INSERÇÃO DE MECÂNICA QUÂNTICA NO ENSINO

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  • 8/3/2019 INSERO DE MECNICA QUNTICA NO ENSINO

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    Marcia Cndida Montano Webber

    Trieste F. Ricci

    v.17 n.5 2006

    Programa de Ps-Graduao em Ensino de Fsica

    INSERO DE MECNICA QUNTICA NO ENSINO

    MDIO: UMA PROPOSTA PARA PROFESSORES

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    Textos de Apoio ao Professor de Fsica, v.17 n.5, 2006.Instituto de Fsica UFRGS

    Programa de Ps Graduao em Ensino de FsicaMestrado Profissional em Ensino de Fsica

    Editores: Marco Antonio MoreiraEliane Angela Veit

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    (Bibliotecria Carla Flores Torres CRB 10/1600)

    Impresso: Waldomiro da Silva OlivoIntercalao: Joo Batista C. da Silva

    W371i Webber, Mrcia Cndida Montano.

    Insero de mecnica quntica no ensino mdio : uma proposta para

    professores / Mrcia Cndido Montano Webber, Trieste Freire Ricci.

    Porto Alegre : UFRGS, Instituto de Fsica, Programa de Ps-Graduao em

    Ensino de Fsica, 2007.

    63p. : il. (Textos de apoio ao professor de fsica / Marco Antonio

    Moreira, Eliane Angela Veit, ISSN 1807-2763; v. 17, n. 5)

    Produto do trabalho de concluso do Mestrado Profissional em Ensino de

    Fsica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

    1. Ensino de Fsica. 2. Formao de Professores 3. Mecnica QunticaI. Webber, Mrcia Cndida Montano. II. Ricci, Trieste Freire III. Ttulo. IV.

    Srie.

    CDU 53:37

    PACS 01.40.J

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    INDICE

    1. O mundo microscpio e o mundo macroscpico .............................................. ............ 5

    2. Objetos clssicos e objetos qunticos ......................................................................... 13

    3. Eltrons e ftons.................................................. .................................................. .......... 17

    4. Revisando a tica ondulatria .............................................. .......................................... 19

    4.1. Propriedades fundamentais de uma onda......................................................... 19

    4.2. Princpio de Huygens....... .................................................. .................................. 19

    4.3. Difrao ............................................. .................................................. .................. 20

    4.4. Superposio linear ........................................... ................................................ .. 21

    4.5. Interferncia .............................................. .................................................. .......... 22

    4.6. Polarizao................ .................................................. .......................................... 22

    5. A experincia da dupla fenda e a natureza ondulatria da luz ................................... 25

    5.1. Um pouco da histria da luz ............................................................................... 25

    5.2. O experimento de Young........................................... .......................................... 25

    6. A experincia da dupla fenda e a natureza corpuscular da luz .................................. 29

    7. Dualidade onda-partcula para luz: onda eletromagntica x feixe de ftons ............ 33

    8. A experincia da fenda dupla com feixe de eltrons ................................................... 37

    9. A funo de onda e a natureza probabilstica da teoria quntica .............................. 43

    Obras consultadas........................................... .................................................. .................. 47

    Apndices ......................................... .................................................. .................................. 49

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    Apndice A - Roteiro para atividade virtual - parte I................................................ 49

    Apndice B - Roteiro para atividade virtual parte II.... .......................................... 55

    Apndice C - Lista de exerccios de reviso ............................................................ 59

    Textos de apoio ao professor de fsica ........................................... .................................. 61

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    CURSO INTRODUTRIO DE MECNICA QUNTICA

    1. O mundo microscpio e o mundo macroscpico

    Sabemos que a matria formada por tomos ou molculas formadas por tomos eestes, por sua vez, so formados por componentes ainda menores.

    muito difcil conseguir uma imagem de tomo ou molcula. Para um objeto ser visvel (em

    bons microscpios), deve ser maior do que o comprimento de onda da luz utilizada para ilumin-lo.

    Uma vez que o espectro da luz visvel pelos olhos humanos est, aproximadamente, na faixa que vai

    de 4.000 a 7.000 (1 , ou um angstrm, corresponde a 10-10 m), conforme pode ser visualizado

    no espectro magntico da Figura 1 (a escala usada para o espectro de luz visvel da figura est em

    nanmetros, e 1nm = 10-9m), os comprimentos de onda tpicos da luz visvel tm ordem de grandeza

    de alguns dcimos de micrmetros (1m = 10-6 m). J o tamanho caracterstico de um tomo da

    ordem de alguns angstrns, o que centenas de vezes menor, portanto, que o comprimento de onda

    da luz visvel. Por isso, um tomo no pode ser visto por meio de qualquer instrumento tico.

    Entretanto, podemos visualizar tomos no como fotografias obtidas com luz, mas como

    imagens obtidas por meio de microscpios eletrnicos de varredura, que produzem uma imagem

    aumentada do objeto (cerca de quinhentas vezes mais ampliada que a fornecida por um bom

    microscpio tico). Tais instrumentos utilizam feixes de eltrons para obter essas imagens, o que

    possvel porque o comprimento de onda dos eltrons que formam o feixe utilizado bem menor do

    que o comprimento de onda da luz visvel e, portanto, da mesma ordem de grandeza do objeto de

    interesse. Tambm podemos capturar imagens de tomos com outro tipo de microscpio eletrnico, o

    microscpio de varredura por tunelamento (STMScanning Tunneling Microscope), no qual uma

    agulha microscpica vasculha a superfcie, medindo, ao mesmo tempo, a corrente de tunelamentoem cada ponto da varredura, resultando numa descrio minuciosa da superfcie atravs da variao

    sofrida por essa corrente.

    Figura 1 O espectro eletromagntico

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    A Tabela 1 mostra algumas ordens de grandezas que podem ser comparadas com o tamanho

    tpico de um tomo, ilustrando o que queremos dizer sempre que nos referirmos a um objeto como

    sendo microscpico.

    Tabela 1 Ordens de grandezas

    Grandezas Ordem de grandeza (em metros)

    Raio do Universo 1025

    Distncia da Terra ao Sol 1011

    Raio da Terra 106

    Altura do homem 100

    Espessura de um cabelo 10-4

    Bactrias 10-6

    Vrus 10-7

    Dimetro atmico 10-10

    Raio nuclear 10-15

    Para ns, um objeto ser considerado macroscpico quando for formado por um nmero

    muito grande (muito maior do que um trilho, por exemplo) de tomos ou de molculas. Podemos

    fazer algumas comparaes entre o dimetro de um tomo com os tamanhos dos objetos

    apresentados na Tabela 1. Iniciamos pelo dimetro de um fio de cabelo, por ser, entre os objetos

    citados, o menor que ainda visvel a olho nu. Comparando-o com o dimetro de um tomo,

    observamos que cerca de 1.000.000 = 106 deles cabem no dimetro de um fio de cabelo tpico.

    Todavia, um pedacinho de fio de cabelo contm muito mais tomos do que isso, pois um objeto

    tridimensional, com espessura e comprimento, alm de largura. Por exemplo, se um fio de cabelo

    como este tivesse um comprimento igual sua largura, teria um nmero de tomos com ordem de

    grandeza de 1018, ou seja, um nmero impronuncivel. Trata-se, por exemplo, de um nmero maior

    do que o nmero de segundos da idade do universo (cerca de 15 bilhes de anos)! Analogamente,

    numa dimenso linear (largura, por exemplo) de uma bactria cabem cerca de 10.000 tomos, e, num

    vrus cerca de 1.000 tomos, numa dimenso linear de um vrus tpico. Como esses so objetos

    tridimensionais, o nmero de tomos que cabem dentro de uma bactria ou de um vrus muitas

    ordens de grandeza maior do que 10.000 ou 1.000.

    Um outro exemplo ainda mais expressivo da ordem de grandeza de uma simples clulaorgnica em relao ordem de grandeza dos nossos objetos microscpicos os tomos o da

    molcula de DNA (cido desoxirribonuclico) humano, ilustrado esquematicamente nas Figuras 2. Tal

    molcula fica localizada no ncleo de uma clula. Elas falam por si s!

    Podemos ainda observar que a ordem de grandeza do tamanho de uma bactria est na faixa

    da ordem do comprimento de onda da luz visvel, de modo que, ao contrrio de um tomo, pode ser

    vista ou fotografada por meio de algum instrumento ptico de aumento que utilize a luz comum, tal

    como um microscpio tico.

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    Como realado por Hewitt (2002), alm de incrivelmente pequenos, os tomos so

    extremamente numerosos. Existem cerca de 1.000.000.000.000.000.000.000.000 = 1024 tomos em

    apenas 1 grama de gua! Esse nmero, por exemplo, maior do que o nmero de gotas de todos os

    lagos e rios do mundo inteiro. Alm disso, os tomos so quase to antigos quanto o prprio

    universo.

    Figura 2 Representao da molcula de DNA

    2(a) Representao de um trecho de uma molcula de DNA humano: cada tomo dedeterminado elemento qumico representado simbolicamente por uma bola de uma mesma cor.

    Nessa representao, comum para os qumicos, as esferas se interpenetram para simbolizar ligaes

    qumicas. 2(b) Como o DNA humano se enrola para formar cada um dos 23 pares de cromossomos

    contidos apenas no ncleo de uma clula humana

    Em contraste, um objeto ser considerado como microscpico quando for constitudo por um

    nmero relativamente pequeno de tomos ou molculas. Mais tarde, quando estivermos abordando a

    mecnica quntica de Schrdinger, trataremos de dar uma definio mais precisa do significado dos

    termos macroscpico e microscpico. Por ora, e neste contexto, os tomos sero nossos

    constituintes microscpicos bsicos e paradigmticos, que serviro de comparao, em tamanho e

    massa, para outros objetos, maiores ou menores.

    Assim, temos basicamente duas escalas de tamanho com as quais podemos analisar o

    comportamento da matria: a escala macroscpica e a escala microscpica. A escala macroscpica

    a dos fenmenos que envolvem objetos (inclusive bactrias!) ditos macroscpicos.

    Os fenmenos que ocorrem no mundo microscpico so analisados de maneira diferente

    daqueles que ocorrem no mundo macroscpico. O mundo macroscpico descrito pela fsica

    clssica (formada pela mecnica newtoniana, termodinmica e o eletromagnetismo de Maxwell), que

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    trabalha com duas categorias de fenmenos: as partculas que possuem massa e evoluem no tempo

    de acordo com as leis de Newton, e as ondas eletromagnticas, entidades sem massa que se

    propagam atravs do espao, evoluindo no tempo de acordo com as leis de Maxwell do

    eletromagnetismo.

