidiu-se que o jornal não sairia .Já era noite alta quando fomos para casa ,frustrados . Matérias, tínhamos aos mon-tes, colhidas pelos repórteres, os corres-pondentes e as agências, bastantes par aencher pelo menos duas edições, aind aque sem conclusão alguma . Não sabía-mos, àquela hora, quem venceria .

No dia seguinte, domingo, todos denovo na redação, não havia mais dúvida .A classe média, no Rio, confraternizav acom o governador Carlos Lacerda e co mos quartéis, todos rebelados . No resto d opaís foi a mesma coisa . O golpe estavavitorioso e O Globo voltou a circular. S óque sem o Lucílio de Castro, aposentad oa partir de então . . .

Carlos Chagas é diretor de jornalismo da Rede Man-chete, em Brasíli a

IMPRENSA - MARÇO 1994 57

Euforia ,depois a ressaca"Invadiram e arrebentaram a redação de

Última Hora no Rio de Janeiro "

aquelesdias queantece -deram ogolp e

Samuel Wainer assu-mira diretamente o co -mando da UltimaHora, deixando o ter-ceiro andar, onde fi-cava a diretoria, e s einstalando no segun-do, onde funcionav aa redação . Os óculo splantados sobre oscabelos grisalhos -sua marca - escancarando os olhos azuis .Samuel devassava as notícias mais im-portantes da cobertura política, aciona-va os colunistas - Berilo Dantas . no Rio ,Flávio Tavares, em Brasília, Batista d ePaula . setorista da área militar - e dita-va o tom do noticiário e da sempre vi-brante manchete de primeira página .

Já há algum tempo, Samuel comanda-va a linha editorial do jornal a certa dis -tância . Mais do que o empresário qu emontara a primeira rede nacional de jor -nais com o mesmo logotipo, a marca Ul-tima Hora vazada em branco sobre o fun-do azul, Samuel se tornara um dos homen smais influentes da República, como con -selheiro político direto do Presidente Joã oGoulart . A redação estava entregue a doi sde seus fiéis companheiros : MoacirWerneck de Castro, que com ele traba-lhava em Diretrizes, nos anos 40, e Jor-ge Miranda Jordão, uma das crias de UH

de São Paulo, ced oalçado à sede nacio-nal, no Rio .

Mas aqueles dia sexigiam um enga-jamento total deSamuel . Aquele mar-ço que se esvaía tive-ra 20 dias que abala -ram o Brasil . No dia13, o Comício das Re -formas, na Central d oBrasil, com centena sde milhares de pesso-as a expressar apoi oàs reformas de bas e

que o presidente João Goulart preconiza -va . Em seguida, a rebelião dos marinhei -ros e fuzileiros navais, reunidos no Sin -dicato dos Metalúrgicos, num bairro deperiferia, onde - parecia - ancorara o nos-so encouraçado Potemkin . No dia 27, n oAutomóvel Clube, a assembléia dos sar -gentos das Forças Armadas, com a pre-sença de Goulart (Jango, como o povo ochamava), que assim oferecia aosgolpistas o pretexto para a irrupção d omovimento pela derrubada do Presiden -te . A hierarquia das Forças Armadas, di -ziam, fora gravemente vulnerada pelo se ucomandante-em-chefe .

Na redação, nós trabalhávamos febril -mente, vivendo intensamente cada acon -tecimento . Era iminente a ruptur ainstitucional, com o esmagamento do sgolpistas, para sempre - pensávamos .Quando o general Mourão Filho lançou ,em Minas, seu manifesto pela deposição

do Presidente no dia 31 . prevíamos qu ehaveria o enfrentamento decisivo, com adelimitação dos dois campos e a vitóri adas forças renovadoras e a abertura do ca-minho para as reformas de base, na lei o una marra, como pregavam as faixas no co-mício da Central do Brasil - a reform aagrária, a reforma urbana, a regulamenta-ção do capital estrangeiro .

