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Pós-Graduação em Direito Tributário Disciplina: Contabilidade Tributária e Planejamento Tributário LEITURA COMPLEMENTAR – AULA 3

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Pós-Graduação em Direito Tributário

Disciplina: Contabilidade Tributária e Planejamento Tributário

LEITURA COMPLEMENTAR – AULA 3

LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 1

NARLON GUTIERRE NOGUEIRA

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Planejamento Tributário – Tecnologia e a CIDE

André Sussumu Iizuka

1. Introdução

Nos últimos 100 anos, a sociedade evoluiu numa velocidade nunca antes imaginada

pelo homem, e foi graças à tecnologia que hoje dispomos de facilidades da vida mo-

derna, como o telefone celular, a televisão, o computador, a internet, os automóveis,

os i-pods, entre outros mimos tecnológicos.

Sem dúvida que a tecnologia eletrônica e digital tem sido a grande mola propulsora

da evolução humana em diversas áreas e ciências, tais como a medicina, a biologia,

a engenharia, a arquitetura, o direito, a física, a astronomia, etc.

Fazendo uma pequena digressão histórica podemos destacar: a criação da lâmpada

por Thomas Edison em 1880; a instalação no Brasil dos primeiros telefones no Rio

de Janeiro, em 1883; o 1º voo de Santos Dumont em 1903 com seu 14 Bis, no Cam-

po de Bagatelle, em Paris; a 1ª fabricação em série de carros por Henry Ford a partir

de 1908; a criação da internet para uso militar e de universidades, nas décadas de

60 e 70, e posteriormente para o mundo a partir de 1990; a caminhada do Homem

na Lua em 1969, por Neil Armstrong; a criação do Altair 8800, um computador pes-

soal baseado na CPU Intel 8080, em 1975; e a forte expansão em telefonia celular

no Brasil, a partir de 1990.

A Era da Informação trouxe ainda em seu bojo um volume extraordinário de dados e

informações, capazes de disseminar qualquer tipo de conhecimento humano em

qualquer lugar do mundo, quebrando fronteiras, e trazendo como consequência o

efeito da globalização em toda sua plenitude.

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Desde então, o principal desafio do desenvolvimento de tecnologias para as empre-

sas tem sido a produção automatizada com menor custo e consumo (eficácia), e

maior velocidade, praticidade e agilidade (eficiência), substituindo trabalhos repetiti-

vos executados anteriormente pelo homem.

Nesse aspecto, o principal coadjuvante dessa evolução é sem dúvida o computador,

formado basicamente por 2 componentes básicos: hardware e software. O hardware

corresponde à conjugação de placas de circuito eletrônico (Microprocessador,

Motherboard, Hard Disk - HD, placas de vídeo, de som, etc.) que ao serem ligadas

executam funções específicas ou conjuntas, enquanto que o software é a expressão

de um conjunto organizado de instruções em linguagem codificada, contido em su-

porte físico de qualquer natureza, baseado em técnica digital ou análoga, para fazê-

los funcionar de modo e para fins determinados.

Dessas 2 frentes de negócios, há várias empresas no mundo focadas na produção

de hardware e outras em software, investindo milhões de dólares em pesquisas e

desenvolvimento de novas tecnologias para facilitar o dia a dia das pessoas e das

empresas.

Neste ponto, podem-se associar os negócios de hardware às operações de comer-

cialização, exploração de patentes, uso de marcas, franquias e de transferência de

tecnologia, enquanto os de software às operações de prestação de serviços, ou de

cessão ou licença de direitos de uso.

O presente estudo visa estudar mais especificamente os contratos internacionais de

tecnologia, identificando as situações em que estarão sujeitas à Contribuição de In-

tervenção do Domínio Econômico – CIDE, instituída pela Lei nº 10.168, de 29 de

dezembro de 2000, e as alternativas de planejamento tributário viáveis para cada

caso.

2. Legislação aplicável

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Basicamente, podemos dividir a legislação aplicável às tecnologias em 2 grandes

ordenamentos jurídicos diversos:

a) Hardware – Lei nº 9.279/98, que trata da propriedade industrial, mais especi-

ficamente das patentes de invenções e modelos de utilidade;

b) Software – Lei nº 9.609/98 (Lei de Software), e Lei nº 9.610/98 (Lei de Direi-

tos Autorais), que trata dos direitos autorais dos programas de computadores.

Tanto é que a Lei nº 9.279/98, em seu artigo 10, inciso V, exclui expressamente da

disciplina da propriedade industrial os programas de computadores, deixando para a

esfera dos Direitos Autorais previsto na Lei nº 9.610/98.

2.1. Hardware

Como já aduzido anteriormente, o hardware é a parte física do computador, ou seja,

é o conjunto de componentes eletrônicos, circuitos integrados e placas, que se co-

municam por meio de barramentos dispostos na MotherBoard (Placa-Mãe).

Para o desenvolvimento desses meios físicos, cientistas, universidades e empresas

investem em constantes pesquisas e desenvolvimentos que geram invenções, as-

sim consideradas “produto da atividade intelectual do ser humano ou mesmo fruto

do acaso, caracterizada pela novidade que possibilita a patente, constituindo um títu-

lo hábil para assegurar o privilégio de uma invenção útil à atividade industrial1”, e

modelos de utilidade que é “o objeto de uso prático, ou parte deste, suscetível de

aplicação industrial, que apresente nova forma ou disposição, envolvendo ato inven-

tivo, que resulte em melhoria funcional no seu uso ou em sua fabricação”2.

1 Crimes contra a Propriedade Industrial e Crimes de Concorrência Desleal, José Henrique Pierangeli, Editora RT Revista dos Tribunais, 2003, página 84. 2 Artigo 9º, da Lei nº 9.279/98 (Lei de Propriedade Industrial).

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Para tanto, não necessariamente o autor do invento ou do modelo de utilidade preci-

sa desenvolver, produzir, e inserir no mercado a sua tecnologia como empresário. É

claro que sendo dotado dessa capacidade, e visando lucros maiores, poderá assu-

mir o risco empresarial, disseminar a novidade no mercado de consumo, e tornar-se

bem sucedido na nova atividade.

Porém, mesmo acreditando no potencial de sua invenção ou modelo de utilidade,

poderá ceder, licenciar ou transferir essa tecnologia para outras pessoas ou empre-

sas que estejam interessadas em materializar e distribuir no mercado, dentro dos

princípios de livre mercado e livre iniciativa.

Para isto, a Lei nº 9.279/98, prevê em seus artigos 61, 62, 63, 68, 121, 139, 140,

141, 2113, os contratos de licenciamento voluntário e compulsório para exploração,

de licença de uso, e de transferência de tecnologia e de franquia.

3 “SEÇÃO I - DA LICENÇA VOLUNTÁRIA Art. 61. O titular de patente ou o depositante poderá celebrar contrato de licença para exploração. Parágrafo único. O licenciado poderá ser investido pelo titular de todos os poderes para agir em defesa da patente. Art. 62. O contrato de licença deverá ser averbado no INPI para que produza efeitos em relação a terceiros. § 1º. A averbação produzirá efeitos em relação a terceiros a partir da data de sua publicação. § 2º. Para efeito de validade de prova de uso, o contrato de licença não precisará estar averbado no INPI. Art. 63. O aperfeiçoamento introduzido em patente licenciada pertence a quem o fizer, sendo assegurado à outra parte contratante o direito de preferência para seu licenciamento. SEÇÃO III - DA LICENÇA COMPULSÓRIA Art. 68. O titular ficará sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial. § 1º. Ensejam, igualmente, licença compulsória: I - a não exploração do objeto da patente no território brasileiro por falta de fabricação ou fabricação incompleta do produto, ou, ainda, a falta de uso integral do processo patenteado, ressalvados os casos de inviabilidade econômica, quando será admitida a importação; ou II - a comercialização que não satisfizer às necessidades do mercado. § 2º. A licença só poderá ser requerida por pessoa com legítimo interesse e que tenha capacidade técnica e econômica para realizar a exploração eficiente do objeto da patente, que deverá destinar-se, predominantemente, ao mercado interno, extinguindo-se nesse caso a excepcionalidade prevista no inciso I do parágrafo anterior. § 3º. No caso de a licença compulsória ser concedida em razão de abuso de poder econômico, ao licenciado, que propõe fabricação local, será garantido um prazo, limitado ao estabelecido no artigo 74, para proceder à importação do objeto da licença, desde que tenha sido colocado no mercado diretamente pelo titular ou com o seu consentimento.

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Infelizmente, no Brasil, em virtude da carência de infraestrutura pública, falta de in-

vestimento em pesquisa, desenvolvimento e educação, exportam-se mais comodi-

ties agrícolas, importam-se produtos beneficiados e acabados, e adquire-se tecnolo-

gia estrangeira por meio de licenciamento e transferência dessas patentes.

