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I WORKSHOP INTERAMERICANO
DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA
Realizado na Confederação Nacional da Indústria - CNI
27 DE OUTUBRO DE 2014
CENÁRIO, LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA
Cassio de Mesquita Barros Jr.
Advogado, Professor Titular aposentado da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo (USP), Ex-membro da Comissão de
Peritos na aplicação das normas internacionais do trabalho da
OIT (1990 – 2006)
2
I – CENÁRIO INTERNACIONAL
1 – As instituições internacionais do trabalho: razões de ser e tendências
Embora se reconheça que a estrutura social não é
favorável a criação de um sistema único de regras jurídicas escalonadas
segundo a fórmula clássica de “pirâmide”, há setores da vida social, como
acontece no domínio do trabalho e da atividade sindical onde as normas
surgem de um processo natural ou espontâneo de criação, que nem
sempre se sabe bem onde convém situá-las se no interior do mundo
fechado do Estado ou, ao contrário, colocá-las na dependência das
exigências da comunidade internacional.
Hoje em dia não se pode deixar de considerar os
elementos sócio econômicos, sendo mesmo incompreensível
prescindirmos do condicionamento da realidade social.
A interdependência internacional aumentou de
modo notável nos últimos tempos e deve ainda aumentar. Os países não
vivem mais isoladamente e a palavra Estado só tem sentido em uma
sociedade internacional.
3
A verdade é que já não vivemos mais no universo
fechado do Estado, mas sim em um pluriverso baseado no pluralismo
interno, internacional e comunitário1.
Também não há no período moderno Estado que
não se considere democrático. Até mesmo os mais violentos
totalitarismos e ditaduras se auto denominam democracia.
Finalmente, se observa que a democracia tende
predominantemente a “obedecer em política a sentimentos” e não a uma
racionalidade2.
Em 1974 a Assembleia Geral da ONU aprovou
carta dos direitos e deveres econômicos dos Estados que contêm as
seguintes normas que tratam do tema:
“Capítulo 1º Fundamento das relações econômicas internacionais. As relações econômicas assim como as políticas e de outra natureza deverão ser governadas “inter alia” pelos seguintes princípios: .................................................................................... b) Igualdade soberana de todos os Estados; ....................................................................................
1 (Pablo Lucas Verdu – La Constituícion aberta y sus enemigos, Madrid, Ediciones Beramer S/A, 1993 in
Direito Constitucional, Celso D. de Albuquerque, Livraria e Editora Renovar Ltda., pag. 34) 2 (Alexis Torqueville, De la démocratie en Amérique, 1888, pg. 99 e seguintes; Michel Levy Freire,
Libraries Editers, Paris).
4
i) Compensação das injustiças que tenham sido produzidas pela força e que privem uma nação dos meios naturais necessários para o seu desenvolvimento normal; .................................................................................... Artigo 10. Todos os Estados são juridicamente iguais e, como membros iguais da comunidade internacional, têm o direito de participar plena e efetivamente no processo internacional de tomada de decisões para solução de problemas econômicos, financeiros e monetários mundiais, “inter alia”, por intermédio das organizações internacionais de acordo com as suas regras existentes e em evolução e de participar equitativamente dos benefícios daí resultantes.”
O direito a paz que os autores denominam de
“direitos a vocação humanitária” ou “direito de solidariedade” ou “novo
direito do homem”, ou ainda “direito de terceira geração”, quer dizer,
direitos humanos que são denominados coletivos: direito ao
desenvolvimento, direito a auto determinação dos povos e direitos da paz.
A paz é reconhecidamente mais um ideal do que
a realidade, mas a solução pacifica dos conflitos faz parte da tradição do
direito internacional3.
A solução pacifica dos conflitos está na carta da
ONU no art.2º, alínea 3, no sentido de que “todos os membros deverão
resolver suas controvérsias internacionais por meio pacíficos de modo que
não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacional”.
3 (Celso de Albuquerque Mello, Direito Constitucional Internacional, Livraria e Editora Renovar, 1944, pg.
135 e 136).
5
Os meios pacíficos são inúmeros: negociações
diplomáticas, bons ofícios, investigação, conciliação, regime de consulta,
solução judiciaria e arbitragem. A arbitragem está na tradição do direito
norte americano.
