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IDENTIFICANDO PONTOS DE MELHORIA DO DESEMPENHO AMBIENTAL DE AUTOMÓVEIS PARA O BRASIL: ALÉM DOS IMPACTOS DURANTE O USO Ernani Francisco Choma, Cássia Maria Lie Ugaya. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. RESUMO Veículos elétricos (VEs) são vistos como uma das potenciais soluções para os problemas ambientais associados com os veículos de combustão interna (VCIs), tendo em vista as emissões de poluentes durante sua utilização. VEs, no entanto, também causam impactos ambientais desde a extração de recursos ao descarte final do produto (ciclo de vida), além do aumento no consumo de eletricidade. Estudos de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) realizados para avaliar os impactos ambientais de VEs em outros países mostram que a fonte de eletricidade é significativa para determinar se estes apresentam melhores resultados que VCIs. O caso brasileiro, contudo, pode apresentar resultados diferentes, em função da matriz elétrica diferente e da possibilidade de utilização de etanol pelos VCIs. O objetivo geral deste estudo é identificar como atender a demanda por transporte de pessoas por automóveis com menor impacto ambiental no Brasil. Para realizar o estudo, foram realizadas quatro etapas: (i) coletar dados; (ii) identificar a fonte de energia elétrica; (iii) realizar ACV dos veículos; e (iv) identificar pontos de melhoria para os veículos. Foram considerados dois horizontes de tempo: 2022 e 2030. Os resultados de ACV para 2022 mostraram que, com recarga em horários de menor demanda, o VE é melhor para algumas categorias de impacto e o VCI melhor para outras. Foram identificadas oportunidades de melhoria para tornar os VEs melhores em todas as categorias avaliadas, tais como a utilização de baterias de lítio e o gerenciamento dos resíduos sulfídricos gerados durante a produção do VE e de seus componentes. Conclui-se que há potencial de redução de impactos por meio da utilização de VEs, sendo necessária uma avaliação de todo o ciclo de vida, e não somente da fase de uso, para verificar quais medidas são eficazes para atingir tal objetivo. Também seria possível avaliar medidas para reduzir os impactos dos VCIs, tal como a utilização de etanol de segunda e/ou terceira geração, não avaliados neste estudo. Aplicabilidade Entre as aplicabilidades do presente estudo destacam-se as aplicabilidades no âmbito das políticas públicas e do desenvolvimento de produtos. A identificação de potenciais de melhoria permite estabelecer políticas para incentivar os VEs de modo a reduzir os impactos ambientais associados ao transporte de passageiros por automóveis. Quanto ao desenvolvimento de produtos, é apresentado como os resultados podem ser utilizados para identificar pontos a serem melhorados que tornem o VE melhor para todos os impactos ambientais avaliados.

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IDENTIFICANDO PONTOS DE MELHORIA DO DESEMPENHO AMBIENTAL DE AUTOMÓVEIS PARA O BRASIL: ALÉM DOS IMPACTOS DURANTE O USO Ernani Francisco Choma, Cássia Maria Lie Ugaya. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. RESUMO Veículos elétricos (VEs) são vistos como uma das potenciais soluções para os problemas ambientais associados com os veículos de combustão interna (VCIs), tendo em vista as emissões de poluentes durante sua utilização. VEs, no entanto, também causam impactos ambientais desde a extração de recursos ao descarte final do produto (ciclo de vida), além do aumento no consumo de eletricidade. Estudos de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) realizados para avaliar os impactos ambientais de VEs em outros países mostram que a fonte de eletricidade é significativa para determinar se estes apresentam melhores resultados que VCIs. O caso brasileiro, contudo, pode apresentar resultados diferentes, em função da matriz elétrica diferente e da possibilidade de utilização de etanol pelos VCIs. O objetivo geral deste estudo é identificar como atender a demanda por transporte de pessoas por automóveis com menor impacto ambiental no Brasil. Para realizar o estudo, foram realizadas quatro etapas: (i) coletar dados; (ii) identificar a fonte de energia elétrica; (iii) realizar ACV dos veículos; e (iv) identificar pontos de melhoria para os veículos. Foram considerados dois horizontes de tempo: 2022 e 2030. Os resultados de ACV para 2022 mostraram que, com recarga em horários de menor demanda, o VE é melhor para algumas categorias de impacto e o VCI melhor para outras. Foram identificadas oportunidades de melhoria para tornar os VEs melhores em todas as categorias avaliadas, tais como a utilização de baterias de lítio e o gerenciamento dos resíduos sulfídricos gerados durante a produção do VE e de seus componentes. Conclui-se que há potencial de redução de impactos por meio da utilização de VEs, sendo necessária uma avaliação de todo o ciclo de vida, e não somente da fase de uso, para verificar quais medidas são eficazes para atingir tal objetivo. Também seria possível avaliar medidas para reduzir os impactos dos VCIs, tal como a utilização de etanol de segunda e/ou terceira geração, não avaliados neste estudo. Aplicabilidade Entre as aplicabilidades do presente estudo destacam-se as aplicabilidades no âmbito das políticas públicas e do desenvolvimento de produtos. A identificação de potenciais de melhoria permite estabelecer políticas para incentivar os VEs de modo a reduzir os impactos ambientais associados ao transporte de passageiros por automóveis. Quanto ao desenvolvimento de produtos, é apresentado como os resultados podem ser utilizados para identificar pontos a serem melhorados que tornem o VE melhor para todos os impactos ambientais avaliados.