Além disso, a alta carga tributária, elevados encargos trabalhistas e previdenciários,

juros bancários caros e a burocracia, levam o país à perda de competitividade em

plena globalização, tornando a exportação uma verdadeira exportação de “impostos

e contribuições sociais”.

2.2. Software

No que tange aos programas de computadores, pode-se dizer que praticamente ine-

xiste previsão dos direitos e obrigações entre os contratantes de todas as operações

que envolvem tecnologia no Código Civil/2002, na Lei nº 9.609/98 (Lei de Software),

§ 4º. No caso de importação para exploração de patente e no caso da importação prevista no parágrafo anterior, será igualmente admitida a importação por terceiros de produto fabricado de acordo com patente de processo ou de produto, desde que tenha sido colocado no mercado diretamente pelo titular ou com o seu consentimento. § 5º. A licença compulsória de que trata o § 1º somente será requerida após decorridos 3 (três) anos da concessão da patente. Art. 121. As disposições dos artigos 58 a 63 aplicam-se, no que couber, à matéria de que trata o presente Título, disciplinando-se o direito do empregado ou prestador de serviços pelas disposições dos artigos 88 a 93. SEÇÃO IV - DA LICENÇA DE USO Art. 139. O titular de registro ou o depositante de pedido de registro poderá celebrar contrato de licença para uso da marca, sem prejuízo de seu direito de exercer controle efetivo sobre as especificações, natureza e qualidade dos respectivos produtos ou serviços. Parágrafo único. O licenciado poderá ser investido pelo titular de todos os poderes para agir em defesa da marca, sem prejuízo dos seus próprios direitos. Art. 140. O contrato de licença deverá ser averbado no INPI para que produza efeitos em relação a terceiros. § 1º. A averbação produzirá efeitos em relação a terceiros a partir da data de sua publicação. § 2º. Para efeito de validade de prova de uso, o contrato de licença não precisará estar averbado no INPI. Art. 141. Da decisão que indeferir a averbação do contrato de licença cabe recurso. TÍTULO VI - DA TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA E DA FRANQUIA Art. 211. O INPI fará o registro dos contratos que impliquem transferência de tecnologia, contratos de franquia e similares para produzirem efeitos em relação a terceiros. Parágrafo único. A decisão relativa aos pedidos de registro de contratos de que trata este artigo será proferida no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data do pedido de registro.”

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e mesmo na Lei nº 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais), tornando, em algumas con-

cepções do mercado de software, contratos puramente atípicos.

A Lei de Software dedica de forma absolutamente precária apenas 3 artigos (9º, 10º

e 11º)4, que tratam de licença de uso, comercialização, e de transferência de tecno-

logia.

Já no aspecto tributário, até em função da voracidade do Governo ávido por arreca-

dação, houve grandes evoluções na definição dos tipos de serviços na área de tec-

nologia, que melhor demonstram a carência no aspecto do Direito Civil e de Direitos

Autorais.

Até o advento da Lei Complementar nº 116/2003, o Decreto-lei nº 406/68 previa no

item 25, da Lista de Serviços apenas os serviços de “análises, inclusive de sistemas,

exames, pesquisas e informações, coleta e processamento de dados de qualquer

natureza”.

4“CAPÍTULO IV - DOS CONTRATOS DE LICENÇA DE USO, DE COMERCIALIZAÇÃO E DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA Art. 9º. O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença. Parágrafo único. Na hipótese de eventual inexistência do contrato referido no caput deste artigo, o documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento de cópia servirá para comprovação da regularidade do seu uso. Art. 10. Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos e estabelecerão a remuneração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior. § 1º. Serão nulas as cláusulas que: I - limitem a produção, a distribuição ou a comercialização, em violação às disposições normativas em vigor; II - eximam qualquer dos contratantes das responsabilidades por eventuais ações de terceiros, decorrentes de vícios, defeitos ou violação de direitos de autor. § 2º. O remetente do correspondente valor em moeda estrangeira, em pagamento da remuneração de que se trata, conservará em seu poder, pelo prazo de cinco anos, todos os documentos necessários à comprovação da licitude das remessas e da sua conformidade ao caput deste artigo. Art. 11. Nos casos de transferência de tecnologia de programa de computador, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a terceiros. Parágrafo único. Para o registro de que trata este artigo, é obrigatória a entrega, por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, memorial descritivo, especificações funcionais internas, diagramas, fluxogramas e outros dados técnicos necessários à absorção da tecnologia.

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A nova lei veio dispor logo no início da nova lista os seguintes serviços:

1.01 Análise e desenvolvimento de sistemas;

1.02 Programação;

1.03 Processamento de dados e congêneres;

1.04 Elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos;

1.05 Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação;

1.06 Assessoria e consultoria em informática;

1.07 Suporte técnico em informática, inclusive instalação, configuração e manuten-

ção de programas de computação e bancos de dados; e

1.08 Planejamento, confecção, manutenção e atualização de páginas eletrônicas.

Para cada um desses serviços há diversas características próprias que podem dife-

renciar e divergir a propriedade da tecnologia e da composição de direitos e servi-

ços.

Não obstante a isto, a cada dia as empresas de tecnologia vêm criando serviços

inovadores e diferenciados fugindo dos institutos jurídicos tradicionais, causando

muitas vezes confusão dos operadores do direito, dos quais podemos citar os con-

tratos de outsourcing, de middleware, de alocação de profissionais, de utilização de

conteúdo, acordos de nível de serviço (SLA), de gestão de processos e de projetos

de tecnologia (PMO), de cleaning, de hosting, de colocation, entre outros.

No Brasil, o desenvolvimento de novas tecnologias em termos de software tem sur-

preendido diversos países no mundo todo, em termos de criatividade, qualidade e

inteligência, havendo aumento crescente de exportação desses programas.

A consultoria AT Kearney publicou um relatório no final de 2007 com os dez países

com melhores condições para a exportação de serviços de tecnologia, e o Brasil

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ficou em 5º lugar, atrás apenas da Índia, China, Malásia, e Tailândia, sendo que no

relatório anterior, de 2005, o País era 10º.

É preciso destacar que o software foi definido como uma das quatro prioridades da

política industrial no começo do governo Lula, quando foi traçada uma meta de US$

2 bilhões em exportação para 2007, porém só foram alcançados em torno de US$

800 milhões, ou seja menos da metade da meta.

Além disso, a Câmara Americana de Comércio – AMCHAM, acaba de divulgar que o

Brasil poderá se destacar como um dos três maiores centros de Tecnologia da In-

formação (TI) do mundo a partir de 2011, como informou Antonio Carlos Rego Gil,

presidente da Brasscom (Associação Brasileira das Empresas de Software e Servi-

ços para Exportação).

Isto se deve recém-anunciada a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) pelo

governo federal que representa um grande avanço nesse sentido.

Antonio Carlos Rego Gil destaca ainda que: “Se conseguirmos resolver alguns desa-

fios e atingir a meta de US$ 5 bilhões em exportações de software e serviços de TI

em 2011, o Brasil já será um dos três maiores. A política industrial é o primeiro pas-

so nessa direção”,

Segundo informações da AMCHAM, o presidente da Brasscom destacou ainda que

o setor foi contemplado pelo governo com a desoneração da folha de pagamento.

“Isso é fundamental porque 70% dos gastos das empresas de TI hoje são relativos à

mão de obra”, disse. A PDP reduz à metade a contribuição à Previdência das com-

panhias exportadoras de software e serviços de TI. As que recolhem hoje ao INSS

20% sobre a folha de pagamento passarão a contribuir com 10%.

Outro benefício trazido pela PDP, segundo Gil, é a dedução em dobro das despesas

com Programas Acelerados de Capacitação de Pessoal para determinação da base

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de cálculo do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido

(CSLL). Essas medidas devem favorecer a contratação de 100 mil profissionais pe-

las companhias do setor nos próximos quatro anos. “Precisamos de pessoas com

qualificação técnica e inglês.”

Gil apontou como outro ponto favorável da política do governo a permissão para que

as empresas de informática e automação deduzam da base de cálculo do Imposto

de Renda e da CSLL os investimentos em pesquisa e desenvolvimento multiplicados

por um fator de até 1,8.

Como se vê, o Governo Brasileiro está incentivando o desenvolvimento econômico

por meio da tecnologia em software, e pretende estar entre os destaques mundiais

nesse setor, e por essa razão, o presente estudo visa auxiliar os operadores do Di-

reito no entendimento de toda normatização que circunda essa evolução.

3. Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico – CIDE e os Contratos

de Tecnologia

De certa forma, a liberdade e o capitalismo acarretam uma forma de controle eco-

nômico de um povo por outro povo, e nesse aspecto, o poder estatal deve por meio

das leis restringir e limitar dentro das políticas e acordos internacionais setores da

economia de seu interesse.