2) Evolução: internacionalização das ideias humanitárias
O estado atual da sociedade internacional é a de
um quadro de nações que se dispõem a resolver os problemas do trabalho
mediante a criação de órgãos internacionais para imporem regras
obrigatórias aos empregadores e assalariados, num esforço que inaugurou
o fim da 1ª grande Guerra Mundial, não negligenciando os problemas do
trabalho.
Realmente, a dureza das condições de trabalho
durante o período da revolução industrial motivaram o desenvolvimento
de certas ideias sociais que se concretizaram primeiramente pela procura
de uma regulamentação internacional destinada a suavizar a penúria de
certos trabalhadores e conduziram a concepção da Organização
Internacional do Trabalho – OIT.
Essas ideias tiveram uma inspiração humanitária,
mas a internacionalização da ação protetora surgiu rapidamente pelo
temor dos industriais e governos serem ao tomar medidas unilaterais,
serem confrontados com aumentos do custo da produção frente aos
demais países, quando as medidas fossem adotadas. Daí surgiram as
6
propostas de regulamentação internacional simultaneamente para todos
os diversos Estados.
Cronologicamente foi o industrial inglês Roberto
Owen que lançou a ideia de uma ação internacional propondo a criação de
uma Comissão do Trabalho no Congresso da Santa Aliança de 1918. Outras
propostas e chamamentos concretos dirigidos a distintos governos se
destinaram a impedir por sua vez a exploração da competência comercial
entre os países baseada na imposição de condições de trabalho diferentes
para cada um deles.
As iniciativas apareceram na França e foram
defendidas na Alemanha, Áustria, Bélgica. O reconhecimento da
necessidade de contar com uma suficiente preparação técnica para esses
fins levou em 1897 a reunião em Bruxelas de um primeiro Congresso
Internacional de Legislação do Trabalho, sob a inspiração do Professor
Ernesto Mahaim, logo seguido de um segundo Congresso em Paris em
1900, organizado por Artur Fountene, Diretor do Trabalho na França e
Charles Gide. Este congresso adotou os estatutos de uma Associação
Internacional para proteção legal dos trabalhadores e criou uma secretaria
internacional do trabalho com sede permanente em Basileia.
Outras reuniões se realizaram em 1844, 1855,
1905, 1906. Em 1910 a entidade fundada em Paris convocou uma nova
conferência com o objetivo de proibir o trabalho dos jovens na indústria e
a jornada de trabalho superior a 10 (dez) horas para as mulheres e
crianças. A primeira reunião técnica aprazada pela Associação teve lugar
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em 1913, mas a reunião diplomática não pode ser celebrada em virtude
da deflagração da primeira grande guerra em 1914 que durou até 1918.
Durante a guerra, todavia, organizações sindicais
de vários países tanto beligerantes como neutros promoveram reuniões,
conferências e congressos preconizando a criação de mecanismo de
legislação internacional com a inclusão de clausulas afirmando certos
direitos fundamentais dos trabalhadores em um futuro tratado de paz. A
essas conferências concorreram sindicalistas britânicos, franceses, belgas
e italianos dos países beligerantes do centro europeu e neutros, assim
como se realizaram congressos sindicais e socialistas em Londres 1918 e
em Berna em 1919.
As resoluções adotadas nessas reuniões também
advogavam a participação de representantes de trabalhadores na
conferência de paz, inspirando a redação de diversos projetos
governamentais principalmente na França e na Grã Bretanha tendentes a
elaboração de uma legislação internacional do trabalho, por ocasião do
Tratado de Paz.
3 – Criação da Organização Internacional do Trabalho
Durante as negociações do Tratado de Paz foi
constituída uma Comissão de Legislação Internacional do Trabalho
integrada por representantes de governos, sindicalistas, universitários,
presidida por Samuel Gompers, dirigente da Federação Americana do
8
Trabalho que em convenção anual que realizava na cidade de Filadélfia,
propôs a realização de um Congresso de trabalhadores por ocasião da
Conferencia de Paz. Essa comissão apresentou um projeto de criação de
um sistema normativo internacional que incluía as chamadas clausulas
trabalhistas com o caráter de princípios fundamentais de toda legislação
trabalhista internacional. Esse projeto tal como foi proposto, foi adotado
finalmente pela conferencia de paz inserido como parte XIII do Tratado de
Versalhes concluído em 1919.