Por volta das 11 :30h da noite desse di aliguei para a Sucursal do Rio da Folha deS .Paulo, para saber das notícias da movi-mentação em São Paulo, cujo governador ,Adehmar de Barros, integrava o esquem ado golpe . Do outro lado da linha .exultante, Sérgio Cabral informou que ogeneral Amaury Kruel, comandante do I IExército, sediado em São Paulo, havi aaderido ao golpe com um manifesto qu epoupava a pessoa do Presidente, de que mera amigo, mas o acusava de acumpliciadocom os comunistas e se associava ao mo -vimento pela sua derrubada . A tomada d eposição de Kruel dava os contornos defi -nitivos aos campos em confronto . Quan-do dei a notícia à redação, não foi meno ra euforia . Vamos derrotá-lo todos juntos ,para sempre - imaginávamos .

Menos de 24 horas depois, dissipa-vam-se os nossos sonhos . Jango declina -

por Mauricio Azédo

S!i IMPRENSA - MARÇO 1994

rva do enfrentamento, não s edispunha sequer à resistência ,que Leonel Brizola, ex-gover-nador do Rio Grande do Sul edeputado federal pelo Rio deJaneiro, começava a montar ,com o apoio do Comandantedo II .Exército, genera lLadário Pereira Teles . A idado Presidente para Porto Ale-gre, onde Brizola o acolhia ,era apenas a ponte para o exí-lio de que Jango nãoretornaria vivo .

Na noite de 1° de abril, UHpagava o caro preço de su aadesão a Jango e às reformas .Depois de atear fogo à sede d aUnião Nacional dos Estudan-tes (UNE), na Praia doFlamengo, 132, os civis vinculados àorientação do governador do então Esta -do da Guanabara, Carlos Lacerda, um do sideólogos do golpe, partiram para o ajus -te de contas com a Ultima Hora, deSamuel, inimigo mortal de Lacerda . Se macesso às oficinas, que pretendia mempastelar mas foram obstados por sóli-das grades de aço, os golpistas subiram àredação, no segundo andar do prédio da

Rua Sotero dos Reis, 62 - uma ruazinh aa dez minutos do centro da cidade -, e ar -rebentaram o que encontraram pela fren-te : máquinas de escrever, telefones, arqui -vos, armários .

Desde o começo da tarde, quando sedesenhou a derrocada do Presidente, co msua partida para Porto Alegre, ficara cla -ro que não havia condições para a resis-tência e, também, que UH seria um dos

primeiros alvos da fúri adireitista, insuflada pelo go-vernador Lacerda e alguns deseus correligionários, como oapresentador de televisão Flá-vio Cavalcanti . A essa altura ,o próprio Samuel já estava asi -lado na Embaixada do Urugua ino Rio . Repórteres, redatore se o pessoal da oficina fora mavisados de que o jornal nã ocircularia no dia seguinte e queninguém deveria aparecer ne mmesmo nas imediações da Ru aSotero dos Reis .

Das previsões daquele sdias tempestuosos, apenas estanão falhou . No bando que as -saltou o jornal, informara mdepois os vizinhos, estava o

próprio Flávio Cavalcanti, que não per-doava a UH o apelido que um dos cronis -tas do jornal, Antônio Maria, lhe impôs .Vendo-o na televisão a fazer biquinho co ma boca, Maria foi implacável, chamando -o de Boca Júnior. Entre outros feitos, ogolpe salvou Flávio do apelido .

Maurício Azêdo é editor especial do Jornal doCommércio, do Rio de Janeiro

"Na redação, trabalhávamo s

febrilmente. Era iminente

o esmagamento dos

golpistas -pensávamos.

O sonho acabou

24 horas depois "

O dia seguinte

O novo presidente Castello

Branco, com seu ministro do

Exército Costa e Silva (esq.) ,

e a polícia na porta da TV

Excelsior, três dias após a

queda de Jango (dir.): os

primeiros sinais do que se

tornaria o novo regime

começaram a surgir. Não

houve censura à imprens a

escrita, mas os poucos

jornais críticos ao golpe

foram alvo de repressão e

ameaças. Um grupo invadiu e

destruiu a redação de ÚltimaHora, no Rio .

I\1PRENSA - MARÇO 1994

Memória

CiIu2EIIiO

4%.

