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HIPÓTESES DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO I A Amaríndia é um Estado costeiro no Pacífico Sul. Em 1998 celebrou com a Betrónia um Tratado, mediante o qual se obrigou a autorizar a pesca na suas águas de 120 embarcações da Betrónia, às quais concederia licenças anuais. Em contrapartida, a Betrónia obrigou-se a acolher anualmente 20.000 emigrantes amaríndios e a abrir o seu mercado interno à indústria de sapatos da Amaríndia. O Tratado seria válido por vinte anos. Em 2001, porém, a Amaríndia comunicou à Betrónia que considerava o Tratado sem efeito, com os seguintes fundamentos: 1. O Parlamento da Amaríndia não tinha aprovado regularmente o Tratado, já que, na reunião em que o mesmo tinha sido votado, estavam presentes menos de metade dos deputados, pelo que o mesmo estava ferido de inconstitucionalidade formal. 2. A Constituição da Amaríndia proibia a cessão plurianual de direitos de pesca nas águas sob a jurisdição do Estado. 3. Mesmo que tais circunstâncias não se tivessem verificado, o Tratado tinha deixado de interessar à Amaríndia, já que não se tinha verificado interesse 1

Hipóteses de Direito Internacional Público

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Page 1: Hipóteses de Direito Internacional Público

HIPÓTESES DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

I

A Amaríndia é um Estado costeiro no Pacífico Sul. Em 1998 celebrou

com a Betrónia um Tratado, mediante o qual se obrigou a autorizar

a pesca na suas águas de 120 embarcações da Betrónia, às quais

concederia licenças anuais. Em contrapartida, a Betrónia obrigou-se

a acolher anualmente 20.000 emigrantes amaríndios e a abrir o seu

mercado interno à indústria de sapatos da Amaríndia. O Tratado

seria válido por vinte anos.

Em 2001, porém, a Amaríndia comunicou à Betrónia que

considerava o Tratado sem efeito, com os seguintes fundamentos:

1. O Parlamento da Amaríndia não tinha aprovado regularmente

o Tratado, já que, na reunião em que o mesmo tinha sido

votado, estavam presentes menos de metade dos deputados,

pelo que o mesmo estava ferido de inconstitucionalidade

formal.

2. A Constituição da Amaríndia proibia a cessão plurianual de

direitos de pesca nas águas sob a jurisdição do Estado.

3. Mesmo que tais circunstâncias não se tivessem verificado, o

Tratado tinha deixado de interessar à Amaríndia, já que não

se tinha verificado interesse significativo por parte dos seus

nacionais na emigração para a Betrónia e, por outro lado, os

sapatos amaríndios não conseguiam penetrar no mercado da

Betrónia por terem preços pouco competitivos.

Suponha que é convidado para elaborar uma parecer sobre a

apreciação deste caso à luz da Convenção de Viena sobre Direito

dos Tratados. Enuncie os aspectos que consideraria mais

relevantes.

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Page 2: Hipóteses de Direito Internacional Público

II

A Nova Grécia é um Estado centro-americano cuja Constituição é

fortemente inspirada na Constituição Portuguesa, contendo,

designadamente, um artigo idêntico ao artigo 8.º n.ºs 1 e 2 desta.

Em 2002 embarcações de pesca do país vizinho, a Croacilândia, são

apresadas pela Guarda Costeira da Nova Grécia por pesca não

autorizada nas suas águas territoriais desta.

Os armadores da Croacilândia contratam um advogado que

sustenta, no tribunal competente da Nova Grécia, a libertação

imediata e incondicional das embarcações, invocando um costume

bilateral entre os dois Estados, segundo o qual a pesca numa zona

com vinte mil Km2, onde se verificou o apresamento, e que abrange

águas territoriais dos dois Estados, é livre para a faina dos

pescadores de ambos os países.

Estará o tribunal vinculado ao costume invocado?

III

Portugal celebrou com Cabo Verde um tratado que prevê

reciprocamente a concessão da naturalização a cidadãos do outro

Estado, desde que residam um ano no seu território.

Em Portugal, o Tratado é publicado no Diário da República após

promulgação pelo Presidente da República. Em Cabo Verde o

Tratado, após os trâmites constitucionais aplicáveis entra em vigor,

sendo logo de seguida concedida a naturalização a vários

portugueses.

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Carlos Silva, cabo-verdiano residente há quatro anos em Portugal,

dirige-se ao SEF para pedir informações sobre a sua naturalização,

sendo-lhe dito, porém, que não a poderá obter, já que o Tratado não

foi aprovado pela Assembleia da República mas pelo Governo, pelo

que estaria ferido de inconstitucionalidade orgânica.

Deverá Carlos Silva conformar-se?

IV

Comente o seguinte caso:

Imagine que Portugal reconhece por declaração do Presidente da

República em visita oficial a outro Estado da região, a

independência de um novo Estado africano, que proclamou a

independência de parte do território numa guerra civil ainda em,

curso.

Dias mais tarde, o Governo vem declarar que tal reconhecimento

carece de qualquer valor, já que o Presidente não tem competência

constitucional para reconhecer Estados.

V

Um Estado europeu conclui com uma República insular do Atlântico

Sul um tratado para a entrega a esta de duas ilhas que se

encontravam sob sua administração mas que há muito eram

reclamadas por aquela República.

Na véspera da entrega do território, o Estado europeu retira da Ilha

todos os arquivos existentes, invocando que alguns têm valor

histórico, visto respeitarem à História da sua expansão ultramarina.

Outros, os de registos prediais, comerciais e civis, porque considera

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Page 4: Hipóteses de Direito Internacional Público

a sua posse indispensável à defesa dos interesses dos seus

cidadãos no território ou à definição da nacionalidade dos seus

cidadãos lá residentes.

A República à qual o território foi entregue apresenta um indignado

protesto pelo que classifica de “saque colonialista”.

O tratado nada dispõe sobre a matéria. A qual dos Estados assiste,

na sua opinião a razão?

VI

Admitindo que os Estados Unidos, face aos acontecimentos do

passado dia 11 de Novembro, exercem acções de retaliação sobre o

Afeganistão, invocando a protecção dada por este Estado ao

presumível autor moral dos atentados, Bin Laden, refira-se ao

enquadramento desses actos de retaliação à luz do Direito

Internacional.

Tome em consideração que o Conselho de Segurança da Nações

Unidas votou por unanimidade uma resolução, reafirmando uma

resolução anterior, exigindo a extradição do referido Ben Laden para

ser julgado por alegado envolvimento em actos terroristas

anteriores.