Sobre a aplicação de regras idênticas as relações
de trabalho a uma pluralidade de países, vale conhecer a opinião dos
professores franceses Jean Rivero e Jean Savatier, a seguir reproduzidas:
“Poderia parecer paradoxal, à primeira vista, pretender dar aos problemas de trabalho soluções idênticas para uma pluralidade de Estados. Há de se sublinhar que o caráter necessariamente concreto do direito do trabalho, a diversidade de soluções vigentes dentro de u’a mesma nação, e a preocupação de modelar as regras sobre as realidades quando de Estado para Estado, os dados econômicos, humanos, técnicos climáticos são diferentes entre uns e outros, legislar para todos, parece uma tentativa não só utópica, mas contraria a própria natureza mesma do direito do trabalho. Se de fato são esses os dados, outras considerações jogam em sentido oposto. De uma parte a concorrência internacional não produz entre os Estados, em matéria de trabalho, o mesmo efeito que a concorrência interna entre empresas. A extensão de legislação ao menos avançados, os encargos sociais tem o risco de pesar sobre os preços e de colocar em desvantagem na competição econômica os Estados que asseguram aos seus trabalhadores uma proteção eficaz. Na
9
realidade a experiência infirma numa certa medida esse raciocínio. Os Estados com elevado nível de vida dos assalariados são, frequentemente, os mais poderosos da ordem econômica. Mas, sob o terreno psicológico e político, a afirmação de que a proteção dos trabalhadores é inerente a condição de um Estado civilizado, o peso da opinião internacional e dos órgãos que se manifestam sobre os governos nacionais, a definição de princípios comuns pode desempenhar um papel importante na melhoria dos regimes nacionais de trabalho. De fato, de outro lado, as legislações nacionais sofrem evolução paralela aos principais Estados industriais consagrados, com diferenças apenas de pormenores dos princípios e instituições análogas. De outra parte e talvez sobretudo, a ação do movimento operário, em muito boa hora, ultrapassou o quadro nacional; o internacionalismo é um aspecto fundamental do socialismo. Por imperfeitos que sejam os esforços dos “proletariados de todos os países” para “se unirem”, notadamente, engajados nas organizações sindicais internacionais, não há forma de se opor a internacionalização, à vista da opinião, os problemas do trabalho.”4 É oportuno anotar agora que a adoção da Declaração da
Filadélfia em 1944, registrou uma abertura que já vinha se anunciando,
em favor de uma temática muito mais ampla. As normas da OIT passaram
a abranger não só o direito do trabalho tradicional, senão questões de
primordial importância no campo dos direitos humanos, tais como o
emprego, as condições de vida, o desenvolvimento e o bem estar social.
As deliberações podem também acrescentar Resoluções adotadas pelas
4 Droit du Travail, Jean Rivero, Jean Lavatier, Ed. Presses Universitairs de France, 1984, págs. 293/295 –
Collection THEMIS dirigée par Maurice Duverger, DROIT
10
Conferências regionais, pelas Comissões da Indústria e concluir
regulamentos do tipo de higiene e segurança do trabalho que, portanto,
criam obrigações genéricas previstas na Constituição da OIT.
4 – Missão, natureza jurídica, competência
Os motivos que inspiraram a criação da OIT
contêm 3 (três) ideias básicas: 1ª) a paz universal e duradoura só pode
fundar-se na justiça social; 2º) é urgente a melhoria das condições de
trabalho de um grande número de pessoas devido a injustiça, privações e
misérias que geram um descontentamento que pode por em risco a paz e
harmonia universal; 3º) a falta de adoção de um regime humano de
trabalho, poderia travar os esforços dos demais para melhorar a sorte dos
trabalhadores de cada país. Esse programa de atividades já com uma lista
de temas trabalhistas, constituiu o programa da Organização Internacional
do Trabalho, como organismo intergovernamental destinado a examinar
todas as medidas trabalhistas de caráter econômico e financeiro em ação
conjunta com outras entidades internacionais, notadamente, com Fundo
Monetário Internacional e Banco Mundial em particular.
O Tratado de Versalhes no art. 387 estipulou que
os membros da Liga das Nações seriam também membros da OIT. Não
obstante, desde o começo, se estabeleceu, na prática, a autonomia da
entidade de aceitar como membros Estados como Alemanha e Áustria que
não pertenciam a Sociedade das Nações “SDN”, e autorizar que outro
Estado, a Argentina que se havia retirado da sociedade, mas que
11
continuaria como membro da OIT. O Brasil participou desde a fundação da
OIT. Os Estados Unidos da América do Norte se incorporou a OIT, em
1934.