    O mundo microscpico, entretanto, no obedece s leis da fsica clssica, e, sim, s leis dafsica quntica. Os constituintes do mundo atmico e subatmico, tomos, molculas e partculas

    subatmicas, possuem massa e so os componentes microscpicos da matria. Quanto radiao,

    como veremos adiante, tambm formada por partculas microscpicas, porm no dotadas de

    massa.

    A estrutura atmica foi objeto de estudo sistemtico no comeo do sculo XX, quando os

    cientistas estudaram detalhadamente vrios fenmenos, tais como os raios-X, a radioatividade e o

    efeito fotoeltrico. As pesquisas sobre o efeito fotoeltrico, por exemplo, mostraram, conclusivamente,

    que a luz possui tambm um carter tipicamente corpuscular e que no pode ser concebida s em

    termos de uma onda. Do ponto de vista clssico, isso parecia contraditrio porque o fenmeno de

    interferncia da luz parecia comprovar, em definitivo, que a luz possui carter ondulatrio.

    As exploraes realizadas do mundo microscpico trouxeram resultados inesperados,

    revelando anomaliasque os cientistas no conseguiam explicar com base em noes clssicas. Aos

    poucos, os fsicos foram tomando conscincia de que as noes da fsica clssica no eram

    suficientes para se compreender o mundo microscpico. Em busca de respostas, foi sendo formulada

    uma nova fsica, a fsica quntica, com alteraes radicais em relao fsica clssica que trata de

    fenmenos macroscpicos.

    A fsica quntica todo um corpo de conhecimentos desenvolvido a partir do incio do sculo

    XX, com o qual se procura descrever um mundo fantstico e muito diferente daquilo a que estamos

    acostumados o mundo microscpico. Trata principalmente dos fenmenos que ocorrem nessaescala de tamanho e do modo como esses fenmenos refletem o que acontece na escala

    macroscpica. A fsica clssica todo um corpo de conhecimentos desenvolvidos at o fim do sculo

    XIX, o qual parecia ser completo porque explicava praticamente todos os fenmenos observados at

    ento. Conta-se que o fsico alemo Max Planck, um dos responsveis pelo surgimento da fsica

    quntica, teria sido aconselhado por um de seus mestres a desistir de seus estudos cientficos e

    escolher a carreira de pianista, assim, os cientistas da poca estavam condenados a ficar sem ter o

    que fazer! Afinal, estava quase tudo pronto, faltavam apenas dois pequenos detalhes. Os dois

    detalhes que os fsicos no conseguiam explicar esto representados pelos tijolos que faltam na

    Figura 3.

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    Figura 3 O edifcio da fsica clssica

    Um tanto arbitrariamente, podemos situar o nascimento da fsica quntica em 14 de

    dezembro de 1900, quando, numa reunio da Sociedade Alem de Fsica, o fsico alemo Max

    Planck (1858-1947) apresentou seu artigo sobre a teoria da lei de distribuio de energia do espectro

    normal, que se constituiu num verdadeiro marco de uma revoluo na fsica. O artigo de Planck

    propunha uma explicao para o problema do espectro de emisso da chamada radiao do corpo

    negro, radiao eletromagntica que emitida por um corpo negro em equilibro trmico a uma dada

    temperatura. Conhecer o espectro de emisso de um objeto macroscpico qualquer , basicamente,

    saber quanta energia radiante emitida pelo objeto em cada faixa de comprimento de onda ou de

    freqncia. Essa informao est contida na curva de um grfico em que o eixo vertical corresponde

    intensidade luminosa emitida (a quantidade de energia emitida por unidade de superfcie e porunidade de tempo, medida em Watt/m2 em unidades do SI) e, o eixo horizontal, ao comprimento de

    onda ou freqncia da radiao emitida. A curva obtida, em funo da freqncia da radiao

    emitida pelo corpo, para diferentes temperaturas, est ilustrada na Figura 4.

    No final do sculo XIX, os fsicos experimentais j conseguiam realizar medidas muito

    precisas do espectro de emisso de um corpo negro, com base nas quais eles obtiveram

    empiricamentea curva do espectro de radiao do corpo negro com grande preciso.

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    Figura 4 Espectro de emisso de um corpo negro

    Entretanto, faltava ainda, deduzir essa curva teoricamente, a partir das leis mais

    fundamentais da fsica. Esse era o objetivo de Planck naquele final de ano de 1900. Ele conseguiu

    fornecer uma soluo para o problema terico da radiao de corpo negro, obtendo a curva correta

    que os experimentais j haviam obtido empiricamente, porm, para isso, Planck foi forado a atribuir

    propriedades qunticas luz. Mais especificamente, Planck foi forado a usar um modelo em que a

    radiao eletromagntica s trocaria energia com a matria em quantidades quantizadas, isto ,

    quantidades de energia que so mltiplas inteiras de uma quantidade mnimade energia, que ele

    denominou de quantum(plural quanta).

    Cinco anos depois, em 1905, Einstein usaria a proposta de Planck para explicar

    convincentemente o efeito fotoeltrico. Contudo, a hiptese de Planck foi usada por Einstein com uma

    interpretao radicalmente diferente daquela dada por Planck: para Einstein, no apenas as trocas de

    energia entre a radiao e a matria so quantizadas, mas a prpria luz o ! Noutras palavras,

    Einstein props um novo modelo corpuscular para a luz ou a radiao eletromagntica em geral, no

    qual a radiao considerada discreta, formada por um nmero inteiro de entidades microscpicas

    sem massa, mas dotadas de energia e de momentumlinear. Einstein denominou-as quanta de luz

    (plural de quantum de luz). Hoje chamamos de ftonao que Einstein denominava quantum de luz.

    Assim, de acordo com Einstein, podemos considerar a luz e a radiao eletromagntica em geral

    como um feixe de ftons.

    Em 1911, o fsico britnico Ernest Rutherford (1871-1937) descobriu a existncia do ncleo

    atmico. A partir das observaes realizadas por ele e por sua equipe, Rutherford props um modelo

    atmico no qual o tomo era quase que totalmente vazio, com um minsculo ncleoextremamente

    denso, constitudo por partculas positivas os prtons e uma regio externa, a eletrosfera,

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    formada por partculas negativas os eltrons , que giram em torno do ncleo descrevendo rbitas

    circulares. Este modelo planetrio do tomo, entretanto, tinha, do ponto de vista terico-clssico um

    srio ponto fraco. De acordo com a teoria eletromagntica, qualquer carga em movimento acelerado

    deve emitir radiao e, portanto, perder continuamente energia em forma de ondas eletromagnticas.

    No caso do modelo de Rutherford, eltrons negativamente carregados descreveriam movimentoscirculares em torno do ncleo e, portanto, teriam uma acelerao (centrpeta). Isso significa que, no

    modelo atmico de Rutherford, o eltron em rbita acabaria por perder toda a sua energia e colapsar

    para o ncleo. Alm disso, um ncleo formado apenas por partculas positivas deveria se desintegrar,

    pois as cargas eltricas de mesmo sinal se repelem mutuamente. Portanto, o modelo atmico

    proposto por Rutherford era instvel do ponto de vista terico e no explicava convincentemente a

    existncia duradoura dos tomos.

    O fsico dinamarqus Niels Bohr (1885-1962), que fizera seu doutorado em fsica terica com

    Rutherford na Universidade de Manchester, comeou a procurar uma soluo que apoiasse a

    estrutura atmica impossvel de Rutherford. Ento, em 1913, Bohr aplicou a teoria quntica de

    Planck e de Einstein na estrutura atmica de Rutherford e formulou o primeiro modelo quantizadodo

    tomo (mais tarde este modelo seria revisado por conter ainda graves defeitos).

    O corpo de leis e modelos desenvolvido durante os primeiros 25 anos do sculo XX (1900-

    1925) ficou conhecido como a velha fsica quntica, por contraste com as descobertas tericas e

    experimentais que se sucederiam rapidamente a partir de 1925 e que gerariam um novo corpo de

    conhecimentos, ainda maior e mais preciso, hoje conhecido como mecnica quntica.

    A partir dos trabalhos pioneiros de Planck e de Einstein no incio do sculo XX,

    gradativamente os fsicos foram aceitando o fato de que as anomalias com as quais se deparavam

    eram inerentes ao mundo microscpico e no podiam ser explicadas com base na fsica do mundo

    macroscpico, ou seja, a fsica clssica.Assim como para a mecnica clssica existem vrias verses ou formulaes matemticas

    fisicamente equivalentes (a mecnica vetorial newtoniana, a mecnica lagrangeana, a mecnica

    hamiltoniana etc.), a mecnica quntica tambm pode ser apresentada em vrias verses, todas

    fisicamente equivalentes. Esses desenvolvimentos constituem uma etapa crucial no desenvolvimento

    da fsica moderna. Pela primeira vez, os resultados fsicos no eram derivados a partir de um modelo

    concreto do universo, mas de uma construo matemtica abstrata.

    A primeira verso da mecnica quntica chama-se mecnica matricial e foi formulada em

    1925 pelo fsico alemo Werner Heisenberg (1901-1976). Esta teoria recebeu tal nome por se utilizar

    de matrizes para representar grandezas fsicas. A segunda verso da mecnica quntica apareceu

    no incio de 1926, quando o fsico austraco Erwin Schrdinger (1887-1961) formulou a chamada

    mecnica ondulatria. Teoria que uma generalizao do postulado de Broglie e recebeu esse

    nome por possuir fortes analogias com a teoria clssica da luz, a ptica ondulatria; a verso mais

    utilizada pelos fsicos em geral. Ainda no ano de 1926, o ingls Paul Dirac (1902-1984) desenvolveu

    uma terceira verso da mecnica quntica.

    O sucesso da mecnica quntica foi uma grande conquista cientfica do sculo XX pelo fato

    de prever o comportamento observado dos sistemas fsicos microscpicos, isto , desenvolve

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    conceitos consistentes e adequados para descrever o mundo em escala microscpica e para fazer

    previses a respeito, confirmando-as ou no em experimentos de grande preciso.

