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 Rev Bras Ortop _  Vol. 33, Nº 5 – Maio, 1998  3 4 5 LESÕES SLAP NO OMBRO Lesões SLAP no ombro * GLAYDSON GOMES GODINHO 1 , J OSÉ MÁRCIO ALVES F REITAS 2 , LUIZ MARCELO B. LEITE 3 , E DUARDO R.M. PINA 4 * Trab . realiz. no s Hosp. Or topédico-AMR e Belo Horizonte, em Belo Ho- rizonte, MG. 1. Cirurg.-c hefe do Grupo de Cir . do Ombro dos Hosp. Ort opédico-AMR e Belo Horizonte – Belo Horizonte, MG. 2. Cirurg. do Grupo de Ci r. do Ombro dos Hosp. Ortopéd ico-AMR e Be lo Horizonte. 3. Residente R4 em Ci rurgia do Ombro. 4. Estagiá rio do Grupo de Cirur gia do Ombro. RESUMO No período compreendido entre março de 1991 e mar- ço de 1998, 662 ombros, correspondendo a 657 pacientes, foram submetidos ao tratamento cirúrgico de desarran-  jos da articu lação do ombro, por via artroscó pica, nos Hospitais Ortopédico-AMR e Belo Horizonte. Foram iden- tificadas 44 lesões SLAP (44 pacientes), isoladas ou asso- ciadas a outras patologias, correspondendo a um percen- tual de 6,6%. A associação mais freqüente foi com a ins- tabilidade anterior (50%). Comparativamente, Stetson et  al. identificaram 140 dessas patologias em uma revisão de 2.375 pacientes submetidos à artroscopia, portanto, com percentual de 5,9%. Os autores discutem a dificuldade do diagnóstico clínico, devido à forma de apresentação mui- to vaga dos sintomas, sugerindo, às vezes, a síndrome do pinçamento subacromial e, às vezes, um quadro de om- bro doloroso por instabilidade oculta. O diagnóstico por imagens também é impreciso e tem variação muito gran- de no índice de acertos e de preferências entre os vários autores. A certeza diagnóstica só pode ser obtida com a artroscopia do ombro, através da qual os autores realiza- ram a reparação das lesões, utilizando apenas o desbrida- mento da lesão em 22 pacientes (55%), sutura translabral transglenóide em 1 (2,5%), miniparafusos e sutura labral em 9 (22,5%), ressecção da alça labral em 6 (15%) e ne- nhum procedimento em 2 (5%). Os resultados do trata- mento, avaliados em 27 pacientes, de acordo com os cri- térios da UCLA, foram de 66,7% de excelentes e 33,3% de bons e o tempo médio de retorno ao esporte foi de 3,5 meses. SUMMARY SLAP lesions in the shoulder  During the period between March 1991 and March 1998, 662 shoulders, corresponding to 657 patients, were submit- ted to a surgical treatment for shoulder articulation disor- ders through arthroscopy at the Hospital Ortopédico-AMR and Hospital Belo Horizonte. Forty-four SLAP lesions (44  patients) were identified, which were isolated or associated to other pathologies, corresponding to a percentage of 6.6%. The most frequent association was made with the anterior instability (50%). Comparably, Stetson et al. have identified 140 of these pathologies in a review of 2,375 patients sub- mitted to arthroscopy, a percentage of 5.9%. The authors dis- cuss the difficulty of clinical diagnosis due to the vague form of presentation of the symptoms, sometimes suggesting sub- acromial impingement syndrome or diagnosis of painful shoulder by occult instability. The image diagnosis is also imprecise and has great variation of accuracy rate and pref- erence among many authors. The diagnostic certainty can only be obtained with the shoul der arthroscopy, through which the authors repaired lesions using lesion debridement in 22  patients (55%) , trans-labrum trans-glenoid in 1 (2.5%), fix- ation labrum using mini-screw and labral suture in 9 (22.5%), labrum bucket-handle resection in 6 (15%), and absence of any other procedure in 2 (5%). The treatment results of 27  patients, according to the UCLA score rate, were 66.7% ex- cellent and 33.3% good, and there was an average time of 3.5 months to resume sports activities. INTRODUÇÃO A investigação das lesões labrais esteve sempre presente nas observações de todos os estudiosos que tentaram com- preender, especialmente, os aspectos anatômicos e fisiopa- tológicos da instabilidade do ombro. Se, por um lado, impor- tantes relatos de lesões localizadas na porção ântero-inferior labral puderam ser feitas e correlacionadas com a clínica, graças a estudos anatômicos e achados cirúrgicos, o mesmo

Lesões SLAP- Maio 1998

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LESÕES SLAP NO OMBRO

Lesões SLAP no ombro*

GLAYDSON GOMES GODINHO1, JOSÉ MÁRCIO ALVES FREITAS2,LUIZ MARCELO B. LEITE3, EDUARDO R.M. PINA4

* Trab. realiz. nos Hosp. Ortopédico-AMR e Belo Horizonte, em Belo Ho-rizonte, MG.