Edição de 13 de abril de 1968 : morte de Edson Luí s

0 sangue domártir na capa

A manchete de O Cruzeiro que desafiou a ditadura

por Mario de Moraes

Naquela semana, quando a re-vista O Cruzeiro foi às ban-cas, com a data de 13 de abri lde 1968, os leitores levaramum choque : na capa, a foto de

um morto ocupando dois terços da página ;dentro do caixão coberto de flores apareciapraticamente só o rosto do morto sendo aca-riciado por uma jovem . Título : "Sangue eódio no mundo sem paz" . A legenda expli-cava: "Edson Luís, 18 anos, brasileiro, es-tudante, desarmado. Edson Luís está mor-to . Um tiro no peito . No coração . EdsonLuís, um menino . Quase um menino . Umtiro no peito . Quase um menino . Edson Luís .Ele podia ser seu filho" .

Eu escolhi a foto ; Alfredo BelmontPessoa fez a legenda . O Cruzeiro desapa -receu das bancas em questão de horas .Toda a edição esgotada. Era a primeira ve zque um órgão de imprensa exibia para opúblico uma vítima da ditadura militar.

A frase "Ele podia ser seu filho" cau-sou um violento impacto. E passou a se rusada em faixas pintadas pelos estudan-tes nas suas manifestações de protestocontra o regime militar.

Tiro no coração - Para quem não s erecorda, a história tinha começado no dia28 de março daquele ano, com manifesta -ções de protesto dos estudantes do Rio d eJaneiro contra a demora da conclusão dasobras do restaurante Calabouço, no cen-tro da cidade . Com ordens expressas d eBrasília para conter qualquer tipo de ma -nifestação, o superintendente da Políci aExecutiva da Guanabara, general Osval-do Niemeyer Lisboa, enviou um batalhãode choque da PM para o local . O confron -to se deu exatamente em frente ao restau -rante : usando de muita violência, os poli -ciais encurralaram os estudantes dentro d oedifício . Os estudantes defendiam-se com

as armas de que dispunham : pedras . Al -guns policiais sacaram seus revólveres efizeram disparos . Um tiro acertou o estu-dante Édson Luís de Lima Souto no cora-ção . Um comerciário que não tinha nad aa ver com o conflito também acabou feri -do . Eram 18 :30 h daquela tarde .

Os colegas carregaram o corpo de Ed -son Luís até a Santa Casa de Misericórdia,que ficava próxima, mas o rapaz chegou l ásem vida. Decidiram, então, levar o corp opara a Assembléia Legislativa, quando u moutro corpo, de um estudante não identifi -cado, apareceu . Carregando as duas víti-mas, os estudantes marcharam contra o spoliciais e invadiram o prédio da Assem-bléia . Os dois corpos foram colocados so-bre uma mesa e o então deputado Jami lHaddad, que é médico, verificou surpres oque um deles estava vivo - apenas havi aentrado em estado de choque .

Autoridades tentaram levar o corp ode Edson Luís para o IML, mas os lídere sestudantes não permitiram . A decisão foratomada ali mesmo : Edson Luís só sairi ada Assembléia para o cemitério . E assimfoi feito . A autópsia acabou sendo reali-zada no Serviço Médico da Assembléia .

A noite, o cadáver de Edson Luís, atéentão um humilde e desconhecido estu-dante vindo do Pará, já colocado no cai-xão, transformara-se num símbolo da re-sistência contra a ditadura . A divulgaçãoda notícia comoveu o país e iniciou-s euma peregrinação de pessoas diante doesquife . Nas ruas, os estudantes continu-avam protestando . A camisa ensangüen-tada de Edson Luís foi desfraldada com obandeira de luta ; na antiga sede da UNEera queimada a bandeira americana e so-bre o caixão do jovem assassinado fora mcolocadas bandejas de comida do restau-rante Calabouço .

Muitas das pessoas que foram ao ve-lório deixaram sua contribuição em di-nheiro para o enterro . Do Estado, os estu-dantes não aceitaram nada .

"Bala mata a fome?" - O governa -dor da Guanabara, Negrão de Lima, de-clarando-se "pesaroso com o aconteci -mento", ordenou o recolhimento da stropas aos quartéis Ao mesmo tempo man -dou libertar os estudantes presos e numanota oficial, garantia que seria aberto um"rigoroso inquérito", solicitava uma ver-ba de 80 .000 cruzeiros novos para as obrasdo Calabouço, acrescentando ainda que ocortejo do sepultamento não teria acom-panhamento policial .