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    2. Objetos clssicos e objetos qunticos

    Os sistemas fsicos so caracterizados pelo seu estado, o qual definido pelos valores

    assumidos por um conjunto mnimo de grandezas fsicas, que so propriedades mensurveisdos

    objetos. As propriedades de um sistema so quaisquer caractersticas avaliveis do mesmo, cujos

    valores revelam as condies em que se encontra o sistema.Portanto, existe um conjunto mnimode grandezas fsicas que define o estadode um sistema

    fsico qualquer. Podemos exemplificar o estado mecnicode um sistema macroscpico usando como

    exemplo o mais simples de todos os sistemas deste tipo, ou seja, aquele constitudo por uma nica

    partcula clssica de massa m. Associando a essa partcula uma representao matemtica, o seu

    estado ser representado por um conjunto de seis nmeros (x, y, z, px, py, pz), onde x, ye zso as

    coordenadas cartesianas que informam sobre a posio da partcula e px, pye pzso as componentes

    cartesianas do vetor momentumlinear (ou quantidade de movimento de translao, definida como p =

    m.v) da partcula. Usando notao vetorial, mais condensada, podemos denotar o estado desse

    sistema muito simples pelo ordenado de vetores ( r, p). Tacitamente, na fsica clssica se assume que

    esses dois observveis vetoriais (ou seis observveis escalares) sejam compatveis entre si (o que

    experimentalmente comprovado para objetos macroscpicos deste tipo). Se o sistema for uma onda

    eletromagntica, o seu estado clssico ser especificado pela quantidade de energia (ou o

    momentum linear) que ela transporta consigo, sua freqncia (ou seu comprimento de onda), sua

    polarizao e sua direo e sentido de propagao.

    O estado termodinmico de um objeto macroscpico qualquer definido por conjunto mnimo

    (ou seja, de menor nmero possvel) de propriedades termodinmicas do sistema. As propriedades

    termodinmicas fundamentais que variam com o transcorrer do tempo so denominadas de

    propriedades dinmicas, de que so exemplos a posio, a velocidade e a energia. As propriedades

    no fundamentais do sistema so aquelas que podem ser expressas como combinaes daspropriedades fundamentais. As propriedades tambm podem ser classificadas como internas, as

    quais so intrnsecas ao sistema, ou externas, aquelas que dependem dos movimentos ou das

    posies das partes que formam o sistema em relao a corpos externos a este, ou seja, que no

    pertencem ao sistema considerado.

    As propriedades dinmicas de um sistema so tambm muitas vezes denominadas variveis

    de estadoou observveis. Na fsica clssica, para sistemas formados por objetos macroscpicos, os

    observveis so grandezas que podem sempre ser medidas simultaneamente, ou seja, ao medirmos

    o valor de uma determinada grandeza, no alteraremos os valores das outras; e se forem medidas

    em seqncia, uma aps a outra, a ordem em que dois observveis quaisquer sero medidos no

    influenciar os resultados obtidos para as duas. E mais, abstraindo-se o ato de medir, podemos dizer

    que, para os objetos clssicos ou macroscpicos, essas variveis de estado esto bem definidas

    simultaneamente em todos os instantes de tempo, mesmo quando no estamos realizando qualquer

    medio das mesmas. Vamos denominar este tipo de observveis que podem ser medidos

    simultaneamente e que esto simultaneamente bem definidos de observveis compatveis. Alm

    disso, podemos atribuir uma srie de propriedades dinmicas bem definidas em cada instante de

    tempo aos objetos e sistemas clssicos; a partir delas, usando as leis da fsica clssica, somos

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    capazes de explicar racionalmente os resultados e fazer previses precisas sobre o comportamento

    futuro dos objetos clssicos.

    Podemos tambm preparar um estado clssicoo que significa estabelecer condies iniciais

    para o sistema, essas definidas pelos valores iniciais (em t = 0) daquelas grandezas que definem de

    maneira completa o estado do sistema clssico. A evoluo temporal de um estado clssico regidapela segunda lei de Newton e determinista, isto , dado um estado inicial qualquer e as foras que

    agem sobre o objeto, os estados futuros estaro determinados.

    A mecnica quntica trabalha com sistemas formados por objetos qunticos, que, como

    referimos anteriormente, so objetos microscpicos. Podemos citar como modelos de objetos

    qunticos eltrons, prtons, nutrons, ncleos atmicos ou molculas, todos eles sendo objetos

    fsicos dotados de massa. Contudo, tambm podemos citar como exemplos de objetos qunticos os

    ftonsque formam a luz e que no possuem massa.

    O sucesso da mecnica quntica est alm do limite macroscpico, uma vez que ela se

    adapta aos resultados da mecnica clssica para objetos macroscpicos, isto , a mecnica quntica

    aplicada a objetos macroscpicos fornece resultados iguais aos obtidos pela mecnica clssica. A

    recproca no verdadeira. Os objetos macroscpicos so formados por inmeros objetos qunticos

    (os tomos). Portanto, qualquer sistema quntico formado por N objetos qunticos menores

    necessariamente tende a ser um objeto clssico quando N tende ao infinito, ou seja, no limite de N

    muito grande, a fsica quntica deve tender e se reduzir fsica clssica. Chamamos a isso de

    Princpio da Correspondncia, que foi postulado por Bohr em 1923. Basicamente, o princpio da

    correspondncia nos diz que, para uma nova teoria ser validada ou corroborada, deve prever os

    mesmos resultados vlidos que j eram previstos pela teoria antiga.

    A diferena fundamental entre os objetos qunticos e os objetos clssicos que nem sempre

    podemos atribuir aos objetos qunticos propriedades dinmicas simultaneamente bem definidas, ouseja, na mecnica quntica nem todos os observveis so compatveis entre si. (Por exemplo, no

    podemos determinar simultaneamente a posio e o momentum linear de um eltron. Isso no

    decorrncia de no possuirmos aparelhos suficientemente precisos para realizar as medies

    necessrias, mas constitui uma limitao intrnseca natureza dos objetos qunticos.).

    Em virtude dessas diferenas, a maneira como so definidos os estados de objetos qunticos

    inteiramente diversa da maneira como isso feito na fsica clssica. O movimento de objetos

    macroscpicos regido por equaes diferenciais, ou seja, equaes cujas solues no so

    nmeros, mas, sim, funes reaisdas coordenadas espaciais e do tempo. Fisicamente, as grandezas

    descritas por essas equaes nos fornecem valores que normalmente so alterados a cada instante.

    Por exemplo, para o caso em que a fora resultante exercida sobre um corpo de massa m for nula, a

    segunda lei de Newton FR = m.a(uma equao diferencial) tem como soluo a funo horria r = r0

    + v.t, que descreve a posio rde uma partcula clssica num instante tqualquer.

    Analogamente, o movimento de objetos na escala microscpica regido pela equao de

    Schrdinger, proposta em 1926 pelo fsico austraco Erwin Schrdinger e que pode ser escrita na

    forma sinttica:

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    =

    .H

    tih

    Onde H um operador diferencial (ou seja, que contm derivadas em sua definio)

    chamado Hamiltoniano. Esta entidade matemtica representa o observvel energia total do sistema

    (e h a constante de Planck normalizada, definida como2

    h=h = 1,05 x 10-34 J.s). A equao de

    Schrdinger tambm uma equao diferencial, mas descreve as variaes em ondas de

    probabilidade associadas a uma partcula quntica (o eltron, por exemplo) sob a ao de foras

    externas, bem diferente, portanto, do que descrito pelas equaes newtonianas da mecnica

    clssica.

    A entidade matemtica que descreve o estado de um sistema quntico sua funo de

    onda, representada pela letra grega (maiscula) , que soluo da equao de Schrdinger. A

    funo de onda contm todas as informaes fsicas a respeito do estado do sistema que descreve,

    ou seja, ela o prprio estado do sistema quntico. A equao de Schrdinger foi apenas

    apresentada, entretanto a sua soluo, a funo de onda, precisa ser compreendida mais

    detalhadamente, de modo que voltaremos a falar da mais detalhadamente no tpico 9.

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    3. Eltrons e ftons

    Foi o fsico britnico Joseph John Thomson (1856-1940) quem descobriu os eltrons em

    1897, atravs da confirmao de que os raios catdicos so formados por feixes de minsculas

    partculas com cargas eltricas negativas (e de mesmo valor), mais tarde chamadas de eltrons.

    Thomson descobriu que os eltrons possuem carga eltrica ao comprovar que eles eram desviadosna presena de um campo eltrico e/ou de um campo magntico. Por meio da direo e do sentido

    em que essas partculas eram desviadas, Thomson concluiu que suas cargas eltricas so negativas

    e chamou-os de eltrons.

    Os eltrons so completamente todos idnticos entre si. Entre outras propriedades fsicas,

    eles possuem o mesmo tamanho (um raio menor que 10-18 m), a mesma massa (aproximadamente

    igual a 9,11.10-31 kg) e a mesma carga eltrica (aproximadamente 1,6022.10-19 C). s vezes,

    quando ligados em tomo, os eltrons so comparados aos planetas do sistema solar. Essa analogia

    imprecisa em vrios aspectos, como j mencionamos anteriormente a respeito do modelo atmico

    de Rutherford. Uma das razes que os movimentos dos eltrons so diferentes do movimento dos

    planetas em torno do Sol porque os eltrons no obedecem s leis da fsica clssica, e, sim, s leis

    da mecnica quntica.

    No inteiramente correto conceber os eltrons como bolinhas em rotao, embora essa

    imagem nos seja a mais familiar e confortvel para a nossa maneira de pensar, baseada no mundo

    macroscpico a que temos acesso pelos nossos sentidos. Embora os eltrons no sejam como as

    bolinhas do mundo clssico, realmente possuem um tipo de rotao que uma caracterstica

    intrnseca dos mesmos, isto , todos os eltrons giram da mesma forma, sem importar a direo em

    que tal rotao medida, e o valor de sua quantidade de movimento de rotao sempre o mesmo

    para todos os eltrons encontrados na natureza. O spin ou momentum angular intrnseco est

    relacionado com a rotao dos eltrons em torno de si mesmos e tem o mesmo valor para todos oseltrons. Dependendo do sentido de rotao, um eltron tem spin up(para cima) ou spin down(para

    baixo).

    Os ftons no foram inicialmente descobertos experimentalmente pelos fsicos, e, sim,

    propostos. Em seu artigo de 1905 sobre o efeito fotoeltrico, do qual falaremos posteriormente,

    Einstein props pela primeira vez a existncia do fton (que ele chamava ento de quantum de luz),

    quando postulou que a luz pode ser encarada como sendo formada por corpsculos ou partculas de

    luz sem massa e sem carga eltrica, atravs dos quais a luz interage com a matria como se fosse

    formada por minsculos corpsculos ou pacotes de energia eletromagntica. Estes foram

    originalmente chamados por Einstein de quanta de luz(quanta plural de quantum, palavra que vem

    do latim e significa quantidade). Um fton, portanto, um quantumde luz. O nome fton foi cunhado

    somente em 1926 pelo fsico Gilbert Newton Lewis (1875-1946).