5 – Estrutura
Desde o começo se decidiu que a OIT haveria de
contar com três órgãos principais: a “Conferência Internacional do
Trabalho”, Conselho de Administração e Escritório Internacional do
Trabalho, seguindo a característica oficial da estrutura que a distingue de
outros organismos de vocação universal que é a sua composição
tripartida. Cada delegação nacional está composta por 2 (dois)
representantes governamentais, 1 (um) dos trabalhadores e outro dos
empregadores que podem ser assistidos por conselheiros técnicos, no
máximo de dois para cada ordem do dia.
A Conferência se reúne habitualmente uma vez
por ano em Genebra, durante o período aproximado de três semanas, em
julho, a não ser quando for tratar de assuntos marítimos, hipótese em que
a conferência se reúne uma segunda vez.
A função básica da conferência é a discussão e
aprovação de instrumentos de caráter internacional normativo, a saber: as
Convenções e as Recomendações, cabendo-lhe ainda o controle das
convenções ratificadas pelos países membros.
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As Convenções e as Recomendações discutidas
no prazo mínimo de 2 (dois) anos só se tornam obrigatórias nos países
membros, se por eles ratificada pelos órgãos competentes, respeitando
assim a soberania de cada membro.
Os EUA não costumam ratificar formalmente as
Convenções adotadas pela OIT, mas reconhecidamente, é o país que na
prática mais obedece as disposições das Convenções aprovadas pela
Conferência.
As Recomendações tem o objetivo de permitir
uma compreensão cabal da economia e do alcance das Convenções. A ela
se deve recorrer para os efeitos de facilitar a sua correta interpretação,
conhecer os trabalhos preparatórios dos instrumentos, bem como
informes prévios, tais como as discussões que tiveram lugar na
Conferência com motivo de sua elaboração e adoção. Assim mesmo os
autores recorrem as opiniões sobre as Convenções e Recomendações dos
órgãos de controle, que no caso são a Comissão de Expertos na aplicação
dos Convênios e Recomendações e a Comissão de liberdade sindical. A
Comissão de Expertos prepara a cada ano, interessante estudos gerais
sobre a aplicação das normas internacionais do trabalho, e em várias
oportunidades sobre os instrumentos dedicados aos direitos humanos.
Esses estudos constitui uma fonte valiosa na que se resumem as opiniões
dessa Comissão sobre a interpretação que se deve dar a essa norma. Por
sua parte, a Comissão de Liberdade Sindical do Conselho de
administração, antes sempre presidida pelo eminente jurista italiano
Roberto Ago, que elaborou uma jurisprudência, cujo conhecimento é
13
indispensável para o cabal entendimento das normas básicas adotadas
pela OIT, em matéria de liberdade sindical.
O trabalho da Comissão de Expertos como o da
liberdade sindical tem sido qualificada de “casi judiciais”, em virtude das
condições de imparcialidade, independência e objetividade com que esses
órgãos realizam suas funções. Posso atestar essas preocupações da
Comissão de Expertos, porque a ela pertenci por 16 (dezesseis) anos.
Seu pessoal é constituído por funcionários
provenientes de mais de 100 (cem) países, com Estatuto próprio e que
não devem receber instruções de seus países nem de outras organizações.
Além dos órgãos principais a entidade realiza
reuniões regionais que completam as suas atividades. O tripartismo da OIT
constitui sua verdadeira força pela autoridade de geralmente contarem
com o apoio maioritário de seus 3 (três) setores. Os métodos de ação da
OIT podem incluir 3 (três) grupos principais: o normativo, o de cooperação
técnica e o de investigação e divulgação. A cooperação técnica é
concedida ao país interessado e se concentra na formação profissional, no
emprego, no desenvolvimento, incluídas as atividades setoriais, as
atividades de meio ambiente de trabalho, as relações profissionais e
legislação do trabalho, administração do trabalho, seguridade social, de
educação operária e de ajuda as organizações empregadoras. A principal
fonte de recursos da OIT são os programas das nações unidas de
desenvolvimento, em menos medida do fundo monetário das nações
14
unidas para atividades em matéria de população, Banco Mundial e Bancos
Regionais para o desenvolvimento5.
