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  • DBORA ANTUNES

    A RETRICA NO JORNALISMO OPINATIVO:

    UMA ANLISE DA ARGUMENTAO DE

    HLIO SCHWARTSMAN

    Viosa - MG

    Curso de Comunicao Social/Jornalismo da UFV

    2009

  • I

    DBORA ANTUNES

    A RETRICA NO JORNALISMO OPINATIVO:

    UMA ANLISE DA ARGUMENTAO DE

    HLIO SCHWARTSMAN

    Monografia apresentada ao Curso de Comunicao

    Social/ Jornalismo da Universidade Federal de Viosa,

    como requisito parcial para obteno do ttulo de

    Bacharel em Comunicao Social.

    Orientadora: Mariana Ramalho Procpio

    Viosa - MG

    Curso de Comunicao Social/Jornalismo da UFV

    2009

  • II

    Universidade Federal de Viosa

    Departamento de Comunicao Social

    Curso de Comunicao Social/Jornalismo

    Monografia intitulada A retrica no jornalismo opinativo: uma anlise da argumentao de

    Hlio Schwartsman, de autoria da estudante Dbora Antunes, aprovada pela banca examinadora

    constituda pelos seguintes membros:

    ____________________________________________________

    Profa. Mestra Mariana Ramalho Procpio (orientadora)

    Curso de Comunicao Social/ Jornalismo da UFV

    ____________________________________________________

    Prof. Mestre Ricardo Gomes Duarte da Silva

    Curso de Comunicao Social/ Jornalismo da UFV

    _____________________________________________________

    Profa. Doutora Mnica Santos de Souza Melo

    Curso de Letras da UFV

    VIOSA, 11 DE NOVEMBRO DE 2009

  • III

    AGRADECIMENTOS

    O espao destinado aos agradecimentos pequeno para citar todas as pessoas que

    estiveram comigo durante estes anos. Lembro dos professores, que desde a infncia me guiaram

    na busca do conhecimento. Dos amigos e colegas que ficaram pelo caminho, mas que

    contriburam muito para meu amadurecimento. Dos familiares que incentivaram meus passos e

    estiveram presentes durante todos os anos de minha vida.

    Ainda menores ficam estas linhas quando falo dos meus pais, Rita e Itamar, que tanto

    batalharam para dar mais oportunidades do que tiveram para mim e para o meu irmo. Para eles

    dedico meu eterno agradecimento e meu amor incondicional. Agradeo-os por todos os meus

    mritos, que s foram possveis por eles; por todas as minhas alegrias, que sempre

    compartilharam e tambm me deixarem saber que sempre poderia contar com eles em momentos

    menos prsperos.

    Ao meu irmo, Diogo, agradeo pelas horas de risadas durante a madrugada, por ter me

    feito esquecer esta monografia quando j estava cansada dela. Pela infncia e adolescncia

    divididas, pelas brigas e pela amizade. Tambm como parte da famlia, agradeo ao pequeno

    Whisky, meu cachorrinho que chegou tomando espao e que alegra meus dias nos ltimos

    tempos.

    Com carinho especial tambm agradeo aos amigos de Viosa. Manuella, amiga to

    cheia de defeitos como eu: que no liga nas frias, que se irrita e que se cansa do mundo. Mas

    que sabe que mesmo assim somos amigas e esta amizade s deu certo por conta dos tantos

    defeitos compartilhados. Marianna, pela amizade e por me fazer ver que todos tm seus

    momentos e seu lado meigo, delicado e cheio de frescuras, no bom sentido, claro. Ao Tim,

    Felipe, Aramis, Ana Paula, Dbora, Ana Terra, Sabrina e Jos Tarcsio, pelas risadas, pela

    amizade, pelos trabalhos e por compartilharem comigo um pedao de suas vidas.

    Agradeo tambm professora Bia, responsvel por parte da minha educao quando eu

    ainda era uma criana, e que gentilmente fez a correo deste trabalho. Ao amigo Rafael, que me

    ajudou na etapa final deste trabalho e que sempre me fez rir com seu mau humor to tpico. E,

    finalmente, professora e orientadora Mariana, que s no se tornou uma amiga pela falta de

    tempo e incompatibilidade de espao, mas que sempre se mostrou to gentil quanto inteligente. A

    ela tambm agradeo por ter me feito acreditar mais nos caminhos do conhecimento.

  • IV

    RESUMO

    Este trabalho pretende mostrar como um dos gneros opinativos, o artigo, ainda figura na

    sociedade atravs do articulista Hlio Schwartsman. Para tanto, selecionamos sete artigos que

    sero analisados no s quanto ao gnero, mas tambm pelo vis da Nova Retrica.

    Esta teoria foi proposta por Chaim Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) no sculo XIX e

    corresponde a uma atualizao dos preceitos da antiga retrica. A adaptao feita possibilita a

    aplicao destes estudos a auditrios miditicos.

    PALAVRAS-CHAVES

    Jornalismo opinativo; artigo; nova retrica; argumentao

    ABSTRACT

    This paper intends to demonstrate how one of opinative genres, the article, still figures in

    society through the article-writer Hlio Schwartsman. For this purpose, we selected seven articles

    that are going to be analyzed not only in respect to genre, but also through the New Rethoric

    perspective.

    This theory was proposed by Chaim Perelman & Olbrechts-Tyteca in the XIX century and

    corresponds to a modernization of the precepts of ancient rhetorics. Such adaptation turns the

    aplication of these studies possible to midiatic audiences.

    KEY-WORDS

    Opinative journalism, article, new rethoric, argumentation.

  • V

    LISTA DE GRADES

    GRADE 1 Exemplo de argumentos quase-lgicos .................................................... 27

    GRADE 2 Exemplo de argumentos baseados na estrutura do real ............................ 30

    GRADE 3 Exemplo de argumentos que fundam a estrutura do real ......................... 32

    GRADE 4 Exemplo de argumento de dissociao .................................................... 33

    GRADE 5 Apresentao do corpus ........................................................................... 37

    GRADE 6 Levantamento quantitativo dos argumentos ............................................ 50

  • VI

    SUMRIO

    INTRODUO ............................................................................................................ 08

    CAPTULO 1 O JORNALISMO OPINATIVO E CONSIDERAES SOBRE

    SEUS GNEROS ......................................................................................................... 11

    1.0 Consideraes inicias ................................................................................................ 11

    1.1 O jornalismo opinativo .............................................................................................. 12

    1.2 Os gneros opinativos no Brasil ................................................................................ 14

    1.3 Especificidades do gnero artigo .............................................................................. 17

    1.4 Os artigos opinativos como discurso ........................................................................ 18

    1.5 Consideraes finais ................................................................................................. 20

    CAPTULO 2 RETRICA E TEORIAS DA ARGUMENTAO .................. 21

    2.0 Consideraes iniciais .............................................................................................. 21

    2.1 Conceitos bsicos da Nova Retrica ........................................................................ 22

    2.2 Aspectos relevantes para a argumentao ................................................................ 23

    2.3 Tcnicas argumentativas e classificao dos argumentos ........................................ 24

    2.3.1 Os argumentos quase lgicos .................................................................... 25

    2.3.2 Os argumentos baseados na estrutura do real ........................................... 28

    2.3.3 Os argumentos que fundam a estrutura do real ........................................ 31

    2.3.4 Os argumentos de dissociao .................................................................. 33

    2.4 A interao dos argumentos .................................................................................... 33

    2.5 Consideraes finais ................................................................................................ 35

    CAPTULO 3 OS ARTIGOS DE HLIO SCHWARTSMAN SOB A LUZ DA

    NOVA RETRICA ................................................................................................... 36

    3.0 Consideraes iniciais ............................................................................................ 36

  • VII

    3.1 Apresentao do corpus ....................................................................................... 37

    3.2 Aplicao das teorias da argumentao ................................................................. 39

    3.2.1 Cincia sob ataque .................................................................................. 39

    3.2.2 F na cincia ........................................................................................... 41

    3.2.3 Tudo relativo ........................................................................................ 42

    3.2.4 O prazer de perdoar ................................................................................ 44

    3.2.5 Clima de guerra ...................................................................................... 46

    3.2.6 O caso Isabella ....................................................................................... 47

    3.2.7 O no to livre arbtrio ........................................................................... 48

    3.3 Consideraes finais ............................................................................................. 50

    CONCLUSO ......................................................................................................... 52

    BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 56

    ANEXOS ................................................................................................................. 58

    Anexo 1 - Cincia sob ataque ................................................................................... 58

    Anexo 2 - F na cincia ............................................................................................ 61

    Anexo 3 - Tudo relativo ......................................................................................... 65

    Anexo 4 - O prazer de perdoar ................................................................................. 68

    Anexo 5 - Clima de guerra ....................................................................................... 71

    Anexo 6 - O caso Isabella ........................................................................................ 74

    Anexo 7 - O no to livre arbtrio ............................................................................ 77

  • 8

    INTRODUO

    Lead, pirmide invertida, objetividade e simplicidade. Estes so os elementos do atual

    padro do jornalismo informativo, to difundido na prtica cotidiana e na academia. As formas de

    construo textuais livres destes padres so relegadas a um segundo plano e ganham pouco

    espao nas instituies que praticam ou ensinam a profisso.

    Desejamos, com este trabalho, sair do ponto deste ponto de vista informativo e estudar o

    jornalismo opinativo. Pois acreditamos que o jornalismo tambm deve apresentar pontos de vista

    e conceitos capazes de aprimorar a cultura da sociedade, incitando o questionamento entre os

    cidados. Desta forma, no queremos desmerecer o jornalismo informativo, mas sim valorizar o

    jornalismo opinativo na imprensa contempornea, cuja presena se encontra reduzida.

    A carncia do jornalismo opinativo mostrada por Melo (2003):

    Se, no passado, o espao aberto para a colaborao dos intelectuais era maior, na

    imprensa brasileira, hoje ele se reduz pela prpria tendncia que assume o

    jornalismo impresso de se pautar por modelos industriais de eficincia e

    profissionalismo. (MELO 2003:129)

    Embora a constatao tenha sido feita com base na mdia impressa, pode-se estend-la

    tambm para os outros meios quando se fala de jornais tradicionais. Na web, por exemplo, os

    jornais ainda seguem os modelos impressos, destinando poucas sees ao contedo opinativo.

    Dentre os produtos opinativos no webjornalismo brasileiro, temos o caderno Pensata do

    Folha Online, um webjornal que trata de assuntos de todo o Brasil e que mantido em parceira

    pelo grupo Folha e o provedor de internet Universo Online. Este caderno, o Pensata1, composto

    por colunas de diversos autores, tratando de economia, msica, atualidades, poltica entre outros.