Desde a promulgação da Constituição Federal/1988, o Estado tem como o objetivo a

promoção e o e incentivo ao desenvolvimento científico e tecnológico, como se pode

conferir dos artigos 218 e 219, retro transcritos:

“CAPÍTULO IV - DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento cien-

tífico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas.

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§ 1º. A pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Es-

tado, tendo em vista o bem público e o progresso das ciências.

§ 2º. A pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a

solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do

sistema produtivo nacional e regional.

§ 3º. O Estado apoiará a formação de recursos humanos nas áreas

de ciência, pesquisa e tecnologia, e concederá aos que delas se

ocupem meios e condições especiais de trabalho.

§ 4º. A lei apoiará e estimulará as empresas que invistam em pesquisa,

criação de tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento

de seus recursos humanos e que pratiquem sistemas de remuneração

que assegurem ao empregado, desvinculada do salário, participação

nos ganhos econômicos resultantes da produtividade de seu trabalho.

§ 5º. É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular parcela de

sua receita orçamentária a entidades públicas de fomento ao ensino e à

pesquisa científica e tecnológica.

Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incenti-

vado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico,

o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos

termos de lei federal.”

Porém, somente em 29 de dezembro de 2000, foi editada a Lei nº 10.168, pelo então

Presidente Fernando Henrique Cardoso, ficando definido como objetivo principal es-

timular o desenvolvimento tecnológico brasileiro, mediante programas de pesquisa

científica e tecnológica cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e o se-

tor produtivo, sendo instituído o Programa de Estímulo à Interação Universidade-

Empresa para o Apoio à Inovação.

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Para tanto, com base no artigo 149, § 2º, da Constituição Federal5, foi criada a Con-

tribuição de Intervenção do Domínio Econômico – CIDE, por meio da Lei nº

10.168/2000, que em seu artigo 2º, (alterada pela Lei nº 11.452/2007, com efeitos a

partir de 01.01.2006), assim disciplinou:

“Art. 2º Para fins de atendimento ao Programa de que trata o artigo anteri-

or, fica instituída contribuição de intervenção no domínio econômico, devi-

da pela pessoa jurídica detentora de licença de uso ou adquirente de co-

nhecimentos tecnológicos, bem como aquela signatária de contratos

que impliquem transferência de tecnologia, firmados com residentes ou

domiciliados no exterior.

§ 1º Consideram-se, para fins desta Lei, contratos de transferência de

tecnologia os relativos à exploração de patentes ou de uso de marcas e os

de fornecimento de tecnologia e prestação de assistência técnica.

§ 1º-A. A contribuição de que trata este artigo não incide sobre a remune-

ração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição

de programa de computador, salvo quando envolverem a transferência da

correspondente tecnologia. (NR)

5 Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos artigos 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no artigo 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação; II - incidirão também sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços; III - poderão ter alíquotas: a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada. § 3º A pessoa natural destinatária das operações de importação poderá ser equiparada a pessoa jurídica, na forma da lei. § 4º A lei definirá as hipóteses em que as contribuições incidirão uma única vez. (NR)

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§ 2º A partir de 1º de janeiro de 2002, a contribuição de que trata o caput

deste artigo passa a ser devida também pelas pessoas jurídicas signatá-

rias de contratos que tenham por objeto serviços técnicos e de assistência

administrativa e semelhantes a serem prestados por residentes ou domici-

liados no exterior, bem assim pelas pessoas jurídicas que pagarem, credi-

tarem, entregarem, empregarem ou remeterem royalties, a qualquer título,

a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior.

§ 3º A contribuição incidirá sobre os valores pagos, creditados, entregues,

empregados ou remetidos, a cada mês, a residentes ou domiciliados no

exterior, a título de remuneração decorrente das obrigações indicadas no

caput e no § 2º deste artigo.

§ 5º O pagamento da contribuição será efetuado até o último dia útil da

quinzena subsequente ao mês de ocorrência do fato gerador. (NR) (Pará-

grafo acrescentado pela Lei nº 10.332, de 19.12.2001, DOU 20.12.2001)

Art. 2º-A. Fica reduzida para 15% (quinze por cento), a partir de 1º de ja-

neiro de 2002, a alíquota do imposto de renda na fonte incidente sobre as

importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao

exterior a título de remuneração de serviços de assistência administrativa

e semelhantes”.

Posteriormente, a Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico – CIDE foi

regulamentada pelo Decreto nº 4.195, de 11 de abril de 2002 (DOU 12.04.2002),

vindo a definir em seu artigo 10, as hipóteses de incidência, ipsis litteris:

“Art. 10. A contribuição de que trata o art. 2º da Lei nº 10.168, de 2000,

incidirá sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, emprega-

das ou remetidas, a cada mês, a residentes ou domiciliados no exterior,

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a título de royalties ou remuneração, previstos nos respectivos contra-

tos, que tenham por objeto:

I - fornecimento de tecnologia;

II - prestação de assistência técnica:

a) serviços de assistência técnica;

b) serviços técnicos especializados;

III - serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes;

IV - cessão e licença de uso de marcas; e

V - cessão e licença de exploração de patentes.”

Nesse sentido, podemos dizer que o Governo seguindo a tendência de mercado

onerou mais os contratos de tecnologia relacionada ao hardware como forma de in-

centivar a criação de novas invenções e modelos de utilidade (Lei nº 9.279/98 – Lei

de Propriedade Industrial) dentro do território nacional, e desestimular a compra ou

licença de tecnologias estrangeiras.

E por outro lado, desonerou os contratos de licenciamento de uso e de direitos de

comercialização ou distribuição de programa de computador, exceto quando envol-

verem a transferência da correspondente tecnologia (§ 1º-A, da Lei nº 10.168/2000).

Por óbvio que se o Governo não desonerasse os softwares estrangeiros para a pes-

quisa e desenvolvimento nacional (P&D), acabaria acarretando num efeito circular

em que a CIDE acabaria ingressando no custo das patentes.

Antes mesmo da alteração do § 1º-A, da Lei nº 10.168/2000, pela Lei nº

11.452/2007, com efeitos a partir de 01.01.2006, muito juristas já entendiam que

com a edição do Decreto nº 4.195, de 11 de abril de 2002, os contratos de licencia-

mento dos direitos de uso do software estavam fora da incidência da CIDE.

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O que fica muito claro pela leitura dos dispositivos é que o objetivo do Governo é

desestimular a compra de tecnologia desenvolvida fora do país, ou a cessão e a li-

cença de patentes estrangeiras.

Por outro lado, para o mercado interno foi editada Lei nº 10.176, de 11 de janeiro de

2001, acrescentando o § 1º-A, do artigo 4º, da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de

1991, reduzindo as alíquotas do IPI para as empresas de desenvolvimento ou pro-

dução de bens e serviços de informática e automação que investirem em atividades

de pesquisa e desenvolvimento em tecnologia da informação.

Além disso, foi publicada a Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005, instituindo o

Regime Especial de Tributação para a Plataforma de Exportação de Serviços de

Tecnologia da Informação - REPES, o Regime Especial de Aquisição de Bens de

Capital para Empresas Exportadoras - RECAP e o Programa de Inclusão Digital,

além de incentivos fiscais para a inovação tecnológica.

Sem dúvida que essas medidas demonstram a intenção do Governo Brasileiro em

se tornar o grande player de mercado, na busca de competitividade internacional, e

principalmente em incentivar o ingresso de recursos estrangeiros com a finalidade

de desenvolvimento dentro do Brasil da tecnologia nacional.

Nesse sentido, Calixto Salomão Filho6, ao analisar a pesquisa tecnológica no Bra-

sil, explicou bem as estruturas de competição entre países no mercado internacio-

nal, e a intenção do Governo, em relação à legislação anti-truste, in verbis:

“a.l) A pesquisa tecnológica

O primeiro dos instrumentos de que se trata é talvez a preocupação nú-

mero um da política industrial da maioria dos países modernos. Nos paí-

ses industrializados, o desenvolvimento tecnológico de há muito já se

transformou em sinônimo de competitividade internacional. O engaja-

6 Direito Concorrencial As Estruturas, 3ª edição, Malheiros Editores, páginas 211 e 212.

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mento estatal nesses projetos é tão grande que alguns autores falam,

inclusive, em uma nova era do direito concorrencial, na qual a competi-

ção entre empresas se transforma em uma competição entre países na

busca da primazia tecnológica e consequentemente da supremacia in-

dustrial.42 Nesses esforços os Estados estão frequentemente dispostos

a excepcionar expressamente os dispositivos concorrenciais ou, então,

interpretá-los extensivamente.