Assim é que, a OIT foi a resposta internacional ao
desejo de milhões de pessoas em melhorar as condições de vida e do
trabalho e através de todas essas décadas e desde 1919 apresenta um
conjunto de normas internacionais ratificadas pelos nossos países e
constituem compromissos obrigatórios e iniludíveis cujo o objeto é
proteger o valor humano fundamentais para a harmonia e progresso
social de nossas comunidades e a convivência internacional, como
acentua José Maria Ruda, Presidente da Comissão de Expertos na
Aplicação de Convenções e Recomendações da OIT, no prologo da obra de
Geraldo W. Von Potobsky e Héctor Bartolomei de la Cruz, obra citada.
6 – Autonomia
Acordo de 30 de maio de 1946, entre a ONU e a
OIT tornou este órgão uma entidade especializada das Nações Unidas com
toda autonomia de administração, financeira e de programa de atividades.
5 La Organización Internacional del Trabajo, Geraldo W. Von Potobsky e Héctor G. Bartolomei de La Cruz,
Editorial Astrea de Alfredo y Ricardo Depalma, 1998, pags. 3 a 16.
15
7 – Negociação coletiva voluntária
A OIT mediante Convenções nº 98 sobre o direito
de sindicalização de negociação coletiva e nº 154 de fomento à
negociação coletiva, estabelece que se devem adotar medidas adequadas
as condições nacionais para estimular e fomentar a negociação voluntária
entre empregados e os empregadores, com o objetivo de regulamentar,
por meio de contratos coletivos as condições de emprego. Destaca a
voluntariedade que constitui um elemento que revela o espírito da grande
importância a utilização da livre negociação que destaca o princípio geral
enunciado pela Comissão de Liberdade Sindical como elemento essencial
a liberdade sindical. O Sindicato deve ter o direito mediante negociação
coletiva melhorar as condições de vida e de trabalho sem a intervenção
das autoridades públicas.
O texto da Convenção nº 98 ratificada pelo Brasil
em 18 de novembro de 1952, pelo Decreto nº 33.196, de 29 de junho de
1953, enfatiza que os trabalhadores devem gozar de proteção adequada
contra quaisquer atos atentatórios a liberdade sindical em matéria de
emprego. Essa proteção deverá particularmente aplicar-se aos atos
destinados a subordinar o emprego a condição de não se filiar ao
Sindicato, a dispensar o trabalhador em virtude de sua filiação ou
participação em atividades sindicais fora do horário de trabalho, ou
durante essas horas desde que autorizado pelo empregador. A proteção
há de abranger os atos de ingerência destinados a interferir nas
organizações de trabalhadores. O art. 5º, da Convenção nº 98 ressalva que
as garantias nela conferidas, se aplicarão as forças armadas e a polícia
16
mediante lei nacional, não tratando da situação específica dos
funcionários públicos a serviço do Estado. O texto é explícito no sentido de
prever a atuação intermediária no recrutamento e mão de obra por fim de
obter ou conservar o emprego.
Na Convenção nº 154 ratificada pelo Brasil, e
incorporada ao direito nacional pelo Decreto 1256, de 9 de setembro de
1994 se refere ao estimulo que todas as nações do mundo ao
reconhecimento solene do direito de negociação coletiva tendo em
consideração, que esse principio é aplicável a todos os povos. A
Convenção faz uma remição expressa as normas contidas na Convenção
sindical e de proteção do direito de sindicalização de 1948, a Convenção
sobre o direito de sindicalização de 1949, a Recomendação de 1951 sobre
conciliação e arbitragem voluntárias e a Convenção e recomendação sobre
relações de trabalho na administração pública de 1978, considerando que
se deve produzir os maiores esforços para realizar os objetivos dessas
normas. Adota diversas proposições relativas ao incentivo de negociação
coletiva. A Convenção 154 no art. 2º enfatiza que a expressão de
negociação coletiva compreende todas as negociações que tem o lugar
entre o empregador, grupo de empregadores com uma organização ou
várias de trabalhadores, visando fixar condições de trabalho, regular as
relações entre empregados e empregadores. Se refere aos impedimentos
que possam existir por normas legais impróprias e a medida de autoridade
pública para estimular a prática da negociação.