    Uma diferena notvel entre ftons e outras partculas que eles podem ser facilmente

    criados e destrudos. A interao de ftons com outras partculas eletricamente carregadas resulta na

    fora eletromagntica, isto , o fton a partcula mediadora da interao eletromagntica. A energia

    de um fton formador de radiao eletromagntica de freqncia f dada pela relao de Planck,

    fhE .= . a energia dos ftons que determina se so ftons de luz visvel, de raios X, de ondas de

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    rdio etc. E como qualquer objeto de massa nula, os ftons propagam-se sempre com a velocidade

    da luz, quaisquer que sejam suas energias e em relao a qualquer observador. Assim como os

    eltrons, os ftons tambm possuem spin, mas o valor do spin do fton um, ao passo que do

    eltron 1/2.

    A confirmao experimental dos ftons aconteceu pela primeira vez em 1923 com osexperimentos de Arthur Holly Compton (1892-1962) e sua equipe, ao constatarem que raios X

    espalhados por superfcies metlicas polidas apresentam alterao de sua freqncia em razo do

    espalhamento. (De acordo com a fsica clssica, os raios X espalhados deviam possuir a mesma

    freqncia que a dos raios X incidentes.). O Efeito Compton, como hoje conhecido (ou seja, a

    alterao das freqncias dos raios X espalhados), evidenciou que a freqncia da luz diminui em

    quantidade dependendo do ngulo em que for espalhada.

    Em nosso curso, os eltrons e os ftons sero usados como modelo de objetos qunticos

    elementares, ou seja, sem estrutura interna.

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    4. Revisando a tica ondulatria

    Antes de seguirmos adiante com o curso, faremos uma breve reviso de alguns conceitos

    referentes tica ondulatria que so muito importantes para o seu seguimento.

    4.1. Propriedades fundamentais de uma ondaO termo onda est presente em muitas situaes e usado com muita freqncia no nosso

    dia-a-dia. Ouvimos falar em ondas de rdio, ondas de televiso, microondas ou mesmo as ondas do

    mar, todas com a mesma funo: transmitir energia. Uma onda uma perturbao que se propaga no

    espao, transmitindo energia, sem que haja, entretanto, transporte de matria junto com a onda.

    A representao grfica de uma onda qualquer feita atravs de uma funo de coordenadas

    e do tempo, denominada genericamente de funo de onda. Para um tipo de ondas muito especiais,

    denominadas harmnicas, a funo de onda uma funo senoidal (seno ou cosseno ou uma

    combinao linear das duas). A Figura 5 mostra a representao grfica de uma onda deste tipo com

    os seus principais elementos.

    Figura 5 Representao grfica de uma onda

    onde:

    A = amplitude da onda, que representa o mximo afastamento em relao ao ponto de

    equilbrio;

    B, C = cristas ou picos, que representam o ponto mais alto da onda;

    D, E =vales ou depresses, que representam o ponto mais baixo da onda;

    = comprimento de onda, que a distncia entre duas cristas ou vales sucessivos.

    4.2. Princpio de Huygens

    Imaginemos que, ao jogar uma pedra em guas calmas, produzamos ondas na superfcie da

    gua, semelhantes s ondas mostradas na Figura 6. Imaginemos tambm que as cristas de ondas

    mostradas na figura formem crculos que tenham o mesmo centro (concntricos). Esses crculos

    concntricos so chamados de frentes de onda.

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    Figura 6 Ondas formadas na gua

    O fsico holands Christian Huygens (1629-1695) props que cada ponto de uma frente de

    onda qualquer, produzida por uma fonte qualquer, comporta-se como uma fonte puntiforme para

    novas ondas secundrias, que se propagam a partir deste ponto. Em outras palavras, as frentes de

    onda que se propagam a partir de uma fonte qualquer podem ser consideradas como a superposio

    das cristas de pequenas ondas secundrias, cada qual tendo sido emitida a partir de um ponto dafrente de onda num instante anterior; aps um intervalo de tempo, todas se somam, produzindo,

    assim, uma nova frente de onda resultante, em outra posio do espao e correspondente a um

    instante de tempo posterior. Quando as ondas formadas esto a uma distncia muito grande da fonte,

    podemos consider-las como formando uma superfcie aproximadamente plana (frente de onda

    plana). As ondas planas podem ser geradas, por exemplo, dentro de uma cuba retangular contendo

    gua, onde produzido um movimento de vai-e-vem de uma rgua. Observamos na Figura 7 (a) o

    princpio de Huygens ilustrado para uma frente de onda plana e, na Figura 7 (b), ilustrado para uma

    frente de onda esfrica.

    Figura 7 Princpio de Huygens aplicado a frentes de ondas.

    4.3. Difrao

    A difrao pode ser explicada pelo princpio de Huygens. O fenmeno da difrao ocorre

    quando uma frente de onda encontra um obstculo ou uma fenda, passa por ele/ela e se espalha

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    lateralmente (ou se difrata) do outro lado do obstculo ou da fenda, com cada um de seus pontos

    constituindo uma fonte puntiforme de uma onda secundria. Para que o fenmeno da difrao seja

    observado nitidamente, necessrio que as dimenses do obstculo ou da abertura sejam da ordem

    de grandeza do comprimento da onda incidente. A difrao ocorre para qualquer tipo de onda e,

    atravs dela, por exemplo, um obstculo pode ser contornado. Nas ondas sonoras, por exemplo, ofato de a onda poder contornar um obstculo que nos permite escutar a voz de uma pessoa que nos

    chama, mesmo quando essa pessoa se encontra atrs de um obstculo. A Figura 8 ilustra ondas

    planas atravessando aberturas de diversos tamanhos.

    Figura 8 Ondas planas atravessando fendas de diferentes larguras

    A difrao tambm ocorre com a luz, porm mais difcil percebermos a difrao de ondas

    luminosas porque os obstculos ou as aberturas em que a luz incide so normalmente bastante

    grandes em relao ao comprimento de onda da luz usada. Entretanto, se fizermos a luz passar por

    orifcios cada vez menores, passaremos a observar com facilidade cada vez maior os efeitos da

    difrao (sempre) existente. Podemos comprovar isso fazendo uma simulao computacional num

    applet1. Com o simulador, pode-se realizar uma demonstrao virtual da difrao da luz atravs de

    uma fenda nica. O appletpossibilita trabalhar com diferentes tamanhos para a abertura do obstculo

    (fenda) e, tambm, a troca de cores (alteraes do comprimento de onda) da luz. Outro recurso muito

    importante proporcionado pelo simulador a visualizao do grfico da distribuio da luz difratada

    atravs da fenda nica.

    4.4. Superposio linear

    Sabemos que um corpo material no pode ocupar simultaneamente a mesma regio doespao que outro. Quanto s ondas, uma onda pode ocupar a mesma regio no espao que outra no

    mesmo instante? E, se ocuparem a mesma regio no espao, uma no acabaria interferindo na

    propagao da outra? Como podemos explicar isso?

    1O appletest disponvel em http://br.geocities.com/saladefisica3/laboratorio/difracao/difracao.htm

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    Duas ou mais ondas podem passar, sim, simultaneamente pela mesma regio do espao.

    Quando isso acontece, as ondas se superpem, isto , se somam algebricamente, ponto a ponto no

    espao, para produzir uma onda resultante. A superposio de ondas no altera a propagao de

    cada onda; apenas seus efeitos se somam, acentuando-se ou reduzindo-se, quando esto passando

    simultaneamente pelo mesmo lugar do espao, dependendo da diferena entre suas fasesindividuais.

    Duas ondas de mesmo comprimento de onda esto em fasese a diferena de fase entre elas

    for nula ou igual a um nmero inteiro qualquer de comprimentos de onda. Se as ondas esto em fase,

    combinam-se aumentando sua amplitude; se estiverem fora de fase, combinam-se reduzindo sua

    amplitude. Novamente podemos comprovar virtualmente esse fenmeno fazendo uma simulao

    computacional com outro applet2. Essa simulao computacional demonstra o princpio da

    superposio para dois pulsos que se cruzam, em fase ou fora de fase, e de maneira completa ou

    parcial. Atravs de sua manipulao, podemos comprovar que, aps os pulsos de onda se

    encontrarem na mesma regio do espao e se combinarem, voltam a se propagar como se nada

    tivesse acontecido.

    4.5. Interferncia

    O fenmeno da combinao de ondas que acabamos de abordar o da interferncia, e se

    refere apenas amplitude da onda, no a sua propagao. A superposio de pulsos de onda em

    fase, portanto, denominada interferncia construtiva, e a superposio de pulsos de onda

    totalmente fora de fase, interferncia destrutiva. Em outras palavras, se duas ondas chegarem a um

    anteparo qualquer em fase, a combinao (soma algbrica) das duas somar seus efeitos; se duas

    ondas chegarem a um anteparo qualquer completamente fora de fase, a combinao reduzir o efeito

    final em relao aos efeitos que seriam provocados individualmente por cada uma das ondassozinha. A interferncia uma caracterstica tpica de qualquer movimento ondulatrio e pode ser

    notada em muitos fenmenos do nosso dia-a-dia. Sugerimos que sejam realizadas no mnimo duas

    experincias reais onde podemos observar a interferncia da luz que passa por uma fenda dupla3 e a

    interferncia da luz que passa por um fio de cabelo4 , antes de seguirmos com essa reviso5.

    Um aspecto bastante importante referente s fontes das ondas a questo de sua coerncia.

    Duas fontes de onda so consideradas coerentes se a diferena entre suas fases individuais

    (diferena de fase) no mudar com o tempo quando essas ondas se encontram. Em outras palavras,

    preciso que as fontes mantenham constante sua diferena de fase, mesmo quando cada fase

    individual varia com o tempo.

    4.6. Polarizao

    2O appletesta disponvel em http://br.geocities.com/saladefisica3/laboratorio/superposicao/superposicao.htm

    3Disponvel em: http://educar.sc.usp.br/experimentoteca/fisica/kit6_otica_fisica/exp2_otica_fisica.pdf

    4Disponvel em: http://educar.sc.usp.br/experimentoteca/fisica/kit6_otica_fisica/exp3_otica_fisica.pdf

    5 Os endereos so apenas sugestes pois existem vrios experimentos reais que demonstram o fenmeno da

    interferncia que podem ser utilizados.

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    Como acabamos de ver, a difrao e a interferncia aplicam-se a qualquer tipo de movimento

    ondulatrio. Em contrapartida, a polarizao, fenmeno que passaremos a abordar, uma

    propriedade exclusiva das ondas transversais.

    Ondas transversais so aquelas em que a direo de propagao e a direo de vibrao da

    onda so transversais, isto , mutuamente perpendiculares. Como exemplos, podemos citar omovimento vibratrio para cima e para baixo, produzindo uma onda numa corda, ou o movimento,

    oscilatrio do campo eltrico da luz, se considerarmos o modelo ondulatrio clssico da mesma.