1. Cirurg.-chefe do Grupo de Cir. do Ombro dos Hosp. Ortopédico-AMR eBelo Horizonte – Belo Horizonte, MG.

2. Cirurg. do Grupo de Cir. do Ombro dos Hosp. Ortopédico-AMR e BeloHorizonte.

3. Residente R4 em Cirurgia do Ombro.

4. Estagiário do Grupo de Cirurgia do Ombro.

RESUMO

No período compreendido entre março de 1991 e mar-ço de 1998, 662 ombros, correspondendo a 657 pacientes,

foram submetidos ao tratamento cirúrgico de desarran-  jos da articulação do ombro, por via artroscópica, nosHospitais Ortopédico-AMR e Belo Horizonte. Foram iden-tificadas 44 lesões SLAP (44 pacientes), isoladas ou asso-ciadas a outras patologias, correspondendo a um percen-tual de 6,6%. A associação mais freqüente foi com a ins-tabilidade anterior (50%). Comparativamente, Stetson et

 al. identificaram 140 dessas patologias em uma revisãode 2.375 pacientes submetidos à artroscopia, portanto, compercentual de 5,9%. Os autores discutem a dificuldade dodiagnóstico clínico, devido à forma de apresentação mui-

to vaga dos sintomas, sugerindo, às vezes, a síndrome dopinçamento subacromial e, às vezes, um quadro de om-bro doloroso por instabilidade oculta. O diagnóstico porimagens também é impreciso e tem variação muito gran-de no índice de acertos e de preferências entre os váriosautores. A certeza diagnóstica só pode ser obtida com aartroscopia do ombro, através da qual os autores realiza-ram a reparação das lesões, utilizando apenas o desbrida-mento da lesão em 22 pacientes (55%), sutura translabraltransglenóide em 1 (2,5%), miniparafusos e sutura labralem 9 (22,5%), ressecção da alça labral em 6 (15%) e ne-nhum procedimento em 2 (5%). Os resultados do trata-

mento, avaliados em 27 pacientes, de acordo com os cri-térios da UCLA, foram de 66,7% de excelentes e 33,3%de bons e o tempo médio de retorno ao esporte foi de 3,5meses.

SUMMARY 

SLAP lesions in the shoulder

 During the period between March 1991 and March 1998,

662 shoulders, corresponding to 657 patients, were submit-

ted to a surgical treatment for shoulder articulation disor-

ders through arthroscopy at the Hospital Ortopédico-AMR

and Hospital Belo Horizonte. Forty-four SLAP lesions (44

 patients) were identified, which were isolated or associated 

to other pathologies, corresponding to a percentage of 6.6%.

The most frequent association was made with the anterior 

instability (50%). Comparably, Stetson et al. have identified 

140 of these pathologies in a review of 2,375 patients sub-

mitted to arthroscopy, a percentage of 5.9%. The authors dis-

cuss the difficulty of clinical diagnosis due to the vague form

of presentation of the symptoms, sometimes suggesting sub-acromial impingement syndrome or diagnosis of painful

shoulder by occult instability. The image diagnosis is also

imprecise and has great variation of accuracy rate and pref-

erence among many authors. The diagnostic certainty can

only be obtained with the shoulder arthroscopy, through which

the authors repaired lesions using lesion debridement in 22

 patients (55%), trans-labrum trans-glenoid in 1 (2.5%), fix-

ation labrum using mini-screw and labral suture in 9 (22.5%),

labrum bucket-handle resection in 6 (15%), and absence of 

any other procedure in 2 (5%). The treatment results of 27 

 patients, according to the UCLA score rate, were 66.7% ex-

cellent and 33.3% good, and there was an average time of 

3.5 months to resume sports activities.