VII

A Industíndia é uma enorme ilha no sudoeste asiático que contém

dois Estados: a República da Industíndia, que ocupa 97% do espaço

da Ilha e a cidade-Estado de Siónia, pequeno sultanato situado

numa península, cuja economia assenta essencialmente na pesca e

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Page 5: Hipóteses de Direito Internacional Público

no turismo e que depende do seu grande vizinho para

abastecimentos essenciais, designada e principalmente água

potável.

Em 1990 são descobertas importantes jazidas de gás natural numa

zona com 200.000 Km2, situada principalmente na ZEE de Siónia e

no espaço adjacente da ZEE da Industíndia.

As relações, até pacíficas entre os dois Estados começam a ser

perturbadas por pressões da Industíndia para que a delimitação das

ZEEs respectivas sejam objecto de um novo tratado que alargue o

espaço sob a sua jurisdição.

Após várias ameaças e alguns actos menos amistosos, como passar

a exigir vistos de entrada aos súbditos de Siónia que queriam entrar

no seu território, mesmo apenas para viajarem para terceiros

países, já que a Siónia não possuía aeroporto internacional, a

Industíndia corta o abastecimento de água potável e bloqueia a

exportação de produtos frescos para a Siónia, provocando uma

grave crise humanitária.

A Siónia consegue promover a instalação em poucos meses de uma

central de dessalinização da água do mar e encontrar alternativas

para os seus abastecimentos, bem como encontrar alternativas para

o acesso dos sioneses ao exterior.

Perante esta resistência às suas pressões, a Industíndia declara um

bloqueio naval à Siónia, colocando três vasos de guerra nas suas

águas, ao mesmo tempo que a sua força aérea sobrevoa

constantemente os céus da Siónia.

Em 1992, no auge das pressões da Industíndia, o Sultão da Siónia

surpreende o mundo ao anunciar que a Siónia celebrou um tratado

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Page 6: Hipóteses de Direito Internacional Público

com a Austrália, colocando-se sob a sua protecção. Nos termos do

tratado os negócios estrangeiros, a defesa e as questões relativas

ao gás natural passam a ser geridas pela Austrália, durante vinte

anos.

No dia seguinte aviões australianos afundam os navios de guerra da

Industíndia, que recorre ao Conselho de Segurança das Nações

Unidas.

Imagine que Portugal é membro não permanente do Conselho de

Segurança e que é consultor da Representação Permanente do

nossos país, sendo encarregado de proceder a um análise destes

factos à luz do Direito Internacional. Elabore um esboço do relatório

que apresentaria.

VIII

O Jacastão é uma república situada no sudoeste da Ásia, com uma

extensa fronteira comum com a Pirolésia. No âmbito de um tratado

celebrado em 1970 entre os dois Estados para o aproveitamento

das águas do Rio Verde, que nasce no Jacastão e atravessa grande

parte dos territórios dos dois países, é estabelecido o regime de

caudais do Rio, ficando o Jacastão com o direito de construir uma

extensa barragem junto à fronteira, desde que assegure um caudal

determinado na parte que corre no território da Pirolésia.

A barragem é inaugurada cinco anos depois. Entretanto, uma

prolongada seca reduz a mínimos históricos as águas do Rio Verde,

pelo que o governo do Jacastão declara em 1985 não estar em

condições de assegurar os caudais a que estava obrigado pelo

Tratado de 1970.

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Page 7: Hipóteses de Direito Internacional Público

Na verdade, a contenção das águas do Rio Verde quase que seca a

parte do curso do rio que corre na Pirolésia, causando uma profunda

crise económica e humanitária neste país. Face a esta situação o

Presidente da Pirolésia, Alex Secco é acusado pelos militares de ter

causado a desgraça do país com o tratado de 1970, acabando por

ser derrubado por um golpe de Estado que instala no Poder uma

junta militar encabeçada pelo General Emil Serio.

No dia seguinte ao golpe um ataque da força aérea da Pirolésia

destrói a barragem do Rio Verde, provocando, aliás, a destruição,

pela enxurrada das águas da albufeira da barragem, de várias

povoações do seu próprio país.

À beira de uma guerra, ambos os Estados são persuadidos por uma

resolução do Conselho de Segurança a submeter a arbitragem os

seus diferendos no âmbito do caso designado “Rio Verde”.

O Jacastão exige: o pagamento integral da reconstrução da

barragem, o ressarcimento dos prejuízos causados pelo ataque e a

inoperacionalidade da barragem até à reconstrução e os respectivos

juros. A Pirolésia pretende pôr fim ao Tratado e obter uma

indemnização pelos prejuízos causados pelo incumprimento das

obrigações relativas aos caudais pelo Jacastão.

Imagine que é encarregado pelo MNE de proceder a uma apreciação

das posições dos Estados envolvidos face ao Direito Internacional.

Quid juris?

IX

Uma empresa portuguesa concorreu, através da sua filial local, à

construção e exploração de um terminal aeroportuário num país

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Page 8: Hipóteses de Direito Internacional Público

asiático, tendo ficado classificada em primeiro lugar no respectivo

concurso público.

No dia seguinte ao da abertura e classificação das propostas, é,

emanado um diploma legislativo pelo governo do país em questão,

que expropria a filial portuguesa no país em questão, atribuindo a

nacionalidade do país aos técnicos portugueses que aí trabalhavam,

a quem foram apreendidos os passaportes portugueses e impedidos

de regressarem a Portugal.

Três meses depois, os bens expropriados são vendidos a um dos

filhos do presidente, que constitui, com esses activos empresariais,

uma nova empresa.

Indique quais as medidas que a empresa portuguesa que viu

expropriada a sua filial e os cidadãos portugueses retidos podem

tomar em sua defesa no quadro do direito internacional público.

X

A Belídia e a Estravónia são Estados com uma extensa fronteira

comum atravessada pelo Rio Ialu. A Belídia, que se situa a

montante, autorizou uma empresa privada, a Nucleon, a instalar

junto à margem do rio uma central nuclear em 1980.

Ambos os Estados são partes, desde 1978, numa convenção

internacional pela qual assumem a responsabilidade pelo risco

decorrente da utilização nos respectivos territórios de instalações

nucleares para fins pacíficos.

Em 1985 ocorre um acidente nuclear na referida central causando

danos materiais e pessoais a pessoas, culturas e explorações

pecuárias nos territórios dos dois Estados.

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Page 9: Hipóteses de Direito Internacional Público

Responda às seguintes questões:

a) De que meios se podem socorrer os nacionais da Estravónia para

verem ressarcidos os respectivos prejuízos;

b) Qual o tipo de responsabilidade em que a Belídia poderá ter

incorrido e que meios poderão ser utilizados para obter da sua

parte o cumprimento do dever de indemnizar.