    Ondas longitudinais, ao contrrio das transversais, so aquelas em que a direo de propagao e a

    direo de vibrao so coincidentes. As ondas sonoras so os exemplos mais familiares de ondas

    longitudinais.

    Como referimos anteriormente, somente as ondas transversais podem ter polarizao. Vamos

    usar o exemplo da luz para explicar o fenmeno da polarizao. Polarizar linearmentea luz significa

    fazer o campo eltrico da luz oscilar num mesmo plano enquanto ela se propaga; polarizar

    circularmente a luz significa fazer o campo eltrico da onda luminosa da luz girar em torno de um

    eixo, mantendo sua amplitude constante, ou seja, a direo de polarizao da onda , por definio, a

    direo de oscilao de seu campo eltrico. Portanto, a luz pode ser polarizada. A luz emitida pelo

    Sol ou por lmpadas comuns, ou a luz refletida pelos objetos, no-polarizada ou apenas

    parcialmente polarizada (no caso da luz refletida por objetos). Contudo,como j mencionamos, podem

    vir a ser polarizadas se as fizermos atravessar filtros polarizadoresde luz (filtros polarides).

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    5. A experincia da dupla fenda e a natureza ondulatria da luz

    5.1. Um pouco da histria da luz

    Uma das questes mais cruciais da histria da cincia sempre foi a de descobrir se a luz

    constituda por partculas ou por ondas. Essa a questo da naturezada luz e tem-se notcia de que

    intrigou os homens desde a poca dos gregos antigos.Os gregos antigos acreditavam que a luz fosse formada por minsculos gros de algum tipo

    de matria, certamente diferente da matria ordinria. Alguns deles afirmavam que a luz estava

    presente nos nossos olhos, na forma de pequenas partculas emitidas, que, ao atingirem um objeto,

    tornavam-no visvel. Essa idia comeou a ser questionada no incio do sculo XVII e, em 1678, o

    astrnomo e fsico holands Christian Huygens (1629-1695) props que a luz seria composta por

    ondas. Segundo Huygens, a luz podia se propagar no vcuo (entre o Sol e a Terra, por exemplo) por

    existir uma substncia invisvel nessa regio, uma substncia sem massa, difusa e esttica, chamada

    ter luminfero, que permearia todo o universo e os poros da matria e que constituiria o meio de

    propagao das ondas luminosas.

    Em 1704, em sua obra ptica, Isaac Newton (1642-1727) descreveu todas as formas de

    comportamento e qualidades da luz, propondo tambm uma teoria corpuscular da luz, na qual a luz

    seria constituda por partculas ou corpsculos de luz. Newton precisou valer-se de algumas

    hipteses adicionais para conseguir explicar corretamente as leis da reflexo e refrao, j ento

    conhecidas. Entre as hipteses auxiliares, Newton admitiu (erroneamente, hoje sabemos) que a

    velocidade de propagao da luz fosse maior na gua, ou no vidro, do que no ar. Dada a grande

    influncia de Newton durante os sculos XVIII e XIX, a teoria corpuscular da luz foi aceita sem

    grandes questionamentos a partir de ento, sobrepujando largamente a teoria rival proposta por

    Huygens. Alm de Christian Huygens, o fsico ingls Robert Hooke (1635-1703) contrapunha-se

    teoria de Newton para a luz, ao explicar a refrao da luz com uma teoria ondulatria antiga,considerando que a luz se propagasse com velocidade menor na gua, ou no vidro, do que no ar.

    Foram eles os principais defensores da teoria ondulatria da luz na poca. Nessa poca ainda no

    tinha sido observado o fenmeno de difrao e acreditava-se ento, que a luz se propagasse sempre

    em linha reta. Esse foi um dos motivos que levaram Newton a rejeitar a teoria ondulatria da luz.

    Essa situao perdurou at o incio do sculo XIX. Em 1801, o mdico Thomas Young (1773-

    1829) corroborou a teoria da natureza ondulatria da luz com seu famoso experimento da fenda

    dupla.

    5.2. O experimento de Young

    Nesse experimento, Young demonstrou que a luz sofre interferncia, um fenmeno comum a

    todos os tipos de onda. O esquema do experimento de Young est mostrado, esquematicamente, na

    Figura 9.

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    Figura 9 Esquema experimental de Young

    Uma fonte de luz monocromtica incidente ilumina a fenda Sodo anteparo A, onde difratada

    pela fenda, espalhando-se em vrias direes; ao chegar ao anteparo B, a luz dividida em dois

    feixes e novamente difratada pelas fendas S1 e S2; da eles seguem, ento, para uma tela branca, C,

    onde se combinam ponto a ponto e do origem a um padro de franjas claras e escuras alternadas,

    tpico de interferncia ondulatria. Esse padro caracterstico conhecido pelo nome de padro de

    interferncia. No anteparo C, os pontos claros so aqueles onde as ondas sofrem interferncia

    construtiva, o que ocorre quando as ondas provenientes das duas fendas chegam ao anteparo com

    fases iguais (em fase). O conjunto desses pontos constitui uma franja clara. Em outros pontos, as

    ondas sofrem interferncia totalmente destrutiva, o que ocorre quando as ondas ali incidentes esto

    completamente fora de fase (ou seja, com uma diferena de fase igual a radianos). O conjuntodesses pontos forma uma franja escura.

    O padro de intensidade produzido em razo da interferncia tem o aspecto mostrado na

    Figura 10(a), no o da Figura 10(b), o que mostra que o padro resultante da iluminao produzida

    pelas duas fendas no , simplesmente, a soma dos dois padres obtidos com cada uma das fendas

    quando a outra est bloqueada. Se isso ocorresse, a intensidade luminosa na tela seria dada pela

    curva mostrada em azul na figura da direita, quando o que se v, de fato, o padro de intensidade

    mostrado na figura da esquerda.

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    Figura 10 Grfico intensidade versus posio na tela

    Na Figura 11 (a), a intensidade luminosa em cada ponto do anteparo Cdepende da diferena

    de distncias percorridas pela luz nos caminhos seguidos pelos raios r 1 e r2, que chegam ao ponto P.

    Na Figura 11 (b), supondo que D>> d, (onde D a distncia do anteparo B at a tela C e d, a

    distncia entre as duas fendas) e que S1, S2 e b constituam um tringulo retngulo com ngulo

    interno , pode-se mostrar que a diferena entre as distncias percorridas dada por:

    sen.dL =

    Figura 11 Esquema de representao do arranjo experimental de Young.

    Para haver uma franja clara, L deve ser igual a zero ou a um nmero inteiro de

    comprimento de onda, isto :

    .. nsend = onde n = 0,1,2,3,...

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    No caso de uma franja escura, portanto, L deve ser igual a um mltiplo mpar de meios

    comprimentos de onda, ou seja:

    .2

    1.

    += nsend onde n = 0,1,2,3,...

    O padro de interferncia observado na experincia de Young tambm pode ser observado

    nas Figuras 12 (a) e 12 (b), que mostram a tela do softwareDoppelspalt, cujo downloadpode ser feito

    gratuitamente a partir do endereo http://www.physik.uni-

    uenchen.de/didaktik/Computer/Doppelspalt/dslit.html, com o qual passaremos a trabalhar a partir de

    agora.

    (a) (b)

    Figura 12 Padro de interferncia visualizado na tela do softwareDoppelspalt.

    A partir desse experimento, a teoria ondulatriada luz passou a predominar sobre a teoria

    corpuscularde Newton, tornando-se o alicerce terico para a ptica ondulatria desenvolvida a partir

    de ento e alcanando sua formulao fsico-matemtica definitiva na dcada de 1860, com o trmino

    da formulao do eletromagnetismo pelo fsico ingls James Clerk Maxwell (1831-1879).

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    6. A experincia da dupla fenda e a natureza corpuscular da luz

    O experimento de Thomas Young foi abordado em termos ondulatrios, quando uma luz

    monocromtica usada como fonte e atravessa duas fendas estreitas e prximas, produzindo numa

    tela um padro de interferncia semelhante ao que mostrado na Figura 13.

    Figura 13 Vista lateral do arranjo do experimento de Young

    Vamos ver, agora, como o resultado observado na tela do arranjo de Young pode ser

    explicado pela teoria quntica da luz, ou seja, usaremos um outro modelo para a luz, no o modelo

    ondulatrio clssico, em que a luz considerada uma onda eletromagntica, mas um modelo

    corpuscular da luz, considerada como um feixe ou uma corrente de partculas de luz, chamadas deftons. Como havamos feito antes quando explicamos o experimento de Young com base na teoria

    ondulatria, vamos considerar que a fonte emite luz monocromtica, ou seja, luz de uma nica

    freqncia (ou cor). Em termos da teoria quntica da luz, isso significa que todos os ftons emitidos

    pela fonte tm a mesma energia (lembre-se da relao de Planck, Efton = h.f). O nmero desses

    ftons monoenergticosemitidos por segundo pela fonte proporcional grandeza que chamamos

    de intensidade luminosa na teoria ondulatria da luz.

    A intensidade da onda, denotada pela letra I, representa a taxa mdia por unidade de rea

    com a qual a energia transportada, isto , a energia transportada por unidade de tempo e de rea:

    A

    tEI =

    No modelo ondulatrio, a intensidade proporcional ao quadrado da amplitude do campo

    eltrico da onda:2

    EI . No modelo corpuscular, a intensidade, proporcional energia

    transportada, a qual , por sua vez, proporcional ao nmero de ftons incidentes, fhNI .. , onde

    N o nmero de ftons incidentes por unidade de tempo. De acordo com a mecnica quntica, essa

    grandeza, por sua vez, diretamente proporcional probabilidade de encontr-los numa determinada

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    regio, ou seja, proporcional ao quadrado da amplitude da funo de onda. Portanto, se

    considerarmos conjuntamente os dois modelos para a luz, chegaremos concluso de que

    22 E .

    Se diminuirmos a intensidade da fonte at que os ftons cheguem ao detector da tela C

    praticamente um a um, num intervalo de tempo de observao muito curto, obteremos a imagem

    registrada na Figura 14 (a), onde os pontos aparecem aleatoriamente um aps o outro, cada qual

    correspondendo a cada fton detectado na tela de maneira localizada. Ainda assim, quando apenas

    um fton incide de cada vez, se esperarmos um tempo suficientemente longo para que muitos pontos

    se acumulem na tela, observaremos o gradual surgimento de um padro de interferncia. Isso nos

    leva a concluir que cada fton deve ter interferido consigo mesmo aps ter ultrapassado a fenda

    dupla, como se tivesse passado simultaneamente pelas duas fendas! (essa situao ser ilustrada

    com o uso do softwareda fenda dupla)

    Quando o nmero Nde ftons incidentes por unidade de tempo aumenta muito, aproximando-

    se dos valores da ordem daqueles que ocorrem normalmente em situaes encontradas no nosso

    dia-a-dia, a distribuio dos impactos na tela comea a revelar um padro no aleatrio de pontos,

    como o mostrado na Figura 14 (b). Quando o valor de Naumenta ainda mais, o padro delineado

    torna-se mais ntido, como o ilustrado na Figura 14(c).