    Um destes colaboradores Hlio Sschwartsman2, que trata das temticas voltadas para

    atualidades em geral, e cuja produo servir como objeto de estudo desta pesquisa.

    Formado em filosofia, mas atuando como jornalista e articulista no Grupo Folha, o autor,

    que possui 44 anos, procura tratar de temas cotidianos sob uma tica opinativa, defendendo seu

    posicionamento frente aos assuntos abordados e dialogando com o leitor, quando isto se torna

    necessrio. Ele mantm uma publicao semanal no peridico online e faz contribuies

    1 O caderno virtual pode ser acessado atravs do endereo http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/.

    2 Os artigos do autor esto listados em http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/.

  • 9

    espordicas para o jornal impresso Folha de So Paulo. Alm disso, autor do livro Aquilae

    Titicans O segredo de Avicena Uma aventura no Afeganisto.

    Entre os artigos apresentados por Hlio Schwartsman selecionamos o corpus atravs de

    trs etapas: primeiro os artigos foram separados de acordo com sua data de publicao, sendo que

    o primeiro semestre de 2008 foi o escolhido para a prxima etapa, pois havia uma publicao

    mais regular por parte do autor. Na etapa seguinte foram analisados os artigos que apresentavam

    uma argumentao de vis mais nitidamente filosfico, por ser esta uma caracterstica que torna

    diferente o discurso de Hlio Schwarstman e tambm uma das cincias que mais se utiliza da

    retrica como forma de argumentao. Dentre os artigos selecionados foram escolhidos como

    corpus final aqueles que partiam de uma premissa factual para incitar as discusses sobre

    determinado tema. Assim, obtivemos sete artigos: Cincia sob ataque, A f na cincia, Tudo

    relativo, O prazer de perdoar, Clima de guerra, O caso Isabella e O no to livre arbtrio.

    Tendo em vista que tais artigos so marcados por estratgias argumentativas, pretende-se

    compreender a seguinte questo: como se manifesta a formao argumentativa no discurso do

    articulista Hlio Schwartsman?

    Com isto, este trabalho tem como objetivo analisar a argumentao dentro do jornalismo

    opinativo. Para tanto faremos uso das definies dos gneros jornalsticos opinativos propostas

    por Melo (2003) e Beltro (1980) e da retrica de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005. Desta

    forma poderemos proporcionar um intercmbio entre os estudos da comunicao e do discurso

    para o aprofundamento dos estudos jornalsticos.

    Embora os estudos sobre a retrica tenham sido menosprezados durante muitos sculos

    (desde o seu surgimento na Grcia Antiga), no sculo XIX, Chaim Perelman trouxe a luz uma

    nova viso desta arte. Denominada Nova Retrica, sua aplicao foi ampliada a auditrios

    miditicos e foram aperfeioados os conhecimentos j alcanados.

    Com base nesta proposta alguns trabalhos j esto aplicando a retrica ao fazer

    jornalstico. Pesquisas como as de Pereira & Rocha (2007) e Freitas (2002) contribuem para um

    maior questionamento da prtica argumentativa, associada ao jornalismo, no meio acadmico. No

    entanto, ambos os trabalhos detiveram-se sobre gneros ou pontos especficos, o que abre espao

    para novas discusses sobre o tema, adicionando conhecimento comunidade cientfica.

    Desta forma, tendo em vista que o discurso opinativo de Hlio Schwartsman marcado

    por estratgias de argumentao, objetivamos tambm compreender como esta formao

  • 10

    argumentativa se manifesta no discurso deste articulista. Para tanto procuraremos verificar

    primeiramente de que forma seu discurso se encaixa no gnero artigo, incluindo suas tipificaes

    e, depois, como o autor se apropria dos modelos argumentativos propostos pela Nova Retrica.

    Iniciamos nossas pesquisas com base em trs hipteses centrais: A primeira tem em mente

    que o autor baseia grande parte de seus artigos em argumentos de autoridade. A segunda hiptese

    prev a ampla utilizao dos argumentos quase-lgicos, descritos por Perelman & Olbrecths-

    Tyteca, os quais abordaremos no captulo apropriado. Como terceira hiptese temos a

    possibilidade da ampla interao argumentativa no discurso do articulista.

    Para realizar nossa pesquisa, optamos pela diviso em trs partes. Na primeira

    estudaremos o jornalismo opinativo e seus gneros, segundo as vertentes de Melo (2003) e

    Beltro (1980). Nesta etapa daremos uma ateno especial ao gnero artigo, por se tratar do

    modelo utilizado para a anlise do corpus.

    No segundo captulo trataremos das teorias relacionadas argumentao sob o ponto de

    vista da retrica. Aqui veremos como os argumentos se fazem presente no discurso e as

    classificaes que recebem. Salientamos que neste captulo teremos grande parte do aporte

    terico e metodolgico de nossa pesquisa. Portanto, requer uma maior ateno do leitor,

    principalmente no que tange a distino entre os diferentes tipos de argumentos.

    Por fim, no terceiro captulo partiremos para a anlise do corpus selecionado.

    Primeiramente analisaremos o discurso de Hlio Schwartsman de um modo geral, para que

    possamos compreender porque estes se classificam dentro do gnero artigo. Em seguida,

    forneceremos um panorama sobre os artigos escolhidos. Aps isto, partiremos para a anlise

    levando em conta as teorias expostas no primeiro e segundo captulos. Ao final desta pesquisa,

    encontram-se disponveis, em anexo, os artigos que fazem parte do corpus.

    Com este trabalho esperamos contribuir para a disseminao do jornalismo opinativo e

    dos estudos da retrica, procurando fazer com que os futuros profissionais (e tambm aqueles que

    j exercem a profisso), ao refletirem sobre estes temas, os levem para seus locais de trabalho.

    Alm disso, ao unir a retrica ao fazer jornalstico, objetivamos tambm aprimorar as

    discusses tericas a respeito do jornalismo, pois a integrao entre estas cincias permite que se

    adquiram novas perspectivas para o tratamento do gnero opinativo artigo no meio acadmico,

    incorporando teorias que podem formar profissionais mais capacitados intelectualmente.

  • 11

    CAPTULO 1 O JORNALISMO OPINATIVO E CONSIDERAES

    SOBRE OS SEUS GNEROS

    1.0 Consideraes iniciais

    Neste primeiro captulo iremos abordar as perspectivas do jornalismo opinativo e de seus

    gneros, salientando as particularidades do artigo. No entanto, antes disto faz-se necessrio uma

    breve explicao sobre os caminhos das pesquisas em jornalismo que levaram as classificaes

    utilizadas e porque elas so necessrias para a rea.

    Os estudos sobre gneros esto presentes no pensamento mundial desde a Grcia Antiga,

    sendo estabelecidos atravs da presena de algumas caractersticas nas unidades textuais

    analisadas. Na contemporaneidade, os gneros servem, de acordo com Pereira e Rocha (2006),

    como um instrumento que permite aos produtores e receptores codificar e decodificar seus textos.

    Marcushi (2003) define os gneros da seguinte forma:

    Trata-se de textos orais ou escritos materializados em situaes comunicativas recorrentes. Os gneros textuais so os textos que encontramos em nossa vida

    diria com padres scio-comunicativos caractersticos definidos por sua

    composio, objetivos enunciativos e estilo concretamente realizados por foras

    histricas, sociais, institucionais e tecnolgicas. (MARCUSHI, 2003:4)

    Devido a sua funo de guia, os estudos dos gneros ganham importncia dentro das

    pesquisas miditicas, j que servem tanto para orientar os jornalistas quanto os leitores. As

    pesquisas neste campo esto em constante atualizao j que h uma evoluo nos gneros, e

    isso permitido pelas transformaes da sociedade, porque o gnero est vinculado s

    caractersticas de espao/tempo (PEREIRA & ROCHA, 2006:46).

    O estudo constante e realizado por diferentes sociedades trouxeram uma grande

    quantidade de classificaes distintas para os gneros jornalsticos. Porm, optamos por estudar

    dois tericos nacionais, Luiz Beltro (1980) e Jos Marques de Melo (2003), pois suas

    classificaes na rea do jornalismo opinativo, apesar de seguirem metodologias diferentes de

    anlise, possuem pontos semelhantes e complementares, divergindo em alguns poucos aspectos

    no que tange a descrio dos gneros. Alm disso, por se tratarem de pesquisadores brasileiros,

    acreditamos que nossa realidade estar melhor retratada em suas obras.

  • 12

    Antes de tabular os gneros propriamente ditos, ambos os autores fizeram divises quanto

    s categorias de jornalismo. Melo (2003) prope apenas duas: o jornalismo informativo e o

    jornalismo opinativo. Estas concluses foram obtidas com base na intencionalidade do relato

    jornalstico.

    J Beltro (1980), estabelece a seguinte diviso: jornalismo informativo, jornalismo

    interpretativo e jornalismo opinativo. O critrio adotado por este autor a funo do jornalismo

    junto ao pblico, ou seja, informar, explicar e orientar. Mas Melo (2003) optou por excluir a

    funo interpretativa por achar que esta pode ser abarcada pelo jornalismo informativo.

    Para esta pesquisa vamos nos deter na anlise da categoria jornalismo opinativo. Marshal

    (2003, apud Pereira & Rocha, 2006) conceitua esta rea como fonte de forte apelo ideolgico,

    servindo de palco para lutas e mobilizaes, defendendo e atacando ideias.

    No entanto, no devemos esquecer que, embora estas manifestaes sejam mais explcitas

    no jornalismo opinativo, tambm aparecem em outras categorias, visto que os produtos

    miditicos so produzidos por pessoas que no esto isentas de valores e que os deixam

    transparecer mesmo que de modo implcito.

    Partiremos agora para os estudos do jornalismo opinativo, para que conheamos um

    pouco melhor suas caractersticas e um pouco da sua histria no contexto nacional, onde a rea

    destinada opinio sofre uma grande carncia.

    Em seguida, aps compreender o cenrio do jornalismo opinativo, seus gneros e as

    especificidades do gnero artigo, faremos uma pequena anlise sobre os artigos opinativos como

    texto e discurso. Esta abordagem ser feita, pois o presente trabalho pretende estudar os artigos,

    pelo vis da retrica, como discurso e, portanto, necessrio saber o que isto representa.