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Objetivo

O objetivo geral do presente trabalho é analisar como atender a demanda por transporte de pessoas por automóveis com menor impacto ambiental no Brasil. 1. Introdução

Os impactos ambientais têm sido cada vez mais discutidos em diferentes setores da economia, inclusive nas políticas governamentais brasileiras. No caso do planejamento energético, a discussão já é antiga. No Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2022, que inclui também o consumo energético no setor de transportes, se observa uma preocupação ambiental, especialmente com as emissões de gases de efeito-estufa (GEE)s [1]. São considerados quantitativamente, contudo, apenas GEEs e dados de ocupação da terra, não sendo considerados impactos desde a extração de recursos ao descarte final do produto (ciclo de vida). Mais particularmente, espera-se que a frota de veículos leves tenha um grande crescimento, de 5,9% ao ano, e um grande crescimento no número de veículos novos licenciados, de 3,6% ao ano, ambos para o horizonte decenal, chegando a 59,3 milhões de veículos leves em 2022 [1, p. 54]. Este grande aumento e substituição da frota por veículos novos possibilita a substituição de grande parte da frota por veículos de tecnologia diferente, por exemplo, a adoção de veículos elétricos (VE)s. As vantagens dos automóveis elétricos considerando-se as emissões de veículos durante o uso são atrativas, já que previsões indicam que a contribuição dos automóveis para o total de emissões de CO2 do setor de transporte rodoviário ocorridas no escapamento deve chegar a 37% em 2020 [2]. No entanto, os VEs causam impactos ambientais decorrentes do ciclo de vida, podendo ser mais prejudiciais em algumas condições. Para tanto, almeja-se com este estudo evitar efeitos colaterais negativos com o uso de VEs, identificando-se alternativas para que o desempenho ambiental destes automóveis não apenas reduza as emissões de poluentes durante o uso, como em todo o ciclo de vida.

2. Impactos Ambientais de VEs.

A Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) é uma técnica que permite a quantificação de impactos ambientais potenciais de produtos e serviços ao longo do ciclo de vida, desde a extração de matéria-prima até a disposição final [3]. No intuito de avaliar os impactos da adoção de VEs na frota, vários estudos de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) já foram realizados para outras regiões e

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países. Uma revisão de vários estudos de ACV de VEs concluiu que os VEs utilizando eletricidade proveniente de termelétricas a carvão possuem menor impacto para aquecimento global que VCIs pouco eficientes, mas maior impacto que VCIs de alta eficiência [4]. Os autores também concluíram que VEs utilizando eletricidade proveniente de fontes cujos impactos para aquecimento global são baixos são melhores, para esta categoria, do que veículos de combustão interna (VCI)s [4].

Um estudo posterior comparou VCIs a gasolina ou diesel com VEs utilizando dois tipos de bateria de lítio em uma ACV com informações detalhadas da indústria para materiais e massas e dados dos demais processos da base de dados do ecoinvent v.2.2 [5]. Os resultados mostraram que VEs utilizando eletricidade proveniente de termelétricas a carvão têm impactos maiores que os VCIs para a maioria das categorias de impacto e que poucos benefícios são observados no caso da utilização de termelétricas utilizando gás natural. Os autores concluíram que seria contraproducente promover VEs em regiões nas quais a eletricidade é gerada a partir de carvão, óleo ou lignito. Neste estudo, os autores também apontam que a produção do VE e da bateria possuiu quase o dobro do impacto, para aquecimento global, do que a produção do VCI, sendo necessária a consideração de todo o ciclo de vida para um resultado mais preciso [5].

As diferenças do caso brasileiro são a fonte de eletricidade, proveniente majoritariamente de hidrelétricas, e os VCIs flex-fuel, que podem utilizar etanol, gasolina tipo C ou uma mistura de ambos. Considerando que os estudos mostram que os dados que mais impactam os resultados são a fonte de eletricidade e a eficiência dos VCIs, os resultados dos estudos anteriores não podem ser adotados no contexto brasileiro. Em um caso mais similar ao brasileiro em termos de geração de eletricidade, um estudo avaliando a introdução de VEs na frota norueguesa, utilizando a produção de veículos com base em [5] e o ecoinvent v. 2.2, mostrou que VEs podem reduzir os impactos de aquecimento global da frota em até 15% caso a penetração no mercado chegue a 39%, devido ao fato de as hidrelétricas serem a principal fonte de eletricidade na Noruega [6]. Os autores também observaram um aumento substancial nos impactos para toxicidade neste cenário com grande número de VEs, de 72% e 57% para toxicidade humana e ecotoxicidade de água doce, respectivamente [6]. Este estudo, no entanto, não considerou VCIs a etanol. Além disso, reservatórios de hidrelétricas em regiões tropicais, como os reservatórios no Brasil, têm maiores emissões de GEE que reservatórios em regiões temperadas [7]. VCIs utilizando etanol também foram comparados com VEs em outros países. Um estudo para os Estados Unidos mostrou que veículos híbridos plug-in (VEHP)s apresentaram melhores resultados que híbridos sem capacidade plug-in e VCIs a gasolina [8]. Já no caso do etanol, o estudo também mostrou que, embora haja uma redução dos impactos no caso da utilização de gasolina com 85% de etanol celulósico, seriam necessários de 50 a 100 milhões de hectares para atender 25% da frota [8]. VCIs a etanol também

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foram avaliados para o caso da China [9]. Neste estudo, VEs podem apresentar apenas redução limitada na utilização de combustíveis fósseis ao longo do ciclo de vida, e podem até não reduzir as emissões de GEE ao longo do ciclo de vida, utilizando a matriz de eletricidade chinesa – altamente dependente de carvão – se comparados com VCIs a gasolina ou diesel [9]. Este estudo já inclui também VCIs utilizando diferentes tipos de etanol, incluindo etanol de cana-de-açúcar, este último apresentando impactos menores que os VEs utilizando a matriz elétrica chinesa tanto para emissões de GEE quanto para uso de combustíveis fósseis. Não obstante, na avaliação de opções para o longo prazo, os autores consideram que os VEs podem apresentar uma melhora significativa em ambas as categorias [9].

Estes estudos, no entanto, não incluem todas as categorias de impacto ambiental, focando apenas em mudanças climáticas e alguns outros tipos de impacto. Além disso, em [8] o etanol considerado não é de cana-de-açúcar, enquanto que, em comparação a [9], a produção de etanol no Brasil poderia ter impactos diferentes.