Essas aludidas Convenções tem despertado
vários pronunciamentos da Comissão de peritos e da Comissão de
17
liberdade sindical a respeito dos princípios básicos de se negociar
livremente, da titularidade da negociação, do reconhecimento dos
Sindicatos, da intervenção das autoridades no processo de negociação, do
conteúdo das Convenções da legislação, do nível das negociações, da
aprovação das negociações coletivas de vários países, das medidas de
estabilização, especialmente em relação aos países ibero americanos,
especialmente em relação a exclusão da sindicalização no âmbito aos
empregados do Estado, especialmente o direito de greve, aos funcionários
públicos.
Não é preciso dizer que o campo das discussões a
respeito desses assuntos é muito vasto, podendo dar margem as várias
conferencias sobre o assunto.
8 – Panorama latino americano
O sistema de relações trabalhistas latino
americano é uma mistura de intervenção estatal e autonomia. A
importância da negociação coletiva varia muito de acordo com as
condições econômicas e sociais de cada país, que de uma ou de outra
maneira fazem presentes.
Durante muitos anos a intervenção ostensiva do
Estado acentuou o conflito trabalhista, pela preferencia dos enfoques
jurídicos e a adoção de um modelo descentralizado de negociações
coletivas, com o predomínio de relações trabalhistas referida apenas ao
trabalhador da vida privada, com a aplicação efetiva limitada ao
18
trabalhador industrial. Essas características pareciam anunciar uma
pequena participação das partes e uma atrofia do sistema que afetava a
liberdade sindical e as possibilidades.
O intervencionismo estatal obedeceu as
tradições centralizantes que tipificaram a vida institucional e política da
região. O interesse dos Estados era controlar o desenvolvimento das
relações coletivas e diminuir o volume de medidas de proteção sindical.
Tratava-se do legalismo produto dos enfoques codificadores herdados da
Espanha e de Portugal que preferiam evitar confrontações de escala
industrial ou nacional que afetassem a ordem pública.
A legislação decorrente do período da ditadura
Vargas do Brasil foi um exemplo claro desse controle da função normativa
principal. Somente na década de 1980 é que algumas dessas
características apresentasse uma tendência de revisão. Claro que é difícil
estabelecer apreciações que cubram o conjunto de países da região, por
isso mesmo os dedicados funcionários da OIT encarregados de estudar as
relações coletivas de trabalho na América Latina preferiram dividir a
região em quatro grupos de países. No primeiro grupo estavam os países
que pareceram ter alcançado o nível de desenvolvimento e maturidade
apreciável, vencendo períodos turbulentos e instituindo práticas idôneas.
O México e a Venezuela foram citados como exemplo nesse primeiro
grupo. A segunda categoria incluíram países como Chile e Uruguai e mais
recentemente Argentina, cujo sistema foi objeto de profundas revisões. O
terceiro grupo está representado pela Republica Dominicana, Equador e
19
Honduras, nos quais as relações trabalhistas se encontravam em fase de
formação.
O Brasil constituía por si só uma quarta categoria
num quadro de relações trabalhistas em que a consolidação das leis do
trabalho e os Tribunais do Trabalho desempenham um papel preeminente
sem paralelo com os demais países. Aqui a negociação coletiva tem de
fato pouca importância. Os demais países encontram-se no meio do
caminho entre alguns dos quatro grupos citados. Alguns países como na
Bolívia o setor mineiro, no Brasil o setor metalúrgico, na Colômbia o setor
público e no Peru o setor magistorial, são exemplos de países a meio
caminho.
A expansão das relações trabalhistas, a
agricultura e ao setor público, embora ainda encontrem sérios problemas
de aplicação nas áreas distantes dos centros urbanos.
É certo, todavia, a tendência ao comportamento
autônomo adquire cada vez mais força e se contrapõe a dependência da
ação estatal, se desenvolvendo muitas vezes à margem de um esquema
jurídico para controlar as relações coletivas. A verdade é que em alguns
países ou setores se encontram sinais exteriores dessa mudança, a saber:
1) expansão da negociação coletiva; 2) importância crescente da
conciliação como meio para a solução dos conflitos; 3) a disposição das
partes pela negociação coletiva em todos os países tem seguido uma
trajetória ascendente pela negociação coletiva. Em quase todos os países
há um aumento das convenções coletivas celebradas a cada ano.
20
No Brasil desde 1977 as regiões de São Paulo,
Belo Horizonte e Rio de Janeiro revelam uma intensa atividade de
negociação salarial e relativa a outras condições de trabalho. Também no
Chile e no Panamá foi reiniciado o processo de negociação, depois de uma
paralização de vários anos.