O caixão, carregado por representan-tes de todas as faculdades, saiu da Assem-bléia, na Praça Floriano, passou pela Ru ada Lapa, Avenida Beira-Mar, Praia d oFlamengo, Marquês de Abrantes, Praia d oBotafogo e Rua General Polidoro, até oCemitério São João Batista . Pétalas de flo-

IMPRENSA - MARÇO 1994

Manifestação na UNE: fogo na bandeira american a

res caíam dos edifícios sobre o cortejo ,calculado em cerca de 20 .000 pessoas . A sfaixas carregadas pelos estudantes tradu -ziam indignação: "Já começaram as co-memorações do 31 de março" ; "Bala mataa fome?" ; "Os velhos no poder, os joven sno caixão" .

O assassinato repercutiu em todo opaís . Numa reação em cadeia, pipocarammanifestações de toda ordem contra o re-gime, seguindo-se um período de turbu-lência com passeatas, comícios, greves enovos choques envolvendo policiais e es -tudantes . Alguns protestos ganharamformas bem sutis, como os cinemas do Ri oque, naquela semana, colocaram os se-guintes filmes em cartaz : "Coração deluto", "A noite dos generais" e "A quei-ma-roupa" .

A dança do general - Nesses dia sagitados, parecendo alheio aos aconteci -mentos, o presidente Costa e Silva go-vernava do Rio Grande do Sul . E o queconta o jornalista Zuenir Ventura no se ulivro 1968, o ano que não terminou . Eisum dos trechos relatados por Zuenir n olivro : "No dia seguinte ao da missa deEdson Luís, o presidente Costa e Silv aainda permanecia no Rio Grande do Sul ,para onde deslocara seu governo . Mai sprecisamente na noite de sexta-feira el ese encontrava no Clube Comercial dePelotas . O salão estava vazio quando aorquestra começou a tocar Carolina . Acanção, um dos sucessos do terceiro dis-co que Chico Buarque acabava de lan-çar, não era propriamente o que se pode -ria chamar de música dançante . E, com ose sabe, a melancólica história de um amoça de olhos fundos, que guardam mui -ta dor, aquela moça que se recusa a ver otempo passar pela janela . Nada disso, po -rém, impediu que o presidente pegass e

ELIIIRREU

Página de O Cruzeiro: tiragem esgotada

dona Iolanda pela mão e abrisse anima-damente o baile" .

O esquadrão de ouro - Antes de ter-minar a história de Edson Luís, gostari ade falar um pouco da história do própri oO Cruzeiro, a revista mais importante d aépoca no Brasil . Depois de alcançar tira-gens de até 800.000 exemplares, naquel eano de 1968 0 Cruzeiro lutava para che-gar a 300 .000 revistas . Eu havia assumi-do a direção da redação num moment odelicado, com a debandada geral da gran -de equipe de reportagem, que Davi dNasser costumava chamar de "Esquadrã ode Ouro". Na época, além do Alfred oBelmont Pessoa, resolvi trazer vários jor-nalistas do tablóide O Sol, que acabara d efechar. O Sol era um semanário dos mai scombativos, feito por uma equipe jove me talentosa, editado junto com o Jornal do sSports . Até Caetano Veloso homenageo uo tablóide numa de suas músicas, cantan-do : "0 Sol nas bancas de revista me en-che de alegria e preguiça" .

Alguns ainda eram focas, outros já ti-nham certa experiência, mas os novos qu echegaram para fazer a revista encararamo desafio de buscar um novo jornalismo ,quer na linguagem, quer na escolha do stemas . Foi assim que O Cruzeiro passou aabordar temas até então considerados ta -bus, como lesbianismo (numa matéria ma -gistralmente ilustrada por Ed Keffel), tó-xicos, aborto, homossexualismo, reformaagrária, infância abandonada, favelas, es -cândalos políticos etc . Ao mesmo tempo ,produzia-se uma reforma gráfica e edito-rial na revista . As capas, costumeiramentepreenchidas por mulheres bonitas, passa -ram a ser, como era jornalisticamente cor -reto, a vitrine da revista . Foi assim que ,no Natal daquele ano, colocamos na cap aum Papai Noel negro, representado pel ocantor Gasolina . E, no número imediata -mente anterior ao de Edson Luís, havía -

mos, pela primeira vez, usado uma chargena capa (no traço primoroso de Carlo sEstêvão, alusiva ao jogo do bicho) .