    1.1 O jornalismo opinativo

    O jornalismo opinativo caracterizado pela clara tomada de posio, seja ela do

    jornalista, do editor, do colaborador ou mesmo do leitor de uma determinada mdia. No entanto,

    nem todo assunto digno de expresso opinativa dentro da imprensa, como afirma Beltro

    (1980).

  • 13

    Para este autor, um fato s se torna opinvel quando a sociedade o considera passvel de

    discusso, ou seja, ele no um tabu e capaz de oferecer s pessoas diversas abordagens que

    merecem passar por argumentaes e discusses diante do pblico.

    Podemos entender a opinio como um estado pessoal ou coletivo que vai contra ou a

    favor de uma idia. Sendo que esta idia no possui argumentos sustentados pela lgica formal

    que levem a existncia de uma verdade possivelmente nica, possibilitando a tomada de

    mltiplos posicionamentos. Assim, a opinio depende, com efeito, de um clculo de

    probabilidade, que leva o sujeito a tomar uma atitude intelectiva de aceitao ou no da

    verossimilhana. (CHARAUDEAU, 2006:121) e esta pode ser entendida como uma atitude

    subjetiva.

    A presena opinativa era constante no perodo em que a imprensa mundial se

    desenvolveu. No entanto, esta manifestao opinativa no satisfazia os detentores do poder, que

    logo conseguiram criar mecanismos para controlar a opinio nos jornais.

    E os caminhos so eficazes. A instituio de taxas, impostos e controles fiscais, atacava o flanco da sobrevivncia econmica. A decretao de limites

    liberdade de imprensa Daca conta do cerceamento poltico, estabelecendo o

    mecanismo da censura a posteriori, ou seja, a punio dos excessos cometidos,

    nos termos da legislao vigente. (MELO, 2003:23)

    No contexto nacional, temos os primeiros jornais marcados pela sua produo monoltica,

    ou seja, apenas uma pessoa confeccionava todo o produto, o que gerava a disseminao de uma

    nica opinio em todo o veculo. Melo (2003) cita como exemplo o Correio Braziliense, de

    Hiplito da Costa, e o Sentinela, de Cipriano Barata.

    A fase predominantemente opinativa da imprensa brasileira durou, segundo Beltro

    (1980), desde o perodo regencial at a dcada de XIX. Neste perodo ocorre a Revoluo

    Industrial e o jornal passou a ser visto como um produto empresarial, adotando os padres norte-

    americanos de agilidade, eficcia e objetividade. E estes padres no condizem com a expresso

    opinativa, j que esta requer mais tempo e preparo do jornalista para a elaborao da matria.

    Embora a fase urea da imprensa opinativa tenha acabado, ainda h nos jornais

    contemporneos espaos dedicados a manifestao da opinio. Hoje, diferentemente da poca de

    Hiplito da Costa, a opinio no jornalismo encontra, no jornalismo, uma diversidade de idias,

    devido ao modo de produo das grandes empresas miditicas. Porm, ainda h as limitaes da

    linha editorial de cada veculo, ou seja, um conjunto de noes que a empresa jornalstica toma

  • 14

    como base. Uma explicao para esta diversidade de que As condies de produo do

    jornalismo atual exigem a participao de equipes numerosas, donde a impossibilidade de

    controle total do que se vai divulgar (MELO, 2003:101)

    Atualmente, os gneros opinativos tm a internet como um meio frtil para sua

    propagao. Instituies jornalsticas, como a Abril, j hospedam blogs de seus colaboradores.

    Nestes meios a opinio pessoal do autor que controla o contedo.

    Os jornais tradicionais tambm possuem sua verso online e neste meio o jornalismo

    opinativo pode agir com mais liberdade, pois, h espao para uma abundncia de dados (no h

    o constrangimento das limitaes fsicas) (BERTOCCHI, 2005:9). Alm disso, Bertocchi (2005)

    tambm afirma que o processo webjornalstico marcado pela intercomunicao de muitos para

    muitos, o que cria um contato mais direto com o pblico, que tambm pode deixar sua opinio e

    assim criar um dilogo entre colaborador e leitores, contribuindo para a diversidade de ideias.

    Apesar da constante mutao que o jornalismo, e consequentemente o modelo opinativo,

    sofre a cada ano e, principalmente com o advento da internet, o estudo dos gneros virtuais ainda

    no encontrou uma teoria prpria. Portanto, os produtos deste meio so analisados sob o vis dos

    gneros opinativos impressos, pois estamos de acordo com a seguinte afirmao:

    Acreditamos que os formatos do ciberjornalismo tendem a ser formar a partir dos modelos do jornalismo impresso, num primeiro momento. Isso acontece

    porque o jornalismo nasce vinculado ao meio papel e no jornalismo impresso

    que existem as referncias tericas e prticas mais consolidadas. (BERTOCCHI, 2005:10)

    Aps estas explanaes podemos partir para os estudos dos gneros jornalsticos

    opinativos, desenvolvidos no Brasil, pelos tericos Luiz Beltro (1980) e Jos Marques de Melo

    (2003).

    1.2 Os gneros opinativos no Brasil

    A classificao dos produtos em gneros obedece a critrios sociais e culturais, sendo

    assim, cada poca e cada sociedade possui uma classificao prpria. Na contemporaneidade a

    tipificao dos gneros jornalsticos mais prxima da realidade brasileira a proposta por Melo

    (2003), responsvel pela atualizao da classificao de Beltro (1980) e com o qual compartilha

    algumas especificaes.

  • 15

    Para classificar os gneros opinativos Melo (op. cit.) observou a estrutura dos relatos dos

    textos miditicos:

    No nos referimos especificamente estrutura do relato do texto ou das imagens e sons que representam e reproduzem a realidade. Tomamos em

    considerao a articulao que existem do ponto de vista processual entre os

    acontecimentos (real), sua expresso jornalstica (relato) e a apreenso pela

    coletividade (leitura). (MELO, 2003:64)

    Assim, o autor define oito formatos: editorial, comentrio, resenha/crtica, artigo, crnica,

    coluna, caricatura e carta. J a classificao de Beltro (1980) guia-se pelo senso comum que rege

    a profisso do jornalista, obtendo os gneros: editorial, artigo, crnica, opinio ilustrada e opinio

    do leitor.

    Entre os gneros propostos por Melo (op. cit.) para o jornalismo opinativo temos as

    seguintes semelhanas aos de Beltro (op. cit.): editorial, artigo, crnica, carta e caricatura. No

    entanto, os dois ltimos recebem nomes diferentes na classificao de Beltro, chamando-se,

    respectivamente, opinio ilustrada, que engloba outros elementos alm da charge, e opinio do

    leitor, tambm mais amplo do que a carta. Desta forma, podemos observar que os gneros

    resenha, coluna e comentrio esto presentes apenas na obra de Melo (op. cit.).

    Embora este trabalho tenha como objetivo se deter no gnero artigo, uma breve

    explanao sobre os outros gneros torna-se importante, pois, como afirma Bonini (2003), as

    anlises de gnero no campo jornalstico so feitas atravs da oposio entre os demais. Portanto,

    passemos ao estudo dos gneros editorial, crnica, caricatura (e opinio ilustrada), carta (e

    opinio do leitor), resenha, coluna e comentrio; para depois iniciar as explanaes acerca do

    gnero opinativo artigo.

    O gnero editorial recebe caractersticas semelhantes nas duas obras verificadas e

    observado como a matria, normalmente no assinada, que expressa a opinio oficial da empresa

    jornalstica sobre certo assunto. Isto no significa que a opinio do proprietrio do jornal ser

    colocada no editorial, mas sim o que pensa o consenso responsvel pela organizao da mdia em

    questo.

    J a crnica vista como o mais literrio dos gneros jornalsticos. Seu surgimento

    encontra-se ligado as publicaes peridicas de poetas e ficcionistas que viam na imprensa uma

    forma de se manter financeiramente e de divulgar suas obras. Assim, a crnica vista como um

  • 16

    relato da atualidade feito de forma mais sensvel, situando-se em uma fronteira entre o jornalismo

    e a literatura.

    Apresentando-se de forma diferente dos gneros anteriores, temos a caricatura e a opinio

    ilustrada, que a crtica feita atravs de desenhos ou fotografias, estas ltimas no caso especfico

    da opinio ilustrada, podendo ou no figurar ao lado de textos.

    Aparecendo tambm na obra dos dois autores, temos os gneros prprios para a expresso

    da opinio do leitor. Melo (2003) opta por denomin-lo de carta, enquanto Beltro (1980) prefere

    a nomenclatura genrica de opinio do leitor. A diferena entre ambos encontra-se no fato de que

    Beltro (1980) tambm considera como espao do leitor as modalidades de entrevista, enquete e

    depoimento. Enquanto Melo (2003) v estas situaes como captadoras de informao e no

    como meios para difuso de opinio.

    Quanto aos gneros presentes apenas na obra de Melo (2003) temos a resenha, a coluna e

    o comentrio. A primeira a manifestao crtica a respeito de produtos da indstria cultural, ela

    feita de modo mais informal do que um ensaio acadmico, mas exigindo do jornalista

    conhecimentos especficos sobre os produtos dos quais deseja falar.

    Enquanto isso, a coluna representa o espao destinado a uma miscelnea de informaes,

    sendo comum a presena de notcias recentes que ainda no passaram por uma checagem mais

    aprofundada. Melo (2003:140) usa a seguinte definio para este gnero: Trata-se, portanto, de

    um mosaico, estruturado por unidades curtssimas de informao e de opinio, caracterizando-se

    pela agilidade e pela abrangncia. Na verdade, a coluna cumpre hoje uma funo que foi peculiar

    ao jornalismo impresso antes do aparecimento do rdio e da televiso: o furo.

    J o comentrio encontra-se ligado a uma notcia e procura explic-la, fornecendo

    detalhes sobre suas causas, consequncias e alcance. Melo (2003) caracteriza o comentarista

    como um jornalista especializado em determinado assunto e com boa carga cultural, o que o

    permite expressar a sua opinio, porm esta nem sempre explcita.

    O ltimo gnero a ser discutido ser o artigo. No entanto, como suas especificaes

    requerem uma abordagem mais detalhada para esta pesquisa, ser o objeto de estudo da prxima

    etapa, onde sero abordados, de forma mais abrangente, aspectos discutidos tanto por Melo

    (2003) quanto por Beltro (1980) para este gnero.

  • 17

    1.3 Especificidades do gnero artigo

    Para a anlise do corpus desta pesquisa ser utilizada a descrio do gnero jornalstico

    opinativo artigo. A definio de artigo aqui utilizada ser a estabelecida como um gnero

    especfico, uma forma de expresso verbal. Trata-se de uma matria jornalstica onde algum

    (jornalista ou no) desenvolve uma ideia e apresenta sua opinio. (MELO, 2003:121).