XI

A Felíntia é um território da Ásia Central que se entende dos dois

lados da fronteira da Rectóvia e da Rotúndia. Habitado por um povo

que se dedica essencialmente à criação de gado em transumância,

os felíntios foram deixados entregues ao seu destino pelos governos

dos Estados pelos quais se estendem os espaços ancestrais que

habitam. Uma tentativa de obter a autonomia foi esmagada através

de uma repressão sangrenta em 1908.

Contudo no ano 1995 foram descobertas riquíssimas jazidas de

petróleo espalhadas por toda a Felíntia. Os governos da Rectóvia e

da Rotúndia encetam negociações que dão lugar em Janeiro de

2000 ao Tratado de Vailatu, mediante o qual acordam em deslocar

todos os felíntios para os deserto de Torrasol situado ao no extremo

Norte da Rectóvia, passando os felíntios a ter todos,

independentemente do seu estatuto nacional anterior, a

nacionalidade da Rectóvia.

Ao longo de 2001 e 2002 os felíntios são deslocados em vagões de

gado para o seu novo território. O seu gado é abatido, sendo

declarado que, em contrapartida o governo da Rectóvia disponibiliza

ao povo felíntio, ao qual é concedida “autonomia limitada”, a

possibilidade de se dedicarem à exploração das pedreiras graníticas

do deserto de Torrasol. Logo no primeiro ano de aplicação do

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Page 10: Hipóteses de Direito Internacional Público

“Programa de Autonomia e Dignificação do Povo Felíntio”, como o

plano foi designado, cerca de 30% dos felíntios morreu de fome,

sede e falta de cuidados de saúde.

Imagine que é encarregado pelo primeiro-ministro da Cilíndria,

Estado vizinho da Rectóvia e da Rotúndia, de elaborar um estudo

sobre as opções que, face ao Direito Internacional poderão existir

para proteger os felíntios. Elabore um relatório preliminar contendo

as suas recomendações.

XII

A República Centro-Asiática (RCA) celebrou em 1957 um Tratado de

Limites com o Sulistão, seu vizinho meridional, na qual é fixada a

fronteira entre os dois Estados pelo curso do Rio Baulu. No mesmo

tratado é ainda regulada a captura dos valioso recursos de esturjão

existentes no rio, bem como a navegação pelo respectivo curso até

ao oceano Índico.

Em 1974 uma violenta erupção vulcânica altera o leito do rio, que

passa a correr mais dez quilómetros para o interior do território que

pertencia ao Sulistão, abrangendo um área de 1367 Km2 do

território deste Estado.

Este facto desencadeia um diferendo entre os dois Estados,

defendendo a RCA que a parte do território do Sulistão em causa

passou a pertencer-lhe por ficar no seu lado da margem do rio. O

Sulistão recusa-se a aceitar a perda do território sustentando a

caducidade do tratado e reivindicando que a fronteira continue a ser

definida pelo antigo leito do rio, passando o curso de água a ser um

seu rio interior.

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Page 11: Hipóteses de Direito Internacional Público

Entretanto, surge um movimento de libertação do território em

litígio o Movimento para a Libertação do Baulu-Norte (MLBN), que

sustenta a auto-determinação do território invocando que a sua

população é maioritariamente composta por um povo com

características bem definidas e uma forte identidade histórica. Tal

pretensão é imediatamente repudiada pelos governos da RCA e do

Sulistão.

A mediação do Secretário-Geral da ONU consegue evitar um conflito

que parecia iminente, aceitando as três partes submetê-lo a

arbitragem. Admitindo que é convidado(a) pelo Ministro dos

Negócios Estrangeiros para dar um parecer sobre a aplicação do

Direito Internacional a este caso, diga como apreciaria as seguintes

questões:

1. Efeito sobre a validade do Tratado do desvio do Rio Baulu,

face à Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados.

2. Factos que deverão ser indagados para se apreciar a

pretensão do MLBN à auto-determinação do território.

3. Caso a auto-determinação seja reconhecida e surja um novo

Estado quais os aspectos essenciais a considerar no que se

refere às regras aplicáveis à sucessão de Estados.

XIII

O Sudistão, Estado africano de grande dimensão territorial e

populacional invade o território do vizinho Nordistão, alegando que

o governo deste último desenvolvia um política desastrosa no que

se refere à conservação dos respectivos recursos hídricos, pondo

em causa a futura sobrevivência do seu povo,

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Page 12: Hipóteses de Direito Internacional Público

Sustenta a sua acção no quadro da ingerência humanitária,

invocando o precedente da acção da NATO no Kosovo, e o costume

internacional por ele criado.

Aprecie esta situação à luz do Direito Internacional.

XIV

Uma empresa portuguesa, a Sociedade Algodoeira da África

Oriental, que detém investimentos avultados num país da África

Oriental, Truvulanda, sofreu avultados prejuízos, resultantes da

destruição da sua sede e valiosa maquinaria durante incidentes que

resultaram de uma rebelião militar que teve lugar no país.

Em Novembro de 1998 Xanuatu, a capital, foi atacada pelas tropas

de dois regimentos instalados numa área militar próxima. O

Governo pediu auxílio a um Estado vizinho, que interveio,

bombardeando as tropas rebeldes com fogo de artilharia. Durante

este bombardeamento, ou na resposta que se seguiu por parte dos

rebeldes, foram provocados os danos nas instalações da empresa

portuguesa.

O Presidente de Truvulanda, Saka Massa, veio a celebrar um acordo

de cessar-fogo com os rebeldes que lhe permitiria manter-se

formalmente no poder, mas veio a ser fuzilado, quando se descobriu

que se preparava para desencaminhar as reservas de ouro do país e

fugir para estrangeiro. Os militares decidiram revogar a Constituição

e implantar um novo regime, com carácter parlamentar, tendo

marcado eleições para o final do ano de 1999, nas quais será

também referendada a nova Constituição.

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Page 13: Hipóteses de Direito Internacional Público

Terá a empresa portuguesa direito a ver ressarcidos as seus

prejuízos? Em caso afirmativo como poderá agir para a defesa dos

seus interesses?

XV

A Sulíndia é um Estado arquipélago situado no Atlântico Sul. Nunca

declarou pretender exercer a jurisdição sobre a zona económica

exclusiva a que teria direito nos termos da Convenção de Montego

Bay.

Em 1993 as autoridades costeiras da Sulíndia procedem ao

apresamento de uma embarcação de pesca do Maraguai, Estado

sul-americano, invocando que esta se dedicava à captura de

lagostas nos fundos marinhos da sua plataforma continental.

O governo do Maraguai protesta firmemente invocando que, não

sendo as lagostas animais que vivam o seu ciclo vital presas ao

fundo marinho, os direitos sobre a sua captura não são abrangidos

pela jurisdição sobre a plataforma continental.