Pelos mesmos motivos a pesquisa tecnológica é importante também pa-

ra os países em vias de desenvolvimento. Com uma agravante bastante

séria: a estrutural — ou talvez se possa dizer endêmica — ausência de

verbas públicas suficientes para o financiamento da pesquisa. Trata-se

de uma realidade que contribui para reforçar a dependência tecnológica

e econômica em relação aos países desenvolvidos. Premente, portanto,

é a necessidade de uma política industrial que permita o investimento da

iniciativa privada na pesquisa, em especial aquela de base.

Muitas legislações antitruste já contêm em seu bojo disposições que

permitem a aprovação de contratos de cooperação ou concentração

empresarial desde que sejam benéficos ao desenvolvimento tecnológi-

co. É o caso do art. 81 (antigo art. 85) do Tratado CEE, e do art. 54 da

nova lei brasileira, que claramente naquele dispositivo se baseou.”

É evidente nesse novo cenário que o Governo Brasileiro utiliza tanto da forma de

oneração de recursos remetidos para o exterior (caráter extrafiscal) como de benefí-

cios e subsídios para empresas instaladas no país como instrumentos regulatórios

no setor tecnológico, forçando que as estrangeiras se instalarem dentro do território

para competirem em igualdade de condições com as nacionais.

3.1. Prestação de serviços de assistência administrativa e técnicos especiali-

zados

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A Lei nº 10.168/2000, em seus §§ 1º e 2º, do artigo 2º, considera como contratos

de transferência de tecnologia os relativos à exploração de patentes ou de uso de

marcas e os de fornecimento de tecnologia e prestação de assistência técnica, bem

como os serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes a serem

prestados por residentes ou domiciliados no exterior.

O Decreto nº 4.195, de 11 de abril de 2002 (DOU 12.04.2002), reafirma em seu arti-

go 10, as hipóteses de incidência, listando-as da seguinte forma:

I - fornecimento de tecnologia;

II - prestação de assistência técnica:

a) serviços de assistência técnica;

b) serviços técnicos especializados;

III - serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes;

IV - cessão e licença de uso de marcas; e

V - cessão e licença de exploração de patentes.”

Nesse aspecto, vale a pena ressaltar que o legislador tributário está impedido por

força do disposto no artigo 1107, do Código Tributário Nacional, de alterar a definição

e os conceitos de direito privado, e nesse sentido vale a pena ressaltar como está

definida a transferência de tecnologia tanto em termos de hardware (invenção e mo-

delo de utilidade) como de software (direitos autorais).

No caso de hardware, para que ocorra a transferência de patente a Lei nº 9.279/98,

em seus artigos 58, 59, 60 e 2118, determina que seja feita por meio de registro no

7 Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. 8 “CAPÍTULO VII - DA CESSÃO E DAS ANOTAÇÕES Art. 58. O pedido de patente ou a patente, ambos de conteúdo indivisível, poderão ser cedidos, total ou parcialmente. Art. 59. O INPI fará as seguintes anotações:

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Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, ou seja, inexistindo efetiva ces-

são registrada da tecnologia ou aquisição de conhecimentos tecnológicos, nos

termos da Lei nº 10.168/2000, não há que se falar em incidência da CIDE.

No que tange ao software, não se exige o registro, porém o artigo 119, da Lei nº

9.609/98 (Lei de Software), exige que haja a efetiva entrega, por parte do fornecedor

ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte

comentado, memorial descritivo, especificações funcionais internas, diagramas, flu-

xogramas e outros dados técnicos necessários à absorção da tecnologia.

Desta forma, tanto em um caso como em outro está evidente a necessidade da efe-

tiva transferência de tecnologia (registro no INPI) ou de aquisição de conheci-

mentos tecnológicos (entrega da documentação completa) para que esteja den-

tro da esfera de incidência da CIDE, caso contrário, não há que se falar no paga-

mento desta contribuição.

Hiromi Higuchi10, em sua obra Imposta de Rendas das Empresas Interpretação e

Prática, descreve com grande propriedade, que lhe é peculiar, as situações em que

entende cabível a CIDE, ipsis litteris:

I - da cessão, fazendo constar a qualificação completa do cessionário; II - de qualquer limitação ou Ônus que recaia sobre o pedido ou a patente; e III - das alterações de nome, sede ou endereço do depositante ou titular. Art. 60. As anotações produzirão efeito em relação a terceiros a partir da data de sua publicação. TÍTULO VI - DA TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA E DA FRANQUIA Art. 211. O INPI fará o registro dos contratos que impliquem transferência de tecnologia, contratos de franquia e similares para produzirem efeitos em relação a terceiros. Parágrafo único. A decisão relativa aos pedidos de registro de contratos de que trata este artigo será proferida no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data do pedido de registro.” 9 “Art. 11. Nos casos de transferência de tecnologia de programa de computador, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a terceiros. Parágrafo único. Para o registro de que trata este artigo, é obrigatória a entrega, por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, memorial descritivo, especificações funcionais internas, diagramas, fluxogramas e outros dados técnicos necessários à absorção da tecnologia.” 10 2007, 32ª edição, IR Publicações Ltda., página 908.

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“Há grande diferença entre assistência administrativa e serviços admi-

nistrativos.

Na assistência administrativa há sempre transferência de tecnologia.

Assim, se a controladora no exterior manda um técnico para que a con-

trolada implante novo sistema de controle de matéria-prima, está haven-

do assistência administrativa com transferência de tecnologia. Se a con-

troladora no exterior tem departamento específico para examinar e con-

trolar as atividades da controlada no Brasil, trata-se de serviços adminis-

trativos sem qualquer transferência de tecnologia. A mesma situação

ocorre no caso de serviços técnicos e assistência técnica. Os serviços

técnicos de montagem de máquina industrial importada do exterior não

transfere tecnologia, assim como os serviços de atualização dos pro-

gramas de computador (software). A assistência técnica para implanta-

ção de novo sistema de produção industrial transfere a tecnologia.”

O mesmo autor informa ainda que a Receita Federal tem entendido que as remune-

rações de serviços técnicos têm incidência de CIDE, ainda que não haja transferên-

cia de tecnologia, citando as Soluções de Consulta nºs 53, 81, 96, 142, 164, 191,

320, e 34611, e inacreditavelmente que o serviço de advocacia paga, creditada ou

remetida ao exterior, está sujeita ao pagamento da CIDE por caracterizar serviços

técnicos especializados, previsto no Decreto nº 4.195/2002, muito embora a Lei nº

10.168/00, em seu artigo 2º “caput”, tenha mencionado como sujeito da obrigação o

adquirente de conhecimentos tecnológicos. Os serviços de advocacia até pode-

riam estar sujeitos em algumas situações à Lei de Direitos Autorais (9.610/98), po-

rém nem é hardware ou software, ou seja, não é tecnologia.

3.2. Royalties

3.2.1. Imposto de Renda

11 Todas da 8ª Região Fiscal, publicados no DOU de 25/6/02, 1º/8/02, 2/8/02, 21-10-03, 7/6/04, 30/10/02, 19/9/06, e 18/10/06

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De acordo com a Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964, em seu artigo 22, letra

d)12, royalties é considerado a exploração de direitos autorais, salvo quando perce-

bidos pelo autor ou criador do bem ou obra.

Entretanto, o artigo 2-A13, da Lei nº 10.168/00, prevê a alíquota de 15% para o Im-

posto de Renda retido na Fonte referindo-se às importâncias pagas, creditadas, en-

tregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de remuneração de serviços

de assistência administrativa e semelhantes.

Ocorre que a Medida Provisória nº 2.159-70, de 24/9/2001, em seu artigo 3º14, já

havia reduzido a alíquota para 15%, incluindo para os royalties, mencionando inclu-

sive “de qualquer natureza”, sem excepcionar os pagamentos pagos ao autor ou

criador do bem ou obra.

Nesse passo, fica bem definido que se a exploração dos direitos autorais ocorrer

pelo próprio autor ou criador do bem ou obra dentro do território nacional estará fora

do conceito de royalties, enquanto que se tratar de pagamentos para um autor es-

trangeiro sofrerá a incidência do imposto de renda.

3.2.2. CIDE - Crédito

12 Art. 22. Serão classificados como royalties os rendimentos de qualquer espécie decorrentes do uso, fruição, exploração de direitos, tais como: d) exploração de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo autor ou criador do bem ou obra. 13 Art. 2º-A. Fica reduzida para 15% (quinze por cento), a partir de 1º de janeiro de 2002, a alíquota do imposto de renda na fonte incidente sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de remuneração de serviços de assistência administrativa e semelhantes. (Artigo acrescentado pela Lei nº 10.332, de 19.12.2001, DOU 20.12.2001) 14 Art. 3º Fica reduzida para quinze por cento a alíquota do imposto de renda incidente na fonte sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de remuneração de serviços técnicos e de assistência técnica, e a título de royalties, de qualquer natureza, a partir do início da cobrança da contribuição instituída pela Lei nº 10.168, de 29 de dezembro de 2000.