    Este se caracteriza por dois elementos principais: a atualidade e a opinio. No entanto, a

    atualidade no se refere apenas ao cotidiano e sim ao momento histrico vivido, sendo este fator

    o diferencial do artigo em relao ao comentrio, pois, enquanto este analisa os fatos em quanto

    eles ocorrem, os artigos procuram captar os aspectos mais duradouros dos acontecimentos.

    Quanto opinio, o produtor do artigo deve manifest-la durante a argumentao e no

    deix-la implcita, pois no artigo o autor tem a liberdade (e o dever) de expressar sua prpria voz.

    Melo (2003) destaca que esta a maior caracterstica do gnero: o ponto de vista exposto por

    algum.

    O perfil dos articulistas discutido por Beltro (1980), ele prope que os autores de

    artigos costumam ser intelectuais, escritores que se especializam em algumas reas e que

    possuem credibilidade junto empresa jornalstica e tambm sociedade. Alm disso, suas ideias

    e opinies devem interessar ao pblico e tambm aos objetivos desejados pelo editor.

    Melo (2003) destaca duas formas de se subdividir os artigos. O artigo propriamente dito e

    o ensaio, a diferena entre ambos visvel pela extenso, sendo a do ensaio superior a do artigo.

    Mas suas diferenciaes mais relevantes devem-se ao tratamento dado ao tema e a forma de

    argumentao.

    No artigo, a subdiviso, o tratamento mais provisrio, pois o assunto abordado

    enquanto ainda est ocorrendo. Alm disso, sua argumentao baseada no conhecimento e na

    sensibilidade do articulista. J no ensaio tem-se uma escrita posterior ao fato, possibilitando uma

    abordagem definitiva do tema. Quanto argumentao nota-se o apoio em fontes de alta

    credibilidade e a legitimao da opinio por meio destas.

    A segunda forma de subdiviso coloca os artigos, o gnero, em duas categorias, os de

    divulgao cientfica e os doutrinrios. O artigo de divulgao cientfica procura mostrar

    descobertas relacionadas s cincias ou educar o leitor a respeito de novas formas de

  • 18

    conhecimento. Enquanto os doutrinrios abordam uma questo da atualidade sugerindo uma

    forma de analis-la.

    Melo (2003) no faz nenhuma meno quanto periodicidade destas contribuies,

    dizendo apenas que elas podem ser espordicas, mas sem negar a hiptese de uma presena

    constante de um articulista. Desta forma, no vai contra a produo de artigos peridicos citada

    na obra de Beltro (1980).

    Embora possua subdivises, o processo para a elaborao de um artigo sempre o

    mesmo. Ele passa sempre por trs etapas: busca de um assunto que motive e proporcione uma

    argumentao; ordenao das ideias e a elocuo, ou seja, o ato de escrever aquilo que j se

    pensou. Todas as etapas so formuladas de acordo com a opinio e a forma de argumentao

    almejada pelo articulista.

    Ainda que este tipo de opinio seja to precioso para a imprensa, Melo (2003:129) destaca

    que se, no passado, o espao aberto para a colaborao dos intelectuais era maior, na imprensa

    brasileira, hoje ele se reduz pela prpria tendncia que assume o jornalismo impresso de se pautar

    por modelos industriais de eficincia e profissionalismo.

    Desta forma, as pesquisas neste campo podem vir a contribuir para a disseminao deste

    formato dentro do meio acadmico e, consequentemente, na retomada dos artigos dentro da

    prtica jornalstica, pois os novos profissionais, quando devidamente instrudos pelas

    universidades, so capazes de modificar os padres da imprensa.

    Ao atingir o meio social, os artigos no podem ser vistos como simples textos, pois

    compreendem, alm de meras palavras, um aporte social e ser dotado de sentido de acordo com

    os eventos scio-histricos que se ligam a ele. Desta forma, ele pode ser compreendido como

    discurso. Veremos a seguir o que isto significa.

    1.4 Os artigos opinativos como discurso

    Os artigos opinativos podem ser vistos sob duas ticas: como textos e como discurso. No

    primeiro caso temos um objeto lingustico, ou seja, um lugar onde se manifesta a linguagem, mas

    que pode ser analisado de forma distanciada de seu contexto social. J ao se estudar o discurso,

    temos como base a definio proposta por Marcushi (2003) que entende o discurso como uma

    produo lingustica ligada ao seu papel scio-histrico.

  • 19

    Desta forma, o discurso compreende:

    O texto como a interao, reenviando a um objeto emprico, selecionado ou transcrito para a anlise, indissocivel do contexto que ele contribuiu para forjar,

    e caracterizado no pelas determinaes exteriores mas pelas dimenses que o

    prprio discurso marca reflexivamente como pertinentes. O discurso o lugar da

    observabilidade da lngua em sua atualizao num contexto emprico. (MONDADA, 1994 apud MARCUSHI, 2003:4)

    Assim, observamos que a linguagem, ao se manifestar em um discurso, no apenas um

    veculo que carrega palavras desprovidas de intenes. Ela torna-se um meio para a transmisso

    de pontos de vistas, de conceitos e ideias que se formam a partir da interao e a interpretao da

    sociedade. Ou seja, atravs do discurso o autor pode disseminar na sociedade aquilo que deseja,

    para isto s precisa analisar quais as melhores estratgias para convencer o seu pblico.

    Tendo em vista esta distino entre texto e discurso, podemos concluir que o estudo do

    discurso para a interpretao dos produtos miditicos, que sofre forte influncia social, so mais

    vantajosos para que se chegue a concluses mais prximas da realidade e no a dados sem

    sustentao no real.

    Associando os estudos do discurso aos gneros temos o fato de que esta prpria forma de

    se classificar um produto do estudo do discurso, pois, como define Bakhtin (1997 apud Perles,

    2006), os gneros so caracterizados de acordo com a esfera social na qual existem, ou seja, os

    fatores sociais e histricos so levados em considerao ao se fazer tal classificao. Este fator

    considerado tanto por Melo (2003) quanto por Beltro (1980), j que ambos rejeitam as

    classificaes estrangeiras para estabelecer um estudo ligado sociedade brasileira.

    Ao se tomar os artigos opinativos como discurso, seu estudo exige uma anlise da

    realidade na qual ele foi elaborado, suas condies de produo, informaes sobre o autor, do

    pblico alvo que se quer atingir e tambm do contexto scio-histrico que deu origem aos

    artigos.

    Alm disso, por se tratarem de produtos miditicos pautados pela atualidade, necessrio

    um estudo sobre o que ocorria na imprensa durante o perodo no qual foram escritos. Pois os

    artigos, normalmente, repercutem informaes que esto presentes na mdia, mas sob um ponto

    de vista explicitamente crtico.

  • 20

    1.5 Consideraes finais

    Ao se analisar os diferentes gneros jornalsticos, devemos ter em mente as dificuldades

    de se classificar um produto, pois, como ressalta Melo (2003) um mesmo texto pode conter

    estruturas presentes em mais de um gnero. Alm disso, o mesmo autor lembra o processo

    dinmico que move a imprensa e altera a cada dia suas formas de produo de contedo,

    enquanto as pesquisas tericas tm sempre um ritmo mais lento.

    Portanto, embora o aporte terico deste trabalho se sustente no gnero artigo, ressalvas

    sero feitas quando e se necessrias, principalmente por se tratar de uma adaptao de gneros

    impressos para a imprensa eletrnica.

    Quanto ao gnero estudado a principal caracterstica a ser destacada a emisso de uma

    opinio extra-oficial, ou seja, no necessariamente compartilhada pela empresa jornalstica,

    marcada pela argumentao e pelo aporte terico, seja acadmico ou emprico, necessrio para a

    construo de um artigo.

    Os artigos so capazes de democratizar a opinio, como ressalta Melo (2003) trazendo

    novas formas de se ver um determinado acontecimento. devido a isto e a sua forte presena

    argumentativa que este gnero opinativo foi escolhido, pois supera as limitaes do jornalismo

    tradicional e trazem importantes contribuies para a imprensa na nacional.

    Para estudar os artigos, o vis escolhido foi o da nova retrica de Chaim Perelman (1996).

    Assim, partiremos para a discusso a respeito das teorias da argumentao ligadas nova retrica

    para que possamos analisar como a opinio colocada no discurso miditico, quais os artifcios

    so utilizados, que tipos de argumentos so utilizados e como se d a construo argumentativa

    nos artigos.

  • 21

    CAPTULO 2 RETRICA E TEORIAS DA ARGUMENTAO

    2.0 Consideraes iniciais

    O surgimento dos estudos em retrica veio para se contrapor exatido das cincias

    lgicas, consideradas como nicas detentoras da razo. Nestas, os argumentos podem ser

    verificados e comprovados e aqueles que no seguem este padro so relegados a um segundo

    plano e no considerados como indignos de uma discusso norteada pela razo. Na categoria de

    excludos encontram-se os valores e ideias subjetivas.

    Amparando estes conceitos sem deixar de ser considerada racional, surge ento a retrica.

    Suas primeiras concepes remontam Grcia Clssica e devem-se aos estudos platnicos e

    aristotlicos, que deram a esta arte, de acordo com Meyer (2007) dois significados distintos. Os

    primeiros a classificam como uma manipulao do auditrio, ou seja, coloca a retrica como

    marcada pela emoo e no pela razo, diferenciando-se drasticamente da idia adotada na

    contemporaneidade.

    A idia em vigor na atualidade encontra-se ligada aos estudos aristotlicos da retrica,

    que a definem como a exposio de argumentos destinados a persuadir determinado pblico.

    Estes estudos serviram como base para a criao de um pensamento adaptado sociedade

    moderna, chamado de Nova Retrica, que servir como teoria e metodologia para esta pesquisa.

    Embora outras teorias a respeito da retrica tenham sido cunhadas na modernidade, como

    as de Plebe & Emanuele e de Tollumin, consideramos que a Nova Retrica, proposta por Chaim

    Perelman & Obrechts-Tyteca (2005), servir melhor aos fins deste trabalho. Isto se d porque

    esta vertente se ocupa de um ramo especfico da retrica: as teorias da argumentao, que ser

    tambm o ponto discutido por ns.

    Para iniciar nossos estudos, iremos expor os conceitos bsicos da Nova Retrica, para que

    assim possamos compreender melhor a classificao e os modelos adotados por Perelman &

    Olbrechts -Tyteca (2005) para os argumentos.