Imagine que é consultado pelo governo da Sulíndia para o

aconselhar neste diferendo, formule, em traços gerais, o seu

parecer.

XVI

Um conjunto de doze Estados do Pacífico Sul celebrou um tratado

através do qual se obrigaram reciprocamente a condicionarem a

pesca pelas respectivas frotas nacionais nas águas internacionais

adjacentes às respectivas zonas económicas exclusivas, à

observância de determinadas condições, designadamente no que se

refere às artes de pesca a utilizar e à abstenção das actividades

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Page 14: Hipóteses de Direito Internacional Público

piscatórias a determinados períodos do ano, por forma a permitir a

reconstituição dos stocks.

Decorrido um ano sobre a celebração do tratado, a República das

Praias Douradas (RPA), parte no Tratado, declara que irá pescar

livremente na zona delimitada no tratado invocando que o mesmo

não produziu resultados, já que frotas de Estados não partes tinham

aumentado o seu esforço de pesca naquela zona, ficando

prejudicados apenas os Estados partes.

Decorridos quinze dias sobre essa declaração, a marinha do Reino

do Mar Azul (RMA), igualmente parte no Tratado, afunda uma

embarcação pesqueira e apresa outra, invocando que se

encontravam a pescar na época de defeso prevista no Tratado.

Em retaliação, a RPD expulsa 300.000 imigrantes Mar Azulenses e

proíbe a travessia das sua águas territoriais e do seu espaço aéreo

por embarcações e aeronaves da República do Mar Azul, mesmo

tratando-se de passagem inofensiva. Esta situação causa grande

perturbação à economia da RMA obrigando toda a navegação e

tráfego aéreo que parte ou se destina ao seu território a longos

desvios, com custos elevadíssimos.

A RMA declara então que as embarcações e aeronaves que

pretendam continuar a passar no seu espaço aéreo ou nas águas da

RPD serão escoltados por meios militares.

Com a mediação do Secretário-Geral da ONU, os dois Estados

concordam em submeter o diferendo a um tribunal arbitral.

Suponha que é encarregado de fazer uma análise da situação à luz

do Direito Internacional.

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Page 15: Hipóteses de Direito Internacional Público

XVII

Durante as celebrações da Festa Nacional da República do

Carabistão, o embaixador da vizinha República de Finistérria,

visivelmente embriagado incendeia a tenda onde decorriam as

celebrações, causando um número elevado de mortos, entre os

quais o Presidente do Carabistão, dois ministros, três embaixadores

de outros Estados, além de 37 empregados que serviam o jantar

comemorativo.

De seguida põe-se em fuga num automóvel que tinha a chave na

ignição, sendo abatido pela polícia que seguia no seu encalço,

quando circulava em manifesto excesso de velocidade.

O Carabistão declara que face a estes acontecimentos rompe

relações diplomáticas com a Finistérria, expropriando, sem direito a

indemnização, todos nos bens públicos ou privados da Finistérria no

seu território, entre os quais uma valiosa colecção de arte que

estava em exposição na capital do Carabistão e que integrava os

maiores tesouros artísticos e históricos da Finistérria.

Imagine que é convidado para apresentar uma solução que sirva de

base a uma eventual mediação entre ambos os Estados, tendo em

vista a resolução do diferendo de forma equilibrada, combinando a

aplicação do Direito Internacional e o justo equilíbrio dos interesses

envolvidos.

XVIII

Na sequência de um referendo, a República da Dubróvia reconhece

o direito à autodeterminação da província da Tirolíndia, que se vem

a constituir num Estado independente.

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Page 16: Hipóteses de Direito Internacional Público

Após a declaração da independência, um consórcio de bancos norte-

americanos vem reclamar ao novo Estado um terço do pagamento

da dívida de 3 biliões de dólares que tinham sido emprestados à

Dubróvia três anos antes da secessão, e que tinham sido

parcialmente investidos no território que veio a integrar a Tirolíndia.

O governo da Tirolíndia rejeita de imediato qualquer

responsabilidade na dívida.

José Popov cidadão da Dubróvia, tinha, entretanto doado ao Estado

um valioso espólio documental que constituía o arquivo pessoal do

seu avô, primeiro chefe de Estado do país. Nos termos do acordo de

secessão, a parte desse arquivo que respeitava à Tirolíndia foi

entregue ao novo Estado, o que José Popov indignadamente

contesta, sendo aconselhado por um grupo de amigos a apresentar

uma reclamação no Tribunal Internacional de Justiça.

Refira-se à responsabilidade da Tirolíndia pela dívida, à licitude da

entrega da documentação às autoridades do novo Estado e à

viabilidade jurídica da reclamação que José Popov foi aconselhado a

fazer.

XIX

O Governo Português celebra com Marrocos um acordo de pescas,

mediante o qual cinquenta embarcações portuguesas são

autorizadas a pescar durante dois anos em águas marroquinas

sendo, em contrapartida, concedida liberdade de acesso de

produtos marroquinos ao mercado português.

O acordo é publicado nos termos constitucionais.

Alguns dias mais tarde, a Comissão Europeia notifica o Estado

Português de que irá instaurar um processo de infracção visto o

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Page 17: Hipóteses de Direito Internacional Público

acordo incidir sobre matérias – acordos de pescas com países

terceiros e acordos comerciais – transferidas pelos tratados para a

União Europeia.

O Presidente da República, surpreendido por estas notícias numa

visita oficial a Marrocos, declara que, efectivamente, o acordo é

inválido.

Pronuncie-se sobre a validade do tratado, antes e depois das

declarações do Presidente da República.

XX

Suponha que o governo português resolve celebrar com os países

da CPLP – Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa um

tratado mediante o qual será atribuída a nacionalidade de cada um

dos Estados a nacionais do outro que a requeiram.

Assinado o tratado, é o mesmo remetido ao Presidente da República

para promulgação, sendo, obtida esta, efectuada a publicação no

Diário da República.

Dois meses após a publicação o Presidente da Assembleia da

República solicita ao Tribunal Constitucional, nos termos do artigo

281.º, n.º 2, alínea b) da Constituição, a apreciação da

constitucionalidade do Tratado, com o fundamento em

inconstitucionalidade orgânica, já que a matéria relativa à

nacionalidade se insere na reserva absoluta de competência

legislativa da Assembleia da República (artigo 164.º, alínea f) da

Constituição), que não interveio no processo, como deveria, nos

termos da alínea i) do artigo 161.º da Constituição.

17

Page 18: Hipóteses de Direito Internacional Público

Decorridos seis meses, o Tribunal Constitucional vem declarar a

inconstitucionalidade.