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É preciso salientar que o Governo Federal, pressupondo a instalação de novas fá-

bricas e empresas de tecnologia estrangeiras, criou um crédito que é reduzido ao

longo de alguns períodos até 2013, conforme se pode conferir do artigo 4º, § 1º, da

Medida Provisória nº 2.159-70, de 24/9/2001, a seguir transcrito:

“Art. 4º É concedido crédito incidente sobre a Contribuição de Intervenção

no Domínio Econômico, instituída pela Lei nº 10.168, de 2000, aplicável

às importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas

para o exterior a título de royalties referentes a contratos de exploração

de patentes e de uso de marcas.

§ 1º O crédito referido no caput:

I - será determinado com base na contribuição devida, incidente sobre

pagamentos, créditos, entregas, emprego ou remessa ao exterior a título

de royalties de que trata o caput deste artigo, mediante utilização dos

seguintes percentuais:

a) cem por cento, relativamente aos períodos de apuração encerrados a

partir de 1º de janeiro de 2001 até 31 de dezembro de 2003;

b) setenta por cento, relativamente aos períodos de apuração encerra-

dos a partir de 1º de janeiro de 2004 até 31 de dezembro de 2008;

c) trinta por cento, relativamente aos períodos de apuração encer-

rados a partir de 1º de janeiro de 2009 até 31 de dezembro de 2013;

II - será utilizado, exclusivamente, para fins de dedução da contribuição

incidente em operações posteriores, relativas a royalties previstos no

caput deste artigo.

§ 2º O Comitê Gestor definido no art. 5º da Lei nº 10.168, de 2000, será

composto por representantes do Governo Federal, do setor industrial e

do seguimento acadêmico-científico.

Pelo que se denota, até o final do presente ano, as pessoas jurídicas detentoras de

licença de uso ou adquirentes de conhecimentos tecnológicos, bem como aquela

signatária de contratos que impliquem transferência de tecnologia, firmados com re-

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sidentes ou domiciliados no exterior, terão impacto da redução do crédito de 70 para

30%, incentivando ainda mais a instalação de empresas no Brasil para evitar a tribu-

tação.

Desta forma, as empresas estrangeiras fornecedoras de tecnologia para o Brasil

precisam rever suas estratégias econômicas financeiras com vistas a obter a melhor

eficiência tributária, motivo pela qual o tema aqui debatido continua tendo a relevân-

cia em função desse momento de redução do crédito da CIDE.

4. Planejamento Tributário

Após delinear os aspectos legais que permeiam a incidência da CIDE e do Imposto

de Renda sobre os valores remetidos a qualquer título, aos beneficiários residentes

ou domiciliados no exterior, decorrentes de contratos de tecnologia, deve-se estudar

os critérios e parâmetros delineadores de um planejamento tributário adequado a fim

de se evitar autuações e desconsideração dos atos praticados.

É certo que não se pretende neste tópico trazer um tratado de planejamento tributá-

rio em que renomados juristas já se debruçaram sobre o tema, mas enfatizar apenas

aqueles relevantes para o presente estudo sobre as operações que sofrem a inci-

dências dos tributos aqui tratados.

Inicialmente, a norma antielisiva é tratada pelo parágrafo único, do artigo 116, do

Código Tributário Nacional, acrescentado pela Lei Complementar nº 104, de

10.01.2001, no qual prevê a possibilidade da autoridade administrativa desconside-

rar atos e negócios jurídicos, in verbis:

“Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fa-

to gerador e existentes os seus efeitos:

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I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifi-

quem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos

que normalmente lhe são próprios;

II - tratando-se da situação jurídica, desde o momento em que esteja de-

finitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar

atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimu-

lar a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos ele-

mentos constitutivos da obrigação tributária, observados os proce-

dimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (AC)”

Posteriormente, numa tentativa de regulamentar melhor a questão, o Governo Fede-

ral editou a Medida Provisória nº 66, de 29 de agosto de 2002, que em seus artigos

13 a 1415, definiram como parâmetros a falta de propósito negocial e o abuso de

forma para a desconsideração.

Porém, na conversão desta Medida Provisória, que tratava também da não cumula-

tividade do PIS, para a Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, os artigos 13 e

14 não foram convertidos e convalidados nesta lei, perdendo a princípio a sua vali-

dade.

15 Art. 13. Os atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência de fato gerador de tributo ou a natureza dos elementos constitutivos de obrigação tributária serão desconsiderados, para fins tributários, pela autoridade administrativa competente, observados os procedimentos estabelecidos nos arts. 14 a 19 subsequentes. Parágrafo único. O disposto neste artigo não inclui atos e negócios jurídicos em que se verificar a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. Art. 14. São passíveis de desconsideração os atos ou negócios jurídicos que visem a reduzir o valor de tributo, a evitar ou a postergar o seu pagamento ou a ocultar os verdadeiros aspectos do fato gerador ou a real natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária. § 1º Para a desconsideração de ato ou negócio jurídico dever-se-á levar em conta, entre outras, a ocorrência de: I - falta de propósito negocial; ou II - abuso de forma. § 2º Considera-se indicativo de falta de propósito negocial a opção pela forma mais complexa ou mais onerosa, para os envolvidos, entre duas ou mais formas para a prática de determinado ato. § 3º Para o efeito do disposto no inciso II do § 1, considera-se abuso de forma jurídica a prática de ato ou negócio jurídico indireto que produza o mesmo resultado econômico do ato ou negócio jurídico dissimulado.

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Atualmente, em mais uma tentativa de regulamentar o parágrafo único, do artigo

116, do CTN, está em trâmite na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº

536/2007 que praticamente é a transcrição dos artigos 13 e 14, somente o caput, e

15 a 19, da Medida Provisória nº 66, de 29 de agosto de 2002, ou seja, com a exclu-

são dos termos falta de propósito negocial e o abuso de forma.

Desta forma, inexiste definição exata de quais casos ou situações em que os atos e

negócios jurídicos podem ser desconsiderados pela autoridade administrativa, es-

tando na maioria dos casos em análise ou decididos pelo Conselho dos Contribuin-

tes, porém com recursos pendentes, e decisões divergentes entre os conselheiros.

No STF e STJ, ainda não temos qualquer posicionamento a respeito dessa questão,

o que dificulta a busca de segurança jurídica nas operações.

4.1. Doutrina

Sabe-se que é direito da empresa organizar e planejar sua atividade de modo a ob-

ter a melhor eficiência operacional, estratégica, financeira, societária e tributária, e é

dever/obrigação dos administradores, sejam sócios ou não, proceder com a devida

diligência na busca de melhores resultados, em cumprimento da função social da

atividade empresarial (art. 170, I, da CF).

A Lei nº 6.404/76 (Lei das S/A´s) dispõe nos seus artigos 153 e 154 que o adminis-

trador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e dili-

gência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus

próprios negócios, bem como, exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe confe-

rem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do

bem público e a função social da empresa.

Entretanto, a falta de regulamentação e o grande subjetivismo que circunda a inter-

pretação do parágrafo único, do artigo 116, do CTN, têm levado os juristas a busca-

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rem dentro dos parâmetros do direito privado, e ainda no Direito Comparado, a fim

de trazer a melhor solução de compatibilidade e harmonização da norma inserta.

Dentre as discussões mais comuns, em termos práticos, estão:

- Hipótese de incidência tributária;

- Princípios constitucionais;

- Abuso de Direito, Fraude, Simulação e Dissimulação;

- Business purpose.

Passamos então ao exame sintético de cada um dos itens:

4.1.1. Hipótese de incidência tributária

Não resta dúvida que a tarefa de planejar exige do hermeneuta a compreensão dos

aspectos que compõe a hipótese de incidência dos tributos em geral. Basicamente

são 5 os aspectos:

a) Pessoal - compreende as pessoas envolvidas na relação jurídica patrimonial, e

que se vinculam à obrigação tributária, ou seja, 1) os titulares da competência

(União, Estados, Distrito Federal e Municípios) - denominados sujeitos ativos; e

2) os contribuintes e responsáveis (pessoas privadas que deve satisfazer a pres-

tação, isto é, cumprir o dever jurídico, suportar os ônus ou ficar em sujeição),

denominados sujeitos passivos;

b) Material - consiste em determinados negócios jurídicos, estados, situações, e

serviços, dispostos na norma tributária;

c) Quantitativo - constitui a dimensão da obrigação pecuniária, positivando o valor

devido pelos sujeitos passivos,

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d) Temporal - consiste na fixação de um determinado momento em que se deve

reputar acontecida a materialidade do tributo. O instante do nascimento da obri-

gação tributária deve guardar efetivo vínculo com a matéria objeto da tributação,

ocorrendo em diversas situações (saída, entrada, fornecimento, primeiro dia do

ano etc.).

e) Espacial - significa que os fatos tributários ocorrem em um determinado lugar,

cumprindo ao legislador estabelecer o local (estabelecimento, entrada no país

etc.) em que, uma vez acontecida à materialidade, se repute devida a obrigação.