  • 22

    2.1 Conceitos bsicos da nova retrica

    As teorias da Nova Retrica tratam mais aprofundadamente de um ramo especfico desta

    arte: a argumentao. Embora este seja um dos vrtices mais importantes, vale lembrar que

    Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) no se preocupam em fornecer longos conceitos para as

    relaes entre ethos, pathos e logos3, que so tratados por outros tericos. Assim, nos deteremos

    em abordar os aspectos discutidos pela Nova Retrica, sabendo de suas limitaes.

    Alm desta limitao, os autores falam que nosso tratado s versar sobre recursos

    discursivos para se obter a adeso dos espritos (PERELMAN & OBRECHTS-TYTECA

    2005:8). Assim, so rejeitadas provas coercivas, experimentais e analticas, pois elas se

    extinguem em si prprias ao estabelecer suas verdades atravs da fora ou de juzos concretos.

    Partindo deste ponto de vista, temos que o discurso retrico apresenta-se como uma

    sequncia de argumentos que visam comprovar uma determinada opinio que no suscetvel de

    provas analticas, devido ao seu teor subjetivo. O autor coloca a seguinte definio:

    A retrica, em nosso sentido da palavra, difere da lgica pelo fato de se ocupar no com a verdade abstrata, categrica ou hipottica, mas com a adeso. Sua

    meta produzir ou aumentar a adeso de um determinado auditrio a certas

    teses seu ponto inicial ser a adeso desse auditrio a outras teses. (PERELMAN, 2007:70)

    Perelman (2005) expe que os argumentos utilizados na retrica so da categoria do

    opinvel e no do verossmil, atravs deles o locutor procura ganhar a adeso de seu auditrio.

    Para isto, o orador deve sempre interagir com o pblico, buscando captar suas peculiaridades e

    assim, moldar seus argumentos. Alm disso, o orador tambm deve ser bem quisto pelo pblico

    que deseja atingir, pois desta forma suas ideias sero aceitas com mais facilidade.

    A Nova Retrica enfatiza de forma veemente a importncia do auditrio, pois todo o

    trabalho do locutor deve ser feito em funo deste. No entanto, no caso dos discursos escritos,

    torna-se difcil delimitar um pblico especfico4, pois se trata de uma situao onde emissor e

    receptor no compartilham o mesmo tempo e espao, sendo difcil a utilizao de adaptaes para

    3 De acordo com Meyer (2003) Ethos refere-se ao modo como o orador se coloca no discurso, Pathos diz respeito a

    emoo envolvida durante uma explanao e Logos demonstra o aspecto racional colocado em questo. 4 Apesar da dificuldade em se limitar o pblico, possvel fazer uma suposio atravs da anlise do discurso do

    autor. No caso de Hlio Schwartsman podemos projetar que o pblico-alvo composto por pessoas da classe A e B

    e com maior formao intelectual e cultural.

  • 23

    cada leitor. Nestas situaes, a criao de um pblico-alvo indispensvel e, para tanto, o locutor

    pode se utilizar de diferentes pontos, como classe social e escolaridade.

    2.2 Aspectos relevantes para a argumentao

    Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) definem alguns elementos que podem auxiliar na

    elaborao de um discurso argumentativo e que, portanto, devem ser verificados quando os

    tomamos como objeto de pesquisa. Estes elementos so chamados de premissas para a

    argumentao e estud-los pode auxiliar na compreenso das estratgias adotadas pelo locutor

    durante sua argumentao. Portanto, analisaremos brevemente os pontos considerados mais

    importantes para este trabalho.

    Antes de iniciar a elaborao da argumentao, o locutor deve levar em conta as opinies

    adotadas pelo seu auditrio, assim, Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) postulam seis itens que,

    se devidamente observados, podem auxiliar na persuaso5 do pblico. Eles so divididos em:

    relativos ao real e relativo ao prefervel.

    As premissas relativas ao real so usadas quando o pblico levado em considerao

    abrangente, sendo chamado de auditrio universal; elas so: os fatos, as verdades, as presunes.

    J as relativas ao prefervel podem ser utilizadas quando se trata de um auditrio especializado,

    elas so os valores, a hierarquia e os lugares.

    Os fatos so compreendidos como um dado ou acontecimento que o auditrio aceita como

    inegvel. Compartilhando deste mesmo conceito temos a noo de verdade. No entanto, ela se

    diferencia dos fatos por ser mais complexa do que estes ao se constituir como uma teoria aceita

    que pode ser utilizada para a comprovao ou determinao de algo.

    Facilmente confundida com os fatos temos tambm a noo de presunes. Elas so

    opinies partilhadas pelo senso comum, consideradas normais, e que podem ser tomadas como

    base de um discurso. Entretanto, diferentemente dos fatos, requerem uma argumentao posterior

    que as reforce. Ao se tratar das presunes, o locutor deve ter em mente que o normal um

    conceito varivel e pode no ser aceito por todos os auditrios.

    5 Alguns estudos na retrica tomam como diferentes as noes de persuadir e convencer, colocando que persuadir

    levar a fazer alguma coisa, mesmo que no a considere correta, enquanto convencer fazer com que algum tome

    partido de uma idia. No entanto, os conceitos da Nova Retrica tomam as duas noes como idnticas e as definem

    o ato de aderir uma idia ou argumento.

  • 24

    Valendo-se da ideia de que o normal costuma ser aceito com mais facilidade, os autores

    destacam a importncia de sua utilizao, pois:

    O mais das vezes, entretanto, o orador s pode contar para suas presunes, com a inrcia psquica e social, que, nas conscincias e nas sociedades,

    corresponde inrcia na fsica. Pode-se presumir, at prova em contrrio, que a

    atitude adotada anteriormente opinio expressa, conduta preferida continuar no futuro, seja por desejo de coerncia, seja em virtude da fora do hbito. (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 2005:119).

    Desta afirmao tambm se pode concluir que o preceito da no negao vlido tanto

    para a postura adotada pelo auditrio como pelo locutor, ou seja, o locutor pode se pautar no

    conceito de que o auditrio no vai mudar facilmente seu senso comum sem que antes seja

    conduzido por uma boa argumentao. Mas tambm deve ter em mente ele, o locutor, ao assumir

    uma premissa no poder neg-la posteriormente sem o risco de ser desacreditado.

    J os valores representam condutas e posicionamentos que so aceitos ou negados por um

    grupo. Servindo a eles temos a hierarquia, que se constitui na elaborao de uma escala que

    define o que considerado mais ou menos importante. Todavia, preciso ressaltar que a

    hierarquizao tambm pode ser adotada por outros elementos alm dos valores, como

    acontecimentos, modelos, entre outros, que podem ser colocados em uma ordem de importncia.

    Ao tomar como base os elementos que o locutor pode considerar na argumentao cria-se

    um conjunto de dados que deve ser escolhido e organizado previamente de modo a facilitar a

    persuaso. Alm disso, os dados selecionados devem ser apresentados sob o ponto de vista

    desejado de forma que no suscitem muitas interpretaes diferentes da planejada.

    Assim, os vrios elementos escolhidos pelo locutor para a elaborao do discurso

    interagem entre si formando diferentes formas de argumentos que, de acordo com a situao,

    visam produzir determinados efeitos. Estudaremos a classificao dos argumentos no prximo

    tpico.

    2.3 Tcnicas argumentativas e classificao dos argumentos

    Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) dividem os argumentos em dois grupos de tcnicas:

    as de ligao e as de dissociao. Nos argumentos de ligao, elementos distintos so

    aproximados visando uma melhor estruturao ou valorizao de um pelo outro. J no processo

  • 25

    de dissociao os elementos que antes faziam parte de um todo so separados, modificando o que

    havia sido dito atravs da reconstituio dos elementos chave de determinado discurso.

    A partir destes esquemas tem-se a formao de quatro tipos argumentativos, os

    argumentos quase-lgicos, os baseados na estrutura do real, os argumentos que fundam a

    estrutura do real - todos pertencentes ao grupo das tcnicas de ligao - e os argumentos de

    dissociao - caracterizados pela tcnica homnima. Dentro de cada um destes grupos h vrios

    tipos de argumentos, estudaremos agora cada um deles separadamente para compreendermos

    seus elementos. Forneceremos ao final de cada grupo uma grade6 com exemplos e, quando

    necessrio, tambm os utilizaremos no decorrer da explicao.

    2.3.1 Os argumentos quase-lgicos

    Os argumentos quase-lgicos tm esse nome por serem semelhantes s estruturas do

    raciocnio lgico. No entanto, utilizam uma linguagem mais comum e um raciocnio sem base

    emprica real, causando mais interpretaes do que quando se usa a linguagem formal. Dentro

    desta modalidade veremos os seguintes tipos de argumentos: de contradio, de comparao,

    ridculos, pelo sacrifcio, de reciprocidade, de definies, de transitividade, de incluso da parte

    no todo, de justia e de probabilidade.

    No primeiro caso temos como argumento a apresentao, atravs de duas ou mais

    afirmaes diferentes, de uma contradio dentro de um sistema, tornando-o incoerente e levando

    a escolha de uma posio ou renncia de todas. J o argumento de comparao utilizado para

    comparar dados tomando um em relao ao outro, visando oposio, quantificao e

    ordenamento.

    Os argumentos ridculos podem ser comparados noo do absurdo na lgica clssica, ou

    seja, uma afirmao completamente incompatvel com o que aceito pelo auditrio. Sua

    principal utilizao se d atravs da ironia.

    No argumento de sacrifcio h uma avaliao sobre as consequncias daquilo que se pensa

    em executar. Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) citam como exemplo o caso de um alpinista

    6 Todos os exemplos utilizados sero retirados do livro Tratado de Argumentao, de Chaim Perelman & Olbrechts-

    Tyteca, publicado em 2005, pela editora Martins Fontes. Pedimos ateno do leitor, pois, para no exceder os limites

    do trabalho no podemos colocar todo o contexto que envolve os argumentos. Portanto, alguns exemplos requerem

    um pouco mais de ateno para a sua compreenso.

  • 26

    que ao se deparar com uma montanha procura lembrar o esforo que ter de fazer para escal-la.

    Neste tipo de argumentao o valor do sacrifcio de grande importncia para a fora do

    argumento.

    Quando se usa os argumentos de reciprocidade pretende-se estabelecer um mesmo parecer

    sobre situaes parecidas. As utilizaes destes argumentos resultam de uma apreciao sobre a

    importncia dos elementos que distinguem situaes, julgadas, entretanto, simtricas num

    determinado ponto de vista. (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 2005:257).