INTRODUÇÃO

A investigação das lesões labrais esteve sempre presentenas observações de todos os estudiosos que tentaram com-preender, especialmente, os aspectos anatômicos e fisiopa-tológicos da instabilidade do ombro. Se, por um lado, impor-tantes relatos de lesões localizadas na porção ântero-inferiorlabral puderam ser feitas e correlacionadas com a clínica,graças a estudos anatômicos e achados cirúrgicos, o mesmo

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G.G. GODINHO, J.M.A. FREITAS, L.M.B. LEITE & E.R.M. PINA

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não aconteceu com a metade superior do labrum e a inserçãodo tendão longo do músculo bíceps devido à dificuldade deabordar aquela região através dos acessos cirúrgicos clássi-cos. Também a dificuldade na obtenção de imagens bem de-finidas, mesmo com métodos modernos, como a ressonâncianuclear magnética, fez com que se reservasse à artroscopiado ombro o grande mérito de estender o campo visual docirurgião até espaços ainda pouco conhecidos, permitindo-lhe diagnosticar, estudar estática e dinamicamente e corrigirlesões que se apresentaram como “novas” dentro do conhe-cimento ortopédico.

Dentro desse grupo de patologias, destacam-se as lesões

que estão localizadas na parte ântero-superior, superior e pós-tero-superior do labrum, tomando-se como referência cen-tral a zona de inserção do tendão longo do bíceps que, exata-mente devido a essa correlação anatômica, assume grandeimportância, por sua função estabilizadora dinâmica e, con-seqüentemente, as lesões aí localizadas constituem fontes desintomas e incapacidades para o paciente, especialmente oatleta jovem.

Snyder et al. classificaram tais lesões em quatro tipos dis-tintos e denominaram-nas SLAP lesions (superior labrum an-

terior and posterior)(22).Na clínica de artroscopia e cirurgia do ombro dos Hospi-

tais Ortopédico e Belo Horizonte, temos desenvolvido umalinha de pesquisa médico-cirúrgica voltada para o estudo daslesões labrais superiores(11).

O objetivo deste trabalho é mostrar a incidência das le-sões SLAP, os métodos de diagnóstico, com ênfase para aartroscopia, as possibilidades cirúrgicas e a importante cor-relação com o trauma no ombro do esportista jovem.

MATERIAL E MÉTODOS

No período compreendido entre março de 1991 e março

de 1998, 662 ombros, correspondendo a 657 pacientes, fo-ram submetidos a cirurgia por via artroscópica, no HospitalOrtopédico-AMR e Hospital Belo Horizonte, para tratamen-to de desarranjos de sua articulação. Foram identificadas 44lesões SLAP, presentes em 44 pacientes, isoladamente ouassociadas a outras patologias, o que corresponde a um per-centual de 6,6% dos ombros operados. Do total, excluímosos pacientes com menos de 6 meses de seguimento pós-ci-rúrgico, o que nos permitiu o estudo em um universo de 40ombros em 40 pacientes.

Vinte e sete pacientes foram submetidos a exame físico eexame radiográfico nas incidências em ântero-posterior em

rotações neutra, externa e interna, perfil de Bernageau(5) eoutlet view. Utilizamos a artrotomografia computadorizada(artro-CT) em 4 pacientes e a artrorressonância nuclear mag-nética (artro-RMN) em 6 outros. Não lançamos mão da ar-trografia simples ou da ecografia como métodos auxiliarespara o diagnóstico.

Esse mesmo grupo de 27 pacientes foi avaliado segundoos critérios clínicos da UCLA e serviram como base para aanálise dos resultados cirúrgicos. Os demais pacientes foramentrevistados por telefone e acrescidos os dados contidos emseus prontuários e em fitas de vídeo contendo o documentá-rio cirúrgico deles. Esse grupo, adicionado aos 27 anterio-res, constitui nossa base do estudo epidemiológico.

O seguimento mínimo foi de 6 meses e o máximo de 84,com média de 42,9 meses. A faixa etária variou de 18 a 46anos, média de 30,6 anos. A incidência no sexo masculino

foi de 33 ombros (82,5%) e, no feminino, de 7 ombros (17,5%).O lado dominante foi acometido 27 vezes (67,5%) e o não-dominante, 13 vezes (32,5%). Trinta e oito pacientes (95%)eram destros e 2 sinistros (5%). Vinte e seis pacientes eramdesportistas (65%) (gráfico 1), 3 deles profissionais (7,5%),sendo 2 nadadores e 1 atleta de vôlei. Os restantes eram atle-tas de lazer ou ocasionais. Quatorze pacientes (35%) não pra-ticavam esportes.