Trezentos cidadãos da Guiné-Bissau, que tinham entretanto

requerido a nacionalidade portuguesa ao abrigo do tratado,

aguardando o despacho dos seus pedidos, dirigem uma petição ao

Governo invocando que lhes deve ser reconhecido o direito, visto

que no seu Estado de origem o tratado já tinha iniciado a sua

aplicação na respectiva ordem jurídica interna, devendo, assim,

aplicar-se o disposto no artigo 277.º, n.º 2 da Constituição.

Aprecie as seguintes questões:

1. Conformidade do tratado com a Constituição.

2. Deverá ser acolhida a pretensão dos cidadãos da Guiné-

Bissau?

XXI

IDurante um voo de uma companhia aérea da República do Suristão,

o embaixador do Nordistão acreditado em Belleville, capital daquele

país, trava-se de razões com outro passageiro, acabando por cravar-

lhe a faca que lhe tinha sido fornecida com o jantar, provocando-lhe

morte imediata. O incidente ocorreu quando o avião sobrevoava

águas internacionais. Ao chegar a Belleville, o embaixador é

conduzido sob escolta policial até à embaixada.

Na sequência de uma campanha jornalística que apelava à

retaliação imediata, é marcada uma manifestação em frente à

embaixada com 48 horas de antecedência.

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Page 19: Hipóteses de Direito Internacional Público

No dia da manifestação, reúne-se uma multidão de cerca de 15.000

pessoas que, perante a passividade policial ataca e saqueia o

edifício da embaixada, amarra o embaixador, que é barbaramente

agredido e passeado pelas ruas de Belleville, até ser finalmente

resgatado pela polícia.

Face a estes acontecimentos, o Governo do Nordistão coloca o seu

exército de prevenção junto da fronteira entre os dois Estados,

exigindo a imediata reparação dos danos causados na embaixada e

na pessoa do seu embaixador.

O Conselho de Segurança da ONU reúne-se de emergência,

conseguindo uma suspensão da escalada dos acontecimentos

durante trinta dias para encontrar uma solução negociada que

reponha a normalidade das relações entre os dois Estados.

Imagine que é encarregado pelo Ministério dos Negócios

Estrangeiros de analisar os factos e os eu enquadramento à luz do

Direito Internacional.

XXII

No âmbito de uma operação policial destinada a combater o tráfico

de pessoas que teve lugar em Solana, pequena República da

América Central, são detidos 20 cidadãos norte-americanos

implicados numa rede de aliciamento de mulheres que, iludidas por

falsas promessas de trabalho numa empresa de informática em

Madrid, eram sequestradas e mantidas numa situação de

escravatura e prostituição na vizinha República de Vila Rica.

Os detidos são julgados e condenados a prisão perpétua e trabalhos

forçados numa pedreira situada numa zona de clima

particularmente agreste no interior de uma floresta equatorial.

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Page 20: Hipóteses de Direito Internacional Público

O Governo do Estados Unidos exige o repatriação imediata dos seus

cidadãos, alegando não terem sido julgados de forma justa e ter-

lhes sido aplicada uma pena desproporcionada e contrária aos

direitos humanos. O governo de Solana recusa a repatriação,

alegando que não existe qualquer tratado que a preveja e

sustentando que a pena aplicada é a prevista no seu Código Penal,

não tendo havido qualquer discriminação dos cidadãos norte-

americanos.

Após meses de tensão, uma força aerotransportada norte-

americana ataca a instalação prisional onde cumpriam pena os seus

cidadãos, que são levados para um porta-aviões que se encontrava

ao largo das águas de Solana.

O governo de Solana decide romper as relações diplomáticas com

os E.U.A. e expropriar sem indemnização os bens de empresas e

cidadãos norte-americanos no seu território. Em resposta os E.U.A.

impõem um embargo comercial a Solana, que causa uma crise

humanitária, já que priva a sua principal produção, o ananás, do

mercado para onde é exportada a quase totalidade da produção.

Qualifique e analise os actos dos Estados envolvidos à luz do Direito

Internacional.

XXIII

Durante 200 anos as embarcações da Borlíndia pescaram

livremente nas águas do Estado vizinho da Estravónia, sendo esta

prática descrita em muitos manuais de Direito Internacional como

um exemplo de costume internacional bilateral. Por ocasião da

entrada em vigor da Convenção de Montego Bay, a Estravónia

20

Page 21: Hipóteses de Direito Internacional Público

declara ter estabelecido uma zona económica exclusiva que

abrange aquelas águas. Algumas semanas mais tarde, são

apresadas pela marinha de guerra da Estravónia embarcações da

Borlíndia que pescavam, como habitualmente, na agora ZEE da

Estravónia.

A Borlíndia apresenta um protesto, declarando que, não tendo

ratificado a Convenção de Montego Bay, não está obrigada a

reconhecer o estabelecimento da ZEE da Estravónia. Esta, por seu

turno, vem responder que o direito ao estabelecimento de uma ZEE

constitui um direito que resulta de um costume internacional geral

que se formou antes da entrada em vigor da Convenção de Montego

Bay e a que a Borlíndia está, assim, vinculada.

Elabore uma apreciação da validade jurídica das posições dos

Estados envolvidos.

XXIV

A República de S. Tomás (RST), após uma prolongada crise

económica e financeira, celebra um acordo com o seu principal

credor, um consórcio de bancos suíços, mediante o qual amortizará

a sua dívida para com esse consórcio com as receitas da venda de

metade da sua produção de petróleo. Obriga-se, para tanto, a incluir

em todos os contratos de venda de crude uma cláusula prevendo o

pagamento directo dessas vendas ao banco líder do referido

consórcio.

Resolvido desta forma um problema que afectava gravemente a sua

credibilidade internacional, o governo de S. Tomás consegue

negociar com uma grande potência vizinha, os Estados

Aglomerados do Atlântico (EAA) um projecto de reconstrução de

infra-estruturas, financiado por este último Estado.

21

Page 22: Hipóteses de Direito Internacional Público

No tratado que formaliza o acordo entre a RST e os EAA, prevê-se

que a RST se obriga a manter um rigoroso cumprimento dos seus

pagamentos internacionais.

Seis meses após a conclusão do tratado, um furacão danifica

gravemente as estruturas de exploração do petróleo da RST,

comprometendo por cerca de sete meses 75% da produção. Face a

esta situação a RST suspende o cumprimento do acordo com o

consórcio de bancos.

Responda às seguintes questões:

a) Como poderá o consórcio de bancos agir se entender que a

RST violou as suas obrigações e que a suspensão do

pagamento não resulta de uma impossibilidade objectiva?

b) Como poderia a RST justificar o incumprimento do tratado

à luz da Convenção de Viena sobre o Direito dos tratados?