    J atravs dos argumentos de definies pretende-se identificar os vrios elementos que

    esto presentes no discurso. Os quatro tipos de definies para a retrica so: as normativas (diz a

    forma na qual uma palavra usada), as descritivas (prega o sentido conferido a uma palavra em

    determinado meio e momento), as de condensao (usadas para indicar os elementos essenciais

    da definio descritiva) e as complexas (que combinam elementos das trs outras espcies).

    Deve-se ainda observar que as definies podem tanto servir como argumentos quanto serem

    justificadas atravs deles.

    Os argumentos de transitividade permitem que se faam sequncias de relaes entre

    dados. Tomemos como exemplo os dados A, B, C e D; se h uma relao entre os termos A e B e

    esta mesma relao opera entre C e D, o argumento de transitividade faz uso disto para concluir

    que entre A e D tambm existe esta relao. Estes argumentos so facilmente contestveis e

    podem operar em relaes de igualdade, superioridade, ascendncia e incluso.

    No argumento de incluso da parte no todo, podemos observar a formao de um

    conjunto a partir de determinados elementos ou ainda a incluso de um elemento dentro de um

    conjunto j pressuposto.

    Quando se d um tratamento idntico a seres idnticos, temos a aplicao do argumento

    de justia. No entanto, os objetos nunca so totalmente idnticos, portanto, o grande problema

    deste argumento verificar se as diferenas existentes so ou no relevantes para cada caso.

    Por fim, os argumentos de probabilidade pautam-se pelo provvel. Neste caso, o locutor

    faz um suposto clculo de probabilidade e assim define se um dado vlido ou no. Este tipo de

    argumentao parece fornecer um carter emprico ao discurso. No entanto, exige que uma srie

    de acordos sejam firmados entre locutor e auditrio para que se torne vlido.

    Para melhor compreenso podemos observar os exemplos:

  • 27

    Grade 1 Exemplos de argumentos quase-lgicos

    De contradio ... os qualificativos imediata e honrosa tornam-se ento

    incompatveis. Devemos nesse caso escolher um dos termos da

    alternativa; se adotamos a moo, no podemos ter uma paz

    imediata e honrosa. Pitt

    De comparao o mesmo crime roubar o Estado ou praticar larguezas contrrias

    ao interesse pblico. - Ccero

    Pelo ridculo ... neutralidade que foi to bem sucedida por duas vezes na

    Blgica. - Reynauld ao ironizar a postura de neutralidade da

    Blgica que, na realidade, no trouxe benefcio algum ao pas.

    Pelo sacrifcio H provavelmente um fim e somente um, para o qual o uso da

    violncia por um governo benfazejo, e o de diminuir o

    montante total da violncia no mundo. - Russell

    De reciprocidade Pouca coisa nos consola, porque pouca coisa nos aflige. - Pascal

    De definies ... aquilo cuja essncia envolve a existncia, ou aquilo cuja

    natureza s pode ser conhecida como existente. - Spinoza

    definindo seu conceito de causa de si.

    De transitividade Os amigos de nossos amigos so nossos amigos. Ditado

    popular

    De incluso da

    parte no todo

    Nada do que permitido pela lei a toda Igreja, pode, por algum

    direito eclesistico, tornar-se ilegal para algum de seus membros.

    - Locke

    De justia Essas fraes de homens, que no tm mais do que pedaos de

    carne, recebem a mesma quantidade de alimentos que os

    prisioneiros em perfeita posse de seus corpos. uma grande

    injustia. Proponho que esses prisioneiros recebam raes

    alimentares proporcionais quantidade de corpo que ainda

    possuem. - Gheorghiu

    De probabilidade Se h apenas uma verdade, um caminho para ir ao cu, que

  • 28

    esperana haver de que mais pessoas a ele sero conduzidas, se

    no tm outra regra alm da religio do prncipe e -lhes imposta a

    obrigao de abandonar a luz de suas prprias razes... o estreito

    caminho ficaria muito apertado; um nico pas teria a verdade...

    Locke.

    Estudaremos agora o conjunto de argumentos baseados na estrutura do real.

    2.3.2 Os argumentos baseados na estrutura do real

    Os argumentos baseados sobre a estrutura do real so aqueles que se utilizam da realidade

    para criar vnculos entre dados admitidos e os que se quer justificar. Para agir desta forma, criam-

    se ligaes de sucesso (causa e efeito) ou de coexistncia entre certos elementos permitindo que

    se sustente sobre eles uma argumentao. Os argumentos que estudaremos nesta categoria so: de

    vnculo causal, de desperdcio, de direo, de superao, pragmtico, de autoridade, de hierarquia

    dupla e de diferena entre grau e ordem. Falaremos brevemente de cada um deles.

    Temos trs formas principais de manifestao do argumento de vnculo causal. A primeira

    diz respeito relao entre dois acontecimentos, a segunda quando se pode argumentar a partir da

    causa de um fato e a terceira quando se faz o mesmo a partir do efeito. Este tipo de argumento

    guiado pela racionalidade dos atos humanos, assim, opera com reaes, causas e efeitos

    esperados pelo racional.

    Os argumentos de desperdcio postulam que mais vantajoso terminar algo que j se

    comeou, neste sentindo, o argumento pode referir-se no somente ao que uma pessoa iniciou,

    mas sim ao ato que j vem sendo praticado pela sociedade, cabendo a cada um apenas dar

    continuidade.

    J nos argumentos de direo temos um caminho a ser seguido para a busca de um

    objetivo. Desta forma, se desejamos chegar de A a C, devemos levar em conta B, que o

    caminho pelo qual devemos passar para facilitar a concluso C. Atravs deste argumento

    podemos decompor um fim em pequenas metas que levaro a ele.

    Enquanto isso, o argumento de superao insiste que se deve ir cada vez mais longe. Um

    exemplo para este argumento a expresso popular quanto mais, melhor. Neste tipo de

  • 29

    argumentao a importncia maior est menos na direo final do que se aponta e mais nos

    valores que ela pode dar aos temas que realmente interessam ao debate.

    A utilizao dos argumentos pragmticos feita para valorizao ou desvalorizao de

    um ato de acordo com suas consequncias. Temos para estes argumentos as exemplificaes, a

    desvalorizao de uma norma, ao mostrar que ela deriva de um costume primitivo do homem,

    porque ele descende dos animais; a valorizao dos filhos, em razo da nobreza dos pais.

    (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 2005: 302).

    Nos argumentos de autoridade h a utilizao de atos ou dizeres de uma pessoa ou meio,

    que pode ser tomado como modelo, para justificar outros procedimentos. Freitas (2002) coloca

    que este tipo de argumento normalmente utilizado para complementar uma argumentao e que

    uma mesma autoridade pode ser valorizada ou desvalorizada de acordo com a opinio do locutor.

    Apesar de fazer parte dos acordos que norteiam o discurso, as hierarquias tambm servem

    como forma de argumentao. Assim, atravs dos argumentos de hierarquia dupla o locutor

    questiona o posicionamento dos termos dentro de uma escala. Estes argumentos so mais

    importantes quando os elementos da hierarquia no podem ser mensurados de maneira exata.

    A ltima forma de argumentao baseada na estrutura do real que estudaremos a dos

    argumentos que apresentam a diferena entre grau e ordem dentro de uma hierarquia. Antes de

    explic-lo vamos entender os dois conceitos expostos: no caso da ordem temos uma situao na

    qual h uma ruptura entre um estado atual para o outro; j o grau trata de termos pertencentes a

    uma mesma ordem com diferentes posies em termos de escala.

    Quando estes termos se relacionam temos uma argumentao que pode ser explicada da

    seguinte maneira:

    A introduo de consideraes relativas ordem, resultem elas de oposio entre uma diferena de grau e uma diferena de natureza, ou entre uma diferena

    de modalidade e uma diferena de princpio, tem o efeito de minimizar as

    diferenas de grau, de igualar mais ou menos os termos que s diferem entre si

    pela intensidade e de acentuar o que os separa de termos de outra ordem. Em

    contrapartida, a transformao de diferenas de ordem em diferenas de grau

    produz o efeito inverso; ela aproxima, uns dos outros, termos que pareciam

    separados por uma barreira intransponvel e ressalta a distncia entre os graus. (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 2005:392).

  • 30

    Desta forma, podemos misturar concepes de ordem e de grau, buscando uma concluso

    diferente, como exemplos temos a mistura entre a ordem do espiritual e do material, em que se

    colocam itens destes grupos dentro de um mesmo conjunto, mas com graus diferentes.

    A seguir temos a grade de exemplos:

    Grade 2 Exemplos de argumentos baseados na estrutura do real

    De vnculo causal ... uma metade de Roma pretende que Guido Franceschini estava

    dormindo no momento da partida da sua mulher, porque esta o

    havia drogado; a outra metade de Roma sugere que Guido

    simulava o sono, para no ter de intervir. Perelman & Olbrechts-

    Tyteca sobre a utilizao dos argumentos no livro The ring and the

    book, de R. Browning.

    De desperdcio ... porque nos lembramos que isso proporciona satisfao e prazer

    ao Senhor do jardim... - Santa Teresa lembrando os benefcios da

    orao, para afirmar que as pessoas devem continuar a rezar

    mesmo nas dificuldades.

    De direo Devemos dizer ento que as reflexes do agente sobre a maneira

    inteligente de comportar-se exigem que ele reflita primeiro na

    melhor maneira de refletir sobre o modo de agir? G. Ryle

    De superao Que estejamos em maior segurana hoje, no s eu admito, mas

    at pretendo que as perspectivas melhoram dia a dia, e que essa

    segurana est cada vez mais garantida. Pitt

    Pragmtico Jamais se poder estabelecer ou salvaguardar nem a paz, nem a

    segurana, nem sequer a simples amizade entre homens, enquanto

    prevalecer a opinio de que o poder fundamentado sobre a Graa

    e de que a religio deve ser propagada pela fora das armas.

    Locke

    De autoridade Mas ela sabe ler, no ? Est em todos os jornais. Fun Fare.

    De hierarquia

    dupla

    Enquanto apraz aos brbaros viver sem se preocupar com o

    amanh, os nossos desgnios devem considerar a eternidade dos

  • 31

    sculos. Ccero

    De diferena entre

    grau e ordem

    H animais intermedirios entre as plantas e os animais com as

    esponjas marinhas, fixas como as plantas, porm sensveis,

    maneira dos animais. H o macaco, que no se sabe se bicho ou

    homem; h a alma intelectiva intermediria entre o temporal e o

    eterno. Pomponazzi

    2.3.3 Os argumentos que fundam a estrutura do real

    Os elementos que fundam a estrutura do real so aqueles nos quais se parte de um caso

    especfico para se criar uma premissa que ser tomada como vlida para todas as situaes.