    Se a observao se estender por um tempo mais longo, aumentando, com isso, o nmero

    total, N, de ftons que j atingiram a tela, os pontos impressos passam a se agrupar em faixas bem

    definidas, dando origem ao padro mostrado nas Figuras 14(b) e 14(c).

    Figura 14 Estgios da formao de um padro de interferncia produzido por dupla fenda.

    Atravs do exemplo numrico, vamos verificar a relao entre o valor da intensidade luminosa

    e o nmero de ftons emitidos num determinado instante.

    Exemplo 1: A mnima intensidade luminosa que o olho humano mdio pode perceber deaproximadamente 10-10 W/m2. Se a radiao incidente possui comprimento de onda de 5.600

    Angstroms, quantos ftons entram por segundo na pupila do olho sob essa intensidade? Pode-se

    tomar a rea de uma pupila tpica como sendo igual a 0,5 x 10 -4 m2.

    Soluo:

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    SendoA

    tE

    I = , ento: E = (10-10 w/m2) x (0,5 x 10-4 m2) x (1 s)

    E = 5.10-15 J

    Sendo fhNE ..= , ento N = 1,4075.104 ftons/s

    Se uma das fendas for coberta, impedindo-se a passagem de ftons atravs dela,

    observaremos na tela um padro de difrao de fenda nica parecido com o que mostrado na

    Figura 15. Agora os ftons incidem em pontos da tela que antes no atingiam quando as duas fendas

    estavam abertas.

    Figura 15 Padro de difrao produzido por fenda nica

    Isso acontece porque o fton que incide na tela comporta-se agora como uma partcula

    clssica, bem localizada e que passa por apenas uma das fendas, sem revelar qualquer sombra de

    um comportamento tipicamente ondulatrio, ou seja, conclumos que um fton pode apresentar tanto

    propriedades corpusculares quanto ondulatrias, dependendo do arranjo experimental que se utiliza

    para efetuar o experimento com ele! Em contrapartida, admitindo que um objeto quntico tenha

    tambm um carter ondulatrio, podemos usar as propriedades ondulatrias associadas a

    comprimento de onda, entre essas a relao de Broglie (p

    h= ).

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    7. Dualidade onda-partcula para luz: onda eletromagntica x feixe de ftons

    Sob determinadas condies, a radiao eletromagntica apresenta propriedades tipicamente

    ondulatrias, tais como difrao, interfernciae polarizao(o experimento de Young constituiu uma

    manifestao basicamente da interferncia). Sob outras condies, porm, a radiao

    eletromagntica comporta-se como se fosse constituda por um feixe de partculas. Esses aspectoscorpusculares da luz s foram revelados pela primeira vez em experimentos realizados nas primeiras

    dcadas do sculo XX, embora o efeito fotoeltrico, de 1887 constitua de fato uma manifestao

    desse carter. Nesse modelo corpuscular a radiao eletromagntica considerada como sendo um

    feixe ou uma corrente de partculas de luz, ou quanta de luz, chamadas atualmente de ftons.

    Dessa forma, a radiao revela um duplo carter fsico, o que significa dizer que se

    comporta como onda sob determinadas circunstncias e como partculas sob outras. Nenhuma das

    teorias ondulatria e corpuscular explica sozinha todos os aspectos e comportamentos da

    radiao observados na natureza. No faz sentido dizer que a radiao uma onda

    eletromagntica, ou um feixe de ftons, mas, sim, que descrita pela fsica com dois modelos

    matemticos concorrentes o modelo ondulatrio e o modelo corpuscular. Portanto, as ondas

    eletromagnticas no so fenmenos puramente ondulatrios nem puramente corpusculares.

    O fato de a natureza da luz deixar de poder ser considerada somente como ondulatria foi

    inicialmente revelado, como afirmamos, no efeito fotoeltrico, que no podia ser explicado

    corretamente com base na teoria ondulatria da luz. Foi Einstein quem, em seu artigo de 1905 sobre

    o efeito fotoeltrico, props o novo modelo corpuscular da luz, juntamente com o conceito de

    quantum de luz. Outros experimentos, porm, especialmente concebidos para testar a hiptese de

    Einstein, revelaram que, sob determinadas condies (ou seja, para determinados arranjos

    experimentais), a radiao realmente se comporta como se fosse formada por um feixe de ftons. Um

    desses experimentos cruciais foi o de espalhamento de raios X em superfcies metlicas, realizadorepetidas vezes e com muita preciso por Compton e sua equipe nos primeiros anos da dcada de

    1920. A partir dele, a comunidade dos fsicos comeou a, gradualmente aceitar a validade da

    hiptese de Einstein para explicar o comportamento observado da radiao.

    Paradoxalmente, a observao do efeito fotoeltrico aconteceu quando Heinrich Hertz

    realizava experincias para confirmar a existncia das ondas eletromagnticas, em 1887. Hertz

    observou que, quando a radiao luminosa ultravioleta incidia sobre um eletrodo negativamente

    carregado e feito de um metal alcalino, promovia uma descarga eltrica (corrente eltrica) entre esse

    eletrodo e o outro (carregado positivamente). Isso constitua uma indicao de que os eltrons

    conseguiam sair da superfcie do metal do eletrodo negativamente carregado pela absoro de

    energia a partir da luz incidente. Nos anos que se seguiram a sua descoberta, o efeito fotoeltrico

    passou a ser estudado detalhadamente com arranjos experimentais que consistiam, basicamente,

    numa cmara lacrada onde era feito vcuo, contendo numa das extremidades uma placa de metal

    alcalino ligada ao plo negativo de uma bateria, um coletor metlico do lado oposto ao da cmara,

    ligado ao plo positivo da bateria, uma fonte de tenso contnua, um voltmetro e um ampermetro,

    conforme mostrado na Figura 16.

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    Figura 16 Arranjo experimental do efeito fotoeltrico

    Entre os dois eletrodos mantida pela bateria uma diferena de potencial cuja polaridade

    podia ser invertida, de modo que os eltrons ejetados do metal (chamados de fotoeltrons) alcalino

    pudessem ser tanto acelerados quanto freados em seu caminho em direo outra placa. Quando a

    luz bate na placa, vrios de seus eltrons superficiais adquirem energia da radiao incidente

    suficiente para que se libertar do campo eletrosttico, que os atrai de volta para a placa alcalina, e

    abandonam o metal com uma determinada quantidade de energia cintica. Esses eltrons, portanto,

    passam a contribuir para a corrente eltrica entre as duas placas, que podia ser medida atravs doampermetro. Para o caso em que a diferena de potencial entre as placas est com polaridade

    invertida em relao da figura mostrada acima, um aumento do valor absoluto dessa voltagem

    provoca portanto, uma diminuio da corrente eltrica da descarga. O valor mnimo de potencial de

    freamento para o qual a corrente cessa totalmente chamado de potencial de corte. Neste caso,

    todos os fotoeltrons provenientes da placa emissora so freados o suficiente para que nenhum

    deles, nem mesmo os mais energticos, alcance a placa coletora. Isso significa, ento, que a energia

    cintica dos fotoeltrons mais energticos toda convertida em energia potencial eltrica no

    momento em que o eltron pra e comea a inverter seu movimento. Assim, medindo-se o valor do

    potencial de corte podia-se determinar a energia cintica mxima dos fotoeltrons emitidos, comvelocidade mxima, a partir da placa alcalina.

    Entretanto, o comportamento observado nesses experimentos no podia ser explicado de

    acordo com algumas consideraes da teoria ondulatria clssica da luz. Havia, basicamente, trs

    resultados experimentais que no podiam ser explicados pela fsica clssica:

    10 - Como mostrado na Figura 17, a corrente eltrica flua somente para valores de potencial

    de freamento superiores ao do potencial de corte (VF na figura). Este comportamento era idntico

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    para vrias intensidades de luz ultravioleta incidente, embora o valor do potencial de corte fosse

    sempre o mesmo, ou seja, a energia cintica mxima dos fotoeltrons independe da intensidade da

    luz, ao passo que a fsica clssica prediz que a energia cintica dos fotoeltrons deveria aumentar

    sempre que a intensidade da luz aumentasse!

    Figura 17 Grfico da corrente i em funo do potencial V. Os dados foram obtidos com o

    aparelho da Figura 16.

    2

    0

    Para qualquerque fosse o valor da intensidade de iluminao, existia um valor mnimode freqncia da luz abaixo do qual o efeito fotoeltrico no ocorria. Isso indicava que a energia

    cintica dos fotoeltrons dependia da freqncia da luz usada, mas no de sua intensidade.

    Entretanto, de acordo com a teoria eletromagntica de Maxwell, a energia cintica dos fotoeltrons

    deveria independer da freqncia da luz, mas ser dependente da intensidade luminosa!

    30 No parecia haver um intervalo de tempo de retardo detectvel entre o instante em que a

    luz incidia sobre a placa e o instante em que surgia a corrente de descarga. Mas a teoria clssica da

    luz exigia que, a fim de acumular energia suficiente para sair do metal, os eltrons deveriam ficar

    absorvendo energia a partir da radiao durante certo intervalo mnimo de tempo, que corresponderia

    ao tempo de retardoesperado entre a incidncia da luz e o aparecimento da corrente eltrica.

    Einstein explicou o efeito fotoeltrico propondo uma nova verso da velha teoria ondulatria

    clssica da luz, qual seja, a hiptese de que a luz formada por pacotes concentrados de energia ou

    quanta de luz, chamados atualmente de ftons. Com essa hiptese, ele conseguiu explicar com

    simplicidade as trs anomalias descritas acima:

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    10 No primeiro caso, no qual a energia cintica no depende de intensidade da luz, a teoria

    dos quanta admite que, ao aumentar a intensidade da luz, o nmero de ftons incidentes que

    aumenta e, conseqentemente, a corrente fotoeltrica tambm, mas no a energia cintica mxima

    desses eltrons, pois tal energia viria da absoro de um fton, cuja energia depende da freqncia,

    no da intensidade da luz.