Na verdade, muitos daqueles rapazes ,excelente jornalistas, terminaram se en -volvendo com a esquerda na luta contra aditadura . Alguns deles chegaram até a par -ticipar em ações armadas e seqüestros . Eum deles, que nada tinha a ver com amilitância política, acabou tendo um fi mtrágico: o fotógrafo Sérgio Rocha, estu-dante de engenharia . Num dia ele estav ana casa de sua namorada (esta, sim, um amilitante), quando foi preso por policiai sdo DOPS . Barbaramente torturado, aca-bou se exilando no exterior. Na volta, de -pois da anistia, ainda traumatizado, ape-lou para o suicídio .

Voltemos aos dias em que Édson Luísfoi assassinado :

- Moraes, o dr. Leão quer falar comvocê .

O dr . Leão - Leão Gondim de Olivei-ra, um dos sócios de Assis Chateaubriand ,era o diretor gerente de O Cruzeiro . En-trei na sala: lá estavam também o vice -presidente da empresa, Theophilo d eAndrade e o superintendente da revista ,José Velasco Portinho .

Foi o Theophilo quem me comunicou :- O pessoal do DOPS está vindo aí

para te prender.- Por que?, perguntei .- Convenhamos que a capa com a fot o

do estudante morto já é uma provocação .Ainda mais o caixão coberto com a ban-deira de Cuba !

Era essa a explicação que os agente sda polícia política haviam dado à direçã oda revista . Naquela época, Cuba, Fide lCastro ou qualquer personagem que seaproximasse do mundo comunista era as-sunto absolutamente proibido .

A salvação : a bandeira não era de Cuba;era do Pará, estado natal de Edson Luís .

Feita a explicação, todos se acalmaram .

LOIS

X

IMPRENSA - MARÇO 1994 61

Eleiçõess jornalistas são testemu -nhas privilegiadas dos tru -ques que os políticos usa mpara vender uma image magradável -e freqüentemente

falsa - aos eleitores . Na cobertura d efatos de campanha ou na assessoria dire -ta de candidatos, os profissionais da im-prensa vivem a situação daquele sujeit oque tem acesso ao manual de efeitos es-peciais do ilusionista e sabe perfeitamen -te aonde o espetáculo vai chegar . O co-nhecimento acumulado pelos jornalista ssobre as espertezas de campanha foi com -pilado num livro que a Editora Atica aca -ba de lançar no mercado, Como não serenganado nas eleições . Assinado por Gil-berto Dimenstein, 37 anos, 17 de profis-são, diretor da Folha de S. Paulo e mBrasília, e pontilhado por textos de algun sdos maiores jornalistas do país, o livro éuma ferramenta útil para quem quer en -

frentar a campanha eleitora lque vem aí com espírito crí -tico aguçado .

O livro de Dimenstein écomposto essecialmente deconselhos, calcados na ex -periência das últimas elei -ções e no bom senso . Mos -tra como tarimbados profis-sionais de marketing zelampela imagem dos candidato se criam estratégias de cam -panha que, em vez de fato se argumentos racionais, ba-seiam-se quase sempre n oapelo às emoções do eleitor .

O caso do "caçador de marajás" que aca-bou destituído por corrupção éemblemático do atoleiro aonde pode dareste tipo de fraude de campanha - eDimenstein não esconde que o episódiodo impeachment foi sua grande fonte d einspiração . O livro chama atenção paraum rosário de truques a que os candida-tos costumam recorrer. Os políticos gos-tam, por exemplo, de divulgar previsõe sde videntes e pais-de-santo a respeito d eseu futuro político. Buscam criar um aaura de misticismo e predestinação emtorno de sua biografia e, assim, cativa ros milhares de eleitores supersticiosos .Outro expediente comum dos gurus d ecampanha consiste em vasculhar a vid apessoal dos candidatos rivais, para dis-parar a munição se os inimigos subire mnas pesquisas . O leitor certamente ir ádeparar-se com truques desse tipo n acampanha eleitoral que chega às ruas -e, assim, terá a chance de interpretá-lo scom olhos mais críticos .

Preleção - Não por acaso, Gilbert oDimenstein fez uma opção preferencia lpelo público jovem, que tem pouca o unenhuma experiência no exercício d o

Antídotocontra os picaretas

Livro ensina a identificar as mentiras dos políticos

62 IMPRENSA - MARÇO 1994