    Perelman & Olbrechts-Tyteca (op. cit.) colocam como argumentos que fundam a estrutura do

    real: o exemplo, a ilustrao, o modelo e a analogia.

    Os argumentos que fazem uso do exemplo permitem que se estabeleam comparaes

    entre dados, ou seja, generalizaes. Assim, os exemplos so encarregados de fundamentar certo

    conceito. Sua utilizao feita a partir da mostra de vrios casos particulares que podem servir

    para que se faa uma deduo do caso que se deseja comprovar.

    A ilustrao tambm se liga aos casos particulares, mas serve para reforar uma regra que

    j conhecida pelo auditrio, ela age fornecendo casos particulares que esclarecem o enunciado

    geral, mostram o interesse deste atravs da variedade das aplicaes possveis, aumentam-lhe a

    presena na conscincia. (PERELMAN & OLBRECHS-TYTECA, 2005:407).

    J os modelos constituem-se em condutas dignas de imitao. Podem servir como

    modelos: pessoas, grupos e pocas. Tais entidades esto sujeitas ao controle e, se fogem das

    regras tidas como aceitas pela sociedade, podem ser condenadas por esta. O conceito de modelos

    tambm origina o antimodelo, que vem a ser aquilo que no deve ser imitado. Rauen (2008)

    lembra que podem ocorrer problemas quando o modelo apresenta pontos errneos e o antimodelo

    possui virtudes; o que quase sempre ocorre quando se trabalha com o meio social.

    Tambm pertencente categoria dos argumentos que fundam a estrutura do real, temos a

    analogia. Ela se refere ao emprego de semelhanas estrutural entre dados de forma que o dado A

    esta para o B assim como C est para D. Para melhor compreender estes argumentos utilizaremos

  • 32

    o argumento aristotlico: Assim como os olhos do morcego so ofuscados pela luz do dia, a

    inteligncia da nossa alma ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentes.

    Partindo deste exemplo podemos evidenciar os elementos que formam a analogia: o tema

    e o foro. O tema o conjunto no qual se encontra a concluso e, no exemplo, eles so

    inteligncia da alma e evidncia; j o foro so os termos que servem para dar base ao

    raciocnio, sendo olhos do morcego e luz do dia. Desta forma podemos observar que o foro

    serve como ponto de partida para a concluso tirada sobre o tema.

    Vejamos agora mais exemplos para os argumentos que fundam a estrutura do real:

    Grade 3 Exemplos de argumentos que fundam a estrutura do real

    Exemplo Assim como a nica maneira de demonstrar respeito por aquele

    que sofre de fome dar-lhe de comer, assim tambm o nico meio

    de demonstrar respeito por aquele que se ps fora da lei reintegr-

    lo lei submetendo-o ao castigo que ela lhe prescreve. S. Weil

    Ilustrao As dificuldades que revelam os homens. Assim, quando

    sobrevm uma dificuldade, lembra-te de que Deus, como um

    professor de ginsio, fez-te enfrentar um jovem e rude parceiro.

    Epicteto

    Modelo O macaco imita o homem, que ele teme, no imita os animais, que

    despreza; julga bom o que feito por um ser melhor que ele.

    Rousseau

    Analogia O homem, comparado a divindade, to pueril quanto a criana

    comparada ao homem. Herclito

    Ao finalizar a discusso sobre os argumentos que fundam a estrutura do real, acabamos as

    tcnicas pertencentes categoria de ligao. Portanto, no prximo tpico estudaremos a nica

    tcnica pertencente categoria de dissociao e que recebe o mesmo nome desta.

  • 33

    2.3.4 Os argumentos de dissociao

    O ltimo caso a ser apresentado so as tcnicas de dissociao que consistem em negar

    alguma coisa tomando como base sua incompatibilidade com outras circunstncias utilizando o

    mtodo da distino e diferenciao entre pares, como por exemplo, meio e fim, ocasio e causa,

    relativo e absoluto e, principalmente o par realidade e aparncia. Como exemplo desta forma,

    tem-se a seguinte explicao:

    O basto, parcialmente mergulhado na gua, parece curvo, quando o olhamos, e

    reto, quanto o tocamos, mas, na realidade, ele no pode ser simultaneamente

    curvo e reto. Enquanto as aparncias podem opor-se, o real coerente: sua

    elaborao ter como efeito dissociar, entre as aparncias, as que so enganosas

    das que correspondem ao real. (PERELMAN e OLBRECHTS-TYTECA,

    1996:472)

    Este exemplo mostra que alguns pares podem ser confundidos, cabendo ao locutor

    encontrar uma argumentao que os dissocie e assim chegue concluso almejada. Os casos de

    dissociao exigem sempre a presena de dois meios que podem levar a relao de inverso de

    valores ou fazer com que haja a valorizao de um caso em relao ao outro.

    Segue abaixo a tabela com outro exemplo para os argumentos de dissociao:

    Grade 4 Exemplo de argumento de dissociao

    Dissociao ... tratar a afirmao de um ideal como uma descrio de fatos e

    interpretar relatrios sobre situaes reais como se elas fossem o

    ideal a ser buscado. McKeon

    Com isto acabamos a explanao sobre as tcnicas argumentativas e os tipos de

    argumento. Portanto, passaremos ao estudo dos modos atravs dos quais estes argumentos podem

    se interagir em um discurso.

    2.4 A interao dos argumentos no discurso

    As formas argumentativas estudadas podem ser utilizadas em conjunto dentro de um

    mesmo discurso, no que Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005) denominam interao de

  • 34

    argumentos. Segundo este ponto de vista, uma argumentao deve agir de acordo com o

    auditrio, ou seja, verificar quais os argumentos causam mais impacto sobre eles, pois aqueles

    considerados bons por uma plateia pode no satisfazer outra.

    A partir deste pressuposto, o locutor pode orientar sua combinao de argumentos,

    segundo o que se denomina fora dos argumentos e esta certamente vinculada, de um lado,

    intensidade de adeso do ouvinte s premissas, inclusive s ligaes utilizadas, de outro,

    relevncia dos argumentos do debate em curso. (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA,

    2005:524).

    Os autores afirmam ainda que um argumento s forte se for eficaz, assim, mentiras

    podem ser usadas para justificar ideias se elas forem eficazes para aquele grupo; ou o locutor

    pode usar argumentos nos quais nem ele acredita se estes forem teis para persuadir o auditrio.

    Ainda sobre a interao dos argumentos temos duas posturas que merecem ser detalhadas:

    a convergncia de argumentos e a amplitude da argumentao. A convergncia ocorre quando um

    grande nmero de argumentos de diferentes categorias utilizado para comprovar uma mesma

    afirmao, esta atitude fortalece a argumentao. No entanto, a convergncia demasiada de

    argumentos pode gerar desconfiana no auditrio.

    O mesmo pode ocorrer com a amplitude da argumentao. Neste caso, o locutor deve

    prestar ateno extenso de seu discurso, pois quanto maior, maiores so as chances de se

    cometer um erro. Os paliativos para este perigo so: renncia ao argumento fraco, uso de

    reticncias, o anncio inconclusivo do argumento, declarao de solidariedade, uso de concesses

    ao adversrio e negao. (RAUEN, 2008)7.

    Para finalizar este tpico veremos brevemente os modos pelos quais os argumentos

    podem se ordenar, de acordo com Perelman & Olbrechts-Tyteca (op. cit.) eles so: a de fora

    crescente, na qual se comea com argumentos fracos que vo progredindo, mas que pode indispor

    o auditrio; a de fora decrescente, que comea com argumentos fortes e vai caminhando para os

    fracos, podendo causar uma impresso final negativa; e a ordem nestoriana, na qual se comea e

    se acaba com argumentos fortes, sendo considerada a mais adequada.

    7 Artigo extrado de http://www.tex.pro.br/wwwroot/00/00_tratado_argumentacao.php, sem a utilizao de

    numerao nas pginas. Acessado em 7 jul. 2009.

  • 35

    2.5 Consideraes finais

    A partir desta base terica e metodolgica poderemos aplicar os conceitos da teoria da

    argumentao no jornalismo opinativo. Tal aplicao j vem sendo desenvolvida por outros

    pesquisadores tanto da rea da lingustica quanto da comunicao, como exemplo podemos citar

    os trabalhos de Freitas (2002) e Pereira & Rocha (2005)

    Gostaramos antes de alertar para o fato de que esta explanao no pretende esgotar

    todos os conceitos desenvolvidos pelos autores. Assim, optamos ainda por no desenvolver

    algumas formas de argumentao, por serem pouco utilizadas e requerem uma anlise mais

    aprofundada, fugindo do grau de complexidade deste trabalho. Deste modo, privilegiamos os

    pontos que consideramos mais viveis para a anlise do gnero jornalstico opinativo.

    Embora a teoria estudada possa fornecer bons critrios de anlise, devemos ressaltar que,

    como afirmam Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005), h inmeras dificuldades em se analisar os

    esquemas argumentativos de um discurso, visto que as palavras do orador podem estar sujeitas a

    vrias interpretaes. Alm disso, Pereira & Rocha (2006) lembram que a argumentao vai alm

    do prprio discurso, pois ao receber as informaes passadas pelo locutor, o auditrio elabora em

    sua mente outros argumentos.

    No entanto, nos deteremos neste trabalho ao estudo do discurso em si e no na recepo

    dos argumentos por parte do auditrio. Portanto, apesar das dificultadas citadas por Perelman &

    Olbrechts-Tyteca (2005), tentaremos, da melhor forma possvel, compreender as situaes

    argumentativas no discurso dos artigos do jornalismo opinativo. Como no ser feito um estudo

    de recepo, ser impossvel estabelecer quais argumentos so fortes e fracos, portanto, no

    julgaremos os artigos quanto ordem da argumentao, deixaremos este caminho em aberto para

    futuras pesquisas que trabalhem mais com o pblico-alvo dos artigos.

    Em posse do material podemos seguir para o prximo captulo, no qual faremos a anlise

    do corpus, tanto do ponto de vista das categorias do gnero jornalstico opinativo quanto das

    teorias da argumentao. Desta forma, procuraremos contribuir para o aprofundamento das

    pesquisas na rea e para a melhor compreenso jornalismo opinativo dentro da imprensa

    brasileira.