As lesões foram classificadas segundo os critérios de Sny-der(22), em tipo I quando existia apenas a fragmentação labral(fig. 1); tipo II, quando existia a desinserção labrum-glenoi-dal (figs. 2, 3 e 4); tipo III, caracterizada pela alça de balde

Gráfico 1 – Distribuição dos pacientes segundo os tipos da lesão (I, II, III e IV), com destaque para a participação dos desportistas

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LESÕES SLAP NO OMBRO

RESULTADOS

Em 9 pacientes (22,5%), a suspeita diagnóstica foi feitaem bases clínicas, em 6 (15%) foi realizado estudo por res-sonância nuclear magnética e destes, apenas 2 (33,3%) evi-

denciavam a imagem da lesão (fig. 2).Em apenas 1 paciente o diagnóstico foi feito através de

artrotomografia computadorizada, enquanto em outros 3 oexame foi negativo.

O tipo I foi identificado em 6 pacientes (15%), tipo II em23 (57,5%), tipo III em 9 (22,5%) e tipo IV em 2 (5%) (grá-fico 2).

A lesão SLAP apresentou-se isoladamente em 7 pacientese em associação com outras patologias nos 33 restantes. En-tre as patologias associadas, a tendinite calcária esteve pre-sente em 5 ombros (12,5%), luxação recidivante anterior em20 (50,0%), subluxação recidivante em 1 (2,5%), síndrome

labral (figs. 7 e 8); e tipo IV, com alça de balde estendendo-

se ao tendão bicipital (fig. 9).A técnica cirúrgica empregada constou de inspeção arti-

cular e tratamento das lesões articulares associadas, desbri-damento e regularização labrum-glenoidal apenas, sem fixa-ção, em 22 pacientes (55%), sutura translabral-transglenóideem 1 (2,5%), sutura com uso de miniparafusos de 2,7mm em9 (22,5%) (figs. 4, 5 e 6), ressecção da alça labral em 6 (15%)(figs. 7, 8 e 9) e, nada foi feito em 2 (5%), tratando-se apenasa lesão associada. Recentemente, tivemos a oportunidade derealizar a sutura da alça, em vez de sua ressecção simples,em 2 pacientes com lesão do tipo IV, ambos não fazendoparte desta série por terem menos de 6 meses pós-cirúrgicos.

 Fig. 4 Diagnósticoartroscópico deuma lesão do tipo II. Setas indicandoa zona de

desinserção e fragmentaçãolabral.G – glenóide, L – labrum , B – tendão longodo bíceps.

 Fig. 3 – Desenhoesquemático dotipo II de lesãoSLAP. Observar adesinserção labralsuperior.

 Fig. 2 – RMN comdiagnóstico do tipo

 II de lesão SLAP.Setas indicando a

  zona labralsuperior lesada.

 Fig. 1 – Desenhoesquemático da

lesão SLAPdo tipo I 

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do impacto na fase II em 6 (15%) e ruptura do manguitorotador em 1 (2,5%).

Em 28 pacientes (70%) houve associação com história detrauma, 20 dos quais com luxação glenumeral anterior e 1subluxação.

A distribuição dos tipos da lesão dentro do grupo de porta-dores de instabilidade glenumeral anterior traumática (luxa-ção e subluxação) mostrou a seguinte freqüência: tipo I com1 paciente (4,8%), tipo II com 11 (52,4%), tipo III com 8(38,0%) e tipo IV com 1 (4,8%) (gráfico 3).

Os resultados, segundo os critérios da UCLA, utilizadosna avaliação de 27 pacientes, foram 18 (66,7%) excelentes e9 (33,3%) bons. Um paciente apresentou recidiva pós-cirúr-gica da luxação, mas a artroscopia evidenciou completa ci-catrização labrum-glenoidal.

Nos ombros que apresentaram lesão SLAP isoladamente,o tempo médio decorrido entre o início dos sintomas e a ci-rurgia foi de 16,3 meses, com mínimo de 6 e máximo de 36meses.

O tempo médio de retorno ao esporte foi de 3,5 meses,mínimo de 1 mês e máximo de 10 meses.