Procurando as razões que explicam o
crescimento das negociações coletivas, as principais são efetivamente 3
(três): 1) os códigos do trabalho que vigoraram por tantos anos estão
envelhecendo, e se mostram insuficientes para atender todos os
problemas trabalhistas; 2) aumento do número da média e grandes
empresas, em consequência dos grandes processos de industrialização; 3)
as partes, empregadores e trabalhadores, parecem dispostos a romper a
tradição paternalista e individualista.
Os participantes do sistema demonstram maior
interesse em recorrer a negociação coletiva como complemento natural
dos códigos, pois permite atender com flexibilidade as condições do
mundo trabalhista em transformação.
É certo que o desenvolvimento dos países e a
dinâmica das relações coletivas, ao contrário da regulamentação produto
da intervenção coletiva, abriu margem a uma atuação diferente. A
Espanha, o Estatuto dos Trabalhadores anunciou claramente a passagem
da regulamentação do Estado para autônomo o que não aconteceu na
América Latina. Os autores mencionados abrem uma única exceção ao
Brasil, cujo governo consciente pelas transformações ocorridas e do
21
anacronismo de um regime institucional, cujas origens remontam a Carta
Italiana del Lavoro de 1927, tentou incluir em 1983 importante mudanças
legislativas. As primeiras medidas tomadas a esse respeito procuravam
estimular as negociações diretas, previam a criação de um serviço nacional
de Mediação e arbitragem. Contudo, essas medidas não foram aceitas
pelos atores sociais e tornaram-se na prática letra morta, parecendo hoje
no meio trabalhista que nunca existiram6.
9 – Solução dos conflitos trabalhistas
No mundo do trabalho a análise comparativa dos
sistemas jurídicos de solução dos conflitos, e o papel da negociação, não é
predominante e a maior parte dessas sociedades, tem na legislação o
papel predominante. No mundo do trabalho, nas sociedades em que
predominam as leis escritas e os códigos de direito, o fator demográfico e
a complexidade da sociedade moderna tornam o cumprimento das leis
um alto custo econômico. O poder judiciário para garantir os
cumprimentos das leis necessita de órgãos judiciais de fiscalização e se
tornam aparatosos, cada vez mais numerosos e disseminados pelo país.
As primeiras deliberações sobre as soluções dos
conflitos trabalhistas adotadas pelos estados americanos, membros da
OIT, realizada no México em 1946 e repetida em Montevideo em 1949,
6 As relações coletivas de trabalho na américa latina, publicado sob a direção de Efrén
Cordova, LTr Ltda., 1985, pág. 32
22
faziam uma nítida distinção entre as duas modalidades de conflitos
trabalhistas: 1) conflitos econômicos ou de interesse cuja solução deveria
ser confiada a órgãos de conciliação e arbitragem estabelecidas pelas
próprias partes; 2) conflitos jurídicos, cuja solução poderia ser confiada a
órgãos judiciais.
Poucos os países ibero americanos seguiram
essas prudentes recomendações. O Brasil, por exemplo, organizou em
1941 a Justiça do Trabalho não tomando em consideração as
recomendações da OIT. A competência da Justiça do Trabalho do Brasil se
abriu para as duas modalidades de conflitos, criando uma situação
paradoxal com uma competência de juízes de formação jurídica para
julgarem conflitos de interesses econômicos. Não tardou para que o Brasil
se tornar-se famoso como por ter atualmente 3 milhões de litígios
individuais e coletivos e o Poder Judiciário sofrendo uma crise sem
precedentes que sente a falta de recursos materiais sempre insuficientes.
Esse volume impressionante de reclamações com improprio desempenho
dos juízes inaugurando uma inseguridade jurídica que se soma as demais
inseguridades que sofre o povo brasileiro.
9 – Considerações finais
De todo o exposto, resulta claro que a
negociação coletiva, como forma autônoma de ação dos protagonistas
sociais passa em todos os países, à luz das recomendações dos órgãos
internacionais, a desempenhar papel de maior importância, muitas vezes
à margem do próprio sistema intervencionista. A Espanha o Estatuto dos
23
Trabalhadores anuncia, claramente, a passagem da regulamentação do
Estado para a autônoma. Na América Latina não se encontra ainda
nenhum exemplo que antecipe de forma similar a mudança para o
comportamento autônomo.
A lição da excelência negociação coletiva foi a
que aprendi tanto na área internacional, na Universidade e no exercício da
advocacia.