No Brasil, foram realizados estudos incluindo aspectos ambientais de veículos, que incluem: (i) cenários de adoção de VEs e estimativas de demanda energética e emissões de GEE, para o estado de São Paulo [10] e para o Brasil [11]; (ii) a avaliação da inclusão de VEHPs no Nordeste para aproveitamento de excedente de energia eólica [12]; (iii) ACV de automóveis no Brasil [13]; e (iv) comparação de VCIs a etanol e gasolina tipo C aplicando-se ACV [14]. Os três primeiros estudos, [11], [12] e [13], contudo, não incluíram ACV para avaliar os impactos ambientais decorrentes da adoção de VEs e os dois últimos, [13] e [14], não avaliaram VEs.

3. Método

Para realizar o estudo foram realizadas quatro etapas: (i) coletar dados; (ii) identificar a fonte de energia elétrica; (iii) realizar ACV dos veículos; e (iv) identificar pontos de melhorias para os veículos.

3.1 Dados gerais para o estudo

Com relação aos anos de projeção, foram adotados dois anos: 2022, o mesmo horizonte de tempo do PDE 2022 [1], e 2030, horizonte de mais longo prazo, já que assumiu-se que não seria possível haver grande penetração de VEs na frota dentro de um horizonte decenal. Como cenário base para 2022 utilizaram-se projeções de [1] com relação à energia, enquanto que para 2030 extrapolaram-se essas projeções para o período 2023-2030. Ainda que haja um plano governamental de expansão de longo prazo, o PNE 2030 [15], este foi publicado em 2007, de forma que optou-se por utilizar dados mais recentes, do PDE 2022 [1].

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Como opções de veículos, foram considerados os VEs e os VCIs flex-fuel utilizando etanol e/ou gasolina tipo C. Foram considerados apenas veículos novos. O VE utilizado como base foi o VE desenvolvido pela Itaipu Binacional em conjunto com outros parceiros [16]. As principais características deste veículo estão descritas no Quadro 1. Para 2022 considerou-se baterias de Na-NiCl2, conforme o Quadro 1, e também de íon de lítio, já que estas são mais amplamente utilizadas. Já para 2030 foram consideradas apenas baterias de lítio, já que apresentam maior potencial de aumento de densidade de energia, se comparadas com as de Na-NiCl2, de acordo com [17]. Para 2022 o cálculo do consumo de eletricidade do VE partiu da energia e eficiência da bateria e da autonomia do veículo, descritos no Quadro 1, resultando em 0,174 kWh/km [18]. Já para 2030 considerou-se um aumento na densidade de energia, para 200 Wh.kg-1, considerando a projeção para o futuro para baterias de Li-ion em [17]. Isto causa uma redução na massa da bateria e na massa do veículo, reduzindo o consumo de eletricidade. Utilizou-se então a equação de Bandivadekar et al. [19, p. 46], que tem como base os VCIs e foi obtida para estes, de forma que foi assumido que o mesmo desempenho que os autores observaram nos VCIs seria observado para os VEs. Isto resultou em um consumo de 0,168 kWh/km [20].

Motor elétrico Bateria

Tipo Assíncrono trifásico Tipo Sódio-Níquel-Cloro Potência nominal 15 kW (20 cv) Tensão 253 V Torque nominal 50 N·m Energia 19,2 kWh Potência máxima 28 kW (37.8 cv) Tempo de recarga 8 h Torque máximo 124 N·m (12.6 kgf.m) Peso 165 kgf Peso 41,5 kgf

a Perdas 8% Autonomia 120 km

a

Quadro 1 - Características do VE de Itaipu Binacional e parceiros. Fonte: [16, p. 12], exceto peso do motor e autonomia da bateria. a Fonte: [21].

Já para os VCIs foram estabelecidos os consumos de energia para os anos 2022 e 2030. Para 2022, partiu-se do consumo de veículos novos em 2009, de [2, p. 47] e considerou-se um aumento de eficiência de 0,7% ao ano, de [1, p. 54]. Para 2030 foram estabelecidas duas situações: 2030a e 2030b. Na primeira (2030a) o consumo foi obtido da mesma forma que para 2022, mas considerando o aumento de eficiência anual até 2030. Já na segunda situação (2030b) considerou-se que seria possível um máximo de redução de 50% (em l/km), com base em [22]. Esta redução de 50% (em relação a 2005) poderia ocorrer até 2030 com a inclusão de híbridos, mas sem a inclusão de híbridos plug-in ou VEs [22]. O consumo para 2005 foi obtido de [2, p. 47]. Este caso foi considerado como um máximo de eficiência para os VCIs, e foi assumido tanto para VCIs utilizando gasolina tipo C quanto para VCIs utilizando etanol. Os valores dos consumos estão descritos no Quadro 2.

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2005a 2009

a 2022 2030a 2030b

Consumo VCI gasolina tipo C [km/l] 11,5 12,0 13,1 13,9 23,0

Consumo VCI etanol [km/l] 7,7 8,0 8,8 9,3 15,4

Quadro 2 - Consumo dos VCIs em 2022 e em 2030, para os dois casos considerados. a Fonte: [2, p. 47].

Considerou-se para ambos os veículos, VEs e VCIs, uma vida útil de 150,000 km. Como distância percorrida anualmente, considerou-se a média dos primeiros nove anos (ano 0 a ano 8; assumindo uma utilização média de seis meses durante o ano 0) de [2, p. 95]. Considerou-se, desta forma, um total de 148.400 km percorridos no período, resultando em uma média de 17.459 km por ano. Isto é o equivalente a 47,8 km por dia ou 334,8 km por semana.

3.2 Fontes de energia elétrica

Avaliou-se a adoção de VEs no período decenal e para 2022 considerou-se que a matriz elétrica adequada, assumindo a recarga das baterias no período noturno, seria a matriz correspondente à expansão prevista pelas projeções governamentais no período, de acordo com a abordagem decisional de ACV, tendo como base [23]. A matriz utilizada (matriz decisional) está descrita no Quadro 3.