DISCUSSÃO

A discussão quanto ao grau de participação das lesões la-brais nas patologias do ombro, especialmente no que concer-

 Fig. 5 – Imagemartroscópica dolabrum superior 

reinserido comsutura anterior e

 posterior àinserção do tendão

bicipital.G – glenóide,

U – cabeça doúmero,

 BL – tendãolongo do bíceps.

 Fig. 6 – Controleradiológico

 pós-cirúrgico da  fixação labral

observada nas figs.2, 4 e 5. Setasindicando os

miniparafusosinseridos no pólo

superior daglenóide.

 Fig. 7 – Desenhoesquemático de

uma lesãodo tipo III 

 Fig. 8 – Imagemartroscópica deuma lesão do tipo III. Setas indicandoa separação daalça labral. L – labrum.

 Fig. 9 – Imagem artroscópica de uma lesão do tipo IV à esquerda e desenhoesquemático (N. Walch), no alto à direita. U – cabeça do úmero, B – tendãolongo do bíceps, G – glenóide. Setas indicando a separação da alça.

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LESÕES SLAP NO OMBRO

Gráfico 2 – Freqüência dos diferentes tipos da lesãoGráfico 3 – Relação percentual entre portadores de instabilidade anterior do ombro (luxação e subluxação) e tipos da lesão

ne à importância do labrum para a estabilidade do ombro,faz parte das inquietações daqueles que ao longo do tempovêm-se ocupando do estudo desta articulação(1,3,8,9,13,20). Como advento da artroscopia, novos horizontes foram abertos e oconhecimento de novas patologias e suas correlações comsintomas e perdas funcionais do ombro passou a ser um novodesafio.

Andrews & Carson(1) relataram a ocorrência de lesões la-brais ântero-superiores, mas sem a extensão ao labrum pos-terior e com incidência de 9,7% de rupturas parciais do bí-ceps. Os autores acreditavam que tal lesão fosse causada portração repetitiva no bíceps, como conseqüência de movimen-tos de arremesso.

Reeves(18) e Perry(16) demonstraram que em jovens com me-nos de 25 anos a fixação do labrum ao osso é mais frágil do

que aquela da cápsula e tendão subescapular. Concluem, as-sim, que luxações nessa faixa etária tendem a romper a liga-ção labrum-glenoidal, raciocínio que podemos estender àslesões labrais superiores.

Burkhead(6) estudou a vascularização labral e demonstrouque o aporte vascular ao labrum é muito rico, exceto no la-

brum superior, o que pode explicar a evolução da lesão SLAPpela dificuldade de cicatrização após um trauma maior oupela repetição de microtraumas locais.

Rodosky et al.(19), Hunter et al.(12) e Snyder et al.(22) de-monstraram que o mecanismo de desaceleração realizado pelobíceps do atleta arremessador causa tração excessiva no la-

brum superior. Demonstrou-se, em laboratório de biomecâ-nica, a importância da ação normal do bíceps, agindo princi-palmente durante a abdução e rotação externa como protetordo mecanismo labrum-ligamentar glenumeral inferior, me-canismo este que entra em falência progressiva quando seestabelece a lesão na inserção do tendão bicipital no labrum

superior (lesão SLAP), como demonstrado experimentalmen-te(19).

As lesões que acometem as porções ântero-súpero-poste-riores do labrum glenoidal, SLAP lesions, como descritas porSnyder et al.(22) e Stetson et al.(23), constituem um grupo delesões de origem traumática, freqüentemente associadas comoutras patologias intra e extra-articulares, traumáticas ou não,com incidência na população mais jovem e ativa. São dediagnóstico extremamente difícil, pois apenas a dor, sem pre-

cisão topográfica, é um achado constante, enquanto sua pre-sença localizada no tendão longo do músculo bíceps é in-freqüente. Infreqüentes também são os estalidos intra-arti-culares que, quando associados à dor, história de trauma comapoio no membro superior com extensão do cotovelo, e om-bro em flexão de 70 graus e abdução de 30 graus(22), ou ematletas arremessadores(19,22), assumem importância na pesqui-sa clínica. Lembrar, contudo, que estalidos articulares sãomuito freqüentes em ombros normais.

O teste clínico realizado com o cotovelo estendido, ante-braço pronado e em adução passando da linha média do tó-rax (cross chest adduction test) tem sido advogado por al-

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guns autores(4). Nesse teste, há manifestação de dor profun-da, localizada no sulco intertubercular, a qual desaparece como antebraço supinado. Esse sinal é de utilidade também parao diagnóstico diferencial com patologias acromioclavicula-res.