XXV

A República da Ilha Azul (RIA) celebra com o Estado vizinho, as Ilhas

de S. João (ISJ), um tratado, mediante o qual transfere para este

último Estado as suas competências na gestão do respectivo espaço

aéreo durante dez anos. Em contrapartida, as ISJ obrigam-se a

entregar à RPA a quantia de 50 milhões de dólares por ano e a

permitir a livre circulação de cidadãos da RIA no seu território.

Dois anos após a celebração e entrada em vigor do tratado, as ISJ

suspendem o pagamento invocando insuperáveis dificuldades

cambiais.

O governo da RIA notifica o governo das ISJ que, face a esse

incumprimento, deseja pôr fim ao tratado, com efeitos imediatos.

22

Page 23: Hipóteses de Direito Internacional Público

Em resposta, o governo das ISJ lembra o governo da RIA que, ao

abrigo do tratado, fixaram residência no seu território 30.000

cidadãos da RIA e que cerca de metade adquiriu a nacionalidade

das ISJ pelo que, caso a RPA não reveja a sua decisão, retaliará com

a expulsão de todos esses indivíduos, naturalizados ou não, do seu

território.

Analise esta hipótese, respondendo às seguintes questões:

a) Licitude das posições assumidas por cada um dos Estados à

luz da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados;

b) Licitude da eventual retirada da nacionalidade aos cidadãos

naturalizados por parte do governo da ISJ.

XXVI

Durante três séculos as águas do Estreito de Karapau foram

livremente atravessadas por embarcações de todos os Estados,

existindo a convicção generalizada de que tal atravessamento não

estava sujeito a quaisquer restrições, designadamente por parte da

República da Carélia, entre cuja parte do território continental e

uma ilha, que também lhe pertence, se situa o referido Estreito.

Em 2003, sem qualquer aviso, o Governo da Carélia, invocando a

realização de manobras navais, interrompe indefinidamente a

circulação no Estreito.

A interrupção obriga os navios que transportam mercadorias de e

para a Donália a utilizar rotas alternativas, com custos muito mais

elevados e, em muitos casos ao pagamento de elevadas

compensações a empresas de transporte.

23

Page 24: Hipóteses de Direito Internacional Público

Enquadre esta hipótese à luz do Direito Internacional, referindo o

que pode, na sua opinião, o Governo da Donália fazer para defender

os seus interesses e os dos seus cidadãos e empresas?

XXVII

Em Junho de 2006 a Marinha de Guerra da Nortlândia apresa duas

embarcações pesqueiras da República de Santa Marinha (RSM),

conduzindo-as, sob ameaça de afundamento, a um porto no seu

território. Segundo se vem a apurar, as referidas embarcações

pesqueiras estavam a pescar numa zona de águas internacionais

que um grupo de Estados, entre os quais a Nortlândia e a RSM se

tinham obrigado, mediante um tratado, a abster-se de pescar,

durante dez anos, entre 2000 e 2010, para permitir a reconstituição

dos stocks de algumas espécies de pescado que se reproduz

principalmente naquela zona.

O armador das embarcações alega não ter cometido nenhuma

ilicitude, visto desconhecer em absoluto a existência do Tratado,

que nunca foi publicado na RSM.

O Governo da RSM reconhece a falta de publicação do Tratado, mas

declara que nada no mesmo ou de acordo com quaisquer regras

vigentes de Direito Internacional autoriza o Governo da Nortlândia a

apresar embarcações em águas internacionais.

O Governo da Nortlândia recusa-se a libertar os navios, a menos

que lhe seja paga uma indemnização de 20 milhões de dólares,

quantia que estima corresponder ao valor dos danos causados aos

stocks de pescado.

24

Page 25: Hipóteses de Direito Internacional Público

Responda às seguintes questões:

a) O acto do Governo da Nortlândia é lícito?

b) O armador das embarcações pesqueiras está obrigado pelo

Tratado?

c) A exigência do Governo da Nortlândia é razoável face ao

Direito Internacional?

XXVIII

Mediante um tratado celebrado em 1995, a Kirguíndia e a Lamarósia

regularam a utilização das águas do Rio Quente, que nasce naquele

Estado e atravessa, até à foz, o território deste último.

Nos termos do referido tratado, a Kirguíndia obrigou-se a controlar o

caudal das águas do rio, podendo utilizá-lo para finalidades

agrícolas ou produção de electricidade, desde que o caudal

respectivo na parte que corre para o território da Lamarósia se

mantivesse constante durante todo o ano.

Tudo decorreu de acordo com o previsto, até que, em 2002, o

governo da Kirguíndia resolveu proceder a importantes trabalhos

numa grande central hidroeléctrica junto à fronteira. Um acidente,

provocado por negligência dos responsáveis da firma empreiteira,

provocou uma ruptura na barragem, inundando os campos vizinhos

no território da Lamarósia e provocando a perda total das colheitas

respectivas.

O governo da Kirguíndia promoveu a reparação da barragem no

mais curto espaço de tempo possível, declarando, após essa

reparação, que teria que reduzir drasticamente o caudal libertado

para a Lamarósia até encher a albufeira da barragem, o que

25

Page 26: Hipóteses de Direito Internacional Público

demoraria dois anos. Caso o não fizesse, alega, provocaria uma

solução de grave e duradoura penúria para uma parte importante

da sua população que vive nas margens dessa albufeira,

essencialmente da agricultura, pesca e turismo. Essa redução de

caudal provoca entretanto uma terrível crise na produção agrícola

da Lamarósia.

Após uma fase de grande tensão, ambos os Estados decidem

submeter a arbitragem internacional a decisão das seguintes

questões:

1. É a Kirguíndia responsável pelos danos causados à Lamarósia

e seus nacionais pela rotura da barragem?

2. É justificável a redução doa caudal do rio após a reparação da

barragem?

3. Terá o governo da Kirguíndia de indemnizar pelos danos

causados por esta sucessão de incidentes?

XXIX

Em Junho de 1997 um grupo de turistas norte-americanos que se

encontrava em viagem de vilegiatura na República do Mar Azul, na

América Central, é detido pela Polícia sob a acusação de integrarem

uma organização subversiva ligada a uma igreja evangélica

americana.

Efectivamente os referidos turistas eram membros da “Igreja da

Salvação Imediata”, que defende ser o destino manifesto dos

Estados Unidos (por revelação divina ao seu fundador John Greed) a

expansão por todo o continente americano, dispondo de células

organizadas em outros países do Continente que vêm com

vantagem a incorporação dos seus Estados de origem nuns Estados

Unidos alargados.

26

Page 27: Hipóteses de Direito Internacional Público

A detenção e a intenção de julgar os cidadãos americanos, que

ficaram sujeitos à pena capital, desencadeia uma onda de

indignação nos Estados Unidos, que assumem de imediato a

protecção dos seus cidadãos, utilizando todos os meios diplomáticos

ao seu dispor.