Dentro desses aspectos, o hermeneuta deve analisar com muita cautela dentro da

operação empresarial o melhor enquadramento de negócios jurídicos pactuados de

forma a maximizar os resultados.

4.1.2. Princípios e limites constitucionais da tributação

É indubitável que o parágrafo único, do artigo 116, do CTN, é uma norma geral e

abstrata, sem a definição específica dos atos e negócios jurídicos que podem ser

desconsiderados.

Em oposição, na defesa do contribuinte, devem ser observados os princípios e limi-

tes constitucionais que norteiam todo o sistema tributário, dentre os mais importan-

tes estão o da legalidade, da tipicidade, da segurança jurídica, da autonomia priva-

da, e da liberdade de escolha.

4.1.2.1. Princípio da legalidade tributária

O fato da atuação do Estado disciplinar por meio de normas gerais implica o auto-

mático desrespeito à liberdade do cidadão, configurando-se em verdadeira arbitrari-

edade na cobrança de tributos, quando o artigo 5º, inciso II, da CF, estabelece que

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“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em vir-

tude de lei”.

Desta forma, quando o parágrafo único, do artigo 116, do CTN, dá competência para

a autoridade administrativa desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com

a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos

elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a se-

rem estabelecidos em lei ordinária, determina que esta lei defina exatamente as hi-

póteses em que pode haver essa nulidade.

Caso contrário, será o mesmo que admitir que com estas normas, quem atua na tri-

butação não é o órgão legislativo, mas o Poder Executivo ou o Poder Judiciário que

na maior parte das vezes é quem decide se o caminho optado pelo contribuinte foi

ou não correto. Diante desta circunstância preambular e condicional, para se obede-

cer à regra da legalidade, o Estado não pode tributar fato gerador que não esteja

tipicamente previsto nas normas de incidência, pois na ausência de normas fiscais

antiabuso não existe um interesse tributário geral que deva ser tutelado.

4.1.2.2. Princípio da tipicidade

É imprescindível a definição do tipo tributário na lei de tal forma que não permitam

uma simples aplicabilidade discricionária, deixando a sua execução à mercê das ne-

cessidades do Estado.

Devem as normas fiscais ser descritas em uma tipologia que traga de modo deta-

lhado, os elementos integrantes do tipo, sendo descabida a aplicação de critérios

subjetivos que se traduzem em cumprimentos abstratos.

Sem dúvida que o Estado insere uma norma geral - violadora do princípio da tipici-

dade e dos respectivos corolários - para tributar esta escolha do contribuinte, que

fora constituída dentro dos limites e ordens legais.

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4.1.2.3. Princípio da segurança jurídica

Como é sabido, o artigo 37, dispõe que: “A administração pública direta e indireta de

qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios

obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência e, também, ao seguinte:”

A segurança jurídica pressupõe e exige que a Administração aplique as normas de

acordo com os princípios constitucionais assegurados e respeitando os direitos dos

contribuintes.

Entretanto, as cláusulas gerais não alcançam essa proteção jurídica aos contribuin-

tes, levando ao caráter subjetivo da ação estatal e que desrespeita a basilar regra da

tributação.

4.1.2.4. Princípio da autonomia privada

Nos termos do artigo 170, da Constituição Federal, constitui como princípios da or-

dem econômica, a valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, para assegu-

rar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

É importante salientar que o contribuinte, principalmente a pessoa jurídica, quando

escolhe o melhor caminho possível para a direção econômica dos seus negócios,

está, evidentemente, pensando em igual na boa saúde da empresa, ligado direta-

mente ao fomento ou, pelo menos, à criação e manutenção de empregos.

4.1.2.5. Princípio da liberdade de escolha

O Neoliberalismo trouxe em seu bojo o controle mitigado pelo Estado das atividades

exercidas pelo cidadão, ou seja, a este é assegurado exercer a vontade desde que

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dentro dos parâmetros exigidos pela lei, sendo permitido o planejamento fiscal, des-

de que não há qualquer oposição à lei ou ato ilícito, sendo plenamente permitida a

reorganização da sua vida econômica, mediante o uso das “lacunas da lei”, para as-

sumir com liberdade o caminho financeiro que lhe parecer mais favorável.

Não resta dúvida que muito embora haja essa liberdade de escolha, por diversas

vezes, o Fisco com o intuito de arrecadar tributos invade o patrimônio dos contribuin-

tes, exigindo uma carga tributária maior, e o contribuinte ao encontrar uma forma

lícita de reduzir a carga fiscal é penalizado ou coibido, porém esta atitude é plena-

mente válida e lícita uma vez que além dos administradores ou membros das em-

presas exercerem a liberdade de organização tem o dever/poder de atender aos

princípios empresariais da “economicidade, profissionalidade e organização”.

Desta forma, a autoridade administrativa está impedida de exercer qualquer descon-

sideração com a instituição desta norma geral, pois acaba por desprestigiar a livre

iniciativa e favorece aos interesses econômicos do Estado.

4.1.3. Abuso de Direito, Fraude, Simulação e Dissimulação;

Muitos doutrinadores encaram o abuso de direito e fraude à lei como figuras volta-

das às qualidades que cercam determinados fatos, atos ou condutas realizadas, que

lhes dão uma configuração específica à vista das previsões legais, de tal forma a

escapar da incidência da lei.

O abuso é derivado do uso regular do direito, sendo afastada a visão individualista

de que um direito comporta qualquer tipo de uso, inclusive o excessivo ou que dis-

torça seu perfil objetivo, e a fraude à lei é decorrência da legalidade e da imperativi-

dade do ordenamento positivo, como um todo, e da norma jurídica específica.

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Encara-se que o abuso e a fraude à lei não interferem na legalidade e na tipicidade,

posto que situadas referem-se exclusivamente aos fatos e não à norma, porém a

falta de definição desta leva ao subjetivismo da autoridade administrativa.

É claro que não se defende aqui aquelas atividades que fujam da coerência, da mo-

ralidade, e da ética nos negócios, jamais se poderia admitir a veiculação de um ne-

gócio jurídico que não represente efetivamente o ato jurídico pactuado, e nesse sen-

tido, deve-se punir o contribuinte de forma bastante coercitiva e punitiva para que o

Estado também proteja os demais contribuintes.

No que tange à fraude à lei, vale a pena ressaltar que os artigos 158 a 16516, do Có-

digo Civil, definem fraude contra credores como os “...negócios de transmissão gra-

tuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por

16 Seção VI - Da Fraude Contra Credores Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos. § 1º Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente. § 2º Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles. Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante. Art. 160. Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de todos os interessados. Parágrafo único. Se inferior, o adquirente, para conservar os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda ao valor real. Art. 161. A ação, nos casos dos arts. 158 e 159, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé. Art. 162. O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu. Art. 163. Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor. Art. 164. Presumem-se, porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família. Art. 165. Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores. Parágrafo único. Se esses negócios tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade importará somente na anulação da preferência ajustada.

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eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos cre-

dores quirografários, como lesivos dos seus direitos.”

Ou seja, o devedor abre mão de um direito, transmitindo gratuitamente o seu patri-

mônio para terceiros com o intuito de fugir de suas obrigações.

Porém, a fraude à lei e o abuso de direito devem ser consideradas exceções e não

uma regra na forma como a autoridade administrativa deve caracterizar certas rela-

ções, pois caso contrário qualquer operação pode ser descaracterizada sob o pre-

texto de que a Administração Pública possui um crédito corrente com o contribuinte

e este nada pode transferir em qualquer hipótese.

Sobre a simulação e a dissimulação, no campo do Direito Tributário, que são formas

ilícitas de evasão ou de sonegação fiscal, e neste sentido, Sampaio Dória17 concei-

tua evasão fiscal como "toda e qualquer ação ou omissão tendente a elidir, reduzir

ou retardar o cumprimento de obrigação tributária"... como "fuga ardilosa, dissimula-

da, sinuosa, furtiva, ilícita em suma, a um dever ou obrigação". (...) "O primeiro as-

pecto substancial que as extrema é a natureza dos meios eficientes para sua conse-

cução: na fraude, atuam meios ilícitos (falsidade) e, na elisão, a licitude dos meios é

condição sine qua non de sua realização efetiva.