Fonte 2013-2022 (consumo) [%]

Hidro 72,48

Urânio 4,48

Gás Natural 3,13

Biomassa 2,53

Eólica 17,38

Quadro 3 - Matriz decisional de eletricidade, considerada para 2022. Fonte: [18].

Para 2030, horizonte temporal mais longo, foram avaliadas quais seriam as possíveis fontes disponíveis para este ano, com base também em dados governamentais, principalmente a respeito de fontes já utilizadas e também de reservas disponíveis atualmente [24], considerando a previsão de consumo até 2030 e verificando para quais haveria disponibilidade. As fontes consideradas foram hidrelétricas e térmicas a partir de bagaço de cana, gás natural (ciclo combinado), carvão, óleo diesel e óleo combustível.

3.3 ACV dos veículos

Para a realização da ACV, foi considerada como unidade funcional o transporte de uma pessoa por 1 km (1 pkm), o que resulta numa utilização (fluxo de referência) de (1/240.000) veículo, assumindo-se uma vida útil de 150.000 km e uma ocupação média de 1,6 pessoas. Considerou-se um sistema de produto “do berço ao túmulo”, isto é, da extração das matérias-primas até a disposição final. Foi utilizada a base de dados de inventário internacional do ecoinvent v.3.01 [25].

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Como esta base é internacional, os conjuntos de dados em muitos casos não são específicos para o Brasil (i.e. são referentes a processos produtivos em outros países) e podem não representar a realidade brasileira, de forma que foi necessário realizar algumas adaptações. As adaptações realizadas referem-se, entre outros, aos itens mais significativos identificados e também aos itens faltantes na base do ecoinvent v.3.01, como o VCI a etanol de cana de açúcar. Adicionalmente, a produção de alguns itens foi adaptada substituindo-se a matriz de eletricidade utilizada no ecoinvent v.3.01 pela matriz brasileira, assumindo que esses ocorrem ou poderiam, no futuro, ocorrer no Brasil. As principais adaptações estão descritas no Quadro 4, sendo o inventário detalhado encontrado em [18].

Veículo Fase Adaptação Fonte

VCI uso emissões atmosféricas e consumo

de combustível Brasil (2011) [2]

VCI

(etanol) uso produção da cana Cavalett et al. (2013) [14]

VE uso matriz de eletricidade Conforme considerado na subseção 3.2

deste estudo

VE uso consumo de eletricidade Conforme as fontes indicadas na subseção

3.1 deste estudo

Quadro 4 - Principais adaptações realizadas na base de dados do ecoinvent v.3.01. Fonte: Com base em [18], [20] e [26].

O software SimaPro v.8.0.2 [27] foi utilizado para os cálculos. O método de avaliação de impacto do ciclo de vida utilizado foi o CML 2000 v.2.05, disponível no SimaPro v.8.0.21.

3.4 Resultados de ACV e oportunidades de melhoria

Com base nos resultados da ACV, foram identificadas oportunidades de melhoria. Estas oportunidades foram identificadas a partir da identificação de processos que são significativos, em termos de impactos ambientais, ao longo do ciclo de vida dos veículos.

4. Resultados

Nesta seção são apresentados os resultados obtidos. Na subseção 4.1 são apresentados os resultados de ACV, na subseção 4.2 são apresentadas oportunidades de melhoria identificadas e, por fim, na subseção 4.3 é apresentado um resultado de ACV para verificação da eficácia de uma das oportunidades identificadas.

1 O método CML utilizado já está implementado no software SimaPro 8.0.2, tendo como base a

seguinte referência: Guinée, J. B. et al. 2001. Handbook on life cycle assessment. Operational guide to the ISO standards Volume 1, 2a, 2b and 3.

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4.1 Resultados de ACV

Os resultados da ACV dos veículos para 2022 para a categoria de aquecimento global estão ilustrados na Figura 1, para os VCIs utilizando diferentes combustíveis e para os VEs com baterias de Na-NiCl2 e utilizando a matriz de eletricidade decisional. Observa-se que o VE apresenta menor impacto para esta categoria, seguindo pelo VCI utilizando etanol. Observa-se que o VCI a gasolina tipo C apresenta impacto superior ao dobro do impacto observado para o VE utilizando a matriz decisional.

Figura 1 - Resultados para aquecimento global para 2022. Fonte: Resultados de [18]. Legenda: Legenda: VE(D) = VE utilizando a matriz de eletricidade decisional; VCI(E) = VCI utilizando etanol; VCI(G) = VCI utilizando gasolina tipo C; VCI(M) = VCI utilizando a proporção média de etanol e gasolina utilizada pela frota, estimada para 2022.

O resultado da Figura 1, no entanto, mostra apenas uma categoria de impacto: aquecimento global. A avaliação e possível tomada de decisão com base em apenas uma categoria poderia causar aumentos em outros tipos de impacto. Desta forma, é necessário avaliar outras categorias. Os resultados indicando os veículos com menor e maior impacto considerando-se todas as categorias de impacto do método de avaliação de impacto utilizado estão descritos no Quadro 5, considerando-se os mesmos veículos avaliados na Figura 1. Nota-se que, embora os VEs utilizando a matriz decisional apresentem o menor impacto para aquecimento global e também para outras três categorias (depleção de recursos abióticos, depleção da camada de ozônio e ecotoxicidade de água doce), eles também apresentam maiores impactos para as outras categorias, se comparados aos VCIs. Em quatro categorias, contudo, os VEs apresentam o maior impacto. No caso das categorias de impacto de eutrofização e ecotoxicidade

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Categoria de impacto: Aquecimento global

Imp

acto

VE(D)

VCI(E)

VCI(M)

VCI(G)

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terrestre, o VE decisional possui menor impacto que o VCI a etanol mas maior impacto que o VCI a gasolina tipo C. Desta forma, a simples adoção do VE com o estado de tecnologia considerado para 2022 reduziria os impactos em algumas categorias às custas de aumentar os impactos em outras categorias.