  • 36

    CAPTULO 3 OS ARTIGOS DE HLIO SCHWARTSMAN SOB A

    LUZ DA NOVA RETRICA

    3.0 Consideraes iniciais

    Antes de iniciarmos a anlise do discurso de Hlio Schwartsman com base nos preceitos

    da Nova Retrica, cabe fazer algumas consideraes sobre a adoo do gnero artigo para este

    corpus. Os textos do autor, publicados no caderno online Pensata, so assinados e refletem uma

    opinio pessoal sobre assuntos que interessam ao momento histrico em que vivemos. Desta

    forma, observamos em seus textos as duas principais caractersticas dos artigos, que so a

    atualidade e a opinio pessoal.

    No entanto, estas tambm podem ser vistas em outros gneros. Portanto, citaremos

    brevemente os motivos que levam o corpus a no se encaixar dentro destas outras formas.

    Comearemos pelo editorial, ele o mais prximo do artigo,no entanto, feito anonimamente e

    reflete a opinio de uma empresa e no de uma pessoa, o que no ocorre em nosso corpus.

    A primeira vista tambm podemos eliminar os gneros carta (ou opinio do leitor) e

    caricatura (ou opinio ilustrada), visto que os textos so puramente lingusticos e escritos por uma

    pessoa ligada mdia em questo. Tambm no figura no discurso de Hlio Schwartsman o vis

    literrio tpico da crnica e nem a anlise de produtos culturais, como acontece na resenha.

    Restam-nos os gneros coluna e comentrio. O termo coluna o que desperta mais

    dvidas quando tomado na noo cotidiana. Porm, devemos lembrar que seguimos os conceitos

    elaboradores por Melo (2003), que a define como um espao destinado ao lanamento de notas

    sobre fatos recentes que ainda no foram devidamente especulados, o que a diferencia do corpus.

    J o comentrio eliminado pelo fato de no possuir uma opinio explcita. Alm disso,

    ele deve ser associado a uma notcia, o que nem sempre ocorre nos textos de Schwarstman.

    Embora o autor tome como premissa, em alguns artigos, dados factuais, estes ensejam discusses

    que se encontram mais ligadas a concepo de atualidade do artigo do que a de notcia.

    Com esta explanao satisfazemos o critrio de eliminao para as classificaes quanto

    aos gneros, restando-nos apenas o artigo. Podemos agora refletir sobre quais modalidades de

    artigos esto presentes no nosso corpus: se de divulgao cientfica ou doutrinrios e se ensaios

  • 37

    ou artigos (subdiviso do gnero que homnima a ele). Faremos isto no prximo tpico, aps

    apresentarmos sinteticamente o assunto de cada um dos artigos que compe o corpus.

    3.1 Apresentao do corpus

    Para que possamos conhecer melhor os artigos a serem estudados, falaremos brevemente

    sobre o assunto abordado por cada um deles, situando-os dentro do contexto scio-histrico no

    qual foram publicados.

    Na primeira coluna apresentamos o ttulo e a data de publicao dos artigos, enquanto na

    segunda podemos encontrar a temtica associada e o contexto na qual se desenvolve.

    Grade 5 Apresentao do Corpus

    Cincia sob ataque

    31/01/2008

    Temtica: defesa de pesquisas cientficas atravs da

    distino entre cincia e religio.

    Contexto: o artigo divide-se em duas situaes, a defesa do

    ensino do criacionismo, feita pela ministra Marina Silva; e a

    proibio de um estudo que visa rastrear o crebro de

    criminosos, buscando marcas que levem violncia.

    A f na cincia

    07/02/2008

    Temtica: distino entre cincia e religio.

    Contexto: elaborado devido s crticas recebidas pelo artigo

    anterior (Cincia sob ataque).

    Tudo relativo

    21/02/2008

    Temtica: origens do relativismo das opinies, tomando

    com exemplo casos do Oriente Mdio.

    Contexto: o artigo parte das declaraes feitas sobre Imad

    Mughniyah, proclamado mrtir pelos xiitas e terrorista pelos

    norte-americanos, para ento comentar sobre como as

    pessoas podem adotar opinies diversas.

    O prazer de perdoar

    05/03/2008

    Temtica: crtica sobre a postura da igreja diante de

    determinadas pesquisas cientficas.

    Contexto: os embates sobre a constitucionalidade ou no

  • 38

    das pesquisas com clula-tronco do origem ao artigo que

    parte tambm para questes como o aborto e a noo de vida

    adotada pela igreja.

    Clima de Guerra

    13/03/2008

    Temtica: o artigo discute ideias relativas linguagem,

    como a hiptese de Sapir-Whorf.

    Contexto: o mote para o artigo o uso da linguagem nas

    discusses entre governos latino-americanos. No entanto,

    este pretexto no ganha importncia no decorrer do texto, s

    servindo mesmo para iniciar a discusso.

    O caso Isabella

    17/04/2008

    Temtica: o autor trata dos motivos que levam uma criana

    a ser mais comovente que um adulto.

    Contexto: desejo das pessoas em saber sobre o assassinato

    da menina Isabella Nardoni, que causa mais revolta do que o

    assassinato de um adulto.

    O no to livre arbtrio

    01/05/2008

    Temtica: consideraes acerca dos fatores que podem

    influenciar as decises humanas, fazendo com que estas no

    sejam tomadas to livremente quanto se pensa.

    Contexto: para este artigo o autor no parte de nenhum

    dado factual, apenas questiona se o homem ou no livre.

    De um modo geral os artigos analisados apresentam inicialmente uma breve explanao

    sobre o assunto a ser discutido, seguido por uma argumentao, de acordo com os ideais do autor,

    que enseja um posicionamento final para a concluso.

    Observando a tabela apresentada e a estrutura dos artigos, podemos verificar que, na

    maioria dos casos, eles partem de premissas factuais para abrir discusses que ainda vigoram na

    sociedade. Assim, os dados no so vistos sob uma tica do passado, o que no nos fornece uma

    abordagem definitiva do tema. Isto seria necessrio para a classificao do gnero artigo em

    ensaio. Alm disso, a extenso dos artigos pequena para que os categorizemos como ensaios.

    Desta forma, definimo-los como artigos (a subdiviso), onde o discurso marcado por

    uma menor extenso em relao ao ensaio e se pauta mais pela opinio, o conhecimento e a

    sensibilidade do articulista.

  • 39

    Quanto esquematizao entre doutrinrios e cientficos, podemos observar que, apesar

    do lao com a cincia mostrado em alguns dos artigos, todos eles tratam de uma questo atual

    mostrando um ponto de vista sobre elas, o que os pe na categoria dos doutrinrios. No entanto,

    os artigos Cincia sob ataque e o Prazer de perdoar apresentam fortes traos de divulgao

    cientfica, pois abordam tcnicas cientficas consideradas atuais, colocando ao leitor um modo de

    pensar sobre elas.

    Tendo em mos estes dados e tambm lembrando que os artigos se encontram disponveis

    ao final desta pesquisa, podemos dar incio anlise da argumentao presente praticada nos

    artigos de Hlio Schwartsman.

    3.2 Aplicao das teorias da argumentao

    Para a anlise do corpus optamos pela subdiviso em artigos e no em teorias. Este

    procedimento foi adotado para que pudssemos analisar separadamente as especificidades de

    cada artigo e, ao final, pudssemos comparar os elementos mais marcantes no discurso de um

    modo geral. Lembramos que para a anlise sero utilizadas apenas as teorias j descritas e que,

    por isso, nem todos os pontos de uma anlise retrica da argumentao podero ser cobertos.

    Assim, dentro de cada item deste captulo, que receber o nome do artigo do qual ir

    tratar, estudaremos a utilizao da teoria da argumentao de Perelman & Olbrechts-Tyteca

    (2005), conforme apresentada no corpo deste trabalho. Somente teremos como exceo o estudo

    da interao argumentativa, pois optamos por trat-lo na concluso, j que esta teoria requer uma

    verificao dos dados obtidos na anlise e oferece um meio de interpretao dos artigos.

    3.2.1 Cincia sob ataque8

    O artigo possui dois caminhos de argumentao: no primeiro, o autor busca defender a

    realizao de um experimento cientfico gacho, que visa rastrear o crebro de criminosos para

    detectar variaes que determinam o carter do indivduo. J no segundo, procura-se mostrar que

    investidas a favor do ensino do criacionismo vo contra a cincia e so at mesmo

    inconstitucionais. Os dois casos tm como inteno comum a defesa da cincia.

    8 O artigo refere-se ao Anexo 1 e encontra-se na pgina 58.

  • 40

    Como premissa para iniciar a argumentao, podemos citar a presuno de que a cincia

    til para a sociedade e os fatos de que determinados agentes sociais posicionam-se contra alguns

    avanos na rea cientfica, no caso, a ministra Marina Silva e o grupo que contra o experimento

    neurolgico. Ambas encontram-se na categoria das premissas relativas ao real, o que pode ser

    compreendido pela dimenso universal do auditrio de Hlio Schwartsman.

    Quanto aos argumentos utilizados para a defesa do experimento gacho, podemos notar

    quatro pontos centrais. No primeiro temos o argumento pelo sacrifcio, pois o autor avalia as

    consequncias do experimento e as toma como positiva. Este caso pode ser observado na seguinte

    amostra:

    E, por mais intransigentes que possamos ser na defesa da vida e da pluralidade humanas, nada justifica deixar de realizar um estudo cujos

    protocolos ticos se mostrem adequados (...). Ele no implica nenhum risco

    pondervel para as "cobaias" e s ocorrer se os pesquisadores obtiverem o

    consentimento esclarecido dos jovens (...) ou responsveis e tambm a

    autorizao da Justia.

    Em seguida vemos um argumento de superao, isto ocorre quando o autor critica toda

    pessoa que se oponha realizao de um experimento capaz de ampliar nosso conhecimento,

    ou seja, deve-se buscar cada vez mais sabedoria e o bloqueio desta superao algo condenvel.

    No prximo argumento a postura daqueles que vo contra o experimento criticada

    abertamente, pois se afirma que a pesquisa deve ser criticada aps seu resultado, segundo o

    mtodo cientfico, e no antes de sua execuo. Desta forma, temos um argumento de hierarquia,

    pois o rigor cientfico colocado em uma escala superior as outras formas de crtica. O que

    podemos ver na frase que critiquem, como convm ao mtodo cientfico, os resultados do

    experimento, no sua realizao.

    No ltimo caso temos uma argumentao atravs do antimodelo, nesta situao o autor

    diz q