Para melhor compreensão, os artigos 167 a 17018, do Código Civil, definem que os

negócios jurídicos serão considerados simulados quando aparentarem conferir ou

17 Elisão e Evasão Fiscal, São Paulo, José Bushatsky Editor, páginas 21 a 45. 18 Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. § 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados. § 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado. Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

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transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou

transmitem; contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

e os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

Os doutrinadores conceituam ainda a simulação pela caracterização do desacordo

entre a vontade interna e a declarada, no sentido de criar, aparentemente, um ato

jurídico que, de fato, não existe, ou então oculta, sob determinada aparência, o ato

realmente querido.

Além disso, a ciência jurídica tem distinguido a simulação entre absoluta ou relativa,

entendendo que a primeira exprime ato jurídico inexistente, ilusório, fictício, ou que

não corresponde à realidade, total ou parcialmente, mas a uma declaração de von-

tade falsa, e a segunda, quando efetivamente há intenção de realizar algum ato jurí-

dico, mas este: a) é de natureza diversa daquele que, de fato, se pretende ultimar.

Ferrara distinguiu simulação e dissimulação nos seguintes termos: “na simulação,

faz-se aparecer o que não existe, na dissimulação se oculta o que é; a simulação

provoca uma crença falsa num estado não real, a dissimulação oculta ao conheci-

mento dos outros uma situação existente... Mas, em ambas, o agente quer o enga-

no; na simulação quer enganar sobre a existência de uma situação não verdadeira,

na dissimulação, sobre a inexistência de situação real. Se a simulação é um fantas-

ma, a dissimulação é uma máscara".

4.1.4. Business purpose;

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes. Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo. Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.

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Da mesma forma como o Brasil, há países que também não inseriram normas gerais

antielisão em seu ordenamento jurídico positivo, mas que possuem uma sólida cons-

trução jurisprudencial que atua como forma de regular as relações.

Nesse passo, transcrevo trecho de João Francisco Bianco19 que melhor detalha

em termos de direito comparado, in verbis:

“Na França existem dois instrumentos utilizados pela Administração para

coibir a elisão fiscal. O primeiro deles é uma norma geral antielisão que

veda o abuso de direito por parte do contribuinte, assim entendida a prá-

tica de uma operação cujo único objetivo tenha sido a obtenção do bene-

fício fiscal, sem, portanto, um objetivo empresarial. O segundo instru-

mento é uma construção jurisprudencial que atinge o ato de gestão

anormal, segundo a qual o contribuinte não pode engajar-se na prática

de alguma operação que seja contrária aos seus interesses. De acordo

com essa teoria, o contribuinte não é obrigado a praticar o ato que lhe

comine maior carga fiscal; mas, por outro lado, o contribuinte pessoa ju-

rídica, por exemplo, não pode transferir resultados para outra empresa,

contrariamente a seus próprios interesses, somente porque a outra pes-

soa jurídica é isenta ou possui menor carga fiscal.

Na Alemanha foi editada norma geral antielisão que veda o abuso das

construções legais. Esse dispositivo tem sido interpretado da seguinte

forma: o contribuinte que estiver diante de diversas estruturas legais

adequadas para atingir o seu objetivo empresarial poderá escolher aque-

la que acarretar o menor impacto fiscal. O abuso somente ocorrerá

quando a estrutura legal escolhida for considerada inadequada. Como

se vê, o que o legislador buscou foi proibir a utilização do negócio jurídi-

co indireto para fins fiscais.

19 O Planejamento Tributário e a Lei Complementar 104, Dialética, páginas 151 e 152.

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Na Holanda existe uma norma geral antielisão prevendo que uma opera-

ção que não tenha por objetivo uma mudança significativa na situação

de fato do contribuinte, ou que somente tenha sido praticada em função

do benefício fiscal obtido, não será considerada para efeitos fiscais.

Na Espanha há intensa discussão na doutrina e na jurisprudência sobre

essa matéria, com decisões judiciais conflitantes, tendo em vista a exis-

tência de legislação contraditória. Por um lado há dispositivos legais de

ordem fiscal coibindo a prática do abuso de direito pelo contribuinte, da

mesma forma que a legislação francesa. Além disso, a legislação fiscal

também determina que o imposto será devido de acordo com a natureza

real ou econômica do evento tributável. Por outro lado, existe um dispo-

sitivo legal específico vedando a interpretação extensiva e a interpreta-

ção analógica da lei fiscal, além do estrito sentido das palavras. Ainda

não há uma firme posição jurisprudencial conciliando a aplicação de to-

dos esses dispositivos.

Nos Estados Unidos não há uma norma geral antielisão no ordenamento

jurídico. Mas a jurisprudência construiu o entendimento segundo o qual

uma operação pode ser desconsiderada para efeitos fiscais quando ela

não tiver um objetivo empresarial ("business purpose"), ou quando ela ti-

ver sido praticada com o claro propósito de evitar a incidência do tributo

e não contiver alguma substância econômica.

O Canadá editou em 1988 uma norma geral antielisão, aplicável sempre

que a operação adotada pelo contribuinte tenha sido praticada essenci-

almente - mas não exclusivamente - com o objetivo de obter um benefí-

cio fiscal.

Como se vê, o exame do direito comparado evidencia que a matéria ain-

da está em franca evolução, as experiências legislativas se sucedem,

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com resultados práticos variados. Basta mencionar que, na Suécia, uma

norma geral antielisão foi adotada, mas os resultados alcançados foram

considerados insatisfatórios pelo Governo e a lei acabou sendo revoga-

da.”

Dentre todas os modelos citados, Daniel Gatschnigg Cardoso20 vem defendendo

que a tendência no Brasil é a adoção do modelo americano do business purpose,

com certas adaptações, ficando mais coerente com a nossa realidade, mencionando

a opinião do Professor Luís Eduardo Schoueri. Vejamos os seus comentários:

“No mesmo sentido é a orientação norte-americana, que aponta para a

teoria Business purpose, que exige que o negócio seja motivado por al-

guma razão econômica, preocupando-se com a utilização das denomi-

nadas conduit companies, criadas somente para servir como instrumento

para a realização de negócios que configurem uma etapa de um negócio

mais amplo ou que atuem como empresas pelas quais transitem recur-

sos que se destinem a operações dos interesses de terceiros.

Na opinião do professor Luís Eduardo Schoueri, a tendência de se intro-

duzir no País o conceito de “propósito negocial”, cuja ausência pode

permitir ao Fisco desconsiderar os negócios praticados pelo contribuinte,

permitiria, inclusive, a contestação da natureza meramente fática do fato

gerador. Ao discorrer sobre o instituto surgido na jurisprudência norte-

americana, o professor ressalta que a sua origem se deu em 1935, na

ocasião em que a Corte Suprema examinou o caso Gregory v. Helve-

ring, que versava sobre reestruturação societária, com a criação de nova

empresa, visando a obter uma vantagem fiscal:

20 A “CFC Legislation” brasileira e os impactos na competitividade internacional, publicada no Juris Síntese nº 63 - Jan/Fev de 2007.

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“Para a Corte, a nova empresa não tinha qualquer business or corporate

task, tendo sido criada apenas para cumprir um objetivo limitado do con-

tribuinte, destinando-se a ser abandonada, assim que este fim fosse

atingido. Deste modo, o reconhecimento de uma sociedade dependeria,

para fins fiscais, do que se passou a chamar business purpose test, i. e.,

a empresa criada deveria ter algum propósito negocial, não podendo ser

utilizada, meramente, como instrumento de evasão de divisas.”13

A partir daí, o professor nos traz uma nova e interessante abordagem do

fato gerador da obrigação tributária, ao observar que “independentemen-

te da posição que se adote sobre a constitucionalidade de tal corrente,

mais uma vez se nota que o ‘propósito negocial’ será um requisito para

que se dê por ocorrido, ou não, o fato gerador; uma vez confirmada a

sua ocorrência, a obrigação tributária nascerá. Ou seja: propósito nego-

cial não significa a intenção das partes de pagar tributos; é, apenas, a

conformidade entre a intenção das partes (motivo do ato) e a causa do

negócio jurídico.”14

Uma das alternativas possíveis para que a legislação atingisse somente

atividades desprovidas de propósito negocial seria restringir a aplicação

às rendas passivas, excluindo as rendas ativas decorrentes da atividade-

fim da sociedade, nos moldes da legislação norte-americana.”

Nessa linha de raciocínio, sem dúvida que é um bom parâmetro para que o contribu-

inte visualize uma operação empresarial dentro de sua realidade de negócio e não

desvirtue a sua atividade somente com um fim tributário.

5. Algumas opções

Não resta dúvida que diante de todos os pontos aqui colocados torna-se bem com-

plexo recomendar uma opção que norteie as empresas que adquiram sob qualquer

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forma tecnologia estrangeira sem que se possa entender a forma de funcionamento

da empresa, e o próprio negócio jurídico existente.