Categoria de impacto Veículo com menor impacto (2022)*

Veículo com maior impacto (2022)*

Depleção de recursos abióticos VE(D) VCI(G)

Acidificação VCI(G) VE(D)

Eutrofização VCI(G) VCI(E)

Aquecimento global VE(D) VCI(G)

Depleção da camada de ozônio VE(D) VCI(G)

Toxicidade humana VCI(G) VE(D)

Ecotoxicidade de água doce VE(D) VCI(E)

Ecotoxicidade marinha VCI(G) VE(D)

Ecotoxicidade terrestre VCI(G) VCI(E)

Oxidação fotoquímica VCI(G) VE(D)

Quadro 5 - Resultados de ACV para 2022. Fonte: Com base nos resultados de [18]. *Considerando os mesmos veículos da Figura 1. Legenda: Legenda: VE(D) = VE utilizando a matriz de eletricidade decisional; VCI(E) = VCI utilizando etanol; VCI(G) = VCI utilizando gasolina tipo C; VCI(M) = VCI utilizando a proporção média de etanol e gasolina utilizada pela frota, estimada para 2022.

Já para 2030, os resultados indicando os veículos de maior e menor impacto estão indicados no Quadro 6, no qual foram selecionados os VEs utilizando eletricidade proveniente de hidrelétricas e de bagaço de cana, em adição aos VCIs no caso de eficiência 2030a. Embora tenham sido avaliadas outras fontes possíveis de energia para o VE, tal como eletricidade proveniente de termelétricas a carvão ou óleo combustível, a utilização destas acarretaria em aumentos nos impactos do VE para várias categorias. Os resultados são similares aos de 2022, já que foi utilizado o mesmo inventário, apenas com pequenas alterações. A exceção é que para 2030 foram consideradas apenas baterias de lítio. Uma diferença observada nos impactos, em relação aos resultados para 2022, ocorreu para a categoria de acidificação.

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Categoria de impacto Veículo com menor impacto (2030)*

Veículo com maior impacto (2030)*

Depleção de recursos abióticos VE(H) VCI(G;2030a)

Acidificação VE(H) VCI(E;2030a)

Eutrofização VCI(G;2030a) VE(B)

Aquecimento global VE(H) VCI(G;2030a)

Depleção da camada de ozônio VE(H) VCI(G;2030a)

Toxicidade humana VCI(G;2030a) VE(B)

Ecotoxicidade de água doce VE(H) VCI(E;2030a)

Ecotoxicidade marinha VCI(G;2030a) VE(B)

Ecotoxicidade terrestre VCI(G;2030a) VE(B)

Oxidação fotoquímica VCI(G;2030a) VE(B)

Quadro 6 - Resultados de ACV para 2030. *Considerando os seguintes veículos: VE(H), VE(B), VCI(E;2030a) e VCI(G;2030a). Legenda: VE(H) = VE utilizando eletricidade de hidrelétricas; VE(B) = VE utilizando eletricidade de termelétricas a bagaço de cana; VCI(E;2030a) = VCI a etanol, caso de eficiência 2030a; VCI(G;2030a) = VCI a gasolina tipo C, caso de eficiência 2030a.

4.2 Oportunidades de melhoria

No intuito de tornar o VE melhor em todas as categorias de impacto do método selecionado, seriam necessárias algumas medidas. Considerando os resultados para 2022, para a categoria de impacto de acidificação o níquel presente na bateria de Na-NiCl2 é responsável por boa parte dos impactos. Desta forma, uma opção seria trocar o tipo de bateria, por exemplo, mudando para uma bateria de lítio. Não obstante, seria necessário realizar a ACV novamente de modo a verificar se essa bateria também não possui grande impacto para acidificação, ou para outras categorias, para assegurar que tal medida diminua o impacto para acidificação sem causar grandes aumentos de impactos em outras categorias, possivelmente tornando o VE pior que o VCI nestas. Considerando também os resultados para 2022, para toxicidade humana, eutrofização, ecotoxicidade marinha e ecotoxicidade de água doce, o tratamento dos resíduos sulfidricos oriundos da produção de placas de circuito impresso e circuitos integrados, utilizados em maior quantidade no VE, é responsável pela maior parte dos impactos ao longo do ciclo de vida do VE. Desta forma, embora estes dados relativos à produção do VE sejam em grande parte referentes à produção de VEs (e seus componentes, mais precisamente na produção de placas de circuito impresso e, também, circuitos integrados) em outros países, e não no Brasil, haveria a necessidade de gerenciar estes resíduos para diminuir os impactos. Isto poderia evitar que a adoção de VEs reduza impactos na fase de uso, ou em outras categorias (e.g. aquecimento global), às custas de aumentar o impacto nestas categorias. Também notou-se que o uso de cobre, utilizado em maior quantidade no VE, é significativo nestas categorias de impacto, de modo que uma outra medida possível seria a busca de materiais alternativos ou demais medidas de redução no uso de cobre. Por fim, para a categoria de oxidação fotoquímica, a emissão de eteno