Face ao fracasso dessas medidas, os EUA impõem um embargo

comercial total à República do Mar Azul, causando uma catástrofe

económica e financeira a este país, largamente dependente das

suas relações económicas com os Estados Unidos.

O Governo da República do Mar Azul denuncia a conduta dos EUA

como colonialista e declara a expropriação sem indemnização de

todos os bens de cidadãos e empresas norte americanas no seu

território.

Como qualifica à luz do Direito Internacional a os actos praticados

pelos EUA e pela RMA?

XXX

Em 1980, o governo da República da Costa Dourada (RCD) lançou

uma grande campanha internacional para promover o turismo no

seu território, dotado de grandes belezas naturais.

Na sequência desses esforços, são construídos vários

empreendimentos turísticos de grande qualidade, gerando-se um

fluxo crescente de visitantes, com grande benefício para e

economia do país.

Dez anos mais tarde, em plena época alta, dá-se um greve da

polícia da Costa Dourada e os resorts turísticos são atacados por

bandidos de todo o tipo que aterrorizam os turistas, roubando-os e

cometendo atrocidades como homicídios, violações e agressões de

todo o tipo. Quando finalmente a ordem é restaurada, após quinze

dias de verdadeira anarquia, os turistas conseguem regressar a

casa.

27

Page 28: Hipóteses de Direito Internacional Público

Organizam-se então três movimentos internacionais de turistas

lesados, com o objectivo de obter reparações da RCD. Um dos

movimentos pretende instaurar um processo judicial nos tribunais

dos Estados Unidos, pedindo de imediato o congelamento de todos

os bens da RCD no território dos E.U.A. Um segundo grupo pretende

ver a RCD julgada no TIJ e um terceiro pretende iniciar os

procedimentos com um processo judicial nos tribunais da RCA.

Como valia a adequação destas intenções à luz do Direito

Internacional?

XXXI

O Rio Quente é um vasto curso de água que nasce no Lago

Esperança, situado no coração de África, e atravessa os territórios

de três Estados: o Alongo, o Bilongo e o Calongo, antes de desaguar

no Oceano Índico. O aproveitamento hidroeléctrico, a navegação e a

pesca no Rio estão regulados no tratado de Imunctu, celebrado em

1964

O Lago Esperança tem, além do Alongo, outros dois Estados

ribeirinhos: o Dauru e o Esterpe. Estes três Estados dividiram entre

si as águas do Lago através do Tratado de Finzé em 1965.

Em 1998, o governo do Dauru decide iniciar a construção de um

canal para ligar o lago Esperança a um vasto vale no centro do seu

território, que se tornaria um novo lago, permitindo tornar produtiva

uma enorme extensão de terras estéreis.

A construção implica uma significativa descida do nível das águas

do Lago Esperança e uma redução para menos de metade do caudal

do Rio Quente, com assinaláveis prejuízos para os Estados que

atravessa. Perante os protestos dos outros cinco Estados, o Governo

do Dauru declara não estar a violar qualquer obrigação

internacional pois não é parte no Tratado de Imunctu e o Tratado de

Finzé apenas estabelece as fronteiras lacustres, nada dizendo sobre

o desvio de águas.

28

Page 29: Hipóteses de Direito Internacional Público

Como enquadra a posição destes Estados à luz do Direito

Internacional?

XXXII

Em 2005 quando as forças armadas da República da Catalândia, no

Extremo-Oriente, procediam a testes de um novo tipo de míssil de

médio alcance, um defeito no dispositivo provocou a queda do

objecto sobre um navio da Japónia que navegava em águas

internacionais.

O governo da Catalândia propõe-se indemnizar o armador do navio

e os familiares dos tripulantes mortos, mas o governo da Japónia

declara não considerar tal suficiente por se estar, segundo alega,

face a um crime internacional, já que o míssil fora desenvolvido

para transportar ogivas nucleares, armas a que a Catalândia

renunciou ao aderir ao Tratado de não Proliferação de Armas

Nucleares.

O governo da Japónia pretende assim responsabilizar pessoalmente

todos os responsáveis da Catalândia envolvidos no desenvolvimento

e produção do míssil, apelando ao Conselho de segurança das

Nações Unidas para aplicar as medidas necessárias à concretização

desse objectivo.

O Governo da Catalândia admite que o engenho fora produzido para

transportar ogivas nucleares mas nega-se a qualquer sanção, à

excepção da reparação que, logo de início ofereceu.

a) Admitindo que o Conselho de Segurança das Nações Unidas

considera provado o crime internacional, que medidas poderá

tomar?

b) Se o Conselho de Segurança não tomar nenhuma medida

concreta que poderá a Japónia, na sua opinião, fazer?

29

Page 30: Hipóteses de Direito Internacional Público

XXXIII

A República da Ilha Azul (RIA), o Reino do Mar Verde (RMV) e as

Ilhas Luxuriantes (IL) constituíram em 1960 uma organização

supranacional com o objectivo de promover a integração

económica, numa primeira fase, e a integração política, numa fase

posterior, dos Estados Membros. A organização, denominada

Comunidade dos Mares Meridionais (CMM), foi dotada de órgãos

próprios, executivos, legislativos e judiciais, e mereceu amplo

reconhecimento internacional.

Em 1995, o Estado dos Corais Refulgentes (ECR) requereu a sua

adesão à CMM, tendo esta aceite a candidatura, embora tenha

sujeito a adesão a uma série de pré-requisitos, como a liberalização

económica, a privatização de amplos sectores da economia e a

abertura à importação dos produtos industriais dos Estados

Membros da CMM. Os termos e condições da futura adesão foram

objecto de um tratado entre a CMM e o ERC.

O ECR cumpriu todas as imposições, que tiveram como

consequência uma degradação acentuada da sua balança comercial

e uma profunda alteração da sua economia, tendo as suas principais

empresas públicas sido adquiridas por grupos empresariais da RIA,

do RMV e das IL.

Em 2001, quando deveria ocorrer a adesão plena, o RMV declara

que o seu consentimento dependeria de referendo interno, que se

realiza, tendo 60% do eleitorado votado contra. A CMM declara

então ao ECR que todo o processo fica prejudicado e, portanto,

encerrado.

O ECR, declara que as alterações a que procedeu na sua estrutura

económica para cumprir as obrigações assumidas no tratado de pré-

adesão lhe causaram prejuízos de 10 biliões de dólares, reclamando

uma indemnização desse montante à CMM. Esta declara que não

tem o dever de satisfazer esse pedido, visto ter sido um acto de um

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Page 31: Hipóteses de Direito Internacional Público

Estado soberano, o RMV, que inviabilizou a adesão. Por sua vez, o

governo do RMV declara que não violou nenhuma obrigação, pois

não é parte no tratado de pré-adesão celebrado entre a CMM e o

ECR.