O teste de compressão-rotação, realizado em posição su-pina, com o membro superior em 90 graus de abdução, 90graus de flexão do cotovelo, fazendo-se compressão articu-lar com movimentos de rotação, objetiva capturar a alça la-bral, provocando um ressalto articular.

A realização do teste de tensão do bíceps (palm up test) éde utilidade e evidencia o grau de participação desse múscu-

lo na patologia.Wright & Hawkins(25) descreveram o teste do deslizamen-

to anterior (AST) realizado com as mãos posicionadas nosquadris, polegar para trás e o examinador estabilizando a es-cápula com uma das mãos, enquanto a outra é colocada nocotovelo, resistindo à força de impulsão realizada para cimae para trás pelo paciente. A suspeita diagnóstica é baseadana presença da dor ou clique durante o esforço. O teste mos-trou sensibilidade de 78,4% e especificidade de 91,5%, masnão confirma o diagnóstico.

A presença como patologia associada deve ser sempre lem-brada nos portadores de instabilidade anterior traumática. En-fim, o quadro clínico, muito impreciso, assume aspectos queconfundem, ora com o diagnóstico de tendinite do supra-espinhoso, ora com o ombro instável doloroso “oculto”, comoatestam Cordasco et al.(8) e até mesmo com as patologiasacromioclaviculares(4).

Como métodos auxiliares de diagnóstico por imagem, aradiografia simples ou contrastada não é eficaz. A ecografiatambém não tem valor(14). Para LaBan et al.(14), a artroscopiado ombro, tomografia computadorizada, artrografia e RMNtêm sensibilidade e especificidade relativamente iguais navisibilização da lesão labral. Para alguns autores (5,12,15), a ar-

trotomografia computadorizada é freqüentemente a técnicamais indicada devido à definição e secção fina que podemser obtidas.

Utilizamos a artrotomografia computadorizada em 4 pa-cientes, com apenas uma confirmação diagnóstica.

Bernageau(5) assegura que a artro-RMN é mais eficaz edeve constituir a técnica do futuro, afirmando ainda que ademonstração e interpretação da lesão SLAP é difícil, parti-cularmente nos tipos I e II, e que a análise do labrum glenoi-dal é limitada. Cartland et al.(7), baseados em estudo realiza-do em 10 pacientes nos quais a RMN não permitiu o diag-nóstico em nenhum deles, concluem que esse é um exame

sem especificidade e sensibilidade. Smith et al.(21) realiza-ram estudo por RMN em 6 pacientes que também foram sub-metidos a artroscopia do ombro. Encontraram 4 lesões SLAP,mas somente 1 apresentou suspeita baseada em dados clíni-cos pré-operatórios. Field & Savoie(10) detectaram a lesão porintermédio da RMN em 4 de 13 pacientes examinados. ParaSnyder et al.(22), a RMN e a artrotomografia ajudam no diag-nóstico, mas não têm definição acurada.

Utilizamos a artro-RMN para pesquisa diagnóstica em 6pacientes, com confirmação em 2 (33,3%).

A definição diagnóstica foi feita sempre através da artros-copia, como recomendado por vários autores(7,22,25).

Stetson et al.(23) identificaram 140 lesões SLAP em umarevisão de 2.375 pacientes submetidos a artroscopia do om-bro (5,9%). Curiosamente, nossos índices se aproximammuito disso, já que identificamos 44 lesões SLAP em 662ombros, ou seja, 6,6%. A proporção semelhante pode ser umindicador de que a capacidade de diagnóstico do grupo detrabalho condiz com um nível de experiência bastante satis-fatório. O diagnóstico não é fácil e pode passar despercebi-do, ou confundir-se com aspectos que são variáveis da ana-tomia normal, como a inserção regular, porém frouxa, dolabrum, a forma labral meniscóide, ou a fragmentação labralcomumente vista em pacientes na faixa etária acima de 50anos de idade e que constitui lesão degenerativa e não lesãoSLAP. Por esses motivos, os tipos I e II são os de diagnósticodiferencial mais difícil, especialmente nas faixas etárias maisaltas, como ocorre no ombro doloroso do atleta sênior.