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durante a manutenção do VE foi responsável por grande parte dos impactos. Também haveria a necessidade de gerenciar tais emissões para evitar que a adoção de VEs cause aumento de impactos para esta categoria. Observou-se também que a produção do veículo é bastante significativa em todas as categorias de impacto, inclusive nas quais o VE é menos impactante, para ambos os veículos: VEs e VCIs. Além da utilização de cobre, já mencionada, observou-se que a produção da carroceria e respectivas matérias-primas utilizadas, principalmente o ciclo de vida do aço, é significativa. Desta forma, embora existam oportunidades de melhoria para tornar o VE melhor em todas as categorias, existem situações que acarretam aumento de impactos para o VE, notadamente a substituição antecipada de VCIs por VEs, reduzindo a vida útil do veículo e aumentando os impactos referentes à sua produção. Neste caso, é necessário que medidas sejam tomadas para evitar tal cenário. Aumento de impactos também seria observado no caso da utilização de eletricidade proveniente de gás natural em maior intensidade. A utilização de eletricidade de gás natural poderia ocorrer em maior intensidade no caso de não haver planejamento antecipado para atender à demanda de eletricidade adicional dos VEs, assim como se a recarga da bateria ocorrer em horários de maior demanda. Para que isto não ocorra, é necessário que a recarga ocorra de fato em horários noturnos – de menor demanda no sistema – e que os VEs sejam incluídos no planejamento energético. Outro fator potencialmente significativo é o tamanho das baterias do VE, que está relacionado à autonomia destes. Neste caso, a fim de evitar aumento de impactos dos VEs em função do aumento do tamanho das baterias, uma medida seria incentivar primeiro a troca de veículos que necessitem de menor autonomia, como veículos que circulam apenas em áreas urbanas. Veículos que necessitem de maior autonomia poderiam ser viabilizados posteriormente, já que com avanços tecnológicos estima-se que vida útil das baterias pode ser aumentada no futuro [17] reduzindo o impacto associado a estas e permitindo, no futuro, veículos com maior autonomia sem acréscimo de impactos, se comparados ao caso base para 2022. Da mesma forma que foram investigadas oportunidades para os VEs, poderiam ser também propostas medidas para os VCIs. Como o impacto nas categorias para as quais o VCI apresenta impacto superior está bastante relacionado ao consumo de combustível, uma medida poderia ser o aumento de eficiência destes. Outra medida poderia ser a avaliação de novas tecnologias, como a utilização de etanol de segunda e/ou terceira geração, não avaliados no presente estudo.

4.3 Verificação da eficácia das oportunidades de melhoria

As oportunidades identificadas na seção 4.2 necessitam de avaliação para verificar a eficácia destas na redução dos impactos propostos.

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Também é importante verificar se alguma ação que vise a redução de impactos nestas categorias (por exemplo: a utilização de baterias de lítio, para redução no impacto para acidificação) não causaria aumentos de impactos em outras categorias, mesmo no caso de obter o resultado desejado para a categoria alvo (neste exemplo, reduzir os impactos para acidificação mas aumentar os impactos para outras categorias). Para tal verificação, é necessário realizar a ACV novamente considerando a medida proposta. O primeiro caso avaliado foi a utilização de baterias de lítio, considerando o horizonte de tempo para 2022. O resultado está mostrado na Figura 2, mostrando todas as categorias de impacto do método utilizado. Pode-se observar que a utilização da bateria de lítio, ao invés da bateria de Na-NiCl2, torna o VE melhor que o VCI menos impactante para esta categoria (VCI utilizando gasolina tipo C), sem causar grandes alterações nas outras categorias, se comparado ao VE utilizando a bateria de Na-NiCl2.

Figura 2 - Resultados da ACV para 2022, considerando também baterias de lítio. Fonte: Resultados de [18]. Legenda: VE(D) = VE utilizando a matriz de eletricidade decisional; VE (D/Li) = VE utilizando a matriz de eletricidade decisional e bateria de lítio; VCI (G) = VCI utilizando gasolina tipo C.

Também foram avaliados, para 2022, os impactos no caso de ocorrer a utilização de eletricidade proveniente de termelétricas a gás natural para a recarga das baterias dos VEs. O resultado está ilustrado na Figura 3, para todas as categorias de impacto do método utilizado. Pode-se notar que a utilização de gás natural acarreta em maiores impactos na maioria das categorias, em alguns casos significativamente maiores. Desta forma, medidas que causem a utilização mais intensa de gás natural para a recarga das baterias dos VEs devem ser evitadas.

0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%

100%

Imp

acto

VE(D)

VE (D/Li)

VCI(G)

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Figura 3 - Resultados para 2022, no caso da utilização de eletricidade de gás natural. Fonte: Resultados de [18]. Legenda: VE(D) = VE utilizando a matriz de eletricidade decisional; VE (GN) = VE utilizando eletricidade proveniente de termelétricas a gás natural (ciclo combinado).

Observa-se que, do mesmo modo que foram avaliadas opções para os VEs, poderiam ser avaliadas opções para reduzir os impactos dos VCIs. Neste caso foi avaliado o caso alternativo de eficiência discutido na seção 3.2, reduzindo pela metade o consumo de combustível dos VCIs (em l/km), o caso 2030b. Os resultados obtidos, contudo, mostraram que, embora haja redução de impactos com este grande ganho de eficiência, esta redução não é suficiente para tornar o VCI menos impactante que o VE. Tomando como base os resultados do Quadro 6, o VE utilizando eletricidade de hidrelétricas continua o veículo com menor impacto para as mesmas cinco categorias identificadas no Quadro 6, mesmo havendo este grande ganho de eficiência por parte dos VCIs. Para tornar os VCIs mais atrativos nestas categorias, portanto, seriam necessárias ainda outras medidas, como, por exemplo, a utilização de etanol de segunda e/ou terceira geração, que teriam que ser também avaliadas por meio da ACV. Por fim, observou-se que o avanço das baterias esperado para o período até 2030 considerado no estudo, com base em [17], já seria suficiente para reduzir bastante os impactos referentes à bateria, podendo proporcionar maior autonomia para os VEs sem que haja grande aumento de impactos.