Imagine que é funcionário do MNE e encarregado de elaborar um

memorando sobre esta questão. Delineie os aspectos fundamentais

desse memorando.

XXXIV

Em 1995, uma erupção vulcânica ocorrida no Atlântico Norte dá

origem ao surgimento de três ilhotas com cerca de 5.000 m2 cada.

Decorridos dois anos já se tinha desenvolvido alguma flora, ervas e

arbustos, bem como alguma fauna, pássaros que passaram a

nidificar no local.

Em 2004 a Gelândia, Estado insular situado a 300 milhas das

referidas ilhotas, vem reclamar a sua soberania sobre o local,

invocando a proximidade em relação ao seu território, bem como o

facto de terem sido marinheiros gelandeses os primeiros a

avistarem as ilhotas e a desembarcarem no local.

Passados alguns meses, é anunciado que foram descobertas a 75

milhas das ilhotas, denominadas Ilhas da Esperança, importantes

jazidas de petróleo e gás natural, que a Gelândia vem declarar

serem suas, sustentando que se situam na plataforma continental

das Ilhas da Esperança.

Imagine que é encarregado pelos MNE de proceder à análise da

licitude da reclamação da Gelândia.

XXXV

O petroleiro Glory of Oil, navio muito antigo e em péssimo estado, navegava

com uma carga de 100.000 toneladas de petróleo bruto a 125 milhas da

costa da República dos Ananases (RA), quando uma tempestade provocou

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Page 32: Hipóteses de Direito Internacional Público

um rombo no costado da embarcação, que ficou em sério risco de se

afundar, derramando toda a sua carga.

Face a esta situação, as autoridades da RA dão instruções à sua marinha de

guerra para recolher a tripulação e afundar o navio, de modo evitar que se

aproximasse mais da costa, aumentando o risco de poluição das praias e dos

viveiros de peixe e marisco das suas costas.

A marinha de guerra da RA age de acordo com essas instruções.

O Glory of Oil pertence a uma companhia liberiana, a Oil Maritime Ventures,

ostentando o pavilhão de conveniência da Libéria, já que a totalidade do

capital daquela companhia pertence a uma sociedade inglesa, com sede em

Londres.

O governo da Libéria apresenta um protesto junto do governo da RA,

declarando que o afundamento do navio foi contrário ao Direito do Mar, já

que o mesmo navegava em águas com total liberdade de navegação, embora

situadas na ZEE da RA.

A RA declara que, sem conceder nessa argumentação, a Libéria não pode

prestar protecção diplomática, já que a sociedade que detém a totalidade do

capital da armadora é inglesa, bem como os seus accionistas.

Responda às seguintes questões:

a) Licitude do afundamento do Glory of Oil.

b) Conformidade da protecção diplomática da Libéria.

c) Poderia o Reino Unido exercer protecção diplomática?

XXXVI

A Rectóvia, Estado insular situado a leste do cone sul da América do Sul

Inicia a exploração de jazidas de petróleo e gás natural situadas nos fundos

marinhos, para além da sua plataforma continental.

Perante o protesto de inúmeros Estados que vêm sustentar que se trata de

uma zona do património comum da Humanidade sob a jurisdição da

Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos, a Rectóvia declara que, não

tendo ratificado a Convenção de Montego Bay não está pela mesma obrigada

e que as riquezas minerais situadas no solo e no subsolo marinhos são res

nullius podendo ser apropriadas por qualquer Estado.

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Page 33: Hipóteses de Direito Internacional Público

Terá a Rectóvia razão? Fundamente.

XXXVII

Em Maio de 2010 Israel impôs um bloqueio naval à Faixa de Gaza com o

alegado objectivo de impedir a entrada de elementos terroristas e armamento

no território.

Na sequência de uma tentativa de entrada de navios com auxílio humanitário

num porto da Faixa de Gaza, as forças armadas israelitas desencadearam

uma acção militar com descida por helicópteros de soldados num dos navios,

de pavilhão turco.

Nessa operação, que decorreu em alto-mar, foram mortas e feridas várias

das pessoas que se encontravam no navio, tendo o mesmo sido conduzido a

um porto israelita, onde permaneceram detidos, durante 48 horas, todos os

elementos, tripulação e passageiros, que se encontravam a bordo.

O Conselho de Segurança das Nações Unidas reuniu a pedido da Turquia,

tendo resolvido instaurar um inquérito internacional aos acontecimentos.

Israel alega que a bordo do navio se encontravam, armas e elementos

terroristas e que o assalto ao navio, tal como, aliás, o bloqueio, é um acto de

legítima defesa. Alega, ainda, que os soldados israelitas foram atacados com

barras de ferro e armas brancas quando desceram no convés da

embarcação.

Responda às seguintes questões:

a) Licitude da imposição de um bloqueio em águas internacionais. (3

valores)

b) Validade do argumento de legítima defesa. (3 valores)

c) Eventual responsabilidade internacional emergente dos

acontecimentos. (3 valores).

XXXVIII

Em 2005 a União Nórdica, poderosa potência nuclear e membro permanente

do Conselho de Segurança das Nações Unidas, invadiu sem pré-aviso a

vizinha República da Juliónia, com a justificação de que as autoridades desta

33

Page 34: Hipóteses de Direito Internacional Público

ultima oprimiam de forma consistente a minoria de etnia nórdica residente no

seu território há muitas gerações, pelo que se tratava de uma ingerência

humanitária. Refira-se que a Juliónia tinha obtido a independência uma

década atrás, na sequência do desmembramento da União das Repúblicas

Populares Nórdicas, que se fragmentou em vários Estados, sendo o maior

deles, que se assumiu e foi reconhecido como seu sucessor, a União

Nórdica.

Após uma resistência pouco mais que simbólica, as tropas da União Nórdica

ocuparam cerca de 40% do Território da Juliónia, onde foi declarada de

imediato a independência de duas novas repúblicas, imediatamente

reconhecidas pela União Nórdica, que se assumiu como aliada e protectora

de facto dos novos Estados. A Juliónia recorreu ao Conselho de Segurança

das Nações Unidas, mas deparou com o veto da União Nórdica.

Apesar dos protestos internacionais e de as novas repúblicas apenas serem

reconhecidas por mais cinco Estados muito dependentes economicamente

da União Nórdica, a situação não se alterou nos anos seguintes.

Responda às seguintes questões:

a) Licitude do uso da força pela União Nórdica?

b) Consequências jurídicas do não reconhecimento dos novos Estados?

c) Responsabilidade internacional dos Estados envolvidos, à luz de

critérios estritamente jurídicos?

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