    20 No segundo caso, no qual a freqncia da luz incidente deveria ter um valor mnimo (f0),

    Einstein argumentou que, quando a energia cintica do fotoeltron nula, o fton doador deve

    possuir uma energia exatamente necessria para ejetar os eltrons; e que, quando a freqncia

    menor do que f0, os ftons incidentes no possuem a energia suficiente para doar aos eltrons e,

    assim, conseguir fazer com que venam a atrao eletrosttica da placa emissora e saiam dela para

    formar a corrente de descarga. Enquanto os eltrons se afastam da superfcie da placa emissora, o

    campo eltrico produzido por esta realiza um trabalho negativo (correspondente ao freamento dos

    eltrons) de valor absoluto igual a0

    w , que Einstein denominou funo-trabalho do metal, ou seja, do

    total de energia que o eltron absorve ao absorver um fton (h.f), uma parte fica com o metal ( 0w ) e

    o restante, com o fotoeltron, na forma de energia cintica. Isso que expressamos com palavras pode

    ser simbolicamente expresso pela equao (Einstein, 1905).

    0whfK =

    0=K 0whf =

    30 No terceiro caso, a ausncia de retardamento automaticamente explicada, pois a

    energia absorvida pelos eltrons da placa emissora de uma s vez, em pacotes inteiros (ftons),

    no de forma gradual, a partir do campo eltrico de uma onda eletromagntica, como pensavam os

    fsicos clssicos.

    So indiscutveis as contribuies que Einstein nos trouxe com seus trabalhos, especialmente

    para a natureza da luz. Nos dias de hoje evidenciamos o efeito fotoeltrico em muitas aplicaes do

    ponto de vista tecnolgico, tais como visores noturnos, fotmetros, dispositivos eletrnicos que

    controlam as portas de elevadores etc.

    A partir da, a radiao eletromagntica, at ento explicada apenas como sendo uma onda

    eletromagntica, passou a ter tambm um carter corpuscular. Do ponto de vista filosfico, a

    descoberta do comportamento dual da onda-partcula representou um marco do pensamento

    racional.

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    8. A experincia da fenda dupla com feixe de eltrons

    O experimento de fenda dupla tambm pode ser realizado com feixes de objetos

    microscpicos, idnticos e dotados de massa. Nosso prottipo desse tipo de objeto microscpico ser

    o eltron. O que podemos esperar como resultado desse experimento levado a cabo com um feixe de

    eltrons, em vez de luz (que um feixe de ftons sem massa)? De acordo com tudo que aprendemosem toda a nossa experincia de vida e de nossa relao com o mundo material a este respeito, se os

    eltrons so partculas massivas, ento deveriam se comportar como bolinhas muito pequenas

    (dotadas de carga eltrica, alm de massa), mas essencialmente bolinhas, nada mais que isso.

    A partir da, a experincia cotidiana nos sugere que tal experimento seria muito parecido com

    uma brincadeira que consiste em atirar um feixe de bolas bolas de tnis, digamos em alta

    velocidade e uma de cada vez (imagine-se uma grande mquina construda para essa finalidade,

    uma espcie de metralhadora de bolas de tnis) contra uma parede de cimento onde existissem

    duas janelas (as fendas). As janelas tm seus centros separados por uma determinada distncia d.

    Uma vez que as bolas so de grande velocidade, todas conseguiriam chegar parede e algumas

    conseguiriam entrar na sala que existe aps a parede, atravessando-a em alta velocidade e atingindo

    uma parede que se encontra do lado oposto da sala. Para melhorar ainda mais a analogia com a

    situao da experincia de fenda dupla com eltrons, poderamos imaginar tambm que as bolas de

    tnis atiradas pela mquina sassem todas pintadas com uma leve camada de tinta vermelha e que

    as paredes da sala aps a parede de porta dupla fossem pintadas de branco e, inicialmente, sem

    nenhuma marca.

    Se a finalidade da nossa mquina no fosse a de atirar bolas de tnis, mas, sim, de produzir

    ondas na gua, observaramos que as ondas se espalhariam por toda a parede alm da janela. E

    com as bola de tnis, o efeito observado seria o mesmo? Como voc, leitor, acha que seria a

    aparncia da parede oposta da sala aps termos esperado tempo suficiente para que um nmeromuito grande de bolas de tnis tenha sido arremessado pela mquina?

    Diferentemente das ondas produzidas na gua, cada bola atingir a parede em apenas uma

    posio. Vamos imaginar ,inicialmente, que apenas uma das janelas est aberta. Embora algumas

    das bolas ricocheteiem nas bordas da janela, a probabilidade de uma bola passar pela janela muito

    maior do que a de ela bater na borda da janela e ser desviada lateralmente. Se esperarmos por

    algum tempo, vamos verificar que as marcas deixadas na parede oposta vo gradualmente revelando

    um padro. A maior parte das bolas incide na parede oposta numa regio situada aproximadamente

    entre as duas linhas perpendiculares parede e que passam pelas bordas laterais da mesma. Fora

    dessa regio, o nmero de marcas diminui rapidamente, tanto para um lado como para outro.

    Podemos visualizar o padro resultante na Figura 18, onde usamos o softwareDoppelspalt para uma

    fonte de balas de espingarda na mesma situao descrita acima (somente uma fenda aberta). Um

    padro semelhante observado quando for a outra janela que estiver aberta, apenas com um

    pequeno deslocamento para o lado da nova janela aberta. Essa distribuio resultante de marcas

    corresponde densidade de probabilidade de uma bola atravessar a sala e colidir com a parede

    oposta na vizinhana de um determinado ponto quando apenas uma das janelas est aberta.

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    Figura 18 Lado esquerdo: Padro observado no softwareDoppelspalt quando a fonte uma

    metralhadora e apenas uma das fendas est aberta. Lado Direito: Grfico do nmero de impactos na

    tela em funo da posio na mesma. O centro do grfico um ponto da tela diretamente frente do

    centro da fenda.

    Continuando com nossa brincadeira, vamos agora imaginar que as duas janelas estejam

    abertas. Neste caso, o que voc imagina que acontece com as marcas de bolas na parede oposta

    medida que o nmero de impactos vai se tornando muito grande? A distribuio das marcas que as

    bolas deixam na parede oposta da sala, isto , sua distribuio, ser parecida com a do caso

    anterior?

    Certamente, com as duas janelas abertas aumenta o nmero total de bolas que incidem na

    parede oposta da sala. Com o decorrer do tempo, observamos que vai surgindo gradualmente um

    padro na distribuio das marcas, com duas regies onde existem altas concentraes de marcas

    de impacto, centradas em pontos separados por uma distncia aproximadamente igual que existe

    entre os centros das janelas (d). Essa distribuio resultante, na verdade, nada mais do que a soma

    de duas distribuies, como a da Figura 18, mas deslocadas por uma distncia aproximadamenteigual a d, como podemos observar na Figura 19. Essa distribuio resultante de marcas corresponde

    densidade de probabilidade de uma bola atravessar a sala e colidir com a parede oposta na

    vizinhana de um determinado ponto quando ambas as janelas esto abertas.

    FIGURA 19: Padro observado no software Doppelspalt quando a fonte so balas de

    metralhadora e as duas fendas esto abertas. A distncia aproximada d entre os centros dos dois

    picos do grfico de 50 unidades.

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    Entretanto, o que nos garante que as bolas no interferem entre si, como ocorre com as

    ondas no experimento de Young, quando foi comprovada a interferncia da luz que passa por duas

    fendas? Ou as bolas no poderiam ricochetear umas contra as outras, desviando-se por todos os

    lados? Isso no seria um tipo de interferncia? Sim, seria, mas, para que isso ocorra, as bolasdeveriam ter sado da mquina ao mesmo tempo, o que no acontece. (Imagine-se a situao

    ilustrada na Figura 20, em que nossa mquina fosse semelhante a uma metralhadora. Suas balas

    no sairiam ao mesmo tempo da metralhadora, mas uma de cada vez, embora com alta freqncia.)

    Ou seja, cada bola deve ter passado por uma ou por outra janela, mas no por ambas ao mesmo

    tempo!

    Figura 20 Balas de metralhadora incidindo em duas fendas

    E se usarmos eltrons no lugar de bolas? Vamos deixar de lado a nossa metralhadora de

    bolas de tnis e imaginar agora que a fonte seja um filamento aquecido capaz de emitir eltrons, os

    quais so colimados na sada da fonte, formando um feixe direcionado (como se fosse um canho de

    eltrons). Que padro voc acha que ser agora observado na tela (semelhante nossa parede do

    lado oposto da sala da analogia anterior)? Como voc acha que o resultado do experimento de duas

    fendas poderia ser interpretado neste caso? O padro observado na parede, que agora serrepresentado por pontos causados pelos impactos dos eltrons numa tela pintada com tinta sensvel

    aos impactos. O padro de impactos que vai se formando medida que o tempo passa ser o

    mesmo observado com as bolas de tnis?

    Para quantificar a distribuio dos eltrons na tela, podemos usar um contador de Geiger,

    posicionado em cada posio da mesma, o qual nos permite realizar uma contagem cumulativa dos

    impactos numa vizinhana daquele ponto. A Figura 21 uma representao esquemtica de como

    fica o arranjo experimental de Young quando a fonte passa a ser de eltrons. O padro de impactos

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    das bolas de tnis e o padro resultante dos impactos eletrnicos esto mostrados juntos, para

    comparao, no lado direito da figura. O padro mostrado mais direita corresponde ao dos impactos

    de eltrons na tela.

    Figura 21 Arranjo experimental de Young com eltrons. O padro mostrado mais direita

    corresponde ao dos impactos de eltrons na tela.

    Assim que o filamento aquece bastante e comea a emitir eltrons, observamos na tela C que

    um padro comea a se formar e fica evidente que a distribuio muito diferente daquela obtida

    com as bolas de tnis da experincia imaginria anterior, pois os eltrons detectados na tela no

    diminuem tanto para um lado como para outro, mas, sim, distribuem-se em bandas, com espaos

    negros entre elas, em regies onde poucos eltrons ou nenhum eltron chega, exatamente como no

    caso do experimento de Young para a radiao eletromagntica. O padro observado o mesmo da

    interferncia com luz! Ou seja, neste experimento, os eltrons esto se comportando como se fossem

    ondas. Ser que isso est acontecendo porque o nmero de eltrons emitidos muito grande? O que

    observaramos se fosse emitido apenas um eltron de cada vez, de maneira que apenas um deles

    incide no anteparo de fenda dupla e tambm na tela de cada vez? Antes de ler as observaes

    registradas abaixo, use o softwareDoppelspalt e verifique por sua conta.