Sem contar que dependerá muito se a empresa produz hardware ou software para

que se possa fazer um estudo de viabilidade econômico-financeira e ainda a tributá-

ria. Pode-se dizer que dificilmente a mesma estratégia ou planejamento poderá ser-

vir para o mesmo ramo de atividade, pois o bem da verdade, o modus operandi de

cada empresa é muito peculiar do líder e gestor da organização.

Não se pode alterar a natureza das coisas, da mesma forma, que não se pode alte-

rar a forma e a operação da empresa sem que estas diretrizes estejam alinhadas

com o querer do líder empresarial, e nessa linha, é muito comum notarmos empre-

sas que mudaram a sua forma com o intuito unicamente tributário e posteriormente

assistiram a sua derrocada por falta de consciência do novo modelo de negócio.

Num país como o nosso em que mais de 90% são empresas familiares, sem dúvida

que muitas preferem uma carga tributária mais elevada a fazer mudanças funda-

mentais, isto não quer dizer que deixem de inovar ou evoluir, porém certas altera-

ções podem levar à destruição de toda a sua história e tradição.

Nesse passo, as opções aqui trazidas dependem muito do momento e da disponibi-

lidade que a empresa vive e do capital que tenha para investir em mudanças, que

são sempre complicadas em grandes estruturas.

Primeiramente, e como não poderia deixar de ser, é a própria instalação no país de

uma empresa que desenvolva a tecnologia tanto hardware como software, é claro

que o estrangeiro terá que comparar em seus custos o que será mais benéfico para

ele em termos econômicos.

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É sabido que não basta apenas a aquisição de máquinas e equipamentos, mas é

preciso pessoas capacitadas e treinadas para o desenvolvimento e a produção de

produtos e serviços de forma a concorrer dentro do mercado brasileiro.

Além disso, deve-se comparar se vale mais a pena pagar a CIDE e o Imposto de

Renda na Fonte pelo licenciamento dos direitos de uso de um software, ou instalar

uma empresa de desenvolvimento de novas tecnologias e licenciá-las internamente.

É claro que dependendo de caso a caso, pode ser interessante para o estrangeiro

converter essa licença que representa a receita bruto, em uma empresa de software

brasileira em que se pode ter um regime de lucro real, com a dedução das despe-

sas, em termos exemplificativos e simplista teríamos a seguinte comparação:

Mensal

Empresa Estrangeira Empresa Nacional

Licenciamento

com transferên-

cia de tecnologia

R$ 1.000.000,00 Faturamento R$ 1.000.000,00

Despesas R$ 700.000,00

Lucro 300.000,00

CIDE R$ 100.000,00 IRPJ/CSLL (34%) 102.000,00

IRRF R$ 150.000,00

PIS/COFINS

(3,65%) 36.500,00

Carga tributária R$ 250.000,00 Carga Tributária R$ 138.500,00

Economia R$ 111.500,00

Economia anual R$ 1.338.000,00

Sem contar ainda que se esta empresa de software exportar, poderá ter uma redu-

ção na folha de salários e ainda um benefício fiscal de até 1,8 sobre as despesas de

pesquisa e desenvolvimento (P&D)

Cabe fazer um paralelo que ao fazer a comparação deve-se considerar que os ser-

viços de manutenção que não envolver transferência de tecnologia deverão obede-

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cer às regras do transfer pricing (preços de transferências), disciplinados pelo artigo

18, § 6º, da Lei nº 9.430/96.

Outro modelo refere-se mais ao hardware. Como já foi mencionado logo no início

deste estudo, o regime jurídico que dispõe sobre os direitos de propriedade, é a Lei

nº 9.279/98, que trata das patentes de invenções e modelos de utilidade.

Porém, estes direitos têm prazo determinado, a patente de invenção vigora pelo pra-

zo de 20 anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 anos contados da data de

depósito, nos termos do artigo 4021, daquela lei, e após esse período o seu objeto

cai em domínio público, nos termos do parágrafo único do artigo 78.

Nesse passo, pode ser interessante para a estrangeira instalar uma indústria que

desenvolva um determinado componente, visando aproveitar de todos os benefícios

conferidos pelo Governo Brasileiro, uma vez que a patente tem prazo determinado,

sendo que se mantivesse fora do nosso país poderia perder aquele mercado que

fora desenvolvido.

Um contraponto é o fato de no ramo de tecnologia desprezar-se muitas vezes a pre-

servação dos direitos de propriedade em função da necessidade de constante ino-

vação e lançamento de novidades para a sobrevivência. Um computador hoje em 6

21 SEÇÃO II - DA VIGÊNCIA DA PATENTE Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito. Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior. CAPÍTULO XI - DA EXTINÇÃO DA PATENTE Art. 78. A patente extingue-se: I - pela expiração do prazo de vigência; II - pela renúncia de seu titular, ressalvado o direito de terceiros; III - pela caducidade; IV - pela falta de pagamento da retribuição anual, nos prazos previstos no § 2º do artigo 84 e no artigo 87; e V - pela inobservância do disposto no artigo 217. Parágrafo único. Extinta a patente, o seu objeto cai em domínio público.

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meses se torna obsoleto, sem contar que é facilmente copiado ou pirateado por con-

correntes.

Porém, algumas patentes são mais perenes, mesmo que envolva tecnologia, e nes-

se passo pode valer à pena a instalação dentro do território brasileiro.

Outra opção é a aquisição de quotas ou ações da contratante brasileira, ou seja, é a

inserção da estrangeira como sócia, configurando-se não mais na condição de de-

tentora de tecnologia licenciada, mas na distribuição de lucro e compartilhamento de

despesas.

Muitas vezes, pode ser interessante para a estrangeira não mais participar do risco

empresarial, mas sim estar na condição de investidora, deixando para os sócios es-

trangeiros a atribuição de desenvolver resultados, que é o mesmo princípio que rege

as companhias abertas em nosso país, que nos últimos anos tem conquistado o

respeito do mercado internacional, por sua eficiência, transparência e lucratividade,

dentro das normas de Governança Corporativa mundialmente reconhecidas.

Nesse caso, é claro que a estrangeira ao migrar toda sua organização para o nosso

país deverá estudar o custo versus benefício de eventuais transferências de funcio-

nários especializados, ou o treinamento e capacitação de novos profissionais brasi-

leiros. Além de que as tecnologias desenvolvidas até então continuariam sujeitas à

CIDE.

Sem dúvida que outras operações poderiam ser desenvolvidas, mas tudo depende

da forma em que as empresas operam atualmente e do modelo de negócio existen-

te, mesmo porque se deve levar em consideração, para o estrangeiro quanto repre-

senta o mercado brasileiro e qual o potencial de exportação, sob pena de ruir todo

planejamento.

6. Conclusões

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Após todas as considerações, é importante salientar que o estudo foi feito de forma

bastante pragmática, com a finalidade de trazer à discussão um tema bastante atual,

e que norteará o Brasil para os próximos anos, qual seja o desenvolvimento tecnoló-

gico.

Porém, a estratégia do Governo é justamente concorrer e tornar o país competitivo

no mercado internacional, como forma de desenvolvimento em todos os sentidos, e

para tanto, criou a CIDE justamente para “fechar” mercado para tecnologia estran-

geira e estimular as empresas nacionais na parceria com universidades para a cons-

trução de uma inteligência própria.

Por outro lado, não está impedido economicamente que as empresas estrangeiras

possam desenvolver-se dentro do mercado brasileiro, desde que enxerguem poten-

cial e vantagem competitiva no atual mundo globalizado.

Para tanto, é obrigatório que essas empresas planejem as suas atividades dentro

dos princípios e normas aqui tratados, pois caso contrário poderá acarretar ou majo-

rar o risco empresarial.

André Sussumu Iizuka

sócio da Iizuka Advocacia, especialista em Direito da Informática, pós-graduando em

Direito Empresarial pela PUC-SP/COGEAE, sócio-fundador e membro do Conselho

Fiscal do Instituto de Tecnologia de São Caetano do Sul – ITESCS, conveniado à

Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação – ABRAT, colabo-

rador nos Comitê de Tecnologia e Informação (COTEC) e Jurídico da Câmara Ítalo-

Brasileira de Comércio e Indústria (ITALCAM).

Como citar este texto:

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IIZUKA, André Sussumu. Planejamento Tributário – Tecnologia e a CIDE. In:

ANAN JUNIOR, Pedro (Coord.). Planejamento Fiscal Teoria e Prática II. São Paulo:

Quartier Latin, 2009. Material da 3ª aula da Disciplina Contabilidade Tributária e Pla-

nejamento Tributário, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual

de Direito Tributário – REDE LFG.