0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%

100%

Imp

acto

VE(D)

VE(GN)

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CONCLUSÃO

Nos resultados para 2022, observou-se que o VE é melhor para as categorias de depleção de recursos abióticos, aquecimento global, depleção da camada de ozônio e ecotoxicidade de água doce. Quando comparado ao VCI a etanol, o VE apresentou-se melhor também para eutrofização e ecotoxicidade terrestre. O VE, contudo, resultou em maiores impactos para toxicidade humana, ecotoxicidade marinha e oxidação fotoquímica. Por fim, para acidificação o VE apresentou-se pior no caso da utilização de baterias de Na-NiCl2, mas isso poderia ser alterado no caso da utilização de baterias de lítio, tornando o VE como a melhor opção para esta categoria sem causar grandes aumentos de impactos nas outras categorias. A análise de diferentes categorias de impacto também mostrou a necessidade de se considerar impactos adicionais ao aquecimento global, e a consideração de impactos ao longo do ciclo de vida evita que sejam tomadas decisões apenas com base nos impactos ocorridos durante a fase de uso. Considera-se, no entanto, que possíveis medidas e avanços tecnológicos poderiam ser avaliadas a fim de tornar o VE melhor para todas as categorias. Estes poderiam incluir melhoras no tratamento dos resíduos sulfídricos de placas de circuito impresso e circuitos integrados ou a redução da utilização destes, que poderiam vir em conjunto também com a redução da utilização de cobre. Também considera-se que as emissões de eteno na manutenção poderiam ser gerenciáveis. Embora estas representem oportunidades de redução de impactos, necessita-se avaliar a viabilidade de tais medidas por meio de ACV. Embora também seja possível tomar medidas para que os VCIs se tornem melhores que os VEs, os VCIs apresentaram grandes impactos em algumas categorias que estão associados à utilização de combustível, de forma que apenas um ganho de eficiência muito grande tornaria estes melhores que os VEs em tais categorias, como, por exemplo, aquecimento global. Mesmo em um cenário alternativo para 2030 no qual se reduziu pela metade o consumo de combustível (em l/km) dos VCIs, estes ainda não se mostraram melhores que os VEs utilizando eletricidade de hidrelétricas para algumas categorias, como aquecimento global e depleção de recursos abióticos. Desta forma, as mudanças teriam que ser ainda mais significativas para que os VCIs se tornassem a melhor opção para esta categoria. Não obstante, não foram avaliados VCIs utilizando etanol de segunda e terceira geração, opções estas que teriam que ser avaliadas no futuro como opções de redução dos impactos dos VCIs. Entre os fatores que poderiam causar um aumento nos impactos dos VEs está a falta de planejamento antecipado, assim como a falta de políticas públicas, tal como a diferenciação de tarifas para os usuários residenciais, que ainda é opcional [28], causando a recarga (ou parte desta) em horários de maior demanda. Isto causaria maior utilização de termelétricas e aumento dos impactos. Tendo em vista os resultados obtidos, conclui-se que os VEs poderiam ser alvo de políticas públicas que visem a redução de impactos ambientais, já apresentando-se como uma melhor opção em relação aos VCIs em várias categorias mesmo no atual estado da tecnologia e com perspectivas de melhoras em outras categorias em função de avanços tecnológicos, possibilitando inclusive a redução de impactos em

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todas as categorias. Considera-se, no entanto, que tais políticas públicas têm que compreender medidas visando torná-los melhores para todas as categorias, além da inclusão dos VEs no planejamento energético e de evitar trocas antecipadas. Outra medida possível a fim de se reduzir os impactos seria substituir primeiro veículos que não necessitem de grande autonomia.

Em função das muitas incertezas associadas a previsões de longo prazo, além de outras incertezas associadas ao estudo, os resultados apresentados não devem ser entendidos como definitivos, e podem ser aprimorados em estudos futuros. Entre as incertezas do estudo incluem-se a simplificação na identificação das fontes de energia; a utilização de parâmetros médios para o setor de transportes, em parte relativos apenas a veículos novos; a não consideração de outras tecnologias de veículo, tal como a utilização de etanol de segunda e terceira geração; e a utilização de dados de inventário do presente ou passado para estimar as condições futuras. Estas poderiam ser tratadas em estudos futuros. AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer à CAPES e ao CNPq pela bolsa de estudos concedida, ao Swiss Centre for Life Cycle Inventories por disponibilizar a licença da base de dados do ecoinvent, à PRé-Consultants por disponibilizar a licença do programa SimaPro v8.0.2 e ao ONS pela disponibilização de dados da curva de carga para o ano de 2012. Nenhum destes teve envolvimento nesta pesquisa. O presente trabalho é parte de pesquisa realizada em dissertação de mestrado [20]. No que refere-se à parte deste trabalho referente ao estudo para o ano de 2022, este já foi previamente submetido ao Journal of Cleaner Production [18]. REFERÊNCIAS [1] BRASIL. Plano Decenal de Expansão de Energia 2022. Ministério de Minas e Energia, Empresa de Pesquisa Energética, 2013. Disponível em: http://www.mme.gov.br/mme/galerias/arquivos/noticias/2014/PDE2022.pdf. Acesso em: 06 de março de 2014. [2] BRASIL. 1º Inventário Nacional de Emissões Atmosféricas por Veículos Automotores Rodoviários: Relatório Final. Ministério do Meio Ambiente, 2011. Disponível em: http://www.mma.gov.br/estruturas/163/_publicacao/163_publicacao27072011055200.pdf. Acesso em: 28 de dezembro de 2012. [3] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 14040: Gestão Ambiental – Avaliação do Ciclo de Vida – Princípios e Estrutura. Rio de Janeiro, 2009. [4] HAWKINS, Troy R.; GAUSEN, Ola M.; STRØMANN, Anders H. Environmental impacts of hybrid and electric vehicles – a review. The International Journal of Life Cycle Assessment, v. 17, n. 8, p. 997-1014, set. 2012. [5] HAWKINS, Troy R. et al. Comparative Environmental Life Cycle Assessment of Conventional and Electric Vehicles. Journal of Industrial Ecology, v. 17, n. 1, p. 53-64, fev. 2013.