Em nossa revisão, lesões SLAP apresentaram-se isolada-mente em 7 pacientes e em associação com outras patologiasnos 33 restantes, o que demonstra a importância do reconhe-cimento e abordagem concomitante dessa lesão.

As patologias associadas são de etiologias as mais varia-das: traumáticas, inflamatórias e degenerativas. Contudo, éfreqüente a correlação com a instabilidade anterior de ori-

gem traumática (21 ombros, ou 52,5%) (gráfico 3). Warneret al.(24) encontraram 9 lesões SLAP em 585 artroscopias(1,5%) e dessas, 7 (77,8%) estavam associadas com lesão deBankart e luxação recidivante.

Muita ênfase tem sido dada à importância do tratamentoda lesão SLAP concomitante com o tratamento artroscópicoda instabilidade anterior do ombro, como um dos fatores quetêm levado a redução nos índices de recidivas pós-cirúrgi-cas(23).

Quando analisamos a freqüência dos tipos da lesão asso-ciados com luxação e subluxação, observamos que o tipo IIfoi o mais freqüente (52,4%) (gráfico 3). Contudo, em análi-

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LESÕES SLAP NO OMBRO

se individualizada dos tipos, observamos que, dos 9 casos dotipo III, 8 (88,9%) apresentaram essa correlação e 1 dos 2portadores do tipo IV, também (50%).

Quanto ao tratamento, Snyder et al.(22) e Stetson et al.(23)

recomendam a realização apenas do desbridamento do teci-do degenerado no tipo I, desbridamento e sutura com fixa-ção labrum-glenoidal no tipo II, desbridamento com fixaçãolabral na glenóide e sutura da alça de balde no tipo III, alter-nativamente podendo apenas ressecar-se a alça (figs. 7, 8 e9). Procedimento semelhante é realizado para o tipo IV. Paraa fixação e sutura, esses autores utilizam miniparafusos de2,7mm fixados em fios inabsorvíveis nº 2. O tratamento da

lesão de Bankart, quando presente, é feito da mesma manei-ra, fixando-se o labrum ântero-inferior com 3 ou 4 minipara-fusos e sutura.

Temos realizado os mesmos procedimentos recomenda-dos por Snyder(22) (figs. 4, 5, 6, 7, 8 e 9), inclusive com sutu-ra da alça nos tipos III e IV. Não temos experiência com ouso de âncoras absorvíveis, usadas por alguns autores(2).

Stetson et al.(23) encontraram 77% de bons ou excelentesresultados, 19% de razoáveis e 4% de pobres, enquanto osnossos situaram-se apenas nas faixas de excelentes e bons(66,7 e 33,3%, respectivamente), mas com um contingentemuito menor de pacientes avaliados.

O tempo médio de retorno ao esporte foi de 3,5 meses,mas, dos 3 atletas profissionais (2 nadadores e 1 atleta devôlei), apenas 1 (nadador) voltou ao nível anterior. Um dosatletas de vôlei abandonou o esporte, devido a uma lesãoligamentar no joelho e não ao resultado cirúrgico do ombro,que está assintomático.

CONCLUSÃO

As lesões SLAP têm origem traumática, são causadas pormecanismo de queda com apoio do membro superior em ab-dução do ombro de 30 graus e flexão de 70 graus, podem ser

conseqüência de tração exercida pelo tendão bicipital no la-brum no esforço do arremesso, ou podem ser conseqüênciade outros mecanismos de trauma ainda não conhecidos oureproduzidos em laboratórios.

Caracteristicamente, ocorrem na população de faixa etá-ria mais jovem e desportista e têm importante correlação coma instabilidade anterior do ombro, devendo ser sempre iden-tificadas e tratadas simultaneamente com a correção da ins-tabilidade.

O diagnóstico clínico é extremamente difícil e as queixasde dor e incapacidade progressiva são muito vagas. A tendi-nite do tendão longo do bíceps, associada a ressaltos articu-

lares, pode sugerir o diagnóstico. Muito embora a artroto-mografia computadorizada seja advogada por alguns auto-res, a artrorressonância nuclear magnética deve vir a ser ométodo de diagnóstico por imagens com maior índice de acer-to. O único método seguro de confirmação diagnóstica é pelaartroscopia, através da qual pode-se também realizar a regu-larização labral e/ou sutura com fixação labrum-glenoidal,com a qual se obtém alto índice de excelentes e bons resulta-dos quanto ao alívio da dor e para a completa recuperaçãofuncional para os esportes.

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