    As observaes registradas so as seguintes:

    1. O detector s registra nmeros inteiros de eltrons, pois nunca chegam at ele eltrons

    fracionados (podemos comparar essa caracterstica para partculas clssicas como balas de

    metralhadoras ou sprays);

    2. Se a fonte de eltrons for muito fraca, eles chegaro ao detector ao acaso e praticamente

    um a um. Podemos medir a distribuio de probabilidade correspondente a ter uma s fenda aberta

    (que igual a P1 ou P2), ou a duas fendas abertas (P1,2 P1 + P2). Mesmo com a intensidade da fonte

    muito fraca, se esperarmos por um tempo suficientemente longo, obteremos uma figura de

    interferncia tal qual a obtida com as ondas luminosas;

    3. Se uma das fendas for fechada, os eltrons detectados na tela acumulam-se formando um

    tpico padro de difrao de fenda nica, com franjas brilhantes laterais a uma central. Isso bem

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    diferente do caso das bolas de tnis atiradas contra uma nica fenda (janela), que no formam um

    padro como esse, pois seu comprimento de onda muito pequeno em relao largura das fendas.

    Isso faz com que as franjas de difrao fiquem to juntas que se superpem, resultando numa regio

    com iluminao mais ou menos uniforme, sem franjas. Por isso no as notamos no caso de objetos

    macroscpicos dotados de massa.As observaes destacadas nesse experimento distribuem-se da seguinte maneira: as

    observaes 1 e 2 so caractersticas de partculas clssicas, mas a observao 3 tem caracterstica

    de ondas! Como conciliar isso? Como podemos aceitar esse comportamento aparentemente

    contraditrio e muito estranho? S temos uma concluso plausvel:

    Os eltrons (ou outras partculas qunticas) no se comportam nem como partculas

    clssicas nem como ondas clssicas, embora, dependendo do experimento que se realize, revelem

    possuir propriedades de ambas.

    Esse experimento nos mostra que eltrons e outras partculas qunticas compartilham do

    carter ondulatrio com o eletromagnetismo clssico, assim como as radiaes eletromagnticas

    compartilham com as partculas clssicas um carter corpuscular da forma como Einstein postulou:

    pacotes de energia para a radiao.

    Se partculas qunticas, tais como eltrons e ftons, possuem tanto propriedades

    corpusculares quanto ondulatrias, o que voc pensa a respeito das partculas macroscpicas? Elas

    no poderiam tambm apresentar esse comportamento dual, ou seja, apresentar ora um

    comportamento tipicamente corpuscular, ora um tipicamente ondulatrio?

    Essa questo foi abordada em 1923-1924 pelo fsico francs Louis de Broglie quando

    desenvolvia sua tese de doutoramento em fsica terica. Ele, ento, props que aquilo que

    chamamos de partculas ou corpos, por serem feitos de matria, seriam, na verdade, ondas de

    matria, de maneira que o comportamento dual (isto , ora de onda, ora de partcula ou corpsculo),at ento apenas associado radiao eletromagntica, tambm se aplicaria matria. Assim, para

    a matria tambm a energia est relacionada com a freqncia de uma onda associada, como no

    caso da radiao: E = h.f. De acordo com De Broglie, todos os corpos eltrons, ftons, tomos,

    balas de metralhadoras, pessoas, animais ou planetas possuem um comprimento de onda dado

    por uma relao que j foi vista no tpico 5:

    p

    h= , onde vmp .= .

    Na relao de De Broglie (como chamada a equao acima), grandezas caractersticas de

    partculas (energia e momentum) esto agora associados a grandezas caractersticas de ondas(freqncia e comprimento de onda), atravs da constante de Planck (h).

    Se todos os corpos apresentam, alm de propriedades corpusculares, tambm propriedades

    ondulatrias, por que no evidenciamos isso no nosso cotidiano? Se isso acontece, no poderamos

    dizer, por exemplo, que as balas que saem de uma metralhadora, ao invs de seguirem em linha reta,

    deveriam apresentar efeitos tpicos de difrao e de interferncia, como padres de franjas obtidos

    com feixes de metralhadora.

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    Os efeitos ondulatrios no so observados em objetos macroscpicos porque os

    comprimentos de onda desses corpos so muito pequenos, de tal modo que a interferncia e a

    difrao so desprezveis. J com objetos qunticos, dotados de quantidades de movimento muito

    menores e que correspondem a comprimentos de onda muito maiores, a difrao pode ser

    aprecivel. Da mesma forma, no evidenciamos a natureza ondulatria da propagao da luz emtica geomtrica porque as dimenses dos equipamentos utilizados (como lentes, espelhos ou

    fendas) so bastante grandes quando comparados com o comprimento de onda da luz.

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    9. A funo de onda e a natureza probabilstica da teoria quntica

    Agora que confirmamos em nossas atividades virtuais o carter ondulatrio das partculas,

    que confirma a hiptese de De Broglie, vamos verificar qual grandeza fsica explica a natureza

    dessas ondas. Como podemos associar uma funo ao movimento de uma partcula microscpica?

    Qual o tipo de descrio que temos para os movimentos em escala microscpica?As respostas s nossas questes foram objetos de estudo de muitos fsicos e, depois de

    vrias tentativas sem nenhum sucesso, verificou-se que nenhuma grandeza fsica at ento

    conhecida explicava a natureza dessas ondas. Para tentar solucionar essa questo, foi proposta uma

    funo de Onda, a funo psi (), da qual tratamos, juntamente com uma interpretao fsica para a

    mesma.

    O destaque histrico da poca foi para dois grandes nomes: Edwin Schrdinger, em 1926, e

    Max Born, em 1927. Schrdinger destacou-se pela descoberta da equao que leva o seu nome, a

    qual determina a evoluo temporal da funo de onda associada a objetos microscpicos. Como

    mencionamos no tpico 2, a entidade matemtica que descreve o estado de um sistema quntico

    sua funo de onda , que uma soluo da equao de Schrdinger. A funo de onda contm

    todas as informaes fsicas a respeito do estado do sistema que descreve, ou seja, podemos

    identific-la como o prprio estado do sistema quntico, pois ela que define completamente o

    estado do sistema quntico correspondente. Contudo, mesmo fornecendo todas as informaes de

    que se pode dispor sobre o estado quntico do sistema, o nmero dessas informaes limitado, e

    essas limitaes so inerentes natureza, no se trata de limitaes tecnolgicas. Por exemplo, para

    um eltron, uma funo de posio e do tempo, mas no do momentum. Isso tem ntima relao

    com o princpio da incerteza de Heisenberg (1927), mas, mesmo sendo limitadas, de forma alguma

    essas informaes podem ser consideradas incompletas. A verso de Schrdinger da teoria quntica,

    atravs de sua equao de onda, foi denominada mecnica ondulatria.A funo de onda , entretanto, no uma funo real. Trata-se de uma funo complexa.

    Como o prprio nome sugere, uma funo complexa por si mesma no pode representar uma

    grandeza fsica, mensurvel, pois possui uma parte imaginria. A prpria , portanto, no possui um

    significado fsico direto. Somente grandezas ou observveis reais possuem um significado fsico

    direto e podem ser medidas atravs de experimentos e instrumentos. Matematicamente, isso significa

    que a possui uma parte real e uma parte imaginria e que deve ser escrita na forma geral iba .+ ,

    onde ae bso funes reais e i a unidade imaginria, definida como 1=i .

    Como a funo de onda complexa, usando um pouco de lgebra, depois de multiplic-la

    pelo seu complexo conjugado, obtm-se o resultado 2|| , que o mdulo (valor absoluto) da

    funo ao quadrado, que uma funo real, no complexa. Essa funo, sim, possui um significado

    fsico direto e fornece a probabilidade, por unidade de volume, de se encontrar a partcula na

    vizinhana de um ponto do espao e num determinado instante de tempo; por isso, seu significado

    fsico o de uma densidade de probabilidade. Foi o fsico alemo Max Born (1882-1970) quem, em

    1927, props essa interpretao para o mdulo ao quadrado da funo de onda, razo por que

    ganhou o prmio Nobel em 1954.

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    No caso muito simples de um sistema quntico formado por uma nica partcula

    microscpica, a funo de onda depende do parmetro te da posio espacial da partcula, ou seja,

    de suas trs coordenadas espaciais. Contudo, no caso de sistemas qunticos mais complexos, ela

    dever ser funo de vrios observveis fsicos, no apenas da posio de uma s partcula.

    Entretanto, como comentamos antes, nem todos os observveis so compatveis para um dadosistema quntico. Isso significa que, como argumentos da funo de onda, s podem comparecer

    observveis compatveis entre si. Portanto, para conhecer a e o estado quntico de um sistema

    necessrio determinar um conjunto mnimo de observveis compatveisassociados ao sistema.

    Com sua interpretao, Born conseguiu relacionar a funo de onda com a probabilidade

    de localizao dos objetos microscpicos. Isso significa que as solues da equao de Schrdinger

    no fornecem trajetrias nem descrevem a propagao de algo material (como o caso das funes

    de onda que descrevem a propagao de ondas sonoras, ondas mecnicas em geral ou ondas

    eletromagnticas), mas somente probabilidades de localizao das partculas! (Por meio de seu

    mdulo ao quadrado.) Essa interpretao causou grande desconforto na poca, traduzindo-se num

    problema conceitual e filosfico, pois, dessa maneira, no mundo atmico o determinismo deveria ser

    abandonado!

    Para compreendermos o sentido do determinismo na fsica clssica e, ento, podermos

    compar-lo com a descrio probabilstica, devemos salientar que, na descrio determinista, se

    conhecermos as condies iniciais do movimento de uma partcula macroscpica (ou seja, sua

    posio inicial e sua velocidade, ou momentumlinear, inicial), poderemos determinar, a partir das leis

    de Newton, a descrio do movimento em termos da posio e da velocidade (ou momentumlinear)

    em qualquer instante. Em outras palavras, conhecendo o presente (condies iniciais), poderemos

    determinar (da o termo determinismo) o futuro. Na mecnica quntica isso no verdadeiro.

    De acordo com tal interpretao, a equao de onda de Schrdinger constitui, portanto, ummodelo estatstico, incapaz de nos fornecer o valor que uma grandeza especfica ter num instante

    especfico, ou seja, o modelo quntico capaz de nos fornecer a probabilidade de cada valor

    esperado vir a ser observado naquele determinado instante.

    O fato de a teoria quntica no fornecer um valor especfico, mas apenas relacionar possveis

    valores e a probabilidade de ocorrncia de cada um, resultou num famoso (e muito respeitoso)

    duelo intelectual entre Einstein e Bohr (Figura 22).

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    Figura 22 Einstein e Bohr

    Voltando s nossas atividades virtuais e s concluses a que chegamos, quando as

    partculas us