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[6] SINGH, Bhawna; STRØMANN, Anders H. Environmental assessment of electrification of road transport in Norway: Scenarios and impacts. Transportation Research Part D, v. 25, p. 106-111, dez. 2013. [7] BARROS, Nathan et al. Carbon emission from hydroelectric reservoirs linked to reservoir age and latitutde. Nature Geoscience, v. 4, n. 9, p. 593-596, set. 2011. [8] SAMARAS, Constantine; MEISTERLING, Kyle. Life Cycle Assessment of Greenhouse Gas Emissions from Plug-In Hybrid Vehicles: Implications for Policy. Environmental Science and Technology, v. 42, n. 9, p. 3170-3176, mai. 2008. [9] YAN, Xiaoyu, CROOKES, Roy J. Energy demand and emissions from road transportation vehicles in China. Progress in Energy and Combustion Science, v. 36, n. 6, p. 651-676, dez. 2010. [10] DIAS, Marcos V. X. et al. The impact on electricity demand and emissions due to the introduction of electric cars in the São Paulo Power System. Energy Policy, v. 65, p. 298-304, fev. 2014. [11] BARAN, Renato; LEGEY, Luiz .F. L. The introduction of electric vehicles in Brazil: Impacts on oil and electricity consumption. Technological Forecasting & Social Change, v. 80, n. 5, p. 907-917, jun. 2013. [12] BORBA, Bruno S. M. C.; SZKLO, Alexandre, SCHAEFFER, Roberto. Plug-in hybrid electric vehicles as a way to maximize the integration of variable energy in power systems: The case of wind generation in the northeastern Brazil. Energy, v. 37, n. 1, p. 469-481, jan. 2012. [13] UGAYA, Cássia M. L.; WALTER, Arnaldo C. S. Life Cycle Inventory Analysis – A Case Study of Steel Used in Brazilian Automobiles. The international journal of life cycle assessment, v. 9, n. 6, p. 365-370, nov. 2004. [14] CAVALETT, Otávio. et al. Comparative LCA of ethanol versus gasoline in Brazil using different LCIA methods. The International Journal of Life Cycle Assessment, v. 18, n. 3, p. 647-658, mar. 2013. [15] BRASIL. Plano Nacional de Energia 2030. Ministério de Minas e Energia, colaboração Empresa de Pesquisa Energética, 2007. Disponível em: http://www.mme.gov.br/mme/galerias/arquivos/publicacoes/pne_2030/PlanoNacionalDeEnergia2030.pdf. Acesso em: 09 de abril de 2014. [16] ITAIPU BINACIONAL. Veículo Elétrico: Itaipu Binacional | KWO Grimselstrom. Sine loco, 2010. [17] GERSSEN-GONDELACH, Sarah J.; FAAIJ, André P. C. Performance of batteries for electric vehicles on short and longer term. Journal of Power Sources, v. 212, n. 15, p. 111-129, ago. 2012. [18] CHOMA, Ernani F.; Ugaya, Cássia M. L. Environmental Impact Assessment of Increasing Electric Vehicles in the Brazilian Fleet, [201-]. Artigo submetido ao Journal of Cleaner Production. [19] BANDIVADEKAR, Anup. et al. On the road in 2035: Reducing Transportation’s Petroleum Consumption and GHG Emissions. Report No. LFEE 2008-05 RP. Cambridge, Massachusetts (Estados Unidos): Massachusetts Institute of Technology, 2008. Disponível em: http://web.mit.edu/sloan-auto-lab/research/beforeh2/otr2035/On%20the%20Road%20in%202035_MIT_July%202008.pdf. Acesso em: 30 de agosto de 2012. [20] CHOMA, Ernani F. Avaliação de impactos ambientais da oferta e demanda de energia para automóveis no Brasil utilizando Avaliação do Ciclo de Vida. 2014. 140 f. Dissertação (mestrado, para o título de “Mestre em Engenharia”) –

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Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica e de Materiais, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, 2014. [21] ITAIPU BINACIONAL. Veículo Elétrico. Disponível em: www.itaipu.gov.br/ve. Acesso em: 27 de agosto de 2012. [22] GLOBAL FUEL ECONOMY INITIATIVE. 50 by 50, Global Fuel Economy Initiative: Making Cars 50% More Fuel Efficient by 2050 Worldwide. [2009?]. Disponível em: http://www.fiafoundation.org/publications/Documents/50BY50_report.pdf. Acesso em: 23 de maio de 2014. [23] FRISCHKNECHT, Rolf; STUCKI, Matthias. Scope-dependent modelling of electricity supply in life cycle assessments. The International Journal of Life Cycle Assessment, v. 15, n.8, p. 806-816, set. 2010. [24] BRASIL. Balanço Energético Nacional 2013: Ano base 2012. Empresa de Pesquisa Energética, 2013. Disponível em: http://www.mme.gov.br/mme/galerias/arquivos/publicacoes/BEN/2_-_BEN_-_Ano_Base/1_-_BEN_Portugues_-_Inglxs_-_Completo.pdf. Acesso em: 25 de abril de 2014. [25] SWISS CENTRE FOR LIFE CYCLE INVENTORIES. Ecoinvent Unit Process Database v.3.01 – allocation, default. Swiss Centre for Life Cycle Inventories, 2014a. [26] CHOMA, Ernani F.; UGAYA, Cássia M. L. 2014b. Avaliação de impactos ambientais da oferta e demanda de energia para automóveis no Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO, 9., 2014, Florianópolis. Anais Eletrônicos do Congresso Brasileiro de Planejamento Energético. SBPE, 2014. 1 CD-ROM. [27] PRÉ CONSULTANTS. SIMAPRO versão 8.0.2. PRé-Consultants, 2014. Países Baixos. [28] ANEEL. Modalidade tarifária branca oferecerá tarifas diferentes dependendo do horário. Disponível em: www.aneel.gov.br/aplicacoes/noticias/Output_Noticias.cfm?Identidade=7646&id_area=90. Acesso em: 20 de janeiro de 2014.